Ortónimo

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Português 12º ano

Fernando
Pessoa:
Ortónimo
Ana Beatriz Pinto
Ana Neves
Bruna Monteiro
Catarina Claudino
Filipa Ramos
Mariana Jesus
12ºM

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Introdução
Objetivos do Trabalho
O principal objetivo deste trabalho é reforçar aprendizagens anteriores sobre
Fernando Pessoa Ortónimo, consolidando os conhecimentos adquiridos ao
longo do estudo da sua obra. Através da análise de algumas das suas poesias
mais emblemáticas, pretende-se aprofundar a compreensão das temáticas
principais abordadas pelo poeta e o seu contributo único para a literatura
portuguesa e o Modernismo.

Relevância de Fernando Pessoa Ortónimo


Fernando Pessoa, enquanto Ortónimo, é um dos pilares do Modernismo em
Portugal, destacando-se pela sua capacidade de explorar os dilemas e
complexidades da condição humana. A sua poesia aborda de forma singular
questões existenciais, como a dor de pensar, a nostalgia pela infância, entre
outros. Este trabalho pretende realçar a importância desta faceta da obra de
Pessoa, essencial para entender a sua genialidade literária.

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Contextualização de
Pessoa
Vida e Obras
Fernando António Nogueira Pessoa nasceu em Lisboa, em 1888, e faleceu na
mesma cidade em 1935. Após a morte do pai, mudou-se com a mãe para
Durban, na África do Sul, onde viveu entre os 7 e os 17 anos. Lá, recebeu uma
educação inglesa que marcaria profundamente a sua escrita. Ao regressar a
Lisboa, iniciou o Curso Superior de Letras, que abandonou sem realizar
exames, preferindo estudar de forma autodidata na Biblioteca Nacional.

Pessoa ganhava a vida como tradutor e redator comercial, enquanto produzia


uma vasta obra literária em português, inglês e francês. Embora socialmente
reservado, foi uma figura central no Modernismo português, colaborando em
revistas literárias e criando movimentos como o “Interseccionismo” e o
“Sensacionismo”.

Durante a sua vida, publicou apenas cinco livros, apenas um é em português e


os restantes são opúsculos (pequenos livros) de poemas:

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Mensagem 35 Sonnets Antinous
1934 1918 1918

English Poems, I-II English Poems, III


1921 1921

O Modernismo em Portugal
O Modernismo em Portugal surge com a publicação da revista Orpheu em
1915, que se tornou um marco na literatura portuguesa. Com a participação de
autores como Fernando Pessoa, Mário de Sá Carneiro, Almada Negreiros e
outros, a Orpheu trouxe uma rutura radical com as convenções literárias
estabelecidas na época, características de uma sociedade portuguesa
conservadora.

A revista propôs uma nova forma de escrever, deixando de parte as normas


poéticas tradicionais, como a métrica e a sintaxe, adotando uma linguagem
mais direta e “provocadora”. No entanto, a reação da sociedade, entretanto,
não foi acolhedora, com críticos a considerarem o conteúdo uma “literatura
de manicómio” e os autores como “imbecis”. A publicação da revista foi curta
— com apenas dois números lançados, o terceiro não foi sequer impresso
devido à falta de financiamento. Apesar disso, a Orpheu foi considerada por
Almada Negreiros como “o primeiro grito moderno dado em Portugal”. A sua

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influência, embora não compreendida na altura, teria um impacto profundo
nos movimentos literários e artísticos subsequentes.

Em termos de características, o Modernismo português na altura guiava-se


por vários pontos centrais, como o questionamento das convenções literárias
tradicionais e a valorização da escrita quotidiana e coloquial, rompendo com a
norma culta. A escrita modernista, dinâmica e renovadora, refletia também as
transformações sociais e tecnológicas do momento. Este movimento tomou
inspiração de correntes europeias como o Expressionismo e o Futurismo,
sendo uma revolução estética e literária.

Embora de curta duração, o movimento modernista português deixou um


legado significativo, especialmente na geração que o seguiu, expandindo as
bases da literatura e da arte no país. Fernando Pessoa e seus companheiros
da Orpheu desempenharam papéis centrais na configuração desse novo olhar
sobre o mundo e a escrita, como parte de uma das vertentes do Modernismo,
o Orfismo.

Diferença entre Ortónimo e


Heterónimos
A principal diferença entre Ortónimo e Heterónimos está na identidade que
escreve:

●​ Ortónimo é o próprio autor, neste caso, Fernando Pessoa. Quando


escreve como Ortónimo, reflete as suas próprias ideias, sentimentos e
visões sobre o mundo, sendo uma expressão direta da sua
personalidade, apesar de muito introspectiva e filosófica. O Ortónimo é,
portanto, o nome real do autor, e os textos resultantes são
considerados uma forma de expressão direta do seu "eu".

●​ Heterónimos, por outro lado, são personagens criadas, neste caso, por
Pessoa, com biografias, personalidades e visões do mundo próprias.
Cada heterónimo tem uma voz única, com estilo, temperamento e
preocupações distintas. Alguns dos seus heterónimos mais famosos

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são Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos, que expressam
diferentes abordagens da realidade, seja de maneira mais simples e
natural (Caeiro), mais racional e estoica (Reis), ou mais emocional e
turbulenta (Campos).

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Temáticas e Estilo
do Ortónimo
Fingimento Artístico
O fingimento artístico é a forma como Fernando Pessoa constrói a sua arte
poética.
O sujeito concebe a sua poesia como a intelectualização de uma emoção. O
poema é, assim, o resultado da racionalização de um sentimento. O fingimento
poético é a transfiguração da emoção pela razão. Os poemas
"Autopsicografia" e "Isto" são considerados poemas de teorização poética ou
de doutrinação estética, em que se apresenta a teoria do fingimento poético.

Dor de Pensar
O sujeito tem a consciência de que existe um enorme fosso entre aquilo que
sente e o que pensa que sente. Dito de outro modo, o eu, no fazer poético,
está consciente do facto de não conseguir exprimir o que efetivamente sente.
Tal situação é concebida como uma
incapacidade que origina angústia.
Esta constatação leva o sujeito a desejar não pensar. Na verdade, a dor de
pensar resulta da obsessão do sujeito pela racionalização, pela análise, pela
abstração.
O sujeito tenta ultrapassar a dor de pensar desejando ser inconsciente e
apenas sentir. A partir da manifestação do desejo do sujeito de ser
inconsciente podemos inferir que o "eu" se debate entre a inconsciência e a

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consciência, entre o sentir e o pensar, numa tentativa de ultrapassar a
infelicidade e angústia originadas pelo pensar. Os poemas "Ela canta,
pobre ceifeira" e "Gato que brincas na rua" são textos que apresentam o
desejo do sujeito de ser inconsciente para poder atingir a felicidade.

Sonho e Realidade
A presentificação da realidade através do sonho torna a realidade tangível. Os
paraísos imaginados são, por isso, reconfortantes para os crédulos, no
entanto, o sujeito, cético e descrente, duvida da possibilidade de ser feliz
Assim, o ato de refletir sobre "imagens de felicidade" consciencializa o poeta
do seu caráter ilusório muito diferente da amarga realidade. Em suma, o sonho
é ilusão e a felicidade procurada é desilusão.

Nostalgia da Infância
Face à incapacidade de viver a vida, o "eu" refugia-se numa infância mítica,
idealizada, uma idade de inocência, em que ainda não se pensa e, por isso,
onde tudo é possível. Esta felicidade que as crianças experimentam, devido à
sua inconsciência e à inconsciência das suas ações, contrasta com a
infelicidade vivida pelo sujeito poético.
O sonho e a infância são os únicos momentos de felicidade para o sujeito
poético, que vê neles o paraíso perdido.

Linguagem e Estilo
A poesia ortónima versa temas complexos em poemas formalmente muito
simples, recorrendo a estruturas rítmicas tradicionais como a quadra ou a
quintilha e o verso de redondilha. Utiliza um léxico próximo do quotidiano e
símbolos facilmente reconhecíveis.
Neste sentido, considera-se que a poesia do ortónimo se aproxima do lirismo
tradicional português, conjugando estas características com as das
vanguardas modernistas.

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Análise de Poemas do
Ortónimo
"Autopsicografia"
O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,


Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda


Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

No contexto do "fingimento artístico" presente em "Autopsicografia", Fernando


Pessoa sugere que o poeta, ao criar, simula, ou "finge", as emoções que
exprime nas suas obras. Este fingimento é tão completo que o próprio poeta
acaba por acreditar nas emoções que está a criar, o que implica que o
processo criativo transforma os sentimentos em algo novo, distinto da
experiência real do autor.

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O fingimento artístico, portanto, não se refere a uma mentira no sentido
simples da palavra, mas a uma reinvenção ou construção da dor, das emoções
e da experiência humana. O poeta transforma as suas vivências em arte
através de uma poética que, embora nasça de algo verdadeiro e pessoal, é
moldada, trabalhada e transposta para o plano literário de modo a gerar novas
emoções, ideias e respostas no leitor. O poema torna-se um espaço onde a
"verdade" da dor ou da emoção já não é mais direta, mas recriada com a
imaginação e a habilidade artística.

Por isso, no "fingimento artístico", o poeta não só expressa o que sente, mas
também dá forma à dor ou a outros sentimentos, tornando-os em algo mais
complexo e universal, ao mesmo tempo que distorce a sua origem. Esta ideia
transforma o "fingir" numa representação artística da verdade, algo que não
está preso apenas à realidade, mas elevado pela imaginação criativa do poeta.

“Ela canta, pobre ceifeira,”


Ela canta, pobre ceifeira,
Julgando-se feliz talvez;
Canta, e ceifa, e a sua voz, cheia
De alegre e anónima viuvez,

Ondula como um canto de ave


No ar limpo como um limiar,
E há curvas no enredo suave
Do som que ela tem a cantar.

Ouvi-la alegra e entristece,


Na sua voz há o campo e a lida,
E canta como se tivesse
Mais razões para cantar que a vida.

Ah, canta, canta sem razão!

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O que em mim sente está pensando.
Derrama no meu coração
A tua incerta voz ondeando!

Ah, poder ser tu, sendo eu!


Ter a tua alegre inconsciência,
E a consciência disso! Ó céu!
Ó campo! Ó canção! A ciência

Pesa tanto e a vida é tão breve!


Entrai por mim dentro! Tornai
Minha alma a vossa sombra leve!
Depois, levando-me, passai!

"Ela canta, pobre ceifeira," é uma reflexão sobre a dor intelectual, a


complexidade da consciência e o peso que o pensamento profundo pode
trazer para o ser humano. A dor do pensar remete para o sofrimento que
surge da reflexão constante sobre a vida, as questões existenciais, o
significado da existência e o futuro, que, por muitas vezes, é incontornável e
intrínseco à experiência humana.

No poema de Pessoa, a personagem enfrenta a angústia de estar consciente,


de perceber a transitoriedade da vida, o sofrimento intrínseco à condição
humana e, ainda assim, ser incapaz de escapar a esse dilema. O pensamento
racional e a introspecção, em vez de proporcionarem alívio ou sabedoria,
podem ser uma carga, criando um espaço de sofrimento e inquietação, onde
a mente não encontra descanso.

No entanto, apesar da dor de pensar, o poeta reconhece também que a


reflexão e a consciência são, de algum modo, essenciais para a experiência
humana. A introspeção permite a compreensão da vida, mas é também uma
causa de sofrimento, trazendo consigo a incapacidade de viver como a
ceifeira – em sua inconsciente e serena felicidade. Ela representa a vida
simples, que se alheia dessas questões mais pesadas da existência.

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Portanto, a dor de pensar não é apenas um sofrimento, mas também um
retrato da condição humana, uma condição pela qual nos distanciamos da
pureza da experiência direta, mas ao mesmo tempo adquirimos um sentido
de profundidade e de capacidade crítica.

"Ó sino da minha aldeia,"


Ó sino da minha aldeia,
Dolente na tarde calma,
Cada tua badalada
Soa dentro da minha alma.

E é tão lento o teu soar,


Tão como triste da vida,
Que já a primeira pancada
Tem o som de repetida.

Por mais que me tanjas perto


Quando passo, sempre errante,
És para mim como um sonho.
Soas-me na alma distante.

A cada pancada tua


Vibrante no céu aberto,
Sinto mais longe o passado,
Sinto a saudade mais perto.

Neste poema de Fernando Pessoa, a nostalgia da infância surge através da


memória evocada pelo som do sino da aldeia. O sino, que faz ecoar "dolente"
na calma da tarde, torna-se um símbolo da relação do eu lírico com o passado
e com a infância. A “dolência” do som remete para um sentimento de perda e
saudade, comuns à infância, uma fase marcada pela perceção sensível e pela
conexão profunda com o ambiente ao redor.

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O sino parece ser um mediador entre o passado infantil e o presente, onde o
eu lírico, ao escutar seu som, revê o que ficou para trás. A comparação do
som com a "primeira pancada" da vida, repetitiva e carregada de tristeza,
sugere que o eco da infância nunca se desvanece completamente,
tornando-se um lembrete da inocência e do que foi deixado para trás. Ao
mesmo tempo, esse som traz uma sensação de afastamento, como se a
infância, por mais que presente nas memórias, ficasse cada vez mais distante
à medida que o eu lírico cresce.

Ao longo do poema, o sino, ainda que muito próximo fisicamente, parece


representar algo inalcançável, um sonho distante, como a própria infância que,
por mais que esteja marcada na memória, nunca pode ser completamente
recuperada. O tema da nostalgia da infância no poema é reforçado por essa
ideia de saudade e de algo que se perde no tempo, o que é comum nas
reflexões que surgem quando se tenta recuperar o vínculo com o passado.

Em resumo, o poema de Pessoa é uma profunda expressão de como as


memórias da infância e a saudade se entrelaçam, e como o som do sino se
torna um veículo para essa reflexão, revivendo emoções e sentimentos que,
embora distantes, continuam a ressoar no presente.

“Não sei se é sonho, se realidade,”


Não sei se é sonho, se realidade,
Se uma mistura de sonho e vida,
Aquela terra de suavidade
Que na ilha extrema do sul se olvida.

É a que ansiamos. Ali, ali


A vida é jovem e o amor sorri
Talvez palmares inexistentes,
Áleas longínquas sem poder ser,

Sombra ou sossego dêem aos crentes

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De que essa terra se pode ter
Felizes, nós? Ali, talvez, talvez,
Naquela terra, daquela vez,

Mas já sonhada se desvirtua,


Só de pensá-la cansou pensar;
Sob os palmares, à luz da lua,
Sente-se o frio de haver luar
Ah, nesta terra também, também
O mal não cessa, não dura o bem.

Não é com ilhas do fim do mundo,


Nem com palmares de sonho ou não,
Que cura a alma seu mal profundo,
Que o bem nos entra no coração.
É em nós que é tudo. É ali, ali,
Que a vida é jovem e o amor sorri.

O poema "Não sei se é sonho, se realidade" aborda o conflito entre sonho e


realidade, explorando o desejo humano por uma terra ideal que represente
felicidade e perfeição. Inicialmente, o sonho é visto como um refúgio para
escapar da imperfeição da realidade, mas rapidamente se desvirtua,
revelando a efemeridade das aspirações idealizadas. A realidade, por sua vez,
é retratada como marcada pelo sofrimento e pela impermanência do bem. No
desfecho, o poeta conclui que a verdadeira felicidade não se encontra em
cenários externos ou imaginários, mas dentro de cada indivíduo, enfatizando a
importância da introspeção e do equilíbrio interior.

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Conclusão
Fernando Pessoa, enquanto Ortónimo, oferece-nos uma visão profundamente
reflexiva e complexa sobre a condição humana, abordando temáticas como o
fingimento artístico, a dor de pensar, o confronto entre sonho e realidade e a
nostalgia da infância. Através da sua escrita, ele explora questões existenciais
universais, de uma forma que continua a ressoar com leitores de todas as
gerações.

Ao longo deste trabalho, tivemos a oportunidade de mergulhar nas suas


palavras e compreender melhor a importância do seu contributo para a
literatura portuguesa e para o Modernismo.

No final, percebemos que a genialidade de Pessoa reside na sua capacidade


de traduzir a complexidade do ser humano em palavras e de desafiar as
convenções do seu tempo. Este estudo reforçou não só os nossos
conhecimentos sobre a sua obra, mas também a sua relevância intemporal no
contexto da literatura mundial.

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Bibliografia
Bibliografia

●​ Areal Editores. Págin@s 12. Porto: Areal Editores, 2023.


●​ Areal Editores. Preparar o Exame Nacional de Português - 12.º Ano. Porto:
Areal Editores, 2023.
●​ Arquivo Pessoa. "Obra Completa de Fernando Pessoa." Disponível em:
○​ http://arquivopessoa.net/textos/63
○​ http://arquivopessoa.net/textos/2429
○​ http://arquivopessoa.net/textos/4234
○​ http://arquivopessoa.net/textos/206
●​ Infopedia. "Modernismo." Disponível em:​
https://www.infopedia.pt/artigos/$modernismo
●​ Stoodi Blog. "Modernismo em Portugal." Disponível em:​
https://blog.stoodi.com.br/blog/portugues/modernismo-em-portugal/#Cara
cteristicas_do_Modernismo_em_Portugal
●​ Casa Fernando Pessoa. "Fernando Pessoa – Obra." Disponível em:​
https://www.casafernandopessoa.pt/pt/fernando-pessoa/obra/fernando-pes
soa

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