Dimensões Da Não Aprendizagem
Dimensões Da Não Aprendizagem
Dimensões Da Não Aprendizagem
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APRESENTAÇÃO
No que tange aos aspectos psiconeurológicos e emocionais, este estudo se propõe a discutir
as dificuldades de aprendizagem na sua relação com as funções cerebrais, abordando os aspectos
psicomotores e focalizando alguns distúrbios específicos de aprendizagem e de comportamento e
suas implicações sobre a educação escolar.
INTRODUÇÃO
Diante de um cenário sociocultural tão mutável e com características tão complexas, surgem
enormes dificuldades por parte das famílias e instituições escolares em prover processos
educacionais adequados e de qualidade, que acompanhem tantas mudanças.
Aprender é ato revestido de concepções e ideologias típicas de cada cultura. Uma criança
que deixa de aprender não o faz por incompetência individual, mas provavelmente porque, em algum
momento, deixou de atender às exigências postas por esta cultura com relação aos conteúdos que
devem ser aprendidos e de que forma isto deve ocorrer.
Apresentar dificuldades para aprender pode ser uma reação saudável do sujeito,
especialmente quando esta carga vem carregada de valores e atitudes sem sentido ou significado
para ele. A escola, uma instituição feita “para todos”, esquece que seres humanos são únicos, em
suas características personológicas assim como em seus anseios e desejos.
Se os conteúdos que a escola empurra goela abaixo de uma criança não interessam ou não
fazem sentido para a sua existência, é muito provável que surja a recusa em aprender. Parece uma
atitude correta, que vai privar o indivíduo de profundos dissabores.
Além das dificuldades de aprendizagem este texto pretende também investigar o fracasso
escolar como ocorrência típica da sociedade industrializada, ou seja, como fenômenos deste
momento histórico e social.
O presente trabalho pretende contribuir neste sentido, apresentando uma discussão mais
elaborada sobre esse tema.
Nossa proposta é olhar o todo sem perder as especificidades das partes. Esta abordagem
prioriza uma perspectiva dialética do fenômeno das dificuldades de aprendizagem, aqui
compreendido como situação construída nas relações sociais macrossistêmicas e interações
microssistêmicas que dão origem e destino aos processos de ensino e aprendizagem.
Objetivos:
Conceituação de aprendizagem
Definir aprendizagem é uma tarefa complexa. Nesta Unidade optamos por apresentar
conceituações elaboradas por investigadores renomados na área, com o propósito de ampliar as
possibilidades de compreensão desse fenômeno assim como do seu oposto: o processo do não
aprender.
Aprende-se perseguindo sinais para o objetivo, mapeando nosso caminho para esse objetivo
(mapa cognitivo); a aprendizagem é adquirida por meio de comportamento significativo, não do
mero movimento. A compreensão, mais que o condicionamento, é a essência da aprendizagem.
(Tolman, 1932 em SAHAKIAN, 1980, p. 220).
Entre as teorias que a discutem, podemos observar duas que atualmente já estão sendo
superadas.
A primeira afirma que ela está associada a um processo de memorização e entende que o ato
de aprender se reduz a uma operação intelectual de acumular informações. Nessa perspectiva
teórica, a educação é entendida como um processo simples de transmissão de conhecimento e o
aluno como um receptáculo vazio de informações, tal como uma página em branco em que podem
ser adicionados diferentes tipos de dados.
O ambiente externo, formado por objetos e pessoas com os quais o indivíduo se relaciona
teria, segundo essa vertente, a capacidade de determinar toda a formação do indivíduo, que é
entendido como aquele que é “moldado” pelo meio. Essa concepção de aprendizagem, por
supervalorizar a importância do meio para a formação do indivíduo, acaba por relegar ao segundo
plano a importância dos processos psicológicos e das características individuais.
Estudos posteriores, orientados pelas contribuições das diversas áreas do conhecimento como
a psicologia cognitiva e sócio-histórica, a psiconeurologia, a antropologia e a linguística ajudaram na
formação de uma nova concepção de aprendizagem, que a entende como um fenômeno
multideterminado.
De acordo com esses estudos, os fatores internos do indivíduo e externos a ele (meio) se inter-
relacionam continuamente, formando uma complexa combinação de influências.
A aprendizagem abrange os hábitos que formamos ao longo de nossas vidas, aspectos da vida
afetiva, os conceitos científicos e os valores culturais que assimilamos. Resulta, portanto, de uma
interação entre as condições singulares, internas de um indivíduo e os recursos desafiadores do
meio sociocultural no qual está inserido. Nesse diálogo constante, ambos se transformam: indivíduo
e meio.
Segundo esse ponto de vista, quando uma pessoa enfrenta algumas situações específicas, a
sua resposta, reação ou aprendizagem dependerá, obviamente, das características dessa situação,
mas será determinada também, em grande parte, pelas suas características pessoais e pela
organização dos seus conhecimentos.
Teorias De Características
aprendizagem
Ponto central: estrutura cognitiva do sujeito. As estruturas cognitivas
Epistemologia mudam por meio dos processos de adaptação: assimilação e
Genética de Piaget acomodação. A assimilação envolve a interpretação de eventos em
termos de estruturas cognitivas existentes, enquanto que a
acomodação se refere à mudança da estrutura cognitiva para
compreender o meio. Níveis diferentes de desenvolvimento cognitivo.
O aprendizado é um processo ativo, baseado em seus conhecimentos
Teoria prévios e os que estão sendo estudados. O aprendiz filtra e transforma
Construtivista de a nova informação, infere hipóteses e toma decisões. Aprendiz é
Bruner participante ativo no processo de aquisição de conhecimento. Instrução
relacionada a contextos e experiências pessoais.
Desenvolvimento cognitivo é limitado a um determinado potencial para
Teoria cada intervalo de idade (ZPD); o indivíduo deve estar inserido em um
Sócio-Cultural de grupo social e aprende o que seu grupo produz; o conhecimento surge
Vygotsky primeiro no grupo, para só depois ser interiorizado. A aprendizagem
ocorre no relacionamento do aluno com o professor e com outros
alunos.
Aprendizagem Aprendizagem se inicia com um problema a ser resolvido. Aprendizado
baseada em baseado em tecnologia. As atividades de aprendizado e ensino devem
Problemas/Instrução ser criadas em torno de uma “âncora”, que deve ser algum tipo de
ancorada (John estudo de um caso ou uma situação envolvendo um problema.
Bransford & the
CTGV)
Teoria da Trata da transferência do conhecimento e habilidades. É especialmente
Flexibilidade formulada para dar suporte ao uso da tecnologia interativa. As
Cognitiva (R. Spiro, atividades de aprendizado precisam fornecer diferentes representações
P. Feltovitch & R. de conteúdo.
Coulson)
Aprendizado Aprendizagem ocorre em função da atividade, contexto e cultura e
Situado (J. Lave) ambiente social na qual está inserida. O aprendizado é fortemente
relacionado com a prática e não pode ser dissociado dela.
Enfatiza a percepção ao invés da resposta. A resposta é considerada
como o sinal de que a aprendizagem ocorreu e não como parte integral
Gestaltismo do processo. Não enfatiza a sequência estímulo-resposta, mas o
contexto ou campo no qual o estímulo ocorre e o insight tem origem,
quando a relação entre estímulo e o campo é percebida pelo aprendiz.
O fator mais importante da aprendizagem é que o aluno já sabe. Para
Teoria da Inclusão ocorrer à aprendizagem, conceitos relevantes e inclusivos devem estar
(D. Ausubel) claros e disponíveis na estrutura cognitiva do indivíduo. A
aprendizagem ocorre quando uma nova informação ancora-se em
conceitos ou proposições relevantes preexistentes.
Deve-se buscar sempre o aprendizado experimental, pois as pessoas
Aprendizado aprendem melhor aquilo que é necessário. O interesse e a motivação
Experimental (C. são essenciais para o aprendizado bem-sucedido. Enfatiza a
Rogers) importância do aspecto interacional do aprendizado. O professor e o
aluno aparecem como os corresponsáveis pela aprendizagem.
No processo de ensino, deve-se procurar identificar as inteligências
Inteligências mais marcantes em cada aprendiz e tentar explorá-las para atingir o
múltiplas (Gardner) objetivo final, que é o aprendizado de determinado conteúdo.
As teorias de aprendizagem buscam reconhecer a dinâmica envolvida nos atos de ensinar e
aprender, partindo do reconhecimento da evolução cognitiva do homem e tentam explicar a relação
entre o conhecimento preexistente e o novo conhecimento. A aprendizagem não seria apenas
inteligência e construção de conhecimento, mas, basicamente, identificação pessoal e relação por
meio da interação entre as pessoas.
A mãe, no princípio da vida, surge como este outro que outorga, dá significados aos
comportamentos, movimentos, sons e desejos incluindo a criança no mundo, investindo-a de
humanidade. O nível qualitativo dessa relação de significação vai depender do tipo de vínculo
emocional existente entre os dois sujeitos do processo.
Para que uma criança alcance a autonomia de pensamento, é imprescindível que conte com
pais significadores, capazes de suportar a originalidade e a diferença de seu pensamento.
Considerando que os pais representam as primeiras figuras que ensinam e que exercem
grande influência sobre a criança, percebe-se a importância de uma ação tolerante, paciente e
amorosa por parte deles no sentido de interpretar e traduzir as expressões infantis sem atropelar ou
impedir seus esforços em direção à autonomia e liberdade de pensar e sentir.
É indispensável para a criança sentir-se aceita e desejada como ser pensante, sentir-se
valorizada por seus produtos e criações. Segundo Aulagnier (em Fernández, 1991, p. 32), “a mãe é a
porta-voz do bebê quando este chega ao mundo, mas se emerge na mãe um desejo de não mudança,
isso tem um poder desestruturante porque a criança não poderá usar a sua voz para enunciar a sua
palavra”.
Quando argumenta que o sujeito aprendiz é atuante em seu processo de aprender, ressalta a
visão sócio-construtivista que percebe o conhecimento como construção do sujeito agindo em um
mundo de significados, por meio das relações com o outro e com o legado cultural.
Ao falar de aprendizagem, Fernández (1991) argumenta que a visão usual encara o
processo de aprender como ação vinculada à mão e ao cérebro, desconsiderando o sujeito desejante
e criador, que atribui sentido e expressão ao ato da aprendizagem.
A aprendizagem é uma teia, tecida conjuntamente pelas mãos de quem ensina e de quem
aprende cujos fios condutores do fenômeno correspondem ao organismo, à inteligência, ao desejo e
o corpo. É no jogo complexo e dinâmico desses fios que se constrói o processo de aprender e
também o de não aprender. Fenelon (1994, p. 20) completa seu raciocínio acrescentando: No
problema de aprendizagem o que acontece, particularmente, é que a inteligência e o corpo ficam
aprisionados pelos desejos inconscientes. O sintoma é um nó que se dá na trama dos fios que tecem
a aprendizagem.
as perturbações que impedem a normalidade do processo de aprender, qualquer que seja o status
cognitivo do sujeito.
Independente de o sujeito obter escores de inteligência altos ou baixos será considerado problemas
de aprendizagem outros fatores que o impeçam de aprender, não permitindo o aproveitamento de
suas potencialidades.
Nos Estados Unidos, há uma definição criada por lei (US Public Law, pp. 94-142), para o
termo learning disabilities, de acordo com a publicação Learning Disabilities: A Guide for Parents
and Teacher – Silber Psychological Service, 1992 (zorzI, 1994, pp. 15-16), que relata a seguinte
conceituação: Dificuldades de aprendizagem (learning disabilities) é uma desordem em um ou mais
dos processos psicológicos envolvidos na compreensão ou uso da linguagem, falada ou escrita, que
pode manifestar-se como uma habilidade imperfeita para ouvir, pensar, falar, ler e escrever ou
realizar cálculos matemáticos.
Tarnopol, 1981 (em DROUET, 1995, p. 91) apresenta uma definição para distúrbios da
aprendizagem influenciada por uma visão interacionista. Segundo este autor, “distúrbios são
perturbações de origem biológica, neurológica, intelectual, psicológica, socioeconômica ou
educacional, encontradas em escolares, que podem tornar-se problemas para a aprendizagem dessas
crianças”.
Já Kirk e Bateman, 1962 (em DROUET, 1995, p. 92) preferem reservar o termo distúrbios de
aprendizagem “apenas para aqueles casos de crianças com dificuldades de aprendizagem de causas
desconhecidas, uma vez que essas crianças não apresentam defeitos físicos, sensoriais, emocionais
ou intelectuais de espécie alguma”.
Autores como Parente e Ranña (1990) discutem as inúmeras definições existentes para as
dificuldades de aprendizagem como efeito resultante do caráter complexo e amplo desse campo do
conhecimento.
A conceituação das dificuldades de aprendizagem parece tarefa complicada, uma vez que é
cercada de posicionamentos distintos, oriundos de áreas do saber que precisam ser conjugadas para
um entendimento global do fenômeno.
A falta de uma teoria sólida e coesa nos seus paradigmas e pressupostos e de uma
taxonomia pormenorizada e compreensível é, assim, uma das razões que explicam a ambiguidade e a
legitimidade das dificuldades de aprendizagem, daí que a criação e promulgação de serviços
educacionais sejam, presentemente, muito restritas e ineficazes, porque não surge, nem se
vislumbra um critério ou uma definição fidedigna e aquiescente.
Uma discussão inicial sobre as origens das dificuldades de aprendizagem requer uma
constatação importante: a criança que apresenta dificuldades no processo de aprender não é uma
criança deficiente.
Em geral pertence a uma população heterogênea, com subtipos de dificuldades, alguns
comportamentos desviantes e outros semelhantes às crianças normais e sem a apresentação de
características específicas. Tal fato dificulta a avaliação psicopedagógica e, consequentemente, os
limites da intervenção.
Segundo mcCarthy, 1974 (em FONSECA, 1995a, p. 92), os dez comportamentos desviantes
mais frequentes em crianças com problemas de aprendizagem são:
1. Hiperatividade;
2. Problemas psicomotores;
3. Problemas emocionais;
5. Desordens de atenção;
6. Impulsividade;
Para Drouet (1995, pp. 97-98), as dificuldades de aprendizagem atendem a uma origem
complexa, que envolve aspectos múltiplos da vida inter e intrapsíquica, orgânica e social do sujeito
que as apresenta.
Na visão de Pain (1992, p. 28), nenhum fator isolado é determinante no surgimento das
dificuldades de aprendizagem. Suas origens surgem “da fratura contemporânea de uma série de
concomitantes”.
Se o aprender pertence à esfera da relação, o não aprender também tem a mesma Origem,
podendo ser acrescido de fatores de ordem orgânica que completam o quadro. O sintoma que delata
o não aprender surge como um emissário que aponta a origem ou o ponto modal de sua própria
essência.
suas primeiras relações com a mãe, num determinado contexto familiar. Esse modelo de relação
vincular tende a ser reproduzido na escola.
Fichtner (1990, p. 56), posicionando-se sobre a origem dos distúrbios de aprendizagem, argumenta
que:
Segundo o professor Vicente Martins (2004) são três os fatores que influem no
desenvolvimento da capacidade de aprender:
1. . Atitude de querer aprender: e é aí que entra a responsabilidade da escola – é preciso que ela
desenvolva, no aluno, o aprendizado dos verbos querer e aprender, de modo a motivar para conjugá-
los assim: eu quero aprender. Tal comportamento exigirá do aluno, de logo, uma série de atitudes
como interesse, motivação, atenção, compreensão, participação e expectativa de aprender a
conhecer, a fazer, a conviver e a ser pessoa.
Muitas vezes, adotam-se termos técnicos que não encontram lastro ou contrapartida no
campo orgânico, como a célebre “disfunção cerebral mínima” (DCm), que muitos discutem ser a
causa da maioria dos casos de dificuldades de aprendizagem e ninguém, até hoje, conseguiu
localizá-la ou comprová-la por meio dos exames neurológicos, permanecendo a mesma como uma
disfunção sem representação ou verificação orgânica.
São elas:
A partir desse elenco de definições, podemos concluir que, se não há consenso quanto ao que
seja dificuldade de aprendizagem, pelo menos a grande maioria dos autores concorda com as
características que as crianças com problemas para aprender “não” possuem.
De acordo com Fonseca (1995a), a criança com dificuldade de aprendizagem não possui
deficiência sensorial, seja ela visual ou auditiva; não é deficiente motor, com quadros de paralisia
cerebral ou de membros; não é deficiente intelectual, mantendo escores de QI por volta de 90 pontos
e não apresenta distúrbios emocionais graves, que podem caracterizar quadros de psicoses severas.
É como se ela não percebesse ou não conseguisse expressar suas habilidades, caracterizando
um bloqueio na dimensão da expressão e/ou realização de suas competências.
Na sua maioria, não apresentam sinais de debilidade mental, privação cultural, perturbações
emocionais ou privação sensorial, porém perturbações no campo perceptivo, comportamentos
inadequados e problemas no processamento de informações são evidenciados com frequência em
crianças com dificuldades de aprendizagem.
Tentar clarificar o que são ou o que representam os sintomas que surgem em quadros de
dificuldades de aprendizagem é tarefa básica do profissional desta área, especialmente como
contribuição para a composição do corpo teórico psicopedagógico.
O fracasso escolar é, sem dúvida, um dos mais graves problemas sociais e econômicos com
o qual nos deparamos. Ele se espalha por todos os níveis educacionais, penalizando desde crianças
da Educação Infantil até adultos que sofrem em programas de alfabetização, em busca de um
mínimo de condições para o exercício de sua cidadania.
Ao longo das últimas décadas, as crianças brasileiras não conseguiram se libertar desse
vaticínio que as impele para uma vida escolar repleta de situações de frustração e insucesso. Afinal,
por que essas crianças fracassam tanto e por tanto tempo?
No Brasil, o número de sujeitos que não conseguem aprender aumenta a cada ano. Diante
de um quadro caracterizado por crescente retenção em séries escolares, exclusão do aluno do
sistema educacional ou encaminhamento para serviços psicológicos, psicopedagógicos ou médicos, a
escola sente-se perdida e repete, continuamente, o comportamento de responsabilizar o sujeito e sua
família pelo fracasso na aprendizagem.
Surgem os rótulos, que atribuem ao aluno deficiências de toda ordem e que em nada
colaboram para a solução do problema. Em geral, esses rótulos legitimam uma suposta
“incompetência individual ou orgânica para a aprendizagem”, excluindo o aluno não só da vida
escolar como do mundo social e do trabalho.
O fracasso escolar tem origem complexa e multideterminada. Analisar suas causas partindo
apenas de aspectos diretamente relacionados ao sujeito que fracassa consiste em visão reduzida do
processo.
Por ser um fenômeno de alta complexidade, sua construção vai espelhar essa natureza
intrincada e vai exigir uma avaliação de todos os aspectos que contribuem para o surgimento dessa
situação, tanto no contexto escolar como também no do trabalho.
Porém, também somos sabedores de que o espaço escolar, apesar de sua função
reprodutivista, é, ainda, um dos poucos contextos que favorecem o surgimento de uma reação
popular ao sistema ideológico dominante. Renomados educadores brasileiros, como Saviani e
Libâneo, vêm discutindo a possibilidade concreta de construção de uma pedagogia crítica, capaz de
restituir ao sujeito sua condição de cidadão, uma pedagogia a serviço do povo brasileiro e não das
elites política e ideológica
O fracasso escolar deve ser compreendido a partir dessa instância macrossistêmica, que
delata um projeto ideológico que exclui a população pobre não apenas da escola, mas,
principalmente, da possibilidade de construção do seu conhecimento, assim como do acesso ao
mercado de trabalho em iguais condições de competição com os raros cidadãos formados nas elites.
Não é por acaso que uma criança fracassa na escola. O fracasso escolar tem uma missão,
infelizmente mais perversa do que imaginamos.
Ele legitima a exclusão escolar e social, de modo sutil e quase imperceptível, ao culpabilizar
o aluno pelo seu insucesso. Uma vez que ainda se discute a não aprendizagem como oriunda de
aspectos orgânicos, fisiológicos e individuais não há porque duvidar das intenções democráticas do
sistema educacional que provê a todos os sujeitos as mesmas condições de ensino. Se o aluno não
aprende, não é o sistema que tem “culpa”, nem o aluno, necessariamente. Esse aluno não aprende
porque, “infelizmente”, pertence a um contexto social e econômico desprivilegiado que termina por
minar suas possibilidades desenvolvimentais e suas condições de vida.
Diante desse cenário tão precário é quase impossível para o aluno passar pela escola sem
apresentar uma quantidade enorme de dificuldades de aprendizagem que vão legitimar o seu
fracasso, ou seja, a sua participação ativa no seu insucesso escolar.
Para revigorar a perversidade do sistema, surge o discurso de que a solução para esse
problema ultrapassa os muros da escola e deve ser objeto de discussão de instâncias superiores.
O sistema educacional deixa claro que a solução para esse intrincado problema diz respeito a
essas instâncias superiores, como se elas não pertencessem, também, ao sistema político dominante.
Ao que parece, a solução para esse problema também ultrapassa o desejo político das elites
governantes. Se assim não fosse, a realidade seria outra.
O sistema escolar ainda se solidariza com o aluno que fracassa ao inventar múltiplas formas de
auxiliá-lo em sua “recuperação”.
Nesse ínterim surgem ações como a implantação da progressão automática nas distintas
etapas do Ensino Básico, programas de aceleração da aprendizagem, entre outros artifícios que
apenas prorrogam o veredicto final, que sempre é a exclusão.
Diante de constatações tão sérias, a necessidade de investigar com maior profundidade esse
fenômeno dissimulado que é o fracasso escolar torna-se imperativa. Neste ponto partimos para a
escola, com o propósito de compreender o que ocorre em seus espaços, na tentativa de lançar luz
sobre essa questão obscura. Escutamos de educadores e professores que as causas do fracasso
escolar têm origem no aluno e em suas precárias condições de vida. Mais uma vez as outras
dimensões são salvas “do julgamento” e permanecem omissas em relação ao quadro do insucesso na
escola.
O ciclo se fecha e a escola legitima a ideologia dominante ao assumir que o aluno e seu
precário contexto socioeconômico são os elementos responsáveis pelo seu fracasso porque dão
origem às suas deficiências de aprendizagem.
Na maioria das vezes o aluno não é responsável pelo seu fracasso na escola. Em algumas
circunstâncias, ele tem pouco sucesso na escola por vivenciar situações que trazem, em seu bojo,
algum tipo de impedimento ou dificuldade para aprender.
Esse cuidado é necessário, pois esses fenômenos não mantêm, necessariamente, uma relação
causal ou mesmo uma correlação. Eles refletem faces distintas de um grave problema, que é a não
aprendizagem, mas nem sempre estão juntos em sua construção.
1. O fracasso escolar costuma ser compreendido como um fenômeno social que afeta,
especialmente, a população de baixo poder aquisitivo e que frequenta o sistema público de ensino.
3. O fracasso escolar tem origem na relação do sujeito de aprendizagem com seu contexto social
e cultural. O que observamos é que, em geral, esse contexto não é construído para promover o
sucesso escolar do aluno e ele não tem outra opção senão falhar. Esse é o fracasso legitimado e
cantado em verso e prosa na literatura da área.
Por que algumas crianças, absolutamente normais, não aprendem? Essa é uma pergunta
intrigante. Dizer que uma criança não aprende porque possui um distúrbio orgânico, fisiológico,
cerebral ou semelhante é menos complicado do que atribuir o seu fracasso escolar a outros fatores
difíceis de serem mensurados ou mesmo diagnosticados mediante exames.
Por essa razão, há uma enorme tendência em medicalizar o fracasso escolar e tratá-lo como
um distúrbio passível de cura por uma terapêutica adequada ou medicação suficiente. Porém,
mesmo quando cedemos a essa tendência, somos cientes de que há outros aspectos presentes na
construção das dificuldades de aprendizagem que extrapolam as nomenclaturas médicas e
psicológicas.
Há também situações nas quais a criança ingressa na escola em condições perfeitas para
aprender e sai dela apresentando limitações sérias à aquisição do conhecimento. Como explicamos
tal fenômeno? Antes da escola a criança aprendia perfeitamente. Depois da escola essa competência
torna-se comprometida?
O foco de investigação das causas da não aprendizagem também pode mudar de rumo e
apontar para a família, as condições sociais e econômicas do aluno, as crenças e concepções do seu
contexto social, os valores culturais, entre tantos outros fatores. Compreender o fracasso escolar e o
surgimento das dificuldades de aprendizagem em um sujeito exige investigação minuciosa,
detalhada, aprofundada.
Uma investigação psicopedagógica dos fatores que impedem a aprendizagem vai lançar luz
sobre as distintas instâncias que operam na construção das dificuldades de aprendizagem
e que também são geradoras do fracasso escolar.
A compreender a não aprendizagem como oriunda de uma única fonte e considera que só é
possível identificar o que impede a aquisição do conhecimento ao considerarmos os pontos de
partida dessa situação, que são muitos.
O ser humano pertence a uma espécie e partilha com ela características desenvolvimentais
comuns. Isso é fato biológico, genético, fisiológico. Entretanto, sabemos que o homem não se torna
“humano” por legado biológico ou genético. Uma criança só se torna “humana” quando faz parte de
uma cultura e conta com mediadores aptos a transmitir a ela os significados dessa cultura. É por
meio da mediação que a criança se torna “uma pessoa”, desenvolve suas funções psicológicas,
cresce, matura, aprende, passa a pertencer à humanidade.
Nem sempre esse sistema se apresenta para o sujeito em concordância com seus desejos e
aspirações. Muitas vezes, socializar-se e educar-se é experiências difíceis, que demandam auxílio
constante dos pares sociais mais experientes e nem sempre a escola ou a família estão prontas para
ofertar esse auxílio. Em situações desse gênero é muito provável o surgimento de dificuldades que
podem se expressar tanto no processo de desenvolvimento do sujeito como em sua aprendizagem.
1. Dimensões biológica e genética: dizem respeito à herança genética que cada ser humano
recebe no momento da concepção e que dá origem a um ser biológico, pertencente a uma espécie
com a qual ele partilha inúmeras regularidades, tanto desenvolvimentais como de aprendizagem. O
homem é único, porém atende a regularidades desenvolvimentais típicas de sua espécie. Seu
processo de desenvolvimento tem aspectos definidos pelo seu código genético e sua biologia,
entretanto essas dimensões também são afetadas por contextos ambientais, sociais e culturais,
promovendo mudanças e transformações.
Diversos estudos mostram que transtornos biológicos ou mesmo genéticos podem gerar
dificuldades de aprendizagem, com destaque especial para os déficits neurológicos. Situações dessa
natureza ocasionam comprometimentos no processo desenvolvimental do sujeito, especialmente em
sua cognição, promovendo alterações biológicas, comportamentais e emocionais que podem impedir
a aprendizagem.
Entre os possíveis fatores físicos e orgânicos com potencial para impedir ou prejudicar os
processos de aprendizagem, destacamos: (a) desnutrição; (b) exposição a agentes teratogênicos,
como drogas, infecções; (c) incompatibilidade de Rh; (d) exposição à irradiação e/ou poluição; (d)
déficits psicomotores; (e) déficit no crescimento e (f) baixo peso.
Esta vida psíquica rica, complexa e subjetiva é construída ao longo do nosso desenvolvimento
e depende de todas as dimensões que cercam o ser humano. Necessitamos de condições físicas,
biológicas, genéticas, ambientais, sociais e históricas favoráveis para desenvolvermos uma
personalidade saudável. Quando essas condições são abaladas por qualquer circunstância, o
desenvolvimento psicológico do sujeito pode apresentar comprometimentos, entre os quais
destacamos aqueles que vão impedir, especificamente, a aprendizagem.
Ela também aprende a ser uma pessoa, por meio das diversas interações com os pares, no
espaço escolar. A sala de aula é muito mais do que um espaço de aprendizagem; ela é um espaço
privilegiado de desenvolvimento humano, onde crianças “tornam-se seres humanos” e aprendem a
viver em coletividade. Portanto, a escola assume papel de extrema importância na construção de
bom ou mau processo de aprendizagem. A intenção contida no processo educativo formal, em geral,
é boa; os resultados nem sempre.
A escola impede a aprendizagem quando: (a) estrutura o mesmo tipo de ensino para diferentes
crianças; (b) não prepara seus professores de modo adequado; (c) não oferta metodologias de ensino
modernas, sofisticadas e de qualidade; (d) enfatiza a aquisição de conteúdos em detrimento da
produção do conhecimento; (e) utiliza a avaliação como sistema punitivo, ao invés de caracterizá-la
como momento especial de aprendizagem; (f) elimina a dimensão lúdica da sala de aula; (g) distancia
conteúdos curriculares da vida do aluno; (h) constrói ambientes de aprendizagem opressivos, sem
destaque para a criatividade. As instituições familiares também não cooperam com o sucesso escolar
quando: (a) não valorizam a aprendizagem e o estudo; (b) não participam da vida escolar dos seus
filhos; (c) não incentivam ou valorizam a leitura; (d) não estimulam adequadamente as crianças; (e)
negligenciam a educação de valores; (f) associam alto nível de ansiedade ao processo escolar; (g)
nutrem relações interfamiliares pouco ajustadas.
Diante de tantos impedimentos, torna-se quase impossível para uma criança pobre alcançar sucesso
na escola. Se somarmos esse aspecto aos outros já relacionados veremos o fracasso escolar se
constituindo, tornando-se um fenômeno muito mais social do que pedagógico, urdido na
perversidade da má distribuição de renda, fato ainda tão presente em nosso país. Mesmo quando
consegue ultrapassar todas as barreiras impostas pelo macrossistema, a criança pobre sai da escola
em condições precárias para competir em um mercado de trabalho delimitado pela alta
especialização e pela busca de excelência. Nesse contexto, parece que não há saída para essas
crianças.
6. Dimensão Ideológica: toda sociedade ou grupo cultural constrói ideologias que sustentam suas
crenças e valores. Por ideologia compreendemos “um conjunto articulado de ideias, valores,
opiniões, crenças que expressam e reforçam as relações que conferem unidade a determinado grupo
social, seja qual for o grau de consciência que disso tenham seus portadores”. As ideologias surgem
a partir de ideias disseminadas como dominantes e representativas do desejo de uma sociedade. Ela
é incutida mediante distintas práticas, entre as quais se destaca a escolar. A escola é uma das
instâncias transmissoras da ideologia de um povo. Ela dissemina de modo subentendido, sistemas de
ideias dogmaticamente organizadas e as transforma em instrumento de manipulação, domínio ou,
até mesmo, de luta de classes. Não percebemos o processo de apropriação da ideologia que domina
o nosso contexto social, histórico e cultural. Quando percebemos já somos portadores desses valores
e, muitas vezes, lutamos para preservá-los.
De que modo uma ideologia pode gerar dificuldades de aprendizagem ou mesmo fracasso escolar?
Quando ela, por exemplo, dissemina para os membros de uma sociedade que o ingresso no trabalho
se dará por meio do preparo do sujeito, no ambiente escolar, para o exercício de uma profissão e, ao
mesmo tempo não oferta condições democráticas de acesso a uma escolarização de qualidade. Ao
partilhar esse ideário, o sujeito considera que o fracasso escolar e profissional de muitos dos seus
pares se justifica por esse conjunto de valores, ou seja, não há lugar para todos, portanto nada mais
natural do que o fracasso de uma boa parcela.
A escola faz isso com muita competência e, como boa reprodutora da ideologia dominante, lança a
responsabilidade do fracasso nas mãos do aluno, eximindo o contexto social de sua enorme parcela
de culpa. O aluno apresenta dificuldades para aprender porque “já espera” esse quadro. Afinal, ele é
pobre, não tem condições financeiras nem culturais de alcançar o topo da pirâmide social, já
disseram a ele que nem todos chegarão lá e que o melhor a fazer é aceitar sua condição subalterna
sem reclamar. A família também legitima o problema ao assumir que seu filho “não dá para os
estudos”, “não é muito inteligente”, “deve ter a mesma profissão do pai”, entre outras crenças
semelhantes que só fortalecem o sistema ideológico vigente. O psicopedagogo tem a obrigação de
investigar essa dimensão que sempre surge como componente em quadros de dificuldades de
aprendizagem e fracasso escolar.
7. Dimensão Ecológica: esta dimensão compreende a criança inserida em distintos contextos que
são formados pelos vários ambientes em que ela habita no seu cotidiano. Esses microssistemas se
relacionam uns com os outros de distintas maneiras, formando mesossistemas que, por sua vez,
interagem com ambientes e espaços institucionais (exossistemas) em que a criança não
necessariamente está presente, mas que influenciam seus processos de desenvolvimento e
aprendizagem de modo significativo. Todos esses sistemas encontram ressonância no macrossistema
que representa as crenças, ideologias e padrões culturais de cada criança.
8. Dimensões históricas e culturais: para finalizar, vamos analisar o contexto histórico e cultural
e suas interferências no contexto da aprendizagem e seus impedimentos. Já discutimos bastante
sobre a natureza dos processos de desenvolvimento humano e aprendizagem. Somos sabedores de
que o filhote do homem só se torna “humano” pela mediação da cultura, ou seja, de significados
simbólicos que damos às coisas e ao mundo e que são transmitidos aos nossos descendentes
mediante os processos educacionais. O homem se torna homem por meio de outros homens. Esse
processo depende da cultura e de seu contexto histórico.
Por motivos que são plurais, uma criança normal começa a apresentar dificuldades para ler,
escrever e raciocinar matematicamente. Compreender a origem dessas irregularidades é uma das
funções do psicopedagogo, que já sabe que tais DAs são multideterminadas e que exigirão
investigação interdisciplinar minuciosa e criteriosa.
No caso das DAs primárias é muito comum a criança manter um padrão intelectual, motor e
social aproximado do normal. O desvio da conduta normal é pouco evidenciado nas DAs primárias,
mas em caso de persistências das irregularidades na aprendizagem, é possível que o quadro evolua
a ponto de incluir problemas de comportamento.
Em sua maioria, as DAs representam respostas que as crianças normais dão quando se
encontram em situações adversas de ensino. É muito comum, no atendimento clínico e mesmo
institucional, verificar o surgimento de impedimentos à aprendizagem quando os alunos são
expostos a metodologias de ensino pouco criativas e conteudistas, a professores com dificuldades de
interação em sala de aula ou mesmo situações de constrangimento ou violência vividas com os
colegas. Nem sempre as delicadezas presentes nas relações em sala de aula são percebidas pelo
professor ou por outros educadores, mas elas podem atuar fortemente no sentido de promover
sentimentos negativos no aluno a ponto de ele optar por não aprender, como uma forma de se
defender de uma possível ameaça emocional. Infelizmente tal realidade é muito mais comum nas
escolas do que imaginamos.
Hoje em dia é comum observar a escola rotulando alunos como portadores de hiperatividade,
déficit de atenção ou mesmo deficiência mental por desconhecer a etiologia e desenvolvimento
desses transtornos e por desejar medicalizar a dificuldade para aprender, medida que a exime de
sua responsabilidade diante do problema. A escola não percebe que ela é a construtora da maioria
dos quadros de não aprendizagem e, assim como se recusa a perceber o seu papel, também se omite
na reconstrução do vínculo da aprendizagem, deixando o aluno nas mãos de médicos e psicólogos
que nem sempre conseguem ajudar.
Para piorar o quadro, a rotulação de uma pessoa como portadora de um déficit ou transtorno
em nada auxilia em sua recuperação, muito pelo contrário. Essa medida gera discriminação e agrega
valores negativos ao sujeito, implicando em baixa autoestima e percepção de si mesmo como
incompetente.
A escola deve se preparar para lidar com as dificuldades de aprendizagem e com o fracasso
escolar e o psicopedagogo é um profissional apto a auxiliar a instituição escolar nesse sentido. É
importante que o trabalho psicopedagógico institucional atue no sentido de evitar a rotulação
precoce de crianças com problemas de aprendizagem, mas também não negligencie aquela pequena
parcela de alunos que podem, de fato, apresentar transtornos que vão demandar ajuda
especializada.
Disnomia: é a incapacidade para recordar nomes próprios. Consiste em uma anomalia que é mais
presente em quadros neurológicos. Uma criança com Disnomia apresenta dificuldade para recordar
substantivos e nomes próprios podendo chegar a uma alteração grave da fluidez da fala. Para
diagnosticar precisamente um quadro de disnomia é recomendável o auxílio de fonoaudiólogos e
neurologistas.
Disartria: caracteriza-se pela articulação defeituosa dos sons da fala sem comprometer, entretanto,
o processo linguístico. Em geral, essa dificuldade tem origem em distúrbios motores dos órgãos da
fonação (língua e lábios) e necessita de apoio fonoaudiológico para ser diagnosticada. Um exemplo
de disartria: troca fonética dos sons “f” e “v”, “p” e “b” como faz o personagem Cebolinha, dos
quadrinhos do Maurício de Souza.
Disgrafia: é uma irregularidade da linguagem escrita conhecida comumente como “letra feia”. A
criança com disgrafia apresenta uma escrita inferior ao esperado para sua etapa desenvolvimental e
série escolar. É comum também evidenciar a inversão de sílabas, a omissão de letras, a escrita em
espelho e a escrita contínua.
· Classificar números.
[...] sendo um dos transtornos de maior incidência nas salas de aula. Pesquisas realizadas em vários
países mostram que entre 05% e 17% da população mundial é disléxica. Ao contrário do que muitos
pensam a dislexia não é o resultado de má alfabetização, desatenção, desmotivação, condição
socioeconômica ou baixa inteligência. Ela é uma condição hereditária com alterações genéticas,
apresentando ainda alterações no padrão neurológico.
Por esses múltiplos fatores é que a dislexia deve ser diagnosticada por uma equipe
multidisciplinar. Esse tipo de avaliação dá condições de um acompanhamento mais efetivo das
dificuldades após o diagnóstico, direcionando-o às particularidades de cada indivíduo, levando a
resultados mais concretos.
Dislexia traz em sua grafia a sua definição. O prefixo “dis”, que tem origem no termo grego
“dys”, significa “estado imperfeito ou disfunção”. O radical “lexia”, também originado do grego
“léxikos”, representa o termo “palavra, léxico, linguagem” em sua expressão mais ampla. Dislexia,
portanto, é um estado imperfeito da linguagem, uma disfunção no funcionamento do sistema léxico e
que atinge a linguagem escrita como a linguagem falada.
Uma criança que apresenta quadro de TDAH tem enorme dificuldade em selecionar estímulos
e manter o seu foco de atenção. A desatenção, inquietude e impulsividade demandam auxílio
constante de outra pessoa, pois o TDAH impede a criança de agir sozinha para controlar o próprio
comportamento. Em várias situações, essa criança é vista como mal-educada ou sem limites, quando
na verdade ela não tem condições de impedir o fluxo de hiperatividade que a acomete.
São várias as causas do Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade. Entre o elenco
de aspectos que podem gerar esse problema destacamos:
(a) a dimensão biológica, que inclui a predisposição genética; (b) a dimensão psicológica, que
compreende o desenvolvimento das funções psicológicas e do repertório comportamental e (c) a
dimensão social, expressa nos problemas de ensino e aprendizagem assim como nas crenças e
valores que permeiam a educação. O TDAH surge do entrelaçamento desses fatores e a eles está
condicionado. Qualquer tentativa de identificação do TDAH e de possíveis intervenções deve
considerar sua natureza biopsicossocial.
Na atualidade, essa disfunção caiu no gosto popular e, junto com a dislexia, tem sido vítima
de diagnósticos equivocados, o que maximiza o problema enfrentado pelo aluno e, mais uma vez,
medicaliza a dificuldade de aprendizagem, eximindo a escola por sua parcela de responsabilidade no
processo de ensinar corretamente para que o aluno aprenda adequadamente.
O TDAH é caracterizado pela presença marcante de duas disfunções, que são: a desatenção
e a hiperatividade/impulsividade. Esses dois fatores se combinam e atuam de modo a potencializar
um ao outro, formando um sistema disfuncional complexo e comprometedor das funções psicológicas
e sociais do sujeito. Essa composição de sintomas resulta em uma criança “avoada”, “ligada em um
motor”, “que não para nunca”, “estabanada”, “inquieta”, entre tantos outros adjetivos pouco
interessantes.
Irregularidades perceptivas
Discriminação visual: diz respeito à habilidade em utilizar o sentido da visão para perceber e
comparar as características de itens diferentes e para distinguir um do outro. A criança com
dificuldade em discriminar visualmente objetos, figuras ou coisas pode ter seu processo de
aprendizagem prejudicado.
Figura-fundo: este tipo de discriminação relaciona-se à habilidade em separar uma forma impressa
no seu fundo. Todos os cenários visuais contêm objetos que compõe o fundo e outros que constituem
elementos sobrepostos ao fundo. Essa percepção, quando prejudicada, impede o andamento regular
do processo de aprendizagem. Existe também a discriminação auditiva de figura-fundo, que
representa a habilidade em distinguir sons relevantes em um contexto de ruídos de fundo. Exemplo:
uma criança pode apresentar dificuldade para perceber figuras definidas sob um fundo indefinido e
ambíguo, confundindo-se do ponto de vista perceptivo. Essa não discriminação pode gerar
dificuldades na aquisição da linguagem, pois tudo o que está escrito sobrepõe-se a um fundo.
Posição e relação espacial: diz respeito à posição que os objetos ocupam no espaço e as relações
existentes entre eles: quem está à direita, quem está à esquerda, quem está acima, quem está abaixo
etc. A criança precisa construir sólidas percepções de posição e relação espacial. Seu aprendizado
depende muito desta competência. Até para escrever é necessário discriminar a ordem da escrita,
das palavras e das letras.
Lateralidade: diz respeito à percepção das relações espaciais que orientam as distintas direções,
como esquerda / direita, frente/atrás, em cima/embaixo, entre outras. O domínio da lateralidade
muda quando consideramos o ponto de vista de quem observa e também a existência de
determinada referência. O domínio da lateralidade marca o início da construção das relações
espaciais.
A criança começa a construir noções de lateralidade usando como ponto de partida o próprio
corpo. Mais tarde, em um processo gradativo de descentralização, considera a posição do corpo das
pessoas à sua frente (a esquerda e a direita do outro) para, finalmente, considerar o posicionamento
dos objetos em relação uns aos outros, a ela própria ou a outras pessoas. A definição da lateralidade
também depende da dominância dos distintos hemisférios cerebrais. O hemisfério direito do cérebro
comanda o lado esquerdo do corpo e o hemisfério esquerdo do cérebro comanda o lado direito. Em
geral, verifica-se a dominância lateral do olho, mão e pé.
As crianças estão sujeitas a disfunções emocionais tanto quanto os adultos, mas em geral
alimenta-se a crença de que na infância não existe “quadro nervoso” e os comportamentos atípicos
que surgem tendem a ser compreendidos muito mais como falhas no sistema educacional parental
do que um possível distúrbio emocional. A falta de informação, tanto da família quanto da escola,
acerca dos problemas emocionais que podem acometer uma criança termina por favorecer uma
situação de diagnóstico pobre e baixa incidência de intervenção terapêutica e médica.
Em decorrência desse tipo de conduta, abre-se campo fértil para a proliferação das
dificuldades de aprendizagem de ordem secundária e também para o surgimento de problemas de
relacionamento e interação escolar e social de um grande número de crianças.
· Psicoses: transtorno psicológico cujo aspecto central é a perda do contato com a realidade,
dependendo da intensidade da psicose. Quando não estão em crise, os psicóticos conseguem
estabelecer padrões de interações regulares com o mundo real. Quando essa característica é
alterada, o sujeito começa a relacionar-se com objetos e coisas inexistentes no “mundo real”, criando
sua realidade paralela.
Referenciais bibliográficos
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Ferramentas da qualidade) CID-10 – Classificação Estatística Internacional de Doenças e
Problemas Relacionados à Saúde. Décima Revisão – Volume I, 2000, , acesso em
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XAVIER, Antônio Carlos Ressurreição et al. Gestão escolar: desafios e tendências. Brasília: IPEA,
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