IA * A
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CTAS
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M A US
Cartas (não) filosóficas
Maruzia Dultra
IA * A
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E
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CTAS
R
M A US
Cartas (não) filosóficas
Maruzia Dultra
A chuva desmanchava a cidade e era preciso, então, refazê-la. Esta era a tarefa do pintor. Ele reunia
suas tintas e pincel para inventar a aquarela urbana. Começava pelo céu – ele acreditava que era
lá onde as casas e tudo se sustentavam, e não no chão. E assim, com uma arquitetura própria, ele
pintava, pintava, pintava... Fazer as coisas era fácil – seu revés era quando chegava a vez dos seres.
Tinha ideias, intuições, planos, mas eles eram sempre mais surpreendentes. Surgiam, ganhavam
vida e tinham suas próprias vontades. Diante de todos esses novos seres, o pintor se encantava.
Hesitava se, a eles, alguma coisa precisava ensinar. A mínima lição que fosse: não beber água para
não dissolver. Mas, entre os seres, havia um professor. Ele haveria de ofertar as aprendizagens
necessárias. O que não se sabia é que era um professor de filosofia, cheio de copos d’água.
Para Peter
uma carta a(guarda) a poesia do instante
fetiche de papel
Imprimir a carta: Tocá-la pela última vez: Dobrá-la: Colocá-la num envelope: Tomar nota de seu endereço:
Ir até o correio: Preencher o campo de destinatário: Temer que ela não chegue: Pedir uma correspondência
com aviso de recebimento: Pagar a postagem: Ir embora de mãos vazias: Sentir um pouco de
arrependimento: Pensar em embargar o carteiro: Impedi-lo imaginariamente de seguir o caminho: Querer
evitar um desastre: Mas já ser tarde demais: Ter novamente um impulso de coragem: Acreditar que fez
o que tinha que ser feito: Não olhar para trás: Deixar que o liame seja suficientemente solto
para que ele não se solte: Liberá-lo dos medos: Voltar a crer no inadvertido: Deixá-lo pulsar:
Entrar num estado agudo de felicidade pelo ato: Ter consciência do abismo: Aceitar um possível
silenciamento: Respeitá-lo: Sem que isso configure uma desistência: Não duvidar do método: Lembrar de
não duvidar: E: Imprimir a carta: Tocá-la pela última vez: Dobrá-la...
carta
um
Professor,
Timidamente inicio esta pesquisa propondo-lhe uma interlocução. Sei que é exigir muito – pois
hoje não há tempo o bastante para cartas – mas precisava tentar. Aqui estou.
Você entendeu algo muito delicado: a busca por uma imagem que possa sentir, com a leveza que
daí se requer. Talvez tenha compreendido antes mesmo de mim. Falar de uma imagem que sente, que é
a pele... O desafio agora será percorrer veredas para que possa alcançar a aparição de um corpoimagem,
mesmo ainda não sabendo muito bem o que isso quer dizer. Vou continuar pelo exercício do pensamento,
tendo como horizonte seu toque e olhar.
Recebo da lógica da sensação, como quase um conselho, a ideia de um olho que toca, uma imagem
tátil. Me parece uma sutil conquista para essa intuição que insisto em perseguir. Muitas vezes considero-a
inatingível, mas aí me vejo, diante do espelho, ou através dos outros, e percebo que há, sim, uma imagem.
Que essa imagem tem um contorno, que esse contorno tem uma superfície, que essa superfície contém
uma derme... E, de novo, se Artaud jamais desiste de seguir seu trabalho singular
sobre o apocalipse do corpo, aqui há uma afirmação (possivelmente distinta ou mesmo oposta):
o corpo como imagem.
Ou talvez essa aparição seja de uma ordem que eu não consigo ainda apreender. Pois não é a
imagem, ela mesma, uma superfície não escavável? [Ler Didi]. Já o corpo humano é de outra natureza:
tem profundidades, circunvoluções, entranhas... Há todo um emaranhado nele aninhado. (A pretensão
começa a apresentar suas contradições; vejo que não será um percurso tão óbvio – e era disso mesmo que
precisava me livrar).
...
Não ter o que dizer, não saber como... De fato, a bibliografia é muito magra. Ainda não atingi
este ponto de não-estilo. Por onde ir? Quais fronteiras cruzar? Ao mesmo tempo, tudo é tão
claro quando você diz: Não a vida vivida, mas o invivível da vida. É isso. Por que duvidar
do dispositivo? Se o que devemos fazer na escrita é da ordem do impossível, comecemos por ele – este
método: inconcebível. Embora tenha sido tão recorrente nos idos antigos, talvez não coubesse entre nós.
No entanto, eis-me aqui. Fugindo mais uma vez, tentando escapar... deixando que escape...
...
E o que é o invivível?
...
Sinto vontade de me tatuar a frase, mas uma tatuagem interna, nas vísceras. Ela é mântrica; meu
amuleto: Não a vida vivida, mas o invivível da vida.
...
Você me ensinou coisas indizíveis. Outras você disse. Como pude viver tanto antes desse encontro.
...
De uma vida que explode quando toco paragens inimagináveis... Posso tocar o próprio toque – Mas como
fazer isso, não é demasiado abstrato? Não, é real, só que de uma realidade outra. É entrar
num outro mundo... E tudo que poderia ser absurdo torna-se plausível – aquilo que era inadvertido
invade, mostra-se como possibilidade, sim, um campo de im/possibilidades, que se misturam... É diante
disso que este novo corpo se faz: desejado e urgente. Como pude viver tanto antes dele.
Percebo, então, que a finalidade é outra. (Mais uma vez, o planejamento se vai represa abaixo...)
Há uma necessidade de conexão, tão imprescindível quanto a de respirar. Tomo coragem de voltar
a seus escritos (evitei durante semanas temendo o que isso poderia causar – uma saída inescapável).
E o que primeiro encontro é: Um livro é isto. Me pergunto como posso ter lhe ensinado que
1 livro é + do que 1 livro... Através de minhas corpografias? Releio: Um livro é isto. Quem sabe
você tenha exagerado, por questão de ênfase; porém resisto em acreditar na banalização da proporção.
Um livro é isto.
Já nas primeiras linhas sou golpeada. De novo, a poesia. (Sustentarei?) Prefiro seguir o risco. É
inevitável continuar a leitura, ir pulando de uma seção a outra, ao sabor da livre escolha – embaralhar
suas palavras, querer achar aquele trecho que preciso copiar e não ter a lembrança de onde ele está...
Rabiscar, ter de novo o canal aberto no qual, em tudo aquilo que leio, vejo o pulsar da nova empreitada.
Tudo se relaciona, como uma espécie de magia. Ou, quando começa a não interessar, pulo de página, às
vezes várias, volto às anteriores, vou ao sumário, traço novas rotas, releio minhas passagens preferidas...
É como te passear. Assim vai se tecendo nossa nova comunicação. Na sua voz e nos seus silêncios:
O que escreve é de câmara.
Por isso tive medo de recomeçar. Mas, agora, em meio à sua caligrafia e vacúolos, apreendo o
quanto preciso deles. Aliás, a cada encontro, eu já sabia. Como pude viver tanto. Sentir o inominável.
Inadvertidamente. Não fazer um projeto, mas favorecer a ampliação do gesto... Talvez seja
isso, apenas isso. Estabelecer a relação, se fazer nela. (Sustentarei?) E, mais uma vez, estar exposta à mais
perigosa das aventuras, colocando tudo inteiramente em xeque, desafiando distâncias inaproximáveis...
É um trabalho de reticências. Voltar à escritura através de correspondências, ter a sua audiência
como se tem um segredo.
E começo a senti-lo: o agir que abre para a iniciativa, para os gestos
inadvertidos, sem finalidade... No fundo, esta carta é isso. Desmoronar novamente o estatuto
de pesquisadora, desconfiar dele, levá-lo a seu próprio limite até torná-lo incabível... Insistir no
método da intimidade, deixá-la encontrar-se, querê-la. Sem que isso represente um empreendimento.
...
Mas e a “aparição” prometida?
...
...
Será na e pela distância que buscarei avistá-la. Sob a distância longínqua de seus dedos.
(Se o êxodo impôs o íntimo estrangeiro de um diário, agora, o regresso à terra natal impele o dispositivo
das cartas). Sob a distância ínfima de seus dedos, descobrir uma construção no exato momento de
seu erguimento. Ou: a constatação da fissura simultaneamente a seu alargamento. São apostas.
E nada disso é sem receio, embora ele não impeça a completa entrega.
fetiche de papel aos pedaços
Imprimir a carta: Tocá-la pela última vez: Dobrá-la: Colocá-la num envelope: Tomar nota de seu endereço:
Ir até o correio: Preencher ERRADO o campo de destinatário: Temer que ela não chegue: Pedir uma
correspondência com aviso de recebimento: Pagar a postagem: Ir embora de mãos vazias: Sentir um pouco
de arrependimento: Pensar em embargar o carteiro: Impedi-lo imaginariamente de seguir o caminho:
Querer evitar um desastre: Mas já ser tarde demais: Ter novamente um impulso de coragem: Acreditar
que fez o que tinha que ser feito: Não olhar para trás: Deixar que o liame seja suficientemente
solto para que ele não se solte: Liberá-lo dos medos: Voltar a crer no inadvertido: Deixá-lo
pulsar: Entrar num estado agudo de felicidade pelo ato: Ter consciência do abismo: Aceitar um
possível silenciamento: Respeitá-lo: Sem que isso configure uma desistência: Não duvidar do método:
Lembrar de não duvidar: E: RECEBER a carta...?????
...
Desabar por ter de volta nas mãos o envelope lacrado: Tentar encontrar explicações: A carta foi devolvida:
Porque não tinha o número do apartamento: Pior: Porque se recusou a abri-la: Sequer, recebê-la: Demorar
três infindáveis minutos para entender o que aconteceu: Ter um alívio instantâneo: Rir: Não acreditar no
próprio feito: Rir muito: Achar graça da assustadora displicência: No segundo seguinte, me dar conta
da terrível possibilidade de que chegue a suas mãos o cartão laranja do ‘aviso de recebimento’: De uma
correspondência que jamais escreveu: Jamais imaginou existir!: Desesperadamente buscar o número
rastreador para tentar identificar qual remetente registrado na agência: Dias depois, ter o sossego da
entrega do documento em minha residência: De não ter cometido o erro ao extremo: De ter me livrado do
absurdo, ao menos perante você.
...
...
Seguir o lembrete inicial: Insistir no envio: Quase repetir o erro: Ser alertada pela irmã caçula:
Preencher com cuidado milimétrico o novo envelope: Ter saudade da caligrafia que tinha: Que agora
é, incontrolavelmente, trêmula: Fazer a nova postagem: Sair do correio com a coragem renovada: Sentir
suavidade para prosseguir as tarefas cotidianas: Calcular o dia da real chegada da carta: 02 dez. 2013:
E, por um grande acaso, descobrir: Você viajará: Na véspera desta data: Para o Japão!
carta
dois
Professor,
Escrevo, já, sem saber de sua receptividade. O que objetar dessa mais concreta experiência? Há
uma intuição de que há algo a ser dito. Algo a ser escutado. Por isso persisto.
“Ele vai responder?” – foi o alcance máximo de uma colega diante do desafio. E me dei conta
do abismo que há nele: estar inteiramente vulnerável a um simples silenciamento... Ou ser considerada
inconveniente, algo do tipo... É que não interessa (exatamente) se a carta terá uma resposta – é de sua
constituição ser despretensiosa, embora haja no sentido das correspondências a expectativa da troca.
Mas é que ela já está acontecendo. Como aquela música belíssima de Clarice... acontece mesmo no
silêncio – pelo silêncio... Porque é de câmara.
Aos poucos, com o avanço da leitura, começo a entender aquilo que me disse quando estava
diante de seus mais de cinco mil livros... (Uma paisagem inesquecível). Que alguns filósofos até
partem do íntimo, mas para atingir outro âmbito; não se trata da vida diária, ela não importa, embora,
como zombou Kafka, esta é a única que temos! É difícil tal apreensão – filósofa que não era,
que não sou! Mas parece que estou atingindo um ponto mais claro de compreensão, não tenho pressa,
nem ansiedade – não tenho prazos para dar conta desta vez... A escritura de agora usufrui de outra
esteira: o vasto campo da vontade. Estar nela, por ela. Aquela liberdade, que deveria ser o princípio de
todo pensamento que se pretende invenção.
Porém há certo constrangimento, em balbuciar bobagens ainda não elaboradas... Só que nisto
mesmo reside a potência do que estou buscando. (A escrita volta a ser reativa, mas não posso parar; é
preciso continuar, até que aquela voz volte a me atravessar...)
Retomemos a questão da “aparição”. Existem motivo e intenção em não a chamar de “aparecimento”, pois
ela resguarda uma fluidez, aqui considerada necessária – o triz de ser uma manifestação súbita;
presença momentânea. Suspeito que nisso esteja a singularidade do corpoimagem. Embora tenha
falado, da outra vez, em afirmação (do corpo como imagem), há algo neste caminho que nega o fixo,
que não admite a rigidez.
(Mas o quê?)
...
...
Você encontra um corpo, você descobre um corpo, de repente o corpo se encontra
lá, destacado da pessoa, da palavra, do contexto, dos sentidos, da história,
da paisagem. Nesta catástrofe, um corpo é sempre estranho e estrangeiro com
sua opacidade inatingível, inexaurível, irredutível. a realidade dada através
do corpo rompe com a significação. O corpo é essa ruptura inqualificável. Ele
é esse estranho começo e recomeço que pode colocar em questão um pouco de
tudo, o pensamento, a narração, a significação, a comunicação, a história: ele
introduz uma catástrofe no tempo que flui. O corpo como ruptura implica um
aspecto partido do tempo, evocando uma imagem rompida.
...
Voltar à gênese de um corpo desconhecido é um grande salto. Como pude viver tanto. – Encontrar o corpo.
Tocar o corpo. Isso me toca muito. É um casamento muito profundo. Casamento para dizer encontro.
O corpo dos filósofos. Isso também me toca muito. – E, desde lá, já havia uma pergunta suspensa,
junto às orelhas-fantasma que nunca mais pararam de ecoar: Aquela imagem de apocalipse do corpo
que respondia algo – mas o quê, o quê?
contando sobre
Como saber, era uma outra língua:
.
O que nos unia era o estudo do corpo – tão pouco? Eu não teria condições de alcançar. Me restava
apenas dividir um pouco do pouco que tenho. Fiz um esforço hercúleo para conseguir,
finalmente, explicar minhas corpografias. Ao meu passo hesitante, o amigo arguto e contundente
ordenou: “A esta altura, você tem que saber responder!”
Acuada pela obrigação, segui em frente naquela tentativa, já frustrada, de explanação.
Foi um instante infinito dizer para você que um corpo poético é um corpo do pensamento. Foi
infinito também ver você concordar. E: Isso
me
toca
muito. Quis este átimo para sempre.
Ou ‘para nunca’, é o mesmo. Daquele verbo nuncar...
Em seguida, veio a avalanche do livro de areia. Kuniichi era o sopro do vento que não cansa
de assoprar – e já o deserto sobre mim. Por um momento, fui arremessada para muito longe, combalida
– a força daquela conjunção não parecia mais sustentável... E você, muito delicadamente, percebeu
meu lapso e argumentou como se quisesse me resgatar para o entorno: LEVE a areia do livro!
Sim, foi você quem disse isso! Fiz questão de tomar nota desta frase-conselho, que foi uma saída risível:
nem se afundar, nem estar à margem – carregar os grãos consigo, para fazer o livro. Tempestades do
deserto são mortíferas como as tormentas, mas não precisa se afogar. Nem em água, nem em terra. Leve.
A leveza de uma gota, de um grão. Deixar o vento levar. . . .
.
.
Alcançamos alguma espécie de cintilação – assustadora, fugidia... E você, no final da leitura de
sua carta (a número zero desta série...?), se confunde com as palavras que escreveu. As aspas perdem o
lugar, se desajustam diante do que está aí nos atingindo... Como findar isto que é imenso, sem ter nem começo?
A pesquisa de uma vida. Inapreensível como aquele sopro – a chama – a chave. A chave perdida. A chave que sequer
existe. algo que é impossível procurar, encontrar e tampouco, talvez, perder. Por
isso não se termina. Viver a duração de outros mundos. Dentre todos os ondes, estar em nenhures. Insituável.
Também não sei de quem são essas palavras... Na época, respondi prontamente “Sou eu!”, mas,
no fundo, não tinha o que dizer. As corpografias inteiras foram tecidas através. Conversação silenciosa,
porque é de câmara. Cada aula, uma música; cada página, um sussurro. Lembro como se fosse hoje
do dia em que conheci: uma pergunta irrespondível. E, mais uma vez, compulsivamente anotei
no caderno. Era o título que precisava para a suposta conclusão.
(Ainda estou amalgamada?)
Procurei como a um enigma pelo conto fantasmático daquela noite milincontável... e assim o
desvendei: descobri que, como na estória, minhas próprias orelhas haviam sido apagadas! E foi por isso,
surda para o desfecho do músico sem orelhas, que eu havia criado seu avesso: orelhas flutuantes sem
corpo... uma desaparição? (Ou finalmente um corpoimagem?) Encontrei também a flutuação itinerante de
Lafcadio Hearn entre a Grécia, Irlanda, EUA, Japão... onde finalmente se tornou Koizumi Yakumo, irmão
de pátria de Kuniichi. E nós, desertados.
Estar sem-lugar, você previa, lendo a kartamiga kafkiana. (“Você é um profeta!”, lembra
muito esse comentário engraçado que li sobre você na internet!) Eu ouvia aquilo tudo, com os anseios e
temores do retorno... Sabia que ia acontecer, embora não planejasse quando. E foi abrupto, sem mediações.
Não houve tempo para despedidas, nem ritos de passagem, simplesmente aconteceu. Como se eu
tivesse sido expurgada.
(Mas para onde?)
Há tempos não estava mais lá, nem aqui; essa sensação de não ter lugar... Levar ao limite
a palavra que você gostou de conhecer: nenhures. Eu também não conhecia, aprendi com as heterotopias:
algures, alhures e nenhures, achei linda a trilogia! E, apesar de tantas possibilidades, não saber onde
colocar o corpo... Isso me toca muito. Queria tocar.
presente
sem ciência
nem filosofia
estás
carta
três
Professor,
Me ocorreu uma nova ideia: voltar a escrever com imagens. Fui provocada por aquela colega:
“Por que você não faz um trabalho prático com dançarinos?” Não cogitava retornar à dança, nem ao
vídeo... No entanto, diante da instigação dela, lembrei imediatamente que Kuniichi desenvolve seu
trabalho numa estreita relação, justamente, com dançarinos e seus escritos de pele-pensamento...
sobretudo para pensar e repensar o que é o corpo − a vida vivida pelo corpo.
Talvez seja, de fato, um caminho.
Faz quatro anos que as sensações não são mais audiovisuais... Algum vídeo morreu em mim.
(e nasceu um livro) (tenho sido parida por ele). Porém já começa a parecer um bom artifício. Passar
da escritura das páginas à tela. Voltar a ela. Vídeo-cartas. Relembro da ideia apaixonante: O vídeo é
de fato um estado do pensamento das imagens, uma forma que pensa. Como
eu me deleitava... Buscava texturas, promovia ligações, tinha nisso uma caligrafia. Feita de filigranas.
Como o corpoimagem?
...
Pressinto um lampejo.
...
Ações entregues ao vídeo – e a elas, ele.
A lente destacando da pele ainda mais imagem;
alguma vida a um só tempo recortada e ampliada. Tornada vídeo.
...
Ela trabalhava caminhando e, de tempos em tempos, estacava bruscamente, procurando
num de seus bolsos profundos um caderninho de pele; videografava nele um pensamento,
uma frase, uma palavra, um lembrete, um mundo, e, fechando o caderno, retomava
sua corrida com mais intensidade. Essa era sua maneira de compor. Mais de uma
vez, ouvimo-la exprimir o desejo de caminhar na vida ao longo de uma imensa
tirinha que se enroscava atrás dela, na qual ela gravaria as imagens que lhe viessem
na estrada, de maneira a formar no final do caminho uma única tela.
...
...
Começo a elaborar uma carta institucional, na qual tenho que declarar por tarefa a “correspondência
estabelecida ficcionalmente com um filósofo”. É doído atingir os limites ilusórios desta relação.
Rapidamente, entretanto, uma rubra chama se faz presença e me chama – retomo a crença de
ser fictícia: é talvez a maior expressão e função da criação artística.
Desejar ser ou parecer, mesmo que por momentos, um outro, ou desejar que o
mundo seja outro.
...
Uma experiência é sempre uma ficção.
...
(Mas essa não?)
enquanto dura poesia
(recado de peu)
ser-rocha, ser-muro, ser-chão
montanha, barro, pó
outros mundos de pedra
Pierre Pietro Petrus Pedro
nele encontrei corrente
m
m
m
m
m
m
nem a ele
e
mas não de prender-me
é correnteza de jorrar
m
m
m
m
m
.
...vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai
mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e
e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem
e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav
vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e
ev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev
vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem
e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav
vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e
ev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev
vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem
e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav
vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e
ev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev
vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem
e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav
vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e
ev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev
vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem
e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav
vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e
ev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev
vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem
e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav
vai e vemcartas
vai e náuticas
vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e
iav mev e iav iav mev e iav mev e iav mev e iav mev
vem vai e vem vai e vem vai e vem vai vai e vem vai e
ev e iavouve
meva earquitetura
iav mev edos
iavmares?
mev e iav mev e iav mev
vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem
e iav mevenquanto
e iav mese
v edespede,
iav mevconvida...
e iav mev e iav mev e iav
vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e
ev e iav mev e iav... mev e iav mev e iav mev e iav me
vem vai e vem vai e vem vai e vem ...vai e vem vai e vem
e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e ia
vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e
ev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav me
vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem
e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e ia
vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e
ev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav me
vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem
e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e ia
vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e
ev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav me
vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem
e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e ia
vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e
ev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav me
vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem
e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e ia
vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e
..mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav mev e iav me
vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem vai e vem...
cartas náufragas (poeminha profundo)
ter nas mãos
todas as cartas
e não saber lê-las
todas terão
um mesmo fim:
pro fundo...
cartas náugrafas I
a escrita por um fio
de lágrima
um copo
uma gota d’água
viva
ou
morta
procura-se
desaparição
uma centelha
tu chamas
cinzas
na dobra da esquina (não) filosófica
os encontros promovidos por acaso e destino
magicamente simultaneamente!
aumentam a certeza
de que há cravada em minha pele
uma língua ancestral que nos conecta
por isso as adivinhações pregressas
as linhas
os rebentos
coincidências que revelam
como que certa irmandade
será esta
filosoficamente
uma amizade?
descartada
no trâmite das correspondências
não sei se fiquei ou fui deixada
se devolvida ou extraviada
cartas náugrafas II
Estar à deriva não é não ter direção: é estar à mercê das correntes do mar – e do ar (mesmo sem
resquício de mastros e velas...); é não ter motor próprio ou tê-lo desligado; é deixar-se marear,
embarcar na onda, entrar numa. É derivar novas rotas: caminhos imprecisos para quem não
conhece suas cartas... (náuticas!) ou não sabe lê-las (cartas náufragas!) – é fazer-se outro na
mesma embarcação, sedenta por chuva, mas nem tanta, querente de ilha ou continente, um
porto, um abrigo quase qualquer – é liberar-se da navegação... E quando a luz do farol ao longe
enfim
aponte,
s a b e r
- s e
d o
h o r i z o n t e
q u e
g u a r d a
o
l a d o
d e
l á
cartas ao mar
Reencontro tuas Cartas ao Max, que vira e mexe roubo para mim, desmoronadamente
n’Élida... Uma lágrima não resiste à pequena e devastadora lembrança de que,
n’algum lugar desta Terra, ela vive sem mim. Lembro de ter aprendido estes dias que
maré, em tua terra natal, é a distância entre dois pontos: Mar–É. Mas é improvável
que estejas lá, o que me impede ainda de calcular. O quanto eu precisaria nadar
ou remar para te alcançar? Me restam estas cartas ao mar, que me envio como
se fosse a ti
– reverberando tua língua, teu ritmo, tua entonação toda única...
Assim, simplesmente, vou lançando oferendas a Iemanjá, torcendo que um dia – ah,
um dia... – Élida há de me escutar!
Mar
sempre
repetindo:
tu,
tu,
tu.
água-viva
se a vê em mim,
saiba-se inundação
deste ser-tão mar
demora
carta
quatro
Professor,
Demora é um depoimento de presença. O retorno à tela foi sugador, como se nunca eu tivesse
saído. Voltar a você. Como se nunca tivesse existido antes disso.
...
Alguns instantes inauditos. Como esse meio-olhar que não se diz mais do que pode. O tempo passa
então a ser concebido não mais como linha, mas como emaranhado, não como rio,
mas como terra, não fluxo, e sim massa, não sucessão, porém coexistência, não
um círculo, mas turbilhão, não ordem, e sim variação infinita, de modo que não
se trata mais de remetê-lo a uma consciência – a consciência do tempo –, mas
à alucinação. Uma demora mais. Um olhar inteiro.
...
Sou um corpo que se arranca célula a célula para com elas fazer as letras; aquela boneca que lhe pareceu
espantosa, assustadora, terrível... Talvez seja essa a gênese de um corpo desconhecido
no corpo de cada um: Nós descobrimos, no interior de nosso corpo, o dançarino que
trabalha nosso corpo. Passos largos. Um salto de quinze quilômetros. Uma realidade
abismal, uma existência abissal.
...
...
Deixei minha pele nas corpografias, por isso desapareci (“transitoriamente”, você me acalentou), (des)
fiz minha pele com elas – despelada. Era isso o que essa palavra-poema queria dizer. Alguns instantes
inauditos. O tempo selvagem. Como esse meio-olhar que não se diz mais do que pode. Uma demora
mais. Um livro que é mais do que um livro. Um olhar inteiro.
...
...
um corpo mais selvagem que o tempo
...
Já podemos ao menos arriscar uma conclusão provisória. é preciso aqui
tomar o termo imagem também nesse sentido que ameaça Platão – a imagem sem
semelhança. No caso do corpo, simplesmente isto: uma imagem que não remete a
um modelo, que lhe é insubordinada, já que esse modelo é um Outro, e essa
imagem é movida pela dessemelhança, é ela mesma dessemelhança. seríamos
tentados a perguntar: seria essa determinação imagética tão essencial ao
corpo a ponto de, para que seja pensado, seja preciso passar por aquela? há
um tipo de imagem, que nada tem a ver com a cópia, pois justamente é rebelde
à cópia e ao modelo, que no seu devir-louco produz um afundamento universal.
eis onde se assiste, através da imagem, à implosão da imagem, onde um
corpoimagem pode liberar um ‘corpo em pessoa’.
...
Mas, afinal, um professor é um professor e um livro é um livro. [E por que recear distâncias
entre nós que nunca poderiam nos separar?] Eu, apenas uma aluna. Não sou escritora, não
sou filósofa, não sou psicóloga, não sou médica, não sou artista... Uma coleção de negativas de existência.
A vida inteira que podia ter sido e não foi.
Mas, afinal, um professor é um professor e um livro é um livro. Eu, apenas uma aluna. [E por que
recear distâncias entre nós que nunca poderiam nos separar?] Não sou escritora, não
sou filósofa, não sou psicóloga, não sou médica, não sou artista... Uma coleção de negativas de existência.
A vida inteira que podia ter sido e não foi.
Mas, afinal, um professor é um professor e um livro é um livro. Eu, apenas uma aluna. Não sou escritora,
não sou filósofa, não sou psicóloga, não sou médica, não sou artista... [E por que recear distâncias
entre nós que nunca poderiam nos separar?] Uma coleção de negativas de existência. A vida
inteira que podia ter sido e não foi.
Mas, afinal, um professor é um professor e um livro é um livro. Eu, apenas uma aluna. Não sou escritora,
não sou filósofa, não sou psicóloga, não sou médica, não sou artista... Uma coleção de negativas de
existência. A vida inteira que podia ter sido e não foi.
...
descolorações afetivas
os cinzas das cinzas
...
A um poeta, é irresistível outro.
...
guardado aguardo
...
Biografias igualadas por um mesmo final
...
3 perpendiculares
3 pontinhos
[o mundo se trifurca]
...
Embarques furtivos que podem não dar em nada (mas às vezes dão)
...
É ao mesmo tempo que alguém não tem mais a chave (quer dizer que a tinha), ainda
a tem (não a havia perdido) e a encontra (quer dizer, ele a terá e não a tinha).
...
Pergunta-arremesso: Como pude viver tanto antes desse encontro.
...
...
Todas as coincidências que me levaram (até) você devem ser escritas.
...
O início do curso de filosofia era uma trama de pensamentos sediados em lugares longínquos
(para mim) de cuja existência eu jamais havia ouvido falar. Saía desses
encontros com a sensação de ter sido levada por um tufão. Eu me dizia o
tempo todo: serei incapaz de resumir o que ouvi, se mal entendo do que estão
falando. algo, enfim, que eu atribuía (para facilitar minha posição) à distância
geracional intelectual. Não sabia como conseguiria escrever, o que quer que
fosse, à altura da experiência.
...
o que
...
...
Duas pessoas se conhecem, mas já se conheciam e não se conhecem ainda.
...
Matiz temporal de sua demora: ao invés de uma linha do tempo, tem-se um emaranhado do
tempo; em vez de fluxo do tempo, veremos surgir uma massa de tempo; em lugar de
um rio, um labirinto do tempo. Ou ainda, não mais um círculo do tempo, porém um
turbilhão, já não uma ordem do tempo, mas variação infinita, nem mesmo uma forma
do tempo, mas um tempo informal, plástico. Com isto estaríamos mais próximos,
sem dúvida, de um tempo da alucinação do que de uma consciência do tempo.
...
um mar de ondas sem destino, de inconclusões, de buscas.
...
O infinitivo que finalmente chegou – como demorou. Ser Mar, labiríntico como o deserto. Em suas
continências mútuas do guardar: marulho oceânico e coral. Um corpoimagem.
...
Onde algo se retarda
espera
hesita
É nesse hiato que nasce algo como a subjetividade...
No retardamento que há entre o que me provoca
e o que eu emano a partir dessa provocação
...
Houve, ainda, uma época nas aulas em que você se demorava mais que o habitual... Talvez sentisse,
mesmo de longe, aquela viva inquietação. Você estendia o olhar em gestos largos...
...
Um amarelo, um vermelho, dois azuis
...
Alguma coisa que se perde
...
Tem algo que não chega
mas, de algum modo, está
...
Tem o tempo das células –
contra o qual não adianta querer
acelerar, nem atrasar.
...
Escrever todas as cartas como se fossem a primeira – inaugural:
Je recommence tout,
d’ailleurs je ne finis jamais de recommencer
...
Aguardar sua resposta como quem espera o retorno de uma partida
(embora seja eu que esteja voltando)
aviso
de recebimento
Professor,
Encontrei um professor aqui, filosofia com sotaque soteropolitano. Dendêleuze! Ele
estuda a imagem do corpo na cidade. Talvez ele dissesse de outra forma, radicalmente outra,
mas é assim que posso reportar, por ora. Na lacuna “Assunto:” do rascunho, nem sei como
nomear aquilo que quero lhe escrever (uma mensagem instantânea que chegará primeiro a ele
que esta carta a você!) Muitos são os pontos que eu preciso dizer, mas vou tentar diluí-los no
tempo, que, espero, teremos.
P.S. Há uma infimidade – ínfima intimidade!
Mal o conheço, e já sei o nome de seu avô!
(depois descubro: de seu bisavô!):
Joaquim Antônio Rodrigues Viana
efêmera fronteira
o hífen que nos separa
desejo ultrapassar
professor-alunar
Do poeta em desespero
à sua amada
cala-me
Da amante em desespero
ao seu poeta
carta-me
nãocarta
Professor,
Você provoca: Cartas Roubadas. Não sei onde, nem como procurá-las; também não sei como, mas
as encontrei... Encontrar é achar, é capturar, é roubar, (...). Roubar é o contrário
de plagiar, de copiar, de imitar ou de fazer como. O roubo é um duplo-roubo, tal qual
o devir – sempre duplo –, e o movimento infinito, não há senão uma dobra de um outro; não
é algo de mútuo, mas um bloco assimétrico... uma imagem em sua segunda potência? o duplo
golpe da imagem da imagem... Também duplo professor, uma dupla!
Vide o chamado da não-carta, seu avesso em papel. O vazio que a vida contém: vi(d)e... Não
um silêncio, nem mesmo um silenciamento (como noutrora), mas uma afasia. Algo que ensurdeceu,
como murmurou ela depois de sua quinta carta ao poeta. Ligeiramente suspeito: a poética epistolar tem
um prazo de validade? Depois disso, ela não escreveu mais uma sequer. Vieram bilhetes, conversas,
entrevistas, outras conversas, convite – não mais cartas. Por isso, a princípio, não me preocupei. Ela
também se perguntava quem havia escrito aquelas epístolas! Quem haveria de voltar para salvar o
trabalho cuja promessa metodológica é de uma interlocução epistolar?
...
Uma criança não brinca para transmitir algo para os adultos ou para outras
crianças. Só os adultos não param de se preocupar em transmitir algo. As
pessoas pensam sempre em um futuro majoritário (quando eu for grande, quando
tiver poder...). Quando o problema é o de um devir-minoritário: Uma criança
brinca para brincar o seu brinquedo. não fingir, não fazer como ou imitar a
criança, o louco, a mulher, o animal, o gago ou o estrangeiro, mas tornar-se
tudo isso, Inédito. para inventar novas forças ou novas armas. Inédito como
o nunca dito, nunca publicado. É como na vida. Cartas vazias. Há na vida uma
espécie de falta de jeito, de fragilidade da saúde, de constituição fraca, de
gagueira vital que é o charme de alguém. Enigmas. O charme, fonte de vida, como
o estilo, fonte de escrever. Enigmas. (...) Só que o charme não é de modo algum
a pessoa. É o que faz apreender as pessoas como combinações e chances únicas que
determinada combinação tenha sido feita. É um lance de dados necessariamente
vencedor, pois afirma suficientemente o acaso, ao invés de recortar, de tornar
provável ou de mutilar o acaso. Dobras em páginas de um caderno-caixa que se des)(faz. Por
isso, através de cada combinação frágil é uma potência de vida que se afirma,
com uma força, uma obstinação, uma perseverança ímpar (...). A criança brinca
para afetar a si mesma, o bebê sorri a sós no berço. Não são pessoas, mas a
cifra de sua própria combinação. (...). Que experiência incrível o bebê está
fazendo? É a um só tempo que o charme dá à vida uma potência não pessoal,
superior aos indivíduos, e que o estilo dá à escritura um fim exterior que
transborda o escrito. É uma experiência invisível. (...) A escritura tem por
único fim a vida,
através das combinações que ela faz.
um fio a vida,
E não faz,
desfaz,
refaz
...
Tive medo de esquecê-lo. (Jamais poderia supor tamanha distração! Traição quase, de minha memória a
toda pele-pensamento...) Por isso fui atrás de seus grãos de existência, linhas escritas, e encontrei tantos,
tantos fios... a costura adivinhada... Uma aparição! A trama de tua voz, minha armadilha confessa... – Minha
ou tua? – se me enreda, se me enredo... Quando, então, lembrei que podia te ouvir literalmente. Uma
porta, muitas, múltiplas, núpcias imperativas do entre: tu(a)-palavra-chave, que logo quis compartilhar
com o melhor orientador que estas cartas poderiam ter. A não-carta também.
carta
cinco
Professor,
Tanto tempo e meio depois, volto a estas linhas minhas que são tuas. Muitas perguntas se
passaram; outras ficaram e ressoam: O que é o invivível? Quase sem querer, descubro que é invivível
viver sem você. Como conviver com esta ausência espectral e sobreviver a ela? Incorro em zonas
limítrofes de tal condição, nas quais posso te encontrar, te encontro. A ressoar a perplexidade de
Espinosa, quantas... O corpo humano tem necessidade, para conservar-se, de muitos
outros corpos, pelos quais ele é como que continuamente regenerado. Quantos...?
Ausento uma página do livro: descolo, desloco, para fazer estas costuras de pele-pensamento. (Será
que olharás para a tua com saudade da minha?) Eis, pois, que (te) escrever é já a minha forma de
provocar tua aparição.
parto da palavra
bilhete
carta
seis
Professor,
Como se nalguma pele tocasse, escrevo... Um encontro que me engolfa, quando acreditava ser eu
a envolver... Escrevo para talvez nunca revelar. Escrevo para talvez nunca publicar, nunca ter mais que
um leitor.
Em busca de uma aparição, constato que o corpoimagem é a pele da palavra poética – a superfície
tátil e sensível da materialidade da poesia? Sim, se por essa matéria entendemos o corpo da escrita poética.
De novo, sempre, os dois aspectos, relembro a ironia com o risível do pensador, que procura pelo
corpo do incorpóreo, como se eles pudessem existir um sem o outro... Não estou sozinha nesta tarefa de
“corpação”, outrora você me alertou como um alento.
Há tempos me persegue a ideia de um corpo invivível (mesmo com tantas e tamanhas
possibilidades que há de vida...!). E um amigo afetuosamente me indaga o que é esse invivível. A resposta
é falível... Como dizer-lhe? Como dizer-lhe tudo sem parecer pueril? O invivível sou eu. Como um bom
conhecedor de mim que era, julguei que ele entenderia a explicação econômica. Mas sabe que até hoje eu
mesma me pergunto?
O invivível da vida é a necessidade do impossível (Percebe a função do muro?, você tornaria a
perguntar). Um impossível necessário para que novos possíveis sejam criados, para que o mundo seja
reinventado, porque a vida não basta. É por esse invivível que respiro, é por ele que escrevo, por ele te
escrevo na esperança de que você seja tocado por esta palavra-pele que tento conceituar agora como
corpoimagem.
Mas, se o invivível é intocável, por que quero tocar na palavra poética e, assim, lhe constituo
uma derme? Por que insisto no “toque” como operador conceitual? A imagem poética talvez amenize o
abismo, constituindo a superfície tátil e sensível da materialidade da poesia... A imagem poética é a
outridade, ouço-a outrando um estar em Paz. Uma pele que escapa a uma “imagem fidedigna”,
uma aparência im?possível, desviada, transgredida. Como esta tese, que é toda um desvio.
Estou à deriva. Percebo que há tempos estou à deriva. E você, com sua voz dérmica, murmura:
A palavra, que em geral designa a ausência da coisa, ao formar poema, designa
esta ausência e ao mesmo tempo a presença dessa ausência. Fico me perguntando
se é uma presença fictícia, de fragilidade extrema, ao tempo em que vejo nascer uma consistência...
A situação é cada vez mais crítica, porque a ficção se torna cada vez mais real. Já não há mais o contorno
da realidade – tudo parece fazer sentido, eu busco esse sentido, eu encontro.
Esse algo a se realizar é o corpoimagem – e, por agora ele se tornar real, é como se eu também
tivesse... É vivífico. Finalmente explicitar essa intuição, conceituá-la e, então, preciso voltar atrás sobre
o nunca revelar. Pois há, sim, uma revelação. Até para mim. Não porque o corpoimagem tivesse uma
existência prévia e eu a tenha descoberto. Não, ele foi criado. Mas é que é difícil falar do que se intui. São
lampejos que assombram. Na deriva, para a deriva... cujo guia de leitura está no poeminha profundo:
ter nas mãos
todas as cartas
e não saber lê-las
todas terão
um mesmo fim:
pro fundo
Saber ler as cartas é se deixar derivar, assim como o é compreender a aparição do corpoimagem. Eu poderia
dissertar durante páginas... no entanto há algo que escapa à tentativa tola de explicá-la. Mas
insisto, quem sabe em forma de poema funcione melhor... Falar da palavra poética através dela própria:
presente
sem ciência
nem filosofia
estás
Colho este poema como um presente para o corpoimagem, esse é o seu título, mas talvez devesse chamálo mesmo de aparição. Por causa de sua presença sub-reptícia, seu ser-pele profusa que se constitui no
corpo da escrita poética, a palavra como poro, que faz sentir a poesia... Enquanto você faz poesia em
prosa: A palavra poética não se dirige para a segurança de uma presença, como
a palavra bruta, mas para a presença de uma ausência, para o aparecimento de
‘tudo desapareceu’ que ela tematiza.
...
Inventei uma Dermoteca, mas fiz desaparecer o corpo humano... fugi dele mais uma vez, a criação me
fez escapar. Como uma válvula? (O corpo médico tornou-se artístico, o diário de corpo tornou-se do
pensamento, e agora o corpoimagem torna-se pele da palavra poética...). Há, aí, uma superação do “bio”
– para além ou mesmo aquém – em plena época do “vale tudo” concedido ao corpo biológico e da vida
toda medicalizada. Caberia ainda ecoar a perplexidade de Spinoza: O que pode o corpo? E,
na esteira desta indagação, adulterá-la: O que pode o corpoimagem?
O que pode essa pele que se forma de modo abrupto, ao mesmo tempo que sutilmente? O que pode
essa camada que é visível, porém intocável? O que pode essa película – sensível? Talvez não seja aquela
imagem que sente, como afirmei na primeira carta... Nem seja a superfície tátil que afirmei no início
desta... A imagem poética é a superfície intocável da poesia. Ela é o outro da palavra poética. Seu duplo.
Sua dupla.
Lembro da primeira vez que me veio
cabelos longos, pele-jambo
como se já soubesse o caminho
ou adivinhasse
O secreto é que ele não existia
você o fazia enquanto andava
um percurso todo seus pés
Captei seu desencontramento
me senti morada nesse estado-mundo
para então lhe descobrir desabitada
Escalei seu olhar estrangeiro
seu riso escondido
sua alma calada
Por isso silenciosamente lhe quis
no hiato em que nenhuma palavra cabe
e por sobre ele atravessamos nosso amor-malabaris
A fresta que nosso encontro rasgou no mundo
Talvez sejamos ela, desafiando a solidão cósmica,
a incomunicabilidade e a distância entre dois. entre duas.
a conjugação que impelimos.
a lacuna, a ausência, o precipício.
Perto da palavra poética, posso até sentir o cheiro da pele que é o corpoimagem. Ele me toca, mesmo não
sendo tocável – tamanha façanha é a sua! Mas, como pesquisadora, seria preciso investigar esse toque...
Aliás, pela (po)ética da deriva, o mais importante não é me deixar ser tocada? Toda a ficção acadêmica
pede que o pesquisador observe, analise, descreva, etc, quando talvez o que lhe seja primordial é sentir.
E eu sinto, eu sinto muito, quando você diz: A palavra poética (...) não remete ao mundo.
Este, junto com suas finalidades, diante dela recua e se cala. Fazer recuar e calar
o mundo... Este é o feito da palavra poética, enquanto sua pele se aproxima... Para tocar. E escutar a pele
do outro. Mesmo que seja para escutar apenas seus silêncios...
carta
sete
Professor,
Que há entre a ausência presente e a presença ausente que as liga tão indiretamente e
intimamente? De um lado, está o estatuto paradoxal da palavra poética: faz as coisas
desaparecerem e faz aparecer esse desaparecimento numa fulguração noturna. Do
outro lado, está você enquanto meu destinatário – imaginário? Entre os dois, esta fina liga que se forma,
uma pele...
Se quando te escrevo, é como se nalguma pele tocasse, é o corpoimagem a aparecer. Sorrateiramente,
cortante... Seu clarão nos ensina tudo de uma vez. Não é todo mundo que pode suportá-lo, nem todos que
podem vê-lo. É preciso um pacto, uma sutileza. É preciso um entendimento que não se aprende: apenas
se sente. Nasce-se com ele; por ele, vive-se.
Que pele tem uma força assim, tão intensa? É para chegar no outro... Todo esse esforço é para
o outro alcançar. Vale variar a língua, até inventá-la. O poeta é o inventor de línguas desnecessárias.
Um ofício das inutilidades (porém de que valeria a vida sem ele?)
O poeta não tem um dia a dia. É uma vida a vida, Clarice tem mil vezes razão.
A derme do poema é permeada de vasos gramaticais, seu circuito sanguíneo possui a pulsação
latente dos sentidos, as células são palavras que respondem à sintaxe de cada verso... E em
cada
palavra pulsa um coração. Se disse da outra vez que fugi do corpo humano, é porque ainda não
tinha visto de tão perto o visível do corpoimagem. Embora invivível. Embora intocável. Embora Artaud
jamais desista de seguir seu trabalho singular sobre o apocalipse do corpo.
o avesso das cartas
Estas Cartas (não) filosóficas são fruto
da aparição, em 2013, do livro O avesso do
niilismo: cartografias do esgotamento,
do filósofo Peter Pál Pelbart.
Um exemplar da publicação,
lançada em São Paulo, chegou-me como
presente em Salvador através do correio.
O mote da correspondência com o
Professor Peter foi desdobrado
na pesquisa de doutorado “Vídeo-cartas
(não) filosóficas: percurso de aparição
de um corpoimagem“, desenvolvida
entre 2015-2018 no Doutorado Multiinstitucional e Multidisciplinar em Difusão
do Conhecimento (DMMDC-UFBA), com
bolsa de estudos Fapesb e orientação
do Professor Joaquim Viana Neto.
postada depois da hora
No percurso de aparição de um corpoimagem,
Maruzia Dultra não se furtou em encontrar na transdisciplinaridade solo fértil e
vigoroso para o pleno desenvolvimento
de sua pesquisa. Seu trabalho envolve
estudos críticos primorosos no campo da
imagem e no campo da poética da escrita,
soerguendo múltiplas referências que vão
se aproximando, intimamente, na medida
exata que as singulares tessituras da tese
se formam. Essas aproximações referenciais são desenhadas enquanto arranjos
plurais e são capazes de formar um corpo de tese heterogêneo e indeterminado,
que permite ao leitor atravessar novas
estruturas que até então poderiam ser
forjadas – e mesmos fixadas – pela ação
capitular adotada. O desenvolvimento da
tese acontece no vir a ser “próprio e apropriado” das relações entre corpo da(e)
escrita (corpo criado e corpo adulterado),
corpoimagem – conceito este estruturante
para a pesquisa – e vida vivida para tecer
o invivível da vida. A pesquisa, portanto,
faz-se enquanto artesania da(s) própria(s)
vida(s) que segue(m) seus encontros entre
cartas e vídeo-cartas (não) filosóficas, entre
qualificações e recusas, entre defesas e
escutas, entre criações fortuitas e outras
duradouras, entre a imagem que cabe e
aquela incabível, entre a borra da imagem
e a tese que se consuma, entre o consumo
da imagem da tese e a formação dos seus
duplos, entre os tempos de feitura e a sua
espera, entre a espera do tempo e o seu
adormecimento, entre o parecer e o (des)
aparecer da vida que se tese. Dessa forma,
esta publicação segue o ritmo dos (des)
encontros que são próprios das pesquisas
e que se efetivam no vigor das entregas,
sejam elas parciais e/ou finais. Daí trazer
a público, anos depois, esta correspondência, a fim de que ela ganhe novos destinatários que adensem a trama temporal
que é este livro.
Salvador, 14 jan. 2019
Joaquim Viana Neto
pppombo-correio
É com enorme satisfação que aceito o convite de dar eco a seu trabalho, e o faço na
forma mais condizente com uma das formas que você adotou – a saber, a epistolar.
Sim, esse modo epistolar que atravessa
este livro, e que toma como destinatário,
amiúde, um tal de ppp, e que cita seus
livros ou fragmentos de aula, não poderia deixar-me indiferente. Mas não pela
vaidade ou orgulho, e sim pela surpresa
em acompanhar como você aproveita as
vozes que te tocam e mobilizam, como
você as incorpora e as põe para funcionar,
a serviço de uma questão que te inquieta
e conduz a sua pesquisa para outros lugares. Portanto, entendi que esse ppp é um
personagem a mais entre outros tantos
que você fabricou, e que você toma como
intercessor para elaborar a questão que te
obseda. Sendo assim, esta “carta” não é
uma resposta às cartas que você enviou
a esse ppp, mas o modo que encontrei de
pensar junto ao movimento que propõe
seu trabalho, sem tomar a posição extrínseca e neutra, supostamente científica, que
sabemos todos, nada mais é que uma ficção acadêmica. Eu me permito, ademais,
revisitar um trecho da arguição de seu
mestrado, defendido há anos atrás, pois
vejo uma continuidade e uma coerência
na sua trajetória de pesquisa surpreendentes. Aqui reproduzo um fragmento
da minha arguição na época: Esse é um
trabalho de metamorfose. Não é uma pesquisadora tomando por tarefa debruçar-se sobre
um objeto, nem mesmo realizar um projeto,
uma obra, uma pesquisa. É colocar-se inteiramente em xeque no ato da pesquisa, expor-se
a ela, mas saber que essa pesquisa ela mesma
só pode dar-se, na sua radicalidade, caso tenha
por matéria-prima precisamente essa existência, a metamorfose dessa existência, a pele
desse vivente que nela se empenha… Não há
como não enxergar que seu trabalho atual
é um prolongamento, um aprofundamento, uma ampliação, uma radicalização da
pesquisa anterior. Mas sua pesquisa ganhou um fôlego, uma amplitude, uma
audácia admiráveis. Os interlocutores se
multiplicaram, os pensadores convocados também. Os planos de experimentação igualmente se ampliaram, os procedimentos inventados, e a escrita ganhou em
delicadeza e inventividade, as cartas (não)
filosóficas se consolidaram como um meio
expressivo, um método de prospecção.
As perguntas se pulverizaram como cartas, por cartas, soltas em páginas que se
esbarrarão em algo ou alguém e pararão.
A pergunta feita por você será respondi-
da a outro, ou por outro, mas não importa
que pergunta e resposta não se encaixem,
importa que ambas tenham existido. Ao
longo desses anos, recebi seus presentes
como o (a)guarda-carta, ou a pequena lousa, ou outros tantos, e não entendia bem
do que se tratava, mas criavam um curto-circuito no meu cotidiano – e só ao ler
sua tese entendi que eles já eram parte
dessa pesquisa que incluía esse exercício
de pombo-correio. Sou-lhe grato por tudo
o que vi e li, pelo modo como você usou o
pouquinho que aprendeu comigo para alçar seu voo próprio com os instrumentos
que você mesma fabricou, produzindo
um movimento esplêndido, de grande alcance, que me leva para muito mais longe
do que eu mesmo acreditava ser possível.
São Paulo, 23 mai. 2017
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______. Curso de Filosofia
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cartografias do esgotamento. São
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______. O tempo nãoreconciliado: imagens de
tempo em Deleuze. São Paulo:
Perspectiva, 2007. (col.
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______. O tempo nãoreconciliado. In: ALLIEZ, Eric
(Org.). Gilles Deleuze: uma vida
filosófica. São Paulo: Ed. 34,
2000. p. 85-97. (col. TRANS)
______. Vida capital: ensaios
de biopolítica. São Paulo:
Iluminuras, 2009.
RANGEL, Sonia. Olho desarmado:
objeto poético e trajeto
criativo. Salvador: Solisluna,
2009.
SPINOZA, Benedictus de. Ética.
3ª ed. 1ª reimp. Belo Horizonte:
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UNO, Kuniichi. A gênese de um
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n – 1 edições, 2012. Trad.
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In: UNO, Kuniichi. Artaud et
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– Faculdade de Vincennes,
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VIANA NETO, Joaquim. L’art
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dépositions. In: MARTIN, Pascal;
SOULAGES, François (Org). Les
frontières du flou. Paris:
L’Harmattan, 2013. v. 1. p. 187-194.
postagens
fetiche de papel 06
carta um 07
fetiche de papel aos pedaços 13
carta dois 16
presente 23
carta três 24
enquanto dura poesia 27
(recado de peu)
sem título 28
cartas náuticas 29
cartas náufragas 30
(poeminha profundo)
36 cartas ao mar
37 água-viva
38 demora
40 carta quatro
51 aviso de recebimento
52 efêmera fronteira
53 carta-me
54 não-carta
58 carta cinco
59 parto da palavra
60 bilhete
cartas náugrafas I 31
61 carta seis
desaparição 32
68 carta sete
na dobra da esquina 33
(não) filosófica
descartada 34
cartas náugrafas II 35
70 o avesso das cartas
71 postada depois da hora
73 pppombo-correio
76 extravios
Este livro é livre para ser acessado,
copiado, adulterado e distribuído, sem a
necessidade de permissão prévia. Obras
derivadas devem manter a mesma licença.
Imagens
Frames do vídeo “Demora” (2010-2013),
de Maruzia Dultra junto ao Grupo Ecoarte
Desenho “Pelegrafia costurada” (2012),
de Branca de Oliveira
Foto da autora
Pedro Soledade
Ectate occat vollam doloris temperum qu
Realização
LABOR.POET.CO
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Agradeço @s autor@s que aqui estão,
nomead@s ou não, pelas palavras que roubei
com o desejo de torná-las minhas também.
Envio mais obrigadas a: Joaquim Viana Neto, pelas
dobras das esquinas filosóficas_Sandro Ornellas, pelo
desvio que adulterou o destino desta correspondência_
Camilo Domingues, pelo entendimento metodológico
que me impele_Élida Lima, voz com que li o que
escrevi_Pedro Soledade, interseções que se estendem
em nós_Leticia Montenegro, palavras (e) partidas_
Ângela Vasconcelos, porto de minhas incertezas, que
me provocou a confiar nelas e não ancorar_Luiza
Cardoso, minha primeira leitora_Ricardo Muniz
Fernandes e Érico Peretta, pelas n–1 edições, em
especial a Isabela Sanches, mensageira do avesso
destas cartas_A tant@s outr@s que me foram e serão
remetentes e destinatári@s, minha gratidão.
Maruzia Dultra (Salvador,
1980) é jornalista, mestra
em Artes Visuais e doutora
em Difusão do Conhecimento com pós-doutorado
em Literatura. Atua como
pesquisadora do corpo em
investigações que abrangem a palavra, a imagem e o
pensamento. Escreve cartas
desde criança, mas estas são
as primeiras publicadas.