Apostila - Ambiental - Sales PDF

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Fernando Augusto De Vita Borges de Sales Direito Ambiental UNIP Paraso 2011

DIREITO AMBIENTAL

CAPTULO 1. PRINCPIOS DO DIREITO AMBIENTAL NA CONSTITUIO FEDERAL DE 1988.

1.1. Consideraes gerais: O Direito Ambiental, como cincia autnoma, est escorado nos seus prprios princpios, que iro informar as suas normas jurdicas e vincular o legislador, os operadores do direito, como de resto toda a sociedade. Os princpios constitucionais do Direto Ambiental esto traados no art. 225 da Carta Magna. Em face da norma constitucional, possvel enumerar alguns dos seus principais princpios como veremos a seguir.

1.2. Princpio do desenvolvimento sustentvel: Estabelecido no caput do art. 225 da Constituio Federal, o princpio do desenvolvimento sustentvel busca conciliar a proteo do meio ambiente com o desenvolvimento socioeconmico para a melhoria da qualidade de vida do homem. E o desenvolvimento econmico de uma nao passa necessariamente pela utilizao de bens ambientais, seja como matria prima na produo industrial (insumo), ou como destinatrio dos dejetos dessa produo (poluio). O Direito Ambiental no pretende proibir pura e simplesmente o desenvolvimento econmico, e nem poderia ser diferente, na medida em que ordem econmica nacional fundada na livre iniciativa (art. 170 da Constituio Federal). Entretanto, esse desenvolvimento deve observar alguns fatores de limitao. A livre iniciativa propagada pela Lei Maior no aquela de outras pocas, em que vigorava o modelo de liberalismo econmico e estatal. A livre iniciativa em que se funda a ordem econmica nacional est condicionada observao de alguns limites, tais como a valorizao do trabalho (caput), a defesa do consumidor (inciso V), e o meio ambiente (inciso VI). A Constituio Federal estabelece, no seu art. 255, a obrigao de todos em defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras geraes, considerando o meio ambiente como um bem de uso comum do povo. Pretendeu com isso, o legislador constituinte, adotar o seguinte princpio: o bem ambiental pode e deve ser usado por todos, e por isso mesmo todos tm o dever de defend-lo e preserv-lo, para que as futuras geraes tambm possam dele se utilizar. A Comisso Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (ECO/92) definiu o desenvolvimento sustentvel como aquele que atende s necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as geraes futuras atenderem a suas prprias necessidades. O meio ambiente no intocvel. Pelo contrrio, a maioria das empresas utiliza-se de recursos naturais como insumo na sua produo. So bens retirados da natureza, os chamados bens ambientais. No pretende a lei proibir que ns nos utilizemos desses bens (at porque se trata de bem de uso comum do povo). O que se pretende, sim, que as mesmas pessoas que usam esses bens, criem mecanismos de preservao e recuperao do meio ambiente. O

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conceito de desenvolvimento sustentvel apresenta, assim, uma feio conciliatria, propondo que pode ocorrer o progresso tcnico, o desenvolvimento, dentro de parmetros que respeitam os limites ambientais ao mesmo tempo em que reafirma a necessidade do crescimento econmico como condio necessria para a gesto de problemas sociais. Os recursos naturais, os bens ambientais, so finitos. Isso significa que a sua utilizao indiscriminada, sem a preocupao com a sua preservao, ir conduzir sua extino. No se pode admitir que as atividades empresariais fiquem alheias a essa realidade. Quem se prope a desenvolver uma atividade econmica tem, como obrigao legal, a responsabilidade com a preservao do meio ambiente.

1.3. Princpio do poluidor-pagador: Encontramos as bases do princpio do poluidor-pagador no pargrafo 3 do art. 225 da Constituio Federal. Uma vez que todos tm direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225, citado, caput), as atividades e as atitudes que causam leso ao meio ambiente no podem ficar impunes. Por isso que aquele que polui tem o dever legal de pagar por isso. Essa a idia central do princpio em comento. A definio jurdica de poluidor encontrada no art. 3, inciso IV, da Lei n 6.938/81: poluidor a pessoa fsica ou jurdica, de direito pblico ou privado, responsvel direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradao ambiental. Desta forma, toda pessoa, seja ela fsica ou jurdica, que causar um dano ambiental dever repar-lo. Devemos observar, entretanto, que o princpio do poluidor-pagador no se traduz apenas na responsabilidade pela reparao do dano ambiental. Ele vai mais alm, contendo o princpio em comento uma natureza primeiramente cautelar e preventiva. O princpio do poluidor-pagador importa na transferncia dos custos, normalmente suportados pela sociedade, referentes poluio, para que seja pago primeiramente pelo poluidor, no apenas como forma de reparao do dano, mas com a implementao de medidas preventivas.

3.4. Princpio da preveno: Previsto no caput do art. 225 da Constituio, o princpio da preveno revela a preocupao com a segurana do meio ambiente, sua manuteno e preservao para que as prximas geraes possam dele usufruir. Preveno vem de prevenir, evitar que acontea. O princpio da preveno determina a todos que se preocupem com a preservao ambiental, evitando que ocorra o dano ambiental. Trata-se de um princpio de importncia impar para o Direito Ambiental, na medida em que os danos ambientais ocorridos, na grande maioria das vezes, no tm reparao, so irreversveis, de forma que se torna impossvel retornar ao status quo ante. O objetivo precpuo evitar que o dano ocorra que prefervel a ter que repara-lo aps a sua ecloso , eis que o dano ambiental dificilmente corrigvel e muitas vezes no indenizvel. A preveno busca minimizar os riscos aos quais o meio ambiente est exposto.

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Como j tivemos a oportunidade de afirmar, o Direito Ambiental deve se harmonizar com a livre iniciativa, e vice versa. O princpio da preveno no busca impedir as atividades econmicas e humanas. Muito pelo contrrio. O princpio da preveno objetiva exatamente possibilitar o desenvolvimento humano, controlando os riscos ambientais.

3.5. Princpio da participao: Previsto no caput do art. 225 da Constituio Federal, o princpio da participao implica no reconhecimento de que a defesa do meio ambiente incumbe a toda a sociedade, ou seja, ao Estado e sociedade civil organizada. Desta forma, observa-se o dever de uma atuao conjunta entre organizaes ambientalistas, sindicatos, indstrias, comrcio, agricultura e tantos outros organismos sociais comprometidos nessa defesa de preservao. A idia central de que, se o bem ambiental um bem de uso comum do povo, o povo, em todas as suas formas de organizao, que deve cuidar e decidir acerca do seu uso. Desta forma, toda a sociedade deve estar engajada, juntamente com o Poder Pblico, na defesa e preservao do meio ambiente.

CAPTULO 2. BEM AMBIENTAL

2.1. Um novo tipo de bem jurdico: A exata compreenso do Direito Ambiental passa necessariamente pela conceituao do que seja bem ambiental. que, com a Constituio Federal de 88, um novo tipo de bem jurdico foi introduzido no nosso ordenamento jurdico, que veio afastar aquela tradicional dicotomia at ento existente entre bens pblicos x bens privados. Esse novo tipo de bem o bem ambiental, previsto expressamente no art. 225 da Constituio Federal, verbis:
Art. 225. Todos tm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Pblico e coletividade o dever de defend-lo e preserv-lo para as presentes e futuras geraes. (g.n.).

O bem ambiental , portanto, um novo tipo de bem jurdico, inserido no ordenamento jurdico pela Constituio de 88, que deve ser considerado de forma autnoma, no se confundindo com os bens pblicos nem com os privados.

2.2. Bem de uso comum do povo: Afirmando a Constituio Federal que o bem ambiental de uso comum do povo e que todos tm o direito de us-lo, resta claro estar-se diante de um bem que no pblico, muito menos particular, eis que no se refere a uma pessoa (fsica ou jurdica, de direito privado ou pblico) individualmente considerada, mas sim a uma coletividade de pessoas, configurando um direito coletivo (lato sensu). Estabelecendo que o meio ambiente ecologicamente equilibrado um

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bem de uso comum do povo a que todos tm direito, o legislador constitucional traou as diretrizes que permitem a identificao da natureza jurdica desse direito. Ora, se o uso do bem garantido a todas as pessoas, no resta dvida que estamos diante de um bem metaindividual, que supera o indivduo. Sua titularidade indefinida, representada pelo pronome indefinido todos, que d maior amplitude abrangncia a norma jurdica, pois, no particularizando quem tem direito ao meio ambiente, evita que se exclua quem quer que seja. E ao determinar o uso comum, estabeleceu-se a natureza indivisvel deste direito ao meio ambiente equilibrado.

2.3. Direitos e interesses difusos: Os direitos coletivos lato sensu, referidos na Carta Magna, ganharam definio legal infraconstitucional com o advento da lei 8078/90, que estabeleceu em seu art. 81, pargrafo nico, inciso I o que so interesses difusos:
I interesses ou direito difusos, assim entendidos, para efeitos deste Cdigo, o transindividuais, de natureza indivisvel, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstncias de fato.

Assim sendo, fazendo a conexo do dispositivo constitucional em conformidade com o disposto no art. 81 do Cdigo de Defesa do Consumidor, o bem ambiental configura um direito difuso, metaindividual, no limitado ao interesses privados ou pblicos, e no subordinado ao direito de propriedade, no guardando qualquer compatibilidade com institutos outros que no estejam adstritos ao direito de usar aludido bem. O titular do bem ambiental a coletividade, assim entendida como os brasileiros e estrangeiros residentes no Pas (CF, art. 5, caput). Tratase, pois, de um direito transindividual, de natureza indivisvel, cujos titulares so pessoas indeterminadas, ligadas por uma circunstncia de fato.

2.4. Bem essencial sadia qualidade de vida: Como o bem ambiental se trata de um bem essencial sadia qualidade de vida, deveremos enfrent-lo luz do que dispem o art. 1, III combinado com o art. 6, ambos da Constituio Federal. Para se ter uma vida saudvel, necessria a satisfao dos fundamentos democrticos previstos na Constituio Federal, em especial o da dignidade da pessoa humana (art. 1, III), alm de valores fundamentais mnimos como a educao, a sade, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurana, a previdncia social, a proteo maternidade e infncia e a assistncia aos desamparados (art. 6). Tais valores constituem um piso vital mnimo de direitos que devem ser assegurados pelo Estado, para o desfrute da sadia qualidade de vida. Uma vida digna e saudvel aquela em que se tem garantidos e efetivados os direitos componentes desse piso, de forma que a definio jurdica de bem ambiental est vinculada no s tutela da vida

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da pessoa humana mas particularmente tutela da vida da pessoa humana com dignidade, remetendo o intrprete ao conceito doutrinrio de piso vital mnimo.

2.5. Bem ambiental concluso: da somatria desses dois aspectos, ser de uso comum do povo e ser essencial sadia qualidade de vida, que se estrutura constitucionalmente o bem ambiental criado pela Constituio Federal de 1988. O bem ambiental, assim, constitui um terceiro tipo de bem jurdico, que no particular e tampouco pblico. um bem de interesse difuso, de uso comum do povo e essencial sadia qualidade de vida da coletividade.

CAPTULO 3. MEIO AMBIENTE

3.1. Meio ambiente conceituao: Meio ambiente tudo aquilo que est nossa volta. A preocupao do ser humano com o meio ambiente relativamente recente, ganhando espao principalmente aps a Revoluo Industrial ocorrida no final do Sculo XIX, quando o desenvolvimento econmico desordenado acarretou uma maior deteriorao da qualidade ambiental, revelando, ainda, a limitao dos recursos ambientais. Tal situao acabou por despertar a conscincia de diversos seguimentos da populao mundial para a necessidade da preservao ambiental. O conceito de meio ambiente dever englobar obrigatoriamente o homem e a natureza, com todos os seus elementos. que, para o homem, a natureza apresenta-se de duas formas: como fonte de recursos econmicos e como fonte de bem-estar. Da natureza o homem tanto pode extrair recursos e insumos necessrios produo de riquezas, como usufruir momentos de lazer.

3.2. Meio ambiente definio jurdica: Juridicamente, a definio de meio ambiente encontra-se no art. 3, inciso I, da Lei da Poltica nacional do Meio Ambiente (Lei n 6.938/81):
Art. 3. Para os fins previstos nesta lei, entende-se: I meio ambiente, o conjunto de condies, leis, influncias e interaes de ordem fsica, qumica e biolgica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.

Com base na definio de meio ambiente acima mencionada e nas disposies constitucionais, podemos classificar o meio ambiente, a ser protegido juridicamente, da seguinte forma: a) Meio ambiente natural: constitudo por solo, gua, ar atmosfrico, flora e fauna. Encontramos sua previso constitucional nos inciso I e VII do art. 225:

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I preservar e restaurar os processos ecolgicos essenciais e prover o manejo ecolgico das espcies e ecossistemas; VII proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as prticas que coloquem em risco sua funo ecolgica, provoquem a extino de espcies ou submetam os animais a crueldade.

b) Meio ambiente artificial. o espao urbano construdo, constitudo pelo conjunto de edificaes e pelos equipamentos pblicos. Encontramos previso constitucional principalmente no art. 182, que trata da Poltica Urbana. No plano infraconstitucional, temos o Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001). c) Meio ambiente do trabalho. o local onde as pessoas executam suas atividades laborais, cujo equilbrio baseia-se na salubridade do meio a na ausncia de agentes que comprometem a sade dos trabalhadores. Est previsto na Constituio federal, no art. 200, VIII:
Art. 200. Ao sistema nico de sade compete, alm de outras atribuies, nos termos da lei: VIII colaborar na proteo do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho.

d) Meio ambiente cultural. integrado pelo patrimnio histrico, artstico, arqueolgico, paisagstico, turstico de um povo. Encontramos previso constitucional no art. 216, que trata do Patrimnio Cultural Brasileiro.

CAPTULO 4. DANO AMBIENTAL

4.1. Qualidade ambiental: Qualidade ambiental pode ser conceituada como o estado do meio ambiente ecologicamente equilibrado que proporciona uma sadia qualidade de vida. Desta forma, todos tm direito a viver com qualidade ambiental, situao que se relaciona com a atividade contnua e ininterrupta das funes essenciais do meio ambiente, adequada para as presentes e as futuras geraes.

4.2. Degradao ambiental: A degradao da qualidade ambiental est definida no art. 3, II, da Lei 6.938/81: degradao da qualidade ambiental a alterao adversa das caractersticas do meio ambiente. Desta forma, haver degradao da qualidade ambiental toda vez que houver alterao adversa das caractersticas dos recursos ambientais (ar atmosfrico, guas superficiais e subterrneas, esturios, mar, solo, subsolo, elementos da biosfera, fauna e flora art. 3, V, da Lei 6.938/81). Na forma do que dispe o decreto 97.632, de 10 de abril de 1989, que regulamentou o art. 2, VIII,

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da Lei 6938/81, ... so considerados como degradao os processos resultantes dos danos ao meio ambiente, pelos quais se perdem ou se reduzem algumas de suas propriedades, tais como, a qualidade ou capacidade produtiva dos recursos ambientais.

4.3. Poluio: Primeiramente, preciso deixar claro que poluio no se confunde com degradao da qualidade ambiental. Embora ambos os termos possuam uma correspondncia direta, eles definem situaes diferentes, eis que a poluio exige a atuao humana, o que no ocorre com a degradao. A definio legal de poluio est no inciso III, do art. 3, da Lei n 6.938/81:
III poluio, a degradao da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: a) prejudiquem a sade, a segurana e o bem-estar da populao; b) criem condies adversas s atividades sociais e econmicas; c) afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condies estticas ou sanitrias do meio ambiente; e) lancem matrias ou energia em desacordo com os padres ambientais estabelecidos;

Poluio tem correspondncia direta com a degradao da qualidade ambiental, posto que a lei vincula, de modo indissocivel, poluio e degradao ambiental, pois, conforme visto, salienta expressamente que a poluio resulta da degradao. Anotamos, no entanto, que poluio no a simples degradao ambiental, mas uma degradao ambiental qualificada por uma atividade humana. Destarte, verificamos que o termo degradao tem um sentido mais amplo do que poluio: o conceito de poluio est contido no conceito de degradao. Toda poluio contm uma degradao ambiental, mas nem toda degradao ambiental ser considerada poluio. Poluio, assim, a degradao ambiental intolervel causada de uma atividade humana.

4.4. Dano ambiental: Dano ambiental a leso a um bem ambiental. Ele decorre de uma atividade humana que causa uma degradao da qualidade ambiental, acima do limite do tolervel. O dano ambiental fator indispensvel para que surja a responsabilidade ambiental. No haver obrigao de indenizar se no houver dano. Por isso mesmo necessrio indagar-se se qualquer dano ambiental ser passvel de indenizao. Toda atividade humana, de uma forma ou de outra, causa um dano ao meio ambiente. A interao do homem com a natureza, atravs dos tempos, sempre ocasionou algum tipo de dano ambiental. Desde as mais remotas eras, o ser humano subjugou a natureza, utilizando-a em seu benefcio prprio e isso, de uma forma ou de outra, implicava numa alterao da qualidade

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ambiental. Tolerada pela sociedade, dentro daquele determinando contexto histrico, social e econmico, aquela alterao no se constitua num dano indenizvel. certo que com a Revoluo Industrial essa interao homem-natureza intensificou-se, tornando-se

assustadoramente danosa ao meio ambiente, o que despertou na sociedade a preocupao com a situao ambiental no planeta, exigindo preservao, proteo e, especialmente, reparao do dano. Mas no menos certo que isso tambm decorre de um contexto social, cultural, econmico e histrico. Assim colocado, veremos que a reparao do dano ambiental decorrer da valorao desse dano, e do grau de intolerabilidade que ele ir gerar. O dano tolerado no ser indenizado. Dano ambiental indenizvel aquele que desborda do limite da tolerabilidade aceitvel.

4.5. Dano ambiental x crime ambiental: Necessrio, ento, estabelecer a diferena entre dano ambiental e crime ambiental. J vimos que poluio a alterao da qualidade ambiental decorrente de uma atividade humana. Em sentido lato, a poluio abrange a poluio strictu sensu, o dano ambiental e o crime ambiental.

Poluio strictu sensu Poluio lato sensu Dano ambiental Crime ambiental

A poluio em sentido estrito a alterao da qualidade ambiental que no capaz de alterar a ordem ambiental vigente, eis que suas repercusses sobre a normalidade do ambiente so desprezveis e, por isto, no so capazes de transtorn-las. que, embora haja uma alterao da qualidade ambiental qualificada por uma ao humana, essa alterao no intolervel, conforme o paradigma se esteja adotando, de modo que a poluio, em sentido estrito, , portanto, um acontecimento irrelevante. Logo, ela no ser punvel. Quando essa alterao ultrapassa os limites do desprezvel e causa alteraes adversas no ambiente, teremos o dano ambiental, que ser objeto da responsabilidade civil, conforme vimos acima. E quando o dano ambiental for de tal monta que dele resulte ou possa resultar danos sade humana, ou provoque a mortandade de animais ou a destruio da flora, estaremos diante de um crime ambiental, cuja previso legal encontra-se no art. 54 da Lei 9605/98:
Art. 54. Causar poluio de qualquer natureza em nveis tais que resultem ou possam resultar em danos sade humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruio significativa da flora.

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Por isso mesmo que no qualquer atividade poluidora que ser punvel como crime ambiental, mas apenas aquela que, produzida em nveis tais, resulte ou possa resultar em danos sade humana ou provoque a mortandade de animais ou a destruio significativa da flora. A criminalizao de condutas lesivas ao meio ambiente demonstra a inteno do legislador de considerar o meio ambiente como um bem jurdico prprio e relevante.

CAPTULO 5. A RESPONSABILIDADE PELO DANO CAUSADO AO MEIO AMBIENTE

5.1. Responsabilidade total: administrativa, criminal e civil: O meio ambiente foi alado condio de bem jurdico pela Carta Constitucional de 88. O bem ambiental passou a ser tutelado expressamente pelo art. 225 da Constituio Federal em todas as suas facetas jurdicas, consagrando a responsabilidade total do poluidor pelas condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente. Destarte, em se tratando de dano causado ao meio ambiente natural, preciso observar que a responsabilidade total, ou seja, o poluidor responder pelo dano causado nas esferas administrativas, criminal e civil. o que dispe o 3 do art. 225 da Constituio Federal:
3. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitaro os infratores, pessoas fsicas ou jurdicas, a sanes penais e administrativas, independentemente da obrigao de reparar os danos causados.

A defesa do meio ambiente deve ser a mais ampla possvel e isso se revela ao comando do caput do art. 225, que coloca o meio ambiente equilibrado como um direito de todos ao mesmo tempo em que atribui a todos (o Poder Pblico e a coletividade) o dever de defend-lo e preservlo para as presentes e futuras geraes. Desta forma, a tutela jurdica do meio ambiente se faz de forma ampla, nas esferas administrativa, penal e civil. Isso significa que, para um mesmo fato, um nico fato, o poluidor poder ser responsabilizado administrativa, civil e criminalmente, concomitantemente, sem que uma exclua a outra. A importncia de se possibilitar a

responsabilizao total do agente poluidor garantir que o dano ambiental seja efetivamente reparado e/ou punido. A impunidade conduz reincidncia e no gera o desestmulo necessrio a evitar que outros danos ambientais ocorram. Em razo disso a responsabilizao do infrator deve ocorrer da forma mais ampla possvel, de sorte a incutir nele o receio de praticar alguma atividade nociva ao meio ambiente. Muitas vezes a simples imposio de multa administrativa no resolve o problema causado, sendo necessrio restituir o ambiente, reparando-o. Outras vezes, a simples reparao no suficiente para desestimular o poluidor, sendo necessrio partir-se para a esfera penal. O direito penal, alis, que vem se tornando a grande arma jurdica para reprimir o dano

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ambiental. de se mencionar, ainda, que a empresa, enquanto pessoa jurdica, poder ser responsabilizada criminalmente pelos danos causados ao meio ambiente, como veremos a seguir. 5.2. A responsabilidade penal da empresa pelo dano ambiental 5.2.1. Responsabilidade penal ambiental: A importncia e a relevncia do meio ambiente para a dignidade da vida humana, como bem jurdico autnomo, se mostra de tal maneira fundamental que o legislador constituinte cuidou, inclusive, de estabelecer a responsabilizao penal do poluidor. o que se v expressamente no pargrafo 3 do art. 225 da Constituio Federal. Um determinado fato somente ser considerado uma infrao penal (crime ou contraveno penal) quando houver expressa previso legal. Isso decorre do princpio de que no h crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prvia cominao legal, expresso no art. 5, XXXIX, da Constituio Federal. Com os crimes ambientais no nem poderia ser diferente. No plano infra-constitucional, at o ano de 1998, encontrvamos a definio de crimes ambientais em vrios diplomas legais, como, por exemplo, o prprio Cdigo Penal (art. 271), o Cdigo Florestal (Lei n 4771/65 arts. 26 e 45), a Lei de Proteo Fauna (Lei n 5197/67 arts. 27 e 34), entre outros. No entanto, todas essas leis foram revogadas pela Lei n 9605, de 12 de fevereiro de 1998, que disps sobre as sanes penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, separando os crimes segundo o objeto de tutela, seguinte forma: crimes contra a fauna (arts. 29 a 37), crimes contra a flora (arts. 38 a 53), poluio e outros crimes (arts. 54 a 61) e crimes contra a administrao ambiental (arts. 66 a 69), revogando expressamente as disposies em contrrio (art. 82). As infraes penais contra o meio ambiente so de ao pblica incondicionada, cabendo ao Ministrio Pblico propor a ao penal cabvel, conforme previsto no Cdigo de Processo Penal. No entanto, aplicam-se aos crimes de menor potencial ofensivo os dispositivos do art. 89 da Lei n 9099/95 (Lei do Juizado Especial), na forma do disposto nos arts. 27 e 28 da citada Lei de Crimes Ambientais (Lei n 9605/98).

5.2.2. A responsabilidade penal da pessoa jurdica: Um tema que sempre desperta algum tipo de discusso mais acalorada, especialmente por parte dos tradicionalistas do direito, diz respeito responsabilidade penal da empresa. A evoluo do mundo, especialmente nos sculos XIX e XX, viu florescer uma era de tecnologia nunca antes imaginada. A industrializao da produo, a informatizao e a biotecnologia mudaram a forma de ser do prprio homem, na sua relao com a natureza. Com isso, grandes corporaes surgiram para explorar o nicho aberto por essa nova ordem. A partir da Revoluo Industrial, as relaes sociais se modificaram profundamente. Antes, apenas o indivduo, pessoa fsica, que praticasse o ato ilcito poderia ser responsabilizado criminalmente. Com a Revoluo Industrial, a empresa passa a ser vista como elemento potencializador de riscos e, como plo agregacional de

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interesses, passa a ser, em algumas circunstncias e dentro de determinados contextos, o centro de ateno da cena criminal, eis que nas ltimas dcadas, a poluio, o desmatamento intensivo, a caa e a pesca predatria no so mais praticados s em pequena escala. O crime ambiental principalmente corporativo. O assunto ora ventilado constitui verdadeiro dogma do Direito Penal. Os tradicionalistas no admitem, em hiptese alguma, que a pessoa jurdica possa ser sujeito ativo de um delito penal. Mas o fato que, desde o advento da Constituio Federal de 88, a responsabilidade penal da pessoa jurdica uma realidade com a qual todos os operadores do Direito tm de conviver, concordem ou no. No mundo moderno, globalizado e massificado, as grandes atividades econmicas so exploradas atravs de grandes corporaes, que se organizam de maneira empresarial em sociedades. Tais sociedades, legalmente constitudas para esse fim, adquirem personalidade jurdica prpria. Os princpios da atividade econmica encontram-se no art. 170 da Constituio Federal: livre iniciativa, livre concorrncia e livre exerccio de qualquer atividade econmica. Mas ao lado desses princpios liberais, encontramos outros limitadores dessa liberdade, como, por exemplo, a defesa do meio ambiente. Isso faz nascer uma obrigao legal para a empresa, que a responsabilidade socioambiental. As sociedades constitudas para o desenvolvimento de uma atividade econmica denominam-se sociedades empresrias. Essas sociedades so, na maioria das vezes, as causadoras dos danos ambientais de grande proporo. Responsabiliz-las civil e administrativamente pelos danos causados simples. O problema surge quando a questo atribuir-lhes responsabilidade penal.

5.2.2.1. O dogma societas delinquere non potest e o crime ambiental corporativo: Durante anos, o direito vedou a possibilidade de responsabilizar criminalmente a pessoa jurdica, opondo obstculos legais e forte oposio doutrinria e jurisprudencial, observando, como regra, a mxima societas delinquere non potest (a sociedade no pode delinqir). Entrementes, se a responsabilidade penal da pessoa jurdica antes era discutvel, hoje reconhecida constitucionalmente. A Constituio de 1988, rompendo com a tradio da doutrina penal, considera a pessoa jurdica - sem distinguir se pblica ou privada - como ente capaz de cometer delitos. A doutrina contempornea reconhece que o princpio do direito penal tradicional de que a sociedade no pode delinqir encontra-se hoje mitigado. Para Srgio Salomo Shecaira, a tendncia do direito penal moderno romper com o clssico princpio societas delinquere non potest. Isso porque a pessoa jurdica no pode ser vista com os olhos conceituais da doutrina clssica.

5.2.2.2. A responsabilidade penal da pessoa jurdica na Constituio e na lei: A Constituio Federal prev a responsabilizao criminal da pessoa jurdica em duas oportunidades. A primeira est situada no captulo que trata dos princpios gerais da atividade

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econmica; a segunda, no que disciplina o meio ambiente. No primeiro caso, diz o artigo 173, 5, da Constituio:
A lei, sem prejuzo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurdica, estabelecer a responsabilidade desta, sujeitando-a s punies compatveis com a sua natureza nos atos praticados contra a ordem econmica e financeira e contra a economia popular.

Na segunda hiptese, o artigo 225, 3 da Constituio preceitua que


as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitaro os infratores, pessoas fsicas ou jurdicas, a sanes penais e administrativas, independentemente da obrigao de reparar os danos causados.

Seguindo a norma constitucional, no plano infraconstitucional a Lei 9.605/98 (que trata dos crimes ambientais), em seu art. 3 estabelece que
as pessoas jurdicas sero responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme disposto nesta lei, nos casos em que a infrao seja cometida por deciso de seu representante legal ou contratual, ou de seu rgo colegiado, no interesse ou benefcio da sua entidade.

Devemos lembrar que o Direito Penal inicia-se a partir da Constituio Federal, e no a partir do Cdigo Penal, que apenas um subsistema do nosso sistema constitucional. Assim que o art. 5, inciso XXXIX, da Carta Magna estabelece que no h crime sem lei anterior que o definam, nem pena sem prvia cominao legal. O significado disso que a lei, em sentido lato, que define o que crime e que estabelece qual ser a pena. Desta forma, nada h de inconstitucional na Lei 9.605/98, muito menos no que se refere ao disposto no mencionado art. 3, eis que em perfeita sintonia com a Constituio Federal. E a mesma Constituio, ao tratar das penas, contempla cinco possibilidades, das quais apenas uma restritiva de liberdade. o que dispe o inciso XLVI do mencionado art. 5, verbis:
XLVI a lei regular a individualizao da pena e adotar, entre outras, as seguintes: a) b) c) d) e) privao ou restrio de liberdade; perda de bens; multa; prestao social alternativa; suspenso ou interdio de direitos.

Podemos observar que apenas 20% das penas previstas na Constituio Federal so privativas ou restritivas de liberdade. As outras 80% referem-se perda de bens e de direitos, perfeitamente aplicveis pessoa jurdica. E isso se d porque o Direito Penal moderno, inaugurado a partir da Carta Magna de 88, tem outras preocupaes que no simplesmente o indivduo, mas principalmente com a coletividade. Os bens jurdicos que atualmente comportam

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proteo do direito penal so diferentes daqueles de outrora. Afinal, na prpria natureza do bem, seja difuso ou coletivo, que reside o alcance do direito penal na sociedade de risco. O sujeito passivo, nesses crimes, no um indivduo, como no estelionato ou nas leses corporais. toda a coletividade. O alcance maior. Enquanto o direito penal tradicional ocupava-se apenas de bens individuais, tais como a vida, a sade ou a honra, a realidade da sociedade de massa, decorrente da revoluo tecnolgica, trouxe profundas alteraes na concepo de criminalidade, que se encontra mais e mais atrelada a atividades lcitas. So atos prprios dessa sociedade surgida posteriormente revoluo industrial e que geralmente atingem interesses difusos. A funo do direito penal moderno , pois, tutelar esses bens difusos. , pois, interesse de toda a sociedade e no de apenas um indivduo ou de um pequeno grupo. Numa sociedade capitalista, cuja ordem econmica fundada na livre iniciativa (art. 170 da Constituio Federal), os potenciais agentes criminosos so as grandes empresas (pelos chamados crimes corporativos), especialmente aqueles praticados contra o meio ambiente. E para tal situao, de nada servem as penas privativas ou restritivas de liberdade: a efetividade da pena somente se dar atravs da perda de bens (ou dinheiro) ou da suspenso ou interdio de direitos, como a suspenso total ou parcial das atividades. Desta forma, ao lado da tradicional pena da restrio da liberdade, o Direito Penal moderno criou outras formas de penalizao, como, por exemplo, a multa, a dissoluo, a interdio, a suspenso da atividade, o confisco, a perda de benefcios fiscais, entre outros, plenamente em condies reais de serem aplicadas pessoa jurdica. O mais importante, no entanto, haver a possibilidade jurdica legal (constitucional e infra-constitucional) de se responsabilizar penalmente a pessoa jurdica.

5.3. A responsabilidade objetiva na reparao do dano ambiental 5.3.1. Responsabilidade civil: Responsabilidade, no seu sentido etimolgico, revela a idia de obrigao, encargo, contraprestao. Em sentido jurdico, a idia praticamente a mesma. A responsabilidade decorre da violao de um dever jurdico que acarreta um dano a outrem, que deve ser reparado, no apenas como forma de justia, mas para restaurar o equilbrio antes existente. A responsabilidade civil nos moldes como conhecemos no direito moderno tem suas origens na Lex Aquilia do direito romano. Embora se saiba que tal lei no dispunha de uma regra de conjunto, ela tornou-se fonte direta da moderna concepo da responsabilidade civil aquiliana, fundamentada na culpa do agente. Foi na Frana, no entanto, que se esboaram os contornos da responsabilidade civil moderna, estabelecendo-se alguns princpios bsicos como o direito reparao sempre que houvesse culpa, ainda que leve, separando-se a responsabilidade civil (perante a vtima) da responsabilidade penal (perante o Estado); a existncia de uma culpa contratual (de quem descumpre as obrigaes) e que no se liga nem a crime nem a delito, mas que decorre da negligncia ou da imprudncia.

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No Brasil no foi diferente, e em 1916 o Cdigo Civil brasileiro foi promulgado contemplando a teoria da responsabilidade civil aquiliana tal qual o direito civil francs. O art. 159 daquele Cdigo estabelecia que aquele que, por ao ou omisso voluntria, negligncia, ou imprudncia, violar direito, ou causar prejuzo a outrem, fica obrigado a reparar o dano. Escoravase assim, a responsabilidade civil, na culpa lato sensu, que abrange o dolo (que o conhecimento do mal e inteno de pratic-lo) e a culpa strictu sensu ou aquiliana (a violao de um dever que o agente podia conhecer e observar, segundo os padres de comportamento do homem mdio). A imprevidncia do agente, que pode resultar no ato lesivo, assenta-se sob a forma de imprudncia, negligncia ou impercia (esta, contida no conceito de negligncia). A expresso ao ou omisso voluntria est diretamente ligada vontade de agir ou se omitir, que caracteriza o dolo, enquanto que negligncia ou imprudncia est diretamente ligada culpa. Para a reparao do dano, no entanto, no h diferena entre dolo ou culpa (strictu sensu). O objetivo central da indenizao recompor o patrimnio do lesado ao status quo ante, de modo que pouco importa se o fato ou ato ilcito proveniente de dolo ou de culpa: o resultado o mesmo em uma ou outra situao. Por isso que havendo culpa, a obrigao de reparar o dano a mesma, haja dolo ou culpa em sentido estrito. A responsabilidade civil aquiliana, para gerar a obrigao de indenizar, ao lado da ao ou omisso do agente, tem que conjugar outros trs fatores indispensveis: dano, nexo causal e culpa (lato sensu). que o instituto da responsabilidade civil, alicerado no nexo causal entre o dano e o fato ou ato jurdico imputado ao agente, desponta no ordenamento jurdico como o meio eficaz de atrelar a agentes identificados o dever de promover a indenizao dos danos acarretados injustamente s vitimas. O novo Cdigo Civil no mudou essa orientao. O art. 186 praticamente repete o teor do revogado art. 159, dispondo que aquele que, por ao ou omisso voluntria, negligncia ou imprudncia, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilcito, mantendo o elemento subjetivo como requisito indispensvel da responsabilidade civil. Desta forma, podemos afirmar que a responsabilidade civil subjetiva, ou seja, aquela baseada na culpa do agente, permanece como regra no Cdigo Civil brasileiro. Mas se certo que a responsabilidade civil subjetiva a regra no Cdigo Civil, o mesmo no pode ser dito no que tange ao ordenamento jurdico ptrio como um todo. que, numa sociedade de massa, de economia globalizada, a esmagadora maioria das relaes privadas ser conceituada como relao de consumo, que consagra a responsabilidade objetiva como regra.

5.3.2. Responsabilidade civil objetiva: Diz-se objetiva a responsabilidade que prescinde do elemento subjetivo, ou seja, que no depende de culpa para gerar a obrigao indenizatria, bastando que haja nexo causal e dano. A evoluo tecnolgica decorrente da Revoluo Industrial acelerou o processo de desenvolvimento industrial e fez surgir atividades perigosas, que punham em risco a sociedade. Em razo disso,

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uma vez que a responsabilidade subjetiva mostrava-se insatisfatria, novas teorias foram surgindo objetivando propiciar maior proteo s vtimas, buscando fundamentos para a imputao da responsabilidade dos danos ensejados pelo risco da atividade decorrentes do progresso. Foi na Frana que surgiu um movimento que buscava alternativas teoria clssica da culpa, iniciado por Saleilles e seguido por Josserand, considerando que, restrito ao mbito da culpa, no seria possvel resolver todos os problemas decorrentes da responsabilidade civil. Surgia a teoria do risco criado, segundo a qual aquele que exercesse uma atividade de risco, responderia pelo dano causado objetivamente, ou seja, independentemente de culpa. No Brasil, os contornos da responsabilidade objetiva comearam a ser desenhados com o Decreto n 2.681 de 7 de dezembro de 1912 (a histrica Lei das Estradas de Ferros), que regulou a responsabilidade civil das companhias ferrovirias com base na atividade desenvolvida. Mas o marco decisivo foi dado pelo Cdigo de Defesa do Consumidor, nos arts. 12 e 14 que, ao consagrar que a responsabilidade do fornecedor pelo fato do produto ou do servio se d independentemente de culpa, acabou adotando a teoria da responsabilidade objetiva fundada no risco da atividade para responsabilizar o fornecedor. No mesmo sentido, o novo Cdigo Civil adotou a teoria do risco, no pargrafo nico do art. 927.

5.3.3. Teoria do risco: A teoria do risco foi a principal, e a mais bem aceita, teoria sobre responsabilidade objetiva. Ela traduz-se no seguinte enunciado: todo aquele que desenvolve uma atividade que implique risco para outrem, fica obrigado a reparar o dano causado, independentemente de culpa. A teoria do risco deve ser conjugada juntamente com os princpios constitucionais da ordem econmica, tendo relao direta com a livre iniciativa. Tendo o empreendedor liberdade de ao, ele deve arcar com os riscos da sua atividade, da mesma forma como ele absorve e aproveita os seus lucros. A liberdade de ao, garantida pela Constituio Federal, acarreta como conseqncia a responsabilizao de empresa pelo risco da sua atividade. Trata-se da Teoria do Risco da Atividade ou do Risco Proveito, segundo a qual quem desenvolve uma atividade com fins de lucro, tem que assumir as responsabilidades decorrentes da prpria atividade. A responsabilidade objetiva prescinde da culpa para obrigar o ofensor reparao, bastando que se demonstre o nexo de causalidade e o dano. Desta forma, possvel nascer a obrigao de indenizar independentemente da prtica de qualquer ato ilcito. Havendo previso legal de responsabilizao, ou sendo a atividade considerada de risco, o responsvel pela reparao pode at no ter praticado nenhum ilcito e mesmo assim haver o dever de indenizar. Mais ainda, o dever da reparao poder at mesmo surgir de um ato lcito, como vai ocorrer nas hipteses de danos ambientais, como veremos a seguir.

5.3.4. A responsabilidade pelo dano ambiental:

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A responsabilidade civil por dano ambiental objetiva. Com efeito, vivemos numa sociedade de risco, onde os perigos da ocorrncia dos danos ambientais decorrentes da evoluo tecnolgica, verificada especialmente no sculo passado, so eminentes e freqentes, o que fora que a reparao se d independentemente de culpa do agente. De fato, esse desenvolvimento econmico e tecnolgico vai trazer como conseqncia um fator de risco, que poder se manifestar nos processos de produo (na explorao de energia nuclear, por exemplo), no aumento de substncias perigosas (resduos txicos), e na forma com que se lida com elas (transporte, armazenamento, descarte). evidente que, de uma forma ou de outra, todas essas atividades afetaro o meio ambiente. Quando isso se der de maneira negativa, ensejando uma degradao da qualidade ambiental que resulta na poluio, o responsvel dever compensar o dano, pelo simples fato de se beneficiar diretamente do exerccio daquelas atividades perigosas, sem qualquer considerao acerca da sua culpa. Por conta disso tudo, a Lei. 6938/81, em seu art. 14, 1, adotou a responsabilizao objetiva do poluidor:
1. Sem obstar a aplicao das penalidades previstas neste artigo, o poluidor obrigado, independentemente da existncia de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministrio Pblico da Unio e dos Estados ter legitimidade para propor ao de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.

Esse artigo 14 foi totalmente recepcionado pela Constituio Federal, que estabeleceu, no 3, do art. 225:
3. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitaro os infratores, pessoas fsicas ou jurdicas, a sanes penais e administrativas, independentemente da obrigao de reparar o dano.

Uma vez que a Constituio no adotou nem estabeleceu nenhum critrio ou elemento vinculado culpa como fundamento da obrigao de reparar o dano ambiental, ela recepcionou e consagrou a responsabilidade objetiva, que a norma infraconstitucional j havia estabelecido quase uma dcada antes, atravs do citado art. 14, 1, da Lei 6938/81. A responsabilidade civil pelo dano ambiental , pois, objetiva e se apia na teoria do risco, de maneira que no se aprecia subjetivamente a conduta do poluidor, mas a ocorrncia do resultado prejudicial ao homem e seu ambiente. Devemos observar, entrementes, que o direito ambiental assenta a responsabilidade civil objetiva na teoria do risco integral. Desta forma, ocorrido o dano ambiental, o poluidor estar obrigado reparao, no podendo se valer de nenhum tipo de excludente em sua defesa. Isso ocorre porque, em se tratando de dano ambiental, devemos sempre conjugar a responsabilidade objetiva prevista o art. 14, 1, da Lei 6938/81, com os princpios do poluidor-pagador e da preveno. Destarte, a aplicao da responsabilidade objetiva pressupe a existncia de uma atividade de risco, impondo empresa o dever de segurana (princpio da preveno),

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internalizando-o no processo produtivo (princpio do poluidor-pagador), sob pena de ter de indenizar todo dano que ocorrer.

5.3.5. Reparao do dano ambiental: reparao integral e reparao especfica: Reparao pressupe a idia de ressarcimento ou compensao do dano sofrido: aquele que causar prejuzo a outrem fica obrigado reparao. A reparao , assim, o sucedneo da responsabilidade civil. Partindo-se dessa premissa, necessrio primeiramente observar, com base nos princpios que norteiam o direito ambiental, que a reparao do dano deve ser integral (restitutio in integrum). Isso se d, porque em se tratando de meio ambiente, o dano exatamente o que se quer evitar, razo pela qual toda lgica jurdica de proteo e gesto ambiental fundamenta-se numa dinmica preventiva (desenvolvimento sustentvel, preveno, poluidorpagador etc.), e uma vez que o dano ocorreu, ele deve ser reparado da forma mais ampla possvel, servindo como desestmulo para outros poluidores potenciais. A reparao integral do meio ambiente lesado deriva do art. 225, 3 da Carta Constitucional, juntamente com o art. 14, 1 da Lei 6938/81, que no restringiram a extenso da reparao. No havendo restrio, a reparao deve ser a mais ampla possvel, para que no ocorra a indesejvel impunidade. Somente com punio exemplar que se desestimular os poluidores a continuar poluindo. por isso que se pode afirmar, no que se refere responsabilidade civil por dano ambiental, que a reparabilidade integral, levando em conta o risco criado pela conduta perigosa do agente, impondo-se ao mesmo um dever-agir preventivo, como meio de se eximir da reparabilidade integral do eventual dano causado. Sabe-se, entretanto, que a natureza, quando danificada, dificilmente poder ser restaurada, voltando ao seu estado anterior: a extino de uma espcie um fator irreversvel. A reparao integral vai compreender no apenas o prejuzo causado ao bem ou recurso ambiental como tambm toda extenso dos danos produzidos em conseqncia do evento danoso. Destarte, a reparao integral exige a reparao dos danos ambientais casos sejam passveis de reparao bem como o dever de indenizar aqueles danos irreparveis. Duas so as formas pelo qual o dano ambiental pode ser reparado: a primeira a denominada reparao natural ou especfica, onde feito o ressarcimento in natura; a segunda a indenizao, que feita atravs do pagamento de quantia em dinheiro. Vamos encontrar no art. 4, VII, da Lei 6938/81 a obrigao do poluidor de restaurar e/ou indenizar os danos causados. Essa opo legislativa indica que, primeiramente, deve-se tentar a restaurao do bem ambiental lesionado e, somente se invivel esta partir-se para a indenizao. Como visto essas duas formas de reparao do dano ambiental no so opcionais. A reparao no pode ser feita de uma ou de outra forma indiferentemente. Como assinala Fiorillo, primeiramente, deve-se verificar se possvel o retorno ao status quo ante por via da especfica reparao, e s depois de infrutfera tal possibilidade que deve recair a condenao sobre um

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quantum pecunirio.... necessrio que primeiro se busquem todos os meios possveis para a restaurao do bem ambiental lesado, que o objetivo precpuo do direito ambiental brasileiro. Pode-se at afirmar que a principal opo da responsabilidade civil ambiental no a justa compensao da vtima, mas a preveno do dano ecolgico e a reintegrao dos bens ambientais lesados. Desta forma, a reparao especfica, in natura, ser sempre a prioridade, ao fundamento do disposto no art. 4, inciso VI, da Lei 6938/81:
Art. 4. A Poltica Nacional do Meio Ambiente visar: (...) VI preservao e restaurao dos recursos ambientais, com vistas sua utilizao racional e disponibilidade permanente, concorrendo para a manuteno do equilbrio ecolgico propcio vida.

Nesse compasso, a idia de recuperar o bem ambiental lesado como medida primeira a ser buscada vem expressa no 2 do art. 225 da Constituio Federal:
2. Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com soluo tcnica exigida pelo rgo pblico competente, na forma da lei.

Como se v, tanto a Constituio Federal quanto a norma infraconstitucional se harmonizam no sentido de indicar que o caminho primeiro a ser trilhado o da reparao especfica, com o objetivo de retornar o meio ambiente lesado ao status quo ante, preservando-o, assim, para as futuras geraes.

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