Antropologia Filosófica e Sociológica
Antropologia Filosófica e Sociológica
Antropologia Filosófica e Sociológica
Filosófica e Sociológica
Indaial – 2020
2a Edição
Elaboração:
Prof. Kelvin Custódio Maciel
Prof.a Luciane da Luz
Prof. Pedro Fernandes Leite da Luz
M152a
ISBN 978-65-5663-215-5
ISBN Digital 978-65-5663-216-2
CDD 128
Impresso por:
APRESENTAÇÃO
Prezado acadêmico! Bem-vindo ao estudo de Antropologia Filosófica e
Sociológica, que vai lhe auxiliar em uma melhor compreensão do que consiste a Ciência
Antropológica, como se situa no campo das Ciências Sociais, quais são seus objetos de
estudo e quais os métodos de que se vale para o entendimento dos fenômenos relativos
aos seres humanos.
GIO
Olá, eu sou a Gio!
ENADE
Acadêmico, você sabe o que é o ENADE? O Enade é um
dos meios avaliativos dos cursos superiores no sistema federal de
educação superior. Todos os estudantes estão habilitados a participar
do ENADE (ingressantes e concluintes das áreas e cursos a serem
avaliados). Diante disso, preparamos um conteúdo simples e objetivo
para complementar a sua compreensão acerca do ENADE. Confira,
acessando o QR Code a seguir. Boa leitura!
LEMBRETE
Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma
disciplina e com ela um novo conhecimento.
REFERÊNCIAS..................................................................................................................... 191
UNIDADE 1 -
O QUE É ANTROPOLOGIA,
OBJETO E MÉTODO
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No decorrer dela, você encontrará
autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.
CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.
1
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 1!
Acesse o
QR Code abaixo:
2
UNIDADE 1 TÓPICO 1 -
O QUE É ANTROPOLOGIA
1 INTRODUÇÃO
Prezado acadêmico, bem-vindo ao estudo da disciplina Antropologia Geral
e da Religião. Nesta primeira unidade nós veremos o que é Antropologia, seu objeto
e método.
Como toda ciência, a Antropologia apresenta um objeto que lhe é próprio e uma
abordagem metodológica característica. Também se constrói por etapas e apresenta
diversos campos de investigação, como veremos nesta unidade.
3
No Tópico 3 trataremos de alguns dos conceitos mais importantes da Antropologia,
conceitos estes que são fundamentais para a compreensão da especificidade do olhar
antropológico e de seu objeto, para que você aprofunde seu entendimento do que trata
a Antropologia.
NOTA
Aqui utilizaremos ser humano em vez de “homem” para nos referirmos
ao “anthropos” (o objeto da Antropologia) por entendermos, dentro da
visão antropológica do fenômeno humano, que nossa espécie apresenta
uma enorme diversidade de gêneros (às vezes dentro de uma mesma
sociedade) o que torna o termo “homem” inapropriado para definir o
conjunto dos seres humanos.
FONTE: <http://msalx.viajeaqui.abril.com.br/2013/08/29/1431/5tY2z/ilustra-final-jubran.
jpeg?1377804486>. Acesso em: 31 mar. 2015.
4
Vejamos: o mesmo compõem-se de dois substantivos daquela língua clássica,
a saber, anthropos, o ser humano, e logos, estudo (ou ainda razão e lógica).
De acordo com Gomes (2013, p. 11), outra tradução possível para Antropologia
seria “Lógica do Ser Humano”, o que colocaria alguns dos focos e análises desta matéria
em sintonia com determinadas áreas da Filosofia, como a Lógica, a Metafísica e a
Hermenêutica, na busca do sentido da experiência humana em sua especificidade.
FONTE: <http://www.ahistoria.com.br/wp-content/uploads/historia-da-evolucao-humana.jpg>.
Acesso em: 8 abr. 2015.
Gomes (2013) chama a atenção para o fato de que, embora a origem do nome
seja grega, não foram os gregos que inventaram a Antropologia, ainda que eles não se
furtassem a especular sobre a condição humana. Isto devido ao etnocentrismo deste
povo, que se julgava superior às demais nações de seu tempo.
NOTA
Etnocentrismo: conceito fundamental da Antropologia, no qual nos
aprofundaremos mais adiante, mas que aqui adiantamos tratar-se da tendência
natural de toda cultura humana de considerar-se superior as demais.
5
Ora, para o fazer antropológico é preciso a superação do entrave colocado pelo
etnocentrismo e se admitir a unidade da espécie humana. É necessário reconhecer que,
apesar de nossas imensas diferenças culturais, somos uma só humanidade.
FONTE: <http://files.seculodasluzes.webnode.com.br/200000006-67d3168ccf/50000000.jpg>.
Acesso em: 8 abr. 2015.
6
Dentro da perspectiva destes autores a Antropologia seria a arte da crítica
cultural, onde a cultura reveste-se de um caráter polissêmico, sendo que a interpretação
do antropólogo é apenas uma das possíveis, junto com aquelas de seus interlocutores,
membros das culturas estudadas.
7
Vemos assim que a abordagem antropológica do ser humano pretende ser
total, contemplando sua dimensão física, sociocultural e ainda filosófica. Em suas
investigações procura a Antropologia captar e transmitir o modo de vida dos povos que
estuda em todos os aspectos possíveis.
FONTE: <http://www.conevyt.org.mx/cursos/cursos/cnaturales_v2/interface/main/recursos/
antologia/imagenes/cnant_1_1_1.jpg>. Acesso em: 9 abr. 2015.
Prezado acadêmico, certamente, pelo que dissemos até agora, você já deve
intuir que a Antropologia é um discurso humano (literário, científico e filosófico,
simultaneamente) acerca de tudo o que diz respeito à experiência humana, e sua
singularidade. Contribui assim a Antropologia para a compreensão teórica do que é ser
humano, em todos os sentidos e dimensões que dizem respeito à humanidade, em si e
para si, a partir de si mesma, de seu logos, sua razão autorreflexiva.
8
E a Antropologia faz isso à sua própria maneira, com seus métodos e teorias
produzidas e utilizadas neste campo da ciência, que lhe dão uma exclusividade
legitimadora diante do conhecimento humano. Procuraremos esclarecer neste caderno,
ao máximo a você aluno(a) da UNIASSELVI, com o intuito de ajudá-lo(a) a refletir
criticamente a respeito da experiência humana, notadamente a experiência religiosa.
FONTE: <http://www.xamanismo.com.br/twiki/pub/Universo/SubUniverso1191191114It010/te.jpg>.
Acesso em: 10 abr. 2015.
3 A ANTROPOLOGIA NA PRÁTICA
Mas seria só isso? A Antropologia limitar-se-ia a ser mais uma teoria (com
sua especificidade, bem verdade) em meio a outras que procuram dar conta do que
somos nós?
9
Os antropólogos estão conscientes e zelam para que a aplicabilidade do
conhecimento que produzem seja pautada por determinados princípios que são
imprescindíveis e indissociáveis de um exercício ético da profissão. É importante que
você, nosso(a) aluno(a), conheça que princípios são estes.
10
Efetivamente a Antropologia tem contribuído para a solução de problemas e
desafios colocados pelo colonialismo, advogando pelos direitos dos povos nativos e
zelando pela preservação cultural destas populações.
11
RESUMO DO TÓPICO 1
• Neste Tópico nós vimos o escopo da Antropologia, no que consiste e do que se
ocupa, caracterizando-a enquanto um discurso racional e sistemático acerca de
nós mesmos, na nossa especificidade enquanto seres vivos.
12
AUTOATIVIDADE
Responda às seguintes perguntas:
1 O que é Antropologia?
2 O que foi preciso superar, e quando isto se deu, para que a Antropologia tivesse gênese?
13
14
UNIDADE 1 TÓPICO 2 -
ETNOGRAFIA, ETNOLOGIA,
ANTROPOLOGIA CULTURAL E
ANTROPOLOGIA SOCIAL
1 INTRODUÇÃO
Prezado acadêmico, neste segundo tópico de nosso Caderno de Estudos
veremos as diferentes etapas do fazer antropológico, a saber, a etnografia e a etnologia, e
os dois principais campos da Antropologia, ou seja, aqueles que investigam os domínios
cultural e social de nossa espécie.
Dizemos isso por que outros autores (ver GOMES, 2013, p. 63) consideram a etnografia
e a etnologia como ramos da ciência da cultura, enquanto que alguns antropólogos têm a
etnografia e a etnologia como métodos procedimentais da disciplina Antropologia.
2 ETNOGRAFIA
Afinal, o que seria Etnografia? Vejamos a origem etimológica da palavra para tentar
entendê-la. Etnografia vem do grego έθνος, ethno - nação, povo e γράφειν, graphein –
escrever. Literalmente “etnografia” tem o sentido de “escrever sobre os povos” (HOEBEL;
FROST, 2006, p. 8).
FONTE: <http://www.fm94.rj.gov.br/application/assets/img/img_historico_02.jpg>.
Acesso em: 10 abr. 2015.
15
Assim, etnografia seria a maneira pela qual a Antropologia coletaria os dados de
que lança mão em suas especulações, sendo resultado do contato entre a subjetividade
do antropólogo e aquela dos membros das culturas que estuda. Podemos, desta
maneira, afirmar que a etnografia consiste em um “estudo descritivo das sociedades
humanas” (HOEBEL; FROST, 2006, p. 8-9).
Aqui cabe destacar que as primeiras etnografias não foram feitas por
antropólogos, de fato, muito antes da constituição da Antropologia enquanto Ciência
já tínhamos descrições de outros povos feitas por pensadores de diferentes culturas.
FONTE: <http://conceito.de/wp-content/uploads/2011/11/etnografia-238x171.jpg>.
Acesso em: 10 abr. 2015.
16
Embora tenha um caráter prático, a etnografia não é livre da influência das
teorias produzidas em Antropologia, uma vez que toda etnografia é informada por
certo referencial teórico que lhe dá uma estrutura e enfoque próprio, muito embora
as descrições etnográficas não se ocupem de problemas teóricos, nem formulem
hipóteses ou teses acerca dos fenômenos sociais e culturais que descreve.
FONTE: <https://encrypted-tbn3.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcSiKdqwjr7QXaPzwkTE2-
4WQRBL0BrX4Xd3fM4TjzV6Q4-eCYD5>. Acesso em: 10 abr. 2015.
Lévi-Strauss (1967, p. 14 apud MARCONI; PRESOTTO, 2001, p. 27) diz que a etnografia:
17
FIGURA 12 – O ANTROPÓLOGO FRANCÊS LÉVI-STRAUSS FAZENDO ETNOGRAFIA ENTRE OS
NAMBIKWARA, GRUPO INDÍGENA BRASILEIRO DO MATO GROSSO E RONDÔNIA
FONTE: <http://www.cella.com.br/blog/wp-content/uploads/2009/11/claudep.jpg>.
Acesso em: 10 abr. 2015.
3 ETNOLOGIA
Prezado acadêmico, agora você já deve estar ciente de que a etnografia, isto é, a
descrição científica de um determinado povo, grupo social ou cultura, é a primeira etapa
do fazer antropológico. Mas qual seria a etapa seguinte? Esta, querido(a) estudante,
seria a Etnologia. Mas o que ela vem a ser?
18
Dentro do ponto de vista que adotamos aqui podemos dizer que a etnologia é
a etapa seguinte da edificação do saber antropológico, após o levantamento de dados
e informações feitas na fase da etnografia. Seria, assim, a etnologia a reflexão, ou
estudo baseado nos fatos documentados no registro de uma cultura, tendo em vista
a apreciação analítica e sua comparação com dados semelhantes de outras culturas.
Etnologia define-se também por seu método próprio, denominado por Espina
Barrio (2005, p. 37) como “método comparativo transcultural”, tendo por base os dados
empíricos levantados na etnografia, comparam-se as informações particulares de cada
povo com o intuito de inferir algo a respeito da humanidade.
Espina Barrio (2005, p. 21) chama a atenção para o fato de a etnologia ir além
das descrições das diferentes culturas, feitas pela etnografia, com o intuito de, pela
comparação entre as diversas etnografias, “analisar as constantes variáveis que se
dão entre as sociedades humanas, e estabelecer generalizações e reconstruções da
história cultural”.
Etnologia, desta forma, apresenta-se como o estudo dos diferentes povos, como
a palavra, de origem grega, revela: éthnos, povo; logos, estudo. Mas, como já dissemos em
relação à etnografia, foi somente a partir do Iluminismo que se estabeleceu um estudo
de cunho verdadeiramente científico da humanidade, a partir da comparação entre os
povos. Embora já na antiguidade clássica alguns autores comparassem os costumes
das diferentes populações humanas de seu tempo, somente com a ideia de unidade da
espécie humana constitui-se a ciência da Antropologia.
19
FIGURA 14 – KÓLLAR AUTOR QUE CUNHOU E DEFINIU O TERMO “ETNOLOGIA”
FONTE: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/9/93/AFKollar_1779.jpg/220px-
AFKollar_1779.jpg>. Acesso em: 14 abr. 2015.
20
FIGURA 15 – REPRESENTAÇÃO DA DIVERSIDADE CULTURAL E APELO À CONSCIENTIZAÇÃO DA
UNIDADE DA HUMANIDADE
FONTE: <http://www.numeroreal.com.br/cerp/wp-content/uploads/2014/08/mafalda.jpg>.
Acesso em: 14 abr. 2015.
4 ANTROPOLOGIA CULTURAL
A princípio, dentro da tradição norte-americana, a Antropologia divide-se em
quatro grandes áreas de investigação, a saber:
21
b) A Arqueologia, que investiga a evolução das sociedades humanas ao longo da
história, focando exclusivamente naquelas extintas e sem escrita, e tendo por
base os vestígios arqueológicos, isto é, os objetos, utensílios, pinturas, restos de
habitações e demais sinais da ocupação humana de um determinado local, revelados
por escavações sistemáticas e de acordo com a metodologia desta ciência, tentando
reconstruir nosso passado.
FONTE: <http://www.abrhestagios.com.br/img/noticia/0959415001411151811arqueologia-a.jpg>.
Acesso em: 22 maio 2015.
c) A Linguística, que se ocupa das línguas humanas, no que diz respeito à sua estrutura
interna, suas conexões, história, dinâmica de mudança e, notadamente, o significado
que estas conferem à cultura e à expressão do ser humano em uma dada sociedade,
dentro da perspectiva que é a língua o meio privilegiado pelo qual nossa espécie
apreende o mundo e lhe dá sentido.
22
É possível, Prezado acadêmico, que você tenha visto em outros livros de
Antropologia uma divisão diferente da que aqui apresentamos. Isto é natural, uma vez
que estas divisões refletem visões e tradições diferentes da disciplina. Nenhuma está
mais correta que a outra, mas todas ajudam a sistematizar o campo e ilustrar o imenso
escopo da Antropologia, que, como você já deve ter percebido, procura dar conta da
totalidade da experiência humana.
Espina Barrio (2005, p. 19) define Antropologia Cultural como “... o estudo e
descrição dos comportamentos aprendidos que caracterizam os diferentes grupos
humanos”. Este autor prossegue informando que o ofício do antropólogo cultural
consiste em investigar os feitos e obras materiais e sociais criados por nossa espécie
ao longo de sua história e que nos possibilitou nos relacionarmos entre nós nas
diversas sociedades e a se apropriar e transformar o meio ambiente de maneira a
garantir nossa sobrevivência.
NOTA
Mais adiante nos deteremos mais aprofundadamente no conceito de cultura
dentro da perspectiva antropológica.
De uma maneira geral a Antropologia Cultural está mais ligada à tradição norte-
americana da ciência antropológica. Mais adiante neste caderno iremos ver como a
gênese e o desenvolvimento da Antropologia nos E. U. A. ficou marcada pelo conceito
de cultura, cujo papel fundamental na reflexão antropológica norte-americana pode ser
visto ao longo da história da antropologia neste país nas diversas escolas da disciplina
que lá floresceram.
24
FIGURA 20 – O ANTROPÓLOGO FRANZ BOAS DEMONSTRA UM RITO DO POVO QUE ESTUDOU
FONTE: <https://encrypted-tbn1.gstatic.com/
images?q=tbn:ANd9GcT21zYLNgQ0v0_3K9eGBUwOpwmXm_11gZv_tN-65bv9JsopZ2PH>.
Acesso em: 18 abr. 2015
5 ANTROPOLOGIA SOCIAL
Para Espina Barrio (2005) a Antropologia Social se ocuparia de problemas
relativos à estrutura social, a saber: aqueles referentes às relações que os membros
de uma determinada sociedade estabelecem entre si, e com os de fora, e as diferentes
instituições sociais humanas, como a família, o parentesco, os diferentes grupos sociais
de caráter político e semelhantes, que determinam a forma e o conteúdo destas relações.
25
Desta forma (MAIR, 1972 apud MARCONI; PRESOTTO, 2001), caberia ao
antropólogo social fazer a observação das relações sociais entre os membros de uma
sociedade, em sua totalidade. Observando e estudando a sociedade como um todo,
a partir de suas diferentes instituições, o antropólogo social seria capaz de chegar a
determinar a estrutura e organização de dada sociedade.
Para Espina Barrio (2005) enquanto que a Antropologia norte-americana foi mais
influenciada pelo conceito de cultura, na Antropologia britânica teve mais peso o conceito de
sociedade. Se os antropólogos norte-americanos estavam mais preocupados com os valores
dos povos que estudavam, seus colegas britânicos privilegiavam as “vinculações concretas”,
isto é, as relações sociais, que os constituíam.
26
FIGURA 22 – CHARGE DE RADCLIFFE-BROWN OBSERVANDO NATIVOS AFRICANOS
FONTE: <http://tocantinsembrasilia.com.br/wp-content/uploads/2014/01/diversidade-religiosa-740x600.jpg>.
Acesso em: 18 abr. 2015.
27
RESUMO DO TÓPICO 2
• Neste tópico vimos o que é etnografia, caracterizando-a enquanto registro total e
pormenorizado de um determinado povo, procurando descrever todos os aspectos
da vida social e da sua cultura.
28
AUTOATIVIDADE
Responda às seguintes perguntas:
4 O que procura determinar a Antropologia Social e a partir do que ela constrói sua reflexão?
29
30
UNIDADE 1 TÓPICO 3 -
CULTURA, ETNOCENTRISMO E
RELATIVISMO CULTURAL
1 INTRODUÇÃO
Prezado acadêmico, já falamos anteriormente em cultura aqui neste Caderno
de Estudos, você certamente já ouviu esta palavra e deve ter uma ideia do que seria isto.
Mas será que o conceito antropológico de cultura corresponde ao que o senso comum
diz a respeito dela?
Todos nós já ouvimos falar de alguém que este seria “culto”, ou que determinada
pessoa não teria nenhuma cultura, ou ainda que a população de um determinado bairro
não tem acesso à cultura.
Será que o uso desta palavra nestes casos tem alguma correspondência com a
aplicação que o antropólogo faz dela?
FONTE: <http://chrisgar.com.br/blog/wp-content/uploads/2014/10/mais-cultura-logo.jpg>.
Acesso em: 24 abr. 2015.
Bom, será disto que trataremos aqui neste tópico, procurando esclarecer a você,
nosso atento e curioso acadêmico, no que consiste a Cultura, de acordo com o emprego
científico deste léxico sob o ponto de vista da Antropologia.
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Igualmente trabalharemos outros conceitos correlatos que ajudam e
complementam o entendimento do que seja cultura para a Antropologia e que a
distinguem em sua compreensão própria do ser humano.
2 CULTURA
Se nós antropólogos tivéssemos que nomear aquele que seria nosso “conceito
básico e central”, conforme afirmou Leslie A. White (In: KAHN, 1975, p. 129 apud MARCONI;
PRESOTTO, 2001, p. 42), este seria, sem dúvida alguma, o conceito de cultura.
Isto é algo que não se coaduna com a visão antropológica, que não emprega o
termo com este sentido e nem faz juízo de valor em relação às diferentes culturas. Para
a Antropologia todo o povo possui cultura, nenhuma cultura é qualitativamente superior
à outra, nem pode alguém ser destituído de cultura. De fato, é a cultura que nos faz
humanos, sendo ela uma característica distintiva de nossa espécie.
Ora, você, querido acadêmico, já deve, pelo exposto, ter intuído a importância
que o conceito antropológico de cultura tem para a Antropologia e que, portanto, se
desenvolveu junto com ela.
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O relativamente longo período em que a Antropologia floresceu e se desenvolveu
a possibilitou refinar, aprimorar e adaptar o conceito de cultura às necessidades
explicativas da disciplina, conforme as teorias que nasceram neste campo de reflexão e
aos problemas relativos ao ser humano sobre os quais ela se deteve.
FONTE: <https://encrypted-tbn1.gstatic.com/
images?q=tbn:ANd9GcQirq3YE0KRRgeYBfY4Ezu0o264iDh34j5gRy02S2IFFfPPZUIu8A>.
Acesso em: 24 abr. 2015.
33
Para Ralph Linton (apud MARCONI; PRESOTTO, 2001, p. 43) a cultura consistiria “...
na soma total de ideias, reações emocionais condicionadas a padrões de comportamento
habitual que seus membros adquirem por meio da instrução ou imitação e de que todos,
em maior ou menor grau, participam”. Desta forma, em um sentido geral, para este autor
a cultura representa “a herança social total da humanidade”.
Segundo Franz Boas (apud MARCONI; PRESOTTO, 2001, p. 43), cultura seria “a
totalidade das reações e atividades mentais e físicas que caracterizam o comportamento
dos indivíduos que compõem um grupo social”.
FONTE: <http://www.newstalk.com/content/000/images/000035/37889_60_news_hub_
multi_630x0.jpg>. Acesso em: 24 abr. 2015.
34
De acordo com Malinowski (apud MARCONI; PRESOTTO, 2001, p. 43) poderíamos
conceituar cultura como “o todo global consistente de implementos e bens de consumo,
de cartas constitucionais para os vários agrupamentos sociais, de ideias e ofícios
humanos, de crenças e costumes”.
FONTE: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/4/47/Ishi.jpg/250px-Ishi.jpg>.
Acesso em: 24 abr. 2015.
35
Definida por Leslie White cultura seria “quando coisas e acontecimentos
dependentes de simbolização são considerados e interpretados num contexto
extrassomático, isto é, face a relação que têm entre si, ao invés de com organismos
humanos”.
Uma definição mais recente seria aquela proposta por Clifford Geertz, onde
“cultura deve ser vista como um conjunto de mecanismos de controle – planos, receitas,
regras, instituições – para governar o comportamento”.
36
Podemos ver, através destas definições dadas como exemplo, a variabilidade
do conceito antropológico de cultura ao longo da evolução da disciplina, variabilidade
esta que revela as transformações que se deram nos paradigmas da Antropologia e que
são sintomáticas das diversas escolas teóricas forjadas neste campo de conhecimento.
Assim cultura é vista ora como ideias, ora como abstrações do comportamento,
ora como comportamento, ora como algo extra somático, ora como os elementos
materiais e imateriais do conhecimento humano e ainda como um mecanismo de
controle do comportamento (MARCONI; PRESOTTO, 2001).
Fonte: <http://www.thecities.com.br/miniaturas/Brasil/Cultura/A_Cultura_
Brasileira/4_1258980357.8385.jpg>. Acesso em: 24 abr. 2015.
37
Aqui, prezado acadêmico, é preciso ter em mente que a cultura é algo que
nos distingue enquanto espécie e que ela mesma é fruto das pressões evolutivas que
nos forjaram. Ou seja, a cultura é algo próprio do ser humano, foi no processo de nos
tornarmos humanos, através das mutações genéticas que levaram ao surgimento de
nossa espécie, que nós desenvolvemos este extraordinário mecanismo adaptativo
que é a cultura. Entretanto, foi esta mesma cultura que nos permitiu escapar dos
determinismos biológicos.
Assim o ser humano voa sem ter asas, cruza os oceanos sem ter escamas nem
barbatanas, nada embaixo d´água sem ter guelras, mora no ártico sem ter pelagem
espessa e realiza uma série de atividades para as quais sua natureza biológica não o
preparou, mas cuja possibilidade se abriu a partir da cultura.
Vamos dar um exemplo para tentar clarificar este ponto para você acadêmico
da UNIASSELVI.
Todos os seres vivos têm que se alimentar, esta é uma necessidade básica
inescapável, procurar alimento é instintivo em todas as espécies. Mas e entre nós?
Embora seja um imperativo da natureza ingerir alimentos, aquilo que nós consideramos
como um alimento próprio, as maneiras pelas quais nós os ingerimos, quando, na
companhia de quem, de que forma e outras tantas variáveis, são aprendidas em
sociedade pelo processo de endoculturação, isto é, através da introjeção no indivíduo
da cultura da qual ele faz parte.
38
já na China come-se com o auxílio de duas varetas. Se entre nós comer sozinho é um
ato normal, entre os Hüpda (povo indígena da Amazônia) ingerir algum alimento sem a
companhia, ou o oferecimento a outrem, é uma ofensa grave. Nas grandes cidades é
costume almoçar ao meio dia, já nos seringais do Acre o almoço é uma refeição tomada
por volta das 10 h da manhã. Nenhum destes comportamentos é instintivo, mas antes
determinado pela cultura dos diferentes povos que os apresentam.
FONTE: <http://img.estadao.com.br/thumbs/910/resources/jpg/8/8/1415931593288.jpg>.
Acesso em: 28 abr. 2015.
Esperamos que sua compreensão de cultura por agora seja suficiente para nós
aprofundarmos alguns assuntos relacionados com este tema.
39
FIGURA 34 – A CULTURA ADQUIRE-SE DURANTE A VIDA SOCIAL DO INDIVÍDUO. EM NOSSA
SOCIEDADE A ESCOLA É UM DOS ESPAÇOS PRIVILEGIADOS NESTE PROCESSO
FONTE: <http://www.pco.org.br/banco_arquivos/conoticias/imagens/19547.jpg>.
Acesso em: 28 abr. 2015.
Desta forma embora faça parte de nossa cultura tocar violão, jogar futebol ou
fazer cálculos matemáticos, nem todos temos estas habilidades ou as desenvolvemos
plenamente. Entretanto, todos nós adquirimos ao longo da vida certos conhecimentos
básicos de nossa cultura que nos permite socializar com seus diferentes membros.
40
para todos os membros daquela cultura. Nas sociedades simples estas normas são
predominantes e se expressam através da língua, dos padrões morais dominantes e dos
valores que orientam a vida social naquele grupo. As normas culturais universais, isto é,
comum a todos os membros de uma determinada cultura, abarcam assim as tradições, os
usos, as ideias, os costumes e as práticas que são compartilhados igualmente por todos.
FONTE: <https://encrypted-tbn2.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcSZtfJEdMkB0oiLxINrh3_00zO
Yoash-pL0ntshAgjc05VRbaGW>. Acesso em: 28 abr. 2015.
41
FIGURA 36 – O SACERDOTE, UM PAPEL SOCIAL ESPECIALIZADO NAS DIFERENTES CULTURAS
Por fim todos nós apresentamos condutas e comportamentos que são frutos
de nossa vivência própria de nossa cultura e que são condicionados por nossa
trajetória individual, consistindo nas diferentes peculiaridades do indivíduo, em nossas
características pessoais, não sendo compartilhadas por outras pessoas de nosso grupo.
Um dos aspectos da cultura é no que consiste e que tem uma existência espaço-
temporal, localizando-se conforme sua qualidade. Vamos tentar tornar isto mais claro
para você, nosso leitor.
42
Aqueles aspectos da cultura que consistem em conceitos, crenças, atitudes,
emoções, no imaginário, e semelhantes, têm uma localização intraorgânica, ou seja,
estão dentro do organismo humano.
43
Por fim, um dos aspectos essenciais da cultura está nos comportamentos que
ela determina, entendidos aqui enquanto maneiras de agir, ou conjunto de reações e
atitudes comuns aos indivíduos em função de sua pertença a uma determinada cultura,
sendo, portanto, não instintivos, mas antes resultado da invenção social e transmitidos
e aprendidos através da linguagem e do aprendizado (MARCONI; PRESOTTO, 2001).
44
FIGURA 39 – ALGUNS DOS VALORES PREGADOS PELAS GRANDES RELIGIÕES
FONTE: <http://www.webquestfacil.com.br/pastas/1362/Valores_humanos,_tesouro_da_
humanidade.gif>. Acesso em: 28 abr. 2015.
A cultura classifica-se ainda como real e ideal, onde a cultura real seria aquela
efetivamente vivenciada por seus membros no cotidiano. A cultura real seria a expressão
na prática de uma determinada cultura, como ela se efetiva no mundo, através das
ações de seus membros, é a cultura no plano concreto.
Embora o altruísmo seja valorizado por nossa cultura, muitas vezes nos
comportamos de maneira egoísta. Na foto uma mulher indiana compartilha o pão com
um morador de rua.
FONTE: <https://encrypted-tbn2.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcTpomYhie-UF0_
L078Num5MFd5f-CP36PWF-FlouLH7pXyHjLOl7A>. Acesso em: 28 abr. 2015.
45
Prezado acadêmico, já dissemos aqui anteriormente que para os membros de
uma determinada cultura seus preceitos são tidos como reais e verdadeiros e que a sua
cultura parece ser superior às demais. Esta atitude é universal, sendo uma característica
própria de todos os grupos humanos. Tal fato chamou a atenção da Antropologia que
cunhou um termo para designar este tipo de postura. Está na hora de nos aprofundarmos
no que consiste o etnocentrismo.
3 ETNOCENTRISMO
Hoebel e Frost (2006, p. 446) definem etnocentrismo como: “Visão das coisas
segundo a qual os valores e o modo de ser do próprio grupo são o centro de tudo, e
todas as outras são avaliadas e julgadas com referência a ela”.
Etnocentrismo.
46
FIGURA 41 – PARA OS MEMBROS DE UMA RELIGIÃO AS OUTRAS PARECEM ABSURDAS
FONTE: <http://image.slidesharecdn.com/eletnocentrismoparapresentar-140506110155-
phpapp01/95/el-etnocentrismo-para-presentar-5-638.jpg?cb=1399392170>. Acesso em: 29 abr. 2015.
4 RELATIVISMO CULTURAL
Para Hoebel e Frost (2006) embora as culturas possam ter certas características
gerais em comum, elas sempre variarão em determinados pontos de seus postulados
básicos. De fato, as culturas diferem umas das outras em muitos aspectos, e algumas
vezes muito significativamente.
Sob este aspecto todas as culturas são iguais e devem ser igualmente
respeitadas e admiradas. Não que a cultura seja sempre coerente, funcional e
harmônica, mas sempre serve como normatizadora e mediadora dos conflitos que por
acaso apresente.
47
A Antropologia não discrimina entre as diferentes culturas, entendendo
todas como fundamentalmente iguais em seu papel adaptativo para nossa espécie.
A compreensão antropológica deste fato levou ao desenvolvimento do conceito de
relativismo cultural.
Desta forma suas crenças, costumes e práticas devem ser vistas sempre em
relação à cultura da qual fazem parte, como partes integradas de um sistema que
fornece o mapa para a ação e reflexão dos indivíduos ali endoculturados.
Para Laraia (2004) toda cultura tem uma lógica própria e cada hábito cultural
apresenta coerência em relação ao sistema do qual faz parte. Devemos, portanto,
compreender cada cultura a partir de sua lógica interna.
48
Devemos compreender cada costume a partir da lógica da cultura onde se
apresenta. Para as muçulmanas usar o véu é um valor positivo de sua religião e cultura.
FONTE: <http://www.smh.com.au/content/dam/images/1/5/h/t/5/image.related.
articleLeadwide.620x349.15hy0.png/1284915601000.jpg>. Acesso em: 30 abr. 2015.
Estivemos durante um ano e quatro meses vivendo entre um grupo nômade coletor-
caçador do noroeste amazônico, conhecidos na literatura antropológica como Hüpda.
49
Desta forma um ato aparentemente machista em relação às mulheres, de
acordo com nossa cultura, revela-se um ato de cuidado e altruísmo em relação a elas,
de acordo com a cultura Hüpda.
FIGURA 43 – ÍNDIO HÜPDA PREPARA O IPADÚ DE ACORDO COM OS COSTUMES DE SUA CULTURA
FONTE: <http://img.socioambiental.org/d/281930-4/maku_4.jpg?g2_GALLERYSID=TMP_SESSION_
ID_DI_NOISSES_PMT>. Acesso em: 4 maio 2015.
50
RESUMO DO TÓPICO 3
• Neste tópico nós estudamos o conceito de cultura, vendo como ele é central na
Antropologia e como tem se modificado ao longo da história. Vimos também como
a cultura é um mecanismo adaptativo próprio de nossa espécie, como determina
nossas crenças, discursos, práticas, hábitos e comportamentos, nos orientando em
nossa vida social e em nossa relação com o meio ambiente.
51
AUTOATIVIDADE
Responda às seguintes perguntas:
2 Como chamamos a atitude de julgar as outras culturas a partir das crenças e valores
de nossa própria cultura?
52
UNIDADE 1 TÓPICO 4 -
O TRABALHO DE CAMPO E A
OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE
1 INTRODUÇÃO
Prezado acadêmico, já vimos anteriormente como a Antropologia se inscreve
entre as Ciências Sociais, destacando-se em razão de sua abordagem própria do
fenômeno humano.
FONTE: <https://encrypted-tbn1.gstatic.com/
images?q=tbn:ANd9GcQCjh0d0LCaxEzYNNJPUXGNGj6q1QUC9UvXK-_SxaQhH8Sr-qyrMw>.
Acesso em: 4 maio 2015.
53
Mas no que consiste, afinal, o trabalho de campo? Vamos descobrir juntos,
prezado aluno?
2 TRABALHO DE CAMPO
Para Gomes (2013) a pesquisa, ou trabalho, de campo consiste no deslocamento
até onde se encontra o objeto da pesquisa, para lá aplicarem-se as diferentes técnicas
e métodos de pesquisa próprias da Antropologia.
De acordo com Espina Barrio (2005, p. 37), o trabalho de campo implica o contato
prolongado e pessoal do antropólogo com o povo que estuda e deve se orientar pela
investigação das inter-relações sociais, com o mínimo de interferência possível por parte
do antropólogo, concentrando os esforços empíricos deste numa parcela da humanidade e
representando um verdadeiro rito de iniciação do pesquisador.
FONTE: <http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/abril2007/fotosju354-on-line/12b.jpg>.
Acesso em: 4 maio 2015.
54
Trabalho de campo consiste assim em uma etapa importante do fazer
antropológico, sendo uma verdadeira iniciação do profissional desta área na prática
característica de sua profissão, representando o momento de coleta empírica dos
dados com os quais o antropólogo irá trabalhar e implicando necessariamente o contato
profícuo com o povo alvo de sua investigação.
Mas no que ela consistiria exatamente, você saberia dizer, Prezado acadêmico?
3 OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE
Para Marconi e Presotto (2001) seria através da observação participante que o
antropólogo teria a chance de viver entre o grupo estudado, podendo assim tomar parte
de suas conversas, ritos e atividades e observar o conjunto de manifestações de caráter
ideológico e material deste povo, bem como as maneiras pelas quais os indivíduos da
sociedade pesquisada reagem aos estímulos psicológicos e ainda os mecanismos
adaptativos e o sistema de valores de sua cultura.
55
Esta prática demandaria do pesquisador argúcia, objetividade e uma atitude
relativista quanto à cultura pesquisada. As técnicas associadas à observação
participante seriam o registro sistemático das atividades e práticas observadas, tanto
por meio do diário de campo do pesquisador, quanto de fichas, fotografias, gravações,
filmes e demais meios disponíveis.
56
Para Gomes (2013) é imprescindível na observação participante o registro dos
fatos observados no cotidiano em um diário de campo, bem como a anotação neste dos
sentimentos suscitados no pesquisador por suas diversas interações sociais junto ao
grupo pesquisado. Junto com esta técnica deve-se também lançar mão da fotografia,
filmagens, gravações etc.
Outro aspecto a ser levado em conta é que geralmente chega-se no grupo sem
um conhecimento prévio deste e de suas relações internas, então parte da observação
participante é gasta somente em mapear-se o território social do grupo pesquisado.
57
Para realizar uma observação participante eficaz é preciso estar com os sentidos
aguçados e saber ouvir e escutar o povo pesquisado, aprendendo tanto com os silêncios,
quanto com suas falas.
FONTE: <http://og.infg.com.br/in/2922952-f5b-e64/FT1500A/550/Darcy-Ribeiro-com-indios-
Kadiweu-Mato-Grosso-do-Sul-1947.-Foto-Berta-Ribeiro.jpg>. Acesso em: 6 maio 2015.
58
LEITURA
COMPLEMENTAR
O QUE É ANTROPOLOGIA?
Esta opinião é falsa. Mais do que isso, espero demonstrar que uma compreensão
clara dos princípios de antropologia ilumina os processos sociais do nosso próprio tempo
e podem mostrar-nos, se estivermos prontos para ouvir seus ensinamentos, o que fazer
e o que evitar.
59
Pode-se dizer que antropologia não é uma única ciência, pois o antropólogo
pressupõe um conhecimento da anatomia, da fisiologia e da psicologia do indivíduo, e
aplica esse conhecimento aos grupos. Cada uma dessas ciências pode ser e está sendo
estudada a partir de um ponto de vista antropológico.
60
O psicólogo pode tentar investigar os processos mentais da criação artística.
Embora os processos possam ser fundamentalmente o mesmo em toda a parte, o próprio
ato de criação implica que não estamos a lidar apenas com o artista como um criador,
mas também com a sua reação à cultura na qual ele vive, e de seus companheiros para
os quais o seu trabalho foi criado.
Uma investigação científica deste tipo está preocupada apenas com as inter-
relações entre os fenômenos observados, da mesma forma que a física e a química
estão interessados nas formas de equilíbrio e movimento da matéria, tal como aparecem
aos nossos sentidos. A questão da utilidade do conhecimento adquirido é totalmente
irrelevante. O interesse do físico e do químico centra-se no desenvolvimento de uma
completa compreensão da complexidade do mundo exterior. A descoberta tem valor só
do ponto de vista do lançamento de nova luz sobre os problemas gerais destas ciências.
A aplicabilidade da experiência de problemas técnicos não diz respeito ao físico. O que
pode ser de grande valor em nossa vida prática, não necessita ser interessante para ele,
e o que não tem qualquer valor em nossas ocupações diárias lhe pode ser de grande
valor. A única avaliação das descobertas que podem ser admitidas pela ciência pura é o
seu significado na solução de problemas abstratos gerais.
61
Embora este ponto de vista da ciência pura seja igualmente aplicado aos
fenômenos sociais, é facilmente reconhecido que estes se referem a nós mesmos, pois
quase todos os problemas antropológicos tocam na maioria de nossas intimidades.
62
RESUMO DO TÓPICO 4
• Neste tópico nós aprendemos que o trabalho de campo é um importante aspecto
do ofício do antropólogo, verdadeiro rito de iniciação da profissão, e consiste em
recolher dados empíricos acerca da cultura estudada in loco, isto é, em seu local
de ocorrência.
63
AUTOATIVIDADE
Responda às seguintes perguntas:
2 Qual a atitude necessária por parte do antropólogo em relação à cultura que pesquisa
que se mostra fundamental para um bom exercício da observação participante?
64
UNIDADE 2 —
AS ESCOLAS ANTROPOLÓGICAS
E OS GRANDES TEMAS
DA DISCIPLINA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará
autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.
CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.
65
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 2!
Acesse o
QR Code abaixo:
66
UNIDADE 2 TÓPICO 1 —
ESCOLAS ANTROPOLÓGICAS: EVOLUCIONISMO,
DIFUSIONISMO, E ESCOLA DA CULTURA
E PERSONALIDADE
1 INTRODUÇÃO
Como pudemos verificar na Unidade 1 deste caderno de estudos, a Antropologia
é uma ciência social que estuda o comportamento humano e seu desenvolvimento,
tanto do ponto de vista cultural quanto social e biológico. Ela é uma ciência relativamente
nova, que se institucionalizou somente no século XIX, mas que possui raízes que datam
das primeiras grandes navegações.
NOTA
Literatura Etnográfica: Trata-se de relatos de viagens (cartas, diários, relatórios
etc.) feitos por missionários, viajantes, comerciantes, exploradores, militares,
administradores coloniais etc. Descrições das terras (fauna, flora, topografia)
e dos povos “descobertos” (hábitos e crenças). Primeiros relatos sobre a
alteridade. Fonte: Texto adaptado de: Disponível em: <http://www.fflch.usp.br/
da/vagner/antropo.html>. Acesso em: 20 jul. 2015.
67
2 A ESCOLA EVOLUCIONISTA
Você já ouviu falar sobre a Teoria da Evolução das Espécies do naturalista
Charles Darwin? Esta foi uma das teorias que mais influenciou o campo das Ciências
Sociais, no século XIX. Vejamos a seguir:
68
Na Antropologia, o pensamento evolucionista é inaugurado no final do século XIX,
mas antes disso, alguns estudiosos já discutiam elementos relativos ao desenvolvimento
das culturas, como Platão, Lucrécio, Vico, Hegel e outros. Eles acreditavam que as
culturas se desenvolviam por meio de um processo evolutivo. Essa informação indica
que a semente do pensamento evolucionista é ainda anterior à teoria da evolução das
espécies de Darwin.
GIO
De maneira geral, o conceito de Evolucionismo se refere a uma corrente
de pensamento que compreende a reprodução das sociedades humanas
como resultado de um processo evolutivo, que tem como base mudanças
progressivas que ocorrem lentamente e que são influenciadas pelo meio
ambiente no qual habitam.
69
FIGURA 1 - REPRESENTAÇÃO DO EVOLUCIONISMO SOCIAL
FONTE: <http://www.materiaincognita.com.br/cooperacao-em-redes-sociais-acelerou-a-
evolucao-humana/#axzz3hIiNGK6Y>. Acesso em: 20 jul. 2015.
GIO
Os iroqueses foram um grupo nativo da América do Norte que viveu na
região dos Grandes Lagos, ao sul de Ontário, no Canadá, onde hoje é o
Estado de Nova York, nos Estados Unidos. Eram cinco nações — caiugas,
mohawks, oneidas, onondagas e sênecas — que constituíam a Confederação
Iroquesa. Disponível em: <http://escola.britannica.com.br/article/487811/
iroqu%C3%AAs>. Acesso em: 21 jul. 2015.
FONTE: <http://aventar.eu/2010/06/25/o-comeco-dos-comecos-lewis-morgan/>.
Acesso em: 25 jul. 2015.
71
QUADRO 1 - ETAPAS EVOLUTIVAS DE LEWIS HENRY MORGAN.
Flechas
Selvageria
Barbárie
Civilização
VII- Estágio que ocorre desde a invenção do alfabeto fonético e do uso da escrita, até o
presente momento.
72
Se os primatas em grande parte são promíscuos, e o homem civilizado
é estritamente monogâmico, a evolução não pôde ser mais que uma
progressiva limitação das possibilidades de escolha sexual humana.
O tabu do incesto é crucial neste desenvolvimento e se irá opondo
e ampliando devido a que, segundo Morgan, as sociedades se foram
dando conta das vantagens genéticas de não realizar matrimônios
consanguíneos e por isso foram desprezando e proibindo. (BARRIO,
2005, p. 75).
73
FIGURA 3 - EDWARD BURNET TYLOR
74
Para Tylor, o animismo nasceu como culto aos antepassados mortos
para passar depois a ser culto a todo o tipo de alma ou espírito
abstrato. Da experiência do sonho em que o corpo permanece imóvel
e inerte, mas em que se dão experiências às vezes muito vívidas,
o primitivo “devia” inferir que depois da morte, embora o corpo
fosse destruído, poderia continuar a existir sob alguma forma. Esta
crença na existência de espíritos imateriais é a base do animismo
que, segundo Taylor, foi se generalizando cada vez mais até que se
foram associando os espíritos a algum fenômeno da natureza. O
culto à natureza, rios, fontes, raios, vento, fogo, etc., é outro estágio
dentro da evolução das crenças que deu origem, por progressiva
antropomorfização, ao politeísmo característico de sociedades
como a egípcia, grega e romana. Do politeísmo passa, finalmente, ao
monoteísmo por depuração e progressiva racionalização da ideia de
divindade. (BARRIO, 2005, p. 79).
O termo animismo vem da palavra latina “ânima”, que significa “alma”. Esse
termo remete à ideia de que todas as crenças, religiões e demais expressões espirituais
possuem uma característica fundamental comum, que é a presença da “alma”. Dito de
outra forma, Rosa (2010) relata que Tylor acreditava que, entre todos os artigos de fé, o
elemento “alma” tinha constituído na pré-história uma espécie de protótipo a partir do
qual tinham sido forjadas todas as outras crenças.
Havia duas concepções básicas para a construção da ideia de alma, na visão de Tylor:
75
CULTURA, ou civilização, tomada em seu sentido amplo, etnográfico,
é aquele todo complexo que inclui conhecimento, crença, arte,
moral, lei, costume e quaisquer outras capacidades e hábitos
adquiridos pelo homem como membro da sociedade. (ERIKSEN;
NIELSEN, 2012, p. 35).
4 A ESCOLA DIFUSIONISTA
O Difusionismo teve início no início do século XIX e refere-se a um conjunto
de teorias que criticou a teoria evolucionista e opôs-se ao entendimento de que as
culturas se desenvolvem de forma linear para todas as sociedades. Os antropólogos
difusionistas acreditavam que a cultura se constrói de forma multidimensional e provém
de outras culturas.
76
4.1 O DIFUSIONISMO INGLÊS: A ESCOLA HIPERDIFUSIONISTA
Os primeiros a criticar a corrente evolucionista e também os mais importantes
autores da escola hiperdifusionista, ou heliocêntrica, foram: J. Perry e Elliot Smith. Esta
escola é considerada hiperdifusionista, porque muitos de seus integrantes defendiam
que havia um só foco cultural para todas as culturas avançadas da Terra, a egípcia.
77
A teoria difusinista da cultura, de Elliot Smith, foi criticada principalmente pelo
dogmatismo de seus pressupostos e também por ser pouco empírica. Por outro lado,
pode-se depreender que o hiperdifusionismo foi uma teoria alternativa importante ao
modelo evolucionista de interpretar a constituição das diferentes sociedades. Para o
hiperdifusionismo, a cultura era interpretada como o resultado da difusão de elementos
culturais provenientes de um centro único, o Egito.
Vejamos o que diz Fritz Graebner, importante representante desta escola, sobre
a difusão da cultura: “Nesses limitados centros primários, isolados uns dos outros, e
desenvolvendo-se independentemente, aparece uma série de complexos culturais que
denomina “círculos”. Por difusão estes “círculos” começam a expandir-se, sobrepor-se
e, inclusive, destruir-se”. (BARRIO, 2005, p. 88).
78
QUADRO 2 – TEORIA SOBRE A DIFUSÃO DA CULTURA DE SCHMIDT
Fases Representantes
Três fases primitivas ou arcaicas Povos pigmeus, esquimós e aborígenes australianos
Três fases primeiras Povos coletores e nômades pastoris
Três fases secundárias Povos agricultores
Por outro lado, houve muitas críticas em relação a essa perspectiva teórica.
Alguns autores enfatizam que os “círculos de cultura” tratavam-se de generalizações
e que, na maioria das vezes, não foram devidamente comprovados. De acordo com os
críticos, os autores difusionistas não demonstraram qual a origem dos círculos culturais,
quando e onde existiram e como puderam ser difundidos por áreas tão distantes.
Assim como outros estudiosos alemães, Boas defendia que para compreender
o processo de desenvolvimento cultural era necessário parar de fazer suposições
e generalizações, como no modelo evolucionista, mas observar empiricamente
a realidade. Para ele, a tarefa do antropólogo era observar, coletar e sistematizar
detalhadamente as culturas de forma individual. Somente após este extensivo
trabalho de campo e análise seria possível fazer alguma generalização teórica.
80
GIO
Antropologia cultural: Abrange o estudo dos homens/mulheres como
seres culturais. Investiga a cultura dos povos, considerando tempo, espaço,
origem e desenvolvimento. Compara e analisa suas diferenças e semelhanças.
Se preocupa com a maneira como o comportamento humano é reproduzido
e os processos de aprendizagem.
81
FIGURA 5 - SOCIEDADE INUÍTE
FONTE: <http://www.nunatsiaqonline.ca/pub/photos/Qaernermiut_Inuit_on_Era_570.jpg>.
Acesso em: 20 jul. 2015.
82
Franz Boas via valor intrínseco na pluralidade das práticas culturais no mundo
e era profundamente cético com relação a qualquer tentativa política ou acadêmica de
interferir nessa diversidade. Ao escrever sobre a dança kwakiutl, por exemplo, ele diz que:
DICAS
Para aprofundamento desta temática,
sugerimos o documentário “Estranhos
no Exterior: as correntes da tradição”,
que trata sobre a vida e o trabalho de
Franz Boas com a sociedade inuíte.
Disponível em: <https://www.youtube.
com/watch?v=zK5lYPeAbDM>. Acesso
em: 20 jun. 2015.
83
5 A ESCOLA DA CULTURA E PERSONALIDADE OU
CONFIGURACIONISMO CULTURAL
A Escola da Cultura e Personalidade, ou Configuracionismo Cultural, é a quarta
escola de orientação antropológica em sequência histórica. Ela recebe forte influência
do Particularismo Histórico de Franz Boas, sendo considerada um prolongamento
do difusionismo norte-americano, porque também representa uma abordagem de
culturas particulares, conforme Boas defendia (uma unidade singular e individual de
estudos). Seus principais representantes foram alunos de Franz Boas. São eles Edward
Sapir, Ruth Benedict e Margareth Mead. Além da influência de Boas, essa corrente
antropológica também sofreu influências de Sigmund Freud (considerado o pai da
psicanálise) e do filósofo Friedrich Nietzsche.
84
Seus principais representantes desta escola tentaram interpretar as culturas
em termos psicológicos de personalidade básica. O seu paradigma central é que uma
personalidade básica é partilhada por todos os membros de uma cultura. Os autores
estabelecem uma tipologia cultural, na qual haveria culturas com padrões diferenciados.
Ruth Benedict compreende que haveria dois padrões típicos de culturas: dionisíacas
(centradas no êxtase) e apolíneas (estruturadas no desejo de moderação). Já a antropóloga
Margaret Mead identifica três tipos de cultura. São elas: pré-figurativas, pós-figurativas e
cofigurativas. Sobre essas diferentes noções de cultura, veremos a seguir.
85
expectativas e verdades gerais. Também para Benjamin Lee Whorf, a linguagem pode
restringir o pensamento, ou seja, a linguagem funda a realidade. Nomes de cores, por
exemplo, podem variar enormemente. Em navajo, cinza e azul têm uma só palavra;
em hebraico, há uma palavra para azul do céu e outra para azul do mar.
Para Benedict, o todo não é apenas a soma das partes. Cada cultura possui
propósitos próprios ou molas mestras emocionais e intelectuais que entranham o
comportamento e as instituições de uma sociedade. Uma região, por exemplo, deve
ser observada como uma configuração cultural de instituições, costumes, tradições,
meios de transporte etc., dentro de certa área geográfica, com caráter próprio.
86
Benedict consagrou a expressão padrão cultural (cultural pattern),
empregando-a num sentido muito mais global do que Sapir. Para a autora, a unidade
significativa que a Antropologia deve estudar é a configuração cultural. Cada
cultura é caracterizada por configurações particulares, que se infiltram em todas
as instituições, toda a vida social, todos os comportamentos individuais. Mas um
indivíduo numa cultura domina somente o que lhe é necessário para desempenhar
papéis definidos, ocupar posições determinadas.
88
LEITURA
COMPLEMENTAR
CONTRIBUIÇÕES DE RUTH BENEDICT EM SEU ESTUDO:
"O CRISÂNTEMO E A ESPADA"
89
Benedict desempenhou um papel fundamental na compreensão do lugar
do Imperador do Japão na cultura popular japonesa, e formulou ao presidente Franklin
D. Roosevelt uma recomendação segundo a qual, “permitir a perpetuação do governo
imperial seria imprescindível para uma eventual rendição”.
Desse texto pode-se ver uma nova maneira de se fazer a pesquisa antropológica
com eficácia, mesmo sem conseguir ir a campo buscar informações. Benedict nos
mostra como às vezes entrevistas com pessoas que já tiveram a experiência ou leituras
de outros autores podem ser suficientes para o estudo. Outro ponto refere-se a saber
o que faz do outro diferente e saber como lidar com essas diferenças. Quais são as
características (sejam elas culturais, físicas) que nos fazem distintos de outros e o que
faz um país realmente pertencer a aquele povo. “Sua finalidade é um mundo assegurado
para as diferenças, onde os Estados Unidos possam ser inteiramente americanos sem
ameaçar a paz do mundo, a França possa ser França e o Japão possa ser Japão nessas
mesmas condições”. (BENEDICT, p. 20).
90
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
• A escola Evolucionista teve início no final do século XIX e se refere a uma corrente
de pensamento que compreende a reprodução das sociedades humanas como
resultado de um processo evolutivo. Seus principais expoentes foram: Lewis Henry
Morgan e Edward Burnet Tylor.
91
AUTOATIVIDADE
1 Do ponto de vista das escolas antropológicas, o Evolucionismo foi a primeira corrente
de pensamento a teorizar sobre o desenvolvimento das sociedades humanas,
enfatizando a cultura como um elemento impulsionador das mudanças dos padrões
culturais. Nesse sentido, Morgan foi um importante colaborador ao desenvolver a
teoria do processo evolutivo das sociedades, que consiste em organizar as fases
do desenvolvimento da cultura em três períodos: Selvageria, Barbárie e Civilização.
Com base nessas informações, analise as sentenças a seguir e classifique V para as
sentenças verdadeiras e F para as falsas.
92
UNIDADE 2 TÓPICO 2 -
ESCOLAS ANTROPOLÓGICAS: FUNCIONALISMO,
ESTRUTURAL-FUNCIONALISMO, ESTRUTURALISMO,
NEOEVOLUCIONISMO E PÓS-MODERNISMO
1 INTRODUÇÃO
Neste segundo tópico daremos continuidade à apresentação das diferentes
escolas antropológicas que ajudaram a construir o campo de estudos da disciplina de
Antropologia. Devemos lembrar que o desenvolvimento das ciências, de maneira geral,
sofreu alterações ao longo da história e os estudos antropológicos também refletem
estas mudanças, conforme poderemos verificar ao longo deste tópico.
2 AS ESCOLAS FUNCIONALISTA E
ESTRUTURAL-FUNCIONALISTA
O desenvolvimento da perspectiva Funcionalista e Estrutural-Funcionalista
na Antropologia foi profundamente marcado pela influência dos sociólogos franceses
Émile Durkheim e Marcel Mauss, que adotavam uma postura sincronicista em seus
estudos. Logo, esta postura também foi se impondo nos estudos de vários antropólogos,
principalmente de Malinowski e Radcliffe-Brown, os principais representantes das
Escolas Funcionalista e Estrutural-Funcionalista. Esses autores compreendiam a cultura
como sistemas sociais inter-relacionados, compondo um todo funcional.
93
Para os seguidores da Escola Funcionalista e Estrutural-Funcionalista,
cada costume é socialmente significativo, uma vez que integra uma ESTRUTURA,
participando de um sistema organizado de atividades. Uma cultura não é
simplesmente um organismo, mas um SISTEMA. Suas partes não podem ser
plenamente compreendidas separadamente do todo, e o todo deve ser compreendido
em termos de suas partes, suas relações umas com as outras e com o sistema
sociocultural em conjunto. Qualquer traço cultural ou costume, qualquer objeto
material ou qualquer ideia, como o fogo, uma peça de cerâmica, a noção de deus
ou deuses etc., que existem no interior das sociedades, têm funções específicas e
mantêm relações com cada um dos outros aspectos da cultura para a manutenção
do seu modo de vida total. Cada costume é socialmente significativo, já que integra
uma estrutura, participando de um sistema organizado de atividades.
94
2.2 A ESCOLA FUNCIONALISTA E SEU PRINCIPAL
REPRESENTANTE: BRONISLAW MALINOWSKI
O antropólogo Bronislaw Malinowski era natural de Cracóvia, uma cidade
polonesa, com cerca de 853 mil habitantes. Seu pai era filólogo, motivo pelo qual se
interessou pela literatura desde cedo. Doutorou-se em Física e ficou por algum tempo
no famoso laboratório de Leipzig, na Alemanha. Mais tarde, Malinowski se apaixonou
pela antropologia, principalmente devido ao seu contato com a temática do parentesco.
95
Outra de suas importantes obras foi escrita em Londres em 1922, com o título
“Os Argonautas do Pacífico Ocidental”. Nessa obra, o autor explica o funcionamento da
economia das ilhas melanésias por meio do estudo de uma instituição fundamental,
chamada o anel “Kula”.
Malinowski entendia que por meio deste intercâmbio estaria organizada uma rede
de relações e rituais complicados que conformariam a cultura dos povos novaguineanos.
Para Malinowski, a cultura destas sociedades compunha um mosaico, que, por qualquer
parte que se iniciasse a compreender, se chegava à compreensão do todo.
96
O primeiro refere-se à busca pela organização da tribo e pela anatomia de sua
cultura, que devem ser delineadas através do método da documentação concreta e
estatística, já que o objetivo fundamental da pesquisa de campo é delinear o esquema
básico da vida tribal. Por isso, torna-se importante observar todos os aspectos da
cultura nativa e anotar o maior número possível de manifestações concretas do que
é observado em um diário de campo.
97
2.3 TEORIA DAS NECESSIDADES HUMANAS DE MALINOWSKI
Na concepção de Malinowski, os seres humanos fazem parte de uma mesma
espécie animal, e, portanto, somente sobrevivem porque suas necessidades biológicas
são satisfeitas por meio da cultura em que vivem. Nesse sentido, as ideias de cultura
e natureza humana estão imbricadas, na medida em que, por meio das culturas, se
desenvolvem instrumentos e estratégias em busca da sobrevivência humana e social.
Por isso Malinowski elaborou uma teoria universal das necessidades humanas, segundo
a qual teríamos três categorias de necessidades fundamentais. São elas:
Para Malinowski, a cultura se desenvolve por meio das instituições sociais para
dar resposta às diferentes necessidades psicológicas das pessoas. Por este motivo
é que as instituições emergem na cultura, como elementos coletivos voltados às
necessidades individuais (Necessidades Humanas).
Por fim, com Malinowski, a Antropologia se torna uma ciência que adquire um
caráter de respeito aos diferentes. As perspectivas etnocêntricas tão presentes na
teoria antropológica evolucionista chegam ao fim com a introdução do pensamento de
Malinowski, que considera toda a cultura como um sistema perfeitamente organizado
em si mesmo. Para ele, as diferentes sociedades possuíam o mesmo status, descartando
a ideia de sociedades atrasadas ou primitivas, mas enfatizando as diferenças como
elementos importantes para a constituição da organização social de cada grupo.
98
FIGURA 10 - BRONISLAW MALINOWSKI NAS ILHAS TROBRIAND, NA MELANÉSIA
FONTE: <http://www.robertarnold.co.uk/seb-and-lucy/Seb%20and%20Lucy.html>.
Acesso em: 20 ago. 2015.
DICAS
Para aprofundamento desta temática, sugerimos o documentário “Estranhos
no exterior: fora da varanda”, que trata sobre a vida e o trabalho de
Bronislaw Malinowski com os habitantes de uma ilha ao leste da Nova Guiné,
chamados trobriandeses. Fonte: Disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=Qn_gLroH3bQ>. Acesso em: 19 ago. 2015.
99
FIGURA 11 – ALFRED REGINALD RADCLIFFE-BROWN
100
suas partes constituintes. Perde algumas moléculas, ganha outras,
mas a disposição estrutural das unidades continua a mesma [...].
O conceito de “função” tal como é aqui definido implica, pois, a
noção de uma estrutura constituída de uma série de relações entre
entidades unidades, sendo mantida a continuidade da estrutura por
um processo vital constituído das atividades integrantes [...].
101
As concepções de Radcliffe-Brown sobre os sistemas de sentimento, em
seu trabalho “Estrutura e Função na Sociedade Primitiva”, assemelham-se à ideia de
“representações coletivas” de Émile Durkheim, conforme destacado no texto a seguir.
FONTE: <http://ant1mcc.blogspot.com.br/2009/05/o-funcionalismo-de-radcliffe-brown.html>.
Acesso em: 15 ago. 2015.
102
De maneira geral, pode-se dizer que as Escolas Funcionalista e Estrutural-
Funcionalista foram importantes para a Antropologia, principalmente porque valorizaram a
pesquisa de campo, como um elemento fundamental do fazer antropológico, valorizando
a aproximação entre pesquisador e pesquisado. Estas escolas descontruíram a ideia
de culturas superiores e inferiores e, por meio do relativismo cultural, interpretaram as
culturas estudadas a partir dos parâmetros desenvolvidos por elas próprias, sem os
valores e pré-noções dos observadores.
Neste tópico foram trabalhadas juntas, porque, apesar de terem alguns embates
acadêmicos, os pensamentos de Radcliffe-Brown e Malinowski são similares.
103
3.1 PRINCIPAL REPRESENTANTE DA ESCOLA
ESTRUTURALISTA: CLAUDE LÉVI-STRAUSS
O antropólogo Claude Lévi-Strauss foi o mais importante representante da
escola estruturalista do século XX e ainda é muito respeitado no meio acadêmico.
No Brasil, ele ficou de 1935 até 1939 e nesse período estudou algumas
comunidades indígenas do interior do país. Os registros apreendidos a partir dos
encontros resultaram no seu livro “Tristes Trópicos”.
104
FIGURA 12 – CLAUDE LÉVI-STRAUSS E A CAPA DE SEU LIVRO “TRISTES TRÓPICOS”
105
Para receber a denominação de estrutura, na concepção de Lévi-Strauss, os
modelos estruturais devem satisfazer a quatro condições básicas. São elas:
Nesse sentido, Lévi-Strauss nos permite conhecer uma realidade muito mais
profunda, que diz respeito mesmo aos condicionamentos inconscientes dos grupos/
indivíduos pesquisados.
106
3.2.2 Culturas simples e complexas
Para melhor compreender e apresentar as estruturas mentais inconscientes
básicas de uma sociedade/cultura humana, Lévi-Strauss organizou as culturas em dois
tipos, que ele chamou de culturas quentes e culturas frias.
107
1- Visão sincrônica e sistêmica da cultura.
2- Visão globalizante do fenômeno cultural, ou seja, o conhecimento do todo leva à
compreensão das partes.
3- Adoção dos conceitos de Estrutura Social e Relações Sociais.
4- Utilização de modelos na análise cultural.
5- Unidades de análise: estruturas mentais inconscientes.
6- Compreensão ampla da realidade cultural.
4 A ESCOLA NEOEVOLUCIONISTA
Após a Segunda Guerra Mundial e a descolonização de muitos países do
Terceiro Mundo, a antropologia tomou um novo rumo, procurando interessar-se pelas
próprias culturas e não somente pelas sociedades tribais, distantes e pouco conhecidas.
Nesse bojo, assim como outras escolas, o neoevolucionismo vai em busca de rever as
interpretações clássicas do evolucionismo.
108
Para White, o nível de uma cultura e sua complexidade dependem
basicamente do poder mecânico de que ela dispõe para controlar o
mundo e para produzir meios de vida mediante técnicas particulares
(força animal, aproveitamento das correntes fluviais, máquinas a
vapor etc.). Por isso, “concentrações maiores de energia e formas
elevadas de organização produzem níveis mais altos de cultura”. A
quantidade de energia de que se dispõe per capita nos dá o nível de
desenvolvimento de uma cultura, que se concretiza em: quantidade
de alimento, moradia, transportes, comunicações, meios de defesa e
domínio sobre as enfermidades.
Períodos Estágios
Energia do próprio corpo, salvo exceções no emprego do
Selvageria (Baixo)
fogo, do vento e da água.
Energia na domesticação dos animais e cultivo das plantas; na
Barbárie (Médio) fabricação e uso de instrumentos e de ferramentas; na invenção do
calendário e da escrita.
Energia na descoberta e aplicação da máquina a vapor (Revolução
Civilizado (Alto)
Industrial).
109
5 ANTROPOLOGIA PÓS-MODERNA
De maneira geral, o pensamento pós-moderno é um movimento que ocorre em
todas as ciências, especialmente nas ciências sociais. Na antropologia, este movimento
manifesta-se por meio de uma postura crítica em relação aos discursos etnográficos
clássicos. Ou seja, coloca-se em xeque os discursos antropológicos produzidos sobre
os “outros”. Mas, para compreender melhor o debate da antropologia pós-moderna, é
necessário compreender o conceito de pós-modernidade. Vejamos a seguir o que diz
Eriksen (2012, p. 169) sobre o conceito de Pós-modernidade:
110
nativos e em nome deles, impedindo-os assim de efetivamente
falarem por si mesmos. Deloria estava especialmente furioso com
os antropólogos boasianos, cujo relativismo condenava os nativos
americanos ao eterno exotismo e os impedia de chegar à igualdade
com os brancos.
111
No mesmo ano foi editado o volume Writing Culture, dos autores Clifford e
Marcus, um livro com 12 capítulos, desenvolvidos por autores de diferentes posições da
escola pós-moderna, mas que de forma unânime desconstruiu o conceito de cultura
como um todo integrado, visão predominante na antropologia até então. Dois anos
após, Clifford publicou The Predicament of Culture, que pode ser resumido como ”um
longo argumento contra o essencialismo”.
112
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
• A Escola Estruturalista é uma das mais importantes do nosso tempo. Ela tem como
principal representante o antropólogo Claude Lévi-Strauss. Esse autor ampliou o
campo de discussão na antropologia, construindo ao mesmo tempo um conjunto de
teorias sobre a cultura e também um método de análise utilizado até os dias atuais.
113
AUTOATIVIDADE
1 Ao estudarmos as Escolas Antropológicas, verificamos que cada uma delas possui
seus principais expoentes, ou seja, aquelas que melhor representaram sua perspectiva
teórica. Diante disso, levando em conta as escolas descritas a seguir: Funcionalista,
Estrutural-Funcionalista e Estruturalista, assinale a alternativa que apresenta os
principais representantes de cada uma delas, respectivamente.
114
UNIDADE 2 TÓPICO 3 -
GRANDES TEMAS DA ANTROPOLOGIA:
UNIÃO, CASAMENTO E PARENTESCO
1 INTRODUÇÃO
A antropologia é um campo de pesquisa que se ocupa da organização e do
desenvolvimento das sociedades humanas. Por este motivo, ao longo do tempo tem
discutido várias dimensões da vida humana, como as instituições sociais, os modelos
políticos e de governo, a economia, a religião, enfim, a cultura de uma forma geral.
Mas para compreender essas dimensões, as escolas antropológicas, por meio de seus
estudos, ao longo do tempo foram construindo conceitos que utilizam instrumentos
analíticos para interpretar as sociedades pesquisadas.
2 UNIÃO
Todas as sociedades humanas, em menor ou maior grau, sofrem cerceamento
de seus impulsos sexuais. Por meio da cultura se estabelecem limitações na conduta
das relações sexuais, no sentido de direcioná-la para um caminho preestabelecido, que
demarca como, quando e com quem o sexo é permitido. Por esse motivo, o fato de ser
humano, ou seja, viver em sociedade e pertencer a uma cultura, é estar sujeito a algum
tipo de inibição sexual.
115
A união dos seres humanos pode ocorrer apenas no plano biológico, como
ocorre com os animais, sem implicar em casamento. Mas, na maioria das vezes, a
união (relação sexual) acaba implicando um certo grau de permanência do par. O que
não quer dizer que pode ser confundido com o casamento, pois pode haver casamento
sem união.
3 CASAMENTO
O casamento é uma instituição social que serve para organizar a relação de um
par, em uma determinada sociedade. Vejamos o que dizem Hoebel e Frost (2006, p. 176):
3.1 EXOGAMIA
O Termo exogamia refere-se à regra social que determina que os casamentos
ocorram fora da família, ou seja, com pessoas de outros grupos familiares. Existem dois
tipos distintos de exogamia, a simples e a restrita. Vejamos como podem ser definidas:
116
3.2 Endogamia
Ocorre de maneira contrária à exogamia. A endogamia refere-se a uma regra
social que determina que os casamentos ocorram dentro da própria organização familiar,
ou grupo social, considerado de pertencimento.
GIO
Castas são sistemas tradicionais, hereditários ou sociais de estratificação, ao
abrigo da lei ou da prática comum, com base em classificações tais como
a raça, a cultura, a ocupação profissional etc. Disponível em: <http://www.
dicionarioinformal.com.br/castas/ >. Acesso em: 10 set. 2015.
4 MODALIDADES DE CASAMENTOS
Neste subtópico vamos focar nas modalidades de casamento, levantadas pelos
antropólogos com base nas diferentes sociedades pesquisadas. Ainda que atualmente,
nas sociedades ocidentais, muitos casamentos ocorram de forma que os pares
escolhem por si próprios seus cônjuges, isso não funciona desta maneira em muitas
sociedades, nas quais os casamentos são arranjados ou dependem de prévio exame e
consentimento das famílias.
Por este motivo, para entender como funciona essa instituição social,
especialmente os casamentos primitivos, é necessário entender o seu conceito. Vejamos
o que dizem Hoebel e Frost (2006, p. 193) sobre os princípios básicos de um casamento:
117
O casamento constitui uma aliança entre dois grupos de parentesco,
nos quais o casal interessado é meramente o vínculo mais
importante. Todo homem aprende, mais cedo ou mais tarde, que
quando ele se casa com uma “única pessoa”, casa-se não somente
com ela, mas com seus parentes. As noivas, naturalmente, têm a
mesma experiência.
Por este motivo, quando nos referimos ao casamento, estamos nos referindo
não só aos interesses do casal, mas também aos interesses sociais relativos ao evento.
A sociedade em geral e os parentes, em particular, têm uma participação bastante direta
no matrimônio. Por este motivo, veremos a seguir algumas modalidades formalizadas
do processo de casamento.
Das sete modalidades para se “conseguir” uma mulher, apenas duas delas não
possuem participação direta da família. São elas: o casamento por captura e o casamento
por fuga, as demais envolvem participação direta da família. De acordo com Hoebel e
Frost (2006), as sete modalidades são: preço por progênie, ou riqueza da noiva; pelo
serviço do pretendente; por troca de presentes; por captura; por afinidade, substituição
ou continuação; por fuga; por adoção.
Não se pode pensar que a noiva é mero objeto de negociação entre as famílias, mas,
ao contrário, pagar pela mulher significa que a posição da mulher em termos de prestígio e
poder é valorizada, além do que, e principalmente, a mulher, como progenitora, tem muito
valor como um membro de um grupo de parentesco.
Vejamos o que dizem Hoebel e Frost (2006, p. 194) sobre os nativos Vezos Sakalavas,
de Madagascar, onde o preço da progênie é regulado na dimensão das leis.
118
quem pagou o preço da progênie à sua família. A mulher cria e toma
conta das crianças até a desmama, quando eles serão entregues ao
seu primeiro marido e se tornam seus legítimos herdeiros, sem as
formalidades de adoção... entre os primitivos, a paternidade legal é,
geralmente, de maior significado do que a paternidade biológica.
119
um ia oferecer em troca. Esperava-se que cada um deles levasse no
dia seguinte, ou, no máximo, dentro de dois dias, alguma coisa de
valor igual ao que tinham recebido.... Assim, com referência ao valor
econômico, os presentes eram exatamente iguais.
O objetivo das trocas para os Cheyennes não era o valor das coisas, mas
sim a possibilidade de reafirmar e reforçar os laços de amizade e, principalmente, de
demonstrar o apreço pelo compromisso entre os noivos confirmado.
4.4 CAPTURA
A ideia de capturar uma noiva parece ser um pouco duvidosa e nos lembra algumas
histórias em quadrinhos ou desenhos animados sobre os casamentos dos “homens das
cavernas”, nos quais o homem captura a mulher com uma paulada na cabeça e a arrasta
para a sua casa. Na verdade, o casamento por captura foi uma das primeiras maneiras de
compreender o princípio da evolução social, pelos antropólogos clássicos, mas hoje ganhou
nova interpretação, o que não quer dizer que não tenha existido. Além disso, não se pode
dizer que foi uma técnica dominante, em tempos mais remotos.
Por esse motivo, o casamento por captura só ocorria em ocasiões em que não
se podia recorrer a outros meios. De maneira geral, mesmo sem recursos, um homem
procurava casar primeiro pelos meios tradicionais de sua sociedade.
a) Levirato: Esse termo é utilizado para identificar os casamentos que ocorrem entre uma
mulher e seu cunhado. É o casamento por afinidade mais conhecido no mundo. No caso
do levirato simples, ocorre quando o irmão do marido falecido se casa com a mulher
viúva. No caso do levirato júnior, somente o irmão mais novo do falecido pode herdar sua
esposa. Essa prática ocorre em todas as partes do mundo, em diferentes sociedades.
120
b) Sororato: Da mesma forma que o levirato, o sororato serve para dar continuidade aos
laços familiares, mas neste caso, ao invés do irmão tomar o lugar do irmão falecido, é
a mulher que assume o posto da irmã falecida, ou seja, casa-se com o cunhado.
4.7 ADOÇÃO
A adoção é uma estratégia de casamento utilizada por países como a Indonésia
e o Japão. O homem pode obter uma esposa, sendo adotado pela família dela,
especialmente quando o sogro não possui filhos homens. Neste caso, o genro adotado
passa a ser filho.
Essa medida é tomada porque possui uma necessidade social importante para
justificá-la. Uma família patrilinear que adota o genro pode manter sua linhagem, mesmo
quando não há filhos homens biológicos.
Tornando-se filho na família de sua esposa, os filhos de sua relação com ela
pertencerão automaticamente à família dela. Um aspecto que chama a atenção é que,
tornando-se filho de seu sogro, sua esposa será ao mesmo tempo sua irmã.
121
5 SISTEMA DE PARENTESCO
Apesar do sistema de parentesco ter adquirido maior destaque no final do século
XX, como um dos elementos centrais das análises antropológicas, ele tem sua origem
na história da antropologia. Os primeiros antropólogos já percebiam que as relações
biológicas tinham um papel importante na compreensão da organização social, porque
permitiam distinguir as relações entre uma pessoa e o seu grupo de origem. Podemos
tomar como exemplo a relação entre mãe e filho, pai e mãe, irmão e irmão, entre outras.
Essas relações biológicas são transferidas para o plano cultural e adquirem significados
diferentes para cada cultura, o que para os antropólogos possibilita compreender a
posição social de cada um em relação ao coletivo, e também lhes permite compreender/
demonstrar o que denominam o “sistema de parentesco” de cada grupo social.
122
O sistema de parentesco, segundo Murdock, refere-se a um sistema
estrutural de relações, no qual os indivíduos encontram-se unidos
entre si por um complexo interligado de laços ramificados. Para
Rivers, sistema de parentesco consiste no “reconhecimento social de
laços biológicos”. As relações de parentesco consistem em “funções
interagentes, atribuídas, segundo o costume, por um povo, aos
diferentes status de relacionamento”, afirmam Hoebel e Frost.
1- Famílias por afinidade (Marital ou Legal) – Laço criado pelo casamento. Por meio
dele o homem contrai laços de afinidade com a esposa e seus familiares: pai,
irmãos, irmãs etc.
2- Consanguinidade (Biológico) – Relação entre pais e filhos.
3- Fictício ou Pseudoparentes (Adotivos) – Muitas sociedades aceitam uma terceira
categoria de relações, denominada fictícia, incluindo-se crianças adotadas,
escravos, compadrio e parentesco ritual (irmãos de sangue).
123
Quadro 5 – Representação de Parentesco
FONTE: <http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.
html?pagina=espaco%2Fvisualizar_aula&aula=56012&secao=espaco&request_locale=es>.
Acesso em: 10 set. 2015.
124
LEITURA
COMPLEMENTAR
AS ESTRUTURAS ELEMENTARES DO PARENTESCO, DE CLAUDE
LÉVI-STRAUSS, POR SIMONE DE BEAUVOIR
125
Esses três tipos de explicação têm conduzido a impossibilidades e contradições. Na
verdade, se a proibição do incesto é de tão grande interesse, é porque ela representa o
momento mesmo da passagem da natureza para a cultura. “É o processo pelo qual a
natureza ultrapassa a ela mesma”. Essa singularidade decorre do caráter particular da
sexualidade mesma: é normal que a dobradiça entre natureza e cultura se encontre no
terreno da vida sexual, pois esta, extraída da biologia, coloca imediatamente outrem em
jogo; no fenômeno da aliança se desenvolve essa dualidade: pois enquanto o parentesco
é dado, a natureza impõe a aliança, mas não a determina. Podemos extrair daqui a
maneira pela qual o homem, assumindo sua condição natural, define sua humanidade.
Pela proibição do incesto se expressam e se realizam as estruturas fundamentais sobre
as quais se funda a sociedade humana como tal. Primeiramente a exogamia manifesta
que não haveria sociedade sem o reconhecimento de uma Regra. Contrariamente aos
mitos e às inverdades liberais, a intervenção não está somente relacionada a alguns
regimes econômicos: ela é tão original quanto a humanidade mesma. A distribuição dos
valores entre os membros da coletividade sempre foi e será um fenômeno cultural;
porém – como o alimento ao qual ela é estreitamente associada –, a mulher é um
produto escasso e essencial à vida do grupo: em muitas civilizações primitivas, o solteiro
é econômica e socialmente um pária; o primeiro cuidado da coletividade será assim
impedir que se estabeleça um monopólio de mulheres. Este é o sentido profundo da
proibição do incesto; afirma-se que não é sobre a base de sua repartição natural que as
mulheres devem receber um uso social; se ao homem se impede escolher seus aliados
entre os seus parentes, se “congelamos” as mulheres no seio da família, é porque a
distribuição se faz sobre o controle do grupo e não em regime privado. A despeito de seu
aspecto negativo, a Regra tem na verdade um sentido positivo; a interdição implica
imediatamente uma organização: pois para renunciar a seus parentes, é necessário que
o indivíduo seja assegurado de que a renúncia simétrica de outro lhe conceda aliados;
ou seja, a regra é a afirmação de uma reciprocidade; a reciprocidade é a maneira imediata
de integrar a oposição entre mim e outrem: sem uma tal integração, a sociedade não
existiria. Porém, tal relação não existiria se permanecesse abstrata; sua tradução
concreta é a troca: a transferência de valores de um indivíduo a outro os transforma em
parceiros; somente sob essa condição pode se estabelecer um “mitsein” humano. A
característica fundamental destas estruturas se revela claramente no estudo da
psicologia infantil: a criança faz o aprendizado de si mesma e do mundo aprendendo a
aceitar a arbitragem de um outro, quer dizer, a Regra, que a faz descobrir a reciprocidade,
descoberta à qual ela reage imediatamente pelo dom e pela exigência. Essa noção de
troca – cuja importância Mauss já havia estabelecido no seu ensaio sobre o dom, e que
envolve as noções de regra e de reciprocidade – nos fornece a chave do mistério da
exogamia: proibir uma mulher aos membros de um dado grupo é colocá-la imediatamente
à disposição de outro homem; a proibição se duplica em obrigação: aquela de dar sua
filha, sua mulher, a outro homem; a parenta que se rejeita, se oferece; o fato sexual, ao
invés de fechar-se sobre si, abre um vasto sistema de comunicação. A proibição do
incesto se confunde com a instauração da ordem humana. Os homens em toda parte
procuraram estabelecer um regime matrimonial tal que a mulher faça parte dos dons
pelos quais se expressa a relação de cada um ao outro e se afirma a existência social.
126
Uma observação extremamente importante impõe-se aqui: não é entre os homens e as
mulheres que aparecem as relações de reciprocidade e de troca; elas se estabelecem
por meio das mulheres, entre os homens; existe e sempre existiu entre os sexos uma
profunda assimetria e o “Reino das mulheres” é um mito superado; qualquer que seja o
modo de descendência, quer os filhos sejam incluídos no grupo do pai ou naquele da
mãe, as mulheres pertencem aos machos e fazem parte do conjunto de prestações que
eles se consentem. Todos os sistemas matrimoniais implicam que as mulheres sejam
dadas por certos machos a outros machos. Há um caso onde a relação entre o casamento
e a troca aparece claramente: é o das organizações dualistas; estas apresentam
analogias tão fortes entre si que se tentou às vezes lhes dar uma origem única: segundo
Lévi-Strauss, sua convergência se explica pela identidade de seu caráter funcional. Não
é o sistema dualista que faz nascer a reciprocidade: ele antes a exprime de uma forma
concreta. É esta mesma perspectiva que permitirá explicar as formas de sociedade mais
complexas: elas não são o resultado de acasos históricos e geográficos; todas elas
manifestam uma mesma e profunda intenção: a de impedir o grupo de se fechar em si
mesmo e de mantê-lo diante de outros grupos com os quais a troca seja possível. O
autor buscará a confirmação dessas ideias em uma minuciosa análise de realidades
sociais dadas; é esse estudo que constitui a parte mais importante de seu trabalho. Não
seria questão aqui de repassar os complicados meandros; tentarei somente indicar o
método, já que é na sua aplicação metódica que uma hipótese manifesta sua
fecundidade. A forma do casamento que fornece o verdadeiro experimentum crucis do
estudo das proibições matrimoniais é o casamento entre primos cruzados. Em um
grande número de sociedades primitivas o casamento é proibido entre primos paralelos
– aqueles provenientes de dois irmãos ou duas irmãs – e recomendado entre primos
cruzados – isto é, advindos de um irmão e uma irmã; o extremo interesse desse costume
provém do fato de que graus de parentesco biologicamente equivalentes são
considerados de um ponto de vista social como radicalmente dessemelhantes: torna-se
patente que não é a natureza quem dita suas leis à sociedade; compreendendo-se a
origem dessa assimetria tem-se a explicação da proibição do incesto. O casamento
entre primos cruzados implica uma organização dualista da coletividade: eles distribuem-
se de fato como se pertencessem a duas metades diferentes; mas não se deve crer que
seja esta a divisão que define as regras de exogamia; os primitivos não começam
estabelecendo classes: a classe é um elemento analítico, como o conceito; o homem
pensa antes que o lógico apreenda o pensamento enquanto forma; assim a sociedade
se organiza antes de definir os elementos separados que essa organização trará à tona;
lá onde são encontradas as classes – e isso não é por toda parte –, elas são menos um
grupo de indivíduos concebidos em extensão que um sistema de posição, no qual
somente a estrutura é constante e onde os indivíduos podem se deslocar, desde que as
relações sejam respeitadas. O princípio da reciprocidade age de duas maneiras
complementares: constituindo classes que delimitam em extensão os cônjuges ou
determinando uma relação que permita dizer se um indivíduo é ou não um cônjuge
possível: no caso dos primos cruzados, esses dois aspectos do princípio se recobrem;
mas não é seu pertencimento a dois grupos diferentes que os destina a se aliar entre si;
ao contrário, a razão de ser do sistema que os opõe é a possibilidade de uma troca. As
127
mulheres aparecem imediatamente como destinadas a serem trocadas e esta
perspectiva cria imediatamente uma oposição entre dois tipos de mulheres: a irmã e a
filha que devem ser cedidas e a esposa que é adquirida, ou seja, a parente e a aliada. Não
se trata aqui, como pensava Frazer, da solução de um problema econômico: os processos
econômicos não são isoláveis; é um ato de consciência primitivo e indivisível que faz
apreender a filha e a irmã como um valor ofertável e a filha e a irmã de outrem como um
valor exigível. Antes mesmo que a coisa a trocar se apresente, a relação de troca já está
dada: antes do nascimento de sua filha, o pai sabe que deverá entregá-la ao homem –
ou ao filho do homem – de quem recebeu a irmã em casamento. Os primos cruzados são
provenientes de famílias que se encontram em posições antagônicas, em um
desequilíbrio dinâmico que somente a aliança pode resolver; ao contrário, duas irmãs ou
dois irmãos, pertencentes ao mesmo grupo, têm entre eles uma relação estática e seus
filhos serão considerados como fazendo parte de um mesmo conjunto; eles não portam
um em relação ao outro o sinal da alteridade, necessário ao estabelecimento das
alianças. Porém, se nos limitarmos a considerar a troca sob essa forma restrita – ou seja,
na medida em que ela estabelece uma reciprocidade entre um certo número de pares
de unidades trocadoras, classes, seções ou subseções –, percebemos que ela não
permite dar conta da integralidade dos fatos. É o que se evidencia, por exemplo, na
análise dos fatos australianos. É sob sua forma generalizada que a ideia de troca pode
servir de chave para o estudo de todas as sociedades. A troca generalizada é aquela que
estabelece relações de reciprocidade entre um número qualquer de parceiros: assim, se
um homem do grupo A esposa necessariamente uma mulher B, ao passo que um
homem B esposa uma mulher C, o homem C uma mulher D, e o homem D uma mulher
A, está-se diante de um sistema de troca generalizada; é o que se produz, entre outros,
no caso em que o casamento é matrilateral, ou seja, o homem deve desposar a filha de
seu tio materno. Essa regra estabelece o desenvolvimento de um ciclo aberto no qual
cada indivíduo deve ter confiança: quando o grupo A cede uma mulher ao B, trata-se de
uma especulação de longo prazo, pois ele deve contar que B cederá uma mulher a C, e
deste a D, e este a A; tal cálculo comporta riscos e é por isso que à troca generalizada
frequentemente se superpõem novas fórmulas de aliança, como o matrimônio por
compra, que permite integrar fatores irracionais, sem destruir o sistema. A aplicação
desses princípios diretores permite a Lévi-Strauss depreender a significação de regimes
matrimoniais que pareciam até então contingentes e ininteligíveis. A conclusão destas
análises que nos transportam à Austrália, à China, às Índias e às Américas é que existem
dois tipos essenciais de exogamia. À troca direta corresponde o casamento bilateral, o
indivíduo podendo desposar a filha de seu tio materno ou de sua tia paterna; à troca
indireta (ou generalizada) corresponde o casamento matrilateral que autoriza a aliança
exclusivamente com a filha do tio materno [a autora não considera que Lévi-Strauss
também toma o casamento com a prima cruzada patrilateral como um modo de troca
generalizada]. O primeiro sistema só é possível nos regimes desarmônicos, ou seja, onde
a residência e a filiação seguem uma linha paterna e o outro a linha materna; o segundo
aparece nos regimes harmônicos, onde residência e filiação seguem a mesma linha; o
primeiro possui uma grande fecundidade em relação ao número de sistemas que é
capaz de fundar, mas sua fecundidade funcional é relativamente fraca; o segundo é, ao
128
contrário, um princípio regulador fecundo que conduz a uma maior solidariedade
orgânica no seio do grupo; no caso da troca restrita, é a inclusão ou a exclusão dentro
ou fora da classe que faz o papel principal; no caso da troca indireta, o grau de parentesco,
ou seja, a natureza da relação, tem uma importância preponderante; os sistemas
desarmônicos têm assim evoluído na direção de organizações de classes matrimoniais,
enquanto o contrário é produzido nos sistemas harmônicos. Estes constituem um ciclo
aberto, longo, aqueles um ciclo curto; o casamento bilateral é uma operação mais
segura; mas o casamento matrilateral oferece virtualidades inesgotáveis, a extensão do
ciclo estando na razão inversa de sua segurança. É por isso que um fator alógeno se
sobrepõe quase sempre às formas simples da troca generalizada; entre grupos que se
lançam nessa grande aventura sociológica, nenhum é liberado inteiramente da
inquietude engendrada pelos riscos do sistema, e eles mantêm um certo coeficiente ou
mesmo um símbolo de patrilateralidade. Nenhum sistema é puro: ele é simultaneamente
simples e coerente, porém cercado por outros sistemas. Resta acrescentar que a
estrutura de troca não é solidária da prescrição de um cônjuge preferencial; entre outras,
a substituição do direito sobre a prima pela compra da mulher permite à troca se
desembaraçar de suas formas elementares. Mas quer seja indireta ou direta, global ou
específica, concreta ou simbólica, é sempre a troca que nós encontramos na base das
instituições matrimoniais. Vê-se então se confirmar a ideia de que a exogamia visa
assegurar a circulação total e contínua das mulheres e das filhas; seu valor não é
negativo, mas positivo: não é que haja um perigo biológico no casamento consanguíneo,
mas um benefício social resulta do casamento exogâmico. A proibição do incesto é por
excelência a lei do dom: é a instauração da cultura no seio da natureza. “Todo casamento
é um encontro dramático entre a natureza e a cultura, entre a aliança e o parentesco...
Já que se deve ceder à natureza para que a espécie se perpetue e com ela a aliança
social, é necessário ao menos negá-la ao mesmo tempo em que acedemos a ela”. Em
um sentido, todo casamento é um incesto social, já que o marido absorve em si algum
bem ao invés de desviá-lo na direção de outrem [no original, s’échapper vers autrui]; ao
menos a sociedade exige que no centro desse ato egoísta a comunicação com o grupo
seja mantida: é por isso que, ainda que mulher seja outra coisa além de um signo, ela é,
todavia, como a palavra, uma coisa que se troca. A relação do homem com a mulher é
também fundamentalmente uma relação com outros homens – com outras mulheres.
Os enamorados nunca estão sozinhos no mundo. O evento mais íntimo para cada um, o
ato sexual é também um evento público: ele coloca em questão, ao mesmo tempo, o
indivíduo e a sociedade inteira; é daí que vem seu caráter dramático; aqueles que se
escandalizam com o ardente interesse que lhe dão os homens hoje em dia demonstram
grande ignorância: a extrema importância conferida aos tabus sexuais nos mostra que
esta preocupação é velha como o mundo; e ela está longe de ser supérflua, já que, pela
maneira como assume sua sexualidade, o homem define sua humanidade. Certamente
essa escolha que ele faz não é fruto de uma deliberação refletida. Mas o primeiro mérito
do estudo de Lévi-Strauss é precisamente o de recusar o velho dilema: ou os fatos
humanos são intencionais ou não possuem significação. O autor os define como
estruturas nas quais o todo precede as partes e cujo princípio regulador possui um valor
racional mesmo quando não seja racionalmente concebido. De onde provêm estrutura
129
e princípio? Lévi-Strauss não se permite aventurar sobre o terreno filosófico, não se
separa jamais de uma rigorosa objetividade científica; mas seu pensamento se inscreve
evidentemente na grande corrente humanista que considera a existência humana
como contendo em si sua própria razão. Não se poderia ler suas conclusões sem se
lembrar das palavras do jovem Marx: “A relação do homem com a mulher...” Entretanto o
livro não desperta apenas ressonâncias marxistas; ele me pareceu muitas vezes
reconciliar de modo feliz Engels e Hegel: pois o homem nos aparece originalmente como
uma antiphysis; e o que realiza sua intervenção é a posição concreta de um eu face a
um outro eu, sem o qual o primeiro não saberia se definir. Também fui singularmente
surpreendida pela concordância de algumas descrições com as teses sustentadas pelo
existencialismo: a existência, ao se colocar, coloca suas leis, em um único movimento;
ela não obedece a nenhuma necessidade interior, entretanto escapa à contingência por
assumir as condições de seu brotar. Se a proibição do incesto é universal e normativa ao
mesmo tempo, é porque ela traduz uma atitude original do existente: ser homem é se
escolher como homem, definindo suas possibilidades sobre a base de uma relação
recíproca com o outro; a presença do outro nada tem de acidental: a exogamia, bem
longe de se limitar a registrá- la, ao contrário, a constitui; através dela se expressa e se
realiza a transcendência do homem; ela é a recusa da imanência, a exigência de
ultrapassá-la; aquilo que os regimes matrimoniais asseguram ao homem, pela
comunicação e pela troca, é um horizonte em direção ao qual ele possa se projetar; sob
sua aparência barroca, eles lhe asseguram um além-humano. Mas seria trair um livro
tão imparcial pretender fechá-lo dentro de um sistema de interpretação: sua fecundidade
está precisamente em convidar cada um a repensá-lo à sua maneira. É por isso também
que nenhuma resenha lhe faria justiça; uma obra que nos apresenta os fatos, que
instaura um método, e que sugere especulações, merece que cada um renove a
descoberta: é preciso lê-la.
130
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
• Vários são os temas estudados pela Antropologia, mas para o terceiro tópico foram
selecionados: união, casamento e parentesco.
• O casamento é um dos mais antigos complexos de normas sociais, que tem por
objetivo organizar a relação de um par. É o que possibilita e normatiza a constituição
da família.
• Existem sete tipos de modalidades de casamento. São eles: preço por progênie, ou
riqueza da noiva; pelo serviço do pretendente; por troca de presentes; por captura;
por afinidade, substituição ou continuação; por fuga e por adoção.
• O que dá origem ao sistema de parentesco é a família nuclear, que pode ser constituída
de três maneiras: por afinidade, consanguinidade e por pseudoparentes (adotivos).
131
AUTOATIVIDADE
1 A antropologia discute vários temas relacionados à existência humana em sociedade.
Um dos elementos é a união. Caracterize este termo.
132
UNIDADE 3 —
FUNDAMENTOS DA
ANTROPOLOGIA FILOSÓFICA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará
autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.
CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.
133
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 3!
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134
UNIDADE 3 TÓPICO 1 —
A CONCEPÇÃO DE HOMEM NA
CULTURA GREGA
1 INTRODUÇÃO
A história da nossa civilização se inicia com a história da civilização dos gregos.
Os filósofos gregos foram os primeiros seres humanos a indagar sobre si e Sobre o mundo
(cosmos) de maneira lógica-racional. Desde os pré-socráticos até a modernidade,
a pergunta: o que é o homem? Não se exauriu. Ao contrário, ela tomou força na
modernidade, e continua fazendo parte das discussões filosóficas contemporâneas. A
antropologia filosófica é o ramo da filosofia que busca investigar a estrutura essencial
do homem, isto é, o que faz do homem, homem. Quais são as propriedades essenciais
que permitem diferenciar o homem de outros animais? A sua razão? A alma (psyché)? A
linguagem? O corpo? Ao longo da história da filosofia, diversos filósofos formularam sua
compreensão do que é o homem. Isso nos mostra que a nossa compreensão de homem
ocidental nasce na civilização Grega Antiga, há mais de 2 mil anos.
Bons estudos!
135
2 O HOMEM NA FILOSOFIA PRÉ-SOCRÁTICA
Inicialmente, os primeiros filósofos gregos, conhecidos como “cosmólogos”,
“naturalistas” ou “físicos”, se ocupavam com o problema filosófico de ordem do cosmos
(universo, astros). A totalidade do real era compreendida como physis (natureza) e cosmos.
Os filósofos pré-socráticos se questionavam: como surgiu o cosmos? Quais são as forças que
geram e movem o cosmos? Portanto, para pensar a individualidade do homem, segundo os
primeiros filósofos, era necessário primeiro compreender a physis e a ordem do mundo.
DICA
Você sabia que um dos primeiros filósofos jônicos independentes foi Heráclito
de Éfeso (500 a.C.). Heráclito foi um dos principais filósofos da Antiguidade
pré-socrática. A obra do filósofo caracterizou-se por iniciar um movimento de
ruptura na filosofia pré-socrática que, com as ideias dos eleatas, desembocaria
nas filosofias socrática, platônica e aristotélica. Heráclito defende que não há
unidade natural no mundo, mas duelos e dualidade constante. “O mundo
é um eterno devir”, afirma o filósofo, querendo dizer que há uma constante
mudança, imprevisível, que caracteriza a natureza. O pensador despreza a
noção de essência e defende que existe uma mutabilidade, surgida de vários
processos contínuos, que resulta no que é o mundo. Essa relação é composta
pelo duelo entre os contrários, o qual gera novas características. Por pensar
assim, Heráclito é considerado o “pai” da dialética. Disponível em: https://
brasilescola.uol.com.br/filosofia/heraclito.htm.
136
FIGURA 1 – DIÓGENES DE APOLÔNIA (440-423 A.C.)
FONTE: <http://3.bp.blogspot.com/-RC25OE10-xI/UWs_TkixJ5I/AAAAAAAAnE4/DJ-i0ku_MoM/s320/
Diogenes.jpg>. Acesso em: 24 jun. 2020.
137
3 OS SOFISTAS E A ANTROPOLOGIA FILOSÓFICA
Os sofistas aparecem na história da filosofia ocidental, como um grupo de
intelectuais itinerantes, considerados “sábios”, especialistas do saber. A acepção do
termo sofista (sophistês), engloba o saber teórico e as habilidades práticas, revelando
um deslocamento, um novo campo de problematização, que tem como perspectiva
o homem e suas capacidades. As práticas utilizadas pelos sofistas se baseavam nas
sutilezas da retórica, com objetivos de obter lucro e vantagens. Sem o interesse pela
verdade (alethéia), os sofistas ensinavam aos seus estudantes a arte da persuasão,
técnicas de discurso que explorava o sentimentalismo, essencial para quem aspirasse o
campinho da vida pública (política).
FIGURA 2 – OS SOFISTAS
FONTE: <https://3.bp.blogspot.com/-UYJjNKryftE/WYDyx1e8xZI/AAAAAAAAFUg/
xZEURjMvKqcnMctow0SD311-B5nakZXqQCLcBGAs/s1600/sofistas.jpg>. Acesso em: 24 jun. 2020.
138
a) o conceito de uma natureza humana (anthropinê physis) com seus
predicados próprios e com as exigências que lhe são essenciais;
b) o conceito de narração histórica pela investigação, seriação
e julgamento dos fatos, na qual emergem a consciência do
pluralismo das culturas (Heródoto) e se revelam as constantes
e fins que sustentam e movem o agir humano em situações
consideradas típicas (Tucídides);
c) a oposição entre a convenção (nómos) e a natureza (physis) na
organização da cidade e nas normas do agir individual, dando
origem às primeiras teorias do convencionalismo jurídico;
d) individualismo relativistas, acompanhado das primeiras
formulações céticas do conceito de verdade;
e) a concepção de um desenvolvimento progressivo da cultura,
exposta, sobretudo, no famoso mito de Protágoras que Platão nos
transmitiu no diálogo homônimo (Prot. 320 c-322d);
f) a análise do homem como ser de necessidade e carência, ao qual
compete suprir com a cultura o que lhe é negado pela natureza,
tema esse que alimentará o pensamento antropológico ao longo
de toda a sua história;
g) finalmente, a ideia fundamental do homem como ser dotado de
logos (zôon logikón), ou seja, da palavra e do discurso capaz de
demonstrar e persuadir.
139
O sofista mais destacado e que teve maior visibilidade no mundo grego
foi Protágoras. Nascido em Abdera (491 a.C.), o pensador viajou por toda a Grécia,
alcançando um enorme sucesso. Era bem visto por políticos, como Péricles que lhe
deu a missão de fazer a legislação para a nova colônia de Turi, em 444 a.C. Sua principal
obra, As Antilogias, foi conhecida apenas por testemunhos (REALE; ANTISERI, 1990).
FIGURA 3 – PROTÁGORAS
FONTE: <https://revjorgeaquino.files.wordpress.com/2016/07/protagoras.jpg?w=640>.
Acesso em: 25 jun. 2020.
140
4 A ANTROPOLOGIA SOCRÁTICA-PLATÔNICA
A figura de Sócrates representa a inflexão decisiva que orienta até hoje
o pensamento antropológico. A sua contribuição no campo da filosofia, da ética,
da política, da moral, do direito, é sentida até hoje. O filósofo nasceu em Atenas em
470/469 a.C. e morreu em 399 a.C., em decorrência de uma condenação de “impiedade”,
coordenada por membros políticos de Atenas. Acusado de corromper os jovens e de
não crer nos deuses da cidade, havia também por trás das acusações, ressentimentos e
manobras políticas. Sócrates tinha origem humilde, filho de um escultor e uma obstetriz
(parteira). Seu legado é conhecido por outros filósofos, pois não deixou nada escrito,
e, também, não fundou nenhuma escola filosófica como fizeram seus sucessores. Os
seus ensinamentos se deram em espaços públicos, como ginásios e praças, no qual
chamava a atenção e causava fascínio de jovens até pessoas de mais idade, o que lhe
custou muitas inimizades (REALE; ANTISSERI, 1990).
FIGURA 4 – SÓCRATES
FONTE: <https://www.mundociencia.com.br/wp-content/uploads/2016/07/socrates.jpg>.
Acesso em: 24 jun. 2020.
141
Segundo Vaz (1991 p. 34-35), as ideias centrais da antropologia filosófica de
Sócrates são:
Enquanto para Sócrates o homem teria como missão moral suprema o cuidado
com a alma, ou seja, o sujeito deveria realizar essa arte do cuidado sobre si, buscando
sempre a verdadeira areté, Platão insere um elemento místico, o cuidado da alma,
segundo ele, significa “purificação da alma”. Nesse sentido o filósofo grego, discípulo
de Sócrates, estabeleceu uma síntese entre a “tradição pré-socrática da relação do
homem com o cosmos, a tradição sofística do homem como ser de cultura (paideía)
destinado à vida política e à herança dominante de Sócrates do “homem interior” e da
“alma” (psyqué)” (VAZ, 1991, p. 36).
142
FIGURA 5 – PLATÃO
DICA
Segundo Abbagnano (2007), o Orfismo consistiu numa seita filosófico-religiosa
difundida na Grécia, a partir do século VI a.C., e que se julgava fundada por
Orfeu. Segundo a crença fundamental dessa seita, a vida terrena era uma
simples preparação para uma vida mais elevada, que podia ser merecida por
meio de cerimônias e de ritos purificadores, que constituíam o arcabouço
secreto da seita. Essa crença passou para várias escolas filosóficas da Grécia
Antiga (Pitágoras, Empédocles, Platão), mas a importância que alguns filólogos e
filósofos dos primeiros decênios do século XX atribuíram ao O., na determinação
das características da filosofia grega, já não é reconhecida por ninguém.
143
Reale e Antiseri (1990) apresentam dois paradoxos presentes no pensamento
antropológico de Platão.
O segundo paradoxo, diz respeito à fuga do mundo, ou seja, o homem deve tornar-
se virtuoso e se assemelhar a Deus. Para isso, deve-se buscar sempre fugir das ilusões e
malefícios que o mundo sensível produz, pois o mal é o oposto e contrário do bem, e sempre
estará presente na terra junto a natureza mortal do homem. Já no mundo inteligível o mal
não existe, pois não habita entre os deuses. Logo, fugir do mundo representa fugir de todo
o mal que o mundo representa, realizando essa fuga através da virtude e do conhecimento
para cada vez mais se assemelhar a Deus (REALE; ANTISERI, 1990).
5 A ANTROPOLOGIA ARISTOTÉLICA
O filósofo grego Aristóteles, discípulo de Platão, nasceu em 384/383 a.C.
em Estagira, na fronteira da macedônica. Com 18 anos, o jovem que já havia ficado
órfão, viajou para Atenas e ingressou na Academia de Platão. Na Academia, Aristóteles
consolidou sua visão filosófica de mundo, conheceu grandes cientistas da época, como
o célebre Eudóxio, permanecendo durante vinte anos, até a morte de Platão em 347 a.C.
Após a morte de Platão, Aristóteles não ficou satisfeito com os rumos que a Academia
144
platônica tinha tomado sob a direção de Espêusipo e decidiu viajar para Ásia Menor. Na
companhia de seu célebre colega Xenócrates, o filósofo fundou uma escola em conjunto
com os platônicos Erasto e Corisco. Por volta de 342 a.C. Aristóteles passou a integrar a
corte de Felipe da Macedônia, com o objetivo de cuidar da educação do filho do rei, cujo
nome era Alexandre (REALE; ANTISERI, 1990).
FIGURA 6 – ARISTÓTELES
INTERESSANTE
Você sabia que o filósofo Aristóteles foi contratado para cuidar da educação de
Alexandre, o Grande? Recentemente, a escritora Annabel Lyon lançou um livro
que recria a relação entre O Filósofo e o Imperador, colocando o foco na vida
de Aristóteles, reconhecido como um dos fundadores da filosofia ocidental. A
narrativa tem início quando Aristóteles se vê forçado a adiar o sonho de suceder
Platão como o líder da Academia em Atenas, para atender ao pedido de Filipe,
da Macedônia, tornando-se tutor de seu filho, Alexandre. No início, o filósofo fica
horrorizado com a perspectiva de ficar preso naquele lugar distante e atrasado
de sua infância, mas logo se sente atraído pelo potencial intelectual do menino
e por sua capacidade de surpreender. O que não sabe é se suas ideias seriam
páreo para a cultura guerreira incutida em Alexandre desde menino. O Filósofo
e o Imperador investiga como o gênio de Aristóteles afetou o garoto que iria
conquistar o mundo conhecido. Que tal aprofundar sua leitura nesse romance?
Acesse o site: https://www.bonde.com.br/entretenimento/literatura/livro-recria-
relacao-entre-aristoteles-e-alexandre-158061.html.
145
Aristóteles é considerado um dos fundadores da antropologia como ciência,
sendo o primeiro a realizar uma síntese científico-filosófica em sua concepção de
homem. Em termos gerais, pode-se dizer que a concepção de homem em Aristóteles,
caminhou desde um platonismo da psyché até um monismo hilemórfico (alma como
forma do corpo).
Entretanto, Aristóteles não deixa de lado sua inspiração platônica, no que diz
respeito à capacidade do homem de se elevar, através da theoría, à contemplação
das realidades transcendentes e eternas (VAZ, 1991). Segundo Vaz (1991), Aristóteles
define sua antropologia filosófica a partir de quatro aspectos fundamentais: a estrutura
biopsíquica do homem ou teoria da psyché; homem como zôon logikón; homem como
ser ético-político; e, por fim, homem como ser de paixão e de desejo.
NOTA
Você sabia que o termo "teoria" provém do verbo grego theorein? O substantivo
correspondente é theoria. Essas palavras têm, de próprio, uma significação
superior e misteriosa. Os gregos pensavam, isto é, recebiam da própria língua
grega e, de uma maneira única, seu modo de estar e ser no ser. Por isso,
junto ao lugar mais alto atribuído à theoria pelo ser vivente (bios) grego, eles
costumavam escutar ainda uma outra coisa na palavra. É que os dois étimos
thea e horaw podem ter outra acentuação: theá e ora. Theá é a deusa. Foi como
deusa que a aletheia apareceu ao pensador originário Parmênides. Traduzimos
aletheia pelo latim veritas, verdade, e pelo alemão wahrheit. A palavra grega
ora significa o respeito que temos, diz a honra e a consideração que damos.
Se pensarmos na palavra theoria a partir das últimas significações, a theoria se
torna a consideração respeitosa da revelação do vigente. Em sentido antigo,
originário, mas de forma alguma antiquado, a teoria é a visão protetora da
verdade (HEIDEGGER, 2002).
146
O segundo aspecto da antropologia aristotélica, refere-se ao homem como zôon
logikón, ou seja, o homem é um animal racional. A racionalidade distingue o homem
de todos os seres encontrados na natureza. Esse é o aspecto específico e peculiar do
homem, ser racional. Portanto, segundo Vaz (1991, p. 40), “enquanto ser dotado de logos
(da fala e do discurso), o homem transcende de alguma maneira a natureza e não pode
ser considerado um simples ser natural”. Aristóteles estuda intensamente o aspecto
racional do homem, especialmente nos tratados: De Anima, De Sensu et Sensibili, De
Memoria et Reminiscentia, De Vita et Morte, em seus livros sob o título de Órganon.
147
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
• Para Diógenes, o homem é superior aos outros animais. Isso se verifica na própria
constituição física do homem.
• Diógenes constrói, pela primeira vez, uma ideia de homem como estrutura corporal-
espiritual, na qual a sua natureza se manifesta na cultura por meio das suas obras,
seus feitos.
• Diógenes é considerado o filósofo que marca uma linha de transição com a primeira
filosofia pré-socrática do século VI, a.C., conhecida pelo problema da physis e pela
busca do princípio primeiro (arché).
• Os sofistas não tinham interesse pela verdade (alethéia), eles ensinavam aos seus
estudantes a arte da persuasão, técnicas de discurso que explorava o sentimentalismo.
• Para Protágoras, “o homem é a medida de todas as coisas, daquelas que são por
aquilo que são e daquelas de não são por aquilo que não são”.
• Para Sócrates, a alma é uma espécie de lugar, de morada para a areté (excelência ou
virtude), que possibilita medir o homem, segundo a dimensão interior na qual reside
a verdadeira grandeza humana.
148
• O pensamento antropológico de Platão deriva de sua teoria do mundo das ideias, no
qual concebe uma separação radical entre corpo e alma (psyché).
149
AUTOATIVIDADE
1 A civilização grega é o berço do humanismo. Nesse sentido, os filósofos gregos
buscavam definir e caracterizar uma ideia de Homem. O Homem era o centro do
pensamento grego. Isso se evidenciava nas produções artísticas, nas esculturas
antigas e nas reflexões filosóficas. Sobre o primeiro filósofo a abordar um pensamento
antropológico, assinale a alternativa CORRETA:
150
3 Sócrates foi um filósofo nascido em Atenas, em 469/470 a.C. e morreu em 399 a.C., em
decorrência de uma condenação de “impiedade” coordenada por membros políticos de
Atenas. Além disso, Sócrates sofreu acusações de corromper os jovens e de não crer nos
deuses da cidade, havia também por trás das acusações, ressentimentos e manobras
políticas. O filósofo grego não deixou nada escrito e não fundou nenhuma escola filosófica.
Sobre a antropologia filosófica socrática, analise as sentenças a seguir:
I- Na visão de Sócrates o homem teria como missão moral suprema a busca pelos
prazeres e a ausência da dor.
II- Sócrates é considerado o fundador da antropologia filosófica, bem como da filosofia
moral.
III- Para Sócrates, a alma é uma espécie de lugar, de morada para a areté (excelência ou
virtude), que possibilita medir o homem segundo a dimensão interior na qual reside
a verdadeira grandeza humana.
IV- Segundo a antropologia filosófica de Sócrates, é na alma que se constitui a verdadeira
essência do homem, sede de sua verdadeira areté.
151
152
UNIDADE 3 TÓPICO 2 -
A CONCEPÇÃO DE HOMEM NO PERÍODO
CRISTÃO-MEDIEVAL
1 INTRODUÇÃO
A concepção de homem no período cristão-medieval se situa no século VI ao
século XV, desdobrando-se em duas principais vertentes: a tradição bíblica e a tradição
filosófica grega. Nesse período, a noção de homem está estritamente vinculada ao
pensamento teológico cristão. O pensamento teológico cristão é aprofundado por dois
principais filósofos-teólogos da igreja, Santo Agostinho e São Tomás de Aquino.
153
Nas sociedades medievais o feudalismo estava integrado ao cristianismo, sendo
que a Europa inteira se considerava cristã e se organizava entorno de dois chefes: o
chefe espiritual – o papa –, e o chefe temporal – o imperador. Na Idade Média, o papa
não apenas ocupava um cargo religioso importante, mas era também uma autoridade
política suprema na Europa. A busca pela unidade cristã europeia, através do imperador
e o papado não se consolidou efetivamente ao longo da Idade Média, havendo inúmeras
disputas e divergências políticas entre essas duas figuras importantes na dinâmica das
sociedades medievais.
154
fragilidade inerente é recompensada nele pelo vigor de sua vitalidade; é “espírito”,
isto é, manifestação superior da vida e do conhecimento que permite estabelecer a
relação com Deus; é “coração”, ou seja, o interior do homem, sede dos afetos e das
paixões, em que se enraízam inteligência e vontade, sendo o lugar do pecado, mas
também da conversão a Deus.
NOTA
Afinal, o que é Soteriologia? Soteriologia é basicamente a doutrina da salvação.
Isto significa que a soteriologia é a área da teologia que estuda a salvação
em todos os seus aspectos. A palavra “soteriologia” vem dos termos gregos
soteria, “salvação” ou “livramento”; e logos, “palavra”. Há subdivisões dentro
da soteriologia que abordam a salvação em seus diferentes aspectos, tais
como: um plano eterno e obra remidora de Deus; a expiação no sangue de
Cristo; a operação da graça divina; o estado do homem em relação ao pecado;
a obra do Espírito Santo; e o destino final do homem. Disponível em: https://
estiloadoracao.com/o-que-e-soteriologia-a-doutrina-da-salvacao/.
INTERESSANTE
Você sabia que o Novo Testamento foi escrito orinariamente em grego? Todos os livros
do Novo Testamento (Evangelhos, Atos dos Apóstolos, Epístolas, e Apocalipse), à exceção
do Evangelho de S. Mateus, foram redigidos primeiramente em grego. O grego bíblico,
porém, difere em muitas particularidades do grego clássico. Com a expansão da civilização
helênica pelo mundo oriental, a língua grega se difundiu tão universalmente, através dos
povos conquistados, que veio a se chamar língua comum ou koiné (dialeto). A koiné era
um idioma eclético (vinda de várias fontes), proveniente da fusão dos vários dialetos.
155
Predominava, contudo, o dialeto Ático. Os livros do
Novo Testamento foram escritos não na koiné erudita
usada pelos escritores aticistas, como Plutarco e
Luciano, mas na koiné popular, diferente da primeira.
Distingue-se, no uso e seleção das palavras, S. Lucas
e S. Paulo. As obras de maior perfeição estilística são
a “Epístola aos Hebreus” e a “Epístola de S. Tiago;
as que mais se afastam da pureza de linguagem
são o Evangelho de S. Marcos e as obras de S. João,
sobretudo, o Apocalipse.
FONTE: <https://www.abiblia.org/ver.php?id=4323>.
Acesso em: 25 jun. 2020.
3 ANTROPOLOGIA PATRÍSTICA
A antropologia patrística desenvolve-se nos dois primeiros séculos da civilização
ocidental em oposição a algumas correntes filosóficas que tinham como base o
Gnosticismo. O Gnosticismo representava um desafio para a antropologia patrística, pois
pregava um dualismo que implicava na condenação da matéria, como um princípio do
mal. Além disso, colocava em xeque a tradicional visão cristã do mistério da Encarnação,
que tinha como fundamento o tema da “imagem e semelhança”. Nesse sentido, o
primeiro teólogo a combater as heresias preconizadas pelas correntes gnósticas, foi
Santo Irineu de Lião (século II), no qual expõe em sua obra Adversus Haereses (Contra
Heresias) o tema do homem como reflexo da glória de Deus (VAZ, 1991).
IMPORTANTE
O termo Gnosticismo consistiu em algumas correntes filosóficas que
se difundiram nos primeiros séculos depois de Cristo no Oriente e
no Ocidente. O G. é uma primeira tentativa de filosofia cristã, feita
sem rigor sistemático, com a mistura de elementos cristãos míticos,
neoplatônicos e orientais. Em geral, para os gnósticos, o conhecimento
era condição para a salvação. Esse nome foi adotado pela primeira vez
pelos Ofitas ou Sociedade da Serpente, que, mais tarde, dividiram-se
em numerosas seitas. Os principais gnósticos dos quais temos notícia
são: Basílides, Carpócrates, Valentim e Bardesane, cujas doutrinas
são conhecidas pelas refutações feitas por Clemente de Alexandria,
Irineu e Hipólito. Uma das teorias mais típicas do G. é o dualismo dos
princípios supremos (admitido, por exemplo, por Basílides), ligado a
concepções orientais. A tentativa de união entre os dois princípios,
bem e mal, tem como resultado o mundo, no qual as trevas e a luz se
unem, mas com predomínio das trevas (ABBAGNANO, 2007).
156
O pensamento patrístico se desdobra em duas principais vertentes: a patrística
grega e a patrística latina. Trataremos em especial da patrística latina, na qual se situa
a obra de Santo Agostinho (354-430), cuja concepção cristã do homem tornou-se
um marco decisivo na história da cultura ocidental. Agostinho foi o maior filósofo da
época patrística, sua contribuição se estendeu para o campo da filosofia, teologia,
dogmática, teologia moral e mística, do direito político e da política eclesiástica. Mas
quem foi Santo Agostinho?
FONTE: <https://img.cancaonova.com/cnimages/canais/uploads/sites/6/2006/08/formacao_
confira-algumas-frases-marcantes-de-santo-agostinho-768x576.jpg>. Acesso em: 24 jun. 2020.
157
A antropologia, ou seja, a visão de homem formulada por Santo Agostinho pode
ser sintetizada em três fontes principais: o neoplatonismo, a antropologia paulina e a
antropologia da narração bíblica da criação. Essas três fontes constituem a antropologia
agostiniana. O neoplatonismo, Agostinho teve acesso especialmente através de textos
de Plotino, Porfírio e do neoplatônico latino Mário Vitorino. A influência neoplatônica,
encontra-se em especial no livro VII das Confissões, e constitui a elaboração do tema da
estrutura do homem interior, no qual Deus está presente no “interior do homem”, mas,
também, como ser superior (interior intimo et superior summo, Conf. III, 6) (VAZ, 1991).
NOTA
Você já ouviu falar em Maniqueísmo? O Maniqueísmo consistiu em uma
doutrina do sacerdote persa Mani, que viveu no século III e proclamou-se
o Paracleto, aquele que devia conduzir a doutrina cristã a perfeição. O M. é
uma mistura imaginosa de elementos gnósticos, cristãos e orientais, sobre
as bases do dualismo da religião de Zoroastro. Admite dois princípios: um do
bem, ou princípio da luz, e outro do mal, ou princípio das trevas. No homem,
esses dois princípios são representados por duas almas: a corpórea, que é
a do mal, e a luminosa, que é a do bem. Pode-se chegar ao predomínio da
alma luminosa através de uma ascese particular, que consiste em três selos:
abstenção de alimentar-se de carne e de manter conversas impuras; abstenção
da propriedade e do trabalho; abster-se do casamento e do concubinato. O M.
foi muito difundido no Oriente e no Ocidente; aqui durou até o século VII. O
grande adversário do M. foi S. Agostinho, que dedicou grande número de obras
a sua refutação (ABBAGNANO, 2007).
158
A antropologia agostiniana compreende o homem como ser itinerante,
cuja visão está associada à concepção de tempo como caminho para a eternidade. A
concepção de homem como ser itinerante é essencial na antropologia de Agostinho,
pois é a representação do itinerário da humanidade simbolizado na figura das duas
cidades, da obra A Cidade de Deus (De Civitate Dei). Para Vaz (1991, p. 66), “a leitura
teológica da história humana apoia-se aí numa visão linear do tempo, não como mera
sucessão cronológica, mas segundo o modelo da vida humana, como crescimento
para a consumação final da segunda e definitiva manifestação do Cristo”. Logo, para
Agostinho, a concepção de história está orientada radicalmente para Deus.
159
FIGURA 8 – SÃO TOMÁS DE AQUINO
Em 1252, sob a indicação de Alberto Magno, Tomás de Aquino inicia sua carreira
acadêmica na Universidade de Paris. Após a sua experiência em Paris, Aquino passou
por diversas universidades da Europa (Colônia, Bolonha, Roma, Nápoles). Foi em Roma
que o Doutor da Igreja começou o seu maior empreendimento, a Summa Theologiae
(Suma Teológica). A maior obra de Aquino, que não foi terminada devido ao seu estado
de saúde. Tomás de Aquino morreu aos cinquenta e três anos, em 7 de março de 1274,
num mosteiro em Fossanova, quando viajava para Lião, para participar do Concílio de
Lião (REALE; ANTISSERI, 1990).
160
IMPORTANTE
O que é a Suma Teológica? Suma Teológica é o título da obra básica
de São Tomás de Aquino, frade, teólogo e santo da Igreja Católica,
um corpo de doutrina que se constitui numa das bases da dogmática
do catolicismo e considerada uma das principais obras filosóficas da
escolástica. Foi escrita entre os anos de 1265 a 1273. Na obra, Aquino
trata da natureza de Deus, das questões morais e da natureza de
Jesus. Disponível em: https://pt.aleteia.org/2017/04/17/sim-a-suma-
teologica-inteira-de-graca/.
Vale ressaltar que a filosofia tomista, no início de sua elaboração, teve forte
oposição da Igreja e das Universidades medievais, justamente porque se apresentava
como novidade em se opor à tradição agostiniana (filosofia de Sto. Agostinho), que era
marcada pelo platonismo. O maior aspecto da rejeição e, também, do espanto referente
à filosofia de Tomás de Aquino deriva do fato da dificuldade de conciliar as conclusões
da filosofia aristotélica com os dogmas revelados da tradição bíblica cristã. Entretanto,
isso não impediu que a filosofia tomista se tornasse, mais tarde, a filosofia oficial da
Igreja Católica, e a Suma Teológica fosse considerada a expressão máxima e acabada
da possível conciliação entre Fé e Razão (REZENDE, 1986).
161
NOTA
O hilemorfismo é a doutrina que Aristóteles concebeu para opor-se,
simultaneamente, ao idealismo platônico (notadamente em sua doutrina
das Ideias) e ao materialismo adotado por filósofos pré-socráticos, entre
os quais figuram, de modo proeminente, Demócrito e Leucipo, fundadores
do Atomismo, Empédocles e Anaxágoras.
162
NOTA
Você sabia que a palavra Eudaimonia se refere a uma doutrina que prega
a felicidade como a finalidade da vida humana? Segundo Aristóteles, a
felicidade é uma finalidade (telos) maior e comum a todos os seres racionais.
Assim, pode-se dizer que Tomás de Aquino realizou uma importante e profunda
síntese da tradição clássica e da tradição cristã no campo da antropologia. Os séculos
que se seguiram até o fim da Idade Média, foram marcados por novas tendências
do pensamento filosófico e teológico. Essas tendências se colocaram em oposição à
síntese antropológica de Tomás de Aquino, como o voluntarismo de Duns Escoto no
século XIV, o nominalismo que perdurou no século XV que buscou dissolver a síntese
medieval entre filosofia e teologia, preparando o terreno para a chegada da filosofia
moderna que irá elaborar uma nova concepção de homem.
NOTA
Você sabia que Duns Escoto foi beatificado, em 1993, pelo Papa João Paulo
II? Foi um filósofo e teólogo escocês, membro da Ordem Franciscana e
professor da Universidade de Paris. Formou-se na Universidade de Oxford
e, no desenvolvimento da sua obra, ergueu importantes contrapontos
ao pensamento de Santo Tomás de Aquino. É um dos mais importantes
pensadores de toda a escolástica, tendo sido mentor de Guilherme de
Ockham e precursor de uma longeva tradição filosófica chamada
de escotismo. Disponível em: https://ecclesiae.com.br/index.
php?route=product/author&author_id=1483.
163
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
• Na Idade Média, o papa não apenas ocupava um cargo religioso importante, mas era
uma autoridade política suprema na Europa.
• A cultura, na Idade Média, era, por excelência, teocêntrica, ou seja, Deus era a
centralidade de todas as ações, o valor supremo e o motor da história.
• A visão de homem formulada por Santo Agostinho pode ser sintetizada em três fontes
principais: o neoplatonismo, a antropologia paulina e a antropologia da narração
bíblica da criação.
• A antropologia de Agostinho entende o homem como ser uno e como ser itinerante.
164
AUTOATIVIDADE
1 A concepção de homem no período cristão-medieval se situa no século VI ao século
XV, desdobrando-se em duas principais vertentes: a tradição bíblica e a tradição
filosófica grega. Nesta época, a concepção de homem está ligada ao pensamento
teológico cristão. Diante do exposto, assinale a alternativa que apresenta os dois
principais filósofos-teólogos da igreja deste período:
165
3 São Tomás de Aquino (1221–1274), conhecido como ‘O Doutor da Igreja’ ou
simplesmente ‘O Aquinate’, foi um expoente da escolástica, considerado gênio
dos metafísicos, sua obra ainda hoje é muito estudada, sendo referência para os
candidatos ao sacerdócio que aspiram às ordens sagradas. Sobre a duas correntes de
pensamento que influenciou significativamente a antropologia tomista, assinale a
alternativa CORRETA:
166
UNIDADE 3 TÓPICO 3 -
A CONCEPÇÃO DE HOMEM NA
MODERNIDADE
1 INTRODUÇÃO
No fim do século XVII, vemos duas correntes moderna de pensamento
consolidadas: o racionalismo e o empirismo. Também, evidencia-se a superação da
cultura medieval, ainda que muitos filósofos modernos cultivam interesses em questões
da Idade Média. O mais evidente dessa ruptura com a cultura medieval, refere-se à
secularização da cultura, isto é, os filósofos racionalistas, como Descartes, Leibniz,
Malebranche não falam mais do Deus da revelação judaico-cristã, mas do Deus da
Razão. No caso dos filósofos empiristas, como em Locke ou em Hume, a distância
cultural com relação ao período medieval é ainda mais evidente.
Bons estudos!
167
2 O HOMEM NO RACIONALISMO DE DESCARTES
A Renascença foi o período que se estendeu do século XIV ao século XVI,
caracterizando-se como uma época do Humanismo. A valorização do homem através da
literatura clássica, sobretudo latina, e a defesa do valor da razão humana para descobrir
a verdade, bem como a exaltação da natureza física e a vida terrena. A antropologia na
Renascença também se caracteriza como uma antropologia de ruptura e de transição.
Ruptura com a imagem de homem judaico-cristã do período medieval e transição para
a imagem racionalista que predominará os séculos XVII e XVIII.
A partir do século XVI, tem-se o fim da Renascença e o início de uma nova forma
de pensar e sentir que será expressado em diversas formas de criação cultural. Segundo
Vaz (1991), esse novo modo de pensar e sentir é herdeiro e devedor do humanismo
renascentista e dele receberá influência direta através de importantes pensadores
moralistas da França do século XVI, por exemplo, o filósofo e humanista Michel de
Montaigne (1553–1592).
NOTA
Michel de Montaigne (1553–1592) era humanista e defendia um certo
número de teses sobre as quais sempre retoma em seus Ensaios. Tendo
uma vida dividida entre uma carreira jurídica e administrativa (foi prefeito
de Bordeaux, França), aproveitava-se dos retiros em seu castelo para se
isolar e escrever. O tema: a sabedoria. Ensaios é sua obra-prima, que
floresceu após 20 anos de reflexão. Consiste em um modo de pensar
crítico à sociedade do século XVI, embora aborde temas variados. Algumas
de suas teses são: 1- Toda ideia nova é perigosa; 2- Todos os homens
devem ser respeitados (humanismo); 3- No domínio da educação, deve-se
respeitar a personalidade da criança. Montaigne adotou o princípio grego
“conhece-te a ti mesmo”. Portanto, segundo ele, a escrita é um meio de
chegar a esse conhecimento de si. Disponível em: https://brasilescola.uol.
com.br/filosofia/as-ideias-michel-montaigne.htm.
168
Esse ambiente formativo, de orientação jesuítica e de abertura para as ciências
e a matemática, causou insatisfação e confusão em Descartes. Em pouco tempo, o
estudante francês já visualizava o abismo que existia entre aquela orientação cultural
da época e as novidades científicas e filosóficas que estavam brotando em toda Europa.
Descartes, logo percebeu “a ausência de uma séria metodologia, capaz de instituir,
controlar e ordenar as ideias existentes e guiar a buscar da verdade” (REALE; ANTESERI,
1990, p. 354).
FONTE: <https://cdn.universoracionalista.org/wp-content/uploads/2017/07/renc3a9_descartes-
filc3b3sofo-francc3aas-696x517.jpg>. Acesso em: 24 jun. 2020.
169
Segundo o método de Descartes, é por meio da busca pelo conhecimento
verdadeiro, que o homem se voltar para si mesmo. Para ele, a única maneira clara
e distinta do eu pensar a alma é como princípio de pensamento, ou seja, como res
cogitans; e a única maneira de se pensar o corpo é concebê-lo como extensão, isto é,
como res extensa. Assim, procedendo, Descartes concebe a realidade como dualista:
pois de um lado há a substância pensante (res cogitans) – mente ou espírito –, e de
outro há a substância – corpo ou matéria.
NOTA
Galileu Galilei (1564–1642) foi um físico, matemático, astrônomo e
filósofo italiano. Foi uma personalidade fundamental na revolução
científica. Desenvolveu os primeiros estudos sistemáticos do movimento
uniformemente acelerado e do movimento do pêndulo. Descobriu a lei
dos corpos e enunciou o princípio da inércia e o conceito de referencial
inercial, ideias precursoras da mecânica newtoniana. Galileu melhorou
significativamente o telescópio refrator e, com ele, descobriu as manchas
solares, as montanhas da Lua, as fases de Vénus, quatro dos satélites de
Júpiter, os anéis de Saturno, as estrelas da Via Láctea. Essas descobertas
contribuíram decisivamente na defesa do heliocentrismo. Contudo, a
principal contribuição de Galileu foi para o método científico, pois a ciência
assentava numa metodologia aristotélica. O método empírico, defendido
por Galileu, constitui um corte com o método aristotélico mais abstrato
utilizado nessa época, devido a ele, Galileu é considerado como o "pai
da ciência moderna". Disponível em: http://www.filosofia.seed.pr.gov.br/
modules/galeria/detalhe.php?foto=532&evento=6.
170
Na obra Discurso do método (1637), Descartes explicita a estrutura fundamental
da antropologia racionalista. Nela, segundo o filósofo, há de um lado o “espírito”, cujo
existir se manifesta na existência do Cogito, e de outro, tem-se o corpo obedecendo
aos movimentos e às leis que impelem à máquina no mundo. Na ideia do Cogito,
está implicado uma nova relação do “espírito” com o mundo que define uma nova
concepção de homem: a concepção moderna de homem. Deste modo, o mundo não é
mais identificado com a physis (natureza) antiga dotada de um princípio imanente de
movimento, mas é (na modernidade) uma grande máquina capaz de ser analisada pela
razão e por ela reproduzida na forma de um modelo matemático. Na visão de Vaz (1991,
p. 84-85), “uma consequência importante da antropologia racionalista é o progressivo
atenuar-se da distinção entre “natural” e “artificial (entre physis e a téchne) que era um
dos fundamentos da visão aristotélica do mundo”.
171
DICA
Em 1654, depois de quase morrer em um acidente de carruagem e
passar por uma experiência mística, Pascal decidiu se consagrar a Deus
e à religião. Elegeu, como seu guia espiritual, o padre jansenista Singlin
e, em 1665, recolheu-se à abadia de Port-Royal des Champs, centro
do jansenismo. Nesse período, elaborou os princípios de sua doutrina
filosófica, centrada na contraposição dos dois elementos básicos e não
excludentes do conhecimento: de um lado, a razão com suas mediações
que tendem ao exato, ao lógico e discursivo (espírito geométrico). Do outro
lado, a emoção ou o coração, que transcende o mundo exterior, intuitiva,
capaz de aprender o inefável, o religioso e o moral (espírito de finura).
Pascal resumiu sua doutrina filosófica na frase que a humanidade repete
há séculos, na qual nomeia os dois elementos do conhecimento – a razão
e a emoção. Disponível em: https://www.ebiografia.com/blaise_pascal/>.
FIGURA 10 – BLAISE PASCAL “O CORAÇÃO TEM RAZÕES QUE A PRÓPRIA RAZÃO DESCONHECE"
172
mas sim na busca pelas descobertas das regras do bien peser (bem pensar): descobrindo
sua dimensão moral. Diferentemente de Descartes, a proposta antropológica de Pascal,
constrói-se tendo em vista a situação do homem e não a verdade na ciência.
DICA
A filosofia de Hobbes foi muito influenciada pelas ideias de Francis
Bacon (1561–1626), de quem foi secretário pessoal durante alguns
anos, e Galileu Galilei (1564–1642). Como estes, abandonou as grandes
pretensões metafísicas (a busca pela essência do ser) e buscou investigar
as causas e propriedades das coisas. A filosofia, para ele, seria a “ciência
dos corpos”, isto é, tudo aquilo que tem existência material. Os corpos se
dividem em “corpos naturais” (filosofia da natureza) e “corpo artificial” ou
“Estado” (filosofia política). Assim, tudo o que não é corpóreo seria excluído
da filosofia como não filosofia. Hobbes é considerado como o primeiro
materialista moderno. Para o filósofo inglês, toda a realidade poderia ser
explicada a partir de dois elementos: do “corpo”, entendido como elemento
material que existe, independentemente do nosso pensamento, e do
“movimento”, que pode ser determinado matemática e geometricamente.
Assim, a qualidade das coisas seriam “fantasmas do sensível”, ou seja,
efeitos dos corpos e de seus movimentos. As principais características do
empirismo hobbesiano são, portanto, o “materialismo” e o “mecanicismo”.
Disponível em: https://conhecerepensar.wordpress.com/2016/11/07/
thomas-hobbes-materialismo-natureza-humana-e-politica/.
173
FIGURA 11 – THOMAS HOBBES
FONTE: <https://lapiedradesisifo.com/wp-content/uploads/2017/09/Thomas-Hobbes-300x194.
jpg>. Acesso em: 24 jun. 2020.
174
DICA
John Locke (1632–1704) foi um dos principais empiristas britânicos com
Thomas Hobbes, George Berkeley e David Hume. Sua filosofia reconhece
a experiência como a única fonte válida de conhecimento. Segundo ele, a
sensação ou a experiência externa, e a reflexão ou a experiência interna,
constituem duas fontes de conhecimento, originando-se ideias simples,
produtos da sensação, e ideias complexas, provenientes da reflexão. John
Locke negava radicalmente que existiam ideias inatas, tese defendida por
Descartes. Argumentava ele, que quando se nasce, a mente é uma página
em branco que a experiência vai preenchendo. Sua teoria do conhecimento
foi exposta em sua obra fundamental: Ensaio Sobre o Conhecimento
Humano. Disponível em: https://www.ebiografia.com/john_locke/.
John Locke tece sua crítica a teoria cartesiana das ideias inatas que afirma
existirem no homem todas as disposições naturais para, usando de suas próprias
capacidades, chegar ao conhecimento de Deus, da natureza e de si mesmo como
ser moral. Entretanto, o naturalismo de Locke não se manifesta em confronto ao
cristianismo. Ao contrário, Locke se mostra um propagador da tolerância religiosa e se
esforçará para evidenciar o caráter razoável do cristianismo, preparando o caminho
para o desenvolvimento do deísmo no século XVIII. A antropologia de John Locke se
fundamenta, portanto, através de sua teoria empirista do conhecimento. Segundo Vaz
(1991), a rejeição das ideias inatas tem como consequência direta a crítica do Cogito
cartesiano e uma concepção de consciência de si como manifestação da identidade
pessoal que põe em destaque a sua estrutura psicológica em âmbitos muito mais
amplos do que os limites apodíticos do Eu penso.
175
Desse modo, o empirismo de Locke, com a primazia conferida ao indivíduo,
também é o fundamento de sua teoria política, na qual influenciará fortemente o
pensamento liberal moderno. Há um paradoxo presente no pensamento político de
Locke: por um lado, há o indivíduo que na sua condição de soberano deve renunciar a
sua absoluta soberania, pois alguns de seus direitos serão transferidos para o Estado
ou serão limitados pela soberania da lei. Nesse sentido, para Locke, a sociedade política
que garante o bem de todos, aparece como um liame nocivo para cada indivíduo, em
contraste à sociedade harmônica e pacífica do “estado de natureza”. Nessas condições,
não restará ao indivíduo outra opção para reencontrar sua autonomia, senão recolher-
se ao isolamento de sua vida privada (VAZ, 1991).
176
respeito à natureza e, ao mesmo tempo, ao homem. “[...] O homem não se reduz à razão,
mas tudo aquilo que lhe diz respeito pode ser indagado através da razão: princípios
do conhecimento, comportamentos éticos, estruturas e instituições políticas, sistemas
filosóficos e crenças religiosas” (REALE; ANTISERI, 1990, p. 674).
177
1- A linha propriamente antropológica, que está inserida no curso de Metafísica
professado por Kant. Nesta linha, Kant introduz, a partir de 1762, uma modificação
decisiva no melhor estilo da Ilustração, colocando no início o estudo empírico do
homem do qual fornece o título de Antropologia.
2- A linha crítica que segue o desenvolvimento da reflexão crítica a partir da Dissertação
de 1770; essa tarefa crítica abrange três atividades superiores do homem: a razão
teórica, a razão prática e a faculdade de julga. Essas três atividades constituem uma
nova imagem do homem transmitida pelo racionalismo clássico.
178
3- Linha da estrutura histórica ou do destino do homem, que o acompanha em duas
direções fundamentais: religiosa, que aponta para o fim último do homem; e a
pedagógica-política que Kant desenvolveu em seus numerosos opúsculos sobre
Filosofia da história, política e pedagogia.
179
LEITURA
COMPLEMENTAR
RESPOSTA À PERGUNTA: “O QUE É O ILUMINISMO?”
Apresentação
Immanuel Kant
180
A preguiça e a cobardia são as causas de os homens em tão grande parte, após
a natureza os ter há muito libertado do controlo alheio (naturaliter maiorennes), [482]
continuarem, todavia, de bom grado menores durante toda a vida; e também de a outros
se tornar tão fácil assumir-se como seus tutores. É tão cômodo ser menor. Se eu tiver
um livro que tem entendimento por mim, um diretor espiritual que, em vez de mim, tem
consciência moral, um médico que, por mim, decide da dieta etc., então, não preciso de
eu próprio me esforçar. Não me é forçoso pensar, quando posso simplesmente pagar;
outros empreenderão por mim essa tarefa aborrecida. Porque a imensa maioria dos
homens (inclusive todo o belo sexo) considera a passagem à maioridade difícil e também
muito perigosa, é que os tutores de bom grado tomaram a seu cargo a superintendência
deles. Depois de terem, primeiro, embrutecido os seus animais domésticos e evitado
cuidadosamente que estas criaturas pacíficas ousassem dar um passo para fora da
carroça em que as encerraram, mostram-lhes, em seguida, o perigo que as ameaça se
tentarem andar sozinhas. Ora, este perigo não é assim tão grande, pois acabariam por
aprender muito bem a andar. Só que um tal exemplo intimida e, em geral, gera pavor
perante todas as tentativas ulteriores.
181
Para essa ilustração, nada mais se exige do que a liberdade; e, claro está, a
mais inofensiva entre tudo o que se pode chamar liberdade, a saber, a de fazer um uso
público da sua razão em todos os elementos. Agora, porém, de todos os lados ouço
gritar: não raciocines! Diz o oficial: não raciocines, mas faz exercícios! Diz o funcionário
de Finanças: não raciocines, paga! E o clérigo: não raciocines, acredita! (apenas um único
senhor no mundo diz: raciocinai tanto quanto quiserdes e sobre o que quiserdes, mas
obedecei!). Por toda a parte se depara com a restrição da liberdade. Qual é a restrição
que se opõe ao Iluminismo? Qual a restrição que o não impede, antes o fomenta?
Respondo: — o uso público da própria razão deve sempre ser livre e só ele pode, entre
os homens, levar a cabo a ilustração [485]; mas o uso privado da razão pode, muitas
vezes, coarctar-se fortemente sem que, no entanto, se entrave assim notavelmente o
progresso da ilustração. Por uso público da própria razão entendo aquele que qualquer
um, enquanto erudito, dela faz perante o grande público do mundo letrado. Chamo uso
privado aquele que alguém pode fazer da sua razão num certo cargo público ou função
a ele confiado. Ora, em muitos assuntos que têm a ver com o interesse da comunidade,
é necessário um certo mecanismo em virtude do qual alguns membros da comunidade
se comportarão de um modo puramente passivo com o propósito de, mediante uma
unanimidade artificial, serem orientados pelo governo para fins públicos ou de, pelo
menos, serem impedidos de destruir tais fins.
O cidadão não pode recusar-se a pagar os impostos que lhe são exigidos; e
uma censura impertinente de tais obrigações, se por ele devem ser cumpridas, pode
mesmo punir-se como um escândalo (que poderia causar uma insubordinação geral).
Apesar disso, não age contra o dever de um cidadão se, como erudito, ele expuser
as suas ideias contra a inconveniência ou também a injustiça de tais prescrições. Do
mesmo modo, um clérigo está obrigado a ensinar os instruindo de catecismo e a sua
comunidade em conformidade com o símbolo da Igreja, a cujo serviço se encontra, pois
ele foi admitido com esta condição. Como erudito, tem plena liberdade e até a missão
de participar ao público todos os seus pensamentos cuidadosamente examinados e
bem-intencionados sobre o que de errôneo há naquele símbolo, e as propostas para
uma melhor regulamentação das matérias que respeitam à religião e à igreja. Nada aqui
existe que possa constituir um peso na consciência. Com efeito, o que ele ensina em
182
virtude da sua função, como ministro da Igreja, expõe-no como algo em relação [487] ao
qual não tem o livre poder de ensinar segundo a sua opinião própria, mas está obrigado
a expor segundo a prescrição e em nome de outrem. Dirá: a nossa Igreja ensina isto ou
aquilo; são estes os argumentos comprovativos de que ela se serve.
Seria decerto possível, na expectativa, por assim dizer, de uma lei melhor, por
um determinado e curto prazo, para introduzir uma certa ordem. Ao mesmo tempo,
facultar-se-ia a cada cidadão, em especial ao clérigo, na qualidade de erudito, fazer
publicamente, isto é, por escritos, as suas observações sobre o que há de errôneo nas
instituições anteriores; entretanto, a ordem introduzida continuaria em vigência até que
o discernimento da natureza de tais coisas se tivesse de tal modo difundido e testado
183
publicamente que os cidadãos, unindo as suas vozes (embora não todas), poderiam
apresentar a sua proposta diante do trono a fim de protegerem as comunidades que,
de acordo com o seu conceito do melhor discernimento, se teriam coadunado numa
organização religiosa modificada, sem todavia impedir os que quisessem ater-se à
antiga. É de todo interdito coadunar-se numa constituição religiosa pertinaz, por
ninguém posta publicamente em dúvida, mesmo só durante o tempo de vida de um
homem e deste modo aniquilar, por assim dizer, um período de tempo no progresso da
humanidade para o melhor e torná-lo infecundo e prejudicial para a posteridade. Um
homem, para a sua pessoa, [490] e mesmo então só por algum tempo, pode, no que lhe
incumbe saber, adiar a ilustração, mas renunciar a ela, quer seja para si, quer ainda mais
para a descendência, significa lesar e calcar aos pés o sagrado direito da humanidade.
O que não é lícito a um povo decidir em relação a si mesmo menos o pode ainda
um monarca decidir sobre o povo, pois a sua autoridade legislativa assenta precisamente
no fato de a sua vontade unificar a vontade conjunta do povo. Quando ele vê que toda
a melhoria verdadeira ou presumida coincide com a ordem civil, pode então permitir
que em tudo o mais os seus súbditos façam por si mesmos o que julguem necessário
fazer para a salvação da sua alma. Não é isso que lhe importa, mas compete-lhe obstar
a que alguém impeça à força outrem de trabalhar segundo toda a sua capacidade
na determinação e fomento da mesma. Constitui até um dano para a sua majestade
imiscuir-se em tais assuntos, ao honrar com a inspeção do seu governo os escritos em
os seus súbditos procuram clarificar as suas ideias, quer quando ele faz isso a partir
do seu discernimento superior, pelo que se sujeita à censura ‘Caesar non est supra
grammaticos’ quer também, e ainda mais, quando rebaixa o seu poder supremo a ponto
de, no seu Estado, apoiar o despotismo espiritual de alguns tiranos [491] contra os
demais súbditos.
Se, pois, se fizer a pergunta – Vivemos nós agora numa época esclarecida? – a
resposta é: não, mas vivemos numa época do Iluminismo. Falta ainda muito para que os
homens tomados em conjunto, da maneira como as coisas agora estão, se encontrem
já numa situação ou nela se possam apenas vir a pôr de, em matéria de religião, se
servirem bem e com segurança do seu próprio entendimento, sem a orientação de
outrem. Temos apenas claros indícios de que se lhes abre agora o campo em que podem
atuar livremente, e diminuem pouco a pouco os obstáculos à ilustração geral ou à saída
dos homens da menoridade de que são culpados. Assim considerada, esta época é a
época do Iluminismo, ou o século de Frederico.
Um príncipe que não acha indigno de si dizer que tem por dever nada prescrever
aos homens em matéria de religião, mas deixar-lhes aí a plena liberdade, que, por
conseguinte, recusa o arrogante nome de tolerância, é efetivamente esclarecido e
merece ser encomiado pelo mundo grato e pela posteridade como aquele que, pela
primeira vez, libertou o género humano da menoridade, pelo menos por parte do governo,
e concedeu a cada qual a liberdade de se [492] servir da própria razão em tudo o que é
assunto da consciência. Sob o seu auspício, clérigos veneráveis podem, sem prejuízo do
184
seu dever ministerial e na qualidade de eruditos, expor livre e publicamente ao mundo
para que este examine os seus juízos e as suas ideias que, aqui ou além, afastam-se do
símbolo admitido; mas, mais permitido é ainda a quem não está limitado por nenhum
dever de ofício. Este espírito de liberdade difunde-se também no exterior, mesmo
onde entra em conflito com obstáculos externos de um governo que a si mesmo se
compreende mal. Com efeito, perante tal governo brilha um exemplo de que, no seio da
liberdade, não há o mínimo a recear pela ordem pública e pela unidade da comunidade.
Os homens libertam-se pouco a pouco da brutalidade, quando de nenhum modo se
procura, de propósito, conservá-los nela.
185
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
• Para Descartes, na ideia do Cogito, está implicada uma nova relação do “espírito”
com o mundo, que define uma nova concepção de homem: a concepção moderna
de homem.
186
• Uma das obras que representa fortemente o espírito da transformação da ideia do homem
ocidental no limiar da idade moderna é a de Blaise Pascal (1623–1662).
• Tanto para Pascal como para Descartes, a dignidade do homem reside no pensamento.
• O Cogito, na visão de Pascal, não se volta para a dominação do mundo, mas sim na
busca pelas descobertas das regras do bien peser (bem pensar): descobrindo sua
dimensão moral.
• Para Hobbes, a filosofia seria a “ciência dos corpos”, isto é, tudo aquilo que tem
existência material. Os corpos se dividem em “corpos naturais” (filosofia da natureza)
e “corpo artificial” ou “Estado” (filosofia política).
• John Locke tece sua crítica diante da teoria cartesiana das ideias inatas, que afirma
existirem no homem todas as disposições naturais para, usando de suas próprias
capacidades, chegar ao conhecimento de Deus, da natureza, e de si mesmo como
ser moral.
• Na visão do filósofo alemão Immanuel Kant, o uso da razão iluminista é o uso público.
187
• Os dois planos epistemológicos sobre os quais se constrói a concepção kantiana de
homem são: o plano de uma ciência de observação e o plano de uma ciência a priori.
188
AUTOATIVIDADE
1 O racionalismo e o empirismo estabeleceram as bases para o desenvolvimento do
pensamento idealista de Immanuel Kant. A filosofia kantiana instaura a revolução no
campo do conhecimento, modificando os rumos da filosofia ocidental. Nesse sentido,
a obra de Kant representa uma das importantes correntes da Ilustração (Iluminismo).
Sobre a ideia kantiana de antropologia, assinale a alternativa CORRETA:
189
3 Com o filósofo René Descartes (1596–1650), a antropologia racionalista moderna
encontrará sua expressão paradigmática, de modo que poderá falar do homem
racionalista ou do homem cartesiano. Na obra Discurso do método (1637), Descartes
explicita a estrutura fundamental da antropologia racionalista. Sobre a antropologia
racionalista de Descartes, assinale a alternativa CORRETA:
190
REFERÊNCIAS
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HOEBEL, E. Adamson & FROST, Everest L. Antropologia cultural e social. São Paulo:
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LARAIA, R.B. Cultura, um conceito antropológico. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004.
191
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