Este trabalho tem como objetivo se debruçar sobre os Princípios da Motivação Maximizad... more Este trabalho tem como objetivo se debruçar sobre os Princípios da Motivação Maximizada e da Não Sinonímia (GOLDBERG, 1995) a partir da descrição e da análise das construções gramaticais “se fazer de X” e “dar uma de X”. Para tanto, este estudo parte de um viés funcionalista, tendo como aporte teórico principal os estudos relacionados à Gramática de Construções Baseada no Uso (HOFFMANN, 2022; AUTOR; PEREK, 2015; GOLDBERG, 2006). Para descrição e análise do objeto, lançamos mão dos corpora Corpus do Português e Corpus Brasileiro, de forma que tivéssemos acesso a dados reais de uso. Esta pesquisa, portanto, dados seu arcabouço teórico e sua metodologia, visa contribuir com os estudos das expressões idiomáticas do português brasileiro, bem como com o campo da Gramática de Construções Baseada no Uso.
Resumo: Este artigo busca descrever duas construções idiomáticas com VÊ/VEJA SE S (ilustradas por... more Resumo: Este artigo busca descrever duas construções idiomáticas com VÊ/VEJA SE S (ilustradas por enunciados como "Vê se me devolve meu livro" e "Veja se meio-dia é hora de acordar") no português brasileiro contemporâneo, tomando como base o arcabouço teórico da Gramática de Construções Baseada no Uso. Do ponto de vista metodológico, recorremos a uma análise quantitativa e qualitativo-interpretativa de dados extraídos do Corpus do Português. Em síntese, o que os dados demonstram é que essas construções idiomáticas são especializadas, respectivamente, na função de dirigir uma repreensão preventiva ao interlocutor e buscar a corroboração do interlocutor. Mais especificamente, a primeira construção expressa um comando para a realização de uma ação que, sob a perspectiva do falante, o interlocutor já sabia que deveria realizar. Já a segunda é usada para convidar o interlocutor a corroborar uma posição de discordância em relação a uma crença atribuída a um dado Sujeito de Consciência. A partir dessa análise, foi possível postular, ainda, a existência de uma construção mais abstrata que, do ponto de vista da forma, exibe a sequência VÊ/VEJA SE S e, do ponto de vista do significado, preserva a semântica de avaliação negativa.
Propõe-se que os adjetivos adverbiais (AAs) do português brasileiro podem ser agrupados em oito c... more Propõe-se que os adjetivos adverbiais (AAs) do português brasileiro podem ser agrupados em oito classes semânticas, que correspondem a construções gramaticais de nível intermediário. Neste estudo, verificamos a realidade psicológica dessa proposta por meio de experimento de julgamento de proximidade semântica. Os dados foram analisados por meio de Escalonamento Multidimensional, técnica que permite gerar representações de clusters de exemplares em duas e três dimensões. A representação em 2D revelou a existência de cinco (meso)construções de adjetivo adverbial, ao passo que a representação em 3D indica a postulações de sete (meso)construções. As representações geradas revelaram a distribuição de diferentes microconstruções de adjetivos adverbiais e fornecem evidências a favor da existência de classes semânticas específicas para a Construção de Adjetivo Adverbial mais geral. Palavras-chave: adjetivo adverbial; semântica; gramática de construções.
O português brasileiro apresenta pelo menos duas construções distintas de modificação ... more O português brasileiro apresenta pelo menos duas construções distintas de modificação verbal: a Construção de Advérbio Canônico (CAC; por exemplo, Pedro falou rapidamente), e a Construção de Adjetivo Adverbial (CAA; por exemplo, Pedro falou rápido). Virgínio et al. (2021) defende a existência de uma diferença discursivo-pragmática entre os dois padrões; argumenta-se que a CAA, mas não a CAC, exige que o modificador verbal seja o elemento mais informativo (foco primário) do enunciado. Neste artigo verifica-se se essa mesma restrição atua no sentido de reduzir a produtividade da CAA do inglês norte-americano (evidenciada em usos como speak slow, por exemplo). Para isso, foi desenvolvido um experimento offline de julgamento de aceitabilidade no qual 28 falantes nativos do inglês norte-americano julgaram sentenças com adjetivos adverbiais (AAs) e sentenças com advérbios canônicos em quatro condições, baseadas em uma combinação de frequência e foco. Os resultados comprovaram que existe diferença significativa na aceitabilidade de enunciados contendo AAs nas condições de foco primário e não-primário (p = 0.003), fornecendo evidências em favor da hipótese de que a CAC do inglês norte-americano também é sensível a fatores discursivo-pragmáticos. No entanto, foi constatado efeito significativo de foco com advérbios canônicos (p = 0.037). Apesar dessa afinidade discursivo-pragmática entre os dois tipos de modificadores verbais, o cálculo de intensidade do efeito apontou efeito moderado de foco para AAs e efeito fraco para advérbios canônicos. No artigo, faz-se uma proposta sistemática de representação da rede construcional da modificação verbal do inglês norte-americano com base nos resultados experimentais obtidos.
Este estudo visa investigar um padrão idiomático existente em algumas variedades do português bra... more Este estudo visa investigar um padrão idiomático existente em algumas variedades do português brasileiro identificado pelo item bem. Exemplos do seu uso são frases como “Eu bem vendi o colar que ela gostou” e “Meu nariz bem sangrou”, em que os valores canônicos associados a essa palavra, como os de modo, intensidade ou precisão, não são identificados; e cujo significado não é autoevidente. Diante de dados desse padrão, questiona-se: haveria um valor semântico-pragmático estável em todos os seus usos? Se sim, qual seria ele? À luz da Gramática de Construções Baseada no Uso, defendemos que todos os usos análogos a esses são instâncias de uma construção gramatical, denominada aqui Construção de Contraexpectativa com Bem (CCB). Sob um viés exploratório, foi realizada uma análise qualitativo-interpretativa a partir de dados retirados de corpora com o objetivo de formular uma hipótese acerca do conteúdo semântico-pragmático dessa construção. Defendemos que ela é responsável por marcar a noção de contraexpectativa, se configurando, gramaticalmente, como um disparador de pressuposição negativa. Em uma perspectiva confirmatória, para testar esta hipótese, foi realizado um experimento psicolinguístico off-line de paradigma de escolha forçada, comparando enunciados com e sem a construção, cujos resultados fornecem evidências significativas em favor da proposta formulada.
Em ciência, modelos são normalmente entendidos como representações simplificadas de um sistema. E... more Em ciência, modelos são normalmente entendidos como representações simplificadas de um sistema. Em outras palavras, trata-se de um conjunto de elementos e princípios que busca capturar, de forma sistemática, a estrutura e o funcionamento de algum fenômeno empírico complexo, a fim de permitir sua investigação detalhada (BÖRNER et al., 2012). Sob essa ótica, a Gramática de Construções (GC) deve ser entendida como um modelo que busca representar, especificamente, a porção da realidade empíricaisto é, o sistemaa que nos referimos normalmente como conhecimento linguístico do falante 4. A ideia aqui, portanto, é bastante simples. Dado que o falante inegavelmente dispõe de um conhecimento inconsciente que permite a ele produzir uma quantidade infinita de sentenças bem-formadas (ao mesmo tempo em que o impede de produzir sentenças malformadas), a pergunta que se coloca é: que elementos compõem esse conhecimento e que princípios o regulam? De maneira didática, a resposta oferecida pela GC pode ser reduzida a três princípios básicos:
Resumo: Este artigo busca investigar a atuação do coverage morfofonológico sobre a extensibilidad... more Resumo: Este artigo busca investigar a atuação do coverage morfofonológico sobre a extensibilidade de construções gramaticais para novos usos. Em poucas palavras, o coverage é entendido como o espaço categorial que inclui os usos já atestados para uma dada construção e os usos inovadores. Tomamos como ponto de partida o estudo de Suttle e Goldberg (2011), que atesta a relevância do coverage semântico pela combinação de efeitos de frequência de tipo e de variabilidade e similaridade semânticas. Neste estudo, porém, buscamos investigar se ocorre efeito de "coverage" associado às propriedades morfofonológicas dos itens. Para isso, desenvolvemos uma adaptação do experimento original, na qual foram incluídos verbos pertencentes às três conjugações verbais do português. Em síntese, o que os resultados demonstram é que, assim como o coverage semântico, também o coverage morfofonológico parece afetar a produtividade construcional.
Este trabalho enfoca o uso de aspas em manchetes jornalísticas do português brasileir... more Este trabalho enfoca o uso de aspas em manchetes jornalísticas do português brasileiro, sob a perspectiva teórica da Linguística Cognitiva e, mais especificamente, da Teoria dos Espaços Mentais (FAUCONNIER, 1994, 1997; FAUCONNIER; TURNER, 2002). Com base no primitivo discursivo de Ponto de Vista (CUTRER, 1994; FAUCONNIER; SWEETSER, 1996; DANCYGIER; SWEETSER, 2012), propõe-se uma explicação unificada para o fenômeno, sob o argumento de que o uso de aspas indica mudança de Ponto de Vista na rede de espaços mentais estabelecida à medida que o discurso se desenvolve. Em particular, a análise evidencia que o uso de aspas para indicar deslocamento de Ponto de Vista pode ocorrer em dois contextos principais nas manchetes: (i) do espaço Base/Ground para um espaço de discurso reportado (discurso direto ou discurso direto parcial); (i) do espaço Base/Ground para o Espaço Metalinguístico, que constitui um espaço mais implícito na Rede de Espaços Comunicativos Básicos (BCSN), no caso de processos metafóricos e/ou metonímicos.
Este artigo busca delinear a trajetória diacrônica de uma construção idiomática com VÊ/VEJA SE S ... more Este artigo busca delinear a trajetória diacrônica de uma construção idiomática com VÊ/VEJA SE S (como em “Vê se me liga” e “Vê se não se atrasa”) no português brasileiro. Tomando como base o arcabouço teórico da Gramática de Construções Baseada no Uso e o modelo de mudança proposto por Traugott e Trousdale (2013), buscamos fornecer explicações acerca do surgimento dessa construção na língua. Do ponto de vista metodológico, recorremos a uma análise quantitativa e qualitativo-interpretativa de dados extraídos do Corpus do Português. Em síntese, o que os resultados demonstram é que essa construção idiomática, especializada na função de dirigir uma cobrança ao interlocutor, surge no século XIX a partir de um mecanismo de neoanálise de construtos de uma construção de imperativo com complemento oracional.
Resumo: No português brasileiro, há uma construção idiomática particular identificada pela sequên... more Resumo: No português brasileiro, há uma construção idiomática particular identificada pela sequência "bem que". Exemplos do seu uso são frases como "Bem que minha mãe avisou que ia chover" e "Bem que eu queria ganhar na loteria". A proposta desse trabalho é investigar esse fenômeno sob a luz da Gramática de Construções Baseada no Uso (BYBEE, 2010; GOLDBERG, 2006). Adotando essa perspectiva, propomos que todos os usos analisados da sequência "bem que" são instâncias de uma construção mais abstrata, a Construção Bem Que S. Especificamente, neste artigo, propomos que ela seja identificada, formalmente, pela sequência [bem que [sentença]] e, no polo semântico-pragmático, pela presença do valor de rejeição de proposição. Nesse sentido, defendemos que se trata de uma construção de intersubjetividade, já que atua no gerenciamento de informações intersujeito. A partir de uma análise qualitativo-interpretativa de dados retirados do Twitter, procuramos relacionar, detalhadamente, os usos dessa construção com as generalizações propostas. Palavras-chave idiomaticidade; construção gramatical; pragmática.
Em ciência, modelos são normalmente entendidos como representações simplificadas de um sistema. E... more Em ciência, modelos são normalmente entendidos como representações simplificadas de um sistema. Em outras palavras, trata-se de um conjunto de elementos e princípios que busca capturar, de forma sistemática, a estrutura e o funcionamento de algum fenômeno
Este trabalho objetiva desenvolver um estudo sobre o sincretismo do clítico se em português brasi... more Este trabalho objetiva desenvolver um estudo sobre o sincretismo do clítico se em português brasileiro, propondo uma categorização em tipos e uma representação gramatical do fenômeno. Elegemos a Gramática de Construções Baseada no Uso como aporte teórico e a concepção cognitiva da gramática como rede. Também, propomos que o sincretismo ocorre por polissemia, pois assumimos que as formas são motivadas funcionalmente. Um pequeno corpus de dados escritos de notícias foi montado, a partir do qual foram observadas seis categorias semânticas nos usos do se: recíproca, reflexiva, média dinâmica, média cognitiva, incoativa e impessoal. Essas categorias foram tratadas como construções de estrutura argumental, contendo sujeito, verbo e se em posição proclítica, e distribuídas em três grandes domínios abstratos: reflexivo-recíproco, médio e impessoal. Finalmente, elaboramos um desenho da rede de construções com se, representando parcialmente o conhecimento gramatical sobre o fenômeno, no qual a classificação proposta é acomodada na rede de links taxonômicos que organizam as construções em diferentes níveis de abstração. Palavras-chave: Sincretismo do se; Gramática de Construções Baseada no Uso; Rede gramatical.
Este artigo contribui com a aplicação dos estudos teóricos da Gramática de Construções Cognitiva ... more Este artigo contribui com a aplicação dos estudos teóricos da Gramática de Construções Cognitiva (GCC) - uma das variantes funcionalistas da Gramática de Construções - ao ensino de língua estrangeira. Para isso, o artigo relata um experimento no qual foi avaliada a viabilidade de se combinar, no ensino da alternância dativa do inglês, os mecanismos analíticos da GCC com as premissas teóricas que caracterizam abordagens comunicativas de ensino de língua estrangeira. Especificamente, o experimento buscou comparar a eficácia de dois tipos de abordagens didáticas da alternância dativa: de um lado, uma abordagem tradicional (isto é, monológica e expositiva) associada a um tratamento construcionista do tópico gramatical; de outro, uma abordagem comunicativa (isto é, fortemente dialógica e centrada no aprendiz), igualmente associada a um tratamento baseado na GCC. Os resultados (i) sugerem que a adoção de uma perspectiva cognitivista e construcionista é perfeitamente compatível com o recurso a uma abordagem comunicativa de ensino de língua e (ii) fornecem indícios de que essa combinação pode ser particularmente relevante quando se trata de produzir melhorias no desempenho dos estudantes em tarefas comunicativas mais naturalísticas.
Redes hierárquicas baseadas em classes semânticas são centrais à Gramática de Construções Baseada... more Redes hierárquicas baseadas em classes semânticas são centrais à Gramática de Construções Baseada no Uso. Como consequência, um desafio metodológico emerge: como identificar as classes semânticas que definem construções intermediárias de uma rede construcional? A fim de contribuir para responder a essa questão, este estudo desenvolve e aplica uma proposta metodológica à Construção de Complementação Sentencial do português brasileiro. O método proposto prevê o mapeamento de construções com verbo especificado à luz da Teoria dos Exemplares, a postulação de categorias semânticas abstratas por meio da observação dos atributos semânticos latentes em clusters de exemplares e o emprego de Escalonamento Multidimensional para verificar a realidade psicológica da rede postulada.
When it comes to categorization, Cognitive Linguistics is well known for rejecting the aristoteli... more When it comes to categorization, Cognitive Linguistics is well known for rejecting the aristotelic ideal of classical definability. Such a rejection, however, still seems to lack empirical support. In this paper, we report an elicited production experiment aimed at investigating the semantics of three Brazilian Portuguese (BP) verbs of separation: "cortar" ('to cut'), "quebrar" ('to break') and "rasgar" ('to tear'). In this experiment, 49 native speakers of BP were asked to provide oral descriptions of video-recorded separation scenes. The results provide empirical support to the rejection of classical definability as well as allow for the description os the semantic structure of the three verbs at stake.
Assim como a maioria das línguas românicas, o português conta com pelo menos dois tipos de modifi... more Assim como a maioria das línguas românicas, o português conta com pelo menos dois tipos de modificadores verbais: os advérbios em-mente ("vencer facilmente") e os adjetivos adverbiais ("vencer fácil"). Intrigados pela sua aparente intercambiabilidade, diversos pesquisadores buscaram evidenciar a existência de diferenças sintáticas, semânticas e estilísticas entre eles. Neste estudo, procuramos contribuir com essa literatura ao sugerir que advérbios canônicos em-mente (ACs) e adjetivos adverbiais (AAs) também são distintos do ponto de vista informacional. Especificamente, sustentamos que os segundos, mas não os primeiros, rejeitam a presença de elementos adicionais no domínio pragmático do foco. A fim de verificar essa hipótese, conduzimos um experimento de julgamento de aceitabilidade. Os resultados mostraram que sentenças com Aas são consideradas significativamente mais aceitáveis quando o advérbio é o único elemento no domínio do foco (p=0,007), ao passo que a mesma diferença não se verifica em sentenças com ACs (p=0,21).
A Linguística Funcional (LF), a Linguística Cognitiva (LC) e a Gramática de Construções (GC) tend... more A Linguística Funcional (LF), a Linguística Cognitiva (LC) e a Gramática de Construções (GC) tendem a ser vistas como modelos teóricos mutuamente compatíveis, se não em grande medida coincidentes. Esse estado de coisas torna difícil identificar com precisão os limites e as áreas de intersecção entre as três teorias, o que pode levar, segundo argumentamos, a certas concepções equivocadas. Diante desse cenário, este artigo parte da seguinte questão: quais são os limites e as intersecções entre LF, LC e GC? Em um esforço para responder a essa pergunta, e com isso mapear o território das abordagens cognitivofuncionais, adotaremos aqui duas perspectivas. De um lado, assumimos um ponto de vista histórico, buscando reconstruir brevemente as origens de cada arcabouço. De outro, concentramo-nos no momento presente, procurando oferecer uma descrição sucinta do mercado teórico contemporâneo de cada um desses paradigmas. Resumidamente, sustentamos que (i) cada arcabouço teórico surgiu a partir de um questionamento distinto em relação à tradição da linguística gerativa e (ii) o desenvolvimento histórico de cada modelo resultou, nos dias de hoje, em uma situação de forte convergência, mas de modo algum sobreposição completa, entre os três quadros teóricos.
Este trabalho tem como objetivo se debruçar sobre os Princípios da Motivação Maximizad... more Este trabalho tem como objetivo se debruçar sobre os Princípios da Motivação Maximizada e da Não Sinonímia (GOLDBERG, 1995) a partir da descrição e da análise das construções gramaticais “se fazer de X” e “dar uma de X”. Para tanto, este estudo parte de um viés funcionalista, tendo como aporte teórico principal os estudos relacionados à Gramática de Construções Baseada no Uso (HOFFMANN, 2022; AUTOR; PEREK, 2015; GOLDBERG, 2006). Para descrição e análise do objeto, lançamos mão dos corpora Corpus do Português e Corpus Brasileiro, de forma que tivéssemos acesso a dados reais de uso. Esta pesquisa, portanto, dados seu arcabouço teórico e sua metodologia, visa contribuir com os estudos das expressões idiomáticas do português brasileiro, bem como com o campo da Gramática de Construções Baseada no Uso.
Resumo: Este artigo busca descrever duas construções idiomáticas com VÊ/VEJA SE S (ilustradas por... more Resumo: Este artigo busca descrever duas construções idiomáticas com VÊ/VEJA SE S (ilustradas por enunciados como "Vê se me devolve meu livro" e "Veja se meio-dia é hora de acordar") no português brasileiro contemporâneo, tomando como base o arcabouço teórico da Gramática de Construções Baseada no Uso. Do ponto de vista metodológico, recorremos a uma análise quantitativa e qualitativo-interpretativa de dados extraídos do Corpus do Português. Em síntese, o que os dados demonstram é que essas construções idiomáticas são especializadas, respectivamente, na função de dirigir uma repreensão preventiva ao interlocutor e buscar a corroboração do interlocutor. Mais especificamente, a primeira construção expressa um comando para a realização de uma ação que, sob a perspectiva do falante, o interlocutor já sabia que deveria realizar. Já a segunda é usada para convidar o interlocutor a corroborar uma posição de discordância em relação a uma crença atribuída a um dado Sujeito de Consciência. A partir dessa análise, foi possível postular, ainda, a existência de uma construção mais abstrata que, do ponto de vista da forma, exibe a sequência VÊ/VEJA SE S e, do ponto de vista do significado, preserva a semântica de avaliação negativa.
Propõe-se que os adjetivos adverbiais (AAs) do português brasileiro podem ser agrupados em oito c... more Propõe-se que os adjetivos adverbiais (AAs) do português brasileiro podem ser agrupados em oito classes semânticas, que correspondem a construções gramaticais de nível intermediário. Neste estudo, verificamos a realidade psicológica dessa proposta por meio de experimento de julgamento de proximidade semântica. Os dados foram analisados por meio de Escalonamento Multidimensional, técnica que permite gerar representações de clusters de exemplares em duas e três dimensões. A representação em 2D revelou a existência de cinco (meso)construções de adjetivo adverbial, ao passo que a representação em 3D indica a postulações de sete (meso)construções. As representações geradas revelaram a distribuição de diferentes microconstruções de adjetivos adverbiais e fornecem evidências a favor da existência de classes semânticas específicas para a Construção de Adjetivo Adverbial mais geral. Palavras-chave: adjetivo adverbial; semântica; gramática de construções.
O português brasileiro apresenta pelo menos duas construções distintas de modificação ... more O português brasileiro apresenta pelo menos duas construções distintas de modificação verbal: a Construção de Advérbio Canônico (CAC; por exemplo, Pedro falou rapidamente), e a Construção de Adjetivo Adverbial (CAA; por exemplo, Pedro falou rápido). Virgínio et al. (2021) defende a existência de uma diferença discursivo-pragmática entre os dois padrões; argumenta-se que a CAA, mas não a CAC, exige que o modificador verbal seja o elemento mais informativo (foco primário) do enunciado. Neste artigo verifica-se se essa mesma restrição atua no sentido de reduzir a produtividade da CAA do inglês norte-americano (evidenciada em usos como speak slow, por exemplo). Para isso, foi desenvolvido um experimento offline de julgamento de aceitabilidade no qual 28 falantes nativos do inglês norte-americano julgaram sentenças com adjetivos adverbiais (AAs) e sentenças com advérbios canônicos em quatro condições, baseadas em uma combinação de frequência e foco. Os resultados comprovaram que existe diferença significativa na aceitabilidade de enunciados contendo AAs nas condições de foco primário e não-primário (p = 0.003), fornecendo evidências em favor da hipótese de que a CAC do inglês norte-americano também é sensível a fatores discursivo-pragmáticos. No entanto, foi constatado efeito significativo de foco com advérbios canônicos (p = 0.037). Apesar dessa afinidade discursivo-pragmática entre os dois tipos de modificadores verbais, o cálculo de intensidade do efeito apontou efeito moderado de foco para AAs e efeito fraco para advérbios canônicos. No artigo, faz-se uma proposta sistemática de representação da rede construcional da modificação verbal do inglês norte-americano com base nos resultados experimentais obtidos.
Este estudo visa investigar um padrão idiomático existente em algumas variedades do português bra... more Este estudo visa investigar um padrão idiomático existente em algumas variedades do português brasileiro identificado pelo item bem. Exemplos do seu uso são frases como “Eu bem vendi o colar que ela gostou” e “Meu nariz bem sangrou”, em que os valores canônicos associados a essa palavra, como os de modo, intensidade ou precisão, não são identificados; e cujo significado não é autoevidente. Diante de dados desse padrão, questiona-se: haveria um valor semântico-pragmático estável em todos os seus usos? Se sim, qual seria ele? À luz da Gramática de Construções Baseada no Uso, defendemos que todos os usos análogos a esses são instâncias de uma construção gramatical, denominada aqui Construção de Contraexpectativa com Bem (CCB). Sob um viés exploratório, foi realizada uma análise qualitativo-interpretativa a partir de dados retirados de corpora com o objetivo de formular uma hipótese acerca do conteúdo semântico-pragmático dessa construção. Defendemos que ela é responsável por marcar a noção de contraexpectativa, se configurando, gramaticalmente, como um disparador de pressuposição negativa. Em uma perspectiva confirmatória, para testar esta hipótese, foi realizado um experimento psicolinguístico off-line de paradigma de escolha forçada, comparando enunciados com e sem a construção, cujos resultados fornecem evidências significativas em favor da proposta formulada.
Em ciência, modelos são normalmente entendidos como representações simplificadas de um sistema. E... more Em ciência, modelos são normalmente entendidos como representações simplificadas de um sistema. Em outras palavras, trata-se de um conjunto de elementos e princípios que busca capturar, de forma sistemática, a estrutura e o funcionamento de algum fenômeno empírico complexo, a fim de permitir sua investigação detalhada (BÖRNER et al., 2012). Sob essa ótica, a Gramática de Construções (GC) deve ser entendida como um modelo que busca representar, especificamente, a porção da realidade empíricaisto é, o sistemaa que nos referimos normalmente como conhecimento linguístico do falante 4. A ideia aqui, portanto, é bastante simples. Dado que o falante inegavelmente dispõe de um conhecimento inconsciente que permite a ele produzir uma quantidade infinita de sentenças bem-formadas (ao mesmo tempo em que o impede de produzir sentenças malformadas), a pergunta que se coloca é: que elementos compõem esse conhecimento e que princípios o regulam? De maneira didática, a resposta oferecida pela GC pode ser reduzida a três princípios básicos:
Resumo: Este artigo busca investigar a atuação do coverage morfofonológico sobre a extensibilidad... more Resumo: Este artigo busca investigar a atuação do coverage morfofonológico sobre a extensibilidade de construções gramaticais para novos usos. Em poucas palavras, o coverage é entendido como o espaço categorial que inclui os usos já atestados para uma dada construção e os usos inovadores. Tomamos como ponto de partida o estudo de Suttle e Goldberg (2011), que atesta a relevância do coverage semântico pela combinação de efeitos de frequência de tipo e de variabilidade e similaridade semânticas. Neste estudo, porém, buscamos investigar se ocorre efeito de "coverage" associado às propriedades morfofonológicas dos itens. Para isso, desenvolvemos uma adaptação do experimento original, na qual foram incluídos verbos pertencentes às três conjugações verbais do português. Em síntese, o que os resultados demonstram é que, assim como o coverage semântico, também o coverage morfofonológico parece afetar a produtividade construcional.
Este trabalho enfoca o uso de aspas em manchetes jornalísticas do português brasileir... more Este trabalho enfoca o uso de aspas em manchetes jornalísticas do português brasileiro, sob a perspectiva teórica da Linguística Cognitiva e, mais especificamente, da Teoria dos Espaços Mentais (FAUCONNIER, 1994, 1997; FAUCONNIER; TURNER, 2002). Com base no primitivo discursivo de Ponto de Vista (CUTRER, 1994; FAUCONNIER; SWEETSER, 1996; DANCYGIER; SWEETSER, 2012), propõe-se uma explicação unificada para o fenômeno, sob o argumento de que o uso de aspas indica mudança de Ponto de Vista na rede de espaços mentais estabelecida à medida que o discurso se desenvolve. Em particular, a análise evidencia que o uso de aspas para indicar deslocamento de Ponto de Vista pode ocorrer em dois contextos principais nas manchetes: (i) do espaço Base/Ground para um espaço de discurso reportado (discurso direto ou discurso direto parcial); (i) do espaço Base/Ground para o Espaço Metalinguístico, que constitui um espaço mais implícito na Rede de Espaços Comunicativos Básicos (BCSN), no caso de processos metafóricos e/ou metonímicos.
Este artigo busca delinear a trajetória diacrônica de uma construção idiomática com VÊ/VEJA SE S ... more Este artigo busca delinear a trajetória diacrônica de uma construção idiomática com VÊ/VEJA SE S (como em “Vê se me liga” e “Vê se não se atrasa”) no português brasileiro. Tomando como base o arcabouço teórico da Gramática de Construções Baseada no Uso e o modelo de mudança proposto por Traugott e Trousdale (2013), buscamos fornecer explicações acerca do surgimento dessa construção na língua. Do ponto de vista metodológico, recorremos a uma análise quantitativa e qualitativo-interpretativa de dados extraídos do Corpus do Português. Em síntese, o que os resultados demonstram é que essa construção idiomática, especializada na função de dirigir uma cobrança ao interlocutor, surge no século XIX a partir de um mecanismo de neoanálise de construtos de uma construção de imperativo com complemento oracional.
Resumo: No português brasileiro, há uma construção idiomática particular identificada pela sequên... more Resumo: No português brasileiro, há uma construção idiomática particular identificada pela sequência "bem que". Exemplos do seu uso são frases como "Bem que minha mãe avisou que ia chover" e "Bem que eu queria ganhar na loteria". A proposta desse trabalho é investigar esse fenômeno sob a luz da Gramática de Construções Baseada no Uso (BYBEE, 2010; GOLDBERG, 2006). Adotando essa perspectiva, propomos que todos os usos analisados da sequência "bem que" são instâncias de uma construção mais abstrata, a Construção Bem Que S. Especificamente, neste artigo, propomos que ela seja identificada, formalmente, pela sequência [bem que [sentença]] e, no polo semântico-pragmático, pela presença do valor de rejeição de proposição. Nesse sentido, defendemos que se trata de uma construção de intersubjetividade, já que atua no gerenciamento de informações intersujeito. A partir de uma análise qualitativo-interpretativa de dados retirados do Twitter, procuramos relacionar, detalhadamente, os usos dessa construção com as generalizações propostas. Palavras-chave idiomaticidade; construção gramatical; pragmática.
Em ciência, modelos são normalmente entendidos como representações simplificadas de um sistema. E... more Em ciência, modelos são normalmente entendidos como representações simplificadas de um sistema. Em outras palavras, trata-se de um conjunto de elementos e princípios que busca capturar, de forma sistemática, a estrutura e o funcionamento de algum fenômeno
Este trabalho objetiva desenvolver um estudo sobre o sincretismo do clítico se em português brasi... more Este trabalho objetiva desenvolver um estudo sobre o sincretismo do clítico se em português brasileiro, propondo uma categorização em tipos e uma representação gramatical do fenômeno. Elegemos a Gramática de Construções Baseada no Uso como aporte teórico e a concepção cognitiva da gramática como rede. Também, propomos que o sincretismo ocorre por polissemia, pois assumimos que as formas são motivadas funcionalmente. Um pequeno corpus de dados escritos de notícias foi montado, a partir do qual foram observadas seis categorias semânticas nos usos do se: recíproca, reflexiva, média dinâmica, média cognitiva, incoativa e impessoal. Essas categorias foram tratadas como construções de estrutura argumental, contendo sujeito, verbo e se em posição proclítica, e distribuídas em três grandes domínios abstratos: reflexivo-recíproco, médio e impessoal. Finalmente, elaboramos um desenho da rede de construções com se, representando parcialmente o conhecimento gramatical sobre o fenômeno, no qual a classificação proposta é acomodada na rede de links taxonômicos que organizam as construções em diferentes níveis de abstração. Palavras-chave: Sincretismo do se; Gramática de Construções Baseada no Uso; Rede gramatical.
Este artigo contribui com a aplicação dos estudos teóricos da Gramática de Construções Cognitiva ... more Este artigo contribui com a aplicação dos estudos teóricos da Gramática de Construções Cognitiva (GCC) - uma das variantes funcionalistas da Gramática de Construções - ao ensino de língua estrangeira. Para isso, o artigo relata um experimento no qual foi avaliada a viabilidade de se combinar, no ensino da alternância dativa do inglês, os mecanismos analíticos da GCC com as premissas teóricas que caracterizam abordagens comunicativas de ensino de língua estrangeira. Especificamente, o experimento buscou comparar a eficácia de dois tipos de abordagens didáticas da alternância dativa: de um lado, uma abordagem tradicional (isto é, monológica e expositiva) associada a um tratamento construcionista do tópico gramatical; de outro, uma abordagem comunicativa (isto é, fortemente dialógica e centrada no aprendiz), igualmente associada a um tratamento baseado na GCC. Os resultados (i) sugerem que a adoção de uma perspectiva cognitivista e construcionista é perfeitamente compatível com o recurso a uma abordagem comunicativa de ensino de língua e (ii) fornecem indícios de que essa combinação pode ser particularmente relevante quando se trata de produzir melhorias no desempenho dos estudantes em tarefas comunicativas mais naturalísticas.
Redes hierárquicas baseadas em classes semânticas são centrais à Gramática de Construções Baseada... more Redes hierárquicas baseadas em classes semânticas são centrais à Gramática de Construções Baseada no Uso. Como consequência, um desafio metodológico emerge: como identificar as classes semânticas que definem construções intermediárias de uma rede construcional? A fim de contribuir para responder a essa questão, este estudo desenvolve e aplica uma proposta metodológica à Construção de Complementação Sentencial do português brasileiro. O método proposto prevê o mapeamento de construções com verbo especificado à luz da Teoria dos Exemplares, a postulação de categorias semânticas abstratas por meio da observação dos atributos semânticos latentes em clusters de exemplares e o emprego de Escalonamento Multidimensional para verificar a realidade psicológica da rede postulada.
When it comes to categorization, Cognitive Linguistics is well known for rejecting the aristoteli... more When it comes to categorization, Cognitive Linguistics is well known for rejecting the aristotelic ideal of classical definability. Such a rejection, however, still seems to lack empirical support. In this paper, we report an elicited production experiment aimed at investigating the semantics of three Brazilian Portuguese (BP) verbs of separation: "cortar" ('to cut'), "quebrar" ('to break') and "rasgar" ('to tear'). In this experiment, 49 native speakers of BP were asked to provide oral descriptions of video-recorded separation scenes. The results provide empirical support to the rejection of classical definability as well as allow for the description os the semantic structure of the three verbs at stake.
Assim como a maioria das línguas românicas, o português conta com pelo menos dois tipos de modifi... more Assim como a maioria das línguas românicas, o português conta com pelo menos dois tipos de modificadores verbais: os advérbios em-mente ("vencer facilmente") e os adjetivos adverbiais ("vencer fácil"). Intrigados pela sua aparente intercambiabilidade, diversos pesquisadores buscaram evidenciar a existência de diferenças sintáticas, semânticas e estilísticas entre eles. Neste estudo, procuramos contribuir com essa literatura ao sugerir que advérbios canônicos em-mente (ACs) e adjetivos adverbiais (AAs) também são distintos do ponto de vista informacional. Especificamente, sustentamos que os segundos, mas não os primeiros, rejeitam a presença de elementos adicionais no domínio pragmático do foco. A fim de verificar essa hipótese, conduzimos um experimento de julgamento de aceitabilidade. Os resultados mostraram que sentenças com Aas são consideradas significativamente mais aceitáveis quando o advérbio é o único elemento no domínio do foco (p=0,007), ao passo que a mesma diferença não se verifica em sentenças com ACs (p=0,21).
A Linguística Funcional (LF), a Linguística Cognitiva (LC) e a Gramática de Construções (GC) tend... more A Linguística Funcional (LF), a Linguística Cognitiva (LC) e a Gramática de Construções (GC) tendem a ser vistas como modelos teóricos mutuamente compatíveis, se não em grande medida coincidentes. Esse estado de coisas torna difícil identificar com precisão os limites e as áreas de intersecção entre as três teorias, o que pode levar, segundo argumentamos, a certas concepções equivocadas. Diante desse cenário, este artigo parte da seguinte questão: quais são os limites e as intersecções entre LF, LC e GC? Em um esforço para responder a essa pergunta, e com isso mapear o território das abordagens cognitivofuncionais, adotaremos aqui duas perspectivas. De um lado, assumimos um ponto de vista histórico, buscando reconstruir brevemente as origens de cada arcabouço. De outro, concentramo-nos no momento presente, procurando oferecer uma descrição sucinta do mercado teórico contemporâneo de cada um desses paradigmas. Resumidamente, sustentamos que (i) cada arcabouço teórico surgiu a partir de um questionamento distinto em relação à tradição da linguística gerativa e (ii) o desenvolvimento histórico de cada modelo resultou, nos dias de hoje, em uma situação de forte convergência, mas de modo algum sobreposição completa, entre os três quadros teóricos.
In traditional structuralist and generative analyses of Portuguese morphology, phonological chang... more In traditional structuralist and generative analyses of Portuguese morphology, phonological changes in the verbal stem are usually conceived as exceptional, unproductive and purely formal phenomena (Mateus et al. 1983; Koch and Souza e Silva 1989; Monteiro 1991; Mateus et al. 2003; Zannoto 2006, among others). Arguing against this tradition, Vivas (2011; 2021) has shown that Brazilian Portuguese (BP) verbal inflection includes a number of systematic, productive and meaningful patterns of stem vowel change, which are better understood as non-concatenative morphological strategies for the expression of particular semantic notions. The present chapter reexamines three of these patterns: vowel alternation expressing the meaning PRESENT; vowel alternation expressing person contrast; and diphthongization expressing the meaning PRESENT. In comparison to Vivas (2011; 2021), two advances stand out. From a descriptive viewpoint, the three patterns at stake are further detailed and new constraints are identified. From a more theoretical standpoint, the chapter provides a unified account of each non-concatenative phenomenon within the framework of Usage-Based Construction Grammar / Construction Morphology. In particular, it's shown that the concept of second order schema is key to appropriately representing BP nonconcatenative verbal inflection within a non-derivational framework.
Linguística para Fonoaudiologia: interdisciplinaridade aplicada, 2022
Uma delimitação precisa do campo da Pragmática está longe de ser trivial, mas uma definição preli... more Uma delimitação precisa do campo da Pragmática está longe de ser trivial, mas uma definição preliminar é relativamente simples. De modo geral, a Pragmática é entendida como o campo que investiga o significado linguístico que emerge em situações comunicativas particulares. A julgar por essa definição, a Pragmática se distingue nitidamente da Semântica, cujo interesse recai sobre o significado descontextualizadoisto é, aquele significado atrelado, de forma inerente, às palavras e sentenças 2. Para ilustrar essa diferença, observemos o diálogo abaixo: JOÃO: Amanhã eu vou acordar às 5 horas e fazer uma hora de exercício. MARIA: E eu sou a rainha da Inglaterra. Considere a sentença "E eu sou a rainha da Inglaterra". Note que, em qualquer situação comunicativa, ela sempre irá evocar a ideia de que a falante é uma mulher que ocupa o cargo mais alto da monarquia inglesa. Esse significado, portanto, é estável e independente do contexto de usoe, precisamente por isso, interessa à Semântica. Por outro lado, no contexto desse diálogo, um significado adicional emerge: a ideia de que a Maria é absolutamente cética em relação à disposição ou capacidade do João para adotar hábitos saudáveis. Como essa interpretação está atrelada a uma situação particular (se o João não tivesse falado sobre acordar cedo e se exercitar, ela não teria emergido), tratase de um tipo de significado que interessa à Pragmática.
FERRARI, L.; PINHEIRO, D. Forma e função: reflexões a partir da Linguística Cognitiva. In: RIOS D... more FERRARI, L.; PINHEIRO, D. Forma e função: reflexões a partir da Linguística Cognitiva. In: RIOS DE OLIVEIRA, M.; CEZARIO, M. M. (Org.) Funcionalismo linguístico: vertentes e diálogos. A sair.
Em poucas palavras, a Gramática de Construções (GC) é um modelo de representação do conhecimento ... more Em poucas palavras, a Gramática de Construções (GC) é um modelo de representação do conhecimento linguístico que emergiu na década de 1980, na Universidade da Califórnia (Berkeley), a partir do trabalho seminal de nomes como Charles Fillmore, Paul Kay e George Lakoff. Com sua crescente popularização nas décadas seguintes, a GC se fragmentou em uma miríade de variantes: mesmo uma lista conservadora, que contenha apenas as abordagens mais consolidadas, deve incluir, ao menos, de Construções Baseada-em-Signos 1 . Mas, afinal, o que todos esses modelos têm em comum? E onde entra a tal "Gramática de Construções Baseada no Uso" que aparece no título deste capítulo? Responder a essas duas perguntas será o objetivo deste texto. Para isso, ele está dividido em duas grandes seções. A primeira introduz o leitor àquilo que Croft (2005, p. 273) chama de "vanilla construction gramar". O termo espirituoso faz referência a um arquimodelo genérico, idealizado a partir daquilo que todos os modelos particulares têm em comum 2 . Por sua vez, a seção seguinte se ocupa, especificamente, da Gramática de Construções Baseada no Uso, a vertente construcionista própria da linguística funcional-cognitiva.
Ao longo deste capítulo 1 , vou empregar a expressão "Sintaxe Construcionista" para fazer referên... more Ao longo deste capítulo 1 , vou empregar a expressão "Sintaxe Construcionista" para fazer referência a uma abordagem dos fenômenos sintáticos que surgiu na década de 80 do século passado, na Universidade da Califórniacampus de Berkeley, em torno de nomes como Charles Fillmore, Paul Kay e George Lakoff 2 . A rigor, o trabalho seminal desses pesquisadores não deu origem apenas a um modelo de descrição sintática, mas a uma concepção alternativa de gramática, que veio a ser conhecida como Gramática de Construções (GC). Nesse sentido, uma resposta simples e obviamente pouco informativa à pergunta acima é a seguinte: Sintaxe Construcionista é o termo que estou empregando para designar a abordagem de fenômenos sintáticos desenvolvida no âmbito da GC.
Este estudo pretende acompanhar a evolução das estruturas interrogativas-Q com pronome deslocado ... more Este estudo pretende acompanhar a evolução das estruturas interrogativas-Q com pronome deslocado no português brasileiro (PB) ao longo de uma faixa de tempo que se estende de meados do século XIX (1845) até o final do século XX (1992). Os exemplos abaixo ilustram os tipos de estruturas interrogativas sobre os quais nos concentramos. Note-se que estão excluídas as sentenças com palavra-Q in situ.
Este capítulo traz uma introdução à empreitada intelectual hoje conhecida como Linguística Cognit... more Este capítulo traz uma introdução à empreitada intelectual hoje conhecida como Linguística Cognitiva (LC). O objetivo aqui é apresentar seus principais conceitos e ferramentas teóricas, a fim de permitir que o leitor explore os estudos descritivos reunidos neste volume. Por essa razão, optamos por não problematizar os pontos controversos. Nos casos em que consideramos útil pontuar o texto com comentários mais aprofundados ou sugestões bibliográficas, isso foi feito nas notas de rodapé. Caso se queira estabelecer uma "data de nascimento" oficial para a LC, é possível pensar no ano de 1989quando foi realizada a Primeira Conferência Internacional de Linguística Cognitiva. Nesse evento, decidiu-se pela criação da ICLA (International Cognitive Linguistics Association) e se anunciou o lançamento do periódico Cognitive Linguistics, cujo primeiro número veio à luz em 1990. Trata-se, portanto, do evento que marca a institucionalização da LC e transforma o empreendimento, nas palavras de um dos seus principais nomes, em um "movimento autoconsciente" (LANGACKER, 1991b: ix).
Se a semântica lexical de inclinação formalista é conhecida por evitar o fenômeno da polissemia, ... more Se a semântica lexical de inclinação formalista é conhecida por evitar o fenômeno da polissemia, os estudos sobre o verbo ter no português brasileiro (PB) não fogem à regra. Esses estudos têm insistido em duas ideias importantes: (i) o verbo ter exibe um único significado altamente geral e inespecífico (indeterminação ou vagueza) e não um conjunto de sentidos relacionados (polissemia); e (ii) a indeterminação semântica de ter chega ao ponto de torná-lo desprovido de qualquer conteúdo conceptual, de maneira que restaria ao verbo veicular informações gramaticais. Neste capítulo, procuraremos questionar essas duas hipóteses. Ao desenvolver uma investigação, de cunho cognitivista, sobre o ter pleno (não-auxiliar e não-modal) no PB contemporâneo, esperamos deixar demonstrado que: (i) esse verbo, longe de ser semanticamente vazio, associa-se a um cenário conceptual específico; e (ii) seu significado pode ser mais bem apreendido por meio de uma rede de sentidos inter-relacionados (polissemia). 1 Registro meu agradecimento às amigas Juliana Marins e Liana Biar pela leitura atenta e pelas sugestões. À Lilian Furtado, fica minha gratidão pela revisão cuidadosa. Os erros que permanecem, claro, são de minha inteira responsabilidade.
6. E o Senhor disse: Eis que o povo é um, e todos têm uma mesma língua; e isto é o que começam a ... more 6. E o Senhor disse: Eis que o povo é um, e todos têm uma mesma língua; e isto é o que começam a fazer; e agora, não haverá restrição para tudo o que eles intentarem fazer. 7. Eia, desçamos e confundamos ali a sua língua, para que não entenda um a língua do outro. 8. Assim o Senhor os espalhou dali sobre a face de toda a terra; e cessaram de edificar a cidade. 9. Por isso se chamou o seu nome Babel, porquanto ali confundiu o Senhor a língua de toda a terra, e dali os espalhou o Senhor sobre a face de toda a terra.
Abralin Ao Vivo -Linguists Online Roteiro 1. Breve reflexão teórica sobre Linguística Cognitiva e... more Abralin Ao Vivo -Linguists Online Roteiro 1. Breve reflexão teórica sobre Linguística Cognitiva e Gramática de Construções, com o objetivo de definir e mapear a organização desses campos.
Em seu conhecido e monumental “comentário” ao pensamento saussuriano, De Mauro (1972) argumenta c... more Em seu conhecido e monumental “comentário” ao pensamento saussuriano, De Mauro (1972) argumenta convincentemente que a posição de Saussure em relação aos “fatos sintáticos” é oscilante: se, em alguns momentos, a sintaxe parece relegada ao domínio do parole, em outros parece haver a sugestão de que ela deve ser entendida como parte da langue. Nesta comunicação, proponho-me a retomar o cansado debate acerca do lugar da sintaxe no modelo saussuriano a fim de chamar a atenção para dois pontos principais. Em primeiro lugar, argumento que a indecisão relativa ao lugar da sintaxe pode ser produtivamente compreendida como um problema decorrente de uma contradição interna relacionada à questão da arquitetura da langue: se, em muitos momentos, a langue é definida, de maneira inequívoca, como um sistema de signos, algumas passagens parecem sugerir que ela inclui ainda uma segunda classe de objetos linguísticos, referidos como tipos sintagmáticos (“types syntagmatiques”). Em segundo lugar, e mais importante, procuro mostrar que o segundo caminho aproxima a abordagem de Saussure, em algumas passagens de maneira impressionante, do modelo teórico conhecido contemporaneamente como Gramática de Construções (FILLMORE, 1985; GOLDBERG, 1995; 2006; CROFT, 2001; dentre outros). Em particular, partirei da sugestão de que a noção de construção gramatical – unidade de análise básica desse modelo – deve ser reconhecida como uma espécie de ampliação natural do conceito saussuriano de signo (DIESSEL, 2015; BOAS, SAG, 2012), de maneira tal que o polo da “imagem acústica” é substituído pelo conjunto de todas as propriedades formais (morfossintáticas, fonológicas, prosódicas), ao passo que o polo do “conceito” se expande para abrigar todos os atributos associados ao domínio do significado (quer sejam eles mais propriamente semânticos, pragmáticos, discursivos ou funcionais). Partindo dessa afinidade fundamental entre o modelo saussuriano e a Gramática de Construções, procurarei mostrar como esta última contribui para dissolver a contradição referente à arquitetura da langue ao unificar, de maneira empiricamente fundamentada, as noções de signo e tipo sintagmático. Neste trabalho, em resumo, assumo o lugar que me cabe – o de um outsider em relação ao campo dos estudos saussurianos – a fim de assinalar a notável convergência entre a Gramática de Construções e algumas das possibilidades analíticas entrevistas no pensamento saussuriano, para com isso, talvez, contribuir para o reconhecimento da obra de Saussure como uma precursora improvável dos atuais estudos construcionistas.
Descrição: Este é um material absolutamente informal, com finalidade didática, que pretende funci... more Descrição: Este é um material absolutamente informal, com finalidade didática, que pretende funcionar como uma porta de entrada à Gramática de Construções. O material toma como ponto de partida dois capítulos inéditos de Thomas Hoffmann (ver referência abaixo), lidos e discutidos em sala de aula. Ao mesmo tempo, não se trata de um simples resumo desses capítulos, dado que foram acrescidas uma série de informações, observações e reflexões que não estão contidas nesses textos.
The Cambridge Encyclopedia of Cognitive Linguistics, 2025
This article explains why constructions have played a central role in recent linguistic theorizin... more This article explains why constructions have played a central role in recent linguistic theorizing and explores some of the controversies surrounding them.
A Gramática de Construções (GC) é um modelo gramatical que surgiu
nos anos 1980, nos Estados U... more A Gramática de Construções (GC) é um modelo gramatical que surgiu
nos anos 1980, nos Estados Unidos, e desde então tem se expandido significativamente no Brasil e no mundo. Curiosamente, porém, apesar da sua grande popularidade, a GC conta com pouquíssimos manuais didáticos em língua inglesa – e nenhum em português. Este livro chega, portanto, para cobrir essa lacuna: seu objetivo é oferecer um curso introdutório completo de Gramática de Construções para estudantes e profissionais de diversas áreas em que a linguagem humana ocupa um lugar central. Para que possa ser lido sem sobressaltos por um público tão heterogêneo, este livro recorre a algumas estratégias didáticas. Em primeiro lugar, ele adota uma linguagem simples e dialogada: a ideia é que o texto pegue o leitor pela mão e o conduza passo a passo na construção do raciocínio. Além disso, o livro conta com uma fartura de ilustrações – que ajudam a concretizar as ideias mais abstratas –, oferece uma síntese do conteúdo ao final de cada capítulo e inclui ainda um glossário de termos técnicos. Para assegurar a fluência do texto, as referências bibliográficas foram reduzidas ao mínimo – e, em larga medida, confinadas às notas de rodapé. LINK: https://www.editoracontexto.com.br/curso-basico-de-gramatica-de-construcoes
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Papers by Diogo Pinheiro
da Gramática de Construções Baseada no Uso e o modelo de mudança proposto por Traugott e Trousdale (2013), buscamos fornecer explicações acerca do surgimento dessa construção na língua. Do ponto de vista
metodológico, recorremos a uma análise quantitativa e qualitativo-interpretativa de dados extraídos do Corpus do Português. Em síntese, o que os resultados demonstram é que essa construção idiomática, especializada na função de dirigir uma cobrança ao interlocutor, surge no século XIX a partir de um mecanismo de neoanálise de construtos de uma construção de imperativo com complemento oracional.
Sentencial do português brasileiro. O método proposto prevê o mapeamento de construções com verbo especificado à luz da Teoria dos Exemplares, a postulação de categorias semânticas abstratas por meio da observação dos atributos semânticos latentes em clusters de exemplares e o emprego de Escalonamento Multidimensional para verificar a realidade psicológica da rede postulada.
da Gramática de Construções Baseada no Uso e o modelo de mudança proposto por Traugott e Trousdale (2013), buscamos fornecer explicações acerca do surgimento dessa construção na língua. Do ponto de vista
metodológico, recorremos a uma análise quantitativa e qualitativo-interpretativa de dados extraídos do Corpus do Português. Em síntese, o que os resultados demonstram é que essa construção idiomática, especializada na função de dirigir uma cobrança ao interlocutor, surge no século XIX a partir de um mecanismo de neoanálise de construtos de uma construção de imperativo com complemento oracional.
Sentencial do português brasileiro. O método proposto prevê o mapeamento de construções com verbo especificado à luz da Teoria dos Exemplares, a postulação de categorias semânticas abstratas por meio da observação dos atributos semânticos latentes em clusters de exemplares e o emprego de Escalonamento Multidimensional para verificar a realidade psicológica da rede postulada.
nos anos 1980, nos Estados Unidos, e desde então tem se expandido significativamente no Brasil e no mundo. Curiosamente, porém, apesar da sua grande popularidade, a GC conta com pouquíssimos manuais didáticos em língua inglesa – e nenhum em português. Este livro chega, portanto, para cobrir essa lacuna: seu objetivo é oferecer um curso introdutório completo de Gramática de Construções para estudantes e profissionais de diversas áreas em que a linguagem humana ocupa um lugar central. Para que possa ser lido sem sobressaltos por um público tão heterogêneo, este livro recorre a algumas estratégias didáticas. Em primeiro lugar, ele adota uma linguagem simples e dialogada: a ideia é que o texto pegue o leitor pela mão e o conduza passo a passo na construção do raciocínio. Além disso, o livro conta com uma fartura de ilustrações – que ajudam a concretizar as ideias mais abstratas –, oferece uma síntese do conteúdo ao final de cada capítulo e inclui ainda um glossário de termos técnicos. Para assegurar a fluência do texto, as referências bibliográficas foram reduzidas ao mínimo – e, em larga medida, confinadas às notas de rodapé. LINK: https://www.editoracontexto.com.br/curso-basico-de-gramatica-de-construcoes