XII SOBERANIA E DISCIPLINA
XII SOBERANIA E DISCIPLINA
XII SOBERANIA E DISCIPLINA
1 parágrafo
A questão central da filosofia política é como o discurso da verdade, ou seja, a
filosofia como o discurso da verdade suprema, estabelece os limites do poder.
Em vez disso, podemos nos perguntar que regras de direito o poder utiliza para
criar discursos de verdade. Em nossa sociedade, que tipo de poder é capaz de
gerar discursos de verdade tão influentes? Em qualquer sociedade, as relações
de poder estão entrelaçadas com a produção, acumulação, circulação e
funcionamento do discurso. Não há exercício de poder sem uma certa
economia de discursos de verdade. Na nossa sociedade, as relações entre
poder, direito e verdade são especialmente complexas.
Este texto propõe uma reflexão sobre a relação entre poder, direito e verdade.
Tradicionalmente, a filosofia política questiona como a filosofia (o discurso da
verdade suprema) estabelece os limites do poder. No entanto, o texto sugere
inverter essa questão para perguntar como o poder utiliza o direito para criar
discursos de verdade.
2 parágrafo
Para resumir, somos influenciados pelo poder a produzir e confessar a
verdade, recompensados por isso. Somos submetidos ao poder da
verdade, que decide nosso destino e nos impõe um modo de viver ou
morrer. As regras de direito, mecanismos de poder e efeitos da
verdade moldam nossa existência. Mesmo que percorramos este
campo de maneira parcial e incerta, é essencial reconhecer a relação
entre o poder, a verdade e nosso papel na sociedade.
Este texto resume a ideia de que somos influenciados pelo poder não
apenas para produzir a verdade, mas também para confessá-la, e
somos recompensados por isso. Estamos sujeitos ao poder da
verdade, que tem a capacidade de decidir nosso destino e nos impor
maneiras de viver ou morrer.
3 parágrafo
Gostaria de dizer algumas palavras sobre aquilo que me guiou como princípio
geral nesse percurso e sobre os imperativos e precauções metodológicos que
adotei. Todos conhecem o papel famoso, célebre e sempre lembrado dos
juristas na organização do poder real. E preciso não esquecer que a reativação
do Direito Romano no século XII foi o grande fenômeno em torno e a partir de
que foi reconstituído o edifício jurídico que se desagregou depois da queda do
Império Romano. Em outras palavras, o personagem central de todo o edifício
jurídico ocidental é o rei.
Este texto reflete sobre os princípios que guiaram o autor em seu trabalho e as
precauções metodológicas que ele adotou. Ele destaca o papel importante dos
juristas na organização do poder real, lembrando que a reativação do Direito
Romano no século XII foi um evento crucial para a reconstrução do sistema
jurídico que havia se desintegrado após a queda do Império Romano.
O autor aponta que, no centro de todo o edifício jurídico ocidental, está a figura
do rei. Isso sugere que o poder monárquico e as leis associadas a ele têm sido
fundamentais na formação das estruturas legais e políticas do Ocidente. O
texto parece estar situando o rei como um personagem central não apenas
historicamente, mas também como um elemento chave na compreensão da
evolução do direito e do poder na sociedade ocidental.
4 parágrafo
Fala−se desse poder de duas maneiras. Ou, ao contrário, para mostrar como
era necessário limitar o poder do soberano, a que regras de direito ele deveria
submeter−se e os limites dentro dos quais ele deveria exercer o poder para
que este conservasse sua legitimidade. Afirmar que a soberania é o problema
central do direito nas sociedades ocidentais implica, no fundo, dizer que o
discurso e a técnica do direito tiveram basicamente a função de dissolver o fato
da dominação dentro do poder para, em seu lugar, fazer aparecer duas coisas:
por um lado, os direitos legítimos da soberania e, por outro, a obrigação legal
da obediência.
Este texto aborda duas maneiras de entender o poder soberano. Por um lado,
discute a necessidade de limitar o poder do soberano, estabelecendo regras de
direito às quais ele deve se submeter e definindo os limites dentro dos quais
ele pode exercer seu poder para manter sua legitimidade.
Por outro lado, o texto sugere que a soberania é o problema central do direito
nas sociedades ocidentais porque o discurso e a técnica do direito serviram
principalmente para dissolver “o fato da dominação” dentro do poder. Em
outras palavras, o direito tem sido usado para transformar a dominação em
duas coisas distintas: os direitos legítimos da soberania, por um lado, e a
obrigação legal da obediência, por outro.
Isso implica que o sistema jurídico ocidental tem como uma de suas funções
fundamentais redefinir as relações de poder para que pareçam baseadas em
princípios legítimos e consensuais, em vez de serem vistas como formas de
dominação.
5 parágrafo
Nos últimos anos, o meu projeto geral consistiu, no fundo, em inverter a direção
da análise do discurso do direito a partir da Idade Média. Procurei fazer o
inverso: fazer sobressair o fato da dominação. Por dominação eu não entendo
o fato de uma dominação global de um sobre os outros, ou de um grupo sobre
outro, mas as múltiplas formas de dominação que podem se exercer na
sociedade.
Quando o autor fala em “dominação”, ele não está se referindo a uma forma
única e abrangente de controle de uma pessoa ou grupo sobre outros. Em vez
disso, ele está interessado nas “múltiplas formas de dominação” que existem
dentro de uma sociedade. Isso pode incluir todo tipo de influência e controle
que diferentes entidades (como instituições, classes sociais, ou indivíduos)
podem exercer umas sobre as outras.
7 parágrafo
Linha geral da análise, algumas precauções metodológicas impunham-se para
desenvolvê-la. Em primeiro lugar: não se trata de analisar as formas
regulamentares e legítimas do poder em seu centro, no que possam ser seus
mecanismos gerais e seus efeitos constantes. Exemplificando: em vez de
tentar saber onde e como o direito de punir se fundamenta na soberania tal
como esta é apresentada pela teoria do direito monárquico ou do direito
democrático, procurei examinar como a punição e o poder de punir
materializavam-se em instituições locais, regionais e materiais. Em outras
palavras, captar o poder na extremidade cada vez menos jurídica de seu
exercício.
Este texto está destacando a importância de analisar o poder não apenas como
uma entidade centralizada e regulamentada, mas também em suas
manifestações práticas e locais. A “linha geral da análise” sugere que, em vez
de se concentrar em como o poder é teoricamente fundamentado em conceitos
de soberania e direito (seja monárquico ou democrático), deve-se examinar
como o poder de punir é exercido nas instituições do dia a dia - como escolas,
prisões, hospitais e outras entidades locais e regionais.
8 parágrafo
Segunda precaução metodológica: não analisar o poder no plano da intenção
ou da decisão, não tentar abordá-lo pelo lado interno, não formular a pergunta
sem resposta: "quem tem o poder e o que pretende, ou o que procura aquele
que tem o poder?"; mas estudar o poder onde sua intenção - se é que há uma
intenção -; estudar o poder em sua face externa. Portanto, não perguntar
porque alguns querem dominar, o que procuram e qual é sua estratégia global,
mas como funcionam as coisas ao nível do processo de sujeição ou dos
processos contínuos e ininterruptos. Em outras palavras, ao invés de perguntar
como o soberano aparece no topo, tentar saber como foram constituídos.
Este texto parece estar discutindo uma abordagem metodológica para o estudo
do poder. A “segunda precaução metodológica” sugere que, em vez de tentar
entender o poder analisando intenções ou decisões internas (o que poderia ser
uma tarefa sem fim e sem resposta), deve-se examinar o poder em sua “face
externa” - ou seja, como ele se manifesta na prática e como os processos de
sujeição ou dominação funcionam no mundo real.
O texto propõe uma análise do poder focada em como as estruturas de poder
são mantidas e operadas, em vez de quem está no poder ou quais são suas
motivações subjacentes. Isso pode envolver olhar para as maneiras pelas
quais as pessoas são subjugadas ou controladas, os processos contínuos que
sustentam o poder e como as posições de autoridade são estabelecidas e
mantidas. Essa abordagem pode ser útil para entender melhor as dinâmicas de
poder sem se perder em especulações sobre intenções ocultas, que podem ser
difíceis ou impossíveis de provar.
9 parágrafo
Terceira preocupação metodológica
De forma resumida, o texto sugere uma abordagem metodológica para analisar
o poder não como uma forma de dominação maciça e homogênea, mas como
algo que circula e funciona em rede. O poder não é algo que algumas pessoas
possuem exclusivamente e outras são submetidas; em vez disso, ele é
exercido e transmitido através de todos os indivíduos na sociedade.
O autor argumenta que os indivíduos não são alvos inertes do poder; eles são
ativos na transmissão do poder e também são afetados por ele. O indivíduo é
visto como um efeito do poder e, ao mesmo tempo, um centro de transmissão
desse poder. Isso significa que o poder não apenas age sobre os indivíduos,
mas também é moldado e transmitido por eles.
10 parágrafo
Quarta preocupação metodológica
O texto sugere uma abordagem metodológica para analisar o poder de baixo
para cima, começando pelos mecanismos minuciosos de poder que têm sua
própria história e táticas, e depois examinando como esses mecanismos são
integrados em formas mais amplas de dominação.
O autor critica as análises que deduzem mudanças sociais a partir das ações
da classe dominante e defende o exame de como o poder opera nos níveis
mais básicos e é cooptado por fenômenos mais globais. Ele usa o exemplo da
loucura para ilustrar como as explicações simplistas podem ser enganosas e
enfatiza a necessidade de entender os procedimentos de poder em sua
complexidade e interação com estruturas maiores.
11 parágrafo
Quinta precaução metodológica
O texto argumenta contra a dedução de fenômenos sociais apenas a partir da
dominação geral da classe burguesa. Em vez disso, defende um exame histórico dos
mecanismos de controle a partir do nível mais básico, focando nos agentes reais e
instrumentos práticos de repressão ou exclusão na sociedade.
O autor sugere que são os micro-mecanismos de poder, e não os interesses da
burguesia, que se tornam economicamente vantajosos e politicamente úteis. Ele
propõe que ao focar nessas técnicas de poder e nos lucros econômicos ou utilidades
políticas que delas derivam, é possível compreender como esses mecanismos se
integram ao sistema mais amplo.
12 parágrafo
Os 4 papeis
13 parágrafo
O texto contrasta um novo mecanismo de poder com a teoria tradicional da
soberania. Este novo mecanismo foca em extrair tempo e trabalho dos corpos
ao invés de bens e riqueza da terra, enfatizando a vigilância contínua sobre a
tributação descontínua, e visa tanto o crescimento das forças dominadas
quanto o aumento do poder e eficiência do dominador.
14 parágrafo
O texto discute o surgimento do poder disciplinar, um novo tipo de poder
distinto da soberania, que foi fundamental para a formação do capitalismo
industrial e sua sociedade correspondente. Apesar de sua diferença radical da
soberania, a teoria da soberania persistiu como ideologia legal e como princípio
organizador dos códigos legais no século XIX, servindo tanto como ferramenta
de crítica quanto como meio de sobrepor mecanismos disciplinares com um
sistema legal que ocultava técnicas de dominação.
15 parágrafo
O texto descreve a interação entre o direito de soberania e o mecanismo de
disciplina nas sociedades modernas. Enfatiza que as disciplinas têm seu
próprio discurso, criando conhecimento e sendo inventivas na produção de
aparelhos de conhecimento. Elas operam em um princípio diferente da lei,
focando em normas e normalização em vez de regras jurídicas derivadas da
soberania.
16 parágrafo
O texto discute a formação das ciências humanas não como uma anexação
gradual às ciências exatas, mas como resultado da justaposição de dois
mecanismos heterogêneos: a organização do direito em torno da soberania e
os mecanismos coercitivos das disciplinas. Essa interação explica o
funcionamento do que é chamado de ‘sociedade de normalização’, onde as
normalizações disciplinares chocam-se cada vez mais com os sistemas
jurídicos da soberania, necessitando de um discurso mediador.
17 parágrafo
Poder e Verdade:
O poder não é apenas exercido por meio de leis e instituições formais, mas
também através da produção de discursos de verdade;
O texto que você compartilhou é uma reflexão do filósofo Michel Foucault sobre
a relação entre direito, poder e soberania nas sociedades ocidentais. Vou
tentar resumir os principais pontos:
O edifício jurídico dessas sociedades foi elaborado para servir ao poder real,
seja como instrumento ou justificação;