Academia.eduAcademia.edu

Cartas (não) filosóficas

DULTRA, Maruzia. Cartas (não) filosóficas. Salvador: Edição da Autora, 2021. 87p.

Esse livro reúne por cartas e poemas endereçados ao professor e filósofo Peter Pál Pelbart, discutindo filosófica e literariamente o conceito “corpoimagem”. Tais escritos integraram a tese de doutorado da autora, realizada entre 2015-2018. O livro conta, ainda, com uma carta do interlocutor da obra, posfácio de Joaquim Viana Neto e três vídeo-cartas. Booktrailer: https://youtu.be/jcrlo8Lcc4o Free-ebook_acesse_copie_adultere_distribua: https://www.livrideo.online/br/colecao-no-prelo

IA * A ppp E *D * CTAS R M A US Cartas (não) filosóficas Maruzia Dultra IA * A ppp E *D * CTAS R M A US Cartas (não) filosóficas Maruzia Dultra A chuva desmanchava a cidade e era preciso, então, refazê-la. Esta era a tarefa do pintor. Ele reunia suas tintas e pincel para inventar a aquarela urbana. Começava pelo céu – ele acreditava que era lá onde as casas e tudo se sustentavam, e não no chão. E assim, com uma arquitetura própria, ele pintava, pintava, pintava... Fazer as coisas era fácil – seu revés era quando chegava a vez dos seres. Tinha ideias, intuições, planos, mas eles eram sempre mais surpreendentes. Surgiam, ganhavam vida e tinham suas próprias vontades. Diante de todos esses novos seres, o pintor se encantava. Hesitava se, a eles, alguma coisa precisava ensinar. A mínima lição que fosse: não beber água para não dissolver. Mas, entre os seres, havia um professor. Ele haveria de ofertar as aprendizagens necessárias. O que não se sabia é que era um professor de filosofia, cheio de copos d’água. Para Peter uma carta a(guarda) a poesia do instante fetiche de papel Imprimir a carta: Tocá-la pela última vez: Dobrá-la: Colocá-la num envelope: Tomar nota de seu endereço: Ir até o correio: Preencher o campo de destinatário: Temer que ela não chegue: Pedir uma correspondência com aviso de recebimento: Pagar a postagem: Ir embora de mãos vazias: Sentir um pouco de arrependimento: Pensar em embargar o carteiro: Impedi-lo imaginariamente de seguir o caminho: Querer evitar um desastre: Mas já ser tarde demais: Ter novamente um impulso de coragem: Acreditar que fez o que tinha que ser feito: Não olhar para trás: Deixar que o liame seja suficientemente solto para que ele não se solte: Liberá-lo dos medos: Voltar a crer no inadvertido: Deixá-lo pulsar: Entrar num estado agudo de felicidade pelo ato: Ter consciência do abismo: Aceitar um possível silenciamento: Respeitá-lo: Sem que isso configure uma desistência: Não duvidar do método: Lembrar de não duvidar: E: Imprimir a carta: Tocá-la pela última vez: Dobrá-la... carta um Professor, Timidamente inicio esta pesquisa propondo-lhe uma interlocução. Sei que é exigir muito – pois hoje não há tempo o bastante para cartas – mas precisava tentar. Aqui estou. Você entendeu algo muito delicado: a busca por uma imagem que possa sentir, com a leveza que daí se requer. Talvez tenha compreendido antes mesmo de mim. Falar de uma imagem que sente, que é a pele... O desafio agora será percorrer veredas para que possa alcançar a aparição de um corpoimagem, mesmo ainda não sabendo muito bem o que isso quer dizer. Vou continuar pelo exercício do pensamento, tendo como horizonte seu toque e olhar. Recebo da lógica da sensação, como quase um conselho, a ideia de um olho que toca, uma imagem tátil. Me parece uma sutil conquista para essa intuição que insisto em perseguir. Muitas vezes considero-a inatingível, mas aí me vejo, diante do espelho, ou através dos outros, e percebo que há, sim, uma imagem. Que essa imagem tem um contorno, que esse contorno tem uma superfície, que essa superfície contém uma derme... E, de novo, se Artaud jamais desiste de seguir seu trabalho singular sobre o apocalipse do corpo, aqui há uma afirmação (possivelmente distinta ou mesmo oposta): o corpo como imagem. Ou talvez essa aparição seja de uma ordem que eu não consigo ainda apreender. Pois não é a imagem, ela mesma, uma superfície não escavável? [Ler Didi]. Já o corpo humano é de outra natureza: tem profundidades, circunvoluções, entranhas... Há todo um emaranhado nele aninhado. (A pretensão começa a apresentar suas contradições; vejo que não será um percurso tão óbvio – e era disso mesmo que precisava me livrar). ... Não ter o que dizer, não saber como... De fato, a bibliografia é muito magra. Ainda não atingi este ponto de não-estilo. Por onde ir? Quais fronteiras cruzar? Ao mesmo tempo, tudo é tão claro quando você diz: Não a vida vivida, mas o invivível da vida. É isso. Por que duvidar do dispositivo? Se o que devemos fazer na escrita é da ordem do impossível, comecemos por ele – este método: inconcebível. Embora tenha sido tão recorrente nos idos antigos, talvez não coubesse entre nós. No entanto, eis-me aqui. Fugindo mais uma vez, tentando escapar... deixando que escape... ... E o que é o invivível? ... Sinto vontade de me tatuar a frase, mas uma tatuagem interna, nas vísceras. Ela é mântrica; meu amuleto: Não a vida vivida, mas o invivível da vida. ... Você me ensinou coisas indizíveis. Outras você disse. Como pude viver tanto antes desse encontro. ... De uma vida que explode quando toco paragens inimagináveis... Posso tocar o próprio toque – Mas como fazer isso, não é demasiado abstrato? Não, é real, só que de uma realidade outra. É entrar num outro mundo... E tudo que poderia ser absurdo torna-se plausível – aquilo que era inadvertido invade, mostra-se como possibilidade, sim, um campo de im/possibilidades, que se misturam... É diante disso que este novo corpo se faz: desejado e urgente. Como pude viver tanto antes dele. Percebo, então, que a finalidade é outra. (Mais uma vez, o planejamento se vai represa abaixo...) Há uma necessidade de conexão, tão imprescindível quanto a de respirar. Tomo coragem de voltar a seus escritos (evitei durante semanas temendo o que isso poderia causar – uma saída inescapável). E o que primeiro encontro é: Um livro é isto. Me pergunto como posso ter lhe ensinado que 1 livro é + do que 1 livro... Através de minhas corpografias? Releio: Um livro é isto. Quem sabe você tenha exagerado, por questão de ênfase; porém resisto em acreditar na banalização da proporção. Um livro é isto. Já nas primeiras linhas sou golpeada. De novo, a poesia. (Sustentarei?) Prefiro seguir o risco. É inevitável continuar a leitura, ir pulando de uma seção a outra, ao sabor da livre escolha – embaralhar suas palavras, querer achar aquele trecho que preciso copiar e não ter a lembrança de onde ele está... Rabiscar, ter de novo o canal aberto no qual, em tudo aquilo que leio, vejo o pulsar da nova empreitada. Tudo se relaciona, como uma espécie de magia. Ou, quando começa a não interessar, pulo de página, às vezes várias, volto às anteriores, vou ao sumário, traço novas rotas, releio minhas passagens preferidas... É como te passear. Assim vai se tecendo nossa nova comunicação. Na sua voz e nos seus silêncios: O que escreve é de câmara. Por isso tive medo de recomeçar. Mas, agora, em meio à sua caligrafia e vacúolos, apreendo o quanto preciso deles. Aliás, a cada encontro, eu já sabia. Como pude viver tanto. Sentir o inominável. Inadvertidamente. Não fazer um projeto, mas favorecer a ampliação do gesto... Talvez seja isso, apenas isso. Estabelecer a relação, se fazer nela. (Sustentarei?) E, mais uma vez, estar exposta à mais perigosa das aventuras, colocando tudo inteiramente em xeque, desafiando distâncias inaproximáveis... É um trabalho de reticências. Voltar à escritura através de correspondências, ter a sua audiência como se tem um segredo. E começo a senti-lo: o agir que abre para a iniciativa, para os gestos inadvertidos, sem finalidade... No fundo, esta carta é isso. Desmoronar novamente o estatuto de pesquisadora, desconfiar dele, levá-lo a seu próprio limite até torná-lo incabível... Insistir no método da intimidade, deixá-la encontrar-se, querê-la. Sem que isso represente um empreendimento. ... Mas e a “aparição” prometida? ... ... Será na e pela distância que buscarei avistá-la. Sob a distância longínqua de seus dedos. (Se o êxodo impôs o íntimo estrangeiro de um diário, agora, o regresso à terra natal impele o dispositivo das cartas). Sob a distância ínfima de seus dedos, descobrir uma construção no exato momento de seu erguimento. Ou: a constatação da fissura simultaneamente a seu alargamento. São apostas. E nada disso é sem receio, embora ele não impeça a completa entrega. fetiche de papel aos pedaços Imprimir a carta: Tocá-la pela última vez: Dobrá-la: Colocá-la num envelope: Tomar nota de seu endereço: Ir até o correio: Preencher ERRADO o campo de destinatário: Temer que ela não chegue: Pedir uma correspondência com aviso de recebimento: Pagar a postagem: Ir embora de mãos vazias: Sentir um pouco de arrependimento: Pensar em embargar o carteiro: Impedi-lo imaginariamente de seguir o caminho: Querer evitar um desastre: Mas já ser tarde demais: Ter novamente um impulso de coragem: Acreditar que fez o que tinha que ser feito: Não olhar para trás: Deixar que o liame seja suficientemente solto para que ele não se solte: Liberá-lo dos medos: Voltar a crer no inadvertido: Deixá-lo pulsar: Entrar num estado agudo de felicidade pelo ato: Ter consciência do abismo: Aceitar um possível silenciamento: Respeitá-lo: Sem que isso configure uma desistência: Não duvidar do método: Lembrar de não duvidar: E: RECEBER a carta...????? ... Desabar por ter de volta nas mãos o envelope lacrado: Tentar encontrar explicações: A carta foi devolvida: Porque não tinha o número do apartamento: Pior: Porque se recusou a abri-la: Sequer, recebê-la: Demorar três infindáveis minutos para entender o que aconteceu: Ter um alívio instantâneo: Rir: Não acreditar no próprio feito: Rir muito: Achar graça da assustadora displicência: No segundo seguinte, me dar conta da terrível possibilidade de que chegue a suas mãos o cartão laranja do ‘aviso de recebimento’: De uma correspondência que jamais escreveu: Jamais imaginou existir!: Desesperadamente buscar o número rastreador para tentar identificar qual remetente registrado na agência: Dias depois, ter o sossego da entrega do documento em minha residência: De não ter cometido o erro ao extremo: De ter me livrado do absurdo, ao menos perante você. ... ... Seguir o lembrete inicial: Insistir no envio: Quase repetir o erro: Ser alertada pela irmã caçula: Preencher com cuidado milimétrico o novo envelope: Ter saudade da caligrafia que tinha: Que agora é, incontrolavelmente, trêmula: Fazer a nova postagem: Sair do correio com a coragem renovada: Sentir suavidade para prosseguir as tarefas cotidianas: Calcular o dia da real chegada da carta: 02 dez. 2013: E, por um grande acaso, descobrir: Você viajará: Na véspera desta data: Para o Japão! carta dois Professor, Escrevo, já, sem saber de sua receptividade. O que objetar dessa mais concreta experiência? Há uma intuição de que há algo a ser dito. Algo a ser escutado. Por isso persisto. “Ele vai responder?” – foi o alcance máximo de uma colega diante do desafio. E me dei conta do abismo que há nele: estar inteiramente vulnerável a um simples silenciamento... Ou ser considerada inconveniente, algo do tipo... É que não interessa (exatamente) se a carta terá uma resposta – é de sua constituição ser despretensiosa, embora haja no sentido das correspondências a expectativa da troca. Mas é que ela já está acontecendo. Como aquela música belíssima de Clarice... acontece mesmo no silêncio – pelo silêncio... Porque é de câmara. Aos poucos, com o avanço da leitura, começo a entender aquilo que me disse quando estava diante de seus mais de cinco mil livros... (Uma paisagem inesquecível). Que alguns filósofos até partem do íntimo, mas para atingir outro âmbito; não se trata da vida diária, ela não importa, embora, como zombou Kafka, esta é a única que temos! É difícil tal apreensão – filósofa que não era, que não sou! Mas parece que estou atingindo um ponto mais claro de compreensão, não tenho pressa, nem ansiedade – não tenho prazos para dar conta desta vez... A escritura de agora usufrui de outra esteira: o vasto campo da vontade. Estar nela, por ela. Aquela liberdade, que deveria ser o princípio de todo pensamento que se pretende invenção. Porém há certo constrangimento, em balbuciar bobagens ainda não elaboradas... Só que nisto mesmo reside a potência do que estou buscando. (A escrita volta a ser reativa, mas não posso parar; é preciso continuar, até que aquela voz volte a me atravessar...) Retomemos a questão da “aparição”. Existem motivo e intenção em não a chamar de “aparecimento”, pois ela resguarda uma fluidez, aqui considerada necessária – o triz de ser uma manifestação súbita; presença momentânea. Suspeito que nisso esteja a singularidade do corpoimagem. Embora tenha falado, da outra vez, em afirmação (do corpo como imagem), há algo neste caminho que nega o fixo, que não admite a rigidez. (Mas o quê?) ... ... Você encontra um corpo, você descobre um corpo, de repente o corpo se encontra lá, destacado da pessoa, da palavra, do contexto, dos sentidos, da história, da paisagem. Nesta catástrofe, um corpo é sempre estranho e estrangeiro com sua opacidade inatingível, inexaurível, irredutível. a realidade dada através do corpo rompe com a significação. O corpo é essa ruptura inqualificável. Ele é esse estranho começo e recomeço que pode colocar em questão um pouco de tudo, o pensamento, a narração, a significação, a comunicação, a história: ele introduz uma catástrofe no tempo que flui. O corpo como ruptura implica um aspecto partido do tempo, evocando uma imagem rompida. ... Voltar à gênese de um corpo desconhecido é um grande salto. Como pude viver tanto. – Encontrar o corpo. Tocar o corpo. Isso me toca muito. É um casamento muito profundo. Casamento para dizer encontro. O corpo dos filósofos. Isso também me toca muito. – E, desde lá, já havia uma pergunta suspensa, junto às orelhas-fantasma que nunca mais pararam de ecoar: Aquela imagem de apocalipse do corpo que respondia algo – mas o quê, o quê? contando sobre Como saber, era uma outra língua: . O que nos unia era o estudo do corpo – tão pouco? Eu não teria condições de alcançar. Me restava apenas dividir um pouco do pouco que tenho. Fiz um esforço hercúleo para conseguir, finalmente, explicar minhas corpografias. Ao meu passo hesitante, o amigo arguto e contundente ordenou: “A esta altura, você tem que saber responder!” Acuada pela obrigação, segui em frente naquela tentativa, já frustrada, de explanação. Foi um instante infinito dizer para você que um corpo poético é um corpo do pensamento. Foi infinito também ver você concordar. E: Isso me toca muito. Quis este átimo para sempre. Ou ‘para nunca’, é o mesmo. Daquele verbo nuncar... Em seguida, veio a avalanche do livro de areia. Kuniichi era o sopro do vento que não cansa de assoprar – e já o deserto sobre mim. Por um momento, fui arremessada para muito longe, combalida – a força daquela conjunção não parecia mais sustentável... E você, muito delicadamente, percebeu meu lapso e argumentou como se quisesse me resgatar para o entorno: LEVE a areia do livro! Sim, foi você quem disse isso! Fiz questão de tomar nota desta frase-conselho, que foi uma saída risível: nem se afundar, nem estar à margem – carregar os grãos consigo, para fazer o livro. Tempestades do deserto são mortíferas como as tormentas, mas não precisa se afogar. Nem em água, nem em terra. Leve. A leveza de uma gota, de um grão. Deixar o vento levar. . . . . . Alcançamos alguma espécie de cintilação – assustadora, fugidia... E você, no final da leitura de sua carta (a número zero desta série...?), se confunde com as palavras que escreveu. As aspas perdem o lugar, se desajustam diante do que está aí nos atingindo... Como findar isto que é imenso, sem ter nem começo? A pesquisa de uma vida. Inapreensível como aquele sopro – a chama – a chave. A chave perdida. A chave que sequer existe. algo que é impossível procurar, encontrar e tampouco, talvez, perder. Por isso não se termina. Viver a duração de outros mundos. Dentre todos os ondes, estar em nenhures. Insituável. Também não sei de quem são essas palavras... Na época, respondi prontamente “Sou eu!”, mas, no fundo, não tinha o que dizer. As corpografias inteiras foram tecidas através. Conversação silenciosa, porque é de câmara. Cada aula, uma música; cada página, um sussurro. Lembro como se fosse hoje do dia em que conheci: uma pergunta irrespondível. E, mais uma vez, compulsivamente anotei no caderno. Era o título que precisava para a suposta conclusão. (Ainda estou amalgamada?) Procurei como a um enigma pelo conto fantasmático daquela noite milincontável... e assim o desvendei: descobri que, como na estória, minhas próprias orelhas haviam sido apagadas! E foi por isso, surda para o desfecho do músico sem orelhas, que eu havia criado seu avesso: orelhas flutuantes sem corpo... uma desaparição? (Ou finalmente um corpoimagem?) Encontrei também a flutuação itinerante de Lafcadio Hearn entre a Grécia, Irlanda, EUA, Japão... onde finalmente se tornou Koizumi Yakumo, irmão de pátria de Kuniichi. E nós, desertados. Estar sem-lugar, você previa, lendo a kartamiga kafkiana. (“Você é um profeta!”, lembra muito esse comentário engraçado que li sobre você na internet!) Eu ouvia aquilo tudo, com os anseios e temores do retorno... Sabia que ia acontecer, embora não planejasse quando. E foi abrupto, sem mediações. Não houve tempo para despedidas, nem ritos de passagem, simplesmente aconteceu. Como se eu tivesse sido expurgada. (Mas para onde?) Há tempos não estava mais lá, nem aqui; essa sensação de não ter lugar... Levar ao limite a palavra que você gostou de conhecer: nenhures. Eu também não conhecia, aprendi com as heterotopias: algures, alhures e nenhures, achei linda a trilogia! E, apesar de tantas possibilidades, não saber onde colocar o corpo... Isso me toca muito. Queria tocar. presente sem ciência nem filosofia estás carta três Professor, Me ocorreu uma nova ideia: voltar a escrever com imagens. Fui provocada por aquela colega: “Por que você não faz um trabalho prático com dançarinos?” Não cogitava retornar à dança, nem ao vídeo... No entanto, diante da instigação dela, lembrei imediatamente que Kuniichi desenvolve seu trabalho numa estreita relação, justamente, com dançarinos e seus escritos de pele-pensamento... sobretudo para pensar e repensar o que é o corpo − a vida vivida pelo corpo. Talvez seja, de fato, um caminho. Faz quatro anos que as sensações não são mais audiovisuais... Algum vídeo morreu em mim. (e nasceu um livro) (tenho sido parida por ele). Porém já começa a parecer um bom artifício. Passar da escritura das páginas à tela. Voltar a ela. Vídeo-cartas. Relembro da ideia apaixonante: O vídeo é de fato um estado do pensamento das imagens, uma forma que pensa. Como eu me deleitava... Buscava texturas, promovia ligações, tinha nisso uma caligrafia. Feita de filigranas. Como o corpoimagem? ... Pressinto um lampejo. ... Ações entregues ao vídeo – e a elas, ele. A lente destacando da pele ainda mais imagem; alguma vida a um só tempo recortada e ampliada. Tornada vídeo. ... Ela trabalhava caminhando e, de tempos em tempos, estacava bruscamente, procurando num de seus bolsos profundos um caderninho de pele; videografava nele um pensamento, uma frase, uma palavra, um lembrete, um mundo, e, fechando o caderno, retomava sua corrida com mais intensidade. Essa era sua maneira de compor. Mais de uma vez, ouvimo-la exprimir o desejo de caminhar na vida ao longo de uma imensa tirinha que se enroscava atrás dela, na qual ela gravaria as imagens que lhe viessem na estrada, de maneira a formar no final do caminho uma única tela. ... ... Começo a elaborar uma carta institucional, na qual tenho que declarar por tarefa a “correspondência estabelecida ficcionalmente com um filósofo”. É doído atingir os limites ilusórios desta relação. Rapidamente, entretanto, uma rubra chama se faz presença e me chama – retomo a crença de ser fictícia: é talvez a maior expressão e função da criação artística. Desejar ser ou parecer, mesmo que por momentos, um outro, ou desejar que o mundo seja outro. ... Uma experiência é sempre uma ficção. ... (Mas essa não?) enquanto dura poesia (recado de peu) ser-rocha, ser-muro, ser-chão montanha, barro, pó outros mundos de pedra Pierre Pietro Petrus Pedro nele encontrei corrente m m m m m m nem a ele e mas não de prender-me é correnteza de jorrar m m m m m . ...vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e ev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e ev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e ev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e ev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e ev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav vai e vemcartas vai e náuticas vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e iav mev e iav iav mev e iav mev e iav mev e iav mev vem vai e vem vai e vem vai e vem vai vai e vem vai e ev e iavouve meva earquitetura iav mev edos iavmares? mev e iav mev e iav mev vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem e iav mevenquanto e iav mese v edespede, iav mevconvida... e iav mev e iav mev e iav vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e ev e iav mev e iav... mev e iav mev e iav mev e iav me vem vai e vem vai e vem vai e vem ...vai e vem vai e vem e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e ia vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e ev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav me vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e ia vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e ev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav me vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e ia vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e ev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav me vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e ia vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e ev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav me vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e ia vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e ..mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav me vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem... cartas náufragas (poeminha profundo) ter nas mãos todas as cartas e não saber lê-las todas terão um mesmo fim: pro fundo... cartas náugrafas I a escrita por um fio de lágrima um copo uma gota d’água viva ou morta procura-se desaparição uma centelha tu chamas cinzas na dobra da esquina (não) filosófica os encontros promovidos por acaso e destino magicamente simultaneamente! aumentam a certeza de que há cravada em minha pele uma língua ancestral que nos conecta por isso as adivinhações pregressas as linhas os rebentos coincidências que revelam como que certa irmandade será esta filosoficamente uma amizade? descartada no trâmite das correspondências não sei se fiquei ou fui deixada se devolvida ou extraviada cartas náugrafas II Estar à deriva não é não ter direção: é estar à mercê das correntes do mar – e do ar (mesmo sem resquício de mastros e velas...); é não ter motor próprio ou tê-lo desligado; é deixar-se marear, embarcar na onda, entrar numa. É derivar novas rotas: caminhos imprecisos para quem não conhece suas cartas... (náuticas!) ou não sabe lê-las (cartas náufragas!) – é fazer-se outro na mesma embarcação, sedenta por chuva, mas nem tanta, querente de ilha ou continente, um porto, um abrigo quase qualquer – é liberar-se da navegação... E quando a luz do farol ao longe enfim aponte, s a b e r - s e d o h o r i z o n t e q u e g u a r d a o l a d o d e l á cartas ao mar Reencontro tuas Cartas ao Max, que vira e mexe roubo para mim, desmoronadamente n’Élida... Uma lágrima não resiste à pequena e devastadora lembrança de que, n’algum lugar desta Terra, ela vive sem mim. Lembro de ter aprendido estes dias que maré, em tua terra natal, é a distância entre dois pontos: Mar–É. Mas é improvável que estejas lá, o que me impede ainda de calcular. O quanto eu precisaria nadar ou remar para te alcançar? Me restam estas cartas ao mar, que me envio como se fosse a ti – reverberando tua língua, teu ritmo, tua entonação toda única... Assim, simplesmente, vou lançando oferendas a Iemanjá, torcendo que um dia – ah, um dia... – Élida há de me escutar! Mar sempre repetindo: tu, tu, tu. água-viva se a vê em mim, saiba-se inundação deste ser-tão mar demora carta quatro Professor, Demora é um depoimento de presença. O retorno à tela foi sugador, como se nunca eu tivesse saído. Voltar a você. Como se nunca tivesse existido antes disso. ... Alguns instantes inauditos. Como esse meio-olhar que não se diz mais do que pode. O tempo passa então a ser concebido não mais como linha, mas como emaranhado, não como rio, mas como terra, não fluxo, e sim massa, não sucessão, porém coexistência, não um círculo, mas turbilhão, não ordem, e sim variação infinita, de modo que não se trata mais de remetê-lo a uma consciência – a consciência do tempo –, mas à alucinação. Uma demora mais. Um olhar inteiro. ... Sou um corpo que se arranca célula a célula para com elas fazer as letras; aquela boneca que lhe pareceu espantosa, assustadora, terrível... Talvez seja essa a gênese de um corpo desconhecido no corpo de cada um: Nós descobrimos, no interior de nosso corpo, o dançarino que trabalha nosso corpo. Passos largos. Um salto de quinze quilômetros. Uma realidade abismal, uma existência abissal. ... ... Deixei minha pele nas corpografias, por isso desapareci (“transitoriamente”, você me acalentou), (des) fiz minha pele com elas – despelada. Era isso o que essa palavra-poema queria dizer. Alguns instantes inauditos. O tempo selvagem. Como esse meio-olhar que não se diz mais do que pode. Uma demora mais. Um livro que é mais do que um livro. Um olhar inteiro. ... ... um corpo mais selvagem que o tempo ... Já podemos ao menos arriscar uma conclusão provisória. é preciso aqui tomar o termo imagem também nesse sentido que ameaça Platão – a imagem sem semelhança. No caso do corpo, simplesmente isto: uma imagem que não remete a um modelo, que lhe é insubordinada, já que esse modelo é um Outro, e essa imagem é movida pela dessemelhança, é ela mesma dessemelhança. seríamos tentados a perguntar: seria essa determinação imagética tão essencial ao corpo a ponto de, para que seja pensado, seja preciso passar por aquela? há um tipo de imagem, que nada tem a ver com a cópia, pois justamente é rebelde à cópia e ao modelo, que no seu devir-louco produz um afundamento universal. eis onde se assiste, através da imagem, à implosão da imagem, onde um corpoimagem pode liberar um ‘corpo em pessoa’. ... Mas, afinal, um professor é um professor e um livro é um livro. [E por que recear distâncias entre nós que nunca poderiam nos separar?] Eu, apenas uma aluna. Não sou escritora, não sou filósofa, não sou psicóloga, não sou médica, não sou artista... Uma coleção de negativas de existência. A vida inteira que podia ter sido e não foi. Mas, afinal, um professor é um professor e um livro é um livro. Eu, apenas uma aluna. [E por que recear distâncias entre nós que nunca poderiam nos separar?] Não sou escritora, não sou filósofa, não sou psicóloga, não sou médica, não sou artista... Uma coleção de negativas de existência. A vida inteira que podia ter sido e não foi. Mas, afinal, um professor é um professor e um livro é um livro. Eu, apenas uma aluna. Não sou escritora, não sou filósofa, não sou psicóloga, não sou médica, não sou artista... [E por que recear distâncias entre nós que nunca poderiam nos separar?] Uma coleção de negativas de existência. A vida inteira que podia ter sido e não foi. Mas, afinal, um professor é um professor e um livro é um livro. Eu, apenas uma aluna. Não sou escritora, não sou filósofa, não sou psicóloga, não sou médica, não sou artista... Uma coleção de negativas de existência. A vida inteira que podia ter sido e não foi. ... descolorações afetivas os cinzas das cinzas ... A um poeta, é irresistível outro. ... guardado aguardo ... Biografias igualadas por um mesmo final ... 3 perpendiculares 3 pontinhos [o mundo se trifurca] ... Embarques furtivos que podem não dar em nada (mas às vezes dão) ... É ao mesmo tempo que alguém não tem mais a chave (quer dizer que a tinha), ainda a tem (não a havia perdido) e a encontra (quer dizer, ele a terá e não a tinha). ... Pergunta-arremesso: Como pude viver tanto antes desse encontro. ... ... Todas as coincidências que me levaram (até) você devem ser escritas. ... O início do curso de filosofia era uma trama de pensamentos sediados em lugares longínquos (para mim) de cuja existência eu jamais havia ouvido falar. Saía desses encontros com a sensação de ter sido levada por um tufão. Eu me dizia o tempo todo: serei incapaz de resumir o que ouvi, se mal entendo do que estão falando. algo, enfim, que eu atribuía (para facilitar minha posição) à distância geracional intelectual. Não sabia como conseguiria escrever, o que quer que fosse, à altura da experiência. ... o que ... ... Duas pessoas se conhecem, mas já se conheciam e não se conhecem ainda. ... Matiz temporal de sua demora: ao invés de uma linha do tempo, tem-se um emaranhado do tempo; em vez de fluxo do tempo, veremos surgir uma massa de tempo; em lugar de um rio, um labirinto do tempo. Ou ainda, não mais um círculo do tempo, porém um turbilhão, já não uma ordem do tempo, mas variação infinita, nem mesmo uma forma do tempo, mas um tempo informal, plástico. Com isto estaríamos mais próximos, sem dúvida, de um tempo da alucinação do que de uma consciência do tempo. ... um mar de ondas sem destino, de inconclusões, de buscas. ... O infinitivo que finalmente chegou – como demorou. Ser Mar, labiríntico como o deserto. Em suas continências mútuas do guardar: marulho oceânico e coral. Um corpoimagem. ... Onde algo se retarda espera hesita É nesse hiato que nasce algo como a subjetividade... No retardamento que há entre o que me provoca e o que eu emano a partir dessa provocação ... Houve, ainda, uma época nas aulas em que você se demorava mais que o habitual... Talvez sentisse, mesmo de longe, aquela viva inquietação. Você estendia o olhar em gestos largos... ... Um amarelo, um vermelho, dois azuis ... Alguma coisa que se perde ... Tem algo que não chega mas, de algum modo, está ... Tem o tempo das células – contra o qual não adianta querer acelerar, nem atrasar. ... Escrever todas as cartas como se fossem a primeira – inaugural: Je recommence tout, d’ailleurs je ne finis jamais de recommencer ... Aguardar sua resposta como quem espera o retorno de uma partida (embora seja eu que esteja voltando) aviso de recebimento Professor, Encontrei um professor aqui, filosofia com sotaque soteropolitano. Dendêleuze! Ele estuda a imagem do corpo na cidade. Talvez ele dissesse de outra forma, radicalmente outra, mas é assim que posso reportar, por ora. Na lacuna “Assunto:” do rascunho, nem sei como nomear aquilo que quero lhe escrever (uma mensagem instantânea que chegará primeiro a ele que esta carta a você!) Muitos são os pontos que eu preciso dizer, mas vou tentar diluí-los no tempo, que, espero, teremos. P.S. Há uma infimidade – ínfima intimidade! Mal o conheço, e já sei o nome de seu avô! (depois descubro: de seu bisavô!): Joaquim Antônio Rodrigues Viana efêmera fronteira o hífen que nos separa desejo ultrapassar professor-alunar Do poeta em desespero à sua amada cala-me Da amante em desespero ao seu poeta carta-me nãocarta Professor, Você provoca: Cartas Roubadas. Não sei onde, nem como procurá-las; também não sei como, mas as encontrei... Encontrar é achar, é capturar, é roubar, (...). Roubar é o contrário de plagiar, de copiar, de imitar ou de fazer como. O roubo é um duplo-roubo, tal qual o devir – sempre duplo –, e o movimento infinito, não há senão uma dobra de um outro; não é algo de mútuo, mas um bloco assimétrico... uma imagem em sua segunda potência? o duplo golpe da imagem da imagem... Também duplo professor, uma dupla! Vide o chamado da não-carta, seu avesso em papel. O vazio que a vida contém: vi(d)e... Não um silêncio, nem mesmo um silenciamento (como noutrora), mas uma afasia. Algo que ensurdeceu, como murmurou ela depois de sua quinta carta ao poeta. Ligeiramente suspeito: a poética epistolar tem um prazo de validade? Depois disso, ela não escreveu mais uma sequer. Vieram bilhetes, conversas, entrevistas, outras conversas, convite – não mais cartas. Por isso, a princípio, não me preocupei. Ela também se perguntava quem havia escrito aquelas epístolas! Quem haveria de voltar para salvar o trabalho cuja promessa metodológica é de uma interlocução epistolar? ... Uma criança não brinca para transmitir algo para os adultos ou para outras crianças. Só os adultos não param de se preocupar em transmitir algo. As pessoas pensam sempre em um futuro majoritário (quando eu for grande, quando tiver poder...). Quando o problema é o de um devir-minoritário: Uma criança brinca para brincar o seu brinquedo. não fingir, não fazer como ou imitar a criança, o louco, a mulher, o animal, o gago ou o estrangeiro, mas tornar-se tudo isso, Inédito. para inventar novas forças ou novas armas. Inédito como o nunca dito, nunca publicado. É como na vida. Cartas vazias. Há na vida uma espécie de falta de jeito, de fragilidade da saúde, de constituição fraca, de gagueira vital que é o charme de alguém. Enigmas. O charme, fonte de vida, como o estilo, fonte de escrever. Enigmas. (...) Só que o charme não é de modo algum a pessoa. É o que faz apreender as pessoas como combinações e chances únicas que determinada combinação tenha sido feita. É um lance de dados necessariamente vencedor, pois afirma suficientemente o acaso, ao invés de recortar, de tornar provável ou de mutilar o acaso. Dobras em páginas de um caderno-caixa que se des)(faz. Por isso, através de cada combinação frágil é uma potência de vida que se afirma, com uma força, uma obstinação, uma perseverança ímpar (...). A criança brinca para afetar a si mesma, o bebê sorri a sós no berço. Não são pessoas, mas a cifra de sua própria combinação. (...). Que experiência incrível o bebê está fazendo? É a um só tempo que o charme dá à vida uma potência não pessoal, superior aos indivíduos, e que o estilo dá à escritura um fim exterior que transborda o escrito. É uma experiência invisível. (...) A escritura tem por único fim a vida, através das combinações que ela faz. um fio a vida, E não faz, desfaz, refaz ... Tive medo de esquecê-lo. (Jamais poderia supor tamanha distração! Traição quase, de minha memória a toda pele-pensamento...) Por isso fui atrás de seus grãos de existência, linhas escritas, e encontrei tantos, tantos fios... a costura adivinhada... Uma aparição! A trama de tua voz, minha armadilha confessa... – Minha ou tua? – se me enreda, se me enredo... Quando, então, lembrei que podia te ouvir literalmente. Uma porta, muitas, múltiplas, núpcias imperativas do entre: tu(a)-palavra-chave, que logo quis compartilhar com o melhor orientador que estas cartas poderiam ter. A não-carta também. carta cinco Professor, Tanto tempo e meio depois, volto a estas linhas minhas que são tuas. Muitas perguntas se passaram; outras ficaram e ressoam: O que é o invivível? Quase sem querer, descubro que é invivível viver sem você. Como conviver com esta ausência espectral e sobreviver a ela? Incorro em zonas limítrofes de tal condição, nas quais posso te encontrar, te encontro. A ressoar a perplexidade de Espinosa, quantas... O corpo humano tem necessidade, para conservar-se, de muitos outros corpos, pelos quais ele é como que continuamente regenerado. Quantos...? Ausento uma página do livro: descolo, desloco, para fazer estas costuras de pele-pensamento. (Será que olharás para a tua com saudade da minha?) Eis, pois, que (te) escrever é já a minha forma de provocar tua aparição. parto da palavra bilhete carta seis Professor, Como se nalguma pele tocasse, escrevo... Um encontro que me engolfa, quando acreditava ser eu a envolver... Escrevo para talvez nunca revelar. Escrevo para talvez nunca publicar, nunca ter mais que um leitor. Em busca de uma aparição, constato que o corpoimagem é a pele da palavra poética – a superfície tátil e sensível da materialidade da poesia? Sim, se por essa matéria entendemos o corpo da escrita poética. De novo, sempre, os dois aspectos, relembro a ironia com o risível do pensador, que procura pelo corpo do incorpóreo, como se eles pudessem existir um sem o outro... Não estou sozinha nesta tarefa de “corpação”, outrora você me alertou como um alento. Há tempos me persegue a ideia de um corpo invivível (mesmo com tantas e tamanhas possibilidades que há de vida...!). E um amigo afetuosamente me indaga o que é esse invivível. A resposta é falível... Como dizer-lhe? Como dizer-lhe tudo sem parecer pueril? O invivível sou eu. Como um bom conhecedor de mim que era, julguei que ele entenderia a explicação econômica. Mas sabe que até hoje eu mesma me pergunto? O invivível da vida é a necessidade do impossível (Percebe a função do muro?, você tornaria a perguntar). Um impossível necessário para que novos possíveis sejam criados, para que o mundo seja reinventado, porque a vida não basta. É por esse invivível que respiro, é por ele que escrevo, por ele te escrevo na esperança de que você seja tocado por esta palavra-pele que tento conceituar agora como corpoimagem. Mas, se o invivível é intocável, por que quero tocar na palavra poética e, assim, lhe constituo uma derme? Por que insisto no “toque” como operador conceitual? A imagem poética talvez amenize o abismo, constituindo a superfície tátil e sensível da materialidade da poesia... A imagem poética é a outridade, ouço-a outrando um estar em Paz. Uma pele que escapa a uma “imagem fidedigna”, uma aparência im?possível, desviada, transgredida. Como esta tese, que é toda um desvio. Estou à deriva. Percebo que há tempos estou à deriva. E você, com sua voz dérmica, murmura: A palavra, que em geral designa a ausência da coisa, ao formar poema, designa esta ausência e ao mesmo tempo a presença dessa ausência. Fico me perguntando se é uma presença fictícia, de fragilidade extrema, ao tempo em que vejo nascer uma consistência... A situação é cada vez mais crítica, porque a ficção se torna cada vez mais real. Já não há mais o contorno da realidade – tudo parece fazer sentido, eu busco esse sentido, eu encontro. Esse algo a se realizar é o corpoimagem – e, por agora ele se tornar real, é como se eu também tivesse... É vivífico. Finalmente explicitar essa intuição, conceituá-la e, então, preciso voltar atrás sobre o nunca revelar. Pois há, sim, uma revelação. Até para mim. Não porque o corpoimagem tivesse uma existência prévia e eu a tenha descoberto. Não, ele foi criado. Mas é que é difícil falar do que se intui. São lampejos que assombram. Na deriva, para a deriva... cujo guia de leitura está no poeminha profundo: ter nas mãos todas as cartas e não saber lê-las todas terão um mesmo fim: pro fundo Saber ler as cartas é se deixar derivar, assim como o é compreender a aparição do corpoimagem. Eu poderia dissertar durante páginas... no entanto há algo que escapa à tentativa tola de explicá-la. Mas insisto, quem sabe em forma de poema funcione melhor... Falar da palavra poética através dela própria: presente sem ciência nem filosofia estás Colho este poema como um presente para o corpoimagem, esse é o seu título, mas talvez devesse chamálo mesmo de aparição. Por causa de sua presença sub-reptícia, seu ser-pele profusa que se constitui no corpo da escrita poética, a palavra como poro, que faz sentir a poesia... Enquanto você faz poesia em prosa: A palavra poética não se dirige para a segurança de uma presença, como a palavra bruta, mas para a presença de uma ausência, para o aparecimento de ‘tudo desapareceu’ que ela tematiza. ... Inventei uma Dermoteca, mas fiz desaparecer o corpo humano... fugi dele mais uma vez, a criação me fez escapar. Como uma válvula? (O corpo médico tornou-se artístico, o diário de corpo tornou-se do pensamento, e agora o corpoimagem torna-se pele da palavra poética...). Há, aí, uma superação do “bio” – para além ou mesmo aquém – em plena época do “vale tudo” concedido ao corpo biológico e da vida toda medicalizada. Caberia ainda ecoar a perplexidade de Spinoza: O que pode o corpo? E, na esteira desta indagação, adulterá-la: O que pode o corpoimagem? O que pode essa pele que se forma de modo abrupto, ao mesmo tempo que sutilmente? O que pode essa camada que é visível, porém intocável? O que pode essa película – sensível? Talvez não seja aquela imagem que sente, como afirmei na primeira carta... Nem seja a superfície tátil que afirmei no início desta... A imagem poética é a superfície intocável da poesia. Ela é o outro da palavra poética. Seu duplo. Sua dupla. Lembro da primeira vez que me veio cabelos longos, pele-jambo como se já soubesse o caminho ou adivinhasse O secreto é que ele não existia você o fazia enquanto andava um percurso todo seus pés Captei seu desencontramento me senti morada nesse estado-mundo para então lhe descobrir desabitada Escalei seu olhar estrangeiro seu riso escondido sua alma calada Por isso silenciosamente lhe quis no hiato em que nenhuma palavra cabe e por sobre ele atravessamos nosso amor-malabaris A fresta que nosso encontro rasgou no mundo Talvez sejamos ela, desafiando a solidão cósmica, a incomunicabilidade e a distância entre dois. entre duas. a conjugação que impelimos. a lacuna, a ausência, o precipício. Perto da palavra poética, posso até sentir o cheiro da pele que é o corpoimagem. Ele me toca, mesmo não sendo tocável – tamanha façanha é a sua! Mas, como pesquisadora, seria preciso investigar esse toque... Aliás, pela (po)ética da deriva, o mais importante não é me deixar ser tocada? Toda a ficção acadêmica pede que o pesquisador observe, analise, descreva, etc, quando talvez o que lhe seja primordial é sentir. E eu sinto, eu sinto muito, quando você diz: A palavra poética (...) não remete ao mundo. Este, junto com suas finalidades, diante dela recua e se cala. Fazer recuar e calar o mundo... Este é o feito da palavra poética, enquanto sua pele se aproxima... Para tocar. E escutar a pele do outro. Mesmo que seja para escutar apenas seus silêncios... carta sete Professor, Que há entre a ausência presente e a presença ausente que as liga tão indiretamente e intimamente? De um lado, está o estatuto paradoxal da palavra poética: faz as coisas desaparecerem e faz aparecer esse desaparecimento numa fulguração noturna. Do outro lado, está você enquanto meu destinatário – imaginário? Entre os dois, esta fina liga que se forma, uma pele... Se quando te escrevo, é como se nalguma pele tocasse, é o corpoimagem a aparecer. Sorrateiramente, cortante... Seu clarão nos ensina tudo de uma vez. Não é todo mundo que pode suportá-lo, nem todos que podem vê-lo. É preciso um pacto, uma sutileza. É preciso um entendimento que não se aprende: apenas se sente. Nasce-se com ele; por ele, vive-se. Que pele tem uma força assim, tão intensa? É para chegar no outro... Todo esse esforço é para o outro alcançar. Vale variar a língua, até inventá-la. O poeta é o inventor de línguas desnecessárias. Um ofício das inutilidades (porém de que valeria a vida sem ele?) O poeta não tem um dia a dia. É uma vida a vida, Clarice tem mil vezes razão. A derme do poema é permeada de vasos gramaticais, seu circuito sanguíneo possui a pulsação latente dos sentidos, as células são palavras que respondem à sintaxe de cada verso... E em cada palavra pulsa um coração. Se disse da outra vez que fugi do corpo humano, é porque ainda não tinha visto de tão perto o visível do corpoimagem. Embora invivível. Embora intocável. Embora Artaud jamais desista de seguir seu trabalho singular sobre o apocalipse do corpo. o avesso das cartas Estas Cartas (não) filosóficas são fruto da aparição, em 2013, do livro O avesso do niilismo: cartografias do esgotamento, do filósofo Peter Pál Pelbart. Um exemplar da publicação, lançada em São Paulo, chegou-me como presente em Salvador através do correio. O mote da correspondência com o Professor Peter foi desdobrado na pesquisa de doutorado “Vídeo-cartas (não) filosóficas: percurso de aparição de um corpoimagem“, desenvolvida entre 2015-2018 no Doutorado Multiinstitucional e Multidisciplinar em Difusão do Conhecimento (DMMDC-UFBA), com bolsa de estudos Fapesb e orientação do Professor Joaquim Viana Neto. postada depois da hora No percurso de aparição de um corpoimagem, Maruzia Dultra não se furtou em encontrar na transdisciplinaridade solo fértil e vigoroso para o pleno desenvolvimento de sua pesquisa. Seu trabalho envolve estudos críticos primorosos no campo da imagem e no campo da poética da escrita, soerguendo múltiplas referências que vão se aproximando, intimamente, na medida exata que as singulares tessituras da tese se formam. Essas aproximações referenciais são desenhadas enquanto arranjos plurais e são capazes de formar um corpo de tese heterogêneo e indeterminado, que permite ao leitor atravessar novas estruturas que até então poderiam ser forjadas – e mesmos fixadas – pela ação capitular adotada. O desenvolvimento da tese acontece no vir a ser “próprio e apropriado” das relações entre corpo da(e) escrita (corpo criado e corpo adulterado), corpoimagem – conceito este estruturante para a pesquisa – e vida vivida para tecer o invivível da vida. A pesquisa, portanto, faz-se enquanto artesania da(s) própria(s) vida(s) que segue(m) seus encontros entre cartas e vídeo-cartas (não) filosóficas, entre qualificações e recusas, entre defesas e escutas, entre criações fortuitas e outras duradouras, entre a imagem que cabe e aquela incabível, entre a borra da imagem e a tese que se consuma, entre o consumo da imagem da tese e a formação dos seus duplos, entre os tempos de feitura e a sua espera, entre a espera do tempo e o seu adormecimento, entre o parecer e o (des) aparecer da vida que se tese. Dessa forma, esta publicação segue o ritmo dos (des) encontros que são próprios das pesquisas e que se efetivam no vigor das entregas, sejam elas parciais e/ou finais. Daí trazer a público, anos depois, esta correspondência, a fim de que ela ganhe novos destinatários que adensem a trama temporal que é este livro. Salvador, 14 jan. 2019 Joaquim Viana Neto pppombo-correio É com enorme satisfação que aceito o convite de dar eco a seu trabalho, e o faço na forma mais condizente com uma das formas que você adotou – a saber, a epistolar. Sim, esse modo epistolar que atravessa este livro, e que toma como destinatário, amiúde, um tal de ppp, e que cita seus livros ou fragmentos de aula, não poderia deixar-me indiferente. Mas não pela vaidade ou orgulho, e sim pela surpresa em acompanhar como você aproveita as vozes que te tocam e mobilizam, como você as incorpora e as põe para funcionar, a serviço de uma questão que te inquieta e conduz a sua pesquisa para outros lugares. Portanto, entendi que esse ppp é um personagem a mais entre outros tantos que você fabricou, e que você toma como intercessor para elaborar a questão que te obseda. Sendo assim, esta “carta” não é uma resposta às cartas que você enviou a esse ppp, mas o modo que encontrei de pensar junto ao movimento que propõe seu trabalho, sem tomar a posição extrínseca e neutra, supostamente científica, que sabemos todos, nada mais é que uma ficção acadêmica. Eu me permito, ademais, revisitar um trecho da arguição de seu mestrado, defendido há anos atrás, pois vejo uma continuidade e uma coerência na sua trajetória de pesquisa surpreendentes. Aqui reproduzo um fragmento da minha arguição na época: Esse é um trabalho de metamorfose. Não é uma pesquisadora tomando por tarefa debruçar-se sobre um objeto, nem mesmo realizar um projeto, uma obra, uma pesquisa. É colocar-se inteiramente em xeque no ato da pesquisa, expor-se a ela, mas saber que essa pesquisa ela mesma só pode dar-se, na sua radicalidade, caso tenha por matéria-prima precisamente essa existência, a metamorfose dessa existência, a pele desse vivente que nela se empenha… Não há como não enxergar que seu trabalho atual é um prolongamento, um aprofundamento, uma ampliação, uma radicalização da pesquisa anterior. Mas sua pesquisa ganhou um fôlego, uma amplitude, uma audácia admiráveis. Os interlocutores se multiplicaram, os pensadores convocados também. Os planos de experimentação igualmente se ampliaram, os procedimentos inventados, e a escrita ganhou em delicadeza e inventividade, as cartas (não) filosóficas se consolidaram como um meio expressivo, um método de prospecção. As perguntas se pulverizaram como cartas, por cartas, soltas em páginas que se esbarrarão em algo ou alguém e pararão. A pergunta feita por você será respondi- da a outro, ou por outro, mas não importa que pergunta e resposta não se encaixem, importa que ambas tenham existido. Ao longo desses anos, recebi seus presentes como o (a)guarda-carta, ou a pequena lousa, ou outros tantos, e não entendia bem do que se tratava, mas criavam um curto-circuito no meu cotidiano – e só ao ler sua tese entendi que eles já eram parte dessa pesquisa que incluía esse exercício de pombo-correio. Sou-lhe grato por tudo o que vi e li, pelo modo como você usou o pouquinho que aprendeu comigo para alçar seu voo próprio com os instrumentos que você mesma fabricou, produzindo um movimento esplêndido, de grande alcance, que me leva para muito mais longe do que eu mesmo acreditava ser possível. São Paulo, 23 mai. 2017 Peter Pál Pelbart extravios APARIÇÃO. In: DICIONÁRIO ONLINE de português. Disponível em: <http://www.dicio.com.br/ aparicao/>. Acesso em 15 nov. 2013. ANTUNES, Arnaldo. Caligrafia. In: DERDYK, Edith (Org.). Disegno. Desenho. Desígnio.. 2ª ed. São Paulo: Senac, 2010. p. 125-131. BANDEIRA, Manuel. Pneumotórax. In: BANDEIRA, Manuel. Estrela da vida inteira: poesias reunidas. 8ª ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1980. BEAUVOIR, Simone de. A Força da Idade. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2010. BIANCO, Giuseppe. Gilles Deleuze Educador: sobre a pedagogia do conceito. Revista Educação & Realidade, v. 27, n. 2, p.179204, jul./dez. 2002. Disponível em: <http://www.seer.ufrgs.br/ educacaoerealidade/article/ download/25927/15195>. Acesso em 19 nov. 2013. BORGES, Jorge Luis. O livro de areia. In: BORGES, Jorge Luis. O livro de areia: (1975). São Paulo: Companhia das letras, 2009. Trad. Davi Arrigucci Jr. p. 100-105. (col. Biblioteca Borges) BOURGEOIS, Louise. I Do, I Undo, I Redo. 1999-2000. Instalação. CHAVES, Anésia Pacheco e. Caderno 2. São Paulo: Miró Editorial, 2009. DELEUZE, Gilles. Francis Bacon: lógica da sensação. Rio de Janeiro: Zahar, 2007. Trad. Roberto Machado (coord.). ______. Lógica do sentido. São Paulo: Perspectiva, 2011. Trad. Luiz Roberto Salinas Fortes. (col. Estudos, n. 35) ______. Nietzsche e a filosofia. Rio de Janeiro: Editora Rio, 1976. Trad. Edmundo Fernandes Dias; Ruth Joffily Dias. (col. Semeion) ______; GUATTARI, Félix. O que é a filosofia?. 3ª ed. Rio de Janeiro: Ed. 34, 2010. Trad. Bento Prado Jr. e Alberto Alonso Muñoz. ______; PARNET, Claire. Uma Conversa: O que é? Para que serve?. In: DELEUZE, Gilles; PARNET, Claire. Diálogos. São Paulo: Escuta, 1998. Trad. Eloisa Araújo Ribeiro. p. 9-45. DUBOIS, Philippe. Cinema, vídeo, Godard. São Paulo: Cosac Naify, 2004. (col. Cinema, teatro e modernidade) DULTRA, Maruzia. Corpografias: incursão em pele imagem escrita pensamento. 2012. Dissertação (Mestrado em Artes Visuais) – Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2012. Disponível em: <http://www.teses.usp.br/ teses/disponiveis/27/27159/ tde-04032013-114309/pt-br.php>. Acesso em 23 dez. 2014. ______. Mensagem de e-mail (Assunto: “Para conhecer um encontro – e também apaixonarse...”). Enviada a Pedro Soledade em 22 dez. 2013. FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso: aula inaugural no Collège de France, pronunciada em 2 de dezembro de 1970. 21ª ed. São Paulo: Edições Loyola, 2011. Trad. Laura Fraga de Almeida Sampaio. ______. O corpo utópico, as heterotopias. São Paulo: n – 1 edições, 2014. Trad. Salma Tannus Muchail. HEARN, Lafcadio (YAKUNO, Koizumi). The story of MimiNashi-Hoichi. In: Kwaidan: stories and studies of strange things. Tokio: The Shimbi Shoin, 1932. Versão digital do texto disponível em: <http://www. sacred-texts.com/shi/kwaidan/ kwai03.htm>. Acesso em 20 dez. 2013. KAFKA, Franz. O veredicto [1912]. In: O veredicto – Na colônia penal. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. Trad. Modesto Carone. p. 7-25. ______. Sobre os símiles. In: Narrativas do espólio: 19141924. São Paulo: Companhia das letras, 2002. Trad. Modesto Carone. p. 210-211. LIMA, Élida. Aproximações entre Poesia e Política. Cartas ao Max (Blogue), 03 out. 2015. Disponível em: <www.cartasaomax. com>. Acesso em 28 abr. 2017. ______. Cartas ao Max: limiar afetivo na obra de Max Martins. São Paulo: Invisíveis Produções, 2013. ______. Mensagem de e-mail (Assunto: “RE: ‘Cada separação entre amigos é uma morte’”. Recebida em 08 dez. 2013. LISPECTOR, Clarice. Água viva. 3ª ed. Rio de Janeiro: Artenova, 1973. ______. Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres. 2ª ed. Rio de Janeiro: Sabiá, 1970. ______. Um sopro de vida: pulsações. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1978. PELBART, Peter Pál. A toca de Kafka: o desdobramento na linguagem. In: PELBART, Peter Pál. Da clausura do fora ao fora da clausura: loucura e desrazão. São Paulo: Brasiliense, 1989. p. 75-81. ______. Curso de Filosofia “Franz Kafka e o desparafusamento do mundo”. São Paulo: Atelier Paulista, mar.-jun./2012. ______. Curso de Filosofia “O tempo em Bergson”. São Paulo: Atelier Paulista, ago.dez./2011. ______. Mídias autônomas ou era pós midiática? [2011]. Laboratório de Sensibilidades (Blogue). Disponível em: <https:// laboratoriodesensibilidades. wordpress.com/2012/11/30/ analise-do-forum-com-o-grupointersecoes-no-circo-voadorrj-escrito-de-peter-pelbartmidias-autonomas-ou-era-posmidiatica/>. Acesso em 20 out. 2021. ______. O avesso do niilismo: cartografias do esgotamento. São Paulo: n – 1 edições, 2013. ______. O tempo nãoreconciliado: imagens de tempo em Deleuze. São Paulo: Perspectiva, 2007. (col. Estudos) ______. O tempo nãoreconciliado. In: ALLIEZ, Eric (Org.). Gilles Deleuze: uma vida filosófica. São Paulo: Ed. 34, 2000. p. 85-97. (col. TRANS) ______. Vida capital: ensaios de biopolítica. São Paulo: Iluminuras, 2009. RANGEL, Sonia. Olho desarmado: objeto poético e trajeto criativo. Salvador: Solisluna, 2009. SPINOZA, Benedictus de. Ética. 3ª ed. 1ª reimp. Belo Horizonte: Autêntica, 2013. Trad. Tomaz Tadeu. UNO, Kuniichi. A gênese de um corpo desconhecido. São Paulo: n – 1 edições, 2012. Trad. Christine Greiner. ______. La pensée sans images. In: UNO, Kuniichi. Artaud et l’espace des forces. 1980. 283f. Tese (Doutorado em Filosofia) – Faculdade de Vincennes, Universidade de Paris VIII, Saint-Denis, 1980. p. p. 7-63. VIANA NETO, Joaquim. L’art du dehors: frontières & dépositions. In: MARTIN, Pascal; SOULAGES, François (Org). Les frontières du flou. Paris: L’Harmattan, 2013. v. 1. p. 187-194. postagens fetiche de papel 06 carta um 07 fetiche de papel aos pedaços 13 carta dois 16 presente 23 carta três 24 enquanto dura poesia 27 (recado de peu) sem título 28 cartas náuticas 29 cartas náufragas 30 (poeminha profundo) 36 cartas ao mar 37 água-viva 38 demora 40 carta quatro 51 aviso de recebimento 52 efêmera fronteira 53 carta-me 54 não-carta 58 carta cinco 59 parto da palavra 60 bilhete cartas náugrafas I 31 61 carta seis desaparição 32 68 carta sete na dobra da esquina 33 (não) filosófica descartada 34 cartas náugrafas II 35 70 o avesso das cartas 71 postada depois da hora 73 pppombo-correio 76 extravios Este livro é livre para ser acessado, copiado, adulterado e distribuído, sem a necessidade de permissão prévia. Obras derivadas devem manter a mesma licença. Imagens Frames do vídeo “Demora” (2010-2013), de Maruzia Dultra junto ao Grupo Ecoarte Desenho “Pelegrafia costurada” (2012), de Branca de Oliveira Foto da autora Pedro Soledade Ectate occat vollam doloris temperum qu Realização LABOR.POET.CO Para acessar mais desta coleção, ative o QR Code ou clique nele Agradeço @s autor@s que aqui estão, nomead@s ou não, pelas palavras que roubei com o desejo de torná-las minhas também. Envio mais obrigadas a: Joaquim Viana Neto, pelas dobras das esquinas filosóficas_Sandro Ornellas, pelo desvio que adulterou o destino desta correspondência_ Camilo Domingues, pelo entendimento metodológico que me impele_Élida Lima, voz com que li o que escrevi_Pedro Soledade, interseções que se estendem em nós_Leticia Montenegro, palavras (e) partidas_ Ângela Vasconcelos, porto de minhas incertezas, que me provocou a confiar nelas e não ancorar_Luiza Cardoso, minha primeira leitora_Ricardo Muniz Fernandes e Érico Peretta, pelas n–1 edições, em especial a Isabela Sanches, mensageira do avesso destas cartas_A tant@s outr@s que me foram e serão remetentes e destinatári@s, minha gratidão. Maruzia Dultra (Salvador, 1980) é jornalista, mestra em Artes Visuais e doutora em Difusão do Conhecimento com pós-doutorado em Literatura. Atua como pesquisadora do corpo em investigações que abrangem a palavra, a imagem e o pensamento. Escreve cartas desde criança, mas estas são as primeiras publicadas.