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Coreopolitica e Coreopolícia

DOI: http://dx.doi.org/10.5007/2175-8034.2011v13n1-2p41 Coreopolítica e coreopolícia André Lepecki Tisch School of the Arts, New York University, EUA E-mail: atl1@nyu.edu André Lepecki Resumo Abstract Neste ensaio, abordo de que modo “coreografia” pode ser usada simultaneamente como prática política e como enquadramento teórico que mapeia, de modo incisivo, performances de mobilidade e mobilização em cenários urbanos de contestação. Tomando como ponto de partida práticas artísticas que implicam diretamente as tensões sociais que formam e performam as fissuras do urbano, e ativando a noção de “polícia” em Jacques Rancière, minha proposta é que as práticas artísticas analisadas revelam coreopoliciamentos sutis que (pre)definem o espaço urbano como imagem do consenso neoliberal. In this essay, I propose how “choreography ” may be approached simultaneously as political practice and as theoretical frame that maps, incisively, performances of mobility and mobilization in urban scenarios of dissent. Taking as a starting point artistic practices that directly implicate social tensions which form and perform such urban fissures, while activating Jacques Rancière notion of “police,” my proposition is that the artistic practices under analysis reveal subtle chore-policing which already predefine urban spaces as so many images of neo-liberal consensus. Keywords: Choreography, Police, Performance, Urban, Dissensus, Politics, Dance. Palavras-chave: Coreografia, Polícia, Performance, Urbano, Dissensão, Política, Dança. ILHA v. 13, n. 1, p. 41-60, jan./jun. (2011) 2012 42 Coreopolítica e coreopolícia Dança e teoria e política e dança C omo ponto de partida para esta fala, uma simples constatação: em anos recentes, temos testemunhado nos campos da filosofia política e da teoria crítica uma recuperação, diríamos quase ontológica, da relação (nem sempre fácil, por vezes mesmo antagônica) entre arte e política. Graças principalmente aos escritos de Jacques Rancière e de Giorgio Agamben, arte e política são entendidas cada vez mais como atividades coconstitutivas uma da outra. É sabido como Jacques Rancière, identificando o que chamou de “regime estético” das artes (que se instaura mais ou menos no que a história da arte chama de “modernismo”), afirma que tal regime opera para além das velhas questões do belo ou do sublime. Em vez disso, nele, a arte seria responsável pela ativação de verdadeiras “partições do sensível, do dizível, do visível e do invisível”, que, por seu lado, ativariam “novos modos coletivos de enunciação”1 e de percepção, que, por sua vez e consequentemente, criariam insuspeitados vetores de subjetivação e de novos modos de vida (Rancière, 2010, p. 173). Tais partilhas e distribuições do sensível surgem, de modo quase imanente, graças à particular força expressiva do objeto artístico no regime estético das artes. Daí a relação estreita, quase inextricável, entre arte e política na contemporaneidade. Avançando mais um conceito, bem familiar aliás, de Rancière, o “elemento” que funde arte e política num só ser seria aquilo que Rancière chama de “dissenso”. Para Rancière, “se existe uma conexão entre arte e política, ela deve ser colocada em termos de dissenso – o âmago do regime estético” (Rancière, 2010, p. 140). Esse âmago tem uma dinâmica; é em si mesmo dinâmico, cinético, no sentido de que dissenso produz a ruptura de ILHA v. 13, n. 1, p. 41-60, jan./jun. (2011) 2012 43 André Lepecki hábitos e comportamentos, e provoca assim o debandar de toda sorte de clichês: sensoriais, de desejo, valor, comportamento, clichês que empobrecem a vida e seus afetos. Ou seja, não é apenas a arte que embaralha e redistribui o sensório. Uma política verdadeira, a verdadeira política (ao contrário da politicagem dos políticos!), deve também ser definida literalmente em termos estéticos: uma vez que a política, para Rancière, seria também ela “uma intervenção no visível e no dizível”, o que o leva a concluir, categoricamente: “há portanto uma ‘estética’ no âmago da política que não tem nada a ver com a problemática que Benjamin avança sobre a ‘estetização da política’ específica à ‘idade das massas’” (Rancière, 2004, p. 13). Quanto a Giorgio Agamben, num texto de 2007 proferido na Bienal de Moscou daquele ano (dedicada justamente ao tema “Arte e Política”), essas últimas estariam intimamente associadas porque são “atividades humanas” (e aqui Agambem é mais antropológico do que histórico) que se preocupam com o que chama de “abertura de potências”. Para Agamben, “A arte é inerentemente política, porque é uma atividade que torna inativos, e contempla, os hábitos sensoriais e os hábitos gestuais dos seres humanos, e, ao fazê-lo, os abre para um novo uso potencial” (Agamben, 2008, p. 204). Dada a invocação direta, por ambos os filósofos, do corpo e suas capacidades, do corpo e suas potências, e dado que suas propostas fundem num só “elemento” (para usar a expressão de Rancière) o binômio arte–política para reconstituí-lo agora como um contínuo cuja função é a de perturbar a formatação cega de gestos, hábitos e percepções, parece-me óbvio que tais posições tenham consequências diretas para se pensarem a dança atual e suas políticas, bem como algumas performances que privilegiam o movimento e a coreografia. Não será por acaso que Agamben e Rancière recuperam, ambos, o que Hanna Arendt considerava um muito necessário, porém raro e talvez mesmo perdido, entendimento de política. Lembremo-nos de que, para Arendt, uma noção de política devidamente restaurada deve ter as características não da arte em geral, mas mais especificamente das artes efêmeras: a dança e o teatro. Como Arendt (1998, p. 207) nos lembra em A condição humana: ILHA v. 13, n. 1, p. 41-60, jan./jun. (2011) 2012 44 Coreopolítica e coreopolícia a política é uma techné, pertence às artes e pode ser equiparada a atividades como a medicina (healing) ou a navegação, onde, tal como na performance do dançarino ou do ator, o ‘produto’ final é idêntico à própria performance. É essa efemeridade, essa performatividade, esse entendimento de que “a política é sempre do momento e o seu sujeito sempre precário; uma diferença política está sempre à beira do seu próprio desaparecimento” (para citar mais uma vez Rancière (2010, p. 39), falando de política como se falasse de dança ou performance art), que coloca a dança no âmago da política. Importa lembrar, no entanto, que alguns nomes importantes nos estudos da dança, como, por exemplo, Mark Franko (1995 e 2002), Randy Martin (1998), Susan Manning (2006) e Bojana Kunst (2009), entre outros, têm avançado, desde os anos 1990 e de modo consistente, a hipótese de que a dança, ao dançar, ou seja, no momento em que se encorpora no mundo das ações humanas, teoriza inevitavelmente nesse ato o seu contexto social.2 A dança entendida como teoria social da ação, e como teoria social em ação, constituiria simultaneamente o seu traço distintivo entre as artes e a sua força política mais específica e relevante. Como esclarece o teórico marxista da dança Randy Martin (1998, p. 6) num livro fundamental que publica em 1998, intitulado Critical Moves: Ao contrário da maior parte da prática política, a dança, quando é dançada e quando é vista por um público, torna disponível, de modo reflexivo, os meios pelos quais uma mobilização é feita. Assim sendo, a relação entre dança e teoria política não poderá nunca ser entendida plenamente, e de forma útil, se for vista meramente como uma analogia ou uma metáfora. De fato, a capacidade imanente da dança de teorizar o contexto social onde emerge, de o interpelar e de revelar as linhas de força que distribuem as possibilidades (energéticas, políticas) de mobilização, de participação, de ativação, bem como de passividade traria para essa arte uma particular força crítica. Pode-se dizer assim que, para além daqueles traços que partilharia com a política (a efemeridade, a ILHA v. 13, n. 1, p. 41-60, jan./jun. (2011) 2012 45 André Lepecki precariedade, a identificação entre produto do trabalho e ação em si, a redistribuição de hábitos e gestos, o aumento de potências), a dança operaria também como uma epistemologia ativa da política em contexto. Andrew Hewitt, no seu livro Social Choreography (2005), leva até o limite esse elo teórico-epistemológico-político-coreográfico, quando redefine o próprio conceito de ‘coreografia’ ao enfatizar, na esteira de Martin, que a relação dança–política requer um modelo analítico que entende essa relação como essencialmente não metafórica e profundamente materialista. De modo sucinto, para Hewitt, “coreografia” nomeia não apenas o modo como a dança reflete, manifesta ou expressa determinada ordem social, mas nomeia igualmente o princípio teórico articulando os elos entre práticas artísticas, sociedade e política. Como esclarece na introdução de Social Choreography: enquanto ato performativo, coreografia não deve ser simplesmente identificada com o ‘estético’ e colocada em oposição à categoria do ‘político’ da qual seria uma metáfora ou imagem predeterminada. [...] O que chamo de ‘coreografia’ não é simplesmente um modo de pensar a ordem social: é também uma via para se pensar a relação estético-política (Hewitt, 2005, p. ii). É importante frisar o ímpeto não metafórico. Coreografia não deve ser entendida como imagem, alegoria ou metáfora da política e do social. Ela é, antes de tudo, a matéria primeira, o conceito, que nomeia a matriz expressiva da função política – função essa que Hewitt (2005, p. 11) define como “a disposição e a manipulação de corpos uns em relação aos outros”.3 Essa necessária antimetaforicidade requer a formação de um empirismo particular, atento aos modos como coreografias são postas em prática, ou seja, dançadas. Antimetaforicidade requer entendermos de que modo, ao atualizar-se, ao entrar no concreto do mundo e das relações humanas, a coreografia aciona uma pluralidade de domínios virtuais diversos – sociais, políticos, econômicos, linguísticos, somáticos, raciais, estéticos, de gênero – e os entrelaça a todos no seu muito particular plano de composição, sempre à beira do sumiço e sempre criando um por-vir. ILHA v. 13, n. 1, p. 41-60, jan./jun. (2011) 2012 46 Coreopolítica e coreopolícia Ou seja, são múltiplas as formações do coreográfico. E elas se expandem bem além do campo restrito da dança. Para mim, tal expansão do campo coreográfico tem uma consequência incontornável: o entendimento de dança como coreopolítica, uma atividade particular e imanente de ação cujo principal objeto é aquilo que Paul Carter chamou, no seu livro The Lie of the Land, de “política do chão”. Para Carter, a política do chão não é mais do que isto: um atentar agudo às particularidades físicas de todos os elementos de uma situação, sabendo que essas particularidades se coformatam num plano de composição entre corpo e chão chamado história. Ou seja, no nosso caso, uma política coreográfica do chão atentaria à maneira como coreografias determinam os modos como danças fincam seus pés nos chãos que as sustentam; e como diferentes chãos sustentam diferentes danças transformando-as, mas também se transformando no processo. Nessa dialética infinita, uma corresonância coconstitutiva se estabelece entre danças e seus lugares; e entre lugares e suas danças. Com esses pensamentos, podemos finalmente entrar na coreopolítica do concreto urbano. No chão do urbano, o dissenso No chão do urbano contemporâneo, a fantasia que determina a espacialização da pólis é dupla: primeiro a pólis se representa como espaço de circulação de sujeitos supostamente livres, principalmente livres na sua capacidade de circular livremente. Ou seja, a pólis, o urbano da contemporaneidade, se apresenta como um palco para a representação de uma “automobilidade”, entendida como emblema privilegiado de subjetivação. Nesse palco, nesse chão supostamente liso, flaneurs e carros, os dois grandes automoventes de uma modernidade que se representa sempre enquanto estado em perpétua mobilidade, coproduzem juntos a imagem-emblema da suposta autonomia política e cinética do cidadão contemporâneo.4 Em segundo lugar, a pólis se representa fisicamente, topologicamente, enquanto um lugar supostamente neutro e, consequentemente, sempre aberto para a construção infindável de toda sorte de edificações que justamente determinam e orientam o urbano como nada mais do que o palco para a circulação ILHA v. 13, n. 1, p. 41-60, jan./jun. (2011) 2012 47 André Lepecki dos emblemas do autônomo. Daqui surge a ligação fundamental entre movimento e arquitetura como os dois fatores fundamentais na construção e na autorrepresentação da pólis como fantasia político-cinética da contemporaneidade. Essa ligação, mais uma vez, nos faz pensar de que modo repensar política hoje; requer uma reformulação radical das relações quase ontológicas no imaginário político ocidental entre movimento e urbanidade. Arendt nos recorda como política e pólis, política e espaço urbano, estão precondicionados a certa ideia de dança e a certa ideia de arquitetura. De acordo com a filósofa, já no imaginário político grego, a construção do espaço físico do urbano enquanto espaço de visibilidade e circulação do cidadão (ou seja, enquanto coreografia da cidadania) ainda não é política, mas sim o elemento necessário que precede a política e lhe dá chão. A anterioridade da arquitetura, da construção física do espaço urbano, em relação à ação política é igualmente a afirmação de uma diferença fundamental entre fazer (“to make” – que Arendt vê como relacionada à atividade legislativa) e “agir” (“to act” – ligada à verdadeira ação política): Antes de os homens começarem a agir, um espaço definido teve que ser assegurado – bem como uma estrutura teve que ser construída – dentro do qual todas as ações subseqüentes poderiam então tomar lugar; esse espaço era o domínio público da pólis, e a sua estrutura, a lei: assim sendo, legislador e arquiteto pertenciam à mesma categoria. No entanto, essas entidades tangíveis, em si mesmas, não eram o conteúdo da política. (Arendt, 1998, p. 194-195, grifo nosso) O urbano, como espaço construído por tangíveis imóveis de acordo com a estrutura incorporal da lei, seria o suporte material necessário para conter a efemeridade, a precariedade, o deslimite e a imprevisibilidade ontológica da política, ou seja, do agir que tem como produto apenas o agir. Tal como em Martin, tal como em Hewitt, não se trata aqui de metáfora: a ação política se equipara mais uma vez à dança, e é isso que faz com que seja necessária a construção do urbano como espaço de contenção arquitetônica e legal da dança–política: ILHA v. 13, n. 1, p. 41-60, jan./jun. (2011) 2012 48 Coreopolítica e coreopolícia o que é peculiar na ação política é que, ao contrário dos espaços que resultam do trabalho de nossas mãos, a ação não sobrevive à atualidade do movimento que a trouxe ao mundo, mas ela desaparece não apenas com a dispersão dos homens, mas com o desaparecimento ou a paragem das próprias atividades. (Arendt, 1998, p. 199) Coconstitutivas uma da outra, poderiam dança (ou ação política imaterial) e cidade (fazer legislativo-arquitetônico material) encontrar-se e renovar-se numa nova política do chão, numa coreopolítica nova em que se possa agir algo mais do que o espetáculo fútil de uma frenética e eterna agitação urbana, espetáculo esse que não é mais do que uma cansativa performance sem fim de uma espécie de passividade hiperativa, poluente e violenta que faz o urbano se representar ao mundo como avatar do contemporâneo? Podem a dança e a cidade refazer o espaço de circulação numa corepolítica que afirme um movimento para uma outra vida, mais alegre, potente, humanizada e menos reprodutora de uma cinética insuportavelmente cansativa, se bem que agitada e com certeza espetacular? Responder positivamente a essas perguntas significa imaginar a possibilidade de construir tangíveis (prédios, ruas, vias de circulação e leis) e de agir intangíveis (danças, política), de acordo com uma coreopolítica do chão urbano, uma que atente aos acidentados terrenos da pólis e suas histórias. Para tal, a coreografia teria que se tornar uma metatopografia. Lendo e ao mesmo tempo reescrevendo o chão, reinscrevendo-se no chão, por via do chão, numa nova ética do lugar, um novo pisar que não recalque e terraplane o terreno, mas que deixe o chão galgar o corpo, determinar os seus gestos, reorientando assim todo o movimento, reinventado toda uma nova coreografa social, a topocoreopolítica. Só assim pode uma cidade, o palco de vida para a maioria da humanidade neste momento em que o ser humano é, pela primeira vez na sua história e majoritariamente, um ser urbano, só assim pode uma cidade deixar de ser essa amálgama de construções e leis criadas com o objetivo de se controlarem cada vez mais totalmente os espaços de circulação (de corpos, desejos, ideais, afetos); só assim pode uma cidade se tornar uma coreografia de atualização de potências políticas ILHA v. 13, n. 1, p. 41-60, jan./jun. (2011) 2012 49 André Lepecki e de viver contido sempre em todo e qualquer cidadão: deixando a dança dançar, ou seja, deixando a política acontecer na sua verdadeira face, de modo a que “se possa esperar que o inesperado aja (performs) o infinitamente improvável”, como disse Arendt. Mas, no meio do caminho dessa coreopolítica do chão e das potências liberadas, tem... a polícia. Coreopolícia Fiquemos um momento com uma série de imagens, tiradas ao longo dos últimos 18 meses em diversos chãos da urbanidade planetária em dissenso: Túnis, 14 de janeiro de 2011; Praça Tahir, Cairo, 28 de janeiro de 2011; Karen Al Nile Bridge, Cairo, 28 de janeiro de 2011; Bahrain, 13 de março de 2011; Picadilly Circus, Londres, 26 de março de 2011; Taiz, Iemen, 12 de abril de 2011; Praça Syntagma, Atenas, 15 de maio de 2011; Plaza Cataluña, Barcelona, 25 de maio de 2011; Rossio, Lisboa, 28 de maio de 2011; Deraa, Síria, 10 de junho de 2011; Wall Street, Nova Iorque, 25 de setembro de 2011; Brooklyn Bridge, Nova Iorque, 2 de outubro de 2011... Obviamente, todas essas imagens que a mídia global produz, reproduz e faz circular são já coreografadas pela câmera e por um aparato de representação midiático que, em si mesmo, já é produtor e reprodutor de certa imagem do que é fazer política e manifestar dissenso no espaço urbano. Mas, se é verdade que essas imagens estão pré-coreografadas por ideologias que determinam o enquadramento de certa noção de protesto, se pode também dizer, se deve também dizer, que essas imagens não deixam também de referenciar atos concretos, afirmativos, corajosos e bem específicos do mundo em que vivemos. Fiquemos, pois, com essas imagens mais um pouco, de modo a que sua persistência perante nós escave nelas uma figuração outra, para lá do puramente ótico. O que encontramos nelas para lá do espetáculo da representação ocular é a potência da coreopolítica dissensual como refrão global do contemporâneo. Então, para lá do clichê, vemos que, no caminho da política em ação, no meio do movimento que ousa a coragem de agir e ironicamente partilhando a mesma raiz etimológica, no meio da pólis e da ILHA v. 13, n. 1, p. 41-60, jan./jun. (2011) 2012 50 Coreopolítica e coreopolícia política está aquele ser oscilando entre a lei e a ação, entre a violência que preserva e a violência que violenta,5 entre o imóvel que bloqueia e o altamente móvel que guerreia. Ou seja, a polícia. Vamos considerar aqui “polícia” um ator social na coreopolítica do urbano atual, uma figura sem a qual não é de todo possível pensarse a governamentabilidade moderna. Uma figura também cheia de movimento, particularmente o ambíguo movimento pendular entre a sua função de fazer cumprir a lei e, a sua capacidade para a sua suspensão arbitrária; uma figura cujo espetáculo cinético é de chamar para si o monopólio sobre a determinação do que, no urbano, constitui um espaço de circulação, tarefa que executa não apenas quando orienta o trânsito, mas também quando executa com alarde a sua performance de transgressão de sentidos de circulação na cidade, com carros velozes cheios de luzes e sirenes alardeando assim a sua excepcional ultramobilidade, uma vez que para a polícia nunca existe a contramão. Após um ano de confrontos entre ação coreopolítica dissensual e reação de coreopoliciamento repressivo, é fundamental entender como a dança e a performance têm endereçado essa figura fundamental no entendimento e no direcionamento da nossa vida ativa e, consequentemente, da nossa função política. Apresentam-se três exemplos. Em The Great White Way, o performer e artista plástico norte-americano William Pope.L, que se autointitula “The Friendliest Black Artist in America©”, se propõe a rastejar, vestido de super-homem e com um skate amarrado às suas costas, toda a Broadway – começando esse trajeto ao pés da Estátua da Liberdade, na Liberty Island, em Nova Iorque.6 Num videodocumentário dessa peça dirigido pelo artista, vemos William se arrastando no chão por alguns metros, até que a polícia aparece. Ouve-se um diálogo entre o operador de câmera e os policiais. O operador diz que já haviam contatado as autoridades, dizendo que iam filmar uma performance na Ilha da Liberdade e que não havia sido colocada alguma objeção ao pedido. Ao que os policiais retrucam: “Mas para isso aí, rastejar no chão, não pode”. E comandam: “Ele tem que voltar para o barco. Não me interessa o que ele faça no barco. Aqui, na Ilha, isso aí ele não pode”. William retorna ao barco, sempre rastejando, super-homem ILHA v. 13, n. 1, p. 41-60, jan./jun. (2011) 2012 51 André Lepecki negro fatigado, sob o olhar pétreo da dama branca da liberdade e o comando policial redirecionando o seu movimento. Em junho de 2008, a artista e performer Tânia Bruguera apresenta na Tate Modern de Londres a sua peça Tatlin’s Whispers #5. Aqui, dois agentes da Polícia Montada Anti-Motim Metropolitana de Londres são contratados para usar as suas técnicas de controle de massas no espaço do museu. É pedido a eles que, a intervalos regulares, dirijam a seu bel-prazer os fluxos e as concentrações de público que visita o museu nesse dia. Cavalo e homem num só agenciamento de comando, os dois policiais trabalham em conjunto em preciso pas-de-quatre e, de fato, conseguem, de modo mais ou menos brando, mover os cidadãos: separam grupos, empurram indivíduos, ordenam outros para se deslocarem de um lado para outro, isolam e param e voltam a deslocar os transeuntes. Entre divertidos e contrariados, a verdade é que todos, por fim, acabam por obedecer às ordens de comando. Quando um policial diz que é para circular, ou ir para algum lugar específico, ou apenas para sair da sua frente já, sua fala opera como um eficientíssimo comando coreográfico: o movimento correspondente é imediatamente executado, do melhor modo possível. Senão... Bruguera revela de modo claro, e mais uma vez nada metafórico, de que modo a coreografia articula as políticas invisíveis que tecem o dia a dia de todos nós. Finalmente, o terceiro exemplo vem de um universo de referência proposital e radicalmente diferente, pois importa igualmente, para além de mostrar essas operações de denúncia política feitas coreograficamente pela arte contemporânea, demonstrar como o policiamento enquanto coreografia do fluxo do cidadão é algo profundamente arraigado, entranhado e que forma e deforma o espaço do urbano e o imaginário social de circulação nesse espaço. Essa imagem da polícia como coreógrafa da cidade e seus fluxos de circulação aparece claramente nas mais comerciais, inocentes e insuspeitadas produções. Por exemplo, num musical de Hollywood dos anos 1950. Na famosíssima cena de Singing in the Rain, em que o ator Gene Kelly dança a sua esfuziante paixão sob um toró implacável, encontramos uma demonstração de como a dança pode ser expressão da potência amorosa. Todos conhecem a cena em que Kelly dança na chuva, e na sua alegria, pula e volteia dentro e fora dos espaços dedicados à cirILHA v. 13, n. 1, p. 41-60, jan./jun. (2011) 2012 52 Coreopolítica e coreopolícia culação pedonal: ele pisoteia em poças na calçada e salta para o meio do asfalto, rodopiando no espaço dedicado ao fluxo do automóvel. E talvez todos se lembrem de como a dança termina nessa clássica cena. A dança não tem um final. Ela é interrompida por um policial que não diz nada. Na verdade, ele interrompe a dança em seu mais pleno desbunde apenas aparecendo na cena, parando e cruzando os braços. Sua presença é assim o erigir provisório de um imóvel tangível que legisla sobre o movente fora da ordem de circulação. Perante os braços cruzados, sua presença parada e o silêncio do policial, Kelly para imediatamente de dançar. E, regressando ao passeio, continua por ele em passos cuidadosos, caminhando agora como um sensato cidadão é suposto fazer e onde um sensato cidadão é suposto mover-se. Queria esclarecer que a total disparidade entre os exemplos que trago é proposital. Ela nos mostra como a “polícia” – independentemente do lugar onde sua figura aparece (ruas verdadeiras ou cenários de cinema), da época (anos 1950 ou 2010), dos modos de representação (Hollywood ou performance art), dos modos de instrumentalização (a polícia é coreografada pela artista para revelar como, por sua vez, nos coreografa) e dos modos de atuação (a polícia interfere no fluxo da arte como um crítico severo, no caso de Pope.L; ou no fluxo do amor, como um rival ciumento) – se constitui como um sistema de presença e um vetor de força que determinam, orientam e contêm movimentos e danças que se atrevem, mesmo que provisoriamente e por via de seus surpreendentes movimentos inusitados, a mudar os lugares onde elas se dão. Ou seja, uma teoria cinética da polícia nos permite identificar a sua função coreográfica como fundamental na constituição do urbano e da própria ideia de política. O desvendar crítico de tal função é exatamente o que Jacques Rancière nos oferece quando propõe a antinomia política–polícia em vários dos seus escritos, mas principalmente num ensaio de 2000 intitulado “Dez teses sobre política”. Queria reter da abordagem de Rancière o modo como sua definição de polícia se distingue conceptual e performativamente do pequeno teatro de interpelação policial descrito por Luis Althusser no seu famoso ensaio de 1970, “Ideologia e aparelhos ideológicos de Estado” (Zizel, 1994). Recordemo-nos que, em Althusser, a polícia ILHA v. 13, n. 1, p. 41-60, jan./jun. (2011) 2012 53 André Lepecki cumpre uma ação de subjetivação, por via do chamado “Ei, você aí!” que o policial arremessa ao transeunte. Recordemo-nos também que esse chamado emitido pelo tira produz um duplo e imediato efeito cinético e político: o sujeito se vira em direção à voz da autoridade, e é esse virar que Althusser identifica como o momento exato em que o indivíduo rende a sua individualidade e se submete (“livremente” Althusser nos lembra com ironia mordaz) à sua sujeição: ser um Sujeito perante a Lei. Rancière propõe, pois, algo diverso. Para ele, a função da polícia é menos cinestésica (o voltear do indivíduo sobre o seu eixo, que o fixa e o recruta para sempre enquanto sujeito) do que coreográfica. Ou seja, para Rancière, a polícia não precisa sequer chamar o sujeito. Ela é aquele elemento que já está dado na organização da pólis. A polícia é um tangível, uma construção, que podemos equiparar à arquitetura, pois ela é principalmente o agente que garante a reprodução e a permanência de modos predeterminados de circulação individual e coletiva. A polícia, em outras palavras, coreografa. Ou seja, é ela que garante que, desde que todos se movam e circulem tal como lhes é dito (aberta ou veladamente, verbal ou espacialmente, por hábito ou por porrada) e se movam de acordo com o plano consensual do movimento, todo o movimento na urbe, por mais agitado que seja, não produzirá nada mais do que mero espetáculo de um movimento que, antes de mais nada, deve ser um movimento cego ao que o leva a mover-se. Ou seja, o que importa é uma fusão particular de coreografia e policiamento – coreopoliciamento. O fim do coreopoliciamento é o de desmobilizar ação política por via da implementação de certo movimento que, ao mover-se, cega e, consensualmente, é incapaz de mobilizar discórdia; um movimento incapaz de romper com a reprodução de uma circulação imposta (e reificada como natural à imagem própria da cidade como espaço para o espetáculo permanente do movimento supostamente livre). Como nos diz Rancière (2010, p. 37, grifo nosso), Intervenções policiais em espaços públicos consistem principalmente não em interpelar os manifestantes, mas em os dispersar. A polícia não é a lei que interpela indivíduos (como em Althusser, e o seu “Ei, você aí”)... O refrão da polícia é antes: “Circular, circular, não há ILHA v. 13, n. 1, p. 41-60, jan./jun. (2011) 2012 54 Coreopolítica e coreopolícia nada para se ver aqui...”. A polícia é aquilo que diz que, aqui, nesta rua, não há nada a ser visto e, portanto, nada mais a fazer do que continuar se movendo. Ela afirma que o espaço para circulação não é mais do que o espaço de circulação. Coreografia da polícia, dinâmica da polícia, cinética da polícia. Coreopoliciamento como implementação do insensato movimento insensível que predetermina uma cinética do cidadão em que as relações movimento e lugar, ou política e chão, são permitidas apenas se permanecem relações reificadas, inquestionáveis, imutáveis, e que reproduzem o consenso sobre o seu “bom senso”. E, por outro lado, coreopolítica: comobilização da ação e dos sentidos, energizada pela ousadia do iniciar o improvável, no chão sempre movente da história, e que pode prescindir mesmo do espetáculo do cinético da circulação e do agito, pois o que importa é implementar um movimento que, ao se dar, de fato promova o movimento que importa. Que pode ser, por exemplo, simplesmente parar. Coreopolítica Voltamos assim ao início deste texto e agora podemos afirmar que toda coreopolítica requer uma distribuição e reinvenção de corpo, de afetos, de sentidos. É que toda coreopolítica revela o entrelaçamento profundo entre movimento, corpo e lugar. Ou, como esclarece Rancière (2010, p. 36, grifos nossos), A essência da polícia se encontra numa partilha do sensível caracterizada pela ausência de vazio e de suplemento: aqui a sociedade é feita de grupos aprisionados a modos específicos de fazeres, a lugares onde esses fazeres são exercitados e a modos de ser que correspondem duplamente a esses afazeres e a esses lugares. Neste encaixe de funções, lugares e modos de ser, não lugar algum para qualquer vazio. A política, então, seria uma operação coreográfica de ruptura da fantasia do espaço público como vazio ou livre de acidentes de terreno. A política (ao contrário da politicagem dos políticos e seus capangas) ILHA v. 13, n. 1, p. 41-60, jan./jun. (2011) 2012 55 André Lepecki seria uma intervenção no fluxo de movimento e nas suas representações. Mais uma vez, vemos que a questão tem que ser tratada o mais não metaforicamente possível. Como nos diz ainda Rancière (2010, p. 37, grifos nossos): “a política consiste em transformar esse espaço de ir andando, de circulação, num espaço onde um sujeito possa aparecer”. Esse sujeito seria o ser político, ou seja, aquele que é capaz de exercitar a sua (sempre presente) potência para o dissenso, que é um exercício também fundamentalmente estético, não arregimentado por vetores de sujeitificação pré-dados. O aparecimento do sujeito político: efeito e causa de um novo entendimento de coreografia. Ou seja, coreografia se torna coreopolítica quando mobiliza ou auxilia uma tomada de ação nos vazios sempre presentes (mas recalcados, denegados, camuflados) na trama de circulação do urbano. Coreopolítica é a revelação teórica e prática do espaço consensual e liso de circulação como máxima fantasia policial, pois não há chão sem acidentes, rachaduras, cicatrizes de historicidade. É na rachadura e no seu vazio plenamente potente, é no acidente que todo chão sempre já é, que o sujeito político surge porque nele escolhe o tropeço, e, no desejar do tropeço, ele vê o delírio policial da circulação cega e sem fim ser sabotado. Como dançar uma dança que muda lugares mas que ao mesmo tempo sabe que um lugar é uma singularidade histórica, reverberando passados, presentes e futuros (políticos)? Como promover uma mobilidade outra que não reproduza a cinética do capital e das máquinas de guerra e policiais? Como coreografar uma dança que rache o chão liso da coreopolícia e que rache a sujeição dos sujeitos arregimentados pela coreopolícia? Dançar para rachar o chão do movimento, dançar no movimento rachado do chão, rachar a sujeição. Criar a rachadura no estado das coisas, e nas coisas do Estado, como propôs Félix Guattari (1987, p. 1): cracks dans l’état des choses, l’état des lieux, l’état des normes... Cracks nous induisant par devers nous, à de nouvelles pratiques sociales et à de nouvelles pratiques esthé tiques, qui se révèleront de moins en moins séparées les unes des autres et, de plus en plus, en complicité de destin. ILHA v. 13, n. 1, p. 41-60, jan./jun. (2011) 2012 56 Coreopolítica e coreopolícia Porque a rachadura, finalmente, não é mais do que o chão emergindo como força coreopolítica: desequilibrando e desestabilizando subjetividades predeterminadas e corpos pré-coreografados para benefício de circulações que, apesar do agito, mantêm tudo no mesmíssimo lugar. A rachadura já é o chão, já é o lugar, e é com sua parceria que podemos agir o desejo de uma outra vida, de uma outra pólis, de uma outra política – de uma coisa outra, pois a arte e a política, na sua fusão coconstitutiva, nos relembram que há tudo ainda a ser visto, sim; há tudo ainda a ser percebido, sim; tudo ainda a ser dançado. O sujeito que emerge entre as rachaduras do urbano, movendose para além e aquém dos passos que lhe teriam sido pré-atribuídos, é o sujeito político pleno. Para esse sujeito, a questão fundamental é recapturar uma nova ideia, uma nova imagem e uma nova noção coreográfica de movimento. A pergunta comum que os confrontos políticos do contemporâneo global (e, apesar da singularidade histórica, geográfica de cada um) nos colocam hoje é: o que, de fato, é um movimento verdadeiramente político? Como criar um movimento de contestação que, de fato, escape das coreopoliciadas imagens do que a “contestação” deve ser nos circuitos do urbano? Enquanto imperativos e comandos mercadológicos animam a circulação de corpos, mercadorias, capital, bits de informação, através de cada vez mais controladas e patrulhadas fronteiras e caminhos, a questão do movimento é central. Ao longo deste último ano, o surgimento de um sujeito político em Cairo, Tunis, Atenas, Londres, Madrid e Nova Iorque se deu por via não da velha imagem de demonstração (o que já coreografa o protesto), mas de uma nova imagem de ocupação. Ocupando a pólis, recusando a circulação, um ato parado toma aspetos políticos, cinéticos, estéticos, pois a ocupação e o permanecer demonstram e revelam como o ímpeto e o imperativo de circulação e de agitação são coreografias que policiam, bloqueiam e impedem uma outra visão da vida. Termino trazendo um outro “dançar na chuva”. Apresento esse dançar enfatizando que ele surge, ao contrário dos exemplos anteriores, fora dos circuitos das artes plásticas, da performance art e do comercialismo hollywoodiano. Trata-se de um dançar que brota da vivência do ILHA v. 13, n. 1, p. 41-60, jan./jun. (2011) 2012 57 André Lepecki urbano e que a essa vivência diretamente se endereça. Numa esquina da cidade de Oakland, Califórnia, quatro jovens, negros, se agrupam numa esquina. Chove. O carro preto e branco da polícia logo aparece. Para. Investiga, pois ficar parado numa esquina, em muitas cidades norte-americanas, é infração que pode levar à cadeia. Para a segurança de todos, diz o discurso coreopolicial, o melhor é desconfiar dos agrupamentos parados, principalmente de jovens cuja cor da pele for mais escura. É que agrupamentos deslocam e ocupam o espaço de circulação. E assim ocupam o tempo também. E quem ocupa o tempo marca, determina e orienta o ritmo de cada espaço. Ou seja, faz coreopolítica. Mas os jovens se dividem, ficam dois de um lado da rua, dois do outro. O carro-patrulha parte. O chão molhado é como uma lâmina de prata. Afiada. Deslizam mais carros, a batida da trilha sonora começa, meio lenta, meio épica. Corta a imagem para um dos jovens no meio da pista, seu corpo, numa espécie de vênia guerreira, braço esquerdo esticado como um toureador elegante, cabeça baixa, encapuzada, se coloca justo no trajeto dos carros, que se desviam desse corpo que desestabiliza o fluxo circulatório. Com firmeza e beleza. E, então, cada qual, por sua vez, numa e noutra esquina, dança o impossível. O estilo de sua dança se chama TURF. Acrônimo de Taking Up Room on the Floor (tomando espaço no chão). É porque o chão, mesmo estando aí, nunca nos é dado – ele tem que ser ocupado mesmo. Há que pensar essa ação de ocupação, de ação no chão, e depois ter a coragem de agir. TURF dancing mistura uma plasticidade elástica e leve do corpo (derivada da plasticidade eletrônica da imagem vídeo) para demonstrar claramente que, nas esquinas do urbano policiado, nos chãos supostamente impróprios para dançar (molhados, acidentados, rachados, desleixados pelo poder público, permanentemente policiados), brota e surge a expressão cinética do dissenso. E aqui voltamos à concretude não metafórica do que a dança pode fazer politicamente: destrambelhar o sensório, rearticular o corpo, suas velocidades e afetos, ocupar o espaço proibido, dançar na contramão num chão rachado, difícil. É assim que ela cumpre a promessa coreopolítica a que se propõe, quando ativada para a verdadeira ação: “que o absolutamente inesperado [...] performe o infinitamente improvável” (Arendt, 1998, p. 178). ILHA v. 13, n. 1, p. 41-60, jan./jun. (2011) 2012 58 Coreopolítica e coreopolícia Notas: 1 2 3 4 5 6 Todas as citações ao longo deste texto são traduções minhas das obras referenciadas. A minha contribuição para tal debate pode ser encontrada em Exhausting Dance: Performance and the Politics of Movement (Lepecki, 2006). Ou seja, Hewitt não entende a política como a atividade humana que busca o bem comum, mas um sistema de distribuição de corpos e suas funções orgânicas e econômicas num sistema social de comandos, regras e performances mais ou menos virtuosísticos, mais ou menos ensaiados. Sobre este tema da automobilidade, ver Peter Sloterdijk, La Mobilisation Infinie (Sennett, 1994). Para uma análise deste tema na performance e na dança contemporâneas, ver Lepecki (2006). Ver Walter Benjamin, “Critique of Violence” em Reflections (1978). Para uma elaboração, ver Jacques Derrida, “Force of Law: The Mystical Foundation of Authority” em Cardozo Law Review (1989-1990). Sobre o rastejar político de William Pope.L, ver “Stumbling Dance” (Lepecki, 2006). Referências AGAMBEN, Giorgio. Art, Inactivity, Politics. In: BACKSTEIN, Joseph; BIRNBAUM, Daniel; WALLENSTEIN, Sven-Olov (Eds.). Thinking Worlds: The Moscow Conference on Philosophy, Politics, and Art. Berlin: Sternberg Press, 2008. ARENDT, Hannah. The Human Condition. 2. ed. Chicago: University of Chicago Press, 1998. BENJAMIN, Walter. Critique of Violence. In: ARENDT, Hanna (Ed.). Reflections. New York: Schocken Books, 1978. DERRIDA, Jacques. Force of Law: The Mystical Foundation of Authority. Cardozo Law Review, n. 11, p. 921-1045, 1989/1990. FRANKO, Mark. Dancing Modernism/Performing Politics. Bloomington: Indiana University Press, 1995. ______.The Work of Dance: Labor, movement, and identity in the 1930s. Middletown, Conn.: Wesleyan University Press, 2002. GUATTARI, Félix. Cracks in the Street. Chimère, Automne, n. 3, p. 1-16, 1987. HEWITT, Andrew. Social Choreography: Ideology as Performance in Dance and Everyday Movement. Durham/London: Duke UNiversity Press, 2005. KUNST, Bojana. On Potentiality and the Future of Performance. In: GAREIS, Sigrid; KRUSCHKOVA, Krassimira. Ungerufen. Tanz und Performance der Zukunft/Uncalled. Dance and Performance of the Future. Berlin: Theater der Zeit, 2009. ILHA v. 13, n. 1, p. 41-60, jan./jun. (2011) 2012 59 André Lepecki LEPECKI, André. Exhausting Dance: Performance and the Politics of Movement. London/New York: Routledge, 2006. MANNING, Susan. Ecstasy and the Demon: The Dances of Mary Wigman. Minneapolis: University of Minnesota Press, 2006. MARTIN, Randy. Critical Moves: Dance Studies in Theory and Politics. Durham: Duke University Press, 1998. RANCIÈRE, Jacques. The Politics of Aesthetics. New York: Continuum, 2004. RANCIÈRE, Jacques. Dissensus: On Politics and Aesthetics. London/ New York: Continuum, 2010. SENNETT, Richard. Flesh and Stone: The Body and the City in Western Civilization. New York: W. W. Norton, 1994. ZIZEK, Slavoj. Mapping Ideology. London: Verso, 1994. Recebido em 01/06/2012 Aceite em 30/06/2012 ILHA v. 13, n. 1, p. 41-60, jan./jun. (2011) 2012 60