LN 103 Completo PDF
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NACIONALISMO E
TENSÕES POLÍTICAS
SOBRE A REVISTA
NACIONALISMO E
TENSÕES POLÍTICAS
LUA NOVA – REVISTA DE CULTURA E POLÍTICA
2018
Razão Social: Centro de Estudos de Cultura Contemporânea – CEDEC
Rua Riachuelo 217 – Sé – Cep: 01007-000 São Paulo, SP
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Editor
Bruno Konder Comparato (Unifesp)
Comitê de redação
Bruno Konder Comparato (Unifesp)
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Sergio Costa (Freie Universität Berlin), Tullo Vigevani (UNESP),
Victor Manuel Durand Ponte (UNAM, México), William C. Smith (University of Miami)
ARTIGOS
11 CONDIÇÕES ESTRUTURAIS DO NACIONALISMO JAPONÊS
RECENTE
Ernani Oda
39 LA VIDA DE DOMINGUITO: CIUDADANÍA, PATERNIDAD Y
GUERRA EN DOMINGO FAUSTINO SARMIENTO
Alejandra Josiowicz
69 RAYMUNDO FAORO E AS LINHAGENS DO PENSAMENTO
POLÍTICO BRASILEIRO
Leonardo Octavio Belinelli de Brito
103 A LINHAGEM CULTURALISTA DA SOCIOLOGIA DO
FUTEBOL BRASILEIRO
Juliano de Souza
135 O CONCEITO DE ESFERA PÚBLICA JURÍDICA E A
AUDIÊNCIA PÚBLICA SOBRE COTAS RACIAIS NO
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Ricardo Juozepavicius Gonçalves
167 CONSUMINDO COMO UMA GAROTA: SUBJETIVAÇÃO E
EMPODERAMENTO NA PUBLICIDADE VOLTADA PARA
MULHERES
Cynthia Hamlin e Gabriel Peters
203 A CONCEPÇÃO HOLÍSTICA E PROCESSUAL DE TEMPO DE
NORBERT ELIAS
Eugênio Rezende de Carvalho
233 O MARCO INSTITUCIONAL DA POLÍTICA URBANA NA
ESPANHA E APONTAMENTOS COMPARATIVOS COM O BRASIL
Jefferson Oliveira Goulart
261 IMPACTOS DA JUSTIÇA TRANSICIONAL SUL-AMERICANA
NO SISTEMA INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS
Isabela Gerbelli Garbin Ramanzini
APRESENTAÇÃO
10
1
A pesquisa para a elaboração deste artigo foi realizada com apoio da Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
12 Nacionalismo e revisionismo
Podemos tomar como primeiro exemplo os discursos
recentes de políticos e intelectuais que defendem o aumento
da capacidade militar japonesa e uma maior participação do
Japão na mediação de conflitos internacionais. Embora a
constituição japonesa de 1946 tenha restringido a capaci
dade militar do país a fins defensivos, fazendo com que o
Japão evitasse por muito tempo se envolver diretamente em
confrontos fora de seu território, muitos têm argumentado
que tais restrições serviram apenas para minar a soberania
japonesa e enfraquecer a posição do país no cenário mun
dial. Isso teria ficado evidente na Guerra do Golfo (1990-
1991), quando o Japão se recusou a enviar tropas para o
conflito e foi severamente criticado pelos países ocidentais.
Têm surgido, com isso, propostas no próprio governo de
rever os princípios da constituição e assumir uma postura
militar mais ativa para restaurar o prestígio do Japão na
comunidade internacional (Maslow, 2015; Soeya, 2011).
Conclusão
Argumentei neste trabalho que podemos entender
melhor o discurso revisionista do nacionalismo japonês
recente se, antes de falarmos em estados psicológicos de
“ansiedade” e “confiança”, atentarmos primeiro para as con
dições estruturais que permitiram que esse discurso surgisse
de maneira intermitente na década de 1980 e ganhasse força
na década de 1990. Dentre tais condições, destaquei duas: a
transformação da estrutura político-partidária japonesa e as
mudanças nas relações do Japão com a China e a Coreia do
Sul.
34
Nos anos 1980, a estrutura descentralizada do PLD
deu mais espaço para que facções nacionalistas dentro do
partido expressassem sua visão revisionista. Além disso, os
vínculos entre China, Coreia do Sul e Japão, que vinham
se fortalecendo desde as décadas anteriores, passaram por
um período de revisão, com a troca de regime na Coreia do
Sul e mudanças na política de segurança chinesa. Isso abriu
mais espaço para que os três países voltassem a discutir a
responsabilidade do Japão por atrocidades cometidas contra
seus vizinhos asiáticos até a Segunda Guerra Mundial.
Ao mesmo tempo, porém, havia ainda condições que
incentivavam os três países a conter os conflitos, como a
necessidade de cooperação econômica e a proximidade
entre suas elites políticas. Além disso, a mesma descentra
lização do PLD que beneficiava as facções nacionalistas
as submetia à pressão de facções mais moderadas. Com
isso, embora houvesse mais manifestações do discurso
Ernani Oda
É pesquisador de pós-doutorado no Programa de Pós-
-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal de
São Paulo (Unifesp). Guarulhos, SP, Brasil.
Bibliografia
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social and cultural life from the recessionary 1990s to the present. Durham,
Duke University Press, pp. 16-53.
38
1
De cualquier modo, los autores aclaran que Sarmiento le confiere a su recons
trucción genealógica un sentido polivalente. Para una lectura más reciente, ver
Sarlo (2012).
2
Porfirio Fariña Nuñez (1934) discute extensamente la “dudosa” filiación de
Dominguito, y opta por atribuir la paternidad biológica a Sarmiento. Enrique
Anderson Imbert (1975) expone una hipótesis similar.
3
Los manuscritos fueron editados con el título de La Vida de Dominguito en 2000
por el Fondo Nacional de las Artes a cargo de Javier Fernández. A partir de aquí,
cito la versión de 1867 como La vida de Dominguito y la de 1886 como La vida de
Dominguito. In memoriam. Por razones prácticas, para el análisis, citaré sobre todo de
la versión reeditada por A. Belin Sarmiento en 1900 como “Vida de Dominguito”.
4
Nicolás Rosa ha comparado al texto con un monumento necrológico: “La escri
tura de la bio-grafía (sic) de Dominguito es escritura de un necro-logos: otra forma
de la inscripción lapidaria” (Rosa, 1990, p. 104).
5
Halperín Donghi ha descripto el pesimismo de la última etapa de Sarmiento y
su posición incómoda ante el ascenso de Julio A. Roca y su tradición federalista al
poder (1980).
6
Sylvia Molloy ha observado al respecto: “He wished to put Franklin’s
Autobiography on school curricula, so that every student, on reading it, would
wish to be a little Franklin” (1992, p. 214). [“Deseaba incluir la autobiografía
de Franklin en los programas escolares, de modo que todo estudiante, al leerla,
deseara ser un Franklincito.”] (trad. del autor)
7
Esta ha sido la característica del texto más señalada por la crítica: Nicolás Rosa
afirma que allí la propia vida se extiende en la del hijo; Sylvia Molloy advierte que
Sarmiento hace del hijo una copia de sí mismo, y de su biografía una especie de
autobiografía (1992, p. 144); Enrique Anderson Imbert la incluye en el corpus
de su obra autobiográfica y argumenta que el texto retrata a Sarmiento más que
a Dominguito (1967, p. 170). Otro de los contados estudios es el texto inédito,
mayormente fáctico y biográfico, de Brizuela Aybar (1988).
8
Esto ha sido analizado por Adolfo Prieto en la escena del ingreso escolar en
Recuerdos de Provincia (1996, p. 60).
58
9
David Viñas ha señalado la importancia del militarismo en la trayectoria y en la
obra de Sarmiento y sus conexiones con el ala conservadora de la Generación de
1880 (1994).
11
Para un análisis de la representación de la adopción en la literatura del
Iluminismo y el Siglo XIX norteamericano, y en particular en Benjamin Franklin,
ver Singley (2011, p. 49).
Conclusión
Ya en Recuerdos de Provincia (1849-1850), uno de los
primeros textos autobiográficos latinoamericanos en otor
gar un lugar significativo a la infancia (Miceli y Myers,
2016), el niño ponía en escena el conflicto entre la nostal
gia por el modo de vida colonial, representado por la casa 65
materna, y el nuevo modelo de ciudadanía democrática
al que Sarmiento accedía en la escuela recién fundada
(Prieto, 1996, p. 60). Esto sólo se intensifica en Vida de
Dominguito, en que la infancia ocupa un lugar aún más
central. Ya desde la escena de la adopción, el texto apunta
a un ideal democrático que concibe el lazo paterno-fi
lial no como dado por la biología y la pertenencia a una
estirpe de sangre, sino como resultado de la mutua elec
ción y el libre arbitrio. Sarmiento le da a Dominguito su
apellido y, al iniciarse en la escritura a los tres años, el
hijo estampa su firma, “Sarmiento”, señalando el carácter
de mutuo acuerdo, voluntario y contractual de la filia
ción. La escena de iniciación en la lectoescritura, pro
tagonizada por padre e hijo, representa el acceso a la
ciudadanía como instancia democrática fundamental de
formación a la vez intelectual y afectiva, a partir de las
capacidades individuales. Dominguito es un niño ávido
Alejandra Josiowicz
é investigadora assistente do Consejo Nacional de
Investigaciones Científicas y Técnicas (CONICET). Tem expe
riência nas áreas de Sociologia da Cultura e da Educação e de
Estudos Culturais na América Latina. Licenciada em Letras
pela Universidade de Buenos Aires (UBA), é mestre e doutora
em Spanish and Portuguese pela Princeton University (PU).
Realizou estágio de pós-doutoramento no Programa de Pós-
Graduação em História das Ciências e da Saúde (PPGHCS)
da Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz). Foi professora
assistente no Programa de Estudos Latino-americanos da
Rutgers University (RU). Publicou artigos em revistas nacio
nais e internacionais e recebeu bolsas da Princeton University,
da Cornell University (CU) e da CAPES/FAPERJ.
Bibliografía
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Provincia. Boletín del Instituto de Historia Argentina y Americana “Dr. Emilio
Ravignani”, Buenos Aires, v. 3. n. 1, pp. 7-22.
Introdução
Raymundo Faoro é tido como um dos grandes “intér
pretes do Brasil”, epíteto que se deve à interpretação his
tórica traçada em Os donos do poder, ensaio que publicou,
em sua primeira versão, em 1958. Contemporâneo de
Formação econômica do Brasil, de Celso Furtado, e Formação
da literatura brasileira, de Antonio Candido – ambos publica
dos em 1959 – o principal ensaio de Faoro era já na altura
de sua publicação, de alguma forma, extemporâneo, pois
sua forma e sua ambição explicativa, que iam na contra
mão da especialização acadêmica dos livros de Furtado e
Candido, colocavam-no mais próximo dos ensaios clássicos
dos anos 1930.
1
Este artigo é fruto da dissertação de mestrado do autor, defendida na
Universidade de São Paulo (USP) em 2015, sob orientação do professor Bernardo
Ricupero. Uma primeira versão do artigo foi apresentada no 10º Encontro da
Associação Brasileira de Ciência Política, ocorrido em 2016 em Belo Horizonte,
Minas Gerais. Nessa ocasião, o texto foi comentado pelos professores Juarez
Guimarães (UFMG) e Jorge Chaloub (IBMEC-Rio), a quem o autor agradece.
2
Foi Sérgio Buarque de Holanda quem primeiro utilizou o arcabouço metodoló
gico de Weber para “explicar o Brasil”, mas, diferentemente de Faoro, não utilizou
sua sociologia da dominação. Para suas diferenças, ver Campante (2003).
Tomo por empréstimo o termo usado por José Murilo de Carvalho (2005) em
3
4
A informação se encontra disponível em: <https://goo.gl/L1Zfjj>. Acesso em:
22 mar. 2018.
5
Faoro sublinha o caráter não democrático da Declaração de Independência dos
Estados Unidos e da Declaração dos Direitos do Homem em Assembleia constituinte:
a legitimidade recuperada (Faoro, 2007).
6
Como recorda Luiz Bernardo Pericás (2010, p. 39), o liberal italiano Piero
Gobetti também compreendia que haveria uma sequência lógica entre liberalismo
e socialismo, de maneira que seria interessante, para estudo futuro, comparar essa
postura com a de Faoro.
7
O termo é de Roberto Schwarz (1997), que o aplicou em contexto diverso.
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CONFIRA a íntegra do discurso de posse do novo ministro da Fazenda,
Joaquim Levy. 2016. Ministério da Fazenda, Brasília, DF, 23 jun. 2016.
Disponível em: <https://goo.gl/iobo71>. Acesso em: 22 mar. 2018.
Introdução
Este texto recupera, expõe e atualiza parte das discussões
de minha tese de doutoramento (Souza, 2014). A hipótese
que aqui procuro desenvolver é que a leitura culturalista
do futebol brasileiro, pensada, sistematizada e rotinizada
no campo intelectual e nas demais esferas de produção cul
tural no país ao longo do século XX, tem pais e herdeiros,
constituindo, portanto, uma “família intelectual”. Inspirado
assim no quadro teórico de Brandão (2005), construído na
esteira do programa para a sociologia do conhecimento de
Mannheim (1967, 1976), procuro restituir o “cordão invisí
vel” através do qual autores e produtores culturais – de gera
ções distintas e tempos históricos diferentes – se apropriaram
de uma série de ideias-força que, embora mobilizadas sob
múltiplas roupagens teóricas em seus empreendimentos ana
líticos em relação ao futebol, e até mesmo com outras cono
tações, reportam a um núcleo argumentativo comum, a saber,
que o futebol no Brasil é uma instituição social sui generis,
supostamente apropriada de forma singular no país, propor
cionando uma dinâmica de sociabilidade que se crê ímpar.
1
Propaganda da Mastercard na edição n. 1578a de 2002 da revista Veja, p. 37.
2
Propaganda da Coca-Cola na edição n. 1289 de 2002 da revista Veja, p. 60. Grifo meu.
Considerações finais
A contribuição da linhagem culturalista da sociologia
do futebol no projeto de construção histórica da identidade
nacional é insofismável. Ao concorrer para que o futebol se
conformasse aos ideais de nação vislumbrados pelos princi
pais intérpretes do país, essas pesquisas, de forma natura
lizada, constituíram um movimento consensual de preser
vação e atualização de um “mundo social invertido”, com
efeitos decisivos no obscurecimento dos “fios” que estrutu
ram as dinâmicas sociais em uma sociedade periférica como
a brasileira; uma sociedade que, assim como qualquer outra,
fez uso social de passatempos, jogos e, no advento da moder
nidade, dos esportes.
Assim sendo, se esse mundo “suspenso”, “liminar”
e “extraordinário” que o futebol institui se levanta de
tempo em tempo, ou de semana em semana no Brasil,
não é de estranhar que seja habitado por “mocinhos” e
“bandidos”, por “heróis” e “malandros”, e que, além disso, 131
por via de seus porta-vozes da academia ou da mídia, ape
teça-lhe ser reconhecido por sua “ginga”, sua “arte” e seu
estilo “genuinamente” nacional. Em certa medida, e guar
dadas as particularidades ou mesmo exceções à regra, os
estudos culturalistas aqui mencionados, ao materializa
rem uma série de análises através de um uso crítico ou
acrítico de categorias como “futebol dionisíaco”, “fute
bol-arte”, “futebol gingado”, “futebol moleque”, “pátria
de chuteiras”, “país do futebol”, “estilo nacional”, “paixão
nacional”, “jeitinho brasileiro” etc., não apenas concorre
ram para restituir cientificamente as dinâmicas estrutu
rantes do contexto de ação futebolístico, como pensaram
seus proponentes, mas também contribuíram para a pre
servação das tradições e raízes identitárias dessa prática
esportiva no Brasil (Souza, 2014).
Por fim, ressalto que não foi possível explorar todas
as particularidades analíticas abertas por essa linhagem,
Juliano de Souza
é professor associado do Programa de Pós-Graduação em
132 Educação Física da Universidade Estadual de Maringá e da
Universidade Estadual de Londrina (PPGEF-UEM/UEL).
Bibliografia
BARRETO, Túlio Velho. 2004. Freyre e o futebol-arte. Revista da USP,
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Gilberto Freyre e o ideal da integração racial. Revista da Educação Física
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CARDOSO, Fernando Henrique. 1962. Capitalismo e escravidão no Brasil
meridional: o negro na sociedade escravocrata do Rio Grande do Sul. São
Paulo: Difel.
Introdução
A partir do advento da Constituição Federal de 1988, ini
ciou-se no Brasil um período de aprofundamento democrático
mediante o aumento de participação social em diversas insti
tuições. O Judiciário, apesar de ser considerado um espaço
reservado aos especialistas e técnicos em direito, também foi
alvo desse movimento2. Novas modalidades de participação
social foram praticadas neste período para enfrentar as limita
ções das formas jurídicas diante de questões sociais complexas
e do tradicional déficit democrático dessa instituição.
1
Este artigo é resultado parcial dos temas trabalhados na dissertação de mestrado
intitulada O conceito de esfera pública jurídica entre Jürgen Habermas e Axel Honneth
(Gonçalves, 2017).
2
Conforme José Rodrigo Rodriguez: “com o processo de redemocratização do país,
seguiu-se um intenso processo de reivindicação de direitos pela sociedade perante
o Poder Judiciário com o fim de tornar efetivas as normas constitucionais. A assim
denominada ‘constituição cidadã’, que nasceu de um intenso processo de debate
na sociedade civil com ampla participação popular em sua confecção, tornou-se
referência necessária para a luta dos diversos movimentos sociais” (2013a, p. 104).
3
Reconhecimento e redistribuição constituem tema polêmico no âmbito da teoria
crítica, principalmente com o debate entre Nancy Fraser e Axel Honneth (2003).
Por meio deste debate também é possível traçar outras possibilidades de estudos
sobre os diferentes tipos de pleitos sociais e de argumentações e suas recepções no
âmbito de uma audiência pública jurisdicional.
4
Além de permear a obra de Boaventura de Sousa Santos (2003, 2011), diag
nóstico semelhante também pode ser encontrado em Leonardo Avritzer e Sérgio
Costa (2004, pp. 708-710), neste último (Costa, 1994, pp. 42-48), em José Rodrigo
Rodriguez (2006, pp. 156-174) e em Rúrion Melo (2015).
5
Neste modelo, o autor considera que a esfera pública pode apenas “sitiar” o
sistema, objetivando conter seus avanços, possuindo uma função predominante
mente passiva.
6
Na ADI nº 3510, que impugnava dispositivos da Lei de Biossegurança (Lei
nº 11.105/2005).
7
A lista completa dos temas tratados nas audiências públicas realizadas até o momento
no STF está disponível em <https://goo.gl/Pg4LDQ>. Acesso em: 28 mar. 2018.
10
A audiência pública está disponível na íntegra em vídeo (em: <https://goo.gl/
HQAKfT>. Acesso em: 28 mar. 2018) e transcrita em nota taquigráfica (em: <https://
goo.gl/txSwhD>. Acesso em: 28 mar. 2018), assim como o acórdão final, também
utilizado para a pesquisa (em: <https://goo.gl/rQZDL7>. Acesso em: 28 mar. 2018).
11
Programação completa e lista dos participantes disponíveis em: <https://goo.
gl/PyZMgG>. Acesso em: 28 mar. 2018.
12
Principalmente nas falas dos representantes do Centro de Estudos Africanos
da USP, Afrobras, Educafro, Fundação Cultural Palmares, Ação Educativa,
Coordenação Nacional de Entidades Negras (Conen), Movimento Negro
Socialista, Instituto da Mulher Negra de São Paulo: Geledés, Movimento-Pardo
Mestiço Brasileiro e da Associação dos Caboclos e Ribeirinhos da Amazônia, e do
Movimento contra o desvirtuamento do espírito da reserva das cotas sociais.
Conclusão
Buscamos demonstrar neste artigo que a construção
teórica sobre as características do espaço das audiências
públicas do STF ligado ao referencial teórico habermasiano
da esfera pública jurídica indicam o funcionamento deste
novo mecanismo institucional, permitindo a troca de ener
gias sociais tradicionalmente ausentes em uma arena jurí
dica como o STF.
Segundo Marcos Nobre, para Habermas, o procedi
mento é o formato do processo em questão – que seria
“capaz de permitir o surgimento do maior número possí
vel de vozes, de alternativas de ação e de formas de vida,
garantindo seu direito de expressão e de participação”
(2008, p. 18), e que não teria conteúdo definido e nem
poderia ser guiado por concepções já determinadas; sua
forma é apenas regulamentada.
Bibliografia
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n. 4, pp. 703-728.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. 2010. Arguição de descumprimento de
preceito fundamental 186: recurso extraordinário 597.285. Brasília, DF: STF.
Disponível em: <https://goo.gl/txSwhD>. Acesso em: 28 mar. 2018.
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166
Gabriel Peters
é Professor do Departamento de Sociologia da Universidade Federal de Pernambuco. Recife, PE, Brasil.
E-mail: <gabrielpeters@hotmail.com>
http://dx.doi.org/10.1590/0102-167202/103
Introdução
Os estudos sobre consumo constituem um campo privi
legiado para pensar a relação entre cultura e subjetividade.
Com a chamada “virada cultural”, esses estudos reforça
ram os aspectos comunicativos, expressivos e, mais recen
temente, subjetivantes do consumo. Embora autores como
Veblen (1987 [1899]) já houvessem alertado para a dimen
são simbólica do consumo conspícuo ou ostentatório entre
as classes abastadas do século XIX, no “capitalismo tardio”
o consumo e seu principal veículo, a publicidade, têm assu
mido um papel sem precedentes na mediação de identi
dades, poderes e mesmo direitos. Ao atrelar determinados
1
Uma versão resumida deste trabalho foi apresentada no GT de Sociologia da
Cultura do 18º Congresso Brasileiro de Sociologia, em julho de 2017, e deverá
constar de seus anais. Agradecemos aos professores Edson Farias e Maria Celeste
Mira pela oportunidade. Também agradecemos a Maria Eduarda Rocha, Gabriel
Cohn, Frédéric Vandenberghe e aos membros do Grupo de Estudos em Teoria
Social e Subjetividades (GETSS) do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da
Universidade Federal de Pernambuco (PPGS-UFPE) pelas valiosas críticas e suges
tões ao texto, em particular: Aloízio Barbosa, Amarildo Malvezzi, Dayra Batista,
Fernanda Fonseca, Mariana Pimentel, Rodrigo Mota, Suzy Luna e Thiago Panica.
2
“CASSIES Grand Prix: Always strikes a chord”. Disponível em: <http://strate
gyonline.ca/2016/02/12/cassies-grand-prix-always-strikes-a-chord/>. Acesso em:
23 fev. 2018.
3
Não há, por exemplo, qualquer menção a absorventes na propaganda da Always;
“não é só cacho, não é só cor, é mais poder”, limita-se a afirmar a publicidade de
uma linha de tintura para cabelos da Garnier Nutrisse.
4
Dado que nosso propósito não é fornecer um sistema classificatório relativo às três
ondas do feminismo, mas meramente ilustrar as relações gerais entre feminismo e
publicidade, nossa caracterização das três ondas inevitavelmente apresenta simplifica
ções que desconsideram as nuances internas a cada uma delas. Isso, contudo, não deve
obscurecer o fato de que alguns temas e questões centrais relativos a cada onda condi
cionaram a forma como a relação entre feminismo e publicidade tornou-se possível.
O pessoal é político
Embora de uso recente nas ciências sociais, o termo
“empoderar” e seus correlatos remetem ao inglês “to
empower”, utilizado desde meados do século XVII com o
5
Salvo engano, o próprio Freire só faz uso do termo na década de 1980, mas
em alguns países, como é o caso do Canadá, seu conceito de “conscientização”,
contido em obras das décadas de 1960 e 1970, foi traduzido como empowerment
(Guareshi, 2010, p. 147).
O político é pessoal
As transformações estruturais que atravessaram a(s)
sociedade(s) capitalista(s) nos últimos cinquenta anos
foram analisadas pela sociologia sob a égide de uma plura
lidade de rótulos, como “modernidade tardia” (Giddens),
“segunda modernidade” (Beck), “modernidade líquida”
(Bauman) e “pós-modernidade” (Lyotard), dentre vários
outros (Vandenberghe, 2013, p. 246). Tais diferenças
6
A importância da dimensão socializadora da publicidade é enfatizada por auto
ras como Susan Bordo (1999). Em sua análise do efeito de imagens da mídia em
concepções de beleza e de normalidade, a autora menciona, por exemplo, um
estudo em que meninos e meninas de onze anos foram solicitados a classificar uma
série de desenhos que retratavam crianças com diversos tipos de “deficiência”.
Surpreendentemente, os desenhos de crianças gordas geraram mais desconforto
e desaprovação do que os de crianças sem mãos ou com desfiguramento facial.
7
“Always: #LikeAGirl”. Disponível em: <https://digitalcasestudies.wordpress.
com/2015/03/11/always-likeagirl-2/>. Acesso em: 27 fev. 2018.
8
Disponível em: <https://digitalcasestudies.wordpress.com/2015/03/11/
always-likeagirl-2/>.
9
Dado que a descrição da metodologia se resume à especificação do tamanho da
amostra, não temos como avaliá-la do ponto de vista de sua validade. No entanto,
os resultados obtidos são compatíveis com a tese de Gilligan (1993) de que meni
nas experimentam uma queda na autoconfiança em torno da puberdade.
11
Esses elementos são também enfatizados no segundo vídeo da campanha, sob
o título de “unstoppable”. Ao enfatizar que “72% das meninas sentem que a socie
dade as limita” e que “a Always quer mudar isso”, meninas são solicitadas a escrever
em grandes caixas de papelão as limitações a que elas se sentem submetidas. As
principais: “sem valor”, “fraca”, “covarde”, “feia”, “meninas não podem jogar bas
quete”, “bonita”, “mandona”, “submissa”, “pequena”, “chorona”, “não pode ter
músculos”. Essas caixas são depois atacadas pelas próprias meninas, em movimen
tos certeiros e fluidos, seguindo-se o convite a nos juntarmos à campanha para
o aumento da autoconfiança de meninas. Disponível em: <https://www.youtube.
com/watch?v=VhB3l1gCz2E>. Acesso em: 25 abr. 2016.
Cynthia Hamlin
é Doutora em Pensamento Político e Social pela
Universidade de Sussex (1997) e professora associada do
Departamento de Sociologia da Universidade Federal de
Pernambuco (UFPE), onde coordena o Grupo de Estudos
em Teoria Social e Subjetividades (GETSS).
Gabriel Peters
é Doutor em Sociologia pelo Instituto de Estudos Sociais e
Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP-
UERJ) e professor adjunto do Departamento de Sociologia
da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Colabora
com o Grupo de Estudos em Teoria Social e Subjetividades
199
(GETSS) na UFPE e com o Núcleo de Pesquisa em Filosofia
das Ciências Sociais (Sociofilo) no IESP-UERJ.
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2
Elias estabeleceu alguns vínculos importantes entre seu estudo sobre o tempo
e investigações anteriores sobre o processo de civilização, notadamente no que se
refere ao sentido das mudanças no uso do tempo, tanto na esfera social quanto na
dimensão física do universo, como meio de orientação e de regulação da conduta
humana. Ver, a propósito, Elias e Dunning (1992, p. 44).
3
Obra sem tradução para o português. Utilizamos, neste artigo, a tradução espa
nhola (Elias, 1994c).
4
A primeira parte dos manuscritos desses ensaios foi redigida em inglês e publicada
em holandês na revista De gids, entre 1974 e 1975, sendo que o restante foi escrito
diretamente em alemão, quando da publicação em forma de livro, em 1984, de
todo o conjunto desses 46 ensaios apenas numerados – incluindo a tradução para o
alemão da primeira parte. Utilizamos neste artigo a edição brasileira (Elias, 1998b).
5
Elias preferiu a expressão “sínteses de alto nível” ao emprego do termo mais
costumeiro, “abstrações”, por considerar a “falta de clareza” desse último, tal como
ocorre na polaridade conceitual “abstrato-concreto”, que lhe seria aparentada. Ver
Elias (1998b, p. 138).
6
Aqui Elias contrapõe o adquirido, o aprendido pela experiência, ao inato, embora
se possa dizer que tal contraposição não é absoluta, na medida em que o inato e
o adquirido de certa forma andam juntos. Se for verdade, por exemplo, que a
capacidade de linguagem é inata e que toda língua é aprendida, deve haver algum
tipo de articulação entre ambas.
7
Embora Elias tenha estabelecido a distinção entre os termos evolução e desenvol-
vimento, limitando o primeiro ao significado de símbolo dos processos biológicos
de transmissão genética, e o segundo aos processos humanos não evolutivos de
transmissão simbólica intergeracional em suas diversas formas.
8
Em seu livro Introdução à sociologia, publicado originalmente em 1970, Elias
explorou mais detalhadamente esse tema ao abordar a pressão social das estruturas
verbais e conceituais, que atuam por vezes como entidades ou forças extra-huma
nas exercidas sobre as pessoas, como se fossem “objetos”. Ver Elias (2008, p. 21)
9
Como bem lembrou nosso autor, coube a Einstein reforçar ainda mais esse cará
ter relacional do tempo ao colocá-lo como dependente do ponto de referência do
observador, revisando assim toda a noção newtoniana do tempo como um fluxo
objetivo e absoluto. Ver Elias (1998b, p. 38).
10
A título de exemplo, o símbolo representado pelo algarismo quatro, por si só,
não significa nada caso não seja relacionado a um objeto específico, como em
“quatro maçãs”. Justamente por essa razão os símbolos matemáticos podem ser
aplicados a inúmeros objetos diferentes, analogamente ao símbolo do tempo. Ver
Elias (1998b, p. 107).
11
Vale ressaltar que esses dois grupos de conceitos temporais correspondem às
duas séries temporais analisadas pelo filósofo inglês John McTaggart (1866-1925)
em sua célebre e controversa tese sobre a inexistência do tempo, publicada no
início do século XX. Ver McTaggart (1988).
12
Elias demonstrou desde cedo um grande fascínio pelo tema mais geral das
“dimensões” do universo e suas representações, o que certamente concorreu para
a construção dessa alegoria pentadimensional, conforme se pode ver no relato de
uma experiência de viagem a Florença, em 1925. Ver Elias (2001, p. 50).
13
“[…] el carácter doble del mundo de nuestra experiencia como un mundo
independiente de nosotros pero que nos incluye y como un mundo del que
hace de intermediaria para nuestro entendimiento una red de representaciones
14
Hermann Minkowski (1864-1909), matemático alemão que contribuiu sobre
maneira para a divulgação da teoria da relatividade de Einstein – a propósito, seu
ex-aluno em Zurique –, ao propor, em 1908, a compreensão dessa teoria a partir da
introdução do conceito de “espaço-tempo” como uma unidade de quatro dimensões.
Considerações finais
Com a imagem das cinco dimensões, Norbert Elias
conseguiu construir e oferecer uma alternativa criativa às
abordagens do tempo oferecidas pelas filosofias ou epis
temologias tradicionais, que alimentavam – e talvez sigam
alimentando, ainda que em menor medida – a contro
vérsia acerca do caráter objetivo ou subjetivo do tempo.
15
As descobertas transcendentais de Einstein sobre a natureza do espaço-tempo
não implicam, todavia, que antes dele ninguém tivesse se dado conta de que não é
possível situar um acontecimento no espaço sem situá-lo juntamente no tempo. O
valor de Einstein, segundo Elias, foi ter demonstrado e expressado isso cientifica
mente. Ver, a propósito, Elias (1994c, p. 34).
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University Press.
A configuração constitucional
A constituição espanhola de 1978 sintetiza os fundamen
tos do modelo territorial, da organização do Estado e das
competências dos níveis de governo quanto à política urbana
(Título VIII). São quatro os níveis de organização territorial:
o próprio Estado (governo central), os municípios, as provín
cias e as comunidades autônomas, e todos “gozam de autono
mia para a gestão de seus respectivos interesses” (artigo 137).
Municípios e províncias têm “personalidade jurídica própria”
(artigos 140 e 141)2. No caso das comunidades autônomas, se
1
Este artigo apresenta resultados de pesquisa pós-doutoral desenvolvida no
Departamento de Sociología II (Ecología Humana y Población) da Universidad
Complutense de Madrid, Espanha. Agradecimentos do autor à Fundação de Amparo
à Pesquisa do Estado de São Paulo pela concessão de Bolsa de Pesquisa no Exterior
(Processo Fapesp 2015/11625/7) e a Luis Cortés Alcalá, pela acolhida generosa.
Versão modificada deste trabalho foi apresentada no XVII Encontro da Associação
Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional.
2
As províncias se limitam ao agrupamento supramunicipal e à divisão ter
ritorial, não têm competências administrativas ou recursos para implantação
de políticas públicas ou para manutenção de infraestrutura urbana. Portanto,
3
São elas: Galícia, Principado de Astúrias, Cantabria, País Vasco (Euskadi),
Navarra, Aragón, Cataluña, Castilla y León, La Rioja, Comunidad de Madrid,
Extremadura, Castilla-La Mancha, Comunidad Valenciana, Islas Baleares,
Andalucía, Murcia e Islas Canarias. Ademais, as cidades de Ceuta e Melilla (encla
ves situados no Marrocos) gozam de estatuto autonômico especial.
4
As comunidades autônomas ainda têm competências quanto a: alterações ter
ritoriais dos municípios; obras públicas; organização dos sistemas de transporte
rodoviário e ferroviário; disposição de equipamentos como portos e aeroportos;
gestão de políticas de meio ambiente; gestão de projetos de recursos hidráulicos;
saúde e saneamento. (<http://www.senado.es/web/conocersenado/normas/cons
titucion/index.html>, acesso em: 14 out. 2017).
Quadro 1
Evolução cronológica da Ley de Suelo
ANO MARCO LEGAL
Legislação original: Ley sobre Régimen del Suelo y Ordenación Urbana LS/56
1956 Classes de solo: Suelo urbano; Suelo de reserva urbana; Suelo rústico
Cenário político: VI governo da ditadura de Francisco Franco
5
A nomenclatura a respeito do mesmo instrumento é variada, refletindo a diver
sidade cultural e linguística do país. Em Andalucía, Castilla y León e Valencia, é
Plan General de Ordenación Urbanística (PGOU); na Cataluña, Pla d’Ordenació Urbana
Municipal (POUM); na Galicia, Plan Xeral de Ordenación Municipal (PXOM).
Quadro 2
Sequência hierárquica de aplicação da legislação urbanística na
Espanha
Constituição [abrangência nacional – foro decisório: Congreso de los Diputados
e Senado]
↓
Ley de Suelo Estatal [incidência nacional – foro decisório: Congreso de los
Diputados]
↓
Legislação setorial [incidência nacional – foro decisório: Congreso de los
Diputados]
↓
Leyes de Suelo das comunidades autônomas [incidência autonômica – foro
decisório:
Asambleas autonómicas]
244 ↓
Plan de Ordenación Urbana [incidência local – foro decisório: Asambleas
autonómicas]
Fonte: elaboração própria.
6
Projeto assinado pelo arquiteto espanhol Santiago Calatrava, um dos ícones do
mainstream da arquitetura contemporânea, associada a estéticas e projetos arrojados
e a intervenções urbanísticas de grande impacto. Outro símbolo desta “escola” é o
arquiteto canadense Frank Gehry, autor dos projetos do Peix (escultura símbolo da
Barcelona pós-olímpica) e do Museu Guggenheim, em Bilbao.
7
Texto legal do Plan General Metropolitano de Barcelona (PGMB) (<http://www.amb.
cat/es/web/territori/gestio-i-organitzacio/numamb>, acesso em: 19 maio 2016).
8
(<http://www.bilbaoria2000.org/ria2000/cas/home/home.aspx>, acesso em:
19 maio 2016).
Quadro 3
Comparativo do Marco Institucional da Política Urbana: Espanha/Brasil
REFERÊNCIA
ESPANHA BRASIL
INSTITUCIONAL
Enunciados Princípios da Política Social e Capítulo da Política Urbana
256 Constitucionais Econômica (artigo 47) (artigo 182 e artigo 183)
Ley de Suelo (LS) –
Principal Legislação Estatuto da Cidade (EC)
Ley 20/2014
infraconstitucional Lei nº 10.257/2001
Real Decreto Legislativo 7/2015
Ley 57/2003
Legislação específica Lei Federal nº 13.089/2015
(Ley de Modernización del
para grandes cidades (Estatuto da Metrópole)
Gobierno Local)
Concepção normativa Plusvalia é reconhecida e admitida Subordinação à função social
da propriedade (CE e LS); função social tênue (CF e EC)
Artigo 148 da CE: competência
Artigo 182 da CF: “política
“exclusiva” das comunidades
de desenvolvimento urbano
autônomas pela “ordenación del
Competência pela executada pelo poder
territorio, urbanismo y vivienda”,
efetivação da política público municipal”; sistema
mas há compartilhamento com
urbana federativo impõe gestão
municípios (Ley 7/1985 – Ley
compartilhada e cooperativa
Reguladora de las Bases del
em políticas públicas
Régimen Local)
Principal instrumento Plano Diretor obrigatório
de ordenamento para municípios com
Planes de Ordenación Urbana
territorial e de população superior a 20 mil
(LS)
regulação do uso e habitantes
do solo (CF e EC)
Fonte: elaboração própria.
Jefferson O. Goulart
é professor do Departamento de Ciências Humanas da
Universidade Estadual Paulista (Unesp), pesquisador do
Cedec e líder do Grupo de Pesquisa Desenvolvimento
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259
Introdução1
A maioria dos Estados sul-americanos esteve sob o
comando de regimes ditatoriais entre as décadas de 1970 e
1980, período que singularizou a história regional pelas diver
sas violações de direitos humanos praticadas de forma siste
mática como políticas de Estado. Os processos de transição
democrática foram – e continuam sendo, em muitos casos –
bastante diversos em termos do tratamento estatal conferido
aos prismas da justiça, da verdade e da reparação. Entretanto,
um denominador comum entre aqueles que lutam pela pre
dominância dos valores democráticos na região consiste no
receio à impunidade. O enfrentamento aos passados auto
ritários na América do Sul experimentou uma diversidade
de métodos e práticas, judiciais (processos criminais) e não
judiciais (comissões da verdade, por exemplo), conduzidos
tanto no plano doméstico, quanto no internacional.
1
Agradeço os comentários e sugestões de Kathryn Sikkink, Rossana Rocha Reis,
Bruno Boti Bernardi e Marcelo Torelly a este texto.
2
A CADH passou a incluir novos direitos civis e políticos (como o direito à inde
nização, o direito de retificação ou de resposta e o direito ao nome) e direitos
econômicos e sociais (como o direito ao desenvolvimento progressivo).
3
A vigência da CADH teve início quando ratificada por 11 Estados: Colômbia,
Costa Rica, El Salvador, Equador, Honduras, Haiti, Granada, Guatemala, Panamá,
República Dominicana e Venezuela. Disponível em: <https://www.cidh.oas.org/
Basicos/Portugues/d.Convencao_Americana_Ratif..htm>. Acesso em: 4 abr. 2018).
4
Relatórios anuais da Corte IDH de 1980 a 1987. Disponível em: <http://www.oas.
org/es/cidh/informes/anuales.asp>. Acesso em: 4 abr. 2018.
5
Na Opinião Consultiva nº 3, de 8 de setembro de 1983, a Corte IDH firmou
entendimento extensivo de que poderia se referir a quaisquer outros tratados
internacionais que a possibilitassem interpretar os instrumentos interamericanos.
Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/opiniones/seriea_03_esp.pdf>.
Acesso em: 28 ago. 2014.
6
Em razão do Caso Schmidt, opinião consultiva nº 5 de 13 de novembro de 1985,
que envolvia a discussão sobre liberdade de impressa em regimes democráticos.
7
Idem.
8
De 1990 até 2001, a CIDH mantém onze relatorias temáticas. A diversidade de
temas trabalhados está disponível em: <http://www.oas.org/es/cidh/mandato/
relatorias.asp>. Acesso em: 16 mar. 2018.
9
Relatórios anuais da Corte IDH de 1988 a 1994. Disponível em: <http://www.
oas.org/es/cidh/informes/anuales.asp>. Acesso em: 28 ago. 2014.
10
Antes dessa reforma, os peticionários não participavam diretamente no proces
samento do caso. Era a CIDH quem desempenhava o papel ambivalente de árbitro
imparcial durante a fase de processamento perante a Comissão e parte oposta ao
Estado-denunciado na fase de processamento perante a Corte IDH.
11
Uma das inovações mais importantes foi a adição da competência supervi
sora pela Corte IDH do cumprimento estatal de suas decisões. Neste sentido, ver
Ramanzini (2014).
12
Nos últimos anos, a Corte IDH cumulou importantes decisões sobre discrimina
ção por razões de orientação sexual, direitos das pessoas portadoras de deficiência,
direitos de paternidade e direitos reprodutivos, entre outras.
13
Neste ponto, cabe mencionar que as raízes do tema da justiça de transição na
região podem até mesmo serem mais profundas e anteriores à institucionalização
do sistema regional de direitos humanos. Sikkink (2014) propõe que o engaja
mento diplomático de Estados latino-americanos nos anos 1940, no que tange à
inclusão do direito à justiça (baseados nas leis regionais de amparo ou tutela) nas
normativas internacionais, sugere um protagonismo normativo do Sul em relação
ao Norte Global.
14
Sobre a ingerência de membros de regimes militares na CIDH, Lima (2012,
p. 196) nota que mesmo quando os membros da Comissão não estavam ligados aos
regimes militares, a asfixia política no interior dos Estados era tanta que tornava
até inadequada a submissão de casos individuais à CIDH, dado que os Estados não
participavam de forma alguma da litigância, nem mesmo indicando provas para
negar os fatos narrados.
A CIDH realizou investigações in loco no Chile em 1974 e na Argentina em 1976.
15
(Myrna Mack Chang, Massacre Plan de Sánchez, Carpio Nicolle e outros, Massacre
de las dos Erres), El Salvador (Hermanas Serrano Cruz, Contreras e outros),
Suriname (Comunidade Moiwana), Uruguai (Gelman) e Brasil (Gomes Lund e
outros) (<https://goo.gl/2VMGyZ>, acesso em: 16 mar. 2018).
25
Da mesma forma que existiam diferenças regionais nos padrões de violações de
direitos humanos durantes as “guerras sujas”, consequentemente, os esforços para
lidar com os abusos do passado também variaram em toda região (Engstrom, 2011).
26
Existe uma exceção a ser considerada. Na Argentina, por exemplo, os processos
judiciais foram iniciados pouco depois da transição, e continuam sendo realizados
vinte anos depois.
27
A decisão do caso Velásquez Rodríguez vs. Honduras, por exemplo, foi aplicada
diretamente na Argentina, em 2001, declarando as leis “Ponto Final e “Obediência
Devida” inconstitucionais. Chile e Uruguai também processaram graves violações
sob a influência das decisões interamericanas. De outro lado, no caso do Brasil,
o judiciário parece não ter sido tão receptivo, havendo ainda debates sobre as
formas de implementação da sentença Gomes Lund e outros. Neste sentido, ver
Malarino (2007).
28
America’s Watch, International Human Rights Law Group, Lawyers Committee
for Human Rights e Washington Office on Latin America.
29
Vale ressaltar que, neste momento, a CIDH não era vista com bons olhos
perante as lutas domésticas, tendo em vista que o órgão se encontrava sob inge
rência ou era até mesmo composto por membros representantes das forças mili
tares estatais.
Considerações finais
Parte da literatura mais recente sobre os arranjos inter
nacionais de direitos humanos tem se mostrado pouco
otimista quanto à eficácia em modificar práticas estatais
(Hathaway, 2002; Hafner-Burton; Tsutsui, 2005; Neumayer,
2005), um achado geralmente atribuído à baixa capacidade
de enforcement das instituições internacionais. Este artigo, vol
tado para a questão do tratamento internacional da justiça
de transição, demonstrou que os regimes internacionais de
direitos humanos, sob determinadas condições, podem ter
um papel relevante não só no processo de transformação do
comportamento estatal, como também podem se apropriar
estrategicamente de determinadas questões sensíveis aos
Estados para se autotransformarem, visando maior autono 281
mia e influência institucional.
As evidências apresentadas demonstram que o litígio
estratégico das redes transnacionais de advocacy no SIDH
produziram efeitos para além do demandado nos casos
contenciosos. O estímulo à produção de processos jurídi
cos na Corte IDH suscitou interpretações expansivas da
CADH, norma da qual o tribunal deriva seus poderes e
competências conferidos pelos Estados-partes do SIDH.
Neste processo de definição de standards jurisprudenciais
em matéria de justiça transicional, a Corte IDH não só
enfrentou objetivamente questões relativas à justiça tran
sicional (leis de anistia, reparação, punição, direito à ver
dade e à memória), como revisou seu posicionamento
quanto à responsabilização estatal e lançou um dos seus
mais amplos poderes, o controle de convencionalidade, na
pretensão de tornar os sistemas jurídicos nacionais cada
vez mais permeáveis ao SIDH.
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