gmcmachado,+415-1-821-3-10-20181003
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Dallys Dantas
RESUMO
Estado é um dos conceitos centrais da obra do pensador italiano Antônio Gramsci. A
centralidade deste conceito no pensamento gramsciano expressa a própria perspectiva
analítica do autor: a análise política dos fatos e processos. Associados a ele estão outros
igualmente fundamentais, quais sejam, sociedade civil, sociedade política e hegemonia.
Por isso, o objetivo deste artigo é contribuir para a compreensão do conceito de Estado
em Gramsci a partir de suas análises sobre a questão meridional. A metodologia
empregada baseou-se em revisão bibliográfica dos principais textos do autor
relacionados ao tema. São eles: A questão meridional (1987) e Cadernos do Cárcere
(1999; 2000a; 2000b; 2002). Constatou-se a relevância do conceito para o entendimento
das questões políticas na Itália entre o final do século XIX e início do século XX, a
exemplo do Risorgimento e da questão meridional, e também sua ampliação em função
das reformulações teóricas do autor durante o cárcere. Conclui-se, portanto, que o
conceito gramsciano de Estado constitui um significativo instrumental teórico para se
pensar as relações políticas de uma sociedade, tendo sempre em vista – importa salientar
– o contexto espacial e histórico em que se desenvolvem.
Palavras-chave: Questão meridional, sociedade civil, sociedade política, Estado.
ABSTRACT
State is one of the concepts central offices of the workmanship of the Italian thinker
Antonio Gramsci. The centralidade of this concept in the express gramsciano thought
the proper analytical perspective of the author: the analysis politics of the facts and
processes. Associates it are equally basic others, which are, civil society, society politics
and hegemony. Therefore, the objective of this article is to contribute for the
understanding of the concept of State in Gramsci from its analyses on the southern
question. The employed methodology was based on bibliographical revision of the main
related texts of the author to the subject. They are they: The Southern Question (1987)
and Prison Notebooks (1999; 2000a; 2000b; 2002). It was evidenced relevance of the
concept for the agreement of the questions politics in Italy enters the end of century
XIX and beginning of century XX, the example of the Risorgimento and the southern
question, and also its magnifying in function of the theoretical reformularizations of the
author during the jail. It is always concluded, therefore, that the gramsciano concept of
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if they develop.
Keywords: Southern question. civil society, politics society, State.
Revista Desenvolvimento Social No 23/01, 2018. (ISSN 2179-6807)
REVISTA DESENVOLVIMENTO SOCIAL
Universidade Estadual de Montes Claros
INTRODUÇÃO
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Expressão utilizada para se referir à porção meridional da Itália.
através desta cultura fez com que fossem absorvidos pela burguesia nacional”. Para
Página
2
Entre os grandes intelectuais estava Benedetto Croce, um dos mais prestigiados filósofos da Itália à
época e com quem Gramsci travou um profundo embate intelectual.
Gramsci (1978), portanto, o bloco intelectual funcionava como uma armadura flexível e
resistente no bloco agrário.
A interpretação de Gramsci sobre a questão meridional não se limitava a um
ponto de vista meramente econômico (ou economicista). Tratava-se, porém, de uma
análise política da formação histórica e da estrutura socioeconômica do Mezzogiorno.
Por isso defendia a importância de se considerar o papel das classes operária e
camponesa, dos intelectuais e do Estado nessa questão (GRAMSCI, 1978). Para o autor,
a grande questão era reconhecer a situação meridional não como um problema de atraso
econômico, porém como resultado de forças políticas cuja hegemonia era exercida pela
classe burguesa do Norte em articulação com os intelectuais e latifundiários do Sul.
Diferentemente do que ocorrera em outros países europeus, na Itália
praticamente não houve a luta entre as duas principais classes dominantes – capitalistas
e latifundiários – para a constituição do Estado moderno liberal (GRAMSCI, 2004a).
Na verdade, defende Gramsci (2004a), a luta ocorreu de forma equívoca, manifestando-
se como subordinação (burocrática e plutocrática) das regiões central e meridional à
região setentrional. O autor aponta que, até o final do século XIX, a aliança dos
capitalistas do Norte com os latifundiários do Sul sufocou tanto a luta de classes do
proletariado industrial e quanto as explosões do campesinato sulista. A partir de 1900,
contudo, “tornou-se evidente que, a longo prazo, esta aliança subverteria a situação,
entregando o poder de Estado aos latifundiários e fazendo com que o Norte perdesse as
posições de privilégio que conquistara com a unidade nacional” (GRASMCI, 2004a, p.
107). Para tentar reverter a situação, assinala Gramsci (2004a), a burguesia setentrional
apostou na aliança com o proletariado urbano, criando, assim, uma base na qual poderia
desenvolver sua democracia parlamentar.
Nesse contexto, a questão meridional emergia como um dos problemas
essenciais da agenda política do proletariado revolucionário (GRAMSCI, 2004a). O que
estava em foco era a compreensão dos desafios a serem superados para a formação de
uma "classe nacional", dirigida pelos operários com apoio dos camponeses, e a
construção da hegemonia do proletariado. A estratégia para superar esses desafios e, por
conseguinte, construir a hegemonia do proletariado, residia na aliança entre os operários
do Norte e os camponeses do Sul. Desse modo, sustenta Gramsci (1978),
o proletariado pode se tornar uma classe dirigente e dominante na medida em
que consegue criar um sistema de alianças de classes que lhe permita
mobilizar contra o capitalismo e o Estado burguês e a maioria da população
trabalhadora – o que significa, na Itália, dadas as reais relações de classes
existentes, que o proletariado pode se tornar classe dirigente e dominante na
medida em que consegue obter o consenso das amplas massas camponesas
(GRAMSCI, 1978, p. 139, grifo nosso).
exemplo da escola e dos jornais, a ideia do Sul como a “bola de chumbo” do Norte – tal
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como mencionado anteriormente. Ideologia esta que, segundo o autor, teve como um de
seus principais veículos o Partido Socialista Italiano (PSI). O fato é que essa concepção,
produtiva das classes sociais não pode ser aplicada mecanicamente à interpretação da
história italiana e europeia”. Para o autor, embora fosse certo que o Estado pudesse ser
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Percebe-se, nesse caso, a atenção que Gramsci dedica aos intelectuais em sua
relação com o Estado. Embora seja amplamente conhecida a centralidade dos estudos
sobre os intelectuais no pensamento gramsciano e que não é o objetivo deste artigo
aprofundar especificamente nesse tema, é preciso ressaltar, todavia, a relevância do
intelectual na formulação do conceito gramsciano de Estado.
Em uma carta enviada a sua cunhada Tatiana, datada de 7 de setembro de 1931,
Gramsci destaca sua preocupação com o projeto de estudo sobre os intelectuais e as suas
implicações sobre o conceito de Estado. Escreve o autor:
Este estudo também leva a certas determinações do conceito de Estado, que,
habitualmente, é entendido como sociedade política (ou ditadura, ou aparelho
coercitivo, para moldar a massa popular segundo o tipo de produção e a
economia de um dado momento) e não como um equilíbrio da sociedade
política com a sociedade civil (ou hegemonia de um grupo social sobre toda a
sociedade nacional, exercida através das organizações ditas privadas, como a
igreja, os sindicatos, as escolas, etc.) e é especialmente na sociedade civil que
operam os intelectuais (GRAMSCI, 2005, p. 84).
exercido principalmente pelos intelectuais). Esta, por sua vez, tornar-se-ia mais eficaz e
resistente à medida em que se que relacionasse com a sociedade política, pois, ao
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representava o elemento organizativo capaz de, por meio do Estado integral, concluir,
de fato, o processo de unificação italiana.
Por esta razão Gramsci (2000b) parte de O Príncipe, de Nicolau Maquiavel,
para demonstrar o fundamento teórico do Estado em sentido orgânico e mais amplo. De
acordo com Gramsci (2000b), o grande mérito do “Príncipe” é que este representava
fundamentalmente o símbolo da vontade coletiva italiana no século XV – período em
que o livro foi escrito –, período este marcado pela instabilidade político-administrativa
da Itália, cuja implicação eminente era sua fragilidade territorial. Desse modo, o autor
afirma que, em linguagem política moderna, o “Príncipe” poderia ser traduzido como
chefe de Estado, chefe de Governo ou partido político. Na realidade de qualquer Estado,
assinala Gramsci (2000b, p. 222), “o elemento equilibrador dos diversos interesses em
luta contra o interesse predominante, mas não exclusivista em sentido absoluto, é
exatamente o partido político”.
Gramsci (2000b) pontua ainda que essa função equilibradora do partido político
não significa que ele reina ou governa juridicamente, mas sim que tem o poder de fato.
Isto quer dizer, segundo o autor, que o partido exerce a função hegemônica na sociedade
civil de tal modo que, estando esta entrelaçada à sociedade política, todos os cidadãos
sentem que ele reina ou governa. Desse modo, Gramsci (2000b) aponta para a
possibilidade de criação de um sistema de princípios no qual a finalidade do Estado
seria “o seu próprio fim, seu próprio desaparecimento, isto é, a reabsorção da sociedade
política na sociedade civil (GRAMSCI, 2000b, p. 223). Nesse sentido, portanto, o
Estado integral poderia ser superado.
De acordo com Gramsci (2000b), ao Estado integral sucederia a sociedade
regulada: uma fase em que a sociedade política estaria dissolvida na sociedade civil,
caracterizando, portanto, o fim do Estado enquanto tal. Para demonstrar essa
potencialidade transitória do Estado integral, o autor faz referência, de modo
comparativo, à concepção liberal de Estado gendarme ou guarda-noturno. Este
representaria uma espécie de tutor do processo transitório que, paradoxalmente,
culminaria no fim do Estado. Desse modo, aponta Gramsci (2000b), a passagem do
Estado para a sociedade regulada,
a uma fase em que "Estado será igual a Governo, e Estado se identificará com
sociedade civil, dever-se-á passar a uma fase de Estado guarda-noturno, isto
é, de uma organização coercitiva que protegerá o desenvolvimento dos
elementos de sociedade regulada em contínuo incremento e que, portanto,
reduzirá gradualmente suas intervenções autoritárias e coativas (GRAMSCI,
2000b, p. 245).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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