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Ex spe in spem: da Lei da Ficha Limpa para onde?

2022, Ex spe in spem: da Lei da Ficha Limpa para onde?

SOBREIRA, Renan Guedes. Ex spe in spem: da Lei da Ficha Limpa para onde? In: MACHADO, Raquel Cavalcanti Ramos; SILVA, André Garcia Xerez. A Lei da Ficha Limpa Passada a Limpo. Fortaleza: Mucuripe, 2022.

DA LIMPA passada a limpo Organizadores Raquel Cavalcanti Ramos Machado André Garcia Xerez Silva A LEI DA FICHA LIMPA passada a limpo Organizadores Raquel Cavalcanti Ramos Machado André Garcia Xerez Silva Prefácio Volgane Oliveira Carvalho Autores Alisson Emmanuel de Oliveira Lucena Kelvin Peroli dos Luiz Ana Claudia Santano Carlos Santos Gonçalves Luiz Eduardo Peccinin André Garcia Xerez Silva Bruno César Lorencini Paula Bernadelli Daniel Falcão Rafael Vieira de Alencar Desirée Cavalcante Ferreira Raquel Cavalcanti Ramos Machado Eneida Desiree Salgado Renan Guedes Sobreira Glauco Costa Leite Tiago Asfor Rocha José Edvaldo Pereira Sales Wagner Wilson Deiró Gundim Walber de Moura Agra José Wellington Bezerra da Costa Neto Juliana Rodrigues Freitas Editora Mucuripe Fortaleza 2022 Esta obra está sob os direitos da Creative Commons 4.0 https://creativecommons.org/licenses/by-sa/4.0/deed.pt_BR A lei da ficha limpa: passada a limpo 1ª edição Raquel Cavalcanti Ramos Machado André Garcia Xerez Silva (Org.) Editora Mucuripe Conselho Editorial André Parmo Folloni Arno Dal Ri Junior Daniela Leutchuk de Cademartori Danielle Annoni Denise Lucena Cavalcante Germana de Oliveira Moraes Gisele Cittadino Hugo de Brito Machado Segundo João Luís Nogueira Matias João Ricardo Catarino Juarez Freitas Marcelo Cattoni Marciano Seabra de Godoi Marcos Wachowicz Maria Vital da Rocha Martonio Mont’Alverne Barreto Lima Paulo Caliendo Roberto Alfonso Viciano Pastor Capa, Editoração e Revisão Álisson José Maia Melo Fotografia: Gustavo-Leighton. National Congress of Brazil (2020) Dados internacionais de Catalogação na Publicação L525 A lei da ficha limpa: passada a limpo / Organizadores: Raquel Cavalcanti Ramos Machado e André Garcia Xerez Silva — 1. ed. — Fortaleza: Mucuripe, 2022. Vários autores. 321 p. : 21 cm. ISBN-13: 978-65-87966-24-3 1. Direito Eleitoral - Brasil. 2. Inelegibilidade – Brasil. Poder Judi ciário - Brasil. I. Machado, Raquel Cavalcanti Ramos. II. Silva, An dré Garcia Xerez. CDD 342.0781 SUMÁRIO SOBRE OS AUTORES............................................................................ 5 LISTA PREFÁCIO DE ABREVIATURAS E SIGLAS........................................... 11 .............................................................................................. 15 Volgane Oliveira Carvalho 1 CORRUPÇÃO, MORALISMO E LEGITIMIDADE DO PROCESSO ELEITORAL À LUZ DA LEI DA FICHA LIMPA: uma radiografia das eleições suplementares de 2021 no Estado do Ceará ........................................................................... 17 André Garcia Xerez Silva 2 BREVES REFLEXÕES SOBRE OS 10 ANOS DA LEI DA FICHA LIMPA: princípio da não culpabilidade e detração do prazo de inelegibilidade ................................................................. 51 José Wellington Bezerra da Costa Neto Glauco Costa Leite 3 A INELEGIBILIDADE POR REJEIÇÃO DE CONTAS APÓS O PLP Nº 09/2021 .................................................................. 81 Luiz Eduardo Peccinin 4 OS INFLUXOS DA NOVA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA NO ARQUÉTIPO DAS INELEGIBILIDADES .................................................................... 101 Walber de Moura Agra Alisson Emmanuel de Oliveira Lucena 5 A MORALIZAÇÃO DA POLÍTICA E SEUS IMPACTOS NA LIBERDADE DE ESCOLHA DOS CANDIDATOS: uma análise da Lei da Ficha Limpa pela perspectiva jusfilosófica do ideal democrático em Aristóteles ................... 127 Bruno César Lorencini Wagner Wilson Deiró Gundim 4 A LEI DA FICHA LIMPA passada a limpo 6 ENTRE A ÉTICA MÉDICA E A VIDA POLÍTICA: diálogos entre a atuação do médico candidato com as hipóteses de inelegibilidade.................................................... 147 Daniel Falcão Kelvin Peroli 7 LEI DA FICHA LIMPA, ONZE ANOS DEPOIS: o leito de Procusto e o princípio da proporcionalidade ..........169 Eneida Desiree Salgado Ana Claudia Santano 8 INELEGIBILIDADE, REJEIÇÃO DE CONTAS E IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA: provocações a partir da Lei nº 14.230/2021 .....................................191 José Edvaldo Pereira Sales Juliana Rodrigues Freitas 9 EX SPE IN SPEM: da Lei da Ficha Limpa para onde? .............. 207 Renan Guedes Sobreira 10 A LUTA PELA MORALIZAÇÃO POLÍTICA COMO PRETEXTO PARA RESTRIÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS.......................................................................... 237 Paula Bernardelli 11 A LEI DA FICHA LIMPA E O PARADOXO DA LEGITIMIDADE PARA A PARTICIPAÇÃO NA VIDA POLÍTICA ........................................................................................ 257 Raquel Cavalcanti Ramos Machado Desirée Cavalcante Ferreira 12 UMA DEFESA DA LEI DA FICHA LIMPA ..............................275 Luiz Carlos dos Santos Gonçalves 13 NOVA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA E INELEGIBILIDADES: apontamentos sobre a possibilidade de aplicação retroativa das normas de prescrição intercorrente e remessa necessária e seus reflexos no processo eleitoral ........293 Tiago Asfor Rocha Rafael Vieira de Alencar CAPÍTULO 9 EX SPE IN SPEM:1 da Lei da Ficha Limpa para onde? Renan Guedes Sobreira2 INTRODUÇÃO “Vivei como irmãos e irmãs, deixando-se conduzir pelo Espírito de Deus, rompendo com as cadeias do pecado e do egoísmo”, foram as palavras dirigidas pelo Papa João Paulo II à Igreja Católica brasileira por ocasião do lançamento da Campanha da Fraternidade de 1996, prosseguindo com: “no vosso País, possuído de inegáveis valores, aberto à solidariedade e ao mútuo respeito, existe, às vezes, certa crise de confiança nas Instituições. É preciso reagir, baseando-se nos valores da honestidade, da retidão, e da dedicação generosa ao bem-estar da Comunidade”.3 A Campanha da Fraternidade de 1996, capitaneada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) tinha como tema “Fraternidade e Política: justiça e paz se abraçarão”. Decorrente da campanha, em 2002, criou-se o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE),4 que tem como objetivo “combater a corrupção eleitoral, bem como realizar um trabalho edu cativo sobre a importância do voto visando sempre à busca por um 1 2 3 4 Fórmula latina que se pode traduzir como “De esperança em esperança”, frequen temente utilizada pela Igreja Católica, sendo o lema do cardeal brasileiro Paulo Evaristo Arns. Mestre em Direito Constitucional, Centro de Estudios Políticos y Constitucionales de la Presidencia de España e Universidad Internacional Menéndez Pelayo, Madri, Espanha. Pós-graduado em Direito Parlamentar, Universidad Nacional Autónoma de México, D.F., México. Bacharel em Direito, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, Brasil. Vice-Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Parlamentar. As sessor Jurídico do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. CNBB. Campanha da Fraternidade 1996. Disponível em: https://campa nhas.cnbb.org.br/campanha/fraternidade1996. Acesso em: 26 de jan. 2022. MOVIMENTO DE COMBATE À CORRUPÇÃO ELEITORAL. Quando foi criado. Disponível em: http://www.mcce.org.br/quando-foi-criado. Acesso em: 26 de jan. 2022. 208 Ex spe in spem cenário político e eleitoral mais justo e transparente”.5 A parceria entre a CNBB e o MCCE gerou forte movimento na sociedade no sentido de moralizar o processo eleitoral, recolhendo 1.604.815 assinaturas de apoio ao projeto que viria se tornar a Lei Complementar n. 135/2010 (LC 135), alcunhada de Lei da Ficha Limpa.6 Da Campanha da Fraternidade à promulgação da LC 135 se pas saram catorze anos. Da promulgação da LC 135 até a atualidade, vão se mais de dez anos. A realidade internacional mudou, assim como a nacional, e as modificações nessa última modificada fazem necessário perquirir se as condições materiais que ensejaram a edição da LC 135 persistem, se o propósito moralizador foi atingido ou não a fim de que se prospecte a atividade legislativa dos próximos anos. Este artigo apresenta as condições políticas, jurídicas e sociais que levaram à edição da LC 135; e aquelas referentes ao momento pos terior, isto é, com a vigência da norma. A partir desse comparativo, pretende-se aferir se a lei complementar tem cumprido o papel que lhe foi atribuído, de moralizar a atividade política nacional. 1 UT OMNES UNUM SINT:7 A FASE PRÉ-LEI DA FICHA LIMPA Ut omnes unum sint, isto é, “de modo que todos sejam um”, é expressão latina frequentemente utilizada pela Igreja Católica, lema do cardeal brasileiro Orani Tempesta. A fórmula sugere unidade de propósitos e ações visando o atingimento de um único objetivo, o que bem caracteriza o contexto que antecede e envolve a edição da Lei da Ficha Limpa. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), na década de 1990, cerca de 89% da população brasileira se 5 6 7 MOVIMENTO DE COMBATE À CORRUPÇÃO ELEITORAL. Objetivo. Disponí vel em: http://www.mcce.org.br/objetivo. Acesso em: 26 de jan. 2022. MOVIMENTO DE COMBATE À CORRUPÇÃO ELEITORAL. Lei Complementar 135/2010 (Lei da Ficha Limpa). Disponível em: http://www.mcce.org.br/leis/lei complementar-1352010-lei-da-ficha-limpa. Acesso em: 26 de jan. 2022. Fórmula latina que se pode traduzir como “De modo que todos sejam um”, fre quentemente utilizada pela Igreja Católica, sendo o lema do cardeal brasileiro Orani Tempesta. SOBREIRA, Renan G. 209 declarava cristã, católica romana, evangélica ou de outras denomina ções.8 Já em 2000,9 cerca de 74% da população brasileira se declarava católica romana e outros 15%, evangélicos, totalizando, aproximada mente, 89% de seguidores do cristianismo. No ano de 2010, católicos somavam 65%; e evangélicos, 22%; totalizando 87% de brasileiros e brasileiras cristãos. Assim, plausível afirmar que as Campanhas da Fraternidade de senvolvidas pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil desde 1964, com pioneirismo da Arquidiocese de Natal,10 atingem fática e moralmente grande parcela da população brasileira. Os temas adota dos são variados, transitando de questões relativas à preservação do Meio Ambiente, ao racismo, à desigualdade agrária e, também, à cida dania e participação política. Sobre a última temática apontada, em 1970 foi lançada a campa nha “Ser Cristão é Participar”, na qual se afirmava que “muitos são os perseguidos políticos e exilados” e que “à Igreja coube mergulhar no escuro dos tempos para reacender fachos de reflexão e incentivo à par ticipação política”.11 Destacava-se o contexto da Ditadura Militar (1964-1985) e o ufanismo nacionalista com o tricampeonato mundial de futebol conquistado pelo Brasil como elementos entorpecedores da consciência social. Em 1978, foi posto o tema “Trabalho e Justiça para Todos”, asse verando que “sim: é impressionante, hoje, o número dos sem-trabalho e o daqueles que, trabalhando, sofrem por falta de justiça”.12 Destacou se que a participação na sociedade é o caminho para a justiça social, geradora de trabalho e renda. No ano de 1996, o lema “Fraternidade e Política: justiça e paz se abraçarão” explicitou a necessidade de participação política. Repri sando um dos objetivos fundamentais da República do Brasil (art. 3º, I da Constituição de 1988), a CNBB estabelece como meta a “formação IBGE. Séries Históricas e Estatísticas: religião. Disponível em: https://seriesesta tisticas.ibge.gov.br/series.aspx?vcodigo=POP60. Acesso em: 4 fev. 2022. 9 IBGE. Atlas do Censo Demográfico 2010. Disponível em: https:// censo2010.ibge.gov.br/apps/atlas/pdf/Pag_203. Acesso em: 4 fev. 2022. 10 CNBB. Campanha da Fraternidade. Disponível em: https://campa nhas.cnbb.org.br/campanha-da-fraternidade. Acesso em: 4 fev. 2022. 11 CNBB. Campanha da Fraternidade de 1970. Disponível em: https://campa nhas.cnbb.org.br/campanha/fraternidade1970. Acesso em: 4 fev. 2022. 12 CNBB. Campanha da Fraternidade de 1978. Disponível em: https://campa nhas.cnbb.org.br/campanha/fraternidade1978. Acesso em: 4 fev. 2022. 8 210 Ex spe in spem política dos cristãos para que exerçam sua cidadania sendo sujeitos da construção de uma sociedade justa e solidária”, a fim de eliminar a existência de “certa crise de confiança nas Instituições”.13 A questão foi ligeiramente recuperada em 1998, quando a cam panha “A Serviço da Vida e da Esperança” estabeleceu como propó sito “estimular o exercício da cidadania em favor de uma sociedade justa e solidária”, que seria construída a partir da garantia de “forma ção integral para a solidariedade e a cidadania”.14 Entre essas duas campanhas, “Comissão Brasileira Justiça e Paz (CBJP) órgão vinculado da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), lançou o Projeto ‘Combatendo a corrupção eleitoral’ em feve reiro de 1997” e “assim, era plantada, em 1998, a semente da iniciativa popular contra a corrupção eleitoral”.15 Politicamente, a década de 1990 no Brasil se iniciara com a elei ção de Fernando Collor à Presidência da República, que havia ocu pado o cargo de Governador do Estado de Alagoas e se notabilizara na imprensa como “O Caçador de Marajás”, em referência à prática de sua gestão de combater salários elevados no setor público. Collor fi zera campanha presidencial com o mote da mudança, da oportuni dade de o povo – em antagonismo aos políticos tradicionais, profissi onais – governar.16 Pouco tempo após a posse, o Governo Collor passa a receber acusações de que seus integrantes, inicialmente os de segundo escalão, estariam envolvidos em casos de corrupção. O crescente acusatório en volve o Presidente da República em 1992, abrindo-se Comissão Parla mentar Mista de Inquérito a fim de investigar as imputações. Presidida pelo Deputado Federal Benito Gama, contando com Vice-Presidente o Senador Maurício Correa, a CPMI foi relatada pelo Senador Amir Lando. Chama a atenção a presença como titulares dos Campanha da Fraternidade de 1996. Disponível em: https://campa nhas.cnbb.org.br/campanha/fraternidade1996. Acesso em: 4 fev. 2022. 14 CNBB. Campanha da Fraternidade de 1998. Disponível em: https://campa nhas.cnbb.org.br/campanha/fraternidade1998. Acesso em: 4 fev. 2022. 15 MOVIMENTO DE COMBATE À CORRUPÇÃO ELEITORAL. Quando foi criado. Disponível em: http://www.mcce.org.br/quando-foi-criado. Acesso em: 26 de jan. 2022. 16 Um de seus jingles de campanha deixava isso bastante claro: https://www.you tube.com/watch?v=qbBOsICP0ME 13 CNBB. SOBREIRA, Renan G. 211 Deputados Federais José Dirceu e Roberto Jefferson, que seriam per sonagens importantes pouco tempo depois.17 O relatório final da CPMI foi lido e aprovado em 26 de agosto de 1992, incriminando o Presidente da República e outras pessoas. Seis dias depois, foi apresentado pedido de impeachment de Collor, o que se consuma em 30 de dezembro daquele ano, com a declaração de inabi litação para o exercício de função pública, por oito anos, obtida com 76 dos 81 votos do Senado da República. Itamar Franco, então Vice-Presidente, assume a Presidência da República e realiza, ao término do mandato, a transição política ao Go verno de Fernando Henrique Cardoso, que fora Ministro das Relações Exteriores e Ministro da Fazenda da Presidência Franco. O governo FHC foi marcado pela estabilização da nova moeda, o Real, e, especi almente, pelas privatizações “envolvidas em denúncias de corrup ção”.18 Apresentada a Emenda Constitucional a fim de permitir a ree leição presidencial, essa foi aprovada em meio a “denúncias de com pra de votos de congressistas pelo governo FHC”.19 De todo modo, Fernando Henrique foi reeleito em 1998, sendo sucedido politicamente por Luiz Inácio Lula da Silva em 2002, o qual logrou reeleição em 2006. A linha política do Partido dos Trabalhadores, de Lula, foi mantida por Dilma Rousseff, eleita em 2010 e reeleita em 2014. Embora o país tenha gozado de estabilidade política nesse período, fazendo a transi ção governamental sem sobressaltos, esses anos foram marcados por denúncias e investigações de casos de corrupção. Conforme levantamento,20 entre 1990 e 2004 funcionou a cha mada Máfia dos Vampiros da Saúde, operação na qual era desviado “dinheiro público fraudando licitacões para a compra de derivados do sangue usados no tratamento de hemofílicos”; entre 1998 e 1999 foi DOS DEPUTADOS. 20 anos do impeachment do Collor. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/plenario/discursos/escre vendohistoria/destaque-de-materias/20-anos-do-impeachment. Acesso em: 4 fev. 2022. 18 SCHWARCZ, Lilia M.; STARLING, Heloisa M. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015, p. 631. 19 SCHWARCZ, Lilia M.; STARLING, Heloisa M. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015, p. 631. 20 LIMA, Cláudia. Os maiores escândalos de corrupção do Brasil. Disponível em: https://super.abril.com.br/mundo-estranho/os-maiores-escandalos-de-corrupcao do-brasil. Acesso em: 5 fev. 2022. 17 CÂMARA 212 Ex spe in spem desviada verba da Superintendência de Desenvolvimento da Amazô nia (SUDAM), envolvendo 143 acusados, entre eles o Senador Jader Barbalho, que renuncia ao mandato a fim de não o ter cassado pelo Conselho de Ética e ficar inabilitado;21 em 2006, a Máfia dos Sangues sugas foi descoberta, cumulando um desvio de mais de cento e qua renta milhões de reais por meio do superfaturamento de ambulância, mas nenhum dos 3 Senadores ou dos 70 Deputados Federais foi res ponsabilizado; em 2007, a Operação Navalha na Carne desbaratou es quema de fraude a licitações relativas ao Programa de Aceleração do Crescimento. Um dos casos mais emblemáticos do período talvez seja o Escân dalo do Mensalão. O destaque que merece se deve não ao montante de recursos desviado ‒ já que a cifra é bastante maior noutros casos ‒ mas às circunstâncias de descoberta, apuração e, especialmente, às conde nações. Em junho de 2005, durante o primeiro Governo Lula, o Depu tado Federal Roberto Jefferson, que integrara a CPMI contra Collor de Mello, denuncia o esquema pelo qual, segundo ele, parlamentares re ceberiam quantias mensais ‒ uma mensalidade aumentada, um men salão ‒ a fim de votar a favor dos projetos de interesse do Poder Execu tivo federal. José Dirceu, que também integrara a CPMI contra Collor de Mello, então Chefe da Casa Civil, foi apontado como o mentor do esquema. Parte da verba seria captada por meio de propina paga por privados a Marcos Valério, publicitário, que se encarregaria da distri buição dos valores ‒ o chamado valerioduto. A fim de diluir os montantes e assim chamar menos atenção, fo ram utilizadas diversas empresas públicas ‒ Furnas Centrais Elétricas S.A., Eletrobrás Eletronuclear, Petrobrás, Empresa Brasileira de Cor reios e Telégrafos (EBCT) ‒, empresas privadas ‒ DNA Publicidade, Banco Opportunity, SMPeB, Banco Rural, BMG ‒, além de contar com pagamentos a jornalistas da grande mídia, encarregados de divulgar notícias positivas sobre o governo. À medida que as investigações avançavam, autoridades foram sendo removidas de seus postos ou entregando o cargo voluntaria mente. Em junho de 2005, por exemplo, toda a diretoria da EBCT deixa Barbalho renuncia ao mandato no Senado em 2001. Em 2003 é eleito Depu tado Federal pelo Pará, cargo que ocupa até 2011, quando é eleito novamente ao Senado da República, onde permanece atualmente. 21 Jader SOBREIRA, Renan G. 213 da a direção empresa. No mesmo mês, José Dirceu entrega o cargo de Ministro Chefe da Casa Civil. Até o final de 2005, quarenta e nove au toridades deixaram seus postos. Roberto Jefferson, ao depor ante o Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, depoimento que durou mais de seis horas, afirmou: “Ô Zé Dirceu, se você não sair daí, rápido, você vai fazer réu um ho mem inocente, que é o Presidente Lula. Rápido, sai daí rápido, Zé, para você não fazer mal a um homem bom, correto, que tenho orgulho de ter apertado a mão”.22 Reiterando que o Chefe do Poder Executivo fe deral desconhecia o esquema, Jefferson prossegue afirmando “A gente não passava do Zé Dirceu. Eu entendi: porque o Presidente Lula abraça a gente assim e deixa a gente abrir o coração. Não é fácil dizer o que eu disse a ele, mas eu medi a sua reação, feri um inocente e sei que ele tomou atitude”. Jefferson, conclamando outras pessoas a delatar o que soubes sem sobre o esquema, afirmou ante o Conselho de Ética: “conte aquilo que lhe deu vontade de vomitar e que faz vontade de vomitar ao povo brasileiro”; e então: “O valor que o povo espera de nós, nós vamos construir, colocando um basta. Isso, sim, nós temos que fazer”. Se gundo o parlamentar, fazia aquilo para “lavar a honra do meu partido. Eu vou lavar a honra dos eleitores que acreditaram no PTB. Eu vou lavar a honra dos meus colegas de partido”.23 O caso ocupou diversas sessões do Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal, no ano de 2012, sob relatoria do Ministro Joaquim Barbosa e revisão do Ministro Ricardo Lewandowski. Compunham, ainda, a Corte os Ministros e as Ministras: Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Cézar Peluso, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Carlos Ayres Britto. Cézar Peluso e Ayres Britto se aposentaram no curso da votação, de modo que não votaram sobre a 22 CÂMARA DOS DEPUTADOS. Conselho de Ética e Decoro Parlamentar: processo nº 1 de 2005. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_ mostrarintegra;jsessionid=3BED999E2A98F3123BD021A203753A4F.proposi coesWebExterno1?codteor=335813&filename=Tramitacao-REP+28/2005. Acesso em: 7 fev. 2022. 23 CÂMARA DOS DEPUTADOS. Conselho de Ética e Decoro Parlamentar: processo nº 1 de 2005. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_ mostrarintegra;jsessionid=3BED999E2A98F3123BD021A203753A4F.proposi coesWebExterno1?codteor=335813&filename=Tramitacao-REP+28/2005. Acesso em: 7 fev. 2022. 214 Ex spe in spem totalidade dos temas. O Procurador-Geral da República, Roberto Gur gel, no início do julgamento fez afirmação que repercutiu em diversos meios jornalísticos: “Creio que o Supremo fará justiça. E, na visão do Ministério Público, justiça é condenar todos”.24 Conforme dados consolidados pelo Ministério Público Federal, vinte e cinco pessoas foram condenadas no Caso do Mensalão, cum prindo penas que variaram de restrição de direitos (Emerson Eloy Pal mieri, José Rodrigues Borba) a detenção de mais de vinte e cinco anos (Cristiano de Mello Paz), mais de vinte e nove anos (Ramon Holler bach Cardoso) e mesmo mais de quarenta anos (Marcos Valério).25 A alta cúpula do Partido dos Trabalhadores foi condenada por formação de quadrilha e corrupção ativa: José Dirceu foi apenado com dez anos e dez meses; Delúbio Soares Castro, oito anos e onze meses; e José Genoíno, seis anos e onze meses. Outros membros do partido foram condenados, como João Paulo Cunha – nove anos e quatros me ses por peculato, lavagem de dinheiro e corrupção passiva –, Henrique Pizzolato – doze anos e sete meses, por peculato, lavagem de dinheiro e corrupção passiva. Durante as investigações e mesmo quando tramitava o julga mento, havia certa desconfiança social sobre o desfecho. Cerca de 60% das pessoas ouvidas afirmava que os acusados não seriam condenados ou presos.26 Posteriormente, em sede de embargos infringentes, o Su premo Tribunal Federal readequou as penas dos condenados, e “com isso, Dirceu e sua turma conseguiram escapar da pena em regime fe chado, o que gerou revolta em parte da população, diante do clima de impunidade com os criminosos de Brasília”.27 As frases famosas do mensalão. Disponível em: https://exame.com/bra sil/as-frases-famosas-do-mensalao. Acesso em: 7 fev. 2022. 25 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. Mensalão Quadro Réus Penas Final. Dispo nível em: http://www.mpf.mp.br/pgr/copy_of_pdfs/mensalao_quadro_reus_penas_final.pdf/view. Acesso em: 7 fev. 2022. 24 EXAME. CIÊNCIAS CRIMINAIS. População ainda não acredita na prisão dos condenados do Mensalão. Disponível em: https://grupocienciascriminais.blogs pot.com/2012/09/populacao-ainda-nao-acredita-na-prisao.html. Acesso em: 7 fev. 2022. 27 GHANI, Alan. E aí, STF, vai mesmo livrar Lula e outros políticos da cadeia? Dis ponível em: https://www.infomoney.com.br/colunistas/economia-e-politica-di reto-ao-ponto/e-ai-stf-vai-mesmo-livrar-lula-e-outros-politicos-da-cadeia. Acesso em: 7 fev. 2022. 26 GRUPOS SOBREIRA, Renan G. 215 do Os anos entre a denúncia do Caso Mensalão (2005) e o início do julgamento e as primeiras condenações (2012-2013) foram marca dos por verdadeiras devassas na máquina pública a fim de identificar e punir rigorosamente qualquer ato que pudesse, ainda que indiciari amente, sinalizar corrupção. Considere-se, por exemplo, o Caso da Tapioca. Orlando Silva, então Ministro do Esporte, comprara, utilizando cartão corporativo do Ministério, uma tapioca no valor de R$ 8,30. A compra foi questionada em Comissão Parlamentar de Inquérito, ainda que tenha sido reem bolsada aos cofres públicos antes da apuração.28 Naturalmente, não se trata de diminuir a importância dos atos de corrupção, malversação do dinheiro público. Pretende-se, na ver dade, enfatizar como mesmo elementos de baixa repercussão, como o Caso da Tapioca, geravam grande agitação social e política nos anos que antecederam e envolveram a edição da Lei da Ficha Limpa. Em julho de 2009, Dom Orani Tempesta comunicou que “o epis copado brasileiro, reunido na sua 46ª Assembleia Geral dos Bispos, em Indaiatuba (SP), no ano de 2008, aprovou a Campanha chamada de ‘Ficha Limpa’”. O religioso afirmava à imprensa que “as tristes situa ções que presenciamos todos os momentos pelos meios de comunica ção social nos conclamam a uma mudança de mentalidade” sendo essa a motivação da campanha, a fim de que “a legislação coíba aqueles e aquelas que não têm respeito pela coisa pública”, de “banir da vida pública aqueles que se encontram inábeis”, “impedindo-os de ascen der ao poder”.29 Anos depois, o Deputado Federal José Carlos Araújo (PSD-BA) afirma em justificativa de projeto de lei que a Lei da Ficha Limpa foi “resposta marcante de indignação da sociedade, diante das crescentes e inadmissíveis afrontas às condutas morais por parte principalmente DE SÃO PAULO. Orlando Silva diz que comprar tapioca com cartão cor porativo foi engano. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ ult96u390119.shtml. Acesso em: 7 fev. 2022. 29 TEMPESTA, Orani João. Campanha “Ficha Limpa”. Disponível em: https:// www.cnbb.org.br/campanha-ficha-limpa. Acesso em: 7 fev. 2022. 28 FOLHA 216 Ex spe in spem de maus agentes públicos, com suas repercussões negativas, sobre tudo no âmbito do processo eleitoral democrático de escolha de can didatos”.30 Segundo magistrado idealizador da Lei da Ficha Limpa, essa surge da “necessidade de impulsionar o Parlamento a estabelecer hi póteses de inelegibilidade que levem em conta a vida pregressa, o his tórico objetivo dos candidatos”, pois em matéria eleitoral “não se aplica o princípio da presunção de inocência”, que “se dirige exclusi vamente à esfera penal”.31 Segundo o magistrado, “não há obstáculo constitucional, político ou ético a impedir que preventivamente sejam 32 excluídas dos pleitos pessoas que já ostentem condenações criminais”. A norma foi sancionada em 4 de junho de 2010 pelo Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, sendo publicada no Diário Ofi cial de 7 de junho de 2010 como Lei Complementar n. 135. O Presi dente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, afirmou que “a sanção do Projeto Ficha Limpa sem vetos demonstra que o presidente da República, tal e qual o Congresso Nacional, inter pretou o sentimento de quase dois milhões de eleitores, que por ele disseram: basta de corrupção!”.33 Almir Pazzianotto Pinto, ex-Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, publica no Jornal Correio Braziliense um artigo intitulado “A impunidade dos corruptos”, no qual afirma que “o saneamento da vida pública pode ter início por meio da Lei da Ficha Limpa”.34 O Ca derno Política do Correio Braziliense estampava em 19 de junho de 2010 a manchete: “Bloco dos Encardidos”, listando políticos eventual mente atingidos para as eleições gerais daquele mesmo ano. No mesmo dia, o periódico publicou na página 6 do Caderno Política: “In dignação popular virou lei”, louvando os méritos da nova norma. No DOS DEPUTADOS. Projeto de Lei 1629/2015. Disponível em: https:// www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1337528&filename=Tramitacao-PL+1629/2015. Acesso em: 7 fev. 2022. 30 CÂMARA Márlon. A Campanha Ficha Limpa. Disponível em: https://congressoem foco.uol.com.br/reportagem/a-campanha-ficha-limpa. Acesso em: 7 fev. 2022. 32 REIS, Márlon. A Campanha Ficha Limpa. Disponível em: https://congressoem foco.uol.com.br/reportagem/a-campanha-ficha-limpa. Acesso em: 7 fev. 2022. 33 CONJUR. Lula sanciona, sem vetos, Lei da Ficha Limpa. Disponível em: https:// www.conjur.com.br/2010-jun-04/lula-sanciona-lei-ficha-limpa-aplicacao-neste ano-duvida. Acesso em: 7 fev. 2022. 34 PINTO, Almir Pazzianotto. A impunidade dos corruptos. Correio Braziliense, 1º jun. 2010, caderno 1, p. 23. 31 REIS, SOBREIRA, Renan G. 217 dia 20 de junho de 2010, o Correio Braziliense expunha sua própria visão “Visão do Correio”, na página 20 do primeiro caderno daquela edição, afirmando que “com a Lei da Ficha Limpa, a cidadania volta a ter certeza de que esse é um combate que vale a pena travar [contra a corrupção]”. Do que se expôs, possível concluir que os acontecimentos, as de núncias, as apurações administrativas, as investigações policiais, os julgamentos judiciais e mesmo midiáticos agiram conformando pen samento majoritário de que todos os atos corruptivos, independente mente de seu alcance e do dano gerado, deveriam ser peremptoria mente repudiados com a mesma intensidade e que os agentes envol vidos deveriam ser afastados definitivamente da arena pública, nota damente da atividade política. O contexto, portanto, estabeleceu ampla movimentação social e política num único sentido – ut omnes unum sint, de modo que todos sejam um –, mas não imunizou a nova norma de críticas e mesmo questionamentos judiciais. Supérstite, a LFL já ultrapassa dez anos de vigência e agora incide em contexto diverso, que se passa a analisar. 2 OMNES VOS FRATES:35 A FASE PÓS-LEI DA FICHA LIMPA Da promulgação da Lei Complementar n. 135, em 4 de junho de 2010, até a atualidade, isto é, passados mais de dez anos, o Brasil pas sou por modificações profundas, que alcançam não apenas o âmbito político, mas também o social e econômico. Politicamente, na esfera federal, considere-se que chegava ao fim o segundo mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (Partido dos Traba lhadores, PT), havendo certa incógnita quanto sua sucessão dentro da agremiação política. Após deliberações, oficializou-se a candidatura de Dilma Rousseff – ex-Ministra de Minas e Energia; e ex-Ministra da Casa Civil após a demissão de José Dirceu no Caso Mensalão –, tendo como candidato à Vice-Presidência Michel Temer (Partido do Movi mento Democrático Brasileiro, PMDB). 35 Fórmula latina que se pode traduzir como “Vós sois todos irmãos”, frequente mente utilizada pela Igreja Católica, sendo o lema do cardeal brasileiro Cláudio Hummes. 218 Ex spe in spem No primeiro turno realizado em 3 de outubro de 2010, foram os mais votados à Presidência da República: Dilma Rousseff, com 46,91% dos votos válidos; José Serra (Partido da Social Democracia Brasileira, PSDB), com 32,61%; Marina Silva (Partido Verde, PV), com 19,33%. As outras seis chapas não obtiveram nem mesmo um por cento dos votos válidos. No segundo turno, realizado em 31 de outubro de 2010, Dilma Rousseff se sagrou vencedora com 56,05% dos votos válidos.36 Assim, inicia-se o primeiro Governo Rousseff em 2011. Em 2013 eclodem por todo o país diversas manifestações que, além de reivindi car mais estabilidade financeira e melhoria na qualidade de vida, bran diam contra a corrupção. O “Brasil amanheceu atônito” já que “nin guém imaginava a explosão social que se seguiu a um protesto contra o aumento das passagens de ônibus”, externando “um sentimento de insatisfação e de frustração e uma aspiração difusa de mudança”.37 As manifestações sociais se alongaram de 2013 a 2014, ano em que se inicia a Operação Lava-Jato, investigação conduzida pela Polí cia Federal a fim de apurar desvios de recursos da estatal Petróleo Bra sileiro S.A. (PETROBRAS), que se estenderia até 2021 e influenciaria significativamente a vida política nacional. Historiadoras, escrevendo em 2015, entenderam aquele mo mento como a sinalização de que “a redemocratização do país havia terminado”, sendo momento de “contribuir com um novo passo à frente no processo de fortalecimento de nossas instituições públicas, de expansão da democracia”,38 o que pode ser severamente contestado a partir dos fatos que se seguiram. De fato, havia aparente normali dade institucional. Ainda que a Presidenta da República tivesse soci almente questionada sua permanência no cargo, exercia suas funções sem embaraços e, dessa mesma forma, ocorreram as eleições presiden ciais de 2014. Contando com onze chapas concorrendo à Presidência da Repú blica em 2014, chegaram ao segundo turno, realizado em 26 de outu bro, Dilma Rousseff (PT), com 41,59% dos votos válidos e Aécio Neves 36 Todos os dados são do TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Estatísticas. Dispo nível em: https://www.tse.jus.br/eleicoes/eleicoes-anteriores/eleicoes-2010/estatis ticas. Acesso em: 9 mar. 2022. 37 SCHWARCZ, Lilia; STARLING, Heloisa. Brasil: uma biografia. São Paulo: Com panhia das Letras, 2015, p. 505. 38 SCHWARCZ, Lilia; STARLING, Heloisa. Brasil: uma biografia. São Paulo: Com panhia das Letras, 2015, p. 506. SOBREIRA, Renan G. 219 com (PSDB), 33,55% dos votos válidos. Marina Silva (Partido Socialista Brasileiro, PSB) somou 21,32% dos votos válidos; Luciana Genro (Par tido Socialismo e Liberdade, PSOL), 1,55%; enquanto as outras sete candidaturas não somaram, individualmente, nem mesmo um por cento. Aproveitando-se da pequena diferença de votos ‒ menos de três milhões ‒, o candidato derrotado passou a questionar a idoneidade do pleito, tese que seria judicialmente refutada apenas em 2015,39 sendo esse o primeiro tremor democrático do período analisado. O avanço das investigações da Operação Lava Jato e o envolvi mento de membros do Partido dos Trabalhadores nos fatos apurados ‒ ainda que a maior parte dos políticos investigados integrasse o Par tido Progressista (PP), atual Progressistas ‒ levou a desgaste político acentuado da segunda Presidência Rousseff, que culminou na aber tura de processo de destituição em 2 de dezembro de 2015 com o aca tamento de denúncia pelo Deputado Federal e Presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB). Em 12 de maio de 2016, o Senado Federal autorizou a tramitação do processo de destituição e ordenou o afastamento de Dilma Rousseff do cargo. Após a regular marcha processual, em 31 de agosto de 2016 o mandato presidencial de Rousseff foi cassado, mantendo-se os direi tos políticos da acusada. No mesmo dia, o Vice-Presidente da Repú blica, Michel Temer (PMDB), assume definitivamente a Presidência. Já à época dos fatos se afirmava que inexistia crime de responsa bilidade a autorizar a destituição da Presidenta da República. Ocorre que um mandato pode chegar ao final por meios legítimos e ilegítimos. No Brasil, entre os legítimos, há aqueles naturais ‒ como o falecimento do detentor do mandato ou o decurso do prazo do mandato ‒ e aque les extraordinários ‒ como a renúncia; a destituição, sendo essa regu lada por lei; ou a determinação judicial após regular trâmite legal. Ine xiste no ordenamento brasileiro a figura do recall ou a moção de cen sura, típica do sistema parlamentarista, as quais levam à perda do mandato por falta de apoio popular ou político. Os meios ilegítimos de pôr termo a um mandato são todos aqueles que não figuram entre os legítimos, ou seja, formas residuais de diagnóstico por exclusão. 39 TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Plenário do TSE: PSDB não encontra fraude nas eleições 2014. Disponível em: https://www.tse.jus.br/imprensa/noti cias-tse/2015/Novembro/plenario-do-tse-psdb-nao-encontra-fraude-nas-eleicoes2014. Acesso em: 9 mar. 2022. 220 Ex spe in spem Diversos atores políticos, sociais e juristas defenderam que no Caso Rousseff inexiste configuração de crime de responsabilidade, de modo que o instrumento da destituição foi utilizado de forma impura, portanto, ilegítima.40 Em 2019, Michel Temer utiliza o termo “golpe”, porque o afirma socialmente consolidado para se referir ao impeach ment de Rousseff.41 Em fevereiro de 2022, o Ministro do Supremo Tri bunal Federal Luís Roberto Barroso afirmou que a destituição de Ro usseff ocorreu por falta de apoio político,42 o que, como visto, figura entre os meios ilegítimos de finalização de mandato. O fato é que houve abalo democrático, sendo esse o segundo grande estremecimento das estruturas democráticas nacionais. O Go verno Temer (2016-2018) foi marcado pelas investigações da Operação Lava Jato, implicando o próprio Presidente, denunciado ante o Su premo Tribunal Federal.43 Sem insurgências sociais significativas, Mi chel Temer chega ao final do mandato como o Presidente com a maior rejeição do mundo.44 Conforme dados do Tribunal Superior Eleitoral,45 em 2018 foram registradas 14 candidaturas à Presidência da República. As duas cha pas mais votadas foram a de Jair Bolsonaro (Partido Social Liberal, PSL) com 46,03% dos votos válidos; e de Fernando Haddad (PT), 29,28% dos votos válidos. No segundo turno, o primeiro somou 40 CLETO, Murilo; DORIA, Kim. Por que gritamos golpe? Para entender o impeach ment e a crise política no Brasil. São Paulo: Boitempo, 2016. 41 UOL. Depois de falar em "golpe", Temer diz que processo de impeachment foi legal. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2019/09/ 17/depois-de-falar-em-golpe-temer-diz-que-processo-de-impeachment-foi-legal.html. Acesso em: 9 mar. 2022. 42 G1. Barroso atribui impeachment de Dilma à falta de apoio político e chama 'pe daladas' de 'justificativa formal'. Disponível em: https://g1.globo.com/politica/ noticia/2022/02/03/barroso-atribui-impeachment-de-dilma-a-falta-de-apoio-politico-e-chama-pedaladas-de-justificativa-formal.ghtml. Acesso em: 9 mar. 2022. 43 EL PAÍS. Temer é denunciado por corrupção e se torna primeiro presidente a responder por crime durante mandato. Disponível em: https://brasil.elpais.com/ brasil/2017/06/26/politica/1498485882380890.html. Acesso em: 9 mar. 2022 44 O GLOBO. Levantamento aponta Temer como presidente mais rejeitado do mundo. Disponível em: https://oglobo.globo.com/brasil/levantamento-aponta-te mer-como-presidente-mais-rejeitado-do-mundo-21994959. Acesso em: 9 mar. 2022. 45 TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Estatísticas. Disponível em: https:// www.tse.jus.br/eleicoes/ estatisticas/estatisticas-eleitorais. Acesso em: 14 mar. 2022. SOBREIRA, Renan G. 221 55,13% e o segundo, 44,87% dos votos válidos; havendo mais de vinte por cento de abstenção do eleitorado. O candidato eleito apresenta perfil nacionalista, militarista e au toritário, defendendo propostas armamentistas e ideias amplamente disseminadas entre conservadores como defesa do modelo tradicional de família e a utilização de discursos religiosos cristãos, de índole evangélica pentecostal, como baliza às atuações políticas.46 Conforme Revisão Periódica Universal (RPU) publicada em 2020,47 considerando o agravamento das situações devido à pandemia do Sars-CoV-2, a proteção e a garantia dos Direitos Humanos no Bra sil, desde o início do Governo Bolsonaro, têm degringolado de forma acintosa. Quanto ao Meio Ambiente, afirma-se: “o desmonte das políticas ambientais e de fiscalização chegaram a patamares tão escandalosos” que “12 Procuradores da República pediram à Justiça Federal, no dia 6 de julho, o afastamento do cargo do ministro do Meio Ambiente”; sobre a prática de tortura: “a tortura e outros tratamentos cruéis, de sumanos e degradantes são práticas institucionalizadas no Brasil, raci almente organizadas e utilizadas de maneira sistemática pelo Estado brasileiro para obter confissões e informações, como forma de punição, ou para impor medo e terror como estratégia de controle sobre pessoas e/ou comunidades inteiras”; quanto à saúde: “O governo federal mos trou-se despreparado para enfrentar a emergência” e “cumpre ressal tar que o governo Bolsonaro eliminou por completo todas as políticas de saúde voltadas à equidade”; o “Comitê Nacional de EDH [Educa ção em Direitos Humanos] foi desarticulado” e “o atual governo ex tinguiu a área do Ministério da Educação (MEC) responsável pela pasta”; há limitação ao acesso de dados e à publicidade de informa ções: “As decisões políticas autoritárias do governo vigente contra riam totalmente as recomendações realizadas, restringem a democra DE REPÚBLICA. Biografia do Presidente. Disponível em: https:// www.gov.br/planalto/pt-br/conheca-a-presidencia/biografia-do-presidente. Acesso em: 14 mar. 2022. 47 INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO E DIREITOS HUMANOS. Relatório da Sociedade Civil: revisão periódica universal dos Direitos Humanos no contexto da COVID-19. Disponível em: https://plataformarpu.org.br/storage/publications_ documents/EfrkBCBQ8IF1CKSyP9gwX2vIJo0RO6kpz9YSC7Am.pdf. Acesso em: 14 mar. 2022. 46 PRESIDÊNCIA 222 Ex spe in spem cia participativa e justificam a avaliação”; ainda “houve desinvesti mento nas políticas públicas, encerramento de programas importan tes, como as Casas da Mulher Brasileira, além de cortes orçamentários em programas sociais como o Programa Bolsa Família, Minha Casa, Minha Vida, Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf)” e aumento dos “entraves para reconhecimento e regulariza ção dos territórios quilombolas e indígenas (MP 870)”. Registre-se que essas práticas foram viabilizadas com o apoio do chamado centrão mediante o loteamento de cargos e distribuição de prebendas no Governo Federal, garantindo governabilidade no perí odo. O que outrora fora noticiado como Escândalo do Mensalão, no Go verno Temer passa a ser manchete como jantar comemorativo;48 e no Governo Bolsonaro, mera negociação,49 chegando ao Supremo Tribu nal Federal com o questionamento das chamadas Emendas do Relator.50 A Federação Nacional dos Jornalistas lavra relatório no qual afirma que “O presidente Jair Bolsonaro foi o principal autor de ata ques a veículos de comunicação e jornalistas, em 2020, repetindo a mesma posição ocupada no ano anterior, quando assumiu a Presidên cia da República”, sendo responsável “por 175 ocorrências (40,89% do total), a maioria delas tentativas de descredibilização da imprensa (145), mas também por 27 casos de agressões diretas aos profissio nais”.51 Afirma-se, ainda que “o ano de 2020 foi o mais violento para os jornalistas brasileiros, desde o início da série histórica dos registros dos ataques à liberdade de imprensa feitos pela Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), iniciada na década de 1990” e que “a explosão de casos está associada à sistemática ação do presidente da República, Jair Bolsonaro, para descredibilizar a imprensa e à ação de seus apoia dores contra veículos de comunicação social e contra os jornalistas”. GLOBO. Temer faz jantar com centrão para comemorar aprovação da DRU. Disponível em: https://oglobo.globo.com/politica/temer-faz-jantar-com-centrao para-comemorar-aprovacao-da-dru-19426674. Acesso em: 14 mar. 2022. 49 BBC NEWS BRASIL. Cargos que Bolsonaro negocia com centrão têm mais de R$ 10,6 bi ‘livres’ para investir em 2020. Disponível em: https://www.bbc.com/portu guese/brasil-52466624. Acesso em: 14 mar. 2022. 50 ADPF 850, 851 e 854, sob relatoria da Ministra Rosa Weber. 51 FEDERAÇÃO NACIONAL DOS JORNALISTAS. Violência contra jornalistas e liberdade de imprensa no Brasil: relatório 2020. Disponível em: https://fenaj.org.br/wp-content/uploads/2021/01/relatorio_fenaj_2020.pdf. Acesso em: 14 mar. 2022. 48 O SOBREIRA, Renan G. 223 O sistema de voto eletrônico consolidado no Brasil tem sido alvo de questionamentos legislativos e por parte do próprio Presidente Bol sonaro, que, em sua página institucional, afirma defender o voto im presso,52 além de reiteradamente tentar retirar a credibilidade da Jus tiça Eleitoral. O tema da forma de voto chegou ao Supremo Tribunal Federal, que declarou inconstitucional a impressão do registro de vo tação, pois ameaça o sigilo e a liberdade do voto.53 Importante destacar, ainda, que no período pós-LFL, em feve reiro de 2012, o Supremo Tribunal Federal julgou conjuntamente a Ação Direta de Inconstitucionalidade 4578 e as Ações Declaratórias de Constitucionalidade n. 29 e 30, tendo como objeto a Lei da Ficha Limpa. Por maioria de votos, a Corte declarou a compatibilidade da norma com a Constituição de República. Em 2021, o Supremo Tribunal Federal passou a analisar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 6630, que pretende a limitação do tempo da inelegibilidade a oito anos, já que a norma, nos termos pos tos, “tem acarretado uma inelegibilidade por tempo indeterminado dependente do tempo de tramitação processual”. O Ministro Nunes Marques, relator da ADI 6630, votou pela interpretação conforme da norma à Constituição a fim de impedir o alargamento da penalidade. O Ministro Luís Roberto Barroso votou para que a detração somente ocorra se houver demora processual em razão de atos da administra ção da justiça. O Ministro Alexandre de Moraes abriu nova divergência no sen tido do não conhecimento da ADI, pois “quando declarou a validade da Lei da Ficha Limpa, o STF entendeu que o prazo previsto no dispo sitivo é uma opção política legislativa para garantir a efetividade das normas relativas à moralidade administrativa, à idoneidade e à legiti midade dos processos eleitorais” e que a “rediscussão, a seu ver, po deria resultar no afastamento da inelegibilidade, em alguns casos”.54 DE REPÚBLICA. Biografia do Presidente. Disponível em: https:// www.gov.br/planalto/pt-br/conheca-a-presidencia/biografia-do-presidente. Acesso em: 14 mar. 2022. 53 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Impressão de registro põe em risco sigilo e liberdade do voto. Disponível em: http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDeta lhe.asp?idConteudo=451785. Acesso em: 14 mar. 2022. 54 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. STF rejeita rediscutir inelegibilidade da Lei da Ficha Limpa. Disponível em: http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDeta lhe.asp?idConteudo=483108&ori=1. Acesso em: 14 mar. 2022. 52 PRESIDÊNCIA 224 Ex spe in spem Acompanharam o Ministro Alexandre de Moraes, os Ministros Edson Fachin, Ricardo Lewandowski e Luiz Fux; e as Ministras Carmén Lú cia e Rosa Weber, formando-se a maioria pela rejeição da ADI. Além da degradação das condições de exercício e garantia de Direitos Humanos no período recente, advindo sobretudo do desman telamento de políticas públicas, a crise econômica agravada pela crise sanitária do cenário pandêmico instalado em 2020, contribuiu para a piora na qualidade de vida do povo brasileiro. Conforme noticiado, em 2021 eram aproximadamente 28 mi lhões de brasileiros e brasileiras abaixo da linha da pobreza, isto é, em miséria absoluta; enquanto em 2019, 23 milhões.55 14.487.733 nacionais vivem em extrema pobreza ‒ renda per capita de até R$ 89,00 ‒, número que não se encontrava tão alto desde outubro de 2014 e distante em 2.660.165 pessoas do patamar mais baixo, em janeiro de 2016.56 Se gundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de feve reiro de 2021,57 a inflação acumulou incremento de 10,54% nos últimos doze meses, achatando o poder de compra do povo brasileiro. A situação de congruência de crises de diversas naturezas e a desassistência estatal têm obrigado a sociedade civil a organizar-se a fim de evitar o perecimento coletivo. Há uma retomada de consciência coletiva de cunho assistencial, de solidariedade, como a lembrar o lema do cardeal brasileiro Cláudio Hummes: omnes vos frates (Vós sois todos irmãos).58 Delineia-se, portanto, um período pós-edição da Lei da Ficha Limpa em que a democracia brasileira sofreu e segue sofrendo ataques 55 CNN. Quase 28 milhões de pessoas vivem abaixo da linha da pobreza no Brasil. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/business/quase-28-milhoes-de-pes soas-vivem-abaixo-da-linha-da-pobreza-no-brasil. Acesso em: 14 mar. 2022. 56 UOL. País tem recorde de extrema pobreza com 14,5 milhões de famílias na mi séria. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2021/ 05/23/com-145-mi-de-familias-na-miseria-brasil-bate-recorde-de-extrema-pobreza.htm. Acesso em: 14 mar. 2022. 57 IBGE. Inflação. Disponível em: https://ibge.gov.br/explica/inflacao.php. Acesso em: 14 mar. 2022. 58 FOLHA DE SÃO PAULO. Solidariedade aumenta durante a pandemia. Disponí vel em: https://www.folha1.com.br/_conteudo/2020/06/geral/1262782-solidarie dade-aumenta-durante-pandemia.html. Acesso em: 14 mar. 2022. CORREIO BRA ZILIENSE. Em meio à pandemia, onda de solidariedade toma conta do país. Dis ponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/brasil/2020/03/26/ interna-brasil,836879/em-meio-a-pandemia-onda-de-solidariedade-toma-contado-pais.shtml. Acesso em: 14 mar. 2022. SOBREIRA, Renan G. 225 de de variadas naturezas, especialmente de dentro si mesma. Agentes políticos encarregados de mandatos por meio democrático passaram a agir contra a própria democracia, minando suas bases sociais e a li berdade de expressão. Nesse contexto, a LFL foi objetada judicial mente duas vezes, mas segue hígida com sua redação original. 3 MIHI FECISTIS:59 UMA ANÁLISE COMPARATIVA A partir dos dois tópicos precedentes, verifica-se que a realidade brasileira foi profundamente alterada em pouco mais de três décadas, enquanto a Lei da Ficha Limpa permanece com seu texto inalterado. Cediço que normas jurídicas devem guardar conexão com a realidade fática em dois sentidos. O primeiro se refere à possibilidade de aplicação. Norma que não guarda conexão com a materialidade, deixa de ser aplicada, ou seja, é preciso haver congruência entre o plano teórico e aquele prático para que a norma incida. O segundo diz respeito aos efeitos gerados. Ocorre que normas de caráter pedagógico – como pretende ser a LFL ao passar o ensinamento à sociedade de que candidatos ficha limpa são mais adequados – necessitam atingir os efeitos pretendidos para que suas existências permaneçam plausíveis. Afinal, ausente efetivi dade, cumprimento de propósitos, a norma se torna inútil e, portanto, passível de revogação. Quanto à LFL, há certas incongruências com o ordenamento ju rídico brasileiro desde o momento de sua feitura. As afirmações en contram reprovações técnicas de variadas formas. Inicialmente cum pre destacar que as afirmações do magistrado idealizador da norma (“necessidade de impulsionar o Parlamento a estabelecer hipóteses de inelegibilidade que levem em conta a vida pregressa, o histórico obje tivo dos candidatos”; em matéria eleitoral “não se aplica o princípio da presunção de inocência”, que “se dirige exclusivamente à esfera pe nal”;60 “não há obstáculo constitucional, político ou ético a impedir que 59 Fórmula latina que se pode traduzir como “A mim o fizestes”, frequentemente utilizada pela Igreja Católica, sendo o lema do cardeal italiano Augusto Paolo Lo judice. 60 REIS, Márlon. A Campanha Ficha Limpa. Disponível em: https://congressoem foco.uol.com.br/reportagem/a-campanha-ficha-limpa. Acesso em: 7 fev. 2022. 226 Ex spe in spem preventivamente sejam excluídas dos pleitos pessoas que já ostentem condenações criminais”)61 parecem não se sustentar. A pretensão de impingir o Parlamento a legislar sobre o tema não encontra respaldo técnico. O art. 14 da Constituição da República prevê as condições de elegibilidade, de modo que seria necessária Emenda Constitucional para se fazer as modificações pretendidas,62 mas não há no Brasil a figura da Emenda Constitucional advinda de iniciativa po pular. Ainda que o termo “impulsionar” utilizado pelo idealizador seja meramente figurado, deve-se recordar que há plena liberdade no exercício do mandato representativo, não sendo admissível no país o mandato imperativo. Ademais, tardando tantos anos a se manifestar sobre o tema, pode-se dizer que não se tratava de prioridade de repre sentantes da vontade popular, de parlamentares. A tese de que o Princípio da Presunção de Inocência se aplica apenas ao âmbito penal é rechaçada pela interpretação constitucional fixada pelo Supremo Tribunal Federal. Há, por exemplo, aplicação em matéria infracional63 e em matéria administrativa.64 Decorre desse princípio constitucional a expressão civilista comum de que a boa-fé se presume, enquanto a má-fé exige provas: “A presunção de boa-fé é Márlon. A Campanha Ficha Limpa. Disponível em: https://congressoem foco.uol.com.br/reportagem/a-campanha-ficha-limpa. Acesso em: 7 fev. 2022. 62 Sobre o tema: SALGADO, Eneida Desiree; ARAÚJO, Eduardo Borges. Do Legisla tivo ao Judiciário: a LC C135/10 (“Lei da Ficha Limpa”), a busca pela moralização da vida pública e os direitos fundamentais. A&C ‒ Revista de Direito Adminis trativo & Constitucional, Belo Horizonte, ano 13, n. 54, p. 121-148, out./dez. 2013. 63 Habeas Corpus 122.072, Relator Ministro Dias Toffoli, julgado em 02/9/2014, Habeas Corpus 84.078, Relator Ministro Eros Grau, julgado em 05/02/2009. 64 “Viola o princípio da presunção de inocência a negativa em homologar diploma de curso de formação de vigilante, com fundamento em inquéritos ou ações penais sem o trânsito em julgado” (Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 805.821, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, julgado em 24/06/2014; Agravo no Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 943.503, Relator Ministro Ro berto Barroso, julgado 08/12/2016; Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 559.135, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, julgado em 20/05/2008. Em aná lise de Processo Administrativo Disciplinar (Mandado de Segurança 23.262, Rela tor Ministro Dias Toffoli, julgado em 23/04/2014). Em análises de concurso público (Agravo Interno 829.186, Relator Ministro Dias Toffoli, julgado em 23/04/2013; Agravo no Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 847.535, Relator Minis tro Celso de Mello, julgado em 30/06/2015). Análise para promoção de patente mi litar (Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 459.320, Relator Ministro Eros Grau, julgado em 22/04/2008. 61 REIS, SOBREIRA, Renan G. 227 de princípio geral direito universalmente aceito, sendo milenar a pa rêmia: a boa-fé se presume; a má-fé se prova”.65 Destarte, não há como afastar a incidência desse princípio do âmbito eleitoral, como afirma o magistrado idealizador da LFL. Há, ainda obstáculos constitucional, político ou ético à LFL. Cons titucionalmente, como afirmado, há a presunção de inocência e necessi dade de Emenda Constitucional, sendo insuficiente a regulação por Lei Complementar. Politicamente está claro que cabe à própria população estabelecer os parâmetros para escolher seus representantes, devendo o povo soberano estar plenamente livre no balizamento. Fixar vedações le gais às escolhas de representantes contraria a própria lógica da represen tação política, eis que se trata de interferência externa na vontade do elei torado. A questão ética remete ao que Michael Sandel chama de creden cialismo. Sandel analisa como as sociedades passaram a entender de sejável que seus governantes sejam pessoas com boas credenciais acadê micas, o que seria sinônimo de bons governantes. No entanto, o autor destaca que “governar bem exige sabedoria pragmática e virtude cí vica – uma habilidade para deliberar sobre o bem comum para efeti vamente obtê-lo. Mas nenhuma dessas capacidades é muito bem de senvolvida na maioria das universidades hoje, nem mesmo naquelas com a mais alta reputação”.66 A lógica credencialista é transponível ao caso da LFL, uma vez que com a norma se pretende obter candidatos e candidatas com credenciais adequadas: sem condenações. Um exemplo pode aclarar a discrepância da norma. Considere se que a alínea m do art. 1º da Lei Complementar n. 64/1990 estabelece que são ficha suja aqueles que “forem excluídos do exercício da pro fissão, por decisão sancionatória do órgão profissional competente, em decorrência de infração ético-profissional”. 65 Agravo Regimental no Recurso Especial 1.533.380/SP, Relator Ministro Antônio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 07/12/2021, DJe 14/12/2021. No mesmo sentido: Recurso Especial 1.381.734/RN, Relator Ministro Benedito Gonçalves, Pri meira Seção, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021; Recurso Especial 1.769.209/ AL, Relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 10/03/2021, DJe 19/05/2021; Recurso no Mandado de Segurança 62.878/RJ, Relator Ministro Sér gio Kukina, Primeira Turma, julgado em 19/05/2020, DJe 27/05/2020. 66 SANDEL, Michael. A tirania do mérito: o que aconteceu com o bem comum? 6. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2021, p. 143. 228 Ex spe in spem O art. 38, I da Lei Federal n. 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil) estabelece que a exclusão do qua dro da advocacia pode ocorrer quando aplicada, por três vezes, a pena de suspensão. Essa pode ser aplicada quando o agente incidir nas con dutas do art. 34, XVII a XXV ou reincidir em quaisquer das infrações, como dispõe o art. 37 da mesma norma. Entre as possibilidades, está o inciso XXII do art. 34, que fixa a suspensão quando o agente retiver, “abusivamente, ou extraviar autos recebidos com vista ou em confi ança”. Noutros termos, o advogado ou a advogada que por três vezes extraviar autos, com ou se intenção, que tenha retirado em vista, está sujeito à expulsão do quadro da OAB e, por conseguinte, inelegível por oito anos, conforme a LFL. Atualmente o número de autos físicos tem diminuído, considerando a informatização do Poder Judiciário. Sem embargo, não parece excessivo o extravio, total ou parcial, de au tos físicos com muitos volumes em mais de uma ocasião. Considere-se o disposto no art. 34, XXIV da Lei Federal n. 8.906/1994 que torna penalizável o profissional que “incidir em erros reiterados que evidenciem inépcia profissional”. A subjetividade da análise é alarmante. De todo modo, incidir nessa hipótese pode levar à expulsão dos quadros da OAB e, por conseguinte, à suspensão de direito fundamental político em decorrência da LFL. Não parece adequada a concatenação lógica de que um profissi onal inepto para exercer a advocacia seja também inepto a exercer um cargo público de preenchimento eletivo, afinal, as habilidades reque ridas são absolutamente distintas. Não há fundamento ético para con siderar que esse profissional inepto à advocacia seja desprovido de “sabedoria pragmática e virtude cívica – uma habilidade para delibe rar sobre o bem comum para efetivamente obtê-lo”, como salienta San del. Ademais, as penalidades estabelecidas na LFL se demonstram excessivas, o que é incompatível com a Constituição da República e com simples análise ética. Considere-se, por exemplo, que o Decreto Lei n. 201/1967 estabelece que a pessoa ocupante do Poder Executivo Municipal que tem o mandato cassado resta inabilitada eleitoralmente por cinco anos, contados da condenação (art. 1º, § 2º). A LFL estabelece punição ao mesmo agente, na mesma circunstância, “para as eleições que se realizarem durante o período remanescente e nos 8 (oito) anos SOBREIRA, Renan G. 229 ao do subsequentes término mandato para o qual tenham sido elei tos”. Suponha-se que determinado agente foi eleito Prefeito para exercício de mandato entre 2020 e 2023, mas no primeiro ano de go verno (2020), teve o mandato cassado por decisão definitiva nos ter mos do Decreto-Lei 201/1967. Conforme essa norma, está inabilitado eleitoralmente até 2024, uma vez que se inclui o ano da condenação. Aplicando-se a LFL, a inabilitação se inicia no ano subsequente ao tér mino do mandato, isto é, inicia-se em 2024 e prorroga-se até 2032. A pena estabelecida na LFL excede significativamente aquela posta no Decreto-Lei. O fato de estabelecer restrição a exercício de direito fundamental para além daquela prevista em norma específica revela, na verdade, preconceito velado para com aqueles que já cumpriram suas penas por infrações para com a sociedade. Trata-se de estigmatização social que impõe a separação legal entre o cidadão ficha limpa, adequadamente credenciado, e o cidadão ficha suja, ainda que já tenha sanado sua dí vida para com a sociedade. Cria-se uma cidadania de “segunda classe”, cujos integrantes permanecem desprovidos desse direito polí tico mesmo cumprindo suas penas. Sandel destaca que “as elites não se sentem constrangidas com seus preconceitos. Talvez condenem racismo e sexismo, mas não se ar rependem dos comportamentos negativos direcionados a pessoas com menor formação educacional”67 ou, pode-se acrescentar, com ficha suja, ainda que essa advenha, eventualmente, de reiterado extravio não in tencional de autos ou de conclusões de análises subjetivas sobre habi lidade profissional. A questão ética, portanto, é mais profunda do que a mera seleção moral de governantes. Trata-se de segregação social amparada em cri térios subjetivos e imprecisos de superioridade moral: “a ideia de que ‘os melhores e mais brilhantes’ governam melhor do que seus colegas cidadãos com menos credenciais é um mito que surgiu a partir da ar rogância meritocrática”, acadêmica ou de outra natureza.68 67 SANDEL, Michael. A tirania do mérito: o que aconteceu com o bem comum? 6. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2021, p. 139. 68 SANDEL, Michael. A tirania do mérito: o que aconteceu com o bem comum? 6. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2021, p. 144. 230 Ex spe in spem A realidade fática brasileira, ainda, parece demonstrar mais cla ramente o fracasso da LFL. Considerando que, a partir da entrada em vigor dessa norma, governantes seriam melhor selecionados, os resul tados de gestão deveriam ser positivos, a qualidade de vida deveria ser incrementada e, por conseguinte, a popularidade dos gestores es taria mais elevada. Isto é, exatamente o oposto daquilo que o Brasil hoje demonstra ser. Segundo dados do Latinobarômetro, de 2020, o apoio à demo cracia no Brasil saiu de seu índice mais alto, 55% em 2009, isto é, pré Lei da Ficha Limpa, e atingiu 40% em 2020. Em 2016, ano dos maiores abalos democráticos com o impeachment de Rousseff, período pós-Lei da Ficha Limpa, apenas 32% do povo brasileiro apoiava o regime de mocrático. Em 2018, quando eleito Jair Bolsonaro, apenas 34% manti nham esse apoio.69 O Relatório de 2020 do Latinobarômetro ainda in dica que 53% da população brasileira apoia “soluções não democráti cas, ainda que rechace um governo militar, sendo mais factível uma autocracia eleitoral no Brasil do que uma ditadura”. Sandel afirma que “transformar Congresso e Parlamentos em domínio exclusivo das classes com credenciais não tornou o governo mais eficiente, mas o tornou menos representativo”,70 podendo ser pa rafraseado no sentido de que transformar os Poderes Legislativo e Exe cutivo em domínio exclusivo dos ficha limpa não tornou os governos mais eficientes, mais transparentes, mas tornou a seleção mais mora lista. O que tem sido feito na legislação eleitoral é efetivo mihi fecistis (a mim o fizestes) à democracia nacional: a desconsideração da vontade social, o que leva ao desacreditar social na democracia, com uma ten dência à autocracia eleitoral. Annual Reports. Disponível em: https://www.latinobaro metro.org/latContents.jsp. Acesso em: 14 mar. 2022. 70 SANDEL, Michael. A tirania do mérito: o que aconteceu com o bem comum? 6. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2021, p. 145. 69 LATINOBARÓMETRO. SOBREIRA, Renan G. 231 EX SPE IN SPEM:71 CONCLUSÕES A Lei da Ficha Limpa ultrapassa dez anos de vigência, supérstite a ações direta de inconstitucionalidade, com a redação substancial mente inalterada ‒ ainda que tramite legislativamente o Projeto de Lei Complementar (PLP) n. 9/2021 visando alterar a alínea g da norma. Sem embargo, a realidade nacional pré-Lei da Ficha Limpa e do mo mento de redação e aquela atual são substancialmente díspares. Desa fortunadamente, a qualidade da democracia e os reflexos disso na so ciedade decresceu sobremaneira, havendo episódios recentes e graves de abalo às instituições democráticas. Os vícios de constituição da Lei da Ficha Limpa não foram resol vidos nessa trajetória. A realidade fática demonstra que os objetivos da norma fracassaram. Percebe-se uma espécie de credencialismo mo ralista na política, que é incompatível, de diferentes maneiras, com o ordenamento jurídico brasileiro e mesmo com padrões éticos aceitá veis. A esperança posta na Lei da Ficha Limpa, tanto por seus ideali zadores, suas idealizadoras, como por seus e suas entusiastas, parece haver fracassado, eis que não tem ocorrido a seleção de agentes políti cos com mais habilidade de gestão democrática, de melhor qualidade administrativa. É necessário encarar os problemas nacionais com pragmatismo e consciência social, diminuindo as disparidades sociais a fim de que maior percentual do povo esteja livre e instruído a fazer escolhas de parlamentares e chefes do Poder Executivo com mais compromisso com o bem comum, mais acurado senso cívico. Somente com trabalho adequado de conscientização democrática social, o Brasil deixará de saltar ex spe in spem (de esperança em esperança) e definirá adequada mente seu rumo. que se pode traduzir como “De esperança em esperança”, frequen temente utilizada pela Igreja Católica, sendo o lema do cardeal brasileiro Paulo Evaristo Arns. 71 Fórmula latina 232 Ex spe in spem REFERÊNCIAS BBC NEWS BRASIL. Cargos que Bolsonaro negocia com centrão têm mais de R$ 10,6 bi ‘livres’ para investir em 2020. Disponível em: https:// www.bbc.com/portuguese/brasil-52466624. Acesso em: 14 mar. 2022. CÂMARA DOS DEPUTADOS. 20 anos do impeachment do Collor. Dispo nível em: https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/plenario/dis cursos/escrevendohistoria/destaque-de-materias/20-anos-do-impeachment. Acesso em: 4 fev. 2022. CÂMARA DOS DEPUTADOS. Conselho de Ética e Decoro Parlamentar: processo nº 1 de 2005. 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