Manipulação de Alimentos Cozinha Hospitalar
Manipulação de Alimentos Cozinha Hospitalar
Manipulação de Alimentos Cozinha Hospitalar
Resumo: Os alimentos contaminados são uma importante via de infecção hospitalar, cujas principais
causas de contaminação são condições higiênico-sanitárias inadequadas. Diante desse contexto o objetivo
deste estudo foi avaliar a adequação às Boas Práticas na manipulação de alimentos das refeições servidas
em um hospital de Porto Alegre e identificar as causas da não adequação. A adequação às Boas Práticas foi
avaliada utilizando como instrumento a Lista de Verificação em Boas Práticas para Serviços de Alimentação
da Portaria nº. 78/2009-RS. Para identificar as possíveis causas relacionadas às não conformidades
foi utilizado o Diagrama de Causa e Efeito construído por meio de uma dinâmica de grupo, chamada
Brainstorming. Dentre os principais resultados destacam-se que 68% das atividades dos manipuladores
de alimentos durante o processo estavam adequadas às Boas Práticas e o hospital apresentou 87% de
conformidades à legislação vigente. Em relação às causas de não atendimento às conformidades, 41,89%
referem-se a mão de obra, encontrando-se nesta categoria as causas mais mencionadas. Conclui-se que, de
acordo com os relatos dos manipuladores, a não adequação está relacionada à deficiência de funcionários.
Abstract: Contaminated food is a major route of nosocomial infection, the main causes of contamination
are inadequate sanitary conditions. In this context, the objective of the study was to assess the adequacy
Practice in handling food meals served in a hospital in Porto Alegre and identify the causes of unsuitability.
The adaptation to Practice was evaluated as a tool to Checklist for Good Practice for Food Services
“Portaria 78/2009- RS”. To identify the possible causes related to noncompliance was used Cause and
Effect Diagram constructed through a dynamic group called Brainstorming. Among the main findings
highlight that 68 % of the activities of food handlers during the process were adequate to good practice
and the hospital had an 87% compliance with current legislation. Regarding the causes of noncompliance
compliances 41.89 % refer shall labor, and in this category are the causes mentioned. We conclude that,
according to the reports of the handlers inadequacy is related to impaired employees.
Keywords: Food hygiene. Food and nutrition unit hospital. Handlers. Practice in Food Production.
1 Doutora em Medicina - Hepatologia pela Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre,
Brasil (2014). Professora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre.
2 Graduada em Nutrição pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Brasil(2009).
3 Doutora em Gerontologia Biomédica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul,
Brasil (2005). Professora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre.
INTRODUÇÃO
As Unidades de Alimentação e Nutrição (UAN) hospitalares podem ser definidas
como estabelecimentos localizados em hospitais que desempenham atividades técnico-
administrativas necessárias à manipulação, à preparação, ao armazenamento e à
distribuição de alimentos e de refeições (BRASIL, 2002; WENDISCH, 2010). Um
dos fatores primordiais para a garantia da qualidade é a inocuidade do alimento, sendo
essencial o controle das condições higiênico-sanitárias nos locais onde os alimentos são
manipulados para o consumo humano (FARIAS; PEREIRA; FIGUEIREDO, 2011).
Um alimento ausente de qualquer agente patogênico ou de suas toxinas caracteriza-
se por uma atribuição primária de segurança na manipulação de alimentos. Dessa
maneira, alimentos com qualidade microbiológica aceitável garantem produto seguro
e sem risco ao consumidor (FRANTZ et al., 2008; RIO GRANDE DO SUL, 2009).
A fim de diminuir os riscos de contaminação em alimentos a RDC 216/2004
regulamenta técnicas de boas práticas no serviço de alimentação, dispondo de vários
critérios para sua padronização (BRASIL, 2004).
Segundo a Organização Mundial da Saúde, o manipulador – qualquer pessoa do
serviço de alimentação que entra em contato direto ou indireto com o alimento (OMS,
1989; MELLO et al., 2010; BRASIL, 2004) –, é a principal via de contaminação dos
alimentos produzidos em larga escala. Ele desempenha papel importante na segurança
dos alimentos, na preservação da higiene dos alimentos durante toda a cadeia produtiva,
desde o recebimento, armazenamento, preparação até a distribuição. Uma manipulação
incorreta e o descuido em relação às normas higiênicas favorecem a contaminação por
microrganismos patogênicos (MELLO et al., 2010; OMS, 2002).
A qualidade higiênico-sanitária dos alimentos pode ser alcançada por meio de
programas de capacitação de manipuladores com treinamentos específicos, sendo
este um dos pré-requisitos para que não ocorra contaminação dos alimentos, já que,
frequentemente, ela está associada à falta de conhecimento ou à negligência (SACCOL
et al., 2006; LANGE et al., 2008).
Segundo Gonzalez et al. (2009), para que se tenha êxito nos programas de
capacitação, o entendimento sobre a percepção do risco é imprescindível. Os
manipuladores têm conhecimento dos procedimentos que devem realizar, contudo
identificam obstáculos que os impedem de colocá-los em prática, tais como falta de
tempo, de pessoal e de recursos.
Para garantir o controle de qualidade é necessário que as decisões sejam tomadas
baseadas em avaliações das operações e processos, que garantam um produto com o
padrão determinado ou mesmo um serviço com o nível esperado. Para contribuir na
tomada de decisões, existem ferramentas de qualidade que servem como apoio à decisão
na análise de determinado problema (JUNIOR, 2010; MORAIS; COSTA, 2013).
MATERIAL E MÉTODOS
A coleta de dados foi realizada em um hospital privado de alta complexidade da
cidade de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, cujos pacientes atendidos são particulares
e com planos de saúde. O hospital possui 370 leitos, serve em média 400 refeições entre
almoço e janta e conta com 75 funcionários no Serviço de Nutrição e Gastronomia
(SNG), dos quais 25 são manipuladores de alimentos. Os demais são atendentes
de nutrição e trabalham dentro das copas nas Unidades de Internação. Na presente
pesquisa participaram os 25 funcionários que manipulam os alimentos na UAN,
perfazendo um total de 100% dos manipuladores de alimentos da UAN hospitalar.
Trata-se de um estudo descritivo transversal híbrido, qualitativo e quantitativo, e
que ocorreu em duas fases. Na primeira foram investigadas se há adequações às Boas
Práticas utilizando-se como instrumento a Lista de Verificação em Boas Práticas para
Serviços de Alimentação da Portaria nº. 78/2009 da Secretaria da Saúde do Estado -
RS (BARROS, 2009; RIO GRANDE DO SUL, 2009).
A partir da aplicação da Lista de Verificação em Boas Práticas para Serviços de
Alimentação, foi possível analisar e identificar o grau de adequação às recomendações
RESULTADOS
Após a aplicação da lista de verificação, o resultado da análise demonstrou que,
dos 63 itens analisados que correspondem às ações dos manipuladores de alimentos no
SNG, em 68% deles as atividades dos manipuladores de alimentos durante o processo
estavam adequados às Boas Práticas.
O índice de adequação do hospital às Boas práticas foi de 87% de conformidades,
sendo classificado no Grupo 1 (76 a 100%), segundo a RDC nº 275/2002, apresentando
um atendimento eficiente às Boas Práticas e à legislação vigente.
Analisando individualmente os 12 blocos que compõem a lista de verificação,
os percentuais de pontos obtidos pelo hospital, em cada critério avaliado, estão
representados na Figura 1. Obtiveram 100% de adequação ao preconizado pela
legislação o bloco 3 (controle integrado de pragas), o bloco 4 (abastecimento de água),
o bloco 7 (matérias-primas, ingredientes e embalagens), o bloco 9 (armazenamento e
transporte do alimento preparado), o bloco 11 (documentação e registro) e o bloco 12
(responsabilidade).
O bloco 1, referente à edificação, instalação, equipamentos, móveis e utensílios, teve
seus aspectos classificados com 91% de adequações. No bloco 2, sobre a higienização
de instalações, equipamentos, móveis e utensílios, foram totalizados 80% de adequação.
As inadequações encontradas se referiam à falta de local apropriado para guardar
produtos saneantes, os quais estavam guardados na despensa junto com os alimentos.
Os funcionários responsáveis pela higienização não utilizam uniforme diferenciado dos
manipuladores de alimentos e as esponjas de limpeza que entram em contato com os
alimentos não eram desinfetadas diariamente.
Os itens do bloco 5, referente ao manejo de resíduos, apresentaram 67% de adequação.
As inadequações estão relacionadas principalmente à dificuldade de transporte dos
DISCUSSÃO
Em Unidades de Alimentação e Nutrição que atendem a coletividade, tanto sadias
como enfermas, em que o objetivo é oferecer refeições equilibradas em quantidade e
padrões tanto nutricional quanto higiênico-sanitário adequados, a busca pela qualidade
é um desafio. O índice de conformidade encontrado neste estudo referente ao SNG do
hospital ficou adequado, segundo a RDC 275/2002, não condizendo com a realidade
de grande parte das UANs (MEDEIROS et al., 2012; SOUSA et al., 2009; SACCOL
et al., 2009; SOUZA; MEDEIROS; SACCOL, 2013). Em um estudo realizado por
Saccol et al. (2009), que verificou o nível de adequação às Boas Práticas em serviços de
alimentação, foi constatado que somente 17% dos estabelecimentos classificaram-se no
grupo 2, considerado regular. O restante dos serviços ficaram no grupo 3 (83%), com a
classificação de deficiente, e nenhum estabelecimento ficou classificado no grupo 1, que
classifica como adequado, como é o caso do hospital que foi avaliado nesta pesquisa.
Outro aspecto relevante para garantir a qualidade da alimentação relaciona-
se à edificação, instalação, equipamentos, móveis e utensílios. Avanços nessa área
permitem a utilização de técnicas de produção de refeições que valorizam o produto
final (ANTUNES; FEOLI, 2009). Condições insatisfatórias de edificação podem
comprometer o desempenho em itens como manipulação e fluxo de produção
(FONSECA et al., 2010).
Na presente pesquisa foi encontrado um resultado diferente do de Fonseca et al.
(2010), no qual avaliaram as condições de edificação, instalações, equipamentos, móveis
e utensílios de restaurantes comerciais de um município da Zona da Mata Mineira
para implementação de boas práticas. Constataram que a maioria dos restaurantes
não atendiam à legislação quanto aos requisitos avaliados, o que pode comprometer a
segurança das refeições servidas.
Segundo a RDC n° 216/2004, os produtos saneantes devem ser identificados
e guardados em local reservado para essa finalidade. Além disso, os funcionários
responsáveis pela atividade de higienização das instalações sanitárias devem utilizar
uniformes apropriados e diferenciados daqueles utilizados na manipulação de alimentos
(BRASIL, 2004).
Mello et al. (2013), ao analisar sete UANs de Porto Alegre – RS, encontraram que
nenhuma apresentou mais de 10% de adequação aos quesitos que compõem o grupo
de higienização de instalações, equipamentos, móveis e utensílios, destacando-se uma
grande dificuldade por parte das UANs em adaptar o uso de esponjas, panos de limpeza
descartáveis e não descartáveis, bem como de realizar o armazenamento correto de
produtos saneantes às boas práticas. Salienta-se que nesta pesquisa foram encontrados
80% de adequações, sendo que algumas das inadequações encontradas falta de local
apropriado para guardar os produtos saneantes e as esponjas que não eram desinfetadas
diariamente, condizendo com as encontradas por Mello et al. (2013).
CONCLUSÃO
Pelos resultados obtidos, pode-se verificar que o SNG do hospital pesquisado
encontra-se adequado do ponto de vista higiênico-sanitário, apresentando 87% de
conformidades, segundo a legislação vigente.
Constatou-se que os manipuladores de alimentos apresentaram 68% de
conformidades dos requisitos exigidos pela legislação, sendo o adequado, segundo a
RDC/275, que apresentassem entre 76% a 100% de conformidades.
Observou-se também que 41,89% das causas que levam os manipuladores a não
atenderem às Boas Práticas diz respeito à mão de obra, mais precisamente a problemas
relacionados à falta de funcionários.
É imprescindível a adoção de medidas de avaliação das operações e processos,
com a finalidade de direcionar os treinamentos conforme a necessidade do serviço, e
que estes proporcionem a adequada percepção do risco à saúde, e sejam administrados
regularmente. Também devem ser utilizadas ferramentas da qualidade como apoio à
tomada de decisão. Essas ações são de extrema importância para que as Boas Práticas
sejam executadas de forma eficaz, e assim seja assegurada a manutenção da qualidade
dos serviços de alimentação que buscam oferecer refeições seguras do ponto de vista
higiênico-sanitário.
Apesar deste resultado de satisfação, cabe analisar os 32% e 13% de inadequação
referentes às ações dos manipuladores e atendimento do hospital às Boas Práticas,
respectivamente, pois se apresentam como oportunidades de melhorias e merecem
desdobramentos e análise.
AGRADECIMENTOS
Ao hospital e aos manipuladores de alimentos do SNG que participaram desta
pesquisa.
REFERÊNCIAS
ANTUNES, M. T.; FEOLI, A. M. Assistência nutricional hospitalar na síndrome
metabólica: da elaboração do plano alimentar à produção de refeições. São Paulo: Ed.
Atheneu, 2009. 243p.
FONSECA, M.P. et al. Avaliação das condições físico funcionais de restaurantes comerciais
para implementação das boas práticas. Alim. Nutr., Araraquara, v. 21, n. 2, p. 251-257, 2010.
RIO GRANDE DO SUL. Secretaria da Saúde. Portaria nº. 78, de 28 de janeiro de 2009.
Aprova a Lista de Verificação em Boas Práticas para Serviços de Alimentação, aprova Normas
para Cursos de Capacitação em Boas Práticas para Serviços de Alimentação e dá outras
providências. Porto Alegre, RS, 2009.
SACCOL, A.L.F. et al. Avaliação das boas práticas em duas visões: técnica e da empresa.
Braz. J. Food Technol., II SSA, 2009.
SOUZA, M.S.; MEDEIROS, L.B.; SACCOL, A.L.F. Implantação das boas práticas em
UAN. Alim. Nutr. = Braz. J. Food Nutr., Araraquara, v.24, n.2, abr./jun. 2013.