USF EAD U2 Fundamentos de Filosofia

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LUZIA BATISTA DE OLIVEIRA SILVA

FUNDAMENTOS DE FILOSOFIA
Luzia Batista de Oliveira Silva

FUNDAMENTOs DE filosofia

2020
Verdade, ciência e os elementos de lógica

UNIDADE 2
2
VERDADE, CIÊNCIA E OS ELEMENTOS DE
LÓGICA

INTRODUÇÃO
Neste tópico vamos apresentar as diferentes correntes filosóficas, abordando sua his-
toricidade bem como a importância para a filosofia. Veremos também que a Lógica é
o campo da Filosofia que se ocupa com os raciocínios, com os argumentos e o bom
encadeamento entre eles, sendo fundamental tanto para a Filosofia quanto para a ciên-
cia. Para o filósofo Aristóteles, a lógica é o órgão do pensamento. O raciocínio lógico ou
silogismo é aquele que permite dizer se um argumento é válido ou não de acordo com
as premissas, como no exemplo clássico:

` Primeira premissa (evidência) – Todos os homens são mortais.

` Segunda premissa (evidência) – José é homem.

` Conclusão (inferência) – Logo, José é mortal.

Marilena Chaui (2010) pontua que, ao fazermos a distinção entre as palavras lógico e
lógica, seguimos de certa forma uma tradição que se originou na Grécia e isso se rela-
ciona ao pensamento aristotélico.

SAIBA MAIS
Silogismo: modelo de raciocínio dedutivo que conta com premissas e inferência (conclusão), ou comu-
mente considerado como ligação de dois termos por um terceiro conclusivo.

Inferência: trata-se de um processo pelo qual chegamos a uma conclusão; constatação de que o conhe-
cimento é constituído por elementos racionais.

Destarte, compreende-se que a lógica formal aristotélica é um tipo de lógica mais sim-
ples e mais usual nos raciocínios e argumentos práticos e racionais. Já a lógica ma-
temática, ou lógica simbólica, somente se desenvolveu depois dos avanços da lógica
formal de Aristóteles e dos pensadores da Idade Média, alcançando maior desenvolvi-
mento no século XIX.

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Figura 08. Exemplo de silogismo

FONTE: Silva (2018)


PREMISSA 1: PREMISSA 2: PORTANTO (USANDO A LÓGICA DEDUTIVA): 2
TODO SER HUMANO É MORTAL - IDEIA GERAL - PREMISSA CLAUDIO É SER HUMANO - PREMISSA MENOR CLÁUDIO É MORTAL - IDEIA PARTICULAR -
MAIOR CONCLUSÃO

1. VERDADE E CIÊNCIA
Marilena Chaui (2011, p. 88) nos lembra da frase de Immanuel Kant, ao alertar-nos que
“não se pode ensinar Filosofia, somente o filosofar”.

A ciência, como outros campos do saber humano, é criação humana e, como tal, até se
constituir ao longo da história humana, cometeu muitos erros e desacertos, resultando
em tentativas fracassadas em suas descobertas, mas o desejo permanente de buscar
a verdade trouxe para a humanidade alguns acertos e sucessos em variados campos
onde ela se faz necessária, e continua sua busca persistente para fazer avançar novas
descobertas, em prol da vida, seja para aprimorar a qualidade de vida dos seres hu-
manos, para explorar matérias-primas a fim de trazer alívios e também luxo para uma
sociedade notável no quesito consumo, no uso indiscriminado e até exagerado de tec-
nologia e aparelhos descartáveis.

1.2 RACIONALISMO
Racionalismo é uma corrente do pensamento filosófico que afirma a razão como princí-
pio fundamental de todo conhecimento, tendo aberta, a partir de seu exercício, a possi-
bilidade de validar a afirmação das crenças e ações de um sujeito (CHAUI, 2011).

O racionalismo considera que um conhecimento só se expressa de fato quando este é


logicamente necessário e universalmente válido. Quando a nossa razão julga que uma
coisa tem que ser assim e que não pode ser de outro modo,
Figura 10. Platão sempre e em todas as partes, então nos encontramos diante
de um conhecimento verdadeiro. Um exemplo é quando fa-
FONTE: Domínio Público

zemos a seguinte afirmação: “o todo é maior do que a parte”.


Vemos com evidência que tem de ser assim e que nossa
razão iria se contradizer caso quisesse afirmar o contrário.

A forma mais antiga de conhecimento racionalista se en-


contra em Platão, que considerava verdadeiro o conheci-
mento que se distinguia através da necessidade lógica e da
validade universal. Desta maneira, a ideia de que os senti-
dos não podem nunca nos conduzir a um saber verdadeiro
é a característica mais importante do pensamento platônico
(REALE; ANTISERIE, 1990).

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Verdade, ciência e os elementos de lógica

Outro exemplo é Santo Agostinho (354-430), que acreditava Figura 11. Santo Agostinho
que um pensamento, no seu sentido próprio e rigoroso, pro-

FONTE: Domínio Público


2 cede ou da razão humana ou da iluminação divina. Neste
caso, o racionalismo se apresenta como uma Teoria da Ilu-
minação Divina, ou seja, o racionalismo como racionalismo
teológico (AGOSTINHO, 1980).

Contudo, o maior representante do racionalismo é o filó-


sofo francês René Descartes (1596-1650), que afirmava
que a razão tem domínio ab-
Figura 12. René Descartes
soluto como fundamento de
todo conhecimento possível,
FONTE: 123rf

colocando o pensamento como


única fonte de conhecimento e
a experiência em segundo plano na obtenção de qualquer
conhecimento. Com sua obra Discurso do método e medi-
tações, o filósofo expressou a preocupação com o proble-
ma do conhecimento na busca da verdade, convertendo a
dúvida em método, ou seja, duvidando das afirmações já
existentes, do senso comum, dos sentidos, e priorizando
o sujeito que busca a verdade e não o objeto em questão
(DESCARTES, 1979).

1.3 EMPIRISMO
O empirismo se opõe à tese do racionalismo pela afir- Figura 13. Conhecimento
mação de que a fonte primeira do conhecimento hu-

FONTE: 123rf
mano é a experiência. Assim, ao contrário do raciona-
lismo, no empirismo, há primazia da experiência sobre
a razão, por isso, afirma-se que os conhecimentos são
frutos da experiência com o auxílio da razão.

Para os empiristas, a experiência dos sentidos consti-


tui-se como uma base para o conhecimento verdadei-
ro. Tal perspectiva fomenta a dúvida sobre qualquer
enunciado que se construa independentemente da
experiência. Para o empirismo, o ser humano, inicial-
mente, é uma “tábua rasa”, ou seja, uma folha em
branco onde a experiência escreve e colore os conhe-
cimentos que serão considerados válidos.

Enquanto o racionalismo se apoia em um conhecimento determinado, o empirismo


parte dos fatos. Justifica-se, assim, a posição do empirismo a partir da concepção de
evolução do pensamento e do conhecimento humanos, desvelando a centralidade que
a experiência tem na produção do conhecimento ao longo da história da humanidade.

O empirismo encontra-se primeiro entre os sofistas, ou sábios, mas não filósofos, as-
sim chamados por se tratar de pensadores que estavam voltados para a educação,

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ensinando para aqueles que podiam pagar por isso, desde uma cultura geral, retórica,
até arte da argumentação, aritmética, política. Os sofistas da primeira geração eram
respeitados na Grécia Antiga, os da segunda geração deixavam suspeitas, dado o des- 2
compromisso na educação com a ética, e os da terceira geração foram expulsos por
não observarem os preceitos éticos em suas práticas, inclusive alguns proferiram lições
de imoralismo. Já os estoicos contribuem para a filosofia grega e romana com a ideia
de sistema (espírito de sistema, que irá vigorar até a filosofia de Kant) ao se referir à
organização da cidade e à organização do conhecimento filosófico como um todo; com
os estoicos, vê-se pela primeira vez a comparação da alma humana como sendo uma
folha em branco, imagem que se tornou emblemática quando se trata de compreender
o empirismo na filosofia. Aristóteles também é um representante do empirismo clássico.
Contudo, é na Idade Moderna, em especial entre os pensadores ingleses dos séculos
XVII e XVIII, que o empirismo se desenvolve mais plenamente.

SAIBA MAIS
As ideias inatas, ou inatismo, são uma expressão filosófica que designa para um filósofo racionalista que
todo conhecimento é inato porque fruto da razão.

Figura 14. John Locke O médico e filósofo inglês John Locke (1632-1704) é con-
siderado um dos nomes mais importantes deste movi-
FONTE: 123rf

mento por combater a Teoria das Ideias Inatas de René


Descartes, afirmando que as ideias podem ou não derivar
da experiência sensível. Há, portanto, uma experiência
externa (sensação) e uma experiência interna (reflexão),
sendo a alma um papel em branco, que a experiência vai
escrevendo e colorindo aos poucos (CHAUI, 2011; ARA-
NHA; MARTINS, 2009).

Posteriormente, o empirismo de Locke foi ampliado e


sofreu avanços e complementações pelo filósofo inglês
David Hume (1711-1776), que divide as ideias de Locke
entre impressões e ideias.
Figura 15. David Hume
Impressões
FONTE:123rf

Hume entende as vivas sensações que temos


quando vemos, ouvimos, tocamos etc. Há também
as impressões da sensação e da reflexão.

Idéias

Hume propõe compreendê-las como representa-


ções da memória e da fantasia, menos vivas do que
as impressões, mas que surgem baseadas nelas.

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Verdade, ciência e os elementos de lógica

Para Hume, todas as ideias procedem das impressões e não são nada mais do que
cópias destas impressões. É justamente este princípio que serve como critério para
2 validar objetivamente as ideias (CHAUI, 2011).

1.4 CRITICISMO
O criticismo é a corrente do pensamento filosófico que se baseia fundamentalmente
na confiança na razão humana, pois parte do princípio de que o conhecimento é pos-
sível, ou seja, de que há realmente uma verdade. O criticismo examina todas as afir-
mações da razão humana e não aceita nenhuma premissa de forma despreocupada.
Contudo, o pensamento no criticismo não é dogmático nem cético, mas, sim, reflexivo
e crítico, apoiando-se sempre na razão (KANT, 1989).

É possível identificar aspectos do criticismo desde os Estoicos, depois em Platão e Aris-


tóteles na Antiguidade, até em René Descartes, Gottfried Leibniz, John Locke e David
Hume. Entretanto, sem dúvida, o nome que mais se destaca no criticismo é Immanuel
Kant, considerado um precursor desta escola de pensamento.

Kant foi quem formulou o criticismo a partir de sua obra Crítica da razão pura, objetivan-
do mostrar a possibilidade do conhecimento se dar no real a partir da livre ação huma-
na, ou seja, o conhecimento se faz a partir do equilíbrio entre a sensibilidade e o enten-
dimento do sujeito que busca conhecer. Kant considera que a sensibilidade possibilita
conhecer um objeto pensando a partir de conceitos estabelecidos pelo entendimento.

O criticismo se constitui em Kant como possibilidade de superação do racionalismo e


do empirismo no que tange ao impasse sobre a formulação dos juízos objetivos acerca
da realidade, já que, para ele, ambas as linhas de pensamento estavam em descrédito.
Desta maneira, o criticismo sintetiza essas duas teorias do conhecimento, investigando
as fontes da própria afirmação e as razões pelas quais elas se assentam.

Ao questionar quais seriam as pré-condições para se estabelecer uma experiência, Kant


argumenta que, para o sujeito interpretar o mundo, o pensamento humano deve impor
certas estruturas capazes de selecionar as informações recebidas pelos sentidos. Nesta
lógica, Kant definiu três (3) juízos fundamentais: juízo analítico, juízo sintético a priori e
juízo sintético a posteriori e doze (12) categorias do entendimento, divididas em quatro
esquemas fundamentais para a experiência humana, que atribuem sentidos, são elas:

QUANTIDADE QUALIDADE

Unidade, pluralidade e totalidade. Realidade, negação e limitação.

RELAÇÃO MODALIDADE
Possibilidade – impossibilidade;
Substância, causalidade e inte-
existência – não existência; ne-
ração.
cessidade – causalidade.

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1.5 POSITIVISMO
O positivismo foi elaborado por Auguste Comte no século XIX. Para ele, o conhe- 2
cimento está limitado àquilo que pode ser derivado da observação e compreendido
cientificamente. Para Comte, existem três etapas para o progresso que devem ser su-
peradas: superstição religiosa, metafísica e teológica, para posteriormente chegar à
ciência positiva, ponto final do progresso humano (CHAUI, 2011).

Para Comte, essas três etapas representam estados de conhecimento. Os três estados
podem ser definidos do seguinte modo:

Estado teológico ou É aquele no qual o pensamento humano dirige suas investigações


concreto para a natureza íntima dos seres.

Estado metafísico Corresponde à transição entre o teológico e o positivo, quando o pen-


ou concreto-abstrato samento humano abre espaço para o sobrenatural e as abstrações.

É aquele no qual o pensamento humano reconhece a impossibilidade


Estado positivo ou
de obter noções absolutas, mas combina raciocínio com observação
abstrato
para comparar fenômenos particulares com fatos gerais.

Tal teoria do conhecimento enfatiza a ideia do ser humano como um ser social e propõe
um estudo científico da sociedade, ou uma física social para se estudar os fatos huma-
nos usando procedimentos, métodos e técnicas. Apesar de iniciado no século XIX, o
positivismo será uma das correntes de pensamento com destacada presença no século
XX, tendo influenciado principalmente a psicologia e a sociologia.

1.6 IDEALISMO
A palavra idealismo pode assumir diversos sentidos, sendo que, na filosofia, ela se
caracterizará principalmente por dois deles: o sentido metafísico e o sentido epistemo-
lógico. A atividade do idealismo enquanto corrente filosófica representa a atitude que
subordina atos e pensamentos a um ideal moral. Nesta implicação, o ser e a realidade
são determinados pela consciência. É uma visão filosófica de que o mundo empírico
não existe independente da mente humana e, portanto, só pode ser conhecido segundo
nossas concepções sobre ele (CHAUI, 2011).

O idealismo em Immanuel Kant também é chamado de idealismo transcendental, pois


considera aquilo que existe antes da experiência. Mesmo com sua crítica ao racionalis-
mo e ao empirismo, o pensamento kantiano resvala para o idealismo por reconhecer a
experiência como fornecedora da matéria do conhecimento.

Há também o idealismo de outro filosofo alemão, Friedrich Hegel, que, partindo do ide-
alismo kantiano, apresenta a chamada filosofia do devir: o ser como processo, como
movimento, como vir-a-ser. Nesta implicação, o ser está em constante transformação e
assim surge a necessidade de uma nova lógica partindo não da identidade, que é está-
tica, mas, sim, da contradição, para então dar conta da dinâmica das mudanças do real.

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Verdade, ciência e os elementos de lógica

1.7 MATERIALISMO
Denomina-se por materialismo a concepção que toma Figura 16. Karl Marx
2
a realidade material como fundamento da existência.

FONTE: Domínio Público


Tal posicionamento tem como uma de suas conse-
quências a anulação da possível existência de um
deus ou deuses, opondo-se diretamente ao idealismo
(CHAUI, 2011).

No materialismo, a realidade material é eterna e o es-


pírito humano deriva dela, acreditando-se que os fenô-
menos do universo advêm dos diversos movimentos
da matéria e que tais movimentos são suas proprie-
dades fundamentais, existindo independentemente da
consciência, tornando o mundo cognoscível.

O materialismo dialético é a escola de pensamento ou


o método de investigação que compreende os fenôme-
nos materiais como processos. Segundo esta implica-
ção, o mundo não é uma realidade estática, mas, sim, uma realidade mecânica em que
a abordagem da realidade deve assumir forma dialética, compreendendo a realidade de
forma não linear. A partir desta dinâmica, a consciência
humana, mesmo que determinada pela matéria e situa- Figura 17. Friedrich Engels
da historicamente, não é passiva. Derivado desta pers-

FONTE: Domínio Público


pectiva, o materialismo histórico corresponde à aplica-
ção dos princípios do materialismo dialético na história,
ou seja, à explicação da história por fatores materiais.

A partir desta ideia é que os filósofos, sociólogos e histo-


riadores Karl Marx e Engels afirmam que as ideias sociais
são o reflexo do desenvolvimento material objetivo da
história. Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-
1895) acreditavam que a teoria hegeliana do desenvolvi-
mento do pensamento humano não dava conta de expli-
car a vida social, que naquele momento era marcada pelo
avanço técnico do ser humano sobre a natureza e do en-
riquecimento e progresso à custa do empobrecimento da
classe operária. Para o materialismo, o mundo material é
anterior ao pensamento, que é seu derivado.

2. ELEMENTOS DE LÓGICA: LÓGICA FORMAL ARISTOTÉLICA


E LÓGICA PÓS-ARISTOTÉLICA – A GEOMETRIA ANALÍTICA DE
DESCARTES

2.1 LÓGICA FORMAL ARISTOTÉLICA


O termo lógica deriva do termo grego lógos, que significa palavra, expressão, pensa-
mento, conceito, discurso, razão. A área da Lógica se caracteriza como aquela que se

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ocupa com os raciocínios, a razão, o pensamento, investigando, por isso, a validade dos
argumentos e atribuindo uma direção ou regras para um raciocínio correto. De maneira
simples, pode-se afirmar que a lógica pode ser compreendida como o estudo normativo 2
das condições de verdade. Sua aplicação examina a natureza do argumento racional,
com foco especialmente para os princípios do raciocínio, a estrutura das proposições,
os métodos utilizados e a validade das deduções. A lógica se ocupa com os raciocínios
corretos e com as leis do pensamento (razão), sendo, por isso, um instrumento que
permite um raciocínio crítico e rigoroso.

SAIBA MAIS
De acordo com os historiadores da Filosofia Giovanni Reale e Dario Antiseri (1990, p. 211), o termo lógica
não foi usado por Aristóteles (que usava a expressão analítica = análysis/ resolução, segundo a etimolo-
gia grega) e não expressava exatamente o que entendemos hoje, é uma herança que remonta a Cícero
ou, quem sabe, a uma gênese estoica.

2.2 TIPOS DE ARGUMENTAÇÃO – DEDUÇÃO, INDUÇÃO E ANALOGIA


Os tipos de argumentos lógicos mais conhecidos são: dedução, indução e analogia.
Eles são importantes quando tratamos de uma representação lógica do raciocínio, isto
é, uma operação discursiva do pensamento, ou ainda, um tipo de conhecimento que
procede de mediação.

Dedução
É um tipo de argumento em que a conclusão é inferida necessariamente de duas pre-
missas, como o exemplo anterior sobre silogismo. O enunciado da conclusão não ex-
cede o conteúdo das premissas, ou seja, não se diz mais na conclusão do que já foi
dito ou não se pode inferir mais do que as premissas apontam. É uma forma de
argumento na qual a conclusão decorre lógica e necessariamente das premissas, do
geral para o particular, sendo que é da concordância geral que a dedução pode ser
considerada válida ou não.

Geral Particular

Pode-se considerar que uma proposição geral ocorre quando o sujeito da proposição é
tomado na sua totalidade. Se na proposição já mencionada tomamos todos os elemen-
tos que a constituem, então se trata de uma proposição geral, por exemplo:

Todo animal é livre.

A baleia é um animal.

Logo, toda baleia é livre.

Pode-se dizer que é uma proposição é particular quando o sujeito da proposição é


tomado em apenas uma parte indeterminada. Exemplos: “Algumas pessoas são cora-
josas”; “Certas pessoas são alegres”; “Alguns seres humanos são cegos de nascença”.

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Verdade, ciência e os elementos de lógica

De forma silogística, citamos como exemplo:

2
Todos os brasileiros são sul-americanos.

Alguns brasileiros são indígenas.

Logo, alguns brasileiros são indígenas sul-americanos.

Uma proposição particular também pode ser singular quando o sujeito se refere a apenas
um indivíduo, por exemplo: “Rita é uma pessoa enigmática”; “Maria é simpática”; “Salva-
dor é uma cidade linda e acolhedora”. De modo silogístico, podemos ter como exemplo:

Todo ser vivo morre.

Um cachorro é um ser vivo.

Logo, o cachorro morre.

Indução
É o tipo de argumentação que se move dos exemplos individuais para um princípio
geral. A partir de dados singulares, infere-se uma verdade universal. Na indução, po-
de-se chegar numa conclusão a partir da experiência sensível, e esta pode exceder
o conteúdo das premissas. Diferentemente da dedução, a indução não leva a re-
sultados necessariamente verdadeiros, pois estes têm apenas probabilidade de
estarem corretos.

Individual Geral

Três etapas são importantes na indução:

1 a observação dos fenômenos;

2 a descoberta da relação entre eles;

3 a generalização da relação.

Ainda que a indução não alcance um raciocínio rigoroso e nem alcance verdades, ela é
uma forma de argumento importante, porque “trata-se de uma forma muito fecunda de
pensar, responsável pela fundamentação de grande parte dos nossos conhecimentos
na vida diária e de grande valia nas ciências experimentais” (ARANHA, 2009, p. 135).

EXEMPLO
O cobre é um condutor de eletricidade, também o ouro, o ferro e o zinco, logo, os metais são condutores
de eletricidade.

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A seguir, trataremos de alguns tipos de indução: indução completa, quando o objeto in-
vestigado pode ser examinado em conjunto; indução incompleta, na qual ocorre a genera-
lização do pensamento, quando se toma uma parte/amostra como representando o todo; 2
e argumento de autoridade, quando buscamos validar ou creditar uma decisão nossa com
base numa autoridade, o que nem sempre garante que a opção foi a mais correta.
Figura 09. Tipos de indução

FORMA CONCEITO EXEMPLO


Segunda-feira, terça-feira, quarta-feira,
quinta-feira, sexta-feira, sábado e domin-
go têm 24 horas. Ora, segunda, terça,
quarta, quinta, sexta, sábado e domingo
Ocorre quando há condições para se são dias da semana. Logo, todos os dias
Indução completa examinar cada um dos elementos de da semana têm 24 horas.
um conjunto.

FONTE: 123rf
Aplica-se quando são observados al- Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter,
guns elementos e destes se conclui Saturno, Urano, Netuno e Plutão não têm
a totalidade. A generalização indutiva brilho próprio. Ora, Mercúrio, Vênus, Ter-
acaba se fazendo de modo precário ra, Marte, Júpiter, Saturno, Urano, Netu-
e sem critérios. Um bom exemplo de no e Plutão são planetas. Logo, todos os
indução incompleta são as pesquisas planetas não têm brilho próprio.
prévias de um processo eleitoral, em

FONTE: 123rf
Indução incompleta que o instituto responsável pela pes-
quisa aponta conclusões acerca das
intenções de votos da população a
partir de amostras significativas, mas
não mostra sua totalidade, desconsi-
derando os interesses dos que res-
pondem e também dos que não par-
ticiparam da pesquisa.

Podemos considerar como exemplo quan-


do vamos ao médico e atendemos a todas
as prescrições que recebemos dele, pois
partimos do princípio de que este profis-
sional, com seu conhecimento e sua ex-
Caracteriza um tipo de raciocínio periência, nos apresentará orientações
Argumento de muito comum na vida cotidiana, com assertivas. Contudo, é evidente que este
autoridade conclusões a partir das afirmações de tipo de argumento pode levar a enganos.
pessoas que se admira ou se respeita.
FONTE: 123rf

FONTE: Silva (2018)

Analogia
É o raciocínio que procede por semelhança, isto é, parte-se de um ou alguns fatos
singulares para, ao invés de uma conclusão universal, uma outra enunciação singular

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Verdade, ciência e os elementos de lógica

ou particular, inferida em decorrência da comparação entre objetos diferentes, mas que


apresentam alguma semelhança. Tal raciocínio, evidentemente,
2
não fornece conclusões, apenas probabilidades de certezas. Este também é um tipo de
raciocínio muito presente no cotidiano. Por exemplo, quando somos bem atendidos em
uma loja, em uma outra oportunidade esperamos ser atendidos da mesma forma como
fomos atendidos anteriormente.

Certamente, não podemos generalizar a respeito das analogias, algumas podem cor-
responder a uma verdade possível, ter um sentido mais forte, enquanto outras podem
ter sentido mais fraco, contudo, as semelhanças são importantes, “Por exemplo: quan-
do as conclusões de experiências biológicas feitas em cobaias são estendidas a se-
res humanos, geralmente a analogia é forte. Embora a fisiologia de ambos os seres
não seja idêntica, as semelhanças tornam a analogia adequada e fecunda” (ARANHA;
MARTINS, 2009, p. 136).

EXEMPLO
Clarice Lispector é uma excelente escritora brasileira. Logo, todas as escritoras brasileiras são excelentes.

2.3 A LÓGICA PÓS-ARISTOTÉLICA: A GEOMETRIA ANALÍTICA DE


DESCARTES
Embora tenha sido alvo de críticas, até o século XIX, Figura 18. René Descartes
a lógica aristotélica não sofreu mudanças significa-

FONTE: 123rf
tivas. No entanto, o pensamento na Idade Moderna
seguiu por caminhos diferentes do pensamento aris-
totélico. Assim, René Descartes (1596–1650) repu-
diou os procedimentos silogísticos apresentados pela
escolástica no período medieval, procurando méto-
dos que possibilitassem novas descobertas para o
pensamento filosófico.

Em sua obra fundamental, o Discurso do Método,


publicada em 1637, Descartes (2005) expõe sua
preocupação com o problema do método como ga-
rantia da obtenção da verdade. De acordo com o
racionalismo cartesiano, a melhor maneira para se
solucionar um problema é direcionar o pensamento
pela ordem e pela clareza com que faremos nossas
reflexões sobre ele. Desse modo, uma questão tende a ser bem resolvida se for dividida
em uma série de pequenos problemas do que se for analisada como um todo.

Descartes (2005) ilustra isso na terceira parte do seu livro, quando apresenta o tratado
geométrico com os fundamentos do que, mais tarde, constituiria sua geometria ana-
lítica. Essencialmente, esta geometria seria uma tradução das operações algébricas
em linguagem geométrica. Assim, a geometria analítica de Descartes nada mais é do
que uma fusão de álgebra com geometria, que se tornou peça fundamental para a Re-

34
Figura 19. Capa da obra O Discurso volução Científica, defendendo que a matemática
do Método seria capaz de fornecer conhecimentos técnicos
para qualquer outra área do conhecimento. 2

FONTE: Domínio Público


Posteriormente, a Geometria Analítica de Des-
cartes foi fundamental para a criação do Cálculo
Diferencial e Integral pelos cientistas Isaac New-
ton e G. W. Leibniz, também foi importante para o
desenvolvimento da Cartografia, que é a ciência
responsável pelos aspectos matemáticos ligados
à formulação de mapas.

Idade Moderna
Na Idade Moderna, principalmente com o cálcu-
lo infinitesimal de Leibniz, a Lógica passou a de-
signar a linguagem matemática. Assim, a Lógica
passa a ser vista como uma “linguagem perfeita,
totalmente purificada das ambiguidades e dos
contrassensos da linguagem cotidiana” (CHAUI,
2010, p. 146).

Sem dúvida, alguns pontos são essenciais para


se compreender a moderna relação entre Lógica e Matemática. O primeiro deles trata
da mudança no modo de conceber o que seja a Matemática. Na Grécia Antiga, a Mate-
mática era considerada uma ciência baseada na intuição intelectual, que não dependia
de nenhuma interferência humana. A partir do século XVII, a Matemática passou a ser
considerada como ciência, resultando de uma construção intelectual, portanto, uma
invenção do pensamento humano, formada a partir de princípios, regras, números, ope-
rações, cálculos etc.

Mas foi no final do século XIX, principalmente com os estudos dos números cardinais
finitos do matemático italiano Giuseppe Peano (1858 –1932), que a matemática ganhou
estrutura para se tornar um ramo da lógica, principalmente com os pensadores George
Boole e Augustus de Morgan, e mais tarde com Bertrand Russel e Alfred Whitehead,
fazendo com que a lógica passasse por essa grande transformação, abandonando as
teorias aristotélicas da inferência.

Outro ponto importante é a mudança no modo de conceber o pensamento, distinguin-


do-se Psicologia e Teoria do Conhecimento. Isso se deve ao fato de que durante muitos
anos a Psicologia e a Teoria do Conhecimento confundiam-se em uma só disciplina. Com
o estatuto científico da Psicologia, foi possível a independência da Teoria do Conhecimen-
to, gerando o esclarecimento dos diferentes conteúdos e formas de conhecimento.

Todavia, pontua Chaui (2010, p. 148) “a lógica não se confunde com a Psicologia nem
com a Teoria do Conhecimento, porque seu objeto é o pensamento como operação
demonstrativa, que segue regras orientadas para determinar se a demonstração é ver-
dadeira ou falsa do ponto de vista do próprio pensamento, isto é, se a demonstração
obedeceu ou não aos princípios lógicos”.

Fundamento de filosofia 35
Verdade, ciência e os elementos de lógica

Tais mudanças possibilitaram para a lógica contemporânea manter sua proximidade


com a matemática, passando a ser considerada como uma avaliadora da verdade ou
2 falsidade do pensamento. Além disso, a distinção entre a Psicologia e a Teoria do Co-
nhecimento permitiu com que a lógica se ocupasse mais da linguagem, oferecendo
normas e critérios para uma linguagem perfeita, capaz de avaliar outras linguagens,
como a científica, a filosófica e a cotidiana.

Por isso, o filósofo austríaco, Ludwig Joseph Johann Wittgenstein (1889 – 1951), autor
das obras O tratado lógico-filosófico (2008), primeira fase, na qual objetiva identificar
como se estabelece a relação entre a linguagem e a realidade; e Investigações filosó-
ficas (2008), segunda fase, na qual discute o papel da linguagem e seus significados
através dos jogos de linguagem. O filósofo considerou que a lógica é o campo da Filo-
sofia que se ocupa com o estudo da Linguagem, e chamou a atenção para frases im-
pactantes como: “O filósofo trata uma questão como uma doença”; “Os limites de meu
mundo são os limites de minha linguagem”. Wittgenstein criou o primeiro dicionário de
lógica para crianças, traduzido em muitos lugares do mundo, mas ainda sem tradução
para o português.

CONCLUSÃO
A intenção deste tópico foi de compreendermos que a filosofia, dotada de uma longa
história, sofreu alterações cruciais em seu desenvolvimento, culminando com a descen-
tralização de sua importância frente aos saberes que outrora a integravam e passaram
a constituir campos específicos de conhecimento.

Apresentamos também algumas formas de raciocínio, fundamentais porque expressam


a linguagem lógica do pensamento, a capacidade do ser humano em se comunicar de
forma coerente e se fazer compreender, seja na vida cotidiana ou na vida de estudos.

REFERÊNCIAS
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Fundamento de filosofia 37

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