Crónica de D.João I

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Crónica de D.

João I

A Crónica de D. João I é considerada a crónica medieval portuguesa mais importante


não só pelos acontecimentos que relata como também pela qualidade literária da sua
prosa. Foi publicada pela primeira vez em 1644, em Lisboa e divide-se em duas partes:
 A PRIMEIRA OCUPA-SE DO ESPAÇO DE TEMPO DSEDE A MORTE DE
D. FERANADO ATÉ À ELEIÇÃO DE D. JOÃO I.
 A SEGUNDA RELATA O REINADO DESTE MONARCA ATÉ À PAZ COM
CASTELA EM 1411.

Escrita durante o reinado de D. Duarte, a Crónica de D. João I é, uma legitimação da


nova dinastia, a dinastia de Avis, iniciada após o período conturbado de interregno na
monarquia portuguesa que vai de 1383 a 1385. A crise dinástica e a revolução popular e
burguesa que então se deram foram o resultado de uma série de acontecimentos, muitos
dos quais ocorridos durante o reinado de D. Fernando (1367-83), reinado este marcado
pelas sucessivas guerras com Castela, que empobreceram o reino e que culminaram com
a assinatura do Tratado de Salvaterra de Magos, que determinou o casamento de D.
Beatriz, sua filha, com o rei João l de Castela, pondo em causa a independência de
Portugal. Para além disso, acresce a grave crise económica, que o monarca tentou
resolver recorrendo a desvalorização da moeda, à legislação para aumentar a produção
agrícola e ao fomento e proteção do comércio naval.
Este período ficou marcado por um clima de instabilidade e de incerteza, que se
acentuou aquando da morte de D. Fernando, que não deixou filho varão, pelo que a
sucessão deveria caber a sua filha D. Beatriz, casada com o rei de Castela.
A nobreza e o clero eram partidários de D. Beatriz, enquanto o povo pretendia que o
sucessor do trono fosse um dos filhos bastardos de D. Pedro (pai de D. Fernando e de D.
João I), meios irmãos, portanto, do falecido rei Fernando. Graças a uma conspiração
bem urdida pelo influente burguês Álvaro Pais, o povo viria a apoiar entusiasticamente
o Mestre de Avis.
Apos a invasão castelhana, seguiram-se um prolongado e doloroso cerco de Lisboa e
diversas batalhas, de que, sob o comando de Nuno Álvares Pereira, os portugueses
saíram vitoriosos. Posteriormente, o Mestre de Avis seria proclamado rei, graças
igualmente à habilidade jurídica do Dr. João das Regras que, nas Cortes de Coimbra,
soube encontrar argumentos para defender a aclamação do Mestre, que receberia o
nome de D. João l e seria o fundador da 2.ª dinastia.

Consciência coletiva do povo


A crónica de D. João I representa a legitimação da dinastia de Avis. Essa legitimação
adveio da força do povo, habilmente "conduzido", é certo, por Álvaro Pais. Na verdade,
o povo, a chamada “arraia-miúda", foi a força motriz da revolução, representando todos
aqueles que queriam preservar a independência de Portugal, todos aqueles que
manifestavam um amor à terra que os vira nascer, a terra que cultivavam e da qual
dependiam para viver.
Por essa razão, é possível dizer que a Crónica de D. João / constitui uma afirmação da
consciência coletiva, no sentido em que o verdadeiro herói que povoa as suas páginas
não é um herói individual, não é um cavaleiro, um nobre, como ate então acontecera na
prosa medieval, mas antes um herói coletivo - o povo.
Fernão Lopes mostra-nos com imenso realismo, vivacidade, pormenor descritivo e
emotividade o povo que se revolta, que irrompe pelas ruas de Lisboa à procura do
Mestre, que detende a cidade contra os castelhanos, que passa fome e privações por
causa do cerco. A voz do povo, o sentir dos homens e das mulheres, dos mesteirais, dos
homens-bons, é muitas vezes transmitida através de uma voz anónima da multidão.
Outras vezes, é a própria cidade que parece revelar essa consciência do todo, assumindo
quase o estatuto de uma personagem coletiva.
A afirmação da consciência coletiva é, sem dúvida alguma, uma inovação e,
simultaneamente, uma prova da originalidade e da modernidade de Fernão Lopes. De
facto, ele é um cronista, um historiador mais preocupado com os movimentos de fundo,
com uma visão de conjunto (em que entram elementos económicos, políticos e sociais),
com as massas, do que propriamente com as figuras isoladas da elite.

Mestre de Avis (D. JOÃO I) – Era filho de D.Pedro e de uma aia de D.Inês de Castro.
Um homem que se mostra receoso, no seguimento do assassinato do conde Andeiro
(amante de D.Leonor Teles). Era acarinhado e apoiado pelo povo de Lisboa, um líder
resoluto, mas também solidário com a população, aquando do cerco à cidade. Foi
aclamado rei em 1385, nas cortes de Coimbra.
Álvaro Pais – o burguês que espalha pelas ruas de Lisboa que estão a matar o Mestre,
influenciando o povo a correr em seu auxílio.
D. Leonor Teles – a mulher que gera ódios na população e que é apelidada de
“aleivosa” (traidora).
Nuno Álvares Pereira – vai chefiar o exército quando o Mestre de Avis é aclamado rei.

Resumo do capítulo 11
 O pajem do Mestre de Avis brada pelas ruas, a caminho da casa de Álvaro Pais,
que matam o Mestre nos paços da rainha, o que leva as gentes, em agitação, à
saírem para a rua e a pegarem em armas.
 Álvaro Pais, que já estava preparado, dirige-se com o pajem e outros aliados
para os paços, apelando à população para que se junte e corra em auxílio do
Mestre.
 Chegada às portas do paço, que estavam fechadas, a multidão mostra-se ansiosa
e agitada, querendo entrar para confirmar que o Mestre está vivo.
 Aconselhado pelos que estavam consigo e atendendo ao alvoroço das pessoas, o
Mestre aparece à janela para apaziguar os ânimos. Perante esta visão, a
população manifesta um "gram prazer".
 Sentindo-se seguro, o Mestre deixa os paços e cavalga pelas ruas em direção aos
paços do Almirante, onde se encontrava o conde D. João Afonso, irmão da
rainha.
 Pelo caminho, o Mestre contacta com a população, que se mostra aliviada,
alegre e disponível.
 Próximo dos paços do Almirante, o Mestre é acolhido pelo conde, pelos
funcionários da cidade e por outros fidalgos.
 Já à mesa, vêm dizer ao Mestre que as gentes da cidade querem matar o bispo
(Conde Andeiro) O Mestre traz tenções de o ir socorrer, mas é aconselhado a
permanecer ali (o bispo é morto pela população).

 O episódio narrado neste capítulo enquadra-se na sequência de eventos que


levaram ao cerco da cidade de Lisboa, considerado um dos focos estruturadores
da Crónica de D. João l (o outro é a batalha de Aljubarrota).
 Neste capítulo, Fernão Lopes relata como se deu a aclamação do Mestre, após o
assassinato do conde Andeiro, as ações da população quando soube que o
Mestre corria perigo e os seus sentimentos relativamente ao futuro monarca.
 A população é, aliás, a protagonista deste episódio. Assemelhando-se a um
repórter que assistiu ao desenrolar dos acontecimentos, Fernão Lopes transmite-
nos as movimentações (d' "as gemtes) através de sensações auditivas
("dizemdo altas vozes, braadamdo pella rua", “e começamdo de fallar huùs com
os outros”, "Soarom as vozes do arroido pella idade ouvido todos braadar que
matavom o Meetre”. "Alli eram ouvidos braados de desvairadas maneiras'), mas
também visuais ("se moverom todos com maão armada, corremdo a pressa", "A
gemte começou de sse jumtar a elle, e era tanta que era estranha cousa de ver.
Nò cabiam pelas ruas primcipaaes, e atrevessavom logares escusos').
 Verifica-se uma concentração espacial (rua-paço-janela) que coincide com uma
gradação e um ritmo crescentes das ações (ao apelo do pajem e de Álvaro Pais,
segue-se o alvoroço da população, que se desloca para o paço e que aí mostra o
seu estado de espírito - confusão, nervosismo), que culminam no clímax: o
aparecimento do Mestre à janela.
 Após a visão do Mestre, o ritmo narrativo diminui e o estado de espírito da
população passa a ser de alegria, de satisfação e de alívio ("ouveram gram prazer
quamdo o virom').
 Os sentimentos desta "gemte" são ainda realçados através das falas transcritas,
que conferem uma tonalidade realista e expressiva a todo o episódio. Estas falas
servem também para denegrir a imagem de Leonor Teles e para fazer a apologia
do futuro monarca (veja-se como sai ilibado de ter matado o conde - "Oo que
mall fez! pois que matou o treedor do Comde, que nom matou logo <e› a
alleivosa com elle!").
 Entre a multidão (ator coletivo) destacam-se, porém, alguns atores individuais,
nomeadamente: pajem do Mestre - já preparado ("segumdo já era percebido),
desencadeia toda a movimentação posterior; Álvaro Pais - avisado pelo pajem, e
também ele pronto ("que estava prestes e armado cò huùa coiffa'"), pegou no seu
cavalo e, com os seus aliados, foi até ao paço, espalhando igualmente o alvoroço
e influenciando o povo a correr em auxílio do Mestre; Mestre de Avis - atua
segundo o conselho dos que o rodeiam; de início, parece ter receio da multidão;
depois, mostra-se à janela e, sentindo-se seguro, abandona o palácio e percorre
as ruas da cidade a cavalo até aos paços do Almirante.
 Quanto ao narrador, detetamos a sua subjetividade ("era estranha cousa de
veer", "era maravilha deveer"), a sua simpatia pelo povo e a sua defesa do
Mestre (legitimação da nova dinastia).

Linguagem e estilo
• Visualismo e dinamismo - a movimentação e o sentir das massas são-nos
apresentados de uma forma muito forte e real, não só através de recursos expressivos,
como a comparação ("e assi com viuva que rei nom tinha'), como também através do
apelo às sensações ou do uso de verbos de movimento ("A gemte começou de se jumtar
a elle, e era tanta que era estranha cousa de veer. Nò cabiam pellas ruas primçipaaes, e
atrevessavom logares escusos", "Huûas vinham com feixes de lenha, outras tragiam
carqueyja').

Resumo do capítulo 115


 Ao saberem da vinda do rei de Castela, o Mestre e os habitantes de Lisboa
começam a recolher mantimentos e muitos vão as lezírias buscar gado morto.
 As populações movimentam-se: muitos lavradores deslocam-se com as
mulheres, os filhos e com tudo o que têm para dentro da cidade; outros vão para
Setúbal e Palmela; outros ficam em Lisboa e há ainda os que permanecem nas
vilas que apoiam Castela.
 Começa-se a preparar a defesa da cidade: primeiro, pensa-se na defesa ao nível
dos muros (muralhas) e das torres, tarefa que o Mestre delega nos fidalgos e
cidadãos honrados, que contam com a ajuda de besteiros e homens de armas.
Mostra-se preocupado com a guarda da cidade e ele próprio passa em revista os
muros e as torres, durante a noite. As gentes que aí se encontram estão alerta e
são diligentes.
 Depois, analisa-se a defesa ao nível das portas da cidade: quantas eram, quem as
vigiava e os cuidados que eram tidos.
 Passa-se para a ribeira, zona onde foram construídas estacas para impedir e/ou
dificultar a passagem dos castelhanos.
 Ainda relativamente à defesa, refere-se à construção de um muro à volta das
muralhas da cidade e a ajuda das mulheres, que, sem medo, apanham pedras
pelas herdades e entoam cantigas a louvar Lisboa.
 A propósito da construção desse muro, o narrador estabelece uma comparação
entre os portugueses, que tão bem defendem a sua cidade (constroem o muro ao
mesmo tempo que defendem a cidade), e os filhos de Israel, que fizeram o
mesmo. Salienta-se, assim, a coragem e a determinação da população.
 Para além disso, é dito que todos estavam em sintonia e a pensar no bem
comum, o que leva o cronista a concluir o capítulo num tom elogioso. Com
efeito, no final, Fernão Lopes menciona a superioridade do rei de Castela (tam
alto e poderoso senhor como he elRei de Castella, com tamta multidom de
gemtes), mas apenas com o objetivo de realçar a postura da cidade de Lisboa,
que, perante um adversário tão feroz, está "guarnecida comtra elle de gemtes e
darmas".

O leitor/ouvinte presencia:
 Na descrição da cidade de Lisboa, quando o rei de Castela a cercou (de
que guisa estava a fidade, jazemdo elRei de Castella sobrella"):
 A preparação da defesa da cidade pelo Mestre de Avis, juntamente
com a população ("per que modo poinha em ssi guarda o Mestre, e as
gertes que dêtro eram, por nom rreceber dano de seus emmiigos");
 O esforço, a valentia, a determinação que a gente de Lisboa
mostrava ("e fouteza que comtra eles mostravom").

 Continuando a interpelar o leitor/ouvinte ("Omde sabe que'), o cronista passa a


relatar o que foi feito relativamente aos mantimentos (2. ° parágrafo), focando
depois (a partir do 3. ° parágrafo) a sua atenção numa outra preocupação: a
defesa da cidade.
 Relativamente à defesa de Lisboa, a informação apresentada é bastante
detalhada: primeiro referem-se os muros, depois as torres, chegando-se por fim
às portas da cidade e ao rio. Os pormenores descritivos abundam (há, por
exemplo, referências ao número de torres, ao número de portas da cidade, ao
número de estacas), bem como os termos técnicos associados ao campo
semântico da guerra (ver 3. ° e 4. ° parágrafos).
 Porém, à medida que o cronista vai descrevendo o que foi feito para proteger a
cidade, vai também mostrando os grupos sociais - os atores coletivos - que
participaram nestes preparativos. Desta forma, vemos como os lavradores se
recolheram à cidade, como a defesa das muralhas foi entregue aos "fidalgos e
cidadaãos homrrados", aos "homêes darmas", aos "mesteiraaes". Até as
mulheres tiveram um papel a desempenhar, apanhando pedras e cantando ("e as
moças sem nehuù medo, apanhamdo pedra pellas herdades, camtavom altas
vozes").
 A cantiga transcrita ilustra bem o espírito de solidariedade, de entreajuda, de
patriotismo e de orgulho que reinava entre as gentes da cidade. Aliás, a atitude
dessas gentes é várias vezes elogiada pelo narrador ("todos rijamente corriam
pera ella", "logo os muros eram cheos, e muita gemte fora", "Nom avia hi
nehuùs revees dos que aviam de vellar, nem tall a que esqueçesse cousa do que
lhe fosse emcomemdado; mas todos muito prestes a fazer o que lhe mamdavom,
de guisa que a todo boom regimento que o Mestre ordenava'). É, assim, evidente
a afirmação da consciência coletiva, uma consciência pela defesa da cidade
contra o inimigo.
 Mas não são só as gentes da cidade que têm um comportamento digno de louvor.
Também o Mestre de Avis - ator individual - merece uma caracterização
favorável, destacando-se a sua diligência e determinação, bem como todo o
apoio que deu à população ("E ordenou o Meestre com as gemtes da idade, que
fosse trepartida a guarda dos muros", "ho Mestre que sobre todos tinha espeçiall
cuidado da guarda e governarça da cidade, dado seu corpo a mui breve sono",
"boom regimemto que o Meestre hordenava”)

Linguagem e estilo
 Registo coloquial - evidente nos apelos ao leitor/ouvinte e no uso da 2.a pessoa
do plural; a transcrição da cantiga, ao reproduzir uma linguagem popular e
carregada de insinuações, contribui também para o tom coloquial.
 Descrição viva e dinâmica - os preparativos de defesa são apresentados com
minúcia, recorrendo a pormenores (quantificação), a vocabulário técnico e a
recursos expressivos, como a enumeração ("forom feitos fortes caramanchoões
de madeira, os quaaes eram bem forneçidos descudos e lamças e dardos e bestas
de torno) e a adjetivação ("gramde e poderoso çerco", "fortes caramanchões",
"O que fremosa cousa", "tam alto e poderoso senhor" "tam fremoso cerco').

Resumo do capítulo 148


 Estando a cidade cercada, os mantimentos começam a faltar, por causa da
quantidade de pessoas que estavam dentro das muralhas de Lisboa, o que leva a
que alguns procurem alimentos fora da cidade e vão de barco, à noite, buscar
trigo, correndo perigo.
 As esmolas também escasseiam e já não há como socorrer os pobres. Então,
estabelece-se quem deve ser posto fora da cidade: as pessoas miseráveis, os que
não combatem, as prostitutas, os judeus. Inicialmente, os castelhanos acolhem
estas gentes, mas, quando percebem que tal ato se devia à fome, também eles as
expulsam do seu acampamento.
 Na cidade, há carência de todo o tipo de alimentos, como trigo, milho e vinho.
O preço destes produtos é elevado e, por isso, os hábitos alimentares mudam e
até há quem procure apenas grãos de trigo na terra ou quem beba tanta água que
acabe por morrer. A carne e os ovos são outros dos alimentos em falta e muito
caros.
 As crianças não têm que comer e andam pela cidade a pedir; as mães não têm
leite para os seus filhos e veem-nos morrer. Toda a cidade está envolta num
ambiente de tristeza, de pesar e de morte. As pessoas dirigem preces a Deus. O
desespero é tal que há até rumores de que o Mestre vai expulsar da cidade todos
os que não têm que comer. Porém, esse rumor é desmentido.
 O capítulo termina com um forte apelo ao leitor/ouvinte, representante da
"geraçom que depois veo", designado de bem-aventurado, pois não teve que
enfrentar os sofrimentos descritos.

 Mais uma vez, o capítulo inicia-se com uma interpelação ao leitor/ouvinte


("Estamdo a cidade assi cercada na maneira que ja ouvistes"), através da qual se
estabelece uma ponte com o capítulo anterior e se transmite uma ideia de
continuidade e de ligação a um dos centros nevrálgicos da narrativa: o cerco de
Lisboa.
 Mais uma vez também, o protagonismo é dado às gentes de Lisboa (ator
coletivo), que vivem momentos atrozes por causa da fome que assola a
cidade, devido ao grande número de pessoas que nela se acolheram.
 Num estilo vivo e emotivo, o cronista narra e descreve, pormenorizadamente, o
sofrimento da população: a procura arriscada de trigo, à noite e em barcos; a
falta de meios (esmolas) para socorrer os pobres; a expulsão de todos aqueles
que não podiam combater, bem como dos judeus e das prostitutas; a recusa dos
castelhanos em receber no seu acampamento os que foram expulsos; a procura
desesperada de algo que comer e beber. O sofrimento é evidenciado através de
pormenores, como, por exemplo, o preço exorbitante de alguns alimentos.
 Perante este cenário, o narrador mostra-se solidário e pretende mesmo
comover/sensibilizar os leitores. Por isso, dirige-lhes, repetidamente,
perguntas retóricas carregadas de intensidade (destaque para a última - "Hora
esguardaae como se fossees presente, húa tall gidade assi descomfortada e sem
nehuña certa feuza de seu livramento, como veviriam em desvairados cuidados,
quem sofria omdas de taaes affliçoões?").
 O Mestre de Avis (ator individual) aparece-nos neste capítulo como o chefe
que tem de tomar decisões ("Mestre mamdou saber em çerto pella çidade que
pam avia per todo em ella), algumas difíceis: até, a bem da comunidade, como a
expulsão dos inaptos. Por outro lado, mostra-se solidário com as suas gentes
("Sabia porem isto o Mestre e os de seu Comsselho, e eramlhe doorosas douvir
taaes novas").

Linguagem e estilo
• Rigor do pormenor - patente, por exemplo, na descrição detalhada dos que saíam à
noite de barco e iam buscar trigo; na informação precisa sobre o preço de alguns
alimentos, como o trigo, o milho, o vinho, a carne - recurso à enumeração.
• Conjugação de planos - por um lado, é-nos dado um plano geral da cidade; por outro,
são-nos apresentados planos de pormenor (por exemplo, quando a atenção se toca nos
pobres, nos que foram expulsos da cidade, nos homens e nas moças cheios de fome que
esgaravatavam a terra).
• Coloquialismo - muito evidente nas interrogações retóricas e no uso do imperativo, no
último parágrafo, combinado com a comparação ("Hora esguardaae, como se fossees
presente “)

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