Educação e Sociologia
Educação e Sociologia
Durkheim
“A educação variou muito de acordo com os tempos e os países.” (46). “[…] se a educação romana
tivesse sido marcada por um individualismo parecido com o nosso, a pólis romanda teria podido se
manter; a civilização latina, e consequentemente a moderna, que em parte deriva daquela, não
teriam podido se constituir.” (46). “Porém, na verdade, cada sociedade, considera em determinado
momento de seu desenvolvimento, tem um sistema de educação que se impõe aos indivíduos com
uma força geralmente irresistível.” (47/48). “[…] em qualquer época, existe um tipo regulador de
educação do qual não podemos nos distanciar sem nos chocarmos com vigorosas resistências que
escondem dissidências frutadas.” (48).
“Não existe, por assim dizer, nenhuma sociedade em que o sistema de educação não apresente um
duplo caráter: ele é ao mesmo tempo singular e múltiplo.” (50).
“Ao longo da nossa história, constituiu-se todo um conjunto de ideias sobre a natureza humana, a
importância respectiva de nossas diferentes faculdades, o direito e o dever, a sociedade, o indivíduo,
o progresso, a ciência, a arte, etc., ideias que se encontram na própria base do nosso espírito
nacional; toda educação, tanto a do rico quanto a do pobre, tanto a que a conduz às profissões
liberais quanto a que prepara prepara para as funções industriais, tem como objetivo fixá-las nas
consciências.” (52).
“A sociedade só pode viver se existir uma homogeneidade suficiente entre seus membros; a
educação perpetua e fortalece esta homogeneidade gravando previamente na alma da criança as
semelhanças essenciais exigidas pela vida coletiva.” (53). “[…] para a sociedade, a educação é
apenas o modo pelo qual ela prepara no coração das crianças as condições essenciais de sua própria
existência.” (53).
Existem dois seres – o ser individual e ser social (54). “A nossa natureza congênita não apresenta
nada que nos predispusesse necessariamente a nos tornarmos servidores de divindades, emblemas
simbólicos da sociedade, a lhes prestarmos culto ou a nos privarmos para honrá-los. Foi a própria
sociedade que, à medida que ia se formando e se consolidando, tirou do seu seio estas grandes
forças morais, diante das quais o homem sentiu sua inferioridade.” (54/55)
Obra da educação: construir um ser capaz de levar uma vida moral e social. Ela cria um novo ser
homem (55).
“[…] o indivíduo só busca as qualidades que à primeira vista aparecem tão espontaneamente
desejáveis quando a sociedade o incita nesta direção. E ele as busca da maneira que ela lhe
prescreve.” (58).
A modelagem do indivíduo pela sociedade é uma tirania? “Porém, na realidade, eles próprios têm
nesta submissão, pois o novo ser que ação coletiva edifica em cada um de nós através da educação
representa o que há de melhor em nós, ou seja, o que há de propriamente humano em nós.” (58).
Sociedade – “O objetivo e o efeito da ação que ela exerce sobre ele, principalmente através da
educação, não são nem um pouco reprimi-lo, diminuí-lo, mas sim amplificá-lo e transformá-lo em
um ser verdadeiramente humano.” (61).
Educação: “[…] função coletiva e tem como objetivo adaptar a criança ao meio social no qual ela
está destinada a viver, é impossível que a sociedade se desinteresse de tal operação.” (62).
Para Durkheim as condições de existências são as mesmas? “Portanto, é ela [sociedade] que cabe
constantemente lembrar ao professor que ideias e sentimentos ele deve arraigar na criança para que
a mesma entre em harmonia com o seu meio social. Se ela não estivesse sempre presente e vigilante
para obrigar a ação pedagógica e se exercer em um sentido social, esta última se colocaria
necessariamente a serviço de crenças particulares , e a alma da pátria se dividiria e se dissolveria em
uma pluralidade incoerente de pequenas almas fragmentárias em conflito umas com as outras.”
(62). “[…] é preciso que a educação estabeleça uma comunhão de ideias e sentimentos suficiente
entre os cidadãos, comunhão sem a qual qualquer sociedade é impossível; e, para que possa
produzir este resultado, a educação não pode ficar totalmente à mercê das arbitrárias vontades
individuais.” (63).
Estado - “[…] tudo que é educação deve ser, em certa medida, submetido à sua ação.” (63). “[…]
não cabe ao Estado criar esta comunhão de ideias e sentimentos sem a qual não existe sociedade;
ela deve se constituir por si só, e a única coisa que ele pode fazer é consagrá-la, mantê-la e torná-la
mais consciente para as pessoas.” (64). Temos que pontuar, que ele escreveu esse texto em um
momento conturbado, politicamente, na França. “Não se trata de conceder ao grupo majoritário o
direito de impor suas ideias às crianças pertencentes ao grupo minoritário. A escola não deve ser
coisa de uma partido, e o professor faltará ao seu dever se usar a autoridade da qual dispõe para
embarcar os seus alunos a bordo de suas parciais visões pessoais, por mais bem fundadas que elas
lhe possam parecer.” (64). “O papel do Estado consiste em identificar estes princípios essenciais,
fazer com que eles sejam ensinados nas escolas, garantir que em lugar algum os adultos deixem as
crianças ignorá-los e certificar-se de que por toda parte se fale deles com respeito que lhes é
devido.” (64).
Poder da edução: meios de ação
Para Durkheim a família não transmite uma herança cultural: “Como nota Bain, ‘o filho de um
grande filólogo não herda um único vocábulo; o filho de um grande viajante pode, na escola, ser
deixado para trás em Geografia pelo filho de um mineiro’. O que a criança recebe dos seus pais
faculdades bastantes gerais, como, por exemplo, determinada capacidade de atenção, certa dose de
perseverança, bom discernimento, imaginação, etc.” (67).
“A criança se encontra naturalmente em um estado de passividade comparável com aquele no qual o
hipnotizado se encontra artificialmente mergulhado.” (69).
“É desnecessário demonstrar que a autoridade entendida desta forma não tem nada a ver com a
violência ou a repressão; ela consiste, por inteiro, em uma certa primazia moral.” (72) – Para
Durkheim a ação educativa não é compreendida como uma violência simbólica. Professor – “Assim
como o padre é o intérprete do seu Deus, ele é, por sua vez, intérprete das grandes ideias morais da
sua época e nação.” (72). “A liberdade é filha da autoridade bem aplicada, pois ser livre não
significa fazer o que bem entender, mas sim ter autocontrole e saber agir guiado pela razão e
cumprir o seu dever.” (73). “A criança deve, portanto, estar acostumada a reconhecer a autoridade
na palavra do educador e a respeitar a sua superioridade. Esta é a condição para que mais tarde ela a
reencontre em sua consciência e acate o que ela prescrever.” (73).
Natureza e Método da Pedagogia
Educação - “[…] é a ação exercida nas crianças pelos pais e professores. Esta ação é constante e
geral.” (75). Pedagogia – “Ela consiste não em ação, mas sim em teorias. Estas teorias explicitam as
maneiras de conceber a educação, e não de praticá-la.” (75). “[…] a educação constitui apenas a
modalidade prática da Pedagogia, que, por sua vez, consiste em uma certa maneira de refletir sobre
as questões relativas à educação.” (75/76).
“[…] povos da mesma espécie, ou seja, povos que se parecem em função de aspectos essenciais de
sua constituição, devem praticar sistemas de educação comparáveis entre si. As semelhanças que a
sua organização geral apresenta devem necessariamente acarretar outras, igualmente importantes,
em sua organização social.” (79/80).
Pedagogia: “Ela não estuda cientificamente os sistemas de educação, mas reflete sobre eles no
intuito de fornecer à atividade do educador ideais que o dirigem.” (86). “[…] a pedagogia não é útil
somente em períodos críticos nos quais é preciso, com urgência, restabelecer a harmonia entre um
sistema escolar e as necessidades da época: hoje em dia, pelo menos, ela se tornou uma auxiliar
constante e indispensável da educação.” (89).
“De fato, tendo em vista que a personalidade individual se tornou um elemento essencial da cultura
intelectual e moral da humanidade, o educador deve levar em conta o germe de individualidade que
existe em toda criança. Ele deve, por todos os meios possíveis, buscar favorecer o desenvolvimento
dele. Em vez de aplicar a todos, invariavelmente, o mesmo regulamento impessoal e uniforme, ele
deveria, ao contrário, variar e diversificar os métodos de acordo com os temperamentos e a
disposição de cada inteligência.” (89). “Uma educação empírica e mecânica não pode ser opressiva
e niveladora.” (89).
“Novas necessidades e ideias surgem sem parar; para poder acompanhar as mudanças incessantes
que atingem as opiniões e costumes, a própria educação deve mudar e, consequentemente,
apresentar uma constante maleabilidade, permitindo assim a mudança.” (90).
“É por isto que, como dissemos no começo, embora seja verdade que a Pedagogia só surge na
história de modo intermitente, ela tende cada vez mais a se tornar a uma função contínua da vida
social. A Idade Média não tinha necessidade dela, era uma época de conformismo, na qual todos
pensavam e sentiam da mesma forma, todas as mentes eram como que tiradas do mesmo molde, as
dissidências individuais eram raras e inclusive proibidas. Por isto, a Educação era impessoal […].
Ao mesmo tempo a imutabilidade das crenças fundamentais impedia o sistema educativo de evoluir
rapidamente.” (91).
“[…] pois este sistema de educação é produto histórico que somente a história pode explicar.” (91).
“As escolas francesas traduzem e exprimem o espírito francês.” (91). “[…] o ideal de uma época
expressa antes de tudo o estado da sociedade na época estudada considerada.” (95).
“De fato, uma turma é uma pequena sociedade. Por isto, não se deve conduzi-la como se ela fosse
apenas uma simples aglomeração de sujeitos independentes uns dos outros. Crianças reunidas em
uma turma pensam, sentem e agem de modo diferente de quando estão isoladas. Em uma turma,
produzem-se fenômenos de contágio, desmotivação coletiva, agitação mútua e efervescência
saudável que é preciso saber discernir no intuito de prevenir ou combater uns e utilizar outros.”
(96).
“[…] não há uma educação universalmente válida para o gênero humano inteiro – em todas as
sociedades, por assim dizer, sistemas pedagógicos diferentes coexistem e funcionam em paralelo.”
(101). “Ainda hoje, não vemos a educação variar com as classes sociais ou mesmo com os habitats?
A cidade não é igual à do campo, a do burguês não é igual à do operário.” (101).
“Mesmo que a carreira de cada criança não fosse, em grande parte, predeterminada por uma cega
hereditariedade, a diversidade moral das profissões não deixaria de exigir uma grande diversidade
pedagógica.” (101). “[…] a criança deve estar preparada com vistas à função que será levada a
cumprir, a educação, a partir de determinada idade, não pode mais continuar a mesma para todos os
sujeitos aos quais ela se aplicar.” (101/102). “[…] em todos os países civilizados, ela tende cada vez
mais a se diversificar e se especializar, a esta especialização, a se tornar cada vez mais precoce.”
(102). “Para encontrar uma educação absolutamente homogênea e igualitária, é preciso voltar no
tempo até as sociedades pré-históricas, no seio das quais não existia nenhuma diferença […].”
(102).
“[…] no nossa temperamento intelectual ou moral não nos predestina a uma função bem
determinada. O homem médio é eminentemente plástico, podendo ser utilizado da mesma forma em
empregos bastante variados. Portanto, se ele se especializa, e se faz de tal modo em vez de outro,
não é por razões interiores e nem pelas necessidades da natureza. É a sociedade que, para se manter,
exige que o trabalho se divida entre os seus membros e de tal maneira em vez de outra.” (102).
“[…] foi para e por ela [sociedade] que a educação se diversificou assim.” (102).
Educações específicas: “Todas elas repousam sobre uma base comum.” (104). “Não há nenhum
povo em que não exista certo número de ideias, sentimentos e práticas que a educação deve inculcar
em todas as crianças sem distinção, seja qual for a categoria social à qual elas pertencem. É
inclusive esta educação comum que é considerada em geral como a verdadeira educação.” (104).
“[…] sobretudo esta educação que é importante investigar para saber, como se supõe, se ela está
contida por inteiro na noção de homem e pode se deduzida da mesma.” (104).
Sistemas de educação: “Eles estão tão obviamente ligados a sistemas sociais determinados que
acabam sendo inseparáveis deles.” (104). “Isto não significa que, por causa de aberrações, os
homens se tenham enganado a respeito de sua natureza humana e de suas necessidades, mas sim
que estas necessidades variam, e variam porque as condições sociais das quais elas dependem não
permaneceram inalteradas.” (105).
“[…] em sociedades tão diferenciadas, o único tipo coletivo que pode haver é o tipo genérico de
homem. Se ele perdesse um pouco da sua generalidade ou deixasse o antigo particularismo
reaparecer, os grandes Estados europeus se dividiram em uma pluralidade de pequenos grupos
fragmentários e de decomporiam. Logo, o nosso ideal pedagógico reflete a nossa estrutura social
[…].” (106).
“[…] a sociedade não somente eleva o tipo humano à dignidade de modelo para o educador
reproduzir, como também o constrói, e o constrói de acordo com as suas necessidades.” “O homem
que a educação deve realizar em nós não é o homem tal como a natureza criou, mas sim tal como a
sociedade quer que ele seja da forma exigida pela sua economia interior. A prova disto é a maneria
como a concepção do homem variou conforme as sociedades.” (107).
“[…] tanto no presente quanto no passado, o nosso ideal pedagógico é, nos mínimos detalhes, fruto
da sociedade. É ela que traça o retrato do homem que devemos ser, retrato no qual se refletem todas
as particularidades da sua organização.” (108).
“A sociedade só pode viver se existir uma homogeneidade suficiente entre os seus membros. A
educação perpetua e reforça esta homogeneidade ao fixar de antemão na alma da criança as
semelhanças essenciais que a vida coletiva supõe.” (108/109). “[…] qualquer cooperação seria
impossível sem um certa diversidade. A educação garante a continuidade dessa necessária
diversidade diversificando-se especializando-se a sim mesma.” (109).
Ser social – constituir esse ser em cada um de nós é o objetivo da educação. (109).