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História do Pensamento

Econômico
Camila Amaral Pereira

2018
Copyright © UNIASSELVI 2018

Elaboração:
Camila Amaral Pereira

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

P436h

Pereira, Camila Amaral


História do Pensamento Econômico. / Camila Amaral Pereira – Indaial:
UNIASSELVI, 2018.

182 p.; il.

ISBN 978-85-515-0193-1

1.Economia – História – Brasil. 2.Economia – Filosofia. II. Centro Universitário


Leonardo Da Vinci.

CDD 330.1

Impresso por:
Apresentação
Prezados estudantes, sejam bem-vindos ao livro de estudos de
História do Pensamento Econômico!

Você deve estar se perguntando o porquê de estudar História do


Pensamento Econômico. Vamos adiantar determinada indagação explicando
que entender a evolução do pensamento econômico é muito importante
para a compreensão do mundo atual. Assim, passaremos pelo período
grego, pelo feudalismo, mercantilismo, fisiocracia, além dos pensadores
econômicos clássicos, neoclássicos e demais teorias, para mostrar a evolução
do pensamento econômico do mundo.

Você saberia dizer o que é riqueza em uma determinada sociedade?
Seria a terra? Os metais preciosos? O trabalho? Sabe dizer também se é
importante a intervenção do Estado na economia? Vamos estudar tais
questionamentos nesta unidade.

Assim, este livro, dedicado à disciplina de História do Pensamento
Econômico, objetiva auxiliá-lo no entendimento dessas questões e, de forma
didática, está dividido em três unidades.

Na Unidade 1, haverá a compressão da história do pensamento


econômico. O objetivo será caracterizar a organização econômica e o
pensamento econômico, principalmente na Grécia, Roma e no período da
Idade Média; observar o movimento da sociedade submetida à filosofia,
à política e à moral, e entender que, nos períodos, havia uma menor
importância atribuída ao individualismo em detrimento do coletivismo.
Assim, observaremos a economia primitiva, o pensamento econômico na
antiguidade, como na Grécia e Roma, a Idade Média, o tempo e trabalho, a
economia e a religião, o feudalismo, a evolução do sistema feudal europeu,
as cidades e o comércio, a transição para o capitalismo e a formação dos
estados absolutistas.

Na Unidade 2, envolvendo o progresso do capitalismo, temos o


objetivo de entender a importância do comércio, da propriedade privada, da
noção de riqueza e da valorização do individualismo na nova construção de
sociedade. Assim, de forma bem didática, trabalharemos tópicos relacionados
ao pensamento mercantilista, os pensadores Thomas Mun, Jean Baptiste
Colbert e Sir William Petty, além do pensamento da fisiocracia, debatendo a
respeito de Quesnay, do Tableau Economique e do Liberalismo clássico.

III
Já na Unidade 3, objetivamos discutir a importância do Estado na
economia. É preciso perceber as desigualdades econômicas entre os países
e suas teorias. Assim, estudaremos a Escola Clássica, envolvendo Adam
Smith, Thomas Malthus, David Ricardo, Jean Bastiste Say, John Stuart Mill,
além do socialismo, marxismo, escola neoclássica e o keynesianismo.

Haverá, ainda, a discussão da presença do Estado nas crises


capitalistas, o pensamento econômico contemporâneo, monetaristas,
expectativas racionais, pós-keynesianos, a Cepal e os pensadores brasileiros
e latino-americanos.

Ao final de cada tópico, elaboramos algumas atividades sobre os


conteúdos abordados, para que você possa aprender mais.

Aproveite o livro de estudos de História do Pensamento Econômico!

Desejamos bons estudos!

NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há
novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto
em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.
 
Bons estudos!

IV
UNI

Olá acadêmico! Para melhorar a qualidade dos


materiais ofertados a você e dinamizar ainda mais
os seus estudos, a Uniasselvi disponibiliza materiais
que possuem o código QR Code, que é um código
que permite que você acesse um conteúdo interativo
relacionado ao tema que você está estudando. Para
utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos
e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar
mais essa facilidade para aprimorar seus estudos!

V
VI
Sumário
UNIDADE 1 – HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO.................................................... 1

TÓPICO 1 – ORGANIZAÇÃO SOCIAL.............................................................................................. 3


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 3
2 INTRODUÇÃO À HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO.......................................... 3
3 O QUE É ORGANIZAÇÃO SOCIAL?............................................................................................... 5
3.1 MODOS DE PRODUÇÃO............................................................................................................... 6
4 ECONOMIA PRIMITIVA.................................................................................................................... 6
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 8
5 ECONOMIA ESCRAVISTA................................................................................................................. 9
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 11
6 O PENSAMENTO ECONÔMICO NA ANTIGUIDADE: GRÉCIA E ROMA........................... 13
6.1 A GRÉCIA E SUA CONSTRUÇÃO DE PENSAMENTO........................................................... 13
6.2 O PENSAMENTO ECONÔMICO EM ROMA............................................................................. 15
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 16
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 18
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 19

TÓPICO 2 – A IDADE MÉDIA.............................................................................................................. 21


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 21
2 O OLHAR DA IDADE MÉDIA NA ECONOMIA.......................................................................... 21
3 CONTEXTO HISTÓRICO-ECONÔMICO DA IDADE MÉDIA................................................. 22
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 24
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 26
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 27

TÓPICO 3 – FEUDALISMO................................................................................................................... 29
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 29
2 CONSTITUIÇÃO DO MODO DE PRODUÇÃO FEUDAL.......................................................... 29
3 ORGANIZAÇÃO DA SOCIEDADE FEUDAL................................................................................ 30
4 TEMPO NA IDADE MÉDIA............................................................................................................... 31
5 O FEUDO E O DIREITO NA IDADE MÉDIA................................................................................. 32
6 A EVOLUÇÃO DO SISTEMA FEUDAL EUROPEU...................................................................... 33
6.1 TRANSFORMAÇÕES NAS RELAÇÕES DE TRABALHO........................................................ 34
7 TENTATIVA DE SUSTENTAÇÃO DO FEUDALISMO: AS CRUZADAS................................ 34
8 A DECADÊNCIA DO FEUDALISMO............................................................................................... 36
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 38
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 41
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 42
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 44

TÓPICO 4 – TRANSIÇÃO PARA O CAPITALISMO....................................................................... 47


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 47
2 A TRANSIÇÃO DO FEUDALISMO PARA O CAPITALISMO................................................... 47

VII
3 FORMAÇÃO DOS ESTADOS ABSOLUTISTAS........................................................................... 48
3.1 DIVISÃO SOCIAL DO ESTADO ABSOLUTISTA........................................................................ 50
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 53
4 REFLEXÕES SOBRE O PODER ABSOLUTISTA............................................................................ 54
4.1 NICOLAU MAQUIAVEL (1469-1527)........................................................................................... 54
4.2 JEAN BODIN (1530-1596)................................................................................................................ 55
4.3 THOMAS HOBBES (1588-1679)...................................................................................................... 56
5 O HUMANISMO................................................................................................................................... 57
6 PODER POLÍTICO E PODER ECONÔMICO: BREVE ANÁLISE DO CAPITALISMO........ 58
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 61
RESUMO DO TÓPICO 4........................................................................................................................ 64
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 65

UNIDADE 2 – DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO........................................................... 67

TÓPICO 1 – MERCANTILISMO........................................................................................................... 69
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 69
2 MERCANTILISMO............................................................................................................................... 69
3 A PRÁTICA DO MERCANTILISMO NOS PAÍSES EUROPEUS............................................... 71
3.1 PORTUGAL E ESPANHA............................................................................................................... 71
3.2 INGLATERRA................................................................................................................................... 72
3.3 ALEMANHA..................................................................................................................................... 72
3.4 HOLANDA........................................................................................................................................ 73
4 UM ADENTRO SOBRE A COLONIZAÇÃO................................................................................... 73
5 TEORIA QUANTITATIVA DA MOEDA.......................................................................................... 75
6 PRINCIPAIS TEÓRICOS DO MERCANTILISMO........................................................................ 76
6.1 THOMAS MUN (1571-1641)........................................................................................................... 76
6.2 JEAN- BAPTISTE COLBERT (1619-1683)...................................................................................... 77
6.3 RICHARD CANTILLON (1680-1734)............................................................................................ 77
6.4 DAVID HUME (1711 – 1776)........................................................................................................... 78
7 MERCADO INTERNO E EXTERNO E O PAPEL DO ESTADO.................................................. 79
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 80
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 83
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 84

TÓPICO 2 – FISIOCRACIA.................................................................................................................... 87
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 87
2 CONTEXTO HISTÓRICO DA FISIOCRACIA............................................................................... 87
3 TEÓRICOS ILUMINISTAS ................................................................................................................ 89
3.1 VOLTARIE (1694-1778).................................................................................................................... 89
3.2 MONTESQUIEU (1689-1755).......................................................................................................... 90
3.3 ROUSSEAU (1712-1778)................................................................................................................... 91
4 OS FISIOCRATAS E O PENSAMENTO ECONÔMICO............................................................... 92
5 PRINCIPAIS TEÓRICOS DA FISIOCRACIA................................................................................. 94
5.1 FRANÇOIS QUESNAY (1694-774)................................................................................................. 94
5.2 TURGOT (1727-1781)........................................................................................................................ 96
6 GERADOR DO EXCEDENTE............................................................................................................. 97
6.1 MERCANTILISMO X FISIOCRACIA: ANÁLISE DOS EXCEDENTES.................................... 98
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 99
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 102
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 103

VIII
TÓPICO 3 – LIBERALISMO................................................................................................................... 105
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 105
2 CIÊNCIA E MÉTODO: PERSPECTIVA HISTÓRICA.................................................................... 105
3 OS LIBERAIS.......................................................................................................................................... 106
4 PRINCIPAL AUTOR DO LIBERALISMO: ADAM SMITH......................................................... 106
4.1 CONFERÊNCIAS DE GLASGOW................................................................................................. 107
4.2 A RIQUEZA DAS NAÇÕES: O TRABALHO............................................................................... 108
4.3 A TEORIA DO VALOR EM SMITH............................................................................................... 109
4.4 A TEORIA DO VALOR E SUA RELAÇÃO COM O TRABALHO............................................ 110
4.5 DISTRIBUIÇÃO DO VALOR GERADO PELO TRABALHO..................................................... 110
4.6 TEORIA DOS SALÁRIOS................................................................................................................ 111
4.7 TEORIA DO CRESCIMENTO ECONÔMICO.............................................................................. 112
5 PRINCIPAL AUTOR DO LIBERALISMO: DAVID RICARDO................................................... 112
5.1 O MÉTODO DE DAVID RICARDO............................................................................................... 113
5.2 OPOSIÇÃO ENTRE LUCROS E SALÁRIOS................................................................................ 114
6 PRINCIPAL AUTOR DO LIBERALISMO: THOMAS MALTHUS............................................. 115
6.1 TEORIA DA POPULAÇÃO............................................................................................................ 115
6.2 TEORIA DA DEMANDA EFETIVA E DA SUPERPRODUÇÃO............................................... 117
7 PRINCIPAL AUTOR DO LIBERALISMO: JONH STUART MILL ............................................ 118
7.1 REVISÃO DA TEORIA DO VALOR E DO CONCEITO DE TRABALHO PRODUTIVO..... 119
7.2 STUART MILL E A POLÍTICA ECONÔMICA............................................................................ 119
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 121
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 126
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 127

UNIDADE 3 – AS TEORIAS DO PENSAMENTO ECONÔMICO................................................ 129

TÓPICO 1 – ESCOLA CLÁSSICA E SOCIALISMO......................................................................... 131


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 131
2 ESCOLA CLÁSSICA NA ECONOMIA............................................................................................. 131
3 OS FISIOCRATAS................................................................................................................................. 132
4 ADAM SMITH ...................................................................................................................................... 132
5 THOMAS MALTHUS........................................................................................................................... 134
6 A TEORIA DO VALOR DE MILL...................................................................................................... 138
7 O MARXISMO....................................................................................................................................... 139
8 SOCIALISMO........................................................................................................................................ 141
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 144
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 145

TÓPICO 2 – ESCOLA NEOCLÁSSICA................................................................................................ 147


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 147
2 OS MARGINALISTAS E OS PARADOXOS DA TEORIA DO VALOR ................................... 147
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 151
3 KEYNESIANISMO................................................................................................................................ 152
3.1 KEYNES E SUA TEORIA................................................................................................................. 153
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 156
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 160
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 161

TÓPICO 3 – PENSAMENTO ECONÔMICO CONTEMPORÂNEO E OS PENSADORES


BRASILEIROS LATINO-AMERICANOS.................................................................... 163

IX
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 163
2 O MONETARISMO, EXPECTATIVAS RACIONAIS E PÓS-KEYNESIANOS........................ 163
3 NEOLIBERALISMO.............................................................................................................................. 165
4 OS PENSADORES BRASILEIROS E LATINO-AMERICANOS ................................................ 167
4.1 PRINCIPAIS AUTORES DO PENSAMENTO LATINO-AMERICANO.................................. 168
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 172
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 175
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 176
REFERÊNCIAS.......................................................................................................................................... 177

X
UNIDADE 1

HISTÓRIA DO PENSAMENTO
ECONÔMICO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir desta unidade, você será capaz de:

• analisar a história como ferramenta indispensável para a interpretação


econômica;

• caracterizar a organização econômica e o pensamento econômico na Gré-


cia, Roma e no período da Idade Média;

• observar o movimento da sociedade submetida à filosofia, economia e à


política;

• entender que nos períodos havia uma menor importância atribuída ao in-
dividualismo em detrimento do coletivismo.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está organizada em quatro tópicos. Ao final de cada um deles,
você encontrará exercícios que o auxiliarão na compreensão dos temas
abordados.

TÓPICO 1 – ORGANIZAÇÃO SOCIAL

TÓPICO 2 – A IDADE MÉDIA

TÓPICO 3 – FEUDALISMO

TÓPICO 4 – TRANSIÇÃO PARA O CAPITALISMO

1
2
UNIDADE 1
TÓPICO 1

ORGANIZAÇÃO SOCIAL

1 INTRODUÇÃO
Prezado acadêmico! Ao introduzir esta unidade é importante dialogarmos
sobre a construção histórica do pensamento econômico.

Assim, nesta primeira unidade, desejamos que você compreenda o
desenvolvimento econômico ao longo da história humana. No decorrer dos
estudos, vamos fazer você perceber como a construção histórica molda a economia
com diferentes olhares, mas antes de citarmos exemplos, gostaríamos de explicar
o termo história do pensamento econômico. Então, o que é história econômica?

2 INTRODUÇÃO À HISTÓRIA DO PENSAMENTO


ECONÔMICO
Para começar, precisamos diferenciar a história econômica da interpretação
econômica. Assim, a resposta para a questão pressupõe o conhecimento de duas
distinções. A primeira é a esfera da existência e nível de realidade e, a segunda,
a distinção entre ciência social retrospectiva e história. Inicialmente, vamos
entender o ponto de vista geral da história da historiografia (a história da história
do discurso historiográfico) que estabelece um corte historiográfico do século
XIX, da anterior, como se fosse um corte epistemológico.

No nosso ponto de vista não há um corte epistemológico, mas sim uma


especificidade da história como um discurso, pois a história é uma das mais
antigas ciências, pois resulta no estudo do impacto das ciências sociais e não o
contrário, pois a ciência social aparece apenas no século XIX.

A história, por ser mais antiga, não responde a nossas demandas históricas
e sociais de outras disciplinas. Então, a história, desde Heródoto até uma história
atual do século XXI, precisa ser uma narrativa do conhecimento, mas por meio da
ciência social, a diferença é como se chega à narrativa do acontecimento.

Antes, o historiador tradicional pesquisava diretamente nas fontes, nos


registros. Já para o historiador moderno, há uma camada de conceitos entre o
registro e a narrativa de conhecimento. Para reconstituir é preciso explicar. É isso
que distingue a relação da história com as ciências sociais. A história trata de
todas as esferas da existência ao mesmo tempo e o objeto é indelimitável. Para o
historiador, a reconstituição é o fim e a explicação é o meio.
3
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

Agora em relação à primeira distinção, devemos perceber que existem


diversos recortes de esferas da existência (seja a política, a econômica, a cultural,
entre outras) com um nível de se observar a realidade.

Assim, a história econômica é um tipo de história que recorta uma esfera


da existência. Pode ser feita pela forma de economia retrospectiva ou sob a forma
de história econômica. Uma não é melhor que a outra, dependendo apenas do
autor.

A interpretação econômica, ou seja, a explicação econômica da história,


é quando se confunde a esfera da existência, como um nível de realidade, ou
quando se torna uma esfera da existência que explica as outras.

Um exemplo geral, ao se pensar no Brasil, seria o livro Formação Econômica


do Brasil (1959), de Celso Furtado, uma forma de escrita de história econômica
retrospectiva (interpretação econômica). Já o livro de Caio Prado Júnior, História
Econômica do Brasil (1945) seria mais um livro de história econômica (ou seja, tem
mais história econômica que economia).

E
IMPORTANT

A história econômica pode ser entendida como a construção histórica dos


processos econômicos.

Segundo Júnior (1975), o estudo da história deve se preocupar com o


movimento das relações sociais, não sendo algo estático. Assim, as incertezas da
organização social levaram aos estudos por meio da história para se entender a
evolução dos processos econômicos.

Entendidos do conceito, vamos para o exemplo: a procura incessante


por meios de subsistências desde os rudimentares até o sistema econômico que
conhecemos atualmente, quando observamos a economia capitalista, considerada
a forma de organização da sociedade atual, sabemos pela construção histórica
que o capitalismo nem sempre foi vigente. Havia outras formas de organização
social, entre elas a feudal, organização que não tinha a circulação do dinheiro
como forma de trocas de mercadorias, entre outros.

Exemplos cotidianos também podem ser observados como quando
aparecem notícias midiáticas anunciando que determinado país se encontra
numa crise econômica. Não significa que foi sempre assim, pois a análise
histórica sempre nos mostra momentos de recessão e prosperidades na economia
de qualquer país.

4
TÓPICO 1 | ORGANIZAÇÃO SOCIAL

Apesar de poucos exemplos, já começamos a perceber a importância da


história na economia. E o que continuaremos a perceber na unidade.

Neste tópico, vamos estudar a história econômica e sua construção nas


diversas formas de organização da sociedade. Estudaremos o pensamento
econômico da antiguidade, compreenderemos o processo histórico da Idade
Média, a relação de tempo e trabalho, bem como a economia e religião.
Conversaremos sobre o feudalismo, a evolução do sistema e o movimento das
cidades e do comércio. Por fim, na unidade, entenderemos a construção histórica
da transição da sociedade para a organização social capitalista e também a
formação dos estados absolutistas. Vamos lá?

E
IMPORTANT

Se deseja ampliar o conhecimento, você encontrará indicações de textos


complementares em cada tópico.

3 O QUE É ORGANIZAÇÃO SOCIAL?


A organização social é uma associação de pessoas para viver em sociedade
nas diversas esferas da vida, seja a econômica, a religiosa, a política, a cultural,
entre outras. Assim, viver em sociedade pressupõe certa organização social que
foi construída historicamente.

Para Durkheim (1974, p. 11) a explicação da vida social se daria por
meio da observação dos fatos sociais, defendendo que “toda maneira de agir
fixa, ou não, é suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior, ou
ainda apresenta uma existência própria, independentemente das manifestações
individuais que se possa ter”.

Os fatos sociais teriam seu corpo próprio ao se pensar a sociedade como
a constituição da família, do estado, das relações de produção, entre outras.
Determinadas partes do corpo social funcionariam de maneira independente do
indivíduo, condicionando suas ações.

Sabemos que viver em sociedade é fazer parte da vida econômica dela,
ou seja, participar das relações de produção dessa organização social. Assim, é
importante compreender os diversos tipos de modos de produção da sociedade
que foram se constituindo ao longo do tempo.

5
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

3.1 MODOS DE PRODUÇÃO


Uma das formas de compreendermos a História Econômica é utilizando
o conceito de modos de produção, que está associado diretamente à forma, ao
modo de como são produzidos, utilizados, trocados, distribuídos os bens para
consumo, serviços, entre outros para a sociedade como um todo.

Para Marx (1988, p. 19), “mais importante do que entender o que produz a
humanidade num certo momento é entender como que a humanidade se organiza
para executar essa produção”.

Assim, segundo o autor, para compreender o conceito de modo de produção


é preciso considerar as relações específicas que são postas em movimento pelos
humanos numa dada sociedade, com a intenção de produzir e reproduzir a vida
material.

Com isso, toda a sociedade apresenta um modo de produção que


determina a certo estágio de desenvolvimento das forças produtivas e que não é
linear, como já explicou a história econômica, mas que de forma didática pode ser
caracterizado de uma maneira mais geral, como: modo de produção primitivo,
escravo, feudal e capitalista. É o que veremos durante os tópicos.

4 ECONOMIA PRIMITIVA
Na economia primitiva, os homens exploravam o mundo ao seu redor,
tendo como objetivo se apropriarem dos recursos oferecidos pela natureza para
usufruírem e se protegerem.

Era, portanto, uma sociedade que se dividia em grupos, que com o passar
dos tempos e com as experiências adquiridas aprenderam a identificar quais
animais podiam caçar e quais plantas eram comestíveis ou úteis no tratamento
de doenças.

Aprenderam também a fazer canoas, meios de transportes importantes
para suas migrações. Também começaram a polir seus instrumentos de pedra,
criando peças mais duráveis que antes, além de descobrirem o fogo. A atividade
agrícola forneceu aos grupos uma fonte estável de alimento, contribuindo para
que eles se fixassem nas áreas mais férteis, como em aldeias de madeiras, pedra
ou barro (Prado Júnior, 1975). Além disso, desenvolveram a domesticação de
animais e pastoreio.

As mudanças ampliaram o domínio do homem sobre a natureza
resultando em maior produção de alimentos e crescimento populacional.

6
TÓPICO 1 | ORGANIZAÇÃO SOCIAL

É importante saber que o Estado existia. A tomada de decisões na aldeia


estava sob o comando dos chefes da família, encarregados de administrar
eventuais conflitos. O líder também tinha a função de proteger a comunidade
contra os ataques de grupos rivais que iam em busca de alimentos e animais
domesticados.

Os homens da denominada organização social primitiva se organizavam


de forma diferente da atual. Os grupos não conheciam o controle do Estado, isto
é, não existia no interior da sociedade a autoridade burocrática e a relação de
poder de coerção sobre as pessoas como conhecemos hoje.

E
IMPORTANT

Ao se analisar qualquer momento do pensamento da história econômica, deve-


se tomar cuidado com o anacronismo, ou seja, o historiador ao reconstituir o fato sabe o
que o protagonista da história não sabia. Ainda, corre o risco de colocar informações para o
protagonista que ele não teria no momento vivido.

FIGURA 1 – ECONOMIA PRIMITIVA

FONTE: Fotografia do filme “A guerra do fogo” (1981). Disponível em:


<https://www.dci.com.br/image/policy:3.20599:1512828307/image.
jpg?q=0.6&w=750&$p$q$w=8b8755e>. Acesso em: 7 maio 2018.

É importante compreender que na economia primitiva a terra era um bem


comum, não existiam instituições privadas, as relações econômicas eram em base
de escambo primitivo, sejam arcos, flechas, dentes ou peles de animais, entre
outros. Não existia moeda como forma de troca de utensílios na época.

7
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

LEITURA COMPLEMENTAR

A REVOLUÇÃO AGRÍCOLA

[...] Não se deve pensar que a passagem da atividade coletora para a


agrícola tenha se dado de uma maneira brusca ou por um toque de mágica. Deu-
se através de um longo processo que inclui cuidadosa percepção dos fenômenos
naturais, elaboração de teoria causa/efeito e doses de acidentalidade.

Um grão caído na terra começa a germinar e é observado em seu crescimento


por algumas mulheres que estão coletando na área. Aí temos, provavelmente, a
base de transformação.

Que a transformação teria sido lenta, não se duvida. Afinal, entre saber que
os vegetais crescem se plantados e conseguir organizar uma plantação racional
e rentável, há uma longa distância que passa pela necessidade de alteração de
padrões de comportamento já arraigados. A convivência da agricultura com a
coleta deve ter sido o fenômeno mais comum durante muito tempo.

O fato é que a economia simples de produção de alimentos provocará


grande transformação no grupo. Pela primeira vez, haverá um excedente a ser
armazenado. O acontecimento não ocorre da vontade manifestada dos membros
do grupo ou de algum sentimento de usura, mas da própria realidade ditada pela
natureza.

Por exemplo: os grãos produzidos ficam maduros de uma só vez numa


certa época e não ao longo do ano, porém deverão ser consumidos lentamente em
refeições distribuídas pelo ano todo. Além disso, parte da colheita deverá servir de
semente na próxima semeadura. O grupo precisa mudar sua atitude com relação
ao alimento: começa a planejar e a poupar; começa também a construir silos
(benfeitoria agrícola para armazenamento de produtos), depósitos adequados
para armazenamento de grãos.

A produção de excedente agrícola, somada à atividade criadora, servirá


para suprir as necessidades da comunidade em períodos mais duros, propiciando
o crescimento da população e o surgimento posterior de um comércio incipiente
[...].
FONTE: PINSKY, Jaime. As primeiras civilizações. São Paulo: Atual, 1994.

8
TÓPICO 1 | ORGANIZAÇÃO SOCIAL

DICAS

Guerra do fogo. Diretor: Jean Jacques Annaud. Nacionalidade: Canadá.


Duração: 97 Minutos. Ano: 1981. Descrição do filme: A Guerra do Fogo conta a história de
uma tribo, que tenta recuperar o precioso fogo recém-descoberto e já que fora roubado. Por
meio dos pântanos e da neve, a tribo encontra três outras, cada uma em um estágio diferente
de evolução, caminhando para a civilização moderna.

5 ECONOMIA ESCRAVISTA
A economia escravista foi marcada por uma rígida divisão social. As
funções de cada indivíduo eram estabelecidas de acordo com a camada social
que pertenciam. Nobres (grandes proprietários de terras) ocupavam posições
privilegiadas. Na base da pirâmide social estavam os escravos e camponeses que
prestavam os serviços para a comunidade.

Os escravos eram constantemente obrigados a prestar serviços militares
e construir obras públicas. Eram capturados de alguma região inimiga por meio
de guerras ou dívidas.

Em fins do século VI a.C., a tirania predominante no último século


do período considerado arcaico foi derrubada por grupos comandados por
aristocratas, dando início ao período denominado pelo estudo da História como
o período clássico da civilização grega.

Em quase todas as cidades-estados, exceto Esparta, os reis tradicionais


foram depostos. A autoridade foi retomada pelas aristocracias locais, porém em
bases diferentes do período da tirania. Assim, a democracia iniciaria seu processo
de desenvolvimento.

Também se desenvolveram a produção artesanal e o comércio, trazendo


a necessidade de ampliar as áreas de cultivo. Tal expansão econômica só seria
possível graças à utilização de mão de obra escrava que forneceu trabalho em
mais diversos setores produtivos em troca de alimentação e moradia. Assim, a
presença do comércio e o escravismo eram características da economia escravista.

Ainda sobre a economia em questão, é importante perceber que para se ter


cidadania, isto é, gozar de direitos políticos e possuir terras, era preciso pertencer
a um grupo de proprietários de terras, sendo que o restante da população,
principalmente os escravos, não eram considerados cidadãos.

9
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

Rezende Filho (1991, p. 24) chama a atenção de que “foram as cidades-


estados gregas que, pela primeira vez na história, tornaram a escravidão a
forma dominante na extensão, transformando-a, de forma de trabalho auxiliar e
complementar, em um sistemático modo de produção”.

Ainda sobre o olhar da economia escravista, Anderson (1987, p. 31)


observa que:

o trabalho escravo no campo permitiu que os proprietários de terra


pudessem se dedicar a outras atividades, estas sim urbanas. Com
isso, determinado modo de produção escravo criou um sistema onde
o trabalho escravo criou excedentes que sustentaram a riqueza e o
conforto da classe urbana do período clássico.

Por fim, é importante notar que determinada organização social


possuía uma autonomia política e suas relações de produção eram baseadas,
principalmente, no trabalho escravo, nas mais diversas formas. Além disso, com
o artesanato houve a dinamização das práticas comerciais na maioria das cidades-
estados. Determinada realidade fortaleceu as relações de troca monetária, gerando
necessidades de conquistas, novas áreas consumidoras (novas demandas) e novas
matérias-primas para os produtos.

FIGURA 2 – ECONOMIA ESCRAVISTA

FONTE: Enciclopédia ilustrada. Editora Educacional Brasileira S.A. 1979.

10
TÓPICO 1 | ORGANIZAÇÃO SOCIAL

LEITURA COMPLEMENTAR

O modo de produção escravo


Perry Anderson

[...] O trabalho escravo da Antiguidade Clássica incorporava dois atributos


contraditórios demonstrando ser a unidade o segredo da paradoxal precocidade
urbana do mundo greco-romano. Por um lado, a escravidão representa a mais
radical degradação rural imaginável do trabalho – a conversão de seres humanos
em meios inertes de produção tendo sua privação de todo direito social e sua
legal assimilação das bestas de cargas. Na teoria romana, o escravo da agricultura
era designado como sendo um instrumentum vocale, um grau acima do gado, que
constituía um instrumentum semi vocale e dois acima do implemento, denominados
instrumentum mutum.

Por outro lado, a escravidão era simultaneamente a mais dramática
comercialização urbana concebível de trabalho: a total redução da individualidade
do trabalhador a um objeto padronizado de compra e venda nos mercados
metropolitanos de comércio de mercadorias. A destinação da maior parte dos
escravos na Antiguidade clássica era o trabalho agrário (não acontecia sempre em
todos os lugares; mas era o caso, no conjunto); sua reunião, alocação e despacho
eram normalmente efetuados a partir de mercados das cidades, locais onde
muitos deles, claro, eram empregados também. Assim, a escravidão era o vínculo
que unia cidade e campo para o desmedido benefício da polis.

Ela tanto mantinha agricultura cativa que permitia o dramático


distanciamento de uma classe dominante urbana de suas origens rurais, quanto
promovia o comércio interurbano que era o complemento da agricultura no
mediterrâneo. Os escravos, entre outras vantagens, eram um bem eminentemente
móvel num mundo onde os transtornos do transporte condicionavam a estrutura
de toda a economia. Eles podiam ser deslocados sem dificuldade de uma região
para outra; podiam se treinados em muitas diferentes especializações. Em épocas
de abundância de estoque, além disso, eles serviam para manter os custos
baixos onde trabalhadores contratados ou artífices estivessem trabalhando, por
constituírem uma fonte alternativa de trabalho. A riqueza e o conforto da classe
urbana proprietária da antiguidade clássica – acima de tudo a de Atenas e Roma
em seu apogeu – repousavam sobre o amplo excedente que rendia a difusa
presença do sistema de trabalho que não deixava nenhum outro intacto.

O preço a pagar pelo esquema brutal e lucrativo era, contudo, alto. As


relações escravagistas de produção determinavam alguns limites insuperáveis
para as antigas forças de produção na época clássica. Acima de tudo, eles tenderam
a paralisar a produtividade na agricultura e na indústria [...].

Aconteceram, naturalmente, alguns melhoramentos técnicos na economia


da Antiguidade Clássica. Nenhum modo de produção está totalmente desprovido
de progresso material em sua fase ascendente, e o modo de produção escravo,
11
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

em seus primórdios, registrou alguns avanços importantes no aparelhamento


econômico desenvolvido no arcabouço de sua nova divisão social do trabalho.
Entre eles podemos contar a disseminação de mais lucrativas culturas de vinho,
azeite, a introdução de moinhos rotativos para cereais e a melhoria na qualidade
de pão. Foram criadas as prensas de parafuso, o vidro soprado se desenvolveu
e os sistemas de produção de calor se refinaram; a combinação de culturas, o
conhecimento botânico e a drenagem do campo provavelmente progrediram.

Não houve, portanto, uma parada técnica no mundo clássico. Ao mesmo
tempo, não ocorreu um enxame de invenções que impulsionasse a economia antiga
para forças de produção qualitativamente novas. Nada é mais impressionante,
em qualquer comparação retrospectiva, do que a estagnação técnica global da
antiguidade. Basta contrastar o registro de seus oito séculos de existência – da
ascensão de Atenas à queda de Roma – com a extensão equivalente do modo de
produção feudal que lhe sucedeu para perceber a diferença entre uma economia
relativamente estática e outra dinâmica.

Ainda mais dramático, naturalmente, era o contraste dentro do próprio


mundo clássico entre sua vitalidade cultural e superestrutural e seu embotamento
infraestrutural. A tecnologia manual da Antiguidade era exígua e primitiva não
apenas pelos padrões externos de uma História posterior, mas sobretudo pela
medida de seu próprio firmamento intelectual – o qual, em muitos aspectos
críticos, sempre permaneceu bem mais alto que o da Idade Média ainda por
chegar.
FONTE: ANDERSON, Perry. Passagens da antiguidade ao feudalismo. São Paulo: Brasiliense,
1987, p. 24-26.

DICAS

A Odisséia. Diretor: Francis Ford Coppola. Nacionalidade: EUA. Duração: 150


min. Ano: 1977. Descrição do filme: Após dez anos, a Guerra de Tróia, conflito bélico entre
gregos e troianos, chega ao fim e o herói Odysseus faz uma viagem de volta para casa. Ele
enfrenta criaturas mitológicas, deuses e outros inimigos poderosos. A adaptação do poema
épico de Homero revela a força e bravura do herói e a sua luta para voltar ao lar, onde
é aguardado pela amada Penélope. Disponível em:<http://www.adorocinema.com/filmes/
filme-206991/>.

12
TÓPICO 1 | ORGANIZAÇÃO SOCIAL

6 O PENSAMENTO ECONÔMICO NA ANTIGUIDADE:


GRÉCIA E ROMA
Trabalharemos o pensamento econômico de Grécia e Roma, bem como
dialogaremos com os filósofos Platão e Aristóteles. Vamos lá?

6.1 A GRÉCIA E SUA CONSTRUÇÃO DE PENSAMENTO


Os filósofos gregos mais conhecidos foram: Sócrates (470-399 a.C.), Platão
(429-348 a.c.) e Aristóteles (348-322 a.C.), conforme veremos na figura a seguir:

FIGURA 3 – OS PENSADORES SÓCRATES, PLATÃO E ARISTÓTELES

FONTE: Enciclopédia ilustrada. Editora Educacional Brasileira S.A. 1979.

Sócrates defendeu que a reflexão e a virtude eram fundamentais para a


vida. Por criticar as instituições políticas e sociais de Atenas, foi condenado à
morte em 399 a.C. O que se sabe do pensamento socrático foi registrado por seus
discípulos, principalmente por Platão.

Fundador da Academia de Atenas, Platão afirmava que o real existia no


plano das ideias ao passo que as coisas concretas e perceptíveis aos sentidos
não passavam de sombras ou projeções. A tarefa dos filósofos, no pensamento
platônico, seria libertar os homens das impressões sensoriais para que pudessem
perceber as coisas como realmente eram. Deixou registro de pensamento
na obra “A república (1993)”, que tende a mostrar que a cidade perfeita será
necessariamente grega. Se houver divergências internas, elas devem ser resolvidas
com benevolência”.

Ainda, Aristóteles foi considerado como o pai da lógica. Partindo de


Sócrates e de Platão, sistematizou os princípios da lógica que chamou analítica.

13
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

Aristóteles deixou registro de seu pensamento em livros como Ética a Nicômaco


(1991), entre outros.

Observado o contexto histórico do período, vamos dialogar agora sobre


o pensamento econômico na antiguidade. Já vimos também que o modo de
produção dominante era escravista.

Assim, na filosofia daquele momento de Aristóteles e Platão, justificava


o modo de produção, no sentido de que “escravos eram sub-homens que não
poderiam ser senhores de sua própria vida e que necessitam de comando, sendo,
portanto, um fenômeno natural” (PLATÃO, 1993, p. 36).

Vejamos uma citação de Platão (1993, p. 49):

Qualquer pessoa, desde que goze de perfeita sanidade mental, poderá tomar,
se o desejar, seu próprio escravo e empregá-lo para qualquer finalidade legal; e
em nome de um outro homem [...]. Ele poderá botar suas mãos sobre o escravo
foragido a fim de assegurar a sua salvaguarda.

Ao se observar a lógica do comércio na Grécia, percebe-se que constituía um


meio econômico favorável, mas os recursos limitados impunham à solidariedade,
elemento ético em torno da Grécia. Desprezava-se a riqueza. Para ele a cidade
tinha a função essencialmente política, vejamos:

Afirmamos que é imperioso não haver no Estado nem ouro nem prata, e nem
tampouco muitas formas de ganhar dinheiro mediante o comércio vulgar, a
usura e a criação vergonhosa de animais, mas apenas aquele lucro possibilitado
e produzido pela agricultura e ainda na medida em que tal atividade que tem
como objetivo o ganho de dinheiro não leve as pessoas a negligenciar os objetos
para os quais o dinheiro existe [...] (PLATÃO, 2002, p. 37).

Platão critica a lógica do comércio e defende a lógica da agricultura.


Assim ficavam proibidas as lógicas da posse de riquezas, como de metais e o
empréstimo a juros.

Além disso, o pensamento do filósofo sobre a vida econômica na


perspectiva da ética era garantir a vida comunitária que surgiria naturalmente
pela especialização do trabalho, da relação entre os cidadãos e os trabalhadores
da cidade. Defendia-se a propriedade privada e na Grécia o valor de uso e de troca
das mercadorias estaria relacionado à necessidade de ampliação do comércio.
Também havia moedas para trocas (no sentido de uma troca justa), mas seria
considerada apenas como meio de troca e unidade, pois ter moeda como reserva
de valor era condenável.

14
TÓPICO 1 | ORGANIZAÇÃO SOCIAL

6.2 O PENSAMENTO ECONÔMICO EM ROMA


Antes de observarmos elementos específicos do pensamento econômico
romano, vamos nos atentar ao seu contexto histórico. Nos primeiros tempos da
República Romana, a sociedade estava dividida em quatro classes consideradas
principais: patrícios, plebeus, clientes e escravos.

Os patrícios ou aristocratas eram os grandes proprietários rurais e


dominavam as instituições políticas republicanas. Os plebeus eram a maioria da
população e correspondiam aos pequenos agricultores, comerciantes, artesãos e
pastores. Os clientes, que não possuíam propriedades, colocavam-se a serviços
dos patrícios. Os escravos, no início da República, eram pouco numerosos, mas
seu número aumentou bastante como consequência de guerras e conquistas.


No período republicano, a estrutura do poder em Roma se concentrou em
instituições como o Senado, as assembleias e as magistraturas, que abrangiam o
conjunto de cargos de poder executivo, como os gestores (que administravam o
tesouro público) e os pretores (que administravam a justiça).

É importante saber que a política expansionista da República Romana teve


inicialmente como objetivos básicos a defesa diante de povos vizinhos rivais e a
obtenção de terras necessárias à agricultura e ao pastoreio, mas logo se revelou
uma fonte de riquezas em metais preciosos e escravos.

Observada a construção histórica, percebemos que o meio econômico de


Roma era mais intenso que na Grécia, pois como vimos, tratava-se de um império
com boas vias de comunicação, área urbana com forte presença de fornecimento
de água, captação de esgoto, proteção, entre outros. A expansão do Império
Romano foi orientada para a agricultura, em paralelo à construção de estradas.

O pensamento econômico de Roma estava muito voltado para a dominação


política, para a posse de riqueza como meio da conquista e dominação militar.

Podemos entender que o pensamento econômico da antiguidade estava


muito atrelado ao país da Grécia e a Roma. Na Grécia tinha-se uma tendência
mais intervencionista, no sentido da figura do Estado auxiliar nas dificuldades de
abastecimento de produtos, meios de subsistências da vida comunitária. Enquanto
isso, em Roma, houve a tendência mais individualista, com fundamentos no
direito romano do olhar individual, do esforço próprio, uma influência tardia
na evolução das ideias econômicas dos fisiocratas e os clássicos (que veremos na
próxima unidade).

15
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

E
IMPORTANT

Segundo Feijó (2001), no período para Aristóteles, há uma distinção importante


entre economia (oikonomik) e crematística (chrematistik). A ciência da administração
doméstica preocupa-se com o consumo e a riqueza no sentido de satisfazer as necessidades
humanas. Já a cremastica estuda tudo que diz respeito à aquisição de riquezas, incluindo o
ganho e o acúmulo de dinheiro por empréstimo e comércio que seriam considerados os
modos não naturais, sendo condenados pelo Aristóteles, pois vai contra a moral. Assim, a
economia não se separa nem da política, nem da moral.

LEITURA COMPLEMENTAR

A república

[...] Sócrates – Diz-me, Céfalo, tu obtiveste por herança teus bens ou os


conquistaste?

Céfalo – Quanto é que conquistei, Sócrates? Como comerciante, fiquei


entre meu avô e meu pai. Meu avô, de quem possuo o mesmo nome, recebeu por
herança uma fortuna quase igual à que tenho agora, e a aumentou. Enquanto meu
pai, Lisânias, tomou-a menor do que é hoje. Eu ficarei satisfeito se não a deixar
diminuída a estes jovens, e sim um pouco superior.

Sócrates – Perguntei-te isto porque pareceu-me que não estimas a riqueza


em excesso, ao contrário daqueles que a adquirem com o próprio trabalho, os
quais a prezam muito mais. Da mesma maneira que os poetas adoram seus
versos, e os pais aos filhos, um comerciante preza sua riqueza por ser obra sua, e
também por causa de sua utilidade, igualmente a todos os outros homens. Este
é o motivo por ser difícil a convivência com eles, pois se interessam apenas pelo
dinheiro.

Céfalo – Tens razão.

Sócrates – Diz-me mais uma coisa: qual foi o maior proveito que recebeste
pelo fato de possuíres tão grande fortuna?

Céfalo – Se eu o dissesse, não conseguiria convencer muitas pessoas. Como
tu sabes, Sócrates, quando alguém chega à idade em que toma consciência de que
logo morrerá, surgem-lhe o temor e a preocupação a respeito de assuntos nos quais
antes não pensava. Efetivamente, tudo o que se conta a respeito do Hades, onde
serão expiados os atos maus praticados em vida, todas essas fábulas das quais até

16
TÓPICO 1 | ORGANIZAÇÃO SOCIAL

então ele fazia troça, agora aterrorizam sua alma, por temer que correspondam
à verdade. E esse alguém – devido à debilidade da velhice, ou porque divisa
agora com maior clareza as coisas do além – toma-se repleto de desconfianças
e receios, inicia a fazer cálculos e a analisar se cometeu alguma injustiça com
alguma pessoa. E aquele que encontrar em sua vida pregressa muitas maldades
intimida-se, seja acordando numerosas vezes durante a noite, da mesma forma
que as crianças, seja esperando alguma desgraça. Ao contrário, aquele que sabe
não haver cometido injustiças sempre alimenta uma doce esperança, benévola
ama da velhice, como declara Píndaro. São encantadoras as palavras deste
poeta, ó Sócrates, a respeito de quem tiver levado uma existência justa e pura:
“a doce esperança que lhe acalenta o coração acompanha-o, qual amada velhice,
a esperança que governa, mais que tudo, os espíritos vacilantes dos mortais”.
Palavras maravilhosas. Devido a isto, tenho as riquezas em grande apreço, não
para todos, mas somente para aqueles homens moderados e cautelosos. Jamais
enganar alguém ou mentir, ainda que inadvertidamente, nem ser devedor, quer
de sacrifícios aos deuses, quer de dinheiro a uma pessoa, e depois falecer sem
nada recear. Para isso, a riqueza é de grande serventia [...].

FONTE: PLATÃO. A república. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian. Tradução de Maria Helena
da Rocha Pereira. 1996. p. 06-07.

17
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu:

• Como ocorre a formação de organizações sociais.

• Como iniciou a exploração da Terra, a descoberta do fogo, a criação de


instrumentos e a convivência dos seres humanos em grupos, bem como cultivo
de alimentos e domesticação de animais.

• Que na economia primitiva a terra era um bem comum, não existiam instituições
privadas, as relações econômicas eram em base de escambo primitivo, sejam
arcos, flechas, dentes ou pele de animais, entre outros. Não existia moeda como
forma de troca de mercadorias da época.

• Que a economia escravista foi marcada por uma rígida divisão social. As
funções de cada indivíduo eram estabelecidas de acordo com a camada social
que pertenciam. Nobres (grandes proprietários de terras) ocupavam posições
privilegiadas. Na base da pirâmide social estavam os escravos e camponeses
que prestavam os serviços para a comunidade.

• Que o pensamento econômico do período estava muito atrelado à Grécia e


a Roma. Na Grécia tinha-se uma tendência mais intervencionista, no sentido
da figura do Estado auxiliar nas dificuldades de abastecimento de produtos,
meios de subsistências da vida comunitária; em Roma havia a tendência mais
individualista, com fundamentos no direito romano do olhar individual, do
esforço próprio.

18
AUTOATIVIDADE

1 Qual é o conceito de história econômica?

2 O que podemos entender por organização social?

3 A base da propriedade era comunitária, logo, somente assim seriam


superadas as dificuldades decorrentes da precariedade dos instrumentos
de trabalho. As pessoas unidas em grupos dividiam o fruto do trabalho de
forma igualitária e com pouca possibilidade de acumulação de bens e de
formação de propriedade privada em função da pequena produção. Está se
referindo ao modo de produção:

a) ( ) Mercantilista.
b) ( ) Comunista primitivo.
c) ( ) Feudal.
d) ( ) Asiático.
e) ( ) Socialista.

4 Na Grécia e Roma antiga, a maior parte da população era formada de:

a) ( ) Servos coletivos que pagavam taxas ao governo em forma de trabalho e


de produtos.
b) ( ) Trabalhadores livres que ganhavam salários pelo seu trabalho.
c) ( ) Escravos oriundos das guerras de conquista.
d) ( ) Pequenos proprietários rurais, formando uma sociedade bastante igualitária.
e) ( ) Trabalhadores de comunidades primitivas que caçam e colhiam.

5 Indique quais das afirmações a seguir estão corretas:

I. No modo de produção escravista, o senhor tem a propriedade tanto nos


meios de produção como sobre o próprio escravo e a produção por ele criada.
II. Filósofos, como Platão e Aristóteles, condenavam veementemente a
escravidão como algo indigno da condição humana.
III. Embora inicialmente os gregos usassem como mão de obra predominante
a escravidão, ao criarem uma sociedade democrática a instituição foi
completamente abolida.
IV. O trabalho escravo estimulava a atividade produtiva e o progresso
tecnológico, contribuindo para o constante desenvolvimento da economia.

a) ( ) Apenas a I e II.
b) ( ) Apenas a II e III.
c) ( ) Apenas a III e IV.
d) ( ) Apenas a I.
e) ( ) Apenas a III.

6 Explique o pensamento econômico na Grécia e Roma. O que os diferencia?


19
20
UNIDADE 1
TÓPICO 2

A IDADE MÉDIA

1 INTRODUÇÃO
Prezado acadêmico! Já chegamos ao Tópico 2 de nosso livro de estudos.
Aqui discutiremos sobre o contexto econômico na Idade Média. Apostamos que
você já ouviu falar do termo.

A Idade Média foi um período de histórias intermediárias entre a


antiguidade e novos descobrimentos. Observando a história geral, lembramos
que, no final do século IV, o Império Romano foi dividido em dois. Sua parte leste
contemplava o Império Romano do Oriente e do lado oeste, o Império Romano
do Ocidente. Este foi destruído em menos de um século e substituído por vários
reinos bárbaros.

Ainda, na fusão de nossa sociedade clássica e judaico-cristã é que nasce


na historiografia a necessidade da narrativa do acontecimento. Assim, sob a
influência da civilização romana e do cristianismo, os reinos criaram, lentamente,
a base da civilização ocidental. Veremos o movimento de forma detalhada aqui.

Vamos lá?

Bons estudos!

2 O OLHAR DA IDADE MÉDIA NA ECONOMIA


Percebemos que no modo de produção escravista havia a construção de
obras públicas grandiosas por meio do trabalho escravo, porém existiam limites.
Um deles seria a incompatibilidade com o progresso técnico, principalmente, na
área da agricultura que não avançou. Além de não haver mais cidades fronteiriças
para conquistar, a quantidade de escravos ia reduzindo e desarticulando a
antiguidade clássica.

A queda do período clássico também pode ser explicada com a invasão


de grupos nômades de diferentes origens que ultrapassaram as fronteiras do
enfraquecido Império Romano, saqueando suas cidades e ocupando boa parte
do território, sendo derrubado no final do século V pela sucessão de golpes dos
povos bárbaros.

21
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

E
IMPORTANT

O termo “povos bárbaros” foi usado para designar os estrangeiros incapazes de


falar corretamente a língua grega e considerados rebeldes a sua civilização.

Para Feijó (2001, p. 29) há no período uma estagnação econômica:

As antigas instituições entram em decadência e um novo conjunto de


crenças religiosas emerge então sob influência do cristianismo. Depois
de séculos de perseguição, em 313 o imperador Constantino legaliza
o culto cristão. O cristianismo converteu os europeus começando
pela periferia do império e pelas áreas rebeladas dos povos
bárbaros. Constantino chegou ao poder com o apoio dos germanos
e em contrapartida autorizou suas práticas religiosas cristãs. A nova
sociedade que começa a se formar é amalgama de tradições que reúne
as antigas instituições romanas, os costumes bárbaros, o credo da
bíblia e os aspectos da filosofia grega.

Toda a transformação vai culminar em mudanças de ordem econômica,
política e social que será conhecido como o modo de produção feudal.

Podemos adiantar o movimento da ruralização do processo econômico.


Houve uma diminuição das atividades econômicas, pois as moedas perdem seu
espaço de circulação e a atividade agrícola passará a ter uma lógica de subsistência.
Devido às constantes guerras/invasões do período, a população foi para o meio
rural em busca de proteção. Assim há um processo de ruralização da sociedade.

3 CONTEXTO HISTÓRICO-ECONÔMICO DA IDADE MÉDIA


O período conhecido como Idade Média diz respeito a uma fase da história
europeia, de cerca de mil anos que, segundo alguns historiadores, estende-se da
segunda metade do século V até a primeira metade do século XV.

Do século VI ao VIII, a Europa ocidental lutou para superar as desordens


causadas pela fragmentação do império e pela deterioração da civilização grego-
romana. No processo, um novo modelo de organização política começou a
criar raízes a partir dos remanescentes greco-romanos, das tradições dos povos
migrantes e da perspectiva cristã, porém seriam necessários séculos para que a
nova civilização florescesse.

Segundo Murilo (2015), tais fatos contribuíram para que alguns


pensadores do século XVI considerassem o período como um retrocesso cultural
e intelectual quando comparado à antiguidade. O próprio termo “Idade Média”
escolhido pelos renascentistas aponta para um sentido pejorativo. As ideias
22
TÓPICO 2 | A IDADE MÉDIA

foram reafirmadas pelos iluministas do século XVIII. Para eles, a Idade Média era
a “idade das trevas”, um tempo sombrio no qual a humanidade, subjugada pela
ignorância e contaminada pela peste, viveu oprimida sob o terror das fogueiras da
Inquisição. É importante ressaltar que, embora a concepção ainda esteja presente,
ela é rejeitada pela maioria dos historiadores.

Ainda, conforme Murilo (2015), no ano de 476, escolhido para marcar


o início da Idade Média, ocorreu a deposição do último soberano do Império
Romano do Ocidente, Rômulo Augustulo. Em 1453, a conquista pelos turcos da
cidade de Constantinopla, derradeiro baluarte do Império Romano do Oriente ou
império bizantino, marca o fim da Idade Média. Os quase mil anos entre os dois
eventos são geralmente divididos em dois períodos: Alta Idade Média (século
V ao X) e Baixa Idade Média (século XI ao XV). Somados, eles correspondem à
longa gestação do mundo moderno.

As magníficas catedrais erguidas na França e em outros países dão


testemunho da intensa religiosidade do período. Homens e mulheres de diversas
localidades da Europa adquiriram a consciência de formar um povo único, uma
entidade que pretendia espelhar e prefigurar a ordem celeste: a cristandade.

Procurando combater o preconceito tradicionalmente presente nos


escritos sobre a Idade Média, alguns estudiosos contribuíram para a elaboração
de uma nova perspectiva da época destacando, por exemplo, o avanço tecnológico
acontecido no período, como o aumento da utilização de pedra e de ferro nas
construções e o progresso no domínio marítimo por meio da construção de navios
com maior capacidade, o desenvolvimento da cartografia e o aperfeiçoamento e
instrumentos de navegação.

E
IMPORTANT

Na Idade Média, o livro por excelência foi a Bíblia. Pode-se dizer que a quase
totalidade do que se produziu em termos de reflexão e pensamento estava diretamente
relacionada aos textos sagrados do cristianismo ou as suas interpretações. Das escolas
monásticas às universidades, o essencial do sistema de ensino estava submetido ao controle
da Igreja, que, por sinal, manteve monopólio sobre a escrita até o século XII [...]. Assim,
reforçando os ensinamentos da religião, controlando as crenças e a moral das pessoas,
dirigindo o sistema de ensino e o universo cultural, penetrando nas consciências por meio
das confissões, a Igreja estendeu um poder sobre as formas de saber. Lembrando que, o
acesso à Bíblia estava restrito, pois a maior parte da população europeia era analfabeta.

FONTE: MICELI, Paulo. O feudalismo. São Paulo. Atual, 1992.

23
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

LEITURA COMPLEMENTAR

A Idade Média para os medievais



Que conceito tinham da “Idade Média” os próprios medievos? Questão
difícil de ser respondida, apesar dos progressos metodológicos das últimas
décadas. A resposta, mesmo provisória e incompleta, precisaria ser matizada
no tempo e no espaço, e ainda considerar pelo menos duas grandes vertentes,
a do clero, elaborada a partir de interpretações teológicas, e a dos leigos, presa
a concepções antigas, pré-cristãs. Simplificadamente, a bipolarização quanto à
História partia de duas visões distintas quanto ao tempo.


A postura pagã, fortemente enraizada na psicologia coletiva, aceitava a
existência de um tempo cíclico. As primeiras sociedades registravam o tempo
biologicamente, sem transformá-lo em História, portanto sem consciência de
sua irreversibilidade. Para elas, viver no real era viver segundo modelos extra-
humanos, arquetípicos. Assim, tanto o tempo sagrado (dos rituais) quanto o
profano (do cotidiano) só existiam por reproduzir atos ocorridos na origem dos
tempos. Daí a importância da festa de Ano-Novo, que era uma retomada do tempo
no seu começo, isto é, uma repetição da cosmogonia, com ritos de expulsão de
demônios e de doenças.

Tal concepção sofreu sua primeira rejeição com o judaísmo, que vê em


Iavé não uma divindade criadora de gestos arquetípicos, mas uma personalidade
que intervém na História. O cristianismo retornou e desenvolveu essa ideia,
enfatizando o caráter linear da História, com seu ponto de partida (Gênese), de
inflexão (Natividade) e de chegada (Juízo Final), portanto, linear, mas não ao
infinito, pois há um tempo escatológico – que só Deus conhece – limitando o
desenrolar da História, isto é, da passagem humana pela Terra.

Contudo, se o cristianismo reinterpretou a História, não pôde deixar de


sentir seu peso, inclusive da mentalidade cíclica, daí a liturgia cristã se basear
na repetição periódica e de eventos essenciais como Natividade, Paixão e
Ressurreição de Jesus. Ao participar da reprodução do evento divino, o fiel volta
ao tempo em que ele ocorreu, ou seja, a cristianização das camadas populares
não aboliu a teoria cíclica, pelo contrário, influenciou o cristianismo erudito e
reforçou certas categorias do pensamento mítico.

Em virtude disso, pelo menos até o século XII, os medievos não sentiam
necessidade de maior precisão no cômputo do tempo, o que expressava e
acentuava a falta de um conceito claro sobre sua própria época. De maneira
geral, prevalecia o sentimento de viverem em “tempos modernos”, devido à
consciência que tinham do passado, dos “tempos antigos”, pré-cristãos. Estava
também presente a ideia de que se caminhava para o fim dos tempos, não muito
distante. Espera difusa, que raramente se concentrou em momentos precisos.

24
TÓPICO 2 | A IDADE MÉDIA

Sabemos hoje que os pretendidos “terrores do ano 1000” foram uma criação
historiográfica, pois não houve nenhum sentimento especial e generalizado de que
o mundo fosse acabar naquele momento, mas é inegável que a psicologia coletiva
medieval esteve constantemente (ainda que com flutuações de intensidade)
preocupada com a proximidade do Apocalipse. Catástrofes naturais ou políticas
eram frequentemente interpretadas como indícios da chegada do anticristo. Havia
uma difundida visão pessimista do presente, porém carregada de esperança no
iminente triunfo do Reino de Deus.

O mundo medieval trazia implícita em si a concepção de um tempus


medium, precedendo a Nova Era. Tempo não monolítico, dividido em várias
fases. A quantidade e caracterização delas não eram, contudo, consensuais. A
periodização mais comum, ao menos entre o clero, concebia seis fases históricas,
de acordo com os dias da criação. Como no sétimo dia Deus descansou, na sétima
fase os homens descansarão no seio de Deus. Assim pensavam muitos, de Santo
Agostinho (354-430) e Isidoro de Sevilha (560-636) até Fernão Lopes (1380-1460).

Também teve sucesso uma concepção trinitária da História, surgida


no século IX com João Escoto Erígena (ca. 830 - ca. 880) e que teve seu maior
representante no monge cisterciense Joaquim de Fiore (1132-1202). Para este, a
Era do Pai ter-se-ia caracterizada pelo temor servil à lei divina, à Era do Filho
pela sabedoria, fé e obediência humilde, temor ao Espírito Santo (que começaria
em 1260) pela plenitude do conhecimento, do amor universal e da liberdade
espiritual. Qualquer que fosse a divisão temporal adotada se reconhecia que o
suceder das fases acabaria com a Parusia quando a História enquanto tal deixaria
de existir.

FONTE: FRANCO JUNIOR, Hilário, 1948. A Idade Média: nascimento do ocidente. Hilário Franco
Júnior. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Brasiliense, 2001, p. 18-20.

25
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• Do século VI ao VIII, a Europa ocidental lutou para superar as desordens


causadas pela fragmentação do império e pela deterioração da civilização
greco-romana.

• Período de deslocamento populacional.

• Junção dos elementos do antigo império, povos bárbaros e o cristianismo.

• Uma nova construção de organização política começou a criar raízes a partir


dos remanescentes greco-romanos, das tradições dos povos migrantes e
da perspectiva cristã, sendo necessários séculos para que a nova civilização
florescesse.

• Tais fatos contribuíram para que alguns pensadores do século XVI


considerassem o período como um retrocesso cultural e intelectual quando
comparado a antiguidade.

26
AUTOATIVIDADE

1 Explique o conceito histórico da Idade Média.

2 Assinale a alternativa correta:

No período da Idade Média, teve:

a) ( ) ruralização da economia.
b) ( ) crescente urbanização.
c) ( ) decadência demográfica.
d) ( ) renascimento dos comércios.

3 Quais foram os povos que construíram o contexto social da Idade Média? O


que eles tinham de diferente? E em comum?

27
28
UNIDADE 1
TÓPICO 3

FEUDALISMO

1 INTRODUÇÃO
Agora sim, acadêmico, chegou a hora de conversarmos sobre o modo de
produção feudal, ou seja, a forma de organização social no período da Idade
Média.

No Tópico 3, vamos observar como que se constituiu o feudalismo, as


relações de trabalho, a noção de tempo, entenderemos a evolução do sistema feudal
europeu, a questão econômica, a relação do feudo e direito, o movimento das
cruzadas, dialogaremos com os pensadores da Idade Média e compreenderemos
o processo de decadência da sociedade.

Sim, trabalharemos muita coisa. Estão preparados para continuar a


jornada de estudos?

Vamos lá?

2 CONSTITUIÇÃO DO MODO DE PRODUÇÃO FEUDAL


Para o autor Le Goff (1989), o feudalismo pode ser considerado como
um sistema de organização econômica, social e política baseada na hierarquia
de dependência. Os senhores donos de terras dominavam o campesinato que
trabalha na terra entre troca de proteção.

Assim, a ideia de feudalismo remete à ideia de troca de proteção e de


várias obrigações de trabalho. Aquele que cede o bem se torna seu suserano e
quem recebe passa a ser seu vassalo. A relação de vassalagem ocorria de cima
para baixo, seguindo a hierarquia da nobreza. A terra, o bem mais valioso,
passou a ser concedido como feudo; quem o recebia tornava-se um senhor feudal.
Formaram-se poucos proprietários de terra que detinham a lógica da suserania e
vassalagem. Todos eles viviam do trabalho da terra dos camponeses situados na
base da pirâmide social.

29
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

3 ORGANIZAÇÃO DA SOCIEDADE FEUDAL


A organização da sociedade feudal se dava basicamente em três divisões:
clero, nobreza e camponeses. Devemos observar a divisão na figura a seguir:

FIGURA 4 – SOCIEDADE FEUDAL

Clero

Nobreza

Camponeses

FONTE: A autora.

O clero é considerado como a presença da igreja católica na sociedade


feudal, desempenhando um papel de poder político e econômico centralizado e
de intermediar a salvação divina na passagem dos homens para o céu.

Sobre a importância da igreja no período, percebemos de acordo com


Macedo (1996, p. 56-57) que “por toda a Europa reinava apenas uma Igreja; se um
homem não era batizado na Igreja, não era membro da sociedade”. Quem quer
que fosse excomungado pela igreja perdia automaticamente seu direito a vida
[…]. Durante muito tempo não houve outra fonte de educação, além da igreja
católica […]. Era enorme a autoridade que a igreja possuía não só sobre as almas
dos homens como também sobre seus negócios”.

A nobreza era composta pela aristocracia, os detentores de terra. A nobreza


era uma camada de pequenas pessoas representada pelos duques, condes, barões
e cavaleiros. Os cavaleiros utilizavam as armas, tinham o cavalo para a guerra
e para as caçadas. Era o guerreiro que deveria proteger o seu feudo. Para Bloch
(1987), a própria vocação do nobre lhe proibia qualquer atividade econômica
direta. Ele pertencia de corpo e alma à função de guerreiro.

Os camponeses eram a maioria da população feudal. Trabalhavam


para produzir alimentos para a família para os senhores feudais. Havia ajuda
mútua entre os camponeses: aquele que possuía ferramentas, carroças ou arados
partilhava-os com os outros camponeses, pois a colheita era importante para
todos.

É importante observar que, ao contrário dos escravos que podiam ser


vendidos, o camponês podia ter um pedaço de terra para sustentar sua família e
ser proprietário dos meios de produção de seu sustento, além de que não podia
ser vendido, mesmo que o feudo passasse para outro senhor feudal, pois o regime
era servidão do terreno.

30
TÓPICO 3 | FEUDALISMO

Os servos estavam sujeitos a uma série de tributos que os condenava à


vida de intenso trabalho. Um dos tributos era a corveia que consistia no trabalho
compulsório e gratuito nas terras do senhor. Tinha-se a talha que obrigava os
camponeses a entregar ao senhor feudal parte da produção obtida em suas terras.
Ainda, pelo uso das ferramentas agrícolas havia o tributo banalidade, que dava
ao senhor o direito de apropriar-se de parte da produção.

E
IMPORTANT

Embora o feudo produzisse basicamente para a própria subsistência, existiu um


mínimo de atividade comercial, portanto, não podemos dizer que houve total retrocesso a
uma economia de ordem primitiva, mas ocorreu uma escassez de moedas na circulação e
distribuição de possíveis mercadorias.

4 TEMPO NA IDADE MÉDIA


A noção de tempo que temos hoje não era conhecida na Idade Média.
Não havia horas e calendários e muito mesmo a consciência de tempo regrado.
Segundo Le Goff (2002, p. 534):

O tempo da Idade Média é, em primeiro lugar, um tempo de Deus e da


terra, depois dos senhores e dos que estão sujeitos ao senhorio, depois
– sem que os tempos precedentes tenham deixado de ser presentes e
exigentes – um tempo das cidades e dos mercadores, e, finalmente, um
tempo do príncipe e do indivíduo.

Podemos perceber que a noção de tempo na Idade Média estava atrelada


à igreja. Ainda para Le Goff (2005, p. 159):

Para a igreja, que era a forma de denominar o tempo mais importante


do período, o tempo era apenas um momento da eternidade,
sendo, portanto de propriedade de Deus, só podendo por parte dos
medievos, ser vivido. Apanhá-lo, medi-lo, tirar partido ou vantagem
era considerado pela igreja como um pecado, assim como subtrair
uma parcela visto como roubo.

Assim, a igreja detinha a noção de tempo da sociedade, detendo também


a referência dos dias de pagamentos das rendas agrícolas e para os artesãos e
camponeses em geral. Le Goof (2005).

31
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

DICAS

Para saber mais sobre a Idade Média, assista ao filme: Lancelot: o primeiro
cavaleiro. Diretor: Jerry Zucker. Nacionalidade: EUA. Duração: 133 minutos. Ano: 1995.
Descrição: Quando Lancelot salva a Guinevere do ataque de um ex-cavaleiro, Sir Malagant,
eles se apaixonam. Só que a donzela está a caminho de Camelot, para se casar com o rei
Arthur, e assim segue seu caminho. Pouco tempo depois, Lancelot é nomeado cavaleiro do
rei, mas não conta a ele que conhece sua futura noiva. No reencontro com Guinevere, os
dois precisam decidir entre o verdadeiro amor e a lealdade ao rei. Disponível em: <http://
www.adorocinema.com/filmes/filme-12995/>. Acesso em: 7 maio 2018.

DICAS

LE GOFF, Jacques. A civilização do ocidente medieval. Bauru, SP: EDUSC, 2005.

5 O FEUDO E O DIREITO NA IDADE MÉDIA


O autor Bloch (2012, p.18) já explicava que na sociedade feudal existia
“basicamente” a relação entre servos e senhores, “cada vez mais o lugar do servo
na sociedade se definia pela sujeição para com outro homem”.

Ainda:

O servo trabalha nos campos ou nos prados do domínio. Ou ainda


o vemos transportar, por conta do senhor, pipas de vinho ou sacos
de trigo, para residências mais distantes. É à custa do suor dos seus
braços que são reparados os muros ou os fossos do castelo. Se o senhor
tem visitas, o camponês cede a sua própria cama para fornecer os leitos
necessários para os hóspedes. Quando chegam as grandes caçadas, é
ele quem sustenta a matilha de cães. Se finalmente rebenta a guerra,
é ele ainda que [...] se faz soldado de infantaria ou criado do exército
(BLOCH, 2012, p. 263).

Depois de observarmos a relação de trabalho da sociedade feudal num


sentido amplo, buscamos entender como se desenvolveu a instituição jurídica no
período.

Grossi (2014, p. 16) explica que a Idade Média jurídica tem suas origens
exatamente no clima intenso do desenvolvimento do feudalismo, que “se por
um momento prestarmos atenção no panorama histórico oferecido por aqueles
séculos, a corrupção política, a desordem social, a crise demográfica geral, a
penosa e cansativa sobrevivência cotidiana, a natureza das coisas físicas e sociais

32
TÓPICO 3 | FEUDALISMO

apresenta-se-nos com sua frugalidade meta-humana, como a única certeza, a guia


única e, como tal, a única fonte normativa”.

Assim, o direito medieval poderia ser entendido por meio do costume no
sentido de expandir-se e generalizar-se, no coletivo, o que tenderia a impregnar
as estruturas das normas.

Além disso, para Grossi (2014), entre os muitos fatos normativos


encontrados na organização feudal, três merecem destaque por sua função
cimentadora da nova ordem jurídica: a terra, o sangue e o tempo. Três fatos
recheados de normatividade, que organizariam a vida cotidiana e que hoje
chamaríamos de direito privado.

Em síntese, podemos refletir que, a constituição de uma organização


social necessita primeiramente de relações de trabalho que vão gerar as ossaturas
das instituições que regerão determinada sociedade, seja a econômica, a política,
a jurídica, entre outras. Como o objetivo era observar o desenvolvimento jurídico
no modo de produção feudal, compreendemos que o caráter normativo do
direito consuetudinário ficou gravado na consciência popular e integrado sem
questionamento nas atitudes oficiais para manter a ordem dos dominantes em
relação aos dominados do período, ou seja, o costume virou lei na Idade Média,
não havendo questionamento às normas.

6 A EVOLUÇÃO DO SISTEMA FEUDAL EUROPEU


Embora a vida econômica da Idade Média se baseou principalmente
na produção agrícola de subsistência, surgiram a partir do século XIII avanços
tecnológicos como a charrua, uma espécie de arado mais eficiente. O moinho
hidráulico foi aperfeiçoado e desenvolveram-se novas formas de atrelar animais,
o que aumentou o poder de tração. Também foi difundida a prática de rotação
de culturas, segundo a qual parte da terra ficava em repouso para que não se
esgotassem os nutrientes do solo. Com isso, os avanços tecnológicos possibilitaram
um aumento da produtividade agrícola que favoreceu o crescimento populacional
e permitiu a geração de excedentes para uma atividade comercial.

Segundo Mota (2005), criando a lógica comercial com comerciantes e
artesãos assegurando a produção, ainda que em base precária, e a circulação
de bens entre os domínios senhorias, as pessoas habitavam os burgos, lugares
fortificados que impulsionaram a retomada da vida urbana. O estilo de vida de
seus habitantes, os burgueses, mostrava-se bem diferente daquele que ocorria
dentro dos feudos, e suas atividades estariam entre os fatores responsáveis pela
destruição do próprio sistema feudal.

33
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

Para Mota (2005), os burgos, considerando uma atividade urbana de


início dos comércios nas cidades, permaneciam sob o controle dos nobres. E, no
decorrer dos tempos, com a expansão da atividade comercial, teve-se o comércio
marítimo no decorrer da Europa, na América e Ásia.

6.1 TRANSFORMAÇÕES NAS RELAÇÕES DE TRABALHO


O desprezo com que eram vistos os camponeses pelos senhores feudais,
bem como os altos impostos que recaíam sobre eles, provocaram inúmeros
movimentos de rebeldias contra a aristocracia. Além das revoltas camponesas,
nos domínios dos senhores feudais, foram abolidas algumas obrigações servis
e passaram a exigir pagamento em dinheiro ou em parte de excedente agrícola.
Alguns deles conseguiram obter rendas vendendo seus excedentes nos mercados
locais, enquanto outros abandonaram as lavouras e se especializaram na produção
artesanal e no comércio.

Determinadas mudanças provocadas pelo comércio e pelo movimento


urbano provocaram o confronto entre as visões dos senhores feudais com os
burgueses do outro. A questão da riqueza, apesar de não estar apenas relacionada
à terra, associava-se diretamente ao número de seus vassalos que viviam dentro
de suas propriedades e a perda das pessoas significava perda do sentido do modo
de produção feudal.

Sobre a usura, observemos segundo Le Goff (1989, p. 80-83):

O usurário que adquirir um lucro sem nenhum trabalho e até dormindo


vai contra a palavra de Deus que diz: “comerás teu pão com o suor o
teu rosto”. Assim, o usuário não vende a seu devedor nada que lhe
pertença, mas apenas o tempo que pertence a Deus. Disso, não deve
tirar nenhum proveito.

É necessário tornar a vida econômica compatível com a obtenção das


metas supremas da humanidade.

7 TENTATIVA DE SUSTENTAÇÃO DO FEUDALISMO: AS


CRUZADAS
Segundo Mota (2005), as cruzadas consistiam em expedições guerreiras
estimuladas pelo papado com vistas para a conquista da Terra Santa, isto é, dos
lugares da Palestina onde Jesus viveu e que havia séculos que estava sob o domínio
muçulmano. Foram convocados em 1095 pelo papa Urbano II, em nome de um
projeto de união da Cristandade contra os “infiéis”, detentores dos lugares santos
e em ofensiva contra os povos cristãos do Oriente. Os que delas participavam eram
chamados de cruzados; receberiam da igreja de Roma uma indulgência específica,
ou seja, o perdão de seus pecados caso partissem para a Terra Santa.

34
TÓPICO 3 | FEUDALISMO

Ao propor a Cruzada, Urbano II pretendia também reaproximar o ramo


latino e grego do cristianismo que haviam se dividido em 1054, em meio da
excomunhão recíproca entre o patriarca de Constantinopla e o papa Leão IX.
A meta não foi alcançada, permanecendo a Igreja Católica e a Igreja Ortodoxa
desunidas.

No terreno militar, as cruzadas obtiveram êxito em primeiro momento.


Apesar de ter menos pessoas, conseguiram paralisar a pressão muçulmana
sobre os territórios bizantinos e conquistar Jerusalém e outros trechos da Síria
e da Palestina, nos quais estabeleceram Estados Feudais, os chamados latinos.
Entretanto, o êxito dos europeus teve curta duração. Sob a liderança do sultão
Saladino, os muçulmanos derrotaram os cruzados em 1187 e reconquistaram
Jerusalém.

FIGURA 5 – AS CRUZADAS

FONTE: Enciclopédia ilustrada. Editora Educacional Brasileira S.A. 1979.

E
IMPORTANT

As cruzadas exerceram forte influência na evolução da civilização europeia. Os


mercadores enriqueceram, pois, aproveitando-se das viagens, criaram novas oportunidades
de comércio.

Com novas oportunidades de comércio, houve o fortalecimento do


poder real, uma vez que os negociantes apoiavam a Coroa. Por outro lado, a
crescente necessidade de transportar peregrinos propiciou novos investimentos
na construção naval e na indústria de bens de consumo.

35
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

UNI

Quer saber mais sobre as Cruzadas? Acesse: <https://www.youtube.com/


watch?v=bLUkuuczGr8>. Acesso em: 22 jan. 2018.

8 A DECADÊNCIA DO FEUDALISMO
No decorrer dos séculos XIV e XV, após um longo período de relativa
prosperidade, a economia da Europa Ocidental passou por uma violenta crise.
Entre as causas da retração podemos citar os efeitos da peste negra, introduzida
na Europa por volta de 1348. Provavelmente de origem oriental, a peste foi
responsável pela morte de milhares de pessoas. Acredita-se que um quarto da
população europeia tenha sido dizimada o que provocou a desorganização da
produção e, com isso, a fome generalizada.

Segundo Mota (2005, p.102-103):

A peste negra devasta a Europa e ceifa um terço de sua população


durante o verão de 1348. Essa epidemia é vivida como uma punição
para o pecado. Então, procuram-se bodes expiatórios e encontram-se
os judeus e os leprosos, acusados de envenenarem os poços. As cidades
isolam-se, proibindo a entrada do estrangeiro suspeito de trazer o mal.
A morte está em toda a parte, na vida, na arte. Contudo, os homens
desse tempo temem muito uma outra doença, a lepra, considerada o
sinal distintivo do desvio sexual. Nos corpos desses infelizes refleter-
se-ia a podridão de sua alma. Então os leprosos são isolados.

Segundo Murilo (2015), para a maioria da época, a peste negra era um


castigo divino por pecar. Enquanto alguns olhavam com ódio para os doentes
e estrangeiros, responsabilizando-se pelas epidemias, outros começaram a ver
o mundo diferente, questionando a ordem feudal. Associada à crise econômica,
a mudança de mentalidade contribuiu para modificações políticas, econômicas,
sociais e culturais que resultaram no colapso de muitas estruturas do sistema em
vigor.

36
TÓPICO 3 | FEUDALISMO

E
IMPORTANT

O nome Peste Negra foi dado devido aos enfermos apresentarem manchas
escuras pelo corpo, principalmente próximo as articulações. A morte, nesses casos, era
relativamente rápida levando de três a cinco dias no máximo. Para marcar as cidades e navios
que tinham a presença da peste, era hasteada uma bandeira preta. Isso fez com que muitos
navios piratas usassem a tática para se aproximar de outras embarcações (que vinham ao
encontro deles com o intuito de ajudar) e saqueá-las.

Assim, as secas, a diminuição da produção agrícola e a fome agravaram


ainda mais a situação. Nos campos vazios, os sobreviventes exigiram melhores
condições de trabalho e uma maior parcela da produção. A resposta dos senhores
foi a imposição de medidas restritivas visando dificultar a saída dos servos dos
feudos. Ao mesmo tempo, nas cidades, os reis tentavam impor aos artesãos os
antigos salários, anteriores a epidemia.

Com isso, as revoltas no modo feudal e as fugas dos camponeses


aumentavam. E apesar da repressão dita acima, as diferenças entre os ricos
mercadores e os mestres das corporações aumentavam. Tentavam controlar
desde a etapa da produção até o preço final das mercadorias, mas isso se fazia
bastante complicado, pois o comércio internacional obtinha lucros crescentes.
Então, determinada crise generalizada obrigou várias categorias sociais a buscar
respostas.

Uma resposta seria o apoio à burguesia comercial, baseando-se no poder


dos reis para restabelecer a ordem e abrir novos mercados. É o que discutiremos
no próximo item.

37
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

LEITURA COMPLEMENTAR

A peste negra

O enorme arquivo da peste não cessa de aumentar, principalmente as


explicações de se amontoarem umas sobre as outras. Para começar, a doença é
pelo menos dupla: peste pulmonar por um lado, nova forma do mal que irrompe
na história com a pandemia de 1348 na Europa; peste bubônica, por outro, mais
antiga (bubões que se formam na virilha e gangrenam). São as marcas de Deus,
os God’s tokens ou, mais correntemente, tokens, em francês os tacs, parecidos com
os botões de metal ou de coro que os comerciantes põem em circulação. Acontece
bastar um para ser fata. A peste negra pulmonar é devida ao vírus transmitido
pelo Mus Rattus. Ora, este, dizia-se outrora, teria invadido a Europa e os celeiros
logo após as Cruzadas. Teria vingado o oriente tal como, em 1492, o fizera o
treponema pálido com a América recém-descoberta.

[...] Logo que o mal aparece, os ricos mudam-se, se podem, para as suas
casas de campo, numa fuga precipitada; cada qual só pensa em si: a doença torna-
nos mais cruéis uns para os outros como fossemos cães, observa Samuel Pepys
em setembro de 1665. E Montaige conta como, tendo sua terra sido atingida pela
epidemia, serviu durante seis meses, uma família perdida que metia medo tanto
aos amigos, como a si própria e horror onde quer que tentasse se instalar. Quanto
aos pobres, ficam sós, imobilizados na cidade contaminada onde o Estado os
alimenta, os isola, os bloqueia, os vigia. O Decameron de Boccaccio é uma série
de conversas e de relatos em uma vivenda perto de Florença, no tempo da peste
negra. Em agosto de 1523, mestre Nicolas Versoris, na Grande Bateliere, então
fora de Paris, se instala na casa de campo das suas pupilas, tem sua mulher
levada pelo mal em três dias. No verão, a peste em Paris atinge, uma vez mais, os
pobres. Como escreve este mesmo Versaris no seu Livre de Raison, principalmente
a morte tinha-se voltado contra os pobres, de maneira que dos carregadores,
que ganhavam o seu dinheiro em Paris e que, antes dos acontecimentos, eram
numerosos em Paris, só muito poucos ficam [...].

Em relação ao quarteirão de Petit Champs, toda a região ficou limpa


de pobres que antes aí habitavam em grande número. Um burguês de Toulose
escreve tranquilamente em 1561: o dito mal contagioso nunca se pôs senão na
gente pobre […]. Deus assim quis na sua misericórdia […]. Os ricos resguardam-
se. J. P. Satre tem razão em escrever: A peste atua apenas como exagero das relações
de classe. Ataca a miséria, poupa os ricos. Na Saboia, terminada a epidemia, antes
de regressarem a suas casas devidamente desinfetadas, os ricos instalam durante
algumas semanas uma pobre, a ensaiadeira, encarregada de verificar com a sua
vida se o perigo está afastado.

FONTE: Braudel, Fernand. Civilização material, economia e capitalismo: séculos XV a XVIII. São
Paulo, Martins Fontes, 1995.

38
TÓPICO 3 | FEUDALISMO

FIGURA 6 – SANTO AGOSTINHO E THOMAS DE AQUINO

FONTE: Enciclopédia ilustrada. Editora Educacional Brasileira S.A. 1979.

Santo Agostinho e São Thomas de Aquino entendiam que Deus seria


eterno e transcendente, sendo o criador de tudo que existe no universo. Tinham a
pobreza como ideal de vida e São Tomaz de Aquino tinha a ideia de preço justo
dos escolásticos.

Para Santo Agostinho, para se chegar à fé, precisa-se antes fazer uma
atividade que exige das pessoas capacidade de se perguntarem e de oferecerem
razões para aquilo em que depositam a sua fé. Santo Agostinho ama a Deus e
sempre busca mais a Ele e necessita de sua lógica da eudaimonia. Para o Santo,
é somente no interior da alma que se encontrará a Deus e precisamos sempre
vencer as forças exteriores da natureza.

Segundo Ratzinger (2008, p.46-47), São Tomas de Aquino diz que a


“filosofia é a razão pura procurando responder às questões últimas da realidade.
Conhecimento filosófico é somente o conhecimento a que se pode chegar pela
razão como tal, sem se recorrer à Revelação”. A filosofia por excelência era o
próprio cristianismo, assim a relação entre filosofia e teologia era de profunda
unidade e reciprocidade, pois, sendo Deus o criador da ordem racional e autor da
fé, não poderia haver contradição em ambas. O que se tem é o olhar da escolástica
que “caracterizou-se pelo uso da filosofia como instrumento de interpretação da
Sagrada Escritura, e de clarificação e defesa da fé em vista da construção de uma
doutrina sistemática (RATZINGER, 2008, p.46-47).

Ademais, um exemplo de como o pensamento de Tomas de Aquino


emprega a razão em serviço da fé cristã é o conjunto de argumentos, todos de
cunho empírico, isto é, que se demonstram por via da experiência, que provam a
existência de Deus. São eles:

39
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

• Segundo Mota (2005), o universo existe movimento e todo movimento


pressupõe uma causa alheia ao objeto em movimento. Deus é o termo do
movimento, o Motor Imóvel ou Primeiro Motor.
• Todas as coisas ou são causas ou são efeitos. Deus é a causa não causada, o
termo da série de causalidades. Deus é a primeira causa eficiente.
• Para que o contingente exista, é preciso que algo de necessário, de absoluto lhe
dê existência; Deus como verdade e bondade em si, que serve de parâmetro
para estabelecer uma hierarquia de graus de perfeição de todas as coisas.
• Deus como inteligência perfeita e soberana, ordenadora da finalidade das
coisas.

Em síntese, as leis humanas mudam conforme a evolução do homem,
mas a lei de Deus, por ser divina, é absolutamente imutável. Assim, por mais
que tinham pensamentos distintos, Santo Agostinho e São Tomas de Aquino não
fugiam da essência de estudar e compreender a razão e fé, considerado o período
da escolástica onde tentaria se conciliar as ideias de humanas e as de Deus, dado
que no período já começasse a questionar se tudo estava em volta da salvação
divina apenas.

Curiosidade sobre as cruzadas: O intercâmbio entre muçulmanos e


cristãos aumentou nos séculos XI e XII com as cruzadas. A criação das primeiras
universidades abriu novos espaços para a difusão do conhecimento. Segundo
o historiador Le Goff (1989), o homem tinha interesse em captar o universo e
descobrir o lado oculto de seu cotidiano e mentalidade. Coube aos humanistas,
como foram chamados homens ligados à renovação da filosofia, da ciência e
da literatura na modernidade, enfatizar a complexidade das transformações
ocorridas na Europa Ocidental a partir do século XII. Com isso, tornaram o
movimento renascentista não um fenômeno isolado, mas um dos elos de uma
vasta cadeia que assinalou a transição da considerada Idade Média para a Idade
Moderna.

40
TÓPICO 3 | FEUDALISMO

LEITURA COMPLEMENTAR

O mundo de Sophia
Jostein Gaarder

[…] Podemos dizer, sem exagero, que no Renascimento a humanidade


começou a se libertar das condições que lhe eram impostas pela natureza. O
homem deixou de ser apenas uma parte da natureza. A natureza passou a ser
algo que se podia usar e explorar. “Saber é poder”, dizia o filosófo inglês Francis
Bacon, sublimando com isto a aplicação prática do conhecimento e isto era uma
coisa nova. A humanidade passou a intervir na natureza e a querer controlá-la,
mas isto não foi uma coisa positiva? Sim e não. Vamos retomar aqui os fios do
bem e do mal que se entrelaçam em tudo o que o homem faz.

A ruptura tecnológica iniciada no Renascimento levou aos teares e


ao desemprego, aos remédios e a novas doenças, à eficiência controlada da
agricultura e à exploração da natureza, a novos utensílios como máquinas de
lavar e geladeiras, e também à poluição ambiental e às montanhas de lixo. O fato
de assistirmos hoje à terrível degradação de nosso meio ambiente levou muitos a
verem a ruptura tecnológica como um perigoso desvio das condições de vida que
nos são dadas pela natureza. Para estas pessoas, o homem colocou em marcha
um processo que não pode mais controlar. Outros, mais otimistas, acreditam
que ainda nos encontramos na infância da tecnologia. A civilização tecnológica
acredita eles, também tem suas doenças de infância; mas no fim os homens vão
aprender a controlar a natureza, sem com isso ameaçá-la em seus pontos vitais
[…].

FONTE: GAARDER, Jostein. O mundo de Sofia. São Paulo. Companhia das letras. 1998.

41
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• O feudalismo pode ser considerado como um sistema de organização rural,


com feudos, castelos e muro protetores.

• A organização se dava basicamente em três divisões: clero, nobreza e camponês.

• A noção de tempo que temos hoje não era conhecida na Idade Média. Não
havia horas e calendários e muito mesmo a consciência de tempo regrado.

• O costume virou lei na Idade Média, não questionavam as normas.

• Embora a vida econômica da Idade Média se baseou principalmente na


produção agrícola de subsistência, surgiram avanços tecnológicos como a
charrua a partir do século XIII, uma espécie de arado mais eficiente. O moinho
hidráulico foi aperfeiçoado e desenvolveram-se novas formas de atrelar
animais, o que aumentou o poder de tração. Também foi difundida a prática
de rotação de culturas, segundo a qual parte da terra ficava em repouso para
que não se esgotassem os nutrientes do solo. Com isso, os avanços tecnológicos
possibilitaram um aumento da produtividade agrícola que favoreceu o
crescimento populacional e permitiu a geração de excedentes para uma
atividade comercial.

• O estilo de vida era predominante agrário. Contudo, com o tempo, teve-se


a construção comercial, por meio dos burgos. O estilo de vida era diferente
daquele que ocorria dentro dos feudos, e suas atividades comerciais por meio
da necessidade de moeda de trocas estariam entre os fatores responsáveis pela
destruição do sistema feudal.

• Para tentativa de sustentação do feudalismo, aconteceu o movimento das


cruzadas, expedições guerreiras estimuladas pelo papado com vistas para a
conquista da Terra Santa, porém não teve êxito.

• No decorrer dos séculos XIV e XV, após um longo período de relativa


prosperidade em relação à economia da Europa Ocidental, houve uma violenta
crise. Entre as causas da retração podemos citar os efeitos da peste negra,
introduzida na Europa por volta de 1348. Provavelmente de origem oriental,
a peste foi responsável pela morte de milhares de pessoas. Acredita-se que
um quarto da população europeia tenha sido dizimada, o que provocou a
desorganização da produção e, com isso, a fome generalizada.

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• As revoltas no modo feudal e as fugas dos camponeses aumentavam. Apesar
da repressão dita anteriormente, as diferenças entre os ricos mercadores e
os mestres das corporações aumentavam. Tentavam controlar desde a etapa
da produção até o preço final das mercadorias, mas isso se fazia bastante
complicado, pois o comércio internacional obtinha lucros crescentes. Então, a
crise generalizada obrigou várias categorias sociais a buscar respostas.

• O apoio à burguesia comercial, baseando-se no poder dos reis para restabelecer


a ordem e abrir novos mercados.

• Os principais pensadores do período se destacam Santo Agostinho (354-430) e


São Thomas de Aquino (1227-1274).

• Santo Agostinho e São Thomas de Aquino entendiam que Deus seria eterno
e transcendente, sendo o criador de tudo que existe no universo. Porém, para
Santo Agostinho, as ideias ou formas estavam no Espírito de Deus. Já para
Tomás de Aquino, deveria ser acrescentada a noção dos universais em seus
raciocínios.

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AUTOATIVIDADE

1 Explique a forma de organização social do feudalismo.

2 Quais foram os principais pensadores do período? E quais eram suas


principais ideias?

3 Marque a afirmativa correta:

A crise do feudalismo deriva não propriamente do renascimento do comércio


em si mesmo, mas da maneira pela qual a estrutura feudal reage ao impacto
da economia de mercado. O revivescimento do comércio (isto é, a instauração
de um setor mercantil na economia e o desenvolvimento de um setor urbano
na sociedade) pode promover, de um lado, a lenta dissolução dos laços servis,
e de outro lado, o enrijecimento da servidão [...]. Nos dois setores, abre-se,
pois, a crise social. (Fernando A. Novais, Portugal e Brasil na crise do Antigo
Sistema Colonial. p. 63-64). Segundo o autor:

a) ( ) A crise foi provocada pelo impacto do desenvolvimento comercial e


urbano na sociedade, pois, na medida em que reforça a servidão, origina as
insurreições camponesas e, quando fragiliza os vínculos servis, provoca as
insurreições urbanas.
b) ( ) A crise do feudalismo nada mais é do que o marasmo econômico
provocado pela queda da produção, uma vez que há um número menor de
camponeses livres, o que leva à crise social do campo, prejudicando também
a nobreza.
c) ( ) A crise foi motivada por fatores externos ao feudalismo, isto é, o
alargamento do mercado pressiona o aumento da produção no campo e
na cidade, o que leva à queda dos preços e às insurreições camponesas e
urbanas.
d) ( ) O desenvolvimento comercial e urbano em si não leva à crise, pois o
que deve ser levado em consideração é a crise social provocada pelo
enfraquecimento dos laços servis, tanto no campo como na cidade.
e) ( ) As insurreições camponesas e urbanas são as respostas para a crise feudal,
pois a servidão foi reforçada tanto no campo como na cidade, garantindo a
sobrevivência da nobreza por meio do pagamento de impostos.

4 Leia com atenção e depois responda:

Mais ou menos a partir do século XI, os cristãos organizaram expedições em


comum contra os muçulmanos, na Palestina, para reconquistar os “lugares
santos” onde Cristo tinha morrido e ressuscitado. São as cruzadas [...]. Os
homens e as mulheres da Idade Média tiveram então o sentimento de pertencer
a um mesmo grupo de instituições, de crenças e de hábitos: a cristandade
(Jacques Le Goff. A Idade Média explicada aos meus filhos, 2007).

44
Segundo o texto, as cruzadas:

a) ( ) Contribuíram para a construção da unidade interna do cristianismo, o


que reforçou o poder da Igreja Católica Romana e do Papa.
b) ( ) Resultaram na conquista definitiva da Palestina pelos cristãos e na
decorrente derrota e submissão dos muçulmanos.
c) ( ) Determinaram o aumento do poder dos reis e dos imperadores, uma vez
que a derrota dos cristãos debilitou o poder político do Papa.
d) ( ) Estabeleceram o caráter monoteísta do cristianismo medieval, o que
ajudou a reduzir a influência judaica e muçulmana na Palestina.
e) ( ) Definiram a separação oficial entre Igreja e Estado, estipulando funções
e papéis diferentes para os líderes políticos e religiosos.

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46
UNIDADE 1
TÓPICO 4

TRANSIÇÃO PARA O CAPITALISMO

1 INTRODUÇÃO
Estamos chegando ao nosso último tópico da unidade. Esperamos que
esteja gostando e aprendendo ao mesmo tempo.

Aqui, vamos estudar a transição do feudalismo para o capitalismo.


Passaremos sobre o debate clássico dos historiadores econômicos Paul Sweezy
(1910-2004) e Maurice Dobb (1900-1976) sobre o período histórico. Discutiremos
a formação do estado absolutista, sua composição social, os pensadores da época
e chegaremos a observar os primeiros embriões do Estado que germinaram ao
longo da Modernidade na Europa Ocidental.

Vamos lá?

Bons estudos!

2 A TRANSIÇÃO DO FEUDALISMO PARA O CAPITALISMO


Entre os historiadores econômicos há um debate sobre a construção
histórica do processo de passagem do modo de produção feudal para o modo de
produção capitalista. Notadamente, é um debate conhecido por meio dos autores
Paul Sweezy e Maurice Dobb.

Paul Sweezy (1910-2004) e Maurice Dobb (1900-1976), estudiosos da


corrente marxista, trabalharam as questões de relação de servidão com o
feudalismo e o impacto do comércio para a decadência daquele.

De acordo com Sweezy et al. (1977, p. 33), Dobb define o Feudalismo


como “uma servidão na qual o produtor é obrigado mediante uso da força,
independentemente de suas vontades, de forma a cumprir as exigências
econômicas do senhor, exigências que poderiam ser a prestação de serviços ou
tributos a serem pagos em dinheiro ou espécie”.

Ao não identificar um sistema de produção, a ideia é considerada falha


por Sweezy et al. (1977). O autor afirma que a servidão “não é restrita ao sistema
feudal e que pode ser verificada em diferentes formas de organização econômica,
em diferentes épocas e diferentes regiões” (SWEEZY et al., 1977, p. 33).

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UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

Sweezy et al. (1977) afirma que Dobb não define um sistema social, mas
uma família dele com foco na servidão. Sugere que Dobb identifique qual membro
da família está sendo estudado. Escolher um “membro” parece ser uma forma de
evitar generalizações.

Na réplica, Dobb aponta suas discordâncias em relação à Sweezy e rejeita


as primeiras críticas, afirmando que a servidão não está ligada apenas à prestação
de serviços compulsórios, “mas à exploração do produtor mediante coação direta
político-legal” (SWEEZY et al., 1977, p. 57). Afirma ainda que, quando Sweezy
et al. (1977) diz que não houve a identificação de um sistema de produção, há
o intuito de analisar a relação entre produtor e mercado, enquanto Sweezy et
al. (1977, p. 58) busca um sistema de produção, “no qual o produtor possui os
meios de produção na qualidade de unidade produtora individual”. Sobre os
impactos do comércio como elemento desestabilizador da organização social do
feudalismo, Sweezy et al. (1977, p. 42) explica que as forças externas, o mercado e
o comércio desintegram o feudalismo na medida em que os centros de comércio
passaram a se racionalizar e dividir o trabalho, se opondo à “ineficiência da
organização senhorial de produção”.

Dobb explica que houve uma interação entre duas forças, dando mais
ênfase às forças internas. Não nega que o crescimento das cidades mercantis e
do comércio influenciaram na desintegração do modo de produção feudal, mas
afirma que a influência refletiu no aumento dos conflitos internos. Por exemplo, o
crescimento do comércio “acelerou o processo de diferenciação social no pequeno
modo de produção” (SWEEZY et al., 1977, p. 60).

Assim, para Sweezy et al. (1977), a passagem do feudalismo para o


capitalismo foi devido à expansão comercial ocorrida entre os ”séculos XI e
XIV”, sendo assim um acontecimento externo. Para Dobb, a passagem para outra
forma de organização social se deu por meio de fatores internos, ou seja, devido
à pressão dos senhores sobre os servos e os conflitos entre a divisão social do
período e suas lutas.

3 FORMAÇÃO DOS ESTADOS ABSOLUTISTAS


A partir da reestruturação, muitos Estados tornaram-se capazes de
demarcar, cada vez mais, a área e a população sob seu controle; passaram
também a acumular um volume crescente de informações relevas a sua soberania
e aprimoraram sua eficiência administrativa.

Os reis tomaram para si o monopólio da lei. A política nacional e todas


as atividades de caráter político e econômico forma subordinadas a eles, ou
deles passaram a depender. Desde o século XVII, o Estado dilatou seu campo de
atividade, a começar pelo controle de seu próprio exército até o gerenciamento
direto de suas indústrias. Na prática, o Estado planejou economias inteiras, até o
ponto de não deixar praticamente nada fora do seu controle.

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TÓPICO 4 | TRANSIÇÃO PARA O CAPITALISMO

E
IMPORTANT

É importante entender que, até o final da Idade Média, não existiam ainda Estados
constituídos, como Portugal, Espanha, França e Inglaterra. O poder político era instituído a
partir das relações pessoais, de laços estabelecidos dentro da sociedade de ordens (nobres,
clero e setores burgueses e populares).

O processo de construção da identidade nacional coube ao governo e às


elites, ambos interessados nas vantagens que a centralização do poder poderia
proporcionar. Além disso, a ideia de Nação não se consolidou de um dia para
outro, mas resultou de um período de grandes mudanças tais como, a gradativa
perda de força dos senhores feudais, o desenvolvimento do comércio e das
cidades e a retomada das autoridades dos reis.

Os antigos interesses regionais, baseados nos laços de fidelidade


característicos da sociedade medieval, foram lentamente substituídos por
necessidades maiores e mais amplas.

A autonomia dos feudos cedeu lugar à centralização do poder nas


mãos de um monarca – o que firmou a noção de que todos os habitantes de um
determinado território, incluindo nobres, burgueses, camponeses e clero deviam
obediência ao rei.

Para compreender a ideia de um Estado Nacional, vamos entender o que


significa Nação. Segundo Bobbio (1993, p.23), a ideia de Nação é concebida como
“um grupo de pessoas unidas por laços naturais […] e por causa desses laços
se torna a base necessária para a organização do poder sob forma do Estado
Nacional”.

Um dos questionamentos de se entender nação de acordo com Bobbio


(1993) seria de identificar os critérios que definiriam as várias individualidades
nacionais.

Já para Hobsbawm (1990) o conceito de nação estaria relacionado ao


sustento da unidade política e nacional. A nação não viria antes do Estado e do
nacionalismo, estes é que geram a nação para o autor. Assim, a questão nacional
está ligada aos estágios econômicos e tecnológicos, utilizando um princípio de
dualidade, o alto como o governo, os ativistas dos movimentos nacionalistas e
as pessoas comuns que são envolvidas em propagandas, até chegar ao conceito
de nação como de um Estado territorial, no sentido de representar um estágio de
desenvolvimento histórico da sociedade humana.

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UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

Diante dos estudos dos autores, percebemos que a nação no período de


construção dos estados absolutistas seria uma espécie de contrato político. Seus
integrantes não se identificam uns com os outros por amizade ou solidariedade
por ordem étnica ou religiosa, mas porque compartilham de um contrato histórico
estabelecido pelo tempo.

Assim, o Estado não é definido por nenhuma norma. Os Estados Nacionais


surgiram em momentos históricos diferentes, aproveitando-se de condições
peculiares além de influências de condições internas e externas.

Para Hobsbawm (1999, p. 17-19),

[…] a única coisa que nenhum Estado, nem mesmo o Leviatã pode fazer
é obrigar as pessoas a matarem ao estarem dispostas a serem mortas.
No entanto, os Estados modernos conseguiram fazer exatamente
isso, e não poucas vezes. Embora muitas vezes tenham conseguido
por meio do alistamento compulsório, também fizeram apelando a
cada cidadão e convencendo-o de que, se ele se identificasse com a
coletividade, deveria estar pronto para o ato supremo de abdicar sua
liberdade e sua vida. A obediência voluntária ao Estado não foi um
elemento essencial na capacidade de mobilizar populações […].

No período aqui estudado, podemos explicar o Estado como um organismo


político-administrativo que exerce um poder soberano sobre determinado
território mediante aplicações de leis e força para assegurar a obediência ao poder
constituído.

O projeto nação estava vinculado à necessidade de apoiar a soberania


do príncipe, vital para a construção de um Estado forte e competitivo, apto a
justificar as decisões mais graves da política exterior.

Tal concepção fez aumentar a necessidade de estabelecer fronteiras


precisas entre um reino e seus vizinhos, pois o Estado deixava de ser um agregado
de feudos para se tornar “nacional” algo com que todos identificavam.

Em geral, os limites eram fixados ao longo dos rios. As fronteiras marítimas,


principalmente após as grandes navegações, tornaram uma questão do Estado
e muitas vezes exigiram a interferência do poder individual. Um exemplo foi
o Tratado de Tordesilhas (1494) que dividiu a América entre os portugueses e
espanhóis sob o auxílio do papa Alexandre VI.

3.1 DIVISÃO SOCIAL DO ESTADO ABSOLUTISTA


O Estado unificado representou a consonância entre o rei e a nação,
convertendo-se em base do desenvolvimento socioeconômico.

O termo nação também pode ser usado no pior sentido do preconceito:


uma comunidade na qual o estrangeiro é visto com desconfiança. Por exemplo:

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TÓPICO 4 | TRANSIÇÃO PARA O CAPITALISMO

judeus da Alemanha vitimados por violência, manifestações de xenofobia e que,


em algumas regiões, foram apontadas como responsáveis pela disseminação da
peste negra.

Para a burguesia, um Estado Nacional centralizado e forte era


indispensável para o estímulo da economia mercantil, enquanto os nobres
acreditavam que a nova ordem política significara um aparelho mais forte de
dominação contra as rebeliões camponesas e outras manifestações populares.

Assim, para a sociedade europeia ocidental de fins da Idade Média, a


unidade nacional parecia ser a palavra de ordem. Por exemplo, exército nacional,
moeda única, território, demarcação, língua e cultura, administração única, ou
seja, muitos fatores relacionados ao sentimento nacional estavam acontecendo na
Europa ocidental, contribuindo com a crise do sistema feudal.

A exacerbação da crise favoreceu o surgimento dos Estados modernos,


governados por monarquias nacionais, assumindo um caráter absolutista, como:
França, Portugal e Espanha.

Nos países ibéricos, a implantação do regime absolutista foi possibilitada


pelo desenvolvimento da burguesia e das atividades econômicas mercantis e
industriais, pois com os conflitos existentes entre os nobres e os comerciantes
exigiram a instalação imediata de uma nova ordem política em que o rei exercia
o papel de árbitro dos conflitos entre as camadas privilegiadas.

Então, a divisão social do absolutismo consistia na presença do clero, da


nobreza e agora também a burguesia e as camadas populares.

Vamos destacar quem era a burguesia?

Primeiro, vamos entender o conceito da palavra burguesia. Segundo a


consulta ao dicionário Aurélio (2002), é uma “categoria social que compreende
os que não exercem profissão manual e usufruem rendimentos ou vencimentos
relativamente elevados”.

Ainda, Miglioli (2010, p. 14) menciona:

A burguesia na Europa ocidental surge entre os séculos 10 e 11 sob


forma mercantil, isto é, composta por comerciantes, cambistas e
emprestadores de dinheiro, e logo em seguida é aumentada com a
participação dos artesãos urbanos. Durante muito tempo, o poder
político esteve nas mãos da nobreza, dos grandes senhores de terras, o
que não impediu o crescimento e enriquecimento da burguesia. Com
a formação das monarquias absolutistas (apoiadas pela burguesia),
unificando territórios, mercados, leis, moedas, tributos etc, o poder
político se concentrou nos reis. Bastante enriquecida, uma parte da
burguesia começou a comprar terras, conquistar títulos de nobreza e,
inclusive, a assumir cargos nos governos. Apesar de continuar sendo
uma classe subordinada, a burguesia se fortaleceu, adquiriu maior
experiência e começou a vislumbrar a possibilidade de tomar o poder.

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UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

Assim, observamos que o estado absolutista tentava amenizar o conflito


das classes, principalmente entre a nobreza e a burguesia, pois ambas estavam
em busca da centralização do poder. Acaba que a formação do estado absolutista
apresentava certas contradições, como conceder monopólios de comércio à
burguesia, estimular as atividades comerciais e, ao mesmo tempo, oferecer
pensões para sustentar uma nobreza cortesã e parasitária.

E
IMPORTANT

Para Caio Prado (1975), a história econômica pode ser compreendida por meio
do contexto histórico da ascensão burguesa (o que já estava prestes a acontecer no período
que estamos analisando). Até então, o estudo da história estava muito pautado na história
eurocêntrica e dos “vencedores da história”. Não se analisava a história por meio da forma das
relações sociais de trabalho, e com isso, não se observava que os oprimidos também faziam
história. Então, por meio da burguesia e a formação do capitalismo, começaram a estudar
a sociedade por meio da história econômica, na busca da compreensão da formação da
sociedade através das atividades econômicas.

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TÓPICO 4 | TRANSIÇÃO PARA O CAPITALISMO

LEITURA COMPLEMENTAR

O surgimento da classe trabalhadora

O início do século XVI é um divisor de águas na História da Europa. Marca


a tênue linha divisória entre a ordem feudal decadente e o sistema capitalista
que surgia. Após 1500, mudanças econômicas e sociais importantes começaram
a ocorrer com maior frequência, cada uma reforçando a anterior e todas juntas
conduzindo ao capitalismo.

Entre as mais importantes mudanças estavam aquelas que criavam uma


classe trabalhadora sistematicamente privada do controle sobre o processo de
produção e forçada a uma situação em que a venda de sua força de trabalho era a
única possibilidade de sobrevivência.

A população da Europa Ocidental, que tinha permanecido relativamente


estagnada durante um século e meio, aumentou em quase um terço no século XVI,
chegando a 70 milhões em 1600. O aumento na população foi acompanhado pelos
movimentos dos cerceamentos que começou na Inglaterra, já no século XIII. A
nobreza feudal, cada vez mais necessitada de dinheiro, cercava ou fechava terras
até então usadas como pasto comum, utilizando-a, então, como pasto de ovelhas
para satisfazer à explosiva demanda por lã pela indústria têxtil lanífera inglesa.

As ovelhas davam bons lucros e exigiam um mínimo de trabalho nas
pastagens. O movimento dos cerceamentos atingiu seu ponto máximo nos séculos
XV e XVI, quando, em algumas áreas, de 3/4 a 9/10 dos habitantes foram expulsos
do campo e forçados a buscar sustento nas cidades.

Ondas subsequentes de cerceamento continuaram até o século XIX.


Os cerceamentos e o crescimento populacional destruíram os laços feudais
remanescentes, criando uma grande e nova força de trabalho – uma força de
trabalho sem terra, sem quaisquer ferramentas ou instrumentos de produção,
apenas com a força do trabalho para vender. A migração para as cidades significava
mais trabalho para as indústrias capitalistas, mais homens para os exércitos e
marinhas, mais homens para colonizar novas terras e mais consumidores ou
compradores potenciais de produtos.

Entretanto, os cercamentos e o aumento populacional não foram, de modo
algum, para uma única origem da nova classe operária. Inúmeros camponeses,
pequenos proprietários de terra e membros da pequena nobreza foram à falência
com os exorbitantes aumentos dos aluguéis monetários. Dívidas acumuladas
que não podiam ser saldadas arruinaram muitos outros. Nas cidades maiores
e menores, as guildas passaram a se preocupar cada vez mais com os níveis de
renda de seus membros.

53
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

Era óbvio, para os artífices e mercadores das corporações, que os passos


dados para minimizar o número de seus membros serviriam para monopolizar
seus ofícios e para aumentar suas rendas. Um número cada vez maior de
produtores urbanos passou a não ter direito a qualquer meio de produção
independente na medida que as guildas ficavam mais exclusivas.

Assim, uma parcela considerável da nova classe trabalhadora foi criada


nas cidades pequenas e grandes. Muitos agricultores e artesãos, que tinham sido,
então, expulsos da terra e impedidos de ter acesso a seus meios originais de
produção, tornaram-se vadios e mendigos. Um número ainda maior procurou
garantir sua subsistência, apossando-se ilegalmente de terras marginais e não
usadas, terras onde podiam plantar para seu próprio uso.

Foram aprovadas leis extremamente repressivas contra o tipo de lavoura
e contra a vadiagem. Assim, quando a força, a fraude e a morte pela fome foram
insuficientes para criar a nova classe trabalhadora, houve a criação de estatutos
criminais e repressão do governo.

FONTE: Hunt, E. K. História do pensamento econômico. E. K. Hunt, Mark Lautzenheiser.


[Tradução de André Arruda Villela]. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.

4 REFLEXÕES SOBRE O PODER ABSOLUTISTA


No período, houve uma reflexão sobre o Estado e política na busca,
principalmente, de entender a ideia de nação e poder. Vamos conhecer os
pensadores?

4.1 NICOLAU MAQUIAVEL (1469-1527)


FIGURA 7 – NICOLAU MAQUIAVEL

FONTE: Enciclopédia ilustrada. Editora Educacional Brasileira


S.A. 1979.

54
TÓPICO 4 | TRANSIÇÃO PARA O CAPITALISMO

Nicolau Maquiavel (1469-1527) explicava sobre a noção de virtude


e fortuna. Para o autor, a virtude era a capacidade de o governante escolher a
melhor estratégia para a ação de seu governo, enquanto a fortuna remetia às
contingências as quais os homens estavam submetidos.

Assim, um bom governante seria aquele que, com sabedoria, soubesse


combinar a virtude e fortuna, sem priorizar uma ação em detrimento de outra.
Então, para alcançar a plenitude na política, os reis precisariam de autonomia e
não poderiam estar submetidos junto com nenhuma instituição.

De acordo com Maquiavel (1986, p.82-83):

O príncipe não precisa ser piedoso, fiel, humano, integro e religioso,


bastando que aparente possuir tais qualidades […] Um príncipe
não pode observar todas as coisas a que são obrigados os homens
considerados bons, sendo frequentemente forçado, para manter o
governo, a agir contra a caridade, a fé, a humanidade, a religião […].
O príncipe não deve se desviar do bem, se possível, mas deve estar
pronto a fazer o mal se necessário.

Assim, Maquiavel (1986) desloca o eixo da filosofia política do campo


da destinação divina para o campo da ação humana, uma considerada visão de
mundo realista que rompe com uma metafísica teológica.

4.2 JEAN BODIN (1530-1596)


FIGURA 8 – JEAN BODIN

FONTE: Enciclopédia ilustrada. Editora Educacional Brasileira


S.A. 1979.

Para Bodin (1996), o órgão legislativo, diante de Deus, não possuía


soberania para resolver qualquer questão, principalmente diante do Rei, que
possuía o poder divino, ou seja, poder humano derivado do poder divino.

55
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

Nas palavras do autor:

O rei sábio deve governar harmonicamente o seu reino, entremeando


suavemente os nobres e os plebeus, os ricos e os pobres com tal
discrição, no entanto os nobres têm alguma vantagem sobre os plebeus,
pois é bem razoável que o gentil-homem, tão excelente nas armas
e nas leis quanto o plebeu, seja preferido nos estados de judicatura
ou da guerra; e que o rico, em igualdade das demais condições, seja
preferido ao pobre nos estados que têm mais honra que lucro. E que
ao pobre caibam os ofícios que dão mais lucro que honra, assim, todos
ficarão contentes […] (BODIN, 1996, p. 49).

É visto que o autor enaltece o absolutismo e o exercício da soberania. Como


vimos, Bodin (1996) defende o Estado, porém a centralização e fortalecimento do
poder deverá passar pelas vias objetivas do direito, e não pela política pura e simples.

4.3 THOMAS HOBBES (1588-1679)


FIGURA 9 – THOMAS HOBBES

FONTE: Enciclopédia ilustrada. Editora Educacional Brasileira S.A. 1979.

Hobbes justificou a necessidade de a sociedade civil organizar-se


politicamente para sair do estado de natureza, que para ele, era sinônimo de caos.
Para o autor:

Do mesmo modo que tantas outras coisas, a natureza (a arte mediante


a qual Deus fez e governa o mundo) é imitada pela arte dos homens
também nisso: que lhe é possível fazer um animal artificial. Vendo que a
vida não é mais do que um movimento de membros, cujo início ocorre
em alguma parte principal interna, por que não poderíamos dizer que
todos os autômatos (máquinas que se movem a si mesmas por meio
de molas como um relógio) possuem uma vida artificial? Pois o que
é o coração senão uma mola; e os nervos, senão outras tantas cordas; e
as juntas, se não outras tantas rodas, imprimindo movimento ao corpo
inteiro, tal como projetado pelo Artífice? E a arte vai mais longe ainda,
imitando aquela criatura racional, a mais excelente obra da natureza, o
Homem. Porque pela arte é criado aquele grande Leviatã, o que se chama
Estado, ou Cidade (em latim, Civitas), que não é senão o homem artificial,
embora de maior estrutura e força que o homem natural, para cuja
proteção e defesa foi projetado (HOBBES, 1999, p. 27).
56
TÓPICO 4 | TRANSIÇÃO PARA O CAPITALISMO

Assim, para Hobbes (1999), o que leva os homens a se associarem não é


uma inclinação natural, uma boa vontade, é a garantia de interesses individuais.
Para ele, a sociedade surge não da boa-vontade dos homens uns para os outros,
mas do medo de uns em relação aos outros. Ainda, para o autor:

A natureza fez os homens tão iguais quanto às faculdades do corpo e do


espírito que, embora por vezes se encontre um homem manifestamente
mais forte de corpo, ou de espírito mais vivo do que outro, mesmo
assim, quando se considera tudo isso em conjunto, a diferença entre
um e outro homem não é suficientemente considerável para que
qualquer um possa com base nela reclamar qualquer benefício a que
outro não possa também aspirar, tal como ele. Porque quanto à força
corporal, o mais fraco tem força suficiente para matar o mais forte, que
por secreta maquinação quer aliando-se com outros que se encontram
ameaçados pelo mesmo perigo” (HOBBES, 1999, p. 107).

Ademais:

Desta igualdade quanto à capacidade deriva a igualdade quanto à


esperança de atingirmos nossos fins. Portanto, se dois homens desejam
a mesma coisa, ao mesmo tempo que é impossível ela ser gozada por
ambos, eles tornam-se inimigos. E no caminho para seu fim (que é
principalmente sua própria conservação, e às vezes apenas seu deleite)
esforçam-se por destruir ou subjugar um ao outro (HOBBES, 1999, p.
108).

Percebe-se que, a transferência das vontades subjetivas ao Estado que,


como vontade única, age em todos os casos como se seus atos fossem os atos
dos indivíduos e também que a origem do poder soberano não é divina: o poder
absoluto é extraído do contrato social.

Então, Hobbes (1999) se configura, de tal modo, como um filósofo de


transição dentro da modernidade: não é antiabsolutista, como serão posteriormente
os iluministas, mas não é mais um teórico político de fundamentos teológicos,
como são tradicionalmente os absolutistas.

Vale ressaltar que o contrato social é um instrumento teórico típico dos
iluministas que buscam fundar uma ordem burguesa contra o poder ilimitado
dos reis. Hobbes é absolutista, mas com ferramentas inovadoras e similares às
depois utilizadas pelos iluministas.

5 O HUMANISMO
No humanismo é importante entender que as influências da era medieval
ainda eram significativas sobre o pensamento do homem ao abrir as portas para
o mundo moderno a partir das exigências políticas, sociais e econômicas que
emergiam na sociedade.

57
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

Já vimos que a Idade Média fora um período de extrema religiosidade, no


qual Deus estava no centro das preocupações. Assim, as influências medievais
se mostraram especialmente religiosas. Entretanto, muitos humanistas viam-se
ainda como bons cristãos, servos obedientes da Igreja de Roma ou das igrejas
reformadas após a ruptura conduzida pelo alemão Martinho Lutero no início do
século XVI.

Já no período do humanismo, os humanistas reivindicavam o direito de


pensar de maneira crítica e de manifestar suas ideias livremente. Eles queriam
examinar criticamente o mundo das ideias, o mundo da natureza, as relações
entre os homens, e a partir do exame agir sobre seu próprio destino. Essa defesa
das ideias individuais nada mais é que o período que ficou conhecido como
Iluminismo.

Teremos o “despotismo esclarecido”, remetendo aos reis absolutistas que


são influenciados pelas ideias iluministas e promovem reformas em seus países,
mas sem perder o poder. A ideia era tentar amenizar rebeliões internas dos
iluministas.

Considerado por muitos historiadores como um movimento que mudou


bastante as esferas que regem a sociedade, seja por meio da filosofia e da ciência,
contrariando o antigo regime. Por isso, a ideia de modernidade.

Bem dizer, veremos na próxima unidade que o iluminismo representou


a forma da burguesia interpretar o mundo. As características básicas do período
são: racionalismo, ciência e individualismo. Todos apoiados no conhecimento
humano que gera experiência e razão.

6 PODER POLÍTICO E PODER ECONÔMICO: BREVE


ANÁLISE DO CAPITALISMO
A história nunca se fecha por si mesma e nunca se fecha para sempre. São
homens, em grupos e confrontando-se como classe em conflito, que “fecham” ou
“abrem” os circuitos da história (FERNANDES, 1976).

Como bem explica a pequena citação, o circuito da história é respaldado


de confrontos, sendo a necessidade da afirmação do poder na sociedade. Então,
na finalidade de entender alguns elementos da formação histórica do capitalismo,
iniciado na Europa Ocidental, partimos da observação do poder político para
posteriori econômico. Isto é, partimos de duas orientações de “valores organizados
e estruturados que possuem caráter duradouro” (FERNANDES, 1976).

58
TÓPICO 4 | TRANSIÇÃO PARA O CAPITALISMO

Sabemos que determinada maneira de recortar a realidade é arbitrária,


pois a análise não está isolada das outras dimensões que compõem a sociedade,
porém em um estudo inicial acreditamos que o recorte menor é para tentarmos
apreender o quanto absorvemos do assunto com possibilidade de fazer uma
conexão com outras dimensões futuramente.

Em linhas gerais, durante a Idade Média, a Europa Ocidental era


caracterizada pela política descentralizada dos senhores feudais. A nobreza
detinha o poder pelo fato de ser dona das terras e ter o poderio militar.

Um dos resultados da desagregação do feudalismo foi a formação das


monarquias nacionais, significando a concentração do poder político com
a consequente constituição do Estado Moderno. A centralização implicou a
delimitação de territórios e por isso, a população estaria submetida ao poder do
Estado, naquele momento, representado pela figura do rei.

Devemos notar que, o reino não era mais um simples agregado desconexo
de feudos submetidos a uma hierarquia diferente de senhores, mas sim, um
território homogêneo submetido a um só Estado. Retirou-se da nobreza o poder
político que ela tinha enquanto ordem, atribuindo funções políticas na corte, o
que permitiu para o Estado dominar politicamente a nobreza.

Para Wallerstein (1979), a centralização do Estado foi importante porque


viria a alterar as regras fundamentais do poder político ao assegurar que a partir
de então as decisões políticas econômicas não poderiam ser facilmente tomadas
sem passarem pela estrutura estatal.

Na época, como a organização social passava por transformações, havia


intensa disputa pelo poder político local e territorial. Por isso, o Estado Absolutista
necessitava afirmar seu poder na Europa Ocidental.

Para Mariutti (2012), a rivalidade política entre os Estados em formação


favoreceu a mercantilização crescente da produção. Os Estados estimularam o
comércio através das práticas mercantilistas como forma de superar os demais
na concorrência internacional que iam em busca de novas terras para serem
transformadas em colônias.

Em outras palavras, as tensões entre as metrópoles que vinham se


formando buscavam no sistema colonial, entre outras, a afirmação do poder
político por meio da exterioridade da produção da riqueza.

59
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

De acordo com Novais (1979, p. 114),

A colonização do Novo Mundo na Época Moderna, ou antes, a


exploração colonial ultramarina organizada nas linhas do antigo
sistema colonial, configura um poderoso instrumento de aceleração da
acumulação primitiva no contexto do capitalismo europeu; envolve,
efetivamente, um processo de transferência de renda das colônias
para as metrópoles, ou mais exatamente das economias periféricas
para os centros dinâmicos da economia europeia, renda que tende a se
concentrar na camada empresarial ligada ao comércio colonial.

A função da colônia era enriquecer a metrópole, podendo retirar da


colônia mercadorias de grande procura na Europa. Só podiam praticar comércio
com suas metrópoles, daí o monopólio comercial, ou seja, o mercado estava
politicamente definido e conferiria poder.

A vantagem do comércio ficava com os comerciantes e não com os


produtores das mercadorias, o que nos permite dizer que a riqueza na economia
mercantilista era apropriada na circulação das mercadorias e não na sua produção.
O circuito de capital era concluído no mercado europeu ocidental.

Segundo Villela (2011), a exploração colonial ultramarina promoveu a


acumulação originária de capital por parte da camada empresarial e ampliou
o mercado consumidor de produtos manufaturados. Determinada acumulação
de capital proporcionou a algumas metrópoles a passagem para a formação
industrial do desenvolvimento capitalista.

Assim, chegamos a uma parte interessante da unidade, porque observamos


que, o que explicava o sistema colonial era o monopólio – dada a exclusividade do
comércio – e as metrópoles tinham condições políticas de se afirmarem no poder.
Entretanto, o que explica a crise do sistema colonial é também o monopólio,
uma vez que, por meio do capital mercantil, houve a intensificação. Beneficiou
o financiamento das atividades econômicas, aumentando o poder em favor do
acúmulo de capital e o contexto criou uma hierarquia no poder econômico e não
mais político entre as metrópoles.

O monopólio já não era vantajoso para os Estados que mais acumularam


capitais. Não se precisava mais da ordem política, porque os comerciantes tinham
capacidade de realizar o comércio em todos os territórios.

Com isso, tem-se o princípio do liberalismo – a presença do livre mercado


–, que dentre outros motivos transformou as colônias em Estados Nacionais. A
lógica agora era produzir para comercializar nos diversos Estados Nacionais,
pois conferiria poder. O instrumento não era mais a imposição política, mas sim,
a do capital – agora seria o nexo que daria a ordem ao conjunto das dimensões
que compõem a sociedade.

60
TÓPICO 4 | TRANSIÇÃO PARA O CAPITALISMO

LEITURA COMPLEMENTAR

Outras forças na transição para o capitalismo

Outras forças de mudança também foram instrumentais na transição para


o capitalismo. Entre elas estava o despertar intelectual do século XVI, promovido
o progresso científico que logo foi aproveitado na prática da navegação. O
telescópio e a bússola permitiram que os homens navegassem com muito mais
precisão, cobrindo distâncias muito maiores. Isso levou às grandes descobertas.
Em um curto período, os europeus tinham mapeado rotas marítimas para as
Índias, para a África e às Américas. Determinadas descobertas tiveram uma dupla
importância: primeiro, resultaram em fluxo rápido e intenso de metais preciosos
para a Europa; em segundo lugar, anunciaram uma época de colonização. Entre
1300 e 1500, a produção de ouro e prata, na Europa, tinha estagnado. O comércio
capitalista, que se expandia rapidamente, e a extensão do sistema de mercado
para a cidade e o campo tinham provocado uma escassez aguda de moedas.
Como eram basicamente de ouro e prata, a necessidade dos metais era crítica.

A partir mais ou menos de 1450 a situação foi aliviada um pouco quando
os portugueses começaram a extrair metais da Costa do Ouro, na África, mas a
escassez geral continuou até meados do século XVI. Daí em diante, houve uma
entrada tão grande de ouro e prata vindos das Américas que a Europa experimentou
a inflação mais rápida e duradoura de sua história. Durante o século XVI, os
preços subiram, na Europa, entre 150% e 400%, dependendo do país ou da região.
Os preços dos produtos manufaturados aumentaram muito mais rápido do que
os aluguéis ou os salários. De fato, a disparidade entre preços e salários persistiu
até fins do século XVII. A classe dos proprietários de terras (ou a nobreza feudal)
e a classe trabalhadora sofreram porque suas rendas subiram menos rapidamente
do que suas despesas. A classe capitalista foi a grande beneficiária da revolução
dos preços. Recebeu lucros cada vez maiores e pagou salários reais cada vez mais
baixos, comprando matérias-primas que se valorizavam muito durante o tempo
em que eram mantidas em estoque. Os lucros maiores foram acumulados como
capital.


O capital inclui os materiais necessários à produção e ao comércio e
consiste em todas as ferramentas, equipamentos, fábricas, matérias-primas,
produtos em elaboração, meios de transporte dos produtos e dinheiro. Existem
meios físicos de produção em todos os tipos de sistema econômico, mas eles
só podem se tornar capital em um contexto social em que existam as relações
sociais necessárias à produção de mercadorias e à propriedade privada. Assim,
o capital refere-se a mais do que simples objetos físicos; refere-se a um conjunto
complexo de relações sociais. Em nossa discussão anterior, vimos que uma das
características que define o sistema capitalista é a existência de uma classe de

61
UNIDADE 1 | HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO

capitalistas que possui o capital. É em virtude da propriedade do capital que ela


aufere seus lucros. Os lucros são reinvestidos ou usados para aumentar o capital.
A acumulação de capital leva a mais lucros, que, por sua vez, levam para mais
acumulação e o sistema continua em uma espiral ascendente.

O termo capitalismo descreve de modo bastante correto o sistema de


busca de lucro e de acumulação de capital. A propriedade do capital é a fonte
dos lucros e daí a fonte de mais acumulação de capital. Contudo, o processo do
“ovo e da galinha” teria de ter um começo. A acumulação inicial substancial ou
acumulação primitiva de capital ocorreu no período que está sendo considerado.
As quatro fontes mais importantes de acumulação inicial de capital foram: (1)
o volume do comércio, que cresceu rapidamente; (2) o sistema industrial de
produção doméstica; (3) o movimento dos cercamentos; (4) a grande inflação
de preços. Havia muitas outras fontes de acumulação inicial de capital, algumas
das quais eram menos respeitáveis e, muitas vezes, esquecidas – por exemplo, a
pilhagem colonial, a pirataria e o comércio de escravos.

Durante os séculos XVI e XVII, o sistema doméstico de trabalho foi


ampliado até se tornar comum em quase todos os tipos de indústria. Embora ainda
não fosse o tipo moderno de produção fabril, o maior grau de especialização do
sistema permitiu significativos aumentos de produtividade. Os avanços técnicos
da construção naval e da navegação também baixaram os custos do transporte.
Assim, durante o período, a produção e o comércio capitalista prosperaram e
cresceram muito depressa. A nova classe capitalista (classe média ou burguesia)
substituiu, lenta, porém inexoravelmente, a nobreza como classe que dominava o
sistema econômico e social.

O aparecimento dos novos Estados-nações assinalou o começo da transição
para uma nova classe dominante. Os novos monarcas, em geral, procuravam
o apoio da classe capitalista burguesa em seu esforço de derrotar seus rivais
feudais e unificar o estado sob o mesmo poder central. A unificação libertou os
mercadores do emaranhado feudal de regras, regulamentos, leis, pesos, medidas
e moedas diferentes; consolidou muitos mercados; deu proteção militar aos
empreendimentos comerciais. Em troca, o monarca dependia dos capitalistas para
as tão necessárias fontes de receita. Embora a Inglaterra tenha sido nominalmente
unificada muito antes, só foi unificada, de fato, quando Henrique VII (1485-1509)
iniciou a dinastia dos monarcas Tudor.

Henrique VIII (1509-1547) e Elizabeth I (1558-1603) conseguiram completar


o trabalho de construção da nação apenas porque tiveram o apoio do Parlamento,
que representava as classes médias dos condados e cidades. Nas revoluções
de 1648 e 1688, a supremacia do Parlamento, ou da classe média burguesa, foi
finalmente estabelecida. Os outros Estados-nações capitalistas importantes
também surgiram na época. Na França, Luís XI (1461-1483) foi o primeiro rei a
unificar efetivamente a França, desde a época de Carlos Magno. O casamento de

62
TÓPICO 4 | TRANSIÇÃO PARA O CAPITALISMO

Fernando de Aragão e Isabela de Castilha, em 1469, e a posterior derrota por eles


infligida aos mouros, levaram à unificação da Espanha. A República Holandesa
– o quarto dos Estados-nações importantes – só conseguiu sua independência em
1690, quando acabou expulsando os opressores espanhóis.

Em fins do século XVI e início do século XVIII, quase todas as grandes
cidades da Inglaterra, França, Espanha e dos Países Baixos (Bélgica e Holanda)
já tinham se transformado em prósperas economias capitalistas dominadas
pelos mercadores capitalistas, que controlavam não só o comércio, mas também
grande parte da indústria. Nos modernos Estados-nações, coalizões de monarcas
e capitalistas tinham retirado o poder efetivo da nobreza feudal de muitas áreas
importantes, principalmente nas relacionadas com a produção e o comércio. A
época do início do capitalismo é conhecida como mercantilismo.

FONTE: HUNT, E. K. História do pensamento econômico. [Tradução de André Arruda Villela].


Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.

63
RESUMO DO TÓPICO 4
Neste tópico, você aprendeu que:

• Paul Sweezy (1910-2004) e Maurice Dobb (1900-1976), estudiosos da corrente


marxista, trabalharam as questões de relação de servidão com o feudalismo e o
impacto do comércio para a decadência daquele.

• Para o autor Sweezy et al. (1997), a passagem do feudalismo para o capitalismo


foi devido à expansão comercial ocorrida entre os séculos XI e XIV, assim um
acontecimento externo. Já para Dobb (1997), a passagem para outra forma
de organização social se deu por meio de fatores internos, ou seja, devido à
pressão dos senhores sobre os servos e os conflitos entre a divisão social do
período e suas lutas.

• A organização dos Estados Nacionais, entre os séculos XV e XVIII, foi


desencadeada por diversos acontecimentos importantes que fizeram parte do
contexto histórico europeu na transição do sistema feudal para a sociedade
burguesa. Cabe ressaltar, porém, que nem toda Europa participou igualmente
das transformações.

• A partir da reestruturação, muitos Estados tornaram-se capazes de demarcar,


cada vez mais, a área e a população sob seu controle; passaram também a
acumular um volume crescente de informações relevantes para sua soberania
e aprimoraram sua eficiência administrativa.

• Neste período, houve uma reflexão sobre o Estado e política na busca,


principalmente, de entender a ideia de nação e poder. Os principais pensadores
foram: Nicolau Maquiavel (1469-1527), Jean Bodin (1530-1596) e Thomas
Hobbes (1588-1679).

64
AUTOATIVIDADE

1 Explique a transição do feudalismo para o capitalismo.

2 Como podemos caracterizar o período de formação dos estados absolutistas?

3 Nicolau Maquiavel (1469-1567), pensador florentino, afirmava que a


obrigação suprema do governante é manter o poder e a segurança do país
que governa. E, para atingir seus objetivos, o governante deve usar de todos
os meios disponíveis, pois “os fins justificam os meios” (MAQUIAVEL,
2004).

Suas ideias ficaram imortalizadas na obra:


a) Leviatã.
b) Política segundo as sagradas escrituras.
c) A arte da guerra.
d) A divina comédia.
e) O príncipe.

4 A famosa frase atribuída para Luís XIV: "O Estado sou eu", define o:

a) Absolutismo.
b) Iluminismo.
c) Liberalismo.
d) Patriotismo do rei.
e) Feudalismo.

5 Diferentes concepções teóricas de Estado foram elaboradas na Inglaterra,


em momentos distintos, por Thomas Hobbes (1588-1679) e John Locke
(1632-1704). Descreva as ideias fundamentais características do pensamento
de Hobbes e Locke, explicando o que diferencia fundamentalmente as teses
dos mencionados pensadores, com relação à organização do Estado.

65
66
UNIDADE 2

DESENVOLVIMENTO DO
CAPITALISMO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir dos estudos desta unidade, você será capaz de:

• entender o processo de desenvolvimento do capitalismo;

• identificar as características da organização social;

• entender as transformações econômicas, sociais, políticas do período e


seus principais teóricos.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está organizada em três tópicos. Ao final de cada tópico, você
encontrará exercícios que o auxiliarão na compreensão dos temas abordados.

TÓPICO 1 – MERCANTILISMO

TÓPICO 2 – FISIOCRACIA

TÓPICO 3 – LIBERALISMO

67
68
UNIDADE 2
TÓPICO 1

MERCANTILISMO

1 INTRODUÇÃO
Prezado acadêmico, ao introduzir a Unidade 2, é importante pensarmos
sobre o movimento da história como uma construção de homens que vivem em
sociedade.

Assim, nesta unidade, objetivamos que você aprenda sobre como a forma
de organização social influencia o pensamento dos homens e modifica-os em sua
ação individual. Assim, no decorrer dos estudos, você perceberá como a história
econômica está presente na visão macro e micro do mundo.


2 MERCANTILISMO
Em geral, o processo de desenvolvimento econômico que transformou a
Europa Ocidental em maior centro comercial do mundo, desde o século XX, é
atribuído a condições econômicas, políticas e sociais.

Vimos, na Unidade 1, que no feudalismo já existiam as atividades de


mercadores, banqueiros e artesãos, mas que o comércio se restringia ao granel.

Aos poucos, podemos observar que, com passar do tempo, inicia-se o


processo de centralização da autoridade política, que vai ao desenvolvimento da
economia da Europa Ocidental, e que os Estados nacionais emergentes optaram
por políticas econômicas de expansão do mercantilismo.

FIGURA 1 – O MERCANTILISMO

FONTE: Disponível em: <https://cdn-images-1.medium.com/


max/1000/1*2HtEvpHIEZoQiA-J1owRjA.jpeg>. Acesso em: 18 jun. 2018.

69
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

Assim, o que seria o termo “mercantilismo”?

E
IMPORTANT

O mercantilismo pode ser entendido como um conjunto de práticas econômicas


que caracteriza a história econômica europeia durante os séculos XV, XVI a XVIII.

De acordo com Novais (1995, p. 91), podemos compreender que o


mercantilismo pode ser entendido como “uma conceituação primária da natureza
dos bens econômicos e a suposição de que os lucros se geram no processo de
circulação das mercadorias, ou seja, configuram vantagens em detrimento do
parceiro”. O mercantilismo não é, efetivamente, uma política que vise ao bem-
estar social, como diríamos hoje, mas visa ao desenvolvimento nacional a todo
custo.

Então, podemos entender que as práticas mercantilistas variaram ao


longo do tempo e no espaço, ou seja, não foram aplicadas simultaneamente nos
estados europeus. Ainda assim, todas apresentaram características comuns, como
a intervenção do Estado na economia para regulamentá-la, bem como fortalecer o
estado e a riqueza nacional.

Houve uma competição capitalista em busca de espaço econômico. Neste


período, surgiram importantes conceitos econômicos, como: metalismo, balança
comercial favorável, cameralismo e colonialismo.

Metalismo: prática mercantilista a fim de juntar metal precioso para


aumentar a riqueza de um Estado, pois a riqueza estava diretamente relacionada
à capacidade de acumular o máximo de ouro e prata.

Segundo Feijó (2000), o mercantilismo caracterizava o conjunto de


doutrinas econômicas dominadas pelos nacionalistas e pelo intervencionismo,
que ganhou impulso nos séculos XVI e XVII. O mercantilismo acompanhou o
surgimento de Estados mais fortes e centralizados, além de ser considerado um
período de transição entre práticas  regulamentárias  da economia. A economia
se mistura com sentimentos religiosos e, posteriormente, toma caráter mais
reacional e o mercantilismo representa um momento de grande fertilidade para
a economia.

Balança comercial favorável: significava promover um superávit da


balança comercial, ou seja, exportar mais do que importar. Permitiria o ingresso
de riquezas, expresso em entrada de moeda metálica no Estado Nacional.

70
TÓPICO 1 | MERCANTILISMO

Cameralismo: tesouro real, servia para designar as medidas que


pretendiam combater os efeitos da divisão territorial excessiva.

Segundo Feijó (2000), no cameralismo, temos um enfoque específico


do mercantilismo relacionado aos problemas particulares da economia, de um
conjunto de países de língua alemã. Surge como um conjunto de ideias voltado
à solução das calamidades econômicas por meio de uma melhor administração
pública. A ênfase recai nos conhecimentos para uma boa gestão e não na
competitividade comercial, diferentemente do mercantilismo ocidental.

Colonialismo: incorporação de regiões da África, Ásia e América para


a economia europeia. Descoberta de novos territórios para a exploração de
matérias-primas e acúmulo de riquezas nos Estados Europeus.

3 A PRÁTICA DO MERCANTILISMO NOS PAÍSES EUROPEUS


Para estudarmos o mercantilismo, precisamos ter em mente que esse
processo buscava o interesse comercial, tinha o apetite pelo dinheiro e a busca
pelo lucro acontecia nos comércios locais, regionais e extraterritoriais.

Assim, uma das características principais desse processo foi a procura


pelo acúmulo de ouro, tanto que se teve a navegação ultramarina com o objetivo
de encontrar materiais preciosos que garantissem formas rentáveis de lucro. É
um diálogo sobre determinado assunto que veremos a seguir.

3.1 PORTUGAL E ESPANHA


Os governos de Portugal e Espanha adotaram o metalismo. Aquele,
concentrou-se no monopólio do comércio de especiarias orientais. Mais tarde,
passou a enfatizar a política colonialista, em especial no que se refere aos
territórios na América.

Em meados dos séculos XVI e XVII, período de intensa colonização na


busca de metais preciosos, os espanhóis praticaram uma política protecionista
para impedir a saída de metais do país com proteções econômicas de restrições
comerciais.

Além da importância do comércio de metais preciosos, havia também a


comercialização de escravos e atividades de agricultura e pecuária. Os produtos
agropecuários destinados à exportação eram o tabaco, a batata, o cacau, o milho,
o açúcar, o couro e o charque. Entretanto, os reis dissiparam boa parte dos
recursos, utilizando-os para o pagamento de empréstimos estrangeiros, para
o financiamento de guerras ou para a compra, para os mercadores italianos,
franceses ou ingleses, de artigos que não eram produzidos pela Espanha.

71
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

3.2 INGLATERRA
O mercantilismo era baseado no estímulo da produção manufatureira.
Também houve incentivo ao desenvolvimento da marinha mercante.

A política mercantilista inglesa dos séculos XVI e XVII coincidiu com a


expansão marítima e colonial. A Companhia das Índias Orientais, organizada
em 1600, estabeleceu entrepostos na Índia e na Indonésia. Posteriormente, os
ingleses se instalaram na Pérsia (atual Irã), Bombaim (Índia) e na América, tanto
nas Antilhas quanto no continente que fundou as Treze colônias.

E
IMPORTANT

Quais eram as 13 colônias? As 13 colônias inglesas que desencadearam o


processo de formação dos Estados Unidos foram instaladas na costa oeste da América, no
Norte, no decorrer do século XVII. Elas eram: Carolina do Norte; Carolina do Sul; Connecticut;
Delaware; Geórgia; Ilha de Rodes; Massachussetts; Marilândia; New Hampshire; Nova York;
Nova Jérsei; Pensilvânia e Virgínia.

O resultado da política expansionista refletiu no desenvolvimento do


comércio exterior e na marinha mercante britânica. Os minérios, como alumínio e
artigos têxteis, passaram a ser exportados com regularidade pelos ingleses.

Segundo Mota (2005), dois atos de navegação tiveram importância para


o desenvolvimento da marinha mercante britânica no período mercantilista.
O primeiro, promulgado em 1651 por Oliver Cromwell, estabelecia que as
mercadorias europeias só poderiam ser transportadas em navios ingleses.

Assim, produtos da África, Ásia e América só poderiam ser importados


em navios da Inglaterra. O segundo ato, promulgado em 1660, especificava
que o capitão e, pelo menos três quartos da tripulação dos navios, deveriam ser
britânicos. Tais medidas se mostraram cruciais para o enriquecimento do Estado
Inglês, para a expansão colonial do país e para a vitória sobre seus concorrentes.

3.3 ALEMANHA
Naquela época, a Alemanha era integrada em vários territórios, e houve
a adoção de um modelo de mercantilismo estilo cameralismo, que servia para
designar as medidas que pretendiam combater os efeitos da divisão territorial
excessiva e que tinha por objetivo aumentar os impostos para o aumento da renda
estatal. Foi um fato que contribuiu para a sustentação econômica da Alemanha
do século XIX.
72
TÓPICO 1 | MERCANTILISMO

E
IMPORTANT

Antes da unificação, o território germânico estava fragmentado em 39 estados


que formavam a Confederação Germânica. Os Estados principais eram a Prússia e a Áustria.

3.4 HOLANDA
Na Holanda, uma atividade burguesa mercantil e bancária se desenvolveu
apoiada em três pilares: a Companhia das Índias Orientais, encarregada de
dirigir o comércio holandês no Oriente (compras, remessas de ouro, vendas das
mercadorias recebidas) e de explorar os recursos de territórios ultramarinos; o
Banco de Amsterdã, responsável pelo fornecimento de crédito e de moedas de
todos os países aos mercadores, para que estes pudessem comprar mercadorias
de qualquer origem; e uma frota mercante capacitada a transportar cargas
pesadas e volumosas ao longo das rotas marítimas.

Os holandeses desenvolveram ainda várias atividades de transformação,


dentre elas: a indústria de tecidos, tecelagem de seda, a cervejaria, preparação de
sal, tabaco, cacau, instrumentos de navegação etc.

4 UM ADENTRO SOBRE A COLONIZAÇÃO


Neste momento, caro acadêmico, é importante observar que os governos
que adotaram o colonialismo, por sua vez, tiveram como preocupação incorporar
extensas regiões da África, do Oriente e da América à economia europeia. Assim,
estabeleceram o sistema colonial por meio do chamado pacto colonial.

Novais (1995) define que o sistema colonial é apresentado como um


tipo particular de relações políticas, com dois elementos: um centro de decisão
(metrópole) e outro (colônia) subordinado, relações que estabelecem o quadro
institucional para que a vida econômica da metrópole seja dinamizada pelas
atividades comerciais.

Então, o que foi o pacto colonial?

Seria uma ideia exclusivamente da metrópole. A colônia existia para


atender às necessidades da metrópole. Significa que a produção colonial deveria
possibilitar lucros elevados aos comerciantes e à Coroa, que monopolizava
as importações e exportações. Assim, as atividades econômicas das colônias
deveriam complementar as economias da metrópole, e não concorrer com elas.
A política foi muito utilizada, por exemplo, com a metrópole Portugal e sua
colônia Brasil.
73
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

Assim, o cenário da expansão colonial, de acordo com Novais (1995),


aconteceu em uma etapa intermediária da vida econômica europeia, ou seja, o
capitalismo mercantil. Romperam-se os limites estreitos da Idade Média quando
o comércio foi revivido e se submeteu às pressões da economia de mercado.

Entende-se que a economia colonial fomentou a acumulação para o


nível econômico e, na economia, serviu para fortalecer o mercado nacional e o
Estado forte, ancorado no governo da nobreza, constituindo uma continuidade
da sociedade estamental, porém, com crises sociais atenuadas. Ainda sobre o
funcionamento do sistema colonial:

• Na fase inicial, havia uma liberdade de comércio a fim de estimular a vinda de


recursos para a colônia.
• Em um segundo momento de enquadramento, em sistema exclusivo de
monopólios comerciais.

Assim, percebemos que o setor de exportação comandava o setor produtivo,


e a demanda crescente da população europeia era cada vez mais monetarizada,
o que levava as economias coloniais a buscarem um sistema de exploração cada
vez mais lucrativo para as metrópoles, levando à adoção de formas de trabalho
compulsório, como o escravismo.

Se vamos à essência da nossa formação, veremos que, na realidade,


constituímo-nos para fornecer açúcar, tabaco, alguns outros gêneros;
mais tarde, ouro e diamantes; depois, algodão e, em seguida, café,
para o comércio europeu. Com tal objetivo, objetivo exterior, voltado
para fora do país e sem atenção e consideração que não fosse o
interesse daquele comércio, que se organizarão a sociedade e a
economia brasileiras. Tudo se disporá naquele sentido: a estrutura,
bem como as atividades do país (PRADO JR., 1981, p. 31-32).

Vimos que, para Prado Jr. (1981), as colônias de exploração estavam


divididas em dois setores: a agricultura de exportação, voltada essencialmente
para o mercado externo, possuindo as características que definem tal tipo de
colônia. Outro seria a agricultura de subsistência, destinada ao abastecimento do
mercado interno.

O pensamento vai ao encontro do argumento de Furtado (1980, p. 95):


“[...] sendo uma plantação de produtos tropicais, a Colônia estava integrada nas
economias europeias, das quais dependia. Não constituía, portanto, um sistema
autônomo, sendo um simples prolongamento de outros maiores”.

Novais (1995) explica o sentido profundo da colonização, pelo fato de a


transferência do excedente da colônia para a metrópole, por meio do monopólio
do comércio de gêneros tropicais, ter servido à acumulação primitiva de capital,
que impulsionaria a Revolução Industrial no século XVIII. Segundo o autor,
ocorreu pela transferência do excedente que era apropriado por Portugal e que
era dependente da Inglaterra.

74
TÓPICO 1 | MERCANTILISMO

FIGURA 2 – COLONIZAÇÃO NO BRASIL

FONTE: Disponível em: <https://conteudo.imguol.com.br/blogs/138/


files/2016/06/debret5.jpg>. Acesso em: 15 jun. 2018.

Assim, percebemos que, no mercantilismo, a ideia de riqueza estava muito


atrelada a metais preciosos, à noção de moeda, de ouro e prata. As características
das práticas mercantilistas eram: nacionalismo, pacto colonial, domínio de rotas
comerciais, guerras, proibição de exportação de metais preciosos, busca de
balança comercial favorável, além de uma noção estática da economia.

E
IMPORTANT

Vamos falar um pouco mais sobre balança comercial favorável? A balança


comercial registra todas as exportações e importações do país. Assim, uma balança comercial
favorável é quando se exporta mais que importa, ficando com um saldo positivo. Entretanto,
será que manter um saldo da balança comercial sempre positivo seria possível? Há uma
discussão muito forte no período sobre a inflação na Europa, no sentido de que havia uma
adulteração das moedas pelo poder público, reduzindo a quantidade de metal nelas. Quer
saber mais? Pesquise sobre a Lei de Thomas Gresham (1519 -1579).

5 TEORIA QUANTITATIVA DA MOEDA


No século XVIII, havia uma discussão entre a relação dos preços e moeda,
no sentido de entender a velocidade de circulação da moeda entre as pessoas. A
teoria era estudada por Fisher (1867-1947), buscando compreender a relação e a
quantidade de moedas. O processo inflacionário é explicado com base nos fluxos
monetário e nominal de cada transação econômica. Observemos:

A equação de troca de Fisher mostra que o fluxo monetário (MV) é


necessariamente igual ao fluxo nominal (PT) das transações:

75
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

MV = PT

Sendo:
M = estoque de moeda
V = velocidade de circulação
P = nível médio dos preços
T = volume de transações realizadas

Fisher (1867-1947) costumava dividir o fluxo monetário em duas partes


referentes à moeda manual (M’V’) e à moeda bancária (M”V”), de modo que MV
é a média ponderada dos componentes. O nível das transações (T) é determinado
por fatores reais (estoque capital, tecnologia, força de trabalho e recursos naturais),
independentes das variáveis contidas na Equação de Trocas. A velocidade de
circulação da moeda (V) é igualmente exógena, sendo determinada pelos hábitos
de pagamento e recebimento da comunidade.

Logo, o nível de preços P é determinado pela quantidade de moeda (M)


que, por sua vez, é controlada pelo Governo: P = (V/T) M. Em suma, dados os
valores de T e V, o nível de preços varia direta e proporcionalmente com o estoque
de moeda da economia. A inflação tem, portanto, origem monetária. Entretanto,
de outra forma, a moeda é neutra, pois não afeta o volume de transações. É a
chamada dicotomia clássica na economia.

6 PRINCIPAIS TEÓRICOS DO MERCANTILISMO


O mercantilismo, assim como os demais períodos históricos da economia,
teve vários precursores, como Thomas Mun, Jean-Batiste Colbert, entre outros.
Para que compreendamos melhor o pensamento de tais filósofos, vamos estudá-
los mais detalhadamente a seguir.

6.1 THOMAS MUN (1571-1641)


Mercantilista britânico, defendia que, elevando as importações, aumentaria
o estoque de metais preciosos na Inglaterra.

FIGURA 3 – THOMAS MUN (1571- 1641)

FONTE: Enciclopédia ilustrada (1979)


76
TÓPICO 1 | MERCANTILISMO

Foi um economista inglês nascido em Londres e reconhecido como um


dos mais notáveis membros da escola mercantilista.
 

6.2 JEAN- BAPTISTE COLBERT (1619-1683)


Defendia a acumulação de metais preciosos e fez o possível para poder
facilitar o comércio interno da França.

FIGURA 4 – JEAN-BAPTISTE COLBERT (1619-1683)

FONTE: Enciclopédia ilustrada (1979)

Foi um político francês que ficou conhecido como ministro de Estado e da


economia do rei Luís XIV.

6.3 RICHARD CANTILLON (1680-1734)


O valor intrínseco das coisas nunca varia, mas a impossibilidade de
estabelecer uma proporção entre a produção de mercadorias e gêneros
e o seu consumo em um país, provoca uma variação diária e um fluxo
e refluxo contínuo nos preços de mercado. Entretanto, nas sociedades
bem reguladas, os preços de mercado dos gêneros e mercadorias,
cujo consumo é constante e uniforme, não se afastam muito de seu
valor intrínseco. Desde que não sobrevenham anos, nem demasiada
escassez, nem demasiado abundantes, os magistrados das cidades
podem fixar o preço de mercado de muitas coisas, como do pão e da
carne, sem que ninguém tenha do que reclamar (CANTILLON, 2002,
p. 35).

77
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

FIGURA 5 – RICHARD CANTILLON (1680-1734)

FONTE: Enciclopédia ilustrada (1979)

Filho de grandes proprietários de terras, foi banqueiro, um  irlandês  e


autor do Ensaio sobre a Natureza do Comércio em Geral (1755).

Assim, a riqueza entendida no mercantilismo teria uma relação de


equivalência à terra, bem como ao valor de mercado.

6.4 DAVID HUME (1711 – 1776)


Analisou a Teoria Quantitativa da Moeda (TQM) como uma teoria
explicativa da inflação como fenômeno exclusivamente monetário. Aplicou para a
teoria do comércio internacional como um mecanismo autorregulador. Vejamos:

Uma das maiores contribuições de Hume é a sua teoria do comércio


internacional, a qual é, substancialmente, a doutrina de Ricardo
e J. S. Mill. Aplicou ele uma teoria quantitativa do dinheiro ao
comércio internacional, afirmou quantitativa do dinheiro ao comércio
internacional e que a teoria do balanço comercial estava errada
porque os saldos comerciais excessivos ocasionariam um aumento da
oferta de moeda em um país, o que, por sua vez, afetaria o nível dos
preços internos e, portanto, o volume da exportação ou importação
de mercadorias transportadas entre nações. As relações assim
estabelecidas entre os preços das mercadorias de nações comerciantes
regulariam automaticamente o fluxo da moeda, e o saldo comercial de
qualquer país não poderia permanecer por muito tempo favorável ou
desfavorável (BELL, 1976, p. 120).

Entendemos que, para David Hume, haveria distribuição natural de moeda


metálica entre as nações e as forças automáticas realizariam tal distribuição, além
de fixarem níveis de preços internos.

78
TÓPICO 1 | MERCANTILISMO

FIGURA 6 – DAVID HUME (1711 – 1776)

FONTE: Enciclopédia ilustrada (1979)

Foi  filósofo, historiador, sociólogo e economista escocês do período do


Iluminismo (século XVIII). É considerado um dos mais importantes filósofos
iluministas ocidentais. Principal obra: Tratado da Natureza Humana, 1740.

7 MERCADO INTERNO E EXTERNO E O PAPEL DO ESTADO


A lógica mercantilista servirá aos mercantes, aos reis e aos seus adeptos.
Em relação ao mercado interno, entende-se que o processo acontecia por meio
do livre comércio interno, com a ausência de taxas, impostos e restrições sobre
o comércio do bem. Os mercantilistas preferiam as concessões de monopólios
e privilégios comerciais exclusivos e, assim, o mercantilismo forneceu uma
contribuição permanente a expandir o mercado interno.

Já em relação ao mercado externo, buscavam uma balança comercial


favorável, principalmente em relação ao que não se podia produzir no mercado
interno.

O papel do Estado seria de regulamentar o mercado por meio do


protecionismo, que seria a defesa do mercado interno através do controle de
consumos internos de certos produtos, além de promover a colonização de novos
territórios como forma de garantir o acesso a matérias-primas e ao escoamento
dos manufaturados.

79
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

LEITURA COMPLEMENTAR

Moeda, tesouro e riqueza: uma anatomia conceitual do mercantilismo


britânico do início do século XVII

Carlos Eduardo Suprinyak

Passados mais de dois séculos desde a idealização do “sistema mercantil”


por obra de Smith e dos fisiocratas, falar em mercantilismo é uma tarefa, no
mínimo, delicada. Capcioso como qualquer generalização histórica abrangente, o
conceito de mercantilismo teve seu prestígio seguidamente abalado e restaurado
pela historiografia.

Desde a imprecisa formulação original de Smith, passando pela


abrangência avassaladora de Hecksher até chegar ao repúdio estrito de Coleman,
a ideia de mercantilismo já significou tudo e nada. Retomá-la, portanto, requer
uma definição precisa do escopo analítico, requer que se estabeleçam, de forma
clara, quais os limites históricos relevantes para o problema em questão.

As primeiras décadas do século XVII configuraram um período


conturbado na história da Europa, em especial na Inglaterra, presságio de um
século marcado por contínuas e profundas turbulências. No início da década de
1620, várias tendências confluíam para deflagrar uma crise econômico-social, que
causou comoção pública nos domínios britânicos.

As contingências bélicas associadas à eclosão da Guerra dos Trinta Anos


deram origem ao célebre fenômeno do Kipper-und Wipper-Zeit, uma série de
desvalorizações metálicas nas moedas dos diversos principados do Sacro Império
Romano-Germânico, que visavam a aumentar os recursos disponíveis para as
despesas de guerra.

O resultado foi um fluxo massivo de moedas de toda a Europa Ocidental


em direção à região dos conflitos, atraídas pela possibilidade de ganhos na
arbitragem entre valores nominais e metálicos. A Inglaterra, que vinha sofrendo
com o aumento da concorrência no mercado internacional de tecidos e com o
recente fracasso do Cockayne Project, que amplificou a crise na manufatura têxtil
do país, sentiu de forma particularmente severa os efeitos da escassez de moeda.
Já em 1621, a grande crise comercial fazia parte da pauta da Câmara dos Comuns
e, em 1622, uma comissão permanente foi instaurada para detectar suas causas e
propor soluções.

Foi no contexto de tal debate que surgiram as principais contribuições


teóricas do pensamento econômico britânico na primeira metade do século. De
formas distintas, os três principais autores do período estiveram envolvidos na
discussão: Gerard de Malynes, Edward Misselden e Thomas Mun. Ao voltarem

80
TÓPICO 1 | MERCANTILISMO

suas atenções para o estudo da crise comercial da década de 1620, os pioneiros da


análise econômica moldaram o que hoje é largamente reconhecida como a forma
clássica do mercantilismo britânico.

Thomas Mun elaborou England's Treasure by Forraign Trade, seu magnum


opus e obra-símbolo da doutrina mercantilista. Na controvérsia acerca das medidas
a serem adotadas, Malynes defendeu o par pro pari e Misselden disseminou a
doutrina do balanço comercial favorável, dois conceitos fundamentais no conjunto
do pensamento econômico pré-clássico. Para o bem ou para o mal, quando
recorremos à definição de bolso do mercantilismo, são as noções predominantes
que surgem.

As últimas décadas de pesquisas no campo da epistemologia nos
ensinaram que conceitos científicos não são imutáveis. Ao contrário, eles evoluem
conjuntamente com as teorias que sustentam, adquirindo significados que se
adaptam de forma mais adequada aos problemas relevantes em determinado
contexto histórico.

Se ocorrem na evolução de disciplinas científicas solidamente


estabelecidas, adquirem um significado ainda mais premente quando se trata
de analisar as elaborações rudimentares que antecedem a consolidação teórica
de determinada área do conhecimento. Embora seja impossível apreender com
precisão o significado atribuído por autores do passado para determinado
conjunto de conceitos, qualquer esforço historiográfico que desconsidere os
vínculos contextuais de tais noções está fadado ao insucesso.

O objetivo do artigo é oferecer uma espécie de mapa conceitual, que


permita apreender de forma mais verossímil as proposições que compõem o
"núcleo duro" da doutrina mercantilista. Conforme indicado, o estudo terá um
foco bastante preciso: o pensamento dos autores britânicos da primeira metade
do século XVII, mais especificamente, os três autores envolvidos no debate sobre
a crise comercial.

A guerra panfletária entre Malynes e Misselden será o suporte principal


da análise, pois os dois autores adotaram as perspectivas antagônicas típicas do
período e efetivamente debateram entre si. Observando suas divergências, podemos
mais facilmente perceber quais as premissas subjacentes por eles compartilhadas.

Embora Mun goze de maior prestígio historiográfico que os demais, sua
inserção no contexto do debate é problemática. O primeiro de seus dois tratados,
publicado na década de 1620, é uma mera refutação de críticas dirigidas à atuação
da East India Company, não possuindo grande riqueza em termos conceituais. Já
England's Treasure, um marco sob o ponto de vista analítico, só foi publicado
postumamente, em 1664. Embora haja certo consenso quanto à relevância da crise
de 1620 para sua elaboração, é difícil definir até que ponto as ideias de Mun já se
encontravam então maduras, ou se, pelo contrário, foram refinadas ao longo das
décadas subsequentes.

81
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

Assim, a obra de Mun será utilizada como um contraponto para a análise,


indicando quais noções sobreviveram ao debate e merecem, portanto, ser
caracterizadas como fundamentais nas reflexões econômicas do início do século.
FONTE: SUPRINYAK, Carlos Eduardo. Moeda, tesouro e riqueza: uma anatomia conceitual do
mercantilismo britânico do início do século XVII. 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/
scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-41612009000300005>. Acesso em: 26 fev. 2018.

82
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• O mercantilismo foi um período em que o comércio estava muito presente


dentro e fora dos países, a moeda se expandiu, ocorreram as grandes descobertas
geográficas e o desenvolvimento da navegação fez com que a esfera comercial
se expandisse. Ainda, houve um fortalecimento dos Estados nacionais e, os
mais fortes, adquiriram colônias.

• Em relação à acumulação de riquezas, acontecia através do acúmulo de metais,


ouro e prata. A prática metalista era o desenvolvimento da riqueza nacional
e a forma de fazê-la era através do comércio. O contexto de expansão dos
mercados foi entre os séculos XV e XVII.

• Principais teóricos:

- Thomas Mun (1571-1641).


- Jean-Baptiste Colbert (1619-1683).
- Richard Cantillon (1680-1734).
- David Hume (1711 – 1776).

• Principais argumentos do período:

- Riqueza provém de reservas de metais preciosos.


- Ouro e prata exercem função de moedas correntes.
- Estado deve acumular reservas pela descoberta de novas jazidas de minério.
- Estado deve ampliar reservas exportando mais e importando menos
(superávit).

83
AUTOATIVIDADE

1 Mercantilismo é o nome normalmente dado à política econômica de alguns


Estados Modernos europeus, desenvolvida entre os séculos XV e XVIII.
Indique:

a) duas características do Mercantilismo.


b) a relação entre o mercantilismo e a colonização da América.

2 “Da armada dependem as colônias, das colônias depende o comércio, do


comércio, a capacidade de um Estado manter exércitos numerosos, aumentar
a sua população e tornar possíveis as mais gloriosas e úteis empresas”. A
afirmação do duque de Choiseul (1719-1785) expressa bem a natureza e o
caráter do:

a) Liberalismo.
b) Feudalismo.
c) Mercantilismo.
d) Escravismo.
e) Corporativismo.

3 O historiador francês Fernand Braudel, referindo-se ao Mercantilismo,


afirma que este reagrupa comodamente uma série de atos de atitudes, de
projetos, de ideias, de experiências que marcam, entre o século XV e o século
XVIII, a primeira afirmação do Estado Moderno em relação aos problemas
concretos que ele tinha que enfrentar. Assinale a alternativa que expressa
corretamente uma característica do mercantilismo:

a) Pacto colonial, permitindo o pleno desenvolvimento interno e a liberdade


político-administrativa da Colônia.
b) Não intervencionismo estatal.
c) Incentivo à manutenção de uma balança comercial favorável, importando
mais que exportando.
d) Intervenção do Estado, que se efetivou sob forma de protecionismo e de
regulamentação da atividade econômica.
e) Monopólio concedido pelo Estado, que permitia a qualquer companhia de
comércio, sem autorização da metrópole, vender seus produtos na Colônia.

4 “Com o objetivo de aumentar o poder do Estado diante dos outros Estados,


o Mercantilismo encorajava a exportação de mercadorias, ao mesmo tempo
em que proibia exportações de ouro e prata e de moeda, na crença de que
existia uma quantidade fixa de comércio e riqueza no Mundo”.
FONTE: ANDERSON, Perry. Linhagens do Estado Absolutista. São Paulo Brasiliense, 1998, p. 35.

84
O trecho refere-se aos princípios básicos da doutrina mercantilista, que
caracterizava a política econômica dos Estados modernos dos séculos XVI,
XVII e XVIII. Com base na doutrina, marque a alternativa correta:

a) A doutrina mercantilista pregava que o Estado deveria se concentrar no


fortalecimento das atividades produtivas manufatureiras, não se envolvendo
em guerras e em disputas territoriais contra outros Estados.
b) Uma das características do mercantilismo é a competição entre os Estados
por mercados consumidores, cada qual visando a fortalecer as atividades
de seus comerciantes, aumentando, consequentemente, a arrecadação de
impostos.
c) Os teóricos do mercantilismo acreditavam na possibilidade de conquista
dos mercados por meio da livre concorrência, de modo que era essencial
desenvolver produtos competitivos, tanto no que diz respeito ao preço
como em relação à qualidade.
d) A conquista de áreas coloniais na América é a base de qualquer política
mercantilista. Tanto que o ouro e a prata, de lá provenientes, possibilitaram
ao Estado espanhol figurar como o mais poderoso da Europa após a Guerra
dos Trinta Anos.

5 Leia o trecho:

O fluxo de prata é despejado em um país protecionista, barricado de


alfândegas. Nada sai ou entra em Espanha sem o consentimento de um governo
desconfiado, tenaz em vigiar as entradas e as saídas de metais preciosos. Em
princípio, a enorme fortuna americana vem, portanto, terminar num vaso
fechado. Mas o fecho não é perfeito [...]. Ou dir-se-ia tão comumente que os
Reinos de Espanha são as “Índias dos outros Reinos Estrangeiros”. FONTE:
BRAUDEL, Fernand. O Mediterrâneo e o mundo mediterrânico à época de
Felipe II. Lisboa: Martins Fontes, 1983-1984, v. 1, p. 523-527.

a) Identifique a prática econômica a que se faz referência no texto.


b) Cite o principal objetivo da prática.

85
86
UNIDADE 2 TÓPICO 2
FISIOCRACIA

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico, estudaremos a fisiocracia, mas é necessário entendermos
a etimologia da palavra fisiocracia, que foi formada a partir do grego PHYSIS,
"forma, ordem natural, origem", mais KRÁTOS, "regra, valor, força".

Assim, fisiocracia foi uma teoria econômica do século XVIII, escrita por
franceses, que vão analisar o contexto histórico do século XVIII-XIX e percebem
que a riqueza das nações seria derivada unicamente da terra e não dos metais
preciosos, como vimos no tópico anterior.

Bons estudos!

2 CONTEXTO HISTÓRICO DA FISIOCRACIA


O contexto histórico da Fisiocracia compreende a era do iluminismo. O
iluminismo foi um movimento de ideias que teve origem no século XVII e se
desenvolveu especialmente no século XVIII. Sua denominação estava ligada ao
fato de seus impulsionadores, os filósofos iluministas, verem a si mesmos como
militantes da luta da razão, a “luz”, contra a tradição cultural e institucional, as
“trevas”.

Em seus escritos, os pensadores iluministas insistiam que somente a partir


do uso da razão, os homens atingiriam o progresso em todos os sentidos. A razão
permitiria instaurar no mundo uma nova ordem, caracterizada pela felicidade ao
alcance de todos. Universalidade, individualidade e autonomia eram o lema do
projeto civilizatório proposto pelos filósofos.

Os três princípios básicos do ideário iluminista podem ser assim


decodificados:

• Universalidade: o projeto visava a todos os seres humanos, independentemente


de barreiras nacionais ou éticas.
• Individualidade: os seres humanos devem ser vistos como pessoas concretas e
não apenas como integrantes de uma coletividade.
• Autonomia: o homem está apto para poder pensar por si mesmo, sem a tutela
ou ideologia, e para agir no espaço público conseguindo, por meio de seu
trabalho, os bens e serviços necessários para a sobrevivência material.

87
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

Sabemos que não podemos nos referir ao iluminismo como um movimento


homogêneo, pois foi uma forma de mentalidade, uma atitude cultural e espiritual
dos filósofos da época e dos burgueses.

Determinado modo de pensar e de sentir difundiu-se por muitos países


da Europa. Suas primeiras manifestações ocorreram na Inglaterra e na Holanda,
a partir do século XVII, mas foi na França do século XVIII que a decadência do
governo absolutista transformou as concepções filosóficas do iluminismo em
uma doutrina política e social.

Entretanto, os pensadores iluministas não apresentaram uma revolução,


mas uma ampla reforma. Mesmo no caso da França, onde a revolução de 1789
proclamou o culto da razão, não podemos afirmar que tais propostas trouxeram
um projeto revolucionário.

Ocorre que o projeto iluminista fez a burguesia adotar uma postura crítica
em relação à tradição cultural e ao Estado e, a partir daí, a propor a transformação
da antiga ordem em um mundo completamente novo, o mundo burguês.

Os iluministas defendiam um Estado constitucional, ou seja, a existência


de uma autoridade nacional central com poderes bem definidos e limitados e
ampla margem de liberdade civil.

Entre os partidários de um Estado constitucional de poderes limitados


está o inglês John Locke (1632-1704), considerado pai da teoria política liberal ou
do liberalismo político. Em sua obra “Segundo Tratado sobre o Governo Civil”,
de 1689, Locke desenvolveu uma teoria de governo limitado, na qual afirmava
que o poder monárquico era um contrato entre governo e governados, regido por
uma constituição.

De acordo com sua teoria, os homens viviam antes em um Estado natural


em que prevaleciam a liberdade e a igualdade absoluta, sem o controle de
nenhuma espécie de governo. A única lei existente era a da natureza, ou seja,
cada indivíduo colocava em execução sua própria lei e propriedade. Como cada
um estabelecia sua própria vontade, o resultado final seria o caos.

Na concepção de Locke, a única saída seria o estabelecimento de uma


sociedade civil e a instituição de um governo. Este, porém, deveria ter seu poder
limitado por um contrato político entre a sociedade e os governantes. Para o
filósofo, a autoridade e o poder delegado ao governante poderiam ser retirados,
pois os indivíduos mantinham o direito de substituir, rebelar-se ou derrubar um
governo tirânico.

Locke condenava o absolutismo pessoal dos monarcas ingleses e


considerava que o Executivo deveria ser um mero agente do legislativo, o poder
supremo. Rejeitava, energicamente, a possibilidade da concessão de um poder

88
TÓPICO 2 | FISIOCRACIA

ilimitado aos representantes do povo, alegando que o governo fora instituído


entre os homens para a preservação da propriedade privada.

3 TEÓRICOS ILUMINISTAS
O  iluminismo  foi um movimento intelectual que surgiu durante o
século XVIII na Europa, que defendia o uso da razão para maior liberdade
econômica e política. O movimento baseado nos ideais de liberdade, igualdade
e fraternidade  contou com a participação de diversos pensadores, os quais
estudaremos a seguir.

3.1 VOLTARIE (1694-1778)


Voltarie, cujo verdadeiro nome era François Marie Arounet, descendia de
família burguesa. Considerado um dos maiores pensadores franceses, partilhava
com o inglês Locke a ideia de um governo com poderes limitados, visto como
um mal necessário. Afirmava que todos os homens são dotados pela natureza do
direito à liberdade, à propriedade e à proteção das leis.

FIGURA 7 – VOLTARIE (1694-1778)

FONTE: Enciclopédia ilustrada (1979)

89
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

Entre os papéis de um jurisconsulto, foram encontradas notas que


talvez mereçam um pouco de exame. Que nunca lei alguma eclesiástica
vigore, salvo se receber a sanção expressa do governo. Foi por este
meio que Atenas e Roma nunca tiveram sequelas que constituem a
divisão das nações bárbaras ou tornadas bárbaras […]. Que todos
os eclesiásticos sejam submetidos, em todas as circunstâncias, ao
governo, pois são súditos do Estado” (VOLTARIE, 1988, p. 23).

3.2 MONTESQUIEU (1689-1755)


O filósofo negava a existência de uma forma perfeita de governo.
Montesquieu achava que o despotismo era o regime político apropriado aos
países com vastos territórios, a monarquia limitada constituía o ideal para os
países de tamanho médio e a república representava a forma de governo mais
adequada aos países pequenos.

Para o autor, os homens têm a tendência natural de abusar de qualquer


parcela de poder que lhes seja confiada. Portanto, para evitar um governo
despótico, a ação do governo deveria ser dividida em três poderes: o legislativo,
o executivo e o judiciário. Assim, cada esfera do governo deveria agir como um
freio para os outros dois.

FIGURA 8 – MONTESQUIEU (1689-1755)

FONTE: Enciclopédia ilustrada (1979)

Nas palavras do autor:

É bem verdade que nas democracias o povo parece fazer o que quer;
mas a liberdade política não se consiste em fazer o que quer. Num
Estado, isto é, numa sociedade em que existem leis, a liberdade só
pode consistir em poder fazer o que se deve querer e a não ser coagido
a fazer o que não se deve querer. É preciso ter em mente o que é
independência e o que é liberdade. A liberdade é o direito de fazer
tudo o que as leis permitem; e se um cidadão pudesse fazer o que
elas proíbem, ele não teria mais liberdade, porque os outros também
teriam esse poder (MONTESQUIEU, 1989, p. 71).

90
TÓPICO 2 | FISIOCRACIA

E
IMPORTANT

Existem três espécies de governo: o republicano, o monárquico e o


despótico. O governo republicano é aquele no qual o povo reunido,
ou somente uma parte do povo, tem o poder soberano; a monarquia,
aquela na qual um só governa, mas por meio de leis fixas e estabelecidas;
enquanto o despotismo apenas um, sem leis e sem regras, arrebata tudo
sob a sua vontade e o seu capricho. Existem em cada Estado três tipos
de poder: o poder legislativo, o executivo das coisas que dependem
da vontade das gentes e o poder executivo daquilo que depende do
direito civil. Pela primeira vez, o príncipe ou magistrado faz as leis por um
certo tempo ou para sempre, e corrige ou substitui aquelas que estão
feitas pela segunda, se faz a paz ou a guerra, se enviam ou recebem os
embaixadores, se estabelece a segurança, se previnem as invasões. Pela
terceira, se punem os crimes ou se julgam as diferenças particulares
(MONTESQUIEU, 1989, p. 12).

3.3 ROUSSEAU (1712-1778)


Ao contrário da maioria dos filósofos, tinha origens modestas e suas
concepções divergiam daquelas dos teóricos liberais. Rosseau defendia a tese de
que os homens viviam, primordialmente, em estado natural, porém conceituava
o estado de modo diferente do estado de Locke.

Enquanto para o pensador inglês o estado natural significava uma


situação de caos, para Rousseau significava o paraíso. Em sua visão, existiam
pouquíssimas possibilidades de conflitos quando os homens estavam em estado
de natureza, uma vez que não existia a propriedade privada a todos e todos eram
iguais entre si.

FIGURA 9 – ROUSSEAU (1712-1778)

FONTE: Enciclopédia ilustrada (1979)

91
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

Segundo Rousseau (1978), houve um momento em que alguns homens


desejaram a posse de terra e, ao demarcarem suas propriedades, iniciaram
o processo de desigualdade social e dominação tirânica. A única forma dos
indivíduos garantirem seus direitos seria a organização de uma sociedade civil
capaz de assegurar os direitos daqueles pertencentes à comunidade. Aconteceria
por meio de um contrato social em que cada indivíduo estaria de acordo em se
submeter pela vontade da maioria. A partir daí, nasceria o Estado. Vejamos:

O verdadeiro fundador da sociedade civil foi o que, tendo cercado um


terreno, lembrou-se de isto é meu e encontrou pessoas suficientemente
simples para acreditá-lo. Quantos crimes, guerras, assassínios, misérias
e horrores poupariam ao gênero humano aquele, que arrancando
estacas ou enchendo o fosso […] tivesse gritado a seus semelhantes:
defendei-vos de ouvir este impostor; estareis perdidos se esquecerdes
que os frutos são de todos e que a terra não pertence a ninguém
(ROUSSEAU, J. J., 1978, p. 45).

Rousseau (1978) defendia a ideia de que a bondade natural dos homens


foi pervertida pela civilização. Ele chegou a apresentar propostas detalhadas
para reformar a sociedade corrompida. Afirmava que a soberania era indivisível
e pertencente à comunidade no momento em que esta se constituía em uma
sociedade civil.

O poder soberano do Estado deveria estar sujeito a reduzidas limitações,


já que o sufrágio universal expressaria a vontade da maioria, ao mesmo tempo
em que se transformaria em um tribunal da última instância dos governos e dos
governados.

Assim, a decisão da maioria seria sempre justa, no sentido político,


tornando-se absolutamente obrigatória para cada cidadão. O governo seria
simplesmente um agente executivo do Estado compreendido por Rosseau como
a comunidade politicamente organizada, cuja função soberana era expressar a
vontade geral.

4 OS FISIOCRATAS E O PENSAMENTO ECONÔMICO


A fisiocracia, no contexto geral, foi percebida na França em meados
do século XVIII, com o objetivo de investigar o sistema econômico em seu
conjunto. Assim, a economia francesa era predominantemente agrícola, sendo as
atividades agrícolas majoritariamente capitalistas, com uma classe bem definida
de arrendatários burgueses, sobretudo na parte setentrional francesa.

Já por outro lado, na faixa meridional do território francês, encontrava-


se principalmente o tipo camponês. Nas cidades, por sua vez, as atividades
manufatureiras eram generalizadamente artesanais, embora não fosse ausente a
gestão capitalista. Quando confrontadas, a agricultura capitalista e a camponesa,
evidenciava-se a superioridade produtiva do capitalismo.

92
TÓPICO 2 | FISIOCRACIA

Os economistas fisiocratas vão passar a enxergar, na gestão capitalista da


atividade agrícola, a forma mais desejável de expansão para todos os meandros
da economia francesa.

Por outro lado, as atividades manufatureiras urbanas capitalistas eram, de


certa forma, omitidas pelos fisiocratas, por dois motivos fundamentais: primeiro
em função do predomínio da condução artesanal e segundo pois os fisiocratas
viam como tarefa histórica do capitalismo a ampliação do excedente.

Assim, os fisiocratas vão evidenciar aquelas atividades nas quais é


possível a formação do excedente: as atividades agrícolas. Se o excedente só existe
na agricultura, o capitalismo, como meio para ampliar o excedente, faz sentido
exclusivamente dentro do âmbito da atividade agrícola. É em tal contexto que
surge a teoria do excedente.

E
IMPORTANT

Excedente é a parte da riqueza produzida que excede a riqueza consumida


durante o processo produtivo. As vantagens associadas à produção estão relacionadas à
ampliação do consumo, sua reutilização na economia, proporcionando o crescimento
econômico.

Assim, os fisiocratas acreditavam que as atividades econômicas naturais,


como a agricultura, a mineração e o extrativismo eram mais importantes para a
prosperidade nacional do que o comércio. Para eles, o comércio era essencialmente
estéril, pois se limitava a transferir, de uma pessoa para outra, mercadorias já
existentes. Ainda, os fisiocratas sustentavam que as restrições impostas pelo
Estado constituíam um obstáculo para a expansão da economia.

E
IMPORTANT

Laissez faire, laisse passer et le monde va de lui-même (deixai fazer, deixai


passar e o mundo marcha sozinho) é a expressão que designa o ideário fisiocrata contra a
política intervencionista do mercantilismo.

93
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

5 PRINCIPAIS TEÓRICOS DA FISIOCRACIA


Os principais teóricos da fisiocracia, como Quesnay e Catillon (ambos
franceses), acreditavam que a riqueza dos países vinha da terra, via atividades
agrícolas. Estudaremos suas principais reflexões e estudos.

5.1 FRANÇOIS QUESNAY (1694-774)


Em seu trabalho “Tableau economique”, François definia três classes: os
proprietários rurais, os fazendeiros, e outras, consideradas classes "estéreis",
que consumiam tudo que produziam e não deixavam excedente para o próximo
período. Quesnay acreditava que somente o setor agrícola poderia produzir um
excedente que pudesse então ser usado para produzir mais no ano seguinte e
assim auxiliar o crescimento. A indústria e a manufatura, segundo ele, eram
estéreis.

FIGURA 10 – FRANÇOIS QUESNAY (1694-1774)

FONTE: Enciclopédia ilustrada (1979)

De início, é importante observarmos que os recursos necessários para


colocarmos a produção de cada setor em movimento são chamados, por Quesnay,
de adiantamentos, podendo ser de três tipos:

1- primitivos: ferramentas, edifícios, alimentos para os trabalhadores, alimentos


para o gado;
2- fundiários: melhorias nas terras, pontes;
3- anuais: salários, sementes e outras despesas com a mesma periodicidade.

Assim, Quesnay (1984) construiu um diagrama que representa a


distribuição dos adiantamentos através dos setores econômicos, revelando
a interdependência destes e as diversas fases que a receita inicial passa até

94
TÓPICO 2 | FISIOCRACIA

acontecerem sua reprodução e a formação do produto líquido. Sinteticamente,


portanto, a função do Tableau é descrever o processo de reprodução econômica.
Esquematicamente, o Tableau funciona da seguinte forma:

• De posse dos adiantamentos anuais (receita guardada do período precedente),


cada setor adquire o necessário para começar a operar: os agricultores compram
sementes e, os artesãos, matéria-prima.
• A parte dos adiantamentos anuais utilizada para comprar a produção dos
outros setores passa a ser chamada pelo setor que a recebe de adiantamento
primitivo.
• De posse dos adiantamentos primitivos, cada setor adquire o resto dos recursos
necessários para produzir: os agricultores compram ferramentas e, os artesãos,
alimento.
• Cada setor retém uma parte de sua produção para consumo próprio: os
agricultores consomem parte da colheita e, os artesãos, usam as ferramentas
que produzem.
• O restante da produção é distribuído entre os setores, sendo que somente para o
setor produtivo sobra o excedente, com o qual é paga a renda aos proprietários.

Vamos observar o quadro econômico:

FIGURA 11 – QUADRO ECONÔMICO


FÓRMULA DO QUADRO ECONÔMICO
Reprodução total: 5 bilhões
Adiantamentos anuais Renda para os Adiantamentos da
da classe produtiva proprietários das classe estéril
terras, o soberano e os
dizimeiros

2 bilhões 2 bilhões 1 bilhão


1 bilhão 1 bilhão
Somas que servem
para pagar a renda 1 bilhão
e os juros dos
adiantamentos 1 bilhão 1 bilhão
primitivos

Despesa dos
adiantamentos anuais 2 bilhões Total ..................... 2 bilhões
dos quais a metade é
Total ..................... 5 bilhões retida por essa classe
para os adiantamentos
do ano seguinte

FONTE: Quesnay (1958)

95
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

Considerações acerca do quadro anterior:

• Inversões de capital somente observamos na agricultura.


• Não se identifica circulação no interior da classe estéril.
• Economia seria fechada.
• Desenvolvimento por meio do cultivo → estágio estacionário.

As condições, segundo Quesnay (1958) para perpetuação do ciclo


produtivo, seriam:

a) Inexistência de política reducionista dos preços dos cereais.


b) Preços dos manufaturados manterem-se ao nível dos custos de produção →
evitar o monopólio → defesa do laissez faire.
c) Defesa do imposto único sobre a renda fundiária.
d) Defesa da expansão capitalista na gestão do território agricultável.
e) Questão pendente: ausência de uma teoria do valor, no quadro econômico se
trabalha apenas com preços.

Assim, a teoria do excedente é a base do sistema econômico representado


no tableau économique, com o objetivo de explicar como a riqueza global é
redistribuída pagando a renda fundiária e garantindo as condições que perpetuam
a reprodução do ciclo produtivo.

O comércio é uma troca entre coisas que existem e que têm, cada uma
delas, o seu valor respectivo. Existe ainda a necessidade de trocar
condição sem a qual não haveria qualquer troca ou comércio; todas
as coisas precedem a ação de trocar; a troca ou comércio não fazem
nascer os produtos: a ação de trocar não produz, portanto, nada; é
somente necessária para satisfazer uma necessidade que é ela própria,
a causa da troca (QUESNAY, 1958, p. 234-235).

Embora Quesnay estivesse errado sobre a esterilidade do setor


manufatureiro, ele estava certo em atribuir a pobreza da França ao mercantilismo,
que ele chamava de Colbertismo (por causa do ministro das finanças de Luís XV,
Jean-Baptiste Colbert).

Assim, o governo francês aplicava uma política de proteção à manufatura


do país em relação à produção externa.

5.2 TURGOT (1727-1781)


O autor defendeu a liberdade econômica e a estimulação do comércio em
um país. Vejamos sua escrita:

96
TÓPICO 2 | FISIOCRACIA

Conclui-se que um país onde o comércio é grandemente estimulado,


onde há muitos produtos e muito consumo, onde há muita oferta e
procura (demanda) de todos os tipos de mercadorias, cada espécie terá
um preço corrente relativamente a cada outra espécie, isto é, uma certa
quantidade de uma equivalerá à certa quantidade de cada uma das
outras (TURGOT, 1779, p. 142).

FIGURA 12 – TURGOT (1727-1781)

FONTE: Enciclopédia ilustrada (1979)

Segundo o autor, para que a França pudesse ter o desenvolvimento da


manufatura, a ação do livre comércio na sociedade francesa deveria acontecer.

6 GERADOR DO EXCEDENTE
Segundo os fisiocratas, o trabalho produtivo seria o gerador de excedentes
e dependia da fertilidade do solo. Tal excedente seria direcionado exclusivamente
à renda fundiária e nasce com a produção e não com a troca. Assim, as rendas são
rendas de trabalho, mesmo a do arrendatário capitalista.

Um dos grandes problemas encontrados na fisiocracia é a inexistência de
uma teoria do valor. Tal ausência limita o pensamento fisiocrático, na medida em
que impossibilita a mensuração, ou seja, a determinação quantitativa (em termos
de valor) das grandezas físicas distintas da produção econômica.

Assim, na fisiocracia, consideramos apenas o aspecto físico da produção,
como no caso da agricultura. Cada um dos bens empregados no processo
produtivo se reencontra em maior quantidade no conjunto dos bens produzidos
pelo próprio setor. “Maior” seria a expressão que denotaria a “mensuração” do
excedente.

97
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

6.1 MERCANTILISMO X FISIOCRACIA: ANÁLISE DOS


EXCEDENTES
O pensamento fisiocrata acreditava na ordem natural da sociedade e
que não poderíamos alterá-la por meio de leis governamentais criticando o
mercantilismo, que utilizava a teoria do laissez faire para condenar a intervenção
do Estado na economia, bem como a noção de riqueza dos mercantilistas que,
para estes, acontecia por meio do acúmulo de metais preciosos.

Assim, para os fisiocratas, a riqueza do mundo seria por meio da terra.


A terra é onde temos a agricultura, o que produziria o excedente econômico.
Vejamos um quadro explicativo:

QUADRO 1 – MERCANTILISTAS X FISIOCRATAS

Mercantilistas Fisiocratas
Origem do excedente O excedente se origina no ato da O excedente, ou produto líquido,
troca, como moeda excedentária. origina-se na produção agrícola.
b) Como o excedente é O excedente é formado Para mover a produção agrícola, é
obtido vendendo-se caro o que foi preciso adiantar os salários e meios
comprado barato. de produção aos trabalhadores.
Como resultado, obter-se-á uma
quantidade de produto que repõe
o investido com lucro, restando
ainda o excedente, que será pago ao
dono de terra. O excedente só surge
porque a terra fértil é um fator de
produção dado pela natureza, pelo
qual não se paga.
c) Quem manipula o O excedente é manipulado O excedente é extraído da
excedente pelos indivíduos ou grupos natureza pelos cultivadores, mas
de indivíduos que agem como é recebido e manipulado pelos
mercadores. donos de terra, sobre os quais pesa
a responsabilidade de utilizá-lo
de forma a otimizar a produção
nacional.
d) Como o excedente A obtenção de mais moeda O excedente, quando utilizado
gera mais excedente possibilita a movimentação de pelos proprietários para adquirirem
maiores transações, gerando-se os produtos dos setores estéreis
maior excedente do que o inicial. e agrícolas, acaba por estimular
a produção dos setores. Pode se
reverter em maior excedente se
o gasto com o setor agrícola for
suficiente para aumentar sua
capacidade produtiva.
FONTE: Pinho; Vasconcellos et al. (2018, p. 12)

98
TÓPICO 2 | FISIOCRACIA

LEITURA COMPLEMENTAR

A influência fisiocrata no pensamento de Adam Smith

CARVALHO, et al. (2013)

No séc. XVIII, na França, surgiu uma escola de economistas denominada


Fisiocratas. A palavra fisiocrata possui origem nas raízes gregas “fisios”
(natureza) e katria (governo), que gera a expressão “governo da natureza”. O
conjunto de reformadores sociais estava composto por Cantillon Turgot, Dupont
de Nermours, Miércer de La Riviére, Mirabeau, Vicent de Gournay e o seu maior
representante intelectual François Quesnay (1694-1774).

Conforme Hunt (1980), as ideias se originaram direta e indiretamente do
Quadro Econômico de Quesnay, de 1758, o qual demonstrava esquematicamente
as relações entre as diferentes classes econômicas, setores da sociedade e o “fluxo
de pagamentos”. Por ter uma proximidade cronológica com a escola clássica
econômica e um contato direto entre Quesnay e Adam Smith, reconhecido como
o maior representante da moderna ciência econômica, os fundamentos da escola
fisiocrata tiveram uma profunda influência na teoria clássica do século XVIII.

Para os fisiocratas, já que estavam em uma transição socioeconômica, o


meio que poderia gerar riqueza era a terra, onde era fonte de riqueza. Segundo
Heilbroner (1992), Adam Smith nasceu na cidade de Kirkcaldy, Condado de Fife,
na Escócia, em 1723.

Em 1759, publicou a “Teoria dos Sentimentos Morais”, entrando para o
seleto grupo dos grandes filósofos da época. Por volta de 1764 a 1766, teve contato
direto com os intelectuais franceses, dentre eles os fisiocratas Quesnay e Turgot.

No período, conhece parte do pensamento fisiocrata, como a questão


do individualismo, liberdade no comércio das mercadorias, liberalismo, ordem
natural, ordem providencial, laissez faire, dentre outros. Em 1776, publica a
sua mais importante obra “A Riqueza das Nações”, tendo nela a influência dos
fisiocratas, principalmente na introdução dos princípios que servirão de base à
Escola Clássica.

Conforme Hugon (1980), Smith cria uma ciência econômica que apresenta
inúmeros pontos de semelhança com os dos fisiocratas. Tal como este, busca
estabelecer as leis naturais explicativas dos fenômenos econômicos e das
suas relações, e melhor que eles, assenta solidamente o estudo dos problemas
econômicos em bases mais científicas e vastas.

Enquanto os fisiocratas partiam do pressuposto de que a sociedade era


gerida por uma Lei Natural, Adam Smith, em suas noções fundamentais, propôs
a mão invisível da concorrência no mercado e a política econômica do laissez-
faire.
99
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

Vicente de Gournay (1712-1759), fisiocrata e iluminista, já propunha, na


França, o laissez-faire, laissez-passer le monde va de lui-même, ou seja, “deixai passar,
deixai fazer o mundo caminhar por ele mesmo”. É a visão do individualismo
fisiocrata que vai influenciar o pressuposto do individualismo dos clássicos.

De acordo com Hunt e Sherman (2010), em uma economia de mercado


competitiva, composta de inúmeros pequenos produtores e consumidores,
em uma política de laissez-faire, encontraria sempre uma combinação ótima de
mercadorias.

Os fatores de produção seriam sempre utilizados de forma mais eficiente


e se os resultados fossem efetivamente ótimos, a interferência governamental nas
funções do mercado livre deveria ser restringida ao mínimo indispensável.

É por existir uma causa sem a qual os recursos naturais, por preciosos
que sejam, nada são, por assim dizer; uma causa que, ao atuar, pode
surgir a ausência ou insuficiência de recursos naturais. Em outros
termos uma causa geral e comum de riqueza, causa que, atuando
de modo desigual e varia entre os diferentes povos, explica as
desigualdades de riqueza de cada um deles; essa causa dominante é
o trabalho, e com isso gera a riqueza de uma nação” (HUGON apud
SMITH, 1988, p. 104).

O pensamento de Smith nada diferiu dos fisiocratas. Observávamos


maior confiança ao interesse privado, ao interesse individual, o homem como
sendo produto da natureza, agindo individualmente e, tendo ampla liberdade,
poderia regular o sistema econômico sem nenhuma ordenação. Embora a escola
fisiocrata não seja considerada como parte da economia como ciência, em Brue
(2005) encontra-se muita influência das ideias fisiocratas no pensamento clássico,
principalmente de Adam Smith.

Talvez, sem a existência da escola francesa, o pensamento clássico e
liberal da Inglaterra demorasse um pouco mais para construir um corpo teórico
explicativo do funcionamento de todo o sistema econômico.

Observando a influência da escola fisiocrata no pensamento clássico,


principalmente em Adam Smith, encontra-se uma grande influência da escola
francesa no pensamento inglês que surge como ciência no século XVIII. O primeiro
não prevalece como ciência por participar de uma mudança socioeconômica de
caráter ideológico.

Assim como em Smith, os princípios econômicos foram usados de forma


abrangente e não simplesmente para a geração de riqueza, mas também como
forma de aproveitamento e utilização por meio da ampliação das relações de
mercado, por considerarem não só a terra como produtora de excedentes, mas
todos os setores produtivos da economia.

100
TÓPICO 2 | FISIOCRACIA

É a tríade clássica da produção-distribuição-consumo que vai comandar


toda uma geração de pensadores, produtores e consumidores. É o mercado que se
contagia pelos princípios de liberdade de produção e escolha. É a ordem natural
aperfeiçoada e substituída pela mão invisível.

FONTE: CARVALHO, et al. A influência fisiocrata no pensamento de Adam Smith. II Congresso


Nacional de Pesquisa em Ciências Sociais Aplicadas – II CONAPE. Francisco Beltrão/PR, 2, 3 e 4
de outubro de 2013.

101
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• Os fisiocratas consideravam o sistema econômico como um “organismo”


regido por leis naturais das coisas.

• Embasavam-se na economia agrícola, identificando na terra a fonte única de


riqueza: uma semente é capaz de gerar mil, os recursos nela se reproduzem.

• Apontavam para a necessidade do laissez-faire (livre mercado).

• O trabalho na terra seria o gerador de excedente.

• Principais teóricos: Quesnay e Turgot.

• Principal obra: Tableau economique (1958).

102
AUTOATIVIDADE

1 Assinale a opção em que se encontra corretamente identificado um dos


preceitos fundamentais da Fisiocracia:

a) ( ) O ouro e a prata suprem as necessidades de todos os homens.


b) ( ) Os meios ordinários, portanto, para aumentar nossa riqueza e tesouro,
são o comércio exterior.
c) ( ) O soberano e a nação jamais devem esquecer de que a terra é a única
fonte de riqueza e de que a agricultura é que a multiplica.
d) ( ) Todo comércio consiste em diminuir os direitos de entrada das
mercadorias que servem às manufaturas interiores.
e) ( ) As manufaturas produzirão benefícios em dinheiro, o que é o único fim
do comércio e o único meio de aumentar a grandeza e o poderio do Estado.

2 A frase “Laissez faire, laissez passer, le monde va de lui même” (“Deixe fazer, deixe
passar, o mundo vai por si mesmo”), atribuída por Vincent de Gournay, é
considerada o emblema da fisiocracia. O que a frase sugere?

a) O mundo precisa ser governado pelas forças da natureza em todas as


instâncias. O homem não deve interferir na ordem natural do mundo.
b) O autor defende a posição intervencionista da economia mercantilista.
c) A iniciativa privada é nociva à economia.
d) A livre iniciativa das pessoas e a livre ação dentro do mercado garantem o
bom funcionamento da economia.
e) Não há liberdade no êxito da economia, portanto os homens não devem se
preocupar com o futuro do mundo e “deixá-lo passar”.

3 “Que nunca percam de vista o Soberano e a Nação o fato de a terra ser a única
fonte das riquezas e que a agricultura as multiplica. Que a propriedade dos bens
de raiz e das riquezas mobiliárias seja assegurada aos seus possuidores legítimos,
pois a segurança da propriedade é o fundamento essencial da ordem econômica
da sociedade” (QUESNAY, François. Maximes Generales du Government
Economique). François Quesnay lançou as bases do pensamento liberal
fisiocrata, o qual:

a) Preconizava que o aumento populacional determinava a escassez de recursos


naturais e, consequentemente, crises de abastecimento.
b) Relacionava a necessidade de manter a ordem socioeconômica ao montante
de investimentos industriais.
c) Explicitava as aspirações das massas camponesas que tencionavam destruir
o feudalismo.
d) Defendia a valorização da nobreza territorial, a supremacia e a centralização
do poder real.
e) Defendia as aspirações burguesas e criticava a intervenção estatal na vida
econômica.
103
4 Descreva o “Tableau Economique” de Quesnay, identificando seus propostos
e sua função. Qual o esquema proposto por ele na circulação da riqueza?
Qual a razão apontada pelo autor de que somente a agricultura produz
riqueza, sendo as outras atividades consideradas “estéreis”?

5 Apresente as definições mercantilistas e fisiocráticas para o conceito de


excedente, discutindo as questões:

a) Qual é a origem do excedente?


b) Como o excedente é obtido?
c) Quem manipula o excedente?
d) Como o excedente gera mais excedente, estimulando a produção?

6 Os fisiocratas foram os primeiros a formular uma teoria coerente sobre o


sistema capitalista de produção. Quais foram as três maiores contribuições
da doutrina?

104
UNIDADE 2 TÓPICO 3

LIBERALISMO

1 INTRODUÇÃO
Para discutirmos o liberalismo, é importante entendermos que a palavra
deriva do latim, liber (livre) e está associada com a palavra “liberdade”. Assim, o
termo “liberalismo” está baseado na defesa da liberdade individual, nos campos
econômico, político, religioso e intelectual, contra as intervenções e atitudes do
poder do Estado.

Em relação aos principais teóricos, vamos analisar, neste tópico, Adam


Smith (1723-1790), David Ricardo (1722-1823), Thomas Malthus (1766-1834) e
Stuart Mill (1806-1873).

Entretanto, é importante discutirmos a lógica da escrita por meio da


ciência e método de perspectiva histórica e os escritos de John Locke (1632-
1704). Seus principais conceitos incluem isonomia metodológica e jurídica
(igualdade diante da lei), liberdade de pensamento (tolerância ideológica –
religião – progresso material que favorece toda a sociedade), direitos vitais
(vida, propriedade e liberdade), estado de direito, governo limitado (defesa dos
governos constitucionais eleitos e representativos de “contrato social”), ordem
espontânea, propriedade privada e livre mercado.

2 CIÊNCIA E MÉTODO: PERSPECTIVA HISTÓRICA


Por que estudar metodologia do conhecimento se conhecer é uma
atividade tão natural e espontânea? Por que problematizar? Se conhecer exige
método, qual o melhor? Qual seu poder e seus limites? O que é o conhecimento
e quais são suas formas?

E
IMPORTANT

Assim, quais são as formas de conhecimento? Dependem do método, seja ele


intuitivo no sentido de imediato, direto, instantâneo, sensitivo. Além do racional, no sentido
filosófico e/ou científico, lógico, abstrato, universal, metódico, dentre outros.

105
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

Sabemos que métodos são caminhos para atingirmos o conhecimento.


Podem ser falsos, nada garantem. Há o mito do método científico que produz
um conhecimento verdadeiro, exato e definitivo; importante é o objetivo e não o
método.

E
IMPORTANT

Método é como a gramática: sua aplicação não garante uma boa poesia. Todo
método é histórico: reflete a visão do homem (sujeito) e do mundo (objeto) e do próprio
conhecimento: mito, razão, fé, experiência-razão.

Perpassado o entendimento sobre ciência e método que envolvem indução,


dedução, percepção da realidade social, vamos dialogar com os principais teóricos
do liberalismo e suas obras.

3 OS LIBERAIS
Os pensadores do século XVIII pregaram essencialmente o fim da intervenção
do Estado na vida particular dos indivíduos e na vida pública. Assim, promoveram a
crítica ao mercantilismo, propondo o fim da interferência estatal na economia.

O liberalismo relaciona a necessidade de desregulamentar e privatizar


as atividades econômicas, reduzindo o Estado a funções bastante definidas.
Determinadas funções constituem apenas parâmetros gerais para as atividades
livres dos agentes econômicos. São três, basicamente: a manutenção da segurança
interna e externa, a garantia dos contratos e a responsabilidade por serviços
essenciais de utilidade pública.

Segundo a ideia liberal, a procura do lucro e a motivação do interesse


próprio, pela lógica do individualismo, estimulam o empenho e o engenho
dos agentes, recompensam a poupança, a abstinência presente e remuneram o
investimento, assim a economia cresce e prospera.

4 PRINCIPAL AUTOR DO LIBERALISMO: ADAM SMITH


O liberalismo pode ser considerado como uma doutrina baseada na
liberdade individual na economia. Adam Smith vai tentar entender os problemas
da economia que os mercantilistas e fisiocratas não conseguiram compreender,
por meio da ótica do liberalismo, denominado por ele de “mão invisível” para
autorregular o mercado.

106
TÓPICO 3 | LIBERALISMO

Estudioso das teorias fisiocratas, é considerado o pai da moderna teoria


econômica. Smith afirmava que o trabalho produtivo, e não a agricultura, era
a verdadeira fonte de riqueza. Embora aceitasse o princípio do laissez-faire,
acreditava que certas formas de interferências governamentais na economia eram
toleráveis, desde que se destinassem a prevenir a injustiça.

FIGURA 13 – ADAM SMITH (1723-1790)

FONTE: Enciclopédia ilustrada (1979)

Outro ponto importante de sua teoria dizia respeito à divisão do trabalho.


Para Adam Smith, no momento em que houvesse a especialização do trabalho
em todas as atividades econômicas, e principalmente em todas as nações, seria
facilitada a produção de bens.

No plano internacional, o mundo se transformaria em uma vasta


oficina, executando o trabalho onde fosse exigida menor necessidade de tempo
e esforço, graças à colaboração da natureza e ao aproveitamento das aptidões
humanas.

Tal divisão do trabalho criaria, mediante o desenvolvimento de atividades
diferentes e complementares, a solidariedade entre os homens e as nações.

4.1 CONFERÊNCIAS DE GLASGOW


Em uma conferência na universidade de Glasgow, Smith observou que:

• Em relação à realidade econômica, a economia ainda era mercantil, existiam


trabalhadores independentes e o artesão.
• O lucro não aparecia como forma de rendimento. A renda do artesão é
proporcional ao trabalho e não ao capital.
• Daí surgem três olhares:

107
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

Esboço da teoria do valor: noções de preço natural (PN) e preço corrente,


PC (PC) > PN através da concorrência. Concorrência entre indivíduos e não entre
capitais, que lutam para ocupar melhores postos de trabalho. O PN é maior.

Divisão do trabalho: causa que aumenta a “capacidade produtiva


do trabalho”. DT como tendência natural da natureza humana, ou seja, da
racionalidade humana.

Esboço do princípio do autointeresse: Smith observava a penetração da


indústria capitalista nas cidades, o assalariamento do trabalhador independente
e o aumento da concorrência.

4.2 A RIQUEZA DAS NAÇÕES: O TRABALHO


O ponto de partida de Smith foi a crítica ao conceito de Produto Líquido
ou Físico (PL) e trabalho produtivo dos fisiocratas, pois:

• Fisiocratas: só trabalho agrícola gera PL – usufrui da produtividade natural da


terra.
• Adam Smith: PL não é exclusivo da agricultura (não só trabalho agrícola gera
PL).

E
IMPORTANT

O que é produto líquido (PL)?

O produto líquido é um fenômeno associado ao trabalho em geral e não a um tipo de


trabalho específico. O PL depende da produtividade do próprio trabalho. Novo conceito de
produtividade.

Se o PL é geral, sua natureza não é mais física, mas abstrata. Não se reduz à renda da terra,
mas toma também a forma de lucro.

Riqueza = PL = Valor = adicionado às mercadorias produzidas pelo trabalho.

Contraste com conceito fisiocrata: riqueza como algo natural, estático – estoque de metais.

Sobre a riqueza das nações e a divisão do trabalho (DT), a principal


questão do autor seria: de que depende a produtividade ou a capacidade de o
trabalho produzir PL, excedente? O trabalho é sempre produtivo? Quando ele
é mais ou menos produtivo? A produtividade do trabalho depende da divisão
do trabalho. A DT gera produtividade porque o trabalhador realiza um número
pequeno de operações.

108
TÓPICO 3 | LIBERALISMO

• Produtividade máxima > cada trabalhador só realiza uma operação.


• Quanto menos operações > menor perda de tempo na passagem entre
atividades.
• Redução de operações > especialização das tarefas e das ferramentas.
• Exemplo da fábrica de alfinetes: sem DT= 1 trabalhador = 1 alfinete/dia
• Com DT= 18 operações diferentes = 10 trabalhadores = 48 mil/dia >> 1 trab. =
4.800/dia.

Assim, a divisão do trabalho não provém de uma diversidade natural de


aptidões e talentos, mas a divisão do trabalho vem da tendência natural para
permuta e troca, e é uma coisa inata; DT especializa e separa os indivíduos.

Então com a com DT > homens vivem das trocas ou do trabalho dos
outros. Sociedade de trocas: trocas criam laços sociais. Há uma relação dinâmica
entre DT e tamanho do mercado.

4.3 A TEORIA DO VALOR EM SMITH


Já vimos que, por meio da divisão do trabalho, temos as trocas de
mercadorias. Então, o que regula as trocas? O valor das mercadorias, pois o valor
de um bem ou serviço depende de forma direta da quantidade de trabalho a ele.
 
Assim, a Teoria do Valor é necessária para explicar:

• A origem do valor das mercadorias.


• As relações de troca entre mercadorias.
• A distribuição do valor entre classes sociais.

Assim, a teoria do valor de Smith explica a origem e distribuição do valor,


a acumulação de capital e o desenvolvimento econômico. Segundo Smith, a
palavra VALOR tem dois significados:

• Valor de uso ou a utilidade que uma mercadoria tem para uma pessoa.
• Valor de troca ou o poder de compra que uma mercadoria tem em relação a
outras mercadorias.

As coisas que têm mais valor de uso, geralmente têm pouco valor de troca
e vice-versa.

109
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

4.4 A TEORIA DO VALOR E SUA RELAÇÃO COM O


TRABALHO
Segundo Smith (1988, p. 61) “o valor de uma mercadoria (M), para quem
a possui e não deseja usá-la, mas trocá-la por outros bens, é igual à quantidade
de trabalho que essa mercadoria lhe dá condições de comprar ou de comandar”.
Assim, o trabalho é a medida real do valor de todas as mercadorias.


O trabalho é o preço real das mercadorias. O preço nominal das mercadorias
varia no mercado de acordo com a quantidade de dinheiro, mas seu preço real é
proporcional ao trabalho que custa para produzi-la.

Ainda, para o autor, “sempre e em toda parte valeu este princípio: é caro o
que é difícil de se conseguir, ou aquilo que custa muito trabalho e é barato aquilo
que pode ser conseguido facilmente ou com muito pouco trabalho” (SMITH,
1988, p. 65). Então, o trabalho constitui o padrão último e real do valor de todas
as mercadorias.

O mecanismo da concorrência assegura que as mercadorias sejam trocadas


de acordo com seu valor. Por exemplo: se A obtivesse na troca outras mercadorias
que tivessem custado uma quantidade maior de trabalho que a quantidade
empregada para produzir A, haveria um afluxo de produtores para produzir A e
seu preço diminuiria até A obter, na troca, mercadorias que contenham a mesma
quantidade de trabalho e vice-versa.

4.5 DISTRIBUIÇÃO DO VALOR GERADO PELO TRABALHO


A distribuição do valor gerado pelo traballho entre as classes sociais
(classe produtiva, classe capitalista, classe proprietária) apresenta algumas
particularidades:

• No estágio antigo e primitivo, que precedeu a acumulação de capital, todo o


produto do trabalho pertence ao trabalhador (“salário” = produto do trabalho).
• No momento em que o capital se acumulou nas mãos de pessoas particulares,
algumas delas empregarão o capital para contratar pessoas laboriosas,
fornecendo-lhes matéria-prima e subsistência a fim de auferir lucro coma
venda do trabalho dessas pessoas.

Assim, o valor que os trabalhadores acrescentaram aos materiais se


desdobra em duas partes, sendo que a primeira paga os salários do trabalho e
a outra, os lucros do empresário. Na situação, o produto total do trabalho não
pertence ao trabalhador, pois deve reparti-lo com o dono do capital (Produto do
trabalho = salário + lucro).

110
TÓPICO 3 | LIBERALISMO

No momento em que toda terra se torna propriedade privada, os seus


donos gostam de colher onde nunca semearam, exigindo uma renda, mesmo pelos
produtos naturais da terra. A renda passa a constituir o terceiro componente do
preço das mercadorias. O valor que os trabalhadores acrescentam aos produtos
agrícolas se desdobra em três partes:

salários + lucros do capital + renda da terra

Smith afirma que todo valor de troca é fruto do trabalho, mas é repartido
na forma de salários, lucro e renda da terra, sendo esses três componentes do
preço das mercadorias presentes em uma sociedade desenvolvida, onde há
acumulação de capital e propriedade privada da terra.

Assim, por meio do trabalho, bem como de sua divisão, é que se faria a
produtividade, bem como se constituiria a riqueza das nações.

4.6 TEORIA DOS SALÁRIOS


Smith (1988) observou que na economia primitiva não há salário, mas é
o ponto de partida da análise da distribuição de Smith, pois nessa situação o
trabalhador fica com todo o fruto de seu trabalho, o que não acontece em uma
economia capitalista.

Já na economia capitalista, o trabalhador reparte o produto do trabalho


com o dono do capital e o dono da terra: salário é um componente do preço
natural das mercadorias. Assim, ter-se-ia duas teorias:

• Teoria do salário de subsistência: é o limite mínimo dos salários. O mecanismo


da concorrência entre trabalhadores e lei da população tendem a estabelecer o
salário de subsistência.
• Teoria da negociação: dependendo das condições da economia (crescimento e
maior demanda por mercadorias) e do poder de barganha dos trabalhadores, o
salário pode ser contratado acima da subsistência. Smith (1988) relata o maior
poder dos capitalistas, sempre protegidos pelas leis e pelas autoridades. Um
salário melhor é fator de progresso, pois aumenta a produtividade do trabalho
e é consequência do progresso. A origem do lucro é o trabalho produtivo, mas
se relaciona ao montante do capital e não tem qualquer relação com o trabalho
capitalista.

Ademais, o autor chama a atenção de que há uma relação inversa entre


lucros e salários: o aumento da acumulação aumenta a demanda de mercadorias
e, assim, dos salários, o que implica em uma queda dos lucros.

111
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

4.7 TEORIA DO CRESCIMENTO ECONÔMICO


O modelo de crescimento de Adam Smith é semelhante ao dos fisiocratas,
mas o setor dinâmico não é a agricultura e sim a indústria; porque a indústria
permite:

• Maior divisão trabalho > produção total.


• Maior acumulação de capital e progresso técnico.

Smith não coloca a primazia do desenvolvimento econômico no


setor agrícola, mas no industrial, por que neste a divisão do trabalho (DT) e a
produtividade podem ser maiores. Assim, os dois requisitos fundamentais para
o desenvolvimento econômico são:

• Crescente Divisão do Trabalho (T) e da Produtividade: a melhoria das forças


produtivas do trabalho depende da melhoria da capacidade do trabalhador e
da melhoria da capacidade das máquinas.
• Acumulação de Capital (K): alimentada pelas poupanças derivadas dos lucros
ou de outras poupanças; o número de trabalhadores empregados depende do
montante de K acumulado.

Em relação aos limites do crescimento econômico, Smith não espera que


prossiga de forma indefinida:

• Limites no Longo Prazo (LP): esgotamento de recursos naturais impediriam


o crescimento demográfico. Há indicações do Estado Estacionário na Riqueza
das Nações.
• Limites no Curto Prazo (CP): sua preocupação maior era com os limites a CP,
colocados por fatores políticos, mais que econômicos.

Enfim, Adam Smith se baseou no método científico por meio da filosofia


moral para escrever seu famoso livro “A Riqueza das Nações”, em 1776,
demonstrando a importância da divisão do trabalho para entendermos a riqueza
das nações, bem como a lógica do autointeresse e da mão invisível, que regularia
a economia sem a necessidade de intervenção do Estado.

5 PRINCIPAL AUTOR DO LIBERALISMO: DAVID RICARDO


David Ricardo foi um corretor de valores enriquecido por especulações,
ficando conhecido pela “lei de ferro dos salários”. Na teoria, Ricardo defendeu a
ideia de que todas as tentativas para o aumento do ganho real dos trabalhadores
são inúteis, uma vez que os salários permanecerão próximos ao nível de
subsistência.

112
TÓPICO 3 | LIBERALISMO

FIGURA 14 – DAVID RICARDO (1772-1823)

FONTE: Enciclopédia ilustrada (1979)

Para Ricardo (1991, p. 67), “o preço natural do trabalho é aquele que


fornece aos operários em geral os meios de subsistir e de perpetuar sua espécie
sem crescimento nem diminuição [...]”. Ainda, também discutiu o valor da
mercadoria. Segundo ele, o valor de uma mercadoria depende da quantidade
relativa de trabalho necessário para produzir e não da remuneração maior ou
menor concedida ao operário.

5.1 O MÉTODO DE DAVID RICARDO


Ricardo inaugurou um novo método de análise. Isolou problemas
econômicos, abstraindo-os do contexto. Ele estreitou o campo da análise
econômica e definiu o método estritamente lógico do conhecimento. Seu objetivo
era elucidar princípios e demonstrar que operavam na realidade. Vejamos o
contexto:

1810 – Ensaio sobre o alto preço do ouro: leis sobre a distribuição


internacional do ouro e os preços monetários internos.
1815 – Ensaio sobre o alto preço do cereal e como ele afeta os lucros do
capital.

Seu principal desafio era demonstrar teoricamente, contra a ortodoxia


dominante, que o alto preço do cereal provocava queda dos lucros, articulando:

• Lei dos rendimentos decrescentes na agricultura.


• Lei populacional e salários de subsistência.
• Teoria do valor trabalho.
• Variação do produto nacional (lei do valor) é independente de sua distribuição
entre Salário, Lucro e Receita da Terra.

113
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

Em sua obra escrita em 1817, “Princípios de Economia Política e


Tributação”, David Ricardo procura leis econômicas que regulam a distribuição,
substitui o tema da acumulação de capital e crescimento pelo problema do Valor
e Distribuição e como afeta a taxa de lucro e o crescimento econômico.

A teoria da acumulação de capital de Ricardo é apenas consequência da


teoria dos lucros, no sentido de que a acumulação depende do comportamento
dos lucros. Temos um método, essencialmente dedutivo e a questão central é o
comportamento da taxa de lucro; oposição entre lucros e salários.

Em relação ao modelo agrícola de determinação da renda e dos lucros,


a questão central é: do que dependem os lucros? Por que cai a taxa de lucro?
Segundo o autor, é devido à menor produtividade do trabalho nas terras não tão
férteis e ao maior custo dos transportes.

É da queda dos lucros que surge a renda e não o contrário. “Em todos
os tempos e em todos os países, os lucros dependem da quantidade de trabalho
suficiente para dar aos trabalhadores um volume de artigos necessários para
sua subsistência, numa terra ou com um capital que não produzem renda”
(RICARDO, 1991, p. 23).

Formalização da teoria ricardiana:

X = quantidade de trigo na terra marginal.


T = quantidade de trabalho utilizada nessa terra.
X/T = a = produtividade do trabalho ou quantidade de trigo produzida por
trabalhador na terra marginal.
W = taxa de salário = quantidade de trigo consumida por trabalhador.
X – WT = lucro.
r = taxa de lucro = X – WT/WT = a/W -1.

Se “w” for constante ao nível da subsistência e se “a” for decrescente, em


virtude do maior cultivo de terra, “r” decresce. Quando “a” = “w”, “r” = zero.

5.2 OPOSIÇÃO ENTRE LUCROS E SALÁRIOS


A renda da terra não explica o comportamento dos lucros e salários.
Ricardo se livra da Renda da Terra (RT) como fator explicativo do Salário (S),
Lucro (L), Renda da Terra (RT), que se explicam pelo mesmo princípio teórico:
dificuldade ou custo crescente de produção de alimentos.

A elevação dos salários só afeta lucros e não os preços (valor) do trigo.


A origem do valor nada tem a ver com a sua distribuição (entre S – L - RT). A
distribuição não afeta o valor e preços dos produtos. A taxa de lucros é determinada
pela taxa de salários.

114
TÓPICO 3 | LIBERALISMO

6 PRINCIPAL AUTOR DO LIBERALISMO: THOMAS MALTHUS


Ficou conhecido pela teoria segundo a qual o crescimento da população
tenderia a superar a produção de alimentos, o que tornaria necessário o controle
de natalidade.

FIGURA 15 – THOMAS MALTHUS (1766-1834)

FONTE: Enciclopédia ilustrada (1979)

Em primeiro lugar, a alimentação é necessária ao homem; em


segundo, a paixão entre os sexos é necessária e se manterá com poucas
diferenças tal como existe agora, o poder da população é infinitamente
maior que o poder da terra para produzir as substâncias necessárias
ao homem. A população não encontra obstáculos, cresce de acordo
com uma progressão geométrica. As substâncias crescem com uma
progressão geométrica. Basta um pequeno conhecimento dos números
para mostrar a imensidade do primeiro poder em comparação com o
segundo (BEAUD, 1991, p. 22).

Percebemos que Adam Smith e David Ricardo tinham uma perspectiva
otimista sobre o futuro do capitalismo, já o autor Malthus teria uma perspectiva
um pouco sombria. Acontecia pelos seguintes motivos:

• Crescimento demográfico ameaça o futuro da sociedade.


• O sistema econômico tem defeitos: crises de superprodução.
• Situação da Inglaterra: os males sociais da Revolução Industrial eram mais
visíveis.

6.1 TEORIA DA POPULAÇÃO


Tomas Malthus não foi o primeiro a tratar do tema “teoria da população”,
mas o primeiro a dar uma resposta teórica. Suas ideias são ainda hoje um ponto
obrigatório de referência. Na sua época, sua teoria atraiu atenção, não tanto por sua
base científica, mas enquanto bandeira conservadora contra qualquer tipo de reforma.
115
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

Formulação de sua teoria: a capacidade de reprodução da população é


sempre superior à capacidade da terra produzir alimentos. A população, quando
não controlada, cresce em uma taxa geométrica, mas a produção de alimentos
cresce, ao máximo, em uma taxa aritmética. A conclusão leva à necessidade de
controle da população.

ATENCAO

Diferença entre progressão aritmética e geométrica: uma progressão aritmética


é a sequência de números em que um termo é resultado da soma do termo anterior com
a razão (r).

Exemplo: 1, 7, 13, 19, 25, 31, 37, 43, 49... Já uma progressão geométrica substitui a soma pela
multiplicação. Exemplo: 1, 4, 16, 64, 256, 1024, 4096...

Assim, há dois tipos de controle da população:

• Controle preventivo: feito pelas normas legais, como retardamento dos


casamentos, limitação do número de filhos. O método pode ser eficaz para os
ricos, que têm maior consciência e medo de rebaixar seu nível de vida, mas
para os pobres não funciona.
• Controle positivo: como o controle preventivo não funciona, é necessário um
controle positivo, exercido pelas leis naturais, como o aumento da mortalidade
infantil, fome, peste, miséria, doenças, guerras. A pobreza e a miséria são uma
punição natural das classes inferiores, que não controlam sua multiplicação.

Para o autor, em relação ao naturalismo social, os objetivos seriam:


lançar uma sombra sobre o futuro da humanidade e levantar a bandeira contra
a igualdade e as reformas sociais. Malthus só admitia o progresso da miséria,
mesmo que se eliminasse toda pobreza e vício. Partindo-se de uma situação de
igualdade, logo surgiriam diferenças sociais, que são naturais e que devem ser
deixadas a cargo das leis naturais.

A pobreza faz parte das leis naturais, que indicam um futuro sombrio para
a humanidade; não há distribuição de renda e reforma social que possa garantir
um padrão de vida digno para os pobres. Se a causa da pobreza é o excesso da
população, qualquer distribuição só serve para estimular a indolência e a preguiça.
As “leis dos pobres” só pioram a pobreza e o progresso depende mais da ação
individual do que das reformas sociais. Segundo Beaud (1991, p. 53):

Um homem que nasce em um mundo já ocupado, não tem o direito de


reivindicar seu lugar; na festa da natureza não há lugar vago para ele;
ela lhe diz para ir embora e logo executa suas próprias ordens; pelas
leis da natureza, algumas pessoas tiraram bilhete em branco na loteria

116
TÓPICO 3 | LIBERALISMO

da vida; nenhum sacrifício dos ricos poderá aliviar o sofrimento dos


pobres, pois eles são os próprios culpados pela sua pobreza; o único
direito de um homem é o de ter o que o seu salário lhe permite adquirir;
a fome é um estímulo ao trabalho.

Em relação à influência sobre a teoria dos salários, podemos dizer que a


teoria da população de Malthus foi um dos pilares da teoria clássica dos salários
de subsistência. Através dela, justifica-se a apropriação de todo o excedente pelos
capitalistas e rentistas. Smith ainda admite que o progresso pode elevar os salários
acima da subsistência. Para Malthus, nem o progresso seria capaz de melhorar a
situação dos pobres; para Ricardo, qualquer aumento salarial afeta os lucros e a
acumulação.

6.2 TEORIA DA DEMANDA EFETIVA E DA SUPERPRODUÇÃO


Vimos que Adam Smith e David Ricardo defendem a poupança como
condição necessária e suficiente da acumulação e do crescimento. Já para Malthus,
o que faz com que os capitalistas invistam? O simples fato da poupança? A
poupança é necessária, mas não suficiente para garantir o novo investimento.

Ninguém arisca investir mais, empregar mais trabalhadores e produzir


mais, esperando vender a nova produção aos novos trabalhadores que vai
empregar. É necessário ter uma demanda efetiva prévia à produção para que
haja investimento, pois a produção não cria necessariamente uma procura efetiva
igual à oferta.

Assim, deve haver qualquer coisa prévia e independente da procura dos


trabalhadores para que seu emprego seja garantido. A procura efetiva não pode se
originar normalmente dos gastos daqueles que produzem. Na falta de demanda
efetiva, é possível uma crise de superprodução.

A origem da falta de demanda seria o padrão de consumo das três classes:


trabalhadores gastam toda renda na sua subsistência, proprietários também gastam
toda sua renda em consumo e artigos de luxo, mas os capitalistas consomem pouco
e poupam muito para o investimento em nova produção. O problema seria o baixo
consumo dos capitalistas e sua ânsia no acúmulo e no lucro.

As soluções seriam gastos para o emprego dos trabalhadores improdutivos


que não gerem produtos, como os serviços pessoais, estradas e obras públicas,
para haver o estímulo do comércio interno e externo, gerando novos mercados.

Assim, percebemos que a teoria da população teve profunda influência


nas teorias e debates sobre população até os dias atuais. O mérito de Malthus
seria o de ter levantado problemas centrais sobre o funcionamento da economia
capitalista, ainda que teoricamente confusa (desequilíbrio entre população e
alimentos e entre oferta e procura).

117
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

ATENCAO

As teorias de Ricardo e também de Smith, como já vimos, ao defenderem o


progresso das forças produtivas inerentes ao capitalismo, não observavam qualquer obstáculo
ao desenvolvimento econômico capitalista. A teoria de Malthus significava uma negação das
virtudes do sistema, enquanto a teoria de Smith e Ricardo era, ao mesmo tempo, uma teoria
e também uma ideologia do sistema capitalista.

7 PRINCIPAL AUTOR DO LIBERALISMO: JONH STUART MILL


Foi um estudioso das obras de John Locke, Adam Smith e David Ricardo.
Em sua principal obra, “Ensaios sobre Economia Política”, de 1848, Mill defendeu
a limitação do crescimento populacional e a criação de cooperativas, entre outras
medidas, para minorar os efeitos das contradições do capitalismo, sistema que,
segundo ele, condenava as classes trabalhadoras e uma existência miserável.

FIGURA 16 – JONH STUART MILL (1806 -1873)

FONTE: Enciclopédia ilustrada (1979)

Destacamos alguns pontos importantes do autor:

• Filho do economista James Mill (primeiro formulador da lei dos mercados).


• Formação excepcional: aos 8 anos lia clássicos gregos; aos 13 estudava Smith-
Ricardo.
• Ele se achava 25 anos na frente de seus contemporâneos.
• Pretendia defender Ricardo de seus críticos, mas sua obra está mais próxima
de Marshall do que de Ricardo.

118
TÓPICO 3 | LIBERALISMO

A época de Mill não era a mesma da época de Tomas Malthus e David


Ricardo, pois as principais batalhas políticas dos clássicos haviam terminado, como:

• Leis do trigo revogadas em 1836.


• Leis dos pobres.
• Sistema monetário: padrão – ouro.
• Sistema capitalista consolidado podia atender às reivindicações dos
trabalhadores (fato que permite Mill criticar o liberalismo e defender políticas
públicas).

7.1 REVISÃO DA TEORIA DO VALOR E DO CONCEITO DE


TRABALHO PRODUTIVO
Para Mill, o trabalho produtivo não é só aquele que agrega valor aos
objetos materiais, pois o trabalho em educação e treinamento também pode ser
produtivo, desde que repercuta positivamente na produção material. Assim, as
atividades governamentais não são necessariamente improdutivas. Por outro
lado, trabalhos que acrescentem valor às mercadorias podem ser improdutivos
e “empobrecer a nação” se a riqueza produzida não for útil à sociedade, o que
indica que o conceito clássico não levava em conta a utilidade e a demanda.

O lucro seria igual à proporção do Capital (K); salário de direção (Senior);


capital: fruto da abstinência do capitalista; teoria da espera. Em relação à Teoria
Produção e Distribuição, o autor percebe que elas se regem por leis diferentes.
Vejamos:

• Teoria da Produção segue leis técnicas, imutáveis, fixadas pela natureza e pela
tecnologia; os homens podem se sujeitar a elas, mas não as modificar.
• Teoria da Distribuição segue critérios políticos e pode ser feita de acordo com
os objetivos políticos do governo.

Em relação ao método da pesquisa de Mill, trabalha com a ideia de que


todo conhecimento se fundamenta na experiência.

7.2 STUART MILL E A POLÍTICA ECONÔMICA


A posição de Mill (1985), em relação ao liberalismo e à intervenção do
Estado, difere da posição clássica em muitos aspectos:

• Defendia um papel educador do Estado na elevação dos gostos e aspirações


populares, o que era fundamental para o controle demográfico e a distribuição
da renda (ao contrário de Malthus).
• Defendia a distribuição de renda de acordo com critérios políticos, não apenas
econômicos.

119
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

• Defendia a função estabilizadora do governo, na medida em que as taxas


decrescentes dos lucros levavam a decisões altamente especulativas. Se o
Estado tributasse fundos potencialmente investíveis e usasse suas receitas para
financiar projetos socialmente benéficos, a sociedade seria beneficiada.
• Defendia mudanças nas instituições, inclusive na propriedade privada, por
considerá-las apenas provisórias.

120
TÓPICO 3 | LIBERALISMO

LEITURA COMPLEMENTAR

Economia política clássica: a teoria do valor dos clássicos

Camila Amaral Pereira

O termo “economia política clássica” é engendrado aos autores que


observaram principalmente a Inglaterra (do século XVIII e meados do XIX,
opondo-se ao protecionismo mercantilista e sedimentando as bases do liberalismo
econômico) por meio da análise dinâmica da sociedade, chegando à teoria do
valor.

Aqueles que trabalhavam, conseguiam um produto líquido que vai além


do que para eles era apropriado, ou seja, produziam um excedente. Se existia
excedente, entretanto, era necessário que buscássemos as causas de sua existência.
Era preciso saber quem gerava, que parte do produto ia para os que produziam e
para os que não produziam.

Os clássicos buscaram os fundamentos do valor (de troca) no trabalho. Os


trabalhadores, no processo produtivo, conseguiam não apenas o necessário para
a sua reprodução, mas criavam um excedente. Os autores clássicos da economia
política, como Adam Smith, David Ricardo e Karl Marx, deixaram explícito, pois
todos eles têm como seus precessores os fisiocratas.

Os fisiocratas denominaram a terra como fonte de valor. Os trabalhadores


da terra seriam responsáveis pela criação do excedente, já que ao trabalharem
seriam capazes de produzir além do necessário para sua subsistência. Assim,
conseguiriam produzir valores de uso maiores do que os dependidos no processo
produtivo.

Se os trabalhadores agrícolas consumissem tudo aquilo que produzissem,


não existiria excedente mas, com a fertilidade da terra, o trabalho gasto em seu
cultivo se tornava produtivo. Então, para os fisiocratas, principalmente para
Quesnay, Turgot, em seu livro “Reflexions Sur La Formation et la distribution
des Richesses (1844)”, mencionava que a riqueza da sociedade era pautada pela
riqueza da terra no desenvolvimento produtivo.

Adam Smith, em seu livro “A Riqueza das Nações”, de 1776, apoiado


nas ideias dos fisiocratas, procurou ampliar o esquema teórico para o início de
uma sociedade industrial. O ponto de partida para Smith é que na sociedade o
processo de produção podia ser reduzido para uma série de esforços humanos.

O trabalho era o primeiro preço, o dinheiro da compra inicial que era pago
por todas as coisas. Segundo o autor, não foi com ouro nem com a prata, mas com
o trabalho que toda a riqueza do mundo foi inicialmente comprada.

121
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

Ao analisarmos o processo de troca das mercadorias, segundo Smith, a


palavra valor adquiria um duplo sentido: às vezes, referia-se às mercadorias que
têm apenas valor de uso (aspecto relacionado à utilidade do produto) e, às vezes,
às mercadorias que possuíam valor de troca (aspecto relacionado ao poder de
compra da mercadoria).

Era necessário investigar os princípios que regulavam o valor de troca


das mercadorias, o que permitiu ao autor enunciar sua lei do valor nos termos
como segue: “[...] o valor de qualquer mercadoria para a pessoa que a possui,
mas não pretende usá-la ou consumi-la, senão trocá-la por outros bens, é igual
à quantidade de trabalho que essa mercadoria lhe dá condições de comprar ou
comandar” (Smith, 1988, p. 36).

Em decorrência da formulação, o trabalho passa a ser considerado a


medida real do valor de troca de todas as mercadorias, uma vez que o valor de
troca de uma mercadoria depende da quantidade de trabalho que essa mercadoria
pode comandar (dominar), com a consequência de que a quantidade de trabalho
que determina o valor de uma mercadoria depende do “valor do trabalho”.

Entretanto, adverte Smith, na ausência de propriedade privada, o valor


produzido pelo trabalhador lhe pertencia integralmente e, assim, o valor de sua
mercadoria era igual à quantidade de trabalho nela inserida. A remuneração que
cada um recebia por seu trabalho, para falar em termos smithianos, era igual ao
valor do produto ou, se preferir, salário e valor eram duas grandezas iguais. A
troca obedecia ao princípio da equivalência.

O autor reconheceria que o princípio perdia sua validade na sociedade


capitalista porque dividida entre proprietários e não-proprietários, o produto do
trabalho não mais pertencia integralmente a quem o produzia, ao trabalhador,
pois agora ele era obrigado a ceder parte do que produziu com quem o empregou.

A igualdade entre salário e valor do produto deixaria de existir. A


quantidade de trabalho que uma dada mercadoria poderia comprar ou comandar
era maior que a quantidade de trabalho nela inserida (contida). Entretanto, qual
desses dois trabalhos deveria ser a medida do valor das mercadorias? O trabalho
contido ou o trabalho comandado?

De uma maneira geral, pode-se dizer que a teoria do valor, nos termos
formulados por Smith, apresenta duas dimensões básicas. A primeira é ressaltar
o trabalho como medida de riqueza e não mais os metais, que passam para um
plano inferior no universo das riquezas (Smith está fazendo uma contraposição
ao mercantilismo, cuja riqueza era medida em moedas metálicas) e a segunda é
destacar o caráter cooperativo da sociedade comandada pelo processo de divisão
do trabalho. A troca de mercadorias revela o seu significado ímpar: troca-se
trabalho por trabalho.

122
TÓPICO 3 | LIBERALISMO

Já David Ricardo inicia seus estudos por meio da distribuição, com


o tema da acumulação de capital sendo subordinado às hipóteses sobre valor
e distribuição. Ricardo, em seu livro “Princípios de economia política e de
tributação” (1817), defrontou-se, desde o início, com o problema do valor.

No entanto, ao formular sua teoria do valor-trabalho, seu objetivo não era


desvendar as origens dele, mas explicar as variações do valor das mercadorias,
o que poderia servir de base para dar sustentação à argumentação sobre a
distribuição da riqueza.

Assim, o autor afirma que “[...] o valor de um bem, ou seja, a quantidade de


qualquer outro bem com o qual se possa trocar, depende da quantidade relativa
de trabalho necessário para produzir e não da maior ou menor remuneração
auferida por este trabalho” (Ricardo, 1991, p. 31). Significa que o valor deve ser
entendido como proporção da troca, que ele depende do trabalho contido na
mercadoria e, finalmente, que o valor não depende da remuneração do trabalho,
mas da quantidade de trabalho em si.

David Ricardo critica a ambiguidade de Smith, refletida nas concepções de


trabalho contido e de trabalho comandado. Com relação ao princípio do trabalho
contido, o autor diz que pode ser perfeitamente aplicado às trocas capitalistas,
pois o fato de parte do trabalho incorporado na mercadoria não voltar para quem
a produziu não altera em nada o seu valor, porque esse valor depende sempre do
tempo de trabalho necessário à produção da mercadoria.

Para Ricardo, a dificuldade que tanto atormentou Smith (o salário do


operário não comprava inteiramente o produto de seu trabalho) não tinha razão
de ser, uma vez que esse problema dizia respeito à distribuição do produto e não
à determinação do seu valor.

Em outras palavras, Ricardo passa a sustentar que, tanto no estado de


natureza, como na sociedade capitalista, o valor das mercadorias é determinado
pelas quantidades de trabalho nelas inseridas. Noutras palavras, para ele é
o conceito de trabalho contido e não o de trabalho comandado que deve ser
afirmado na construção da teoria do valor.

Com Karl Marx, o conceito clássico do valor-trabalho sofre uma


reformulação definitiva, pois o autor mostra o equívoco dos precursores ao
desvendarem que não é o trabalho que é trocado por outra mercadoria, mas a
“capacidade de trabalho” (trabalho em potência ou trabalho ainda a realizar).

Com a descoberta de Marx e com o fim da oposição simples do trabalho


ao capital, sem qualquer especificação, abriu-se o caminho para a explicação
do valor a partir do valor de troca das mercadorias, baseado na quantidade
de trabalho necessário à produção ou, de outra forma, a troca entre trabalho
objetivado (morto) e trabalho vivo, que Smith já havia detectado.

123
UNIDADE 2 | DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO

O trabalho era considerado, pelos “clássicos”, como uma unidade física


imediata, sendo visto, inclusive, como algo indiferente às mercadorias. Marx, ao
contrário, faz a crítica da economia clássica tentando compreender o significado
do valor a partir das leis gerais do sistema capitalista. Decorre que o objeto de
estudo de Marx não é o valor, mas a mercadoria, porque nela é encontrado o
resultado (produto) do trabalho humano. O autor tira uma primeira conclusão
importante: o trabalho não é valor, mas o seu fundamento.

Marx qualifica o debate mostrando que não é o trabalho (na sua forma
de produto, conforme anunciado pelos "clássicos") que está em contraposição
ao capital, mas a força de trabalho, que é trocada com o capital por um valor
capaz de garantir a própria reprodução dessa força de trabalho e produzir novos
produtos. Marx inicia sua obra diferenciando valor de uso e valor de troca para
distinguir o próprio trabalho (trabalho concreto e trabalho abstrato).

Os valores de uso apenas são realizados com a utilização ou com o


consumo e constituem o conteúdo material da riqueza, qualquer que seja a forma
social dela, além de serem, ao mesmo tempo, os veículos materiais do valor de
troca.

Já o valor de troca é revelado na relação quantitativa em que se trocam


valores de uso de espécies diferentes, relação esta que muda constantemente no
tempo e no espaço. Assim, como valores de uso, as mercadorias são de qualidades
diferentes e, como valores de troca, só podem diferir nas quantidades.

Marx desvenda a forma e as condições em que o trabalho é conduzido à


posição de valor. Surge a questão central da teoria do valor marxista, ou seja, a
distinção entre os tipos de trabalho (concreto e abstrato) pois, da mesma forma que
a mercadoria, que possui valor de uso e valor de troca, o trabalho materializado
nas mercadorias também tem um duplo caráter: “[...] quando se expressa como
valor, não possui mais as mesmas características que lhe pertencem como gerador
de valores de uso” (Marx, 1975, p. 48). Entretanto, os tipos de trabalhos são um e
o mesmo trabalho incorporado na mercadoria.

Marx menciona que o trabalho se decompõe durante o processo de trocas


em duas categorias: (a) o trabalho individual vira trabalho social (trabalho de todos
e que é representado pelo desprendimento de energia); (b) o trabalho concreto
(trabalho que diferencia os trabalhadores pela destreza e habilidade) transforma-
se em trabalho abstrato (surge através da troca e representa a igualação social
das diferentes formas de trabalho) pois, na troca, os valores de uso concretos e as
formas concretas de trabalho são pontos inteiramente abstraídos.

Marx conclui que a transformação do trabalho individual em trabalho


social (aspecto quantitativo) revela o aspecto qualitativo do processo concreto
para o abstrato.

124
TÓPICO 3 | LIBERALISMO

Segundo o autor, “[...] os homens não estabelecem relações entre os


produtos de seu trabalho como valores por considerá-los simples aparência
material do trabalho humano de igual natureza. Ao contrário. Ao igualar, na
permuta, como valores seus diferentes produtos, igualam seus trabalhos diferentes
de acordo com sua qualidade comum de trabalho humano. Fazem sem o saber
[...]" e, assim, "[...] o valor transforma cada produto do trabalho humano em um
hieróglifo social que os homens procuram decifrar seu significado" (MARX, 1975,
p. 82-83).

A análise desenvolvida permite afirmar com clareza e segurança
que a obra de Marx, no que diz respeito ao valor, significa uma nova teoria,
comparativamente às formulações dos economistas "clássicos" que o precederam.

De um modo geral, a preocupação básica dos autores "clássicos" era
entender o sistema econômico e a forma de repartição da riqueza na sociedade.
Esses autores acreditavam que a riqueza de uma nação era resultado do trabalho
das pessoas e que o valor de troca das mercadorias refletia o esforço despendido
na produção delas.

FONTE: PEREIRA, Camila Amaral. Economia política clássica: a teoria do valor dos clássicos.
S/N. 2016.

125
RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• No decorrer dos séculos XVIII e XIX, o pensamento econômico inglês evoluiu


e refletiu as mudanças enfrentadas pela sociedade.

• Há uma discussão entre os economistas sobre qual seria a verdadeira fonte de


riqueza: a capacidade de produzir.

• Surgiram obras sobre as causas da riqueza, a divisão do trabalho, a ação do


Estado, os salários, o mercado. A partir da experiência da economia inglesa,
vão embasar a teoria do liberalismo econômico.

• O liberalismo econômico pregava o fim da intervenção do Estado na produção


e na distribuição das riquezas, o fim das medidas protecionistas e dos
monopólios e defende a livre concorrência entre as empresas e a abertura dos
portos entre os países.

• Principais autores do período: Adam Smith, Thomas Malthus, David Ricardo,


James Mill, dentre outros que formarão a economia política clássica.

126
AUTOATIVIDADE

1 O texto a seguir, de John Locke (1632-1704), revela algumas características


de uma determinada corrente de pensamento.

“Se o homem no estado de natureza é tão livre, conforme dissemos, se é senhor


absoluto da sua própria pessoa e posses, igual ao maior e a ninguém sujeito,
por que abrirá ele mão dessa liberdade, por que abandonará o seu império e
sujeitar-se-á ao domínio e controle de qualquer outro poder? Ao que é óbvio
responder que, embora no estado de natureza tenha tal direito, a utilização do
mesmo é muito incerta e está constantemente exposto à invasão de terceiros
porque, sendo todos senhores tanto quanto ele, todo homem igual a ele e,
na maior parte, pouco observadores da equidade e da justiça, o proveito da
propriedade que possui nesse estado é muito inseguro e muito arriscado. Estas
circunstâncias obrigam-no a abandonar uma condição que, embora livre, está
cheia de temores e perigos constantes; e não é sem razão que procura de boa
vontade juntar-se em sociedade com outros que estão já unidos, ou pretendem
unir-se, para a mútua conservação da vida, da liberdade e dos bens a que
chamo de propriedade” (Os Pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1991).

Do ponto de vista político, podemos considerar o texto como uma tentativa de


justificar:
a) A existência do governo como um poder oriundo da natureza.
b) A origem do governo como uma propriedade do rei.
c) O absolutismo monárquico como uma imposição da natureza humana.
d) A origem do governo como uma proteção à vida, aos bens e aos direitos.
e) O poder dos governantes, colocando a liberdade individual acima da
propriedade.

2 Analisando o texto, podemos concluir que se trata de um pensamento:

a) Do liberalismo.
b) Do socialismo utópico.
c) Do absolutismo monárquico.
d) Do socialismo científico.
e) Do anarquismo.

3 “Um comerciante está acostumado a empregar o seu dinheiro principalmente


em projetos lucrativos, ao passo que um simples cavalheiro rural costuma
empregar o seu em despesas. Um frequentemente vê seu dinheiro se afastar e
voltar às mãos com lucro; o outro, quando se separa do dinheiro, raramente
espera vê-lo de novo. Esses hábitos diferentes afetam naturalmente os seus
temperamentos e disposições em toda espécie de atividade. O comerciante
é, em geral, um empreendedor audacioso; o cavalheiro rural, um tímido em
seus empreendimentos...” (Smith. A riqueza das nações. Livro III, capítulo 4).

127
No pequeno trecho citado, Adam Smith:
a) Contrapõe lucro e renda, pois geram racionalidades e modos de vida
distintos.
b) Mostra as vantagens do capitalismo comercial em face da estagnação
medieval.
c) Defende a lucratividade do comércio contra os baixos rendimentos do
campo.
d) Critica a preocupação dos comerciantes com seus lucros e dos cavalheiros
com a ostentação de riquezas.
e) Expõe as causas da estagnação da agricultura no final do século XVIII.

128
UNIDADE 3

AS TEORIAS DO PENSAMENTO
ECONÔMICO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir desta unidade você será capaz de:

• entender o desenvolvimento das escolas de pensamento econômico;

• compreender os fenômenos econômicos;

• perceber e analisar os principais elementos que norteiam as decisões eco-


nômicas;

• observar os ciclos do capitalismo, suas fases de ascensão e recessão;

• discutir a importância do Estado na economia;

• estimular a construção do pensamento econômico e refletir sobre ele.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está organizada em três tópicos. Ao final de cada um deles, você
encontrará exercícios que o auxiliarão na compreensão dos temas abordados.

TÓPICO 1 – ESCOLA CLÁSSICA E SOCIALISMO

TÓPICO 2 – ESCOLA NEOCLÁSSICA E KEYNESIANISMO

TÓPICO 3 – PENSAMENTO ECONÔMICO CONTEMPORÂNEO E OS


PENSADORES BRASILEIROS E LATINO-AMERICANOS

129
130
UNIDADE 3
TÓPICO 1
ESCOLA CLÁSSICA E SOCIALISMO

1 INTRODUÇÃO
Prezado acadêmico, ao introduzir a Unidade 3, é importante nos
questionarmos a formação da organização social em que vivemos. Você já
parou para pensar sobre o tema? Consegue compreender o desenvolvimento do
capitalismo? Como isso impacta no Brasil e na região em que vive?

Nesta unidade, nós objetivamos que você reflita sobre tais questionamentos
e conheça o movimento dinâmico e contraditório do capitalismo.

Diante do contexto apresentado, vamos estudar como os clássicos


buscaram os fundamentos do valor (de troca) no trabalho e os autores clássicos
da economia política, principalmente Adam Smith (1723-1790), David Ricardo
(1772-1823) e Karl Marx (1818-1883). Ainda, estudaremos os neoclássicos, a teoria
keynesiana, os monetaristas, a teoria das expectativas racionais, dentre outros.
Bons estudos!

2 ESCOLA CLÁSSICA NA ECONOMIA


O termo economia política clássica é dirigido aos autores que observaram
principalmente a Inglaterra (do século XVIII e meados do XIX, opondo-se ao
protecionismo mercantilista e sedimentando as bases do liberalismo econômico)
por meio da análise dinâmica da sociedade, chegando à teoria do valor.

A ideia demonstra que aqueles que trabalhavam conseguiam “algo


a mais”, que ia além do que por eles era apropriado, ou seja, produziam um
excedente. Se existia excedente, era necessário que buscássemos as causas de sua
existência. Era preciso saber quem o gerava, que parte do produto ia para os que
produziam e para os que não produziam.

As mercadorias, além de terem diferentes valores de uso, ou seja,


qualidades diferentes para o agrado das diferentes necessidades humanas,
naturais, históricas e sociais, deveriam possuir um valor de troca. Tornava-se
então necessária uma teoria do valor.

131
UNIDADE 3 | AS TEORIAS DO PENSAMENTO ECONÔMICO

3 OS FISIOCRATAS
Na unidade anterior, estudamos que os fisiocratas (governo da terra)
denominaram a terra como fonte de valor. Os trabalhadores da terra seriam
responsáveis pela criação do excedente, já que ao trabalharem seriam capazes
de produzir além do necessário para sua subsistência. Assim, conseguiriam
produzir valores de uso maiores do que os dependidos no processo produtivo.
Se os trabalhadores agrícolas consumissem tudo aquilo que produzissem, não
existiria excedente. Entretanto, com a fertilidade da terra, o trabalho gasto em seu
cultivo se tornava produtivo.

4 ADAM SMITH
Segundo Freitas (2006, p. 45), Adam Smith, em seu livro A Riqueza das
Nações, de 1776, apoiado nas ideias dos fisiocratas, procurou ampliar o esquema
teórico para o início de uma sociedade industrial. Utilizou o exemplo de uma
fábrica de alfinetes, mostrando a divisão do trabalho. “Um homem puxa o arame,
outro endireita-o, um terceiro corta-o, um quarto aguça-o, um quinto afia-lhe o
topo para receber a cabeça [...]”.

Assim, o ponto de partida para Smith é que na sociedade o processo de


produção podia ser reduzido a uma série de esforços humanos. O trabalho era
o primeiro preço, o dinheiro da compra inicial que era pago por todas as coisas.
Segundo Smith (1989, p. 123), “não foi com ouro nem com a prata, mas com o
trabalho que toda a riqueza do mundo foi inicialmente comprada”.

FIGURA 1 – ADAM SMITH (1723-1790)

FONTE: Disponível em: <http://pt.acton.org/historical/


adam-smith-1723-1790>. Acesso em: 14 jun. 2018.

132
TÓPICO 1 | ESCOLA CLÁSSICA E SOCIALISMO

Ao analisar o processo de troca das mercadorias, Smith argumentava que


a palavra valor adquiria um duplo sentido: às vezes, referia-se às mercadorias
que têm apenas valor de uso (aspecto relacionado à utilidade do produto) e, às
vezes, às mercadorias que possuíam valor de troca (aspecto relacionado ao poder
de compra da mercadoria).

Segundo Smith (1989, p. 36), “[...] o valor de qualquer mercadoria, para
a pessoa que a possui, mas não pretende usá-la ou consumi-la, senão trocá-la
por outros bens, é igual à quantidade de trabalho que essa mercadoria lhe dá
condições de comprar ou comandar”.

E
IMPORTANT

Para Adam Smith, a quantidade de trabalho determina o valor de uma mercadoria.

Entretanto, adverte que na ausência de propriedade privada, o valor


produzido pelo trabalhador pertencia integralmente a ele e o valor de sua
mercadoria era igual à quantidade de trabalho inserida. A remuneração que cada
um recebia por seu trabalho, ao falarmos em termos smithianos, era igual ao valor
do produto. Melhor dizendo, salário e valor eram duas grandezas iguais. A troca
obedecia ao princípio da equivalência.

O autor reconhece que o princípio perdia sua validade na sociedade
capitalista porque dividida entre proprietários e não-proprietários, o produto do
trabalho não mais pertencia integralmente a quem o produzia, ao trabalhador,
pois agora ele era obrigado a ceder parte do que produziu com quem o empregou.

E
IMPORTANT

A igualdade entre salário e valor do produto deixaria de existir. A quantidade


de trabalho que uma dada mercadoria poderia comprar ou comandar era maior que a
quantidade de trabalho nela inserida (contida). Entretanto, qual dos dois trabalhos deveria ser
a medida do valor das mercadorias: o trabalho contido ou o trabalho comandado?

133
UNIDADE 3 | AS TEORIAS DO PENSAMENTO ECONÔMICO

Podemos refletir que, de uma maneira geral, a teoria do valor, nos


termos formulados por Smith, apresenta duas dimensões básicas. A primeira é
ressaltar o trabalho como medida de riqueza e não mais os metais, que passam
para um plano inferior no universo das riquezas. A segunda é destacar o caráter
cooperativo da sociedade comandada pelo processo de divisão do trabalho,
e a troca de mercadorias revela o seu significado ímpar: troca-se trabalho por
trabalho.

5 THOMAS MALTHUS
Segundo Hunt (2005), durante e após a segunda década do século XIX, a
preocupação de Malthus se deslocou do conflito de classes entre os proprietários e
trabalhadores para o conflito entre as duas classes antagônicas de proprietários: a
dos capitalistas e a dos proprietários de terras. Assim, quase todos os seus escritos
teóricos, no período, foram incorporados em seus princípios de economia política.

Para Hunt (2005, p. 98), Malthus não tinha a mesma visão da História
que tinha Smith, pois ele “tinha uma visão bastante condicionada pela cultura
egocêntrica, e havia apenas dois estados da sociedade: o estado rude, não
civilizado, e o estado civilizado”.

A divisão de classes no mundo civilizado presumia não só “uma sociedade


de trocas monetárias e que produzisse mercadorias, como também uma sociedade
em que a força de trabalho tivesse se transformado em mercadoria” (HUNT, 2005,
p. 45). Com determinada visão, ao contrário de Smith, Malthus não desenvolveu
um método capaz de compreender a apropriação do excedente econômico na
formaçao do capitalismo.

FIGURA 2 – THOMAS MALTHUS (1766-1834)

FONTE: Disponível em: <https://www.thefamouspeople.com/


profiles/thomas-malthus-5174.php>. Acesso em: 15 jun. 2018.

134
TÓPICO 1 | ESCOLA CLÁSSICA E SOCIALISMO

Conforme já estudamos na unidade anterior, Malthus ficou conhecido


pela teoria segundo a qual o crescimento da população tenderia a superar a
produção de alimentos, o que tornaria necessário o controle de natalidade.

Em primeiro lugar, a alimentação é necessária ao homem; em


segundo, a paixão entre os sexos é necessária e se manterá, com poucas
diferenças como agora. O poder da população é infinitamente maior
do que o poder da terra para produzir as substâncias necessárias
ao homem. A população não encontra obstáculos, cresce de acordo
com uma progressão geométrica. As substâncias crescem com uma
progressão geométrica. Basta um pequeno conhecimento dos números
para mostrar a imensidade do primeiro poder em comparação com o
segundo (MALTHUS, 1991, p. 67).

Podemos compreender que a teoria malthusiana demonstra que a


população deveria ser mantida ao nível de subsistência. A organização da
sociedade dependia do equilíbrio entre a população e da produção de alimentos.

Ainda, vamos estudar a seguir o pensador David Ricardo. De acordo com


Hunt (2005), Ricardo inicia seus estudos por meio da distribuição, com o tema da
acumulação de capital sendo subordinado às hipóteses sobre valor e distribuição.

FIGURA 3 – DAVID RICARDO (1772-1823)

FONTE: Disponível em: <http://www.gftcap.org/thinkers.html>.


Acesso em: 18 jun. 2018.

Com base na construção de pensamento citada, David Ricardo, em seu


livro “Princípios de Economia Política e de Tributação, de 1817, defrontou-se,
desde o início, com o problema do valor. No entanto, ao formular sua teoria
do valor-trabalho, seu objetivo não era desvendar as origens, mas explicar
as variações do valor das mercadorias, o que poderia servir de base para dar
sustentação à argumentação sobre a distribuição da riqueza.

135
UNIDADE 3 | AS TEORIAS DO PENSAMENTO ECONÔMICO

Assim, o autor afirma que “[...] o valor de um bem, ou seja, a quantidade


de qualquer outro bem, depende da quantidade relativa de trabalho necessário
para produzir e não da maior ou menor remuneração auferida por este trabalho”
(RICARDO, 1985, p. 31).

Significa que o valor deve ser entendido como proporção da troca, que
ele depende do trabalho contido na mercadoria e, finalmente, que o valor não
depende da remuneração do trabalho, mas da quantidade de trabalho em si.
Assim, em outras palavras, Ricardo passa a sustentar que o valor das mercadorias
é determinado pelas quantidades de trabalho nelas inseridas.

Então, entendidos sobre a teoria de David Ricardo, vamos estudar Jean


Bastiste Say.

Segundo Hunt (2005), Say é muito conhecido na história do pensamento


econômico por meio da lei de Say. Determinada lei diz que a soma dos valores de
tudo aquilo que é produzido é equivalente à soma dos valores empregados como
fatores na produção. Vulgarmente, a lei de Say explicaria que “toda oferta cria
sua procura”.

FIGURA 4 – JEAN BASTISTE SAY (1767-1832)

FONTE: Disponível em: <https://alchetron.com/Jean-Baptiste-


Say>. Acesso em: 18 jun. 2018.

Vejamos a escrita de Say no Tratado de Economia Política (1814, p. 301):

Vale a pena notar que um produto, tão logo seja criado, nesse mesmo
instante, gera um mercado para outros produtos em toda a grandeza de
seu próprio valor. Quando o produtor dá o toque final ao seu produto,
ele está ansioso para vendê-lo imediatamente para que o valor do
produto não pereça em suas mãos. Nem está ele menos ansioso para
se utilizar do dinheiro que pode obter, porque o valor do dinheiro
também é perecível. Mas o único modo de se desfazer do dinheiro é
pela compra de um produto ou outro. Assim, a mera circunstância da
criação de um produto imediatamente abre um mercado para outros
produtos.

136
TÓPICO 1 | ESCOLA CLÁSSICA E SOCIALISMO

Resumidamente, a sociedade pode ser dividida entre famílias e empresas.


A economia funcionaria como uma interação entre dois fluxos: o real, representado
pelo fluxo externo; e o monetário, representado pelo fluxo interno. Vejamos a
seguir:

FIGURA 5 – FLUXO CIRCULAR DE RENDA

Fluxo Circular da Renda

Mercado de Bens e serviços


Oferta
Demanda de bens e
de Serviços O que e quanto produzir serviços

Famílias Como produzir Empresas

Oferta de Pra quem produzir Demanda de


serviços dos serviços dos
fatores de fatores de
produção produção
Mercado de fatores de produção

Fluxo Monetário
Fluxo Real (bens e serviços)

FONTE: Adaptado de: <http://www.souzaaranhamachado.com.br/2007/01/grandes-


economistas-jean-baptiste-say/>. Acesso em: 18 jun. 2018.

Assim, entendemos que, no fluxo real, as famílias fornecem às empresas


a mão de obra (trabalho) que será empregada na produção de bens e serviços. Já
no fluxo monetário, as empresas remuneram os fatores de produção por meio de
aluguéis para os donos de terras, salários para os trabalhadores, lucros para os
capitalistas, gerando a renda necessária para a aquisição dos serviços oferecidos
às famílias.

Segundo Hunt (2005), na interação dos dois fluxos, de acordo com a lei de
Say, a oferta, que corresponde à análise da produção, tem um papel determinante.
Se houver um aumento da produção de bens e serviços e, por conseguinte, um
aumento da quantidade de fatores envolvidos na produção, mais gente estará
empregada e, ao serem remunerados por sua participação no processo, estarão
auferindo renda com a qual poderão comprar uma quantidade maior de bens e
serviços que estará sendo disponibilizada.

137
UNIDADE 3 | AS TEORIAS DO PENSAMENTO ECONÔMICO

Por outro lado, se houver uma redução do volume de produção, as


empresas poderão ser obrigadas a desempregar fatores de produção, ocasionando
uma redução do volume de remuneração das famílias e, por extensão, menos
renda para a aquisição de uma quantidade menor de bens e serviços oferecida
no mercado. Assim, a oferta funciona como uma espécie de termômetro do
funcionamento da economia.

E
IMPORTANT

Quando a oferta se expande, permite uma expansão correspondente da


demanda; quando se contrai, ocasiona uma contração correspondente da demanda.

Então, segundo o pensamento de Say, a economia tende naturalmente à


situação de equilíbrio de mercado, ou seja, a oferta cria sua demanda. Outro autor
importante no contexto e que estudaremos a seguir é John Stuart Mill.

6 A TEORIA DO VALOR DE MILL


Para Mill, a produção consistia no trabalho que transformava os recursos
naturais. “Os requisitos da produção são dois: o trabalho e objetos naturais
apropriados. Em quase todos os casos, os objetos oferecidos pela natureza são
apenas instrumentais para as necessidades humanas, após terem sido, de certa
maneira, transformados pelo esforço humano” (HUNT, 2005, p. 67).

FIGURA 6 – JOHN STUART MILL (1806-1873)

FONTE: Disponível em: <https://www.pensador.com/autor/john_


stuart_mill/>. Acesso em: 18 jun. 2018.
138
TÓPICO 1 | ESCOLA CLÁSSICA E SOCIALISMO

Segundo Hunt (2005), Mill começou com uma ideia muito próxima de
uma teoria do valor-trabalho de Ricardo, no sentido de que a produção de uma
coisa que custa ao produtor é o trabalho empregado em sua produção.

Na verdade, parece apenas uma parte das despesas de um capitalista, pois


ele não só pagou salários aos trabalhadores como também forneceu instrumentos,
materiais e, talvez, prédios. Esses instrumentos, materiais e prédios foram,
porém, produzidos pelo trabalho e pelo capital, e seu valor depende do custo de
produção que, uma vez mais, pode ser reduzido ao trabalho.

Portanto, o valor das mercadorias depende, principalmente, da quantidade


de trabalho necessária para sua produção. De acordo com Hunt (2005), a teoria do
valor-trabalho só era válida para Mill quando as razões capital/trabalho fossem as
mesmas em todas as indústrias.

Os custos de produção seriam proporcionais ao trabalho incorporado às


várias mercadorias. Entretanto, não ocorria com a maioria das mercadorias. Por
exemplo, o vinho e o tecido produzidos pelas mesmas quantidades de trabalho
têm valores diferentes, porque o vinho “demorava mais a dar lucro do que o
tecido”. Ainda, todas as mercadorias feitas por máquinas eram semelhantes, pelo
menos aproximadamente, ao vinho, no exemplo anterior.

7 O MARXISMO
Com Karl Marx, o conceito clássico do valor-trabalho sofre uma
reformulação definitiva, pois o autor mostra o equívoco dos precursores ao
desvendarem que não é o trabalho que é trocado por outra mercadoria, mas a
“capacidade de trabalho” (trabalho em potência ou trabalho ainda a realizar).

FIGURA 7 – KARL MARX (1818-1883)

FONTE: Disponível em: <https://www.ushmm.org/wlc/en/


article.php?ModuleId=10006086>. Acesso em: 18 jun. 2018.

139
UNIDADE 3 | AS TEORIAS DO PENSAMENTO ECONÔMICO

Segundo Hunt (2005), com a descoberta de Marx e com o fim da oposição


simples do trabalho ao capital sem qualquer especificação, abriu-se o caminho
para a explicação do valor a partir do valor de troca das mercadorias. É baseado
na quantidade de trabalho necessária à produção ou, de outra forma, na troca
entre trabalho objetivado (morto) e trabalho vivo, que Smith já havia detectado.

E
IMPORTANT

O trabalho morto seria o trabalho que não utiliza o trabalho humano. Já o


trabalho vivo utiliza amplamente o trabalho humano.

Segundo Mattei (2003), o trabalho era considerado pelos “clássicos” como


uma unidade física imediata. Marx, ao contrário, tenta compreender o significado
do valor a partir das leis gerais do sistema capitalista. O objeto de estudo deste é
a mercadoria, porque nela encontramos o resultado do trabalho humano. Assim,
não é que o trabalho seja o valor das coisas, mas seu fundamento.

De acordo com Hunt (2005), Marx qualifica o debate mostrando que não é
o trabalho, na sua forma de produto, conforme anunciado pelos “clássicos”, que
está em contraposição ao capital, mas a força de trabalho, que é trocada com o
capital por um valor capaz de garantir a própria reprodução da força de trabalho.
Devemos recordar que Marx inicia sua obra diferenciando valor de uso e valor
de troca para, em seguida, distinguir o próprio trabalho (trabalho concreto e
trabalho abstrato).

E
IMPORTANT

O trabalho concreto seria aquele que se manifesta no valor de uso e o abstrato


aquele que se manifesta no valor de troca da mercadoria.

Em síntese, a preocupação básica dos autores “clássicos” era entender o


sistema econômico e a forma de repartição da riqueza na sociedade. Os autores
acreditavam que a riqueza de uma nação era resultado do trabalho das pessoas e
que o valor de troca das mercadorias refletia o esforço despendido na produção.

140
TÓPICO 1 | ESCOLA CLÁSSICA E SOCIALISMO

8 SOCIALISMO
O socialismo surge com o movimento histórico da Revolução Industrial,
com o objetivo de luta pelo social, em detrimento da lógica individual do modo
de produção capitalista que estava se formando. Um dos principais expoentes do
socialismo é Karl Marx que, ao estudar a acumulação primitiva, buscava entender
o modo de produção que estava se formando por meio da transformação social.

Para Marx, é com a separação do trabalhador de seus meios de produção
que nascem os agentes da produção capitalista: de um lado, os trabalhadores
assalariados que foram desapropriados de seus meios de produção e que,
portanto, só conseguem sobreviver se conseguirem vender sua força de trabalho
por um salário e, de outro lado, os capitalistas, aqueles que se apropriaram dos
meios de produção dos trabalhadores independentes e que vivem empenhados
na ampliação de suas riquezas por meio da compra do trabalho alheio.

A exploração dos trabalhadores só acabaria se, ao invés do capitalismo,


houvesse o socialismo, uma forma de organização social menos desigual e que
não buscaria o lucro, mas a vida em sociedade.

A Revolução Industrial, associada ao novo processo de organização


social, pode ser vista como uma nova era na história da humanidade, pois dá
início à acumulação crescente de população, bens e serviços em uma proporção
sem precedentes.

Assim, diante dos problemas sociais que afligiam a Europa do século


XVIII-XIX, como o desemprego nas indústrias, Karl Marx buscou entender as
contradições do modo de produção capitalista e a luta de classes. Seu método de
estudo foi por meio do materialismo histórico, que estuda as formas de produção
da vida material da sociedade.

E
IMPORTANT

Materialismo histórico pode ser entendido como uma forma de analisar a


história da sociedade por meio de sua construção material. Marx, por exemplo, analisa a
sociedade capitalista por meio da mercadoria.

Uma das interpretações da teoria sociológica de Marx pode ser encontrada


no prefácio à “Contribuição à Crítica da Economia Política”, de 1972. “Na produção
social de sua vida, os homens contraem determinadas relações necessárias
e independentes de sua vontade, relações de produção que correspondem à

141
UNIDADE 3 | AS TEORIAS DO PENSAMENTO ECONÔMICO

determinada fase de desenvolvimento das forças produtivas materiais. Não é a


consciência do homem que determina o seu ser, mas pelo contrário, o seu ser
social é que determina a sua consciência” (MARX, 1972, p. 34-36).

A sociedade, para Marx, é o conjunto da “estrutura econômica da


sociedade”, ou seja, a infraestrutura e “superestrutura”. A infraestrutura é
composta não só pelas forças materiais de produção, como máquinas, ferramentas,
divisão do trabalho, mas tudo que contribui para incrementar a produção
econômica em uma determinada fase do desenvolvimento social.

“A superestrutura é o conjunto das consciências individuais ou de classes


que constituem o pensamento social. Essas consciências podem se manifestar sob
formas jurídicas, políticas, religiosas, artísticas ou filosóficas” (MARX, 1972, p. 304).

No entendimento de Marx, principalmente no livro Manifesto do


Partido Comunista (1980), são necessárias duas condições para que possa
ocorrer a transformação da sociedade. Em primeiro lugar, é necessário que as
forças produtivas tenham entrado em contradição com as relações de produção
acirrando, objetivamente, a exploração. Em segundo lugar, é preciso que as
classes sociais tenham consciência dos conflitos e “lutem para resolvê-los”, por
isso o lema: trabalhadores, uni-vos!

FIGURA 8 – MANIFESTO DO PARTIDO COMUNISTA

TRABALHADORES DE TODO O
MUNDO, UNI–VOS!
MARX E ENGELS - MANIFESTO DO
PARTIDO COMUNISTA

FONTE: Disponível em: <http://www.pictame.com/tag/ManifestoComunista>.


Acesso em: 18 jun. 2018.

142
TÓPICO 1 | ESCOLA CLÁSSICA E SOCIALISMO

E
IMPORTANT

O socialismo é oposto ao modo de produção capitalista, cujo sistema se baseia


na propriedade privada dos meios de produção e exploração dos trabalhadores.

143
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico, você aprendeu que:

• A Escola Clássica buscou explicar a teoria do valor, cuja única fonte original
era identificada no trabalho em geral.

• Além da Teoria do Valor-Trabalho, a Escola Clássica se baseou nos preceitos


filosóficos do liberalismo e do individualismo.

• O socialismo seria uma alternativa para o modo de produção capitalista.

• O ideal do socialismo era lutar contra a desigualdade social.

• Os principais expoentes do socialismo foram Karl Marx e Engels.

144
AUTOATIVIDADE

1 Explique a Teoria valor-trabalho, dentre os principais autores clássicos.

2 Explique a Lei de Say.

3 Explique o socialismo.

4 Você acredita que o socialismo seria no possível no Brasil? Explique.

145
146
UNIDADE 3
TÓPICO 2

ESCOLA NEOCLÁSSICA

1 INTRODUÇÃO
A Escola Neoclássica buscava a integração da Teoria do Valor dos Clássicos
com a Teoria do Custo de Produção. Objetivava-se uma maior otimização dos
recursos em consequência da escassez.

2 OS MARGINALISTAS E OS PARADOXOS DA TEORIA DO


VALOR
De acordo com Hunt (2005), a partir de 1870, a análise econômica passou a
ser enriquecida com o desenvolvimento da teoria neoclássica (teoria descendente
dos Clássicos). A teoria estudou a alocação dos recursos escassos entre usos
alternativos, com o fim de maximizar a utilidade ou a satisfação dos consumidores.

Diante de uma série de opções de bens e serviços, os indivíduos escolhem a


opção que consideram ser a mais vantajosa. Os neoclássicos também são conhecidos
como marginalistas e, entre os principais representantes da escola estão: William
Stanley Jevons (Inglaterra), Carl Menger (Áustria) e Léon Walras (Suíça).

Os autores formularam a lei da utilidade marginal decrescente a qual, em
uma relação econômica, a utilidade decresce ao consumirmos mais uma unidade.
A utilidade total de um bem cresce quando se consome maiores quantidades dele,
mas seu incremento da utilidade marginal é cada vez menor.

A utilidade é o grau de satisfação que os consumidores atribuem aos bens


e serviços que podem adquirir no mercado. De acordo com a lei, a intensidade
de uma necessidade diminui na medida em que é satisfeita quando os bens e
serviços são consumidos.

E
IMPORTANT

Você sabia que é por meio da lei da utilidade que temos a teoria do consumidor
na economia? As pessoas têm necessidades diferentes e fazem escolhas. Por exemplo: será
que a utilidade de um ar condicionado na região Nordeste do Brasil seria a mesma para a
região serrana de Santa Catarina?

147
UNIDADE 3 | AS TEORIAS DO PENSAMENTO ECONÔMICO

A teoria neoclássica explica o “paradoxo da água e do diamante”, que é


uma citação do livro de Smith, intitulado “A riqueza das nações”, de 1776:

As coisas que têm mais valor de uso têm, quase sempre, pouco ou
nenhum valor de troca; ao contrário, as coisas que têm mais valor de
troca, têm pouco ou nenhum valor de uso. Nada mais útil do que a
água; no entanto, ela compra pouca coisa; quase nada pode ser obtido
em troca de agua. Um diamante, pelo contrário, tem pouco valor de
uso, mas pode ser, quase sempre, trocado por uma grande quantidade
de outros bens (SMITH,1989, p. 341).

A explicação do paradoxo da água e do diamante, para os neoclássicos,


demonstra que o valor passa a depender do estado psicológico da pessoa ou da
força de atração que cada bem exerce no indivíduo. Assim, o valor não está nem
no diamante nem na água, mas nas necessidades das duas pessoas que efetivaram
a troca.

A teoria do valor utilidade pressupõe que o valor de um bem se forma por


sua demanda, ou seja, pela satisfação que o bem representa para o consumidor.
Assim, inicia uma abordagem microeconômica, sendo o indivíduo o centro do
estudo. Um dos principais autores é Alfred Marshall.

FIGURA 9 – ALFRED MARSHALL (1842-1924)

FONTE: Disponível em: <https://www.elblogsalmon.com/


economistas-notables/economistas-notables-alfred-marshall>.
Acesso em: 18 jun. 2018.

Marshall, com seu livro “Princípios de economia”, de 1890, foi um dos


principais representantes da escola de pensamento econômico. Buscou integrar a
teoria do valor utilidade com a teoria do custo de produção dos clássicos.

148
TÓPICO 2 | ESCOLA NEOCLÁSSICA

Para ele, o valor do bem não poderia ser determinado apenas pelo lado da
oferta, representado pelo custo de produção, mas também pelo lado da demanda,
expresso na utilidade. Segundo Hunt (2005), quanto à contribuição dos clássicos,
o que Marshall tentou fazer, segundo ele próprio, foi complementar e generalizar,
por meio do aparato matemático, os postulados de Smith e principalmente de
Ricardo.

Ao introduzir o fator tempo na análise econômica pela distinção entre
curtos e longos períodos, o autor procurou determinar o papel do custo objetivo
de produção (longos períodos) e o papel da utilidade marginal (períodos curtos)
na determinação do valor de bens e serviços.

O método da análise parcial ou análise do equilíbrio parcial consiste em


compartimentar a economia de modo que os principais efeitos de uma mudança
de parâmetro em um determinado minimercado possam ser ressaltados sem
considerarmos os efeitos colaterais em outros mercados.

A concepção geral dos “Princípios de economia”, de Marshall, baseia-se
em uma visão microeconômica do regime capitalista de produção segundo um
enfoque neoclássico. A tese central da doutrina econômica é a de uma tendência
natural para o equilíbrio do mercado. Em resumo, podemos dizer que os
neoclássicos se preocupavam com o equilíbrio, aceitavam a Lei de Say, o “laissez
faire”, e tinham a suposição de um mundo de concorrência perfeita.

E
IMPORTANT

Laissez-faire é uma expressão francesa para designar o liberalismo econômico.


O mercado deve funcionar livremente.

E
IMPORTANT

O que é concorrência perfeita? É a concorrência de mercado em que há um


grande número de vendedores (geralmente pequenas empresas) e de compradores.

Segundo Hunt (2005), outra contribuição dos autores pode ser avaliada
considerando a mudança na maneira como o objeto de estudo da economia
passou a ser visto. O objetivo era neutralizar o componente político da ciência.

149
UNIDADE 3 | AS TEORIAS DO PENSAMENTO ECONÔMICO

A economia política dos clássicos era essencialmente “política”, estando voltada


para a compreensão das relações socioeconômicas entre os homens em sua
capacidade como produtores (as relações de classes sociais).

As relações determinariam, em última análise, as relações de mercado.


Os marginalistas abstraem da ciência econômica as classes sociais, e com elas as
relações sociais, e voltam-se para a relação psicológica entre atores abstratos e
bens. Ainda, o núcleo abstrato da teoria trata de um objeto tido como “natural” e
regido por leis naturais. A síntese do pensamento neoclássico seria:

• Raciocínio na margem: a decisão de produzir ou consumir vai depender do


custo ou benefício proporcionado pela última unidade.
• Abordagem microeconômica: o indivíduo e a firma estão no centro da análise,
cada bem levado ao mercado é único ou homogêneo, possuindo um preço que
equilibra sua oferta com a demanda.
• Método abstrato-dedutivo: abstração teórica, argumentação lógica e conclusão.
• Concorrência pura nos mercados, sendo o monopólio uma exceção: muitos
vendedores e compradores concorrem no mercado por bens e serviços; as
firmas são pequenas e individualmente não conseguem influenciar o preço de
equilíbrio de mercado.

150
TÓPICO 2 | ESCOLA NEOCLÁSSICA

LEITURA COMPLEMENTAR

A ortodoxia neoclássica

Eleutério F. S. Prado

Para definir os contornos da teoria neoclássica, é preciso contrapô-la


à teoria clássica. Esta última caracteriza-se  por analisar o sistema econômico
principalmente no âmbito da produção e em uma perspectiva de longo prazo.
Na situação em que se faz abstração dos desequilíbrios e das flutuações de curto
prazo, as taxas de lucro calculadas em relação aos preços de oferta dos bens de
capital são uniformes, assim como são uniformes as remunerações da força de
trabalho e dos recursos naturais considerados qualitativamente homogêneos.

Pressupõe-se que haja livre competição, e que não existam barreiras


na entrada das diversas indústrias. No estado de longo prazo, os preços são
ditos naturais ou de produção, porque refletem as condições de reprodução da
economia capitalista de mercado.

Os economistas clássicos, assim como Marx, acreditavam que o sistema


econômico funcionava sob uma lei de tendência à igualação das taxas de
lucro nos diferentes setores e ramos da economia. Segundo eles, os capitais,
principalmente na forma monetária, partiam dos ramos com taxas de lucro
mais baixas para poderem entrar naqueles com taxas de lucro acima da média.
Ocorria em consequência da ação dos empresários capitalistas, que buscavam
persistentemente a valorização de seus capitais no mais alto nível possível.

Dada a alta mobilidade do capital e uma certa mobilidade da força de


trabalho, a alocação dos capitais nos diversos setores industriais e agrícolas
acabava gerando uma tendência para a uniformização das taxas lucro e das
remunerações dos demais agentes da produção.

Os preços de produção apareciam como possibilidades que são reais,


porém improváveis. De qualquer modo, funcionavam como centros de gravidade
dos preços de mercado, que supostamente refletiam nas condições contingentes
do processo econômico em cada lugar e a cada momento do tempo.

A teoria clássica se caracterizava por uma falta de assimetria no tratamento


das diferentes parcelas recebidas pelas diversas classes sociais. Os salários mais
baixos da escala de remunerações tendiam a ser determinados pelo nível social
de subsistência; fora desse estado, flutuavam em torno desse valor, em função da
demanda e da oferta de força de trabalho.

Deduzindo os salários pagos do montante das vendas efetivadas nos


mercados, assim como os valores necessários para repor os meios de produção
gastos no processo produtivo, chegavam aos lucros, que eram vistos como um

151
UNIDADE 3 | AS TEORIAS DO PENSAMENTO ECONÔMICO

excedente, mediante o qual os capitalistas remuneravam as classes possuidoras:


fossem eles próprios proprietários do capital, fossem os proprietários dos recursos
naturais empregados na produção.

Assim, a renda da terra era determinada, segundo eles, pela possibilidade


de remuneração daquelas parcelas de solo menos férteis, mais distantes, que
podiam ser empregadas na agricultura e na pecuária somente na falta de parcelas
melhores, e que eram chamadas, por isso, de marginais.

A teoria neoclássica tradicional de Marshall, Jevons, Walras, Menger etc,


nascida na última terça parte do século XIX como um desvio de curso que vai se
afastando progressivamente da corrente da teoria clássica, continuou analisando
a economia capitalista dentro do mesmo contexto de longo prazo. Entretanto, ela
modificou algo essencial na tradição. A mudança fundamental desse novo curso
de análise econômica, que não parou de engrossar durante todo o século XX,
aconteceu na teoria da repartição.

Assim, a marca distintiva da teoria neoclássica ou das teorias neoclássicas,


para sermos mais precisos, vem a ser o tratamento simétrico dado às diversas
parcelas da renda. Os salários, os lucros e as rendas passam a ser vistos como
partes determinadas pelas interseções das ofertas e das demandas em níveis que
se igualam, sob a suposição de que a economia se encontra em equilíbrio aos
valores dos produtos marginais dos chamados serviços.

A força de trabalho, os recursos naturais e os meios de produção


reprodutíveis (também chamados de capitais físicos) vêm a ser denominados
indistintamente fatores de produção. Como tais, eles passam a ser vistos como
capazes na geração de serviços que contribuem para a efetivação do processo
produtivo. Dentro do suposto, as chamadas “condições marginais” tornaram-
se, então, associadas às remunerações de todas as classes sociais, agora vistas
indistintamente como fornecedoras de serviços.

FONTE: PRADO, Eleutério F. S. A ortodoxia neoclássica. 2001. Disponível em: <http://www.


scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142001000100003>. Acesso em: 18 jun.
2018.

3 KEYNESIANISMO
A crise econômica de 1929 foi uma crise de superprodução, a qual havia
muita oferta de mercadoria, mas não havia demanda. Colocou em discussão a
viabilidade das medidas econômicas, que apontava para o mercado capitalista
como o instrumento ideal para alcançarmos o equilíbrio econômico e social, sem
a intervenção do Estado.

152
TÓPICO 2 | ESCOLA NEOCLÁSSICA

A resposta à crise foi encontrada nos Estados Unidos e depois nos demais
países do capitalismo ocidental, na ampliação da intervenção do Estado, com o
planejamento econômico. Nos EUA, as medidas foram implantadas no governo
do presidente democrata Franklin Delano Roosevelt (1933-1945) e receberam o
nome de New Deal (Novo Acordo).

O New Deal foi influenciado pela teoria econômica de John Maynard


Keynes, economista britânico que apontava para a necessidade da mediação
econômica do Estado para garantir o conforto da população.

3.1 KEYNES E SUA TEORIA


Para Hunt (2005), o ponto de partida do pensamento de Keynes demonstra
que o sistema capitalista tem um caráter instável. A operação da “mão invisível”,
ao contrário do que afirmavam os economistas clássicos, não produz a harmonia
no mercado. Em momentos de crises, argumenta Keynes, a intervenção do Estado
pode gerar demanda frente aos investimentos, tendo o objetivo da garantia de
níveis elevados de emprego.

FIGURA 10 – JOHN MAYNARD KEYNES (1883-1946)

FONTE: Disponível em: <https://www.thefamouspeople.com/


profiles/john-maynard-keynes-191.php>. Acesso em: 18 jun. 2018.

O pensamento de Keynes comandou as bases do capitalismo mundial entre


a década de 1940 e final dos anos de 1970. No Brasil, o pensamento keynesiano
vigorou até o final dos anos 80, principalmente no que diz respeito ao Estado
interventor.

A forte intervenção do Estado na economia brasileira, entre as décadas


de 1950 e 1980, foi realizada com base teórica fundamentada no pensamento
de Keynes. A análise keynesiana veio se opor aos postulados da economia
Neoclássica, que tinham na Lei de Say a sua pedra angular.

153
UNIDADE 3 | AS TEORIAS DO PENSAMENTO ECONÔMICO

E
IMPORTANT

A Lei de Say diz que a soma dos valores de tudo aquilo que é produzido é
sempre equivalente à soma dos valores empregados como fatores na produção.

Segundo Hunt (2005), muitos economistas deduziram que o princípio


da Lei de Say é válido para uma economia de produtores simples, de troca, de
escambo, na qual cada família seria proprietária de seus meios de produção e
trocaria apenas o excedente de bens que ela mesma produz, mas não consome.

O dinheiro é visto apenas como um meio de troca, sendo gasto


imediatamente. Para Say, ninguém teria interesse em conservá-lo (atribuindo-
lhe reserva de valor). Assim, podemos afirmar que dentro da filosofia de Say,
os produtores ou possuidores de dinheiro não tinham interesse em mantê-lo em
suas mãos e a demanda seria ilimitada.

Fica entendido que toda a renda ganha é sempre gasta no processo


produtivo, sinalizando a inexistência de entesouramento. Na Lei de Say inexiste
entesouramento do dinheiro. Nenhum indivíduo, ao auferir uma renda, deixa de
usá-la inteiramente. Uma parte dela é utilizada para o consumo pessoal, enquanto
a outra parte é poupada.

E
IMPORTANT

Poupança não significa entesouramento para a Lei de Say. A poupança será


sempre utilizada. O indivíduo a emprega para acumular capital ou a empresta para outro, que
deve imediatamente fazer uso dela.

Assim, de acordo com Hunt (2005), podemos dizer que tudo que
ganhamos deve ser gasto. Se parte não é, outra pessoa o faz, recebendo o dinheiro
por empréstimo. Considerando que o volume dos meios de produção e da força
de trabalho é regulado pela produção, temos que a economia tende a operar com
pleno emprego de recursos (ou plena capacidade de produção).

Ao contrário de Say, Keynes entendeu que, para a sobrevivência do


capitalismo, era necessária uma ação efetiva do Estado na regulação das crises do
capital. Em 1930, escreveu o “Tratado Sobre a Moeda” e, em 1936, a sua principal
obra, a “Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda”. Foi esta última que mais
contestou a Teoria Neoclássica.
154
TÓPICO 2 | ESCOLA NEOCLÁSSICA

A Teoria Geral abalou profundamente os pressupostos do liberalismo


econômico, mostrando a inexistência do princípio do equilíbrio automático na
economia capitalista. Até então, nos meios marginalistas, a economia de mercado
encontrava naturalmente seu equilíbrio em uma situação em que todos os que
desejassem trabalhar por uma remuneração correspondente à produtividade
poderiam fazê-lo.

De acordo com Feijó (2007), a questão da produção e do emprego foi


demasiadamente avaliada por Keynes. Ele concluiu que o fator responsável
pela alteração do volume de emprego é a procura de mão de obra, e não a sua
oferta, como pensavam os neoclássicos. Logo, o desemprego é o resultado de uma
demanda insuficiente de bens e serviços, e somente pode ser resolvido por meio
de investimentos.

O investimento, para Keynes, é o fator dinâmico na economia, capaz de
assegurar o pleno emprego e influenciar a demanda. Ao contrário da tradição
clássica e neoclássica, Keynes enfatiza acentuadamente o papel do Estado na
economia, e destaca que as mudanças no sistema produtivo não poderiam ocorrer
sem a ação efetiva do poder público.

Assim, segundo Hunt (2005), o eixo da análise de Keynes sobre a


intervenção do Estado na economia é a superação da crise, no curto prazo,
durante a própria crise, possibilitando o aumento dos investimentos através
de uma política de aumento da demanda. O aumento das despesas em obras
públicas, graças ao multiplicador, provocaria o aquecimento da economia, que
se espalharia para os demais setores. Contudo, por meio dos investimentos
privados, vistos como eixo central de toda a economia, promovemos a elevação
do nível de emprego, aumentamos a renda e o crescimento econômico.

É do Estado a responsabilidade de ativar o investimento e de assegurar
a alocação dos recursos. Keynes estava convencido da importância da ação do
Estado na economia, e toda a ação governamental deveria estar pautada na busca
da redução dos efeitos da crise de acumulação de capitais que, de qualquer forma,
promoveria a queima de certa quantidade de capital.

E
IMPORTANT

O multiplicador keynesiano seria o efeito criado pelo investimento. Ao investir


em algo, terá um aumento na produção, impactando positivamente no lucro.

Demanda agregada é diferente da demanda efetiva: a demanda agregada seria o total de


bens e serviços que uma determinada economia está determinada a comprar. Já a demanda
efetiva é a demanda que realmente se realiza na prática, depois da aquisição de bens e
serviços.

155
UNIDADE 3 | AS TEORIAS DO PENSAMENTO ECONÔMICO

LEITURA COMPLEMENTAR

Um esboço da Teoria Keynesiana

Ricardo Dathein

Na teoria de Keynes, existe uma ordem causal na determinação das


variáveis econômicas, que é basicamente oposta à neoclássica. O salário real pode
ser determinado no “Mercado de Trabalho”, mas necessita-se conhecer antes o
nível de emprego, não determinado no mercado.

É necessário recuarmos ao Mercado de Bens e Serviços, onde se encontra


o nível de emprego a partir da Oferta e Demanda Agregadas. No entanto, é
necessário partir das funções consumo e investimento e, para a determinação do
nível de investimentos, torna-se necessário recuar ao Mercado de Capitais. Este, por
sua vez, depende da taxa de juros determinada no Mercado Monetário.

Assim, Keynes constrói a “Teoria Geral”, desconstruindo o caminho lógico


neoclássico. O modelo básico de Keynes, na lógica inversa, pode ser apresentado
da seguinte forma. Parte-se da análise do Mercado Monetário para encontrar a
taxa real de juros (i). A taxa é determinada em função da demanda especulativa
por moeda, ou preferência pela liquidez, e pela oferta residual de moeda.

A partir da renda, determinada simultaneamente, e com a função da


demanda transacional e precaucional por moeda, podemos encontrar a oferta
residual de moeda. A oferta é relevante para determinar a taxa de juros quando
contraposta à demanda especulativa por moeda no Mercado Monetário.

A oferta total de moeda é determinada exogenamente, ou seja, é controlada
pelas autoridades monetárias. Podemos dizer que Keynes faz um nexo entre
a teoria econômica e a política econômica para fechar o modelo, ou que, para
resolver o sistema de equações, é necessário o uso de um determinante exógeno
(VERCELLI, 1991).

A moeda, para Keynes e para os pós-keynesianos, possui um papel


essencial na tomada de decisões, dada a incerteza e o tempo histórico, pois pode
produzir impactos na produção e no emprego. Os empresários decidem ao longo
do tempo (em uma economia sequencial), conforme suas expectativas, sobre
estratégias produtivas ou especulativas de valorização de riqueza.

Por outro lado, a própria contratação de fatores de produção, sendo
anterior à etapa de venda, cria a necessidade de liquidez. A busca por liquidez
é um comportamento racional em contextos de incerteza e sob o domínio de
expectativas. A liquidez permite maior segurança, sendo um instrumento de
defesa e de refúgio (hedge) contra um futuro imprevisível, permitindo também a
postergação de decisões sobre ativos menos líquidos.

156
TÓPICO 2 | ESCOLA NEOCLÁSSICA

A moeda faz uma ligação entre o presente e o futuro na economia


empresarial. Em um mundo incerto, o dinheiro é o instrumento básico para adiar
decisões “reais” ou para transferir poder de compra no tempo (DAVIDSON,
1977). Keynes parte da ideia de que existem três coisas a fazer com a renda, e não
apenas duas: os agentes podem consumir, podem investir ou podem aplicar seus
recursos em moeda ou outros ativos líquidos substitutos.

Existe uma preferência por liquidez, dada a incerteza, e uma determinada


iliquidez nos ativos financeiros, o que pode ser entendido como um custo da
aplicação, que precisa ser compensado por um determinado nível de taxa de
juros para fazer o agente abrir mão da liquidez.

Na realidade, existem aplicações financeiras de curto prazo, rapidamente


resgatáveis e que pouco variam com a taxa de juros, sem risco, mas que garantem
uma remuneração, mesmo que baixa. Dificilmente os agentes ficariam com muita
moeda líquida, até pelo risco da insegurança.

A escolha, portanto, não é entre aplicações com risco e moeda, mas


entre aplicações em títulos de longo prazo, com risco e remuneração superior, e
aplicações de curto prazo com baixo retorno, mas sem risco.

O argumento keynesiano sobre a preferência por liquidez derivado da


demanda especulativa deve explicar, portanto, a distribuição das aplicações entre
curto e longo prazo ou entre menores e maiores taxas de retorno. Potencialmente,
portanto, existiria pouca moeda ociosa, pois quase toda ficaria aplicada,
disponível para ser usada de forma ativa, em consumo ou investimentos, por
todos os agentes econômicos, além do aplicador.

Para Keynes, os empresários não fazem somente cálculos sobre lucros, mas
possuem um instinto espontâneo de agir. Não leva ao irracionalismo, uma vez
que as expectativas de longo prazo são muitas vezes estáveis, com os empresários
se baseando em determinados “estados de confiança”.

A rejeição de Keynes à lei de Say aparece no Mercado de Bens e Serviços,


de modo que pode existir divergência entre a capacidade produtiva potencial e a
produção real no caso de existir uma Demanda Efetiva insuficiente.

Como a oferta não cria automaticamente e necessariamente uma demanda
exatamente igual, as curvas de Oferta Agregada e de Demanda Agregada
não coincidem, a não ser no ponto de Demanda Efetiva, o qual representa um
equilíbrio de curto prazo que depende de expectativas empresariais concretizadas.
Considerando-se que a função Oferta Agregada é razoavelmente fixa no curto
prazo, o emprego aparece como dependente da Demanda Agregada.

No Mercado de Bens e Serviços, podemos determinar o nível de emprego
de equilíbrio da economia (N*). O ponto de equilíbrio entre as funções de Oferta
Agregada (Z) e de Demanda Agregada (D) é chamado de nível da Demanda
Efetiva (DE).
157
UNIDADE 3 | AS TEORIAS DO PENSAMENTO ECONÔMICO

O ponto corresponde à renda de equilíbrio (Y*) e determina o nível de


emprego, indicando o limite para a expansão lucrativa da produção, ou seja, a
situação na qual a expectativa de lucros do empresário é maximizada (CHICK,
1983).

A função de Demanda Agregada corresponde a um gasto desejado e a


um correspondente rendimento esperado pelas empresas. A curva possui uma
inclinação menor que a da Oferta Agregada no espaço relevante (próximo da
DE) pelo fato de que a propensão marginal a consumir é menor que um, ou pela
própria percepção dos empresários de que a taxa de expansão do mercado não é
ilimitada (em relação à rentabilidade).

Por outro lado, inicia-se acima do ponto zero devido ao consumo


autônomo. A curva de Demanda Agregada é derivada da soma dos gastos em
consumo e investimentos. O ponto de Demanda Efetiva (ex-ante) corresponde ao
nível de equilíbrio na ótica gasto/renda (ex-post), de modo que as expectativas de
curto prazo são tomadas como satisfeitas.

Keynes rejeitou a oferta de trabalho neoclássica, de maneira que não existe


mais um ponto de equilíbrio no Mercado de Trabalho e o salário real só pode ser
encontrado com o auxílio de um elemento exógeno: a Demanda Efetiva. Keynes
também alterou o sentido causal da análise. Não é o salário real, mas a Demanda
Efetiva que determina o emprego e este determina o salário real. A aceitação, por
Keynes, da curva de demanda por trabalho neoclássica, deve ser qualificada.

Uma forma de mensurar o desemprego involuntário seria acrescentar


ao “Mercado de Trabalho” uma curva de oferta de mão de obra. Keynes nega a
curva enquanto determinante de salários reais e emprego, mas ela ainda poderia
servir para definir a oferta de trabalho dado um salário real, sendo assim um
limite máximo de emprego (VERCELLI, 1991).

Em síntese, a análise causal de Keynes é inversa à neoclássica, partindo
dos Mercados Monetário e de Capitais para o Mercado de Bens e Serviços, e deste
para o “Mercado de Trabalho”. Este último não é determinante para a economia,
e, portanto, para a teoria, sendo colocado como última etapa da análise.

Outra crítica que pode ser feita, segundo os pós-keynesianos, à
determinação dos salários reais, é que os salários, lucros e outras rendas são
interdependentes e a sua soma está dada no curto prazo.

Os salários reais não podem ser determinados pela oferta e demanda de


trabalho, independentemente ou tomando como fixos os lucros e outras rendas,
como fazem as teorias neoclássicas, pois são elementos interdependentes. Se os
lucros e outras rendas estão dados, o salário real também estará e o Mercado de
Trabalho neoclássico não pode explicá-lo (DENIS, 1966).

158
TÓPICO 2 | ESCOLA NEOCLÁSSICA

A teoria pós-keynesiana esclarece, enfatiza e acrescenta elementos em


relação à teoria de Keynes. O autor, de acordo com a visão pós-keynesiana,
elaborou uma teoria monetária do emprego, ou seja, considerou que as variáveis
monetárias causariam efeitos reais e, assim, não poderia ser aceita a dicotomia
rígida entre variáveis monetárias e reais da teoria neoclássica. Os autores
keynesianos ou pós-keynesianos criticam fortemente a teoria neoclássica.

FONTE: DATHEIN, Ricardo. Um esboço da teoria keynesiana. 2000. Disponível em: <www.
virtual.ie.ufrj.br/ufrgs/analisemacroeconomicaa/textos/teoriakeynesiana.doc>. Acesso em: 18
jun. 2018.

159
RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• A economia neoclássica questiona os clássicos e relaciona a oferta, a demanda


(procura), a racionalidade de cada agente e sua capacidade de maximizar a
utilidade ou o lucro.

• Há a ótica do liberalismo clássico do laissez faire.

• O objetivo da demanda busca maximizar ganhos.

• O objetivo da oferta busca maximizar receitas e reduzir custos.

• Os indivíduos fornecem sua mão de obra para as empresas. Buscam equilibrar


o ganho de oferecer a unidade marginal de seus serviços (o salário a receber).

• Para o keynesianismo, é necessária a intervenção do Estado na economia em


momentos de crises.

• A economia capitalista é cíclica.

• O grande eixo da análise de Keynes sobre a intervenção do Estado na economia


é a superação da crise, no curto prazo, durante a própria crise, possibilitando o
aumento dos investimentos através de uma política de aumento da demanda. O
aumento das despesas em obras públicas, graças ao multiplicador, provocaria
o aquecimento da economia, que se espalharia para os demais setores.

• A demanda efetiva é demanda  agregada que de fato se realiza na aquisição


de bens, e não procura potencial por esses bens econômicos. É a parte que
realmente se realiza.

160
AUTOATIVIDADE

1 Diferencie o liberalismo da intervenção do Estado na economia.

2 Explique as principais ideias de Keynes.

3 Diferencie a Lei de Say da demanda efetiva.

161
162
UNIDADE 3
TÓPICO 3

PENSAMENTO ECONÔMICO
CONTEMPORÂNEO E OS PENSADORES
BRASILEIROS LATINO-AMERICANOS

1 INTRODUÇÃO
Você já ouviu falar sobre o neoliberalismo? Leu sobre nos jornais, nas
redes sociais ou em qualquer lugar do mundo atual? Lembra que já estudamos
o pensamento econômico do liberalismo? Então, será que atualmente estamos
vivendo em um neo (novo) liberalismo?

Segundo Hunt (2005), depois da Segunda Guerra Mundial, Friedrich


Hayek, economista austríaco naturalizado inglês, publicou o livro “O Caminho
da Servidão” (2010), no qual critica a socialdemocracia e a proteção do Estado aos
trabalhadores com leis trabalhistas, bem como a cobrança de impostos dos ricos.

De acordo com o pensamento defendido por Hayek (2010), considerado


o pai do neoliberalismo, o Estado deve implantar um amplo programa de
privatizações, o mercado deve funcionar sem restrições do Estado e deve haver
liberdade econômica absoluta.

Entretanto, antes de dialogarmos sobre o neoliberalismo, precisamos


compreender as escolas que perpassam o caminho de tal pensamento econômico,
que são elas: o monetarismo, as expectativas racionais e o pós-keynesianismo.

2 O MONETARISMO, EXPECTATIVAS RACIONAIS E PÓS-


KEYNESIANOS
O monetarismo foi uma das escolas de maior destaque da segunda
metade do século passado. Seu mais famoso expoente, Milton Friedman (1912-
2006), ganhador do Prêmio Nobel em 1976, é para boa parte dos economistas o
mais influente pensador econômico do século XX. A escola monetarista fez suas
proposições serem ouvidas no meio acadêmico e político, influenciando bancos
centrais, governos, universidades, entre outros (HUNT, 2005).

163
UNIDADE 3 | AS TEORIAS DO PENSAMENTO ECONÔMICO

E
IMPORTANT

Monetarismo: teoria macroeconômica que analisa a oferta monetária. Identifica-


se com uma interpretação da forma como a oferta de dinheiro afeta outras variáveis, como
os preços, a produção e o emprego, contrapondo-se ao keynesianismo.

Para a escola monetarista, a moeda é neutra. Há uma crítica para a teoria


de Keynes, pois com a intervenção do Estado na economia, gera-se inflação.
Segundo Hunt (2005), a teoria monetarista buscava explicar as variações da
atividade econômica pelas variações de oferta de dinheiro e não pelas variações
de investimento.

Assim, Friedman considera prejudicial a intervenção do Estado no


desenvolvimento da economia por meio de despesas de investimento. Ao
contrário, deve-se apenas dirigir cientificamente a evolução da massa de dinheiro
em circulação para obter o desenvolvimento e a estabilidade econômica, pois a
inflação e outros fenômenos teriam raízes puramente monetárias.

Já os monetaristas defendiam que a política monetária exercia papel


central na economia, sobretudo quando se pretendia alcançar a estabilidade
macroeconômica. Ainda, dever-se-ia adotar regras monetárias, como o controle
do crescimento do estoque de moeda, para evitar oscilações na economia.

Segundo Hunt (2005), o pressuposto das expectativas racionais é um


conceito econômico que se baseia na hipótese de que os agentes econômicos
utilizam toda a informação disponível sobre o atual comportamento e as previsões
para o futuro da economia. Com base na experiência e nas informações, os agentes
antecipam de forma racional as atitudes políticas futuras do governo, reagindo
no presente em consonância com as expectativas formadas e anulando em algum
grau a efetividade de tais políticas.

A teoria pós-keynesiana foi uma das críticas ao economista monetarista


e às expectativas racionais, principalmente a partir da década de 1970 buscando,
a partir dos pressupostos de Keynes, desenvolver uma abordagem alternativa,
que procurasse dar explicações convincentes sobre o funcionamento do “mundo
real”. Seus ícones foram os economistas Paul Davidson, Hyman Minsky e Jan
Kregel.

Segundo Hunt (2005), uma das intenções de Keynes, no livro “A teoria


geral do emprego, dos juros e da moeda”, de 1936, era uma crítica ao conceito da mão
invisível de Adam Smith, que autoequilibrava e regulava o mercado.

164
TÓPICO 3 | PENSAMENTO ECONÔMICO CONTEMPORÂNEO E OS PENSADORES BRASILEIROS LATINO-AMERICANOS

Assim, uma das características principais do pós-keynesianismo era


mostrar, de forma coerente, que uma economia, quando deixada ao livre jogo das
forças de mercado, é incapaz de alcançar e/ou permanecer em uma posição de
pleno emprego da força de trabalho. Uma de suas conclusões é que os mercados
não se autoequilibram e, assim, são falhos. Então, a política do “laissez-faire”, é
considerada inadequada como solução para os problemas econômicos e sociais
do mundo atual, particularmente em relação ao desemprego e à distribuição de
renda.

De acordo com Feijó (2007), a teoria pós-keynesiana defende um papel


permanente para o governo na economia, não se confundindo com a simples
substituição dos mercados privados pela ação do Estado na determinação do
investimento.

Propõe a adoção de políticas econômicas dirigidas para o aumento do


nível de demanda agregada, para o estímulo do empresariado a realizar novos
investimentos, uma vez que os níveis de emprego e utilização da capacidade
dependem dos determinantes da demanda agregada.
 
Outra ideia proposta pelos pensadores pós-keynesianos no mundo real,
que é crítica direta aos monetaristas, demonstra que a moeda não é neutra, o
futuro é incerto. Entendidos das escolas que perpassaram no caminho que hoje é
denominado neoliberalismo, vamos entender determinado termo.

3 NEOLIBERALISMO
O Neoliberalismo é um novo conceito do liberalismo clássico, cuja
característica marcante é a defesa de maior autonomia dos cidadãos nos setores
econômicos e políticos e, consequentemente, com pouca intervenção estatal.

O neoliberalismo econômico iniciou na década de 1970, substituindo as


medidas do modelo keynesiano e tendo como objetivo o desenvolvimento do
capitalismo sem a intervenção do Estado.

Os neoliberais, tendo como base os economistas clássicos, sustentam a


teoria de que a economia se autorregula através das forças do próprio mercado,
possibilitando o crescimento e desenvolvimento do país sem a intervenção.

Marcado por um período do advento e intensificação da globalização,


podemos destacar como características do neoliberalismo:

• Privatização de empresas estatais.


• Livre circulação de capitais internacionais.
• Abertura econômica para a entrada de empresas multinacionais.
• Adoção de medidas contra o protecionismo econômico.
• Redução de impostos e tributos cobrados indiscriminadamente.

165
UNIDADE 3 | AS TEORIAS DO PENSAMENTO ECONÔMICO

Ainda, a década de 1970 foi marcada por significativas mudanças


econômicas na esfera global (FIORI, 2002). O capitalismo que estava em crise
econômica e política se renovou por meio de uma reestruturação do seu modo de
produção, a denominada reestruturação produtiva.

E
IMPORTANT

A reestruturação produtiva foi a flexibilização do trabalho na área industrial.


Um mesmo empregado, se quiser se manter na empresa, precisa fazer várias funções, sendo
diferente da época do modelo Taylorista/Fordista, na qual havia modelos de produção com
uma estrutura rígida a ser seguida, havendo trabalho repetitivo e produção em massa de
mercadorias.

Os métodos rígidos do processo de produção tinham por objetivo


produzir em massa, características que eram marcantes dos modos de produção
Taylorista e Fordista. Nos dois modelos de produção, o trabalhador precisava ser
especializado para executar uma única função dentro das linhas de produção. Ao
mesmo tempo, começava a ser substituído por novas tecnologias eletroeletrônicas,
que possibilitam a diversificação de produtos com custos de produção menores.

No Brasil, o liberalismo econômico prevaleceu nos governos do


presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-1998 e 1999-2002). Na época,
foram implantadas reformas consideradas essenciais para a modernização do
país e para a garantia da estabilidade econômica.

No período, os países principais do mundo, seguindo as orientações do
FMI (Fundo Monetário Internacional) e do Banco Mundial, passaram a adotar um
conjunto de medidas para o controle da inflação e da modernização do Estado.
Dentre elas, destacam-se:

• Ajuste fiscal.
• Redução do tamanho do Estado.
• Privatização.
• Abertura comercial.
• Abertura financeira.
• Fiscalização dos gastos públicos e fim das obras faraônicas.
• Investimento em infraestrutura básica.
• Terceirização.

Cabe salientar que no Brasil, como nos demais países, as medidas


neoliberais implantadas não resolveram os graves problemas sociais.

166
TÓPICO 3 | PENSAMENTO ECONÔMICO CONTEMPORÂNEO E OS PENSADORES BRASILEIROS LATINO-AMERICANOS

4 OS PENSADORES BRASILEIROS E LATINO-AMERICANOS


Prezado acadêmico, para falarmos sobre os pensadores brasileiros e
latino-americanos, precisamos falar sobre a Comissão Econômica para a América
Latina (CEPAL). Você já ouviu falar da CEPAL?

E
IMPORTANT

A Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL) foi estabelecida pela


resolução 106 (VI) do Conselho Econômico e Social, de 25 de fevereiro de 1948, e começou
a funcionar no mesmo ano. Diante da Resolução 1984/67, de 27 de julho de 1984, o Conselho
decidiu que a Comissão passaria a se chamar Comissão Econômica para a América Latina
e o Caribe.

FIGURA 11 – EDIFÍCIO DA SEDE DA CEPAL

FONTE: Disponível em: <https://www.cepal.org/pt-br/about>. Acesso em: 19 jun.


2018.

A CEPAL é uma das cinco comissões regionais das Nações Unidas e sua sede
está em Santiago do Chile. Foi fundada para contribuir com o desenvolvimento
econômico da América Latina, coordenar as ações encaminhadas à promoção e
reforçar as relações econômicas dos países entre si e com as outras nações do
mundo.

No Brasil, a presença da CEPAL ocorreu em outubro de 1952, quando foi


criado um grupo conhecido como “Grupo Misto de Estudos CAPEL/BNDES”,
resultante de um acordo entre os dois órgãos. Entretanto, foi somente em setembro
de 1960 que o Centro de Desenvolvimento Econômico CEPAL/BNDES se instalou
no Rio de Janeiro. Atualmente, o escritório da CEPAL está localizado em Brasília.

167
UNIDADE 3 | AS TEORIAS DO PENSAMENTO ECONÔMICO

4.1 PRINCIPAIS AUTORES DO PENSAMENTO LATINO-


AMERICANO
Para iniciarmos a conversa, é importante sabermos que os principais
autores que estudaram o desenvolvimento econômico e participaram da Comissão
da América Latina (CEPAL) foram Raul Prebisch, um economista argentino e
Celso Furtado, um economista brasileiro.

Utilizavam como método de pesquisa a analise estrutural da história


econômica de suas regiões, observando a diferença da América Latina dos países
considerados desenvolvidos como a Inglaterra, os EUA, entre outros.

Assim, buscamos apreender as mudanças do “desenvolvimento” no


contexto econômico, em uma breve análise histórica e com ênfase na ideia de
“desenvolvimento” utilizada pela Comissão da América Latina (CEPAL).

FIGURA 12 – RAUL PREBISCH (1901-1986) E CELSO FURTADO (1920-


2004)

FONTE: Disponível em: <http://www.paulogala.com.br/prebisch-


e-furtado-dois-expoentes-do-pensamento-economico-latino-
americano/>. Acesso em: 19 jun. 2018.

A palavra “desenvolvimento” é apresentada nos estudos clássicos das


Ciências Econômicas como uma ideia de “desenvolver a nação”. De modo geral,
a atenção dos economistas clássicos, como Adam Smith e David Ricardo, voltava-
se para “questões que diziam respeito aos seus países e ignoravam o mundo
subdesenvolvido [...]” (ARNDT, 1989, p. 31).

Já a análise marxista enfatiza o processo de “desenvolvimento” por meio


da transformação da economia capitalista ao longo do tempo. Assim, a origem
da ideia de desenvolvimento está ligada à evolução do capitalismo (ESCOBAR,
1995).

168
TÓPICO 3 | PENSAMENTO ECONÔMICO CONTEMPORÂNEO E OS PENSADORES BRASILEIROS LATINO-AMERICANOS

Com o passar dos tempos, a palavra “desenvolvimento” se conjugará


fortemente com o termo “desenvolvimento econômico” após a Segunda Guerra
Mundial:

O termo “desenvolvimento econômico” denota um processo


atravessado pelas sociedades que foi raramente usado antes da Segunda
Guerra Mundial. De fato, o uso do termo até o período entre guerras
costumava denotar, em um contexto colonial, o “desenvolvimento ou
exploração de recursos naturais” e não possuía qualquer relação com
a melhoria do bem-estar social (ARNDT, 1989, p. 35).

Assim, após a Segunda Guerra Mundial, o “desenvolvimento econômico”


passa a ser entendido como a melhoria da qualidade de vida, apreendido por
meio do crescimento econômico, levando aos países considerados menos
“desenvolvidos” o modelo de estado capitalista dos países considerados
“desenvolvidos”.

O desenvolvimento era visto como um processo histórico natural. A


teoria fundamenta-se na ideia de que o “desenvolvimento econômico”
de países como os Estados Unidos e Europa possui um valor normativo
que deve ser levado para o resto do mundo. Na primeira fase, o
desenvolvimento significa a aquisição pelos países subdesenvolvidos
dos traços e características dos países desenvolvidos (PRESTON, 2009,
p. 17).

Na mesma época, foi criada a Comissão Econômica para a América


Latina e o Caribe (CEPAL), para monitorar as políticas direcionadas à promoção
do desenvolvimento econômico da região latino-americana, assessorar as
ações encaminhadas para sua promoção e contribuir para reforçar as relações
econômicas dos países da área, tanto entre si como com as demais nações do
mundo. Posteriormente, seu trabalho se ampliou para os países do Caribe e
incorporou o objetivo de promover o desenvolvimento social e sustentável.

Seu conceito de “desenvolvimento” se origina no contexto da pós-segunda


guerra mundial, motivado pela divisão internacional do trabalho, distinguindo
economias primário-exportadoras e economias urbanas indústrias, economias
periféricas e economias centrais. A escola de pensamento (CEPAL), no início dos
anos 50, objetivava examinar a América Latina e seus países periféricos em um
contexto estrutural quando havia a comparação com os países centrais.
  
De acordo com Prebisch (1961), autor que teve influência nas políticas
econômicas de países da América Latina, bem como na CEPAL, especialmente
em relação à adoção de medidas de substituição de importação como políticas
governamentais de desenvolvimento, mostra que:

A diferença entre “centro” e “periferia” estaria relacionada a piores


condições de crescimento na periferia, o que impunha restrições ao
processo de industrialização e ao progresso tecnológico e exigindo,
portanto, que estratégias de crescimento fossem coordenadas pelo
estado, visto que tais condições tornavam as forças do mercado
insuficientes (PREBISCH, 1961 apud BIELSCHOWSKY, 2006, p. 8).

169
UNIDADE 3 | AS TEORIAS DO PENSAMENTO ECONÔMICO

Segundo Prebisch (1961), os países em desenvolvimento podiam ser


caracterizados por uma estrutura dupla em que um setor agrícola tardio e um
setor industrial sofisticado poderiam coexistir.

A importância da manufatura frente a concentrações em exportações de


commodities primárias era uma preocupação central da abordagem estruturalista
associada à CEPAL. A industrialização baseada em sofisticação produtiva era
encarada como a única maneira pela qual os países em desenvolvimento poderiam
realizar o catch-up.

E
IMPORTANT

Catch up, nos estudos econômico, é o processo em que as economias em


desenvolvimento se aproximam do nível de riqueza acumulada das economias mais
desenvolvidas.

Após a segunda Guerra Mundial, foi visto que, no ambiente econômico,


o termo “desenvolvimento econômico” (sinônimo de crescimento econômico)
foi muito utilizado para expressar o “desenvolvimento”. Ainda, países segundo
a CEPAL defenderão, no início dos anos 1950, a industrialização por substituição
de exportações como o caminho para o alcance do “desenvolvimento econômico”
com a participação ativa dos Estados nacionais.

Entretanto, a partir do final de 1980, diante do contexto econômico
mundial, como a globalização, a abertura dos mercados, a presença do Consenso
de Washington para os países “periféricos”, entre outros, podemos observar o
declínio das teorias que justificavam o “desenvolvimento” por meio da participação
efetiva de Estados nacionais, como o pensamento que era defendido pela CEPAL.
Assim, as ideias neoliberais passam a dominar o debate do “desenvolvimento”:

O neoliberalismo atribui ao estado o problema do desenvolvimento,


apontando ineficiências decorrentes da intervenção do estado com base
em experiências como o modelo de industrialização por substituição
de importação, além de afirmar que a presença do estado fortalece o
surgimento de poderosos grupos de interesse. Na visão neoliberal, os
mercados, ainda que imperfeitos, seriam superiores a estados, que são
entendidos como necessariamente imperfeitos (ÖNIS; SENSES, 2005,
p. 264).
 
Assim, a partir de 1990, a CEPAL assume uma postura neoestruturalista,
com a agenda de transformação produtiva com “equidade”, na qual o Estado
passa a atuar como mero coadjuvante das forças de mercado. De acordo com
Almeida e Corrêa (2011, p. 108-109):
 

170
TÓPICO 3 | PENSAMENTO ECONÔMICO CONTEMPORÂNEO E OS PENSADORES BRASILEIROS LATINO-AMERICANOS

[...] Há inequivocamente um novo conjunto de ideias e proposições


que sustenta a ação estratégica da CEPAL desde os anos 1990 [...].
Concluímos que a CEPAL ainda realiza pesquisas e diagnósticos
relevantes para a região da América Latina, porém que não tem mais
condições de realizar um papel de Escola de Pensamento pois, para
isso, seria imprescindível uma independência de atuação que os
organismos multilaterais não têm, pelo menos desde os anos 1990.

Em síntese, você pode observar que no decorrer dos acontecimentos


históricos econômicos, o conceito de “desenvolvimento” se modificou para se
“adequar” à estratégia de acordo com a realidade do momento, que agora cerca
a economia global.

171
UNIDADE 3 | AS TEORIAS DO PENSAMENTO ECONÔMICO

LEITURA COMPLEMENTAR

Atualidade do pensamento de Celso Furtado na avaliação do desenvolvimento


social da América Latina

Luiza Cristina de Oliveira Lins


Solange Regina Marin

A atualidade do pensamento de Celso Furtado compreende a convicção


de que o estabelecimento de sociedades mais justas está vinculado a atuações
políticas conscientes no sentido de desenvolvimento de uma ética do crescimento
econômico, ou seja, de um crescimento que contemple as melhorias na qualidade
de vida das pessoas.

Na visão do autor, a contemplação dos problemas sociais exigia tanta
atenção quanto os econômicos; as restrições que impediam o desenvolvimento só
seriam superadas a partir da identificação das dificuldades sociais.

Tornava-se relevante a elaboração de um projeto de desenvolvimento que
definisse os planos de ação para o alcance dos resultados almejados a partir do
social. Para tanto, era necessária uma modificação no modelo de desenvolvimento
que se buscava implementar, com a finalidade de superar a condição de
dependência característica do subdesenvolvimento.

Cabe considerarmos o enfoque furtadiano relativo a um projeto de


construção do desenvolvimento a partir da suposição de que o projeto deve
ser viabilizado por meio de uma atuação política eficaz, que promova maior
igualdade e bem-estar social. O processo ocorrido no espaço econômico, social
e cultural das economias em desenvolvimento, como as da América Latina, é
caracterizado por importantes peculiaridades devido às estruturas específicas
dos sistemas econômicos.

O objeto de estudo deste artigo se restringe ao campo do procedimento de
ação recíproca entre política econômica e metas de bem-estar como componentes
da construção do desenvolvimento social. O problema a que buscamos responder
se relaciona à seguinte questão: qual a importância dos encaminhamentos
propostos por Furtado para a construção de um desenvolvimento orientado para
o social e para o contexto econômico atual das economias latino-americanas?

A hipótese de estudo é que, para a promoção do desenvolvimento, são
necessárias modificações estruturais no sistema econômico e político de uma
dada sociedade com a intenção de alcance das pretensões de aumento do bem-
estar das pessoas.

A proposta metodológica é fundamentada em pesquisa bibliográfica,
realizada com base em livros, artigos de periódicos e outros materiais relevantes
para a análise do tema e interpretação das contribuições teóricas de Celso Furtado,
172
TÓPICO 3 | PENSAMENTO ECONÔMICO CONTEMPORÂNEO E OS PENSADORES BRASILEIROS LATINO-AMERICANOS

além de uma breve avaliação do documento “A hora da igualdade: brechas por


fechar, caminhos por abrir”, elaborado pela Comissão Econômica para a América
Latina e o Caribe (CEPAL, 2010). O ensaio está estruturado no sentido de
compreendermos quais as definições que melhor representam o desenvolvimento
na interpretação de Furtado.

O que Furtado apontava como importante para alcançarmos o
desenvolvimento era investigar as carências das pessoas, além de buscar as boas
condições que são produzidas pela evolução científica e tecnológica, ao invés de
persuadir as sociedades das regiões dependentes a realizar esforços exagerados
para atingir objetivos econômicos, mesmo à custa do bem-estar da maior parte do
povo, no intuito de tentar se tornar semelhantes às economias centrais.

Seria necessária uma mudança de perspectiva, uma vez que os países
dependentes vinham seguindo uma direção que não correspondia à realidade e
não levaria ao tipo de desenvolvimento que almejavam, àquele dos países centrais
que causava uma atração irresistível, que se traduzia em grande influência cultural
e conduzia as economias subdesenvolvidas à condição de simples mercados dos
países avançados, perpetuando a situação de subdesenvolvimento.

A mudança deveria ser realizada a partir da contemplação de planos
sociais, e não apenas de fatores econômicos, sendo estes limitados à função de
recurso para a ação, pois as dificuldades não poderiam ser solucionadas apenas
seguindo princípios de razão econômica.

A superação do subdesenvolvimento requeria uma reedificação em nível


organizacional, na qual era necessária uma ação planejada do Estado por meio da
admissão de políticas e precauções adequadas pelos países dependentes capazes
de promover o dinamismo e impulsionar o sistema econômico.

A importância do pensamento de Furtado para a discussão do


desenvolvimento social contemporâneo pode ser determinada diante da
perpetuação de certas limitações que atravessam as economias latino-americanas
por décadas. Tais limitações preservam as desigualdades e a exclusão social na
região.

Apesar de avanços terem sido alcançados, o caminho para chegarmos
ao crescimento econômico que possibilite uma melhor distribuição da renda, a
ampliação da igualdade, e que configure um verdadeiro desenvolvimento social,
parece necessitar da elaboração de um planejamento adequado e de políticas que
funcionem como um instrumento de promoção do desenvolvimento.

O que parece se configurar como indispensável é a adoção de uma


estratégica de desenvolvimento que tenha por finalidade a redução das
heterogeneidades e o alargamento de melhores condições de bem-estar para as
populações das sociedades latino-americanas.

173
UNIDADE 3 | AS TEORIAS DO PENSAMENTO ECONÔMICO

Comprovou-se a hipótese de que para alcançar o desenvolvimento social,


é necessária a reconstrução das estruturas econômicas a partir da mudança de
paradigmas, de modo a promover a evolução do sistema livre da dependência
tecnológica e cultural.

É fundamental a construção de projetos que direcionem o processo de


desenvolvimento, estabelecendo um padrão de crescimento e desenvolvimento
diferente da reprodução de estilos de comportamento de economias avançadas.
A superação das grandes disparidades sociais e a promoção da igualdade são as
bases de tal projeto de desenvolvimento.

Constatou-se que a construção do desenvolvimento social passa por


uma proposta alternativa para solução de questões como a desigualdade social,
condições precárias de vida, falta de acesso à educação e à saúde.

A proposta alternativa configura a necessidade de um projeto de


desenvolvimento que deverá contemplar a implementação de políticas econômicas
que assegurem melhores condições de emprego e melhor distribuição da renda
obtida com os ganhos de produtividade.

Para chegarmos ao conceito de desenvolvimento social, segundo a


compreensão furtadiana, confirma-se a necessidade de uma mudança de
paradigma econômico e social. Comprova-se também a necessidade de definição
do tipo de desenvolvimento que se deseja promover, e sendo esse desenvolvimento
almejado, o desenvolvimento social, tornam-se indispensáveis as reformas
estruturais relacionadas às estratégias de desenvolvimento que tenderão a definir
os rumos para levar a cabo o projeto de desenvolvimento.

As estratégias devem avaliar as melhores alternativas para cada sistema


econômico, observando as potencialidades dos indivíduos, além dos fatores
internos locais para fazer frente ao desafio de superar o subdesenvolvimento e
promover o desenvolvimento econômico e social.

FONTE: LINS, Luiza Cristina de Oliveira; MARIN, Solange Regina. Atualidade do pensamento
de Celso Furtado na avaliação do desenvolvimento social da América Latina. Coleção
documentos de projeto. Nações Unidas, março de 2014.

174
RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• O neoliberalismo é o pensamento econômico atual.

• O modelo defende a liberdade de mercado e uma restrição à intervenção estatal


na economia.

• Há forte financeirização da economia e reestruturação produtiva.

• Houve o aumento da desigualdade social.

• Existiram outras escolas anteriores ao neoliberalismo, como o monetarismo, a


teoria das expectativas racionais e o pós-keynesianismo.

• Os autores latino-americanos lutavam para o desenvolvimento das regiões.


Entenderam que há um subdesenvolvimento na América Latina, que é algo
estrutural e não uma etapa do desenvolvimento.

• A Cepal é a comissão de referência econômica para a América Latina.

175
AUTOATIVIDADE

1 Explique a diferença do neoliberalismo para o liberalismo clássico.

2 Explique a teoria monetarista, a expectativa racional e pós-keynesiana.

3 Explique por que o neoliberalismo é considerado o pensamento econômico


contemporâneo.

4 Explique as ideais dos principais pensadores latino-americanos e a


importância da CEPAL no processo.

176
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