Cartilha Direitos Humanos Na Graduação em Psico

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Grupo de pesquisa

Violência, Infância, Adolescência e


Atuação das Redes de proteção e de atendimento

Abordagem dos DIREITOS HUMANOS


na graduação em PSICOLOGIA

AUTORIA
Stéfani Loize Schmitt Silveira
Jean Von Hohendorff

REVISÃO GRAMATICAL
Lariani de Cesaro Acevedo

DIAGRAMAÇÃO
Stéfani Loize Schmitt Silveira

2024
Agradecemos às pessoas professoras do curso de Psicologia
da Atitus Educação pelas sugestões.

Como citar:
APA: Silveira, S. L. S., & Hohendorff, J. V. (2024). Abordagem dos direitos
humanos na graduação em Psicologia [Livro eletrônico]. Ed. dos Autores.
ABNT: SILVEIRA, Stéfani Loize Schmitt; HOHENDORFF, Jean Von. Abordagem dos
direitos humanos na graduação em Psicologia [Livro eletrônico]. Passo Fundo,
RS: Ed. dos Autores, 2024.
Código de Ética Profissional
Conselho Federal de Psicologia
1

Os Direitos Humanos (DH) podem ser definidos como


direitos inerentes a todas as pessoas,
independentemente de sua nacionalidade, etnia,
gênero, religião, orientação sexual ou qualquer
outra característica. Esses direitos são considerados
fundamentais e universais, abrangendo diversas
liberdades e garantias nos aspectos civis, políticos,
1
econômicos, sociais e culturais.
A necessidade de instituir os DH surgiu após a I
Guerra Mundial, em 1919, e teve de ser reafirmada
após a II Guerra Mundial, que chegou ao fim em
1945. A Declaração Universal dos Direitos Humanos,
aprovada pela Resolução 217-A, durante a 3ª Sessão
Ordinária da Assembleia Geral das Nações Unidas,
em 10 de dezembro de 1948, representa o principal
2
instrumento normativo desses direitos.
No Brasil, a luta pelos DH emergiu com maior
intensidade na segunda metade dos anos 70, com
diversos movimentos sociais contrários à ditadura
3
militar. No entanto, esses direitos foram efetivamente
reconhecidos apenas em 1988, por meio da nova
4
Constituição da República Federativa do Brasil.
2

Os DH fornecem a base para diferentes


profissões. Na Psicologia, os princípios
fundamentais do código de ética orientam o
trabalho da pessoa psicóloga para respeitar e
promover a liberdade, dignidade, igualdade e
integridade do ser humano, alinhando-se aos
5
valores da Declaração Universal dos DH. Existem,
inclusive, Comissões de Direitos Humanos no
Conselho Federal e nos Conselhos Regionais de
6, 7
Psicologia. A Diretriz Curricular Nacional (DCN)
também destaca o respeito à diversidade
pessoal, social, cultural e ética, em consonância
com a Declaração Universal dos Direitos
Humanos, como elemento transversal no ensino da
8
Psicologia.

É perceptível, então, que os DH devem fazer parte


do ensino e da prática de Psicologia.

2
3

Diante disso, foi realizado um estudo com o


objetivo de conhecer as percepções de
estudantes de Psicologia sobre os DH. Foram
realizadas entrevistas semi-estruturadas com 34
estudantes de psicologia dos níveis iniciais (ie.,
1º ao 4º); níveis intermediários (ie., 5º ao 7º) e
concluintes (ie., 8º ao 10º) de dois campus de
uma instituição privada, localizados na capital
e no norte do Rio Grande do Sul. Os resultados
indicam que a abordagem dos DH parece estar
focada no início da graduação e de forma
pontual em algumas disciplinas. Nesse sentido,
elaboramos essa cartilha a fim de sugerir como
temáticas de DH podem ser abordadas nas
diferentes disciplinas ao longo de toda a
graduação e de forma transversal, como indica
a DCN.

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4
DIREITOS HUMANOS
na graduação em PSICOLOGIA
A abordagem dos DH durante a graduação em
Psicologia deve ser constante. É inadequado que o
tema fique restrito a uma disciplina, uma vez que o
fazer psicológico deve estar baseado na
Declaração Universal dos Direitos Humanos,
conforme Princípios Fundamentais do Código de
Ética da Psicologia. Assim, buscou-se oferecer um
material conciso, no qual apresentamos algumas
indicações de abordagem dos DH nas mais
variadas disciplinas. É importante ressaltar que o
objetivo não é esgotar todas as possibilidades de
trabalhar DH na graduação de psicologia, dada a
amplitude e complexidade do tema. Destacamos,
também, que os DH devem ser abordados de
forma transversal em todas as disciplinas da grade
curricular. Optamos por apresentar as indicações
a partir de agrupamentos de disciplinas, que
geralmente integram as grades curriculares dos
cursos de graduação.
5
DIREITOS HUMANOS nas
disciplinas de PSICOLOGIA CLÍNICA
Nessas disciplinas é possível introduzir os DH
utilizando pessoas autoras nacionais que
aplicam as aborgagens no território nacional,
bem como ensinar a postura da psicologia
afirmativa, problematizar se as técnicas
propostam levam em consideração
especifidades de raça, gênero e demais
marcardores sociais. Na teoria Cognitivo-
Comportamental, por exemplo, a utilização
de técnicas de exposição para ansiedade
social deve ser questionada com pessoas
negras que, por conta do racismo e da
branquitude, realmente sofrem rechaço social
e a exposição acabaria por ser algo aversivo.
A discussão sobre a origem das abordagens,
que geralmente se baseiam em visões
eurocêntricas e norte americanas, e o
questionamento da aplicabilidade de certos
transtornos psicológicos também deve ser
feito (ver disciplinas de Psicopatologia).
6
DIREITOS HUMANOS nas
disciplinas de HISTÓRIA DA PSICOLOGIA

Examinar como a psicologia, em sua criação,


costuma fomentar a normatividade, sendo que
a ciência psicológica contribui para regular as
pessoas que não se encaixam em um padrão
estabelecido. Também, é necessário que se
aborde o histórico do DSM como um processo
de medicalização de condutas consideradas
socialmente indesejáveis, que passaram a ser
classificadas como anormais - como, por
exemplo, o envolvimento da psicologia com a
patologização da negritude e da diversidade
sexual e de gênero.
7
DIREITOS HUMANOS nas
disciplinas de HISTÓRIA DA PSICOLOGIA

Além do mais, é possível trazer para o debate a


atuação da Psicologia durante a ditadura
militar brasileira, quando eram utilizadas
ferramentas (e.g., testes psicológicos) para
classificar e rotular pessoas de oposição como
desestruturadas ou desajustadas. Pode-se
estabelecer uma crítica ao posicionamento
cultural das concepções de base da Psicologia
voltadas a modos de vida e expressões greco-
romanas, judaicas e cristãs. Deste modo, é
possível incluir a discussão da Psicologia
Indígena evitando reprodução de violências
epistêmicas e explorando a diversidade das
tradições culturais.
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DIREITOS HUMANOS nas disciplinas
de DESENVOLVIMENTO HUMANO

Nessas disciplinas, ao utilizar livros clássicos


de desenvolvimento humano, buscar conectar
os conteúdos à realidade brasileira e local.
Problematizar os impactos da falta de acesso
aos direitos básicos no desenvolvimento
humano, principalmente, relacionados à
desigualdade social, tão característica do
Brasil. Estudar leis e diretrizes nacionais, por
exemplo, o Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA), Estatuto da Juventude, Lei
Maria da Penha e o Estatuto do idoso. Estudar
o desenvolvimento de grupos minorizados e
não apenas de grupos hegemônicos. Abordar
as violações dos DH ao longo do ciclo vital e o
papel da Psicologia no seu enfrentamento.
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DIREITOS HUMANOS nas
disciplinas de PSICOPATOLOGIAS

É imprescindível não focar em uma


perspectiva reducionista e individualista do
sofrimento psicológico, buscando considerar
determinantes sociais. Problematizar os
transtornos psicológicos a partir de aspectos
como raça, gênero e orientação sexual.
Analisar como os transtornos mentais foram
sendo alterados ao longo do tempo. Discutir
sobre reforma psiquiátrica e luta
antimanicomial. Abordar fatos históricos
nacionais, como o ocorrido no Hospital
Barbacena, em Minas Gerais, e
personalidades importantes para a luta
antimanicomial como Ivone Lara e Nise da
Silveira.

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DIREITOS HUMANOS nas disciplinas
de PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL

Nessas disciplinas é necessário abordar


vieses como os de raça e de gênero nos
processos de seleção, além dos impactos da
precarização do trabalho. Abordar as
relações entre neoliberalismo e o sofrimento
psíquico. Refletir sobre modelos de
recrutamento/seleção e a inclusão. Abordar
o racismo e o pacto da branquitude nas
empresas. Ressaltar a importância da
diversidade no ambiente de trabalho.
Abordar sobre o papel da Comissão Interna
de Prevenção de Acidentes (CIPA) e a sua
nova responsabilidade de prevenir violência
contra as mulheres.
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DIREITOS HUMANOS nas


disciplinas de AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA
Refletir sobre qual foi a população, quais
foram os instrumentos validados e como são
aplicados em pessoas com diferentes
necessidades. Questionar normatizações
presentes nos instrumentos (e.g., questões
apenas sobre casais heterossexuais). Refletir
sobre qual o objetivo das avaliações e como
podem ser usadas para a produção ou
reprodução de rótulos. Atentar para as
especificidades socioculturais e sua possível
influência na subjetividade, com o objetivo de
não patologizar comportamentos e emoções
culturalmente definidos.
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DIREITOS HUMANOS nas
disciplinas de MÉTODO CIENTÍFICO

Questionar a "neutralidade" da ciência e o


seu papel na defesa de DH. Abordar a ética
em pesquisa, principalmente, relacionada aos
riscos e benefícios para as pessoas
participantes e pesquisadoras. Apresentar
histórico de violação de DH em pesquisas
científicas (e.g., Caso Tuskegee) e a
importância dos Comitês de Ética. Abordar
estudos decoloniais e pensamento
afrodiaspórico, bem como estratégias de
pesquisa latino-americanas.
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DIREITOS HUMANOS nas
disciplinas de PSICOLOGIA JURÍDICA

Nessas disciplinas é possível enfatizar o


papel da Psicologia em relação às leis,
verificando o quanto o ordenamento jurídico
pode reproduzir preconceitos e
discriminações. Abordar o racismo e sexismo
presentes nas decisões judiciais. Discutir
procedimentos realizados por pessoas
psicólogas, tais como Depoimento Especial e
perícia técnica, bem como a sua relação
com a garantia de DH. Abordar a produção
de documentos por profissionais da
psicologia e suas possíveis implicações
jurídicas. Analisar criticamente a proposição
de leis acerca de fenômenos ditos
psicológicos, como a Lei da Alienação
Parental e seu potencial de contribuir para
violações de DH.
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DIREITOS HUMANOS nas
disciplinas de PSICOLOGIA ESCOLAR
Refletir sobre as diferentes realidades que
existem na educação brasileira. Discutir sobre
a precarização da educação, a influência da
lógica capitalista no cotidiano da escola
como um todo, a psicopatologização da
infância e aspectos macrossociais envolvidos
em ataques às escolas. Estudar sobre
violência contra crianças e adolescentes e
estratégias de enfrentamento a partir do ECA.
Conhecer as legislações para atuação
profissional na educação. Refletir sobre a
atuação da Psicologia escolar junto à
educação inclusiva (Educação Especial;
diversidade racial/étnica; diversidade sexual
e de gênero, diversidade religiosa e
diversidade de classes). Ampliar o olhar de
atuação para além da escola formal, e
destacar o papel profissional da psicologia
junto à educação em outros espaços, como
em organizações não governamentais
(ONGs), Educação de Jovens e Adultos,
educação nos presídios, entre outros.
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DIREITOS HUMANOS nas disciplinas
de PSICOLOGIA SOCIAL E COMUNITÁRIA
É preciso analisar, nessas disciplinas, o papel
da Psicologia na defesa das instituições
democráticas e na promoção dos DH. Da
mesma maneira, deve-se estimular a
compreensão dos fenômenos sociais a partir
das dinâmicas de desigualdade social e da
opressão. É necessário abordar a importância
de processos de participação popular nas
propostas de intervenção, considerando a
cultura e saberes populares das diversas
comunidades, bem como a importância de
equipes multidisciplinares. Discutir formas de
promoção da justiça social, considerando
aspectos da interseccionalidade entre
gênero, raça e classe. Estudar as políticas
públicas, como o Sistema Único de Saúde
(SUS) e o Sistema Único de Assistência Social
(SUAS), como também as políticas nacionais
de transferência de renda e seus impactos. O
estudo da psicologia social e comunitária
brasileira e latino-americana deve ser incluso
nas ementas (ver indicações ao final).
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DIREITOS HUMANOS
nos ESTÁGIOS EM PSICOLOGIA

Nos estágios em Psicologia é necessário ter


atenção a possíveis violações de direitos e
realizar as intervenções (e.g. notificações),
como preconiza o Código de Ética. É
imprescindível que as pessoas estagiárias e
supervisoras estejam preparadas para o
trabalho com diferentes populações. Para tal,
é importante o uso de referências técnicas do
Centro de Referências Técnicas em Psicologia
e Políticas Públicas (CREPOP).
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INDICAÇÕES DE MATERIAIS
Acesse via QR Code ou clicando no título quando sublinhado.

Gênero e orientação sexual


Estabelece normas de atuação para
pessoas psicólogas em relação à
questão da orientação sexual.

Estabelece normas de atuação


para as pessoas psicólogas em
relação às pessoas transexuais e
travestis.
Estabelece normas de atuação
para pessoas psicólogas em
relação às bissexualidades e
demais orientações não
monossexuais.

Referências técnicas para atuação


de pessoas psicólogas em políticas
públicas para população LGBTQIA+.

Manual de Terapia Afirmativa: Um guia


para a psicoterapia com pessoas
LGBTQ+. Editora Afirmativa: 2023.
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INDICAÇÕES DE MATERIAIS
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Religião
Estabelece normas para o exercício
profissional em relação ao caráter
laico da prática psicológica.

Moradia
Referências técnicas para atuação
das pessoas psicólogas em
questões relativas à terra

Se a cidade fosse nossa.


Editora Paz e Terra: 2023.

Direito à moradia e
participação popular.
Editora Dialética: 2021.
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INDICAÇÕES DE MATERIAIS
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Racismo e Branquitude

Estabelece normas de atuação para


as pessoas psicólogas em relação a
preconceito e discriminação racial.

Institui o Estatuto da Igualdade


Racial.

Relações raciais: Referências


técnicas para atuação de pessoas
psicólogas.

Racismo: por uma psicanálise


implicada. Artes e Eccos: 2021.

O pacto da Branquitude.
Companhia das Letras: 2022.
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INDICAÇÕES DE MATERIAIS
Acesse via QR Code ou clicando no título quando sublinhado.

Violência
Referências técnicas para atuação
de psicólogas/os na rede de
proteção às crianças e
adolescentes em situação de
violência sexual

Lei Maria da Penha

Referências técnicas para atuação


de psicólogas/os em Programas
de Atenção à Mulher em situação
de Violência

Desenvolvimento Humano
Estatuto da Criança e do
Adolescente

Estatuto da Juventude

Estatuto da Pessoa Idosa


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INDICAÇÕES DE MATERIAIS
Acesse via QR Code ou clicando no título quando sublinhado.

Povos tradicionais

Referências técnicas para


atuação de psicólogas/os junto
aos povos indígenas

Referências técnicas para


atuação de psicólogas/os com
povos tradicionais

Ideias para adiar o fim do


mundo. Companhia das letras:
2020.

A terra dá, a terra quer.


Ubu Editora: 2023.
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Referências
1. UNICEF. Declaração Universal dos Direitos Humanos.
https://www.unicef.org/brazil/declaracao-universal-dos-
direitos-humanos
2. Sorto, F. O. (2018). The universal declaration of human
rights: Authority, meaning and legal nature. Araucaria,
20(40), 209–232.
https://doi.org/10.12795/araucaria.2018.i40.09
3. Coimbra, C. M. B. (2000). Psicologia, Direitos Humanos e
Neoliberalismo. Revista Psicologia Política, 139–148.
4. Brasil (1988). Constituição Federal de 1988. Promulgada
em 5 de outubro de 1988.
Recuperado:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/consti
tuicao/constituicao.htm
5. Conselho Federal de Psicologia (2005). Código de Ética
Profissional do Psicólogo. https://site.cfp.org.br/wp-
content/uploads/2012/07/codigo-de-etica-
psicologia.pdf
6. Conselho Federal de Psicologia (n.d.). Comissão de
direitos Humanos. https://site.cfp.org.br/cfp/comissao-
de-direitos-
humanos/#:~:text=O%20CFP%20e%20a%20CDH,humanos
%20e%20suas%20diversas%20tem%C3%A1ticas.
7. Conselho Federal de Psicologia (2003). Os Direitos
Humanos na Prática Profissional dos Psicólogos.
https://site.cfp.org.br/publicacao/os-direitos-humanos-
na-prtica-profissional-dos-psiclogos/
8. Ministério da Educação (2023). Resolução CNE/CES nº 1,
de 11 de outubro de 2023. Institui as Diretrizes Curriculares
Nacionais para os cursos de graduação em Psicologia.
https://www.in.gov.br/web/dou/-/resolucao-cne/ces-n-
1-de-11-de-outubro-de-2023-518120795

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