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O COMÉRCIO DA AJUDA: ÓRGÃO DE PUBLICAÇÃO QUINZENAL, ANUNCIADOR,

NOTICIOSO E DEFENSOR DOS INTERESSES DA FREGUESIA DA AJUDA1 - Jornal local


lisboeta cujo primeiro número saiu a público a 12 de Setembro de 1931, e o último
número a 11 de Setembro de 1937, com um total de 153 edições distribuídas por duas
séries. Seis anos, de um jornal que se declarava “órgão de publicação quinzenal,
anunciador, noticioso e defensor dos interesses da Freguesia da Ajuda”. Era
propriedade e edição da Tipografia Gráfica Ajudense, na Calçada da Ajuda, nº 176
(com o telefone B. 487) e na mesma morada funcionava a redação, a administração e
a composição. A partir da 2ª Série, com início no nº 13, publicado a 19 de Março de
1932, teve como diretor António Gomes Rocha, como administrador J.A. Silva Coelho
e como editor António de Campos Aço. Teve um novo grafismo com um desenho de
José Martins, da Imprensa Nacional de Lisboa, com a Torre da Ajuda à direita e
Mercúrio, deus do comércio, à esquerda. A partir de 22 de Outubro de 1932 passa a
ser dirigido por Alexandre Rosado. Só o primeiro número não tem a célebre frase
“Este número foi visado pela Comissão de Censura”, cumprindo a legislação
entretanto em vigor, e que surge em todos os restantes números. Distribuía-se
gratuitamente nos estabelecimentos comerciais a todos os fregueses que adquirissem
produtos das lojas.

Teve a colaboração de vários moradores, quer através de pequenos artigos, quer sob
a forma de cartas à redação, bem como a colaboração de alguns autores
especializados. Por exemplo, logo no 1º número se anuncia que o jornal terá uma
coluna médica da responsabilidade de médicos, com residência ou consultório na
Ajuda, com conselhos úteis para a população em geral. Os artigos médicos versam
sobre saúde pública (doenças infetocontagiosas, o vício do tabaco, por exemplo), bem
como sobre conselhos à população, nomeadamente em questões de saúde infantil.

De igual forma vão surgindo alguns textos literários, poemas e prosas, de autores
portugueses. Também se publicam contos estrangeiros traduzidos, à semelhança do
que se fazia em outras publicações da época.

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Disponível na Hemeroteca Digital, em:
http://hemerotecadigital.cm‐lisboa.pt/Periodicos/ocomerciodaajuda/ocomerciodaajuda.htm

© Hemeroteca Municipal de Lisboa Página 1


Teve ainda a colaboração de Alfredo Gameiro, com uma vasta série de artigos sobre a
toponímia e a história local, de quem, em jeito de homenagem, o jornal publicou a obra
“Os meus Versos”, em 1936, sob a forma de livro. E ainda de Mário de Sampaio
Ribeiro que se dedicou a escrever sobretudo sobre toponímia ajudense.

O Comércio da Ajuda não é caso único à época. Temos conhecimento ainda dos
seguintes títulos seus contemporâneos: a Voz de Alcântara, os Ecos da Graça, os
Ecos dos Anjos, os Ecos de Campo de Ourique e os Ecos de Belém, único que se
publicou até aos anos 80. Todos se apresentam como defensores das suas freguesias
e dos seus fregueses, apoiando-se no comércio local, divulgando as atividades
sociais, culturais, desportivas dos seus bairros, expondo as condições de vida e as
necessidades sentidas pelas populações, reivindicando as alterações necessárias. É
através da consulta destes periódicos que podemos entrever a vida destas freguesias
nos anos 30, anos em que predominantemente se publicam estes periódicos.

Ao lermos o editorial “O Nosso Programa”, no 1º número do periódico, verificamos que


o jornal se propunha dois objectivos:

“(…) pairava no espírito dos reclamantes o desejo de ver a freguesia da Ajuda sair do
ostracismo a que foi votada, progredindo e elevando-se, pelo menos, até ao nível das
restantes freguesias de Lisboa. Esse desejo está latente em todos os peitos. Todos
estão – afirmamo-lo dispostos a trabalhar para esse fim. Mas… que parta dos outros a
iniciativa e o exemplo. Daí, a necessidade dum agente de ligação – este jornal –
repositório de todos os bons alvitres e opiniões tendentes a um eficaz aproveitamento
de todos os esforços.”

Por outro lado, a crise económica que grassava no Mundo levava também a uma
estagnação do próprio comércio local, preferindo os moradores abastecer-se noutros
locais da cidade, muito por culpa da publicidade desses estabelecimentos comerciais,
no entender da redação.

“Daí, a necessidade de um agente de ligação – este jornal – destinado a indicar ao


consumidor o caminho a seguir para melhor acautelar os seus interesses e os da sua
freguesia.”

Concluindo que “Do progresso da freguesia melhores dias poderão vir para o comércio
local. Da melhoria do comércio muito pode beneficiar a freguesia.”

© Hemeroteca Municipal de Lisboa Página 2


O Comércio da Ajuda propunha-se, assim, servir de intermediário entre o comércio e
as instituições locais, tendo por objetivo o melhoramento da freguesia.

No 2º número, regressa a redação a falar do apoio recebido e insiste “Desde a obra de


assistência à conquista dos mais indispensáveis melhoramentos: a abertura do bairro
social, a abastecimento de águas, o serviço de limpeza e regas, etc., muito há a tratar,
e nós estamos dispostos a não largar de mão estes assuntos enquanto os nossos
brados não forem ouvidos por quem de direito.”

Ao longo da sua existência O Comércio da Ajuda bater-se-á pelo progresso da


freguesia. De entre os seus temas mais debatidos, encontramos três predominantes: a
questão da habitação, a falta de abastecimento de água e a ausência de
estabelecimentos escolares.

Na questão da habitação, ganha relevância o Bairro Social da Ajuda. Planeado em


1918 e iniciando-se as obras nesse mesmo ano, verá a sua construção arrastar-se até
ao ano de 1932, quando Duarte Pacheco, então ministro das Obras Públicas, retoma e
faz avançar o projeto. Em 1934, a 31 de Janeiro, foi inaugurado o Bairro, com direito a
notícia na 1ª página do dia 3 de Fevereiro, embora a redação lamente o facto de não
ter sido convidada para a cerimónia.

O problema do abastecimento de água à freguesia, bem como o da rede de esgotos,


surge ao longo da publicação, com maior incidência nos meses de Verão quando a
escassez de água mais se fazia sentir. Só a partir de 1936 começa o jornal a dar
notícias positivas uma vez que a Companhia das Águas anunciara grandes obras no
melhoramento da rede de abastecimento à cidade. No entanto, ainda num dos seus
últimos números (Junho de 1937), e apesar de se congratular com o facto de parecer
que a freguesia tinha saído do esquecimento, apontava a existência de um esgoto a
céu aberto entre a Sacota e o Rio Seco, nas proximidades de habitações.

A ausência de estabelecimentos de ensino é debatida quer pela redação, quer através


da participação de moradores preocupados com o abandono a que eram votadas as
crianças da freguesia. Queixam-se da disparidade entre a freguesia de Belém, menos
populosa, mas que tinha seis escolas oficiais, enquanto a populosa freguesia da Ajuda
apenas possuía dois. O Comércio da Ajuda apoia a iniciativa de Ilda Bulhão Pato,
diretora da Escola Maternal da Ajuda, na criação de um outro estabelecimento – o
Jardim Infantil da Ajuda – «, fomenta a criação de cursos escolares (diurnos e
noturnos) nas várias coletividades locais e, até 1936, ano em que o ensino desta

© Hemeroteca Municipal de Lisboa Página 3


língua é proibido em Portugal, publica diversos artigos sobre o Esperanto e noticia as
escolas e associações que a ensinavam.

Promove campanhas pela abertura do Jardim Botânico da Ajuda, que obtém grande
êxito, uma vez que o jardim passa a abrir ao público em Outubro de 1934; pela
abertura do Palácio da Ajuda; pela alteração do percurso da linha de elétricos; pela
criação de uma clínica médica gratuita no Hospital Militar de Belém e por um mercado
na freguesia.

A par destes temas mais prementes, O Comércio da Ajuda, como jornal local,
acompanha a vida da freguesia, publicando pequenos artigos sobre acontecimentos
ocorridos na freguesia, mantendo uma coluna (Vidas de Trabalho) sobre
comerciantes, divulgando as atividades desportivas e sociais, noticiando mortes,
casamentos.

Desconhecemos o motivo concreto que levou à decisão de suspender o jornal. As


primeiras páginas dos três últimos números, porém, deixam-nos entrever que alguma
oposição ao jornal tinha ganho força, e a direção optara por não a combater.

A 11 de Setembro de 1937, faltando um único dia para os seis anos exatos, O


Comércio da Ajuda publicava o seu último número.

Ana Homem de Melo

Gabinete de Estudos Olisiponenses

Lisboa, 17 de Outubro de 2018

© Hemeroteca Municipal de Lisboa Página 4

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