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Rute_ Esperança e Resgate - Davi Helon de Andrade

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Produção Editorial

Marcos Santana
Revisão
Tiago Santana
Editor
Ilustração da capa: Rute e Boaz, gravura de Rembrandt,1643. Imagem em domínio público.

Editora Tssantana – Rua Apinajés, 1712 – Sumaré SP Cep 01258-000. © Copyright 2024 Todos os direitos reservados, proibida a
cópia sem autorização por escrito da Editora Tssantana. Em virtude deste mundo pós-queda possuir a pior terra para se lavrar, a
terra da comunicação, existe a possibilidade de que o conteúdo das obras publicadas contenha divergências da opinião de fé da
Editora Tssantana. A posição desta editora no essencial é o que está disposto nos símbolos de fé produzidos em Westminster e,
especialmente, de acordo com as Escrituras.
Dedico este livro ao meu pastor, Ari Nogueira, e sua esposa, Jean Thomson, que me
discipularam e me ensinaram a amar as Escrituras.

Série Comentários Pastorais

Ao longo de seus 20 anos de ministério, o pastor Davi Helon reuniu seus estudos e ministrações
para compor os livros desta série. Trata-se de exposições do texto bíblico de forma expositiva, se
valendo do método histórico-gramatical.
A preocupação da série é nutrir o povo de Deus com comentários bíblicos com linguagem
simples, porém com conteúdo relevante a partir da mensagem bíblica.
A série é destinada à igreja como um todo, líderes de pequenos grupos, professores de escola
dominical e o crente interessado em entender melhor as passagens bíblicas.
Ao final dos livros sempre há a referência bibliográfica destinada a referendar o estudo e para
que os leitores que intencionam se aprofundar em algum tema poderem buscar direto nas fontes.
A esperança e oração do editorial da Editora Tssantana é que a Igreja Brasileira tenha mais uma
ferramenta (dentre aquelas de muito boa qualidade) que seja edificante e que alcance o povo da
igreja, para que todos possamos nos alimentar com alimento mais sólido do que os laticínios
teológicos da atualidade.

Agradecimentos

Primeiramente gostaria de agradecer a Deus por ter começado uma obra em minha vida e sua
fidelidade em completá-la. Agradeço aos meus pais, por me educarem na fé cristã e serem
exemplos para mim, especialmente minha mãe, que tanto se derramou em oração pela minha
salvação e ministério. Agradeço minha querida esposa Tais, que está sempre ao meu lado sendo
a minha incentivadora e motivadora no trabalho do Reino do Senhor. E por fim, agradeço a
Igreja Presbiteriana de Higienópolis, pois este trabalho nasceu como fruto de uma série de
mensagens ministradas a essa igreja que tanto amo.
PREFÁCIO
Hernandes Dias Lopes

Sinto-me honrado em prefaciar esta preciosa obra, RUTE: Esperança e Resgate, do eminente
pastor Davi Helon de Andrade. Trata-se de um texto fiel e relevante sobre um dos livros mais
empolgantes da Bíblia, o livro de Rute. Meu entusiasmo em apresentar aos leitores o texto em
tela decorre de alguns fatores, que passo a elencar:
Primeiro, porque Davi traz à lume uma exposição clara e eloquente do texto bíblico, tomando-
nos pela mão e nos conduzindo pelos corredores da história, extraindo da correta interpretação
do texto bíblico aplicações oportunas para os nossos dias.
Segundo, porque Davi, com estilo belo e eloquente, constrói uma ponte entre o texto antigo e o
ouvinte contemporâneo, mostrando-nos como a Palavra de Deus, sempre viva e atual, traz
respostas para os grandes dilemas da vida.
Terceiro, porque Davi, reafirma seu zelo pelas Escrituras, sua fidelidade na interpretação do
texto inspirado, oferecendo aos leitores, a partir daí, direcionamento diante dos grandes dilemas
da vida. O livro de Rute é um farol a brilhar num ambiente de desesperança. É um ato providente
de resgate num cenário cinzento de escassez. É um romance de amor abnegado e incondicional
de uma jovem viúva que deixa sua terra, sua parentela e seus deuses para abraçar o povo de Deus
e o Deus do seu povo, vindo a ser a bisavó do rei Davi e ancestral do Messias.
Quarto, porque Davi é um homem de Deus que ensina pela vida mais do que pelas palavras. Seu
testemunho é avalista de sua obra. Seu exemplo nos motiva a ler este livro com entusiasmo.

Então, boa leitura!


INTRODUÇÃO

Esta exposição do livro de Rute nasceu em um período de crise mundial, em que o mundo
passava por uma pandemia chamada COVID-19.[1] Período em que foi necessário o isolamento
social, evitando-se assim o contágio em massa. Por conta disso, eu estava impedido de ir
trabalhar no meu escritório na igreja.
Ainda me lembro que escrevi este estudo de um escritório adaptado na varanda da sala do meu
apartamento. Enquanto escrevia, com a porta de vidro fechada, via meus filhos brincando na
sala, como se o mundo estivesse normal.
O momento era crítico e o medo de muitos era grande. Medo de pegar a doença; medo de algum
ente querido ou amigo se contaminar e vir a falecer; medo de quebrar a economia, pois muitos
estabelecimentos comerciais estavam fechados; além do medo do desemprego que bateu à porta
de muitos. Também se falava nos males que o pós-pandemia poderia causar à saúde mental das
pessoas.
Além daquele momento mundial, ainda tínhamos que lidar com problemas pessoais, familiares,
profissionais, de saúde, e tantos outros.
E o resultado pós-pandemia foi muito parecido com o esperado: milhões de pessoas morreram,
muitos perderam entes queridos e amigos, os hospitais ficaram lotados, empreendimentos foram
fechados, muitos foram demitidos, a economia passou por muitos acidentes, além de outras
tragédias pessoais causadas pela pandemia.
O mundo passou por grandes dificuldades com a pandemia, mas ainda hoje, todos passamos por
crises. Então, surge a pergunta: será que podemos avistar a esperança em meio ao caos?
O livro de Rute nos mostra a trajetória de uma mulher chamada Noemi, sogra de Rute,
que juntamente com seu marido Elimeleque e seus filhos Malom e Quiliom, saíram de Belém por
causa da fome e foram para Moabe. Em Moabe, Elimeleque, Malom e Quiliom morreram,
ficando somente ela com suas duas noras, Orfa e Rute.
Noemi ficou amargurada, culpando a Deus pelos seus problemas. Imagine o momento
desta mulher: ela sai em busca de esperança, mas nesta jornada acaba trazendo perdas e aflição
para sua alma.
O livro nos mostra um resgate, que veio tanto para Noemi quanto para Rute, no tempo
determinado por Deus. O interessante nessa história de salvação, que veio para elas, é que ela
aponta para Jesus Cristo, o Resgatador do mundo.
Rute é esta narrativa que nos traz esperança, apontando para o nosso Resgatador, Jesus
Cristo. Antes de iniciarmos, vejamos algumas considerações importantes para a compreensão do
texto.
Título

O título leva o nome da personagem principal deste livro, Rute (‫ רות‬Ruwth), que significa
“amizade”.[2] Durante a exposição, veremos o valor da amizade de Rute com sua sogra Noemi.

Autoria e data

A tradição judaica atribui a autoria do livro a Samuel. No entanto, esta sugestão entra
em conflito com o livro. A história se passa no período dos juízes (1.1), contudo, no final do
livro, Davi já é apresentado como um personagem notório em Israel (4.18-22). Logo, é
improvável que Samuel tenha sido o autor, pois, no auge da história de Davi, quando ele era bem
conhecido, o profeta já havia morrido.
Não sabemos ao certo quem é o autor, mas pode ter sido um funcionário do templo ou escriba do
período do reinado de Davi (+ ou – 1.000 a.C.), alguém que “teve acesso à coletânea de fatos e
tradições, quer oral ou escrita, sobre a família de Davi. Ainda mais, a referência à prática legal
que havia antes (4.7) e à genealogia (4.18–22) poderia sugerir acesso semelhante a registros
antigos guardados na corte real em Jerusalém.”[3]

Propósito

Escrito para demonstrar o amor leal de Deus, que preserva um remanescente numa época
obscura, culminando com o nascimento do rei Davi.

Tema

Esperança e resgate permeiam todo o livro. No início, Noemi acredita que o Senhor se voltou
contra ela (1.13, 20–21). Apesar disso, Rute demonstra seu amor ficando com Noemi, em vez de
retornar à sua própria família. Essas duas mulheres marginalizadas viajam juntas para Israel,
esperando uma vida melhor.
Em Belém, Noemi tem sua esperança renovada, pois entende que Deus a tinha guiado,
juntamente com Rute, para um resgatador (2.20).

Características teológicas
Misericórdia de Deus

Através de Rute, vemos que o plano redentor de Deus não se limita aos judeus, mas a todos que
se achegam a Yahweh em fé evidenciada por compromisso. (2.12)

Soberania de Deus

O livro de Rute descreve a soberania de Deus (1.6; 4.13) e seu cuidado providencial (2.3) com
pessoas aparentemente sem importância, em tempos aparentemente insignificantes, que mais
tarde demonstraram ser de importância crucial para o cumprimento da vontade de Deus.[4]
Boaz como um tipo de Cristo

Boaz era um retrato do amor gracioso de Deus, um tipo de Cristo, que se doa para o
resgate de Rute (4.1-12), assim como Cristo se entregou por nós.

Genealogia de Davi

O livro termina com uma genealogia de dez gerações, desde Perez, filho de Judá (filho de Jacó),
até Davi, neto de Obede (4.18-22). Assim, Deus mostra que está cumprindo sua aliança com
Abraão, de que faria dele uma grande nação e que, por meio dele, todas as famílias da terra
seriam abençoadas. Essa genealogia também mostra que Deus tem um propósito maior na
história da redenção, pois o Messias viria da tribo de Judá (Gn 49.10). Boaz é descendente de
Peres, Davi é descendente de Boaz, e vemos no Novo Testamento que Jesus é descendente de
Davi (Mt 5.1, 5, 6).

CAPÍTULO 1

DIAS DIFÍCEIS, CAMINHOS RUINS: DEUS NO CONTROLE

No ano de 2017, minha esposa, Taís, meus filhos e eu tiramos um tempo de férias. Neste
período, fomos ao Sul de Minas Gerais, onde nos encontramos com meus pais. No caminho,
passamos perto da Pedra do Baú (uma pedra de 340 metros de altura), na cidade de São Bento do
Sapucaí (SP). Da estrada, podíamos avistá-la quase toda. Mostrei para o João, nosso filho mais
velho, dizendo-lhe que, no ano de 1997, eu havia escalado e ido até o topo da Pedra, e naquele
dia muitas nuvens estavam sobre ela. João me disse: “Pai, gostaria de um dia estar acima das
nuvens”.
Na volta do Sul de Minas, passamos pela cidade de Campos do Jordão (SP), onde fomos
ao Pico de Itapeva, que tem 2.030 metros de altitude, o ponto mais alto do Estado de São Paulo.
Lá, eu pude dizer ao João: “Veja, meu filho, agora estamos acima das nuvens”.
Como é incrível olhar lá de cima! Tudo parece pequeno, dá até para ver a cidade de São José dos
Campos (SP), que está a mais de uma hora de carro. Da mesma forma é a nossa vida! Olhamos
para a vida, da perspectiva de quem está embaixo, não conseguimos ver o todo, o cenário no qual
Deus está trabalhando. “O nosso Deus está nos céus, e pode fazer tudo o que lhe agrada.”
(Salmo 115.3)
Por conta disso, pelas lutas que enfrentamos, vivemos sem perspectiva, olhando para a
vida no aqui e agora. E, por não conseguirmos olhar para o todo, acabamos perdendo a
esperança, nos tornando pessoas sem perspectiva.
“Quando o mundo está desmoronando, precisamos da segurança de que Deus reina
sobre tudo.”[5]
Estamos iniciando uma jornada no maravilhoso livro de Rute. Ele nos mostra a tristeza, a
amargura e a falta de esperança de uma mulher chamada Noemi, e como Deus a resgatou e a
levou a ter uma nova esperança.
Esta história se passa no tempo dos juízes, uma época de muita descrença no meio do
povo, e, consequentemente, um caos moral e social em Israel. No meio dessa confusão, surge
esta narrativa de amor e resgate.
Sendo o livro de Rute um livro de esperança em meio ao caos, apresentando Deus
soberanamente cuidando do seu povo continuamente. E ele começa nos mostrando:

DIAS DIFÍCEIS

O texto diz: “Na época dos juízes houve fome na terra.” (1.1)
Nas Escrituras, nem sempre a fome está ligada aos juízos de Deus. No entanto, neste caso,
poderia ser um ato de disciplina do Senhor. Lembrem-se de que este relato bíblico se passa nos
tempos dos Juízes, quando o povo vivia altos e baixos espirituais diante do Senhor na Terra
Prometida. Deus havia prometido um lugar de descanso ao seu povo. Depois de saírem do Egito,
eles marcharam rumo à essa terra. No caminho, Deus lhes deu a Lei de como deveriam viver lá:
se obedecessem, seriam abençoados; mas, se desobedecessem, seriam amaldiçoados.
Veja o que Levítico 26.3, 4 diz:
“Se vocês seguirem os meus decretos e obedecerem aos meus mandamentos, e os colocarem
em prática, eu lhes mandarei chuva na estação certa, e a terra dará a sua colheita e as
árvores do campo darão o seu fruto.”

O povo, porém, estava vivendo longe do Senhor. Por isso, o tempo dos Juízes foi
marcado por muita descrença, e, consequentemente, houve uma inversão de valores e uma perda
de referência em Israel.
Por que este caos moral e social?
Israel professava ser o povo de Deus, mas eles eram ateus na prática, tanto que o livro de
Juízes nos diz em duas ocasiões que: “cada um fazia o que lhe parecia certo.” (Juízes 17.6;
21.25)
Foi um tempo em que os israelitas tinham de escolher diariamente entre seguir a Deus como
Senhor, ou seguir as preferências e tendências da época.”
Como consequência a mão do Senhor pesou sobre o povo. Havia ali uma catástrofe
nacional, Belém era conhecida como a terra que manava leite e mel, e agora estava em um
momento de fome. Uma curiosidade é que a palavra Belém significa casa do pão, mas agora
faltava pão na “padaria”.
O contexto de Rute é distante de nós cultural e geograficamente, além do tempo que nos separa
dali. Vivemos dias tecnológicos bem avançados, mas o coração do homem continua o mesmo.
Basta olharmos a nossa volta e veremos uma enorme instabilidade política e social em cada canto
da terra. Se não fosse suficiente, acabamos de passar por uma pandemia, o COVID19 matou
muita gente no mundo e no Brasil, enfim, os resultados já chegaram nos corações e nos bolsos.
Além disso, a expressão, “cada um faz o que acha certo aos seus próprios olhos”, é facilmente
observada à nossa volta, todos querem liberdade para fazer o que acham certo aos seus próprios
olhos. Vivemos dias em que o certo se tornou duvidoso, e o errado uma boa opção.
Nós também enfrentamos dias difíceis.

DIAS DIFÍCEIS, CAMINHOS RUINS

“Um homem de Belém de Judá, com a mulher e os dois filhos, foi viver por algum tempo
nas terras de Moabe. O homem chamava-se Elimeleque, sua mulher Noemi e seus dois
filhos Malom e Quiliom. Eram efrateus de Belém de Judá. Chegaram a Moabe, e lá
ficaram. Morreu Elimeleque, marido de Noemi, e ela ficou sozinha, com seus dois filhos.
Eles se casaram com mulheres moabitas, uma chamada Orfa e a outra Rute. Depois de
terem morado lá por quase dez anos, morreram também Malom e Quiliom, e Noemi ficou
sozinha, sem os dois filhos e o seu marido.” Rute 1.1-5
Assim começa a história de Elimeleque e sua família: Noemi, sua esposa, e seus filhos,
Malom e Quiliom.
Neste momento de catástrofe nacional, de fome na terra, Elimeleque decide levá-los para
as terras de Moabe. Naquela circunstância, a fuga parecia o melhor recurso.
Emilio Garofalo comentando sobre Elimeleque diz:
“Talvez a nossa impressão, ao começar o livro de Rute, seja a de que estamos diante de um
homem que decidiu fazer de tudo para superar a adversidade e que vai, por meio de grandes
lutas e sacrifícios próprios, proteger a família e alcançar seus sonhos.”[6]

Mas, ao mesmo tempo em que Elimeleque estava tentando o melhor para sua família, ele
também estava sendo incrédulo e rebelde. Deus estava pesando sua mão sobre o seu povo, e a
resposta daquela nação, inclusive a de Elimeleque, deveria ser de arrependimento. No entanto,
ele escolheu um caminho mais fácil.
Em nenhum momento o texto diz que Elimeleque buscou ao Senhor e perguntou a sua
vontade. Até porque, o que ele precisava de fato era arrepender-se e permanecer em Belém. Ele
precisava obedecer aos decretos de Deus e ser abençoado, conforme Levítico 26.3, 4:
“Se vocês seguirem os meus decretos e obedecerem aos meus mandamentos, e os colocarem
em prática, eu lhes mandarei chuva na estação certa, e a terra dará a sua colheita e as
árvores do campo darão o seu fruto.”

Mas ele simplesmente fez o que era certo aos seus próprios olhos. Decisões sempre
trazem consequências! Quais foram as consequências da decisão de Elimeleque?
Primeiramente, Elimeleque morre. Ele perdeu a vida procurando a sobrevivência. Não
sabemos a causa da morte, pois o autor simplesmente coloca: “Morreu Elimeleque”. Perguntas
ficam no ar: por que ele morreu? Qual o plano de Deus em tudo isso? Foi pela desobediência?
Não sabemos claramente, mas, agora Noemi fica sozinha com seus dois filhos.
Segundo, os filhos se casam com moabitas. Embora Israel olhasse tais uniões com
espírito precavido, a lei não as proibia explicitamente. Também não proibia que um estrangeiro
se tornasse israelita.[7] Mas não havia indícios de conversão das mulheres, especialmente Rute,
até aquele momento.
Elimeleque saiu de Belém por sua incredulidade. Ele morreu, e agora seus filhos
tomaram estrangeiras como mulheres. Sua família já havia se misturado com os moabitas. Tanto
que, uma ida que era para ser temporária, passaram-se dez anos, mostrando como seus corações
estavam em Moabe.
Terceiro, não somente Elimeleque morreu, mas os filhos também. O texto também não
diz se foi juízo de Deus ou não, mas tratava-se de outra tragédia na família.
Quarto, Noemi ficou viúva, literalmente “desamparada de seus filhos e marido”,[8] e se
tornou sogra de duas viúvas. A família de Elimeleque estava praticamente destruída. Tudo aquilo
que parecia ser o melhor só os levou a um pesadelo.
“Muitas vezes, os caminhos que escolhemos revelam a todos os compromissos mais profundos
do nosso coração.”[9]
Elimeleque, (que significa Deus é meu rei), era da comunidade de Israel, pertencia ao povo de
Deus, mas vivia como se não pertencesse. Ele era o seu próprio rei. Ele escolheu virar as costas
ao seu povo e ao seu Deus, e fez o que achava certo aos seus olhos. O compromisso do seu
coração era consigo mesmo.
Da mesma forma, muitos portam o rótulo de “cristão”, mas seu cristianismo não tem
nenhum impacto nas decisões da vida.
“O livro de Rute começa nos mostrando que o caminho da vida não é simplesmente buscar
o melhor para si, mas buscar viver o caminho proposto pelo Senhor, mesmo que este
caminho seja duro. O caminho mais fácil não é necessariamente o correto.”[10]
As crises revelam muito sobre o nosso coração, sobre o nosso verdadeiro compromisso. E
qual é o compromisso do seu coração?

DIAS DIFÍCEIS, CAMINHOS RUINS: DEUS NO CONTROLE

O livro de Rute foi escrito para demonstrar a maravilhosa graça de Deus em preservar o seu povo
numa época de escuridão.
“...o Senhor viera em auxílio do seu povo, dando-lhe alimento...” Rute 1.6
A palavra “auxílio” denota “cuidar de”:[11] “O Senhor viera cuidar do seu povo”. “Deus
estava atento ao seu povo e cuidava das suas necessidades.[12] Logo, o Senhor veio em seu
auxílio graciosamente. Ele trouxe alívio à fome, mandou chuva e restaurou a agricultura de
Israel.
Quando Deus pesa a mão sobre os seus, é a fim de conduzi-los ao arrependimento.
Noemi sabia que Deus havia visitado Israel com seu perdão. Novamente havia pão na casa do
pão. E agora é a vez desta mulher, já se passaram alguns anos, ela não tem mais marido e filhos,
mas ela resolve voltar.
Quando pensamos que Deus está contra nós, ou mesmo nos abandonou, ele continua atento às
nossas vidas e às nossas necessidades. Ele está trabalhando sempre em algo maior. No caso de
Israel, eles estavam longe do Senhor e precisavam se arrepender, no nosso caso, Deus está nos
provando, tratando o nosso coração.
As circunstâncias dos nossos sofrimentos podem ser devido aos nossos erros, como pela própria
vida. Mas Deus não desperdiça o nosso sofrimento, ele trabalha em nossas vidas.
“Sabemos que Deus age em todas as coisas para o bem daqueles que o amam, dos que foram
chamados de acordo com o seu propósito.” Romanos 8.28

CONCLUSÃO

Dias difíceis, caminhos ruins: Deus no controle.


Vivemos dias complexos, dias de instabilidade política e social. Muitos experienciam suas vidas
fazendo o que acham certo aos seus olhos.
Talvez, além destas dificuldades da nossa época, você ainda tem passado por problemas
particulares.
Quais caminhos você tem trilhado?
Precisamos sempre nos lembrar que nossas decisões revelam os compromissos mais profundos
do nosso coração.
Quem governa o seu coração? Você mesmo, ou Deus é o seu rei?
E mesmo diante das calamidades, mesmo que você não esteja enxergando, Deus continua
reinando e cuidando dos seus. Sua Graça brilha para levar-nos para mais perto de si, como foi no
caso de Noemi, em que ela volta para casa, de volta para Belém.

CAPÍTULO 2

O CAMINHO DO RECOMEÇO
Os anos 2015 e 2016 não foram fáceis para nossa família. Nós estávamos muito felizes pelo
nascimento do nosso filho do meio, mas junto veio a notícia de que possivelmente ele passaria
por uma grande cirurgia para reconstrução do crânio. Ainda me lembro do dia em que eu e minha
esposa estivemos no consultório do médico e ele nos informou que seria necessária aquela
intervenção cirúrgica. Nosso mundo desmanchou diante dos nossos olhos, contudo Deus usou
aquele momento para nos ensinar muito sobre o seu cuidado em nossas vidas.
A cirurgia foi realizada e, um mês depois, realizamos um culto de gratidão a Deus.
Todavia, na semana do culto, veio a notícia de que meu sogro estava com câncer terminal. Taís
se apressou com as crianças para Vitória – ES. Eu só pude ir alguns dias depois, no dia da morte
do meu sogro.
Recordo que, no caminho para o aeroporto, eu estava meditando sobre todos esses
acontecimentos. Quando cheguei, o tempo estava fechado e garoando, mas apesar do clima
chuvoso, o voo saiu normalmente. Notei algo incrível, o avião atravessou as nuvens e o céu
estava azul, o sol brilhava fortemente.
Então, eu me lembrei de uma frase do poeta Willian Cowper, que diz: “Por trás de toda
providência carrancuda, esconde-se uma face sorridente.”[13]
No primeiro capítulo falamos sobre “Dias ruins, caminhos difíceis: Deus no controle”. Iniciamos
com Elimeleque e sua família. Ele decide deixar Belém, era um tempo de escassez de comida, e
foram todos para Moabe, contrariando assim a vontade do Senhor, que era a permanência da
família em Belém, se arrepender junto ao povo e aguardar o livramento divino.
Teimoso, ele foi para a terra dos moabitas, pouco depois faleceu. Deixou Noemi e seus dois
filhos. Na sequência, eles se casaram com moabitas, algo que não era bem-visto pelo povo de
Israel, isso mostra que eles já estavam com seus corações em Moabe. Eles infelizmente morrem,
ficando somente Noemi e suas duas noras.
Imaginem até aqui, o quão sombrio estavam os dias de Noemi: Morte do marido - O principal
provedor - Morte dos dois filhos - Solidão.
Como disse anteriormente, ela ficou sozinha (v 5) “desamparada de seus filhos e
marido”, sogra de duas viúvas. (v 4)
Terminamos com um raio de esperança, o Senhor não se esqueceu do seu povo: Ele veio em seu
auxílio, dando-lhe alimento (1.6). Estas notícias chegam aos ouvidos de Noemi que, junto com
suas duas noras, decide voltar.
Quais lições podemos tirar para nossas vidas deste pequeno trecho que relata o retorno de Noemi
com suas noras? Quais foram os caminhos trilhados por elas?

O CAMINHO DA AMARGURA

O Senhor viera em auxílio do seu povo, dando-lhe alimento. E se havia alguém que estava
necessitando de auxílio era Noemi. Então, ela decide voltar para junto do seu povo. Talvez com
o sentimento de que ainda houvesse alguma esperança para ela, e junto com suas noras, partiu.
“Assim ela, com as duas noras, partiu do lugar onde tinha morado. Enquanto voltavam
para a terra de Judá, Noemi disse às duas noras: ‘Vão! Voltem para a casa de suas mães!
Que o Senhor seja leal com vocês, como vocês foram leais com os falecidos e comigo. O
Senhor conceda que cada uma de vocês encontre segurança no lar doutro marido.’ Então
deu-lhes beijos de despedida. Mas elas começaram a chorar bem alto e lhe disseram: ‘Não!
Voltaremos com você para junto de seu povo!’” Rute 1.7-10
Em algum lugar da jornada, Noemi tenta convencê-las a voltarem para casa de suas mães,
[14] ela testifica que elas foram boas esposas e noras, sendo também verdadeiramente leais
(hesed).[15]
Noemi ainda invoca a benção do Deus de Israel (Yahweh) sobre elas e pede para que o Senhor as
dê maridos novos e um lar seguro.
Noemi não via futuro para elas em seu próprio país. Por serem moabitas, suas noras teriam uma
menor probabilidade de encontrar um novo casamento em Israel;[16] além disso, elas
compartilhariam a pobreza.
Beijando-as em despedida, todas começaram a chorar alto. É nítido aqui o amor de umas pelas
outras. Mas, elas disseram - “Não! Voltaremos com você para junto de seu povo" (1.10), porém,
mais uma vez, Noemi insiste para que voltem, veja o tom:
Voltem, minhas filhas! Vão! Estou velha demais para ter outro marido. E mesmo que eu
pensasse que ainda há esperança para mim — ainda que eu me casasse esta noite e depois
desse à luz filhos, iriam vocês esperar até que eles crescessem? Ficariam sem se casar à
espera deles? De jeito nenhum, minhas filhas...! Rute 1.12, 13
Noemi mostra a elas um misto de verdade e desesperança.
Em primeiro lugar, ela já estava velha para se casar novamente, e em segundo, mesmo que ela se
casasse, estariam as duas dispostas a esperar os filhos crescerem? O que isso significava?
A triste senhora estava provavelmente se referindo a lei do levirato, uma lei em Israel em que, o
irmão do falecido era obrigado a se casar com a cunhada viúva. (Dt 24.5, 6). Neste caso seria
praticamente impossível, mesmo que Noemi se casasse e tivesse filhos, demoraria muitos anos.
Esse misto de “verdade” com desesperança, só demonstrava o seu coração amargurado, ao ponto
de ela dizer:
“Para mim é mais amargo do que para vocês, pois a mão do Senhor voltou-se contra mim!”
Rute 1.13b
Noemi estava amargurada na alma, e a razão, segundo ela, era a oposição divina.
Mais uma vez, elas choraram, então Orfa se despede dela com um beijo, mas Rute ficou.
Noemi estava tão desconsolada pela dura Providência Divina que não enxergava a misericórdia
do bom Deus trabalhando em sua vida. Olhos amargurados ficam cegos.
Ela estava agindo com autocomiseração. Quis ficar só, como se estivesse dizendo: “NÃO
SIRVO DE BOA COMPANHIA, por isso Voltem, minhas filhas! Não há mais esperança para
mim. A mão do Senhor voltou-se contra mim.”
Ela encarou a felicidade como algo apenas para ser lembrado. Para ela, parecia que Deus era
bom apenas para os outros: “Que o Senhor seja leal com vocês...”
Muitas vezes estamos tão machucados e feridos, que não conseguimos ver a bondade de
Deus conosco. Noemi reagiu assim porque ela ainda não estava vendo Deus trabalhar em sua
vida. E da mesma forma somos nós, ela não conseguia ver o quadro todo, como nós geralmente
não vemos ou ignoramos.
Se vivêssemos de um modo em que pudéssemos enxergar o todo, não seria mais fé.
Imagine se você conseguisse ver um mapa do início ao fim dos seus anos, enxergando as
dificuldades, as lutas, os vales; com certeza muitas coisas que veríamos ali, não concordaríamos,
iríamos querer mudar ou pular.
Observe o que a Bíblia diz:
“Porque os meus pensamentos não são os vossos pensamentos, nem os vossos caminhos, os
meus caminhos, diz o SENHOR, porque, assim como os céus são mais altos do que a terra,
assim são os meus caminhos mais altos do que os vossos caminhos, e os meus pensamentos,
mais altos do que os vossos pensamentos”. Isaías 55.8, 9

Muitas pessoas vivem de espírito abatido e se ressentem de Deus porque as coisas não
foram como elas planejaram. Isso normalmente acontece, porque muitos tendem a achar que suas
escolhas e seus caminhos são melhores do que os de Deus. Contudo, a graça de Deus, está muito
além da compreensão humana. A esperança estava a caminho, somente Noemi ainda não tinha
percebido.

O CAMINHO DA FÉ

“Depois Orfa deu um beijo de despedida em sua sogra, mas Rute ficou com ela. Então
Noemi a aconselhou: ‘Veja, sua concunhada está voltando para o seu povo e para o seu
deus. Volte com ela’” Rute 1.14, 15

Orfa retornou, ela teve uma escolha racional, pois, junto a Noemi, não haveria esperança e sim
amargura, por que segui-la? Além do mais, elas seriam pobres, Orfa também poderia ser
rejeitada em Israel, portanto, o melhor seria voltar para sua terra e se casar por lá.
Rute toma uma decisão pela fé, uma decisão de amor, uma decisão pactual. Ela permaneceu. Sua
sogra, Noemi, ainda mais uma vez, tenta convencê-la de voltar para Moabe, era certo, a decisão
estava tomada: ir plenamente pela fé. Temos, diante disso, uma das respostas mais lindas da
Bíblia sobre lealdade, muito utilizada em cerimônias de casamento:
“Rute, porém, respondeu: ‘Não insistas comigo que te deixe e não mais a acompanhe.
Aonde fores irei, onde ficares ficarei! O teu povo será o meu povo e o teu Deus será o meu
Deus! Onde morreres morrerei, e ali serei sepultada. Que o Senhor me castigue com todo o
rigor, se outra coisa que não a morte me separar de ti!’” Rute 1.16, 17

Sendo racional, não havia nada de bom para Rute indo com Noemi. Ela estava indo rumo ao
desconhecido, renunciando uma vida melhor. Todavia, ela expressa seu amor leal a Noemi,
decidida de que a seguiria até o fim, não importando o que o futuro reservasse. “Aonde fores irei,
onde ficares ficarei.”
Rute não se compromete somente com Noemi, mas com Israel e com o Deus de Israel. “O teu
povo será o meu povo e o teu Deus será o meu Deus!” Ela estava renunciando suas raízes étnicas
e religiosas, adotando a nacionalidade e a religião de Noemi. Dali em diante, seus parentes
seriam israelitas; seu Deus, Yahweh.[17]
Isso só é possível pelo agir de Deus, pois Rute confiou no Deus de Noemi, apesar das
experiências amargas da própria sogra. Ela sela este pacto dizendo: “Que o Senhor me castigue
com todo o rigor, se outra coisa que não a morte me separar de ti!”
Na antiguidade, as antigas alianças eram feitas com um animal que era cortado ao meio,
as pessoas envolvidas passavam entre as metades, simbolizando que, caso um dos pertencentes a
esse pacto não cumprisse sua palavra, a outra parte poderia fazer a mesma coisa feita ao animal
partido com quem fosse infiel. O Senhor fez uma aliança com Abraão desse mesmo jeito, porém,
somente Deus passou entre as partes do animal, assumindo a total responsabilidade na aliança
(Gn 15). Rute fez uma aliança com Noemi, para isso, ela usa o nome do Deus de Israel (Yahweh)
como prova desta aliança, e “voluntariamente ela tomou sobre si consequências terríveis, não
especificadas, se a condição estipulada em seguida acontecesse.”[18]
A nora renunciou à sua vida para seguir sua sogra, elas estavam ligadas pela amizade e pela fé
agora. O povo de Noemi seria o seu povo, o Deus de Israel, seria o seu Deus. Rute renunciou
uma vida que aparentava ser melhor. Deixar Moabe significava fechar muitas portas. O mesmo
podemos dizer a respeito de seguirmos a Cristo. É necessário renunciarmos nossa vida, e
caminharmos pela fé, em consequência, muitas portas se fecharão.
Muitos preferem o caminho de Orfa, aparentemente seguro, do que o Caminho que Rute tomou.
Esta história nos faz pensar, quais caminhos estamos tomando? O da sogra amarga, o de Orfa, da
segurança, ou o de Rute, da fé?

O CAMINHO DO RECOMEÇO

“Quando Noemi viu que Rute estava de fato decidida a acompanhá-la, não insistiu mais.”
Rute 1.18
O texto agora nos mostra um aparente silêncio de ambas prosseguindo até Belém. Fico
imaginando esta peregrinação das duas, nem mesmo um muito obrigado de Noemi após a
declaração da sua nora.
Elas chegam ao seu destino. Noemi ainda era lembrada. Todo o povoado fez um alvoroço com a
chegada dela, e diziam: “...Será que é Noemi?", perguntavam as mulheres.” 1.19.b
Essa era uma pergunta dolorosa, pois Noemi significa agradável, mas agora ela responde:
“Não me chamem Noemi, chamem-me Mara,” (1.20). Mara significa amarga. Noemi estava
dizendo: “não me chamem de agradável, mas de amarga”, “pois o Todo-Poderoso tornou minha
vida muito amarga!”
Ela havia partido com fartura, mas agora volta de mãos vazias: viúva, sem filhos, pobre,
com uma de suas noras ao seu lado. No seu coração, Deus, o Todo-Poderoso, foi o responsável
por tudo isso.
Mesmo com o conhecimento que Noemi tinha de Deus, “fiel e Todo-Poderoso”. Ela se
ressentia e cria que o Senhor estava contra ela. “Quando decidimos que Deus está contra nós,
geralmente exageramos nossa falta de esperança.”[19]
Foi Deus quem tirou a fome e abriu o caminho de volta ao lar (1.6). Ela enxergava isso
com suspeitas, não via tudo que Deus estava fazendo. Lembre-se: olhos amargurados ficam
cegos.
Noemi não voltou de mãos vazias, ela chegou com Rute. E o autor termina com um
gancho, as cenas do próximo capítulo: “Elas chegaram a Belém no início da colheita da
cevada.” Rute 1.22
Noemi, Elimeleque e filhos partiram em dias de fome, mas agora voltam as mulheres na
época da colheita. Exatamente naqueles campos da colheita da cevada será onde Rute irá
conhecer Boaz, seu futuro marido.
Se Noemi tivesse visto todo esse quadro antes, ela não entenderia qual a razão de Deus
usar uma estrangeira moabita, uma impura diante dos israelitas, para trazer em sua descendência
com Boaz, Davi, e de Davi, Jesus. Sim, Jesus é descendente de Rute. (Mateus 1.5, 6)
Noemi, não teria de volta seu marido e filhos, mas o Senhor tinha algo muito maior, que
ela mesma não veria. A nora e sua sogra estavam no caminho do recomeço, algo extraordinário
na história da salvação.
Isso nos faz lembrar mais uma vez:
“Uma providência carrancuda esconde um rosto sorridente.”

CONCLUSÃO

Deus dirige a história. Os caminhos dele são invariavelmente melhores que os nossos. Muitas
coisas nos acontecem, e não temos uma resposta clara do porquê, ainda assim Deus tem
propósitos memoráveis.
“Sabemos que Deus age em todas as coisas para o bem daqueles que o amam, dos que foram
chamados de acordo com o seu propósito.” Romanos 8.28
Deus pode usar os caminhos amargos pelos quais passamos, para nos levar a caminhos de
recomeço junto dele. Entretanto, muitos preferem o amargor da vida ou procuram algo que lhes
ofereça segurança no tempo presente. O Caminho dos Recomeços é o Caminho da Fé, que
necessariamente passa pelo Caminho da Cruz, o Caminho da Morte para Si Mesmo e para os
próprios interesses.
Rute renunciou toda sua vida, ela morreu para si mesma, para seus próprios interesses, decidiu
caminhar com uma senhora, seguindo ao Deus de Israel, sem saber o que a esperava. Isso é fé, e
Deus a honrou.
Da mesma forma Jesus disse:
“Se alguém quiser acompanhar-me, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me. Pois
quem quiser salvar a sua vida, a perderá, mas quem perder a vida por minha causa, a
encontrará.” Mateus 16.24-25

Em qual caminho você tem trilhado? Da amargura, da segurança ou da fé? Talvez seja
hoje o dia em que você voltará para Jesus com fé, negará a si mesmo e o seguirá.

CAPÍTULO 3
DEBAIXO DE SUAS ASAS

No decorrer da pandemia de Coronavírus, após uma quarentena dentro de casa, minha família e
eu, fomos nos refugiar por sete dias, dentro de uma Chácara maravilhosa, na cidade de Campo
Grande, no Mato Grosso do Sul. Lá, além de protegidos, estávamos cercados por florestas e um
rico habitat para araras, tucanos, cotias, ovelhas, cachorros e galinhas.
É interessante o fato de que levei diversas vezes as crianças até o galinheiro para verem as
galinhas e os pintinhos. Elas puderam ver como os filhotes das penosas eram protegidos debaixo
das suas asas, e como eles se sentiam confortáveis ali!
Estamos percorrendo esta belíssima narrativa do livro de Rute. Começando com a fome, a fuga,
as mortes e a amargura e, por fim, a narrativa nos mostra que existe um Deus soberano, Senhor
da história.
No capítulo anterior vimos sobre “O caminho do recomeço”. Noemi e Rute voltaram para
Belém, e assim que chegaram, Noemi foi reconhecida pelos conterrâneos, que a chamaram pelo
seu nome (Noemi = agradável). Rapidamente, ela expressou sua amargura na alma dizendo: “me
chamem Mara”, (que significa amarga), mostrando assim, uma falta de compreensão do trabalho
de Deus em sua vida. Lembre-se: “olhos amargurados ficam cegos”.
O capítulo termina com um raio de esperança, pois chegaram em Belém no início da colheita,
como se o autor estivesse adiantando um plot twist, uma reviravolta, nas cenas que se seguiriam.
Já no início do segundo capítulo, no primeiro versículo, temos um novo personagem:
“Noemi tinha um parente por parte do marido. Era um homem rico e influente, pertencia ao clã
de Elimeleque e chamava-se Boaz.” Rute 2.1
Ele nos apresenta Boaz, um parente[20] de Elimeleque, um homem de honra, “rico e
influente”. É como se o autor dissesse: “Vou lhes apresentar este grande homem, antes do
desenrolar da história, para que vocês saibam a importância do seu papel.” Após apresentá-lo, ele
continua narrando.

DIAS COMUNS: DEUS NO CONTROLE

Dias comuns

Rute e Noemi chegaram em Belém, e a vida seguia. As duas estão na terra prometida, mas a
despensa está vazia. A nora não perdeu tempo resmungando, nem mesmo ficando na
autocomiseração, ela fez o que pôde por si mesma e por sua sogra.
Assim disse Rute: “...‘Vou recolher espigas no campo daquele que me permitir.’ ‘Vá,
minha filha’, respondeu-lhe Noemi.” Rute 2.2
“Rute estava dando um passo de fé, na esperança de que em algum lugar lá fora haveria um
proprietário de terras temente a Deus e generoso para com os pobres.”[21]

A lei no Antigo Testamento dizia que os ceifadores deveriam abandonar algumas espigas
para os pobres e os estrangeiros apanharem (Lv 19.9, 10). É justamente isso que Rute foi fazer,
trabalhando com muita humildade e confiando na provisão do Senhor:
“A atitude de Rute nos ensina algo sobre a humildade e a dignidade que existem em
qualquer emprego honesto. Apanhar sobras de espigas é serviço humilde e um tanto
inglório, mas não é algo de que ela se ressente. Muitos corações reclamariam: “Deus, eu
deixei tudo pelo Senhor e agora terei de colher espigas? Sobras? Eu abandonei a
segurança de minha terra para isso? A postura de Rute é muito importante e revela algo
precioso sobre quem ela é.”[22]

Deus no controle
“Então ela foi e começou a recolher espigas atrás dos ceifeiros. Por acaso entrou
justamente na parte da plantação que pertencia a Boaz, que era do clã de Elimeleque.”
Rute 2.3

Vemos aqui uma divina coincidência. Lembre-se que o capítulo começa nos falando de
Boaz, e agora diz que “por acaso”, Rute entra na plantação que pertencia a ele. Este “por acaso”
significa que ela não tinha planejado isso, mostrando assim que Deus é quem está dirigindo os
seus passos.
“Em seu coração o homem planeja o seu caminho, mas o Senhor determina os seus passos.”
Provérbios 16.9
Não somente as pegadas de Rute eram dirigidas pelo Senhor, mas também as de Boaz:
“Naquele exato momento, Boaz chegou de Belém e saudou os ceifeiros: ‘O Senhor esteja com
vocês!’ Eles responderam: ‘O Senhor te abençoe’” Rute 2.4
“Naquele exato momento”, Boaz chegou de Belém. Isso mostra a soberania de Deus sobre os
eventos que se desenrolam. Mostra também que a agenda da nossa vida está nas mãos do
Altíssimo.
A vida continua para todos nós. Mesmo em meio à pandemia que passamos, mesmo com
as lutas que enfrentamos, a vida continua. Aprendemos com Rute que não devemos ficar
remoendo como a vida deveria ser. Não devemos reclamar com Deus como se ele estivesse
errado em nos colocar onde estamos, ou pelo que estamos passando.
É comum reclamarmos: “Deus, deixei tudo por ti, e olha minha situação”. Você, leitor, tem
vivido assim? Reclamando, amargurado com a vida e cobrando de Deus? Precisamos nos
levantar, nos mexer, e fazer o que estiver ao nosso alcance. Precisamos correr, ir atrás, trabalhar,
mesmo que seja um simples recomeço. Mas devemos fazer isso com fé, confiando que Deus está
no controle e que ele há de prover para nossa vida.
Lembre-se: a agenda da nossa vida se encontra nas mãos de Deus.

BOAZ, O RESGATADOR

A partir daí, começa o primeiro diálogo de Boaz. Podemos ver pelas suas ações como ele é um
retrato do amor gracioso de Deus. Logo de início, ele já se mostra um homem de honra, e como é
honrado pelos seus funcionários, cumprimentando-se da seguinte maneira:
“...‘O Senhor esteja com vocês.’ Eles responderam: ‘O Senhor te abençoe!’” Rute 2.4
Ele chega encorajando-os dizendo que Yahweh estava presente “com eles”, abençoando
seu trabalho.[23]
E logo ele pergunta, a quem pertencia a moça que estava lá. (2.5)
“O capataz respondeu: ‘É uma moabita que voltou de Moabe com Noemi. Ela me pediu que
a deixasse recolher e juntar espigas entre os feixes, após os ceifeiros. Ela chegou cedo e
está de pé até agora. Só se sentou um pouco no abrigo.’” Rute 2.6, 7

Boaz já sabia tudo sobre Rute, já tinha ouvido falar sobre ela e Noemi, então, finalmente, ele se
encontrou com ela no campo. Algo digno de nota: Boaz é filho de Raabe, uma prostituta
cananeia que se converteu ao Deus de Israel nos dias de Josué. Logo, “ele sabia sobre as
dificuldades de um estrangeiro dentro da nação, particularmente uma mulher estrangeira.”[24]
Então, ele a chama para uma conversa:
“Disse então Boaz a Rute: ‘Ouça bem, minha filha, não vá colher noutra lavoura, nem se
afaste daqui. Fique com minhas servas. Preste atenção onde os homens estão ceifando, e vá
atrás das moças que vão colher. Darei ordem aos rapazes para que não toquem em você.
Quando tiver sede, beba da água dos potes que os rapazes encheram.’”

Que palavra! E quanta graça demonstrada a Rute. Por isso, Boaz é um retrato do amor gracioso
de Deus. Ele se dirige a ela com ternura, “minha filha”,[25] e lhe dá permissão para recolher
espigas, como também a instrui a permanecer em seu campo, e trabalhar com suas servas. Ele lhe
oferece proteção contra qualquer assédio que ela poderia enfrentar, e permite que ela beba da
água retirada por seus trabalhadores, poupando-a de ir até o poço.
Boaz estava fazendo muito além do seu dever, por isso Rute, em humildade e gratidão, se prostra
diante dele e lhe pergunta:
“...Por que achei favor a seus olhos, a ponto de o senhor se importar comigo, uma
estrangeira?” E “Boaz respondeu: ‘Contaram-me tudo o que você tem feito por sua sogra,
depois que você perdeu o marido: como deixou seu pai, sua mãe e sua terra natal para
viver com um povo que pouco conhecia. O Senhor lhe retribua o que você tem feito! Que
você seja ricamente recompensada pelo Senhor, o Deus de Israel, sob cujas asas você veio
buscar refúgio!’” Rute 2.11-12

Boaz ouviu acerca de todo amor de Rute por sua sogra, após perder o marido e deixar sua terra e
família para viver em Israel. Rute era verdadeiramente uma mulher leal. Lembrem-se também
que, ao seguir Noemi, ela estava renunciando toda sua vida, e seguindo o Deus de Israel. Até
então, toda atitude de Rute, foi resultado da sua fé em Yahweh, o Deus em cuja asas ele
buscou abrigo.
Boaz a convida para comer junto com ele. Ela se assentou à mesa e comeu. Logo após, ele deu
ordens aos seus servos para que ela levasse espigas além do que ela poderia carregar para casa.
Em contraste com a declaração de Noemi em 1.21, de que ela saiu de mãos cheias e
voltou de mãos vazias, Rute saiu de mãos vazias e voltou para casa de mãos cheias.
Jesus, de modo semelhante a Boaz, tem nos tratado bem, enchendo nossas mãos. Ele sabe
como temos dificuldade em nos aproximar de Deus e do seu povo, pois estamos separados
devido o nosso pecado.
Por isso, ele gentilmente se aproxima de nós e graciosamente nos dá mais do que
merecemos, a salvação e a vida eterna. O Mestre promete estar conosco até o fim, além disso,
nos convida para assentarmos em sua mesa.
Qual nossa reação diante disso tudo? Nos ajoelharmos em humilde gratidão. Confessarmos que
somos indignos, e nos refugiarmos debaixo de suas asas.
Onde você tem se refugiado? Qual a segurança da sua vida?

UMA NOVA ESPERANÇA

Aqui enxergamos a proposta para o título do livro: Rute – Esperança e resgate. Rute retorna, de
mãos cheias para casa, com aproximadamente 22 quilos de cereais, o equivalente a várias
semanas de comida para um trabalhador médio,[26] e Noemi vendo o resultado pergunta:
“‘Onde você colheu hoje?’... ‘Onde trabalhou? Bendito seja aquele que se importou com você’”
Rute 2.19
Ela, em sua animação, abençoa aquele que foi tão bondoso com Rute. Sua nora, então, responde
quem foi este homem:
“O nome do homem com quem trabalhei hoje é Boaz.” (2.19)
Noemi ficou tão animada que disse:
“...Seja ele abençoado pelo Senhor, que não deixa de ser leal e bondoso com os vivos e com
os mortos!’ E acrescentou: ‘Aquele homem é nosso parente; é um de nossos
resgatadores!’” Rute 2.20
Noemi, antes cega por sua amargura, volta a enxergar a lealdade e bondade de Deus, e não
somente isso, ela volta a ter esperança quando diz que Boaz é um resgatador.
Como resgatador, além de poder se casar com Rute, ele teria direito de readquirir todos
os bens que eram de Elimeleque, dando assim um recomeço a Rute e Noemi.
Rute ainda vai contar que Boaz havia dito para que ela ficasse junto aos seus ceifeiros. Noemi
concorda que ela fique próxima às servas dele, para que não corra o risco de ser molestada.
O capítulo termina dizendo: “ela continuou trabalhando com as servas de Boaz até o fim da
colheita e ainda morando com sua sogra”. Como se o autor estivesse novamente mostrando as
cenas do próximo capítulo, em que Rute seria resgatada.
Noemi não teria seu marido e filhos de volta, mas ela teria uma nova vida. Ela, que antes estava
cega pela amargura, agora volta a ver a lealdade de Deus.
Você enxerga a lealdade de Deus em sua vida? Talvez, muito do que você perdeu ou pelo que
passou não será recuperado, mas, em Cristo, Deus lhe dá uma nova esperança, um recomeço. Ele
é o nosso resgatador.

CONCLUSÃO

Dias comuns: Deus no controle.


Num dia comum, em que a vida continua, Rute se levanta indo atrás do sustento, porém Deus,
aquele que dirige a história, a leva para os campos de Boaz, o seu resgatador.
Boaz sabia como os estrangeiros viviam em dificuldades entre o povo de Israel, então, ele
graciosamente estende sua mão para Rute, sendo-lhe gentil, dando-lhe permissão para colher em
seus campos além do que era permitido e lhe protegendo. Grata e em humildade, Rute se ajoelha.
Mas ele vai além, convidando a moça para assentar-se junto dele, para terem uma refeição.
Noemi e Rute, agora têm uma nova esperança.
É dessa mesma maneira que Jesus nos trata, ele sabe da nossa dificuldade de nos
aproximarmos de Deus e do seu povo, pois estamos separados devido o nosso pecado.
“pois todos pecaram e estão destituídos da glória de Deus” Romanos 3.23
Mas Cristo gentilmente nos chama:
“Venham a mim, todos os que estão cansados e sobrecarregados, e eu lhes darei descanso.”
Mateus 11.28
E nos dá o que não merecíamos, a salvação.
“Pois vocês são salvos pela graça, por meio da fé, e isto não vem de vocês, é dom de Deus”.
Efésios 2.8
Ele também nos oferece proteção, prometendo estar conosco todos os dias até a sua volta. Nos
convida a participarmos de sua mesa, nos dá uma viva esperança, um recomeço.
Por isso, ajoelhe-se diante dele, confessando os seus pecados, a sua indignidade, a sua fragilidade
e, por fim, se refugie debaixo das suas asas.

CAPÍTULO 4

GRAÇA VIRTUOSA
Vivemos dias em que muitas pessoas têm vergonha do que fazem ou do que fizeram. A culpa as
atormenta, não conseguem enxergar e entender que para ele ou ela, em Cristo Jesus, há uma
segunda chance.
Também existem aqueles que tratam com preconceito, até certo distanciamento, àqueles que
tiveram uma vida ou uma origem que não estão de acordo com seus “padrões”.
Até aqui vimos como Deus levou Noemi e Rute a uma viva esperança através de um resgatador.
No capítulo anterior, terminamos com a seguinte cena: Rute continuava trabalhando com as
servas de Boaz e morando com a sua sogra, mas algo estava prestes a acontecer.
Neste terceiro capítulo veremos como a esperança, e a graça de Deus, transbordam por toda essa
narrativa bíblica.

A ESTRATÉGIA DE NOEMI

Descanso e alegria

Noemi, no primeiro capítulo, havia pedido ao Senhor que provesse “segurança” para Orfa e Rute
no lar de um novo marido, pois ela não podia ajudá-las. Inadvertidamente, ela percebe que isso
seria possível em Belém, e esta seria a resposta adequada daquela oração, especialmente para
Rute.
“Certo dia, Noemi, sua sogra, lhe disse: ‘Minha filha, tenho que procurar um lar seguro, para
sua felicidade.’” Rute 3.1
As duas, vivendo juntas, teriam uma vida de muitos desafios, pois, além de viúvas e pobres, Rute
era moabita, lembrando que os moabitas não eram bem-vistos pelos israelitas.
O plano de Noemi era que Rute tivesse descanso e proteção em um novo lar, com um novo
marido. A Palavra “lar” significa literalmente lugar de descanso.[27]

A estratégia

Dessa maneira, a sogra elabora uma estratégia e conta à sua nora:


“‘Boaz, aquele com cujas servas você esteve, é nosso parente próximo. Esta noite ele estará
limpando cevada na eira. Lave-se, perfume-se, vista sua melhor roupa e desça para a eira.
Mas não deixe que ele perceba você até que tenha comido e bebido. Quando ele for dormir,
note bem o lugar em que ele se deitar. Então vá, descubra os pés dele e deite-se. Ele lhe
dirá o que fazer.’ Respondeu Rute: ‘Farei tudo o que você está me dizendo.’” Rute 3.2-5

Resumindo, Noemi disse: “Rute, esta noite Boaz vai dormir lá na eira (lugar onde se moe as
sementes), por isso, arrume-se bem e vá para lá! Tome um banho, não deixe de se ungir. Mostre
que está pronta para se casar de novo. Hoje você vai arrumar um marido para si. Chegue perto e
deixe que ele dite o rumo da situação.”
“Banhar, ungir e vestir. Por toda a Escritura, essas três ações representam os passos da noiva
enquanto ela se prepara para encontrar seu marido.”[28] Noemi pede para Rute se preparar como
quem estava pronta para se casar, e a instrui a ir até Boaz, mas de uma forma muito arriscada,
pois, “Rute estaria pedindo que ele se casasse com ela naquela noite e consumasse o casamento.”
Talvez os leitores daquela época se lembrariam de Gênesis 19, em que as filhas de Ló,
percebendo que não teriam marido, embebedaram o pai e se deitaram com ele. De uma de suas
filhas nasceu Moabe, dando origem ao povo de Rute. Talvez os leitores conhecedores da origem
dos moabitas, estariam pensando, será que veremos algo semelhante?
Então, Rute disse à sua sogra que faria tudo conforme ela disse. É nítido até aqui que Noemi
voltou a ter esperança e a sonhar. Aquela Noemi amargurada do primeiro capítulo, que havia
despedido suas noras, agora ela mesma vai atrás de um marido, de descanso e alegria, para Rute.
Uma das características de uma pessoa amargurada e deprimida é a incapacidade de mover-se
com propósito e esperança para o futuro. E como é nítido isso na vida de muitos, falta de
esperança quanto ao futuro no Brasil, na vida profissional, na família, e isso os paralisa.
Aprendemos com Noemi, que após ela ter renovado sua esperança em Yahweh, ela age
sonhando. A esperança nos ajuda a pensar em formas de fazer o bem e agir. A esperança nos
ajuda a sonhar.

O PEDIDO DE RUTE

“Então ela desceu para a eira e fez tudo o que a sua sogra lhe tinha recomendado. Quando
Boaz terminou de comer e beber, ficou alegre e foi deitar-se perto do monte de grãos. Rute
aproximou-se sem ser notada, descobriu os pés dele, e deitou-se. No meio da noite, o
homem acordou de repente. Ele se virou e assustou-se ao ver uma mulher deitada a seus
pés.” Rute 3.6-8
Rute foi e agiu como Noemi lhe pediu. Ela entrou na eira, e quando Boaz já voltava alegre após
beber vinho, ele se deitou. Ela vai de mansinho, e se deita aos seus pés. Lá pela meia noite, ele
sente algo estranho, se assusta, se senta e vê que havia uma mulher deitada aos seus pés.
Que susto deve ter sido! Ele não a reconheceu, a ponto de perguntar: “Quem é você?” Rute
responde, porém, agindo um pouco diferente do que Noemi a havia instruído:
“...‘Sou sua serva Rute’, disse ela. ‘Estenda a sua capa sobre a sua serva, pois o senhor é
resgatador’” Rute 3.9
Rute, como uma mulher de caráter que era, não se aproveitou da situação, mas ela foi direta, a
ponto de não o deixar ditar o rumo da conversa. Ela não deixa espaço para más interpretações.
Ela estava ali dizendo: “Estou pronta para me casar, me resgate.”
Ela faz isso com humildade, pois primeiramente se chama de serva. E então pede para
que ele estenda sua capa sobre ela. “Estender a ponta da capa sobre a pessoa era símbolo de
compromisso para casar.”[29] A palavra capa é literalmente asas (‫ כנף‬kanaph).[30]
Rute havia se colocado debaixo das asas de Yahweh quando veio a Belém (2.12), agora ela
procura se colocar debaixo das asas de Boaz, pedindo que ele cumpra o seu papel de resgatador.
Ela está simplesmente pedindo que ele cumpra o que a lei o pede para fazer.
Procure pensar como o leitor daquela época estava neste momento. Ele poderia se lembrar de Ló
e suas filhas (Gn 19), ou de quando mulheres moabitas seduziram homens israelitas após
deixarem o Egito (Nm 25). Mas a atitude de Rute é digna de nota, ela humildemente pede para
que Boaz cumpra seu papel.
A atitude de Boaz, também é digna.
Emilio Garofalo diz:
“Ele enfrenta a tentação que certamente foi real! Estava escuro, não havia ninguém por
perto, o coração ia alegre com vinho, e ali estava uma mulher disposta a se casar. Trata-se
de um homem com as mesmas inclinações de todos os outros.”[31]

Porém, ele aproveita a situação para abençoá-la, “Deus lhe abençoe minha filha”, e diz
que o ato de bondade dela foi maior, pois ela poderia ir atrás de homens mais jovens, ricos ou
pobres. Rute foi atrás dele, um homem crente e que estava na posição bíblica adequada à
situação dela. Mesmo ele sendo mais velho.
Então ele diz:
“Agora, minha filha, não tenha medo; farei por você tudo o que me pedir. Todos os meus
concidadãos sabem que você é mulher virtuosa.” Rute 3.11
Boaz reconhece o quão virtuosa Rute é, e não somente ele reconhecia isso, mas todos os seus
concidadãos. Para se ter uma ideia, algumas organizações da Bíblia hebraica tem uma ordem
diferente de livros daquela a que estamos acostumados. Numa das organizações, o livro de
Provérbios vem antes de Rute. Pois você deve se lembrar que no final de Provérbios temos a
seguinte pergunta. “mulher virtuosa, quem a achara?” (Pv 31.10). Provérbios termina com uma
pergunta que é respondida em Rute, ela é uma mulher virtuosa!
Mais uma vez, imagine o leitor daquela época lendo sobre Rute, e como ela se tornou uma
mulher virtuosa. Rute não era da linhagem de Israel, vinha de um povo que não era bem-visto
por eles, por conta dos vários problemas que já causaram. Neste capítulo vemos quão poderosa é
a graça de Deus, agora todos os concidadãos de Belém a chamam de virtuosa.
Boaz também entende desta graça: sua mãe era uma cananeia que havia sido prostituta,
mas que se converteu ao Deus de Israel. E agora, mesmo ele sabendo do passado de Rute e de
sua origem, ele sabia que ela estava debaixo das asas de Yahweh, e que havia se tornado uma
mulher virtuosa.
Quantos homens e mulheres pensam: “meu passado é pesado, minha vida deixou muitas
marcas”. Sim, nós erramos. Muitas vezes, a vergonha e a culpa estão latentes dentro de nós.
Já outros têm preconceitos de seu próprio passado, ou do passado e origem de outros,
mas nada disso nos impede de sermos transformados pela graça de Deus em pessoas virtuosas. A
graça de Deus cobre tudo, trazendo nova vida, viva esperança, nos fazendo pessoas virtuosas.
“Portanto, se alguém está em Cristo, é nova criação. As coisas antigas já passaram; eis que
surgiram coisas novas!” 2 Coríntios 5.17

A PERSISTÊNCIA DE BOAZ

Boaz então diz:


“É verdade que sou resgatador, mas há um outro que é parente mais próximo do que eu.” Rute
3.12
Quando Rute vai até ele, ela está pedindo que eles se casem naquela noite, consumando o
casamento. Boaz não está pronto para fazer isso porque há um parente mais próximo que tem
prioridade.
Lembrando que “o resgatador era um parente próximo que poderia se casar, caso quisesse, com a
viúva e readquirir todos os bens do falecido.”[32] Está claro que Boaz queria resgatá-la, mas
obedecer à lei é ainda mais importante para ele.
Ele pede para que Rute passe a noite ali, que na manhã seguinte ele iria atrás deste parente para
resolver a situação, pois se ele quisesse poderia resgatá-la, se não, Boaz jura que se casaria com
Rute. (3.13)
Rute levantou-se ainda pela madrugada para não ser reconhecida por ninguém. (3.14). Algumas
coisas estavam em jogo, como a sua reputação e a de Boaz, além do mais, havia um outro
resgatador. Eles não fizeram nada de errado, mas Boaz toma o cuidado de evitar a aparência do
mal. Ele ainda lhe dá, seis medidas de cevada, algo em torno de 32 quilos.
Quando ela volta para casa, conta tudo para Noemi sobre como foi com Boaz, e ainda mostra as
seis medidas de cevada que ganhou.
“Ele me deu estas seis medidas de cevada, dizendo: ‘Não volte para a sua sogra de mãos
vazias’.” Rute 3.17
“Rute volta para casa com expectativas não realizadas, mas com a prova do amor leal de
Boaz, mantendo viva a esperança”,[33] tanto dela, como de Noemi.
Lembre-se, quando Noemi voltou a Belém, ela havia expressado sua amargura na alma,
pois havia partido de mãos cheias e voltado de mãos vazias. Agora quando Rute volta para casa,
novamente volta de mãos cheias, e Boaz pede para que mostre a Noemi. Esperança é o que
vemos aqui.
“Disse então Noemi: ‘Agora espere, minha filha, até saber o que acontecerá. Sem dúvida
aquele homem não descansará enquanto não resolver esta questão hoje mesmo.’” Rute
3.18

Noemi entendeu o recado de Boaz e tranquilizou o coração de Rute, Boaz estaria disposto a
enfrentar os riscos, até mesmo sociais, de se casar com Rute, uma moabita. O capítulo começa
com Noemi dizendo que buscaria descanso para Rute, e termina dizendo que Boaz não
descansaria enquanto não resolvesse aquela questão.

CONCLUSÃO
Quanta esperança e graça vimos neste capítulo! Quantos homens e mulheres pensam: “Meu
passado é pesado, minha vida deixou muitas marcas pesadas”. Quantas pessoas perderam a
esperança.
Uma das características de uma pessoa amargurada e deprimida é a incapacidade de
mover-se com propósito e esperança para o futuro. Mas nada disso nos impede de sermos
transformados pela graça de Deus em pessoas virtuosas.
A graça de Deus nos dá uma nova vida, e uma viva esperança. Como? Através do nosso
Resgatador. Boaz era o resgatador de Rute e o nosso Resgatador é Jesus Cristo.
Semelhantemente a habilitação de Boaz para resgatar Rute e a pessoa certa para isso,
somente Jesus é plenamente habilitado para nos resgatar:
“pois todos pecaram e estão destituídos da glória de Deus, sendo justificados
gratuitamente por sua graça, por meio da redenção que há em Cristo Jesus.” Romanos
3.23, 24

Jesus Cristo é o nosso Redentor, aquele que nos resgata e nos dá uma nova vida, uma viva
esperança. Assim como Boaz não descansaria até que tudo ficasse resolvido, Cristo não desiste
de nós, e nele finalmente podemos descansar.
Muitas vezes estamos desanimados com a situação da nossa igreja, país, cidade, casamento,
nossa própria vida cristã. Mas Cristo ainda está agindo e trabalhando.
“Estou convencido de que aquele que começou boa obra em vocês, vai completá-la até o dia de
Cristo Jesus.” Filipenses 1.6
Nós podemos descansar porque temos um resgatador que nunca desiste de nós.
CAPÍTULO 5

ESPERANÇA E RESGATE

Todos nós queremos ser lembrados por coisas boas que fizemos, também queremos deixar um
legado. Isso me faz lembrar de um homem de Deus que viveu no século XVIII deixando um
grande legado e, ainda hoje, é muito lembrado, Jonathan Edwards.
No início do século XX, um estudo traçou sua descendência e os resultados são impressionantes:
“trezentos ministros, missionários e professores de teologia; cento e vinte professores
universitários; cento e dez advogados; mais de sessenta médicos; mais de sessenta autores
de bons livros; trinta juízes; catorze reitores de universidades; numerosos gigantes da
indústria norte-americana; oitenta detentores de importantes cargos públicos; três
prefeitos de grandes cidades; três governadores de estados; três senadores; um capelão do
senado dos Estados Unidos; um fiscal da Fazenda e um vice-presidente dos Estados
Unidos. É difícil imaginar alguém que tenha contribuído de forma mais vital para a alma
dessa nação do que esse teólogo da Nova Inglaterra.”[34]

Jonathan Edwards morreu com 54 anos, e talvez ele não tivesse noção do tamanho do legado que
deixaria.
No ano de 2018, quando estive em um treinamento do ministério 9Marks em Washington, DC,
na igreja Batista do Capitólio, conheci um pastor presbiteriano chamado Jonathan. Para minha
surpresa, ele era da 13ª geração de Jonathan Edwards. Então, pude ver de perto o legado que este
homem deixou. Edwards, foi um homem que procurou viver uma vida para a glória de Deus.
Chegamos no capítulo final deste livro maravilhoso. No capítulo anterior, terminamos dizendo
que Boaz não descansaria enquanto não resolvesse sua questão com Rute.
Lembrando que ela foi até Boaz pedir para que o resgate fosse feito, ou seja, se casasse com ela,
e assim readquirisse as terras que pertenciam a Elimeleque e seus filhos.
Boaz era um homem muito competente e de valor extraordinário, ele queria resgatar Rute, mas
sabia que havia um parente mais próximo que poderia resgatá-la, portanto, ele não descansaria
enquanto não resolvesse esta questão.
Neste capítulo final, vamos ver como Boaz resolveu este imbróglio e como foi maravilhoso o
fechamento desta história.

O HOMEM SEM NOME

Boaz e o Fulano de tal

Boaz vai se encontrar com o outro possível resgatador:


“Enquanto isso, Boaz subiu à porta da cidade e sentou-se ali exatamente quando o
resgatador que ele havia mencionado estava passando por ali. Boaz chamou-lhe e disse:
‘Meu amigo, venha cá e sente-se.’ Ele foi e sentou-se. Boaz reuniu dez líderes da cidade e
disse: ‘Sentem-se aqui’. E eles se sentaram.” Rute 4.1, 2.

A porta da cidade era uma espécie de praça onde transações legais e comerciais aconteciam. Ali,
Boaz assentou-se exatamente quando o outro resgatador passaria, e então o chamou: “Meu
amigo, venha cá...”. É interessante que esta é uma expressão no hebraico de duas palavras (pelōnî
’almōnî) que significa mais ou menos “Fulano de Tal”.
Ele se aproximou e se assentou, mas “Boaz também reuniu um quórum de dez anciãos
como testemunhas oficiais”[35] daquele momento e passou a explicar:
“‘Noemi, que voltou de Moabe, está vendendo o pedaço de terra que pertencia ao nosso
irmão Elimeleque. Pensei que devia trazer o assunto para a sua consideração e sugerir-lhe
que o adquira, na presença destes que aqui estão sentados e na presença dos líderes do
meu povo. Se quer resgatar esta propriedade, resgate-a. Se não, diga-me, para que eu o
saiba. Pois ninguém tem esse direito, a não ser você; e depois eu’. ‘Eu a resgatarei’,
respondeu ele.” Rute 4.3, 4

Inicialmente o “Fulano” fica empolgado, pois de acordo com a lei, o resgatador readquiria a terra
como um arrendador, e mais tarde ele a devolveria para os descendentes do falecido. Porém, no
caso de Noemi, ela não tinha filhos e era impossível ela ter pela idade avançada. Dessa maneira,
assim que ela morresse, a terra ficaria com o “Fulano”. Por isso ele diz: “Eu a resgatarei”.
Contudo, Boaz tinha uma carta na manga e a usa.
“...No dia em que você adquirir as terras de Noemi e da moabita Rute, estará adquirindo
também a viúva do falecido, para manter o nome dele em sua herança.” Rute 4.5
Ou seja, agora pode não parecer tão vantajoso, pois, junto viria Rute, a moabita. Rute era nova, e
ainda poderia ter filhos, isso significa que eles iriam crescer e tomariam posse do campo.
Então, o resgatador responde:
“...Nesse caso não poderei resgatá-la, pois poria em risco a minha propriedade. Resgate-a você
mesmo. Eu não poderei fazê-lo!” Rute 4.6
O resgatador era um tipo de pessoa que se dava pelo bem dos outros. Se o “Fulano” resgatasse o
campo, não haveria retorno para ele mesmo, mas seria para preservar o nome dos falecidos.
Portanto, não seria algo pelo bem do seu nome, mas pelo bem de Rute, Noemi e os que viessem
depois.
Assim ele decide não as resgatar, pois colocaria em risco seus bens e seu legado. A ironia é que,
tentando manter seu nome não ajudando os outros, e não pondo em risco a sua propriedade, esse
homem nem sequer tem o nome mencionado nas Escrituras, apenas ficou conhecido como o
“Fulano de Tal”.

O contrato

Então, ali mesmo, foi feito um contrato formal e selado, conforme o costume da época.
“(Antigamente, em Israel, para que o resgate e a transferência de propriedade fossem
válidos, a pessoa tirava a sandália e a dava ao outro. Assim oficializavam os negócios em
Israel.) Quando, pois, o resgatador disse a Boaz: ‘Adquira-a você mesmo!’, ele também
tirou a sandália.” Rute 4.7, 8

Robert B. Chisholm explica:


“A sandália simbolizava o direito do proprietário de pisar na sua terra. A transferência da
sandália do proprietário para o comprador simbolizava a transferência desse direito.”[36]

Algo a se destacar aqui também, é que naquela sociedade a maioria das pessoas não sabiam ler e
escrever, dessa forma, contratos eram feitos de maneiras estranhas como essa, e com
testemunhas para comprovar o negócio.
Então, Boaz confirma o contrato dizendo:
“...Vocês hoje são testemunhas de que estou adquirindo de Noemi toda a propriedade de
Elimeleque, de Quiliom e de Malom. Também estou adquirindo o direito de ter como
mulher a moabita Rute, viúva de Malom, para manter o nome do falecido sobre a sua
herança e para que o seu nome não desapareça do meio da sua família ou dos registros da
cidade. Vocês hoje são testemunhas disso!” Rute 4.9-10

Desse momento em diante, não só as propriedades estavam sendo resgatadas, mas também Rute.
Reparem que com isso, o nome que seria preservado seria o de Malom. Boaz estava fazendo o
papel do resgatador, se doando para o bem de Rute, Noemi e para preservar o nome de Malon.
Por fim, os líderes confirmaram o contrato com três bênçãos.

Sobre Rute

“Faça o Senhor com essa mulher que está entrando em sua família, como fez com Raquel e
Lia, que juntas formaram as tribos de Israel” Rute 4.11

Aquelas pessoas estavam pedindo ao Senhor que desse a Rute um lugar ao lado dessas
mães do povo de Deus.

Sobre Boaz

“Seja poderoso em Efrata e ganhe fama em Belém!” Rute 4.11


Oraram também pela prosperidade e a reputação dele. Para que ele tivesse uma linhagem
renomada em Belém.

Bênção sobre a família como um todo

“E com os filhos que o Senhor lhe conceder dessa jovem, seja a sua família como a de Perez,
que Tamar deu a Judá!” Rute 4.12
Esta oração é para que a casa de Boaz e Rute seja tão honrosa e numerosa como a de Perez, filho
de Tamar e Judá, o ancestral do povo de Belém, de quem o Messias viria (Gn 49.10).
Quantas coisas o homem sem nome, o “Fulano”, rejeitou ao negar o resgate para Noemi e Rute.
Ao procurar proteger seu legado futuro, ironicamente, ele acabou permanecendo sem nome, e
ficando de fora de uma benção muito maior.
Assim como ele, nós também colocamos nossos interesses em primeiro lugar. Geralmente
pensamos em como as situações podem ser benéficas a nós mesmos e como podemos tirar
proveito das situações.
Isso vale para quando ajudamos o próximo, ou quando nos envolvemos com a igreja local.
Muitas vezes perguntamos: “O que eu vou ganhar com isso? Isso vai me satisfazer? Vou gostar?
Quanto vai me custar?”. Ao fazermos as contas, se vamos ou não nos envolver, deixamos Deus
completamente de fora da equação. Nós calculamos, nos protegemos, e podemos nunca saber as
bênçãos que perdemos.”[37]
Boaz é um retrato da graça de Deus. Ele era um doador gracioso e alegre, e estava se arriscando
se doando pelo bem de Rute e Noemi, e para manter o nome dos falecidos. Para isso, ele estava
se anulando, gastando dinheiro em um campo que não seria dele.
Que loucura! Entretanto, a sabedoria do Senhor opera com base num tipo de cálculo diferente da
sabedoria do mundo. Aquele que quis preservar seu nome nem sequer é lembrado, já Boaz, que
refletia o amor altruísta de Cristo, é mencionado nas Escrituras e está na linhagem de Jesus.
As pessoas, que mais marcaram a história de maneira positiva, foram aquelas que trabalharam de
maneira responsável, e que também se doaram em favor de outras pessoas.
Foi assim com Jesus. Ele veio, não se anulou em sua essência, mas se esvaziou e nos serviu, até a
morte, e morte de cruz. E a Palavra diz:
“Seja a atitude de vocês a mesma de Cristo Jesus, que, embora sendo Deus, não considerou
que o ser igual a Deus era algo a que devia apegar-se; mas esvaziou-se a si mesmo, vindo a
ser servo, tornando-se semelhante aos homens.” Filipenses 2.5-7

Cristo era Deus, contudo não se apegou à sua igualdade com Deus. Ele não pretendeu cobrar os
seus direitos enquanto Deus, pensou nos outros e se dedicou a isso.
Como gostaríamos de ser lembrados? Com quem minha vida se identifica hoje? Com a
do “Fulano” que pensava somente no momento, o “aqui e agora”, “eu preciso proteger o meu
legado”; ou como Boaz que refletiu a graça e o amor altruísta de Cristo.
UM CASAMENTO, UM NASCIMENTO E O RESGATE

O casamento

“Boaz casou-se com Rute, e ela se tornou sua mulher. Boaz a possuiu, e o Senhor concedeu que
ela engravidasse e desse à luz um filho.” Rute 4.13

Agora, legalmente, e da maneira correta, Boaz e Rute se casaram. Podemos ver dois destaques
neste versículo: o primeiro é que Rute, é chamada só pelo nome e não mais de “a moabita”,
mostrando que agora ela tinha um novo status, a esposa de Boaz; segundo, ela também
engravidou, reparem que o texto diz que “o Senhor concedeu que ela engravidasse”.
Ela ficou casada dez anos com Malom e não teve filhos, indicando assim, que Rute poderia ser
estéril, e agora, o Senhor “concedeu” (nathan = dar, conceder, pôr, colocar)[38] que ela
engravidasse.
Este filho foi uma dádiva de Deus:

O nascimento
“As mulheres disseram a Noemi: ‘Louvado seja o Senhor, que hoje não a deixou sem
resgatador! Que o seu nome seja celebrado em Israel! O menino lhe dará nova vida e a
sustentará na velhice, pois é filho da sua nora, que a ama e que lhe é melhor do que sete
filhos!’ Noemi pôs o menino no colo, e passou a cuidar dele.” Rute 4.14-16

Noemi não ficou sem um resgatador, consequentemente, ela teria uma nova vida. Reparem que
seu neto é que é chamado de seu resgatador.
Robert B. Chisholm Jr. Comentando sobre este texto diz:
“Quando ela ficasse velha, vulnerável e fraca demais para cuidar de suas próprias
necessidades básicas, a criança lhe proveria abrigo e alimento, assim como lhe traria
alegria e satisfação.”[39]
Noemi não teria seu marido e filhos de volta, naquela ocasião, ela tinha uma nora que todos
reconheciam como “melhor do que sete filhos”, um elogio impressionante no mundo antigo.
Ela também tinha um descendente para continuar a linhagem da família, e que cuidaria
dela. Esta criança resgatou não só a esperança de Noemi, como também sua dignidade. Reparem
que ela é novamente chamada de Noemi e não Mara, que significa amarga.
“As mulheres da vizinhança celebraram o seu nome e disseram: ‘Noemi tem um filho!’ e lhe
deram o nome de Obede. Este foi o pai de Jessé, pai de Davi.” Rute 4.17

No meio desta celebração, quando Noemi desfilava com o neto, as mulheres deram-lhe o nome
de “Obede”,[40] que significa “Servo do Senhor”. E o versículo termina dizendo: “Este foi o pai
de Jessé, pai de Davi.”
Lembre-se:

“Por trás de toda providência carrancuda, esconde-se uma face sorridente.”[41]


Noemi sai de mãos cheias em busca de algo melhor juntamente com seu marido Elimeleque e
seus filhos, mas eles morreram, deixando-a com suas duas noras. Então, ela volta com Rute,
contudo amargurada.
Porém, agora no final da narrativa bíblica, vemos Noemi com uma nova esperança, uma vida
renovada, com um resgatador, seu neto, com quem ela andava para todos os lados. Este neto
seria mais tarde o avô de Davi, o maior rei da história de Israel.
E, muito mais do que isso, ele não era só ascendência de Davi, mas os nomes de Boaz e Rute
estão na genealogia de Jesus no evangelho de Mateus 1.5, 6.
“Registro da genealogia de Jesus Cristo, filho de Davi, filho de Abraão: ... Salmom gerou
Boaz, cuja mãe foi Raabe; Boaz gerou Obede, cuja mãe foi Rute; Obede gerou Jessé; e
Jessé gerou o rei Davi. Davi gerou Salomão, cuja mãe tinha sido mulher de Urias.”
Algo a se entender aqui é que Noemi não sabia nada disso, nem de Davi e nem de Jesus.
A vida corria normalmente ali, era apenas um resgate que estava acontecendo, contudo, como já
dissemos, Boaz se entregou para que isso acontecesse.
Rute deu à luz um filho que seria o resgatador de Noemi, aquele que traria alegria e vida
tranquila na sua velhice. A alegria de Noemi foi restaurada. Deus tinha um plano muito maior.
Igualmente em nossas vidas, talvez você tenha perdido bens, cônjuge, filhos, saúde,
emprego, e pode ser que estas coisas nunca mais serão recuperadas, como no caso de Noemi.
Pode ser que você tenha perdido o foco, se tornando uma pessoa amargurada. Talvez Deus
permitiu que você chegasse aonde chegou para que você enxergasse o quanto precisa de resgate.
Caso contrário, você não enxergaria.
Deus, na história de Noemi e Rute, providenciou um resgatador. O impressionante é que
este resgatador aponta para aquele que é o nosso resgatador, Jesus Cristo.
Só ele pode nos dar uma nova esperança. A esperança de uma nova vida, uma vida digna.
Ele não promete devolver nada, mas ele é aquele que sustém e é o seu Bom Pastor. Aquele que
deu a sua própria vida por você. “Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a sua vida pelas
ovelhas.” João 10.11
O que você precisa fazer é: creia em Jesus como Senhor e Salvador da sua vida! “Se você
confessar com a sua boca que Jesus é Senhor e crer em seu coração que Deus o ressuscitou
dentre os mortos, será salvo.” Romanos 10.9
CONCLUSÃO

A história de Rute é apenas um pequeno ponto dentro da obra muito maior que Deus está
fazendo na história da redenção.
O livro começa com a fome em um tempo conturbado nos dias dos juízes, em que cada um fazia
o que achava certo aos seus olhos. Mas este livro nos mostra que Deus é soberano sobre a
história, mesmo em meio à fome e ao caos.
O que se passou no mundo, no Brasil e na sua vida, não pegou Deus de surpresa. Ele continua
dirigindo a história, sendo fiel e bondoso para com o seu povo, mesmo que não enxerguemos.
Esta é uma narrativa de esperança. Deus é soberano e direciona tudo para um propósito maior.
Ele ainda se importa conosco. O Senhor levanta amigos, como providenciou Rute para Noemi.
Ele nos dá um resgatador, assim como moveu Boaz. No nosso caso, ele enviou seu próprio Filho,
Jesus Cristo.
Este livro nos ensina que o evangelho é para todos, sem distinção. Rute, uma estrangeira
moabita, se torna a bisavó do maior rei da história de Israel, Davi. Ela entra na linhagem de
Jesus, sem que seja mencionado que ela era nora de Raabe, uma ex-prostituta cananita, que
também está na genealogia de Jesus.
Boaz era um retrato do amor gracioso de Deus, um tipo de Cristo. Ele nos ensina a nos doar pelo
bem dos outros, assim como Cristo se entregou por nós. Realmente, o livro de Rute nos traz
esperança e aponta para o nosso Redentor: Jesus Cristo.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

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PIPER, John. Doce e amarga providência: sexo, raça e a soberania de Deus. São Paulo: Hagnos,
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STRONG, J. (2002). Léxico Hebraico, Aramaico e Grego de Strong. Sociedade Bíblica do
Brasil.
[1] A COVID-19 é uma doença causada pelo coronavírus SARS-CoV-2, que apresenta um quadro clínico que varia de infecções
assintomáticas a quadros respiratórios graves. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a maioria dos pacientes
com COVID-19 (cerca de 80%) pode ser assintomática e cerca de 20% dos casos podem requerer atendimento hospitalar por
apresentarem dificuldade respiratória. Desses casos, aproximadamente 5% podem necessitar de suporte para o tratamento de
insuficiência respiratória (suporte ventilatório). Ver: https://coronavirus.saude.gov.br/sobre-a-doenca#o-que-e-covid
[2] Strong, J. (2002). Léxico Hebraico, Aramaico e Grego de Strong. Sociedade Bíblica do Brasil.
[3] Hubbard, R. L., Jr. (2003). Rute. (C. A. B. Marra, Org., H. H. G. Silva, Trad.) (1a edição, p. 45). São Paulo, SP: Editora
Cultura Cristã.
[4] MacArthur, John. Manual bíblico MacArthur (Locais do Kindle 2457-2459). Thomas Nelson Brasil. Edição do Kindle.
[5] PIPER, John. Doce e amarga providência: sexo, raça e a soberania de Deus. São Paulo: Hagnos, 2012. P. 21.
[6] NETO. Emilio Garofalo. As boas novas em Rute. Brasília, DF: Monergismo, 2018. P. 32.
[7] Hubbard, R. L., Jr. (2003). Rute. (C. A. B. Marra, Org., H. H. G. Silva, Trad.) (1a edição, p. 135). São Paulo, SP: Editora
Cultura Cristã.
[8] Na versão Almeida Revista e Atualizada.
[9] Duguid, Iain M. Estudos bíblicos expositivos em Ester e Rute. Editora Cultura Cristã. Edição do Kindle.
[10] NETO. Emilio Garofalo. As boas novas em Rute. Brasília, DF: Monergismo, 2018. P. 43.
[11] Strong, J. (2002). Léxico Hebraico, Aramaico e Grego de Strong. Sociedade Bíblica do Brasil.
[12] Barry, J. D., Mangum, D., Brown, D. R., Heiser, M. S., Custis, M., Ritzema, E., Bomar, D. (2012, 2016). Bíblia de Estudo
sobre a Vida na Fé (Rt 1.6). Bellingham, WA: Lexham Press.
[13] PIPER, John. Doce e amarga providência: sexo, raça e a soberania de Deus. São Paulo: Hagnos, 2012. P. 18.
[14] Noemi está sugerindo que a primeira responsabilidade das moças era de cada uma para com sua mãe, não para com a sogra.
[15] “bondade, benignidade, fidelidade”. Strong, J. (2002). Léxico Hebraico, Aramaico e Grego de Strong. Sociedade Bíblica do
Brasil.
[16] CUNDALL, Arthur E. Morris, Leon. Juízes e Rute: Introdução e comentário. São Paulo, SP. Mundo Cristão/Vida Nova,
1986. P.239.
[17] Hubbard, R. L., Jr. (2003). Rute. (C. A. B. Marra, Org., H. H. G. Silva, Trad.) (1a edição, p. 166). São Paulo, SP: Editora
Cultura Cristã.
[18] Robert L. Hubbard Jr., Rute, ed. Cláudio Antônio Batista Marra, trans. Helen Hope Gordon Silva, 1a edição., Comentários
do Antigo Testamento (São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2003), 168.
[19] PIPER, John. Doce e amarga providência: sexo, raça e a soberania de Deus. São Paulo: Hagnos, 2012. P. 26.
[20] Não sabemos o grau de parentesco. Alguns comentaristas preferem entender que aqui ele era um amigo chegado. Além do
mais, eles eram do mesmo clã, sendo provavelmente o clã dos Efrateus. (1.1).
[21] Duguid, Iain M. Estudos bíblicos expositivos em Ester e Rute. Editora Cultura Cristã. Edição do Kindle.
[22] NETO. Emilio Garofalo. As boas novas em Rute. Brasília, DF: Monergismo, 2018. P.82,83.
[23] Hubbard, R. L., Jr. (2003). Rute. (C. A. B. Marra, Org., H. H. G. Silva, Trad.) (1a edição, p. 200). São Paulo, SP: Editora
Cultura Cristã.
[24] Lusk, Rich. Sob suas asas: O evangelho segundo Rute. Editora Monergismo. Edição do Kindle.
[25] Alguns comentaristas entendem isso como uma pista de que talvez exista uma grande diferença de idade entre Boaz e Rute,
indicando que ela é uma mulher relativamente jovem, e ele é um homem mais velho, com uma grande propriedade. Lusk, Rich.
Sob suas asas: O evangelho segundo Rute. Editora Monergismo. Edição do Kindle.
[26] Duguid, Iain M. Estudos bíblicos expositivos em Ester e Rute. Editora Cultura Cristã. Edição do Kindle.
[27] Manowach = lugar de descanso, estado ou condição de descanso, lugar. Strong, J. (2002). Léxico Hebraico, Aramaico e
Grego de Strong. Sociedade Bíblica do Brasil.
[28] Lusk, Rich. Sob suas asas: O evangelho segundo Rute. Editora Monergismo. Edição do Kindle.
[29] NETO. Emilio Garofalo. As boas novas em Rute. Brasília, DF: Monergismo, 2018. P. 111.
[30] Strong, J. (2002). Léxico Hebraico, Aramaico e Grego de Strong. Sociedade Bíblica do Brasil.
[31] Ibidem, p. 118.
[32] Existiam mais funções, mas neste caso, seria o casamento e o readquirir os bens de Elimeleque.
[33] PINTO. Carlos Osvaldo. Foco e desenvolvimento do Antigo Testamento. São Paulo: Hagnos. P. 251.
[34] Lawson, Steven J. As Firmes Resoluções de Jonathan Edwards (Um Perfil de Homens Piedosos) (p. 17). Editora Fiel
(www.editorafiel.com.br). Edição do Kindle.
[35] Duguid, I. M. (2017). Ruth. In E. A. Blum & T. Wax (Orgs.), CSB Study Bible: Notes (p. 405). Nashville, TN: Holman Bible
Publishers.
[36] CHISHOLM JR., Robert B. A história de Rute. São Paulo: Cultura Cristã, 2016. P. 153.
[37] Duguid, Iain M. Estudos bíblicos expositivos em Ester e Rute. Editora Cultura Cristã. Edição do Kindle.
[38] Grisanti, M. A. (2011). ‫נתן‬. W. A. VanGemeren (Org.), Novo Dicionário Internacional de Teologia e Exegese do Antigo
Testamento (1a edição, Vol. 3, p. 1129). São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã.
[39] CHISHOLM JR., Robert B. A história de Rute. São Paulo: Cultura Cristã, 2016. P. 157.
[40] A short form of Obadiah, which means “Servant of the LORD.” - Duguid, I. M. (2017). Ruth. In E. A. Blum & T. Wax
(Orgs.), CSB Study Bible: Notes (p. 406). Nashville, TN: Holman Bible Publishers.
[41] PIPER, John. Doce e amarga providência: sexo, raça e a soberania de Deus. São Paulo: Hagnos, 2012. P. 18.

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