MACEDO - 2009 - Daquilo Que Se Como PDF
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Belém
2009.
SIDIANA DA CONSOLAÇÃO FERREIRA DE MACÊDO
BELÉM
2009
SIDIANA DA CONSOLAÇÃO FERREIRA DE MACÊDO
Data de Aprovação:04/09/2009.
Banca Examinadora:
______________________________________
Prof. Dr. Antônio Otaviano Vieira Júnior.
_______________________________________
Prof. (a) Dr.(a) Denise Bernuzzi de Sant’Anna.
_______________________________________
Prof. (a) Dr.(a) Franciane Gama Lacerda.
_______________________________________
Suplente: Prof. Dr. Rafael Chambouleyron.
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
Este trabalho chega a sua etapa final e pesquisar sobre a alimentação em Belém
e mesmo fazer o mestrado não foi a mais fácil das tarefas, pois, para chegar até aqui tive
que dividir espaço com tantas outras atividades, entre elas o trabalho da licenciatura,
afinal não é possível ser apenas pesquisadora, havendo ainda as atividades domésticas
diárias, o papel de filha, irmã, amiga e esposa. O conteúdo do trabalho aqui exposto é o
resultado de muito esforço para ter tempo, ou melhor, inventar tempo para ler, pesquisar
e escrever.
Gostaria de agradecer aos professores do programa de pós-graduação em
História social da Amazônia que contribuíram muito em minha formação durante as
aulas do curso, em especial à professora Dra. Magda Ricci que de forma tão brilhante
ministrou o curso de Teoria; ao professor Dr. Pere Petit, que durante a linha de pesquisa
mostrou uma gama de autores que foram fundamentais para pensar a História Cultural.
Seu curso tão atual foi de um engrandecimento significativo. À professora Dra. Maria
de Nazaré Sarges, que em seu curso levantou discussões tão proveitosas não apenas para
mim, mas, sobretudo para toda turma. Seu curso foi um momento importante para
pensar o que ainda era apenas projetos. Ao professor Dr. Aldrin Figueiredo, que em seu
curso me fez pensar que o trabalho do historiador também tem um pouco de poesia. À
professora Doutora Francesca Foccarolli, que em seu curso sobre alteridade ajudou na
compreensão de autores com os quais que não tinha uma maior intimidade e que me
foram muito importantes, sendo as discussões sobre tais autores um conhecimento a
mais para minha profissão. Desde já, muito obrigada!
O resultado final deste trabalho não seria possível sem a contribuição das
professoras doutoras Franciane Gama Lacerda e Maria de Nazaré Sarges que no exame
de qualificação desta dissertação fizeram valiosos e pertinentes comentários, que tentei
incorporar ao trabalho. Enfim, agradeço às duas professoras a cuidadosa leitura que
fizeram ao meu trabalho.
Agradeço ao meu orientador professor Dr. Antonio Otaviano Vieira Júnior, que
desde a graduação me acompanha neste caminho com conselhos, questões e soluções na
elaboração desta dissertação. Otaviano sempre muito disciplinado, por diversas vezes,
quando os outros trabalhos me exigiam tempo demais, me chamou de volta ao exercício
da escrita. Em alguns pontos ele foi incansável em exigir que fosse feito isto ou aquilo,
para tanto não se importou de “brigar” quando achou necessário, como no caso dos
gráficos que depois de feitos percebi o quanto foram importantes e melhoraram a
qualidade do trabalho. Sei que toda sua preocupação era porque ele queria extrair o
melhor de mim e do trabalho. Obrigada por acreditar neste trabalho.
Um agradecimento especial deve ser feito à professora Paula Bezerra, diretora
do Centro Educacional Paula Franssinetti, escola em que trabalho e que durante os dois
anos do mestrado sempre soube entender as minhas “ausências” em alguns momentos e
sempre que possível fez concessões em prol do curso, já que poucas instituições
privadas teriam tido a mesma paciência e sensibilidade. Desde sempre, obrigada.
Aos Funcionários do Arquivo Público do Estado do Pará, da Biblioteca Pública
Arthur Vianna e do Grêmio Literário Português, em Belém, e aos da Biblioteca do
Instituto de Estudos Brasileiros da USP, pela prestatividade e interesse em me auxiliar
durante o período da pesquisa, deixo também meus agradecimentos.
O período do mestrado seria muito mais difícil se não contasse com o apoio de
minha família tão importante para manutenção do equilíbrio que precisamos; às vezes é
um sorriso, um abraço ou um pergunta de como vai tudo, que nos da força quando às
vezes não sentimos vontade de continuar. Entre as pessoas que preciso agradecer de
forma contínua está minha mãe Ana Maria Ferreira que sempre, sempre torce por mim e
me ensinou a nunca desistir de um ideal. Foi através de sua força e exemplo e, mais do
que isso, seu apoio financeiro ao longo de minha vida em prol de meus estudos que
cheguei até aqui. Ao meu pai Osni Soares de Macêdo, que com sua esperança na
importância do estudo teve um papel na profissão que escolhi, também agradeço o apoio
financeiro ao longo de meus estudos. Aos meus irmãos Ana Rita, Cícero e “Leila” que
completam minha existência. A tia Nenéia que sempre tão amorosa e zelosa entre um
tempinho ou outro da escrita me aguardava com um dos seus pudins deliciosos ou com
um sorriso. À Ana Paola pela meiguice e carinho sempre animadores e à Ana Priscila,
minhas enteadas, também expresso meus agradecimentos.
À minha avó Maria da Consolação Dias Ferreira, da qual herdei mais do que o
nome que tanto me abençoa, também tenho muito que agradecer, pois com ela a cada
novo encontro percebo o quanto devemos ser forte para enfrentar qualquer obstáculo da
vida. Igualmente devo agradecer aos meus “bebês” Sâmia e Ana Flávia que não
imaginam o quanto foram importantes nesta caminhada, pois com elas aprendi que na
elaboração desta pesquisa os nossos passeios sempre tão divertidos foram fundamentais
para que entre um capítulo e outro eu tivesse serenidade para ir em frente. Ao meu
sogro Dr. José Roberto Pinheiro Maia Bezerra, que sempre interessado na elaboração do
trabalho e perguntando como ia tudo não imagina o quanto me apoiou; e à minha sogra
Dona Paula, que sempre me deu total apoio e amor, um agradecimento especial.
Um agradecimento é prioridade neste trabalho: ao meu esposo José Maia
Bezerra Neto que ao longo destes dois anos foi mais do que eu podia imaginar. José
Maia foi um amigo, companheiro, leitor, crítico e acima de tudo um incentivador de
minha dissertação. Agradeço a ele todo o tempo que o tirei da escrita da sua tese para
me ajudar com as minhas mil inquietações comuns na escrita de uma dissertação. Um
amigo de todas as horas que sempre paciente me tranqüilizava quando as crises e
angustias eram mais fortes. Tenho a certeza que sua presença com suas inúmeras
qualidades foram fundamentais ao longo de todo o processo da pesquisa, leitura e
escrita do trabalho. Com Maia descobrir que a escrita é um processo de aprendizagem
cotidiano e contínuo e que às vezes rir da vida é uma necessidade.
SUMÁRIO
Resumo............................................................................................................................IX
Abstract.............................................................................................................................X
Lista de Tabelas...............................................................................................................XI
Lista de Figuras..............................................................................................................XII
Lista de Gráficos............................................................................................................XII
Introdução...................................................................................................................XIII
Primeiras Palavras...........................................................................................................87
Introduzir é preciso........................................................................................................116
Conclusão.....................................................................................................................194
Fontes............................................................................................................................196
Bibliografia...................................................................................................................202
Anexos...........................................................................................................................209
IX
RESUMO
Palavras-Chave
Alimentação - Belém- Abastecimento- Século XIX
X
ABSTRACT
This dissertation focuses on the food history in Belém (State of Pará, Brazil)
between 1850 and 1900. It examines the process of buying and saling food in city of
Belém, and their relationships with the countryside of province, with other Brazilians
provinces of empire and with other countries focusing the spaces and produces directly
connected to food. On the other hand, the grown of rubber economy with their urban
and demography important transformations in city of Belém, it is possible the analyses
of spaces to eat and their producers, tradesmen, working class and other socials
individuals in the streets, restaurants, bakery e other food spaces.
Key-words
Food – Belém – provision - nineteenth century.
XI
Lista de Tabelas
Tabela I: Municípios que tinham fazendas de criação de gado no ano de 1861............48
Tabela VI: Quantidade de Castanhas e sua origem que chegou à capital em 1863.......83
Lista de Figuras
Lista de Gráficos
INTRODUÇÃO.
5
CARNEIRO, Henrique. Comida e sociedade: Uma história da alimentação. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003, pp. 16.
6
Ver, por exemplo, MAUÉS, Maria Angélica Motta & MAUÉS, Raymundo Heraldo. O Folclore da alimentação:
tabus alimentares na Amazônia (Um estudo de caso numa população de pescadores do litoral paraense). Belém:
Falangola, 1980; e FUCKNER, Ismael. Comidas do céu, comidas da terra: invenções e reinvenções culinárias entre
as adventistas do Sétimo Dia (Marco-Belém-Pará). Belém: CFCH/UFPA, 2004, Dissertação de Mestrado em
Antropologia Social.
7
Cf., por exemplo, STRONG, Roy C. Banquete: uma história ilustrada da culinária dos costumes e da fartura à
mesa. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2004. & MOURA, Daniella Almeida. A República em festa (1890-1911).
Dissertação de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em História Social da Amazônia. Belém. 2008.
8
Apud. CARNEIRO. op. cit., p. 143.
XV
historiadores, sendo que podemos citar ainda, Jean- François, Bergier. Une histoire du
Sel, de 1982; ou ainda L, Bourdeau, L. Histoire de L’Alimentation de 1984.9
Assim, fazer uma História da Alimentação que não se baseie somente nas cifras
e números, indo além da história do abastecimento entendendo o lugar dos padeiros,
açougueiros ou feirantes e das vendedoras ambulantes de uma dada sociedade é de fato
tentador. Porque a História Cultural é um trabalho de esmiuçar o cotidiano querendo
compreender quais eram os produtos que compunham a lista dos mais necessários,
ressaltando que este necessário também faz parte do hábito de um dado grupo social.
9
Apud. CARNEIRO, op. cit.,
10
CARNEIRO, op. cit., p. 132.
11
CARNEIRO, op. cit., p. 132.
12
CABRERA, Miguel Angel. “Introdução”, “Los antecedentes: de la historia social a la nueva historia
cultural” e “ Um nuevo orden Del dia para la investigación histórica” In: Historia, Lenguaje y Teoria
de la Sociedad. Madrid, Cátedra, 2001, pp. 9-46 e 181.
XVI
É graças a essa nova História que se encaixa na chamada História Cultural, que
podemos fazer uma História da Alimentação, dos costumes à mesa etc. É bem verdade
que a História Cultural teve que se voltar para temas que antes eram olhados pelos
antropólogos e esse ‘movimento’ ganhou força em fins da década de 1960 como nos diz
Burke:
13
Cf. BURKE, Peter. O que é História Cultural. Trad. Sérgio Goes de Paula. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
ed. 2005.
14
Cf. REZENDE, Marcela Torres. A alimentação como objeto histórico complexo: relações entre
comidas e sociedades. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, n. 33, 2004. p. 1. Neste texto a autora faz uma
resenha do livro de Henrique Carneiro. Comida e Sociedade: Uma história da alimentação.
15
Cf. CARNEIRO, op. cit., pp. 133.
16
Cf. SILVA, João Máximo da. Cozinha Modelo: O impacto do Gás e da eletricidade na Casa
Paulistana (1870-1930). São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2008. p. 22.
XVII
alimentação. Sem perder de vista que as relações sociais também estão imbricadas no
universo material. A este respeito Marcelo Rede nos informa que:
Perceber como tais produtos eram propagados pela Província, isto se evidencia
nos documentos de balanço das casas comerciais como a de José Ferreira de Mello, em
Cametá, de dezembro de 1875, no qual encontramos: “7 garrafas de vinho do porto... 8
garrafas de vinho Bordeaux”.19 Essa busca de refinamento não deixou de ser percebido
no romance O Missionário publicado em 1891 por Inglês de Sousa: “O pão fresco,
barrado de manteiga inglesa de barril, revelara-lhe delícias gastronômicas, de que seu
paladar exigente nunca mais se saciara”.20
17
Apud, Ibdem, nota 16.
18
Cf. SARGES, Maria de Nazaré. Belém. Riquezas produzindo a Belle-Époque (1870/1912). Belém:
Paka-Tatu, 2002.
19
Arquivo Público do Estado do Pará. Secretária da Presidência da Província. Abaixo-assinados. Ano
1876-1879. Caixa 5 a.
20
SOUSA, Inglês de. O Missionário. Rio de Janeiro: Ed. Topbooks, 1998, p. 17.
XVIII
21
AMORIM, Suely Teresinha S. Passos de. Alimentação Infantil e o Marketing da Indústria de
Alimentos. Brasil, 1960-1988. História: Questões e Debates, Curitiba, n. 42, pp. 95-111, 2005. Cf.
SANT’ANNA, Denise Bernuzzi. Transformações das Intolerâncias alimentares em São Paulo, 1850-
1920. História: Questões & Debates. n. 42. Editora UFPR, Curitiba. 2005. p. 81-93. Sant’Anna chama a
atenção que os alimentos já vão deixando de ser apenas manufaturados e são aos poucos substituídos
pelos industrializados como foi o caso da manteiga com uma “imagem de refinamento” transformando-se
“em atestado de riqueza e sofisticação”. Cf. p. 91.
22
Acerca da cultura popular e cultura de elite, por exemplo, Cf. Ginzburg, Carlo. O queijo e os vermes: o
cotidiano e as idéias de um moleiro perseguido pela Inquisição. Tradução: Maria Betania Amoroso, - São
Paulo: Companhia das Letras, 1987.
XIX
Discuto também como alguns alvitres que eram produzidos na Província tinham
duplo destino o abastecimento regional, quanto as pautas exportáveis, tais como a
castanha, cacau, arroz entre outros. Também é possível visualizar algumas regiões onde
havia a predominância de cultivo e produção de determinados produtos. Sendo que
alguns lugares ainda havia o trabalho escravo utilizado nas atividades agrícolas e
criatórias vislumbrando-se então quem eram os principais produtores. Enfim, mesmo os
produtos exportáveis eram de consumo na capital.
que a oferta, ou seja, que a quantidade de produtos que os interiores enviavam para o
abastecimento da cidade nem sempre era suficiente.
Outro fator eram justamente as epidemias, já que sempre que havia uma crise
epidêmica o abastecimento ficava prejudicado ou porque havia mortes com o
enfraquecimento do trabalho nas lavouras e fazendas criatórias ou porque os portos
ficavam de quarentena. Outro motivo eram os roubos de gado, isto porque esse peculato
torna-se atividade rentável para alguns criminosos e prejuízo para os fazendeiros. Essa
realidade faz com que o abastecimento da capital em determinados anos acabe sendo
prejudicado. Sendo que a carne verde era juntamente com o peixe seco e a farinha o
tripé da base alimentar da Província e de Belém. Somando-se a isso a decisão dos
fazendeiros que muitas vezes preferiam mandar gado para fora da província, pois
estavam lucrando mais do que fazer negócio com a capital.
países que mais enviavam mercadorias e quais os principais produtos que vinham em
tais navios, geralmente já consignados a comerciantes locais.
Alguns estabelecimentos tinham dupla utilidade, como no caso das tabernas que
podiam ser estabelecimentos de venda de produtos variados inclusive da alimentação, e
também de lugares em que os negros e demais segmentos sociais encontravam-se para
seus divertimentos. Outros eram os restaurantes e como eles surgem com os novos
hábitos de requinte e bom gosto. Discuto também como a alimentação cria espaços de
sociabilidade em especial oriundos da nova sensibilidade de bom gosto e refinamento
oriundo da “Belle- Époque” como hotéis, cafés e restaurantes, sua aceitação na
sociedade belenense, ressaltando os agentes que freqüentavam e sociabilizavam tais
espaços do convívio alimentar, não descuidando que as quitandas e pontos de venda de
comidas e bebidas nasce nas ruas de Belém continuaram existindo.
26
SANT’ANNA, Denise Bernuzzi. Transformações das Intolerâncias alimentares em São Paulo, 1850-
1920. História: Questões & Debates. n. 42. Editora UFPR, Curitiba. 2005. p. 81-93.
27
COUTO, Cristiana Loureiro de Mendonça. Alimentação no Brasil e em Portugal no século XIX e o que
os livros de cozinha revelam sobre as relações entre colônia e metrópole. Dissertação de Mestrado.
Pontifícia Universidade Católica- SP. 2003.
28
Cf. FLANDRIN, Jean-Louis & MONTANARI, Massimo. História da Alimentação. Trad. Luciano
Vieira Machado, Guilherme J. F. Teixeiral. São Paulo: Estação Liberdade, 1998 & STRONG, Roy C.
XXV
Enfim, a historiografia foi essencial para a reflexão das questões arroladas neste
trabalho como as leituras de Braudel em seu trabalho Civilização Material, economia e
capitalismo séculos XV-XVIII. Ao trazer como a sociedade ao longo dos séculos viveu
em prol da alimentação buscando saídas para as crises de fome; ressaltando a
alimentação como identidade e como o próprio aumento da população influenciava na
vida alimentar das pessoas e ainda como a alimentação tem sua importância na
organização econômica de cada região entre outros aspectos, foram aspectos
fundamentais para pensar tais problemas e realidades em Belém.29
Nobert Elias, com seu Processo Civilizador, me fez pensar a idéia sempre
mutável de civilização ao longo do tempo e das diferentes sociedades. Corbin com a
História dos tempos livres: o advento do lazer, ao ressaltar como os novos espaços de
lazer ganham importância e lugar na sociedade, me fez voltar as atenções em como
Belém a sociedade também criou novos espaços de lazer como os restaurantes entre
outros. E por fim, as leituras dos trabalhos envolvendo a História Cultural30 e ainda
sobre cultura material foram importantes para pensar como a História Cultural está tão
presente no estudo da alimentação. E como a cultura material não é somente os objetos,
mas acima de tudo a sociedade que os produziu. 31
Banquete: uma história ilustrada da culinária dos costumes e da fartura á mesa. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar, 2004.
29
BRAUDEL, Fernand, Civilização Material, economia e capitalismo séculos XV-XVIII: As estruturas
do cotidiano; os Jogos da troca e o Tempo do mundo. Trad. Telma Costa. São Paulo: Martins Fontes,
1995.
30
Cf. BARROS, José D’ Assunção. História Cultural e História das idéias- Diálogos Historiográficos.
História Cultural: Várias interpretações. Goiânia: E. V., 2006; BURKE, Peter. O que é História
Cultural. Trad. Sérgio Goes de Paula. Rio de Janeiro: Jorge Zahar ed. 2005.
31
Cf. FRANCO, Afonso Arinos de Melo. Desenvolvimento da Civilização Material no Brasil. 3ª edição.
Ed. Topbooks. Rio de Janeiro. 2005; REDE, Marcelo. História a partir das coisas: tendências recentes nos
estudos de cultura material. Anais do Museu Paulista. Nova Série. V. 4, pp. 265-82, jan./dez. 1996; REIS,
José Abberione. Sobre uma arrelia que provoca tensão entre arqueologia e história: documento escrito/
documento material. In: Métis: História e Cultura. Universidade do Sul. v.1. n. 1, 2002. Caxias do Sul:
RS. Educs, 2004. P. 93-114. SILVA, João Máximo da. Cozinha Modelo: O impacto do Gás e da
eletricidade na Casa Paulistana (1870-1930). São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2008.
XXVI
da alimentação, mas que muito contribuíram para a dissertação como foi o caso de
Batista que ao falar da economia da borracha já elencava discussões de abastecimento.
E mesmo Cancela que com seu trabalho trouxe idéias que favoreceram pensar o
momento da economia crescente da borracha, sendo seus dados fundamentais para o
tópico sobre produção versus população.32
Foram importantes ainda Osvaldo Orico com sua A cozinha Amazônica que tão
bem ressaltou a importância da originalidade da cozinha Amazônica, que com sua
cozinha ao ar livre é uma das mais autônomas de todo país.33 Cruz, por sua vez, com A
História da Associação Comercial do Pará, trouxe dados importantes para se pensar os
produtos cultivados e sua importância em face da exportação. A literatura regional,
como a de Inglês de Sousa, permitiu conhecer os costumes alimentares descritos nos
romances ou contos. Por exemplo, em sua obra intitulada O Missionário aparece à dieta
alimentar de pirarucu, farinha e às vezes de certas frutas: “Naquele dia podia oferecer-
lhe uma boa posta de pirarucu fresco, e umas excelentes bananas-da-terra”.34 Da mesma
forma, nos informa sobre os gêneros mais consumidos nos dias de festas e seus
35
instrumentos, os quais já eram sinônimos de refinamento. Bem como a literatura
brasileira como o livro Cortiço de Aluísio de Azevedo entre outras, que muito
contribuíram com as reflexões desenvolvidas nesta dissertação. Uma delas foi o caso de
Marques de Carvalho um dos pioneiros em escrever romance citadino, com seu livro
intitulado Hortência; mostrou-me uma Belém de fins do século XIX que veio de
encontro ao que já conhecia das fontes e documentos, no entanto, sua poesia foi o
32
Cf. LIMA, Eli Napoleão. Extrativismo e produção de alimentos: Belém e o “núcleo subsidiário” de
Marajó. 1859-1920. Revista Estudos Sociedade e agricultura, 7 de Dezembro de 1996. 59/89.
http://bibliotecavirtual.clacso.org.ar;VILHENA, Sandra Helena F. O abastecimento de gêneros
alimentícios através das mercearias (1890-1900). Belém: UFPA, Monografia de Graduação em História,
1990. BATISTA, Luciana Marinho. Muito além dos Seringais: Elites, Fortunas e Hierarquias no Grão-
Pará, c. 1850-1870. Instituto de Filosofia e Ciências Sociais. Programa de Pós-Graduação em História
Social. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro. 2004 e CANCELA, Cristina Donza.
Casamentos e Relações Familiares na economia da Borracha (Belém 1870-1920). Universidade de São
Paulo. Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas. Departamento de História. Programa de Pós-
Graduação em História Econômica. USP-SP. 2006.
33
Cf. ORICO, Osvaldo. Cozinha Amazônica: uma autobiografia do paladar. Coleção Amazônica.
Universidade Federal do Pará. 1972; CRUZ, Ernesto. História da Associação Comercial do Pará. 2ª Ed.
Ver. E ampl.-Belém: Editora Universitária. UFPA, 1996; MAUÉS, Maria Angélica Motta & MAUÉS,
Raymundo Heraldo. O Folclore da alimentação: tabus alimentares na Amazônia (Um estudo de caso
numa população de pescadores do litoral paraense). Belém: Falangola, 1980; POZZEBON, Sandra
Elisabeth. O papel das mercearias na distribuição de gêneros alimentícios e a população de Belém na
segunda década do séc. XX. Belém: UFPA, Monografia de Graduação em História, 1990.
34
SOUSA, op. cit., p. 46.
35
SOUSA, op. cit., p. 105.
XXVII
Por fim, as leituras que discutiam alimentação em outras regiões como São Paulo
e Rio de Janeiro foram de grande acréscimo para pensar a alimentação em outros
lugares, algumas delas discussões, problemas e questões que são parecidas e outras tão
distintas da Belém oitocentista. Desta forma, foi possível fazer esta dissertação sobre a
história da alimentação em Belém na segunda metade do século XIX.
36
Cf. CARVALHO, Marques de. Hortência. Ed. especial. Belém: Cejup/ Secult, 1997; SOUSA, H.
Inglês. O Missionário. Ed. Topbooks. Rio de Janeiro. 1998.
37
Cf. AGASSIZ, Louis & Agassiz Elisabeth Cary. Viagem ao Brasil (1865-1866). Trad: Edgar Sussiking
de Mendonça. São Paulo. Companhia Editora Nacional, 1938. (Brasiliana, 95); AVÉ-LALLEMANT,
Robert. No Rio Amazonas. Trad: Eduardo de Lima Castro. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Ed. da
Universidade de São Paulo, 1980; BATES, Henry Walter. Um naturalista no rio Amazonas. Trad: Régis
Junqueira; apresentação Mário Guimarães Ferri. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Ed. da
Universidade de São Paulo, 1979; WALLACE, Alfred Russel. Viagens pelos rios Amazonas e Negro.
Trad: Eugênio Amado; apresentação Mário Guimarães Ferri. Belo Horizonte: Ed: Itatiaia; São Paulo,
1979.
28
38
CARNEIRO, Henrique. Comida e Sociedade: uma história da alimentação. Rio de Janeiro: Elsevier,
2003. 3ª Reimpressão. p 13.
39
Sobre o abastecimento ver os trabalhos de SILVEIRA, Neudalino Viana da. Santa Maria de Belém do
Grão-Pará. Problemática do abastecimento alimentício durante o período áureo da borracha (1850-
1920). Dissertação de mestrado em História. Recife. UFPE, 1989. SOUSA, Benedito. O abastecimento de
gêneros de primeira necessidade através das mercearias em Belém no período de 1880-1900. Belém:
UFPA, Monografia de Graduação em História, 1990. VILHENA, Sandra Helena F. O abastecimento de
gêneros alimentícios através das mercearias (1890-1900). Belém: UFPA, Monografia de Graduação em
História, 1990. Existe ainda o trabalho de Nírvia Ravena sobre abastecimento da cidade de Belém para o
século XVIII. RAVENA, Nírvia. O abastecimento no século XVIII no Grão-Pará: Macapá e vilas
circunvizinhas. Novos Cadernos NAEA. V.8, n.2, dez 2005. pp. 124-149.
29
40
Nesse sentido, Luciana Batista faz uma análise dos principais trabalhos que discutiram as relações
entre agricultura e extrativismo ressaltando as explicações mais tradicionais como a de Ernesto Cruz ou
Arthur Cezar Ferreira Reis cujos estudos, a autora nos esclarece, “também aponta que as atividades
agrícolas teriam sido abandonadas em função da extração da borracha”. Outro trabalho que Batista
destaca é Roberto Santos que, em seu trabalho História econômica da Amazônia, concentra a importância
da economia da Amazônia na borracha destacando-a em detrimento de outros produtos que ficaram
marginalizados. Batista em seu trabalho argumenta a partir de alguns dados se de fato a agricultura e
outras atividades ficaram em 2ª plano pela extração da goma elástica. Batista ratifica que: “considero
fundamental, (...) não passar por cima de outros tipos de produção que, mesmo em tempos de crescimento
de exploração da borracha, também se fizeram presentes no local”. Cf. BATISTA, Luciana Marinho.
Muito Além dos Seringais: Elites, Fortunas e Hierarquias no Grão-Pará, c.1850- c. 1870. Instituto de
Filosofia e Ciências Sociais. Universidade Federal do Rio de Janeiro. 2004. pp. 33, 34, 35, 37 e 39.
30
41
Fonte: Mapa adaptado de Cândido Mendes de Almeida. Atlas do Império do Brasil, Rio de Janeiro,
1868.
42
Relatório do Presidente de Província Dr. Abel Graça. Pará. Typ. do Diário do Gram-Pará. Travessa de
S. Matheus. casa n. 29. 1871. p. 45 e 46; Relatório Exmo. Dr. José Coelho da Gama e Abreu. Em 15 de
fevereiro de 1881. Pará. Typ. Do Diário de Noticias de Costa & Campbell. 1881. pp. 130; Falla Exm.
Senr. Conselheiro João Silveira de Sousa em 15 de outubro de 1884. Pará. Typ. de Francisco da Costa
Junior. Travessa 7 de Setembro. 1885. pp. 43.
31
Fonte: Mapa adaptado de Cândido Mendes de Almeida. Atlas do Império do Brasil, Rio de Janeiro, 1868.
32
(...) da criação de uma linha de vapor, sendo esta a mesma que toca
entre os portos da capital e Soure, pois, com essa linha é de esperar que em
breve apareça os melhores desenvolvimento não só comercial como outros,
45
que interessa a Província para o seu engrandecimento.
43
AVÉ-LALLEMANT, Robert. No Rio Amazonas. Trad: Eduardo de Lima Castro. Belo Horizonte: Ed.
Itatiaia; São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo, 1980. pp. 55/56.
44
Idem, Ibdem.
45
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária da Presidência da Província. Série: Ofícios das
Câmaras Municipais. Ano 1870-1875. Caixa 309. Documento 08.
33
Avè-Lallemant faz uma descrição de forma muito real relatando o movimento continuo,
determinados produtos e ainda a movimentação de pessoas:
Outro viajante que teceu comentários sobre a movimentação do porto foi Kidder,
o qual, dizia “Em tôrno da Ponta de Pedras, o desembarcadouro principal da cidade, há,
geralmente, grande número de canoas atracadas. Essa cena movimentada pela turba
indígena que fala os mais variados dialetos amazônicos, é peculiar a cidade”. O viajante
ainda ressalta que as ditas canoas vinham carregadas de “castanhas do Pará, cacau,
baunilha, urucu, salsaparrilha, canela, tapioca (...) peixe seco em pacotes, cestas de
frutas de infinitas variedades (...)”. O interessante é notar que um dos grupos que
traziam os produtos para serem comercializados era os indígenas. E ao que parece os
indígenas compunham um grupo de abastecimento importante já que segundo Kidder a
produção indígena da Província era grande e estimada.51
50
AVÉ-LALLEMANT. op. cit., pp. 55/56.
51
KIDDER, Daniel P. Reminiscencias de viagens e permanência no Brasil. Ed. Universidade de São
Paulo. São Paulo, 1972.
35
Planta I:
54
BRAUDEL, op. cit., pp. 20.
55
Essas embarcações eram conseguiam transportar uma quantidade significativa de produtos não eram
pequenas como nos salienta o viajante Avé-Lallemant: “(...) as canoas ou canuas, como se gosta de
pronunciar a palavra no Rio Amazonas. Deve-se, quando se fala ali numa canoa do comércio, afastar logo
a idéia dum tronco escavado, como já vimos, tratando do S. Francisco. As grandes canoas do Rio
Amazonas são enormes batelões, que podem carregar até 4000 arrobas (a arroba tem 32 libras)”.Cf.
AVÉ-LALLEMANT, op. cit., pp. 62.
56
Ao longo do trabalho será utilizado as medidas de peso que era arroba e de volume o alqueires segundo
Barickman, “1 arroba = 14, 746 quilogramas”. Anderson fornece os seguintes valores 1@ = 15 kg e 1alq. = 13,8
litros. Já que nos dias atuais essas medidas correspondem ao Kilo e ao Litro. No entanto na trabalho foi
preservado as medidas tal como no século XIX em arrobas e alqueires. Cf. ANDERSON, Robin Leslie.
“Following Curupira: colonization and migration in Pará, 1758 to 1930. As study in settlement of the
humid tropics”. University of. California Daers, PhD, 1976. BARICKMAN, B. J. (Bert Jude). Um
contraponto baiano: açúcar, fumo, mandioca e escravidão no Reconcâvo, 1780-1860. Trad. Maria Luiza
X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, pp. 23.
57
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Correspondência de Diversos com o Governo (1834-1840).
Antiga: 523. Atual: 983. Mod: 11. Prat: 05. Fortaleza de Gurupá, 7 de Janeiro de 1834.
37
Analisando esses dados dos produtos, se percebe que somente de peixe seco
foram 3. 252 arrobas, o que reflete o amplo consumo do peixe seco na cidade. O
segundo lugar era ocupado pelo cacau com 1.625 arrobas, embora um produto visado no
mercado exterior, pois, ele geralmente tinha os portos estrangeiros como destino, mas
uma quantia da produção permanecia em Belém. O terceiro produto era a manteiga de
tartaruga60 com expressivos 671 potes, esse produto era bastante utilizado na cozinha e
diversos foram os viajantes que se ocuparam em descrever o produto em si e sua
fabricação. Ela era feita com os ovos da tartaruga e a sua diminuição na segunda metade
do século XIX faz-se tendo em vista a entrada da manteiga inglesa e francesa em maior
quantidade na capital por conta das novas sensibilidades que passam a ver na fabricação
da manteiga de tartaruga rústico e sem civilidade. O quarto lugar era da salsa com 249
arrobas; o quinto lugar ficava o café com 275 arrobas; em sexto lugar estava a carne
58
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Correspondência de Diversos com o Governo (1834-1840).
Antiga: 523. Atual: 983. Mod: 11. Prat: 05.
59
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Correspondência de Diversos com o Governo (1834-1840).
Antiga: 523. Atual: 983. Mod: 11. Prat: 05.
60
Gaetano Osculati viajante italiano que em sua viagem em 1847 de Tabatinga a Belém nos esclarece o
seguinte sobre a dita manteiga: “Calderon é um banco de areia muito conhecido no Amazonas por ser um
local muito freqüentado na estação da pesca da tartaruga e fabricação da manteiga de tartaruga pelos
habitantes de Loreto, Tabatinga, S. Paulo de Olivença (...) as tartarugas, nos meses de outubro, novembro
e dezembro saem do rio e põem seus ovos nos bancos de areia (...) passado algum tempo, os
manteigueiros de todas as aldeias, que são autorizados, dirigem-se aos locais com alguns índios, e vão
recolhendo todos os ovos que encontram debaixo da areia (....) enchem metade de uma piroga larga e
limpa; depois, vão quebrando-os com bastões e com os pés, até restar apenas um líquido amarelo
espumoso (...) Depois de ter misturado uma porção de água, deixam por todo um dia exposta ao forte sol
a piroga que contém o líquido, tempo em que o calor faz fermentar, aflorando todo óleo e a gordura;
depois vão escumando e retirando aquele óleo com o auxílio de cuias. O óleo assim obtido é colocado em
vasos de barro que podem conter de 40 a 50 libras cada uma, cozendo-se a fogo lento dentro de panelões
de cobre (...) É recolocado novamente em recipientes de argila, as quais se tampam com grandes folhas e
vimes, e assim são transportados às vilas com o cuidado de mantê-las sempre semi-enterradas na areia.
Estes vasos de óleo são comerciados no Sertão e Grão Pará sob o nome de manteiga de charapa. É um
ótimo condimento, se bem que conserve sempre um pouco de odor rançoso e sabor nauseante (...)”.
Apesar de o viajante denominá-la de charapa nos documentos oficiais e jornais de Belém, ela sempre
aparece como manteiga de tartaruga. ISENBURG, Teresa (organizadora). Naturalistas italianos no
Brasil. São Paulo: Ícone: Secretária de Estado da Cultura, 1990. pp. 145-146.
38
seca com 182 arrobas e ½ libra, e por fim ocupando o último lugar os 4 potes de
mexira.61 Ou também chamada de Mixira; encontramos no glossário de Chermont de Miranda a
seguinte definição:
O interessante observar é que parece haver uma predominância dos artigos dos
interiores na 1ª metade do século XIX, quando o Pará ainda não contava com a
navegação a vapor e nem com o capital gomífero, muitos desses produtos continuam
impondo sua presença na segunda metade do XIX. Vamos então, conhecer um pouco
mais desse comércio inter-regional que a capital da província manteve na segunda
metade do século XIX, começando pelo peixe seco e/ou salgado.
61
MIRANDA, Vicente Chermont de. Glossário Paraense (Coleção de Vocábulos Peculiares à Amazônia
e Especialmente à Ilha do Marajó). Universidade Federal do Pará. Coleção Amazônica Série Ferreira
Pena. 1968. pp. 55. E ainda, mixira, lingüiça feita da carne de peixe-boi- espécie de cipó. RUBIM, Braz
da Costa. Vocabulario Brasileiro. Rio de Janeiro. Emp. Typ. Dous de Dezembro de Paula Brito.
Impressor da Casa Imperial. 1853. pp.51.
62
MIRANDA, op. cit., pp. 51.
63
Ainda segundo Veríssimo “O muquem é um assadouro ou grelha, de fôrma geralmente triangular, cada
ângulo descançando em uma pedra ou em uma forquilha de madeira. Madeira especial, refractaria ao
fogo, chamada páo de muquem, ou outra pouco combustível, é usada neste assadouro sob o qual fazem
lume, para assar a fogo lento o peixe era ou caça que lhe põem em cima. O peixe moqueado reduzem-no a
migalhas e o esfarinham levando-o aos seus fornos de farinha brandamente aquecidos. Ao peixe assim
39
(...) os campos sofrem por vezes muito mais do que elas. Como
vivem na dependência dos mercadores, das cidades, dos senhores, o
camponês não dispõem de quaisquer rendas. Em caso de má colheita, não lhe
resta outra solução senão recuar para a cidade, mudar-se para lá custe o que
custar, mendigar nas ruas, muitas vezes morrer lá, como em Veneza ou
64
Amiens ainda no século XVI, nas praças públicas.
A população dos interiores do Pará diante de uma crise recorria aos rios tão
abundantes na região, comendo ao lado da farinha pirarucu, o peixe-boi, as tainhas e
afins. Em muitos documentos é possível identificar a pesca e o salgamento do peixe
como atividade lucrativa e constante, um destes é sobre taxação de impostos dos
interiores de Vigia, Faro, Cintra, Sant’Ana do Igarapé Mirim e outros, para a captura do
peixe, isto é, sobre o uso de feitorias para matar pirarucu como na vila de Faro, em
1869, cujo valor era de 2.000 réis por cada feitoria feita nos lagos;65 igual situação
encontrava-se em Vigia, em 1871, onde havia o imposto de 5.000 réis por cada feitoria
desfeito chamão piracui, farinha de peixe (pirá, peixe em tupi, ui farinha) Comem simplesmente, au
naturel, com a sua indefectivel farinha d’agua ou fazendo-a cozinhar em água com algum raro
condimento, alguma pimenta malagueta ou cheirosa e ajuntando-lhe durante ou após a cocção uma porção
desta farinha, com que engrossam o prato e o servem. Chamão-lhe mogica, nome de todo o seu preparado
culinário em que entra uma fécula qualquer com o fim de condimentar ou antes, engrossar, que é no tupi o
significado de mogica um caldo qualquer, ou porção de peixe secco ou salgado da sua panella de barro”.
Cf. VERÍSSIMO, José. A pesca na Amazônia. Monographias Brasileiras. Rio de Janeiro/São Paulo.
Livraria Clássica de Alves & C. 1895. pp. 11 e 12.
64
BRAUDEL, op. cit., pp. 62. Neste fato, encontramos a surpresa da maioria dos viajantes quanto à
fartura de peixes para a população da Amazônia.
65
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária da Presidência de Província. Série: Ofícios da
Camâra Municipal. Ano 1860-1869. Caixa 230.
40
ou barraca de pescados que fosse construída na costa do município, sendo que este
interior tinha exportação de gurijuba, tainhas e outros peixes.66
66
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária da Presidência de Província. Série: Ofícios da
Camâras Municipais. Ano 1870-1875. Caixa 309. Receita da Camara Municipal da cidade de Vigia para o
ano de 1871.
67
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária da Presidência de Província. Série: Ofícios da
Camâras Municipais. Ano 1870-1875. Caixa 309. Doc. 18. Artigos de posturas especiais para a Câmara
da Cachoeira.
68
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária da Presidência de Província. Série: Ofícios da
Camâras Municipais. Ano 1876-1879. Caixa 357. Orçamento da Receita e Despesa da Câmara Municipal
de Cintra para o ano de 1878-1879. Paço da Câmara Municipal de Cintra 16 de Janeiro de 1878.
69
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária da Presidência de Província. Série: Ofícios da
Camâras Municipais. Ano 1876-1879. Caixa 357. Orçamento da Receita e Despesa da Câmara Municipal
da Vila de Sant’Ana do Igarapé Mirim para o ano vindouro de 1ª de janeiro a 31 de Dezembro de 1878.
Paço da Câmara Municipal de Igarapé Mirim em 9 de janeiro de 1877.
70
VERÍSSIMO, op. cit., pp. 20.
41
71
OSCULATI, op. cit., pp.143.
72
AGASSIZ, Louis. Viajem ao Brasil. Luiz Agassiz e Elisabeth Cary Agassiz; Tradução de João Etienne
Filho, apresentação de Mário Guimarães Ferri. Belo Horizonte, Ed. Itatiaia; São Paulo, Ed. da
Universidade de São Paulo. 1975. pp. 122/123.
73
Relatório apresentado a Assembléia Legislativa da Província do Pará feita pelo Presidente de Província
Dr. Domingos José da Cunha Junio. 1 de julho de 1873. Pará. Typographia do Diário do Gram-Pará.
Travessa de São Matheus. n. 29. 1873. Anexos; pp. 4.
74
Fala Dr. João José Pedrosa. 29 de abril de 1882. Pará. typ. de Francisco da Costa Junior. Travessa 7 de
setembro de 1882. pp.6.
75
“Este desmesurado peixe de água-doce tem a cabeça muito volumosa, ou seja, de forma quase
cilíndrica. O corpo é oblongo, as escamas são grandes, ósseas, com a espinha dorsal muito longa. A cor é
de um verde escuro por cima e rosa escuro debaixo; a maioria das escamas tem uma mancha rosa de um
lado, e as caudas são listradas de vermelho e azul. O pirarucu ou sudis gigas encontra-se no rio das
Amazonas e no Japurá; atinge o comprimento de 7 a 8 pés; os naturais do lugar guardam a sua língua, que
é óssea, rugosa, e da qual se servem para raspar o Guaraná”. ISENBURG, op. cit., pp. 143.
76
AVÉ-LALLEMANT, op. cit., pp. 146.
42
peixes ficava nos interiores em que eram pescados e serviam para o consumo. Segundo
Veríssimo o pirarucu “é à base da alimentação amazônica (...) o papel que a carne seca faz no
Sul do paiz ou o bacalháo entre as populações pobres da Europa e da America do Norte. Elle é
o nosso bacalháo (“...)”. 77
Outro viajante, o italiano Gaetano Osculati que percorreu a
Amazônia, quando de sua estada em Tabatinga nos informa:
A presença de taxas e impostos serve não apenas para ratificar que existia um
comércio significativo, mas acima de tudo ressaltar que a pesca na região não ocorria
apenas de forma casual: com pescadores sem equipamentos que iam aos rios obter o
peixe de forma simples e rotineira quase de forma natural como deixa parecer parte dos
viajantes e mesmo dos Presidentes de Província quando afirmam que a população vivia
apenas do que a natureza dava; ao contrário, até para se conseguir o que a natureza dava
existia o que podemos chamar de uma indústria pesqueira.
Indústria pesqueira que acontecia com o uso de feitorias e currais para suprir
uma determinada demanda de peixe que na maioria das vezes não estava destinado
apenas ao consumo loca, havendo lugares destinados a melhor atender o abastecimento
77
VERÍSSIMO, op. cit., pp. 28.
78
ISENBURG, op. cit., p. 143.
79
Fala dirigida a Assembléia Legislativa da Província do Pará pelo Presidente de Província Manoel de
Frias e Vasconcellos. 1 de Outubro de 1859. Pará. Typ. Commercial de A. J. R. Guimarães. Travessa de
S. Matheus, casa n. 2 AA. Mapa D.
43
da capital, bem como pessoas que viviam de tal renda e que tinham no apanhar o peixe
métodos e formas de melhor alcançar seu intento que em nada lembra o comércio do
peixe como apenas de subsistência.
80
Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco Carlos
de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico Carlos
Rhossard.
81
A carne quando estava em mau estado era porque o difícil transporte do gado da Ilha do Marajó e
outros lugares distantes faziam com que o animal já chegasse ao curro em péssimas condições físicas e
muitas vezes a espera para ser talhado fazia com a carne, produto final, fosse prejudicada. É comum
encontrar documentos na maioria das vezes abaixo-assinados dos fazendeiros solicitando ao governo
melhorias nos curros e apressamento para talhar as cabeças e ainda melhoramento nos transportes. O
governo por sua vez, reclamava que o problema estava com: “O péssimo acondicionamento do gado nos
barcos encarregados do transporte, e mais que tudo a falta absoluta de pasto e até de água que soffrem as
rezes desde que chegão a cidade até a ocassião de irem para o matadouro, são as causas que devem ser
removidas para melhorar o estado das carnes verdes”. Relatório Exmo. Snr. Vice- Almirante Joaquim
Raymundo De Lamare. Presidente da Província do Grào-Pará. Em 6 de agosto de 1868. Pará.
Typographia do Diario do Gram-Pará. Travessa de S. Matheus. pp. 39-42. Em 1870, o Dr. Abel Graça
salienta que: “(...) às difficuldades que offereceo trasnporte do gado vaccum da ilha do Marajó para a
capital; e, também, ao estado do curro público que não tem o necessário espaço para estabelecer o pasto
indispensável ao sustento e descanço do grande numero de rezes que, depois de torturadas na viagem, são
alli depositadas por muitos dias”. Relatório Dr. Abel Graça. Pará, Typ. do Diario do Gram-Pará. Travessa
de S. Matheus. Casa n. 29. 1870.
44
82
Fala do Presidente de Província Tristão de Alencar Araripe. Assembléia Legislativa Provincial. 5 de
Novembro de 1885. Pará, Impreso na Typografia do Diário de Notícias. 1886. pp. 77.
83
Fala Dr. João José Pedrosa. 23 de abril de 1882. Pará. Typ. Francisco da Costa Júnior. Travessa 7 de
Setembro. 1882. pp. 20 e 21.
84
CRUZ, Ernesto. História da Associação Comercial do Pará. 2ª Ed. Ver. E ampl.-Belém: Editora
Universitária. UFPA, 1996. Pp. 77.
85
Relatório de Negócios da Província. Presidente Couto de Magalhães. Em 15 de Agosto de 1864.
Impresso na Typ. de Frederico Rhossard. Pará. 1864.
45
madeiras, cumaru, urucu, salsaparrilha.86 Em 1872 os produtos exportáveis eram Açúcar branco,
mascavo, arroz pilado, com casca, cacau, castanha da terra, bagas de cumaru, couros, salgados,
borracha, grude de Gurijuba e óleo de copaíba.87 Em 1867, apareciam como os principais
produtos exportados constavam Borracha, cacau, castanha, couros de boi, urucu, couros de
veado, arroz, óleo de copaíba, grude de peixe, salsa, açúcar, guaraná, cumaru, cravo entre
outros.88
Se o peixe não compunha a lista dos principais produtos exportáveis o grude de peixe
era produto sempre presente e em quantidade significativa. O grude de peixe era uma espécie de
cola feita a partir dos peixes. Veríssimo nos informa sobre a gurijuba que
Entre os peixes que mais entravam na capital da província estava o pirarucu que
era produto constante nas tabernas, feiras, mercados e vendas. No armazém da Viúva
Fernandes & filho encontramos para leilão no ano de 1858: “uma partida de pirarucu de
superior qualidade, uma dita de cacau, e uma dita de couros salgados”.90 Em um
anúncio de 1852 encontramos entre os produtos considerados tipicamente regionais:
“Pirarucú, carne seca, mapará em porção (...) tudo de boa qualidade em porção, se
vende por cômodos preços na taberna de Manoel da Cunha Muniz na travessa
Pelourinho”. 91
Em 1869 encontramos do dia 11 a 25 de janeiro chegaram a capital
3.320 arrobas de peixe, que não foram especificados o tipo, mas provavelmente vinham
dos interiores, já que estavam locados ao lado de produtos tipicamente regionais como
urucu, sebo, salsa, azeite de andiroba. 92
O pirarucu compunha a lista dos peixes que eram salgados para a venda. Avé-
Lallemant resume bem a atividade de uma feitoria nas proximidades do Rio Iça, no
Amazonas, os pescadores eram os próprios habitantes da região dos rios que na época
da pesca deixavam suas casas e desciam para as praias onde construíam as feitorias para
o beneficiamento dos peixes. Nas feitorias “deitam o peixe com o ventre para baixo,
escamam-lhe as costas com uma machadinha ou um facão, de maneira a poderem
enterrar uma afiada faca de cozinha entre o couro e a carne e esfolá-lo” E ainda “Cortam
depois as duas metades do corpo, no que revelam uma habilidade peculiar, dos dois
lados da carcaça, separando-a das grossas espinhas da cavidade abdominal, esfregam-
lhe sal e suspendem-nas por cima de varas, onde secam rapidamente, dentro de um a
três dias, sob o sol abrasador”.94
A carne salgada rende cerca de um terço de seu peso quando fresca, ou seja, um
pirarucu de 120 libras, seco da cerca de 40 libras de peixe. Avé-Lallemant informava
que a pesca da Amazônia chega a cerca de dois milhões de peixes por ano, grande parte
é salgada e a outra consumida fresca. 95 No ano de 1876 dentre os impostos arrecadados
sobre os principais produtos da província estava o pirarucu seco com 1.021.761 kilos.96
Segue tal situação para o ano de 1892 onde nos deparamos no jornal Diário de Notícias
na seção de Leilões de várias partidas de peixes de diversas marcas e do próprio
pirarucu. Em 1ª de julho de 1892 temos no trapiche da Companhia do Amazonas
“venderá leilão diversas marcas de peixe” e ainda “diversas marcas de pirarucu”.97
93
VILHENA, Sandra Helena Ferreira. Belém: o abastecimento de gêneros alimentícios, através das
mercearias (1890-1900). Universidade Federal do Pará. Monografia de Graduação em História. Centro de
Filosofia e Ciências Humanas. Departamento de História e Antropologia. Belém-Pará. 1990. pp.23.
94
AVÉ-LALLEMANT, op. cit., p. 173.
95
AVÉ-LALLEMANT, op. cit., p. 173.
96
Fala Dr. João Capistrano Bandeira de Mello Filho. Em 15 de Fevereiro de 1877. Pará. Typ. do Livro do
Commércio. Theophilo, Schoogel & Comp. Adm. Antonio Ribeiro dos Santos. 1877. pp. 136.
97
Diário de Notícias. Estado do Pará, Sexta-feira 1 de julho de 1892. Numero 142.
47
Tabela I
Municípios que tinham fazendas de criação de gado no ano de 1861.
Origem N. Fazendas N. Cabeças de Gado Gado Cavallar
101
gado Vaccum
98
A pesca da Gurijuba e tainha ocorria “faz-se forá das aguas amazonicas, a da gurijuba em pleno mar, a
da tainha, na orla marítima das regiões da geographia local denominadas Contra-costa, - Léste e nordéste
da Ilha de Marajó- e Salgado-.as costas de éste e sudéste- banhadas pelas derradeiras vagas do estuário do
rio Pará e pelas do Atlantico na porção oriental do Pará, e também no Tocantins inferior, naquelle mesmo
rio Pará e bahias do Sol, de Marajó, da Vigia , de Santo Antonio e outras por elles formadas. A costa
chamada da Vigia e a fronteira, á Leste de Marajó, entre Souré e Maguari, são o principal campo das
pescarias de tainha”. VERÍSSIMO, op. cit., pp. 88.
99
VERÍSSIMO, op. cit.,pp. 89.
100
VERÍSSIMO, op. cit., pp. 96.
101
As cabeças de gado eram diferenciadas como vacum e cavalar, encontramos no Glossário Paraense de
Vicente Chermont de Miranda há a seguinte definição: “Gado, s.m. –Usado pelos vaqueiros sómente em
48
referência ao gado vacum”. “cavalhada, s. f. – Os cavalos de serviço de uma fazenda. Gado cavalar alto e
mau”. MIRANDA, op. cit., pp. 20 e 40.
102
É válido observar que antes de 1859 havia 10 fazendas de gado com mais de 6.000 cabeças, porém,
com a grande cheia que ocorreu no referido lugar restaram apenas 60 cabeças. Relatório apresentado. Á
Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª
de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico Carlos Rhossard. pp.63.
103
Apud: Museu da Casa Brasileira. Cd. Room Equipamentos da Casa Brasileira Usos e costumes.
D’Orbigny. Viagem Pitoresca através do Brasil. São Paulo, Belo Horizonte. Edusp/ Itatiaia Editora,
49
Observando a tabela I, das 34.853 cabeças de gado de Soure, exportava por ano
cerca de 1.500 a 2.000 cabeças.104 Soure não configura nem o sexto lugar com
quantidades de fazendas, mas ficava em segundo com números de cabeça, o que se
destaca não é o número de fazendas, mas a quantidade de gado. Soure contava com 38
fazendas, mas tinha 34.853 cabeças para abastecimento, já Macapá que tinha quase o
dobro de fazendas (62) contava com 22.000 cabeças o que demonstra que Soure era
mais importante criatório do que Macapá. Logo, as fazendas do Marajó podiam não ser
as únicas produtoras, conseqüentemente fornecedoras de gado, mas lideravam quanto ao
quesito número de cabeças de gado. O número relativamente pequeno de gado cavalar
ocorre porque em geral eram utilizados para os serviços de transporte e da fazenda em
geral. Segundo o presidente Rohan, em 1862, a ilha do Marajó:
1976, pp.77. Arquivo Ernani Bruno. Secretária de Estado de Cultura. Governo de São Paulo. Setembro de
2005.
104
Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco
Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico
Carlos Rhossard. pp.60.
105
Relatório apresentado pelo Presidente Henrique de Beaurepaire Rohan. Em 15 de agosto de 1856.
Pará. Typ. de Santos & Filhos. 1856. pp. 20.
106
Ainda em Cametá no período entre 1858/1859 temos um total de 80 arrobas de carne que através dos
vapores da companhia de navegação abasteceram a capital. Fala dirigida a Assembléia Legislativa da
Provincia do Pará pelo Presidente de Província Manoel de Frias e Vasconcellos. 1 de Outubro de 1859.
Pará. Typ. Commercial de A. J. R. Guimarães. Travessa de S. Matheus, casa n. 2 AA. Mapa n. 30 C.
107
Sobre a indústria do gado no Marajó ver: Apud. BATISTA, op. cit. pp. 94.
108
Discurso da Abertura da Sessão Extraordinária da Assembléia Legislativa Provincial do Pará, pelo
Presidente Dr. João da Silva Carrão. 7 de abril de 1858. Typ. Do Diário do Commercio. Impresso por J. J.
de Sá. pp.47.
50
25.000
20.000
Abastecimento de Gado
15.000 Marajó
Abastecimento de Gado
10.000 Baixo Amazonas e Gurupá
Abastecimento de Gado
5.000 Diferentes Lugares
0
Cabeças de gado Ano/1884
Fonte: Relatório Exmo. Snr. General Visconde de Maracajú Gustavo Galvão. Em 24 de junho
de 1884. Pará. Typ. de Francisco Costa Junior. 1884.pp. 10/11.
Pelo gráfico acima, pode-se indagar se de fato, não existia produção de carne na
Província? Já que somente no ano de 1884, os interiores foram capazes de enviar à
capital um total de 21.604 bois e 2.637 vacas para abastecimento. Somente do Marajó
vieram 17.177 bois e 2.327 vacas; do Baixo Amazonas e Gurupá vieram, 4.140 bois e
259 vacas e ainda de Macapá, Vizeu, Bragança, Turyassú e do pasto da cidade
contavam 287 bois e 51 vacas. É também importante notar que o Marajó de longe era a
109
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária de Presidência de Província. Série: Ofícios
Câmara Municipal. Ano: 1864-1869. Caixa 275.
110
Fala Dr. João Capistrano Bandeira de Mello Filho. Em 15 de Fevereiro de 1877. Pará. Typ. do Livro do
Commércio. Theópilo, Schoogel & Comp. Adm. Antonio Ribeiro dos Santos. 1877. pp. 136.
51
região que maior concentração de indústria pastoril que abasteciam a capital bem como
outras regiões.
Tabela II
Quantidade de cabeças de gado e Indústria Pastoril existentes no Marajó e Baixo Amazonas em
1881.
Procedência Gado Vacum
Marajó 193.722.
Baixo Amazonas 129.668.
Cintra 285.
Total 355.451.
Fonte: Relatório Exmo. Sr. José Coelho da Gama e Abreu. Em 15 de fevereiro de 1881. Typographia do
Diário de Notícias de Costa & Campbell. 1881. pp. 130.
Como se pode ver na tabela acima, no ano de 1881, o Sr. José Coelho da Gama
ao fazer um balanço da indústria pastoril da província nos informa que do Marajó
existia uma quantidade de 193.722 cabeças de gado, no Baixo Amazonas eram 129.668.
Assim deve-se entender que os interiores estavam criando gado e enviando-os para
exportação. Assim como o peixe, não foi possível visualizar em números para todos os
anos citados a quantidade de carne que ficava na capital. Sobre o consumo da capital em
1863 chegaram para o fornecimento da capital 13.565 cabeças de gado vacum111, já entre 1897-
1899 foram 4.238 kilos de carne e 35.232 unidades de bois para abate.112 por estes dado
pode-se ter uma noção que a quantidade de carne necessária para o consumo era grande
e que praticamente todas as arrobas que os interiores produziam vinham para
alimentação.
A carne não compunha a lista dos produtos mais exportados e quando o era tinha
como destino as Províncias do Império, sendo que no geral eram os couros que iam para
outros países. Ou seja, devido aos inúmeros pedidos de fazendeiros e criadores de gado
solicitando ao governo medidas para melhorar o abastecimento e ainda os documentos
que salientam que a carne era um alimento de primeiríssima necessidade e que parte
considerável ou quase toda que era exportada dos interiores ficavam na capital.
111
As cabeças de gado vieram dos seguintes interiores: Marajó com 13.318 cabeças; Monte Alegre com
208 cabeças e Alemquer com 39 cabeças. Relatório de Negócios da Província. Presidente Couto de
Magalhães. Em 15 de Agosto de 1864. Impresso na Typ. de Frederico Rhossard. Pará. 1864.
112
VILHENA, op. cit., pp. 22 e 23.
52
significativas, o que pode ter ocorrido para falta do produto era que o número
populacional113 estava maior ou que a carne compunha os gêneros de primeira
necessidade e que abastecia grande parcela da população. Daí porque se procurava tanto
esse produto, pois em todos os relatórios pesquisados em épocas de crise aumentava-se
a procura de carne e assim os inúmeros contratos para que fosse o mercado abastecido
de tal produto e que os preços não fossem tão abusivos.
Em Belém até a carne chegar à mesa dos consumidores ela passava por algumas
etapas. Primeiramente, após o desembarque o gado era levado para ser abatido
geralmente no curro público, alguns senhores negociantes da capital tinham o
monopólio deste carregamento eram os chamados marchantes entre os nomes dos
principais marchantes entre o período de 18 a 28 de maio de 1858 foi possível encontrar
o senhor Francisco Carlos Delduque, Mattos & Ca., Campbell & Pombo, Penna &
Filho, Fernando Maria da Cunha, Pedro Canovas e ainda Jorge Campbell de
Albuquerque.115
113
A relação população versus produção de alimentos será discutida no 2ª capítulo.
114
Em troca de tal concessão os fazendeiros ainda comprometiam-se a talhar o gado de outros fazendeiros
da província assim como de outro lugar. Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária da
Presidência da Província. (Documentação avulso). Série: Abaixo-assinados. Ano: 1883-1885. Cx 07.
115
Sobre famílias de marchantes e suas participações no comércio local ver o trabalho de BATISTA, op.
cit.pp. 95. Gazeta Official. 10 a 31 de maio de 1858. Ano I. Número 1. pp. 3.
116
CANCELA, Cristina Donza. Casamentos e Relações Familiares na economia da Borracha (Belém
1870-1920). Universidade de São Paulo. Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas.
Departamento de História. Programa de Pós- Graduação em História Econômica. USP-SP. 2006. Mas
adiante no capítulo IV a história de Silveste será contada em maiores detalhes.
53
Por fim, as arrobas eram levadas aos talhos estes eram espalhados por alguns
lugares da cidade onde se fazia a venda para a população. Ou ainda como nos informa
Wallace “são abatidas na madrugada do mesmo dia em que são consumidas, sendo
cortadas a machado e cutelo, sem qualquer preocupação com asseio. (...) Lá pela seis da
manhã podem-se ver carroças carregadas de carne seguindo para os diversos
açougues”.120 Os donos de carroças também configuravam personagens importantes no
dia a dia da cidade. Um desses era o senhor Joaquim Teixeira de Macedo que em 13 de
junho de 1874 recorria junto a Camara Municipal que fica isento do imposto sobre a
condução de carroças puxadas por animal, deixando claro que antes de ser lavrada a lei
n. 800 de 13 de setembro de 1873, sobre a taxação de impostos as conduções de
carroças puxadas por animal, ele já havia substituído a carroça que possuía, “puxada por
animal, por outra menor puxada a braço de homem”. 121
117
SALLES, Vicente. O Negro no Pará: sob regime da escravidão. 2ª Ed.- Brasilia: Ministério da
Cultura; Belém: Secretaria de Estado da Cultura; Fundação Cultural do Pará “Tancredo Neves”. , 1988.
pp. 175.
118
SALLES, op. cit., pp. 169.
119
Apud: SALLES. op. cit., pp. 169.
120
WALLACE, Alfred Russel. Viagens pelso rios Amazonas e Negro. Trad. Eugênio Amado;
apresentação Mário Guimarães Ferri. – Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Ed. da Universidade de
São Paulo, 1979. pp. 24.
121
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária da Presidência da Província. Série: Ofícios.
Ano: 1870-1875. Caixa: 309. Doc: 108.
54
substituindo a mesma por peixe fresco e salgado e mesmo a carne salgada ou seca, as
quais eram expostas à venda sem designação ou limitação de lugar.122 Geralmente, os
donos de fazendas tinham alguma relação com os marchantes e vice-versa, algumas
eram relações de casamentos e família como era o caso dos Campbell & Pombo assim
um dos membros atuavam na criação dos animais enquanto a outra parte ao vender a
dita carne ratificava uma rede de monopólio deste gênero. 123
122
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária da Presidência da Província. Série: Abaixo-
assinados. Ano: 1860-1869. Cx 04. 15 de Março de 1866.
123
Sobre a relação entre as famílias e os negócios na capital ver o trabalho de CANCELA, op. cit.,E
ainda de BATISTA, op. cit.,.
124
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Juízo Municipal da Capital. Série: Autos de Testamento.
Caixa: 1868-1870.
125
WALLACE, op. cit., pp. 76.
126
WALLACE, op. cit., pp. 76/77.
127
WALLACE, op. cit., pp. 98/99.
55
usualmente como nas fazendas libertos, índios e mestiços livres”. O trabalho destes
128
empregados destinava-se aos cuidados com o gado bovino e cavalar, construções nas
fazendas bem como pescaria e os cuidados referentes a uma fazenda.
Fora da capital os lugares onde com maior facilidade podia-se comprar a carne
eram os que tinham criação de gado. Em 1851, Bates nos diz sobre a facilidade de
comprar a carne em Santarém: “(...) Havia dois ou três açougues, onde se podia comprar
excelente carne, a dois dinheiros ou a dois dinheiros e meio a libra. O gado não
precisava ser trazido de longa distância, como no Pará, criando-se nos campos em torno
de Lago Grande, a um ou dois dias de viagem da cidade”. 129
O viajante nos diz que
além dos açougues que atendiam a população local a carne fresca era vendida bem mais
em conta, pois, era de fazendas da região e não dependiam como no Pará em importá-
las dos interiores. Esse fato de dependência da carne vinda de outras regiões talvez se
explique pelo fato de que quando chegava ao mercado era logo disputada pela
população como observa François Biard em 1859 no mercado local de Belém “É
aconselhável realizar suas compras bem cedinho, pois depois de certa hora não se
encontra mais nada que preste, principalmente carne”. 130
128
BEZERRA NETO, José Maia. Escravidão Negra na Amazônia (Sécs. XVII-XIX). Belém: Paka-Tatu,
2001. pp. 80.
129
Apud:Museu da Casa Brasileira. op. cit.,.Cd room.
130
Apud. Museu da Casa Brasileira. op. cit.,.Cd. room.
131
Foram responsáveis por tal abastecimento Santarém com 2.620 arrobas; Marajó com 1.668 arrobas e
Óbidos com 2.376 arrobas. Relatório de Negócios da Província. Presidente Couto de Magalhães. Em 15
de Agosto de 1864. Impresso na Typ. de Frederico Rhossard. Pará. 1864.
132
Relatório Exmo. Snr. Joaquim Raymundo de Lamare. Em 6 de Agosto de 1868. Pará. Typographia do
Diário do Gram-Pará. 1868.
56
Já dizia Spix e Martius em 1819 relatando sobre Belém que “O homem do povo
nutre-se principalmente de farinha de mandioca, peixe seco e carne seca, esta ultima
vinda da vizinha Ilha de Marajó [...]”. 134
Apesar do ano mencionado na citação ser da
primeira metade do XIX, ele nos mostra a carne compunha um alimento básico, como
fornecedores além do Marajó outros lugares também enviavam a dita carne para
consumo como Manaus, Óbidos e outros. E juntamente com o peixe e a carne a farinha
completava o item de 1ª necessidade da população. Ela era alimento primordial na mesa
de significativa parcela da gente amazônica do interior bem como da capital.
133
BATES, op. cit., pp.
134
E ainda sobre o salgamento do gado em uma opulenta fazenda nos arredores de Belém em uma ilha:
“O gado bovino pasta em liberdade nas campinas da ilha, porém à noite é tocado de volta para o curral
(...) É principalmente destinado ao consumo doméstico para cujo, fim a carne é salgada e exposta ao
vento para secar. Freqüentemente é o fazendeiro obrigado a abastecer-se de peixe salgado ou seco
pirarucu vindo da Ilha de Marajó. Por motive do grande calor, a carne raramente é saborosa; não se
conserva bem, e as partes que estiverem ao ar precisam ser logo cortadas e eliminadas”. SPIX, Johann
Baptiste Von e MARTIUS, Carl Friedrich Philippe Von. Viagem pelo Brasil. 91819-1829). Vol III, Rio
de Janeiro, Imprensa Nacional, 1938. pp. 16-7/ 69.
135
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária da Presidência da Província. (Documentação
Avulsa) Abaixo-Assinados. Ano: 1876-1879. Pará, 10 de março de 1877. Caixa: 05 A. Documento 62.
57
Em Macapá no ano de 1861 dos 471 estabelecimentos industriais 400 eram sítios
de fazer farinha que produziram 20.000 alqueires.141 Ainda em 1875 Macapá, havia
136
Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco
Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico
Carlos Rhossard.
137
Relatório apresentado ao Exm. Snr. Dr. Francisco Maria Corrêa de Sá e Benevides pelo Exm. Snr. Dr.
Pedro Vicente de Azevedo. Em 17 de Janeiro de 1875. Pará. Travessa de S. Matheus. n. 29. 1875.pp. 78.
138
Relatório Exmo. Snr. Dr. Pedro Vicente de Azevedo. Em 15 de Fevereiro de 1874. Pará. Typographia
do Diario do Gram-Pará. Travessa de S. Matheus. n. 29. 1874. pp. 61.
139
WALLACE, op. cit., pp. 46.
140
Relatório apresentado ao Exm. Snr. Dr. Francisco Maria Corrêa de Sá e Benevides pelo Exm. Snr. Dr.
Pedro Vicente de Azevedo. Em 17 de Janeiro de 1875. Pará. Travessa de S. Matheus. n. 29. 1875. pp. 62.
141
Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco
Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico
Carlos Rhossard. pp. 62.
58
142
Relatório apresentado ao Exm. Snr. Dr. Francisco Maria Corrêa de Sá e Benevides pelo Exm. Snr. Dr.
Pedro Vicente de Azevedo. Em 17 de Janeiro de 1875. Pará. Travessa de S. Matheus. n. 29. 1875.pp. 82.
143
Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco
Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico
Carlos Rhossard.
144
Entre os interiores que abasteciam a capital estava Bragança com 7.369 alq.; Curuça com 7.182 alq.;
Bujarú com 6.376 alq. ; Acará com 6.350 alq.; Inhangapy com 4.863 alq. ; Capim com 3.608 alq.; Cintra
com 3.577 alq. ; Mojú 3. 559 alq.; Vigia com 2.209 alq. ; Irituia 1.708 alq.; E ainda a comarca da capital o
Guamá com 7.370 alq. Relatório de Negócios da Província. Presidente Couto de Magalhães. Em 15 de
Agosto de 1864. Impresso na Typ. de Frederico Rhossard. Pará. 1864.
145
VILHENA, op. cit., pp. 22 e 23.
146
Osvaldo Orico nos informa sobre o chibé: “E existe o chibé ou caribe, o alimento dos pobres, aquele
que não falta sob nenhum teto, ainda que seja de palha. Não se vende pronto nos mercados nem nos
tabuleiros dos largos e praças da cidade. Cada família o faz a domicílio. É o sustento da casa, quando não
há pão, nem carne, nem peixe, nem frutas. (...) Quando não há nada disso, surge o chibé ou caribe, a que
nos referimos nos verbetes herdados de alimentação indígena. Dos vinhos e infusões desta procedência é
um dos que persistem nos hábitos da gente amazônica pela sua composição simples e providencial: água,
farinha de mandioca e açúcar, três elementos que podem ser reduzidos a dois, pois se não existe açúcar, a
água, e a farinha preenchem o objetivo, que é sustentar o corpo. Assim se espanta a fome da Amazônia,
tanto nas cidades como nas roças e nos tejupares, à margem dos rios, furos e igarapés”. Apesar do autor
ter escrito tais reminiscências no século XX, ele traz muita informação sobre a dieta dos paraenses ainda
do século anterior. Da mesma forma, podemos imaginar o chibé ou xibé entre os escravos, trabalhadores e
as crianças bem como na população que desejosa do alimento e sem melhores nutrientes como a carne ou
peixe salgado encontrava na farinha com água o seu alimento principal e acessível. O mesmo autor
relembra: “Para dizer a verdade, já tomamos em nossa infância e vimos muita caboclinyha e mesmo
meninas de família com seu copo ou cuia d’àgua, farinha e açúcar, refrescando-se nas tardes tropicais.
Nos nossos tempos de criança, o hábito estava tão propagado que havia até uma etiqueta para classificar a
59
de variedades que podia dela se utilizar. Vejamos o comentário de Bates de 1850, sobre
Tefé no Amazonas: “Fazem-se bolos com farinha meio torrada (...)”.147 Apesar de o
comentário ser do Amazonas, para Belém acredito não ser menos verdade.
Sobre a fabricação da farinha Bates ao passar pelo sítio do Sr. Joaquim observa: “ A
pouca distância da casa situavam-se os galpões, ou tendas, onde era fabricada a farinha de
mandioca usada pela comunidade. No centro de cada tenda ficavam, em cima dos fornos, as
panelas rasas feitas de barro, onde era tostada a farinha. Um longo e flexível cilindro feito da
casca trançada de uma marantácea pendia de uma viga do teto; dentro desse cilindro é
espremida a mandioca ralada, e o suco altamente venenoso que ela escorre (...) é recolhido em
vasilhas colocadas em baixo”. Após secar a massa era levada para os fornos onde seria tostada,
par enfim, ser consumida.148 Destinavam-se a fabricação da farinha os sertanejos e
indígenas em grande parte em alguns lugares os escravos também conheceram esse
ofício. O viajante Osculati informa que quando esteve em Egas, Amazonas, presenciou
os índios preparando a farinha de mandioca “ Não é menos curioso o modo pelo qual os
índios de Egas preparam a farinha de mandioca”.149 Nada mais natural os índios terem
tanta afinidade com a mandioca, se para alguns grupos indígenas o milho ocupava o
papel importante na alimentação, no Pará os grupos indígenas faziam dela seu principal
produto, de onde derivava inúmeras outros alimentos.
autenticidade do tipo regional: paraense papa-chibé. Isto é, o elemento puro da terra, o que lhe seguia as
pegadas das tradições”. Tradições essas que já estão presente no século XIX, que compõem o consumo
diário ou esporádico das mais diversas famílias. Cf. ORICO, OSVALDO. Cozinha Amazônica: uma
autobiografia do paladar. Coleção Amazônica. Universidade Federal do Pará. 1972. pp. 46.
147
Apud: ACAYABA, op. cit., p. 134.
148
BATES, op. cit.,pp. 64.
149
OSCULATI, op.cit.,p p. 162.
150
Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco
Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico
Carlos Rhossard.
151
Entre 1836 a 1852 pelos dados oficiais foram exportados 3.453 alqueires de farinha de tapioca num
valor para a receita de 6.450$234. Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará.
60
kilos de tapioca que foram exportados para fora da província bem como para fora do
Brasil. 152 Hábito muito comum no século XIX em toda a Província do Pará e Amazonas
veja o que nos diz Bates sobre tal iguaria: “Há um tipo de farinha feita em Ega com a
mandioca doce (...) Está é feita com mistura do amido da raiz, e portanto gênero
alimentício muito saudavel que a farinha comum que se faz no Amazonas, apenas com a
polpa, depois de extraída a goma, pondo-a de molho na água. Quando não conseguimos
ter pão nem biscoito, achava a tapioca molhada no café o melhor substituto nativo”.153
Sobre a farinha de tapioca Agassiz quando de sua estada em Vila Bela, Amazonas
descreve:
Feita pelo Dr. Francisco Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na
Typografia de Frederico Carlos Rhossard.p p. 52.
152
Relatório Presidente de Província Pedro Vicente de Azevedo. Em 15 de fevereiro de 1874. Pará.
Typographia do Diario do Gram-Pará. Travessa de S. Matheus. n 29.pp. 78.
153
Apud. ACAYABA. op. cit,. pp. 134.
154
AGASSIZ, Louis. Viagem ao Brasil: 1865-1866. Por Luiz Agassiz e Elizabeth Cary Agassiz;
Tradução de Jõao Etienne Filho, apresentação de Mário Guimãres Ferri. Belo Horizonte; Ed. Itatiaia; São
Paulo, Ed. da Universidade de São Paulo, 1975. pp. 120.
155
Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco
Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico
Carlos Rhossard.pp. 52 e 53.
61
simples xibé sendo consumido sozinho ou degustado com uma posta de peixe ou ainda
uma carne seca ou verde.
156
Nos arredores de Belém em 1832. D’Orbigny, Alcides. Viagem Pitoresca através do Brasil. p. 80. In:
ACAYABA, op. cit., pp. 177.
157
KIDDER, op. cit., pp. 182.
62
Independente do fator que levou sua diminuição o importante é saber que apesar
de tal queda ela não some das pautas comerciais e continua ao longo da segunda metade
do século XIX a chegar à capital para o consumo disputando lugar de venda entre as
manteigas importadas. É bem verdade que seu consumo vai tornando-se pelo menos na
capital cada vez mais escasso, Avé-Lallemant em 1859 ressalta que “come-se cada vez
menos essa manteiga de tartaruga, de preferência usada como óleo para iluminação,
importando-se manteiga da Europa”.161 Todavia, a dita manteiga mantinha seus
consumidores freqüentes já que o mesmo viajante nos informa que ele próprio viu
serem enviados para o Pará em um dado ano cerca de 4.000 a 6.000 potes. 162 Inclusive
havia leis do governo relacionadas às fabricas de dita manteiga a Lei n. 48 de 15 de
outubro de 1859, incubia as Câmaras Municipais dos Municípios que tivessem praias
aproveitáveis para o fabrico de manteiga de ovos de tartaruga, providenciar condições a
fim de as mesmas pudessem produzir toda a quantidade de que forem capazes. 163
158
KIDDER, op. cit., pp. 182.
159
Ele ainda nos diz que “Exportam-se pelo menos 6.000 jarras de três galões de óleo, todos os anos, do
Alto Amazonas e do Madeira para o Pará, onde o mesmo é usado na iluminação, para frigir peixe e outros
misteres”. Apud:ACAYABA, op. cit., pp. 177.
160
SOUSA, H. O Missionário. Ed.Topbooks. Rio de Janeiro. 1998. pp. 14 e 17.
161
AVÉ-LALLEMANT, op. cit., p. 87.
162
AVÉ-LALLEMANT, op. cit., p. 86.
163
Relatório Exm. Snr. Vice-Almirante e Conselheiro de Guerra. Joaquim Raymundo De Lamare. Em 6
de agosto de 1868. Pará. Typographia do Diario do Gram-Pará. Travessa de S. Matheus. 1868.pp. 30.
63
100 réis por pessoa.170 Nesta primeira discussão chamo a atenção para a importância na
alimentação citadina de Belém de três produtos que comporiam o tripé da alimentação
que eram o peixe, a carne e a farinha de mandioca. Ainda ressalto a existência no
comércio de outro produto regional que era manteiga de tartaruga e como o seu
consumo aos poucos foi substituído pela manteiga importada. A seguir outros produtos
que faziam parte da alimentação e/ou comércio serão analisados sempre tomando como
ponto de partida o fato de que tais produtos durante o período estudado chegavam aos
portos para o abastecimento da capital.
Entre os produtos que eram produzidos no Pará têm-se alguns que além de serem
para consumo na Província, freqüentemente estavam nas pautas de exportação. Como o
café, arroz, açúcar que será responsável pelo comércio em interiores como Abaeté,
Igarapé-Miry e outros contando ainda com a produção de aguardente essa acabava em
170
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária de Presidência de Província. Série: Ofícios
Câmara Municipal. Ano: 1850-1858. Caixa: 143.
65
grande medida sendo exportada. O cacau era outro produto que tinha grande cultivo
inclusive várias vezes ocupando o 1ª lugar nas pautas exportáveis ao lado da borracha.
A castanha também era um produto regional que contava lugar importante no comércio
e por fim, o feijão que apesar de uma produção pequena era existente.
Café.
O café foi introduzido no Brasil pelo Pará por Francisco de Mello Palheta por
volta de 1727, que após voltar de uma viagem a Caiena trouxe consigo mudas de
plantas de café juntamente com outras frutas. Além dele, um dos pioneiros no cultivo do
café foi o rico senhor Agostinho Domingos de Sequeira em suas terras do rio Guamá,
introduziu o cultivo do dito produto. Em 1750 o Pará exportou para Portugal um valor
de 4.835 arrobas.173
171
BATES, op. cit., pp. 205/ 329.
172
Dados fornecidos pelo Relatório Exmo. Snr. Vice-Almirante e Conselheiro de Guerra. Joaquim
Raymundo de Lamare. Em 15 de agosto de 1867. Pará. Typographia de Frederico Rhossard. Travessa de
S. Matheus. casa n. 29. 1867. pp. 62.
173
BARATA, Manoel. Formação Histórica do Pará. Obras Reunidas. Coleção Amazonica- Série José
Veríssimo. Universidade Federal do Pará. 1973. pp. 309.
174
Sempre aparecem exportações de café dos interiores com a cidade de Belém, encontramos os seguintes
dados de interiores/produção que ficavam na capital para o ano de 2ª semestre de 1858 e 1ª semestre de
1859 um total de 293 arrobas de café vindos dos portos de Manaus e portos intermediários como Serpa,
66
818 arrobas, Portel com 800 arrobas e Itaituba com 410 arrobas. Os outros ficavam com
arrobas inferiores as três primeiras, como é o caso de Monsarás com 202 ½ arrobas,
Vigia e Vizeu com 210 arrobas, Curuça, Melgaço e Faro com 100 arrobas e Oeiras que
tinha apenas 30 arrobas. Portanto, para 1861, vieram 2.980 ½ arrobas de café dos
interiores citados. O café apesar de continuar sendo cultura de alguns interiores, sua
quantidade, a partir, da década de 60 a sua quantidade é significativamente inferior ao
que foi produzido anteriormente em seu relatório de 1ª de setembro de 1862, Araújo
Brusque então Presidente de Província esclarecia que: “Tendo constituído outr’ora
artigo de exportação, é cultivado em muito pequena escala (...) actualmente não produz
o necessário para seo consumo, e importa annualmente mais de 20.000 arrobas do
Ceará, e da Bahia (...)”.175
Daí porque os valores do café não são tão expressivos. Entretanto, é possível
encontrar regiões produtoras de café e nas pautas comerciais, mais em pequenos
números, por exemplo, no período entre 1847 a 1867 apenas 629 arrobas e 73 libras de
Prainha. Manaus com 66 arrobas; Serpa com 76 arrobas; Vila Bela com 10 arrobas; Óbidos 35 arrobas;
Santarém 74 arrobas; Prainha 25 arrobas; Gurupá 12 arrobas. Fonte: Tabela adaptada da Fala dirigida a
Assembléia Legislativa da Província do Pará pelo Presidente de Província Manoel de Frias e
Vasconcellos. 1 de Outubro de 1859. Pará. Typ. Commercial de A. J. R. Guimarães. Travessa de S.
Matheus, casa n. 2 AA. Mapa D. Já em 1861 as províncias do Amazonas enviaram 417 arrobas e ainda
Óbidos, Breves. Somando um total de 610 arrobas. Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da
Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará:
Impresso na Typografia de Frederico Carlos Rhossard.
175
Relatório Exm. Snr Presidente da Província Dr. Francisco de Araújo Brusque. Em 1ª de Setembro de
1862. Pará. Typographia de Frederico Carlos Rhossard. Travessa de S. Matheus. n. 22. pp. 54.
176
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Juízo de Direito da 1ª Vara Cível. Série: Autos Cíveis de
Inventário e Partilhas. 18 de dezembro de 1877. Caixa:01.
177
Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco
Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico
Carlos Rhossard. pp. 58.
67
café exportado.178 Ou seja, para um período de 20 anos, os números são pequenos. Mas,
continuava sendo produzido. No ano de 1867, o café também fazia parte dos produtos
importados com destino à capital temos um valor de 22.307$000 réis de café, vindo dos
portos de Breves, Gurupá, Porto de Moz, Prainha, Monte Alegre, Santarém e Óbidos e
ainda de Províncias do Amazonas como Vila-Bela, Serpa e Manaus. 179
O café
permaneceu presente nas pautas comerciais só que numa quantidade bem diminuta. Isso
explicaria que o café era um dos produtos mais importados das outras províncias em
especial das províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Ele era cultivado nas imediações da cidade bem como em maior e melhor
quantidade no rio Acará. 181 Para o ano de 1861 os interiores que enviavam arroz para a
capital eram: Muaná que liderava as exportações com um total de 1.500 alqueires
seguida de Melgaço com 1.000 arrobas, Bragança com 450 arrobas, Oeiras com 400
arrobas, Portel com 300 alqueires, Cametá 30 arrobas e Monsarás com 25 alqueires, no
178
Relatório Exmo. Sr. Vice- Almirante e Conselheiro de Guerra. Joaquim Raymundo De Lamare.
Presidente de Província. Em 15 de agosto de 1867. Pará. Typographia de Frederico Rhossard. Trvaessa de
S. Matheus, casa n. 29. 1867. s/ número de página.
179
Relatório Exm. Snr Vice-Almirante e Conselheiro de Guerra Joaquim Raymundo De Lamare. Em 6 de
agosto de 1868. Pará. Typographia do Diario do Gram-Pará. Travessa de S. Matheus. n. 29. Quadro n. 18.
180
KIDDER, op. cit., pp. 177.
181
Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco
Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico
Carlos Rhossard. pp. 38.
68
entanto neste município existiam estabelecimentos de socar e pilar arroz que por serem
poucos produziram 100 alqueires de arroz.182
Dos gêneros exportados entre 1870-1871 o arroz estava entre eles onde o pilado
contava 466 kilos e o de casca 228.427 kilos.190 Apesar de Barata afirmar que a indústria
no Pará teve uma decadência que abrangia o dito produto, o qual, se encontrava
totalmente abandonado, através dos números mencionados vemos que havia o cultivo
182
Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco
Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico
Carlos Rhossard.
183
Acho conveniente chamar atenção para o emprego da palavra exportação Batista nos diz que “o termo
“exportação”, no século XIX, podia fazer referência tanto a vendas feitas para países estrangeiros, quanto
para outras províncias do Império”. Eu ainda neste tópico utilizo a palavra exportação para a relação entre
as vilas e/ou municípios e a capital. BATISTA, op. cit., pp. 67.
184
BATISTA, op. cit., pp. 67.
185
BARATA, op. cit., p. 301, 307 e 318.
186
Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco
Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico
Carlos Rhossard. pp. 57.
187
Biblioteca Pública Arthur Vianna. Setor Microfilmagem. Jornal Diário de Notícias. 5 a 25 de Julho de
1883. Domingo, 22 de Julho de 1883. n. 165. pp. 3.
188
Relatório Presidente de Província Dr. Abel Graça. Em 15 de Agosto de 1871. Typ. do Diário Gram-
Pará. Travessa de S. Matheus. Casa n. 29. 1871.pp. 45.
189
Relatório. Exmo. Snr. Dr. Pedro Vicente de Azevedo. Em 15 de fevereiro de 1874. Pará. Typographia
do Diário do Gram-Pará. Travessa de S. Matheus. n. 29. 1874. pp. 61.
190
Relatório Presidente de Província Dr. Abel Graça. Em 15 de fevereiro de 1872. Typ. do Diário Gram-
Pará. Travessa de S. Matheus. Casa n. 29. 1872. pp. 30.
69
191
Relatório Dr. Pedro Leão Vellozo. Em 9 de abril de 1867. Para’. Typographia de Frederico Rhossard.
Travessa de S. Matheus, casa n. 29. 1867. pp. 23.
192
Relatório Dr. Pedro Vicente de Azevedo. Em 17 de Janeiro de 1875. Pará. Travessa de S. Matheus. n.
29. 1875. pp. 62.
193
VILHENA, op. cit., pp. 22.
194
Biblioteca Pública Arthur Vianna. Setor Microfilmagem. Jornal Diário de Noticias. Estado do Pará,
Sexta- Feira 1 de julho de 1892. Num. 142. pp.1.
195
Relatório Exmo. Snr. Vice-Almirante e Conselheiro de Guerra. Joaquim Raymundo de Lamare. Em 15
de agosto de 1867. Pará. Typographia de Frederico Rhossard. Travessa de S. Matheus. casa n. 29. 1867.
pp. 62.
196
Relatório Dr. Abel Graça. Pará. Typ. do Diário do Gram-Pará. Travessa de S. Matheus. Casa n. 29.
1871. pp. 32.
197
Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo eram lugares onde o arroz era constante e diário: Thomas
Davatz nos arredores de limeira em 1855 descreve sobre a situação dos colonos doentes da fazenda
Ibicaba “(...) e é forçado a limitar sua dieta a um mingau de arroz (...)” Ou ainda Charles Riblyrolles entre
1858-1860 nos arredores de Vassouras no Rio de Janeiro faz o seguinte comentário: “(...) no Quilombo,
pequeno hotel da estrada de Vassouras, onde há feijão, milho arroz (...) o serviço foi excelente (...)”. Já
Saint-Hilaire em 1819 nos arredores do Rio Grande em Minas Gerais observa sobre os fazendeiros
criadores de gado: “pois, ali até mesmo as pessoas abastadas só usam na sua mesa feijão, carne de porco,
arroz, leite, queijo e canjica”. ACAYABA. op.cit., Cd. Room.
70
arroz com casca e 2.262 alqueires do dito pilado.198 Ou seja, apenas para 1867 a
população contava com mais de 50.000 alqueires de arroz com casca e uma porção
menor do pilado, o que nos leva a pensar que não era todo o arroz com casca que era
exportado, até porque existiam na urbe engenhos de beneficiamento do produto.
198
Foram fornecedores do arroz com casca: Guamá com 3.199 alqueires; Bujarú com 5.221 alq.; Acará
com 28.605 alq. ; Inhangapy com 3.161 alq.; Capim com 2.700 alq.; Mojú com 2.371 alq.; Abaeté com
11.544 alq. ; Igarapé-Mirim com 1.415 alq. E Muaná com 1.028 alq. E do arroz pilado: Acará com 785
alq. E Capim com 1.477 alq. Relatório de Negócios da Província. Presidente Couto de Magalhães. Em 15
de Agosto de 1864. Impresso na Typ. de Frederico Rhossard. Pará. 1864.
199
WALLACE, op. cit., p. 32.
200
WALLACE, op. cit., p. 82.
201
Ao lado do arroz contavam açúcar, café, azeite de luz, farinha d’água, vinagre de Lisboa, pirarucu,
toucinho alhos e molhos. Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária da Presidência da
Província. Série: Ofícios do Estabelecimento dos educandos do Pará). 1850-1853. Caixa 40. Doc 56.
71
Açúcares e aguardentes.
O açúcar era um produto que está presente nas pautas comerciais do Pará e que
apesar da Província em determinados momentos necessitar importar de outras
províncias seu cultivo não era inexistente. O gráfico abaixo salientará as quantidades do
açúcar produzido e exportado:
202
Grêmio Literário & Recreativo Português. Biblioteca Fran-Paxeco. Jornal Gazeta Official. Anno I,
Pará, terça- feira 18 de maio de 1858. pp.3.
72
Pelo Gráfico acima entre os anos de 1847-1867203 vieram para a capital 294.020
arrobas de açúcar: entre 1847/52 foram 73.974 arrobas; 1852//57 foram 34.157; 1857/62
foram 98.813 e 1862/67 87.076 arrobas. Ora, além do açúcar era produzido da cultura
da cana de açúcar como também a aguardente em especial nos municípios de Igarapé-
Mirim e Abaetetuba.204 Ambos fornecedores de aguardente para exportação, inclusive
para a capital. No ano de 1861 existiam 46 engenhos assim distribuídos: Vigia, 4 de
fabricação de aguardente e 1 de açúcar; Cintra 3 de aguardente; Cametá 6 de
aguardente; Bragança 3 de açúcar; Muaná 20 de fabricar cachaça; Macapá 8 de açúcar e
Santarém com 1 de fabricação de açúcar e aguardente.205 A tabela de 1881 ressalta bem
a quantidade de municípios que produziam aguardente e açúcar no referido ano:
Tabela III.
Números de engenhos de fabricar aguardente e açúcar em 1881.
Localidade Engenhos de Fabricar Aguardente & Açúcar
203
Em 1873, ou melhor, no semestre que vai de junho a dezembro do mesmo ano, nas pautas comerciais o
açúcar ocupava o quadro dos produtos mais exportados pela província com um valor de 17.729 kilos e em
réis de 2.953$553.Relatório. Exmo. Snr. Dr. Pedro Vicente de Azevedo. Em 15 de fevereiro de 1884.
Pará. Typographia do Diario do Gram-Pará. Travessa de S. Matheus. n. 29. 1874. p. 77. Para os gêneros
exportados entre 1870 a 1871 o açúcar encontra-se com os seguintes números: Açúcar Branco 1.047 kilos
e o Mascavado com 37.696 kilos. Relatório Presidente de Província Dr. Abel Graça. 15 de fevereiro de
1872. Pará. Typ. Diário do Gram-Pará. Travessa de S. Matheus n. 2. 1872. P. 30.
204
Relatório Dr. Abel Graça. Pará. Typ. do Diário do Gram-Pará. Travessa de S. Matheus. Casa n. 29.
1871. p. 32.
205
Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco
Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico
Carlos Rhossard. p. 59.
73
Capital 36
Vigia 6
Igarapé- Miry 116
Cametá 1
Cachoeira 25
Marajó 7
Macapá 1
Breves 5
Santarém 12
Total 209
Fonte: Relatório Exm. Snr. José Colho da Gama e Abreu. Em 15 de fevereiro de 1881. Pará.
Typ. do Diário de Noticias de Costa & Campbell. 1881. p. 130.
A presença de 209 engenhos espalhados pelo Pará mostra- nos, que o açúcar
diferentemente do café ou arroz tinha uma cultura em desenvolvimento até por que
grande parte dela tinha como destino a produção da aguardente, como é o caso de
Igarapé-Miry com cultivo “n’elle em grande escala [o] a canna de assucar” donde
“Fabrica-se grande quantidade de aguardente que se exporta para a capital e para as
ilhas”. E, além disso, uma parte do açúcar produzido em parte era exportada para outros
lugares.206 Santarém que em 1881 contava com 12 engenhos em 1861 só tinha 1
engenho de aguardente e açúcar cuja produção foi de 600 frasqueiras de aguardente e
400 arrobas de açúcar207 o que de imediato nos leva a crer que os seus 12 engenhos de
1881 produziam muito mais. 208 Em 1870 existiam na capital duas fábricas de refinação
braçal de açúcar e três mercadores por grosso do dito produto.209 Assim como os demais
produtos nos documentos arrolados não foi possível visualizar a quantidade exata de
açúcar que ficava na capital, foi possível apenas para o ano de 1863 quando veio para o
consumo da capital dos interiores 26.641 arrobas de diversos açúcares. Ou seja, se
206
Relatório apresentado ao Exm. Snr.Dr. Francisco Maria Corrêa de Sá e Benevides pelo Exm. Snr Dr.
Pedro Vicente de Azevedo por ocasião de passar-lhe a administração. Em 15 de Janeiro de 1875. Pará.
Travessa de S. Matheus n. 29. 1975. pp. 79.
207
Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco
Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico
Carlos Rhossard.
208
O município de Cintra que não aparece em 1881 vinte anos antes aparece como a existência de
engenhos já que vieram, para a capital uma quantia de 20 frasqueiras de aguardente. Bragança de igual
situação produziu e exportou no mesmo ano, 92 frasqueiras e ainda Muaná com seus significativos 1.296
frasqueiras com valor de 4.147$000 réis bem como Oeiras com 100 frasqueiras somando 500$000 réis.
Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco Carlos
de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico Carlos
Rhossard. pp. 62.
209
Relatório Dr. Abel Graça. Pará. Typ. do Diário do Gram-Pará. Travessa de S. Matheus. Casa n. 29.
1871. pp. 32.
74
tomarmos este valor como ponto de referência posso dizer que apesar desta ser uma
cultura exportável, uma parte considerável do açúcar produzido nos arredores de Belém
permanecia para consumo na cidade. 210
210
Foram responsáveis por esse abastecimento: Guamá com 7.218 arrobas; Acará com 3.412 arrobas;
Capim com 433 arrobas; Mojú com 1.967 arrobas; Vigia com 4.876 arrobas e Barcarena com 8. 735
arrobas. Relatório de Negócios da Província. Presidente Couto de Magalhães. Em 15 de Agosto de 1864.
Impresso na Typ. de Frederico Rhossard. Pará. 1864.
211
Sobre os engenhos no Pará ver CRUZ, op. cit.,;BEZERRA NETO, José Maia. ‘’ A vida não é só
trabalho: Fugas escravas na província do Pará (1860-1888). In: Cadernos do CFCH. Belém,
CFCH/UFPa, vol12, n. ½, 1993, p. 141-154. E sobre a importância dos engenhos de açúcar, no período
colonial ver: KELLY-NORMAND, Arlene. “Africanos na Amazônia, cem anos antes da abolição”. In:
Cadernos do CFCH. Belém, CFCH/UFPa, 1987.
75
São Francisco do senhor Antônio Francisco Corrêa Caripunas ou o Engenho São José,
no rio Capim, de propriedade de Calixto Wallace”. 212
Este senhor Calixto, era o mesmo que tinha os moinhos de arroz ele contava com
um engenho considerável onde “produzia açúcar e cachaça, especialmente esta, que
alcança melhores preços”.213 Na região de Cametá Wallace encontrou o Sr. Gomes
homem que era proprietário de um engenho de produzir açúcar e aguardente.214 Já o
senhor José Antonio Brandão que era dono de propriedade na Barra do Rio Negro tinha
um engenho de cana.215
O trabalho nos sítios e fazendas de cana era realizado em grande parte por
escravos e depois pelos índios que faziam desde a plantação, colheita e fabricação de
açúcar e/ou aguardente. Por exemplo, um dos proprietários de engenho em Abaeté era
“o senhor Antonio José da Silva Brabo que contava com 23 escravos que faziam os mais
diversos ofícios da carpintaria à fabricação da cachaça” 218
No sítio e engenho São José, “o
senhor Antonio José tinha (...) 23 escravos (...) aptos ao trabalho, que no caso deste senhor
212
MACÊDO, Sidiana da Consolação Ferreira de. Sítios e Engenhos em Abaeté: Um estudo de Cultura
Material (1840-1870). Monografia apresentada ao Colegiado de Graduação do Curso de História da
Universidade Federal do Pará. Belém. Pará. 2006. pp. 15.
213
WALLACE, op. cit., pp. 82.
214
WALLACE, op. cit., pp48.
215
WALLACE, op. cit., pp. 117.
216
Arquivo público do Estado do Pará. Fundo: Autos de Inventário e Partilhas. Série: Juízo de Orfãos da
Capital. Caixa/Ano: 1848-50, n. 03.
217
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Juízo Municipal da Capital. Série: Autos de Testamentos.
Caixa: 1868-1870. Doc. 1.
218
MACÊDO, op. cit., pp. 31.
76
Cacau.
Outro produto era o cacau que sempre chegava a quantidades expressivas nas
embarcações que entravam em Belém.222 Ele já era extrativo desde o século XVII onde
era colhido na floresta, e era denominado de bravo, apenas a partir de 1678 é que sua
cultura foi autorizada por carta régia. 223
Durante todo o século XVIII este produto
também foi destaque na exportação com destino a Portugal. Do período de 1773 a 1786
foram exportados um total de 827.833 arrobas e 15 libras;224 em 1794 a 1802 os
números foram de 764.826 arrobas e 30 libras e o ano de 1808 têm 16.465 arrobas; por
fim no período de 1810 a 1818 calculamos uma soma de 968.164 arrobas e ½ libra.225
Essa cultura do cacau chega ao século XIX com força, nos interiores da capital
da província e também do Amazonas originando boas fazendas de cultura do mesmo em
1861 entraram na capital 226.248 arrobas de cacau de onde parte desse cacau acabava
ficando em Belém quando nos diz que portos da Província do Amazonas e do Pará
exportaram para esta cidade nos vapores da Companhia de Navegação e Comércio do
Amazonas um total de 229.138$000 réis em cacau.226
219
MACÊDO, op. cit., pp. 31.
220
Arquivo público do Estado do Pará. Fundo: Autos de Inventário e Partilhas. Série: Juízo de Orfãos da
Capital. Caixa/Ano: 1848-50, n. 03.
221
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Juízo Municipal da Capital. Série: Autos de Testamentos.
Caixa: 1868-1870. Doc. 1.
222
Sobre o cacau ver o trabalho de ALDEN, Dauril. O significado da produção de cacau na região
Amazônica no fim do período colonial; um ensaio de História Econômica comparada. Belém:
UFPA/NAEA;1974.
223
BARATA, Manoel. Op. cit., pp. 308.
224
A exceção dos anos de 1782, 1783 que não encontramos dados para exportação do cacau. Supomos
que nestes anos não houve. Em 1787, 1788, 1789 e 1805 também não houve exportação. Ibdem: nota
186. pp. 304-305.
225
BARATA, op. cit., pp. 305,306 e 307.
226
Relatório apresentado à Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco Carlos
de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico Carlos
Rhossard.
77
Das 82.128 arrobas, de cacau, vindos de Òbidos cerca de 18.000 e uma fração227
ficou na capital das 40.000 arrobas exportadas de Santarém ficaram em Belém 18.044
arrobas; já de Prainha foram 40 arrobas, das 3.000 arrobas de Gurupá foi um total de
455 arrobas que ficaram na capital; em Breves foram 153 arrobas. De Cametá das
66.620 arrobas, 55.211 ficaram na capital.228 Existem ainda os interiores que apesar de
aparecerem como exportando esse produto não há indícios nem valores que especifique
se parte de sua produção ficava na província, ao que parece foram exportado para outros
destinos. Entre eles estavam Alenquer com 16.000 arrobas, Muaná com 6.000 arrobas,
Baião e Monte Alegre com 4.000 arrobas, Faro com 2.000 arrobas, Melgaço com 500
arrobas, Itaituba com 600 arrobas, Oeiras com 450 arrobas, Macapá e Mazagão com 400
arrobas.229
227
Não foi colocado o número na integra, pois encontra-se ilegível. É possível apenas visualizar que era
18 mil.
228
Os outros municípios citados na tabela não aparecem no quadro como fornecedores desse gênero para
a capital. Estamos confrontando os valores a partir de um quadro do relatório do presidente de província
que descreve os produtos importados pela capital no ano de 1861 dos Portos da Província do Amazonas e
do Pará pelos vapores da Companhia de Navegação e Comércio do Amazonas. Relatório apresentado à
Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª
de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico Carlos Rhossard. pp.68.
229
Relatório apresentado à Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco Carlos
de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico Carlos
Rhossard.
230
Relatório Presidente de Província Dr. Abel Graça. Pará. 15 de Agosto de 1871. Typ. do Diário do
Gram-Pará. Travessa de S. Matheus. Casa n. 29. 1871. pp. 45.
78
em 1867 a indústria da província contasse com uma fábrica de chocolate e uma destinada a
fabricação de licor .231
No geral o cacau era um produto que em grande parte era exportado e o que
ficava na capital era empregada na fabrica de chocolate existente. O Dr. Couto
Magalhães nos informa que no ano de 1863232 chegaram à capital 239.717 arrobas do
produto das seguintes localidades: Cametá 110.714 arrobas; Santarém 96.81; Capital
(distritos do interior) 22.566 arrobas e Gurupá 1.279 arrobas.233 No entanto desses
valores “quase todo o cacáo e castanha foram exportados para outras províncias, e
principalmente para fóra do império, ficando na capital mui pequena quantidade que foi
empregada na fabrica de chocolate aqui existente”. 234
Talvez a mesma fábrica descrita
como única em 1867, pelo Presidente Raymundo de Lamare.
Cametá era considerada como um dos municípios mais produtivos tanto que em
relatório de 1867 De Lamare ao comentar sobre a indústria e cultura salienta o fato de
que o cacau era o produto mais importante e que Cametá era responsável pelo
fornecimento de metade de todo cacau exportado para a capital.235 Dez anos depois em
1877 o Dr. João Capistrano presidente de província chamava a atenção para o fato de
uma epidemia de peste ter sido dos fatores que fez o próprio comércio e lavoura terem
sofrido uma queda dizendo o seguinte: “a peste que lavrou em muitos pontos e com
intensidade em Cametá, um dos municípios mais procdutores e que se avantajava
principalmente na cultura do caçáo”236.
231
Relatório Exmo. Sr. Vice- Almirante e Conselheiro de Guerra. Joaquim Raymundo De Lamare.
Presidente de Província. Em 15 de agosto de 1867. Pará. Typographia de Frederico Rhossard. Trvaessa de
S. Matheus, casa n. 29. 1867.pp. 10.
232
No ano de 1863 vindos de Manaus e portos intermediários temos uma quantia de 2.398 arrobas com 46
libras já consignados a diversos comerciantes e no mesmo dia 13 de abril foram importados de outros
interiores cerca, de 1.703 arrobas. Relatório dos Negócios da Província do Pará. Dr. Couto de Magalhães
Presidente de Província. Em 15 de Agosto de 1864. Pará. Impresso na Typ. de Frederico Rhossard. 1864.
233
Em outra data que vai de julho a dezembro de 1858 a janeiro a junho de 1859 vieram de Cametá para
os portos da capital 9.356 arrobas de cacau. Fala dirigida a Assembléia Legislativa da Província do Pará
pelo Presidente de Província Manoel de Frias e Vasconcellos. 1 de Outubro de 1859. Pará. Typ.
Commercial de A. J. R. Guimarães. Travessa de S. Matheus, casa n. 2 AA. Mapa n. 30 C
234
Relatório dos Negócios da Província do Pará. Dr. Couto de Magalhães Presidente de Província. Em 15
de Agosto de 1864. Pará. Impresso na Typ. de Frederico Rhossard. 1864. pp. 67.
235
Ibdem. nota 194. pp. 10.
236
Fala apresentada à Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. João Capistrano
Bandeira de Mello Filho. Em 15 de Fevereiro de 1877. Pará: Impresso na Typografia do Livro do
Commércio Theophilo, Schlogel & Comp. Adm. Antonio Ribeiro dos Santos. 1877. pp. 123.
79
O mesmo Veríssimo que seguia a linha dos críticos à agricultura por falta de
braços e também pelo fato de que a população na Amazônia destina-se apenas ao
237
BATISTA, op. cit., pp.66.
238
Relatório Exmo. Sr. Vice- Almirante e Conselheiro de Guerra. Joaquim Raymundo De Lamare.
Presidente de Província. Em 15 de agosto de 1867. Pará. Typographia de Frederico Rhossard. Trvaessa de
S. Matheus, casa n. 29. 1867. s/ número de página.
239
Relatório do Presidente de Província Dr. Abel Graça. 15 de Fevereiro de 1872. Pará. Typ. Diário do
Gram-Pará. Travessa de S. Matheus. Casa n. 20. 1872. pp. 30.
240
Relatório do Presidente de Província Dr. Francisco Maria Correa de Sá e Benevides. 17 de Janeiro de
1875. Pará.Travessa de S. Matheus. Casa n. 29. 1875. pp. 81.
241
A autora coloca ainda como um dos motivos para a queda em alguns anos dos produtos regionais uma
falta de políticas públicas que estivessem voltados para a agricultura. VILHENA, op. cit., pp. 22 e 23.
242
Relatório Exm. Snr. Barão de Santarém 2ª Vice-Presidente de Província. Em 18 de abril de 1873. Pará.
Typographia do Diário do Gram-Pará. Travessa de São Matheus. n. 29. 1873.pp. 77.
80
extrativismo, também informa que nos idos de 1892 que o cacau após a borracha era o
principal produto da indústria e que o Pará produzia mais do que o Amazonas onde
tinha como os fundamentais centros produtores Cametá, Baião, Mocajuba, Santarém e
Óbidos. Ou seja, tínhamos interiores produzindo cacau e braços também existiam, pois
se não como explicar que entre 1897 a 1899 chegaram na capital 5.000.593 kilos do
produto e que entre 1886 a 1889 ele continuava ocupando o 2ª lugar nas pautas
exportáveis com 17.526.674 kilos. 243
E ainda se fosse uma indústria apenas extrativa teria que haver pessoas para tirar
e algumas vezes beneficiar o cacau. Então não vejo a dita cultura apenas como
extrativista e totalmente decadente. Devemos entender antes que tipo de agricultura e
pessoas se desejava para a Amazônia, já que as culturas existiam e na maioria das vezes
formavam parcela significativa das rendas provincial. Até porque o produto não fazia
parte das pautas exportáveis ele tinha outras utilidades na região, como nos informa
Veríssimo:
Apesar da cultura do cacau ser vista pelo viajante como extrativa, note-se que
existiam fazendas de cultivo a esse gênero no Pará e que como produto bastante
significativo nas pautas comerciais que assim como a exportação para fora da província
243
VERÍSSIMO, op. cit., pp. 174, 190 e 191.
244
VERÍSSIMO, op. cit., pp. 184.
245
AVÉ-LALLEMANT. op. cit., pp. 41.
81
246
Alden, Dauril também trabalha essa perspectiva. Cf. ALDEN, op. cit.
247
WALLACE, op. cit., pp. 59.
248
Arquivo público do Estado do Pará. Fundo: Autos de Inventários e Pratilhas, Juízo Municipal da
Capital. Caixa/Ano: 1868-70, n.03.
249
Arquivo público do Estado do Pará. Fundo: Juízo de Direito da 1ª Vara Cível. Série: Autos Cíveis de
Inventário e Partilhas. 28 de abril de 1875. Caixa: 2.
250
AVÉ-LALLEMANT. op. cit., pp. 146.
82
Tabela IV.
Castanhas de Diferentes Lugares das Províncias do Amazonas
e Pará exportada para Belém em 1858.
Procedência Quantidades alqueires
Manaus (Amazonas) 171 alq.
Serpa (Amazonas) 986 alq.
Óbidos (Pará) 479 alq.
Santarém (Pará) 47 alq.
Gurupá (Pará) 53 alq.
Fonte Boa (Amazonas) 66 alq.
Total 1.769 alq.
Fonte: Relatório Vice-Presidente de Província Ambrósio Leitão da Cunha. Pará. Typ. Commercial
Antonio José Rabello. 1858. p. 39-41.
Tabela V.
Castanha vinda de diferentes lugares da província para a capital em 1861.
Procedência Quantidade Valor
Cametá 9.086 alqueires
Macapá 2.500 alqueires 7.500$000
Mazagão 4.000 alqueires 10.000$000
Gurupá 8.000 alqueires
Porto de Moz 500 potes 1.000$000
Baião 15.000 alqueires
Melgaço 2.000 alqueires 4.000$000
Portel 800 alqueires 1.600$000
Oeiras 500 alqueires 1.000$000
Santarém 10.000 alqueires 20.000$000
Alemquer 12.000 alqueires 30.000$000
Óbidos 2.400$000
Faro 800 alqueires 1.600$000
Itaituba 120 alqueires 240$000
Fonte: Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco
Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico
Carlos Rhossard.
Tabela VI
Quantidade de Castanha e sua origem que chegou à capital em 1863.
Origem Castanha/alq.
Tocantins. 18.164 alq.
Santarém. 7.751 alq.
Gurupá. 5.423 alq.
Óbidos. 4.844 alq.
Alenquer. 3.978 alq.
Macapá. 2.098 alq.
Ilhas de Macapá. 1.953 alq.
Breves. 1.610 alq.
Oeiras. 1.508 alq.
Cairary. 1.200 alq.
Fonte: Relatório dos Negocios da Província do Pará. Dr. Couto de Magalhães Presidente de Província.
Pará. Impresso na Typ. de Frederico Rhossard. 1864.
251
Relatório Exm. Snr. Vice-Presidente de Província Joaquim Raymundo de Lamare. Em 6 de Agosto de
1868. Pará. Typographia do Diario do Gram-Pará. Travessa de S. Matheus. n 29. pp. 23 /25.
252
Relatório Exmo. Snr Dr. Pedro Vicente de Azevedo. Em 15 de fevereiro de 1874. Pará. Typographia
do Diário do Gram-Pará. Travessa de S. Matheus. n . 29. 1874. p. 77 & Fala Dr. João Capistrano Bandeira
de Mello Filho. Em 15 de Fevereiro de 1877. Pará. Typ. do Livro do Commércio. Theophilo, Schoogel &
Comp. Adm. Antonio Ribeiro dos Santos. 1877. pp. 136.
84
Outro produto que chegava à capital produzido nos interiores da província era o
feijão. Em 1858 encontramo-lo entre os produtos agrícolas da província exportados para
o estrangeiro no valor de 12.000 réis.261No ano de 1861 chegaram à capital 3.624
alqueires de feijão donde quem lidera a lista com maior número é Bragança com 3.164.
253
Relatório apresentado ao Exm. Snr. Dr. Francisco Maria Corrêa de Sá e Benevides pelo Exm. Snr. Dr.
Pedro Vicente de Azevedo. Em 17 de Janeiro de 1875. Pará. Travessa de S. Matheus. n. 29. 1875. pp. 82.
254
Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco
Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico
Carlos Rhossard. p. 85.
255
Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco
Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico
Carlos Rhossard.
256
Relatório Exm. Snr. Vice-Presidente de Província Joaquim Raymundo de Lamare. Em 6 de Agosto de
1868. Pará. Typographia do Diario do Gram-Pará. Travessa de S. Matheus. n 29. p. 23 /25.
257
Relatório Presidente de Província Dr. Abel Graça. Em 15 de fevereiro de 1872. Pará. Typ. Diário do
Gram-Pará. Travessa de S. Matheus. Casa n. 20. pp. 30.
258
Relatório apresentado ao Exm. Snr. Dr. Francisco Maria Corrêa de Sá e Benevides pelo Exm. Snr. Dr.
Pedro Vicente de Azevedo. Em 17 de Janeiro de 1875. Pará. Travessa de S. Matheus. n. 29. 1875. pp. 85
e 86.
259
VILHENA, op. cit., pp. 22/23.
260
As castanhas vieram de Santarém 7. 751 alq.; Cabo Norte com 2.093 alq. Cametá com 18.164 alq.;
Óbidos com 4.044 alq.; Alemquer com 3.978 alq. E Gurupá com 5.423 alq. Relatório de Negócios da
Província. Presidente Couto de Magalhães. Em 15 de Agosto de 1864. Impresso na Typ. de Frederico
Rhossard. Pará. 1864.
261
Relatório Vice-Presidente de Província Leitão da Cunha. Em 15 de agosto de 1858. Pará. Typographia
do Commercial de Antonio Jozé Rabello. pp. 32.
85
Seguida de Santarém com 200 alqueires, Portel com 100 alqueires, Muaná e Faro ambos
com 50 alqueires, Macapá, Melgaço e Oeiras com o número reduzido de 20 alqueires.
262
Bragança era um dos interiores agrícolas que tinha na sua cultura além da
farinha o feijão, então grande parte de tais produtos eram abastecidos por Bragança. No
ano de 1862 o Município de Belém com 1.130 alqueires sendo que neste ano o
município da Capital contava com 1.437 estabelecimentos dedicados a cultura do feijão,
cacau, milho, arroz, café, algodão e fumo.263 No ano de 1863 vieram para consumo da
capital 2.023 alqueires de feijão.264 Entre os anos de 1897-1899 foram enviados para a
capital 218. 338 kilos265 de feijão de regiões agrícolas do interior sinal de que nem o
feijão desapareceu de nossa agricultura. E sempre nas épocas de carestia o feijão era
importado ou do Rio ou do Ceará. Era também produzido feijão em Chaves e no
Guamá. Todavia, no Mojú, na capital e em Santarém, Por exemplo, segundo o
presidente Azevedo a produção era insuficiente. De fato, se observarmos a tabela XVII
tirando Bragança, os demais municípios tinham uma produção bem pequena, daí porque
o feijão acaba sendo um produto importado do Maranhão e Ceará quando não do Rio de
Janeiro para o equilíbrio do abastecimento.
262
Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco
Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico
Carlos Rhossard.
263
Relatório apresentado. Á Assembléia Legislativa da Província do Pará. Feita pelo Dr. Francisco
Carlos de Araujo Brusque. Em 1ª de Setembro de 1862. Pará: Impresso na Typografia de Frederico
Carlos Rhossard. pp. 57.
264
O feijão teve procedência de: Guamá 123 alqs.; Bragança com 1.357 alqs.; Capim com 190 alqs. E
Santarém com 353 alqs. Relatório de Negócios da Província. Presidente Couto de Magalhães. Em 15 de
Agosto de 1864. Impresso na Typ. de Frederico Rhossard. Pará. 1864.
265
VILHENA, op. cit., pp. 22 e 23.
86
seringa tentando, quem sabe, tirar o seu quinhão dessa economia que se agitava”.266 No
entanto, “se forem lidas mais atentamente algumas das fontes disponíveis sobre a
exportação de determinados gêneros da Província, pode-se ver que os dados indicam
momentos de crescimento no volume dos gêneros agrícolas comercializados”. 267
Através dos dados expostos neste capítulo é possível afirmar que apesar da
economia gomifera ter tido uma grande importância e monopolizado as atenções
comerciais, a produção local manteve-se e foi capaz de produzir alimentos para o
abastecimento da capital, e mesmo da própria Província. Outro ponto é notar que
mesmo os produtos que contavam as pautas de exportação também em certa medida
eram consumidos na capital, a exemplo o cacau. E por fim, entender que as tão
propaladas crises de carestia que eram constantemente citadas nos Relatórios
Provinciais ou ainda pelos representantes do Governo poderiam estar relacionadas a
outros fatores, tais fatores serão apresentados e discutidos no capítulo que segue.
Logo, dizer que não tínhamos cultura deste produto e que tudo foi dizimado com o
alarido da borracha é exagero e de certo modo simplifica a análise da organização
produtiva dos interiores da Província.
266
BATISTA, op. cit., pp. 61.
267
BATISTA, op. cit., pp. 65.
87
Primeiras palavras.
Até aqui mostrei como se dava a presença dos produtos regionais na capital e
que durante a segunda metade do século XIX temos um comércio significativo entre a
capital, a Província do Amazonas e os diversos interiores do Pará. Em meados do século
XIX, Ângelo Custódio Corrêa nos informa que o considerado aumento das rendas
durante o 1ª semestre de 1850 ocorreu tendo em vista o maior número de gêneros
chegados do interior e que tinham como destino os mercados da capital. 268 Ora, através
dos números elencados se pode ter a certeza de que os interiores e/ou sertão estavam
produzindo, que este comércio nunca parou por conta da economia da borracha e que o
abastecimento da capital fazia-se de forma significativa através dos produtos regionais.
Todavia não podemos dizer que a capital e alguns interiores ficaram isentos das
crises de determinados víveres, sendo preciso discutir determinadas questões sobre o
que possibilitavam tais momentos de conjunturas. Não creio poder dizer que tais crises
existiram tão somente pelo “Boom” da economia da borracha que tirava os braços das
áreas agrícolas e da pecuária. Trabalho com a idéia de que apesar da borracha ter sido o
grande produto para o comércio no período estudado e ter tido uma grande propagação
de braços que foram trabalhar na economia da goma elástica, como alguns presidentes
de Província ponderavam, penso que as crises tão propaladas pelos administradores
sobre a agricultura tinham outros motivos que levavam aos momentos de carestia onde
os produtos agrícolas e alimentares ficavam a preços elevados ou ainda uma procura
maior que a oferta, mas se levarmos em conta o significativo crescimento demográfico,
vê-se que este contribuiu para que em muitos momentos os alimentos não fossem
suficientes, soma-se a esse os fatores naturais como o clima da região e as enchentes e
outros que serão discutidos neste capítulo.
No ano de 1854 o presidente de Província Rego Barros nos informa que o valor
da importação era praticamente o dobro da exportação já que aos seus olhos:
268
As informações citadas foram encontradas no trabalho de BATISTA, op. cit., pp. 55.
88
Batista aponta que essa possível “crise da agricultura provincial” pode ser
reinterpretada, assim como as palavras de tais presidentes, uma vez que se “forem lidas
mais atentamente algumas das fontes disponíveis sobre a exportação de determinados
gêneros da Província, pode-se ver que os dados indicam momentos de crescimento no
volume dos gêneros agrícolas comercializados”.270 Também já foi dito que os interiores
possuíam significativo comércio com Belém. O gráfico abaixo do período entre 1860 a
1864, momento onde a borracha está em crescimento, demonstra que é possível
encontrar os produtos agrícolas e através de seus números perceber a importância das
lavouras de culturas na província paraense e comércio dos gêneros alimentares, entre
outros.
300000
250000
200000
150000 1860/1861
100000 1861/1862
1862/1863
50000
1863/1864
0
Fonte: Relatório dos Negócios da Província do Pará. Dr. Couto de Magalhães Presidente de
Província. Pará. Impresso na Typ. de Frederico Rhossard. 1864
269
Apud, Batista, op, cit., pp. 63.
270
BATISTA, op. cit., pp. 65.
89
com a Borracha. Os produtos que tinham maior consumo têm um equilíbrio quanto a
sua quantidade como é o caso de arroz com casca, arroz pilado, açúcar e cacau.
Acredito que o diagnóstico dos períodos de crise talvez fosse presente nas
queixas dos presidentes de Província porque não se tinha uma produção agrícola aos
moldes europeus, onde havia uma lavoura agrícola em larga escala, e isso é possível de
identificar nas falas dos governantes, daí o porquê do incentivo e a esperança de que a
colonização européia mudasse tal quadro.271 Mas, insistiam igualmente de outros fatores
que contribuíam para a carestia de determinados produtos. Até porque as crises de
carestia não estavam apenas relacionadas à falta ou não de oferta mais a insuficiência
dela ou o elevado preço as quais podiam ser encontradas os gêneros fato este que em
parte era resultado dos vários fatores que serão aqui analisados.
Braudel dizia que falar tão somente da vida material das coisas que compunham
a vida do homem não era “a única maneira de avaliar sua existência cotidiana. Também
o número dos que partilham as riquezas da terra faz sentido”.272 Já que “vida material
são homens e coisas, coisas e homens”.273 Ora, se a quantidade de homens é necessária
como uma espécie de indicador para entender a própria vida material. Uma análise
sobre o aumento demográfico e o abastecimento da cidade de Belém se torna um
indicador fundamental para abranger como as chamadas crises de carestia eram também
provenientes do aumento demográfico e não da falta de produtos.
271
Luciana em seu trabalho já traz a tona tal preocupação entre as diferenças de produção agrícola entre a
Europa e o Brasil. Cf. BATISTA. op. cit.
272
BRAUDEL, Fernand, Civilização Material, economia e capitalismo séculos XV-XVIII. As estruturas
do cotidiano. Trad. Telma Costa. São Paulo: Martins Fontes, 1995. p. 19.
273
BRAUDEL, op. cit., p. 19.
274
CANCELA, op. cit., pp. 84.
91
Habitantes
96.402
90.119
70.000
61.997
50.064
30.000
17.510 18.305
12.500 16.510
Ano 1801 1853 1856 1862 1868 1872 1884 1890 1896 1900
Fonte: CANCELA, Cristina Donza. op. cit., p. 81. & BATISTA, Luciana. Op. cit.
Pelos dados podemos perceber que até em 1862 a população mantêm num
aumento razoável e que o acréscimo demográfico sofre grande crescimento no período
áureo da borracha em 1868 o contingente populacional estava em 30.000 habitantes em
quatro anos o número de habitantes dobra, em 1872 quando havia 61.997 habitantes.
Ora, “Neste período, a economia da borracha ascendera, e a renda da província, advinda
275
BRAUDEL, op. cit., pp. 21.
276
BRAUDEL, op. cit., pp. 21.
92
das taxas de exportação, crescera mais de 100% entre os anos de 1852 e 1865. Neste
último ano, a borracha já constituía dois terços do valor das exportações do Pará”.277
Além do mais segundo estudos de Ruth Burlamarqui 280 sobre demografia outros
motivos podem ser considerados como “a descoberta de novos seringais no Amazonas,
que poderia ter contribuído para o deslocamento de população rumo a essa nova área de
expansão, e por fim, a migração de nordestinos para a província do Amazonas, bem
281
como o retorno de alguns deles para seus estados de origem”. Para os anos de 1896
os números sobem novamente para 90.119 habitantes e chegam em 1900 com cerca de
96.560 habitantes, o que denota forte crescimento.
277
CANCELA, op. cit., pp. 81 e 82.
278
CANCELA, op. cit., p. 79.
279
CANCELA, op. cit., p. 80.
280
Apud. CANCELA, op. cit., pp. 83.
281
CANCELA, op. cit., p. 83.
282
Cancela em seu trabalho nos informa que durante as décadas de 1870 a 1920 cerca de 20% a 25% da
população do Pará vivia em Belém. CANCELA, op. cit., p. 83.
283
BATISTA, op. cit., p. 87.
93
1900
1898/99
1897/98
1896
1890
Farinha
1884
Gado
1884
1876 Carne verde
1872 Peixe
1868 Habitantes
1863
1862
Ano
Fonte: Relatório do Presidente de Província Relatório dos Negócios da Província do Pará. Dr.
Couto de Magalhães Presidente de Província. Em 15 de Agosto de 1864. Pará. Impresso na Typ.
de Frederico Rhossard. 1864. Fala apresentada à Assembléia Legislativa da Província do Pará.
Feita pelo Dr. João Capistrano Bandeira de Mello Filho. Em 15 de Fevereiro de 1877. Pará:
Impresso na Typografia do Livro do Commércio Theophilo, Schlogel & Comp. Adm. Antonio
Ribeiro dos Santos. 1877. VILHENA, op. cit., pp. 22/23.
A carne também em alguns anos foi ao que parece insuficiente, pois teve
diminuição na produção, entre 1897/98 vieram 71.53 arrobas e 19.508 cabeças de gado
o que também é um numero reduzido para uma população que dois anos depois já
contava com 96.560 habitantes.284 E mesmo as arrobas contavam valores menores que
em 1876 quando foram 184.719.86 arrobas em detrimento de 71.53 arrobas entre
1897/98. Já entre 1897/1899 o número de bois foi de 45.188 um aumento de 25.68
cabeças comparado a 1897/98 quando vieram 19.508, só que a população que em 1896
contava com 90.119 habitantes pula em 1900 para 96.560 um aumento de mais de 6.000
habitantes.
284
CANCELA, op. cit., p. 81.
95
285
BATISTA, op. cit., pp. 91.
286
BATISTA, op. cit., pp. 87.
287
VILHENA, op. cit., pp. 24.
96
Assim, entender o crescimento demográfico é estar atento para que este fator fosse um
dos principais fatores que culminavam com as crises de carestia, estas abalavam não
apenas a população que ficava obrigada a comprar carne e peixe com preços mais
elevados mais acima de tudo altera a própria dinâmica da economia na capital, já que
não apenas o governo vai ter que buscar produtos fora da Província para completar o
abastecimento e isso também encarecia o produto, como os próprios revendedores e
comerciantes do produto tinham a árdua tarefa de manter um preço que ainda elevado
fosse possível acessível as classes mais desprovidos financeiramente. Assim, entre o
aumento populacional e no vai e vem de pessoas surgia outra preocupação dos governos
e da população no que tange o problema de abastecimento eram as epidemias que
grassavam vidas mais também desestabilizavam o abastecimento local.
288
Relatório feito pelo Exmo. Sñr. Conselheiro Jeronimo Francisco Coelho presidente desta Província. 1ª
de Agosto de 1850. Pará. Impresso na Typographia de Santos & Filhos, Rua de S. João canto da Estrada
de S. José. 1850. p. 10. De Janeiro /Julho foram atacados pela epidemia um total de 12.000 enfermos
destes estavam computados o número de 506 mortes.
289
Ainda no ano de 1855 a renda do Tesouro Público Provincial foi de 715.634$904 réis uma diferença
para menos em consideração ao ano anterior de 78.620$069 e segundo João Maria de Moraes uma das
causa segundo o inspetor da repartição era: “(...) a falencia de braços e productos na calamitosa quadra da
epidemia, e a baixa dos preços desses poucos productos”. Relatório apresentado pelo Exm. Senr. Dr.
Henrique de Beaurepaire Rohan. Em 15 de Agosto de 1856. Typ. de Santos & Filhos. 1856. Relatório
apresentado pelo Vice-Presidente Pinto Guimarães. 15 de Outubro de 1855. Publicado como anexos do
Relatório 16 de Out. 1855 e da Falla 26 Out. 1855. p. 13.
97
290
Uma das doenças que atacou a cidade de Belém fazendo muitas vitimas foi o Cólera. Sobre este
aasunto e para uma leitura mais elucidativa ver o trabalho BELTRÃO, Jane Felipe. Cólera, o flagelo da
Belém do Grão-Pará. Belém: Museu Paraense Goeldi; Universidade Federal do Pará. 2004. VIANNA,
Arthur. As epidemias no Pará. 2ª Ed. Universidade Federal do Pará. 1975.
290
Relatório feito pelo Exmo. Sñr. Conselheiro Jeronimo Francisco Coelho presidente desta Província. 1ª
de Agosto de 1850. Pará. Impresso na Typographia de Santos & Filhos, Rua de S. João canto da Estrada
de S. José. 1850. p. 10. De Janeiro /Julho foram atacados pela epidemia um total de 12.000 enfermos
destes estavam computados o número de 506 mortes. Exposição apresentada pelo Exmo. Senr.
Conselheiro Sebastião do Rego Barros, Presidente da Província do Gram-Pará. 29 de Maio de 1856. Typ.
De Santos & Filho. p. 17.
291
Ibdem, nota 23. p. 7 e 8.
292
Ibdem, nota 24. p. 8.
293
Ibidem, nota 25. p. 15.
294
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretaria da Presidencia da Província. Série: Ofícios das
Câmaras Municipais. Ano: 1870-1875. Paço da Camara Municipal da Cidade da Vigia. Em 14 de agosto
de 1874. Doc: 224. Caixa:309.
98
Vale destacar que não eram apenas os números de mortos em si, que era um
fator de desequilíbrio dos lugares produtores, as epidemias não grassavam só vidas e
não era somente a mortandade que figura o caos, o próprio fato de que havia uma
epidemia muitas vezes dificultava a agricultura e produção bem como a manutenção das
295
Fala apresentada à Assembléia Legislativa da Província do Pará feita pelo Dr. Capistrano Bandeira de
Mello Filho. Em 15 de fevereiro de 1877. Pará. Impresso na Typographia do Livro do Commércio
Theophilo Schlogl & Comp. Adm. Antonio Ribeiro dos Santos. 1877. p. 123.
296
Além dos citados outros que tiveram uma mortandade menor também sentiram a presença das
epidemias e eram lugares importantes para o abastecimento como Igarapé-Miri com 50 mortes, Abaeté
com 50 mortes, Curuça com 44 mortes, Cintra com 23 mortes, Ourém com 64 mortes, Gurupá com 37
mortes. VIANNA, Arthur. op. cit., p.172.
297
Relatório à Assembléia Legislativa da Província do Pará feita pelo Dr. José Coelho da Game e Abreu.
Em 15 de fevereiro de 1880. Pará. Impresso na Typographia do Diário do Gram-Pará. Travessa de S.
Matheus.
298
Relatório apresentado à Assembléia Legislativa da Província do Pará feito pelo Dr. João Antonio
d’Araújo Freitas Henriques. 6 de Outubro de 1886. p. 56.
299
VIANNA, op. cit.
99
Outro motivo eram os roubos de gado, como ocorria com o gado nas fazendas do
Marajó.300 Sobre o que trato a partir deste ponto o roubo de gado acabava sendo um
fator que contribuía para os momentos de crise quando somos informados pelos relatos
governamentais que eles afetavam: “os nossos mais vitaes interesses, porque elles
occasionão a carestia de carnes verdes que não se poupe o emprego de todo e qualquer
meio para que venhamos a conseguir satisfactorio resultado”.301 Já na crise de 1856,
uma das atitudes do presidente foi mandar uma comissão com liderança de Victorio de
Figueiredo Vasconcelos comprar o maior número possível de gado na ilha do Marajó. A
preocupação maior é com o fato de que
(...) uma delas, a meu ver é estar habilitada a Presidencia com mais alguns
meios que já tem sido por mim requisitados ao Governo Imperial para
impedir o roubo e exportação do gado do Marajó; outra é a necessidade de
serem mais bem conhecidas pelos fazendeiros de gado as vantagens de uma
criação cuidadosa, do transporte de uma maneira mais digna da civilisação da
Provincia, e finalmente que o capricho e o mal entendido interesse particular
300
Sobre um estudo mais aprofundado sobre os problemas que dificultavam o abastecimento pela capital
por parte do Marajó têm-se o trabalho Eli Napoleão Lima que discute a ilha do Marajó como um Núcleo
Subsidiário onde ele levanta os mesmos problemas aqui discutidos para a Província enfatizando a
deficiência do Transporte e o roubo do gado bem como as epidemias que assolavam os gados. LIMA, Eli
Napoleão. Extrativismo e produção de alimentos: Belém e o “núcleo subsidiário” de Marajó. 1859-1920.
Revista Estudos Sociedade e agricultura, 7 de Dezembro de 1996.pp. 59/89.
http://bibliotecavirtual.clacso.org.ar & Batista em seu trabalho já ressaltava tais fatores como aqueles que
contribuíam para as crises de carestia. BATISTA, op. cit.
301
Relatório feito pelo Exmo. Sñr. Conselheiro Jeronimo Francisco Coelho presidente desta Província. 1ª
de Agosto de 1850. Pará. Impresso na Typographia de Santos & Filhos, Rua de S. João canto da Estrada
de S. José. 1850. Exposição apresentada pelo Exmo. Senr. Conselheiro Sebastião do Rego Barros,
Presidente da Província do Gram-Pará. 29 de Maio de 1856. Typ. De Santos & Filho. p. 30.
100
Nesse relato se percebe várias razões para que o abastecimento da província pela
ilha do Marajó se torne precário: o roubo do gado atrelado ao fato de que o gado era em
sua maioria exportado para fora da Província e que os próprios fazendeiros estariam
mais preocupados com os lucros do que com a situação da população, ao ponto do
Presidente ter que recorrer ao abastecimento do mesmo em outras Províncias como o
Ceará. Rego Barros, ainda em 1854, já expunha a questão do roubo de gado e como o
Regulamento da Portaria de 16 de Dezembro de 1852, o qual garantia os fazendeiros
contra os roubos constantes, não estava surtindo efeito e que tal situação poderia ser
resolvida se ali fosse criada uma Comarca e a compra de um vapor que “ponha em mais
freqüente e fácil communicação alguns pontos da mesma Ilha entre si e com esta
capital” a “prover-nos de carne boa e abundante”.303 Tal situação, também foi visível no
relatório datado de 1866 pelo Barão de Arary quando este denúncia
Eram justamente tais roubos que muitas vezes deixavam a população com falta
de um dos gêneros mais procurados e que compunha a lista dos mantimentos de
primeira necessidade. No ano de 1864 os problemas provenientes com o roubo do gado
passam a enquadrar o quadro de causas que impedem o desenvolvimento da atividade
pastoril. Sobre a situação, o Presidente Couto de Magalhães salientava que nenhuma
indústria agüentaria já que: “O furto de gado ali tem sido elevado á cathegoria de
industria licita, de forma que os bons fasendeiros dão-se por muito felizes quando
referem que durante tal anno só perderão mil cabeças de gado”.305 Dez anos passados,
em 15 de junho de 1874, no paço da Câmara Municipal de Cachoeira no Marajó na
pauta das necessidades mais urgentes a serem sanadas encontra-se uma reclamação que
302
Exposição apresentada pelo Exmo. Senr. Conselheiro Sebastião do Rego Barros, Presidente da
Província do Gram-Pará. 29 de Maio de 1856. Typ. De Santos & Filho. pp. 21 e 22.
303
Fala que o Exmo. Sr. Conselheiro Sebastião do Rego Barros Presidente de Província. Em 15 de
Agosto de 1854. Pará. Imp. Na Typ. da Aurora Paraense por Joaquim Francisco de Mendonça, 1854. p.
54.
304
Relatório da Presidência do Pará. Exmo. Sr. Vice-Presidente Barão de Arary. Em 1 de Outubro de
1866. Pará. Impresso na Typographia do Jornal do Amazonas. 1866. p.36.
305
Relatório dos Negocios da Província do Pará. Presidente de Província Dr. Couto de Magalhães. Em 15
de Agosto de 1864. Pará. Impresso na Typografia de Frederico Rhossard. p. 9.
101
Soma-se a isso o fato de que havia a opção dos fazendeiros e produtores de gado
que muitas vezes não priorizavam o abastecimento da capital. Como bons capitalistas
buscavam o que rendia mais. Em 1884 têm-se o seguinte comentário do Visconde de
Maracajú sobre o fato do governo provincial dar apoio aos proprietários do Marajó, já
306
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária da Presidência da Província. Série: Ofícios das
Camâras Municipais. Em 15 de junho de 1874. Ano: 1864-1874. Doc. 24.
307
Relatório Exmo. Sr. Dr. João Lourenço Paes de Souza. 1ª Vice-Presidente de Província. 16 de
setembro de 1885. Pará. Typ. de Francisco da Costa Junior. Travessa 7 de Setembro de 1885.p. 6.
308
LIMA, op. cit., p. 13.
309
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária da Presidência da Província. (Documentação
avulso). Série: Abaixo- Assinados. Ano: 1886-1889. Em fevereiro de 1887. Doc. 118/124.
102
que: “é sabido que Marajó exporta na actualidade para Caiena não menos de duzentas
rezes mensaes”. Ou seja, não convinha ao governo privilegiar a proposta do cidadão
carioca Collatino Marques de Souza em fornecer tal gênero, pois, assim corria o risco
até que a indústria pastoril do Marajó “naturalmente se desgostaria e descrente da boa
vontade do governo para consigo iria vender seu gado ao estrangeiro em maior escala, e
310
assim o principal gênero alimentício escaceando no mercado, attingiria alto preço”.
Alguns governantes tinham essa política de incentivar os fazendeiros dando a eles
vantagens para que estes não optassem por fazer comércio para fora da província, uma
vez que sendo estes já monopolizadores ficava difícil a manutenção da carne fresca na
capital.
310
Fala Exmo. Snr. Presidente de Província General Visconde de Maracajú. Em 7 de janeiro de 1884.
Pará Typ. do Diario de Noticias. 1884. p. 25.
311
Fala Dr. João José Pedrosa. Em 23 de abril de 1882. Pará Typ. Francisco da Costa Junior. Travessa 7
de Setembro. p. 16.
103
O mapa acima demonstra bem como a Província do Pará era uma região de rica
bacia hidrográfica o que limitava o comércio através destes rios como o rio Capim, rio
Guamá, rio Tocantins, diversos furos o próprio arquipélago do Marajó e ainda os que
comunicavam com outras áreas produtoras e fornecedoras como Amazonas com rio
Tapajós, rio Xingú e tantos outros. A frase de Ruy Barata: "Este rio é minha rua”,312
expressa bem a importância dos rios, furos e afins para a Província do Pará. Uma vez
que os rios e afluentes tornavam-se meios para o fluxo do transporte, tanto das pessoas
quanto para a produção, fonte para obtenção de alimentos como a pesca. Assim os
sítios, fazendas, engenhos e áreas de cultivo em geral estavam localizados próximos ou
entre furos e rios.
312
BARATA, Ruy. Revista Ver-o-Pará. Amazônia. Abaetetuba. Ano X. N. 23, março/ 2002.
313
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária da Presidência da Província. (Documentação
avulsa). Série: Abaixo- assinados. Ano: 1851-1859. Cx 03. 20 de Janeiro de 1857.
105
(...) um melhoramento dos correios mensais já que tendo em vista o rio Caeté
que deu nome a esta vila é depois do rio Caeté comercialmente falando o
mais importante de toda costa marítima desta Província, sendo a sua
314
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária da Presidência da Província. (Documentação
avulsa). Série: Abaixo- assinados. Ano: 1860-1869. Cx 04. 31 de Janeiro de 1868.
315
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretaria da Presidência da Província. Série: Ofícios das
Câmaras Municipais). Província do Pará- Paço da Câmara Municipal da vila de Cachoeira em Marajó.
Em 29 de Setembro de 1870. Ano: 1870-1875. Doc: 17. Caixa: 309.
316
Fala Exmo. Sr. Conselheiro Tristão de Alencar Araripe Presidente de Província. Em 25 de março de
1886.Pará. Belém. Diário de Notícias. 1886. p. 8.
106
Soma-se a esse problema a questão da falta de estrutura no curro tanto que desde
1872 por ato foi nomeada um comissão que tinha como função um minucioso exame no
curro e ainda “declarar si o local em que se acha elle situado actualmente, é ou não o
mais conveniente” a dita comissão após análise chegou a conclusão que dentre outras
coisas “uma canalisação d’água no estabelecimento, é a primeira medida a tomar-se
para aquelle fim”. 319
A vila de Faro como já foi dito tinha comércio significativo com a capital e
mesmo assim dependia do vapor que passava por Óbidos, além do mais, estas viagens
de abastecimento eram apenas uma vez ao mês e de certa forma nada econômica. Igual
317
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária da Presidência da Província. (documento
avulso). Série: Abaixo – assinados. Ano 1876-1879. Pará 10 de março de 1877. Doc. 62.
318
Relatório Exmo. Dr. José Coelho da Gama e Abreu. Em 15 de fevereiro de 1881. Pará. Typ. Do Diário
de Noticias de Costa & Campbell. 1881. p. 126.
319
Relatório 5 de Novembro de 1872.
320
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo Secretária da Presidência da Província. (Documentação
Avulsa). Série: Abaixo- Assinados. Ano 1880-1882. Em 9 de janeiro de 1880. Doc. 70/73.
107
situação vivia o núcleo de Santa Izabel em 1883, quando os lavradores e colonos tendo
notícias que os engenheiros da Companhia da Estrada de Ferro de Bragança estariam
passando por perto do povoado pediam “que se digne ordenar para que seja proferida a
linha que passa por este povoado, visto melhor servir dos nossos interesses agrícolas,
aumentando a renda do tráfego”. 321 Assim, a população e os negócios em certa medida
dependiam dos transportes já que para uma região com uma vastíssima hidrografia que
muitas vezes tornava-se um verdadeiro empecilho diante do abastecimento. Além do
que não somente os transportes tinham que ser adequados mais acima de tudo a natureza
também era um obstáculo e com ela não dava simplesmente para tentar melhorá-la mais
sim se adequar aos fatores climáticos e naturais da região e quando não fosse possível
apenas aceitar.
Incluindo todos esses fatores citados, ainda se tinha o próprio clima da região
que contribuía para perdas de produtos, uma vez que as enchentes e alagamentos em
determinados pontos culminavam na perda de toda ou parte dos víveres que abasteciam
a capital da Província. Silva em seu trabalho ao falar da Amazônia esclarecia que a
colonização na Amazônia era um caso singular, uma vez que, “devido as condições
naturais desfavoráveis, caracterizada por uma mata espessa e semi-aquatica, submetida
a um regime fluvial que, com o enorme volume das águas, alaga áreas imensas e arrasa
qualquer lavoura”322; e que, portanto segundo seus argumentos o extrativismo parecia a
melhor opção. Se o extrativismo era a melhor opção ou não, esta discussão não cabe a
nosso trabalho. O fundamental de perceber é que do período colonial para o século XIX,
as questões ambientais continuavam a afetar o abastecimento e com isso as relações
comerciais entre a capital da província e os diversos interiores.
321
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária da Presidencia da Província. (Documento
Avulso). Série: Abaixo-Assinado. Ano 1883-1885. Caixa 07. Santa Izabel 22 de Outubro de 1883. Doc.
94.
322
SILVA, Paula Pinto e, Entre Tampas e Panelas por uma etnografia da cozinha no Brasil. Dissertação
de Mestrado apresentada ao departamento de Antropologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciêncais
Humanas da Universidade de São Paulo. pp. 56 e 57.
108
O viajante Biard quando esteve no Pará entre 1858/59 fez o seguinte comentário:
“Fornece ainda a ilha do Marajó o gado para o abastecimento da do Pará. Foi adverso
aos bois o ano de 1859: as inundações do Amazonas destruíram os rebanhos quase por
completo”.324 Avé Lallemant também em 1859 ao passar por um povoado em Óbidos
enfatiza que as enchentes eram responsáveis por prejuízos que ia das casas dos
moradores até o gado ele dizia que os criadores perdiam número considerável com essas
inundações naturais “onde havia grandes rebanhos, quando faltavam terras altas na
vizinhança, foram completamente destroçados. Milhares de reses morreram afogadas.
Nós mesmos vimos muito gado morto, levado rio abaixo pela corrente”. 325 Buscava-se,
portanto, construir as colônias326 em locais tidos como mais elevados para que a
produção não sofresse danos com as inundações. Esse foi o caso da colônia de Nossa
Senhora do Ó, na Ilha das Onças que se apresentava onde:
(...) não se deve dar mão á empresa, por que reservados os lugares mais
elevados, que devem naturalmente ser preferidos para a edificação, restará
unicamente proceder com tino na escolha dos gêneros, que devem formar a
industria capital da colônia. E demais, sabemos que, no intervallo das
innundações, vegetaes há que podem ser plantados e colhidos, sem que o
agricultor tenha soffrido o menor estorvo”. 327
323
Fala dirigida a Assembléia Legislativa da Província do Pará pelo Presidente de Província Manoel de
Frias e Vasconcellos. 1 de Outubro de 1859. Pará. Typ. Commercial de A. J. R. Guimarães. Travessa de
S. Matheus, casa n. 2 AA. p. 64.
324
F. BIARD. Dois anos no Brasil. Tradução Mario Sette. Companhia Editora Nacional. Brasiliana. Série
5ª . volume 244. 1945. p.167.
325
O viajante ainda observa que “Em novembro e Dezembro, quando o sol volta do norte e traz consigo
ainda mais calor para a região quente, aludes começam a derreter-se n a cordilheira. As águas das
montanhas descem então em grande quantidade e enchem cada vez mais os afluentes do Amazonas; Os
aguaceiros desabam dos céus com mais freqüência e mais abundantes; tudo corre para o Amazonas, que
engrossa cada vez mais até atingir seu máximo em abril e manter-se nele por semanas. “De 8 de junho em
diante as águas começam a baixar”, disseram-me muitas vezes, quando me informava das condições (...)
realmente a 23 de junho já baixara três pés”. AVÉ-LALLEMANT, op. cit., p. 85.
326
As colônias foram espaços onde houve a introdução de imigrantes destinados as lavouras com o intuito
do desenvolvimento da região e em especial da própria produção agrícola, uma delas foi a de Benevides
criada em 1875, com o passar do tempo elas vão aumentando, a maioria das colônias foram se edificando
em fins do século XIX para o XX. Falarei das colônias mais adiante.
327
Falla do Presidente de Província Exmo. Sr. Tenente-Coronel Manoel de Frias e Vasconcellos. Em 1 de
Outubro de 1859. Pará. Typ. Commercial de A. J. R. Guimarães. Travessa de S. Matheus, casa n. 02 AA.
p. 64.
109
agricultores pudessem não ter perda dos vegetais e que provavelmente essa situação
culminaria em uma carestia àqueles municípios em especial quanto ao gado: “Ricas
pastagens cobertas de gado, plantações de arvores fructiferas e de cereaes, tudo emfim
quanto não se achava em terrenos altos foi destruído ou deteriorado”.328 Relatou o
presidente provincial.
Em 1871 quando a capital passava por uma crise de abastecimento o Dr. Abel
Graça presidente de província esclarece que grande parte da responsabilidade pela falta
de víveres era o: “inverno que alaga todos os campos das fazendas, não permitindo, uma
e outra causa, fazer-se o transporte regular dos bois necessários ao consumo da
capital”.329 Exatos 11 anos findos, os problemas referentes as inundações são existentes
e preocupantes quando temos a seguinte proposta por parte do governo provincial de
“desobstrução dos seus rios e igarapés como meio de prevenir inundações, terrível
flagello que desima annualmente milhares de cabeças de gado”.330
Não farei aqui todas as análises cabíveis a esse tema, mas elas são significativas
para mostrar que os “fatores naturais” comuns à região ao dificultar o transporte, alagar
328
Ibdem. nota 60. p. 12.
329
Relatório Presidente de Provincia Dr. Abel Graça. Em 15 de Agosto de 1871. Typ. do Diário Gram-
Pará, Travessa de S. Matheus. Casa n. 29. 1871. p. 52.
330
Relatório Exmo. Snr. Presidente de Província Dr. Manuel Pinto de Souza Dantas Filho. Em 4 de
Janeiro de 1882. Typ. Liberal do Pará. Largo das Merces. N. 4. 1882.p. 118.
331
VERÍSSIMO, op. cit., p. 9.
332
VERÍSSIMO, op. cit., p. 8.
333
VERÍSSIMO, op. cit., p. 9.
110
Ora, não bastava que o produto viesse da capital era preciso que a
população tivesse acesso a ele. De fato, desde 1851 já havia uma discussão na
Assembléia Provincial relacionada aos impostos sobre um dos produtos de 1ª
necessidade a farinha de mandioca. Em 3 de setembro de 1851 o Jornal Correio dos
Pobres trazia a seguinte notícia “no dia 29 do passado teve lugar no recinto
d’Assembléia Provincial a 2ª discussão do Projeto n. 309 em que exemptava de pagar os
direitos a nossa farinha (vulgo d’agoâ)”336 o mesmo autor da notícia intitulado o
“Contra Mestre do Barquinho” ainda dizia com clareza que no dia da 3ª discussão
estaria presente para tomar os nomes daqueles que votassem contra tal projeto. Passados
8 dias no dia 11 de Setembro o mesmo “Contra mestre” publicou um artigo intitulado
“A Assembléia Provincial e a Farinha”, no qual defende o projeto de isenção do
imposto sobre a farinha de mandioca salientando que os lavradores pobres que em
partidas de 10, 15 e 20 alqueires teriam perdas ao pagar o imposto.337
334
VILHENA, op. cit., p. 21.
335
Ibdem; nota 67.
336
Correio dos Pobres. 3 de Setembro de 1851. n. 7. p. 3.
337
Correio dos Pobres. 11 de Setembro de 1851. n. 8. p. 3.
338
Correio dos Pobres. 15 de Setembro de 1851. n. 9. p. 4.
111
naquele momento já existir uma discussão para reduzir os impostos sobre os principais
produtos esta não era bem aceita por unanimidade. E mas, até a década de 90 a
discussão não saía da teoria para a prática e o problema não sumia. Em 05 de julho de
1893 o jornal Correior Paraense trazia uma manchete sobre o Imposto de gêneros
alimentícios o seguinte comentário sobre as saídas para a carestia:
Entretanto, não podemos dizer que não foram tomadas medidas para o aumento
da produção fosse à agrícola ou a industrial, por exemplo, um dos grandes projetos que
tinham tal intenção foram as chamadas colônias agrícolas que surgiram como uma das
formas de conter o que as autoridades chamavam de falta de produção, foi por parte do
governo a criação das colônias agrícolas341 que surgem como uma forma de civilidade e
ainda de disciplina do trabalho agrícola. O mito do extrativismo e que não havia
produção agrícola eram fatores que geravam a fundação de tais colônias como nos
expõe Lacerda:
341
Sobre as colônias agrícolas ver CRUZ, Ernesto. Colonização do Pará. Belém: Conselho Nacional de
Pesquisa/ Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, 1958. Muniz, João de Palma. Estado do Grão-
Pará. Imigração e Colonização Estatistica 1616-1916. Belém: Imprensa Oficial do Estado do Pará. 1916.
SANTOS, Roberto. História econômica da Amazônia (1800-1920). São Paulo: T. A. Queiroz, 1980.
WEINSTEIN, Barbara. A borracha na Amazônia: expansão e decadência, 1850-1920.Trdução Lólio
Lourenço de Oliveira. São Paulo: HUCITEC: Editora da Universidade de São Paulo, 1993.
342
LACERDA, Franciane Gama. Migrantes Cearenses no Pará: faces da sobrevivência (1889-1916).
Universidade de São Paulo, 2006. p. 266.
343
Relatório Dr. Pedro Leão Velozo. 9 de abril de 1867. Pará. Typografia de Frederico Rhossard.
Travessa de S. Matheus, caza n. 20. p. 19.
344
Relatório Dr. João Alfredo Corrêa de Oliveira. 17 de abril de 1870. Pará. Typografia do Diário do
Gram-Pará. Travessa de S. Matheus, caza n. 29. 1870. p. 29.
113
Assim, sempre houve o mito do extrativismo e que a única solução para Belém
seria a colonização de imigrantes que através da disciplina do trabalho iriam produzir
para o abastecimento da região. Como nos mostra Lacerda
345
LACERDA, op. cit., p. 261.
346
Relatório Dr. João Alfredo Corrêa de Oliveira. 17 de abril de 1870. Pará. Typografia do Diário do
Gram-Pará. Travessa de S. Matheus, caza n. 29. 1870.
347
Apud LACERDA. op. cit., p. 289.
348
LACERDA, op. cit., p. 286.
114
Grande parte das colônias são do final do século XIX, o que demonstra que elas
não foram responsáveis por resolver os problemas relacionados aos períodos de carestia,
pois até o colono chegar, se estabilizar e plantar em “larga escala” decorre um tempo em
que ele produzia a si próprio o que deixa uma lacuna no que tange o abastecimento em
larga escala. É notório que as colônias não vão suprir as tais carestia a década de 80 e
90, pois, os relatos nos relatório provinciais sobre carestia de carne verde, por exemplo,
ou de alguns gêneros como farinha, porque o problema não estava somente na produção
e sim nos tantos pontos que já discuti. O problema maior fazia parte de uma falta de
estrutura e interesses além das condições climáticas que não favoreciam o
abastecimento.
Não se pode pensar que na segunda metade do século XIX não havia um
importante comércio entre os interiores e capital, por conta de que hoje os gêneros
alimentícios estavam sendo importados da Europa ou porque as crises de abastecimento
deixavam a população sem os tão consumidos produtos regionais, mas, ao contrário,
estes continuavam abastecendo a região. Sendo que a importação de produtos
alimentícios atendia uma determinada demanda como ver-se á no próximo capítulo. Não
se pode também entender as crises de abastecimento da Província como apenas
conseqüências diretas da extração da borracha e sim dos diversos fatores acima
expostos. Portanto, é preciso entender de que crise de abastecimento está se falando
motivada por uma série de fatores que não a evasão de braços das atividades agrícolas
para os seringais.
Grande parte desses interiores manteve sua agricultura e enviava produtos para a
capital e para o exterior. E nada impedia que um interior que tivesse produção da
borracha também mantivesse suas culturas. Por exemplo, Weinstein afirma que apesar
do Pará ser um grande produtor e exportador da borracha em 1880 a partir de 1870 sofre
quedas dessa produção e que nos primeiros anos apenas uns poucos município
paraenses entre eles Breves, Anajás, Melgaço e Gurupá, eram os que mais produziam
borracha.350 Ao longo deste período estes municípios sempre estão presentes exportando
para a capital seus produtos. O que ocorria era que muitas vezes pelas diversas razões já
349
Relatório feito pelo Governador do Estado Dr. José Paes de Carvalho. 1 de fevereiro de 1900. Pará.
Belém. Typografia do Diário Official. 1900. p. 69.
350
WEINSTEIN, op. cit; p. 71.
115
aqui expostas os produtos não chegavam à quantidade suficiente não por que não
estavam sendo produzidos, mas, sobretudo porque vinham em quantias que se tornavam
insuficientes. Daí porque, o comércio com as províncias tornar-se muitas vezes a única
opção para amenizar as carestias. Por outro lado, o governo tentou de sanar o problema
da carestia, uma dessas formas foi o fomento das colônias agrícolas, entretanto tais
colônias de fato, só passam a contribuir de forma mais abundante com seus produtos no
século XX, uma vez que grande parte de tais colônias foram criadas em fins do século
XIX. Outra medida que tentava resolver a situação foram propostas de redução ou
eliminação de impostos sobre os produtos de 1ª necessidade como a farinha, mas que
não eram atendidos em sua plenitude. Tal realidade vai fazer com que o comércio com
as outras províncias e mesmo com os países estrangeiros se acentuem. É o que será
analisado no próximo capítulo.
116
Introduzir é preciso.
351
Desde 1847 o Pará figura entre as cinco Províncias do Império com maior rendimento. As principais
províncias entre 1847 e 1ª semestre de 1851 eram: Rio de Janeiro com 29.535.890 $; Bahia com
9.757.477 $; Pernambuco com 9.472.871$; Maranhão com 2.343.789 $ e o Pará com 1.290.942 $.
Proposta e Relatório Apresentado pelo Ministro e Secretário d’Estado dos Negócios da Fazenda Joaquim
Rodrigues Torres. Rio de Janeiro. Typ. Nacional. 1851.
352
A autora ainda salienta que: “Na dinâmica da cidade de Belém foram projetados além do Porto de
Belém, O mercado Municipal do Ver-o-peso (1901) (...) [ havendo] 43 fábricas (incluindo chapéus e
perfumaria), 5 bancos, 4 companhais seguradoras, além da implantação da iluminação a gás, sob
117
Esse novo tempo que exalava requinte com casas com azulejos e implementos
importados; lojas de departamento com perfumes; roupas francesas ou ainda as óperas e
peças ressaltando o caráter refinado e o tempo de ouro da Paris nos Trópicos, acaba por
refletir também na alimentação da urbe. Couto em seu trabalho sobre alimentação no
Brasil e em Portugal no século XIX enfatiza que desde 1808 com a chegada da família
real no Brasil o país começa a viver em busca de civilidade, de certa forma, aos moldes
europeus e que está tem inicio no Rio de Janeiro onde um dos pontos que se desejava
enquadrar nos padrões civilizatórios era justamente a alimentação, já que: “como parte
integrante das observações sobre a cultura de um povo, os hábitos alimentares dos
brasileiros inserem-se também neste contexto de civilização.353 Ou seja, o refinamento
da alimentação refletia diretamente neste contexto civilizatório exigido para um país
que procurava selar seu ingresso no seleto clube de países ditos civilizados.354
O Rio de Janeiro na visão dos viajantes Spix e Martius era avaliado com certo
grau de civilidade pela presença de alimentos importados. Já que: “(...) é avaliado, entre
outros fatores, pelos alimentos importados, presentes nas mesas abastadas, cujo afluxo
torna-se intenso a partir da abertura dos portos e que, ao lado dos produtos nativos,
abastecem o mercado da capital”.355 Apesar da realidade ser do Rio de Janeiro do início
do século XIX, essa idéia também cabe para a Belém, já que há uma entrada intensa de
determinados produtos europeus e americanos bem como pelo fato de que o comércio
local também era abastecido tanto por produtos nativos quanto pelos importados.
responsabilidade da Pará Eletric Railway Lighting (...)”. SARGES, Maria de Nazaré. Belém: riquezas
produzindo a belle—époque. (1870-1912). Belém: Paka-Tatu, 2002, p. 137.
353
COUTO, Cristiana Loureiro de Mendonça. Alimentação no Brasil e em Portugal no século XIX e o
que os livros de cozinha revelam sobre as relações entre colônia e metrópole. São Paulo: PUC-SP,
Dissertação de Mestrado. 2003, p. 68.
354
ELIAS, Norbert. O Processo Civilizador. Uma História dos Costumes. Trad. Ruy Jungmann. Ed.
Jorge Zahar Editor. Rio de Janeiro. 1990.
355
COUTO, op. cit., pp. 68 e 69.
356
Em 1870 continuava a existir um fabricante de chocolate em Belém. Relatório Dr. Abel Graça. Pará.
Typ. do Diario do Gram-Pará. Travessa de S. Matheu. N. 29. 1871. p. 33.
357
SARGES, op. cit., p. 20.
118
Paraense em 1905 e uma de licor em 1906.358 Industrialização que será consolidada para
as décadas iniciais do século XX.359
Bem, antes, contudo, outro fator que beneficiou o comércio de importados foi à
introdução da navegação a vapor em 1853, que diminuiu consideravelmente as
distâncias e aumentou as oportunidades do próprio comércio de porte médio e grande e
de longa distância. Sobre a importância da navegação a vapor Ernesto Cruz salientou o
diagnóstico de Joaquim Raimundo de Lamare Presidente Provincial do Pará em fins da
década de 1860. Lamare nos diz o seguinte:
Os fretes que eram caros nos barcos à vela, sendo calculados de acôrdo com
os comerciantes carregadores para a navegação a vapor, ficaram muito
reduzidos: as distâncias quasi desapareceram; as comunicações tornaram-se
mais ativas (...) e o vale do Amazônas viu enfim, entra por suas portas a
riqueza, a prosperidade e a civilização, há tantos séculos esperada.360
358
Ibdem, nota 7, p. 21.
359
Sobre a memória da Indústria Paraense Cf. MOURÃO, Leila. Memória da Indústria Paraense. Fiepa.
( Federação das Indústrias do Estado do Pará. Sesi, Senai, Idepar, IEL. Belém: 1989.
360
Apud CRUZ, CRUZ, Ernesto. História da Associação Comercial do Pará. 2ª Ed. Ver. E ampl.-Belém:
Editora Universitária. UFPA, 1996. p. 108.
361
FRANCO, Afonso Arinos de Melo. Desenvolvimento da Civilização Material no Brasil. 3ª edição. Rio
de Janeiro: Ed. Topbooks, 2005, p. 146.
119
transporte fluvial, também por vias marítimas o comércio internacional fazia-se. Tanto
que o primeiro navio a vapor a chegar a Belém em 1826 vinha dos Estados Unidos,
chamado de Amazon, todavia, o governo da província não permitiu que naquele
momento o tráfego fosse aberto a outros países.
Não havendo problemas com o transporte das mercadorias, então, logo fica a
questão: quem eram os consumidores destes produtos importados? Quando se diz que a
alimentação com produtos importados era consumida por parte da população, entendo
que as novidades chegavam a uma parcela da sociedade, pois, assim como havia
pessoas que podiam comprar o azeite doce, o vinho, o bacalhau e as massas finas, por
exemplo, outras pessoas em alguns momentos sentiam dificuldade em comprar os
produtos locais. Nesse sentido, Sarges ressalta que:
(...) tornou-se por hábito das elites paraenses consumirem (...) uma
gama de produtos importados da Europa e dos Estados Unidos (...).
Importavam-se biscoitos e champanha Franceses, vinagre português,
azeitonas portuguesas, vinhos portugueses, franceses e espanhóis, manteiga
inglesa, sabão americano e até chá de Pequim e uma série de produtos
considerados supérfluos numa cidade em que a maior parte da população não
podia sequer comprar o peixe da região. 362
362
SARGES, op. cit., p. 160.
363
Burke ao delimitar a estrutura de uma elite o faz a partir de três pontos: status, poder e riqueza
BURKE, Peter. Veneza e Amsterdã um estudo das elites do século XVII. Apresentação: Edgard S. De
Decca. Trad: Rosaura Eichemberg. São Paulo. Editora Brasiliense. 1991. p. 24.
364
Ainda sobre a elite paraense na economia e sociedade da borracha ver: CANCELA, Cristina Donza.
Casamentos e Relações Familiares na economia da Borracha (Belém 1870-1920). Universidade de São
Paulo. Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas. Departamento de História. Programa de Pós-
Graduação em História Econômica. USP-SP. 2006. pp. 27 e 28.
120
Também existiam grupos de pessoas que apesar de não serem abastados tinham
acesso a determinados produtos tidos como apurados. Em 1851, na lista de produtos
arrematados para a escola dos educandos para o mês de março constava chá, vinagre de
Lisboa e o azeite doce.365 Assim, os educandos tinham a oportunidade de degustar
determinados produtos tendo em vista que o governo pagava tais custos, mas não se vê
outros produtos como frutas importadas ou mesmo a manteiga, pois se comprava o que
era necessário à alimentação. Obviamente, a maior parte da população não consumia
tais produtos.
O que dizer ainda das pessoas que moravam nos subúrbios da capital, já que
muitas vezes não tinham condições de ir ao mercado diariamente comprar seus
alimentos. Em 1866 essa era a realidade de muitas famílias que para suprir a falta dos
gêneros frescos acabavam recorrendo ao peixe salgado, à carne salgada ou seca que
poderiam ser expostos em vários lugares nos subúrbios. Se de fato estas pessoas não
tinham condições de ir ao mercado comprar o trivial dado sua pobreza, imagine se
poderiam ser abastecidos com os produtos importados.366
Wallace quando de sua viagem teceu comentários sobre alimentação que seria
possível entender as “diferenciações existentes entre formas de consumo pertencentes a
grupos sociais diferentes”. E que “(...) é plausível que as diferenças expostas entre os
mencionados grupos [“população branca” e “índios e negros”] relativas aos seus
367
padrões alimentares, estavam ligadas a culturas de consumo distintas”. Acredito que
um dos principais fatores que justifiquem em certo modo a cultura de consumo
diferenciada foi à crescente economia gomifera já que:
As rendas provinciais cresciam, em grande medida por causa do
comércio de exportação que passou a ter um produto bastante procurado por
países estrangeiros; o poder de compra de, pelo menos, parte da sociedade
local, também dá a impressão de ter tido algum aumento. 368
365
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária da Presidência da Província. Série: Ofícios do
estabelecimento dos educandos do Pará. Ano: 1850-1853. Caixa 140.
366
Sobre a questão, ver pedido de alguns fazendeiros e criadores de gado que solicitam ao Presidente que
vete a medida que estipulava que na falta de carne verde está deveria ser concentrada nos talhos do
mercado público para que todos tivessem oportunidade de comprá-la. No entanto, com o fim da escassez
no dito ano de 1866, onde havia grande oferta de carne verde, estes pediam que a carne pudesse voltar a
ser espalhada pelos talhos ao longo da cidade, já que havia sobra de carne, pois as pessoas que não tinham
condições de vir ao mercado todos os dias substituíam este gênero por carne salgada e/ou seca. No geral,
eram as pessoas que moravam nos subúrbios que mais sofriam com tal medida. Arquivo Público do
Estado do Pará. Fundo: Secretária da Presidência da Província. Série: Abaixo-assinados. Ano: 1860-
1869. Caixa: 04.
367
BATISTA, op. cit., p. 83.
368
BATISTA, op. cit., p. 61.
121
Tal realidade gerava entre aqueles que tinham o poder de compra novos padrões
de consumo é perceptível que ainda na década de 50 os jornais noticiam a venda e
anúncios sobre produtos estrangeiros numa quantidade bem inferior as décadas
seguintes, o que demonstra que os anos de maior crescimento da economia da borracha
aumentaram o poder de compra de parte da sociedade, o que foi um fator responsável
pelo aumento de produtos alimentícios de outros países.
O sal também era outro dos importados de necessidade básica, já que ele era
utilizado tanto nas casas como tempero da comida e conservação dos alimentos, como
também nas indústrias de salgamento de carnes como foi visto no capítulo anterior. Ao
lado desses produtos mais básicos, outros ostentavam riqueza e refinamento como a
manteiga inglesa ou francesa, bolachas, chás entre outros. O comércio com outros
369
Apud. BURKE, Peter. O que é história cultural. Tradução: Sérgio Goes de Paula. – Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Ed., 2005. pp. 76 e 77
122
países tende a aumentar em paralelo aos negócios da borracha tais interesses vão
originar receita a Fazenda.
Nesse setor de refinamento não faltou quem almejasse conseguir seu espaço na
preferência de seus fregueses e não era somente os produtos importados que refletiam
tal postura os produtos locais também tentavam passar ar de bom gosto como foi o caso
dos biscoito produzidos na Fábrica Palmeira que num catalogo de propaganda exaltava
seus artigos que como não eram estrangeiros tinham pelo menos no nome e em seus
ingredientes a idéia de refinados, se tomarmos como refinado aquilo que vinha de
outros países como é o caso dos biscoitos seguintes:
A fábrica Palmeira apesar de ser local não contava diligência para levar aos seus
fregueses biscoitos que seriam refinados e alguns de certo modo com preço mais alto do
que os simples além de colocar produtos importados como as amêndoas ainda tinha um
biscoito que lembrava o costume dos ingleses ao chá das cinco, pois tem o nome de
Five o’Clock tea, outros biscoitos citados que eram descritos com adjetivos a ressaltar
sua aprimoramento e qualidade como “levemente adocicado, agradável, excellente
paladar finíssimo e uma verdadeira maravilha”.371 Ao que tudo indica tais produtos
atendiam a um público com certo poder aquisitivo pois, a mesma fábrica produzia
biscoitos para atender fregueses menos exigentes e com menos dinheiro entre eles
estavam o ‘popular’ que segundo o catálogo era “preferido pela sua qualidade e módico
preço” e ainda o ‘popular moreno’ que era “de preço popular e agradavel paladar de
chocolate”.372
370
Biblioteca Pública Arthur Vianna. Seção: Obras Raras. Fábrica Palmeira. Catalogo da Secção de
Bolachas e Biscoitos. Pará. Brasil. Jorge Corrêa & Ca. não numerada. n: 017.681.1 (811.51). F 122 f.
371
Ibdem. nota 20.
372
Ibdem nota 20.
123
Figura 1 e 2 : Bolachas doces da Fábrica Palmeira inclusive a tea e a outra de araruta com o nome
da Fábrica.373
373
Figuras retiradas de FONTES, Edilza Joana de Oliveira. O pão nosso de cada dia: trabalhadores e
indústria da panificação e a legislação trabalhista (Belém 1940-1954). Belém: Paka-tatu, 2002.
374
BATISTA, op. cit., p. 61.
124
Tabela VII.
Valores sobre os impostos de importação e exportação no período de 1848 a
1851.375
Ano Importação Exportação
Fonte: Tabela adaptada do Relatório do Presidente de Província Dr. Fausto Augusto d’Aguiar. 15 de
Agosto de 1851. Typographia Santos & Filhos. Rua de S. João canto da estrada de S. José. Pará. 1851.
Mapa sem número.
375
Aqui não está especificado quanto desse valor era dos países estrangeiros e quanto era de outras
províncias a mesma coisa para a exportação.
125
Tabela VIII.
Tabela IX
376
Para a exportação foi levado em consideração à exportação por cabotagem e comércio geral por
concorrência.
126
Na tabela IX, nota-se que entre os anos de 1858/59 e 1860/61 é que a importação
mantém vantagem sobre a exportação; entre 1858/59 os valores são de importação 3:
946.363$957 e para a exportação com 3: 917. 103$688 também entre 1860/61 a
importação é maior em ambos os anos a diferença entre os valores é pequena. Nos
demais anos os valores invertem-se e a exportação lidera as pautas e as diferenças
tornam-se maiores somando as cifras dos anos citados temos a exportação com 21:
916.171$747 réis contra 18: 228. 080$700 réis de importação. Assim em determinados
momentos a exportação dos produtos do país para o estrangeiro tem sustentado um
valor maior do que a importação direta dos gêneros estrangeiros. As exportações
crescem a partir da década de 1850 por conta da borracha.
Ou ainda, pelo fato de que os gêneros exportados tinham o valor de mercado que
eram semanalmente regulados devidos os preços correntes ao passo que os das
mercadorias importadas estavam organizados em tarifas para produtos importados as
tarifas eram diferentes das de exportação. E o fato de economia crescente da borracha
377
Relatório do Presidente Couto de Magalhães. 15 de Agosto de 1864. Livraria do Povo. Rua de S. José
67. Casa de Quatro Portas. Rio de Janeiro. 1864. Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. p. 48.
378
Relatório Exmo. Snr. Dr. Domingos José da Cunha Júnior. 31 de Dezembro de 1873. Pará.
Typographia do –Diário do Gram-Pará- Travessa de S. Matheus. n. 29. p. 43.
127
Tabela X.
Valores de impostos arrecadados sobre exportação e importação
(1869-1885).
379
SANTOS, SANTOS, Roberto. História econômica da Amazônia (1800-1920). São Paulo: T. A.
Queiroz, 1980.
380
Deste valor ocupava o 1ª lugar como fornecedora de mercadorias com 4, 183:804$924 réis a Grã-
Bretanha, em 2ª lugar com os Estados Unidos com 1, 265:414$890 réis, seguido de Portugal com 1,
141:900$721, em 4ª a França com 850:389$613 réis, no 5ª lugar Alemanha com 3:281$531 e por ultimo,
a Espanha com 3:083$408. Cf. Relatório de Dr. José da Gama Malcher 1ª Vice-Presidente. Em 9 de
Março de 1878. Pará. Typ. Guttemberg. Praça de Pedro II, Esquina da Rua do General Gurjão. 1878. p.
124.
128
É bom lembrar que nestes anos a borracha ocupa os principais lugares nas pautas
de exportação, então se pode supor que os produtos alimentícios exportáveis estavam
saindo em menor escala. Além do mais a importação não girava apenas em torno de
produtos voltados para a alimentação, ao contrário, diversos tipos de produtos
chegavam à capital dos países estrangeiros como produtos de perfumaria, vestuário
entre outros. Assim pelas tabelas é possível pensar que nos anos de crescimento da
economia gomifera em diversos momentos os valores de importação estavam maiores
que os de exportação, tal situação ressalta que a possibilidade de poder de compra com a
ascensão da borracha estava maior.
381
Portos Franceses na América e Portos do Império. É adequado observar que a
presença significativa de navios estrangeiros já existia desde a 1ª metade do século XIX.
entre 1850-1883.
140
120
100
80 Inlgaterra
60 Estados Unidos
40 França
Portugal
20
Pelo Gráfico acima nos anos referidos o comércio com Inglaterra superava todos
os outros num total 313 embarcações, seguida dos Estados Unidos com 186, em terceiro
a França com 120 e por fim os Portugueses com 101. O comércio com a Inglaterra já
existia na 1ª metade do século XIX. Durante o movimento da Cabanagem os
381
Relatório do Exmo. Snr. Vice-Almirante Joaquim Raymundo De Lamare. Em 6 de agosto de 1868.
Pará. Typographia do Diario do Gram-Para. Travessa de S. Matheus. n. 29. p. 29. Fala Coronel Manoel de
Frias e Vasconcellos. Em 1 de outubro de 1859. Pará. Typ. Commercial de A. J. R. Guimarães. Travessa
de S. Matheus, casa n. 2 AA. n. 35.
130
382
CRUZ, op. cit., p. 131.
383
CRUZ, op. cit., p. 131.
384
A abreviatura brs, era de barris.
385
A abreviatura cxs, era de caixas.
386
A abreviatura sacs, era de sacas.
387
A abreviatura de dts, era de ditas.
131
macarrão 80 cxs; batatas 50 cxs. N. Pontes e Corrêa: castanhas 2 cxs. Nunes d’Almeida
e C: vinho 25 brs. Silva e C: vinho 70 brs. R. J. da Cruz e C: vinho 15 brs. Joaquim
Dias d’Oliveira: vinho 20 brs. J. R. Gill e C: vi nho 50 brs; vinagre 50 dts. C. Rodrigues
Mattos: vinho 10 brs. Antonio Coelho Moreira: vinho 6 cxs. Manoel R. Caetano: vinho
20 brs. J. A. da Cunha: vinho 10 brs. Carvalhos e C: vinho 20 brs. Machado Rocha e C:
macarrão 76 cxs. Manoel Joaquim Rodrigues: repolhos 1 grade, castanhas 5 cxs. Castro
e Irmão e C: vinho 20 brs; cebolas 20 cxs/ Hamburgo: bacalhau 20 cxs. Joaquim N. da
Silva Matto e C: vinho 20 brs. Francisco G. da Costa e Filhos: vinhos 100 cxs;
Francisco J. da Silva e C: vinho 15 brs e 80 cxs. Alfredo Barros e C: vinho 10 brs. J. S.
Salgado: vinho 9 brs. A. S. da Silva e C: vinho 15 brs. Rodrigues Vieira e C: batatas
100 cxs. Leite Silva e C: batatas 50 cxs/ Hamburgo phosphosros 100 cxs, bacalhau 50
ditas. Souza Irmão e C: batatas 50 cxs.A. Martin e C: vinho 8 cxs. M. Pinto e Alves:
manteiga 30 cxs; batatas 200 ditas. Luiz de Araújo e C: manteiga 27 cxs. A. Sovignard:
vinho 2 brs. A. F. de Oliveira e C: batatas 250 cxs./ Hamburgo: cevada 10 cxs; bacalhau
100 cxs. Machado Rocha e C: batatas 100 cxs. P. da Costa e Serra: batatas 15 cxs,
conservas 29. Souza Irmão e C: manteiga 18 cxs/ Liverpool sal 1000 scs; bacalhau 20
cxs, phosphoros 25 dts; arroz 30 sacs. Alfredo Barros e C: provisões 50 cxs, batatas 375
ditas/ Hamburgo: bacalhau 50 cxs; batatas 5 ditas. Lopes Braga e C: batatas 80 cxs.
M.M. Nogueira e C: Batatas 300 cxs. Antonio J. Sardo e C: batatas 40 cxs. J. Vianna e
C: batatas 50 cxs. Barboza Smith e C: batatas 50 cxs/ Hamburgo: bacalhau 30 cxs.
Castro Marques e C: batatas 100 cxs/ Hamburgo: bacalhau 50 cxs. Teixeira Silva e C:
batatas 50 cxs. Gonçalves de Brito e C: batatas 50 cxs. P. Motta e Antongine: vinho 30
cxs, vermouth 30 dts. M. Grumbacher e C: manteiga 20 cxs.388
388
Jornal Diário de Noticias. 08/01/1891. pp. 1 col 1,2. n. 5. & 09/01/1891. p. 1 col1. n. 6.
389
Ibdem; nota 38.
132
vidros, obras de folha de flandes entre outros.390 Vê-se, então, no decorrer do século
XIX um aumento desses produtos importados e conseqüentemente do seu consumo,
sendo incluídos nos lares e hábitos das famílias paraenses que tinham condições para
tal, embora esses produtos importados em maior escala não tenham no conjunto das
práticas alimentares substituído por completo os produtos regionais na capital. Assim,
os produtos importados que tinham maior entrada na Província devem ser enfatizados,
pois ao listá-los é possível entender o perfil das pessoas que os consumiam. Quais
seriam os produtos tidos como mais refinados?
Na capital, o consumo era variado quanto à origem dos produtos, pois, havia
lugar para os produtos regionais, de outras províncias e mesmo de outros países. A
diferença não se fazia apenas na quantidade e sim na natureza dos produtos. Através dos
produtos listados nas tabelas que seguem, entendo que os produtos estrangeiros
chegavam atendendo a um padrão como os chás, vinhos, cerveja, bacalhau entre outros.
Tabela XI
Gêneros Importados à venda na Capital da Província em 1852.
Bebidas Peixes Derivados Massas Frutos Outros
Animais
Fonte: Jornal O Monarchista Paraense. Biblioteca Fran-Paxeco/ Grêmio Literário Português. Anúncios:
Janeiro a Setembro 1852. Ano I. n. 1 ao 18.
390
Ibdem nota 38.
133
Tabela XII
Gêneros Importados do Estrangeiro entre
1857-1858.
Gênero Valor (Em mil réis).
391
Monarchista Paraense. 29 de março de 1852. p. 3.
134
Chá 16.230,417.
Bolachas, biscoitos e roscas 13.692,115.
Tartaruga em rama e em obras. 10.761,736.
Batata 7.203,285.
Fonte: Relatório lido na abertura da Assembléia Legislativa pelo Ex. Sr. Vice-Presidente da Província
Ambrósio Leitão da Cunha. 15 de Agosto de 1858. Typ. Commercial de Antonio Jose Rabello. p. 32.
Tabela XIII
Fonte: Relatório lido na abertura da Assembléia Legislativa pelo Ex. Sr. Vice-Presidente da
Província Ambrósio Leitão da Cunha. 15 de Agosto de 1858. Typ. Commercial de Antonio Jose
Rabello. p. 33.
Na importação direta temos a farinha de trigo com 206.815.376 réis; sal com
106.397.700 réis; manteiga com 81.554.847 réis; vinhos 46.131.042 réis e em quinto
135
392
COELHO, Geraldo Mártires. O violino de ingres; leituras de história cultural. Belém: Paka-tatu,
2005. p. 354.
136
É válido pensar, então que o padrão de consumo aos produtos importados iam
além de se querer alcançar os requintes e bons modos europeus pelos simples fato de
usufruí-los, era também certo luxo, que para muitos era usufruído nas datas festivas e/ou
comemorativas de formas esporádicas e não no cotidiano. Em 1884 se encontra na fala
do senhor Visconde de Maracajú o que estou expondo, falava o Presidente da Província
das frutas, ainda mais as conservadas, que não compunham os gêneros ditos de principal
para a alimentação, quando ao fazer o balancete dos principais produtos nas pautas
comercias da província no que dizia sobre as frutas conservadas “Achamos ocioso fallar
das fructas conservadas que não constituindo o principal alimento, não merecem fixar
attenção dos poderes públicos”.394
393
Apud, VILHENA, Sandra Helena Ferreira. Belém: O Abastecimento de gêneros alimentícios, através
das mercearias (1890-1900). Universidade Federal do Pará. Centro de Filosofia e Ciências Humanas.
Departamento de História e Antropologia. Laboratório de História. 1990. Belém. Pará. p. 19. A fonte
citada pela autora é o jornal Diário de Notícias. 05-01-1893, p. 3.
394
Fala Exm. Snr. Presidente de Província General Visconde de Maracajú. Em 7 de Janeiro de 1884.
Impresso na Typ. do Diário de Noticias. 1884. p. 26.
395
Treze de Maio. Belém do Pará. 4 de Janeiro de 1856. N. 628. p. 4.
137
Por muito tempo a falta da farinha era suprida pela mandioca, já dizia Debret: “O
emprego generalizado da farinha de mandioca em lugar da farinha de trigo fazia da
profissão de padeiro uma indústria de luxo no Brasil (...)”.396 Era justamente a mandioca
que por muito tempo ocupou o lugar do trigo. No entanto, a partir da melhora nos
transportes a longo curso com a introdução do navio a vapor ficou mais fácil a
importação deste produto e cada vez mais ele era consumido em Belém e interiores,
Bates observa que em Belém, em 1859 “A farinha de mandioca, o pão da região, era tão
escassa, tão cara e tão ruim que as classes mais pobres de naturais passavam fome. E
397
fomos obrigados a comer pão de trigo, feito de farinha americana (...)”. Pelo seu
comentário vemos que a farinha de trigo americana era uma das que figuravam no
cenário gastronômico da região.
Dos produtos estrangeiros a farinha de trigo era um dos mais importantes e não
constituía um produto de luxo, que além de ser uma substituição da mandioca quando
necessário, se tornava parte essencial para a indústria local, pois,somente na capital no
ano de 1870 havia 40 padarias e um dono de confeitaria que pagavam impostos.398 Ou
seja, já havia um numero significativo de padarias o que justifica as somas elevadas de
trigo que aportavam na cidade.
396
DEBRET, Jean Baptiste. “Viagem pitoresca e histórica do Brzasil”, t. 1, vol. 1 e 2, p. 260. Arquivo
Ernani Silva Bruni. Equipamentos da casa Brasileira usos e costumes. São Paulo: Museu da Casa
Brasileira, cd-room.
397
BATES, Henry Walter. Um Naturalista no rio Amazonas. (1850-1859). Vol. II, São Paulo, Companhia
Editora Nacional, 1944, p. 395. In: Arquivo Ernani Silva Bruni. op. cit., cd. Room.
398
Naquele ano sobre imposto de indústria e profissões a capital contava com 1,277 estabelecimentos,
dos quais 1,055 estavam sujeitos a impostos e 222 isentos, sendo 394 nacionais e 883 estrangeiros. E
ainda 82 eram da industria mercantil com um valor lucrativo na importação de 349:842.5000 rs. Cf.
Relatório do Presidente de Província Dr. Abel Graça. Pará. Typ. do Diario do Gram-Pará. Travessa de S.
Matheus. Casa n. 29. 1871. pp. 31/34.
399
A Epocha. 03 de janeiro de 1859. N. 01 a 291. Anno II. Anúncios.
400
Apud SANTOS, Roberto Araújo de Oliveira. op. cit.,p. 126.
138
401
BATES, op. cit., p. 16.
402
O sal geralmente vem especificado em unidades de móis, é preciso ressaltar que 1 moio equivale a 60
alqueires. http://br.geocities.com/jcc5002/unidadesantigas.htm.
403
Epocha. Ano I. 9 de setembro & 14 de junho de 1858. Pará. Imp. No Pará na Typ. do Observado Rua
do E. Santo casa n. 16 L. A. Pinheiro 1858
404
Treze de Maio. Belém do Pará. 4 de Janeiro de 1856. N. 628. p. 4.
405
Diário de Belém, quinta - feira, 13 de agosto de 1868. p. 3; Anúncios.
406
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária da Presidência da Província. (Documentação
Avulsa). Série: Abaixo-assinados. Ano: 1870-1879. Cx 05.
407
Relatório Dr. Abel Graça. Pará. 1871. Typ. do Diario do Gram-Pará. Travessa de S. Matheus. n. 29. p.
33.
408
Gazeta Official. Pará, Quarta-Feira 12 de Maio de 1858. Número 3. p. 4.
139
casa do Sr. Antonio Pereira Macedo, em 18 de maio, haveria leilão de uma partida de
barris e meio de manteiga francesa.409
No jornal Diário de Belém de 1868 ela também era presença nos anúncios dos
dias 22 e 25 de agosto de 1868, com dois armazéns anunciando leilão desse artigo: “O
agente Almeida fará leilão em seu armazém,... uma partida de barris com manteiga
ingleza”; ou ainda, “Lima e Calheiros farão leilão em seu armazém... d’um variado
sortimento de gêneros d’estiva, uma partida de barris com manteiga ingleza”.410 Em 16
de janeiro de 1869 no navio inglês Augustine chegaram 23 barris com manteiga. 411 E já
em fins do século no ano de 1891 no jornal Diário de Noticias é possível encontrar
diversos anúncios de leilões do dito produto como é o caso do armazém dos srs. Martins
Pintos & Alves de manteiga Bretel está manteiga também estava sendo vendida no
armazém dos Srs. M. M. Nogueira & Ca. no mesmo ano.412
409
Gazeta Official. Pará, Sexta-Feira 14 de Maio de 1858. Número 3. p. 4.
410
Diário de Belém. Quinta-Feira, 13 agosto de 1868. p. 2.
411
O Liberal do Pará. 16 de janeiro de 1869. p.5.
412
Diário de Noticias. 14 de janeiro de 1891. p. 1. Col 4.
413
AVÉ-LALLEMANT, Robert. Viagem pelo Norte do Brasil em 1859. Vol I. Rio de Janeiro. Ministério
da Educação e Cultura/Instituto Nacional do Livro, 1961. pp. 84-5. ACAYABA, op. cit. cd-room.
414
BATES, op. cit., p. 271.
415
Apud SANTOS, op. cit., p. 126.
140
No gênero das bebidas de teor alcoólico, as cervejas tinham uma aceitação não
apenas na capital do Pará, mas ao longo do Brasil. Exemplo disto era a cerveja de
origem inglesa vinda no vapor inglez Augustine oriundo de Liverpool em 1869, com um
carregamento de 20 caixas e 20 barricas. Em 1869, na ainda, na casa do Sr. Antonio
Pereira Macedo, em 1858, havia cerveja marca India para leilão.418Aliás, segundo
Soares, à medida que fábricas de origem alemã e inglesa desse produto foram sendo
instaladas no Brasil já que a “cerveja ganhava a preferência do brasileiro comum e
tornava-se cada vez mais popular”.419 No entanto, não posso dizer ainda a partir de
quando no Pará essa bebida torna-se de pessoas comuns, o que posso dizer é que no
brigue Ligeiro vieram 25 volumes de cevada constantemente utilizadas para o fabrico da
cerveja.420 A importação de cevada demonstra que Belém não era apenas importadora
desta bebida, pois, em 1870 existiam em Belém 4 fabricantes de cerveja, sinal de que
não havia só importação.421 Ainda tratando das bebidas havia o chá cujo valor entre os
anos 1857-1858 importou em 16.665.417 réis. Quase uma década depois, em 1869, o
brigue inglez Augustine trouxe 10 caixas e por cabotagem vinda de New-York foram 27
caixas importadas do produto.422
416
Treze de Maio. Belém do Pará. 4 de Janeiro de 1856. N. 628. p. 4.
417
Gazeta Official. Pará, Sexta-Feira 14 de Maio de 1858. Número 3.p. 4.
418
Gazeta Official. Pará, Sexta-Feira 14 de Maio de 1858. Número 3. p. 4.
419
LEAL, Maria Leonor Macedo Soares. A história da Gastronomia. Rio de Janeiro: Senac Nacional,
2007. 144p. il. pp. 84/85.
420
O Liberal do Pará. Belém do Pará. Mês de Janeiro de 1869.p. 5.
421
Relatório Dr. Abel Graça. Pará. Typ. do Diario do Gram-Pará. Travessa de S. Matheu. N. 29. 1871. p.
33.
422
Sobre os valores do ano entre 1857-1858 foram obtidos em Relatório lido na abertura da Assembléia
Legislativa pelo Ex. Sr. Vice-Presidente da Província Ambrósio Leitão da Cunha. 15 de Agosto de 1858.
Typ. Commercial de Antonio Jose Rabello. p. 33. E os valores de 1869 foram retirados do jornal O
Liberal do Pará. Belém do Pará. Mês de Janeiro de 1869. p. 5.
141
O azeite também fazia parte dos produtos importados, isto é o azeite doce. Por
exemplo, em 4 de janeiro de 1856, no jornal Treze de Maio no brigue português Tarujo
3ª, vindo de Lisboa, consignado ao Sr. Joaquim Roberto da Silva, vieram 2 bilhas com
azeite.423 Nos anos entre 1857-1858 foram importados 26.898.765 em réis do tal azeite;
em 1869 foram 80 barris de azeite doce, bem como 50 volumes de banha no hyate
americano F. G. Davis, produtos que eram utilizados na própria cozinha ocupando o
lugar que hoje é destinado ao óleo de cozinha.424 Ou como diz ainda Soares,
enfatizando a influência portuguesa em especial a partir da chegada da corte da Família
Real ao Brasil: “o azeite doce dominou nas cozinhas, principalmente em frituras”. Os
números acima mencionados ressaltam que esse produto não permaneceu apenas no Rio
de Janeiro o seu uso e consumo, considerando ainda a significativa presença da
imigração portuguesa em Belém propagou-se.
423
Treze de Maio. Belém do Pará. 4 de Janeiro de 1856. N. 628. p. 4.
424
O Liberal do Pará. Belém do Pará. Mês de Janeiro de 1869. p. 5.
425
Treze de Maio. Belém do Pará. 4 de Janeiro de 1856. N. 628. p. 4.
426
Diário de Notícias. Belém do Pará. Janeiro de 1891.
427
Treze de Maio. Belém do Pará. 4 de Janeiro de 1856. N. 628. p. 4.
428
Diário de Noticias. Em 04 de janeiro de 1891. N. 3. p. 4. Col. 5.
142
Figura 3:
3: Anúncio do Centro Comercial Reductoense em 1891.
429
Treze de Maio. Belém do Pará. 4 de Janeiro de 1856. N. 628. p. 4.
430
O Monarchista Paraense. Janeiro a Setembro
Se 1852. Ano I. n. 1 ao 18. E para os dados de 1869 em O
Liberal do Pará.. Belém do Pará. Mês de Janeiro de 1869. p. 5.
431
Diário de Noticias. Em 01 de janeiro de 1891. p. 4. Col 1.
143
Além das frutas havia também o queijo da Serra da Estrela e a queijada de Cintra
que ao lado de caixinhas e presépios de Natal compunham a lista de presentes. Os
queijos também ocupavam as embarcações e prateleiras espalhadas pela capital. Ainda
com base nas tabelas têm-se
se um valor de 33.260.301 réis. No vapor Augustine foram 66
caixas de queijos e durante os leilões anunciados
anunciados nos jornais a presença de tal produto
era constante. 433
O bacalhau era um dos produtos que fazia parte dos produtos importados que
chegava à capital.. Vinha da Europa onde era um produto bastante procurado desde fins
do século XVI, sendo a exploração deste
d peixe concorrida entre bascos, franceses,
holandeses, ingleses e ao redor dele tinha todo um comércio e métodos de
preparação.434 Tal pesca foi um dos principais comércios da Europa e rendeu muito
lucro para Espanha e França.
França Aqui sua participação é constante
stante e apesar de virem outros
peixes como as sardinhas de Nantes, entre os seus consumidores o bacalhau era
432
Diário de Notícias. 08 de Janeiro de 1891. p. 3. Col 4.
433
O Monarchista Paraense. Janeiro a Setembro
Setembro 1852. Ano I. n. 1 ao 18. E para os dados de 1869 em O
Liberal do Pará.. Belém do Pará. Mês de Janeiro de 1869. p. 5.
434
BRAUDEL, Fernand. Civilização Material, economia e capitalismo séculos XV-XVIII; XV tradução
Telma Costa. – São Paulo: Martins Fontes, 1995, p. 192.
144
Destaco agora a presença de dois itens nas tabelas. O primeiro é o presunto. Este
produto tem ampla entrada em Belém em especial o tido de origem portuguesa. No ano
de 1852 o vapor Augustine trouxe 2 barris deste produto. Além do presunto também se
trazia a carne. No ano de 1869 temos 10 barris de carne, vindas de New-York. Em 1891
temos a venda no Centro Commercial Reductoense Presunto de Lamego.439 Ainda têm-
se o consumo do toucinho tanto em 1852 ele já aparecia à venda, quanto em 1869
quanto se tem notícia da chegada de 185 barris. 440
435
Treze de Maio. Belém do Pará. 4 de Janeiro de 1856. N. 628, p. 4.
436
O Liberal do Pará. Belém do Pará. Mês de Janeiro de 1869, p. 5.
437
Gazeta Official. Pará, Sexta-Feira 14 de Maio de 1858. Número 3, p. 4.
438
Relatório Exm. Snr. General Visconde de Maracajú Gustavo Galvão. Em 24 de junho de 1884. Pará.
Typ. de Francisco Costa Junior. 1884.
439
Diário de Noticias. Em 04 de janeiro de 1891. N. 3. pp. 4, Col. 5.
440
Jornal O Monarchista Paraense. Janeiro a Setembro 1852. Ano I. n. 1 ao 18. E para os dados de 1869
em O Liberal do Pará. Belém do Pará. Mês de Janeiro de 1869, p. 5.
441
Sobre os valores do ano entre 1857-1858 foram obtidos em Relatório lido na abertura da Assembléia
Legislativa pelo Ex. Sr. Vice-Presidente da Província Ambrósio Leitão da Cunha. 15 de Agosto de 1858.
Typ. Commercial de Antonio Jose Rabello. p. 33. E os valores de 1869 foram retirados em Biblioteca
Pública Arthur Viana. Setor Microfilmagem. Jornal O Liberal do Pará. Belém do Pará. Mês de Janeiro de
1869, p. 5.
145
Além desses produtos, ainda aparecem nos anúncios e cargas das embarcações
as massas. Em 1852 têm-se
se o anúncio de massas sortidas; em 1869 vieram num brigue
português 185 caixas de massas. Havia ainda, em quantidades menores, a importação de
conservas 42 caixas e 116 volumes, ambas vindas de Lisboa bem como cominho 49
barricas, a erva-doce com
m 21 barricas, a pimenta com 20 sacas e o vinagre em 3 pipas e
442
Diário de Noticias.. Em 06 de janeiro de 1891. N. 4.p p. 3. Col. 5.
146
70 barris, todos já consignados.443 O brigue Tarujo trouxe ainda ao Sr. Joaquim Roberto
da Silva, também de Lisboa, 1 caixa com conservas e 4 sacas com cominho.444
Ou seja, não se pode esquecer que os produtos em geral vinham de países que
mantinham relações comerciais constantes com Belém e que entravam e saíam
carregados de produtos. Logo, os produtos estrangeiros podem não ter substituídos os
produtos regionais, mas faziam parte do comércio e dos lucros obtidos e arrecadados
pelo governo e que estes eram significativos.
Já no ano de 1852 os produtos passam a ser vistos com maior freqüência nos
anúncios dos jornais que circulavam na província como é o caso do Bacalhau, sardinhas
de Nantes, vinho do Porto, manteiga inglesa, chá inglês e outros.448 A esse respeito
lembre-se que:
443
O Liberal do Pará. Belém do Pará. Mês de Janeiro de 1869. p. 5.
444
Treze de Maio. Belém do Pará. 4 de Janeiro de 1856. N. 628. p. 4.
445
Entre 1862-1863 entraram 49 navios com 27.860 toneladas. Já em 1863-1864 entraram no porto 57
embarcações vindas dos portos do império com 26.945 toneladas. Cf. Relatório de Negócios da Província.
Presidente Couto de Magalhães. Em 15 de agosto de 1864. Pará. Impresso na typ. de Frederico Rhossard.
1864. p. 52.
446
Ibid, nota. 133, p. 4.
447
Diário de Noticias. Em 06 de janeiro de 1891. N. 4. p. 3. Col. 5.
448
O Monarchista Paraense. Ano I. Pará, 7 de fevereiro de 1852. n. 13 e 14. Série 2ª . p. 7.
147
Aliás, uma das casas que vendiam os produtos importados com anúncio de 1915,
era o estabelecimento denominado de Casa Carvalhaes que foi fundado em 1860 e ao
que tudo indica permanecia vendendo os mesmos produtos apenas incorporando
elementos que para o início do século XX era novidade como uma câmara frigorífica de
sua propriedade. A dita casa tinha à venda licores, champagnes, vinhos finos, conservas
finas, fructas, queijos e legumes, produtos que vinham direto dos vapores da Europa e
América do Norte.450
449
ACAYABA, op. cit., p. 37.
450
Annuario de Belém em Comemoração do seu Tricentenário 1616-1916. Eng. Ignacio Moura. E. U do
Brasil. Estado do Pará. Imprensa Official. 1915p. 62.
451
Diário de Notícias. 5 a 25 de Julho de 1883. Domingo, 22 de Julho de 1883. n. 165. p. 3.
452
O Liberal do Pará. n. 20 a 40. Em 2 a 28 de fevereiro de 1869. Em 2 de fevereiro de 1869. p. 3.
453
Gazeta Official. Pará, Sabbado, 15 de maio de 1858. N. 5 p. 4.
148
como “Verdadeiro leite puro de vaccas suissas, tendo conservado seu aroma e todas
suas qualidades nutritivas”, que além de ser utilizado em hospitais e ao exército, cada
vez mais vinha ganhando as casas e alimentação dos particulares onde “ella assegura
um leite agradável, saudavel e natural”.454 O mesmo anúncio dizia que não havia mais
apenas um único agente para a venda no Brasil, mais que já era possível encontrá-lo nas
principais casas importadoras.
Logo, tanto o leite suíço como a farinha láctea e o leite condensado faziam parte
da composição do padrão das indústrias que cresciam no mercado de alimentos e
também dos novos padrões de cultura alimentar, já que a própria Nestlé fazia campanha
onde o leite materno deveria ser substituído pelo leite condensado, sobre o papel da
Nestlé Amorim ressalta que “Com a fabricação do leite condensado no final do século
XIX, na Suíça, a indústria de lacticínios conseguiu um desenvolvimento tecnológico
que marcou, no início do século XX”.455
Agora não bastava mais a ama de leite portuguesa mais sim o leite condensado
surge como um substituto mais eficaz e higiênico. A esse respeito a farinha láctea
também ocupou o papel as ama de leite como ressalta Fontes que “desde o ano de 1873,
a falta de amas-de-leite ‘boas e sadias’ e o seu preço elevado serviu de mote publicitário
para um anúncio da farinha láctea ‘Nestlé’. Tal anúncio informava que as mães
poderiam ficar despreocupadas pois o dito produto era garantia de saúde aos seus filhos
e com ele as crianças não corriam o risco de adoecer ao tomar “um leite fraco, doente ou
pouco”.456 A idéia das concepções mais higiênicas que em fins do século XIX passam a
aflorar cada vez mais, bem como o pudor em não utilizar mais as amas de leite e sim um
produto.
Entre as passas, amêndoas, sal, trigo, bacalhau figuravam mais que produtos e
sim refletiam também um padrão de consumo que variava entre produtos que vinham
para atender uma parcela da população que desejava refinar seus hábitos bem como
produtos que chegavam para saciar a vontade de conterrâneos que para estas paragens
vieram. À medida que a economia gomifera cresce os valores de importação de gêneros
454
Diário de Notícias. Em 03 de Janeiro de 1891. pp. 4. Col 2.
455
Sobre a discussão a alimentação infantil e a indústria do marketing do leite no Brasil ver o trabalho de
AMORIM, Suely Teresinha Schmidt Passos de. Alimentação Infantil e o Marketing da Indústria de
Alimentos no Brasil (1960-1988). In: História: Questões & Debates, Curitiba, n. 42, pp. 95-111, 2005.
Editora UFPR.
456
FONTES, op. cit., p. 81.
149
Em contra partida existiam produtos estrangeiros que não eram de luxo mais
necessários para a manutenção da vida alimentar da cidade como o trigo e o sal. Logo,
os produtos estrangeiros não concorriam com os locais e não houve substituição de um
pelo outro, pois, os produtos importados de outros países, muitas vezes com preço mais
elevado não estavam no orçamento de uma parcela da população da capital. Acredito
que eles podiam completar as refeições e que a presença de produtos estrangeiros não
alterou a preferência muitas vezes pelo alimento regional, onde ambos podiam estar
presentes quando possível.
Parte dos produtos estrangeiros não ficava na capital eram reexportados, ou seja,
enviados da capital para os interiores. O que demonstra que não era apenas a capital que
consumia os produtos importados, que as possibilidades econômicas de aquisição de
tais produtos também existiam no interior e que uma parte considerável dos que
chegavam aos portos do Pará acabavam sendo redistribuídos. No ano de 1860/61, os
valores em réis da renda proveniente de produtos de fora do Império e despachados para
o consumo na capital foi de 5.232.001$244 e deste valor cerca de 13. 948$500 réis457
foram reexportados e despachados para consumo nos interiores, lembrando, todavia,
que além da reexportação de produtos de outros países havia também os de outras
províncias brasileiras.
Weinstein nos informa que parte dos produtos que chegava no porto de Belém
era reexportado. Inclusive, produtos de outras províncias como a farinha, que vinha do
Maranhão e tinha como destino Manaus.458 Isto é, produtos originados do comércio
interprovincial e do estrangeiro, tinham tal destino. Assim, se pode constatar que parte
dos produtos eram redistribuídos e tinham como destino alguns interiores da província
paraense e da província amazonense. Daí por que se pode afirmar que as barricas e
457
Relatório dirigido a Assembléia Legislativa da Província do Pará pelo Exm. Sr. Dr. Francisco Carlos
de Araújo Brusque Presidente da Mesma Província. 17 de Agosto de 1861. Pará. Typ. Do Diário do
Gram-Pará. p. 12.
458
WEINSTEIN, WEINSTEIN, Barbara. A borracha na Amazônia: expansão e decadência, 1850-
1920.Trdução Lólio Lourenço de Oliveira. São Paulo: HUCITEC: Editora da Universidade de São Paulo,
1993.p. 237.
150
sacas com mercadorias diversas que vinham do estrangeiro não ficavam apenas em
Belém, elas eram distribuídas pelos interiores.
459
Quatro de Maio. Província do Pará. Santarém, Quarta-Feira, 03 de fevereiro de 1850. p. 4.
460
Arquivo Público do Estado do Pará. Série: Ofícios e Ofícios das Companhias de Navegação. Ano de
1856-1859. Caixa 205. Escritório da Gerência da Companhia de Navegação e Comércio do Amazonas em
Belém, 27 de setembro de 1858. Gerente Manoel Antonio Pimenta Bueno.
461
Entende-se a linha de Cametá fazendo escalas em Abaeté. S. Domingos e Cametá. Ou seja, os
produtos ficavam espalhados por tais municípios.
462
Ibdem, nota 222. Anexo/Mapa n. 20.
463
Entende-se por Belém e Chaves os municípios de Muaná, Boa vista, Curralinho, Breves, Macapá e
Chaves.
464
Ibdem: nota 116. Anexo/Mapa n. 22.
151
vinho.465 Através dos dados nota-se que parte dos produtos estrangeiros iam para os
interiores para serem comercializados nas casas comerciais, para o consumo local. Um
desses interiores que tinha uma freguesia certa era Cametá. No balanço da casa de José
Ferreira de Mello Irmão localizada no 3ª districto em 31 de dezembro de 1875
encontrava-se a venda ao lado de produtos regionais como pirarucu, mapará e sabão de
cacau: “7 garrafas de vinho do porto, 8 garrafas de vinho Bordeux, 4 dezenas de cerveja,
10 ½ frascos azeite doce, 14 8/24 dezenas Cerveja marca Castelo, 2/3 vinho tinto, 2/3
vinho branco”. 466 Em outro documento da mesma casa e do mesmo ano datado de 31 de
dezembro de 1875 tinha ainda os seguintes produtos: “21 e 15/24 dezenas de garrafa de
cerveja, 6/2 botijas de cerveja preta, 8 garrafas de licor, 1 frasqueiro de vinagre”.467
465
Relatório Exm. Snr. Vice-Almirante e Conselheiro de Guerra Joaquim Raymundo de Lamare. Em 6
de Agosto de 1868. Pará. Typographia do Diario-do-Gram-Pará. Travessa de S. Matheus. n 29. 1868. p.
Anexo/Quadro. 18.
466
A documentação consta 2/3 bel vinho tinto e 2/3 bel de branco. Não conseguir decifrar a que
corresponderia tal sigla, talvez fosse de barril, que geralmente era colocado em sigla.
467
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária de Presidência de Província. Documento
Avulso. Série Abaixo-Assinados. Ano: 1870-1879. Em 18 de Dezembro de 1875.Caixa 05. Documento
49.
468
Baixo Amazonas. Sabádo, 6 de julho de 1872. Anno I. p. 4.
152
portos ser cerca de 36.709 contos,469 deve-se lembrar que o porto do Pará fazia parte da
cidade-mundo e assim era o mais importante da Amazônia e que além dos produtos
alimentícios vinham outros tipos como bens da moda e acessórios, então parte destes
não estavam destinados à alimentação e outros compunham outros tipos de bens de
consumo. E além do mais, até mesmo os que eram alimentícios não ficavam todos na
capital, eram reexportados para outros municípios. Logo, os produtos importados de
outros países eram bem variados quanto seu tipo e apesar de terem sua clientela na
cidade não foram capazes de substituir os produtos regionais, em sua maioria eram tidos
como de luxo, mas, sobretudo havia aqueles que eram de suma importância como era o
caso do trigo e sal. Nesse comércio de importados não era somente a capital que
consumia os vinhos, bolachas, champagne importadas nesse momento de refinamento
dos gostos os interiores também consumiam tais produtos. Os produtos importados não
se restringiam aos vindos de outros países em certa medida havia importação de
produtos vindos de outras Províncias e estes na maioria das vezes eram considerados
alimentos de 1ª necessidade como carne, farinha entre outros.
469
WEINSTEIN; op. cit., p. 237.
153
III. III. Café do Rio e Ceará, sal de assú470: produtos importados das províncias do
império.
Neste tópico ressalto que o comércio de importação não girava apenas em torno
dos produtos estrangeiros em grande parte europeus, que além deste comércio
internacional, a província também conheceu de modo expressivo o comércio inter -
provincial. Se a navegação a vapor foi importante para reduzir o tempo de viagem ela
também vai intensificar as relações comerciais com as outras províncias. Soma-se à
navegação a vapor, o fato de que em momentos de “crises” de abastecimento os
presidentes de províncias recorreriam às províncias vizinhas para manutenção de
determinados produtos. Encontra-se, portanto, uma movimentação interprovincial
expressiva, como é o caso de uma notícia em que se esperava o vapor da Corte, o qual
471
traria “feijão preto e lombo de minas” . Esses produtos, aliás, também foram
encontrados no jornal a Voz de Guajará de 1851, nos anúncios de venda na Taberna de
João Baptista Fermink: “feijão preto do Rio de Janeiro, e toucinho de minas”. 472
É importante notar que para o ano de 1851, nos jornais consultados não há
anúncios em quantidade expressiva de produtos importados de outros países
prevalecendo um comércio interprovincial mercadejando feijão preto, toucinho de
minas, etc. Sendo mais significativos ainda os produtos advindos dos interiores que
abasteciam a cidade com farinha, guaraná, pirarucu e outros, mesmo que em meados do
século XIX houvesse ainda resquícios da crise pela qual a província passou em virtude
das epidemias que se alastravam. Na década de 1850 o comércio sofria um período de
carestia, pelo menos sentida até início dessa década, daí porque no período de Julho a
Novembro de 1851 o Jornal o Correio dos Pobres publicou que: “Continua a haver falta
de azeite de luz- feijão- galinhas- milho- arroz- farinha... 473. Eram também produtos em
falta: “milho, peixe secco e mesmo lenha para a cozinha”.474 Seguiam-se então, as
queixas sobre a falta de gêneros, resultado da crise de abastecimento; os poucos
produtos que chegavam aos portos só eram encontrados a preços exorbitantes que: “faz
470
A cidade de Assú está localizada no Rio Grande do Norte.
471
Correio dos Pobres. Serie Primeira. n. 4. 14 de agosto de 1851. p. 4.
472
Voz de Guajará. Ano I. Pará, 5 de Dezembro de 1851. N. 4. p. 4.
473
Correio dos Pobres. Serie Primeira. n. 2. 31 de julho de 1851. p. 4.
474
Correio dos Pobres. Serie Primeira. n. 1. 25 de julho de 1851. p. 3.
154
espantar os ricos pelo seu enorme preço, e pasmar e espalmar os pobres”. 475 Até mesmo
o gado do Marajó estava vindo em quantidade insuficiente, o que intensificava o
consumo de peixes. Devido a essa carestia talvez não houvesse um número significativo
de produtos importados do exterior para a província paraense no ano de 1851 e
seguintes.
475
op. cit., nota 125. 27 agosto de 1851. p. 4.
476
Entre 1855 à 1859 entraram 222 navios com 69.117 toneladas vindas das seguintes províncias: Rio de
Janeiro, Pernambuco, Parnaíba, Ceará, Assú e Maranhão. Relatório Coronel Manoel de Frias e
Vasconcellos. Em 1 de Outubro de 1859. Pará. Typ. Commercial de A. J. R. Guimarães. Travessa de S.
Matheus, casa n. 2 AA. n. 36.
477
O jornal O Monarchista Paraense é o mesmo a Voz do Guajará que a partir do ano de 1852 tem seu
nome substituído para O Monarchista Paraense.
478
O Monarchista Paraense. Ano I. Pará, 2 de março de 1852. N. 5. 1ª série. p. 4. Este anúncio já existe
desde 5 de Dezembro de 1851.
479
Fala Exm. Snr. Conselheiro Sebastião do Rego Barros. Assembléia Legislativa Provincial. 15 de
Agosto de 1854. Typ. Da - Aurora Paraense- Imp. Por J. NF. De Mendonça, 1854. Pará. Mapa n. 24.
480
Relatório apresentado pelo Vice-Presidente Pinto Guimarães. 15 de Outubro de 1855. Publicado como
anexos do Relatório 16 de Out. 1855 e da Falla 26 Out. 1855. p. 15.
155
importados: “café pilado do Rio, dito do ceará, charutos da Bahia bons...Sal de Assú,
[RN]481.
Ao contrário de boa parte dos produtos importados contavam com artigos que
não estavam entre os de primeira necessidade, o comércio com as outras províncias
computava gêneros de primeira necessidade e por várias vezes tornou-se um recurso
importante para os momentos de falta de determinados produtos, uma vez que encontro
uma movimentação interprovincial significativa e bem mais variada no que tange os
gêneros de primeira necessidade do que o comércio com o estrangeiro.
Tabela XIV.
481
Gazeta Official. Pará, terça-feira 11 de maio de 1858. N. 2. N. 312. p. 4.
156
Tabela XV.
entre 1853-1870.
350000
300000
250000
200000
Fonte 1 Fonte: Relatório apresentado pelo 4ª vice-presidente de Província Dr. Abel Graça.Em
15 de Agosto de 1870. Pará. Typographia do Diario do Gram-Pará. Travessa de S. Matheus n.
29. 1870. p. 33.
arroz pilado e o açúcar. Em 1875, por exemplo, a província estava importando carne
seca do sul; café do Rio de Janeiro e Ceará; algodão e açúcar de Pernambuco; arroz e
farinha do Maranhão e ainda havia sido criada uma lei provincial autorizando a compra
de gado vaccum de outras províncias.482 No jornal Diário de Notícias, em 22 de julho de
1883, se anunciava que na Mercearia Fafeense, na travessa das Mercês, próximo ao
Largo, em frente à Casa Africana se vendia o seguinte produto: “Carne sêcca do sul”,
além do feijão preto e queijos novos. O Rio de Janeiro, aliás, era uma das províncias
que mantinha relação comercial com a capital paraense. Mas, também era possível de se
encontrar produtos vindos de outras províncias. Em 1892, no jornal Diário de Notícias
eram anunciados os seguintes produtos: café mineiro à venda na Empresa de Serviços
Comerciais; já em depósito no mercado público havia à venda de queijos do Ceará;
doce de goiabada; açúcar de Pernambuco; bem como café xarque e milho no trapiche do
Lloyd Brazileiro todos vindos no vapor S. Salvador e ainda camarão, feijão e farinha
vindos no vapor costeiro com venda no trapiche Belém.483
482
Relatório apresentado ao Exm. Sr. Dr. Francisco Maria Corrêa de Sá e Benevides pelo Exm. Sr. Dr.
Pedro Vicente de Azevedo. Em 17 de janeiro de 1875. Pará. Travessa de S. Matheus n. 29. 1875. p. 60.
483
Diário de Notícias. 5 a 26 de Julho de 1883.
484
Diário de Notícias. 06 de Janeiro de 1891. p. 1 col. 1.
485
Diário de Notícias. 06 de Janeiro de 1891. p. 1 col. 2.
159
Corria então o ano de 1873 e Cunha Junior nos informa que devido a uma crise
de carestia e tentando saná-la o mais depressa possível ele também recorrera a Província
do Maranhão donde a farinha tida como alimento de primeira necessidade estava mais
barata do que a encontrada na capital, daí porque o mesmo logo tratou de enviar um
empregado da Tesouraria da Fazenda comprar o tal produto.488 Mas, a problemática
relativa ao abastecimento ao longo do oitocentos paraense parece ter sido a carestia de
carne verde, sendo por várias vezes tentado o seu fornecimento a partir de outras
províncias. Em resolução n. 251 de 27 de setembro e com contrato firmado em 1855, os
comerciantes João Augusto Corrêa & Cia. se comprometiam com o transporte de gado
do Maranhão e Ceará, por exemplo. E ainda pela lei n. 645 de 24 de outubro havia a
garantia do prêmio anual de 12% sobre o capital que fosse empregado na importação de
gado introduzido na capital paraense de fora da província, com a finalidade de ser
talhado em carne verde.489
passando por uma de suas carestias de carne verde, propõem ao governo paraense um
contrato para o abastecimento de tal gênero; o dito coronel propunha um contrato de
cinco anos, fornecendo 600 bois por mês com peso nunca inferior a 120 kilos.490 No ano
de 1883 e pela lei número 1.098 de 8 de novembro de 1882, ficou estabelecido que a
presidência poderia contratar com Pedro Paulo de Moraes Rego, ou quem maiores
vantagens pudesse oferecer fornecimento de gado vindo de fora da Província para aqui
ser talhado pelo próprio governo como solução para amenizar o momento de carestia.
491
Outra proposta aceita foi a de Fellipe Joaquim de Souza Filho e Feliciano Ramos
Ferreira Bentes, um contrato de dois anos para a importação de gado também de fora da
província e a venda de carne verde à população, com o devido cuidado do gado e seu
preço nunca superior a 600 réis o kilograma e na quantidade de pelo menos 1.950
kilos.492 No ano de 1884, após uma das inúmeras crises alimentícias, o Visconde de
Maracajú aprovou em 22 de janeiro uma proposta de Felippe Joaquim de Souza Filho e
Feliciano Ramos Ferreira Bentes firmando com ambos um contrato de dois anos para a
importação de gado de fora da Província e conseqüentemente venda de carne verde para
a população na quantidade de pelo menos 50 kilos e preço nunca superior a 600 réis o
quilograma. Era uma medida com a qual o então presidente tentava amenizar a carestia
deste produto.493
490
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo Secretária da Presidência da Província. Em 30 de maio de
1881. (Documentação avulso). Série: Abaixo-assinados. Ano: 1880-1882. Caixa 06.
491
Fala do Exmo. Snr. Barão de Maracajú. Em 15 de fevereiro de 1883. Pará. Impresso na Typ. do Jornal
da Tarde. 1883. pp. 65.
492
Relatório Ex. Snr. General Visconde de Maracajú. Gustavo Galvão. Em 24 de junho de 1884. Pará.
Typ. de Francisco Costa Junior. 1884.pp. 7/8.
493
Relatório Exm. Snr. General Visconde de Maracajú. Gustavo Galvão. Em 24 de junho de 1884. Pará.
Typ. de Francisco Costa Junior. 1884. p. 6.
161
Posso, então, pensar que em grande parte o comércio com as outras províncias
era algo importante, particularmente em épocas das chamadas carestia em que se
recorria ao comércio com determinadas províncias para tentar conseguir a quantidade de
alimentos para completar o abastecimento da capital e/ou interiores. Possibilidade que
se traduz no fato de que grande parte dos produtos vindos de outros pontos do Império
era tida como de 1ª necessidade e completavam o nosso “cardápio” regional. No
entanto, sem deixar de entender que havia ligações entre as regiões por relações
econômicas, já que sendo o porto da capital paraense tão importante era possível que as
outras províncias tentassem lucrar com a venda de seus produtos.
Todavia, como Belém era uma cidade que tinha forte ligação marítima entre o
porto de Belém e outros portos (Europa, E.U.A e Brasil) situação que aumentava a
condição da cidade como lugar de comércio e onde parte dos produtos importados
podiam ficar, sendo que como foi visto uma parcela de tais artigos não ficava em
494
WEINSTEIN, op. cit., p. 237.
162
Belém, já que sua importância também ocorria quanto uma porta de entrada que muitas
vezes iam para os interiores ou outros lugares como o Amazonas. Discutir os produtos
que abasteciam a cidade demonstra quais os artigos faziam parte da alimentação das
pessoas e isso foi possível moldar a partir das discussões já feitas, entretanto nem só de
produtos vive uma sociedade é necessário andar pela cidade e conhecer onde eles eram
comercializados e quem os fazia, ou seja, quais os lugares e sujeitos que trabalhavam
com comida e artigos alimentícios em Belém.
163
495
Sobre a história da alimentação ver: ACAYABA, Marlene Milan (coord-geral da coleção) & ZERON,
Carlos Alberto (org. volume). Equipamentos, usos e costumes da Casa Brasileira. São Paulo: Museu da
Casa Brasileira, 2000. BOURDEAU, L., Histoire se l’Alimentation, Paris, 1894. BRAUDEL, op. cit.
FLANDRIN, Jean-Louis & MONTANARI, Massimo. História da Alimentação. Trad. Luciano Vieira
Machado, Guilherme J. F. Teixeiral. São Paulo: Estação Liberdade, 1998. CÂMARA CASCUDO, Luís
da. História da alimentação no Brasil: pesquisa e notas. Belo Horizonte, Itatiaia, 1983. CARNEIRO, op.
cit. SAMPAIO, A. J. de, Alimentação sertaneja e do interior da Amazônia, São Paulo, Cia. Ed. Nacional,
1944. REVEL, Jean-François. Um banquete de palavras: uma história de sensibilidade gastronômica.
São Paulo: Companhia das Letras, 1996. SILVA, Entre Tampas e Panelas por uma etnografia da cozinha
no Brasil. Dissertação de Mestrado apresentada ao departamento de Antropologia da Faculdade de
Filosofia, Letras e Ciêncais Humanas da Universidade de São Paulo. Orientação: Dra. Lilia Katri Moritz
Scwarcz. In: Biblioteca da Universidade de São Paulo. 2001. Acervo-FFLCH-FIL.. STRONG, Roy C.
Banquete: uma história ilustrada da culinária dos costumes e da fartura à mesa. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar. 2004.
496
Sobre autores que discutem classes populares/ eruditas ver: BURKER, op. cit. BOURDIEU, Pierre.
“Condição de classe posição de classe”. In: AGUIAR, Neuma. Hierarquias em classe. Rio de Janeiro:
Zahar, 1973. Sobre história Cultural e trocas culturais ver: BARROS, José D’ Assunção.História Cultural
e História das idéias- Diálogos Historiográficos.História Cultural: Várias interpretações. Goiânia: E. V.,
2006. BURKE, Peter. O que é história cultural. Trad.: Sérgio Góes de Paula. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Ed. 2005. CABRERA, Miguel Angel. “Introdução”, “Los antecedentes: de la historia social a la nueva
historia cultural” e “ Um nuevo orden Del dia para la investigación histórica” In: Historia, Lenguaje y
Teoria de la Sociedad. Madrid, Cátedra, 2001, pp. 9-46 e 181.
497
Sobre o conceito de civilização ver: ELIAS, Norbert. O Processo Civilizador. Uma História dos
Costumes. Trad. Ruy Jungmann. Ed. Jorge Zahar Editor. Rio de Janeiro. 1990.
164
498
Sobre o processo de industrialização no Pará ver os trabalhos de: MOURÃO, Leila. Memória da
Indústria Paraense. Belém: Federação das Indústrias do Pará. (FIEPA), 1989. SARGES, Maria de
Nazaré. Belém. Riquezas produzindo a Belle-Époque (1870/1912). Belém: Paka-Tatu, 2002.
499
Sobre a discussão dos negócios da borracha ver: SARGES, op. cit. Para um período anterior
dissertação de BATISTA, Luciana Marinho. Muito Além dos Seringais: Elites, Fortunas e Hierarquias no
Grão-Pará, c.1850- c. 1870. Instituto de Filosofia e Ciências Sociais. Universidade Federal do Rio de
Janeiro. 2004. Para um processo semelhante à Belém ver: DIAS, Edinea Mascarenhas. A ilusão do
Fausto. Manaus 1890-1920. Manaus: Valer, 1999. DAOU, Ana Maria.A belle Époque amazônica. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Ed. 2000.
500
SARGES, op. cit., p. 13.
165
linha de bondes, instalação de bancos (...)”.501 A cada dia a cidade tomava novos ares
com cafés, restaurantes e a construção de prédios elegantes, bem como parecia mudar
com a incorporação de gostos refinados, o que salienta uma mudança de mentalidade.
Assim, dá-se a incorporação de novos ambientes de lazer e sociabilidade. Embora, os
outros estabelecimentos preexistentes não tenham desaparecido com os novos hábitos,
tais como as tabernas e mercearias, ainda que tivessem que se adaptar aos novos tempos.
Por sua vez, o momento destinado à alimentação faz parte do cotidiano desde a
antiguidade, enquanto momento de lazer e sociabilidade em que as pessoas se reuniam
para uma ceia, para um banquete de matrimônio, uma pausa entre a lavoura de café
pelos escravos para o consumo da farinha de mandioca com toucinho e carne seca ou
simplesmente para o lazer da comida. Criando assim novos ou remodelando antigos
tempos sociais. Desde a antiguidade: “o ato de comer em conjunto transformou uma
501
SARGES, op. cit., p. 83.
502
ELIAS, op. cit., p. 13.
166
503
STRONG, Roy C. Banquete: uma história ilustrada da culinária dos costumes e da fartura à mesa.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004.
504
ELIAS. op. cit., p. 14.
167
E que as rusgas entre eles não eram especificidades de Belém, Dias salientou
que na cidade de São Paulo uma das preocupações da Câmara Municipal no início do
século XIX era com as rixas entre vendedoras ambulantes e taverneiros ressaltando que
o papel destas mulheres sempre “caracterizou-se por um permanente estado de tensão”
não somente com os taverneiros, mas, sobretudo com as autoridades. 506 A autora ainda
cita que “(...) não poderão vender as quitandeiras, nos taboleiros, pelo miúdo e aos
vinténs, farinha, milho e feijão, por que tudo isto acima dito ficam reservados tão
507
somente aos taverneiros, que pagam direitos de suas negociações”. As semelhanças
entre São Paulo e Belém não estão somente expressa no conteúdo dos documentos, mas
acima de tudo nos sujeitos sociais envolvidos neles e como estes traçavam seu cotidiano
na venda de seus produtos alimentícios. E sobre tais sujeitos e seus lugares de vivência
505
O Monarchista Paraense. Anno I. Pará, 13 de março de 1852. 1ª Série. n. 6 & 7. p.7.
506
DIAS, Maria Odila Leite da Silva. Quotidiano e poder em São Paulo no século XIX. Prefácio de Ecléa
Bosi. 2ª Ed. ver. São Paulo: Brasiliense, 1995. p. 68.
507
DIAS, op. cit., p. 68.
168
que vou falar agora. Iniciarei pelos espaços de venda onde os Gregórios, Antonios e
Joanas circulavam.
508
Sobre a família Miranda seu patrimônio e importância ver o trabalho o trabalho de BATISTA, op. cit.
E ainda CANCELA, Cristina Donza. Casamentos e Relações Familiares na economia da Borracha
(Belém 1870-1920). Universidade de São Paulo. Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas.
Departamento de História. Programa de Pós- Graduação em História Econômica. USP-SP. 2006.
509
Arquivo Público do Estado do Pará. Autos de Inventários e Partilhas, Juízo de Orfãos de Belém, 1853.
Caixa/Ano: 1853. n. 03.
510
Arquivo Público do Estado do Pará. Autos de Inventários e Partilhas, Juízo de Orfãos de Belém, 1850.
Caixa/Ano: 1848-50. n. 06. p. 4.
169
511
A Voz do Guajará. 14 de Novembro de 1851 a 10 de janeiro de 1852. O Monarchista Paraense de 24
de Janeiro a 7 de setembro de 1852.
512
A Voz do Guajará. 14 de Novembro de 1851 a 10 de janeiro de 1852. p. 4.
513
O Monarchista Paraense. 24 de Janeiro de 1852 a 7 de setembro de 1852. p. 4.
514
O Monarchista Paraense. op. cit., 29 de março de 1852. p. 8.
515
O Monarchista Paraense. op. cit., 15 de maio de 1852. p. 7.
516
O Monarchista Paraense. op. cit., nota 20.
517
VILHENA, Sandra Helena F. O abastecimento de gêneros alimentícios através das mercearias (1890-
1900). Belém: UFPA, Monografia de Graduação em História, 1990.
170
518
O significado em francês de mercerie é boutique, no entanto no século XIX estes estabelecimentos
vendiam os mais variados produtos e não tinham o significado que conhecemos hoje de boutique.
Enquanto mercearia corresponderia a épicerie loja de produtos alimentares de qualidade superior.
LARROUSSE. Mini dictionaire. Français et Portugais,Larrousse/HER, Paris, 2005.
519
BRAUDEL, op. cit., p. 210.
520
Ibdem. nota 24. p.211.
171
Nesse sentido, a maioria das tabernas, lojas e armazéns ficavam localizadas nos
1ª e 2ª distrito.. Ver mapa da localização dos distritos na década de 1880:
Planta II
A cidade de Belém e seus
s distritos na década de 1880.
Fonte: BEZERRA NETO, Fugindo, sempre fugindo: escravidão, fugas escravas e fugitivos no
1888). Dissertação de Mestrado. Departamento de História do Instituto de
Grão-Pará (1840-1888).
Filosofia e Ciências Humanas da Universidade
Universidade Estadual de Campinas. Março, 2000. p. 263.
521
BEZERRA NETO, Fugindo, sempre fugindo: escravidão, fugas escravas e fugitivos no Grão-Pará
Grão
(1840-1888). Dissertação de Mestrado. Departamento de História do Instituto de Filosofia e Ciências
Humanas da Universidade Estadual de Campinas. Março, 2000. p. 264.
172
No ano de 1869, na rua Nova canto da de S. Matheus,522 parece que havia uma
taberna, a qual os negros e negras transformaram em sua bodega, onde os mesmos
faziam “seu rendez-vous nocturno”. Este estabelecimento que continha em suas paredes
o nome de ‘Canto d’Alegria’, como o próprio nome sugere, parecia ser o lugar onde os
‘diletos’ passavam as noites alegremente. O autor do queixume intitulado ‘Censor’
ainda lamentava que qualquer homem de bem que passasse “por uma taberna ou
esquinas de ruas onde quase sempre há reuniões de preto, não terão presenciado
523
espectaculos repgnantes, e offensivos à moral pública!”. Anos passados em 22 de
julho de 1881 o jornal Diário- Gram-Pará trazia uma queixa sobre uns ajuntamentos
que eram feitos nas tabernas que ficavam localizadas na rua dos Martyres, esquina com
a travessa 15 de Agosto, sendo pedido que o subdelegado fizesse algo contra tais
ajuntamentos.524
Um ano depois em 1882 o mesmo jornal trazia como noticia que na taberna
localizada na travessa General Gurjão, esquina com a travessa das Mercês dois sujeitos
após terem se embriagado jogaram tapona velha fazendo uma verdadeira gritaria que
nem a patrulha pode deter e para espanto de todos, o dono da dita taberna era o
inspector de quarteirão, o qual, diga-se de passagem deveria zelar pela ordem pública.525
Em 1885 o jornal Diário de Notícias apresentou a seguinte nota sobre “uma “troça de
vadios”, que todas as noites estariam reunindo-se numa taberna localizada na travessa
de Santo Antonio”. 526
Ao que tudo indica estas tabernas eram repudiadas não apenas pelos vizinhos
que estavam incomodados com tais reuniões, mas, de uma parte da população que via
nesses encontros lugares de “pretos” e “desocupados” e que não cabia mais para Belém.
A questão não era apenas de segurança e ordem pública, mas, todavia de ordem cultural
já que havia uma necessidade de remodelar os hábitos e costumes dos espaços públicos
com o que se enquadraria nos padrões de civilidade. Já que a esse respeito: “Desde a
522
A rua de S. Matheus hoje é a atual Padre Eutíquio. A rua Nova hoje durante o período colonial era a
rua da “praia”corresponde hoje a Boulervard Castilho França. Como no salienta CRUZ, ERNESTO. As
ruas de Belém: significado histórico de suas denominações. Ilustrações de Rudolf Richl. – 2ª ed. Belém:
CEJUP, 1992.
523
Diário de Gram-Pará. 5 de junho de 1869. n. 126. p. 01.
524
Diário de Gram-Pará. 22 de julho de 1881. p. 02.
525
Diário de Gram-Pará. 20 de junho de 1882. p. 02.
526
Apud. ALMEIDA, Conceição Maria Rocha de. O Termo insultuoso: ofensas verbais, história e
sensibilidades na Belém do Grão-Pará. (1850-1900). Universidade Federal do Pará. Programa de Pós-
Graduação em História Social da Amazônia. Belém/Pa. Fevereiro 2006. p, 43.
173
EM NAZARETH
Ao que tudo indica este senhor era dono de uma pensão que durante a
festividade de Nossa Senhora de Nazareth fazia dela também uma espécie de ‘cafeteria’.
533
Arquivo Público do Estado do Pará. Autos de Inventários e Partilhas. Juízo de Orfãos de Belém. 1853.
Caixa/Ano: 1853, n. 03.
534
Diário de Notícias. 03 de janeiro de 1891. pp. 1 col 2, n. 2.
535
Diário de Notícias. 10 de janeiro de 1891. pp. 1 col 3, n. 7.
536
Diário de Notícias. 5 de julho de 1892. p. 1.
537
Correio dos Pobres. Anno de 1851. Pará 23 de Outubro. 2ª Série. n. 14. p. 4.
175
Isto em 1852, quarenta anos depois em outro ponto da cidade temos localizado na Rua
das Flores no canto da Travessa Primeiro de Março um restaurante denominado de
Quatro Cantos.538 A venda de comida na casa do Sr. Lisboa era sazonal aproveitando o
momento do Círio de Nazaré, já o Quatro Cantos um restaurante permanente,
indicando-nos como ao longo da segunda metade do século XIX novos hábitos foram se
constituindo em Belém associados a novas utilidades do tempo. E o que antes era
sazonal como a pensão-restaurante torna-se cotidiano. Lembrando aqui Alain Corbin539
no que tange os tempos sociais, suas mudanças e apropriações; ao mostrar que os
paquetes deixavam de ser um mero meio de transporte para transforma-se em um lugar
propício ao que ele mesmo chama de “advento dos lazeres”, da mesma forma que um
lugar com mesas deixava de ser apenas o local para saciar a fome, tornando-se
restaurante. Assim, se pode entender a alimentação como um tipo de lazer responsável
pela construção de tempos sociais diversos e em diversas classes.
Falo agora um pouco sobre os lugares tidos como mais refinados e aqueles
procurados pelas pessoas que incorporando valores e sensibilidades tidas como
civilizadas freqüentemente estavam presentes em tais estabelecimentos. Um dos pontos
de alimentação eram os hotéis, que além dos hospedes também variavam a clientela
com pessoas que iam lá para jantar ou almoçar. E ainda, os restaurantes como aqueles
destinados à alimentação cotidiana, mas acima de tudo espaços de sociabilidade.
538
Diário de Noticias, 10 de julho de 1892. N. 150.p. 1.
539
Alain Corbin é considerado como o historiador do sensível e tem obras que marcam a história dos
sentidos e conseqüentemente das mentalidades. CORBIN, Alain. Entrevista concedida a Laurent Vidal.
In: Revista Brasileira História. Volume 25 n. 49. São Paulo. Jan/June. 2005. CORBIN, Alain. “História
dos Tempos livres”. e “Do lazer culto à classe do lazer”. In CORBIN, Alain (org) História dos tempos
livros. O advento do lazer. Lisboa: Teorema, 2001 pp. 59-90. p. 86.
540
AVÉ-LALLEMANT. op. cit., p., 29.
176
O aspecto do referido hotel era tão repugnante ao viajante que este optou por
ficar como hospede na casa dos comerciantes e compatriotas Senhores cuja firma era
denominada Tappenbeck & Cia. Já nas décadas seguintes é possível visualizar nos
jornais o aparecimento talvez melhor estruturado que o citado pelo viajante, haja vista
que esses espaços ganharam novos ares oferecendo como atrativo certo conforto para
época, como, por exemplo, dispor de restaurante, inclusive aberto ao público externo.
Posso supor que muitos desses numerosos fregueses eram de condição mais
abastadas ou de uma situação econômica distinta, já que as iguarias não contavam no
cardápio da população pobre: uma suculenta vitella,546 num período que a carne fresca
era de fato para poucos, uma iguaria e as ostras frescas importadas confirmam que o
paladar dos freqüentadores era no mínimo refinado. A promessa de que cada
funcionário iria atender da melhor forma os clientes reforça que estes faziam parte de
um grupo distinto onde ele podia ser bem servido. O freguês estava num ambiente
543
BRAUDEL, Fernand. Civilização Material, economia e capitalismo séculos XV-XVIII. Trad. Telma
Costa. São Paulo: Martins Fontes, 1995. p. 89.
544
Diário de Noticias. 25 de Janeiro de 1891. n. 20. p. 3 coluna 3.
545
Ibdem; nota 40.
546
A vitela é uma carne de novilha ou novilho menor de um ano, por isso mais macia e, portanto mais
saborosa, provavelmente era mais cara. Pode-se com ela fazer iguarias. HOLANDA, Aurélio Buarque de.
Dicionário Aurélio do século XXI. On line. Versão 3.0 Editora Nova Fronteira.
178
refinado e que tinha na sua propaganda um dos seus atrativos não apenas pelo menu,
mas também pelo esmero destinado aos seus freqüentadores. Em outro anúncio ele
aparece como um dos mais importantes da região Norte do Brasil com um serviço de 1ª
ordem e com uma novidade: seu funcionamento era durante todo o dia e ainda estava
sempre pronta a fornecer banquetes com um tratamento sem igual.
Outro estabelecimento que estava em voga em 1891 era o Café Carneiro que era
uma espécie de café-restaurante
restaurante já que oferecia gordo leitão e como o nome já diz uma
carne de carneiro saborosa. O referido estabelecimento pertencia ao “simpático”
Machado, o qual oferecia aos seus clientes uma “esplendida carta escolhida pelo hábil
chefe da arte culinária, chegado ultimamente da capital Federal”. Seus fregueses
contavam com “O gordo leitão, o saboroso carneiro e os succulentos borrachinhos e
muitas outras variedades, gelo e bebidas geladas, isso não se falta é um nunca acabar!”
do anúncio publicado no diário de notícias em 4 de janeiro daquele ano.548 O
Segundo
café-restaurante
restaurante Carneiro também tinha suas peculiaridades e fazia propaganda sobre
elas, ou melhor, que os fregueses estavam mais exigentes não se contentando com
cozinheiros locaiss e sim chefe de culinária importado do Rio de Janeiro, o que mostrava
requinte. Ou seja, a alimentação tornava-se
tornava se uma arte culinária. Por fim, a introdução de
547
Apud. CAIEIRO, op. cit.,p.p. 69.
548
Diário de Noticias. 4 de janeiro de 1891. p. 3.
179
bebidas geladas bem como o gelo retrata a introdução de hábitos que vigoravam nos
principais centros urbanos do Império.
Belém ainda contava com as padarias e confeitarias abertas todos os dias para
vender um pão quentinho ou ainda quitutes de confeitaria. Em 1859 na padaria da rua S.
Vicente o proprietário tinha a venda café de sevada superior da terra, sevada crua,
farinha de milho e pão “dito a sahir do forno depois das 10 horas”.549 Outra padaria
desta vez em 1885 recebia os paladares mais requintados e ilustres, sendo o caso da
padaria e confeitaria Vienense de propriedade de Ponte e Souza & C. que comunicava a
seus fregueses, em especial “ao seu ilustrado público desta capital e do interior”, que a
confeitaria contava com um habilidoso “confeiteiro madrileno” e “estando assim no
caso de effectuar toda sorte de encommenda”.550 Ao que tudo indica não só a confeitaria
deste senhor era bem freqüentada, mas o negócio ia tão bem que ele se propunha a
atender as encomendas fazendo uso inclusive de um confeiteiro especialista e
estrangeiro. Ele ainda faz propaganda de seu pão: “O pão tem sido reconhecido por
diversos Srs. (...) por causa da falta absoluta de qualquer gosto acido”.551 A diferença
deste pão também se dava tendo em vista que está padaria contava com toda sorte de
utensílios destinados à fabricação de excelentes produtos.552 Algumas diferenças são
possíveis notar, portanto, ao longo da segunda metade do século XIX, no tocante as
padarias e suas relações com os hábitos de consumo da população, citadina de Belém.553
No caso da padaria da rua S. Vicente de 1859 da pra perceber que neste período
ainda estava forte o hábito de comer em casa, tanto que além do pão quentinho a padaria
fornecia café e farinha de milho para aqueles que tinham o hábito de fazer pão em casa.
Já em 1885 a padaria vienense não, apenas pão, mas todos os doces de uma confeitaria e
ainda recebia encomendas, o que ressalta que houve uma mudança de mentalidade onde
as pessoas não faziam os doces apenas em casa, já havia o hábito de comprar fora. Bem
549
A Epocha. 03 a 08 de janeiro de 1959. n. 01. Ano II. p. 3.
550
Diário do Gram-Pará. 04 de Dezembro de 1885. p. 3ª, 5ª coluna.
551
É possível que ao falar da acidez do pão esteja se fazendo referência a questão da presença em grande
quantidade do ácido ascórbico na fabricação do pão, já que este componente na produção do pão aumenta
seu volume. Ou seja, quanto maior a quantidade de acido ascórbico maior o tamanho do pão o que leva a
dita acidez. Sobre o uso do acido ascórbico conferir o trabalho de LOPES Alessandra Santos et AL.
Influência do uso simultâneo de àcido ascórbico e azodicarbonameda na qualidade do pão francês.
Cienc. Tecnol. Aliment. Campinas, v.27, n. 2, jun 2007. Disponível em: http://www.scielo.br. Acesso em
01 fevereiro 2009.
552
Diário do Gram-Pará. 04 de Dezembro de 1885. pp. 3ª ,5ª coluna.
553
Para o século XX, acerca do processo de industrialização das padarias, ver: FONTES, op. cit.
180
Através da idéia defendida por Alain Corbin554 de que “Cada sociedade vive
dentro de um arcabouço temporal, e mesmo cada indivíduo”,555 podemos pensar como a
alimentação também é um veículo de construção dos tempos sociais à medida que ela é
capaz de representar novos usos do tempo, uma vez que o ato de alimentar-se também
tem sensibilidades e representações. É claro que o tempo de alimentar-se de um senhor
bem colocado socialmente e economicamente na sociedade paraense não seria o mesmo
para o vendedor de farinha do mercado da palha, a vendedora de mingau do cais da Boa
vista e do escravo. Também como “O arcabouço temporal de nossas sociedades é assim
marcado pela vitória progressiva de um tempo monocrômico”,556 pode-se entender
como o arcabouço temporal nos revela as novas e/ou velhas estruturas alimentares da
sociedade belenense na segunda metade do século XIX.
554
Alain Corbin é considerado como o historiador do sensível tem obras que marcam a história dos
sentidos e conseqüentemente das mentalidades tem livros que seguem essa linha historiográfica como
“Les coches de La terre. Paysage sonore et culture sensible dans Le campagnes au XIX siècle, Le
miasma et la jonquille: odorat et imaginaire social. XVIII siècles”. E ainda foi ganhador em 2000 de um
grande prêmio pela Academia Francesa pelo seu papel e obra enquanto historiador. Revista Brasileira
História. Volume 25 n. 49. São Paulo. Jan/June. 2005.
555
CORBIN, op. cit.
556
CORBIN, op. cit.
181
557
O Paraense, 9 de dezembro de 1843. Número 38. Ano de 1843.
558
No Rio de Janeiro tínhamos de forma freqüente as quitandeiras como nos informa KIDDER: “ As
quitandeiras são as vendedoras de verduras, laranjas, goiabas, maracujás, ou frutas da “flor da paixão”,
mangas, doces, cana-de-açúcar, brinquedos, etc (...)”.Arquivo Ernani Silva Bruno. Op. cit.
559
ROCQUE, Carlos. História de A Província do Pará. Belém: Ed. Mitograph Editora LTDA. p. 22.
182
conhecida” porque “a sua ocupação era vender mingau de manhã e à tarde”.560 Ao que
tudo indica Nazaré já exercia tal função há bastante tempo, pois, quando estava sob o
poder de sua primeira dona D. Maria Barreto de Aragão, residindo na vila de Gurupá, lá
561
também ela se ocupava na venda do dito mingau. Eram então escravas de ganho,
sendo o comércio de comida nas ruas da cidade atividade dominada por escravas e
mulheres forras e livres pobres, ao que parece, compondo grupo considerável.562 No ano
de 1849 encontra-se no jornal O Publicador Paraense a venda de uma mulata que além
de saber cozinhar, sabia “também ganhar na rua”. Já um ano depois, O Planeta trazia o
seguinte anúncio “Vende-se uma escrava de nação, de idade de 36 annos pouco mais ou
563
menos, boa vendedeira e compradeira”. Ora, não era a toa que nos anúncios era
especificado que as ditas escravas tinham bom tino para os negócios de rua, em especial
para a venda. Já que uma das atividades econômicas mais importantes na capital eram
as vendas nas ruas, que naquele momento tinha como principais atuantes as escravas.
560
Apud. ROCQUE, Carlos. História de A Província do Pará. Belém: Mitograph Editora Ltda., 1976, pp.
22 e 23.
561
ROCQUE, op. cit., p. 23.
562
Ver a respeito no tocante o Rio de Janeiro, FARIA, Sheila de Castro. Mulheres forras – Riquezas e
estigma social. Rio de Janeiro, n. 9, pp. 65-92, 2000.
563
ACEVEDO MARIN, Rosa Elizabeth. Trabalho escravo e trabalho feminino no Pará. In: Cadernos do
Centro de filosofia e Ciências Humanas, n. 1- Belém: Universidade Federal do Pará. 1980. p. 70.
564
ACAYABA, Marlene Milan (coord-geral da coleção) & ZERON, Carlos Alberto (org. volume).
Equipamentos, usos e costumes da Casa Brasileira. São Paulo: Museu da Casa Brasileira, 2000.
565
Apud. SANT’ANNA. Denise Bernuzzi de. Transformações das Intolerâncias Alimentares em São
Paulo, 1850-1920. História Questões & Debates, Curitiba, n. 42, p. 81-93. 2005. Editora da UFPR. p. 86.
183
Outra famosa quituteira era Nhá Maria que como cita a autora “pela manhã,
vendia empadas de farinha de milho com piqueira ou lambari, por vinte réis cada uma,
além de um famoso café quente conhecido por seu sabor e frescor”.566 Ela “mantinha
uma freguesia numerosa e, ao anoitecer, vendia um apreciado cuscuz, de bagre e
camarão e água doce, bastante procurado pelos moradores locais”.567 Inclusive a Nhá
Maria tinha como um de seus fregueses João Teodoro, um dos Presidentes de Província
de São Paulo em 1872.568 Assim, não seria nenhum espanto que no universo urbano de
Belém também existissem “tais negras” que tanto encantaram Ribeyrolles. Ou ainda
aqueles que conquistavam os mais importantes paladares como o caso de Nhá Maria.
Seriam escravas de ganho, afinal o comércio de comida nas ruas da cidade era atividade
de escravas, mas também de mulheres livres como aquela Dona Joanna vendedora de
mingau de arroz para os soldados.
566
SANT’ANNA. op. cit., p. 87.
567
Ibdem; nota 71.
568
Ibdem; Ibdem.
569
BRAUDEL, op. cit., p. 229.
570
Arquivo Ernani Silva Bruno. op. cit., Cd-room.
184
exigindo que estes não adulterassem o leite com água.571 A briga ocorria, porque a
câmara não queria permitir os leiteiros vendessem o leite em latas, pois segundo as
denúncias este se encontrava com excesso de água e pouco leite. O interessante é notar
que em 1883, quando Belém vive sob a égide do discurso civilizador, era possível
encontrar vendedores de leite ambulantes e uma população que exigia que o leite fosse
tirado diretamente da vaca em sua frente. Não havia lugar para as latas e muito menos
para as possíveis garrafas. E os leiteiros para atestarem que não estavam corrompendo o
leite deviam andar pela cidade com suas respectivas vacas.
Não somente os ditos senhores queriam que aqui fosse adotado tal método que
aos seus olhos não trazia prejuízo a ninguém, já que a prática da venda do animal era
uma forma de violação da liberdade de indústria. Outra justificativa dos ditos senhores
estava no fato de que essa prática inviabilizava o lucro e o abastecimento, já que ao que
tudo indica que eles não eram simples senhores com um animal que saíam todos os dias
a venda, mas que faziam parte de uma “indústria do leite”, já que eram possuidores de
cerca de cinco a vinte vacas. E como donos de seu negócio não eram eles que saíam a
vender o leite todo dia, Como nos informa o documento:
(...) não é possível que um vendedor de leite que possua cinco, dez ou vinte
vaccas possa conduzir consigo todo seo gado pelas ruas da cidade, e assim
571
Diário de Notícias, 05 de julho de 1883. n. 150. p. 2.
572
Arquivo Público do Estado do Pará. Fundo: Secretária de Presidência de Província. Câmara Municipal
de Belém. Abaixo-assinados. Belém do Pará, 6 de Junho de 1883.
185
sendo perde todo o leite, que não pode trazer em latas, e não pode com uma
só vacca servir a todos os seus fregueses (...). 573
573
Ibdem; nota 43. Os pães também eram vendidos nas ruas de porta em porta nos cestos em 25 de junho
de 1883 encontrei o seguinte anúncio “Attenção dos padeiros chegaram para a loja Veado Branco, de
Carreiro & Compa. Um grande sortimento de cestas de vime, próprias para conduzir pão e que se vende
muito barato”. Diário do Gram-Pará. 25 de junho de 1883. n. 143. p. 02. Sobre o século XX e o processo
de panificação ver: FONTES. op. cit.
574
ALMEIDA, op. cit.
575
AVÉ-LALLEMANT, op. cit., p. 34.
576
CARVALHO, Marques de. Hortência. -ed. especial- Belém: Cejup/Secult, 1997. p. 27.
186
vendedoras de açaí atravessaram toda a segunda metade do século XIX, com suas
cantigas de venda, oferecendo em sua gamela com vasilha ou panela um dos alimentos
cotidiano de Belém.
Além deles, havia ainda Jerôncio, nascido, criado e bem conhecido em Belém,
que fugiu em 20 de novembro de 1869, dizendo seu senhor que “há mais de um anno”
em fuga ele andava “apanhando assahy” para “vender na Ponte de Pedras e no Porto do
577
O viajante Avé-Lallemant nos diz o seguinte sobre o abastecimento do fruto que produzia um vinho
cor de ameixa: “A cidade recebe o abastecimento necessário dos rios vizinhos, Guamá e Mojú, cujas
margens são especialmente ricas dessas euterpes, dalgumas ilhas e mesmo mais longínqua Marajó, pois,
sem esse açaí a cidade do Pará não saberia como arranjar-se. Por felicidade, como já disse, há durante
todo o ano bagas maduras de açaí nas vizinhanças”. AVÉ-LALLEMANT, op. cit., p. 36.
578
Diário do Gram-Pará. Fevereiro de 1870.
187
Outra das atividades que eram comuns em Belém estava relacionada com os
açougues, tão presentes na capital onde o número de rezes era grande a ser abatido e
assim comercializado. Nesses ambientes era comum a figura dos vendedores e entre
eles muitas vezes era possível encontrar os escravos, forros e outros com suas histórias,
sendo uma dessas a do preto forro José Gregório que era talhador em um açougue no 1ª
Distrito da Capital, e que em 28 de julho de 1854 fazia seu serviço quando foi ferido a
579
faca por um Fiscal do 2ª Distrito de nome Manoel de Trindade e Souza. No entanto,
existe outra versão para o fato que foi documentado no Jornal Treze de Maio, segundo
579
SALLES, Vicente. O Negro no Pará: sob o regime da escravidão. 2ª Ed. Brasília: Ministério da
Cultura; Belém: Secretaria de Estado da Cultura; Fundação Cultural do Pará “Trancredo Neves”. 1988.
pp. 146.
188
esta consta que “Deu-se ontem um atentado contra a pessoa do Fiscal suplente do 1ª
Distrito, Manoel da Trindade de Souza, no desempenho de suas obrigações, praticado
pelo preto talhador do açougue que demora na rua da Paixão, de nome Gregório. Eis
como se passou o fato: Dirigiu-se aquêle fiscal ao dito açougue, e, em conseqüência de
haver pouca carne, intimou o talhador que não fizesse pesos de 16 a 20 libras como
estava fazendo, e que devia limitar a oito libras para cada pessoa (...). O talhador
cumpriu a ordem, mas despeitado passou a aviar únicamente as pessoas que ele
conhecia com preterição de muitas outras brancas (...) o que notando o fiscal disse que
não devia ter seleções, e que fizesse o peso de seis libras a um homem que ali estava de
há muito tempo. O talhador fez o peso (...) ia dar a uma preta, quando o fiscal indignado
por este procedimento lançou mão da carne, para dar à pessoa que êle havia designado e
por este ato o talhador o repeliu com a faca em punho, a qual tomando-lhe das mãos o
fiscal, deu com ela uma pancada, de que resultou ferimento na cabeça do mencionado
talhador, o qual levado a raiva e lançando-se sobre sôbre o fiscal, o enxovalhou,
pisando-o ou esmurrando-o”. 580
A história de Gregório mostra que o mais importante era o fato dele na condição
de talhador preferir aviar carne a sua “gente”, os negros e não aos brancos, ela também
mostra que os açougues tinham como vendedores os escravos, pessoas livres e ainda os
forros. Que a vida comercial da capital era diversificada com seus inúmeros sujeitos
criando e reconstruindo espaços que iam além do comércio em si. Mas, vendo os
escravos como trabalhadores lembremos mais uma vez que, além de pescadores e
apanhadores de açaí ou mesmo talhadores de carne que vendiam este e outras coisas de
comer como bolachas, havia escravas na cidade de Belém que exerciam importante
atividade nas ruas, justamente a venda de comidas e bebidas em tabuleiros ou em
tendas, comes e bebes que haviam preparado em suas casas, caso morassem por conta
própria ou nas casas de seus senhores. Sobre elas queremos falar um pouco mais.
580
SALLES, op. cit.,p. 146.
189
feitos na casa de sua senhora “com os xarões à cabeça”, na época em que a indústria
caseira de “fazer doces para fora” era uma atividade rentável.581
O caso de Tia Rufina talvez seja incomum, mas o seu ‘comércio’ que lhe rendeu
tanto era comum a muitas mulheres escravas, forras ou livres, isto é, a atividade de
preparar e vender comes e bebes nos mercados ou ruas de cidades como Belém ou
outras espalhadas pelo Brasil.583 No Rio de Janeiro a crioula Bertoleza, personagem de
O Cortiço de Aluísio de Azevedo, que vendia angu de manhã e peixe frito e iscas de
fígado à noite juntando o suficiente para sua alforria, não acabou seus dias enganada por
João Romão a quem ajudou com seu trabalho a prosperar e ficar rico? 584
Bates conta ainda que nas portas das igrejas de Belém em época de festas como
a do Círio várias escravas vendiam em seus tabuleiros licores, doces e cigarros.585 Mas
que comes e bebes então vendiam as escravas pelas ruas? Não temos certeza, mas se
imagina que além dos licores e doces de frutas regionais, elas vendiam comidas aos
trabalhadores e populares de passagem, ou que já eram seus fregueses habituais. Quais?
O vatapá, o caruru, a moqueca, o peixe frito e a farinha que nunca podia faltar. Em
581
Cf. GOMES, Luís Teixeira. “Paladino da arte e do sonho”. In: AZEVEDO, J. Eustáquio de. Antologia
Amazônica (Poetas paraenses). Belém: Conselho Estadual de Cultura, 1970, pp. 310-311.
582
Cf. BATES, op. cit., p. 291.
583
Cf. FARIA, op. cit., bem como DIAS, op. cit.
584
AZEVEDO, Aluísio. O Cortiço.São Paulo: Editora Ática. 1986.
585
Cf. BATES, op. cit., p. 45.
190
certas ocasiões, como em épocas de festas religiosas, podiam vender ainda a canjica ou
mungunzá. Elas podiam igualmente ser tacacazeiras ou vendedeira de tacacá como a
mulher negra de turbante à cabeça, retratada no livro Tipos Regionais do Brasil do
IBGE da década de 1960. Embora, atividades não exclusivas de mulheres negras
escravas ou forras, o sendo também de livres disputando com aquelas os fregueses pelas
ruas da cidade, tipo a cabocla de feições indígenas com flores de jasmim ao cabelo,
pintada por Antonieta Santos Feio na tela Vendedora de Tacacá de 1937. (Ver imagem
5). A tacacazeira aparece bem vestida com roupas brancas, jasmim nos cabelos e colares
vendendo seu tacacá ao que parece na rua numa espécie de mesa improvisada com uma
toalha branca Vê-se também a presença das cuias pintadas que serviam o tão famoso
tacacá, as quais completam o cenário da venda citadina característica da cidade de
Belém. A tacacazeira para Belém seria o mesmo que a baiana de tabuleiro vendedora
de acarajé e outras comidas para salvador.
A história do cearense Silveste é uma dentre outras tantas de pessoas que vinham
do Ceará para Belém. A partir de 1877 o número destes imigrantes aumenta
consideravelmente, pois a “seca dos dois sete” atemorizou a população que se via numa
penúria completa com a falta de abastecimento e carestia. Sobre essa realidade Aguiar
informa: “O embarque dos retirantes, por via marítima, intensifica-se em 1878”.
Vinham, portanto, buscar novos horizontes e muitos aqui na cidade de Belém viviam da
586
Cf. CANCELA, op. cit., p. 90.
587
Ibdem: nota 91.
588
CANCELA. op. cit., p. 91.
191
589
AGUIAR, Manoel Pinto de. Abastecimento: crises, motins e intervenção. Rio de Janeiro: Philobiblion,
1985. p. 57
590
Cf. SALLES, Vicente. Vocabulário crioulo. Contribuição do negro ao falar regional amazônico.
Belém: IAP, 2003.
591
Diário do Gram-Pará.9 de julho de 1854.
592
O Liberal do Pará. 28 de maio de 1871. p. 3.
593
Diário de Gram-Pará. 28 de outubro de 1882. n. 243. p. 03.
192
trouxera alguns meses antes o anuncio do Sr. Serafim Ferreira de Oliveira & Cia. da
Fábrica de sabão Consumo, que tinha a necessidade de um cozinheiro. 594
594
Diário de Notícias 1 de Julho de 1892. p. 1.
595
A Voz do Guajará. 30 de Dezembro de 1851.p. 4.
596
A Voz do Guajará. 10 de Janeiro de 1851. p. 4.
597
Diário do Gram-Pará. 4 de março de 1870.
598
No caso das amas-de-leite, Edilza Fontes já havia demonstrado o que foi dito aqui, com a preferência e
substituição das amas-de-leite negras livres e escravas pelas de origem portuguesa. Cf. FONTES, Edilza.
Prefere-se portuguesas: mercado de trabalho, racismo e relações de gênero em Belém do Pará. Cadernos
do CFCH, Belém, v. 12, n. 1/2, pp. 67-84, 1993.
599
Apud. BEZERRA NETO. “O asilo lyndo e protetor”: Práticas e representações sociais sobre a
educação feminina- Belém (1870-1888). In: A mulher existe? Uma contribuição ao estudo da mulher e
193
Enfim, à medida que avançava as últimas décadas do século XIX, esse processo
de refinamento dos costumes com toda a sua carga de preconceitos de classe e raciais
cada vez mais colocavam a necessidade de profissionais especializados para Belém e,
assim, os chefes de cozinha do Rio de Janeiro ou o confeiteiro madrileno vão tomando
lugar de espaços de venda e freguesia que antes eram das quituteiras e vendedoras
ambulantes. Não que isso leve ao fim destes setores sociais, mais a partir de agora há
outros profissionais atuando no ramo da alimentação em Belém.
Ao longo do texto demonstrei que apesar de Belém estar vivendo um fervor nas
sensibilidades e novas perspectivas de cidade civilizada, não escapa aos nossos olhos
que apesar das políticas públicas tentarem mudar determinados costumes e modos de
venda estipulando lugares fixos e/ou novos pontos, os diversos tipos de venda
ambulantes persistiam. Isto se torna claro, quando em 1883 encontramos os leiteiros
sendo obrigados a andar com suas respectivas vacas para a venda do leite. Por outro
lado, apesar da necessidade da civilidade, havia as resistências dos segmentos populares
em se amoldar aos novos figurinos urbanos ditados pelas elites, sendo possível passado
tanto tempo ainda vermos nas ruas da tão modificada Belém de hoje as “Nazarés” com
seu tão degustado mingau ou outro quitute, ou mesmo as “Efigênias” com seus
tabuleiros trazendo seus doces.
gênero na Amazônia/ organizado por Maria Luzia Miranda Álvares, Maria Ângela D’Incao. – Belém:
GEPEM, 1995. p. 54.
194
CONSIDERAÇÕES FINAIS.
Por fim, mas não menos importante nesta dissertação também se investigou
quais os lugares de comer existentes até então, que passam a existir ou deixam de ter
lugar na cidade, com as mudanças das práticas alimentares ou não daí decorrentes; bem
como, tratou de compreender que mudanças e permanências se entrelaçavam e faziam
parte da vida dos sujeitos envoltos com a produção, venda e consumo de comidas na
cidade de Belém, se observando como se dava as relações entre eles tensionadas ou
circulares, relações essas configuradas por marcadores sociais de gênero, origem e de
classe. Assim, não bastava falar somente do abastecimento. Foi necessário mostrar os
lugares de consumo e comércio dos produtos alimentícios como tabernas, armazéns,
restaurantes, pensões e outros que ao longo do século XIX buscavam seu lugar entre os
fregueses que podiam ser refinados ou mais populares. Assim sendo, na Belém ao lado
das transformações urbanas e demográficas havia mudanças de comportamento e
atitudes, inclusive em relação as práticas alimentares, havendo entre as elites e camadas
médias urbanas um refinamento dessas práticas à moda européia em detrimento das
formas tradicionais alimentares da população, com o surgimento de novos hábitos à
mesa, bem como de novos lugares de comer como hotéis e restaurantes com chefes
importados, enquanto a rua tomava cada vez mais o espaço da alimentação e lazer dos
mais pobres e trabalhadores, entre eles as vendedoras de comida, escravas ou livres.
Nesse campo destacam-se os diversos sujeitos sociais como tia Rufina, Dona Nazareth e
outras tantas que compunham as vendedoras ambulantes, vendendo mingau, açaí, bolos
e outras gostosuras. Ao lado de outros sujeitos que também viviam do trabalho com a
manipulação ou venda de alimentos, tal como Gregório que era talhador em um açougue
na capital.
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210
ANEXOS
211
TABELAS
Tabela I
Camará 52 23 75
Muaná 30 30
Fonte: Relatório Exm. Snr. General Visconde de Maracajú Gustavo Galvão. Em 24 de junho de 1884.
Pará. Typ. de Francisco Costa Junior. 1884. p.10.
Tabela II
Gurupá 41 41.
Faro 32 1 33.
Fonte: Relatório Exm. Snr. General Visconde de Maracajú Gustavo Galvão. Em 24 de junho de 1884.
Pará. Typ. de Francisco Costa Junior. 1884. p.10.
Tabela III
Macapá 94 1 95.
Turyassú 66 66.
Vizeu 32 34 66.
Bragança 1 1 2.
Fonte: Relatório Exm. Snr. General Visconde de Maracajú Gustavo Galvão. Em 24 de junho de 1884.
Pará. Typ. de Francisco Costa Junior. 1884. p.11.
213
Tabela IV
Fonte: Relatório dos Negócios da Província do Pará. Dr. Couto de Magalhães Presidente de Província.
Pará. Impresso na Typ. de Frederico Rhossard. 1864.
Tabela V
ANO HABITANTES
1801 12.500
1853 16.510
1856 17.510
1862 18.305
214
1868 30.000
1872 61.997
1884 70.000
1890 50.064
1896 90.119
1900 96.402
Fonte: CANCELA, Cristina Donza. op. cit., p. 81. & BATISTA, Luciana. Op. cit.
Tabela VI.
Tabela VII.
entre 1853-1870.
1857-1858 1867-1868
e se converte em sempre”.
Eduardo Galeano.
217
Imagem 1: Vendedor de Leite. GERODETTI, João Emílio- CORNEJO, Carlos. Lembranças do Brasil:
as capitais brasileiras nos cartões postais e álbuns de lembranças. São Paulo: Solaris Edições Culturais,
2004. p. 224.
Imagem 2: Barraca de venda de açaí, em Belém, 1879. Charles Scribners Sons. Fonte:
BASTOS, Vera Burlamaque, CRISPINO, Luís Carlos Bassalo & TOLEDO, Peter Man.
(Organizadores). As origens do Museu Paraense Emílio Goeldi: Aspectos históricos e
Iconográficos (1860-1921). Belém: Paka-Tatu, 2006. p. 99.
218
Imagem 3: Vendedora ambulante uma negra com seu tabuleiro na cabeça no Largo do
quartel em Belém no século XIX. (Leon Righini).
219
Imagem 4: Largo do Quartel num dos momentos cotidianos a direita a vendedora ambulante, ao
centro as lavadeiras com suas roupas e retirando água e a vida acontecendo em Belém. (Leon
Righini).
(GERODETTI, João Emílio- CORNEJO, Carlos. Lembranças do Brasil: as capitais brasileiras nos
cartões postais e álbuns de lembranças. São Paulo: Solaris Edições Culturais, 2004. P. 224.)
Apesar de o postal ser de 1910 a paisagem não é muito distinta do que era no
século XIX, uma profusão de embarcações que todos os dias atracavam na Doca do
Ver-o Peso, para o abastecimento da cidade de Belém e também para o comércio com o
exterior.
Pela imagem vê-se que as canoas eram parte do cenário da Doca do Ver-O-Peso,
entre as canoas e produtos é possível visualizar o fluxo intenso de pessoas que iam
desde o carregador até os comerciantes donos das mercadorias, desde aquela época o
Ver-O-Peso já destacava-se como o que Osvaldo Orico denomina de Feira ao ar livre.
1) Pirarucu Grelhado.
Lavam-se duas postas do pirarucu com limão e ferve-se para perder o excesso de
sal, corta-se em pedaços e leva-se ao braseiro sobre grelhas e quando estiver
bem grelhado (dourado). Após acrescenta em cima do peixe um molho de
vinagre, azeite e cebolas. O ideal deste prato e come-lo com farinha d’água,
chibé ou açaí.
3) Chibé ou xibé.
600
A exceção do Pirarucu ao Chico Fidêncio todas as receitas foram retiradas do livro de Osvaldo Orico
que além destas traz outras receitas. É válido observar que apesar do livro ser já do século XX, é possível
visualizar que tanto o peixe como a tartaruga também no século XIX, fossem consumidos de maneira
semelhante as receitas aqui elencadas. Cf. ORICO, Osvaldo. Cozinha Amazônica (Uma autobiografia do
paladar). Universidade Federal do Pará. 1972. pp. 106, 184 a 193.
∗
Essa receita foi adaptada do Livro de Inglês de Souza “O Missionário”, no qual a caseira D. Maria
Miquelina fazia o almoço para o professor então personagem denominado de Chico Fidêncio em Silves.
O livro passa-se por volta de fins do século XIX, 1888. O prato original descrito pelo autor leva apenas a
posta de Pirarucu, bananas-da-terra, manteiga, açúcar, cebolas, tomates e sal. Eu optei por acrescentar a
água e o sal ao peixe. SOUSA, H. Inglês. O Missionário. Ed. Topbooks. Rio de Janeiro. 1998. p. 46.
227
4) Bifes de Tartaruga.
Faça com o peito da tartaruga (carne branca) bifes, finos em seguida tempero-os
com sal, alho e limão. Após frita-se em óleo, banha ou azeite, ou tão somente na
própria gordura do animal.
5) Picadinho de Tartaruga.
Após a carne ter sido moída (carne branca) e tempere com sal, alho, cebola e
limão. Após faça o picadinho com tomate, cebola, salsa picadinha e banha. No
casco da tartaruga bem lavado e também temperado coloque o picadinho e cubra
com uma camada de farinha d’água torrada na manteiga. Leve ao forno. Depois
é só servir.
Separe vinte gemas de ovos de tartaruga junte a elas, uma xícara de farinha de
trigo, uma pitada de sal e meia colher (de chá) de fermento. Mexa muito bem
todos os ingredientes. Pingue óleo numa frigideira ou manteiga, em fofo baixo e
com uma colher grande ponha uma porção da massa. Após dourar vire até que
os dois lados estejam douradinhos é só servir.
Quebre em uma vasilha inclinada uns 50 a 100 ovos de tartaruga, pois desta
forma as gemas vão separar-se das claras que não presta. Em outra vasilha faça uma
calda à parte com açúcar, cravo e canela ponha as gemas na calda e fora do fogo vá
mexendo, em seguida volte ao fogo e mexa mais um pouco e o doce pode ser
degustado.
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