D. Sebenta (Mariana Tralhão)

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DIREITO DA UNIÃO EUROPEIA II

COMPETÊNCIA CONTENCIOSA
O Tribunal de Justiça da União Europeia dispõe de competência contenciosa, dirimindo
litígios entre:
1. Instituições, órgãos ou organismos da União Europeia;
2. Estados Membros;
3. Entre Estados Membros e instituições, órgãos ou organismos da União Europeia.

Funções do Tribunal de Justiça da União Europeia:


1. Jurisdição internacional – responsabilidade dos Estados Membros;
2. Jurisdição constitucional – interpretação e validade do direito derivado em função
do direito originário;
3. Jurisdição administrativa – validade dos atos;
4. Jurisdição cível – responsabilidade da União Europeia;
5. Jurisdição laboral – funcionários e agentes.

Deve destacar-se que a competência genérica do Tribunal de Justiça da União Europeia


pretende garantir um direito fundamental à ação e a um tribunal, consagrado:
 Constituição da República Portuguesa – art. 20º;
 Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia – art. 47º;
 Tratado da União Europeia – art. 19º/1.

Com o Tratado de Lisboa reconhece-se ao Tribunal Geral a competência em primeira


instância nos recursos de anulação, ações para cumprimento, ações de responsabilidade
civil extracontratual ou contratual (art. 256º TFUE). Excecionados ficam os recursos
atribuídos em primeira instância a um tribunal especializado ou reservados para o
Tribunal de Justiça pelo respetivo estatuto.

Meios processuais de recurso ao Tribunal:


 Respeito pelo direito da União Europeia pelos Estados Membros:
 Ação de incumprimento:
 Respeito institucional do direito da União Europeia:
 Recurso de anulação;
 Ação por omissão;
 Exceção de ilegalidade.

Mariana Tralhão
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AÇÃO POR INCUMPRIMENTO

Nesta ação (arts. 258º a 260º TFUE), o Tribunal de Justiça tem o poder de declarar a
infração do direito da União Europeia por parte dos Estados membros. Subjacente ao
mesmo está a compreensão da União Europeia como comunidade de direito, juntamente
com o princípio pacta sunt servanda, que se consubstancia no princípio da cooperação leal
(art. 4º/3 TUE).
O Tribunal de Justiça (o Tribunal Geral não tem competência) declara que um Estado
Membro não cumpriu as suas obrigações à luz do direito da União, tais como:
 Uma Diretiva não foi transposta a tempo ou a transposição foi feita de forma
incorreta;
 Uma entidade pública violou disposições comunitárias:
 Diretamente;
 Indiretamente (ex: por não controlar atividades desenvolvidas por
privados);
 Ativamente (ex: adotando atos contrários ao direito da União);
 Por omissão (ex: ao não revogar ou anular um ato contrário ao direitoda
União, quando o devia ter feito).
 Não se respeitou um acórdão do Tribunal de Justiça;
 A adoção de medidas de implementação pelo Estado-membro não foi notificada à
Comissão, estando prevista essa obrigação.

PRÉ-CONTENCIOSO
Existe necessariamente um período pré-contencioso (administrativo):
 Ou iniciado pela Comissão – art. 258º TFUE;
 Ou iniciado por um Estado-membro, mas conduzido pela Comissão (situação
pouco frequente – apenas três na história) – art. 259º TFUE.
 Não pode ser iniciado por entidades privadas, mas estas podem dar
conhecimento de uma situação de infração, à Comissão, podendo esta
recolher informações e eventualmente dar início a um procedimento pré-
contencioso.
 Há especiais obrigações da Comissão perante os denunciantes.
O objetivo deste período é dar aos Estados-membros a oportunidade de remediarem o
incumprimento antes da ação ser iniciada perante o Tribunal de Justiça (aproximação
preventiva).
 No entanto, existem situações especiais em que não há uma específica fase
contenciosa: art. 70º (espaço de liberdade, segurança e justiça); art. 108º/2
(ajudas de Estado); e art. 114º/9 (mercado interno).

Deve realçar-se que esta é uma faculdade (ou direito) e não uma obrigação. Se a Comissão
assume normalmente o ónus de uma tal decisão (art. 258º TFUE), que se inclui ainda no
âmbito geral das suas competências enquanto “guardiã dos Tratados” (art. 17º/1 TUE), tal

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DUEII 2º ano

não lhe impõe uma obrigação, antes se traduzindo no exercício de um poder


discricionário não sindicável jurisdicionalmente por parte dos particulares queixosos,
nem sujeito a qualquer prazo prescricional.
 Questiona-se se se deverá falar de responsabilidade da Comissão ou dos
Comissários, sendo que o funcionamento da Comissão rege-se pelo princípio da
colegialidade, que assenta na igualdade dos membros da Comissão relativamente à
participação na tomada de decisões e implica que as mesmas sejam tomadas em
comum e que todos os membros do órgão colegial sejam coletivamente
responsáveis, no plano político, pelo conjunto das decisões. Ainda que de forma
mitigada, este princípio aplica-se à emissão de parecer fundamentado e ao início
da ação judicial.

PROCEDIMENTO
Processo pré-contencioso
 Carta de notificação para cumprimento: o objetivo é identificar uma alegada
violação de direito da União Europeia (que definirá o objeto do litígio) e conferir
um prazo para os Estados membros apresentarem as suas observações ou fazerem
cessar a situação de incumprimento.
 Deve dar-se um período de tempo razoável aos Estados membros, para apresentar
as suas observações. Todavia, é a Comissão que define este prazo, ainda que se
possa solicitar a sua prorrogação (em regra, este prazo é de dois meses).
 Os Estados membros devem responder à Comissão. Esta resposta é entendida
como obrigatória (um ónus administrativo).
 Se após estes trâmites iniciais a Comissão considerar que os comentários dos
Estados membros são insuficientes, deve emitir um parecer fundamentado no qual
se constate o incumprimento e se identifiquem as medidas que lhe permitem pôr
termo.
 A Comissão deve prescrever ainda no parecer fundamentado qual o período de
tempo que os Estados têm para cumprir o parecer fundamentado. De notar que,
sendo um parecer, os Estados não são obrigados a cumpri-lo, ainda que, de tal
forma, se sujeitam à efetiva propositura da ação por parte da Comissão.
 Há diferenças no processo pré-contencioso consoante o tipo de entidade que lhe
deu início (Comissão ou Estado membro):
 Iniciativa proveniente da Comissão:
▫ O procedimento desenrola-se entre esta e o Estado membro;
▫ Não se estabelece qualquer prazo para o parecer fundamentado ser
emitido;
▫ A Comissão pode iniciar uma ação perante o Tribunal de Justiça
(poder discricionário), se o parecer fundamentado não for
respeitado.
 Iniciativa proveniente de Estado membro:
▫ O procedimento pré-contencioso é também desenvolvido pela
Comissão;
▫ A Comissão tem três meses para proferir um parecer
fundamentado;

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DUEII 2º ano

▫ A ausência de parecer fundamentado (emitido no prazo pela


Comissão) não impede o início de um procedimento contencioso,
pelo Estado membro queixoso (o mesmo já não parecendo suceder
se o parecer for negativo, isto é, se for emitido no sentido de que
não há violação).

Processo contencioso
Sem grandes detalhes, devem destacar-se dois aspetos relativos a:
 Identidade entre a fase pré-contenciosa e a fase contenciosa: o Tribunal de Justiça
não considerará uma causa de incumprimento (acusação) que não tenha sido
formulada no parecer fundamentado.
 Ónus de prova nestas ações: compete à Comissão (ou ao Estado membro autor) a
prova de que ocorreu uma violação de direito da União, por isso, a acusação
formulada deve ser consistente.
No termo deste processo, o Tribunal de Justiça tanto poderá considerar procedente o
pedido da Comissão condenando o Estado-membro, como poderá absolver o Estado, na
hipótese contrária.
 Devido à limitação das suas competências, o Tribunal de Justiça limita-se a
declarar o incumprimento. Ele não anula o ato nacional ou força o Estado a agir de
uma determinada maneira, sendo que não pode substituir-se às autoridades
nacionais na revogação e desaplicação das normas e medidas nacionais em causa:
Por isso o julgamento tem apenas natureza declarativa e não confere direitos aos
indivíduos.
 O Estado deve tirar todas as interferências da decisão do Tribunal de Justiça,
compatibilizando a sua ação com a mesma. Contudo, não existe um prazo
estabelecido nos Tratados para que essa compatibilização ocorra, ainda que deva
ter lugar o mais rapidamente possível (princípio da cooperação sincera) – art.
260º/1. Por isso, há quem fale de acórdãos “condenatórios” do TJ.
 Se o Estado membro não se compatibilizar com a decisão do TJ:
 O Estado membro encontra-se a infringir duplamente direito da União,
porque, para além da reiteração do incumprimento, se encontra a
desrespeitar a decisão judicial;
 Se o Tribunal considera que o Estado membro não cumpriu a sua decisão,
pode numa segunda ação por incumprimento impor uma quantia fixa ou
uma sanção pecuniária compulsória, adequada ao caso (art. 260º/2).
▫ Contudo, este artigo contempla um encurtamento da fase pré-
contenciosa do segundo processo por incumprimento, dado que
não é necessário um parecer fundamentado pela Comissão.
▫ Este órgão pode, após ter dado ao Estado em causa a possibilidade
de apresentar as suas observações (notificação por
incumprimento), propor uma ação por incumprimento no Tribunal
de Justiça da União, indicando o montante da quantia fixa ou
progressiva a pagar pelo Estado membro, que considerar adequada
às circunstâncias,
▫ Se o Tribunal declarar verificado que o Estado membro em causa
não deu cumprimento ao seu acórdão, pode, nesta segunda ação,

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condená-lo ao pagamento de uma quantia fixa ou progressiva


correspondente a uma sanção pecuniária.
▫ Este entendimento levou o TJ a considerar-se livre para fixar
sanções pecuniárias.

Com o Tratado de Lisboa foi criado um regime especial da primeira ação por
incumprimento, simultaneamente declarativa e condenatória, apenas para o caso do
incumprimento formal da obrigação de comunicação de medidas de transposição de uma
Diretiva – art. 260º/3.
Este tipo específico de ação de incumprimento afigura-se criticável pela negativa e pela
positiva:
 Negativa – por idêntico mecanismo não ter sido estendido a outras situações de
incumprimento nas quais se continua a ter de recorrer a duas ações sucessivas, no
caso da persistência da ação;
 Positiva – porque o TJ fica limitado a condenar o Estado infrator “no limite do
montante indicado pela Comissão” – limitação que não se verifica no art. 260º/2
TFUE.

Sanções:
 De modo a assegurar que a sua ação é transparente e consistente, a Comissão
adotou uma Comunicação na qual estabeleceu três critérios:
1. A seriedade do incumprimento;
2. A sua duração;
3. A necessidade de assegurar que a sanção previne/evita novas infrações
(além da capacidade de pagamento do Estado membro).
 De acordo com a jurisprudência do TJ, este deve aplicar, à luz das circunstâncias do
caso, quais as sanções financeiras a aplicar.
 As sugestões da Comissão não vinculam, em princípio, o Tribunal (plena
jurisdição), mas são um útil ponto de referência. Como tal, o TJ pode fixar uma
sanção pecuniária:
 Para além do pedido da Comissão Europeia (Ac. Comissão c. República
Francesa) – sanção não constitui uma indemnização, mas uma pressão
económica para que o Estado cumpra;

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 Mesmo que a Comissão considera que a aplicação da sanção pecuniária já


não se justifique.
 O TJ considera que a cumulação das duas penalidades, uma fixa e uma progressiva
– cada uma com funções distintas – depende da capacidad de cada uma para
cumprir os seus objetivos:
 Montante progressivo – incita um Estado membro a pôr fim o mais
rapidamente possível a um incumprimento que tenderia a persistir;
 Montante fixo – apreciação das consequências de não execução das
obrigações do Estado membri em causa para os interesses privados e
públicos, designadamente quando o incumprimento se tiver mantido por
um long período desde o acórdão que inicialmente o declarou.
 Ambos – quando o incumprimento se tiver mantido durante um longo
período e tenda a persistir.

AÇÃO/RECURSO DE ANULAÇÃO

Atos nacionais

Via nacional Ação perante Tribunais nacionais

Eventual reenvio prejudicial


AÇÃO DE
ANULAÇÃO
Atos comunitários

Via comunitária Ação perante o Tribunal de Justiça

Eventual exceção de ilegalidade

Exceção: art. 14º/2 Protocolo nº4, relativo aos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos
Centrais e do BCE – recurso de anulação para o TJ contra o ato nacional de destituição do
governo do Banco Central Nacional.

PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Requisitos necessários para ser proferida uma decisão, favorável ou desfavorável ao seu
autor:
1. Atos passíveis de anulação;
2. Legitimidade processual passiva (contra quem?);
3. Legitimidade processual ativa (o autor tem legitimidade?);
4. Prazo para propor ação (ainda há?);
5. Fundamentos para anulação.

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Em alguns casos pode ainda haver outros pressupostos relacionados com a existência de
recursos administrativos prévios necessários – art. 73º/1 Regulamento nº2100/94
Conselho.

Condições de procedência da ação: se o autor prova os factos de que depende ganho de


causa e se o réu não elide a pretensão do autor.

1. ATOS IMPUGNÁVEIS
Por intermédio desta ação, o requerente solicita a anulação de uma medida adotada
por uma Instituição, órgão ou organismo da União Europeia (art. 263º/1 TFUE).
 Atos legislativos;
 Atos do Conselho, da Comissão e do Banco Central Europeu, que não sejam
recomendações ou pareceres;
 Atos do Parlamento Europeu e do Conselho Europeu destinados a produzir
efeitos jurídicos em relação a terceiros;
 Atos dos órgãos ou organismos da União destinados a produzir efeitos jurídicos
em relação a terceiros.
Estas medidas/atos devem ser emitidos por uma Instituição ou outro órgão ou
organismo comunitário (mesmo que seja um órgão não instituído pelos Tratados),
mas não por entidades nacionais ainda que em execução ou implementação ou
preparação do direito da União.

As medidas/atos sujeitos à apreciação do TJUE nesta ação são apenas os que revistam
de vinculatividade (atos decisórios, obrigatórios e com efeitos externos).
- Medidas vinculativas – aquelas que se destinam a produzir efeitos externos,
positivos ou negativos, relativamente a terceiros/medidas que produzem
efeitos jurídicos vinculativos que afetem os interesses do recorrente,
alterando de forma caracterizada a situação jurídica deste.
Por esta razão se usa a formulação “que não sejam recomendações ou pareceres” ou
“destinados a produzir efeitos jurídicos em relação a terceiros”.
No entanto, deve atender-se que é irrelevante o critério formal nomen iuris, para
definir os efeitos de um ato comunitário.

Não são atos recorríveis:


 Atos informativos (meras recomendações ou pareceres);
 Atos preparatórios;
 Atos provisórios;
 Atos confirmativos;
 Atos de execução;
 Atos políticos (art. 275º TFUE);
 Atos ou instruções internos;
 Atos adotados pelos Estados membros.

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2. PRAZO DE INTERPOSIÇÃO
Segundo o art. 263º/6 TFUE, o prazo para dar início a esta ação é muito limitado: dois
meses (ao que acresce uma dilatação em razão da distância de 10 dias – art. 51º do
Reg TJ; art. 59º Reg TG), a contar, conforme o caso, desde:
 Publicação da medida:
▫ Se a medida é publicada – art. 297º TFUE, o prazo acima referido só
começa a contar a partir do termo do 14º dia subsequente ao dia da
publicação – art. 50º Regulamento de Processo do TJUE e art. 60º Reg TG).
 Notificação da medida:
▫ Nos casos não sujeitos a publicação.
 Dia em que o recorrente tenha tomado conhecimento do ato:
▫ Aplica-se em situações e que o recorrente não tenha podido tomar
conhecimento do texto preciso da decisão impugnada antes da sua
notificação ou publicação, caso em que deve num prazo razoável solicitar
o texto integral da medida).
Estes requisitos que asseguram a cognoscibilidade da medida, sendo que o
conhecimento exato e inequívoco do ato é condição para a produção de efeitos
jurídicos, se desfavoráveis, da mesma, são aplicáveis de forma subsidiária.

Regime de publicação (em todas as línguas oficiais) ou notificação – art. 297º:


 Atos legislativos adotados de acordo com o procedimento ordinário ou especial
devem ser publicados;
 Atos não legislativos:
▫ Regulamentos e Diretivas dirigidas a todos os Estados membros e
decisões que não especifiquem os destinatários são publicados no Jornal
Oficial da União Europeia.
 Outros atos que especifiquem o destinatário são notificados.

Flexibilidade: existe a possibilidade de exercício do direito depois do decurso do


prazo, mediante prova de caso fortuito ou de força maior (art. 45º/2 TFUE).
Incumbe à parte que invoca a intempestividade de um recurso demonstrar a partir de
que dia começou a correr o prazo para a sua interposição.

3. LEGITIMIDADE PROCESSUAL ATIVA


O art. 263º/1 TFUE enumera taxativamente as entidades produtoras de atos
impugnáveis, consequentemente, quem tem legitimidade passiva. Contudo, é
diretamente impugnável, perante o tribunal europeu competente (TJ, TG ou TFP),
qualquer ato que apresente as características necessárias para ser impugnado,
mesmo que praticado por um órgão não mencionado no referido artigo.
O disposto traduz a ideia segundo a qual não podem existir atos produtores de efeitos
jurídicos que escapem ao controlo jurisdicional do Tribunal de Justiça, tendo o

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objetivo de garantir uma proteção jurisdicional efetiva dos direitos conferidos aos
cidadãos pelo direito comunitário.

4. LEGITIMIDADE PROCESSUAL PASSIVA


Este requisito encontra-se, em regra, usualmente ligado à existência de interesse para
agir (a anulação de um ato deve ter consequências jurídicas efeticas na esfera do
recorrente). Contudo, deve realçar-se a existência de três categorias de recorrentes:
A. Recorrentes privilegiados: Estados membros, Comissão, Conselho e
Parlamento Europeu (recente – desde o Tratado de Nice).
 Não necessitam de um interesse específico para agir.
 Podem atacar qualquer ato da União desde que produtor de efeitos
jurídicos obrigatórios em relação a terceiros, qualquer que seja o
interesse em agir ou o fundamento da ação.
 Como visam a defesa da legalidade objetiva, os requerentes não estão
vinculados por anteriores tomadas de posição que tenham manifestado
no processo de adoção da medida.
B. Recorrentes institucionalmente interessados: Banco Central Europeu,
Tribunal de Contas e Comité das Regiões.
 Apenas podem pedir a anulação de atos que ponham em causa as suas
prerrogativas, conferidas pelo Tratado ou pelos Estatutos;
 O Tratado de Lisboa criou um novo tipo de recurso: os Estados-
membros, por indicação (obrigatória) dos parlamentos nacionais ou
uma câmara destes e o Comité das Regiões podem intentar recursos de
anulação contra os atos que considerem contrários ao princípio da
subsidiariedade.
EX: Diretiva adotada sem prévio parecer do Comité das Regiões (quando
legalmente previsto.
C. Recorrentes ordinários: pessoas singulares ou coletivas (cidadãos europeus
e estrangeiros, pessoas coletivas de direito privado e direito público não
estaduais, Estados terceiros ou organizações internacionais).
 Requisitos – apenas podem intentar recursos contra:
▫ Atos de que sejam destinatários;
▫ Atos dirigidos a outra pessoa lhes digam direta e individualmente
respeito;
▫ Atos regulamentares que lhes digam diretamente respeito e não
necessitem de medidas de execução;
▫ Atos normativos que lhes digam direta e individualmente respeito.
Estes requisitos são de ordem pública, isto é, de conhecimento oficioso e
a todo o tempo, mesmo que a questão prévia da inadmissibilidade não
tenha sido levantada pelas partes.

Antes do Tratado de Lisboa, os requisitos legalmente fixados para determinar


quando é que um ato diz direta e individualmente respeito a um particular,
eram os de que as pessoas singulares coletivas, às quais não fosse endereçado

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um ato, deveriam ter um interesse individual e direto para recorrer


(requisitos cumulativos):
1. Interesse/afetação direto/a – quando a medida em causa:
a. Produz um prejuízo (afetação) da esfera jurídica pessoal ou
patrimonial do requerente, porque o priva de um direito ou lhe
impõe uma obrigação, de modo similar ao que aconteceria se
fosse o destinatário de uma decisão (referência ao art. 263º/4
TFUE);
b. Não deixa qualquer poder de apreciação aos destinatários da
medida encarregados da sua aplicação. Pode intermediar um
ato de implementação, mas com discricionariedade zero, isto é,
que não deixe qualquer margem de apreciação para a entidade
nacional encarregada de aplicar o ato.
Refira-se: Processo Regione Siciliana.
2. Interesse/afetação individual: o requerente deve diferenciar-se, devido
a características próprias dos demais.
a. O alcance geral e, portanto, a natureza normativa de um ato não
é posto em causa pela possibilidade de se determinar, com
maior ou menos precisão, o número, ou mesmo a identidade
dos sujeitos de direito a que a norma se aplica num dado
momento, desde que se comprove que essa aplicação se efectua
em virtude de uma situação objetiva, de direito ou de facto,
definida pelo ato em relação com a finalidade deste.
b. Para que a recorrente possa pretender ser individualmente
afetada, é necessário que seja atingida na sua posição jurídica
em razão de uma situação de facto que a caracteriza em relação
a qualquer outra pessoa e a individualiza de maneira análoga à
de um destinatário.
EX de quando um ato é dirigido a outra pessoa, mas afeta o recorrente
de uma forma análoga ou contrária: há apenas um subsídio aplicável,
que é atribuído a outra empresa, que não ao recorrente.
Refira-se: Processo Union de Pequeños Agricultores c. Conselho.

No Tratado de Lisboa, o locus standi/legitimidade dos recorrentes privados foi


tendencialmente alargado, para amainar as críticas relativas à deficiente tutela
judicial efetiva concedida pelo Tribunal de Justiça, no caso de atos
regulamentares (1), que digam diretamente respeito ao recorrente (2) e não
necessitem de medidas de execução (3) – art. 263º/4 TFUE.
Esta posição inovadora implica a análise da natureza do ato que é objeto do
recurso e a posição da pessoa que invooa o direito de recurso.
1. Atos regulamentares – aqueles de aplicação geral adotados de acordo
com um procedimento distinto do legislativo;
▫ Propôs-se esta interpretação com base no princípio da separação
institucional, segundo o qual deveria ser mais fácil aos indivíduos
recorrer de atos com um menor grau de legitimidade democrática
(como os atos não legislativos de alcance geral);

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DUEII 2º ano

▫ Praticamente só cabem nesta via os atos regulamentares da


Comissão ou decisões da mesma.
▫ Tem-se assim em consideração a seguinte hierarquia:
(1) Direito originário (princípios);
(2) Atos convencionais;
(3) Atos legislativos;
(4) Atos não legislativos.
A diferença entre atos legislativos e atos não legislativos não se
relaciona com o tipo material de atos adotados (Regulamentos,
Diretivas e Decisões podem ter tanto natureza legislativa como não
legislativa), mas com o procedimento adotado.
Os atos adotados de acordo com o procedimento legislativo
ordinário e especial são considerados atos legislativos, porque
pressupõem a participação do Parlamento Europeu e, por isso, têm
uma mais ampla base democrática.
▫ Atos não legislativos – atos adotaods por intermédio de um
procedimento não legislativo, em especial os adotados por uma
única Instituição (arts. 105º/3 e 106º/3 TFUE):
- Atos executados no âmbito de uma competência própria;
- Atos praticados na sequência do anteriormente designado
procedimento comum de decisão ou de consulta obrigatória
(arts. 103º, 74º, 78º, 95º e 129º TFUE);
- Atos adotados pela Comissão e nalguns casos (devidamente
fundamentados) pelo Conselho em execução de atos
legislativos.
2. Digam diretamente respeito ao recorrente: critério similar ao do
“interesse individual” já indicado.
3. Não necessitem de medida de execução: que não necessitem de
qualquer medida de execução, ainda que esta seja meramente
automática.
Na prática, esta novidade do Tratado de Lisboa tem-se revelado uma via muito
limitada de acesso ao Tribunal de Justiça. O que continua a remeter
privilegiadamente para a abertura de vias de recurso nacionais: a norma
promete mais do que efetivamente dá.
Não aprece que tenha sido alterado substancialmente o estatuto limitado de
recurso ao Tribunal de Justiça, porque a nova abertura introduzida pelo
Tribunal de Justiça não pode ser mobilizada perante atos legislativos, para
além de que mesmo quanto a atos legislativos, apenas pode ser mobilizada
perante aquele que não careçam de qualquer execução (que não sejam
puramente acessória) por parte dos Estados membros.
Por isso, tem sido sujeita a amplas críticas tanto doutrinal como
jurisprudencial, a alteração. Há quem considere que a expressão “ato
regulamentar” deve ser interpretada no sentido de que constitui um ato de
carácter geral, seja ou não legislativo. Para além disso, defendem ainda que a
condição relativa à inexistência de medidas de execução é uma simples
repetição da afetação direta.

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DUEII 2º ano

5. FUNDAMENTOS DO PEDIDO
Segundo o art. 263º/2 TFUE, são fundamente quatro os fundamentos (tendo sido
inspirados na tradição francesa):
1. Incompetência:
 Parcial – quando o ato é adotado por um órgão e devia ser por mais do
que um;
 Total – quando aquele órgão não pode sequer agir ou não pode agir sem
delegação:
▫ Interna;
▫ Externa ou usurpação de poderes – quando a ação for adotada fora
do âmbito de atribuições da União Europeia (tem a consequência
de inexistência e não de invalidade).
2. Violação de formalidades essenciais:
 Falta de indicação de base legal;
 Ausência de audiência prévia;
 Ausência de parecer obrigatório;
 Ausência de fundamentação (arts. 296º e 297º).
3. Violação dos Tratados ou de qualquer norma jurídica relativa à sua aplicação
(inclui disposições de direito secundário ou de direito convencional ou
princípios de direito da União, como os da subsidiariedade e
proporcionalidade).
4. Desvio de poder – uma instituição ou órgão é movida, na sua ação, por
finalidades distintas das estabelecidas por lei, ou o seu objetivo é o de se furtar
ao cumprimento de uma regra ou procedimento pré-estabelecido.

Fundamentos não taxativos: o Tribunal de Justiça tem admitido e aplicado outros


fundamentos para o escrutíneo judicial não previstos expressamente nos Tratados,
tais como a existência de erro manifesto de apreciação ou de erro de direito, desde
que não se refira ao direito nacional ou a outras ordens jurídicas internacionais.
Outras vezes é pedida a anulação de um ato com fundamento na violação de direitos
de defesa ou na insuficiência de fundamentação da decisão.

A arguição de fundamentos deve ser feita logo com a Petição Inicial, dado o princípio da
proibição de introdução de novos fundamentos (arts. 42º/2 Reg TJ e 48º/2 Reg TG).
Porém, é admitida a ampliação ou novos fundamentos que tenham origem em elementos
de facto de direito revelados ao longo do processo.

EFEITOS DO ACÓRDÃO
 Improcedência do recurso – a presunção de validade não foi posta em causa,
inexistindo a específica causa de invalidade apreciada no processo (o que impede
que se inicie uma outra ação com base nos mesmos fundamentos, mas não que se
venha a invocar um vício não apreciado ainda pelo TJUE);

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DUEII 2º ano

 Procedência do recurso – o ato é considerado nulo erga omnes (total ou


parcialmente, desde que os elementos cuja anulação se pede possam ser separados
do resto do ato), com efeitos retroativos (ab initium ou ex tunc).
 Esta é uma ação com efeitos constitutivos e não apenas declarativos, o que
pode implicar a repristinação dos atos revogados (mas também o
aproveitamento de atos que não sejam tocados pela invalidade).
 O Tribunal pode, contudo, indicar, quando o considerar necessário, quais
os efeitos do ato anulado que se devem considerar subsistentes – art.
264º/2 TFUE (EX: efeitos ex nunc, para o futuro).
▫ Esta opção é comum quando existe uma ilegalidade formal, o ato
será provavelmente repetido com o mesmo conteúdo.
 As Instituições devem, num período de temro razoável, pôr termo à
ilegalidade, pela adoção das medidas necessárias (art. 264º TFUE) –
princípio da responsabilidade dos órgãos da União.
Isto será relevante quando a reposição da legalidade não se baste com a
eliminação do ato viciado, mas implique a prática de um ato válido em sua
substituição.
 Mas não há qualquer condenação à prática de atos determinados, nem
poderes de injunção ou substituição, salvo em situações de plena
jurisdição, que são limitadas:
▫ Os regulamentos adotados conjuntamente pelo Conselho e
Parlamento Europeu, e pelo Conselho, por força das disposições
dos Tratados, podem atribuir plena jurisdição ao Tribunal, como
sucede em matérias de contencioso de sanções – Regulamento
1/2003 (direito da concorrência).
 Não se prevê qualquer sanção pecuniária aplicável para promover o
cumprimento da medida; ao contrário do que sucede na ação por
incumprimento.

Mariana Tralhão – 2016/17 13


DUEII 2º ano

AÇÃO POR OMISSÃO1

Prevista no art. 265º TFUE, esta ação (por omissão ou para cumprimento) visa controlar a
ausência de pronúncia das Instituições, órgãos e organismos da União, quando um
comportamento ativo destes seja exigível.
O sistema jurisdicional da União ficaria incompleto se apenas a ação das Instituições e
Órgãos da União pudesse ser fiscalizada judicialmente, mas não a sua inação (nalguns
casos o Tribunal de Justiça afirmou a unidade ou complementaridade entre a ação do art.
263º e a do art. 264º TFUE).

PRESSUPOSTOS
Apesar das semelhanças entre a ação por omissão e da ação de anulação, há diferenças
entre estas ações no que se refere aos seus requisitos processuais, que por sua vez
aproxima a primeira ação da por incumprimento:
 É sempre precedida de uma fase não contenciosa (fase esta que encontra o seu
fundamento no princípio da separação de poderes e que constitui um pressuposto
processual necessário para o momento judicial);
 Tem natureza declarativa, não declaratória.

Apesar do exposto, é possível estabelecer uma forte interligação da ação por omissão da
ação de anulação:
 Ambas são um mecanismo de garantia de proteção jurídica.
 A ação por omissão é um mecanismo subsidiário relativamente à ação de anulação,
sendo que tudo o que puder ser impugnado por esta via deve permanecer afastado
daquela. As omissões das instituições, dos órgãos e dos organismos da União
Europeia não se confundem com as decisões de indeferimento de uma pretensão
ou de adoção de outro ato que não o pretendido.
 A ação de controlo permite exigir a prática de atos insuscetíveis de impugnação
contenciosa.
 O controlo das omissões permite considerar os casos em que as Instituições e
órgãos ou organismos da União Europeia não executem o acórdão do Tribunal da
Justiça ou do Tribunal Geral em ação de anulação, nomeadamente quando está em
causa um dever de adotar vários atos de execução, incluindo a execução de atos
que não haviam sido objeto de impugnação.

PROCEDIMENTO
1. Convite à ação (notificação ou solicitação para agir) dirigido pelo interessado à
entidade competente para a prática do ato;
2. Eventual resposta da instituição no prazo de dois meses a contar da data do
convite à ação;

1A. Barbosa de Melo: esta ação é muitas vezes designada de recurso. Esta não é, contudo, a melhor
designação, porque através dela não se reage contra um ato (ainda que silente) da Administração,
mas contra uma omissão.

Mariana Tralhão – 2016/17 14


DUEII 2º ano

3. Eventual procedimento (fase contensiosa) perante o Tribunal de Justiça, no


prazo de dois meses a contar da responsa ou termo do prazo anterior.

FASE PRÉ-CONTENCIOSA
O interessado deve primeiro solicitar que a Instituição cumpra o seu dever de decidir de
acordo com o Direito da União.
Este dever deve ser caracterizado como uma verdadeira obrigação, não apenas como
uma faculdade/habilitação para agir. Ele pode ser um dever de adoção de um ato ou de
alteração ou de revogação de um ato existente, que não tem de ser vinculativo.
 Obrigações procedimentais:
 Não é omissão não iniciar uma ação por incumprimento por parte da
Comissão;
 Já poderá ser omissão não iniciar um processo de averiguações quando
tenha sido apresentada uma denúncia no âmbito da política da
concorrência, dada a menor discricionariedade existente neste âmbito para
a Comissão.
 Obrigações substanciais:
 A não execução de um acórdão do Tribunal de Justiça em prazo razoável
configura uma omissão;
 O mesmo poderá decorrer da ausência de regulamentação de uma matéria
referida nos Tratados ou noutras disposições de direito da União Europeia.

CONVITE À AÇÃO:
 Convite escrito fundamentado, com intenção de prossecução da ação, dirigido pelo
interessado à entidade reputada competente, num prazo razoável desde a
constatação do incumprimento:
1) Convite para a adoção de um ato devido;
2) Dirigido pelo interessado à entidade a que é imputada a omissão;
3) Deve ser escrito;
4) Não há prazo (embora possa ser rejeitado em caso de demora excessiva,
por razões de segurança jurídica);
5) Deve identificar a obrigação de agir (fundamento) à luz do direito
originário e do direito derivado e o ato pretendido;
6) Deve mencionar a intenção de recorrer à ação por incumprimento, no caso
de a omissão persistir, no prazo de dois meses.

 Importância do convite:
 É importante que o interessado seja o mais preciso possível ao fazer a
solicitação das medidas concretas que devem ser adotadas, porque este é o
documento que definirá o objeto da disputa (mesmo perante o Tribunal);
 É um momento relevante porque os prazos começam a contar da data do
convite:

Mariana Tralhão – 2016/17 15


DUEII 2º ano

▫ Dois meses para a resposta (art. 265º/2);


▫ Dois meses depois da resposta ou do decurso do prazo anterior
para a sua emissão para iniciar o processo em Tribunal.
 Confere um prazo “final” para que a entidade competente cumpra com o
direito da União.

 Possíveis respostas da Instituição, órgão ou organismo:


1) Adoção do ato que foi soicitado, caso em que o propósito da ação por
omissão cessa.
▫ Se a Instituição adota uma posição, mesmo depois da propositura
da ação, mas antes da decisão, priva a ação do seu objeto, mesmo
que a tomada de posição não se traduza na adoção de um ato
definitivo dirigido ao autor.
2) Não há resposta nos dois meses ou há uma resposta de forma inconclusiva,
remissiva ou dilatória. Neste caso é possível perante este estado de
incumprimento/indefinição iniciar o processo judicial (ação por omissão).
3) Adoção de um ato incorreto (em moldes diversos do solicitado), caso em
que, como foi proferido um ato com um conteúdo determinado, o meio
processual adequando é o de ação de anulação.
4) Resposta diz que foi aberto um processo de averiguações na sequência da
solicitação do interessado. Neste caso, cessa a omissão, apesar de este ato
não ser, em si, suscetível de recurso de anulação, pode, todavia, constituir
uma tomada de posição que põe fim à omissão, se constituir a condição
necessária para o desenrolar de um processo que deve terminar num ato
jurídico que pode ser objeto de recurso de anulação.
5) Resposta quem que a Instituição declara que não se encontra a infringir o
direito da União. Assim sendo, a mesma recusa explicita e
fundamentadamente a prática do ato, por considerar que não tem o dever
de o praticar ou que o mesmo já foi praticado. Esta resposta corresponde a
uma tomada de posição:
▫ Nestes casos, a doutrina divide-se:
- Quem considera que deve poder seguir-se um ação por
omissão;
- Quem considera que, como houve uma tomada de posição,
o meio processual idóneo deve ser uma ação de anulação.
▫ A jurisprudência do Tribunal de Justiça vai no sentido de que
qualquer ato, mesmo de conteúdo negativo, dá lugar à ação de
anulação, exceto se o mesmo não tiver força vinculativa ou se for
um ato puramente preparatório.

PROCEDIMENTO JUDICIAL
 O recurso pode ser apresentado dentro de um novo prazo de dois meses contra a
entidade que deveria ter praticado o ato.
 O decurso do prazo tem efeitos preclusivos.

Mariana Tralhão – 2016/17 16


DUEII 2º ano

 Todavia, também aqui há a possibilidade de extensão do prazo (10 dias)


por causa da distância.
 Do mesmo modo, o decurso do prazo não extingue o direito de praticar o
ato, se o interessado provar a existência de caso fortuito ou de força maior
(art. 45º ETJUE).

FUNDAMENTO DE ILEGALIDADE
Uma interpretação textual do art. 266º TFUE, que fala de abstenção declarada contrária
aos Tratados, faz crer que este é o único fundamento de ilegalidade invocável nesta ação.
No entanto, aquela norma deve ser interpretada de modo a abranger todas as formas de
violação de direito secundário, desde que não sejam relativas a questões formais (como o
vício de incompetência ou preterição de formalidades essenciais).

LEGITIMIDADE PROCESSUAL PASSIVA


Esta ação deve ser instaurada contra o Conselho, o Conselho Europeu, a Comissão, o
Parlamento Europeu e o Banco Central Europeu, bem como outros órgãos e organismos da
Administração comunitária (os que tiverem competência para a adoção do ato).
 Estas são as Instituições e órgãos que adotam atos vinculativos. Mas uma ação por
omissão não necessita de se referir à omissão de atos vinculativos, podendo
reportar-se à prática de:
 Atos preliminares (EX: aprovação de um projeto de orçamento);
 Atos finais não vinculativos (EX: aprovação de um relatório de avaliação);
 Atos de execução (EX: não fazer pagamentos devidos num determinado
prazo).
Pode haver lugar à demanda de duas entidades, através de litisconsórcio passivo.
A ação não procede caso tenha sido demandada uma entidade sem competência para
tomar posição na matéria.

LEGITIMIDADE PROCESSUAL ATIVA


 Recorrentes privilegiados:
 Os Estados membros e as Instituições da União Europeia podem interpor
ações de controlo das abstenções do Parlamento Europeu, do Conselho, da
Comissão e do Banco Central Europeu, assim como as omissões dos órgãos
e organismos da União Europeia (art. 265º/1 TFUE).
▫ Esta legitimidade funda-se na defesa da legalidade objetiva da
União Europeia, não dependendo da invocação de uma espe´cifica
carência de tutela.
 O Banco Central Europeu, o Tribunal da Contas e os órgãos e organismos
da União Europeia têm também legitimidade que deve ser entendida como
semi-privilegiada.
▫ Esta circunscreve-se à defesa das prerrogativas institucionais e à
prossecução das atribuições que lhes foram cometidas.

Mariana Tralhão – 2016/17 17


DUEII 2º ano

 Recorrentes não privilegiados: pessoas singulares e coletivas (art. 265º/3


TFUE), apenas podendo intervir para acusar uma das instituições, órgãos ou
organismos da União de não lhe ter dirigido um ato que não seja recomendação ou
parecer.
Estes recorrentes devem ser entendidos da mesma forma que o são na ação de
anulação, aplicando-se-lhes o teste do interesse “direto e individual”.
 Esta legitimidade funda-se no suprimento de uma carência de proteção, na
defesa dos direitos e interesses dos particulares.

SENTENÇA E EXECUÇÃO
O acórdão tem natureza declarativa, sendo que o Tribunal se limita a afirmar que a
entidade não praticou um ato que deveria ter praticado:
 Não se condena o órgão a adotar uma posição, muito menos determinado o seu
conteúdo (seria uma decisão condenatória);
 Não se determina a produção dos efeitos jurídicos que o ato em falta deveria impor
(seria uma decisão constitutiva);
 Não há lugar à condenação em sanções, como na ação por incumprimento, não
havendo, por isso, utilidade para uma segunda ação por omissão.
O exposto enfraquece substancialmente o controlo da legalidade por omissão. Contudo,
existe uma obrigação de execução da sentença por parte do órgão que incorreu na omissão
(art. 266º/1 TFUE), isto, num prazo considerado razoável. Esta execuçãonão tem
necessariamente de conduzir ao ato pretendido pelo autor da ação.
Nos termos do art. 266º/1, o dever de execução do acórdão não prejudica a obrigação de
reparação que possa decorrer do art. 340º/2 TFUE – responsabilidade extracontratual da
União.

Mariana Tralhão – 2016/17 18


DUEII 2º ano

EXCEÇÃO DE ILEGALIDADE
NOÇÃO
Previsto no art. 277º, este é um meio processual subjacente ao princípio de que toda a
pessoa deve poder defender-se de um ato normativo que sirva de base a uma decisão que
lhe seja dirigida, estando presente um interesse de legalidade objetiva, na medida em que
se pretende evitar a aplicação de uma norma de alcance geral ferida de ilegalidade.
O objetivo do mesmo é a desaplicação do diploma em causa no caso concreto (no âmbito
de um processo que decorra perante o TJUE), com efeitos inter partes, segundo o art.
263º/2 TFUE.

FUNÇÕES
Subjetiva
Conferir um acesso mais amplo dos particulares aos tribunais comunitários ou evitar
situações de denegação de justiça – visa primacialmente compensar os particulares pelas
limitações resultantes de um acoesso condicionado ao recurso de anulação.
A exceção de ilegalidade pode ser suscitada pelo (podendo ser o excipiente):
 Demandante – em apoio de uma ação;
 Demandado – para contestar a pretensão da parte contrária.

Objetiva
 Defesa da legalidade “constitucional e ordinária” da União Europeia;
 O art. 263º/6 (prazo de dois meses para recurso de anulação) visa promover a
segurança jurídica, enquanto o art. 277º visa a defesa da legalidade;
 Relativamente ao art. 36º CECA, o Tribunal considerou estar em causa um
princípio geral de direito, aplicável a qualquer pretensão, de modo a evitar
decisões de aplicação de regulamentos ilegais (Caso Meroni).

CARACTERÍSTICAS
1. Via de recurso acessória, que permite um controlo incidental da legalidade
comunitária;
2. A inadmissibilidade do recurso principal inviabiliza automaticamente a exceção de
ilegalidade;
3. A questão incidental deve ser pertinente para a decisão da causa principal;
4. Verifica-se uma dependência desta relativamente a outras vias processuais, sendo
que é um meio processual que só pode ser usado perante o Tribunal de Justiça, o
Tribunal Geral e Tribunais Especializados e em processos principais que nestes
corram.

Mariana Tralhão – 2016/17 19


DUEII 2º ano

RELAÇÕES COM OUTROS MEIOS PROCESSUAIS


A exceção de ilegalidade tem uma função paralela ao reenvio prejudicial de validade
nas ações que corram os seus termos nos Tribunais Nacionais.
Barbosa de Melo fala a propósito dos regulamentos inimpugnáveis (por decurso do prazo)
do dever do juiz interno de requerer a pronúncia ao Tribunal de Justiça sobre a sua
legalidade através do reenvio prejudicial. Idêntica faculdade deve existir nas ações que
correm os seus termos nos Tribunais organicamente comunitários.
No Caso TWD e no Caso Nachi Europe, o Tribunal determinou que, se o particular poderia
ter reagido, sem margem para dúvidas, através da ação de anulação (perante o Tribunal de
Justiça), deixou de poder alegar nos Tribunais Nacionais o mesmo facto (preclusão do
recurso ao reenvio prejudicial). Esta situação é similar à da exceção de ilegalidade.
Nos Caso Simmenthal, Caso TWD e Caso Nacho Europe, o Tribunal aplicou o princípio de
não duplicação das vias processuais aos recorrentes não privilegiados: se podiam ter
reagido ao abrigo de uma ação de anulação, não se abre a via de exceção.
 Assim, o destinatário de uma decisão (ou aquele que é direta e individualmente
afetado pela mesma) que não atacou o ato no prazo previsto no art. 263º/6 TFUE,
não pode invocar a exceção de ilegalidade.
 Outro entendimento poderia converter a exceção de ilegalidade em meio
processual paralelo aos demais e não vê-la como um meio excecional, que visa
colmatar falhas do sistema.
Esta preclusão de recusa de mobilização da exceção da legalidade reveste uma
flexibilidade: deve ter-se em consideração a oportunidade do auxílio individual
concedido, no âmbito da legitimidade dos indivíduos para contestar a decisão genérica, ou
seja, esta exceção poderá ser alegada por alguém que demonstre que tinha razões
fundadas para crer que a impugnação direta do ato de natureza geral seria rejeitada – Caso
ARAP c. Comissão e Caso Schintegen c. Comissão.

1. Ação de anulação
A exceção de ilegalidade constitui um “prolongamento normal” do recurso de
anulação. Isto justitica-se por duas limitações:
 O prazo do recurso (dois meses);
 Os recorrentes não privilegiados, no que se refere aos requisitos ligados à
ilegitimidade processual (têm de ter um interesse individual e direto).
A cumulação destas duas limitações sobretudo no que aos regulamentos diz
respeito torna difícil a tarefa de reação contenciosa a cargo do interessado, quando
em causa estejam decisões encapotadas em atos normativos.
Para tanto contribuem:
1) Difícil deteção de tais disposições;
2) A inadmissibilidade de reação contra atos confirmativos;
3) Regras da publicidade e notificação.

Sendo que o Tratado de Lisboa refere que a exceção de ilegalidade pode ser suscitada em
qualquer litígio, pode esta ser relevante no âmbito de outros processos levados perante o
Tribunal de Justiça.

Mariana Tralhão – 2016/17 20


DUEII 2º ano

2. Ação por omissão


Uma vez que no âmbito desta ação não há qualquer decisão implícita de recusa
(indeferimento), parece não haver lugar à invocação da exceção de ilegalidade. No
entanto, a entidade contra quem é dirigida esta ação pode pretender defender-se,
afirmando que não pratica o ato porque teria de aplicar um Regulamento que
considera ilegal.

3. Ação de indemnização
Não se revela necessária a existência de uma declaração prévia de ilegalidade da
medida comunitária (em sede de ação de anulação) para que a ação de
indemnização seja procedente. Não obstante, a ilegalidade de um ato de alcance
geral pode auxiliar a fundamentar a pretensão do interessado, que invoca um
prejuízo resultante de uma ação ilícita da União.

4. Ação por incumprimento


No âmbito desta, a exceção de ilegalidade faz sentido porque, em princípio, a
ilegalidade de um regulamento não pode ser uma motivação para uma atuação em
incumprimento de direito da União.
Não podem os Estados invocar utilmente a ilegalidade de uma decisão comunitária
de que são destinatários numa ação por incumprimento fundada na falta de
execução dessa decisão, salvo no caso de inexistência do ato, que padece de vícios
particularmente graves e evidentes (Processo Comissão c. Portugal).
No entanto, pode suceder que, em certos casos, a efetiva declaração de ilegalidade
de um ato normativo geral seja relevante para defesa do Estado.

OBJETO
A exceção de ilegalidade pode ser invocada quando esteja em causa um ato de alcance
geral, adotado por uma Instituição, órgão e organismo da União Europeia para além do
prazo da impugnação de dois meses previsto no art. 263º/6 TFUE.
Assim, incluem-se aqui atos desde os regulamentos aos atos de alcance geral que servem
de norma habilitante à pretensão jurídica individual (Caso Simmenthal):
 Atos típicos ou atípicos com efeitos análogos aos Regulamentos;
 Deve ter-se em consideração que os regulamentos são atos que podem revestir
uma natureza dual: normativa e individual ou decisional.
No caso do âmbito do escrutínio permitido pela invocação de exceção de
ilegalidade, excluem-se:
 Os regulamentos que digam direta e individualmente respeito a uma
pessoa ou pessoas determinadas (Caso Nachi Europe);
 Os regulamentos que afetem diretamente sem necessitar de medidas de
execução, porque aqui a reação teria de ser dirigida a título principal, e não
como exceção, contra estes atos.

Mariana Tralhão – 2016/17 21


DUEII 2º ano

Excluem-se dos possíveis objetos da exceção de ilegalidade, os atos individuais,


excetuando-se:
1. Decisões com uma composição legislativa-administrativa (medidas dirigidas aos
Estados-Membros ou indivíduos de modo a alterar, suplementar ou implementar
provisões de Regulamentos ou Diretivas).
Neste caso, para além de não haver necessidade de transposição, há uma
generalidade e indeterminação temporal que está associada a estas Decisões, pelo
que pode ser considerados, em caso particulares, atos de conteúdo geral.
2. Discute-se o possível alargamento da impugnação a algumas diretivas que
assumam uma “forma regulatória”. Para tanto, exige-se que exista entre o ato
atacado e o ato normativo ilegal um “nexo de causalidade, de interdependência ou
de conexão jurídica suficiente”.

O controlo, à semelhança do que sucede com o art. 267º/2 TFUE, incide sobre vícios de
incompetência, violação de formalidades essenciais, violação dos Tratados ou de qualquer
norma jurídica relativa à sua aplicação, ou desvio de poder.

LEGITIMIDADE ATIVA
O art. 277º confere o direito de contestar, em caso de litígio, a legalidade de um ato de
alcance geral por “qualquer parte”. Desta forma, tem legitimidade para tal:
1. Os particulares:
 Qualquer particular que seja destinatário da decisão comunitária fundada
no ato de alcance geral ilegal ou a quem essa decisão diga direta e
individualmente respeito.
 No entanto, excluem-se, em princípio, os particulares que detinham
legitimidade ativa para recorrer diretamente dos atos normativos e não o
fizeram nos prazos estipulados.
2. Os Estados membros:
 Dúvidas iniciais: como os Estados membros não têm de invocar interesse
para agir no âmbito da ação de anulação, questionou-se se poderiam mais
tarde invocar a ilegalidade em sede de exceção.
▫ Nos processos Comissão c. França e Comissão c. Bélgica entendeu-se
que, como o Estado não contestou uma decisão no tempo devido,
não pode colocar em causa as suas consequências factuais e legais.
▫ Contudo, no Caso Espanha c. Conselho o Tribunal entendeu que
resulta do art. 277º que um Estado membro pode contestar a
ilegalidade de um regualmento contra o qual não interpôs recuso
de anulação antes de decorrido o prazo para ele determinado (art.
263º/5). O mesmo considera que se fosse acolhida tese em
contrário (afirmada pela Comissão e pelo Conselho), que determina
que, podendo ter arguido no prazo e não o tendo feito, o Estado
membro não pode invocar a ilegalidade, equivaleria a negar aos
Estados membros o direito de contestar, em caso de litígio, a
legalidade de um regulamento para invocar, no Tribunal de Justiça,

Mariana Tralhão – 2016/17 22


DUEII 2º ano

a sai inaplicabilidade. Esta solução seria contrária à letra do


próprio art. 277º que confere essa possibilidade a “qualquer parte”.
3. As Instituições, os órgãos e os organismos comunitários.

FUNDAMENTOS DE ILEGALIDADE
O Tribunal pode analisar a ilegalidade do ato de alcance geral com base em todos os
fundamentos permitidos em direito (e identificados em sede de recurso de anulação), tais
como:
 Incompetência;
 Violação de formalidades essenciais;
 Violação de tratado ou de qualquer norma jurídica relativa à sua aplicação;
 Desvio de poder;
 Outros fundamentos (erro de direito, erro manifesto de apreciação, etc.).

REGIME PROCESSUAL
1. Arguição expressa ou inequívoca pelos demandantes ou demandados da
ilegalidade do ato contra o qual instaura o recurso fundada na ilegalidade do ato de
alcance geral (este pode ser o fundamento único ou pode ser cumulado com outras
ilegalidade imputadas ao ato individual):
a. A exceção de ilegalidade deve ser invocada logo na petição inicial. No
entanto, nada impede que a mesma seja só explicitamente formulada na
réplica, desde que se entenda que a mesma já estava implícita na petição
inicial (Caso Espanha c. Conselho).
b. Tem de existir um dever de agir (a medida não pode já estar revogada).
2. Tramitação base é a do recurso ou da ação de que se trata a título principal;
3. Necessária intervenção no processo da Instituição ou Instituições, órgãos ou
organismos que emanaram o ato de alcance geral, mesmo que a ação seja dirigida
contra outrem;
4. Apesar de ser um meio processual individualizado não é uma via processual
autónoma mas um incidente processual: a exceção de ilegalidade funciona como
um fundamento do pedido ou da defesa noutro processo perante o Tribunal de
Justiça.

EFEITOS
A exceção de ilegalidade tem como efeito a desaplicação da norma reputada ilegal com
efeitos restritos ao caso concreto (inter partes), não se anulando o ato de alcance geral
ferido de ilegalidade. No entanto, o ato atacado a título principal, se for no âmbito de um
recurso de anulação, é ilegal (ou nulo) com efeitos erga omnes, dada a ilegalidade do ato de
natureza geral em que se funda.
Apesar do exposto, o princípio da lealdade institucional surge como corretor da
ausência de um mecanismo de generalização dos efeitos da sentença relativamente ao ato
normativo impugnado incidentalmente. Ou seja, há uma obrigação de as Instituições
comunitárias que emanaram o ato o revogarem.

Mariana Tralhão – 2016/17 23


DUEII 2º ano

AÇÃO DE RESPONSABILIDADE
TIPOS DE RESPONSABILIDADE
1. RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL DA UNIÃO: apesar de não estar
expressamente prevista, a União Europeia responde por atos violadores do direito
internacional suscetíveis de causar danos a outros sujeitos do direito
internacional. A União Europeia responde na qualidade de organização
internacional e os Estados membros podem responder subsidiariamente, como
sujeitos do direito internacional.

2. RESPONSABILIDADE CONTRATUAL2 (art. 340º):


 Em princípio, esses litígios, em que a União Europeia seja parte, podem ser
decididos pelos Tribunais nacionais, de acordo com o direito comum
nacional (art. 274º TFUE). Todavia, o art. 272º TFUE prevê a competência
do TJUE para decidir com base em cláusula compromissória constante dos
contratos. Através dessas cláusulas, a competência de dirimir litígios
contratuais pode ser transferida para o TJUE, de acordo com a lei aplicável
ao contrato (Caso Bauer c. Comissão).
 Facto gerador – incumprimento ou cumprimento defeituoso de um
contrato celebrado pelo União Europeia.
 Esta responsabilidade é regida pela lei aplicável ao contrato em causa, sem
prejuízo da cláusula compromissória (art. 340º/1 TFUE).
▫ O contrato surge como relevante, sendo manifestação da vontade
das partes.
▫ Em caso de dúvida, serão aplicados os princípios do direito
internacional privado.

3. RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL (arts. 268º e 340º):


O art. 340º/2 determina que a União deve indemnizar, de acordo com os princípios
gerais comuns aos direitos dos Estados membros, os danos causados pelas suas
instituições ou pelos sues agentes no exercício das suas funções.
O Tribunal de Justiça da União Europeia é competente para conhecer dos litígios:
 Garantia de uniformidade das decisões;
 O direito aplicável é o direito da União Europeia;
 O que está em causa é o controlo da atuação das instituições europeias.
A existência da responsabilidade extracontratual da União Europeia é importante
para:
 Afirmação da uma comunidade de direito;
 Reforço dos direitos dos particulares;
 Reforço da legalidade comunitária.

2Sendo que a União Europeia tem personalidade jurídica, ela pode celebrar contratos de direito
pública e de direito privado, com pessoas físicas e coletivas no seio dos diferentes Estados
membros.

Mariana Tralhão – 2016/17 24


DUEII 2º ano

Legitimidade processual ativa:


1) Estados membros;
2) Outros membros ou organizações internacionais;
3) Pessoas singulares e coletivas: desde que aleguem uma lesão por parte da
União Europeia e pretendam a reparação dos prejuízos sofridos,
necessitando de ser nacionais e residentes na União.

Legitimidade processual passiva:


 A ação de responsabilidade deve ser instaurada contra a União Europeia, a
quem devem ser imputados os atos ou omissões legais (das suas
Instituições, órgãos ou agentes)3;
 A representação da União Europeia é assegurada pela Instituição a quem o
facto geradores da responsabilidade é imputado;
 Se a ação for dirigida contra os Estados membros, relativamente a atos de
execução do direito da União, mas que impliquem o exercício de poderes
discricionários por parte daqueles, o Tribunal de Justiça declara-se
incompetente.

Especificidade processual quanto ao Banco Central Europeu: o art. 340º parece


deter um parágrafo autónomo (3º parágrafo), que contraria o parágrafo anterior.
Aquele parágrafo é relativo ao Banco Central Europeu e determina ser este, e não a
União Europeia, a responder ele próprio financeiramente pelos danos que sejam
causados por si ou pelos seus agentes no exercício das suas funções.
Com efeito, o BCE é um ente jurídico dotado de personalidade jurídica e órgãos
próprios de decisão e independência no exercício dos seus poderes e na gestão das
suas finanças, pelo que a indemnização de danos ser-lhe-á diretamente imputável,
tendo, por isso, uma posição processual específica.

Características processuais:
 Prazo de prescrição de 5 anos (art. 46º ETIJ): este prazo conta-se da data
da efetivação do prejuízo (e não da data da emissão do ato ou facto que o
originou).
 Autonomia da ação de indemnização: mesmo que haja limitações de acesso
a outras vias processuais, essas não se comunicam à ação de indemnização,
sendo que a questão da ilicitude da ação da União Europeia será apreciada
diretamente na ação de responsabilidade.
 Carácter subsidiário da ação em relação às vias nacionais:
▫ No caso de medidas individuais nacionais de aplicação de atos
ilegais da União – é perante os Tribunais Nacionais que se deve
fazer valer esta ilegalidade (por reenvio da validade para o
Tribunal de Justiça). Mas apenas se, no âmbito nacional, o particular
consiga ver a sua esfera jurídica reintegrada. Em caso contrário,

3 Processo Frank Lamberts v. Provedor de Justiça Europeu.

Mariana Tralhão – 2016/17 25


DUEII 2º ano

abrir-se-á sempre a ação perante o Tribunal de Justiça enquanto


única via jurisdicional adequada.
▫ No caso de o comportamento ser exclusivamente imputável à
União, é a ela (ou os seus órgãos) que compete responder perante o
Tribunal de Justiça (critério de imputabilidade).

Condições de procedência da ação:


Os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual baseiam-se nos
princípios gerais comuns aos direitos dos Estados membros (arts. 340º TFUE; 21º
ETIJ; e 38º/1-c Reg. TJ):
1) Ato que expresse direta e exclusivamente a vontade da União – conduta de
uma autoridade da União Europeia (ações ou omissões) no exercício das
suas funções e seja produtor de efeitos jurídicos.
2) Ilicitude do ato – para a jurisprudência do TJUE, a verificação de uma
ilegalidade segue hoje a chamada fórmula Schöppenstedt: estamos perante
uma ilegalidade quando se dá uma violação suficientemente caracterizada de
norma superior de proteção do particular.
a. Violação suficientemente caracterizada – esta responsabilidade
pressupõe uma violação especialmente qualificada e não uma qualquer
infração de modo a afastar a responsabilidade da União por toda e
qualquer atuação errónea.
Assim, temos de esta perante uma violação suficientemente grave,
grosseira e caracterizada, aferida tendo em conta o âmbito
discricionário e complexo dos poderes que se exercitam (se esta
margem de apreciação for reduzida, haverá sempre violação).
Quando se está diante de um quadro normativo de difícil interpretação
e aplicação, a entidade da União Europeia será responsável apenas nas
situações de erro manifesto de apreciação, de um excesso grave de
poderes discricionários ou de uma aplicação manifestamente
enviesada das normas materiais e processuais relevantes.
b. Normas superiores – normas de direito da União hierarquicamente
superior (de direito primário ou secundário) ou princípios gerais da
União que tinham de ser respeitados pela atuação que se reputa ilícita.
c. Proteção do particular – a norma violada deve ter como objetivo a
proteção do lesado, concedendo-lhe uma posição jurídica
individualizável (acontece claramente com as normas consagradoras
de direitos fundamentais e de liberdades fundamentais do mercado
interno).
3) Prejuízos e danos reais – os danos podem ser atuais ou previsíveis (em
posições jurídicas individualizáveis protegidas pelo direito, não pode esta
em causa o prejuízo que é sofrido uniformemente por todos os sujeitos),
sejam prejuízos emergentes, lucros cessantes, danos patrimoniais ou morais.

Mariana Tralhão – 2016/17 26


DUEII 2º ano

4) Nexo de causalidade adequada – o dano tem de ser uma consequência


provável de conduta ilegal da União, não do Estado. Adotam-se duas
doutrinas:
a. Conditio sine qua non – uma conduta é adequada a produzir o dano se
este não se produzisse se essa conduta ilegal não se tivesse verificado
(situação que hipoteticamente existiria).
b. Causalidade adequada – deve perguntar-se se o dano é a consequência
normal e esperada da conduta ilegal em presença. A adequação causal
não se verifica quando o dano é uma consequência imporvável da
conduta ilegal.

Efeitos – dever de indemnizar:


A União Europeia tem a obrigação de reposição da situação em que o lesado se
encontraria no caso de não se ter verificado o evento lesivo.
Preferivelmente, a compensação é realizada pela restituição natural, que pretende
restituir a situação atual hipotética (status quo ante). Na impossibilidade, é devida
uma indemnização por equivalente pecuniário, acrescida de juros de mora a contar
da data da prolação do acórdão que declara o dever de indemnizar a União
Europeia.

Limitações:
 Exclusão da responsabilidade pelo risco;
 Limitada aceitação da responsabilidade por atos ilícitos
▫ A verificação da responsabilidade extracontratual por facto ilícito
ou lícito, em qualquer hipótese, pressupõe a demonstração da
realidade do prejuízo alegadamente sofrido e a existência de um
nexo de causalidade entre o prejuízo e aquele facto.
Na hipótese de se reconhecer responsabilidade por facto lícito, a
verificação dessa responsabilidade pressupõe a existência de um
prejuízo anormal e especial. Tende de se encontrar verificadas as
condições enunciadas, cumulativamente – Processo Dorch (C-
237/98).

Mariana Tralhão – 2016/17 27


DUEII 2º ano

MEDIDAS PROVISÓRIAS
TIPOS DE MEDIDAS PROVISÓRIAS
 Art. 278º – suspensão: os recursos interpostos para o Tribunal de Justiça da
União Europeia não têm efeito suspensivo. Todavia, o Tribunal pode ordenar a
suspensão da execução do ato impugnado, se considerar que as circunstâncias o
exigem.
 Art. 279º – autorização genérica de outras medidas provisórias: estas podem
ser conservatórias (mantêm o status quo ante, como a suspensão de efeitos de um
ato) como antecipatórias. Admite-se que possa ser ordenada a suspensão pelo
Tribunal de Justiça de decisões nacionais (Processo CCE c. RFA).

CARACTERÍSTICAS
1. Provisoriedade dos efeitos;
2. Acessoriedade (relativamente a qualquer tipo de ação principal, ainda que a
suspensão de efeitos só faça sentido quanto ao recurso de anulação ou ao
contencioso da função pública);
3. Recorribilidade – a adoção de medidas provisórias é passível de recurso, dado o
seu potencial lesivo e a possibilidad de poderem ser decretadas sem participação
da outra parte – recurso limitado a questões de direito (arts. 57º, 58º e 225º ETIJ)
e com efeito suspensivo (art. 60º ETIJ).

REQUISITOS
1. Urgência (periculum in mora) – evitar um prejuízo sério e irreparável (não
hipotético nem meramente pecuniário, a não ser que a compensação não reponha
a posição do interessado) – aponta para a proporcionalidade da medida.
2. Probabilidade séria de existência do direito (fumus bonis iuris – aparência de bom
direito) – juízo sumário acerca da probabilidade de procedência do pedido.
3. Provisoriedade do efeito – não deve resolver a questão principal, nem desprovê-la
de utilidade.

Mariana Tralhão – 2016/17 28


DUEII 2º ano

COMPETÊNCIAS NÃO CONTENCIOSAS


1) Competência consultiva;
2) Competência de cooperação/prejudicial.

COMPETÊNCIA CONSULTIVA
A competência consultiva do Tribunal de Justiça emana da norma que prevê a celebração
de acordos internacionais pela União, o art. 218º/11 TFUE. Os acordos concluídos por
aquela são vinculativos para esta e para os seus Estados membros.
Este mecanismo caracteriza-se por ser:
1) Facultativo (resulta expressamente do artigo referido);
2) Prévio – esta natureza preventiva determina que, sendo o acordo concluído, o
Tribunal de Justiça não pode exercer competências consultivas (apesar de, sendo
parte do direito secundário da União, o Tribunal de Justiça poder assumir
competências judiciais a posteriori).

OBJETIVO:
Fiscalização abstrata preventiva da compatibilidade de um projeto de acordo
internacional com os Tratados.

LEGITIMIDADE PROCESSUAL ATIVA:


Podem requerer a apreciação preventiva os Estados membros, o Parlamento Europeu, o
Conselho ou a Comissão.

TIPOS DE PARECERES:
1) Compatibilidade de um concreto projeto de acordo (já negociado, portanto) com o
direito da União Europeia;
2) Análise sobre se a União é competente para adotar esse acordo – não é necessário
que haja um projeto formal/já negociado de acordo, sendo suficientes a intenção
de negociar um acordo e o seu enquadramento geral.

EFEITOS DO PARECER DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


 Se for emitido em sentido negativo – o parecer deve ser seguido. Assim:
 Se no âmbito das competências da União, a única forma de concluir o
acordo passa por respeitar as indicações do Tribunal de Justiça;
 Se o objeto do acordo for para além das competências da União, a única
forma de o concluir passa por rever os Tratados, em primeiro lugar.
 Se for emitido em sentido positivo – o acordo pode ou não ser concluído.

Mariana Tralhão – 2016/17 29


DUEII 2º ano

PROCEDIMENTO:
1) Pedido de parecer;
2) Nomeação de um juiz relator;
3) Designação de um advogado-geral;
4) Audição do advogado-geral;
5) Apresentação de uma proposta de parecer pelo juiz relator;
6) Adoção do parecer pelo Tribunal.
Como o parecer tem efeitos vinculativos, se o mesmo for pedido, o acordo só pode ser
concluído após a sua emissão.

COMPETÊNCIA DE COOPERAÇÃO
REENVIO PREJUDICIAL
O reenvio prejudicial (art. 267º TFUE) é uma forma de controlo judicial indireto (ou de
colaboração na administração da justiça), pelo qual o Tribunal interpreta ou aprecia a
validade das normas comunitárias.
O Tribunal não decide o caso, respondendo apenas a questões colocadas pelos Tribunais
Nacionais. No entanto, as conclusões a que o Tribunal de Justiça chega são relevantes,
porque vinculam o Tribunal de reenvio (os procedimentos judiciais suspendem-se
enquanto o processo de reenvio prejudicial se encontra pendente).
A decisão do Tribunal de Justiça tem natureza interlocutória/incidental/não litigiosa, por
não dar uma solução para o litígio. Os Tribunais devem ainda analisar os factos relevantes
e concretizar o direito aplicável.
Contudo, discute-se se o Tribunal de Justiça não tem ido, por vezes, longe demais, ao dar
respostas muito precisas no caso concreto, sendo que se revela necessária a autolimitação
dos Tribunais nacionais e do Tribunal de Justiça.

OBJETIVO
Este é um procedimento baseado na cooperação entre os Tribunais Nacionais e o
Tribunal de Justiça, sendo que os primeiros se encontram vinculados à aplicação do direito
da União Europeia e que o Tribunal de Justiça é relevante para a decisão do caso.
Manifestam-se como principais objetivos:
1) Melhorar a administração da justiça – o Tribunal esforça-se por dar uma resposa
útil para a solução do litígio no processo principal, mas é ao órgão jurisdicional de
reenvio que cabe tirar as consequências concretas dessa resposta;
2) Promover a interpretaçãoe aplicação consistente do Direito da União (Ac.
Schwarze);
3) Assegurar que o direito da União é o mesmo em todos os Estados,
independentemente das suas especificidades nacionais;
4) Constituir uma ampliação da garantia de acesso de indivíduos ao Tribunal de
Justiça, dadas as limitações resultantes do art. 230º TFUE;
5) Permitir o desenvolvimento do direito da União, de certa forma.

Mariana Tralhão – 2016/17 30


DUEII 2º ano

SUJEITOS DO LADO DA UNIÃO EUROPEIA


Desde o Tratado de Nice é possível que o Tribunal Geral tenha competência para apreciar
questões prejudiciais em específicas áreas definido no seu Estatuto (art. 234º). Contudo,
esta possibilidade não foi prevista e regulada no respetivo Estatuto, permanecendo o
Tribunal de Justiça como única autoridade competente em matéria de reenvio prejudicial.
Mesmo que o Tribunal Geral venha a ter competência, o Tribunal de Justiça sempre teria a
última palvra quando estivesse em causa um sério risco para a unidade e consistência do
direito da União (art. 256º).
 As decisões preliminares representam cerca de metade dos casos decididos pelo
Tribunal de Justiça, tendo havido um aumento crescente, dado o aumento das
competências da União e do número de Estados.
 O processo prejudicial no Tribunal de Justiça é gratuito.
 O órgão jurisdicional nacional deve comunicar a decisão que, in fine, tenha
proferido ao Tribunal de Justiça.

CLASSIFICAÇÃO DE ACORDO COM O SEU ÂMBITO


Segundo o art. 267º/1:
 Reenvio de interpretação:
 Pode incidir sobre normas de direito originário e normas de direito
derivado.
 Uma das partes, ou o juiz oficiosamente tem de suscitar a referida dúvida,
sendo este último quem decide a forma do despacho ou as perguntas a
colocar. Para tanto, suspende o litígio.
 A interpretação do direito da União inclui determinar o sentido e alcance
de uma disposição normativa, incluindo a definição se ela é vinculativa ou
não ou se tem ou não efeito direto.
 Reenvio de validade:
 Apenas pode incidir sobre normas de direito derivado, já que a validade do
direito primário não pode ser fiscalizada, sendo este parâmetro de
validade daquele.
 Uma das partes, ou o juiz oficiosamente tem de suscitar a referida dúvida.
O juiz nacional suspende o litígio e pergunta ao Tribunal de Justiça se a
norma é válida.
▫ As causas de invalidade que poderão ser invocadas, de ordem
material ou formal, são as que estão previstas como fundamento de
um recurso direto de anulação no art. 263º.

CLASSIFICAÇÃO DE ACORDO COM A SUA NECESSIDADE


A divisão anterior pode subdividir-se, cada um dos reenvios caracterizados, em reenvio
facultativo/discricionário (art. 267º/2) e reenvio obrigatório (art.267º/3).

Mariana Tralhão – 2016/17 31


DUEII 2º ano

A solução para este problema é objeto de uma divergência doutrinal:


 Mota de Campos: só há reenvio obrigatório para os Tribunais Supremos. Os
tribunais de instância, mesmo que no caso concreto não haja possibilidade de
recurso, não estão sujeitos à obrigação de reenvio.
 Argumento literal: o artigo refere-se a órgão jurisdicional cujas decisões
não sejam suscetíveis de recurso, mandando atender à natureza do
tribunal e não à possibilidade ou não de recurso;
 A entender-se que os tribunais de instância têm obrigação de reenvio
quando não for possível recurso, isso significaria uma imensa sobrecarga
do Tribunal de Justiça;
 Se os tribunais nacionais de instância erram, também se pode recorrer. Um
erro de interpretação do direito comunitário num caso de pequena monta
não causa nenhuma brecha no ordenamento jurídico comunitário.
 Gorjão-Henriques (na linha de Rui Moura Ramos): o reenvio deve ser obrigatório
sempre que, em concreto, não haja recurso das decisões dos tribunais.
 O objetivo da uniformidade da aplicação do direito implica que as decisões
definitivas estejam sujeitas à interpretação do Tribunal de Justiça das
normas comunitárias.
 O valor da uniformidade da aplicação do direito comunitário é importante
também nos casos de pouca monta.
O Tribunal de Justiça já se pronunciou no Acórdão Costa/E.N.E.L., considerando que os
tribunais de instância de que, em concreto, não caiba recurso, são obrigados a reenviar a
questão para o Tribunal de Justiça4.
Contudo, o Tribunal estabeleceu casos em que o Tribunal Nacional está isento de reenviar:
1) Falta de pertinência da questão suscitada no processo:
a. Caso de ser suscitada uma dúvida de interpretação de uma norma
comunitária mas o juiz nacional entende que essa norma não é
aplicável;
b. Quando o juiz nacional pretende decidir apenas com base no direito
interno ou com base noutra norma comunitária cuja interpretação (ou
validade) não foi questionada.
2) Existência de anterior decisão do Tribunal de Justiça:
a. Se o Tribunal de Justiça se tiver pronunciado, o Tribunal Nacional fica
dispensado de fazer o reenvio (não proibido), desde que pretenda
aplicar a norma com o sentido fixado pelo Tribunal de Justiça.
3) Total clareza da norma em causa:
a. Teoria do ato claro – se o ato não suscitar qualquer dúvida, é pouco
razoável obrigar os tribunais nacionais a enviar a questão para o
Tribunal de Justiça.
4) Quando uma decisão for substancialmente análoga a outras já submetidas e
analisadas pelo Tribunal de Justiça, ainda que a disputa possa não ser
estritamente idêntica (teoria do ato esclarecido).

4 Em Portugal não há recurso das ações com valor de 200€.

Mariana Tralhão – 2016/17 32


DUEII 2º ano

 Reenvio de validade:
 Doutrina Foto-Frost (já invocada pelo TJ – posição adotada):
▫ Os tribunais nacionais, de reenvio facultativo, podem apreciar a
validade de um ato comunitário e, se não considerarem
precedentes os fundamentos de invalidade que as partes invocam
perante eles, podem rejeitar esses fundamentos, concluindo que o
ato é plenamente válido. Assim, se a questão é suscitada e
entenderem que o ato é válido, o reenvio é facultativo.
▫ Pelo contrário, os tribunais nacionais não são competentes para
declarar a invalidade dos atos das Instituições comunitárias. Assim,
se entenderem que o ato é inválido, devem reenviar, mesmo que o
reenvio seja facultativo (ou seja, quando ainda é possível recorrer
perante instituições internas).
Argumentos:
▫ Exigência de uniformidade na aplicação do direito comunitário;
▫ Coerência do sistema de proteção jurisdicional instituído pelo
Tratado. Os Tratados estabeleceram um sentido complexo de vias
de recurso e de procedimentos destinados a confiar exclusivamente
ao Tribunal de Justiça a fiscalização da legalidade dos atos das
Instituições.
Esta doutrina estabelece, contudo uma exceção para os tribunais que
decidam a título cautelar (Hoffman La Roche), não sendo para eles
obrigatório o reenvio quando perante um ato que considerem inválido.
 Opinião de Gorjão-Henriques:
▫ Viola a letra do art. 267º – este artigo não estabelece qualquer
diferença entre o reenvio de validade e o reenvio de interpretação;
▫ Viola o sentido do reenvio – o reenvio é a prova que os tribunais
nacionais são os tribunais comuns de direito comunitário. Só é
chamado o Tribunal de Justiça quando não há possibilidade de
recurso.
▫ Se os tribunais nacionais têm autonomia para afirmar a validade do
ato, não se compreende que não tenham para afirmar a sua
invalidade.

FORMULAÇÃO DO PEDIDO INCIDENTAL


A redação deste pedido deve ser simples, clara e precisa, sem elementos supérfluos (10
páginas, em regra). Ela deve incluir:
1) Texto das questões submetidas ao TJ;
2) Exposição sumária do objeto do litígio, bem como dos factos pertinentes;
3) Teor das disposições nacionais suscetíveis de se aplicar no caso concreto
(jurisprudência nacional pertinente);
4) Exposição das razões que conduziram ao reenvio;
5) Identificação das disposições pertinentes do direito da União;
6) Ponto de vista do Tribunal nacional (se for esse o caso);

Mariana Tralhão – 2016/17 33


DUEII 2º ano

7) Solicitação de tramitação acelerada (redução de prazos) ou urgente (com


supressão de fases), se for necessário (art. 23º-a ETJ).
a. Tramitação urgente apenas pode ser utilizada em questões prévias na área
da liberdade, segurança e justiça.
O pedido tem efeitos suspensivos.

SUJEITOS DO LADO DOS ESTADOS


Apenas órgãos jurisdicionais nacionais dos Estados membros (e dos Estados onde o
direito da União é aplicado como tal) podem recorrer ao reenvio prejudicial.
As partes num processo judicial podem solicitar que certas questões sejam colocadas ao
Tribunal de Justiça, mas o pedido de reenvio é sempre formulado pelo tribunal nacional,
competindo-lhe determinar o conteúdo das questões prejudiciais.
 Questão da sujeição dos Tribunais Constitucionais ao procedimento de reenvio
prejudicial: esta hipótese é possível, no entanto, apenas em casos limitados,
quando em causa esteja uma contradição entre o direito da União Europeia e o
direito constitucional. Neste caso, O Tribunal constitucional é a última instância de
recurso nacional, logo, encontra-se sujeita a reenvio obrigatório (Cardoso Costa)
A noção de órgãos jurisdicionais é uma noção autónoma, que deve ser lida à luz do
direito da União. De acordo com Tribunal (nomeadamente no processo Vaasen-Goebells),
existem cinco critérios para determinar se estamos perante um daqueles órgãos:
(1) Origem e competências para resolver litígios definidas por lei;
(2) Permanência;
(3) Respeito pelos princípios do processo (due process of law);
(4) Jurisdição obrigatória;
(5) Aplicação de regras de direito e não, em princípio, de equidadade;
(6) Independência (acrescentada posteriormente).
Nem todas estas características têm de se encontrar sempre verificadas.
O Tribunal de Justiça tem entendido que nenhuma norma de direito nacional deve poder
impedir o recurso ao instituto do reenvio prejudicial por parte de um órgão jurisdicional
nacional (acórdão Rheinmülen).

RECUSA DO PEDIDO
O Tribunal de Justiça pode recusar pronunciar-se sobre uma questão prejudicial:
1) Quando for manifesto que a interpretação do direito comunitário solicitada não
tem qualquer relação com a realidade ou com o objeto do litígio do processo
principal (daí a importância que o Tribunal Nacional justifique o recurso e o
quadro factual na base da questão);
2) Quando o problema for de natureza hipotética;
3) Quando o Tribunal não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários
para responder utilmente às questões que lhe são submetidas.

Mariana Tralhão – 2016/17 34


DUEII 2º ano

Segundo o art. 99º do Reg. Do TJ, o Tribunal pode, a qualquer momento, mediante
proposta do juiz-relator, ouvido o advogado-geral, decidir pronunciar-se por meio de
despacho fundamentado, quando:
 A questão submetida a título prejudicial for idêntica a uma questão sobre a qual o
Tribunal de Justiça já se tenha pronunciado;
 A resposta a essa questão possa ser claramente deduzida da jurisprudência ou
quando a resposta à questão submetida a título principal não suscite nenhuma
dúvida razoável.

EFEITOS
A resposta do Tribunal de Justiça não é apenas uma opinião, assumindo a forma de um
julgamento que tem um efeito retroativo – ex tunc (exceto se o Tribunal decidir, por
atenção ao princípio da boa fé, restringir os seus efeitos temporais – acórdão Defrenne).
Desta forma, o Tribunal nacional ao qual a decisão do Tribunal de Justiça é reenviada está
vinculado pela interpretação dada pelo Tribunal de Jusitça (efeito restrito do caso):
 O Tribunal nacional, ao decidir o caso, deve:
 interpretar as provisões de acordo com as indicações dadas pelo Tribunal
de Justiça:
 Desaplicar a norma se esta for considerada inválida e não pode desaplicá-la
se esta for considerada válida.
 A decisão do Tribunal de Justiça vincula igualmente outros tribunais nacionais
perante os quais aquele mesmo litígio é suscitado.

INVALIDADE
Se o ato for declarado inválido, a doutrina tem avançado que a decisão se impõe erga
omnes, ainda que a questão prejudicial possa ser colocada se subsistirem dúvidas quando
à invalidade. Todavia, o ato permanece na ordem jurídica da União até à sua alteração ou
revogação.
Esta declaração de invalidade vincula quer os Tribunais nacionais, quer os órgãos da
União, gerando um dever de eliminação ou alteração do ato em causa pelos órgãos
competentes da União.

VIOLAÇÃO DE OBRIGAÇÕES PELOS ESTADOS


A violação de obrigações pelos Estados (onde se inclui a obrigação de colcoar uma questão
prejudicial ao TJ quando a mesma seja obrigatória) podem ser objeto de uma ação por
incumprimento.
Essa violação pode ainda gerar responsabilidade do Estado-juiz por incumprimento do
direito da União aferida à luz do princípio da responsabilidade dos Estados membros.

Relativamente à violação do dever de reenvio, este corresponde:


 Do ponto de vista constitucional: violação do princípio do juiz legal;

Mariana Tralhão – 2016/17 35


DUEII 2º ano

 Do ponto de vista da União: como já referido, a ação de incumprimento e de


responsabilidade;
 Do ponto de vista internacional: violação de um direito a um julgamento justo e a
um processo equitativo, podendo a decisão do tribunal nacional ser contestada
junto do TEDH por violação do art. 6º CEDH.

Mariana Tralhão – 2016/17 36


DUEII 2º ano

DIREITO MATERIAL DA UNIÃO

INTEGRAÇÃO ECONÓMICA, SOCIAL E POLÍTICA


Apesar de os Estados serem as únicas entidades que dispõem de um território
economicamente integrado, uma integração económica entre vários Estados é vista como
desejável, de modo a obter:
 Economias de escala – conduz ao aumento da eficiência, já que o número de bens
produzidos é maio, como é igualmente o mercado ao qual são destinados;
 Desenvolvimento de projetos apenas possíveis a uma escala mais ampla,
sobretudo projetos de Investigação e Desenvolvimento (I&D) em áreas como as
energias renováveis;
 Melhor qualidade das políticas sociais e económicas (como consequência do
abandono de medidas protecionistas);
 Aceleração do desenvolvimento e melhor resposta (global) a crises (globais);
 Concorrência efetiva através da aplicação de regras de concorrência ao nível
internacional.

ESTÁDIOS PROGRESSIVOS DE INTEGRAÇÃO ECONÓMICA


1. Zona de preferência tarifária: assegura níveis tarifários preferenciais para o grupo
de países que integram a Zona.
2. Área de comércio livre:
 Eliminação das tradicionais restrições às relações comerciais entre os Estados.
 Garantia da livre circulação da maioria dos bens originais dos Estados
membros (o ónus da prova desta regra de origem incumbe o
exportador/importado do produto). Na ausência de regras de origem, os países
terceiros escolherão aceder a esta área através do país que pratique a tarifa
mais baixa, de modo a conseguir entrar em toda a ária de comércio livre.
 Aplicabilidade das tarifas nacionais e diferenciadas ao comércio externo.
3. União aduaneira:
 A liberdade de circulação é aplicável a todos os produtos (excluindo
normalmente os produtos agrícolas), sejam originários ou portadores, na
medida em que existe uma tarifa externa comum.
 Os países membros têm de abdicar de alguma liberdade para fixar as suas
políticas (principalmente a comercial) e reconhecer algumas limitações na
condução da sua política externa.
 Verifica-se a eliminação dos direitos aduaneiros, das restrições quantitativas e
de todas as medidas de efeito equivalente, sendo estas aplicáveis apenas às
importações do exterior da União, através de uma pauta alfandegária comum.
4. Mercado comum:
 Faz acrescer à União aduaneira o reconhecimento de outros produtos, os
fatores de produção, tradicionalmente o capital e o trabalho, ao qual se
adiciona os serviços.

Mariana Tralhão – 2016/17 37


DUEII 2º ano

 São eliminadas barreiras não tarifárias ao comércio e exigida uma


harmonização de políticas significativa em diversas áreas (ex: qualificação e
certificação dos trabalhadores).
5. União económica:
 Para além do mercado comum, existe uma coordenação das políticas económicas e
sociais entre Estados membros (de modo a eliminar divergências ou contradições
entre elas). Alguns setores económicos podem mesmo ser geridos por autoridade
conjunta (como acontece com a política agrícola comum).
6. União económica e monetária (Tratado de Maastricht):
 Coordenação de políticas monetárias (política monetária única), evitando que a
área de livre comércio seja afetada por oscilações cambiárias.
 Introdução da uma moeda única.

Sobretudo depois do Tratado de Maastricht verificou-se:


 O aprofundamento da integração europeia para domínios sociais e políticos.
 Crescente papel dos direitos humanos e dos princípios fundamentais, bem como
do reconhecimento da cidadania da União.
 A cidadania é um estatuto:
▫ Complementar, que pretende assumir-se como catalizador da
identidade europeia e da confiança no projeto europeu, logo
fundamental para a estruturação político-jurídica da União
Europeia.
▫ Fundamental pessoal e político dos cidadãos da União, que estende
os direitos de cariz económico previstos nos Tratados.

LIBERDADES COMUNITÁRIAS FUNDAMENTAIS


Desde o início, a União Europeia (então CE) suportou-se no reconhecimento, ainda que
progressivo, de várias liberdades, estritamente necessárias ao estabelecimento do
mercado comum.
Estas liberdades estão diretamente ligadas ao princípio da não discriminação em razão de
nacionalidade (art. 18º TFUE) e ao princípio do reconhecimento mútuo.
A concretização das liberdades tem sido feita paulatinamente no plano europeu. Estas
liberdades só valem no espaço interno da União, sendo que a fronteira externa delimita o
seu âmbito.
 No âmbito da livre circulação de pessoas, o espaço de liberdade, segurança e
justiça – art. 67º/2 TFUE;
 Para o exterior, no âmbito da livre circulação de mercadorias – pauta aduaneira
comum e código aduaneiro da União.
 Controlos aduaneiros e fiscalização aduaneira encontra-se definidos no art.
5º do Código Aduaneiro.

Mariana Tralhão – 2016/17 38


DUEII 2º ano

▫ Sendo que os primeiros consistem no cumprimento de


formalidades aduaneiras e no pagamento de direitos aduaneiros.
- Direitos anti-dumping (visam proteger a economia europeia
da prática de venda de mercadorias nos mercados
internacionais a preços inferiores aos praticados a nível
interno);
- Direitos de compensação (visam compensar a atribuição de
apoios estaduais por parte de países terceiros às suas
empresas, que desvirtuam o comércio internacional.
Embora a legislação aduaneira se encontre plenamente harmonizada, a sua execução, que
garante a conformidade com a regulamentação aduaneira e a legalidade da imposiçãode
sanções, situa-se no âmbito do direito nacional dos Estados membros (Portugal –
Autoridade Tributária e Aduaneira).

LIBERDADE DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS


Relativamente a esta liberdade de circulação, destaca-se:
 Art. 28º TFUE – consagra a liberdade de circulação de mercadorias, abrangendo a
totalidade do comércio de mercadorias, procura-se abolir quaisquer obstáculos
entre Estados, bem como a criação de um espaço único de circulação de produtos
do espaço europeu.
 Arts. 30º e 31º TFUE – proíbe-se entre os Estados membros os direitos aduaneiros
de importação e de exportação ou os encargos de efeito equivalente. Pressupondo-
se, desta forma, a fixação de uma pauta aduaneira comum (receitas dos direitos
aduaneiros cobrados pela entrada de produtos provindos de Estados terceiros
constitui uma receita própria da União).
 Arts. 34º e 35º - proíbem as restrições quantitativas à importação e à exportação,
bem como toda as medidas de efeitos equivalentes.
 Arts. 36º e 347º – medidas de salcaguarda.
A jurisprudência relevou-se fundamental na consagração dos princípios (1) da ilicitude de
toda a regulamentação comercial dos Estados membros que constitua um entrave à
circulação das mercadorias (acórdão Dassonville); (2) do esgotamento dos direitos; e (3)
do reconhecimento mútuo das legislações. (acórdão Cassis de Dijon).

CONCEITO DE MERCADORIA
Este é um conceito amplo e autónomo, que integra os produtos que podem ser avaliados
em dinheiro e que são passíveis de transações comerciais (Tribunal de Justiça). Excluídos
do conceito ficam apenas os capitais e meios de pagamento5.
O art. 5º (ponto 23) do Código Aduaneiro determina quais as mercadorias comunitárias

5Quando a moeda não se encontra em circulação, não é considerada forma de pagamento e pode
constituir mercadoria. No entanto, se for uma moeda antiquíssima integrada no domínio público de
um Estado, é uma res extra comercium, logo, não é uma mercadoria.

Mariana Tralhão – 2016/17 39


DUEII 2º ano

Mercadorias em livre prática:


Para serem considerados como estando em livre prática (art. 28º/2) e beneficiar do
princípio da equiparação, os produtos devem preencher os seguintes requisitos (art. 29º):
1) Ter cumprido as formalidades de importação;
2) Ter pago os direitos aduaneiros ou encargos de efeito equivalente exigíveis nesse
Estado membro;
3) Não ter beneficiado de total ou parcial draubaque desses direitos ou encargos
(Convenção de Kyoto – restituição dos direitos pagos na alfândega, quando certos
artigos importados são reexportados, isto é, não se destinam ao mercado interno).
Em suma, existe livre circulação de qualquer mercadoria em livre prática, mesmo que não
sejam produtos originários de Estados membros.

OBSTÁCULOS À LIVRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS


Os seguintes obstáculos à livre circulação de mercadorias são proibidos:
1) Direitos aduaneiros (art. 30º TFUE) – tributos (taxas) cobradas no momento da
importação ou exportação de uma mercadoria, sem a imposição de um tributo
idêntico a uma mercadoria de um Estado membro.
Através destes os Estados realizam dois objetivos: (1) proteção dos mercados
nacionais de produção ou comercialização; e (2) arrecadação de receitas.
Modalidades:
1) Ad valorem: uma percentagem do valor dos bens;
2) Específicos: montante fixado em função das características do produto e
não do seu valor.
EX: fixação de taxa específica ou ad valorem a certos produtos agrícolas
importados, para proteger os agricultores nacionais.

2) Encargos de efeito equivalente a direitos aduaneiros (art. 30º TFUE) –


medidas unilaterais impostas a uma mercadoria importada ou exportada que
aumentam o seu preço relativamente a idêntico produto comercializado no Estado,
independentemente da sua denominação técnica e aplicação.
Estes encargos pecuniários só não são considerados de efeito equivalente se:
a. Sobre as mercadorias nacionais incidirem encargos idênticos (pode não
haver mercadorias nacionais equivalentes para servirem de paralelo) –
princípio da neutralidade fiscal adotado pela jurisprudência;
b. Sempre que se trate de um serviço efetivamente prestado ao importador ou
ao exportador, num montante proporcional (EX: controlo de qualidade);
c. Se encontrarem previstos numa Convenção Internacional ou ato
comunitário;
d. Se previstos no art. 36º TFUE.
O TJUE considerou que este artigo impunha uma obrigação clara, precisa e
incondicionada, logo, produz efeito direto (Acórdão Van Gend en Loos). Como tal:
 Pode ser invocado este direito nos tribunais nacionais, contra o Estado ou
contra particulares;

Mariana Tralhão – 2016/17 40


DUEII 2º ano

 Qualquer exceção a esta regra tem de ser interpretada restritivamente.


EX: sujeição de importação de animais vivos a um exame sanitário na fronteira,
cujos encargos financeiros são assumidos pelo importador.

3) Restrições quantitativas ou contingentes – interdições totais ou parciais das


importações ou exportações de determinado tipo de bens.
EX: proibição de importação de carne de cavalo.

4) Medidas de efeitos equivalentes a restrições quantitativas – conceito jurídico


indeterminado que cobre todas as outras normas comerciais que tenham por
efeito entravar, direta ou indiretamente, autal ou potencialmente, o comércio
intracomunitário (fórmula Dassonville).
Para tanto, exige-se que se verifiquem os seguintes requisitos:
a. Que se trata de um ato ou comportamento de uma autoridade pública (ou
que lhe seja imputável), independentemente da sua configuração.
Esta é uma noção ampla que cobre quaisquer práticas protecionistas ou
discricionárias, com um grau razoável de constância e generalidade. Desta
forma, inclui:
i. Deveres de abstenção do Estado (não introdução de quaisquer
medidas de efeitos equivalentes);
ii. Deveres de proteção do Estado (eliminação de quaisquer medidas
de efeitos equivalentes e garantia que estas não são adotadas por
outras entidades públicas ou privadas – ligação ao efeito direto
horizontal desta liberdade.
b. Que o ato ou comportamento tenha efeitos restritivos equivalentes ao das
restrições quantitativas: geram efeitos que tornam as importações
impossíveis, mais difíceis ou onerosas do que o escoamento da produção
nacional.
Neste âmbito, podemos distinguir entre as medidas de efeito equivalente:
a. Discriminatórias – adotadas pelo Estado para se aplicarem exclusivamente
aos produtos importados ou exportados;
b. Teoricamente não discriminatórias – adotadas pelo Estado para se
aplicarem quer a produtos nacionais, quer estrangeiros, mas afetando
especialmente os produtos estrangeiros (mesmo medidas que se aplicam a
todos os produtos, por terem por efeito restringir o comércio de produtos
importados).

Estas proibições não determinam a proibição de contraprestações (taxa ou preço) pelos


serviços prestados pelas autoridades locais.
O critério utilizado pela Comissão é o de saber se o valor varia ou não com o valor da
mercadoria importada. Apenas no segundo caso poderemos estar perante uma taxa.

Destaca-se que nos domínios harmonizados pela legislação europeia, os Estados só são
admitidos a derrogar esta proibição (arts. 30º, 34º e 35º) nos casos previstos no art. 36º,

Mariana Tralhão – 2016/17 41


DUEII 2º ano

sempre limitados por princípios estritos de não discriminação, necessidade,


proporcionalidade e unidade.

Mercado interno
O mercado interno não é caracterizado apenas pela garantia da livre circulação de
mercadorias, mas por outras políticas como a da concorrência e a da fiscalidade.
Quanto à fiscalidade, apesar de se tratar de uma matéria de competência essencialmente
nacional, os Tratados efectuam também restrições. Existe duas condicionantes:
1) Princípio de neutralidade fiscal – as normas fiscais (sobretudo de tributação
indireta) não podem ser utilizadas como obstáculos à livre circulação de
mercadorias (art. 110º TFUE);
2) Tributação indireta – esta é feita apenas no Estado de importação (consumo) e não
no Estado de exportação (por isso se preveem as isenções às exportações (arts.
111º e 112º).
Assim, proíbem-se certos tipos de tributação direta ou indireta sobre produtos:
 Aqueles que favoreçam os bens nacionais ou de determinados Estados
relativamente a produtos similares, isto é, substituíveis ou comparáveis (art.
110º/1);
 Aqueles que visem proteger indiretamente outras produções (art. 110º/2 TFUE).
Estas reconduzem-se a:
- Diferentes taxas e incidências;
- Diferentes meios de pagamento (mais onerosos para os produtos importados);
- Diferentes benefícios fiscais.

Um importante passo neste âmbito foi dado Ac. Cassis de Dijon. Desta forma, foi
estabelecido o princípio de reconhecimento mútuo das legislações nacionais no âmbito da
liberdade de circulação.
Segundo o mesmo, uma mercadoria produzida ou legalmente introduzida no mercado de
um Estado membro pode, em princípio, ser introduzida no mercado de outro Estado
(encontra-se em livre prática – art. 28º TFUE).
No entanto, há limitações a este princípio:
 Umas provenientes da União Europeia;
 Outras adotadas pelos Estados, que devem ser comunicadas à União, e que são
admitidas desde que os Estados provem que estas são restrições:
 Que prosseguem fins legítimos à luz do Tratado (art. 346º, art. 36º TFUE ou
outros limites implícitos de interesse geral – EX: proteção do meio
ambiente; eficácia dos controlos fiscais; proteção da saúde pública; defesa
do consumidor).
 Sejam proporcionais aos objetivos a atingir;
 Não sejam discriminatórias (ainda que nem sempre este critério
prevaleça);
 Cumpram o direito comunitário aplicável.

Mariana Tralhão – 2016/17 42


DUEII 2º ano

LIBERDADE DE CIRCULAÇÃO DE CIDADÃOS/TRABALHADORES6


O art. 45º TFUE inclui a liberdade de acesso à profissão e ao exercício da profissão, bem
como à cessação do vínculo, sem discriminação em razão de nacionalidade (em todas as
suas vertentes: emprego, remunerações e condições de trabalho).
A livre circulação dos trabalhadores compreende, sem prejuízo das limitações justificadas
por razões de ordem pública, segurança pública e saúde pública, o direito de:
a) Responder a ofertas de emprego efetivamente feitas;
b) Deslocar-se livremente, para o efeito, no território dos Estados membros;
c) Residir num dos Estados membros a fim de nele exercer uma atividade laboral, em
conformidade com as disposições legislativas, regulamentares e administrativas
que regem o emprego dos trabalhadores nacionais;
d) Permanecer no território de um Estado membro depois de nele ter exercido uma
atividade laboral, nas condições que serão objeto de regulamentos a estabelecer
pela Comissão.

O exercício de atividades na administração pública não é coberto pela liberdade de


circulação de trabalhadores. Nos termos do art. 46º TFUE, é ao Parlamento Europeu e ao
Conselho que cabe emanar as diretivas e os regulamentos necessários à efetivação desta
liberdade.

CONCEITO DE TRABALHADOR
O conceito de trabalhador é um conceito autónomo do direito da União Europeia, que
deve ser interpretado independentemente dos conceitos de trabalhador dos direitos
nacionais.
 O conceito depende largamente da distinção entre o exercício de atividades
assalariadas e não assalariadas – serviços (art. 48º TFUE), estando associado às
primeiras atividades. Isto porque uma mesma função pode ser assegurada nestes
dois moldes, dependendo da qualificação do vínculo jurídico com a entidade
empregadora/adquirente (critério da relação laboral real e efetiva).
 O trabalhador será uma pessoa que realiza, durante um certo tempo, uma
prestação com valor económico determinado em função de uma pessoa,
sob direção desta, recebendo como contrapartida uma remuneração.
 Atende-se ainda à relevância transfronteiriça da relação laboral. Com base neste
critério, consideram-se excluídas do âmbito normativo da liberdade de circulação
dos trabalhadores as situações puramente internas de um Estado. Requer-se,
assim, que estejam em causa pelo menos dois Estados.
EX: abrange uma pessoa que procura emprego no seu próprio Estado, quando haja
sido obtido o seu diploma de estudos noutro Estado membro inclui o conceito de
trabalhador.

6A livre circulação de pessoas pode efetivar-se através da liberdade de circulação de trabalhadores,


da liberdade de prestação de serviços e da liberdade de estabelecimento.

Mariana Tralhão – 2016/17 43


DUEII 2º ano

EVOLUÇÃO DO DIREITO DE LIVRE CIRCULAÇÃO DOS TRABALHADORES


De uma liberdade reconhecida apenas aos trabalhadores que desenvolviam efetivamente
uma atividade laboral (dependente/assalariada) para uma liberdade ampla:
1) Inicialmente a extensão desta liberdade foi sendo feita de forma limitada:
a. Pelo Tribunal de Justiça (permitindo que o nacional de um Estado membro
possa procurar emprego noutro Estado ou nele permanecer se ficar
desempregado, por um período de tempo razoável); ou
b. Pela legislação (através do reconhecimento do direito à reunificação
familiar, considerando um requisito fundamental para o usufruto efetivo
do direito à circulação).
2) Também foram adotadas previsões específicas quanto à liberdade de circulação de
estudantes (considerando como um pré-requisito à liberdade de circulaçãode
estudantes).
3) A afirmação do reconhecimento mútuo de habilitações académicas e profissionais
é essencial neste domínio:
a. O reconhecimento das qualificações obtidas no Estado de origem é em
princípio automático, apenas se podendo prever condições adicionais que
tenham um fundamento material, objetivo na proteção de bens como a
segurança pública, saúde pública ou a proteção do consumidor e respeitem
os princípios da igualdade e da proporcionalidade.
b. Não há absoluta harmonização (apesar de haver medidas de simplificação
e promoção do reconhecimento), por isso podem, verificados aqueles
requisitos, ser previstas medidas de compensação (ex: provas de
compensação, formação complementar, estágios).
4) Verificou-se também o alargamento, ainda que mais limitado, no domínio de
segurança social (art. 48º TFUE e acórdão Hadj Ahmen).
5) O Tratado de Schengen e a sua integração no acervo da União (bem como o espaço
de liberdade, segurança e justiça) promoveram a livre circulação no espaço
europeu, para além da qualidade de trabalhador.
6) O maior contributo neste alargamento de uma liberdade económica para uma
liberdade fundamental (da pessoa) foi dado, porém, pela cidadania europeia da
União. O direito de livre circulação passou a incluir também um direito de
permanência e residência.
 Discutiu-se inicialmente a ausência de um carácter inovador deste direito
em face do já existente. Com o Acórdão Baumbast determinou-se que,
embora seja verdade que, antes da entrada em vigor do TUE, o Tribunal de
Justiça já tinha declarado que existia já nos termos da liberdade de
circulação dos trabalhadores um direito de residência.
 Contudo, no que respeita, em especial ao direito de residir no território dos
Estados membros previsto no art. 21º/1 TFUE, importa assinalar que este
é diretamente reconhecido a qualquer cidadão da União, por uma
disposição clara e precisa do TFUE.

DIMENSÕES DO DIREITO DE CIRCULAÇÃO


1. Liberdade de abandonar o Estado de que se é nacional

Mariana Tralhão – 2016/17 44


DUEII 2º ano

a. Proíbe: que os Estados membros criem limitações à saída de trabalhadores;


b. Confere: o direito aos trabalhadores europeus de abandonarem o Estado da
nacionalidade sem necessidade de visto de saída e apenas com bilhete de
identidade ou passaporte válido.
2. Liberdade de acesso a qualquer Estado membro
a. Proíbe: os Estados membros de criar entraves ao acesso de trabalhadores de
outros Estados membros.
b. Confere: o direito de acesso a qualquer Estado membro sem necessidade de
visto de entrada e apenas com os mesmos documentos já referidos.
3. Direito de deslocação dos familiares dos trabalhadores
a. Este direito é mais recente por se ter considerado que, sem o mesmo, os
trabalhadores não eram verdadeiramente livres de circular, já que seriam
sempre constrangidos por deixar para trás as suas famílias.
b. Que família goza desta liberdade?
i. Cônjuge;
ii. Sujeitos com união de facto registada;
iii. Descendentes até 21 anos;
iv. Descendentes com mais de 21 anos e ascendentes que estejam a cargo do
trabalhador.

DIREITO DE RESIDÊNCIA
O Tratado confere aos trabalhadores um direito de residência no país onde exerça a sua
atividade:
 Até três meses – direito a residir sem qualquer formalidade (apenas podem ser
exigidos os documentos referidos);
 A partir de três meses:
 Qualquer trabalhador da União tem direito a uma carta de residente, de
modelo único, se estiver a trabalhar. O direito à carta de residente é
judicialmente exigível.
 Se ainda não tiver encontrado trabalho, pode-lhe ser exigido que tenha
recursos financeiros suficientes e um seguro-doença, para evitar
sobrecarregar o Estado de acolhimento.

DIREITO DE PERMANÊNCIA
Depois de trabalhar em certo Estado, o trabalhador não é obrigado a abandonar o Estado
membro de acolhimento. Ou seja, não perde o estatuto de “trabalhador comunitário” se:
 Estiver em situação de incapacidade temporária de trabalho, em virtude de doença
ou acidente;
 Estiver em situação de desemprego involuntário, desde que tenha trabalhado mais
do que um ano e esteja inscrito num centro de emprego;
 Estiver aposentado.

Mariana Tralhão – 2016/17 45


DUEII 2º ano

Este regime não é estendido a nacionais de estados terceiros, mesmo que trablhadores
residentes num determinado Estado membro. A única exceção são os familiares dos
trabalhadores que não sejam nacionais de nenhum Estado membro.

RESTRIÇÕES A ESTA LIBERDADE


A liberdade de circulação de trabalhadores (art. 46º TFUE) pode conhecer restrições tendo
por base razões de ordem pública, segurança pública e saúde pública.
Todavia, sendo este um direito fundamental, diretamente aplicável, qualquer obstáculo
nacional apenas pode ser justificável se:
 Visa prosseguir um objetivo compatível com os Tratados;
 For justificado por razões de interesse público;
 For apropriado à consecução daquele objetivo legítimo;
 Não for para além do necessário para prosseguir aquele objetivo (sendo
proporcional).

Quanto ao interesse público:


1) Reserva de saúde pública – a Diretiva 2004/38/CE contém limites à forma de
demonstração das razões de saúde pública:
 Se o trabalhador já está no Estado de acolhimento há mais de três meses,
deixa de ser possível invocar a reserva de saúde pública.
 Cabe às autoridades nacionais a prova de que a doença foi contraída antes
de aceder ao Estado.
2) Reserva de ordem pública e de segurança pública – a mesma Diretiva deixa ao
Estado membro a liberdade de aplicar estes interesses, mas impõe três limites:
 Não podem ser invocadas para a salvaguarda de interesses ou finalidades
económicas (exclui o desemprego ou a crise);
 Têm de basear-se no comportamento pessoal do indivíduo (Ac. Van Duyn);
 A simples existência de condenações anteriores não é fundamento bastante
para invocar, tendo de haver uma ameaça real e atual (a mesma pode ser
originada por condenações anteriores).

LIBERDADE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS


Esta liberdade encontra-se consagrada nos arts. 56º a 62º, onde se proíbem as restrições à
liberdade de prestação de serviços, sem que, para tanto, se tenha de criar no Estado
membro em que se presta os mesmos um estabelecimento estável de qualquer natureza.
O conceito de prestação de serviços está integrado no art. 57º. Destaca-se como
características da liberdade de prestação de serviços:
 Carácter residual ou subsidiário – constitui um complemento à liberdade de
circulação de trabalhadores, do direito de estabelecimento e à livre circulação de
capitais. O que decorre do art. 57º TFUE.

Mariana Tralhão – 2016/17 46


DUEII 2º ano

 Da mesma definição, compreende-se que os serviços são realizados, em


regra, mediante de uma remuneração, o que não impede que a mesma não
tenha um fim lucrativo ou que redunde num ganho aleatório.
 Carácter temporário – o prestador pode, para execução da prestação, exercer, a
título temporário, a sua atividade no Estado membro onde a prestação é realizada,
nas mesmas condições que esse Estado impõe aos seus próprios nacionais.
 Carácter dual – engloba o direito de prestar serviços e o direito de aceder ao
serviço prestado noutro país da União Europeia (liberdade ativa e passiva –ou seja,
pode ser invocada pelo prestador ou pelo prestatário) ou serviços de
correspondência (elemento de extraneidade).
 Eficácia direta, podendo ser invocada contra entidades públicas e privadas.

DIRETIVA 2006/123/CE, PARLAMENTO EUROPEU E CONSELHO


A presente diretiva (Diretiva Bolkenstein), relativa aos serviços no mercado interno,
estabelece disposições gerais que facilitam o exercício da liberdade de estabelecimento
dos prestadores de serviços e a livre circulação dos serviços, mantendo simultaneamente
um elevado nível de qualidade dos serviços.

Vetores desta Diretiva:


1. Harmonização e simplificação dos procedimentos administrativos nacionais;
2. Acessibilidade da informação sobre as regras aplicáveis à prestação de serviços,
através de um ponto de contacto único;
3. Reconhecimento automático de certificados ou outros documentos de outro
Estado membro;
4. Procedimentos autorizativos devem ser claros, não dissuasivos, necessários,
proporcionais e não discriminatórios;
5. As derrogações às regras gerais são apenas permitidas em casos bem definidos de
ordem pública, segurança pública ou proteção do ambiente;
6. Podem ser adotados requisitos específicos em profissões reguladas de modo a
preserva a sua imparcialidade, independência e integridade.

SETORES ESPECIAIS OU EXCLUÍDOS:


 O art. 58º/1 TFUE determina o tratamento separado, em título próprio, da
prestação de serviços no domínio dos transportes.
 O nº2 determina que a liberalização dos serviços bancários e de seguros ligados
a movimentos de capitais deve efectuar-se de harmonia com a liberdade de
circulação de capitais.
 Determinam-se excluídos estão também alguns serviços de interesse geral, que
são financiados pelo Estado e relativamente a cuja prestação não se pode falar de
uma remuneração, uma vez que, ainda que os seus destinatário possam pagar
taxas, as mesmas são consideradas contribuições para o sistema público, não como
remuneração.
 Excluem-se, também, as atividades ocasionalmente ligadas ao exercício da
autoridade pública (EX: consultoria no domínio militar).

Mariana Tralhão – 2016/17 47


DUEII 2º ano

Um dos temas fundamentais prende-se com a coordenação dos regimes jurídicos


(requisitos para a atividade) e o reconhecimento das qualificações profissionais, de acordo
com o princípio da equivalência e de Estado de origem.
No âmbito do princípio do Estado de origem, o art. 5º/1 da Diretiva 2005/36/CE dispõe
que os Estados membros não podem restringir a livre prestação de serviços, por razões
relativas às qualificações profissionais, se o prestador de serviços estiver legalmente
estabelecido noutro Estado Membro onde a profissão esteja regulamentada.
Contudo, isto não afasta o estabelecimento de normas adicionais pelo Estado onde ocorre
a prestação de serviços. Por remissão do art. 62º TFUE, aplicam-se à liberdade de
prestação de serviços as autorizações de restrição constantes do art. 52º/1. Isto significa
que este direito pode ser restringido.
Estas restrições devem ser:
1) Restritivamente interpretadas e aplicadas;
2) Motivadas por um interesse ponderoso – razões de ordem pública, segurança
pública e saúde pública (o art. 4º/8 Diretiva 2006/123/CE define bens de
interesse geral);
3) Proporcionais à obtenção do interesse.
Não se pode esquecer a necessidade de respeitarem o princípio da igualdade, não podendo
ser discriminatórias.

LIBERDADE DE ESTABELECIMENTO
O direito de liberdade de estabelecimento encontra-se regulado nos arts. 49º a 55º do
TFUE:
 Pretende ser um fator de mobilidade social e económica, protegendo a liberdade
de escolha da localização da atividade e da estratégia empresarial com base em
critérios económicos.
 Visa a criação de condições de livre e leal concorrência entre empresas e
profissionais liberais e para a adaptação das estruturas de produção à escala da
União.
 Pretende aumentar a mobilidade dos trabalhadores por conta própria;
 Permite às empresas a reorganização das suas atividades no mercado interno
reduzindo os respetivos custos de transação.

ÂMBITO DE PROTEÇÃO
Nos termos do art. 49º/2, este direito compreende tanto o acesso a atividades não
assalariadas coo a constituição e a gestão de empresas, sob as mais variadas formas.
Desta forma, ele garante uma atividade económica autónoma (não assalariada, implicando
a assunção do risco e a sua direção própria) com características de permanência ou
estabilidade, num ambiente transfronteiriço e em condições de igualdade e não
discriminação.

PROGRAMA NORMATIVO

Mariana Tralhão – 2016/17 48


DUEII 2º ano

O objetivo, como refere o art. 50º/2-f TFUE é a supressão gradual das restrições à
liberdade de estabelecimento em todos os domínios, o que exige a harmonização dos
regimes nacionais e a criação de regimes europeus.

Profissionais liberais:
Neste domínio, é relevante o conhecimento de diplomas e qualificações profissionais.
No caso dos advogados, existem três modalidades de regimes de exercício da atividades
de advocacia em Portugal por parte de cidadãos de outros Estados membros. A primeira
permite a prestação de serviços pontuais, enquanto as restantes supõem um direito de
estabelecimento.
1) O cidadão de outro Estado membro pode exercer a atividade apenas com o título
profissional de origem, prestando serviços apenas nos domínios do direito interno,
do direito comunitário e do direito internacional. Existe aqui o dever de inscrição
no órgão profissional do Estado membro de origem e o de dar conhecimento da
sua atividade à Ordem de Advogados portuguesa.
2) Esta diz respeito ao exercício da atividade com título profissional e registo na
Ordem dos Advogados. O advogado pode exercer uma atividade permanente com
título de origem e inscrição na Ordem dos Advogados. Ele está subordinado às
regras de ambos os Estados.
3) Esta prende-se com o exercício da atividade com qualificações obtidas no Estado
de origem e um título profissional nacional do Estado de acolhimento. O advogado
pode exercer a atividade permanente com o título, desde que se sujeite a um
exame de habilitação ou que comprove a sua experiência.

IGUALDADE E NÃO DISCRIMINAÇÃO


Da dimensão da igualdade decorre a obrigação de assimilação dos nacionais de outros
Estados membros aos cidadãos nacionais, juntamente com a proibição de toda a
discriminação em função da nacionalidade. Neste sentido é que o art. 55º consagra o
princípio do tratamento nacional, postulando o mesmo tratamento para ambos os
nacionais.

TITULARES E DESTINATÁRIOS
Este direito é aplicável a entidades privadas, singulares ou coletivas (referidas no art.
54º), e públicas no âmbito dos serviços e do direito das sociedades, que pretende
estabelecer-se num outro Estado membro.
 Aplica-se a trabalhadores assalariados num Estado membro que pretendem
estabelecer-se para exercer uma profissão independente noutro Estado membro
(art. 50º/2-d TFUE, destaca-se ainda o art. 7º/1-a da Diretiva nº 2004/38/CE).
 O art. 54º TFUE estabelece o princípio da equiparação, às pessoas singulares, as
sociedades que tenham sede, administração ou estabelecimento principal na União
Europeia, afastando do conceito de sociedade todas as entidades sem fins
lucrativos.
Vincula autoridades públicas europeias e nacionais, bem como entidades privadas que
possam adotar práticas contrárias à liberdade do estabelecimento.

Mariana Tralhão – 2016/17 49


DUEII 2º ano

 Este aspeto sugere a importância do dever estadual de proteção da liberdade de


estabelecimento contra restrições impostas por entidades privadas.
 O Estado deve adotar todas as medidas adequadas e necessárias a garantir o
respeito das liberdades fundamentais.
 A avaliação das medidas adotadas cabe, em primeira linha, aos tribunais nacionais.

RESTRIÇÕES
Apenas se permitem as restrições com fundamentos de natureza não económica. Estes
devem ser alvo de interpretação restritiva.
Elencam-se como limitações à liberdade de estabelecimento:
1) Participação no exercício de atividades de autoridade pública (art. 51º TFUE);
2) Restrições motivadas em razões de interesse público (art. 52º TFUE). Destaca-se
que a Diretiva 2006/123/CE reconhece um vasto elenco de bens dignos de
proteção.
 Apenas justifica medidas restritivas não discriminatórias;
 Os direitos fundamentais reconhecidos pelo direito da União Europeia
podem justificar a restrição da liberdade de estabelecimento.

Limites das restrições


 Princípio da excecionalidade das restrições;
 Princípio da igualdade e da proporcionalidade;
 Interpretadas restritivamente;
 Sujeitas a um apertado controlo jurisdicional;
 Prosseguem um fim legítimo de natureza não económica.

Apesar de a tributação interna ser uma matéria da competência reservada dos Estados
membros, o proíbe-se a discriminação fiscal, ou seja, um tratamento fiscal diferenciando
nacionais, residentes ou sediados em diferentes Estados membros.
Contudo, um qualquer tributo que decorra de um único Estado membro pode constituir
uma restrição ao direito de estabelecimento se torna menos atrativo o respetivo exercício.
A mesma apenas poderia ser admitida se justificada e proporcional.
O TJUE não desconsidera totalmente a proteção de bens estaduais relevantes, como sejam
o combate à fraude e à evasão fiscal, a defesa da coerência e da integridade do sistema
fiscal e a repartição equilibrada do poder de tributar.

EXEMPLO DOS NOTÁRIOS – DIREITO NACIONAL


O art. 15º da CRP estabelece o princípio da equiparação dos estrangeiros aos nacionais,
com exceção dos direitos políticos, do exercício de funções públicas que não tenham
carácter predominantemente técnico e os direitos e deveres reservados pela Constituição
e pela lei exclusivamente aos cidadãos portugueses, de acordo com o princípio da
proporcionalidade.

Mariana Tralhão – 2016/17 50


DUEII 2º ano

Pode questionar-se se não será a própria Constituição que exclui os estrangeiros da função
notarial. Assim, o notário continua a desempenhar uma função pública (mesmo
privatizado), mas coloca-se a questão da sua natureza.
Desta forma, parece haver um eventual desacerto entre direito constitucional e direito da
União, tornando-se imperativo uma interpretação conforme com o direito comunitário.
 Até à reforma trazida pelo Decreto-Lei nº 26/2004, de 4 fevereiro, o notariado
regia-se pelo estatuto da função pública (seguia-se o modelo do notariado público),
razão pela qual se considerava, quase sem oposição, que a Diretiva n+º 89/48/CE,
do Conselho, de 21 de dezembro de 1988, não era aplicável aos notários em
Portugal7.
 Com o Decreto-Lei nº 26/2004, verifica-se a privatização do notariado, segundo a
qual o notário exerce a sua função no quadro de uma profissão liberal, mas são-lhe
atribuídas prerrogativas que o farão participar da autoridade pública, devendo,
por isso, o Estado controlar o exercício da atividade notarial, a fim da garantir a
realização dos valores servidos pela fé pública, que ficariam necessariamente
afetados caso se consagrasse um sistema de livre acesso à função. Mas a natureza
pública e privada da função notarial é incidível (art. 1º/3).
Este Decreto-Lei estabelece como requisitos de acesso à função notarial (art. 25º), no
entanto, o mesmo não estabelece qualquer referência à nacionalidade portuguesa dos
notários, pelo que parece admitir o acesso ao notariado de estrangeiros. Coloca-se assim o
problema de saber se se incluem aqui apenas nacionais.
À luz do direito da União Europeia, deve atender-se ao facto de:
 O art. 49º TFUE reconhecer o direito de estabelecimento, que implica a
possibilidade de um nacional da União participar, de modo estável e contínuo, na
vida económica de um Estado membro diferente do seu Estado de origem.
 O art. 51º TFUE estipula também que o direito de estabelecimento não é aplciável
às atividades que, nos Estados membros, estão ligadas, ainda que ocasionalmente,
ao exercício de autoridade pública.
No âmbito da Diretiva nº 89/48/CEE, do Conselho, de 21 de dezembro de 1988, a
tendência ia no sentido de considerar a função notarial excluída das liberdades
comunitárias.
A Diretiva nº 2005/36/CE, por sua vez, trouxe sentidos diversos:
 Por um lado, o seu art. 2º/3 refere que sempre que num instrumento separado da
legislação comunitária sejam estabelecidas outras regras específicas diretamente
relacionadas com o reconhecimento de qualificações profissionais para
determinada profissão regulamentada, não se aplicarão as disposições
correspondentes na diretiva.
 Por outro lado, no considerando 41 da Diretiva, estatui-se que a Diretica não
prejudica a aplicação dos arts. 39º/4 e 45º do TFUE, designadamente no que diz
respeito aos notários.
No entanto, a proposta inicial era a de considerar expressamente excluída do
âmbito da Diretiva a atividade notarial, sendo que o exposto é apenas uma

7Também as Diretivas sobre advogados, de 1977 e 1998, se permitia que se excluísse um advogado
proveniente de um Estado membro do exercício de atividades tipicamente de um Estado membro
do exercício de atividades tipicamente notariais noutro.

Mariana Tralhão – 2016/17 51


DUEII 2º ano

formulação do considerando, que não tem natureza diretamente vinculativa, uma


solução de compromisso.
A colocar ainda mais dúvidas, a Diretiva 2006/123/CE, relativa aos serviços no mercado
interno, exclui a atividade notarial do seu campo de aplicação. Isto porque visa facilitar a
liberdade de estabelecimento e de prestação de serviços, mas não se aplica aos serviços de
interesse económico geral (como os notariais), que sofrem especificidades quanto ao seu
exercício.
A lei francesa determina que apenas podem ser notários os franceses, sendo que a
principal função dos mesmos consiste em lavrar atos autênticos, sendo que ele verifica que
se estão reunidos requisitos legalmente exigidos para a realização do ato.
No entanto, o Tribunal de Justiça8 já teve a ocasião de considerar que estão excluídas da
derrogação do Tratado certas atividades que são auxiliares ou preparatórias
relativamente ao exercício da autoridade pública, como é o caso da atividade do notário,
que depende do consentimento das partes, não o podendo alterar unilateralmente. O facto
de certos atos ou certas convenções deverem obrigatoriamente ser objeto de autenticação,
sob pena de nulidade, não é suscetível de pôr em causa esta conclusão.
 Relativamente à força probatória e à força executória de que o ato notarial
beneficia, não se pode contestar que as mesmas conferem aos referidos atos
efeitos jurídicos importantes. No entanto, o facto de uma determinada atividade
comportar a elaboração de atos dotados de tais efeitos não basta para que se
considere que essa atividade está direta e especificamente ligada ao exercício da
autoridade pública.
 No que concerne às funções de cobrança de impostos, de que o notário está
encarregado, não podem também ser consideradas em si mesmas como estando
ligadas direta e especificamente ao exercício da autoridade pública, sendo que este
entrega o imposto ao Estado, não sendo muito diferente do que se passa com o
IVA.
 O facto de prosseguir objetivos de interesse geral não basta, também.
Contudo, o facto de esse interesse geral visar garantir a legalidade e a segurança jurídica
dos atos celebrados entre particulares, constitui uma razão imperiosa de interesse geral
que permite justificar eventuais restrições ao art. 49º TFUE, como o enquadramento de
que os notários são objeto através dos processos de recrutamento que lhes são aplicáveis,
a limitação do seu número e das suas competências territoriais ou ainda o seu regime de
remuneração, independência, incompatibilidades e inamovibilidade, desde que essas
permitam alcançar os referidos objetivos e sejam necessárias para esse efeito.
O DL nº 15/2011, de 25 de janeiro (na sequência da Lei nº 9/2009, de 4 de março) veio
clarificar como requisito para adquirir a qualidade de notário em Portugal a nacionalidade
portuguesa ou de outro Estado membro da União (ou outro signatário de acordo com
Portugal).

LIBERDADE DE CIRCULAÇÃO DE CAPITAIS E PAGAMENTOS


Esta encontra-se consagrada no art. 63º TFUE.
No início, esta política não tinha o mesmo estatuto de outras liberdades, sendo que a
abolição à restrição de capitais deveria ser assegurada na extensão necessária para
garantir o funcionamento adequado do mercado comum.

8 Acórdão do TJ de 24 de maio de 2011 – Proc. C-50/08

Mariana Tralhão – 2016/17 52


DUEII 2º ano

Depois da Diretiva 88/361/CEE e da introdução da União Económica e Monetária pelo


Tratado de Maastricht, a liberdade de circulação de capitais passou a ter um estatuto
similar às outras liberdades.

ÂMBITO DE APLICAÇÃO
 Investimento estrangeiro direto (aquisição de uma empresa ou de partes
relevantes das suas ações);
 Compras ou investimentos imobiliários;
 Investimentos no mercado de capitais (ações, fundos, trust);
 Concessão de empréstimos e créditos;
 Outras operações financeiras (heranças, legados).

Esta liberdade proíbe limitações às trocas de capitais e pagamentos entre os Estados


membros e entre estes países terceiros ou a aplicação de disposições discriminatórias, de
modo a estruturar um mercado de capitais à escala europeia9.
A mesma tem implicações em matérias diversas, como a bolsa, banca e seguros, motivando
medidas de harmonização, também em matéria fiscal (evitando a dupla tributação de
rendimentos).

RESTRIÇÕES
A liberdade de circulação de capitais pode ser restringida com base em fundamentos
expressamente previstos nos Tratados (ou seus fundamentos implícitos).
Existe a possibilidade de adoção medidas que constituam um retrocesso no direito da
União em relação à liberalização dos movimentos de capitais com destino a países
terceiros ou deles provenientes (art. 64º/3) e ainda a de aceitação de medidas adotadas
por um Estado com o mesmo teor (art. 65º/4).
Segundo o art. 65º/1, os Estados membros têm direito de:
1) Aplicar as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma
distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se
refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido
(critérios da residência e da fonte).
2) Tomar todas as medidas indispensáveis para impedir infrações às suas leis e
regulamentos, nomeadamente em matéria fiscal e de supervisão providencial das
instituições financeiras, preverem processos de declaração dos movimentos de
capitais para efeitos de informação administrativa ou estatística, ou tomarem
medidas justificadas por razões de ordem pública ou de segurança pública.
a. Ter fundamento em objetivos legítimos a promoção da coerência fiscal dos
sistemas nacionais, de evitar o branqueamento de capitais, de evitar o
financiamento do terrorismo (desde que não se trate de bens de natureza
económica, como a proteção dos interesses financeiros gerais do Estado);

9Caso Golden Shares Português (regras nacionais que proibiam que investidores de outros Estados
apenas adquirissem um certo número de ações em empresas recem privatizadas).

Mariana Tralhão – 2016/17 53


DUEII 2º ano

b. As ameaças a estes objetivos sejam suficientemente graves, caracterizadas


e determinadas (Caso Golden Shares e Eurobonds). Segundo o TJ, o simples
receito de fraude ou evasão fiscal não pode, por si só, justificar uma medida
fiscal que configura uma violação frontal de uma liberdade de circulação.
Destaca-se ainda a necessidade de respeito pelo princípio da proporcionalidade, da
igualdade e a submissão a jurisdição efetiva.

TITULARES
Os titulares desta liberdades são os nacionais, residentes e sediados na União Europeia.
Os Estados devem garantir que a liberdade de circulação de capitais seja na sua veste de
entidade dotada de poderes públicos, seja enquanto Estado Acionista, independentemente
de o movimento de capitais ser intracomunitário ou entre um Estado terceiro e a União.
A proibição de restrição à liberdade de circulação de capitais e pagamentos tem efeito
direto (Processo Bordessa, Sanz de Lera).

RESTRIÇÕES ÀS LIBERDADES DE CIRCULAÇÃO


REQUISITOS:
1) Objetivos legítimos, sendo os mais relevantes:
a. Ordem pública – este é um conceito comunitário, mas cujo preenchimento
é deixado, muitas vezes, aos Estados, dentro de limites dos Tratados. Este
remete para a violação de princípios jurídicos fundamentais.
b. Segurança pública – conceito ais limitado que se relaciona com a proteção
do Estado contra ameaças e inimigos (mas pode abranger condutas não
políticas).
c. Saúde pública – conceito diferenciado, mais concreto e determinável, sendo
que as pessoas já estão estabelecidas no Estado de origem passam a
merecer mais proteção.
As únicas doenças que podem justificar medidas restritivas devem ter
potencial epidémico e outras doenças infecioas ou parasitárias.

2) As restrições têm de ser justificar com base na conduta pessoal do visado, isto é,
o comportamento da pessoa deve constituir uma ameaça real, atual e
suficientemente grave que afete um interesse fundamental da sociedade.

3) As condenações penais (no estado de origem ou de acolhimento) não podem ter


efeitos automáticos, tendo de ser devidamente ponderadas as circunstâncias do
caso, de modo a aferir se a pessoa constitui ainda um perigo.

4) As restrições não podem ser justificadas por fins económicos ou


protecionistas;

Mariana Tralhão – 2016/17 54


DUEII 2º ano

5) Exige-se o respeito pelos direitos fundamentais e pelo princípio da não


discriminação;

6) A medida adotada tem de ser proporcional – adequada, necessária e proporcional


em sentido estrito.

GARANTIAS PROCEDIMENTAIS/PROCESSUAIS
 Acesso a documentos do país de origem (registo de condenações penais, cadastro
criminal);
 Prazos para a tomada de decisão;
 Direito a ser ouvido;
 Fundamentação da decisão;
 Notificação da decisão;
 Direitos de recurso administrativo e judicial;
 Atribuição em princípio de efeito suspensivo ao recurso;
 Limites à detenção e deportação.

Mariana Tralhão – 2016/17 55


DUEII 2º ano

AMBIENTE
Cada vez há mais atos jurídicos de direito ambiental na União Europeia, este aumento
pode justificar-se pela atuação do princípio da integração.
 Princípio da integração – obriga as instituições a integrar as exigências em matéria
de proteção do ambiente na definição e execução das políticas e ações da União,
com o objetivo de promover um desenvolvimento sustentável.

TRANSVERSALIDADE DA POLÍTICA AMBIENTAL DA UNIÃO


As normas de direito ambiental europeu estabelecem cada vez mais restrições às
liberdades fundamentais e cada vez mais conformam a prossecução das restantes políticas
europeias, as quais passam a dever considerar o ambiente não apenas como um limite,
mas também como um fim acessório dessa política.

LIBERDADES FUNDAMENTAIS
1. Proc. C-240/83 (livre circulação de óleos usados) – admitiu-se restrições à
liberdade de circulação de mercadorias por razões ambientais.
2. Caso das garrafas dinamarquesas (Proc. 302/86) – Tribunal pronunciou-se em
sentido favorável às restrições à liberdade de circulação de mercadorias por
razões de proteção ambiental (medida impunha o mesmo regime tanto para os
produtores dinamarqueses como para os estrangeiros).
3. Diretiva 2006/123/CE, que veio liberalizar os serviços no mercado interno,
permite regimes restritivos para certos serviços ambientais.
4. Diretiva 2008/87/CE, confirmando a legitmidade do comércio de licenças de
emissões enquanto mecanismo do protocolo de Kyoto, mesmo que configure uma
restrição ao livre estabelecimento de instalações emissoras de dióxido de carbono
ou gases com efeito equivalente.

ÂMBITO DE OUTRAS POLÍTICAS


1. Política Agrícola Comum – apoios específicos (medidas agro-ambientais) para
atividades ou práticas agrícolas consideradas importantes para a proteção ou
valoração do ambiente (69º/1-a) a v) – Reg. Nº 73/2009).
2. Política de Transportes – programa Marco Polo I e II, que tem como objetivo
melhorar o desempenho e impacte ambiental do sistema de transportes (Reg. nº
1692/2006 e Diretiva 2009/33/CE).
3. Política de Coesão – o Fundo de Coesão apoia os investimentos no ambiente,
tendo como prioridades a transição para uma economia de baixo teor de carbono,
prevenção e gestão dos riscos, preservação e proteção do ambiente, utilização
eficiente dos recursos e promoção de transportes sustentáveis (Reg. 1300/2013).
4. Política de Pesca – garantir que as atividades de pesca e da agricultura sejam
ambientalmente sustentáveis a longo prazo, conduzindo à redução ao mínimo
possível dos impactes negativos que estas atividades possam gerar nos
ecossistemas (Reg. nº 1380/2013).

Mariana Tralhão – 2016/17 56


DUEII 2º ano

5. Política Industrial – introdução da licença ambiental, reduzindo-se a emissão de


gases poluentes e atingindo-se um elevado nível de proteção do ambiente no seu
todo (Diretiva 2010/75/EU).
6. Política Energética e do Ambiente – promoção da utilização de energia
proveniente de fontes renováveis (os preços das energias devem refletir os seus
custos externos de consumo e produção, designadamente os custos ambientais –
Diretiva 2009/28/CE).

HISTÓRIA
Nos finais da década de cinquenta do séc. XX, quando as Comunidades Europeias foram
criadas, não lhes foram atribuídas competências em matéria ambiental.
Começaram a ser emitidas Diretivas nesta área, para cuja base legal foi utilizada a norma
que consagrava o sistema de integração de lacunas (art. 352º TFUE). Sendo ténue o
fundamento da competência europeia, foi questionado, a nível dos Estados membros, a
validade destas Diretivas.
O TJUE veio considerar que o fundamento jurídico das diretivas aceitável, uma vez que a
proteção do ambiente é uma condição sine qua non da melhoria das condições de vida, a
qual é um objetivo prioritário expresso nos Tratados.

DIREITO AMBIENTAL PRIMÁRIO


Ato Único Europeu (1986) – desde então que o ambiente figura entre as competências
partilhadas entre a Comunidade e os Estados membros.
Tratado de Maastricht – acrescentou aos artigos do ato anterior o princípio da precaução
e o objetivo de promover, no plano internacional, medidas destinadas a enfrentar os
problemas regionais ou mundiais do ambiente.
TFUE atualmente – prevê a política ambiental nos arts. 191º e ss.
Tratado de Lisboa – aditou mesmo as alterações climáticas como um problema ambiental
global, que cabe à União Europeia combater através da política ambiental.

OBJETIVOS DA POLÍTICA AMBIENTAL DA UNIÃO


O art. 191º/1 do TFUE consagra os quatro os objetivos da política ambiental da União.
1) Preservação, proteção e melhoria da qualidade do ambiente;
2) Proteção da saúde das pessoas;
3) Utilização prudente e racional dos recursos naturais;
4) Promoção, no plano internacional, de medidas destinadas a enfrentar os problemas
regionais ou mundiais do ambiente, designadamente combater as alterações climatéricas.

Este elenco de objetivos permite duas conclusões relativamente às preocupações


ambientais da União:
1) Não são meramente internas, mas também internacionais;
2) Não são puramente antropocentristas, pois o ambiente deve ser protegido mesmo
quando a poluição ou a degradação dos componentes ambientais não causa danos
às pessoas.

Mariana Tralhão – 2016/17 57


DUEII 2º ano

Com o Tratado de Lisboa (2009), o surgimento da política de energia (art. 194º TFUE) vem
confirmar a íntima ligação entre a política ambiental e a política energética, na luta contra
as alterações climatéricas.

PRESSUPOSTOS DA POLÍTICA AMBIENTAL DA UNIÃO


A amplitude da proteção ambiental sofre algumas limitações postas pelos pressupostos de
atuação, consagrados no art. 3º do art. 191º:
1. Dados científicos e técnicos disponíveis – a consagração deste foi fruto da posição
britânica, que defendia que só seria possível exigir uma ação preventiva de
proteção do ambiente quando a causa da poluição estivesse cientificamente
comprovada.
Contudo, o mesmo não está em contradição com o princípio da precaução, uma vez
que não impede que a União adote medidas de proteção ambiental mesmo na
ausência de dados científicos ou perante dados científicos contraditórios.
O seu fundamento é impedir que se ignorem os dados científicos e técnicos
disponíveis, inspirando uma atualização permanente do direito derivado europeu
do ambiente, para o adaptar ao progresso e obrigando à introdução de clásulas de
progresso na legislação ambiental europeia.
2. Condições do ambiente nas diversas regiões da União:
a. Enquanto pressuposto, a diversidade regional relevante é apenas a
diversidade ambiental (art. 191º/3-2) e a diversidade económico-social
(art. 191º/3-4).
b. Enquanto moderador do nível elevado de proteção, releva a diversidade
europeia em geral (art. 191º/2).
c. Enquanto fundamento de cláusulas de salvaguarda e de apoios financeiros,
funciona apenas a diversidade económica, remetendo para o
financiamento, quando necessário, proveniente do Fundo de Coesão (art.
192º/5).
3. Vantagens e encargos que podem resultar da atuação ou da sua ausência – o que
aqui se exige não são análises quantificadas de custos e benefícios, mas
ponderações não quantificadas de vantagens e encargos. Isto porque, em regra, os
encargos são os custos económicos de investimentos atuais, por isso, são fáceis de
calcular. No entanto, as vantagens das medidas ambientais, que são as melhorias
de qualidade ambiental e consequentemente da qualidade de vida, são muito mais
difíceis de contabilizar.
4. Desenvolvimento económico e social da União no seu conjunto e o
desenvolvimento equilibrado das suas regiões.

PROCEDIMENTO LEGISLATIVO AMBIENTAL


Regra: procedimento legislativo ordinário (deliberação do Parlamento Europeu e do
Conselho após consulta ao Comité Económico Social e ao Comité das Regiões).
Exceção: procedimento legislativo especial (antigo procedimento deliberativo), de acordo
com o mesmo, o Parlamento é apenas consultado, sendo que o seu parecer não vinculativo
deve ser tido em consideração pelo Conselho. Isto acontece em matérias de grande
sensibilidade política e social, que estão ligadas com a soberania fiscal, territorial ou
energética do Estado.

Mariana Tralhão – 2016/17 58


DUEII 2º ano

Unanimidade de todos os Estados do Conselho:


1) Domínio da fiscalidade ambiental e no ordenamento do território ou da afetação dos
solos: contudo, este direito de veto não significa que os objetivos ambientais
fiquem fora das decisões de gestão dos solos e de ordenamento do território, nos
Estados membros. De facto, o regime europeu obriga os Estados membros a
submeter todos os planos e programas que considerem suscetíveis de ter efeitos
significativos no ambiente a uma avaliação ambiental destinada a ponderar todas
as alternativas razoáveis para evitar, reduzir ou compensar os efeitos ambientais
adversos.
2) Domínio da gestão dos recursos hídricos: esta exigência limita-se à questão
quantitativa, ou seja, às medidas destinadas a assegurar a existência e
disponibilidade do recurso fundamental, mas não já à sua qualidade, a qual é
objeto de harmonização pela Diretiva 2000/60/CE.

PRINCÍPIOS JURÍDICOS DE DIREITO AMBIENTAL


Num direito tão técnico, com uma evolução tão rápida, que tenta acompanhar uma
realidade vertiginosa, o papel dos princípios de direito do ambiente é fundamental,
garantindo a coerência e articulação dos ordenamentos jurídicos na integração de lacunas
legais e na correção de antinomias normativas, como auxiliares na interpretação jurídica,
orientando a atuação administrativa ou criando imposições legiferantes.

1. Princípio do desenvolvimento sustentável


Este princípio tem uma relação de abrangência, sendo um princípio e um objetivo
transversal das políticas da União Europeia. A sua relevância ultrapassa as
fronteiras da política ambiental, estando presente em momentos fundamentais dos
Tratados como a definição dos fins da União Europeia (art. 3º/3 TUE) e a CDFUE
(art. 37º).
a. Escala planetária e intergeracional – esta pode ser analisada em duas
perspetivas:
i. Perspetiva sincrónica: que permite avaliar o desenvolvimento
sustentável à escala planetária. Deste ponto de vista, o princípio do
desenvolvimento sustentável traduz a ideia de justiça em sentido
espacial. Na União, esta aproximação, quer interna quer externa, ao
desenvolvimento está claramente presente nos Tratados:
- Externa: art. 21º TUE (als. d) e f));
- Interna: referências no parágrafo 9 do preâmbulo do TUE e
art. 3º/3 TUE e art. 11º TFUE.
ii. Perspetiva diacrónica: considerando a sua aplicação ao longo do
tempo, o princípio reflete a ideia de justiça intergeracional, isto é,
responsabilidade das gerações atuais perante as gerações futuras.
b. Caminho para a sustentabilidade:
i. Perspetiva procedimental: os princípios da participação e da
abertura (arts. 10º e 11º TUE) densificam o “como” do princípio do
desenvolvimento sustentável, sendo que a validade das decisões
atuais, com repercussões futuras, depende do grau de efetiva

Mariana Tralhão – 2016/17 59


DUEII 2º ano

participação cívica e da tomada em consideração dos interesses dos


cidadãos atuais, mas também das gerações vindouras.
ii. Perspetiva material: neste caso, devem ser consideradas três
vertentes:
1. Ambiental – dever de gerir, de forma sustentável, a
utilização dos recursos naturais e da capacidade de suporte
dos ecossistemas, respeitando a sua capacidade de
renovação, quando sejam renováveis, e preservando, sem
esgotar, os que não sejam renováveis.
2. Social – apela-se aqui às ideias de democracia ambiental,
pela participação do público nos processos ambientalmente
relevantes e de justiça ambiental, pela eliminação das
situações de injustiça resultantes de serem sobretudo os
mais frágeis e vulneráveis a sofrer os efeitos dos impactes
ambientais e da degradação dos recursos naturais.
3. Económica – consiste na promoção da atividade
económicas duradouras e ainda na plena internalização dos
custos ambientais e sociais das atividades económicas ou,
quando possível, na redistribuição equitativa desses custos.
Conciliação das diferentes vertentes pela jurisprudência: Caso das
Marismas de Santoña; caso Carrtta carretta e caso da autoestrada de
Castro Verde.

2. Princípio da integração
Este obriga à consideração da proteção ambiental em atividades que não sejam
expressamente ligadas à proteção de componentes ambientais ou à conservação
da natureza.
Nas restantes políticas, o princípio da integração resulta do reconhecimento de
que não há atividades humanas que se possam afirmar como totalmente inócuas
em termos ambientais.
Transversalidade do ambiente:
 Neste sentido, uma das principais consequências do dever de integração
das considerações ambientais é tornar obrigatória a aplicação de todos os
restantes princípios ecológicos às restantes políticas europeias – carácter
transversal.
 Por força do mesmo, é possível fiscalizar a legalidade de uma política no
âmbito ambiental e sancionar o desrespeito pelos referidos princípios.
 O carácter transversal não é único da política do ambiente (ver arts. 8º, 9º
e 10º TFUE), apesar de apenas em relação a este se referir a CDFUE.
Consideração do ambiente:
 A ideia de integração do ambiente nas outras políticas significa que tanto
as medidas legislativas como administrativas adotadas no âmbito de
políticas devem ter em consideração os seus efeitos no ambiente.
 Realça-se que os seus efeitos relevantes não inclui apenas os diretos e
imediatos, mas todos.

Mariana Tralhão – 2016/17 60


DUEII 2º ano

 Ter em consideração é ponderar adequadamente, em conformidade com os


critérios jurídicos ecológicos, quando confrontados com outro aspetos
extra-ambientais. Alguns destes critérios são:
▫ Prioridade aos valores ambientais (princípio do nível elevado de
protação);
▫ Preferência pela prevenção em detrimento da reparação (princípio
da preservação);
▫ Internalização dos custos da proteção ambiental (princípio do
poluidor-pagador);
▫ Atuação segura e prudencial (princípio da precaução).

3. Princípio do nível elevado de proteção ecológica


Este princípio está consagrado nos arts. 3º/3 TUE e 114º e 119º TFUE.
Ponto de comparação:
 Estabelecer um nível elevado de proteção ambiental é permitir que a
legislação dos Estados possa ir ainda mais longe, na proteção ambiental, do
que a União Europeia.
 Esta possibilidade está consagrada no art. 193º TFUE, a doutrina
denomina-a de “dourar” o direito europeu e foi aceite no proc. C-6/03.
 Atualmente, é defensável uma compreensão ainda mais abrangente do
princípio do nível elevado, significando que, depois de adotar um certo
nível de proteção, há que mantê-lo, proibindo voltar atrás. Ou seja, exige-se
irreversibilidade.
Proteção dinâmica:
 A CDFUE parece exigir ainda mais do que o exposto, referindo-se à
melhoria da qualidade da protação ambiental.
 Depreende-se, assim, que, para garantir a proteção elevada, não basta uma
proteção omissiva, que se limita a repelir atuações degradadoras dos
recursos naturais ou ofensivas do equilíbrio dos componentes ambientais,
exigindo-se uma proteção dinâmica, pró-ativa.
 Esta atuação mais progressista será mais difícil de executar, na medida em
que está mais dependente de condições sociais e económicas, não se
aplicando neste caso a proibição do retrocesso.

4. Princípio da prevenção
Segundo esta, em vês de contabilizar-se os danos e tentar repará-los, deve
procurar-se evitar a sua ocorrência, antes de os mesmos se verificarem
Ratio da prevenção:
 Irreversibilidade dos danos:
▫ A restauração natural, envolvendo a reposição da situação anterior
ao dano, deverá ter sempre prioridade absoluta sobre a solução de
compensação por equivalente.

Mariana Tralhão – 2016/17 61


DUEII 2º ano

▫ Em muitos casos, esta reparação não é possível. Mesmo sendo,


frequentemente ela é de tal modo onerosa que esse esforço não
pode ser exigido aos poluidores.
▫ Não sendo possível obter a reconstituição do satus quo ante, pelo
esforço do próprio responsável, resta a alternativa de ser o Estado
a adotar, subsidiariamente, medidas de compensação ambiental,
apesar do esforço orçamental que isso significa e da injustiça que é
o esforço ser dos contribuintes.
 É mais dispendioso prevenir do que remediar.
Medidas preventivas:
Na aplicação do princípio da prevenção é indispensável a ponderação de formas
alternativas de realizar projetos, configurar planos ou conceber programas, de
modo a poder optar por aquele tipo de projeto, plano ou programa que seja
suscetível de produzir menores impactes ambientais.
Destacam-se alguns instrumentos: fiscais ou penais, que começam a ser aplicados
na área do ambiente; avaliação do impacte ambiental; licença ambiental.

5. Princípio da precaução
Em comparação com o princípio da prevenção:
 Semelhança – destina-se a evitar a ocorrência de danos ambientais futuros;
 Diferença – tem a sua máxima aplicação em casos de incertezas.
Fala-se de uma espécie de princípio in dúbio pro ambiente, ou seja, o ambiente
deve ter a seu favor o benefício da dúvida, quando não haja certezas, por falta de
provas científicas evidentes, sobre o nexo causal entre uma atividade e um
determinado fenómeno de poluição ou degradação do ambiente.
Condições de aplicação:
 Campo de aplicação: atividades que envolvam riscos ecológicos, impondo
ao potencial poluidor o ónus da prova de que um acidente ecológico não
vai ocorrer e de que adotou específicas medidas de precaução.
 O ónus da prova é transferido do Estado ou dos potenciais poluídos para os
potenciais poluidores.
 Dúvidas podem existir em diversas circunstâncias:
a. Quando ainda não se verificaram quaisquer danos decorrentes dessa
atividade, mas se receia apesar da falta de provas científicas, que
possam vir a ocorrer;
b. Quando havendo já danos provocados ao ambiente, não há
conhecimento científico de qual a causa que está na origem dos danos;
c. Quando, apesar de haver danos provocados ao ambiente, não há
provas científicas sobre o nexo de causalidade entre uma determinada
causa hipotética e os danos verificados.
Medidas precaucionais:
 Este princípio envolve a adoção, em cada caso, de diferentes tipos de
medidas, em cuja escolha deve ter-se em consideração que a gravidades
das medidas preconizadas deve ser proporcional ao carácter dos riscos

Mariana Tralhão – 2016/17 62


DUEII 2º ano

receados, em função não só da probabilidade do rico, como da natureza, da


magnitude, da reversibilidade ou da extensão geográfica e populacional
dos impactes prováveis.
 Tratando-se de medidas baseadas na falta ou na insuficiência de
conhecimentos científicos, qualquer decisão fundada no princípio da
precaução será sempre precária e submetida a reapreciação periódica, à
luz do progresso da ciência e da técnica e da experiência entretanto
adquirida.
 Com base no princípio da precaução, havendo qualquer risco ou receio de
que uma decisão conduzirá a um impacte ambiental, não poderá a mesma
ser tomada.

6. Princípio do poluidor-pagador
O PPP é mais do que um princípio de responsabilidade, voltado para a reparação
dos danos causados às vítimas.
Este é um princípio de precaução, prevenção e redistribuição dos custos das
medidas públicas de prevenção da poluição, cuja aplicação permite melhorar o
ambiente e a qualidade de vida, com maior justiça social e ao menor custo
económico. O mesmo atua antes e independentemente quer dos danos ao
ambiente terem ocorrido, quer da existência de vítimas.
Montante do pagamento:
 Não sendo um princípio a posteriori, o montante dos pagamentos a impor
aos poluidores deve ser proporcional aos custos de precaução e prevenção,
e não proporcional aos danos causados.
 Se o valor a suportar pelos poluidores for bem calculado, atingir-se-á uma
situação social e ambientalmente ótima, a redução da poluição a um nível
considerado aceitável e simultaneamente a criação de um fundo destinado
ao combate à poluição residual ou acidental, ao auxílio às vítimas da
poluição e ao financiamento de despesas públicas de administração,
planeamento e execução da política ambiental.
 Estes pagamentos são um incentivo aos poluidores que passam a escolher
entre:
▫ Poluir e pagar ao Estado;
▫ Pagar para não poluir, investindo em processo produtivos ou
matérias-primas menos poluentes ou em investigação de novas
técnicas e produtos alternativos, que sejam mais amigos do
ambiente.
Cumprimento alternativo:
 Se aos poluidores não forem dadas outras alternativas a não ser deixar de
poluir ou ter de suportar um custo económico em favor do Estado, então,
os poluidores terão e fazer os seus cálculos económicos de modo a escolher
a opção mais vantajosa:
▫ Acatar as disposições dissuasórias da poluição e tomas as medidas
necessárias para evitar a poluição;
▫ Produzir, suportando economicamente os custos que isso acarreta.

Mariana Tralhão – 2016/17 63


DUEII 2º ano

 O resultado alcançado será sempre vantajoso em termos sociais:


▫ Ou deixa praticamente de haver poluição e, portanto, poluidores
pagadores;
▫ Ou a poluição reduz-se a níveis mais aceitáveis e os poderes
públicos responsáveis pelo ambiente passam a dispor de verbas
para afetar a um combate público sistemática à poluição, sem com
isso onerar mais os contribuintes em geral.
 Deste modo, evitamos que os contribuintes passem a ser duplamente
vítimas da poluição:
▫ Fisicamente, suportando os danos originados;
▫ Economicamente, suportando o agravamento da carga fiscal, para
dotar o Estado de meios de combate à poluição e aos danos.

DIREITO AMBIENTAL SECUNDÁRIO


Em correspondência com os princípios referidos, forma criados novos instrumentos
jurídicos que têm em comum o facto de visarem prevenir os impactes ambientais
provenientes de atividade humana de natureza diversa. O seu enquadramento é
determinado pelos planos plurianuais.

PROGRAMAS DE AÇÃO EM MATÉRIA AMBIENTAL


Os objetivos gerais da política ambiental da União Europeia, estabelecidos no art. 191º/1
TFUE, são consagrados em planos de ação, que determinam as grandes linhas de
orientação da política europeia.
Os planos são aprovados através do processo legislativo ordinário, vigorando durante
um período temporal alargado.
Desde 1973, estiveram em vigor seis programas de ação relativamente aos três últimos
“Programas de ação”:
 Quinto Programa Comunitário (1993-2002): foi a primeira grande tentativa de
alargar a atuação comunitária de abranger não só o ambiente mas também o
desenvolvimento sustentável. Os seus setores-alvo eram a indústria, a energia, os
transportes, a agricultura e o turismo. Os agentes das mudanças eram não só as
autoridades públicas e as empresas (públicas e privadas) como o próprio público
em geral.
 Sexto Programa Comunitário (2002-2013): as maiores preocupações foram o
efeito de estufa, proteção da natureza e a biodiversidade, assim como a saúde
humana, a utilização sustentável e a gestão de resíduos.
 A abordagem estratégica visou a melhoria de aplicação da legislação em
vigor, reforçando a eficácia do princípio da integração, colaborando com o
mercado na promoção ambiental, responsabilizando os cidadãos pela
alteração dos seus comportamentos e influenciando as decisões dos
Estados membros sobre o ordenamento e gestão do território através dos
fundos estruturais.
 Quanto à responsabilidade internacional da União Europeia, os desafios
eram a integração do ambiente nos domínios económico social,

Mariana Tralhão – 2016/17 64


DUEII 2º ano

promovendo uma sensibilização ambiental de toda a população numa


Europa alargada, com vista à realização de um desenvolvimento
sustentável.
 Sétimo Programa Comunitária (atual): refere expressamente um movimento
científico de definição dos chamados “limites do Planeta”, denotando a
determinação Europeia de contribuir para a preservação de um “espaço seguro
para a humanidade”.

AVALIAÇÃO DE IMPACTE AMBIENTAL DE PROJETOS


A avaliação de impacte ambiental de projetos foi o primeiro instrumento jurídico criado
expressamente com o propósito de proteção ambiental.
Este procedimento tem como objetivos sucessivos, por ordem de preferência: evitar,
prevenir; e compensar os potenciais efeitos negativos significativos no ambiente causadas
por certas atividades produtivas, sempre com os objetivos últimos de evitar a deterioração
da qualidade do ambiente e a perda líquida da biodiversidade.

Âmbito de aplicação:
 O meio para alcançar esses objetivos é a antevisão e a avaliação prospetiva dos
impactes ambientais de certos projetos considerados suscetíveis de gerar impactes
significativos. Os Estados membros têm alguma liberdade na forma como definem
os projetos que, em concreto, irão sujeitar-se a avaliação de impacte ambiental.
 Em qualquer caso, o legislador europeu definiu os limiares e os critérios relativos
às características dos projetos, à sua localização ou aos seus impactes que
reforçam a segurança jurídica e garantem a desejável harmonização.
 A localização, por sua vez, leva a que se submetam a avaliação de impacte
ambiental os projetos situados em zonas ambientalmente sensíveis ou em locais
onde a afetação do uso do solo, a riqueza relativa, a qualidade dos recursos
naturais e a capacidade de absorção e de regeneração do ambiente natural o
justifiquem.
 Por fim, tomam-se em consideração as características do impacte potencial:
magnitude, extensão, natureza do impacte, natureza fronteiriça, intensidade,
complexidade, probabilidade, ocorrência, duração, frequência e reversibilidade, a
acumulação de impactes com projetos existentes ou aprovados e ainda a
possibilidade de redução dos impactes de maneira eficaz.
 Mas a União foi mais longe e aplicou, ela própria, os critérios para impor, em
relação a alguns projetos, a realização de avaliação do impacte ambiental.

Mariana Tralhão – 2016/17 65

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