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(Artigo de Jornal) Máquinas e Mentes

2005

Máquinas e Mentes 29-03-2005 Podem as máquinas pensar ? Sem dúvida, a resposta a essa pergunta já está enredada em nosso dia-a-dia: vemos empresas anunciando que seus computadores podem pensar e pessoas jogando xadrez com seus computadores. Denomina-se de “Inteligência Artificial” uma das áreas da Ciência da Computação atual, o que sugere que podemos fazer uma máquina, um computador, pensar. Claro que, nesse caso, a resposta à nossa inquietante pergunta inicial é restritamente técnica, isto é, depende de uma definição técnica e precisa do que seja “pensar”, ou, mais exatamente, no caso, de uma definição de “inteligência”. Com efeito, se definirmos “inteligência” como “capacidade de resolver problemas”, então máquinas podem pensar, pois quantas vezes já não vimos computadores resolver vários de nossos problemas relacionados à manipulação da informação ? Mas, nossa inquietação em relação à pergunta inicial não é um problema técnico e sabemos que a questão toca o âmago de nosso ser: somos apenas máquinas... !? Certamente, quando a pergunta se desloca para esse aspecto, saímos do plano da técnica e avançamos sobre um plano mais amplo de atribuição de sentido e valor às coisas do Mundo: ... valho tanto quanto uma máquina ? Quando nos colocamos a questão sob esse ponto de vista, estamos, certamente, no plano filosófico – lembremos do imperativo “Conhece-te a ti mesmo!” colocado ao nosso querido Sócrates – e as pessoas tendem a acreditar que, pela dificuldade em estabelecer um raciocínio constante e profundo sobre o assunto e pela diversidade de opiniões, essa questão nunca terá uma resposta precisa. Porém, nossa reflexão sobre a Ciência, pode vir a fornecer uma resposta a essa inquietante questão. Não falo aqui de uma reflexão que se dê apenas no interior de conhecimentos já estabelecidos por uma ou outra ciência particular, seja na Física, na Química, na Biológica ou na Computação, pois, certamente, nenhuma dessas ciências consegue dar uma definição precisa de “mente humana”, em termos de seus já bem estabelecidos conceitos, que abarque toda a amplitude da noção de mente humana como geradora de toda nossa cultura (inclusive das citadas ciências). A resposta é dada a partir de uma análise do corpo formado pelas diversas ciências, principalmente sobre os métodos formais adotados nessas ciências, que são os que podem ser realizados por computadores. Essa análise nos dá uma resposta negativa à questão inicial. Com efeito, sob uma definição de “pensar” como “encontrar a solução dos problemas matemáticos que podem ser resolvidos por seres humanos”, nossa resposta é: não, máquinas não podem pensar. Alguns profissionais tendem a não aceitar essa resposta, seja porque não entendem completamente o argumento, seja porque, colocada de forma tão ampla, a questão não tem, para eles, interesse. Porém, acredito que, quando as técnicas se desenvolverem o bastante para se tentar simular esses comportamentos inteligentes mais complexos, comece-se a perceber esse limite já estabelecido pela teoria. Fica, então, uma pergunta mais intrigante ainda: se não somos máquinas, o que somos ? É, humanidade, “Conhece-te a ti mesmo!”. Ao que parece a Filosofia, enquanto reflexão das questões humanas, nunca perderá sua atualidade. Ricardo Pereira Tassinari - Professor de Lógica e Filosofia da Ciência do Curso de Filosofia da UNESP - Campus Marília.