Universidade Do Estado Da Bahia - Uneb Departamento de Educação - Dedc/Campus I Programa de Pós-Graduação em Educação E Contemporaneidade - Ppgeduc
Universidade Do Estado Da Bahia - Uneb Departamento de Educação - Dedc/Campus I Programa de Pós-Graduação em Educação E Contemporaneidade - Ppgeduc
Universidade Do Estado Da Bahia - Uneb Departamento de Educação - Dedc/Campus I Programa de Pós-Graduação em Educação E Contemporaneidade - Ppgeduc
Salvador – Bahia
2013
SANDRA REGINA MAGALHÃES DE ARAÚJO
Salvador – Bahia.
2013
FICHA CATALOGRÁFICA
Sistema de Bibliotecas da UNEB
Bibliotecária: Jacira Almeida Mendes – CRB: 5/592
CDD: 370.19340
Aos idealizadores e monitores/formadores das
Escolas Famílias Agrícolas do Estado da Bahia,
representados pelas redes AECOFABA e REFAISA.
Ao meu filho, Vinícius, que, apesar das incompreensões em certos momentos, entendia no
fundo do coração, a relevância deste trabalho para a minha vida pessoal e profissional.
À Sandra, Secretária do meu Lar, pois se não fosse seu carinho, sabedoria e dedicação comigo
e com Vinícius, possivelmente, não tivesse escrito esta tese.
A minha mãe, que sempre torce pelo meu sucesso. Sei quão orgulhosa deve estar agora. Do
mesmo modo, Diogo.
Aos meus irmãos, cunhadas, em especial, Nayara, sobrinhos, todos orgulhosos de minha
trajetória acadêmico-profissional.
Ao Prof. Dr. Antônio Dias que me acolheu neste Programa. Meus sinceros agradecimentos.
Ao meu orientador, Prof. Dr. Eduardo Nunes, que carinhosamente me recebeu como sua nova
orientanda, pelo acolhimento e pela confiança na realização desta pesquisa.
À Profa. Dra. Marilde Queiroz Guedes, amiga, pessoa humana, professora perspicaz e
criteriosa, pelas contribuições não somente neste momento, mas desde que me ingressei na
vida acadêmico-científica; e também pelas sugestões importantes para o trabalho, quando do
exame de qualificação e, agora, por ter aceitado o convite para participar como membro da
banca examinadora de defesa desta tese.
À Profa. Dra. Jane Adriana Rios, amiga com quem venho dividindo, nos últimos tempos,
reflexões em torno da educação e da formação de educadores do campo, por aceitar o convite
de participar como membro da banca examinadora de defesa desta tese.
Ao Prof. Ms. Fábio Dantas, amigo, interlocutor fecundo deste trabalho, pelas críticas,
sugestões e pelas trocas de conhecimento nos instantes em que dividimos nossas pesquisas.
À Profa. Dra. Isabel Dantas (Belzinha), pela amizade sincera e pelos diálogos intelectuais
travados durante o desenvolvimento desta pesquisa.
Aos amigos do GRAFHO, coordenado pelo Prof. Dr. Elizeu Clementino, nos encontros de
orientação em Amargosa-Ba., trocando inquietações, críticas respeitosas, mas, acima de tudo,
pelas sugestões valiosas em torno de nossos trabalhos de pesquisas.
Às minhas amigas-irmãs, Desiré Campos e Roseane Leite, pelo amor, afinal, entre lágrimas e
risos, dores e alegrias, estiveram presentes neste momento de minha vida, encorajando-me a
concluir mais este desafio.
Às minhas amigas de Barreiras-Bahia, Dona Idalina, Dona Dyrene Dourado, Valéria, Zaíra,
Marinélia, Dora, Flor, Zilene, Tatá, entre outras, pelo carinho e incentivo nesta caminhada.
À minha amiga querida, Profa. Ms. Adriana Marmori, Vice-Reitora e Pró-Reitora de Extensão
da UNEB, pela atenção, pelo carinho e pelo apoio ao desenvolvimento desta pesquisa.
Aos Proneristas Joseane Batista e André Luis Carmo, pela amizade, respeito e consideração.
Aos professores/formadores, por terem aceitado o convite para participarem desta pesquisa,
contribuindo sobremaneira para o alcance dos objetivos.
Aos professores/estudantes das EFAs de Ribeira do Pombal e Caetité, pelos motivos expostos
acima, pois deram uma contribuição significativa para o trabalho. São eles: Vera, David,
Sandra, Geralda, Geraldo, Raimunda, Joscicleide, Eval, Érika, Terezinha e Arievaldo. E,
também, aos apoios da Profa. Josefa Santana, Diretora da EFA de Ribeira do Pombal e da
Profa. Ms. Isabel Xavier da AECOFABA.
A Solange Fonseca, pela revisão cuidadosa deste trabalho, além de meu carinho e respeito.
À UNEB, pela liberação para que eu pudesse realizar mais esta etapa de minha formação
acadêmico-científica, inclusive com o apoio de bolsa de pesquisa.
Esta tese tem como tema estruturante a formação de educadores do campo. O objetivo deste
estudo é investigar a experiência de formação inicial voltada para os monitores das Escolas
Famílias Agrícolas da Bahia, sob a concepção de formação de educadores do campo na
contemporaneidade. A opção metodológica que orientou a pesquisa é a abordagem qualitativa
ancorada no Estudo de Caso. O estudo de caso em foco possibilitou lançar mão dos seguintes
instrumentos e técnicas de entrevistas: análise documental (projetos político-pedagógicos) e
entrevistas semiestruturadas com os sujeitos/colaboradores da pesquisa – professores/
estudantes, professores/formadores, coordenadoras da universidade e lideranças desse
movimento educativo na Bahia. Para tanto, recorreu-se à análise de conteúdo, dadas as
condições que essa perspectiva analítica possibilita. O locus da pesquisa foram os mais
variados possíveis, tendo em vista a complexidade do estudo, por exemplo, a diversidade dos
sujeitos/colaboradores. As Escolas Famílias Agrícolas de Ribeira do Pombal e de Caculé
foram escolhidas com base em critérios definidos no caminhar desta investigação, com vistas
a entrevistar os professores/estudantes. Em relação aos demais sujeitos/colaboradores, as
entrevistas ocorreram em tempos e espaços distintos. Os resultados revelaram que essa
formação inicial foi uma experiência ímpar, tanto na dimensão pessoal como profissional dos
sujeitos/colaboradores da pesquisa, e também para o movimento educativo EFAs da Bahia,
confirmados pelas narrativas dos sujeitos/colaboradores. Entretanto, essa formação apresentou
lacunas, entre as quais, a ausência de abordagem em torno da pedagogia da alternância e da
filosofia dos Centros Educativos Familiares de Formação por Alternância. Acrescenta-se,
ainda, a inexistência de componentes curriculares que abordassem a concepção de educação
do campo e a formação de seus educadores na contemporaneidade construída pelas
organizações sociais do campo e pelas Faculdades de Educação por meio dos seus
professores/pesquisadores. Apesar disso, espera-se que esta investigação possa servir de
orientação para as políticas de formação inicial e continuada para os educadores que
desenvolvem ou desenvolverão práticas educativas em escolas situadas no campo brasileiro,
considerando a diversidade de sujeitos e dos contextos sociocultural e político, entre outros,
presentes no meio rural.
La estructura temática de esta tesis es la formación de educadores del campo. El objetivo del
estudio es investigar la experiencia de formación inicial de los monitores de las Escuelas
Familias Agrícolas de Bahia, Brasil, bajo la concepción de formación de educadores del
campo en la contemporaneidad. La opción metodológica que ha orientado la investigación es
el abordaje cualitativo basado en el Estudio de Caso. El estudio de caso en foco ha
posibilitado utilizar los siguientes instrumentos de entrevista: los sujetos/colaboradores de la
investigación – profesores/estudiantes, profesores/formadores, los comandos de la universidad
y del movimiento educativo de las Escuelas Familias Agrícolas de Bahia. El locus de la
investigación han sido los más variados posibles, considerándose la complejidad del estudio,
entre los cuales, la diversidad de los sujetos/colaboradores. Las Escuelas Familias Agrícolas
de Ribeira do Pombal y de Caculé (Bahia) han sido elegidas con base en criterios definidos
durante el caminar de esta investigación, visando a hacer entrevista con los
profesores/estudiantes. Respecto a los demás sujetos/colaboradores, las entrevistas han sido
realizadas en tiempos y espacios distintos. Los resultados han revelado que esa formación
inicial fue una experiencia impar, tanto en la dimensión personal como profesional de los
sujetos/colaboradores de la investigación, cuanto para el movimiento, confirmados por las
narrativas de los sujetos/colaboradores. Con todo, esa formación ha presentado huecos, entre
los cuales, la ausencia de abordaje sobre la pedagogía de la alternancia y de la filosofía de los
Centros Educativos Familiares de Formación por Alternancia. Se añade, todavía, la
inexistencia de componentes curriculares que abordasen la concepción de educación del
campo y la formación de sus educadores en la contemporaneidad construída por las
organizaciones sociales del campo y por las facultades de Educación por medio de sus
profesores/investigadores. A pesar de ello, se espera que esta investigación sirva de
orientación para las políticas de formación inicial y continuada para los educadores que
desarrollen o desarrollarán prácticas educativas en escuelas ubicadas en el campo brasileño,
considerando la diversidad de sujetos y de los contextos sociocultural y político, entre otros,
presentes en el medio rural.
Palabras claves: Formación de Educadores del Campo – Educación del Campo – Escuelas
Familias Agrícolas –Pedagogía de la Alternancia.
RÉSUMÉ
Cette thèse a pour thème la formation des professeurs ruraux. Son objectif est l'étude de
l'expérience de formation initiale des moniteurs des Écoles Familiales Agricoles de l'état de
Bahia (Brésil) et la conception de formation des professeurs ruraux dans le monde
contemporain. Nous avons opté pour une approche qualitative ancrée sur l'Étude de cas,
appuyé par les techniques suivantes : analyse documentaire des projets pédagogiques,
entrevues semi-structurées des professeurs, étudiants, coordinateurs et leaders. Nous avons
également eu recours à l'analyse de contenu. Les écoles familiales agricoles de Ribeira de
Pombal e de Calculé (Bahia-Brasil) ont été choisies a partir de critères définis a travers le
cheminement de cette recherche, afin d'interviewer les professeurs-étudiants. Les entrevues
ont été réalisées à des moments et en des espaces distincts. Les résultats ont révélés que cette
formation initiale a été une expérience exceptionnelle, tant dans sa dimension personnelle
comme dans sa dimension professionnelle, tout comme pour le mouvement d’éducation EFA
de Bahia, tel qu’a été démontré par les récits des sujets-collaborateurs de la recherche. Cette
formation présente néanmoins des lacunes, parmi lesquelles, nous pouvons mentionner
l'absence de la pédagogie de l'alternance et de la philosophie. Ajoutons également
l'inexistence des éléments de programmes qui traitent de l'éducation rurale et de la formation
des professeurs dans le monde contemporain, construite par les organisations sociales rurales
et par les facultés d'éducation à travers ses professeurs-chercheurs. En débit de ces lacunes,
nous croyons que cette recherche pourra servir d'orientation pour refonder les politiques de
formation initiales et permanente pour les professeurs qui exercent ou exerceront des
pratiques éducatives dans des écoles rurales brésiliennes, considérant la diversité des sujets et
des contextes sociaux et politiques présentes dans le monde rural.
Mots-clés: Formation des professeurs ruraux – Éducation rurale – Écoles Familles Agricoles
– Pédagogie de l'alternance.
LISTA DE TABELA E QUADROS
INTRODUÇÃO 19
REFERÊNCIAS 290
APÊNDICES 299
ANEXOS 310
INTRODUÇÃO
(Gastón Pineau)
Para Catani (2006, p.16), é “[...] por meio das narrativas que produzem sobre si, as
experiências pelas quais passaram dotando a própria trajetória profissional de sentido [...]”.
Além disso, a escrita de si “[...] tem um papel estruturante com relação a experiências de
formação, uma vez que, ao desencadear o questionamento sobre as ‘escolhas, as inércias e as
dinâmicas’, favorece o ‘embate paradoxal entre o passado e o futuro em favor do
questionamento presente” (CATANI, 2006, p. 24).
Souza (2006), ao tratar da abordagem (auto)biográfica ou narrativas de formação, fala
da subjetividade e da hermenêutica enquanto um dos princípios que orientam esta abordagem
de pesquisa. Daí que, segundo ele, foi necessário que a abordagem biográfica assumisse com
clareza a questão do distanciamento e da implicação no processo formativo como assinala:
Recordar é viver...
Nascida no seio de uma família humilde, no “fim do mundo”, “nos confins do sertão
baiano”, como alguns se referem à região do extremo oeste baiano, na cidade de Barreiras, fui
para a escola ainda muito cedo, sendo praticamente alfabetizada pela minha mãe. Nos
primeiros anos de escolaridade, estudei tanto na rede pública de ensino como também na rede
privada, possibilitando o contato com pessoas de diferentes classes sociais e culturais. Dessa
caminhada como estudante, ficou a lembrança, a saudade, de um professor de História Geral e
do Brasil, quando cursava a 7ª série do antigo primeiro grau, hoje anos finais do ensino
fundamental na rede pública de ensino e que me fez pensar em me tornar “professora”.
Nesse período, por conta das condições financeiras de minha família, iniciei muito
cedo minha vida profissional em Barreiras, aos quatorze anos de idade, trabalhando em uma
boutique como vendedora, sem, contudo, deixar de estudar. Nessa época, cursava o primeiro
21
ano básico do antigo 2º grau, atualmente ensino médio, numa Fundação Educacional privada
de ensino, única alternativa de cursar o ensino médio na minha cidade. Porém, aos dezessete
anos, deixei o trabalho por estar cursando o 3º ano de Magistério, com a extinção das Escolas
Normais, o que naquela época exigia muita dedicação em função do Estágio Supervisionado.
Vale ressaltar que a criação da Habilitação Específica para o Magistério se deu a partir da
promulgação da Lei nº 5.692/71 (reforma do 1º e 2º graus), período em que o sistema
educacional brasileiro adotou a dimensão técnica, a pedagogia tecnicista no processo de
ensino-aprendizagem, uma das prerrogativas da ditadura militar no campo educacional.
Assim que concluí o Ensino Médio, Curso Magistério lecionei em uma escola
particular – Escola Padre Anchieta, atuando na Educação Infantil Jardim I (turma com
crianças de quatro anos), no turno matutino, e 3ª e 4ª séries do vespertino, com a disciplina
Estudos Sociais, durante o ano de 1982. Nesse mesmo período, cursei Licenciatura Curta em
Artes Industriais pelo antigo Centro de Educação Técnica da Bahia – CETEBA, hoje
Universidade do Estado da Bahia (UNEB).
Em 1983, continuei trabalhando nessa escola da rede particular de ensino no turno
matutino e, no vespertino, fui lecionar em uma escola estadual, situada na periferia da cidade
de Barreiras, em uma classe de alfabetização, com o antigo método ALFA. Considero essa
experiência extremamente gratificante, pois, dos 38 alunos matriculados, somente um aluno
chegou ao final do ano sem saber “ler” e “escrever”, motivando-me, quatorze anos depois, na
condição de estudante do Curso de Pedagogia na Universidade do Estado da Bahia (UNEB),
Campus IX/Barreiras, desenvolver projetos nos Estágios I e II na área de Alfabetização, no
ano de 1997.
Como ser professora neste país, em especial das séries iniciais do ensino fundamental
e médio, é “sinônimo de miséria”, por conta dos baixos salários, da falta de reconhecimento e
valorização profissional, optei por outro emprego. Através de aprovação em concurso público,
fui trabalhar na então Companhia de Eletricidade do Estado da Bahia – COELBA, onde
permaneci durante 11 anos e 6 meses, quando, por força do projeto privatista neoliberal do
governo de FHC, aderi ao Plano de Demissão Voluntária, em janeiro de 1997.
É importante ressaltar que, mesmo tendo deixado a COELBA, empresa de economia
mista, nas vésperas de ser privatizada, posso afirmar quanto este trabalho foi importante para
minha formação pessoal, profissional e, sobretudo, como militante no movimento sindical.
22
[...] a vida não é feita apenas de fatos importantes, é feita de altos e baixos, e
nem sempre os altos feitos são os que se destacam primeiro como os jovens
e adultos em formação, mas talvez os espaços, as passagens vazias, as
experiências nas quais não se vê sentido, o sofrimento, a morte. Para
aproximar essas experiências pouco compreensíveis, é a analogia com o
claro-obscuro da noite que se impõe. Por outro lado, do ponto de vista
temporal, muitas experiências se passaram à noite, e, simbolicamente, a
noite exprime bem a falta de clareza que eu tinha. (PINEAU, 2011, p. 31).
Como dito, esta fala tão carregada de sentidos, é a expressão pura e verdadeira do que
vivi recentemente em minha vida pessoal, marcada por altos e baixos, afinal, muitas coisas se
passaram, muitas coisas aconteceram do nascer do sol ao seu poente, como também nas horas
“infinitas” do adormecer, que não dormia ... Ressalto que foram, sem dúvida, momentos
extremantes formativos em todos os sentidos que comportam a existência humana e, portanto,
desejo carregar comigo para o resto da minha vida.
Minha opção pelo Curso de Pedagogia teve início em 1992, quando ingressei na
Universidade do Estado da Bahia (UNEB) no turno noturno, com Habilitação em Magistério
das Matérias Pedagógicas do 2º Grau, único curso de licenciatura existente na época naquela
cidade. Apesar de ser o único curso em nível superior, o interesse de cursar Pedagogia se deu
em função de ser multiplicadora na COELBA e a possibilidade de mudar de nível,
consequentemente, obter melhoria salarial.
Por conta da minha experiência como militante sindical na COELBA, minha vida
acadêmica na condição de discente foi marcada pela participação no movimento estudantil em
defesa da escola pública, da democratização e da qualidade da educação na Bahia, do ensino
superior e, particularmente, da UNEB. Desse modo, fiz parte do Diretório Acadêmico do
Curso de Pedagogia, participando inclusive da Direção Colegiada do Departamento na
condição de representante dos estudantes. É oportuno destacar que esta experiência de
Direção Colegiada com a participação dos estudantes foi uma conquista do movimento
estudantil de Barreiras e, portanto, pioneira na UNEB.
23
1
O Projeto de Assentamento de Angical atinge uma área de 54 mil hectares da antiga Fazenda Sertaneja
Agropastoril, desapropriada através do Decreto Federal nº 92.279 de 8 de janeiro de 1986, no governo do
Presidente da República, hoje Senador José Sarney, e fez parte do primeiro Plano Nacional de Reforma Agrária
(PNRA), sendo considerada a maior área de reforma agrária desapropriada para fins de reforma agrária no
Brasil.
24
implantada em 1996, após a criação de sua Associação. Passados, portanto, seis anos após a
primeira visita e tantos outros encontros que aconteceram posteriormente, essa escola, com
sua experiência formativa, acabou sendo meu objeto de pesquisa no Programa de Pós-
Graduação (Mestrado) em Educação e Contemporaneidade da Universidade do Estado da
Bahia – UNEB, entre os anos de 2003 e 2005.
Foi nessa época, após me desligar da COELBA, que retomo definitivamente a
profissão docente. Passei, então, a ministrar aulas em um colégio da rede municipal de ensino
no turno noturno, atividade que exerci paralelamente aos Estágios Supervisionados I e II.
Confesso que foi outro grande desafio; momentos de angústias por estar ausente da sala de
aula há mais de uma década. No Estágio Supervisionado II, ministrei a disciplina
Metodologia da Alfabetização, curso de Magistério, numa escola da rede estadual de ensino.
Esta prática educativa me possibilitou aprofundar e refletir os estudos sobre esta área do
conhecimento, recorrendo a autores como Paulo Freire, Emília Ferreiro, Magda Soares, Luiz
Carlos Cagliari, entre outros.
Após a conclusão do curso de Pedagogia em 1997, assumi a docência em várias
escolas da rede municipal e privada no município de Barreiras. Em minha prática pedagógica,
sempre procurei pautar-me em compreender a escola e, de modo muito especial, a sala de aula
como o espaço de discussão, de debates, de ideias, de conflitos, tensões e, acima de tudo,
como nos diz nosso saudoso Paulo Freire (1988), como espaço do diálogo, da contradição, da
boniteza na busca da construção do conhecimento, da ética profissional e do entendimento da
educação enquanto ato político. Enfim, ver a escola e a sala de aula como o espaço da utopia
de um dia vivermos em uma sociedade mais justa, mais democrática e fraterna. Nesse
contexto, exerci a docência calcada no tripé ação-reflexão-ação e na curiosidade
epistemológica, a qual nos ensina Paulo Freire.
O meu ingresso como docente no ensino superior se deu no ano de 1999, na condição
de professora substituta na UNEB (Universidade do Estado da Bahia) – Departamento de
Ciências Humanas Campus IX – Barreiras, ministrando a disciplina Currículo e Avaliação.
Durante esse período, colaborei com o Núcleo de Bom Jesus da Lapa, atualmente
Departamento de Educação e Tecnologias, Campus XVII da UNEB, ministrando as
disciplinas Metodologia dos Estudos Sociais e Currículo e Avaliação, na turma de 1997 (1º e
2º semestres).
25
diferencial(ais)? Para responder a essas questões, o estudo teve como objetivo compreender
em que medida a Escola Família Agrícola José Nunes da Matta, orientada pelos princípios
metodológicos da Pedagogia da Alternância, constitui uma escola viável para o fortalecimento
da agricultura familiar.
Para apreender em profundidade essa alternativa de educação para os(as) filhos(as) de
agricultores familiares, recorreu-se aos fundamentos teórico-metodológicos de autores
franceses e dos educadores Paulo Freire, Miguel Arroyo e outros. O estudo revelou, através
das entrevistas semiestruturadas com os egressos e as lideranças comunitárias, que a Escola
Família Agrícola de Angical – Bahia é, de fato, uma alternativa de educação viável para o
fortalecimento da agricultura familiar e, como tal, apresenta um diferencial para a política de
educação do campo, revelada pelos achados da pesquisa.
No momento da defesa do trabalho, intitulado Escola para o trabalho, escola para a
vida: o caso da Escola Família Agrícola de Angical – Bahia, após a apresentação e as
reflexões levantadas pela banca examinadora, esta assinalou a importância da continuidade do
estudo em nível de doutoramento, sugerindo estudar, entre outros temas, a formação dos
monitores/formadores das EFAs. Acrescenta-se a essa motivação, o fato de ter coordenado o
Curso Pedagogia da Terra, do PRONERA (Ministério do Desenvolvimento Agrário/Incra) na
UNEB – outra experiência de formação em graduação para educadores assentados e
acampados de áreas de reforma agrária –, inclusive ministrando a disciplina História da
Educação do Campo neste curso, além de orientar e participar de bancas dos Trabalhos de
Conclusão de Curso (TCC) em torno da Educação do Campo; por ter estado à frente, em
2007, da Coordenação de Educação do Campo na Secretaria de Educação do Estado da Bahia,
onde pude constatar a inexistência de políticas públicas de formação inicial e continuada para
os educadores que atuam nas escolas do campo, em todos os níveis e modalidades de ensino;
e, finalmente, por ter participado da equipe de elaboração do Projeto Político-Pedagógico do
Curso de Licenciatura em Educação do Campo (Procampo), como também do Programa
ProJovem Campo – Saberes da Terra, os dois programas vinculados ao Ministério da
Educação por intermédio da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e
Inclusão (SECADI/MEC).
Essas vivências, itinerâncias formativas, sem sombra de dúvida, me instigaram o
desejo de continuar ampliando e aprofundando minhas reflexões em torno da formação de
educadores do campo, em especial dos monitores/formadores das Escolas Famílias Agrícolas
da Bahia que vivenciaram o processo formativo em nível universitário, em cinco áreas do
conhecimento – História, Letras, Matemática, Biologia e Geografia –, através de convênio
27
entre a UNEB, a Associação das Escolas Comunidades das Famílias Agrícolas da Bahia
(AECOFABA) e a Rede das Escolas Famílias Integradas do Semi-Árido (REFAISA).
A relevância deste estudo se deve, sobretudo, ao quadro de extrema desigualdade
desses profissionais no que tange à formação inicial e continuada, comparados com os
educadores que desenvolvem suas atividades na cidade. Os educadores do campo, em sua
grande maioria, enfrentam sobrecarga de trabalho, alta rotatividade por conta de questões
político-partidárias, dificuldades de acesso a determinadas comunidades, salários inferiores,
baixa qualificação profissional, revelando a inexistência de políticas públicas voltadas para os
educadores que desenvolvem suas atividades didático-pedagógicas nas escolas do campo, isto
é, da total precariedade do trabalho docente.
Portanto, ao narrar minha história de vida pessoal e profissional, minhas memórias,
minha autobiografia no campo da educação e, sobretudo, no que tange à educação do campo,
penso ter construído uma narrativa que, a meu ver, inclui as dimensões ontológicas,
epistemológicas e formativas vivenciadas num passado recente de “ser educadora” e, de agora
em diante, de ser professora/pesquisadora, visto que
Para responder a essas questões, o trabalho está organizado em seis capítulos, a seguir
descritos sucintamente.
O Capítulo 1 – Educação do Campo: história, políticas públicas e formação de
educadores do campo descreve e analisa, inicialmente, o contexto histórico e político da
educação no meio rural brasileiro. Posteriormente, discute a problemática da formação dos
educadores que atuam nas escolas do campo, com ênfase na formação do educador das
escolas rurais, que teve início nos anos 30 do século passado, chegando até a atualidade,
quando se adota a expressão ‘formação de educadores do campo’, protagonizada pelo
movimento político-ideológico Por uma Educação do Campo.
Casas Familiares Rurais: gênese do movimento na França, Brasil e Bahia, título do
Capítulo 2, apresenta e analisa aspectos fundamentais no tocante ao surgimento das Casas
Familiares Rurais (CFRs) na França, no Brasil e na Bahia. Não se intentou fazer uma
descrição profunda, densa, das experiências francesas e brasileiras, tendo em vista o número
de trabalhos, seja de dissertações, teses, ensaios, livros, que já se ocuparam dessa tarefa tanto
em nível internacional (NOVÉ-JOSSERAND, 1998; CALVÓ, 1999; 2010; FORGEARD,
1999; GIMONET, 1999, 2004, 2007; PINEAU, 1999, 2002, 2004; GARCÍA-
MARIRRODRIGA; CALVÓ, 2010) como nacional (NOSELLA, 1977; BEGANAMI, 2003;
SILVA, 2003; QUEIROZ, 2004; CAVALCANTE, 2007; NASCIMENTO, 2007; RIBEIRO,
2010; BURGHGRAVE, 2011; entre outros).
Interessa, portanto, descrever e analisar, a partir das leituras e reflexões em torno das
obras dos autores mencionados, a origem das CFRs, rememorar os atores e autores histórico-
sociais, seus “artesãos” na expressão de García-Marirrodriga (2010), que estiveram
implicados diretamente com o nascimento das primeiras experiências na França. Do mesmo
modo, analisa a trajetória histórica desse sistema educativo, de modo particular sobre as
Escolas Famílias Agrícola – EFAs no Brasil e na Bahia, por serem estas as primeiras
experiências desenvolvidas em Alternância em território brasileiro e baiano.
No Capítulo 3 – Centros Educativos Familiares de Formação por Alternância:
dimensões teórico-metodológicas de um movimento educativo do/no campo, busca-se
compreender os princípios que orientam os CEFFAs enquanto um sistema educativo do/no
campo e sua pedagogia – a alternância. Desse modo, utiliza-se o termo CEFFAs,
denominação assumida pelos dois centros mais antigos e com maior experiência no Brasil e
em outros países dos cinco continentes onde essas escolas estão presentes – Escolas Famílias
29
2
Segundo Queiroz (2006), o termo CEFFAs foi assumido em um encontro realizado em Puerto Iguazú –
Argentina, nos dias 7 e 8 de abril de 2001, contando com a participação de representantes das EFAs, CFRs,
CFRs e PROJOVEM, além de representantes do Ministério do Desenvolvimento Agrário. Ainda de acordo com
esse autor, o termo CEFFAs expressa melhor a realidade das experiências em desenvolvimento no Brasil.
30
Desse modo, segundo Werebe (1997, p. 31): “[...] nenhuma perspectiva, daí por
diante, para uma política educacional de larga envergadura. A educação teria de arrastar-se
através de todo o século XIX, inorganizada, anárquica, incessantemente desagregada”.
Com a promulgação da Constituição de 1891, estabeleceu-se a forma federativa da
República, sendo influenciada por ideias positivistas, separando o Estado da Igreja. Várias
medidas liberais foram propostas nesta lei, inclusive para o ensino, inspiradas por Benjamin
32
Constant, Ministro da Instrução, dos Correios e Telégrafos até 1892, quando os negócios da
Instrução passaram para a pasta do Interior e da Justiça. Nessa reforma, foi proposta a
reorganização de todo o sistema de ensino, porém, segundo Werebe, (1997, p.40), “[...] só
havia preocupação (assim mesmo sem grande empenho) com o ensino urbano, relegando-se
ao esquecimento o ensino rural”.
De acordo com Calazans (1993, p. 18), os estudos efetuados sobre essa temática
revelam que “[...] antes de 1930 as iniciativas mais consistentes de formação dirigidas às
populações do meio rural deram-se nos setores de ensino médio e superior, especialmente
neste último”. Este processo se deu em função da necessidade de mão de obra especializada
para lidar com a evolução das estruturas socioagrárias do País naquele momento histórico,
com o advento da monocultura cafeeira e de outras culturas, exigindo pessoal mais
qualificado para o setor agrícola, tanto no nível do Ensino Fundamental como no Médio.
E, com certeza, não eram escolas para os filhos dos produtores familiares, por
exemplo, mas escolas destinadas aos filhos dos latifundiários, esses tipos de fazendeiro,
contemporaneamente conhecido como coronel, “[...] juiz da vida e da morte que não deixou
saudades, Só um rastro de violência, dominação e exploração” (JOSÉ, 1981, p. 74). Daí que a
educação ofertada pelo Estado Nacional, nesse período, negou às populações que praticavam
a agricultura familiar e outras formas de produção nos distintos contextos rurais, o direito de
as crianças, os adolescentes, os jovens e adultos cursarem o ensino fundamental, médio e,
consequentemente, a possibilidade de se construir um campo diferente, onde essas pessoas
pudessem estudar e trabalhar ao mesmo tempo e com dignidade.
Sobre o ensino ofertado neste período, inclusive, o da Escola Normal Rural de
Juazeiro do Norte, Estado do Ceará, referenciada mais adiante, Magalhães Júnior e Faria
(2007, p. 57) confirmam o público atendido pela educação ofertada pelo Estado: “A
instituição, destinada a formar professores ruralistas, inicialmente recebeu, principalmente,
alunas pertencentes às ‘boas famílias’ de Juazeiro, isso é, as filhas dos grupos
economicamente mais abastados”.
função da inexistência de uma política pública agrária para os pequenos produtores familiares
rurais, como meeiros, posseiros arrendatários, entre outras categorias, excluídos
historicamente deste modo de produção – a terra, e o aparecimento de uma nova classe social
em oposição à aristocracia rural trouxeram para o debate a questão da educação rural. .
Werebe (1997) afirma que esses debates ocorreram, sobretudo, pelo crescente êxodo
rural, cuja responsabilidade se atribuiu à escola. A escola rural, então, ao transmitir os valores
urbanos e o desprezo pela vida do campo, não teria levado à fixação do homem na terra.
Pretendia-se, assim, “[...] atribuir à escola rural uma função que não lhe cabia, pois a fixação
do homem na terra dependia, de fato, das suas condições de vida e trabalho” (WEREBE,
1997, p. 41). A fixação do homem na terra, como sabemos, não é uma questão educacional, a
raiz desta problemática estando relacionada ao processo de colonização do Brasil, na base das
sesmarias, da monocultura para o mercado externo, do latifúndio e do trabalho escravo
construído historicamente pelos donos das terras de além-mar.
Ainda sobre essa questão, Lourenço Filho (1953), que defendia um projeto de
educação geral em oposição a outro grupo que privilegiava o ensino das técnicas, entendia
que a fixação do homem no campo é consequência de outros fatores que não somente da
educação. Diz ele:
Por outro lado, Werebe (1997) afirma que realmente os professores das escolas do
meio rural vindos da cidade, com seus modos de vestir, de falar, carregavam todos os valores
urbanos e que, portanto, a prática educativa desenvolvida por esses professores não era de fato
adaptada à vida e aos interesses das comunidades rurais. Entretanto, não poderiam ser
considerados os responsáveis pelo êxodo rural.
Havia, de outro lado, os que acusavam o camponês de desinteressado pelo ensino de
seus filhos, porque não compreendia os benefícios que eles poderiam tirar do que aprendiam
na escola. A posição dos camponeses se justificava na medida em que o pouco que a escola
34
rural lhes dava não tinha uma aplicação prática imediata, pois esses poucos que aprendiam a
ler e escrever, voltavam a ser analfabetos pelo desuso dessas práticas no meio em que viviam
(WEREBE, 1997).
Havia, também, os que não apoiavam a ideia de que a população rural se
desinteressava da escola. O que esta população recusava era a escola de má qualidade, com
professores mal preparados, e a má distribuição geográfica das escolas rurais, obrigando as
crianças a fazerem um esforço para frequentá-las (WEREBE, 1993), fenômeno que persiste
ainda hoje.
Para Leite (2002), esses debates ocorreram também a partir de dois aspectos:
primeiramente, as tendências escolanovistas e progressistas em educação lançadas pelos
Pioneiros da Educação Nova; em segundo lugar, as novas tendências sociais e políticas
oriundas das reivindicações urbanizantes iniciadas na década de 20, provocadas pelas
alterações agroindustriais.
Mesmo assim, o processo escolar para o meio rural continuou descontínuo e
desordenado, como sempre fora. Somente em 1937, o Estado Novo volta sua atenção para a
escola rural com a criação da Sociedade Brasileira de Educação Rural, com o objetivo de:
(CNER) e o Serviço Social Rural (SSR), que tinham como objetivo o desenvolvimento de
comunidades.
Para Calazans (1993), a CNER pretendia preparar ‘técnicos’ para atender a
necessidades da educação de base e de desenvolvimento comunitário, sendo seus objetivos
inspirados na Unesco. Quanto ao Serviço Social Rural, mantinha um sistema de conselhos
regionais sediados nas capitais dos Estados de todo o território brasileiro, sobretudo os
Estados da Região Nordeste, cuidando das questões do cooperativismo, associativismo,
economia doméstica, artesanato, entre outras. Para Gadotti ([2000], p. 2), esses programas
eram expressão da tendência de uma “[...] educação funcional (profissional), isto é, o
treinamento de mão de obra mais produtiva, útil ao projeto de desenvolvimento nacional
dependente”, diferente da educação libertadora, como “conscientização”, proposta por Paulo
Freire.
Para Leite (2002), a filosofia da CNER se limitou a repetir fórmulas tradicionais de
dominação, uma vez que ela não trouxe à tona, em suas discussões, os mecanismos
verdadeiros da problemática rural. A ideia de desenvolvimento comunitário e a modernização
do campo nada mais foram do que a internacionalização da economia brasileira para atender
aos interesses monopolistas. A CNER desse modo, com seu trabalho educativo, não levou em
conta as contradições naturais dos povos do campo e seus elementos integrativos: políticos,
sociais e culturais.
Ainda na década de 50, surge o Programa de Extensão Rural no Brasil, na perspectiva
de transformar o pequeno produtor brasileiro, mediante eficaz e intensivo programa
educativo, num fazendeiro americano, incidindo sobre a cultura do homem rural, já que este
era visto como ignorante, desprovido de valores, de sistematização de trabalho e incapaz de
desenvolver tarefas socialmente significativas. Para isso, criou-se a Associação Brasileira de
Crédito e Assistência Rural (ABCAR). Analisando os princípios teóricos que sustentaram o
programa de extensão Rural no Brasil, Leite (2002, p. 34) ressalta:
autora levanta como justificativa para a elaboração de uma nova lei sobre a Educação
Nacional, é que os ideais ou as funções da Escola Nova, dentro da nova conjuntura da
economia brasileira no contexto internacional, não mais atendiam aos interesses do grupo
dominante.
O projeto de lei encaminhado à Câmara em 1948, pelo então ministro da Educação
Clemente Mariani, traduzia a expressão das preocupações populistas do novo governo,
procurando corresponder a certas ambições das classes subalternas, pois a burguesia nacional
abre nesse projeto algumas concessões às classes camponesa e operária. Propunha,
primeiramente, a extensão da rede escolar gratuita; em segundo lugar, criar a equivalência dos
cursos de nível médio, permitindo, inclusive, a transferência do aluno de um ramo de ensino
para outro, mediante prova de adaptação.
O projeto foi engavetado e, somente em 1957, um novo projeto de lei, conhecido pelo
nome de Substitutivo Lacerda, é encaminhado à Câmara. Diferentemente do projeto anterior,
este reduz ao máximo o controle da administração pública sobre a escola, restituindo-a, como
instituição privada, à sociedade civil (FREITAG, 1984).
Após vários debates, aprovou-se a Lei 4.024/61, que estabelecia as Diretrizes e Bases
da Educação Nacional, expressão das duas tendências, ou seja, tanto o setor público como o
privado teriam o direito de ministrar o ensino no Brasil em todos os níveis. Daí que a LDB
reflete, assim, “[...] as contradições e os conflitos que caracterizam as próprias frações de
classe da burguesia brasileira. Apesar de ainda conter certos elementos populistas, essa lei não
deixa de ter um caráter elitista” (FREITAG, 1984, p.58).
A modalidade de ensino rural na Lei 4.024/61 acabou sendo omitida, pois a estrutura e
a organização da escola e do ensino fundamental ficavam a cargo dos municípios e, como as
prefeituras municipais eram desprovidas de recursos financeiros, o sistema formal de
educação rural entrou num processo de deteriorização, submetendo-se aos interesses urbanos
(LEITE, 2002).
Nesse período, foram implantados alguns programas e projetos integrados em áreas
rurais em algumas regiões do Brasil, procurando desenvolver ações educacionais de forma a
melhor atingir as populações. Na Região Nordeste, destacam-se: o Povoamento do Maranhão
(1961); o Grupo de Estudos do Vale do Jaguaribe (1961); o Grupo de Imigração do São
Francisco (1960) (CALAZANS, 1993).
A autora aponta, ainda, outros projetos e programas que, em sua análise, não foram tão
relevantes, mas atuavam intensamente, como: a) Cohebe (Companhia Hidrelétrica de Boa
Esperança) em 1963; b) Ceplac (Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira), criada
39
em 1957, mas cuja atuação efetiva ocorre apenas a partir de 1960; c) Geran – criado após
estudos que concluíram pela necessidade de modificação na estrutura da produção de açúcar
no Nordeste, em 1966; d) Projeto Sertanejo – desdobramento natural da ação governamental
de produção do Nordeste rural.
A tônica dos programas acima citados era o desenvolvimento de comunidade e a
educação de adultos a partir de convênios assistenciais/educacionais entre Brasil e Estados
Unidos, justificados pelo ritmo insatisfatório de desenvolvimento da América Latina, entre
outras razões, criando-se, então, a Aliança para o Progresso (CALAZANS, 1993; LEITE,
2002).
Com referência aos projetos integrados executados pela Superintendência da Região
Sul (Sudesul)3, destacam-se: o Projeto Integrado Sudoeste e o Projeto do Litoral do Sul de
Santa Catarina e o seu subprojeto, o Plano de Desenvolvimento Integrado, que representava o
instrumento compatiblizador de todas as operações do projeto global (CALAZANS, 1993).
Em relação às atividades desenvolvidas pela Sudesul, no âmbito dos projetos citados,
estas emanam das diretrizes do Plano Setorial de Educação e visam a coordenação e a
vinculação dos diversos organismos responsáveis por sua execução, na respectiva área
(CALAZANS, 1993).
Além dos programas e projetos integrados nas Regiões Nordeste e Sul, houve, ao
mesmo tempo, outros nos setores de colonização e reforma agrária, tais como: Supra
(Superintendência da Política de Reforma Agrária), em 1962; Ibra (Instituto Brasileiro de
Reforma Agrária) e Inda (Instituto Nacional do Desenvolvimento Agrário), criados com a
extinção da Supra em 1964; além do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária), que emerge no final da década de 60, da fusão do Ibra com o Inda.
Embora as orientações teórico-metodológicas das propostas educativas desses órgãos
tenham sido diferentes, em função da conjuntura de cada época, as características eram as
mesmas, ou seja, uma educação pautada no desenvolvimento de comunidade, na educação
popular e de adultos sob a forma organizativa de projetos integrados. Todas essas
características demonstram que as décadas de 60 e 70 foram de proliferação de programas
para o meio rural em âmbito nacional (CALAZANS, 1993), embora visassem também,
3
A Sudesul foi criada pelo Decreto-lei nº 301, de 28 de fevereiro de 1967, em substituição à Superintendência
do Plano de Valorização Econômica da Região Fronteira Sudeste do País. A Lei nº 5.365, de 1º de dezembro de
1967, alterou sua área de jurisdição, que passou a ser constituída pela totalidade dos territórios dos Estados do
Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. O Decreto-lei nº 576, de 8 de maio de 1969, regulamentou sua
denominação atual. A organização da Sudesul e sua competência foram reguladas pelo Decreto nº 66.882, de 16
de julho de 1970 (CALAZANS, 1993).
40
segundo Leite (2002, p. 41), “[...] conter o expansionismo dos movimentos agrários e das
lutas camponesas”.
Constata-se que a expansão de programas e projetos educativos para o meio rural, por
parte do governo, começou a partir do aparecimento de movimentos populares, como os
Centros Populares de Cultura (CPC) e, mais tarde, o Movimento de Educação de Base
(MEB), inicialmente ligados aos movimentos de esquerda e, posteriormente, aos trabalhos
desenvolvidos pelos sindicatos de trabalhadores rurais, às ligas camponesas e outras
entidades, inclusive a ala progressista da Igreja Católica, em favor dos desprotegidos da zona
rural, culminando, em 2 de março de 1963, com a aprovação do Estatuto do Trabalhador
Rural, Lei nº 4.214 (LEITE, 2002).
Com relação ao movimento das Ligas Camponesas no início dos anos 60, vale
ressaltar o papel do líder Francisco Julião em defesa da população camponesa do Nordeste,
que vivia em condições de miséria, fruto da exploração dos proprietários rurais, e que
encontrou, naquela população, apoio para suas reivindicações. Esse movimento dos
camponeses, segundo Werebe (1997, p.73), “[...] provocou um desagrado dos proprietários
rurais e dos setores mais conservadores do país, que viam neles o perigo de uma sublevação
‘comunista’ que devia ser combatida”.
Outros programas/projetos educativos destinados ao campo assinalados pelos autores
foram: a) PIPMOA – Programa Intensivo de Preparação de Mão-de-Obra Agrícola (1963); b)
SUPRA – Superintendência Política de Reforma Agrária (1964); c) CRUTAC – Centro Rural
Universitário de Treinamento e de Ação Comunitário (1965); d) Projeto Rondon (1968).
Verifica-se, desse modo, que os primeiros anos da década de 60 foram marcados por
mudanças significativas, principalmente no campo da educação popular, destacando-se: o
Plano Nacional de Alfabetização, dirigido por Paulo Freire e extinto pelo Golpe de Estado de
1964 após um ano de funcionamento, os Movimentos de Educação de Base (MEB), os
Centros Populares de Cultura (CPC), anunciando um novo paradigma de educação escolar
centrada na concepção libertadora de educação.
acesso à terra, ao crédito e assessoria técnica capaz de revelar melhorias substanciais nas suas
condições de vida. Tais programas, na verdade, estavam voltados para a questão do
desenvolvimento ‘insustentável’ e a difusão da ideologia do consenso, garantida pelo modelo
capitalista-dependente e pela manutenção do status quo.
A primeira metade dos anos 80 esteve voltada para a mobilização em torno do
processo constituinte, pela democratização do nosso país mediante a participação popular, dos
partidos políticos progressistas, dos sindicatos do campo e da cidade, além de entidades e
organizações não governamentais, entre outros setores da sociedade civil organizada, na busca
de garantia dos direitos e da conquista de espaços que assegurassem uma lei que fosse a
expressão da demanda da sociedade brasileira. Com efeito, a Constituição de 1988 não só
reconheceu como preconizou a participação dos cidadãos e cidadãs na formulação das
políticas públicas, inclusive a de educação.
Com a redemocratização do País, a Nova República extingue o Mobral e cria a
Fundação Educar, com objetivos mais democráticos, mas sem os recursos de que dispunha o
Mobral. Em seguida, cria-se o Plano Nacional de Alfabetização e Cidadania (PNAC), mas,
sem grande explicação para o povo, foi extinto no ano seguinte, isto é, em 1991. Em 1989,
criou-se a Comissão Nacional de Alfabetização com o objetivo de elaborar diretrizes para a
formulação de políticas de alfabetização em longo prazo, que não foram assumidas pelo
Governo Federal. Ao contrário, o Governo de Fernando Henrique Cardoso desconsiderou toda
a educação popular, extinguindo a Comissão e, com a Lei do FUNDEF (9.424/96), vetou os
recursos para esta modalidade de ensino, o que levou à não abertura de vagas pelos governos
estaduais e municipais para educação de jovens e adultos (GADOTTI, [2000?]).
Os anos que se seguiram foram assinalados por debates e discussões em torno da
elaboração e aprovação da atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN).
Vale mencionar, no âmbito dessas discussões, o papel das entidades e dos sindicatos na luta
por uma lei que garantisse uma escola pública de qualidade, tais como: ANPEd4, ANDES5,
CNTE6. Finalmente, após vários debates com interesses antagônicos, aprovou-se, em
dezembro de 1996 a LDBEN nº 9.394/96, conhecida também como Lei Darcy Ribeiro
(SAVIANI, 1998).
A trajetória de luta desta nova LDB não difere das leis de diretrizes e bases apontadas
anteriormente. De um lado, estavam as forças progressistas empenhados na construção e na
4
Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação.
5
Associação Nacional de Docentes do Ensino Superior.
6
Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação.
45
defesa de uma escola pública democrática, incluindo, entre outros pontos, a questão da gestão
democrática e a garantia de recursos financeiros. De outro, posicionavam-se setores
conservadores, representantes do Estado, desejosos da garantia dos recursos públicos para o
ensino privado, através de escolas confessionais, comunitárias e filantrópicas.
Nesse contexto, aprovou-se, mais uma vez, uma lei como resultado expresso de
interesses dos grupos dominantes, desconsiderando aspectos relevantes postos pelos
movimentos sociais, tais como: gestão democrática com eleição direta para diretores(as) de
escolas, obrigação da divulgação dos gastos com a educação, etc. Avaliando a trajetória da
atual LDB, Brito (1996, p. 20) afirma:
Quanto à educação rural, a LDB, no seu Título V, Capítulo II, Art. 28, propõe medidas
de adaptação e de adequação da escola às peculiaridades da vida rural quando da oferta da
educação básica pelos sistemas de ensino, a saber:
Tal modelo foi implantado na Inglaterra no final dos anos 70 no governo da “dama de
ferro” Margareth Thatcher, e, nos Estados Unidos, no governo de Ronald Regan, de maneiras
distintas. Na América Latina, o país pioneiro a adotar o projeto neoliberal foi o Chile.
No Brasil, as ideias do projeto neoliberal são introduzidas no governo de Fernando
Collor de Melo e consolidadas nos governos seguintes – Itamar Franco e Fernando Henrique
Cardoso. As primeiras medidas adotadas como parte desse projeto ocorreram com as
privatizações das empresas estatais – telefonia, energia elétrica, mineração e bancos estaduais
–, culminando com um alto índice de desemprego e outras conseqüências para a população
brasileira.
No plano educacional, dentro do modelo neoliberal, ações foram desenvolvidas
visando à melhoria da qualidade de ensino, como: a redução dos índices de reprovação e o
combate à evasão escolar. Desse modo, são instituídos os Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCN’s), na mesma linha dos países europeus, especificamente a Espanha. Não é em vão que
o seu maior consultor tenha sido um psicólogo espanhol, César Coll e sua equipe de técnicos
e burocratas articulados com o Banco Mundial – instituição financeira que tem como objetivo
financiar projetos dentre dessa nova ordem mundial, inclusive para as áreas sociais.
É nesse contexto político-neoliberal que o MEC lança, em 1998, com o objetivo de
subsidiar as Secretarias Municipais, a proposta pedagógica Escola Ativa, inicialmente no
Nordeste, voltada para as classes multisseriadas e que deveria atender as crianças nos mais
distantes rincões do interior nordestino. Incluída no Programa FUNDESCOLA7, essa
experiência foi ampliada para os Estados do Norte e Centro-Oeste8.
Portanto, é no bojo dessa conjuntura político-educacional e dada a adversidade a que
estão submetidos os filhos dos agricultores familiares, entre outros povos que habitam e
trabalham no campo conforme já referenciado, os movimentos sociais entram em cena não
somente na luta pela terra por meio do processo de reforma agrária, mas também lutam por
7
Fundo de Fortalecimento da Escola.
8
Ver por exemplo: PINHO, Ana Sueli Teixeira de. A heterogeneidade fundante das classes multisseriadas do
meio rural: entre a persistência do passado e as imposições do presente. 2004. 475f. Dissertação (Mestrado em
Educação e Contemporaneidade) – Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Salvador, 2004; ANTUNES-
ROCHA, Maria Isabel; HAGE, Salomão Mufarrej (Org.). Escola de direito: reinventando a escola multisseriada.
Belo Horizonte: Autêntica, 2010 (Coleção Caminho da Educação do Campo); GONÇALVES, Gustavo Bruno
Bicalho; ANTUNES-ROCHA, Maria Isabel; RIBEIRO, Vândiner. Programa Escola Ativa: um pacote
educacional ou uma possibilidade para a escola do campo. In: ANTUNES-ROCHA, Maria Isabel; HAGE,
Salomão Mufarrej (Org.). Escola de direito: reinventando a escola multisseriada. p.49-60; SANTOS, Fábio
Josué Souza dos; MOURA, Terciana Vidal. Políticas Educacionais, modernização pedagógica e racionalização
do trabalho docente: problematizando as representações negativas sobre as classes multisseriadas. In:
ANTUNES-ROCHA, Maria Isabel; HAGE, Salomão Mufarrej (Org.). Escola de direito: reinventando a escola
multisseriada. p. 35-48.
49
para o meio rural”, ou seja, educação no e do campo expressa, segundo essa perspectiva, o
direito do povo de ser educado no lugar onde vive, a partir do seu lugar, com sua participação,
vinculado à sua cultura e às necessidades humanas e sociais (CALDART, 2004 a).
Desse modo, é fundamental para o conjunto da sociedade brasileira, de modo especial,
pessoas e organizações sociais sensíveis à problemática dos povos do campo e ao processo de
inclusão desses sujeitos em uma educação contextualizada e diferenciada, compreender o
porquê do uso da expressão Educação do Campo e não mais Educação Rural, como justifica
Fernandes, Cerioli e Caldart (2004, p.25):
Decidimos utilizar a expressão campo e não a mais usual meio rural, com o
objetivo de incluir no processo da Conferência uma reflexão sobre o sentido
atual do trabalho camponês e das lutas sociais e culturais dos grupos que
hoje tentam garantir a sobrevivência deste trabalho. Mas quando discutimos
a educação do campo estamos tratando da educação que se volta ao
conjunto dos trabalhadores e das trabalhadoras do campo, sejam os
camponeses, incluindo os quilombolas, sejam as nações indígenas, sejam os
diversos tipos de assalariados vinculados à vida e ao trabalho no meio rural.
aos diferentes sujeitos que ali habitam, deve, necessariamente: 1º) integrar as diferentes
políticas de desenvolvimento sustentável; 2ª) planejar a produção e o acesso aos mercados
com garantia de crédito diferenciado e de preços adequados; 3ª) dotar de infraestrutura social
e produtiva, com assessoria técnica; 4ª) investimento em pesquisa e, por último, 5ª)
capacidade de conjugar educação e formação para o trabalho numa outra lógica pedagógica,
considerando os saberes acumulados e a cultura local (CONTAG, 2004).
Esse movimento desencadeado em torno da educação do campo, portanto, reescreveu
um novo capítulo na História da Educação brasileira com o nascimento de um projeto de
educação “[...] protagonizado pelos trabalhadores e trabalhadoras do campo e suas
organizações sociais”, como afirmam Arroyo, Caldart e Molina (2004, p.7).
Outro desdobramento do I ENERA foi a criação do Programa Nacional de Educação
na Reforma Agrária (PRONERA), enquanto uma política social do governo federal, que
emerge da demanda dos movimentos sociais, em especial dos Movimentos dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra (MST), em parceria com as universidades federais e estaduais e o apoio de
instituições, entidades e sindicatos rurais por meio da Confederação Nacional dos
Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB), da UNESCO e da Comissão Pastoral da Terra (CPT).
Criado oficialmente por meio da Portaria nº 10/98, de 16 de abril de 1998, junto ao
Ministério Extraordinário de Política Fundiária (MEPF), hoje Ministério do Desenvolvimento
Agrário (MDA), o PRONERA nasce como uma experiência inovadora para a população dos
acampamentos e assentamentos rurais da Reforma Agrária, com o objetivo de reduzir o
analfabetismo e elevar o nível de escolaridade das crianças, adolescentes, jovens e adultos. Do
ponto de vista administrativo-pedagógico, o Programa inova em duas direções: primeiro, de
construir e empregar uma metodologia de ensino voltada para a realidade sociocultural dos
assentados e acampados e, segundo, por exercitar um modelo de gestão colegiada,
participativa e democrática, envolvendo todos os parceiros – universidade, movimentos
sociais e governo federal (ANDRADE; DI PIERRO, 2006; HAGE, 2007).
Vale ressaltar que o Programa, no ano de 2001, foi incorporado ao Instituto Nacional
de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), órgão vinculado ao Ministério do
Desenvolvimento Agrário (MDA) e, segundo Hage (2007, p. 243), “[...] passando, assim, a
depender de aval das instâncias superiores e não mais da Coordenação Geral de Projetos
Especiais da Superintendência do Desenvolvimento Agrário”.
Na sua origem, como já citado, a intenção do PRONERA voltava-se para a
alfabetização dos acampados e assentados de áreas de reforma agrária, contudo, a luta não só
54
por escolas públicas nessas áreas, como também para garantir professores do próprio
movimento nas escolas conquistadas, seja na condição de disputar vagas via concursos, seja
por contratações públicas, acabou demandando cursos de formação de educadores, como o
curso de Magistério, denominado na legislação brasileira de Normal de Nível Médio, tendo
sua primeira turma iniciada no Rio Grande do Sul em 1990 (CALDART, 2004 a). Essa
experiência, somada a outras de nível superior implantadas posteriormente, acabou se
espalhando para outros Estados do País, inclusive para o Estado da Bahia, a ser destacado no
item a seguir.
para atuarem nas escolas localizadas no meio rural, visando contribuir com o
desenvolvimento do meio rural, através de ações educativas para o homem do campo, tanto
do ponto de vista das especificidades da vida do campo, quanto para o trato com a higiene e a
profilaxia, necessidades propaladas desde o final do século XIX.
A proposta de criação de escolas de formação de professores para o meio rural estava
diretamente ligada às ideias do movimento denominado de ruralização do ensino (grifo dos
autores), movimento este que teve início nas primeiras décadas do século 20 por pensadores
sociais, intelectuais como Sílvio Romero, Alberto Torres, Belizário Pena e Sud Mennucci 11
(MAGALHÃES Jr.; FARIAS, 2007).
Os debates em torno do ensino e da formação de professores para o meio rural
fomentados por esses intelectuais, defensores do nacionalismo, do agrarismo brasileiro, por
entenderem ser esta a vocação histórica, natural do nosso país, viam, na educação e na
formação dos professores, a alternativa de levar a cabo uma política de valorização do
crescimento e de desenvolvimento de atividades econômicas no meio rural, bem como de
barrar o fluxo migratório dos povos carentes principalmente das Regiões Norte e Nordeste
para o Sul e o Sudeste. Na verdade, a ideia de fixar o homem do campo no campo ou no meio
rural, de certa forma era uma maneira de impedir o empobrecimento e a mendicância nas
cidades, tendo em vista que esse fenômeno já começava a causar problemas no meio urbano
(MAGALHÃES Jr.; FARIAS, 2007; WERLE; METZLER, 2010).
Com base nesses ideais, surge a experiência pioneira de formação de professores para
as escolas rurais – a Escola Normal Rural de Juazeiro do Norte, no Estado do Ceará –,
posteriormente entendida para vários Estados, consolidando, desse modo, o movimento de
ruralização do ensino. A Escola Normal Rural de Juazeiro iniciou suas atividades no dia 13
de março de 1934, por meio de um Exame de Admissão. Essa experiência não foi subsidiada
integralmente com recursos públicos, mas, por intermédio da concessão governamental como
também da iniciativa de uma entidade privada criada exatamente para este fim, tendo como
maior articulador o juiz municipal de Juazeiro do Norte. Pelos motivos expostos, essa escola
funcionou mediante sistema de parceria público-privado12.
11
Um dos maiores ou, provavelmente, o maior defensor da Escola Normal Rural no Brasil.
12
Para maiores informações sobre a experiência de Juazeiro do Norte, consultar: MAGALHÃES Jr.; FARIAS,
Ruralismo, memórias e práticas educativas no cotidiano da Primeira Escola Normal Rural do Brasil: a Escola
Normal Rural de Juazeiro do Norte – CE (1934-1946). In: WERLE, Flávia Obino Corrêa (Org.). Educação
Rural em perspectiva internacional: instituições, práticas e formação do educador. Ijuí, Rio Grande do Sul:
Editora INUJUI, 2007. Consultar também o estudo preparado por solicitação da UNESCO realizado por Manoel
Bergstrom Lourenço Filho sob o título: Preparação de pessoal docente para as escolas rurais, de 1953.
56
13
Para maior aprofundamento sobre a experiência da Escola Normal Rural da Fazenda Rosário, ver artigo de
PEIXOTO, Ana Maria Casasanta; ANDRADE, Therezinha. A utopia que brota do campo: a Educação Rural em
Minas Gerais (1949-1971). In: WERLE, Flávia, Obino Corrêa (Org.). Educação Rural em perspectiva
internacional: instituições, práticas e formação do educador. Ijuí, Rio Grande do Sul: Editora INUJUI, 2007.
57
Por conta das reformas educacionais empreendidas nos anos 40, entre as quais, a dos
cursos normais rurais que passaram a ser chamados de cursos normais regionais, pela Lei
Orgânica do Ensino Normal, Lei nº 8.530 de 1946, pesquisa desenvolvida por Lourenço Filho
por solicitação da UNESCO e publicada em 1953, revela que em 1951 funcionaram no Brasil
546 estabelecimentos de ensino normal, dos quais 434 escolas normais e 112 cursos normais
regionais, distribuídos de forma desigual entre os diferentes Estados do Brasil, conforme a
Tabela 1 abaixo.
Tabela 1 – Distribuição das Escolas Normais e Cursos Normais Regionais pelos Estados,
Territórios e Distrito Federal em 1951
Cursos Regionais Escolas Normais Total
Alagoas 2 4 6
Amazonas 6 4 10
Bahia 2 12 14
Ceará 12 12 24
Espírito Santo 1 13 14
Goiás 6 16 22
Maranhão 1 1 2
Mato Grosso - 3 3
Minas Gerais 9 124 133
Pará 2 4 6
Paraíba 8 8 16
Paraná 8 16 24
Pernambuco 9 11 20
Piauí 1 4 5
Rio Grande do Norte - 2 2
Rio Grande do Sul 2 27 29
Rio de Janeiro - 20 20
58
Santa Catarina 38 12 50
São Paulo - 135 135
Sergipe 2 2 4
T. Acre 2 2 4
T. do Amapá 1 - 1
T. do Guaporé 1 1 2
T. do Rio Branco 1 - 1
Distrito Federal - 11 11
Totais 112 434 546
Fonte: Lourenço Filho (1953, p. 82).
Como se vê, os Estados com maior número de Escolas Normais Rurais são: Santa
Catarina com 38 cursos, seguido do Ceará com 12, Estado onde teve início o processo de
implantação dessas escolas, acompanhado dos Estados de Minas Gerais e Pernambuco com 9
cursos cada um. O Estado da Bahia teve apenas duas escolas, sendo um na cidade de Feira de
Santana e outro na de Caetité conforme decreto-lei descrito abaixo, aqui destacado tão
somente por ser o Estado locus onde se desenvolve a pesquisa em pauta.
Sobre as duas experiências descritas por Lourenço Filho (1953) – estudo realizado a
pedido da UNESCO conforme se destacou –, seguem algumas considerações apresentadas por
ele quanto a essas escolas normais rurais mais antigas em nosso país. Primeira consideração:
as duas experiências nascem apoiadas por entidades privadas e denotam uma preocupação e
59
um interesse pela organização da vida rural no País, tanto do ponto de vista pedagógico
quanto de ordem econômico-social.
Em segundo lugar, as bases teórico-epistemológicas das duas experiências são
diversas. As de Juazeiro do Norte decorreram da aceitação do ideal de que bastará juntar ao
currículo das escolas normais da cidade o ensino de práticas e técnicas agrícolas cujo objetivo
era o de que, ao se verem formados, os jovens viessem a sentir entusiasmo pelos trabalhos nas
escolas rurais e, como tal, contribuíssem eficientemente para a fixação do homem ao campo.
Já nas da Fazenda Rosário, o problema da formação do pessoal docente está intimamente
ligado ao de seu recrutamento e, desse modo, concluindo-se, então, que o problema da
formação regular não poderia estar desvinculado do da origem dos candidatos ao ensino nas
zonas rurais.
Uma terceira consideração é que tanto a experiência de Juazeiro do Norte quanto a da
Fazenda Rosário em Betim, Minas Gerais, de qualquer modo, acabaram por influenciar os
estudos sobre os problemas da educação rural no País, servindo, entre outras atividades, de
espaços de treinamentos, de reuniões de estudos da vida rural, de estágios de outras escolas
normais de muitos Estados, como também de treinamentos de bolsistas. Vale ressaltar, com
base nas considerações destacadas por Lourenço Filho (1953), entre tantas atividades
realizadas na Fazenda Rosário, a realização do I Seminário de Estudos Rurais, do qual
participaram representantes de 16 Estados brasileiros. Entre as conclusões desse Seminário,
nasce a ideia da criação de um Instituto de Educação Rural, voltado para as pesquisas sobre o
assunto e a formação dos professores de Escolas Normais Regionais, ideia fomentada
anteriormente pela comissão organizadora do Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e
Cultura, que é, no Brasil, a Comissão Nacional da Unesco.
A maioria das Escolas Normais Rurais criadas desde então, cujo objetivo era formar
professores para desenvolverem a regência ou o magistério nas escolas localizadas em
contextos rurais diversos, teve como resultado seu fechamento por conta da Reforma da Lei
de Ensino de 1º e 2º Graus – Lei nº 5.692/1971 com a criação do Curso Técnico em
Magistério de Nível Médio, que perdurou até a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional – LDBEN nº 9.394/96.
Os debates em torno da educação escolar e, consequentemente, sobre a formação de
professores ganham força a partir da abertura política no final do regime militar,
possibilitando aos educadores progressistas, inspirados no referencial marxista e gramscniano
uma análise dos problemas educacionais e da escolaridade no País. Também as teorias crítico-
60
A história nos mostra que não temos uma tradição nem na formulação de
políticas públicas, nem no pensamento e na prática de formação de
profissionais da educação que focalize a educação do campo e a formação de
educadores do campo como preocupação legítima. (ARROYO, 2007 b,
p.158).
63
Para o mesmo autor, a educação brasileira no percurso da sua história e, por extensão,
a formação de seus educadores, sempre se inspiraram em uma visão generalista também
nomeada por ele de universalista em todos os sentidos: de direitos, de cidadania, de educação,
de igualdade, que ignora diferenças de território, e mais, a diversidade é secundarizada, entre
outras representações sobre as “minorias”, “Os diversos”, ‘Os outros’ (ARROYO, 2008, p.
15). Inspirados nessas visões (universalista e generalista), os órgãos normativos, responsáveis
pelo processo de formulação e implementação de políticas públicas, seja no campo da gestão,
do currículo, da formação, da organização dos tempos escolares, do livro ou do material
didático, materializaram essas políticas nas Leis de Diretrizes e Bases da Educação e,
obviamente, nos demais documentos legais que orientam a política de educação, de modo
geral, e a do campo particularmente (ARROYO, 2007 b).
Sendo assim, o PRONACAMPO, no tocante ao Eixo II – Formação de Professores
esboçou um plano de formação inicial, continuada e de pós-graduação. Daí são as seguintes
ações destacadas no documento no tocante a esse eixo: oferta de cursos de licenciatura em
educação do campo; expansão de pólos da Universidade Aberta do Brasil; cursos de
aperfeiçoamento e especialização; financiamento de pesquisas voltadas para o
desenvolvimento da educação do campo e quilombola; participação das escolas do campo no
Programa Escola sem Fronteiras.
Os instrumentos para dar conta de operacionalizar essas ações, de acordo com o
documento, são: Universidade Aberta do Brasil (UAB), Plano Nacional de Formação de
Professores da Educação Básica – PARFOR, Instituições de Educação Superior Públicas e
Comunitárias e Programa Nacional de Assistência Estudantil – PNAES. Para alcançar os
objetivos ou ações previstos, o documento traz como metas: Primeira Etapa da formação
inicial: 45.000 mil professores; Primeira Etapa da formação continuada: 100.000 mil
professores.
Enquanto uma política pública recente do MEC merece todo respeito, e esperamos que
as metas sejam alcançadas, para minimizar consideravelmente um dos maiores gargalos da
educação do campo que é a formação de educadores. Contudo, não se deve desconsiderar a
importância do movimento construído pelas organizações sociais do campo no tocante à
formulação de políticas públicas voltadas para a formação de educadores do campo, a
exemplo do Curso de Pedagogia da Terra do PRONERA/MDA e de outros cursos de
licenciatura vinculados a esse programa e dos Cursos de Licenciatura em Educação do Campo
da SECADI/MEC tratados de agora em diante.
64
2004b), “[...] cuja opção é explicitamente pelo desenvolvimento de práticas educativas com o
objetivo de contribuir com os processos de promoção da emancipação dos sujeitos
camponeses” (MOLINA, 2009, p.189).
Para se ter uma ideia da expansão dos cursos de nível superior do PRONERA em
parceria com as instituições de ensino superior e os movimentos sociais, em todas as regiões
do País, a pesquisa, realizada por Hage (UFPR) em 2005, revelou a existência de 16 turmas de
Pedagogia da Terra, uma (01) turma de Normal Superior, uma (01) turma de Formação do
Educador, duas (02) turmas de Letras, uma (01) turma de História, uma (01) turma de
Geografia, uma (01) turma de Técnico em Gestão Superior, três (03) turmas de Agronomia,
uma (01) turma de Ciências Agrárias e um (01) curso de Especialização (HAGE, 2007).
Como se vê, pouco a pouco, cresceu o número de cursos para atender à demanda da
população assentada e acampada de áreas de reforma agrária através do PRONERA – órgão
vinculado ao Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), conforme já assinalado,
presente em todas as regiões do Brasil e cujo objetivo é garantir a melhoria da qualidade do
processo de ensino-aprendizagem a essa população.
Do exposto sobre o PRONERA, referência na construção do paradigma da Educação
do Campo no qual os próprios movimentos sociais e sindicais se retroalimentam, como
também setores do próprio Estado, constatam-se vários avanços, sendo um dos principais,
conforme mencionado, a aprovação das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas
Escolas do Campo. Por sua vez, também contribuiu sobremaneira para reinserir o campo na
agenda de pesquisa dos programas de pós-graduação em educação das universidades públicas
brasileiras (MOLINA, 2009).
O Parecer CNE/CEB 36/2001 e a Resolução CNE/CEB 1/2002, que institui as
Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo, trazem orientações
nos seus artigos quanto a: organização da escola, elaboração do currículo e do projeto
político- pedagógico, como também da formação dos professores que atuam ou atuarão na
educação básica nas escolas do campo.
No artigo 12º, o documento, de conformidade com a LDB nos arts. 12, 13, 61 e 62, nas
Resoluções nºs 3/1997 e 2/1999 da Câmara de Educação Básica, assim como os Pareceres nºs
9/2002, 27/2002 e 28/2002, no tocante à formação de professores em nível superior para a
Educação Básica, prevê a formação inicial em curso de licenciatura e estabelece, também,
uma qualificação mínima para atuar na Educação Infantil e nos anos iniciais do ensino
fundamental, por meio do curso de formação de professores em Nível Médio, na modalidade
Normal. No parágrafo único, destaca: “Os sistemas de ensino, de acordo com o art. 67 da
66
É, pois, com base nesses componentes que as organizações sociais do campo, entre
esses os movimentos sociais, têm pautado o processo de criação e implementação dos cursos
de licenciatura para o conjunto da população assentada, acampada e quilombola, na
perspectiva de garantir uma educação que dê conta das especificidades, das singularidades
própria deste lugar, sem desconsiderar os conhecimentos construídos historicamente pela
humanidade, bem como os avanços científicos e tecnológicos contemporâneos com vista à
construção de uma sociedade mais humana e para uma convivência solidária. Para tanto, os
movimentos sociais reivindicam, nos programas e projetos de formação de educadores, a
inclusão da realidade do campo, a diversidade sociocultural, bem como as tensões ali
presentes entre o latifúndio e os camponeses em suas diversas formas de produção e
existência humana.
Sobre essa questão, expressa Arroyo (2008, p. 19):
Nesse contexto, vale ressaltar o esforço do Ministério da Educação (MEC), por meio
da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI), ao
criar a Coordenação Geral de Educação do Campo (CGEC) que, entre suas várias funções,
vem contribuindo para a ampliação do debate sobre esta modalidade de ensino e a questão da
formação de educadores do campo, tendo como referência os padrões apontados por Arroyo.
Como parte de suas funções, a SECADI/MEC, ao lado do CONSED e da UNDIME,
realizou o Seminário Nacional sobre Educação do Campo, que resultou na Carta de Mato
Grosso15, propondo uma agenda prioritária de compromissos para o desenvolvimento das
Políticas Públicas de Educação do Campo, entre elas, destacando-se: consolidar, socializar e
validar, entre os entes federados, universidades, movimentos sociais e sindicais, proposta de
Política Nacional de Formação dos Profissionais do Campo; definir política inicial e
continuada para os profissionais da Educação do Campo, com base em novo desenho e em
novas propostas pedagógicas; e institucionalizar Políticas de Valorização dos Profissionais da
Educação do Campo, na perspectiva da melhoria da qualidade das condições de trabalho e de
vida, em razão do exercício da atividade na Escola do Campo.
O resultado desses eventos em torno de uma política nacional de formação de
professores na CGEC culminou com a criação do Programa de Apoio à Formação Superior
em Licenciatura em Educação do Campo – PROCAMPO, em cumprimento às atribuições
dessa Coordenação, que busca atender à formulação de políticas públicas de superação das
históricas desvantagens educacionais às quais são submetidas as populações rurais,
acentuando a atenção à diversidade nas políticas públicas (BRASIL. SECADI/MEC, 2007),
como sugere o INEP/MEC:
15
Esse Seminário aconteceu nos dias 8 e 9 de junho de 2006, com a participação do Secretário da SECAD/MEC,
do Presidente do CONSED e da Presidente da UNDIME, além da participação de organizações da sociedade
civil. O Seminário teve como objetivos: cumprir a agenda proposta na reunião em Gramado/RS, de 23 de
novembro de 2005, aprofundar o debate e contribuir de forma sistêmica para a definição e implantação de uma
política que promova a Educação do e no Campo como direito a uma educação de qualidade (BRASIL, 2006).
68
Como se vê, o tema formação de educadores do campo vem, pouco a pouco, ocupando
lugar de destaque nas discussões e reflexões, seja no âmbito dos Ministérios da Educação
(MEC) por meio da SECADI, do Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA), pelo
PRONERA, conforme se destacou, seja através dos cursos de graduação de Pedagogia com a
inclusão do componente curricular Educação do Campo17, seja por meio dos programas de
pós-graduação em educação e áreas afins, como também nos encontros acadêmico-científicos,
a exemplo do Encontro Nacional de Pesquisa em Educação do Campo (ENPEC), do
Seminário sobre Educação Superior, das Políticas para o Desenvolvimento do Campo
brasileiro e do Encontro Internacional de Educação do Campo, ocorridos simultaneamente, no
âmbito da Universidade de Brasília (UnB), promovidos pelo Observatório de Educação do
Campo, nos anos de 2005, 2008 e 2010, respectivamente.
Destacam-se, também, como parte deste movimento de inclusão da Educação do
Campo e, por extensão, da formação de educadores do campo, no Subtema 10 – Educação do
16
O Observatório da Educação é um Programa de fomento que visa ao desenvolvimento de estudos e pesquisas
na área de educação. Tem como objetivo estimular o crescimento da produção acadêmica e a formação de
recursos humanos pós-graduados, nos níveis de mestrado e doutorado, por meio de financiamento específico.
Trata-se de uma parceria entre a CAPES e o INEP. Prevê que regularmente seja feita a abertura de editais
convocando a comunidade acadêmica a apresentar projetos de estudos e pesquisas na área de educação,
envolvendo os programas de pós-graduação de mestrado e de doutorado das Instituições de Educação Superior
(IES). As normas do Programa exigem a utilização dos dados estatísticos educacionais produzidos pelo INEP
como subsídio ao aprofundamento de estudos sobre a realidade educacional brasileira. Universidades que
compõem o Observatório: Universidade de Brasília, Universidade Federal de Sergipe, Universidade Federal do
Rio Grande do Norte, Universidade Federal do Ceará, Universidade Federal da Paraíba, Universidade Federal de
Minas Gerais, Universidade Federal de Santa Catarina/Instituto EDUCAMPO, Universidade Estadual Paulista
“Júlio de Mesquita Filho” – Cátedra de Educação do Campo da UNESCO. Disponível em:< www.
observatorio.inep.gov.br/index.php?option >. Acesso em: 27 set. 2010.
17
A Universidade do Estado da Bahia (UNEB), por exemplo, incluiu nos Cursos de Pedagogia, o componente
curricular Educação do Campo.
70
18
Estiveram presentes, neste encontro, 350 pesquisadores de todo o país (MOLINA, 2010).
71
19
O Caderno de Resumos foi entregue aos inscritos durante o credenciamento e contém toda a programação do
evento, incluindo também, em anexo, um CD com os artigos aprovados.
72
20
O trabalho apresentado teve como título: “Formação de Educadores do Campo: considerações a partir dos
cursos de licenciaturas para os monitores das Escolas Famílias Agrícolas”.
73
21
Nos 275 trabalhos, estão inclusos os onze (11) que tratam da formação de educadores do campo.
22
A referida pesquisa contou com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia
(FAPESB), por meio do Edital FAPESB 04/2007 – Temático – Educação, e também do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), por meio do Edital MCT/CNPq 03/2008 – Ciências
Humanas, Sociais e Sociais Aplicadas. Atualmente, conta com financiamento do CNPq, Edital Universal
74
Esse projeto de pesquisa, após sua aprovação pelos comitês científicos das agências de
fomento às pesquisas no campo da educação, vem desenvolvendo diversas atividades, entre
estas, pensar ações educativas de formação e autoformação em torno da educação do campo, a
exemplo do Seminário Ruralidades, Currículo e Formação: sujeitos, práticas pedagógicas e
multisseriação, realizado pelo GRAFHO e CAF/UFRB, no município de Amargosa/Ba, no
período de 15 a 17 de abril de 2009. Registram-se ainda quatro encontros de estudos e de
orientação de pesquisa com os estudantes de pós-graduação (mestrandos e doutorandos)
associados do grupo e dos professores orientadores no município de Amargosa-Bahia e visitas
às escolas do meio rural, entre estes, de classes multisseriadas. Além dessas ações, é
fundamental destacar as produções acadêmico-científicas que tratam do objeto de pesquisa,
publicados em periódicos reconhecidos tanto em nível nacional como internacional, a saber:
“Sujeitos e Práticas Pedagógicas nas Escolas Rurais da Bahia: ações educativas e territórios
de formação”, publicado pela Revista on-line Currículo sem Fronteiras23; “Sujeitos,
instituições e práticas pedagógicas: tecendo as múltiplas redes da educação rural na Bahia”24,
publicado pela Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade, do Departamento de
Educação/Campus I da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), vinculada ao PPGEduC.
Nessa trajetória de luta e labuta por políticas públicas bem como de discussões que
vêm acontecendo nos espaços acadêmico-científicos aqui destacados, no que se refere à
formação de educadores do campo, Antunes-Rocha (2010), a partir de sua experiência com os
cursos de formação de educadores do campo na Faculdade de Educação (FAE) da
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), junto aos movimentos sociais e sindicais, a
exemplo do Curso de Licenciatura em Educação do Campo, destaca aspectos a serem
considerados no perfil de um curso de formação de educadores vinculados às escolas do
campo, a saber: “[...] que tenha compromisso, condições teóricas e técnicas para desconstruir
as práticas e ideais que forjaram o meio e a escola rural”. E mais, que o educador do campo
precisa “[...] ter a compreensão da dimensão do seu papel na construção de alternativas de
14/2010. O projeto de pesquisa é composto por estudantes de Iniciação Científica do Curso de Graduação em
Pedagogia do Campus I/DEDC, de mestres e mestrandos, como também de doutores e doutorandos do Programa
de Pós-Graduação em Educação e Contemporaneidade da UNEB (PPGEduC).
23
SOUZA, Elizeu Clementino de; SANTOS, Fábio Josué Souza; PINHO, Ana Sueli Teixeira de; ARAÚJO,
Sandra Regina Magalhães de. Sujeitos e Práticas Pedagógicas nas Escolas Rurais da Bahia: ações educativas e
territórios de formação. Currículo sem Fronteiras, v. 11, n.1, p.156-169, jan./jun. 2011.
24
SOUZA, Elizeu Clementino de; SANTOS, Fábio Josué Souza; PINHO, Ana Sueli Teixeira de; ARAÚJO,
Sandra Regina Magalhães de. Sujeitos, instituições e práticas pedagógicas: tecendo as múltiplas redes da
educação rural na Bahia. Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade, Salvador, v. 20, n. 36, p.151-
164, jul./dez./ 2011..
75
organização do trabalho escolar. Uma atuação que entenda a educação como prática social”
(ANTUNES-ROCHA, 2010, p. 395).
Ainda, como parte das reflexões acerca da formação do educador do campo para as
escolas do campo, Antunes-Rocha (2010, p.396) traz outras considerações:
[...] a formação deve contribuir para que o educador seja capaz de propor e
implementar as transformações político-pedagógicas necessárias à rede de
escolas que hoje atendem a população que trabalha e vive no e do campo.
Um educador do povo do campo para muito além do papel da educação
escolar. Um educador que assume seu papel como agente de transformação
da sua realidade pessoal e social.
educadores das escolas presentes no meio rural é proveniente da cidade. Desse modo, diz
Arroyo (2007 b, p.169): “A maioria das educadoras e educadores vai, cada dia, da cidade à
escola rural e de lá volta a seu lugar, a cidade, a sua cultura urbana. Consequentemente, nem
tem suas raízes na cultura do campo, nem cria raízes”.
Contrários a essa lógica instituída nos e pelos programas ou projetos de formação
generalista, os movimentos sociais vêm defendendo cursos de formação em áreas onde
possam concentrar os formandos, cursos estes ofertados em regime semipresencial,
articulando a formação pedagógica com as experiências e vivências da comunidade. Os
movimentos sociais defendem, também, o ponto de vista de que o professor/formador dos
cursos tenha conhecimentos sobre a realidade do campo e a especificidade de ser educador
do/no campo (ARROYO, 2007 b).
Segunda consideração destacada pelo autor é a construção de um corpo estável de
educadores nas escolas do campo, pois, com a ausência de um corpo docente estável,
provavelmente todo esforço quanto à especificidade da formação inicial poderá se perder.
Formação para um projeto de campo é outra consideração que o autor apresenta
quanto à formação específica para ser um educador do campo. Para ele, a ausência de
políticas de formação de educadores se justifica pela própria inexistência de uma política
específica de educação do campo, enquanto um direito constitucional de todos à educação
básica, seja para as crianças, adolescentes, jovens ou adultos. Nesse quesito, mais uma vez, os
movimentos sociais têm sido decisivos, ao reivindicar políticas públicas de educação e de
formação alinhadas a um projeto de campo que assegure a permanência da agricultura
familiar ante o agronegócio, que luta pela sua extinção. E mais: “[...] defesa da tradição
camponesa, da cultura, dos valores, dos territórios, dos modos de produção de bens para a
vida de seres humanos. Essa é a defesa mais radical do sentido social e cultural da educação
do campo e da formação de seus profissionais” (ARROYO, 2007 b, p. 171).
Finalmente, o autor traz mais duas considerações para responder a questão inicial, ou
seja, qual a formação específica para ser educador(a) do campo? A formação assumida como
política de Estado e superar o estilo delegado de formação. A primeira destaca as
reivindicações dos movimentos sociais, ao exigir do Estado políticas públicas tanto para a
educação do campo quanto para a formação dos educadores do campo. Tal exigência visa a
superação de programas e projetos temporários, supletivos, experimentais e, como tal, não
constituem políticas de Estado permanentes. Em relação à segunda consideração, o autor
chama atenção para o fato de que o processo de implantação, implementação e financiamento
dos programas são entregues aos bancos ou agências de financiamento. É aqui, segundo ele,
77
que os órgãos financiadores incorporam nos programas ou projetos suas visões, ou melhor,
suas concepções de campo, de educação e o papel dos educadores e gestores ante esse estilo
delegado de formação.
Por fim, Arroyo (2007 b) esboça alguns “traços” de uma política de formação
construídos pelos movimentos sociais, contrapondo-se aos “estilos” de programas e projetos
implementados pelas agências de financiamento e de outras formas de oferta de cursos de
formação de educadores do campo, a saber: políticas que afirmem uma visão positiva do
campo; políticas de formação articuladas a políticas públicas de garantia de direitos; políticas
de formação afirmativas da especificidade do campo; políticas de formação a serviço de um
projeto de campo e políticas de formação sintonizadas com a dinâmica social do campo.
O perfil e a centralidade dos saberes a serem ensinados e aprendidos nos cursos de
formação de educadores do campo apontados pelos autores (ARROYO, 2007 b; ANTUNES-
ROCHA, 2010) se mostram compatíveis com o perfil e a centralidade de saberes e fazeres
desenvolvidos pelos monitores do movimento educativo CEFFAs, construídos na relação
teoria-prática, ação-reflexão-ação, tendo em vista os quatros pilares que orientam essas
escolas: uma metodologia que está pautada no princípio da Alternância integrativa, por meio
de dois tempos-espaços formativos – o meio socioprofissional (família/comunidade) e o
centro escolar; uma Associação responsável nos diversos aspectos – econômicos, jurídicos,
de gestão, etc.; a educação e a formação integral da pessoa, contribuindo para que o jovem
construa a sua personalidade e o seu futuro com a família e no meio em que vive; e,
finalmente, o desenvolvimento local sustentável e solidário através da formação de seus
próprios atores sociais (CALVÓ, 1999).
Nesse campo de preocupação com uma política de formação inicial voltada para os
educadores do campo, inscreve-se esta pesquisa ao buscar compreender uma experiência de
formação inicial para os monitores das Escolas Famílias Agrícolas do Estado da Bahia através
das duas redes – AECOFABA e REFAISA – em convênio com a UNEB.
78
No contexto dos anos de 1920 a 1930, a agricultura francesa passava por mudanças,
incluindo, de um lado, o início do processo da mecanização agrícola e, do outro, uma crise no
mercado agrícola e pecuário no âmbito dos pequenos proprietários de terra. Em consequência,
80
– Yves não quer ir à escola superior. É uma desgraça, porque aos doze anos
ainda não acabou de se formar.
– Nem tudo está perdido. Existem outras escolas – disse o pároco. Escolas
do Estado, Escolas Livres, a Escola de Marmande, por exemplo.
– Sim, tudo isso está muito bem para formar as pessoas da cidade, mas não
para formar agricultores.
– Existem as Escolas de Agricultura; existe uma em Fazanes, a trinta
quilômetros de sua casa.
– Quantos agricultores autênticos – prosseguiu Jean Peyrat – você têm visto
sair da Escola de Agricultura? Além disso, é muito cara. Sempre acontece
igual conosco: ou instruir-se, abandonar a terra e seguir desenganados, ou
não abandonar a terra e continuar ignorantes por toda a vida.
– Existem também cursos por correspondência...
– Mas então, e se eu mesmo fizer o trabalho?
– Ele sozinho vai se aborrecer. O remédio seria pior que a doença.
– E se encontrar outros?
– Então, encontre outros, senhor padre, meu filho será o primeiro. (NOVÉ-
JOSSERAND, 1998, apud GARCÍA-MARIRRODRIGA, 2010, p.24).
Ainda que houvesse certas reticências por parte dos pais, o pároco lhes
convenceu da necessidade da vida de grupo dos adolescentes como parte
indispensável de sua formação e de que eles teriam que se comprometer a
82
deixar tempo livre para seus filhos durante as três semanas que passavam
em suas casas para que pudessem fazer suas tarefas. Desta forma tão
natural, começou uma incipiente ‘alternância’ com um ritmo de três
semanas na propriedade e uma semana na escola’.
‘Escola Agrícola’. É nesse contexto que os pais decidem contratar um monitor em tempo
integral. Desse modo, elegem Jean Cambon, filho de agricultor, recém-graduado pela Escola
Superior de Purpan, para ser monitor. Sobre essa questão, Chartier (apud QUEIROZ, 2004, p.
68) diz: “[...] é, portanto, possível de afirmar que de fato por conta de sua qualificação e de
seu estatuto, Jean Cambon seja realmente o primeiro monitor das Casas Familiares Rurais”.
Em relação à questão legal, houve uma reunião com a presença de uma dezena de
pessoas em 23 de agosto de 1936, na qual se constitui uma comissão presidida por Jean Peyrat
e que resultou na escrita de uma carta encaminhada para o Ministério da Agricultura cujo teor
foi o processo de reconhecimento da iniciativa da Escola Camponesa como escolaridade
obrigatória.
No ano seguinte, mais precisamente em 21 de março de 1937, ocorre outra reunião
importante: a transferência das aulas de Sérignac-Péroudou para Lauzun, não apenas por
oferecer melhores condições físicas como também para difundir essa experiência França
afora. Também se discutiu a criação de uma escola agrícola para as meninas, que passou a
funcionar no ano de 1940 com 35 alunas, o funcionamento e o futuro da Maison
d’Apprentissage Agricole, como esclarece García-Marirrodriga (2010, p. 30-31): “Pela
primeira vez, aparece a palavra Maison, casa, no lugar de escola. Foi um passo a mais em
direção ao que seria um pouco mais tarde a denominação de ‘Maison Familiale’ (casa das
famílias). Mais que um nome, era um avanço frente à responsabilização das famílias”.
Para concretizar a mudança do local da escola, os pais dos jovens em formação foram
convocados para uma Assembleia Geral da Seção Regional do SCIR em 25 de abril de 1937
com o objetivo de decidir, entre outras coisas, a compra de um imóvel onde funcionaria a
nova escola em Lauzun. Nesse mesmo dia, os quinze alunos fizeram o exame do segundo ano.
Inicialmente, a paróquia se comprometeu com a compra, mas a proposta foi recusada pelos
agricultores. Daí que, numa outra Assembleia Geral realizada em 25 de julho desse mesmo
ano, as famílias decidem mudar os estatutos, tirando a responsabilidade legal do SCIR e
passam a assumir a responsabilidade com a Seção Regional. Em 24 de outubro, compram uma
casa em Lauzun e o Conselho da Seção Regional do SCIR assume a responsabilidade
financeira como também desobriga o Padre Granereau desta responsabilidade, mas manteve
as outras (QUEIROZ, 2004; GARCÍA-MARIRRODRIGA, 2010).
Constata-se que o ano de 1937 foi decisivo para as Casas Familiares Rurais, por conta
dos acontecimentos, das decisões por parte dos agricultores, na perspectiva de avançar nos
princípios que orientam essas escolas: a responsabilidade e o comprometimento dos pais,
tanto em relação à formação dos jovens como do ponto de vista da sustentação financeira.
84
Outro fator importante de consolidação das Casas Familiares Rurais foi a presença em tempo
integral do monitor, o engenheiro Jean Cambom.
Paulo Nosella (1977), o primeiro a pesquisar sobre a Pedagogia da Alternância no
Brasil, destaca que, além dessas questões de organização e estruturação dessa escola, chama
atenção para outras características das Casas Familiares Rurais, como: a manutenção da
estreita relação desta com os sindicatos rurais e com o movimento da Ação Católica Francesa,
através da Juventude Agrícola Católica (JAC), o que, segundo ele, “[...] significa que as Casas
Familiares Rurais nunca foi uma escola isolada da ação e do desenvolvimento
socioeconômico de seu meio” (NOSELLA, 1977, p.22). Sobre essa questão, García-
Marirrodriga (2010, p.34) expressa: “[...] o meio socioprofissional e a associação dos atores
locais, se colocam no coração do processo de formação por alternância. E animando o
conjunto, a equipe de monitores”.
Outro elemento destacado por Nosella (1977, p.22) sobre as Casas Familiares Rurais,
nesse primeiro período, “[...] é a ação e reflexão dos jovens alunos realizadas no meio social
deles, participando nas organizações e reuniões sócio-religiosas de suas comunidades,
procurando melhorar a situação de seu meio”. O jovem, nesse contexto, passa da condição de
ser pessoa em formação a autor de sua própria formação.
Por conta da expansão das experiências em alternância, para se ter uma ideia, em 1944
já existiam 50 escolas na França, sendo necessário criar uma União Nacional e um Centro
Pedagógico. Assim, constituiu-se o primeiro Conselho de Administração Nacional, tendo
como presidente Jean Peyrat, e com a sede em Lauzun. Quanto à formação dos formadores,
criou-se a Escola de Quadros em 1942, pois, com o processo de expansão, acabou exigindo
uma melhor consistência pedagógica por parte dos monitores, como também uma
compreensão da proposta em alternância, como afirma Queiroz (2004, p. 71):
sacerdote, pois, na avaliação dos agricultores, o bom sacerdote não era um bom
administrador, e, do outro, pela presença do Ministério da Agricultura. Disse Gustave Thibon,
Presidente da União Nacional na terceira Assembléia Geral:
Como se vê, motivado pelo ideal cristão e, compreendendo o papel das Casas
Familiares Rurais na vida e na formação dos jovens do meio rural na perspectiva do
desenvolvimento da agricultura, do meio rural e o papel dos pais nesta empreitada, Nové-
Josserand, toma as primeiras decisões ou iniciativas.
Rural se deu no Continente Africano, no final dos anos 50 e início dos 60, em Tebourda, na
Tunísia. Essas experiências, porém, não tiveram muito sucesso, como foi o caso da Tunísia,
Costa do Marfim, Gabão, Argélia, Camarões, Etiópia e Burkina Faso (QUEIROZ, 2004).
Sobre essa aventura expansionista, narra brilhantemente Florent Nové-Josserand:
das Casas Familiares Rurais, entre eles, a responsabilidade e a condução dos trabalhos da
experiência pelas famílias, através de associações próprias, e a adaptação da pedagogia ao
meio rural, como uma forma de dar ao indivíduo a formação integral e, com isso, ajudar no
desenvolvimento do seu meio.
Atualmente, cada país tem uma associação nacional e associações regionais. Todas se
agrupam na Associação Internacional dos Movimentos Familiares de Formação Rural
(AIMFR), fundada em Dakar (Senegal), por ocasião do I Congresso Internacional das Casas
Familiares Rurais, de 12 a 16 de maio de 1975, a qual elegeu Florent Nové-Josserand como
presidente. Participaram representantes da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da
UNESCO e da FAO, além do governo de Senegal. Então, a AIMFR é um organismo de
caráter educativo e familiar para todos os países do mundo, sem distinção de raça ou
ideologia, e sua sede está localizada em Paris, França. São os seguintes os objetivos da
AIMFR:
A experiência das Escolas Famílias Agrícolas (EFAs) surge no Brasil no ano de 1969,
no meio rural, em três municípios ao mesmo tempo: Olivânia, distrito de Anchieta, Alfredo
Chaves, Rio Novo do Sul, todas no sul do Estado do Espírito Santo, acolhendo inicialmente
apenas rapazes e só mais tarde, em 1970, em Iconha, nesse mesmo Estado, implanta-se uma
EFAs somente para moças.
As EFAs, como foram denominadas as primeiras experiências em terras brasileiras,
são implantadas por iniciativa do jesuíta italiano Pe. Humberto Pietrogrande, nascido na
região de Vêneto, nordeste da Itália que chega ao Brasil em 1962 a convite de um padre
provincial do Brasil quando este visitava a Itália. Vindo de navio da Itália para o Brasil,
desembarca no porto de Salvador, Bahia, e logo segue de ônibus para São Leopoldo, no Rio
Grande do Sul para completar o seminário.
Após ser ordenado em 1964, Pe. Humberto se instala no sul do Espírito Santo onde
permaneceu até 1984 com uma tarefa: assumir a direção de uma escola no município de
Anchieta, nome da cidade em homenagem ao seu fundador, um padre jesuíta, região
colonizada por imigrantes italianos. A convite de um padre provincial para uma visita, Pe.
Humberto se depara com uma realidade extremamente triste da maioria dos descendentes de
92
imigrantes italianos, bastante diferente da situação dos que foram para o Rio Grande do Sul,
como ele expressa em uma entrevista narrativa à Revista Marco Social:
A narrativa do Pe. Humberto nos remete a duas reflexões. A primeira delas diz
respeito às condições de sofrimento e miséria dos seus compatriotas, e a outra, à vergonha
instalada nos jovens do meio rural de se identificarem como sujeitos do campo, como
agricultores ou filhos de agricultores, enquanto uma das formas de produção e de existência
de vida no campo.
Muito embora a região apresentasse um potencial humano elevado, este não era
aproveitado, apesar de estar em condições de desenvolver experiências de promoção
comunitária, por praticar a agricultura familiar e este era, portanto, o grupo social de maior
consistência, as famílias apresentavam as seguintes características: “[...] baixa renda per
capita, agravada pela crise dos cafezais, baixo nível de educação, economia essencialmente
agrícola, etc.” (CEAS, 1971, p.2).
Diante desse quadro, o padre se convenceu de que era preciso fazer algo para o interior
capixaba, na perspectiva do desenvolvimento econômico, religioso, cultural e social. Desejoso
de um futuro promissor para essa região e, de modo particular, para os jovens, por conta do
êxodo rural, começa a buscar alternativas de um ensino condizente com aquela realidade,
como ele narra ao rememorar aquele momento histórico durante a entrevista narrativa.
mantenedora, sem fins lucrativos, sob a presidência do pároco, com ações na área de
educação, saúde e ação comunitária no meio rural capixaba (SILVA, 2003). Essa entidade
acabou sendo responsável diretamente por mudanças significativas na vida das pessoas que
acreditaram, apostaram numa educação diferenciada para os sujeitos do campo, filhos de
agricultores familiares, como diz Pe. Humberto:
[...] aos poucos, o MEPES foi mudando a cara do interior do Espírito Santo,
possibilitando um cenário de mudança da agricultura de subsistência para
uma agricultura empreendedora, que gera renda e traz qualidade de vida.
Essa transformação gerou um impacto positivo na economia do estado e nos
credenciou perante o poder público e a sociedade. (PIETOGRANDE, 2010,
p. 69).
Como visto, a experiência das EFAs aqui implantadas teve como referência as escolas
de alternância da Itália e, no início, as escolas acolhiam somente rapazes. Somente após
alguns anos, em decorrência de várias discussões, implanta-se em Iconha, no mesmo Estado,
uma escola para moças, filhas de pequenos agricultores. As primeiras iniciativas ganharam
visibilidade, e as escolas foram-se ampliando, tanto para o interior capixaba, como para outros
Estados brasileiros, a exemplo do Estado da Bahia, sob o intercâmbio do MEPES.
Por conta do processo de expansão das EFAs, houve a necessidade de criação de um
Centro de Formação e Reflexão (CFR) para os educadores que viessem a atuar com a
Pedagogia da Alternância, como uma forma de garantir a identidade do projeto. Na verdade,
essa escola exige outro educador diferente da maioria dos educadores presentes nas escolas do
meio rural, conforme veremos mais adiante.
Vale ressaltar que o processo de implantação das EFAs, no Brasil, teve início no auge
da ditadura militar, período em que o campo sofreu um processo de total abandono por parte
dos poderes públicos, excluindo a agricultura familiar. As políticas públicas para o campo,
naquela época, estavam centradas na grande produção agropecuária, no modelo de agricultura
patronal voltado para a monocultura e o mercado externo, associado à sofisticação
tecnológica, conhecida como modernização conservadora. Como consequência desse modelo
de desenvolvimento econômico, ocorre a proletarização dos trabalhadores rurais e a liberação
de mão de obra.
Muito embora as EFAs, desde o seu nascedouro na França, tenham uma relação direta
com lideranças ligadas à Igreja Católica, do mesmo modo que ocorreu no Brasil, com um
projeto de educação escolar voltado para as pessoas do meio rural, inicialmente jovens e
95
adultos, seus promotores não foram poupados das perseguições instituídas pelo golpe militar
de 1964, conforme entrevista narrativa do Pe. Humberto.
(Lei 9.394/96), no começo, em dois anos e, depois, em três, com diploma de conclusão do
ensino fundamental e pré-qualificação profissional em agropecuária. O público era o mesmo:
jovens adolescentes acima de 14 anos de idade, filhos de agricultores familiares.
O plano de formação nessa fase tinha como finalidade a pré-qualificação profissional e
a escolarização formal. Por conta do funcionamento irregular e entendendo a educação no
campo do direito, emerge o movimento dos agricultores, pais de alunos, em prol do
reconhecimento da escolarização ofertada pelas EFAs, pois a universalização do ensino era
garantida pela Constituição Federal e pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional em
vigor na época – Lei 5.692/71, que obrigava apenas as quatro séries primárias.
Desse modo, segundo Begnami (2002, p. 109), “[...] as comunidades sem escola
básica do campo e sem uma política definida apropriada à educação rural, colocam esta
demanda para as EFAs como salvadora de uma situação que é caótica em todo o país”. Para
ele, portanto, as EFAs surgem, na maioria das comunidades, como uma alternativa ao
processo de escolarização em virtude da falta de escolas no campo, da inexistência de uma
política pública de educação para a juventude rural para cursar os anos finais do ensino
fundamental e médio. Era uma situação semelhante à ocorrida na França nos idos dos anos 30,
tornando-se um fator de risco para a proposta político-pedagógica de uma educação
diferenciada e, portanto, dessa experiência inovadora de educação do/no campo.
É dessa fase também, de acordo com esse autor, a criação do antigo 2º Grau (Lei
5.692/71), curso profissionalizante, no qual o ensino agrícola recebeu a denominação de
Habilitação Plena de Técnico em Agropecuária, atualmente ensino médio e educação
profissional (Lei nº 9.394/96), para os egressos do ensino fundamental. A primeira escola
nesta modalidade de ensino foi a de Olivânia, no município de Anchieta – ES, em 1976,
vindo, posteriormente, a Escola Técnica da Família Agrícola da Bahia – ETFAB em Riacho
de Santana, na Bahia, em 1984.
Por sua vez, deve-se mencionar nesta segunda fase, no contexto histórico de expansão
das EFAs no Brasil, o aparecimento das primeiras pesquisas no âmbito dos programas de pós-
graduação, cujo objeto de estudo recai sobre a pedagogia da alternância, como as
desenvolvidos por Nosella (1977), Pessotti (1978) e Gianodoli (1980), conforme relata Silva
(2003).
A terceira fase vai do início dos anos 80 ao início dos anos 90, quando ocorre um
processo de expansão dessa experiência, a criação das associações e a alternância de ensino
regular, isto é, passando de escolas de suplência para escolas de 5ª à 8ª série. Isso se deveu,
mais uma vez, às organizações camponesas reivindicando o direito à escola, como afirma
98
Begnami (2004, p. 8), “[...] querem uma escola diferente com uma identidade própria de
escola do campo”.
Data desse período a criação do Centro de Formação e Reflexão (CFR) com sede em
Anchieta – ES, mantido pelo Movimento Educacional e Promocional do Espírito Santo
(MEPES), com o objetivo de difundir os princípios e a filosofia das EFAs, como também
subsidiar as novas experiências com atividades de capacitação dos monitores, assessoria
pedagógica, intercâmbio de material didático, entre outras (SILVA, 2003).
Nosella (1977) destaca, em seu estudo, os objetivos do Plano Pedagógico desse
Centro, a saber: objetivo de conscientização, que constitui um pressuposto essencial e
coerente com os objetivos de análise e de mudança social que as escolas pretendem; objetivo
de fundamentação teórica ancora-se nas áreas da Sociologia e Psicologia e, por sua vez,
fundamenta a profissão docente; e objetivo de capacitação técnica, que trata da Didática Geral
e Especial e da metodologia da Escola Família Agrícola, possibilitando efetivamente o saber-
fazer de um monitor numa EFA.
Por conta da expansão das EFAs em todo o país, demandando acompanhamento, bem
como da falta de recursos financeiros para gerir essas escolas, funda-se, em 12 de março de
1982, em São Mateus, no Espírito Santo, a União Nacional das Escolas Famílias Agrícolas do
Brasil (UNEFAB), organização de articulação em nível nacional, onde permaneceu até 2002
quando segue para Brasília, permanecendo até 2010, e daí se transferindo para a cidade de
Orizona, no Estado de Goiás. Thierry de Burghgrave (2011)26, em seu brilhante livro com o
título Vagabundos, Não Senhor – Cidadãos brasileiros e planetários! Uma experiência
educativa pioneira do campo, faz referência ao processo da fundação da UNEFAB, que teve
início em 1981, inclusive tendo feito parte, na condição de secretário, da Comissão Nacional
Provisória, cujo objetivo era escrever o Estatuto baseado no da União Internacional, como
também para organizar a Assembleia Constitutiva. Além dele, participaram da Comissão
Nacional Provisória os seguintes membros: Mário Zuliani, João Batista Martins, Vicente
26
Thierry de Burghgrave, belga, chega ao sertão baiano no final dos anos 60 para trabalhar com jovens rurais em
projetos ligados à Igreja Católica. Aqui, estabeleceu laços profundos, como família e outras formas de relações
em terreno brasileiro, de modo especial com a organização sindical dos trabalhadores rurais. Foi um dos
principais promotores no processo de implantação da primeira Escola Família Agrícola da Bahia em Brotas de
Macaúbas. Tem sido responsável pela tradução de obras/publicações em francês para a língua portuguesa, entre
as quais as citados neste trabalho. É autor de um número considerável de artigos sobre o referido tema. Por
último, é autor do livro Vagabundos, não Senhor – cidadãos brasileiros e planetários! Uma experiência
educativa pioneira do Campo, que faz parte da Coleção Agir e Pensar das EFAs do Brasil, pela UNEFAB –
2011. Coordenador Editorial da Revista Formação por Alternância, Membro da Equipe Nacional Pedagógica,
entre outros trabalhos de base e ação comunitária.
99
Cosme, Francisco Giusti, Pe. Aldo Luchetta, Felipe Éluard, Hildo Azevedo, Pierre Gilly e
Manoel Pedro Dias Paes (BURGHGRAVE, 2011 p.181).
Com a criação da UNEFAB, a capacitação pedagógica dos monitores e assessores
pedagógicos, que sempre esteve sob a responsabilidade do MEPES, agora por conta de toda
uma reorganização do movimento em nível nacional, passou pouco a pouco para a UNEFAB,
que conta atualmente com uma Equipe Pedagógica Nacional composta, em sua maioria, por
representantes das Associações Regionais (BEGNAMI, 2003; SILVA, 2003).
É desse segundo período, a instituição do plano de formação para o ensino
fundamental, o qual tem como finalidade a escolarização e a orientação profissional; já o
plano de formação para o ensino médio está voltado para a formação geral e a educação
profissional. Embora as EFAs tenham instituído a formação profissional, tanto no nível
fundamental como no médio, essas escolas dão ênfase à questão da cidadania, da politização e
formação de líderes, sobrepondo-se aos aspectos da profissionalização (BEGNAMI, 2004).
Para Begnami (2004), o plano de formação ainda hoje sofre problemas de ordem legal,
pois os órgãos oficiais que regulamentam a educação básica no Brasil tentam sufocar alguns
instrumentos metodológicos específicos da Pedagogia da Alternância, a exemplo do Plano de
Formação. O problema é antigo e, por isso, Nosella (1977) questiona: As EFAs adotam um
currículo oficial ou plano de estudo? A LDB em vigência – Lei 9.394/96, em seu artigo 23,
trata da questão da alternância e é exatamente nas brechas dessa lei que o plano de formação
das EFAs é “[...] construído a partir de planos de estudo, ou seja, com temas geradores,
ligados ao contexto, constitui a base do currículo da EFA” (BEGNAMI, 2004, p. 9).
Daí que as EFAs não adotam o livro didático – instrumento de ensino ou na maioria
das vezes usado como “manual didático” (D’ÁVILA, 2001) –, frequentemente utilizado nas
escolas oficiais que fazem parte dos sistemas de ensino, seja municipal ou estadual, inclusive
nas do meio rural no processo educativo. Na verdade, as EFAs consideram os livros didáticos
inadequados ao campo e ao sistema alternante, ou seja, são essencialmente urbanos. Os
conteúdos estudados nos CEFFAs têm como referência o Plano de Formação, que, nas escolas
oficiais, corresponde às chamadas Diretrizes Curriculares Nacionais.
Para tanto, o processo de ensinar e de aprender nos CEFFAs tem como ponto de
partida os temas geradores elaborados em conjunto entre monitores e alternantes nos Plano de
Estudo. Os temas geradores do método dialético da pedagogia de Paulo Freire constituem a
base dos currículos dos CEFFAs e são sempre voltados para o contexto local, as vivências, os
saberes e a cultura dos jovens alternantes em formação.
100
Um aspecto dessa nova fase, destacado por Begnami (2004), é o fato de crianças
estarem frequentando os CEFFAs e, para ele, este é um fenômeno tipicamente brasileiro – por
conta do vazio de escolas públicas para este segmento no/do campo –, ocorrendo desse modo
mais escolarização do que profissionalização. Consequentemente, há pouca interferência na
realidade socioprofissional e vice-versa, diferentemente de outros países como também do
momento de implantação, quando apenas eram recebidos jovens acima de 16 anos de idade.
Outra característica dessa fase abordada pelo autor diz respeito à criação de uma associação
mantenedora, responsável pela gestão político-pedagógica antes mesmo da criação da escola.
A quarta fase tratada pelo autor de forma cronológica se inicia nos anos 90, vindo até
os dias de hoje, sendo caracterizada pelo fortalecimento da UNEFAB, das regionais e da
adequação da formação do jovem ao mundo rural, por conta das mudanças da sociedade
globalizada e das novas tecnologias. Há de se registrar nesta fase a presença da ONG
Solidariedade Internacional dos Movimentos de Formação Rural (SIMFR), com ajuda
financeira inicialmente para algumas regionais e, a partir de 1997, após convênio com a
UNEFAB, estendendo ao conjunto das EFAs de todo o Brasil.
Em virtude das mudanças do mundo globalizado e das novas tecnologias praticadas na
agricultura patronal e, como consequência, do aumento das desigualdades sociais no campo,
agravado pela falta de educação, de políticas agrárias e agrícolas voltadas para a agricultura
familiar, as EFAs vêm discutindo e sugerindo respostas para o desenvolvimento e o
fortalecimento da agricultura familiar. Tais respostas podem surgir através da formação dos
agricultores e dos jovens alternantes, por ser esta uma fonte de renda e de geração de
emprego, evitando assim o êxodo rural, a miséria e a pauperização dos sujeitos que vivem no
campo. Desse modo, segundo Begnami (2004, p. 11): “A urgência do empreendedorismo e a
busca da diversificação das atividades no meio rural vão sugerir e orientar os novos planos de
formação dos jovens nas EFAs, na busca de soluções e futuro condigno no meio rural”. Nesse
contexto, a UNEFAB vem desenvolvendo ações e atividades que configuram esta nova fase
de desenvolvimento das EFAs no Brasil, com vistas a responder à demanda dos jovens, de sua
família e da comunidade na chamada sociedade do conhecimento.
Finalmente, Begnami (2004) aponta em seu texto os desafios ao desenvolvimento da
Pedagogia da Alternância no Brasil. Por considerarmos de extrema relevância tais desafios
por conta de as EFAs terem assumido a demanda da educação básica no campo no Brasil há
mais de quarenta anos, em virtude do vazio deixado pelas políticas públicas de educação para
este segmento da sociedade, analisar-se-á cada uma delas.
101
O primeiro desafio apontado por ele diz respeito à questão financeira para manutenção
das escolas por parte dos poderes públicos de forma mais efetiva, sem, contudo, perder a
autonomia administrativa e pedagógica das escolas e do próprio movimento. Verifica-se que
esta questão tem-se verificado desde a criação, a implantação das primeiras escolas no norte
do Espírito Santo, como visto na entrevista narrativa de Pe. Humberto, tratada anteriormente,
e perdura até os dias atuais, sempre contando com recursos externos, de ONGs e de pessoas
solidárias a este movimento educativo, muitas vezes também de fora do Brasil, a exemplo da
EFA de Angical, objeto de pesquisa de mestrado desta autora27.
O segundo desafio apontado por Begnami (2004) diz respeito ao reconhecimento da
pedagogia da alternância pelos poderes públicos, pois esta sempre funcionou nas “brechas da
lei”, como ele expressa. Contudo, por conta do processo de expansão e consolidação das
diferentes experiências que adotam a Pedagogia da Alternância, o governo federal,
reconhecendo o valor histórico, social, político e educacional desta alternativa de educação
do/no campo, resolveu recentemente, por meio do Parecer da Câmara de Educação Básica nº
01/2006, do Conselho Nacional de Educação, aprovado em 1º/02/2006, recomendar a Adoção
da Pedagogia da Alternância em Escolas do Campo. O referido documento foi homologado
por despacho do ministro da Educação da época, Prof. Fernando Haddad, e publicado no
Diário Oficial da União em 15/03/2006. A exposição de motivos para tal reconhecimento foi
fundamentada na tese de Doutorado do Prof. João Batista Pereira de Queiroz, apresentada na
Universidade de Brasília em 2004, citada no Relatório.
Assim, em entrevista exclusiva à Revista Marco Social do Instituto Souza Cruz, o ex-
ministro da Educação, quando perguntado se existe alguma parceria no MEC com entidades
da sociedade civil que seja digna de menção, diz:
27
A Escola Família Agrícola José Nunes da Matta, conhecida popularmente como EFA de Angical, é mantida
desde a sua criação até os dias atuais com recursos proveniente dos “amigos de Pe. Geraldo” que moram na
Áustria. Inclusive, um dos entrevistados na época da realização da pesquisa (2003-2005), quando inquirido sobre
o que ele gostaria de expressar que não lhe foi perguntado, ele disse: “Nós temos aqui um agravante, é que boa
parte do dinheiro para manter a nossa Escola Família Agrícola são de entidades de pessoas da Áustria, e aí a
gente pode questionar: bom, se a Escola de Angical, a sua clientela é basicamente de Angical e de alguns
municípios vizinhos da região oeste, porque estamos sempre dependendo da ajuda de pessoas e entidades do
exterior, e se algum dia esta fonte chegar a secar? Então nós temos que ter essa visão de que a administração
pública tem que ter esse comprometimento com as Escolas Famílias Agrícola e as Escolas têm que ver maneiras
de se autosustentarem, tornarem suas propriedades autosustentáveis com produção excelente, não só para
manutenção, mas para a venda” (JOÃO FRANCISCO, funcionário público, liderança comunitária).
102
Tem muita gente que faz um trabalho muito bom no campo. Tem um grupo
da Bahia que trabalha no Semiárido que é muito bom. As Escolas Famílias
Agrícolas desenvolveram uma tecnologia de educação por alternância de
muita qualidade. [...] Tem também nosso modelo de formação do professor
do campo, o ProJovem. Ele é todo inspirado na Pedagogia da Alternância,
cuja origem são as Casas Familiares Rurais. O que a gente tem procurado
fazer é aprender com o que deu certo no campo, seja de que origem for.
(HADDAD, 2010, p. 35).
Como se vê, os desafios são muitos. Contudo, as EFAs não param de crescer, pois a
cada ano novas escolas são implantadas e outras estão em fase de implantação. Segundo
pesquisa desenvolvida por Begnami (2011), existem 148 Escolas Famílias Agrícolas
espalhadas em todas as Regiões e Estados brasileiros, e são filiadas a uma regional, num total
de 12 e associadas à UNEFAB (BEGNAMI, 2011). São as seguintes associações regionais, o
ano de criação por Estado como também destaca o número de EFAs, de acordo com os
quadros a seguir.
AECOFABA – Associação das Escolas Comunidades das Famílias
Agrícolas da Bahia;
AEFACOT – Associação das Escolas Famílias Agrícolas do Centro-Oeste e
Tocantins;
AEFARO – Associação das Escolas Famílias Agrícolas de Rondônia;
103
Quadro 2 – Organizações regionais das EFAs e respectivo ano de criação por Estado
ESTADO ES BA PI RO MG MA BA/SE CO AP RJ RS
CRIAÇÃO 1968 1974 1974 1983 1984 1989 1989 1989 1994 1994 ??
AECOFABA
RACEFAES
AEFACOT*
UAEFAMA
REFAISA
AEFARO
RAEFAP
FUNACI
IBLEGA
AMEFA
AGEFA
MEPES
REGIONAL
EFAs
Rede Nacional
UNEFAB – União Nacional das Escolas Família Agrícola do Brasil
Associações Regionais vinculadas à UNEFAB
AECOFABA
RACEFAES
UAEFAMA
AEFACOT
REFAISA
AEFARO
RAEFAP
MEPES /
IBLEGA
AEFAPI
AMEFA
AGEFA
ES MG RJ BA SE PI MA CE GO MS MT TO RO AP PA AC RS
30 18 04 32 01 17 20 01 04 03 01 03 05 05 02 01 01
52 71 08 16 01
Total: 148
Fonte: Begnami (2011).
Os dados em torno das EFAs no Brasil nos instigam a refletir sobre alguns aspectos,
como chama atenção Queiroz (2004), em seu estudo, que marcaram e continuam marcando
esta experiência bem-sucedida de educação do campo no Brasil, inspirando, inclusive,
programas e projetos da SECADI/MEC por meio do regime de alternância, ou seja, no
formato Tempo-Escola e Tempo-Comunidade, a exemplo do ProJovem Campo – Saberes da
Terra e dos Cursos de Licenciatura em Educação do Campo.
A primeira reflexão é que o processo de implantação de muitas das EFAs teve e
continua tendo uma “[...] estreita ligação com a Igreja Católica [sendo] algumas ligadas à
Igreja de Confissão Luterana, seja diretamente através da forte presença de religiosos, seja
através de movimentos e organizações eclesiais” (2004, p. 35). A segunda reflexão é que as
experiências brasileiras são de inspiração italiana e já nascem como escolas, enquanto, na
França, surgiram como Casas Famílias Rurais. Isto significa que, no Brasil, há uma
preocupação com a escolarização, enquanto na França esteve sempre voltada para a
organização dos trabalhadores do e no campo. A terceira é que as nossas escolas sempre
contam com apoio financeiro de entidades européias, e, quando isso não é mais possível,
resulta no fechamento de algumas escolas ou no funcionamento por conta do compromisso
dos monitores, muitos deles trabalhando em regime de voluntariado, o que caracteriza uma
vergonha para o sistema escolar baiano e brasileiro.
As reflexões acima se aproximam das ideias de Burghgrave (2011, p. 106), ao analisar
o movimento que resultou no fechamento da Escola Comunidade de Brotas, Bahia, pois cabe
perfeitamente a outras escolas que tiveram o mesmo destino. Diz ele: “A Pedagogia da
Alternância praticada pelos CEFFAs só assume sua verdadeira dimensão na medida em que o
aspecto associativo seja verdadeiramente incorporado e assumido pelas famílias e, em
algumas regiões mais do que em outras, pela comunidade”; sem desconsiderar, é óbvio, o
apoio dos entes federados em todos os níveis, no tocante à questão financeira.
Como se vê, os desafios e as reflexões em torno dessa alternativa de educação do/no
campo são enormes, mesmo assim foram-se expandindo por todo o país e, atualmente,
105
1ª) Escolas Famílias Agrícolas (EFAs) – contam com 148 centros, presentes em 16
estados brasileiros, atuando com os anos finais do Ensino Fundamental, Ensino Médio
e Educação Profissional Técnica de nível médio.
2ª) Casas Familiares Rurais (CFRs) – com 120 centros, presentes em seis estados,
desenvolvendo os anos finais do Ensino Fundamental, Ensino Médio e Educação
Profissional Técnica de nível médio.
3ª) Escolas Comunitárias Rurais (ECORs) – com três centros no Espírito Santo
desenvolvendo os anos finais do Ensino Fundamental.
4ª) Escolas Populares de Assentamentos (EPAs) – com oito centros desenvolvendo os
anos finais do Ensino Fundamental.
5ª) Programa de Formação de Jovens Empresários Rurais (PROJOVEM) – com sete
centros no Estado de São Paulo, atuando somente com cursos de qualificação
profissional.
6ª) Escolas Técnicas Estaduais (ETEs) – com três centros no Estado de São Paulo.
7ª) Casas das Famílias Rurais (CdFRs) – com três centros localizados nos Estados da
Bahia, Pernambuco e Piauí, atuando com anos finais do Ensino Fundamental.
8ª) Centro de Desenvolvimento do Jovem Rural (CDEJOR) – com quatro centros em
Estados do Sul do Brasil, desenvolvendo somente cursos de qualificação profissional
(QUEIROZ, 2004; BRASIL, 2007).
da UFES com três trabalhos; a UFV aparece com dois trabalhos; já a PUC-MG, UNIRIO,
UFRRJ, UNICAMP e UFVJM, cada uma delas apresenta um trabalho. Na sequência, aparece
a Região Sul, com destaque para a UFSC com três teses e duas dissertações, seguidas da
UFPR e UFRGS, cada uma com dois trabalhos, sendo uma tese e três dissertações. Aparecem
ainda no conjunto das IES do Sul do País: UNISINOS, UNIJUÍ, UEM e UNIFAE, todas com
um trabalho cada. Na Região Norte, registram-se sete trabalhos, em apenas duas instituições
de ensino superior – cinco na UFPA e na UFRO – e todos são dissertações de mestrado. Na
Região Nordeste, são quatro trabalhos, sendo uma tese e uma dissertação na UFBA, uma tese
na UFCE e uma dissertação na UNEB. A Região Centro-Oeste apresenta quatro trabalhos,
todos, e, do mesmo modo que a Região Norte, são dissertações de mestrado, distribuídas em
cada uma das instituições, a saber: UCB, UFG, UFGD e UFT.
Os dados apontam a Região Sudeste como a que ainda concentra o maior quantitativo
de trabalhos em números absolutos, da mesma forma que registra o estudo de Teixeira,
Bernartt e Trindade (2008). É possível que esse fenômeno se justifique por dois motivos: por
um lado, é nessa região que se concentra o maior número de programas de pós-graduação; por
outro, o fato de os Estados de Minas Gerais e Espírito Santo possuírem um número
considerável, ou seja, 48 Escolas Famílias Agrícolas, com suas respectivas associações
filiadas à UNEFAB e que adotam a Pedagogia da Alternância, de acordo com o levantamento
feito por Begnami (2011).
Quanto à Região Sul, foi constatado um aumento de trabalhos nesses cinco anos, num
total de treze (13), espalhados em várias IES, com destaque para a UFSC, que registra grupos
de estudos e pesquisas implicados com a problemática da educação do campo. Isso
provavelmente justifica a ampliação dos estudos sobre os CEFFAs nessa região de um modo
geral e, em especial, na instituição de ensino superior referida 25.
Na Região Norte, mantém-se uma produção baixa de trabalhos sobre os CEFFAs se
for considerado o número de escolas presentes nesta região, ou seja, são 45 escolas, sendo 29
Casas Familiares Rurais vinculadas à ARCAFAR-Norte do Brasil e 16 Escolas Famílias
Agrícolas vinculadas à UNEFAB. Por sua vez, registram-se dois trabalhos que tomaram como
campo empírico a Região Norte, embora tenham sido defendidos em IES do Sudeste, como os
casos da tese de Meguins (2010) e da dissertação de Portilho (2008).
25
Ver, por exemplo, os grupos de estudos e pesquisas dos Professores Antônio Munarim e Célia Regina
Vendramini. Em 2010, os pesquisadores organizaram o I Seminário de Pesquisa em Educação do Campo. Criou-
se ainda, no âmbito da UFSC, o Instituto de Educação do Campo, vinculado ao Departamento de Educação.
108
2.5.1Contexto Histórico
Com o nascimento dessa primeira EFA no sertão baiano, na região do Médio São
Francisco, outras são implantadas como as de Cruz das Almas-Sapeaçu, Maragogipe, Itanhém
e, logo depois, veio a de Ibotirama, sob a influência e tutela direta da Igreja Católica, por meio
do trabalho de base comunitário junto aos agricultores familiares.
Nesse contexto, Pe. Aldo Luchetta, que já se encontrava no município de Caetité,
Bahia, e nomeado pelo Bispo Dom Eliseu Gomes de Oliveira como vigário da Paróquia
Nossa Senhora da Glória no município de Riacho de Santana, dando início, por conta do seu
trabalho de Evangelização e Promoção Humana, ao movimento de expansão das EFAs nesse
Estado, motivado e orientado por ele. “A forte personalidade do Pe. Aldo Luchetta, de Riacho
de Santana, imprimiria à expansão das EFAs um ritmo acelerado em curtíssimo espaço de
tempo” (DE BURGHGRAVE, 2011, p.179).
É importante ressaltar nesta descrição histórica, de forma breve, a trajetória cristã e
política empreendida por Pe. Aldo Luchetta, figura inconteste no processo de ampliação das
EFAs na Bahia. Vindo da Itália, o “Herói do Sertão”, “O Gigante do Sertão”, “Cidadão do
Infinito” – como as pessoas de Riacho de Santana e das cidades circunvizinhas se referem a
ele, além de servir de títulos de trabalhos de conclusão dos cursos de licenciaturas, objeto de
estudo desta tese – chega ao Brasil no final da década de 60 do século XX, mas precisamente
no município de São Mateus, norte do Espírito Santo onde conhece a experiência do MEPES
com as Escolas Famílias Agrícolas e a Pedagogia da Alternância. Ali, o pároco implanta duas
EFAs: uma no distrito de Jaguaré e outra escola no distrito de Nestor Gomes, pertencentes ao
município de São Mateus.
Estando o Brasil nesse período sob a égide da ditadura militar e por ser ele uma figura
extremamente revolucionária, destemida e estar desenvolvendo um trabalho de base
denunciando as injustiças sociais e organizando o povo a não ter medo da repressão, teve
início um movimento de perseguição a ele, o que resultou no seu retorno para a Itália como
uma forma de precaução da sua própria vida. Em 1973, retorna ao Brasil agora no Estado da
Bahia e aqui dá prosseguimento ao seu trabalho com as EFAs, por ser um simpatizante e
entusiasta desta prática pioneira de educação voltada para os jovens camponeses, por serem
estes os mais vulneráveis ao êxodo rural ou, quando muito, de permanecerem na terra, mas
sem conhecimento suficiente para lidar com a terra (NOGUEIRA, et al., 2003; FAGUNDES,
et al., 2004; PEREIRA et al., 2004; CAVALCANTE, 2007).
Então, sob a liderança e hegemonia desse incansável padre, desse “trator” (PEREIRA,
2004, p. 3) como também era conhecido, por ter aberto caminhos para outras ações em Riacho
112
de Santana28, entre estas, a implantação de novas escolas em tempo tão rápido, incluindo a de
Riacho de Santana, na década de 80, por exemplo, já existiam doze Escolas Famílias
Agrícolas, funcionando com ensino fundamental de 5ª à 8ª série.
Para darem prosseguimento aos estudos, ou seja, para cursarem o ensino médio,
muitos jovens baianos, por intermédio dele, foram estudar, nessa época, na única Escola de
Ensino Médio de Formação Técnico-Agrícola em Alternância existente no Brasil, em
Olivânia, Distrito de Anchieta no Estado do Espírito Santo, cujo objetivo foi de formar
quadros para serem monitores das EFAs na Bahia. Além disso, jovens capixabas, formados
em Olivânia, vieram para a Bahia para serem monitores.
Segundo Nogueira (2005), o intercâmbio foi ótimo, porém houve problemas,
principalmente com adaptação. Surge desse modo, a necessidade de criar uma EFA de Ensino
Médio na Bahia, que preparasse não só Técnicos Agrícolas, mas também Monitores. Assim,
em 25 de março de 1984, inaugura a Escola Técnica da Família Agrícola da Bahia (ETFAB),
Curso Educação Profissional de Nível Técnico em Agropecuária, no município de Riacho de
Santana, “[...] única neste Estado, servindo para que os jovens oriundos das Escolas Famílias
Agrícolas de Ensino Fundamental pudessem continuar seus estudos dentro da mesma
Filosofia: preparar técnicos agrícolas que pudessem trabalhar na família e comunidade com
maior aptidão” (NOGUEIRA, et al., 2003, p.31).
28
Funda Sindicatos dos Trabalhadores Rurais nos municípios atendidos por ele; a Associação Beneficente
Promocional Agrícola de Riacho de Santana (ABEPARS), em 1º de outubro de 1977; Clube de Mães; Rádio
Nossa Senhora de Guadalupe em Riacho de Santana; entre tantas outras ações.
113
no Estado de Sergipe, ligada à REFAISA, único caso existente no Brasil, conforme quadro
abaixo.
ANO DE
Nº ASSOCIAÇÃO MUNICÍPIO SIGLA
FUNDAÇÃO
Ass. das Esc. das Comunidades Riacho de AECOFAB
1. 1979
e Famílias Agrícolas da Bahia Santana A
Ass. da Escola Família Agrícola
2. Anagé 2002 AEFAAN
de Anagé
Ass. da Escola Família Agrícola
3. Andarai 2001 ADRA
de Andaraí
Ass. da Escola Família Agrícola
4. Angical 1995 AEFAA
de Angical
Ass. da Escola Família Agrícola
5. B. Vista Tupim 1995 AEFAT
Tupinense
Ass. da Escola Família Agrícola
6. Boquira 1982 AEFAB
de Boquira
7. Fundação Sagrada Família Botuporã 1982 F.S.F.
Ass. Promocional Agrícola de
8. Caculé 1985 APAC
Caculé –
Ass. Servidora dos Pequenos
9. Ilhéus 1997 A.S.P.P.
Produtores
Ass. da Escola Família Agrícola
10. Itaetê 2002 AEFAI
de Itaetê
Ass. Beneficente Comunitária e
Licínio de ABECOPA
11. Promocional Agrícola 1989
Almeida L
Liciniense
Ass. da Escola Família
12. Macaúbas 1982 AEFAM
Agropecuária de Macaúbas
Ass. da Escola Família Agrícola
13. Paramirim 1985 AFAPA
de Paramirim
Ass. dos Pequenos Produtores
14. Quixabeira 1994 A.P.P.J.
de Jaboticaba
Ass. Beneficente Promocional
15. Riacho I 1980 ABEPARS
Agrícola de Riacho de Santana
Ass. dos Trabalhadores de Ruy
16. Rui Barbosa 1980 ATARB
Barbosa
Ass. das Comunidades da
17. Escola Família Agrícola de Santana 1993 ACEFASA
Santana
Associação Educacional
18. Agrícola do Território da Seabra 2008 AEATC
Chapada
Ass. da Escola Família Agrícola Tabocas do Brejo
19. 2007 AEFATB
de Tabocas e Brejolândia Velho
115
ANO DE
Nº ASSOCIAÇÃO MUNICÍPIO SIGLA
FUNDAÇÃO
Associação Mantenedora da
1. Escola Família Agrícola de Pintadas 1996 EFAP
Pintadas
Associação Escola Comunitária
Ribeira do AECFACID
2. Família Agrícola da Região de 1994
Pombal A
Cícero Dantas
Associação Com. Da Escola
3. Família Agrícola Rural de Correntina 1994 EFACOR
Correntina e Arredores
Associação Regional da Escola
Antônio
4. Família Agrícola de Antonio 2004 AREFAG
Gonçalves
Gonçalves
Associação Comunitária da
5. Escola Família Agrícola de Sobradinho 1999 AMEFAS
Sobradinho
Associação de Pais e Amigos da
6. Escola Família Agrícola Avani Valente 1996 APAEB
de Lima Cunha
Associação Regional da Escola
7. Monte Santo 1997 EFASE
Família Agrícola do Sertão
Associação Regional da Escola
8. Itiúba 2009 AREFAI
família Agrícola de Itiúba
Associação da Escola Família
9. Agrícola dos Municípios Irará 2008 AEFAMI
Integrados da Região de Irará
Associação Mantenedora da
10. Escola Família Agrícola de Japoatã 1995 AMEFAL
Ladeirinhas
Associação da Escola da
11. Família da Região de Alagoinhas 1983 EFARA
Alagoinhas
Associação Mantenedora da
12. Escola Família Agrícola do Rio Real 2007 EFALN
Litoral Norte
Fonte: REFAISA (2012).
116
ENSINO ENSINO
Nº ESCOLA MUNICÍPIO
FUNDAMENTAL MÉDIO
Escola Família Agrícola de Riacho de
1. X X
Riacho de Santana Santana
Escola Família Agrícola de
2. Anagé X
Anagé
Escola Família Agrícola de
3. Andarai X X
Andaraí
Escola Família Agrícola José
4. Angical X
Nunes da Mata
Escola Família Agrícola B. Vista do
5. X
Tupinense Tupim
Escola Família Agrícola de
6. Boquira X X
Boquira
Escola Família Agrícola de
7. Botuporã X
Botuporã
Escola Família Agrícola de
8. Caculé X
Caculé
Escola Agrícola Comunitária
9. Ilhéus X
Margarida Alves
Escola Família Agrícola de
10. Itaetê X
Itaetê
Escola Família Agrícola de Licínio de
11. X
Licínio de Almeida Almeida
Escola Família Agrícola de
12. Macaúbas X X
Macaúbas
Escola Família Agrícola de
13. Paramirim X
Paramirim
Escola Família Agrícola de
14. Quixabeira X X
Jaboticaba-Quixabeira
Escola Técnica da Família Riacho de
15. X
Agrícola da Bahia Santana I
Escola Família Agrícola Mãe
16. Rui Barbosa X
Jovina
Escola Família Agrícola Padre
17. Santana X
Arthur Birk
Escola Família Agrícola do
18. Seabra X X
Território da Chapada
117
Tabocas do
Escola Família Agrícola Padre
19. Brejo Velho/ X
Luis Lintiner
Brejolândia
Escola Família Agrícola de
20. Tanque Novo X
Tanque Novo
Escola Família Agrícola
21. Itanhém X X
Itanhém
Fonte: AECOFABA (2012).
formação inicial ofertada pela Assessoria Pedagógica da Regional e 19 não fizeram nenhuma
das duas formações de acordo informações prestadas pelo Secretário Executivo da
AECOFABA por solicitação da pesquisadora e encaminhado para a mesma via mensagem
eletrônica (2010).
Vale ressaltar o esforço conjunto das redes AECOFABA e REFAISA no tocante a
duas conquistas importantes para o movimento EFAs na Bahia. A primeira delas diz respeito
aos cursos de licenciatura plena em Letras, História, Geografia, Biologia e Matemática para
os monitores, por meio de convênio com a UNEB (2002-2004), objeto de estudo desta
pesquisa de doutoramento. A segunda foi a aprovação da Lei Estadual nº 11.352, de 23 de
dezembro de 2008, que prevê o financiamento público das Escolas Famílias Agrícolas no
Estado e reconhece a gestão associativa e comunitária das associações mantenedoras das
EFAs, respeitando sua autonomia político-pedagógica (DE BURGHGRAVE, 2011). Além
dessas duas conquistas a nível regional, destaca um ganho extraordinário para os CEFFAs:
pela Medida Provisória nº 562, de 20 de Março de 2012, altera a Lei nº 11.494, de 20 de
junho de 2007, para contemplar com recursos do FUNDEB as instituições comunitárias que
atuam na educação do campo, ou seja, ao conjunto das experiências que adotam a Pedagogia
da Alternância.
Na sede da AECOFABA, em Riacho de Santana, existe um Centro de Formação onde
se realizam atividades de formação inicial e continuada para os monitores, coordenadores das
EFAs e também para dirigentes das associações. Neste centro, foram realizadas as aulas do 1º
Ano Básico dos cursos de todas as Licenciaturas Plenas, descritos acima, e as do 2º e 3º anos
dos cursos de Letras, História e Geografia; os outros dois, ou seja, Matemática e Biologia
foram desenvolvidos no Campus II/Alagoinhas da UNEB.
Dada a complexidade do método da Pedagogia da Alternância desenvolvida no âmbito
dos sistemas educativos dos CEFFAs, o próximo capítulo tem como escopo apresentar seus
fundamentos teórico-metodológicos, com base nos autores que se vêm debruçando a
compreender e sistematizar tais abordagens.
119
Dentre os estudiosos do sistema educativo CEFFAs, está o francês Pedro Puig Calvó,
que tem feito um esforço muito grande para definir o que se denomina de movimento
CEFFAs. Para ele (2010, p. 59), um CEFFA “[...] é uma associação de famílias, pessoas e
instituições que buscam solucionar uma problemática comum de desenvolvimento local
através de atividades de formação em alternância, principalmente de jovens, mas sem excluir
os adultos”. Esse conceito fez com que a UNEFAB esboçasse a seguinte definição de um
CEFAA: “[...] é uma Associação de famílias, pessoas e instituições que se unem para
promover o Desenvolvimento Sustentável e Solidário do Campo através da formação dos
adolescentes, jovens e suas famílias” (UNEFAB, 2003, p. 16).
Tais conceitos nos fazem compreender que os CEFFAs, enquanto um movimento
educativo, organizado em âmbito internacional e nacional, estão voltados para a promoção do
desenvolvimento intelectual, humano, social, cultural, profissional, ético, ecológico e
econômico dos sujeitos do campo, particularmente dos jovens, no aspecto individual e
coletivo. Neste sentido, os CEFFAs buscam facilitar os meios e os instrumentos da formação
integral adequados ao crescimento dos educandos, pois são estes os principais protagonistas
da promoção e do desenvolvimento do meio e de todo o processo de formação alternada.
Tendo como referência tais definições, Calvó (1999) apresenta as características que
identificaram inicialmente as Casas Familiares Rurais ou Maisons Familiales Rurales (MFRs)
e constituem os quatros pilares nos quais se baseiam os novos CEFFAs que se desenvolveram
pelo mundo todo. São eles: 1º) uma metodologia que está pautada no princípio da
Alternância integrativa, entre o meio socioprofissional (família/comunidade) e a escola; 2º)
uma Associação Local responsável nos diversos aspectos: econômicos, jurídicos, de gestão,
etc.; 3º) a formação integral e personalizada, contribuindo para que o jovem construa a sua
personalidade e o seu futuro junto com a família e no meio em que vive; e, finalmente, 4º) o
desenvolvimento do meio local através da formação de seus próprios atores.
120
Esses pilares são considerados como condição sine qua non nos CEFFAs como afirma
Novè-Josserand: “[...] não há escola de alternância sem a responsabilidade efetiva dos pais”
(1998, 41-42), ou seja, não existe um CEFFA que não esteja voltado para o envolvimento das
famílias por meio das associações, da problemática do desenvolvimento local solidário e do
fortalecimento da agricultura familiar. Assim, o que dá unidade, especificidade, ao
movimento, é a aplicação conjunta desses quatro pilares (CALVÓ, 1999). Por isso é que os
CEFFAs propõem-se a formar um indivíduo novo, sujeito de sua história, comprometido com
o meio rural e com o futuro da região onde está situada.
A UNEFAB adota esses pilares e divide-os, sendo: dois estão no plano das finalidades
e dois são os meios pelos quais esse movimento educativo se desenvolve. Daí que as
finalidades de um CEFFA são a Formação Integral Personalizada e o Desenvolvimento
Sustentável Local e Solidário onde os atores sociais vivem e trabalham. Já os meios para se
alcançar esses fins, são a Associação Local e a Pedagogia da Alternância (QUEIROZ,
2004; 2006), aqui sistematizados a partir das contribuições de Calvó (1999; 2010), de
Forgeard (1999), Pineau (1999), Silva (2003) e Queiroz (2004), entre outros autores que, de
alguma maneira, tem contribuído com as reflexões em torno dessas abordagens, fundamentais
para uma compreensão mais aprofundada sobre os CEFFAs, conforme esquema abaixo e
descrição posterior:
A ideia de formação integral das pessoas, como vimos, está presente desde o
nascedouro dessas escolas com os jovens agricultores e se mantêm viva ainda hoje como
explicita muito bem Duffaure (1993, p. 89), ao afirmar: “As escolas famílias não se contentam
em formar homens para que sejam agricultores. Elas têm a ambição de formar agricultores,
para que sejam homens”.
É nesse contexto que os CEFFAs buscam na epistemologia da Complexidade de Edgar
Morin fundamentos para pensar esse sistema educativo. A educação de base moriniana deve
promover o que o autor chama de ‘inteligência geral’, pronta para referir-se ao complexo, ao
contexto, de modo multidimensional – a compreensão do ser humano ao mesmo tempo como
ser biológico, psíquico, social, afetivo e racional –, dentro da concepção global, isto é,
entendendo que a sociedade comporta as dimensões histórica, econômica, sociológica,
religiosa, entre outras.
Daí que uma das atenções dos CEFFAs é para com o projeto profissional ou projeto
educativo do alternante através da formação integral que lhe permita desenvolver seu próprio
projeto de vida, se possível em seu meio, considerando todos os ângulos: formação escolar,
formação profissional, formação social, educação, cidadania, projeto de vida, economia,
família e meio.
Esse conjunto de saberes-formação interagindo constantemente, de acordo com a
abordagem epistemológica de Edgar Morin, da teoria da complexidade ou pensamento
complexo, que a Pedagogia da Alternância, desenvolvida pelos CEFFAs, busca formar nos
alternantes, pois nos CEFFAs o jovem “[...] não é objeto de formação, ao contrário, ele é
sujeito e autor de sua educação. [...] Com eles pratica-se uma estratégia personalista, isto é, do
‘eu’ no meio do ‘nós’ e de ambientes [...]” (OLIVEIRA, 2007, p.11). Assim, não existe na
Pedagogia da Alternância, um único elemento que intervém na formação do sujeito, da
pessoa, mas é a relação, a interação de diversos elementos que influi e colabora na formação
de todos os aspectos da pessoa humana.
Gastón Pineau (1999), outro estudioso/pensador que se tem debruçado a refletir sobre
a formação alternada e integral da pessoa que os CEFFAs pode favorecer, enquanto uma
escola da experiência, através do contato, da interação entre organismo e o ambiente, da
possibilidade de uma reflexão ativa, afirma ser esta:
[...] mais uma escola da ação que uma escola do discurso. [...] ela pode ser
vista como uma ‘trans-escola’ da experiência visando, através e além desta,
122
Por escola da ação mais que uma escola do discurso, o autor se refere a uma escola da
experiência, da vivência, do enfrentamento direto com as coisas da vida, incluindo nós
mesmos e os outros; uma escola onde todos são mestres. Por esse motivo, é um CEFFA “[...]
Uma escola diferente. Será que a diferença não vai até à oposição, à contradição? Será que a
escola da experiência não é uma contra-escola” (PINEAU, 1999, p.63), questiona ele. Por
transescola, o autor expressa a relação entre ação e reflexão que a Alternância oferece por
meio da experiência concreta dos sujeitos em seu meio socioprofisional com o
desenvolvimento de si mesmo. As referências apontadas por Pineau (1999, p. 63) no tocante
ao movimento educativo dos CEFFAs, levou-o à seguinte conclusão: “[...] Eis porque a
Pedagogia da Alternância pode também ser a Pedagogia da Esperança”, preconizada por
Paulo Freire, enquanto um dos autores que vem inspirando teórica e metodologicamente a
pedagogia da alternância no Brasil.
Então, fundamentados na ideia de que a vida ensina mais do que a escola, este
movimento educativo do/no campo por meio de suas escolas valoriza o aprender pelo fazer
concreto do dia a dia, na experiência do trabalho familiar e em outras situações. Desse modo,
a aprendizagem acontece principalmente nos períodos de atividades em casa e nos estágios,
ou seja, na relação com a família, com as pessoas da comunidade, ouvindo, pesquisando e
aprendendo com os mais velhos por meio da sua pedagogia e dos seus instrumentos ou
dispositivos didáticos, descritos mais adiante.
Fica evidente, portanto, a partir dos objetivos descritos, a relação indissociável entre
alternância, desenvolvimento e fortalecimento da agricultura familiar nos CEFFAs através da
tríade – escola, família e comunidade. Para Forgeard (1999), ser ator do desenvolvimento do
meio, da agricultura familiar, consiste em criar condições de desenvolver competências,
atitudes, comportamentos, na perspectiva de possibilitar um bem-estar econômico e social às
pessoas que vivem no campo; é fazer crescer estas pessoas tanto no plano individual como no
coletivo. Para isso é preciso, inicialmente, fazer um diagnóstico através de uma pesquisa
participativa, valorizando os recursos locais, pois “[...] não se trata de propor um modelo a ser
reproduzido, mas de tomar consciência da situação e agir em busca de soluções”
(FORGEARD, 1999, p.69).
Desse modo é que os CEFFAs vêm desempenhando um importante papel no contexto
social onde estão inseridos, pois estão sempre a serviço do desenvolvimento do meio rural e
isto significa o fortalecimento da agricultura familiar no Brasil por meio de suas associações
como afirmou Carlos Cristovão Sossai, na época, Presidente da União Nacional das Escolas
Famílias Agrícolas do Brasil – UNEFAB, no discurso de abertura na ocasião do I Seminário
Internacional intitulado Pedagogia da Alternância: alternância e desenvolvimento, realizado
de 3 a 5 de novembro de 1999, na Cidade do Salvador – Bahia – Brasil.
uma verdadeira rede de responsáveis e parceiros locais com a finalidade de agilizar o meio
social e econômico e valorizar a região onde ela atua. A Associação composta pelos atores
locais, a família principalmente, responsável nos aspectos jurídico, político, administrativo e
econômico, se coloca no coração do processo de formação por alternância.
As reflexões em torno da Associação e o papel que esta exerce no sucesso e/ou
fracasso de um CEFFFA me fizeram recorrer mais uma vez às reflexões de Thierry de
Burghgrave (2011, p.98) ao descrever, rememorar, o processo de implantação da primeira
Escola Família Agrícola da Bahia – a Escola Comunidade Rural de Brotas de Macaúbas, que
“[...] após 19 anos de bons e leais serviços às comunidades rurais da região”, resultou no seu
fechamento. O autor, então, nos adverte quanto ao papel da comunidade, da Associação na
vida presente e futura de um CEFFA: “Se o objetivo da ECR era formar jovens agricultores
para serem orientadores de suas comunidades, a coerência exigia que as mesmas comunidades
se comprometessem com os jovens, conseqüentemente, com a Escola (DE BURGHRAVE,
2011, p.135).
Portanto, considerando a Associação uma atividade meio em um CEFFA e sendo esta
última uma instituição de educação formal pública não estatal, e, por esta razão, obedece a
regras e formas político-institucionais reconhecidas oficialmente, o que lhes permite,
inclusive, receber recursos financeiros do Estado, de domínio público, de interesse de todos os
envolvidos, entre esses da Associação, fica evidente a importância deste pilar em um CEFFA
(ZAMBERLAN, 2006).
Daí a questão da participação, do engajamento das famílias, dos agricultores familiares
no processo de gestão administrativo-financeira de um CEFFA, sem desconsiderar o
acompanhamento didático-pedagógico da escola e nem o processo de aprendizagem dos seus
filhos com vistas a alcançarem as finalidades, ou seja, a formação integral dos adolescentes e
jovens e o desenvolvimento local sustentável e solidário.
trabalho como pré-requisito para a formação (BEGNAMI, 2003; SILVA, 2003; QUEIROZ,
2004).
Outro autor corrobora a discussão em torno das tipologias de alternância, é Malglaive
ao estudar os problemas da formação dos formadores. Ele faz referência a três tipos de
alternância: a falsa alternância, a alternância aproximativa e a alternância real. A falsa
alternância, segundo ele, é aquela que deixa lacunas nos cursos de formação já que não
estabelece uma ligação clara entre a formação acadêmica e as atividades práticas; a
alternância aproximativa consiste em um modelo mais elaborado, com certa organização
didática na medida em que busca unir os tempos e espaços de formação (escola e atividade).
Para isso, Malglaive se utiliza de instrumentos metodológicos e conceituais, os quais
ajudarão, por meio da observação direta do vivido, dos dados coletados, um trabalho teórico
dentro da sala de aula (CALVÓ, 1999; BEGNAMI, 2003; SILVA, 2003). Para Calvó (1999),
a crítica à alternância aproximativa repousa no fato de ela usar o modelo de observação e da
análise da realidade na qual os jovens terão que atuar, sem, contudo, oferecer-lhes condições
para atuar diretamente sobre esta mesma realidade.
A alternância real, por sua vez, intenta uma formação teórica e prática global e, desse
modo, possibilita ao alternante, o jovem em formação, construir o seu próprio projeto
pedagógico, colocando-o em prática e, ao mesmo tempo, fazendo uma análise reflexiva sobre
si mesmo. Calvó (1999) chama atenção para um aspecto que diferencia este modelo da
anterior, pois neste verifica-se a efetiva implicação do alternante, tanto do ponto de vista
pessoal como em relação às demais instituições envolvidas com o processo formativo do
jovem, ou seja, os atores e os sistemas interagem constantemente.
Tendo como referência uma análise espaço-temporal das práticas de formação em
alternância, Gil Bourgeon, apresenta três tipos de alternância, e, apesar das terminologias
serem diferentes, de alguma forma, são parecidas com as apresentadas por Malglaive. O autor,
seguindo um itinerário progressivo, parte de uma classificação de alternância mais simples até
chegar a uma forma mais complexa. São elas: a alternância justaposta, a alternância
associativa e a alternância copulativa.
A alternância justaposta se caracteriza por intercalar diferentes tempos entre as
atividades e os diferentes espaços, ou seja, entre o trabalho e o estudo, sem haver qualquer
ligação entre elas. Dessa feita, verifica-se uma total disjunção entre a escola e o trabalho, haja
vista que inexiste um instrumento didático que dê conta de unir as duas ações e, do mesmo
modo, os conteúdos nessa sucessão temporal não têm nenhuma relação um com o outro. A
130
alternância justaposta nos remete à ideia da falsa alternância apresentada por Malglaive
(CALVÓ, 1999; BEGNAMI, 2003; SILVA, 2003).
A alternância associativa, por sua vez, associa a formação profissional com a
formação geral. Para isso, as instituições devem organizar em uma única formação e em um
mesmo programa, tanto as atividades teóricas quanto práticas. Calvó (1999, p. 20) mais uma
vez, ao analisar tais classificações ou tipologias, afirma neste caso que se trata de uma “[...]
simples adição de estudos e atividades profissionais, com pouca ou nenhuma interação nem
transversalidade entre ambos os elementos”. Para Silva (2003), ela é de fato uma alternância
que associa, contudo não há um movimento de religar. Assim, ela corresponde à alternância
aproximativa proposta por Malglaive.
Seguindo a classificação estabelecida por Bourgeon, temos a alternância copulativa.
Esta consiste em um movimento no qual se identifica uma interação entre todos os momentos
de atividades, uma verdadeira conexão entre todos os elementos que configuram o aspecto
educativo, seja em âmbito pessoal, relacional, didático ou institucional. Este tipo de
alternância possibilita ao jovem alternante construir seu projeto pessoal e, neste sentido,
coloca-o como autor em seu meio. Verifica-se, neste tipo de alternância, mais uma
semelhança com as tipologias apresentadas por G. Malglaive, quando ele trata da alternância
real ou da verdadeira alternância, segundo a análise desenvolvida por Calvó (1999).
Além dessas três tipologias ou classificações em torno do conceito de alternância,
Queiroz (2004) traz outra classificação esboçada pelo estudioso Lerbert. Para esse autor,
existem três tipos de alternância: alternância ritmo, alternância da inversão e alternância
reversibilidade. De acordo com Queiroz (2004), tanto as classificações de Malglaive, como
as de Bourgeon, guardadas as diferenças entre si, se assemelham com as de Lerbert. Por
exemplo, a alternância justaposta de Bourgeon corresponde à alternância ritmo de Lerbert, à
alternância externa de Girod de L’Ain e à falsa alternância de Malglaive. Do mesmo modo, a
alternância associativa de Malglaive corresponde à alternância de Lerbert, e a alternância
copulativa se assemelha à alternância reversibilidade de Lerbert.
As análises e reflexões sobre as diferentes classificações ou tipologias em torno da
ideia de alternância como visto, desenvolvidas por diferentes estudiosos, aproximam-se da
alternância integrativa ou interativa como defende Calvó e assumida pelos CEFFAs (1999, p.
21). A razão é que “[...] nela existe uma verdadeira colaboração, cogestão, coabitação, co-
ação, onde o meio profissional intervém na escola e esta intervém no meio, com intervenções
na educação”.
131
[...] a Alternância não consiste em dar aulas aos jovens, e em seguida pedir-
lhes que apliquem isto no terreno. Mas ao contrário, o processo de
aprendizagem do jovem parte de situações vividas, encontradas, observadas
no seu meio. Elas passam a ser fontes de interrogações, de trocas e o
CEFFA o ajuda a encontrar suas respostas.
Uma
Uma rede de concepção do
parceiros formador
coformadores Estatuto e papéis
[?]papéis
Um dispositivo Um contexto
pedagógico educativo
conteúdo- facilitador
método-
instrumentos
não cabe a palavra aluno, tendo em vista a diferença de estatutos nos sistemas escolares de
ensino e, sim, para esse sistema educativo, a palavra alternante.
O segundo componente é o projeto educativo e tem sua relevância, pois trata das
finalidades e das metas, tanto do ponto de vista da instituição que organiza a formação, como
de cada alternante. Assim, o que determina o funcionamento da alternância são as finalidades,
as metas e os objetivos a serem alcançados levando em consideração o público-alvo. Para
tanto, a Associação responsável pela elaboração do projeto educativo tem um papel
importante já que é este componente que dá sentido à formação do adolescente ou jovem
alternante, com vistas a contribuir para o desenvolvimento sustentável e a promoção do
dinamismo local.
A experiência, terceiro componente, ganha lugar na formação alternada, seja na
relação com o trabalho, com o mundo da produção, com a vida para além da escola, e, neste
sentido, inverte a lógica da escola formal, pois esses saberes-fazeres são o ponto de partida do
processo de aprender.
Desse modo, Gimonet (2004) aponta três dimensões que devem ser investidas na
formação: a) a dimensão temporal, isto é, a experiência passada, presente e futura enquanto
projeto e projeção; b) a dimensão espacial, que tem a ver com a diversidade de experiências
vividas pelos alternantes em locais diferentes e cujo objetivo é possibilitar a comparação e o
distanciamento desses espaços, sem perder de vista um modelo de referência; c) os campos
vivenciais a serem levados em conta: familiar, profissional e social. São esses três campos, a
que chamamos habitualmente de ambiente de vida, o dia a dia, o cotidiano, que alternam com
a vida da escola. É aqui que a teoria tripolar de Gastón Pineau (2004) tem sentido nos
CEFFAs – a auto, a hetero e a ecoformação –, a ser apresentada logo adiante.
O quarto componente é constituído pela rede de parceiros coformadores que atuam
em diferentes espaços-tempos da formação. São eles: pais, mestres de estágios ou tutores e os
monitores/formadores dos CEFFAs, além dos próprios alternantes em grupo, todos, mais ou
menos, em interação e sempre de acordo com as finalidades da formação como também das
dimensões dos campos de vivências (familiar, profissional e social). Aqui reside uma questão
fundante nos CEFFAs, que é a partilha do poder educativo imbricado pelo jogo da diferença e
da complementaridade, e isso significa dizer que cada um tem seu lugar, seu estatuto e poder.
Gimonet (2004; 2007) chama atenção para alguns aspectos nesse componente: a
convivência do alternante com culturas diferentes e, algumas vezes, contraditórias, se
considerarmos as lógicas vivenciados por cada um dos parceiros coformadores envolvidos. Se
o alternante é o centro deste complexo sistema educativo, ele pode, de um lado, desenvolver a
139
Mas este protagonista não está sozinho em uma ilha. Ele está, com outros,
em múltiplas sociedades, maiores ou menores e instituídas, e o estudo deste
pólo auto o coloca habitualmente nesta situação social complexa, em
tensão, tão diferente, mas tão ligado quanto a noite pode estar ao dia.
(PINEAU, 2004, p.157).
Verifica-se, a partir dos dois tempos e dos três movimentos formativos apresentados
pela teoria ou modelo tripolar de Gastón Pineau, quão eles são significativos para o sistema
educativo CEFFAs, do ponto de vista da formação individual, social e ambiental, todos
interligados por meio de suas interfaces e variantes, propiciando assim, um movimento de
complementaridade por meio da ligação e da interação.
contexto histórico-social dos alunos, daí não deve haver a separação entre as aprendizagens
do meio escolar e da realidade dos alunos (ELIAS, 1997), princípios que norteiam a prática
educativa das Escolas Famílias Agrícolas e sua pedagogia – a Alternância, assegurados pelos
instrumentos pedagógicos como o Plano de Estudo e o Caderno da Realidade.
Para a Escola Ativa, o centro escolar é o aluno, e a mediação didática docente deve
facilitar a aquisição de novos conhecimentos pelos alunos; o âmbito e os elementos da
formação não se devem limitar somente à escola, mas devem levar em consideração todo o
seu entorno (CALVÓ, 1999). Neste sentido, segundo d’Ávila (2001, p. 81), “[...] a mediação
docente [...] se dialetiza na relação com o educando, onde o professor deixa de ser o detentor
absoluto do saber – como na pedagogia tradicional – e passa a constituir-se em orientador da
aprendizagem”. Para se ter uma ideia da influência da Pedagogia de Freinet sobre a Pedagogia
da Alternância, recorre-se à visão de Elias (1997, p. 92):
Ainda com referência ao processo de nascimento das Casas Familiares Rurais, Calvó
(1999) ressalta que os princípios filosóficos dessas escolas têm origem no personalismo, de
Emmanuel Mounier. O personalismo, como diz Mounier “[...] é uma filosofia, não é apenas
uma atitude. É uma filosofia, não é um sistema” (1964, p.16). É uma filosofia na qual o
experienciar do ser pelo pensar é o próprio pensar, e, neste movimento de contato direto com
as coisas experienciadas, ouvindo, vendo, entendendo refletindo, as coisas passam a ter
sentido na vida das pessoas. Assim, a experiência pensada passa a ser um princípio e
fundamento do personalismo mourniano, por não se enquadrar em um sistema ou pensamento
filosófico “[...] restrito a uma elite intelectual universitária, presa ao formalismo institucional
e desligada dos reais problemas da comunidade humana” (LORENZON, 1996, p.69).
Sob esse ponto de vista, o personalismo se opõe ao idealismo por dois motivos, no
dizer de Mounier: “1º – Reduz a matéria (e o corpo) à aparência do espírito humano, nele se
inserindo através duma actividade puramente ideal; 2º – Dissolve o sujeito pessoal num
amontoado de relações geométricas ou inteligíveis, donde a sua presença é expulsa, ou reduz
a um simples posto receptor de resultados objetivos” (MOUNIER, 1964, p. 49-50). Daí o
personalismo ser contrário ao individualismo por ser este
144
construtivista de Jean Piaget – de onde se depreende a ideia do sujeito aprendente como ativo,
construtor do seu conhecimento em íntima interação com seu meio (família, comunidade e
escola) –, indiscutivelmente, subsidia a compreensão de mediação didática na Pedagogia da
Alternância, pelos monitores e alternantes, num processo construtivo de ensino e de
aprendizagem.
O pensamento complexo de Edgar Morin, como já assinalado, tem seu lugar nos
CEFFAs. O termo complexus significa “[...] o que tece junto e responde ao apelo do verbo
latino complexare: abraçar” (MORIN, 1999, p.33). Para esse autor, há de fato complexidade
quando diferentes elementos são inseparáveis constitutivos do todo, como o político, o
econômico, o sociológico, o afetivo, o mitológico, “[...] e há um tecido interdependente,
interativo e inter-retroativo entre o objeto de conhecimento e seu contexto, as partes e o todo,
o todo e as partes entre si” (MORIN, 2001, p. 38).
Da Pedagogia Libertadora de Paulo Freire, a Pedagogia da Alternância se nutre do
tripé ação-reflexão-ação, da verdadeira práxis. O movimento de ir e vir do alternante, de
combinar quinze dias na escola e quinze na família/comunidade, possibilita a este pensar a
prática e retornar a ela para transformá-la. Este ‘quefazer’ é teoria e prática, é reflexão e ação,
como diz Paulo Freire (1987, p.122), “[...] Esse quefazer implica a transformação da realidade
em que se acham os oprimidos”. Daí que o ato de conhecer deve envolver um movimento
dialético que vai da ação à reflexão sobre ela e desta a uma nova ação.
Os CEFFAs, nessa perspectiva, não propõem uma educação antidialógica, bancária,
para a qual a educação é o ato de transmitir valores e conhecimentos a serviço da dominação e
que Paulo Freire tanto criticou, mas que ainda se encontra presente em nossas escolas: negar
às classes populares, aos camponeses a verdadeira práxis, ou seja, a capacidade dos sujeitos
de praticar e teorizar, de refletir na ação e sobre a ação. A Pedagogia da Alternância
desenvolvida pelos CEFFAs, além de ser uma pedagogia da complexidade, da realidade, da
experiência, é também a pedagogia da libertação, da problematização, da conscientização, à
medida que esta toma à práxis como outra forma de conhecer, do estar dos sujeitos históricos
no mundo, de sujeito criador, reflexivo. Daí que, como afirma Freire (1987, p.125), “[...] ação
e reflexão se dão simultaneamente”.
Além desse princípio educativo que os CEFFAs extraíram da filosofia da educação de
Paulo Freire, para Mânfio (1999), existem semelhanças entre o legado desse
educador/pensador e a Pedagogia da Alternância desenvolvida pelos CEFFAs. O autor
destaca quatorze dimensões que se assemelham às duas pedagogias, muito embora oriundas
de espaços-tempos diferenciados, ou seja, uma de origem europeia e nascida nos idos dos
146
anos 30 do século passado e outra, posteriormente, em terreno sul-americano, nos idos dos
anos 60, aqui destacadas.
Em primeiro lugar, essas experiências nasceram fora da academia ou do sistema
oficial de ensino cujo objetivo foi de responder aos problemas das comunidades em um
contexto de intensa mobilização popular. No Brasil, por exemplo, a pedagogia freiriana nasce
colada aos movimentos sociais populares, tanto do campo como da cidade, como as Ligas
Camponesas, o Movimento de Educação de Base liderado pela Igreja Católica, o Movimento
de Cultura Popular, todos instigados pelo alto número de analfabetismo populacional, entre
outros, somando-se à crise do modelo desenvolvimentista no final dos anos 50. Na França, a
pedagogia da alternância foi motivada pelo movimento de educação popular – o Sulco,
conforme mencionado no capítulo anterior, o que resultou na necessidade de organizar e de
formar os jovens trabalhadores e burgueses na perspectiva do desenvolvimento do meio rural
francês.
Em segundo lugar, ambas as experiências apontam para a formação integral do ser
humano. Paulo Freire (1987) dirige-se ao homem oprimido, marginalizado pelo dominador,
os camponeses, ribeirinhos, quilombolas, entre outros povos do campo, que também foram
excluídos das escolas oficiais brasileiras, seja por sua inexistência no meio rural, por conta da
falta de políticas públicas, e, se existiam, por essas escolas só ofertarem até a 4ª série do
ensino fundamental. Eram classes multisseriadas e unidocentes, sem uma formação
condizente com as exigências que tais turmas demandam, fenômeno que ainda persiste até os
dias atuais. A Pedagogia da Alternância, por sua vez, se volta para os jovens agricultores e
suas famílias, que também eram excluídos das escolas oficiais francesas ou estimulados a
estudarem nas escolas da cidade, como destaca Nosella (1977, p.19):
Já no terceiro lugar, está a consideração de que ambas buscam, por meio da utopia, a
construção de uma vida melhor e de um futuro mais justo, humano e solidário para os homens
e mulheres do campo e da cidade, distante da opressão. Entendem, porém, que, por meio da
participação e de uma verdadeira democracia, é possível instalar uma pedagogia da esperança.
147
atores mais importantes do sistema educativo CEFFAs. Daí a exigência de um educador com
outro perfil, ou seja, engajado no movimento, conhecedor dos princípios da pedagogia da
alternância e dos seus instrumentos didáticos, com capacidade de liderança, entre outras, o
que se detalha logo abaixo.
desenvolver competências para o exercício que as funções exigem; já “Pela Alternância” quer
dizer que a formação resulta da ação profissional em serviço, dentro de uma equipe educativa
de um CEFFA, com sessões de formação pedagógica que pontuam periodicamente o percurso
formativo.
A formação pedagógica, tanto inicial como continuada segundo Gimonet (1999;
2004), não deve ser feita de ensinamentos nem de consumo de conhecimento abstratos, fora
da realidade dos monitores. Ela deve ser justamente ao contrário: uma formação que
acompanha a entrada, e, em seguida, a experiência da profissão, ligando sempre a prática à
teoria, num movimento de pesquisa-ação, de construção de conhecimentos, para alcançar
mais entendimento sobre as práticas.
Nesse contexto, no ano de 1996, por ocasião da Assembleia da UNEFAB em Riacho
de Santana – Bahia, sede da AECOFABA, aprova-se o esboço da proposta de Formação
Pedagógica Inicial de Monitores das EFAs do Brasil, por compreender a necessidade de todo
monitor fazer uma formação pedagógica específica para atuar com a pedagogia da alternância
e seus instrumentos didáticos. Outra decisão tomada nessa Assembleia foi a criação de uma
equipe pedagógica nacional na UNEFAB, composta de representantes das Regionais. Desse
modo, na reunião do Conselho de Administração da UNEFAB, em maio de 1997, em
Salvador – Bahia, formou-se a Equipe Pedagógica Nacional, inaugurando uma nova fase no
movimento EFAs na busca de unidade das diversas práticas pedagógicas de alternâncias
desenvolvidas no Brasil (BEGNAMI, 2003).
A formação pedagógica se torna, portanto, uma exigência do movimento para todos os
monitores que atuam numa Escola que trabalha com a Pedagogia da Alternância, e, por isso
mesmo, visa prioritariamente a docência, mas também as atividades específicas que os
monitores desempenham num CEFFA, entre essas, de responsável pelo processo educativo do
alternante (BEGNAMI, 2003).
Além do objetivo acima, é importante descrever os quatro outros objetivos do Plano de
Formação Pedagógica de Monitores, destacados por Begnami (2003, p. 83):
Uma das condições para se candidatar a fazer a formação pedagógica inicial é que os
monitores deverão estar em pleno exercício profissional num CEFFA, tendo em vista que se
trata de uma formação em serviço, e por isso deve articular o fazer pedagógico com a reflexão
teórica, com o objetivo de intervir diretamente na prática e também se formar pela prática.
Além dessas condições, o Plano de Formação Pedagógica Inicial de Monitores traz as
seguintes características: a) capacidade de conviver e trabalhar em grupo; b) capacidades
técnicas e compromisso político com as causas do meio rural; c) habilitação e inclinação para
o magistério; d) motivações para continuar na função de monitoria no CEFFA; e) abertura e
disposição para incorporar inovações e inovar (BEGNAMI, 2003)
O Plano de Formação Pedagógica Inicial de Monitores está estruturado com base nos
seguintes princípios: a) a Alternância e o lugar da experiência na formação; b) o Monitor, ator
de sua formação; c) a formação pela pesquisa; d) um conjunto de parceiros colaboradores na
formação; e) acompanhamento e avaliação.
Para dar conta desses princípios, o Plano Curricular da Formação Pedagógica Inicial
de Monitores está organizado em sete sessões trabalhadas no Centro de Formação das
Regionais, desenvolvidas em onze módulos temáticos e com o seguinte esquema: a)
colocação em comum; b) aprofundamento teórico e; c) preparação da alternância. Todas as
sessões estão organizadas em uma carga horária de 40 horas (ANEXO A).
Do exposto sobre o percurso formativo dos monitores das EFAs por meio do plano de
formação organizado pela Equipe Pedagógica Nacional da UNEFAB, verifica-se que, para
atuar nessas escolas em que o ator principal é o alternante, filhos de agricultores familiares e
de outras formas de produção e existência humana, e com uma proposta diferenciada, requer-
se um educador diferente, ou seja, engajado, militante e sensível às causas dos povos do
campo. Daí que, geralmente, os monitores das Escolas Famílias Agrícolas são os seus
egressos.
Na EFA de Angical, objeto de nosso estudo anterior (ARAÚJO, 2005), por exemplo,
dos cinco monitores, quatro são egressos da EFA de Ensino Médio de Riacho de Santana,
sendo que três deles moram na escola juntamente com a família desde sua criação, ou seja, há
uma década. Constata-se que a maioria tem uma história de vida-formação implicada
152
diretamente com a Pedagogia da Alternância e, desse modo, estão aptos a desenvolver uma
prática pedagógica centrada nos quatro pilares dos CEFFAs. Dessa forma, eles se tornam
verdadeiros multiplicadores dessa alternativa de educação do e no campo, ao contrário de
muitos professores que atuam nas escolas do campo com uma formação essencialmente
urbana.
O fato de esses monitores morarem na escola assegura-lhes viverem, de fato e de
direito, o cotidiano de seu local de trabalho, de poderem conviver com os jovens, filhos e
filhas de pequenos produtores familiares rurais de diferentes contextos – educacional, cultural,
econômico, político e social. É diferente dos educadores das escolas públicas, seja municipal
ou estadual, em que a maioria só vai às escolas para ministrar suas aulas e, em seguida,
retorna para suas casas, muitos deles sem “[...] enraizamento cultural [...] e sem vínculos com
a vida e a cultura das comunidades onde são educadores e educadoras (ARROYO, 2005, p. 5).
Além das atividades de ensino, os monitores nos CEFFAs, mediante sistema de
rodízio, são responsáveis por outras atividades como: coordenação da escola (eleição de dois
em dois anos), almoxarifado, horta, alimentação, secretaria, biblioteca. Afora essas tarefas,
uma vez por semana, cada monitor assume o papel de responsável do dia, acompanhando os
alternantes desde a hora em que acordam até a hora de dormir.
Os monitores são também responsáveis por um número de alternantes de diferentes
séries, constituindo atividade obrigatória a visita às famílias, conforme assinalado, no
mínimo, duas vezes por ano, com o objetivo de conhecer o ambiente em que vive o alternante
e, a partir daí, pensar nos temas geradores a serem trabalhados na escola, refletir com a
família a importância do Plano de Estudo e acompanhar o desempenho do aluno/alternante
junto à escola e à comunidade. Essa diversidade de ações, de saberes e fazeres desenvolvidos
pelos monitores no cotidiano dos CEFFAs nos remete à ideia de complexidade moriniana
preservando sua singularidade. Como se verifica, ser educador nos CEFFAs é bastante
diferente de muitos educadores que atuam nas escolas das redes públicas e privadas de ensino,
entre estas, nas escolas rurais onde os professores desenvolvem suas atividades didático-
pedagógicas, tendo como referência o contexto urbano.
Além do monitor que acompanha a evolução do jovem alternante, existem também os
mestres de estágios e que, durante este período (último ano), têm a função de orientador
profissional e geral no desenvolvimento do jovem, seguindo os objetivos estabelecidos pelos
CEFFAs, ou seja: assumem a formação do jovem; auxiliam na sua formação integral; ajudam
o jovem em sua inserção no ambiente e na relação sobre o futuro; favorecem a progressiva
participação do jovem no conjunto dos trabalhos do empreendimento e/ou empresa; e
153
Essa premissa foi reconhecida pela Câmara de Educação Básica (CEB) do Conselho
Nacional de Educação (CNE), através do Parecer nº 1/2006, que expõe motivos e aprova os
dias de estudos na comunidade como dias letivos para a adoção da Pedagogia da Alternância,
ou seja, passaram a reconhecer a formação escolar em dois tempos-espaços formativos
interligados: o Tempo-Escola e o Tempo-Família/Comunidade, metodologia bastante
apropriada, sobretudo para os filhos de agricultores familiares, mas também para outros povos
155
que praticam outras formas de produção no campo brasileiro como: pesqueiros, ribeirinhos,
extrativistas, pecuaristas, entre outros populações do campo que desenvolvem diferentes
práticas produtivas no meio rural brasileiro.
Como já dito, o interesse de estudar os cursos de formação inicial para os monitores
das EFAs, mediante convênio com a UNEB, nasceu no momento da defesa de dissertação de
Mestrado no Programa de Pós-Graduação em Educação e Contemporaneidade (PPGEduC) da
Universidade do Estado da Bahia (UNEB), quando a banca examinadora assinalou a
necessidade da continuidade dos estudos sobre esta alternativa de educação do e no campo –
as EFAs — desta vez, entre outras temáticas, a formação dos monitores/formadores.
Referendada por esses professores, dei início a um processo de reflexão em torno do
seguinte ponto: o que pesquisar sobre a formação de educadores do campo e, em especial,
sobre os monitores/formadores das EFAs como assim são chamados nesta rede de ensino?
Das indagações, questionamentos, que fui desenvolvendo, diuturnamente, sobre “o
que pesquisar”, emergiu o interesse de estudar a questão da formação de educadores, pois, na
condição de professora do curso de Pedagogia, tenho estado extremamente preocupada com o
processo formativo de nossos estudantes, dos futuros pedagogos. Também me preocupa o
rebatimento dessa formação no “chão da sala de aula”, no cotidiano escolar, enfim, das
práticas educativas por eles desenvolvidas.
Daí que fui, pouco a pouco, convencida de que a problemática da formação dos
educadores ainda constitui, sem sombra de dúvida, uma temática a ser pensada, pesquisada,
com vistas à construção de um novo jeito de ensinar e de aprender, e isto, necessariamente,
passa, a meu ver, entre outros aspectos, pela formação dos professores.
Em decorrência, optei por estudar os cursos de formação inicial em serviço (cursos de
licenciaturas) ofertados para os monitores das EFAs do Estado da Bahia, por meio de
convênio entre as duas redes presentes neste Estado: a Associação das Escolas das
Comunidades e Famílias Agrícolas da Bahia (AECOFABA) e a Rede das Escolas Famílias
Integradas do Semi-Árido (REFAISA) e a Universidade do Estado da Bahia (UNEB).
com a pedagogia da alternância e com a educação do campo. Para tanto, realizei os estudos
durante um ano, refletindo em torno dessas questões e objetivos.
Contudo, em março de 2010, foi iniciado o processo de análise de parte dos
documentos que compõem o acervo dos cursos, ou seja: o Projeto Político-Pedagógico dos
Cursos, os Projetos de Reconhecimento dos Cursos, os Relatórios de Avaliação das
Atividades do 1º Módulo do Núcleo Básico, de março de 2002, e os Relatórios das Práticas
Pedagógicas das Etapas I, II, III e IV.
Durante o trabalho de análise dos referidos documentos, vários aspectos mencionados
pelo conjunto dos professores/formadores em relação à prática pedagógica dos
professores/estudantes29, chamaram a atenção, principalmente quando afirmaram que tais
cursos não levavam em conta o que era “ensinado” nas Oficinas Pedagógicas, ou seja, não
desenvolviam um planejamento em consonância com a visão de planejamento e de ensino-
aprendizagem por eles transmitidos. Relatos do tipo “quanto ao planejamento, a monitora
justificou que estava sendo montado e que, portanto, seguia o planejamento montado pela
EFA” aparecem com frequência nos Relatórios dos Professores de Estágio Supervisionado.
Esses relatos me levaram a fazer as seguintes indagações, descritas no Caderno de
Campo: o planejamento ensinado nesses cursos levou em conta os instrumentos didáticos da
pedagogia da alternância? Qual a ideia, concepção, de planejamento presente nesses cursos?
Caso os referidos cursos não tenham sido formatados nos moldes da pedagogia da alternância
e da concepção de educação do campo, foram ressignificados pelo professores/formadores e
pelos professores/estudantes ao longo do processo formativo?
Além desses aspectos quanto à prática pedagógica dos monitores, chamou minha
atenção, ao analisar os projetos político-pedagógicos dos cursos, a ausência de disciplinas, ou
seja, de componentes curriculares ou eixos temáticos que contemplassem as discussões em
torno da educação do campo, da pedagogia da alternância e de seus instrumentos didáticos.
Por sua vez, a “falta de conhecimento” dos professores/formadores sobre a pedagogia da
alternância, expressa principalmente nos relatórios de estágio, denominado de Prática
Pedagógica, resultou em um movimento de estranhamento de minha parte.
Outro aspecto a ser destacado diz respeito ao referencial bibliográfico apresentado nos
projetos de Reconhecimento dos Cursos, pois, em momento algum aparecem os autores que
produzem conhecimentos sobre os Centros Educativos Familiares de Formação por
Alternância (CEFFAS) não só da França, já conhecidos entre nós, quando da elaboração da
29
Nesse estudo, compreende-se por professores-estudantes os monitores e monitores egressos que fizeram a
formação inicial, objeto de estudo dessa tese.
157
proposta dos cursos, como Jean-Claude Gimonet, Gastón Pineau, Pedro Puig Calvó e Gilbert
Forgeard. Do mesmo modo, não são mencionados no referencial bibliográfico desses projetos,
pesquisadores, autores brasileiros com larga experiência, que também pesquisam e publicam
artigos, livros, na maioria das vezes, resultado de dissertações e teses de doutorado30.
Essas “ausências”, essas “faltas”, esses “desconhecimentos” em torno da Pedagogia
da Alternância e dos seus instrumentos didáticos, presentes nos referidos documentos, me
fizeram pensar sobre essa formação inicial em nível superior para os monitores da EFAs e,
como já mencionado, fui tomada constantemente por uma sensação de estranhamento. Daí
que comecei a questionar: será que esses cursos foram ofertados somente para atender às
exigências da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, ao afirmar que, até o ano de
2007, todos os professores que atuam na educação básica deveriam ter curso superior?
Confirma-se, neste sentido, o que apresentam a justificativa e os objetivos dos projetos
político-pedagógicos dos cursos?
Motivada por essas indagações, por esses questionamentos, prossegui as reflexões
sobre o tema em questão. Afinal, o cerne da pesquisa era compreender se os projetos político-
pedagógicos dos cursos levaram em conta a complexidade e a singularidade de ser educador
nessas escolas e se estavam sintonizados com a pedagogia da alternância e as discussões
contemporâneas em torno da educação do campo. Nesse contexto, desloquei-me de Salvador
onde resido, até a cidade de Riacho de Santana, sede da Associação das Escolas das
Comunidades e Famílias Agrícolas da Bahia (AECOFABA), com o objetivo de obter mais
informações sobre “o dito e o não dito” de “documentar o não-documentado” (LUDKE;
ANDRÉ, 1995, p.41), sobre esses cursos de formação inicial para os monitores das EFAs. O
processo investigativo que me orientou naquele momento, foi de uma “escuta sensível”
(BARBIER, 1993) com a Coordenadora Pedagógica, Profª Isabel Oliveira31, pois, como
assinala Macedo (2004, p.147), “[...] para se obter dados que caracterizam a complexidade
dos grupos, organizações e instituições em educação, por exemplo, as informações não-
oficiais terão grande importância”.
30
Só para exemplificar: João Batista Begnami, João Batista Pereira de Queiroz, Isabel Xavier, Lourdes Helena
da Silva e Thierry de Burghgrave, este último, belga radicado no Brasil e um dos responsáveis pela expansão das
EFAs na Bahia e no Brasil, tradutor de livros e artigos em francês dos autores acima mencionados, Coordenador
Pedagógico desses Cursos de Licenciatura, entre outros estudiosos.
31
Pedagoga, Especialista em Psicopedagogia e Mestre em Ciências da Educação pela Universidade de Nova
Lisboa – Portugal. Ex-monitora e Assessora Pedagógica da Regional AECOFABA. Membro do Conselho
Editorial da Revista Formação por Alternância.
158
Toda a pressão da LDB era que, até 2007, não poderiam estar em sala de
aula professores sem nível superior e os professores das EFAs mais de 90%
não tinham nível superior. As EFAs não tinham como desenvolver um
projeto, gestar um curso que tivesse a cara do movimento EFA, voltado
para essa formação integral, da mesma forma que dão aos jovens de forma
contextualizada levando em conta o contexto sociocultural, ambiental e
religioso, até porque existe uma ligação das EFAs com o CEB. (ISABEL
OLIVEIRA, 1º/07/2010).
32
Queiroz . A conversa se deu durante o III Encontro Nacional de Pesquisa em Educação do
Campo, III Seminário sobre Educação Superior e as Políticas para o Desenvolvimento do
Campo Brasileiro e I Encontro Internacional de Educação do Campo, ocorridos
simultaneamente em Brasília – DF, no período de 4 a 6 de agosto de 2010, em torno do tema,
objeto e o problema de pesquisa.
Pelo fato de ser um conhecedor profundo do movimento CEFFAs no Brasil e no
exterior, inclusive tendo orientado monografias nos referidos cursos, ele foi enfático ao
afirmar que os projetos dos cursos de licenciaturas ofertados pela UNEB em convênio com as
EFAs da Bahia, representadas pela AECOFABA e REFAISA, não tiveram, em momento
algum, a intenção de desenvolver os cursos e nem de formar monitores nos moldes da
Pedagogia da Alternância e seus dispositivos didáticos, a exemplo dos cursos de formação
continuada ofertados pelas Assessorias Regionais das Escolas Famílias Agrícolas e das Casas
Familiares Rurais, dos cursos de Especialização em Pedagogia da Alternância da
Universidade Católica de Brasília (UCB) e do Curso de Especialização em Pedagogia da
Alternância e Sustentabilidade da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em
parceria com a Associação Mineira das Escolas Famílias Agrícolas (AMEFA). Nessa
perspectiva, pode-se inferir que esses cursos foram ofertados apenas para atender às
exigências da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei nº 9.394/96, conforme
expresso nos artigos 61 a 67, que tratam da formação de professores.
Portanto, as informações fornecidas pela Profª Isabel Oliveira (2010), bem como a
conversa com o Prof. João Batista Queiroz, foram cruciais no sentido de poder repensar o
problema de pesquisa, tendo em vista que as questões construídas até então não traziam no
seu bojo, algo que se pudesse configurar como fundamental para uma investigação científica
da envergadura de uma tese de doutorado, em virtude do conjunto das pessoas mais
implicadas, conhecedoras das situações em que os cursos foram concebidos e implementados,
já saberem de antemão que eles foram ofertados para responder aos requisitos exigidos pela
legislação educacional brasileira.
Compreendi, naquele momento, a necessidade de busca de um referencial teórico-
metodológico que pudesse dar conta de explicitar esse percurso vivido nesta “trama do
conhecimento” (BIANCHETTI; MEKSENAS, 2008) em torno da formação inicial para os
32
Doutor em Sociologia pela Universidade de Brasília. Professor da Universidade de Brasília (UnB). Membro
do Conselho Editorial da Revista Formação por Alternância e pesquisador do Movimento dos Centros
Familiares de Formação por Alternância. A Tese de Doutorado do referido Professor serviu de referência para o
reconhecimento e aprovação do Parecer nº 01/2006 da Câmara de Educação Básica (CEB), que “Recomenda a
Adoção da Pedagogia da Alternância em Escolas do Campo” do Conselho Nacional de Educação (CNE).
160
monitores das EFAs. Esse movimento me remeteu à ideia de rigor assumida por Macedo
(2009, p. 86) quando diz:
Para tanto, o objetivo geral que norteia esse estudo é: investigar a experiência de
formação inicial voltada para os professores/estudantes (monitores/formadores) das Escolas
Famílias Agrícolas da Bahia, sob a concepção de formação de educadores do campo na
contemporaneidade. Já os objetivos específicos foram assim definidos: 1º) compreender o que
os professores/estudantes consideram como sendo singular na formação inicial do ponto de
vista pessoal e profissional; 2º) compreender o que professores/formadores considera como
sendo singular nesses cursos de licenciaturas e nos professores/estudantes, comparando com
os estudantes de outras licenciaturas de que participam como professor/formador; 3º) analisar
como se deu, no percurso da história da educação brasileira, a problemática da educação do
campo e a formação de seus educadores; 4º) descrever, historicamente, o movimento em torno
da criação das Casas Familiares Rurais e das Escolas Famílias Agrícolas em terras francesas,
brasileiras e baianas; 5º) contextualizar o processo de construção da Pedagogia da Alternância
e seus instrumentos didáticos; 6º) analisar, reflexivamente, o dito nos projetos político-
pedagógicos dos cursos e o não dito expresso nas falas dos sujeitos colaboradores da
pesquisa.
Para responder às questões em foco, em que os professores/estudantes e os
professores/formadores são os sujeitos/colaboradores mais importantes desta investigação,
recorremos a Goodson (2007), que estuda a história de vida de professores articulada com o
currículo e a escolaridade, para ilustrar a nossa intenção, ou seja, a de dar voz a esses sujeitos
por meio de entrevistas semiestruturadas e com profundidade. Assim, diz Goodson (2007,
p.67): “O projecto que recomendo respeita à reconceptualização da investigação educacional,
de modo a assegurar que a voz do professor seja ouvida, ouvida em voz alta e ouvida
articuladamente”.
Haguette (1990) contribui com essa discussão metodológica nas ciências sociais e
sustenta que a abordagem qualitativa fornece uma compreensão profunda dos fenômenos
sociais, apoiada no pressuposto de grande relevância do aspecto subjetivo da ação social,
decorrente da própria configuração de como se estrutura a sociedade. Aqui, portanto, segundo
a autora, se encontra a incapacidade de a estatística, da abordagem quantitativa, dar conta dos
fenômenos complexos e dos fenômenos únicos em termos de suas origens e de sua razão de
ser.
Para Ludke e André (1986), a abordagem qualitativa possibilita o contato direto,
pessoal, com o objeto investigado e sua complexidade, e permite não só a multiplicidade dos
dados a serem coletados, como também a participação direta dos sujeitos envolvidos. Para as
autoras, um dos grandes desafios lançados atualmente às pesquisas em educação é o de buscar
captar essa realidade dinâmica e complexa do objeto de estudo. Seguindo essa mesma
compreensão, Gatti (2007, p.27) esclarece:
A ciência social será sempre uma ciência subjetiva e não objetiva como as
ciências naturais; tem de compreender os fenômenos sociais a partir das
atitudes mentais e do sentido que os agentes conferem às suas ações, para o
que é necessário utilizar métodos de investigação e mesmo critérios
epistemológicos diferentes dos correntes nas ciências naturais, métodos
qualitativos em vez de quantitativos, com vistas à obtenção de um
conhecimento intersubjetivo, descritivo e compreensivo, em vez de um
conhecimento objetivo, explicativo e nomotético.
orientam esta pesquisa, contribuíram para definir metodologicamente este trabalho como
sendo um Estudo de Caso. (ANDRÉ, 2005).
Desse modo, entendo, com Gatti (2007, p.63), que a “[...] colocação dos problemas de
investigação é reveladora da perspectiva de abordagem do pesquisador e determinante para
seu método. [...] O método não é um roteiro fixo, é uma referência”. Ele, de fato, é construído
na prática, “[...] no exercício do ‘fazer a pesquisa’, pois o método, neste sentido, está sempre
em construção”.
Nessa perspectiva, justifica-se a escolha pelo Estudo de Caso, porque
Seguindo essa mesma compreensão, Macedo (2000, p.150) entende que o Estudo de
Caso, “[...] tem por preocupação principal compreender uma instância singular, especial. O
objeto é tratado como único, ideográfico, mesmo compreendendo-o enquanto emergência
molar e relacional, isto é, consubstancia-se numa totalidade composta de, e que compõe
outros âmbitos ou realidades [...]”.
O Estudo de Caso, nessa perspectiva, possibilita compreender o objeto estudado como
um único caso ou um conjunto de casos são estudados em profundidade, singulares, em uma
dada realidade multidimensional e historicamente situada (LUDKE; ANDRÉ, 1986). Por isso
apresenta, entre outras, as seguintes características: visa a descoberta, o que implica dizer que
o conhecimento não é algo acabado, mas uma construção que se faz e se refaz
constantemente; enfatiza a interpretação em contexto, isto é, deve-se levar em conta o local
onde está situado o objeto de estudo; busca retratar a realidade de forma complexa e profunda;
possibilita ao pesquisador recorrer a uma variedade de dados, coletados em diferentes
momentos, em situações variadas; revela experiência vicária e permite generalizações
naturalísticas, ou seja, o pesquisador procura relatar as suas experiências durante o estudo de
modo que o leitor ou usuário possa fazer as ‘generalizações naturalísticas’.
Todas essas características tornam ”[...] o estudo de caso especialmente relevante na
construção de novas teorias e no avanço do conhecimento na área” (ANDRÉ, 1995, p.53). Em
outra obra, tratando do Estudo de Caso, diz André (2008, p.40): “É esse movimento de vai-e-
165
vem da empiria para a teoria e novamente para a empiria, que vai tornando possível a
produção de novos conhecimentos”.
Mesmo não sendo um método específico de pesquisa e que, muitas vezes, “[...] podem
ter graus de dificuldade variável” (BOGDAN; BIKLEN, 2006, p.89), os instrumentos e as
técnicas de coleta de dados, como a observação participante, as análises avaliativas, pois “[...]
o poder diferenciador do estudo de caso é sua capacidade de lidar com uma ampla variedade
de evidências” (YIN, 2005, p.26-27).
Os diferentes instrumentos e técnicas utilizados no decorrer da pesquisa possibilitado
pelo Estudo de Caso, cujo objetivo é construir novos conhecimentos, no caso em estudo,
acerca da formação de educadores que atuam nas escolas do campo, nos remetem à visão de
Boaventura de Souza Santos (2009, p.77-78) quanto aos diversos métodos a serem utilizados
nas pesquisas qualitativas denominadas por ele de paradigma emergente em oposição ao
paradigma moderno: “Só uma constelação de métodos pode captar o silêncio que persiste
entre cada língua que pergunta. Numa fase de revolução científica como a dos tempos atuais,
essa pluralidade de métodos só é possível mediante transgressão metodológica”.
Desse modo, o estudo de caso em foco permitiu descrever e compreender, de forma
multifacetada e em profundidade, aspectos fundamentais desse processo formativo a partir de
uma variedade de evidências e informantes, ou seja, 1º) por meio de análise documental
(projeto político-pedagógicos), e 2º) através das entrevistas semiestruturadas intensivas e em
profundidade com os sujeitos da pesquisa: professores/estudantes que se encontram em suas
atividades docentes e os egressos dos cursos (ex-monitores), professores/formadores,
coordenadoras de projetos especiais da UNEB e lideranças do movimento EFAs da Bahia
esta fase aponta para a necessidade do uso de outras técnicas de pesquisas (LUDKE; ANDRÉ,
1986).
Para Macedo (2004, p. 171), “[...] os documentos têm a vantagem de serem fontes
relativamente estáveis de pesquisa, o que facilita sobremaneira o trabalho do pesquisador
interessado na qualidade das práticas humanas e com a fugacidade destas”. Daí, diz esse
autor, ser uma fonte importantíssima para a compreensão e explicitação da instituição escolar,
já que não é possível compreender a vida escolar sem um processo de documentação desta.
A análise documental, portanto, intenta identificar informações factuais presentes nos
documentos por meio de questões ou hipóteses de interesse do pesquisador (LUDKE;
ANDRÉ, 1986). No caso em estudo, a análise recaiu sobre os projetos político-pedagógicos
dos cursos de licenciatura para os monitores das Escolas Famílias Agrícolas do Estado da
Bahia em Matemática, Biologia, História, Letras e Geografia, ministrados pela UNEB por
meio de convênio com as redes AECOFABA e REFAISA. Assim, buscou compreender o dito
por meio do documento referido e o não dito por meio das narrativas das coordenadoras dessa
instituição de ensino superior e das lideranças das mencionadas redes de escolas, fonte de
análise e sistematização do Capítulo 5, conforme esclarecido na introdução.
Ainda de acordo com as autoras acima, existem dois tipos de entrevistas: entrevista
padronizada ou estruturada e entrevista semiestruturada. Esta última, utilizada nesta pesquisa
junto aos sujeitos/colaboradores da pesquisa permitiu que a pesquisadora fizesse as
adaptações necessárias com vistas a responder às questões e aos objetivos que orientam o
estudo em foco.
Bogdan e Biklen (2006, p. 135), ao tratar das entrevistas semiestruturadas, diz da
possibilidade de esse tipo de entrevista comparar os dados entre os vários sujeitos, muito
embora também possa perder a oportunidade de compreender como os sujeitos estruturam a
questão em tópico.
Na perspectiva de dar conta das exigências que configuram uma entrevista
semiestruturada refenciada pelos autores acima citados, foi dado início aos contatos com as
EFAs e os sujeitos/colaboradores da pesquisa. Daí que, após contato telefônico com a Direção
da EFA de Ribeira do Pombal informando sobre o estudo e a escolha dessa escola para
compor o lócus da pesquisa, desloquei-me dia 06 de fevereiro de 2012 com o objetivo de
entrevistar os monitores, denominados neste estudo de professores/estudantes, como também
de coletar dados sobre a EFA junto à direção e demais pessoas implicadas com a Escola, entre
essas, os membros da Associação Mantenedora.
A visita à essa EFA possibilitou, após apresentação dos objetivos da pesquisa em
reunião com a direção, monitores e pessoas da associação da EFA, o contato com uma
professora/estudante egressa dessa formação inicial, objeto de estudo desta tese, moradora da
cidade onde está localizada a escola, e que prontamente aceitou ser uma das colaboradoras
desta pesquisa na condição de entrevistada.
Cheguei nesta Escola por volta das 18:00 horas do dia 06, na qual fui acolhida por
duas monitoras e apresentada à Diretora, Profª Joseja Santana, na sua residência localizada
nas dependências da escola onde me hospedei naquela noite permanecendo no dia seguinte
quando retorno para Salvador às 18:00 horas após a conclusão das entrevistas junto à três
monitores e uma ex-monitora no dia 07/02/2012.
Do mesmo modo, as entrevistas semiestruturdas realizadas junto aos
professores/estudantes da Escola Família Agrícola de Caculé (EFAC), foram realizadas no dia
23 de abril de 2012 quando chego na escola vindo de Salvador às 05:00 horas. Tais entrevistas
foram desevolvidas na área externa de uma uma das casas das monitoras onde ficamos
hospedada e pernoitamos. A casa é toda cercada de jardim, diga-se, muito bem cuidado, com
muitas rosas, gramas entre outras plantas. A média de tempo das entrevista foi de 35 minutos
168
o que no mesmo dia foi possível desenvolver as cinco entrevistas previstas com todos os
monitores das diferentes áreas do conhecimento que compõem o quadro desta EFA.
As narrativas recolhidas por meio das entrevistas semiestruturadas com esses
sujeitos/colaboradores estão sistematizadas e analisadas no Capitulo 6 desta tese juntamente
com a dos professores/formadores da UNEB.
Por sua vez, o fato de ter sido feita a opção por esses sujeitos para compor o conjunto
dos entrevistados, em face do número representativo dos que deixaram as EFAs, trouxe como
definição, nas questões da pesquisa, não mais a categoria monitor ou ex-monitor, isto é, os
que ainda permanecem e os que deixaram as EFAs como são intitulados no movimento
CEFFAs, e sim professores/estudantes, por contemplar esses dois segmentos, na perspectiva
de alcançar os objetivos propostos na pesquisa. Tal opção exigiu a necessidade de serem
estabelecidos critérios para a análise, a sistematização e a apresentação dos dados, permitindo
inclusive, identificar essas diferentes narrativas mediante carta de aceite.
As narrativas desses sujeitos/colaboradores permitiram que a pesquisadora utilizasse o
recurso da triangulação dos dados, por se tratar de “[...] um dispositivo que dá um valor de
consistência às conclusões da pesquisa, pela pluralidade de referências e perspectivas
representativas de uma dada realidade com as quais trabalha” (MACEDO, 2009, p.103). E
prossegue:
instrumentos e nas técnicas de pesquisas que deu início ao processo de análise do conteúdo
dos dados coletados, possibilitando à pesquisadora fazer todas as inferências em
conformidade com as orientações de Franco (2007) sobre esta perspectiva de análise.
A ideia foi que, por meio dessas diferentes fontes de pesquisa, de teorias e métodos, se
construa um conhecimento capaz de contribuir para as reflexões e discussões em torno da
formação inicial e continuada para os educadores do campo, e, de modo especial, para o
conjunto dos monitores atuantes no sistema CEFFAs, com vistas à proposição de alternativas
formativas, seja inicial ou continuada.
Daí que a noção/conceito de reflexividade, de distanciamento, estranhamento por
conta das ausências, das faltas, presentes nos documentos, foram importantes na perspectiva
de poder construir um conhecimento capaz de elucidar aspectos fundamentais dessa formação
na vida pessoal e profissional desses educadores do campo. Tal procedimento se fez a partir
do que esses professores/estudantes consideraram como sendo singular sobre esses cursos em
diferentes áreas do conhecimento, com vista a contribuir com a qualidade da educação básica
e da formação de educadores do campo, de modo especial com os que atuam nos anos finais
do ensino fundamental e médio, integrado à educação profissional, locus de atuação
profissional desses educadores, sujeitos da pesquisa.
Deputada Estadual), Roberto, David, Davildes, Olavo, Cristóvão, Maria de Fátima (Fafá) e
outros animadores de comunidade. Após este processo de mobilização social a EFA foi
inaugada em 05 de março de 1995, com uma equipe formada por cinco (05) monitores e
quatro (04) pessoas da parte administrativa.
A EFA de Ribeira do Pombal, desde a sua criação oferta aos adolescentes, jovens e
adultos, filhos de agricultores os anos finais do ensino fundamental (5º a 8º série), atualmente,
por conta da ampliação do ensino fundamental para nove anos, corresponde do 6º ao 9º ano.
Está em fase de discussão o processo de implantação do Ensino Médio integrado à Educação
Profissioanl Técnico em Agropecuária. Essa pretensão se deve, de acordo com a justificativa
no roteiro de questões cujo objetivo foi coletar dados sobre essa EFA, pela carência deste
profissional nesta região e deste modo, de poder continuar com a sequencia do curso tendo em
vista que a matriz curricular contempla três componentes curriculares da área técncia a saber:
Iniciação à Zootecnia, Iniciação a Agricultura e Iniciação a Administração e Engenharia
Rural.
A área total da EFA é de 70 hectares (ha) e conta com três salas de aula além de outros
cômodos distribuídos em toda a área como: cozinha, dispensa, duas garagens, sala de
informática, biblioteca, sala de monitores, sala de reunião, secretaria, almoxarifado didático,
174
São parceiros da Escola: NASP, ARCAS, ASA, Rádio Regioal, Prefeitura de Ribeira
do Pombal, Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Ribeira do Pombal (STR), COOAPIS,
Pastoral Rural, Movimento Afro e Grupo de Italianos.
A EFA de Ribeira do Pombal, conta atualmente com uma equipe formada por nove
(09) monitores e dois (02) professores, sendo que deste, cinco (05) residem na própria escola.
A gestão ou adminsitração da EFA é realizada pela Associação Mantenedora conforme
destacamos, além da Diretora e de mais duas pessoas que ajudam nas questões
administrativas. Tem ainda o pessoal de apoio que são: quatro cozinheiras e dois
trabalhadores agropecuários (caseiros).
Do total de monitores que fazem parte do quadro da EFA, entrevistamos três
monitores por serem eles os únicos que fizeram os cursos de formação inicial, objeto de
estudo desta tese, e permanecem atuando na EFA, acrescido de uma ex-monitora, totalizando
175
33
Ribeira do Pombal – Povoado Poço das Varas, Fazenda Piqués, Fazenda Macambira, Fazenda Abóbora,
Povoado Mocó, Estrada da Mirandela, Fazenda Cardan, Fazenda Alexandrino I, Fazenda Contendas, Fazenda
São José do Tabuleirinho, Fazenda Saco Comprido e Fazenda Serra Grande. Cícero Dantas: Povoado Campinas
de Castro, Assentamento São Gabriel, Sede, Povoado Betânia, Fazenda Fidentina e Fazenda Miriró. Heliópolis:
Fazenda Itapororoca, Povoado Farmácia, Fazenda Calombi, Fazenda Candeal, Povoado Massaranduba, Fazenda
Boa Sorte, Fazenda Arrozal e Fazenda Pau Ferro. Fátima: Fazenda Paus Pretos, Povoado Capim Duro, Fazenda
Gruê e Povoado Belém de Fátima. Banzaê: Fazenda Terra da Lua, Aldeia Cajazeira, Aldeia Segredo, Aldeia
Araçá, Aldeia Lagoa Grande, Fazenda Jitirana e Povoado Queimada Grande. Tucano: Povoado Tracupá,
Assentamento Beira Rio, Povoado Buraco do Vento, Fazenda Boqueirão e Sede. Cipó: Fazenda Correnteza e
Fazenda Tamanduá. Paripiranga: Fazenda Sabão, Fazenda Alegres e Povoado Chico Pereira. Adustina: Fazenda
Quixabeira de Baixo e Assentamento Santa Maria. Novo Triunfo: Sede, Fazenda Jatobá e Povoado Raso dos
Besouros. Antas: Fazenda Brejo. Jeremoabo: Assentamento Caritá e Canudos: Povoado Água Branca.
176
A área total da escola é de 65 hectares (ha), com duas salas de aula que se desdobram
em duas devido ao sistema de alternância além de: uma biblioteca com acervo de 1.250
títulos, uma sala de informática, uma Igreja, uma cozinha com área de serviços, um refeitório,
três dormitórios para os alunos/alternantes, um dormitório para os monitores, dois
apartamentos para professores, duas casas equipadas para os monitores, quatorze banheiros,
sendo seis masculinos e seis femininos, um banheiro na cozinha e um para os monitores, um
almoxarifado, uma marcenaria, uma lavanderia, uma secretaria em conjunto com a sala dos
monitores, uma área coberta (pátio), um depósito com Kit Apícola, uma borracharia, um
galpão para máquinas e equipamentos e uma garagem.
Em relação às práticas de agricultura a EFAC desenvolve: preparo e adubação do solo;
plantio de culturas anuais, frutíferas e hortaliças; tratos culturais; colheita e armazenamento;
compostagem; enxertia e práticas de conservação de solo. Já em relação as atividades
pecuárias, desenvolve: vacinação dos animais; controle de endo e ecto parasitas; castração;
discórnea; silagem; fenação e formulação de ração.
São parceiros da Escola: Prefeitura Municipal de Caculé, AECOFABA, Famílias e
Comunidades, Paróquias, Sindicato dos Trabalhadores Rurais e as Cooperativas –
COOPMEL, COOPERMAN e COODELEITE.
177
A Escola conta com uma equipe de cinco monitores, destes quatro moram nas
dependências da própria Escola. São três pessoas envolvidas diretamente na administração da
34
As Comunidades atendidas dos respectivos municípios são: Campo Largo, Cachoeira, Curral do Meio,
Marruás Terra Vermelha, Rua 7 de Setembro 381 Bairro Potosi, Junco1, São Domingos, Pedra Grande, Santana,
Papagaio, Vázea Grande, Tapera, Capão da Ripa, Caetitu, Vereda do Meio, Água Branca, Baixa do Cedro,
Passagem dos Carneiros, Boqueirão, Serra do salto, Tabuleiro, Pau Ferro, Jurema, Lagoa do Menino, Maxixe,
Rabanada, Lagoa da Vereda, Coelho, Olho Dágua, Pedrinha, Sumidouro, Alecrim, São Joaquim, Malancieira,
Vaquetal, Lagoa da Torta, Apostema, Mulungu, Corisco, Riacho Fundo, Cassote, Boa Vista do Gavião, Tibiraba,
Duas Passagens, Bezero, Mocambo, Fundos, Barreiro do Mato, Covas de Mandioca, Barra da Conceição, Serra
Pelada, Queimadas, Lagoa Comprida, Três Lagoas, Pé do Morro, Santa Efigênia, Grama, Caiana, Bambuzal,
Piedade, Lagoa do Tamboril, Canafístula Rio das Antas, Ribeirão, brejo, Cabeludo, Salininha, Furados,
Mandacaru, Baixa do Meio, Lagoa de Cima, Morrinhos, Caetano, Varginha, Lagoa das Caraíbas, Vereda Bonita,
Barra dos Brenhas, Canjica, Queimada do Jacó e Sem Bezerro.
178
EFAC incluindo o Diretor e mais o pessoal da Associação, num total de treze (13) pessoas.
Também conta com uma cozinheira e um auxiliar técnico.
179
A Universidade do Estado da Bahia (UNEB) foi criada pela Lei Delegada nº 66, de 1º
de junho de 1983, posteriormente reconhecida pela Portaria do Ministério da Educação nº
909, de 31 de julho de 1995. Sua origem remonta aos finais dos anos 60, com a implantação
do Centro de Educação Técnica da Bahia – CETEBA, transformado em Fundação em 1974,
sendo extinta em 1980, com a criação da Superintendência de Ensino Superior do Estado da
Bahia – SESEB, congregando o CETEBA, a Faculdade de Agronomia do Médio São
Francisco, as Faculdades de Formação de Professores de Alagoinhas, de Jacobina e de Santo
Antônio de Jesus, além das Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras de Caetité e de
Juazeiro. Finalmente, em 1983, a SESAB é extinta e, em seu lugar, cria-se a UNEB, formada
pelas unidades superiores existentes e pela Faculdade de Educação – FAEEBA, criada nesse
mesmo período (FIALHO, 2005).
Perseguindo a ideia de criação de uma universidade multicampi, com a intenção de
ampliar o ensino superior para as diferentes regiões do Estado, geograficamente extenso e
concentrando, praticamente, todo o ensino superior na Capital, e, por conseguinte, um Estado
complexo, dada a diversidade de climas, de culturas, entre outras características ou
singularidades próprias da Bahia, Boaventura (1998, p.237) assim se manifesta: “[...] o que
mais me motivava era voltar o ensino superior para o interior, no atendimento à demanda de
educação universitária nos principais centros urbanos da Bahia”. Acrescenta ainda: “Sabia,
como sei até hoje que, academicamente, não é fácil, mas é necessário dotar os centros
regionais de educação superior”.
Nesse contexto de criação de uma universidade multicampi, com sua missão e vocação
preferencialmente para a formação de professores, como descreve Boaventura (1998, p.45) –
“Ao conjunto reunido pela extinta SESEB, acrescentei a Faculdade de Educação do Estado da
Bahia, em Salvador. Não poderia conceber uma universidade sem a sua unidade pedagógica
[...]”. Desse modo, constata-se o modelo multicampi como a opção correta, acertada, naquele
180
35
O referido curso foi objeto de estudo de duas pesquisas em nível de Mestrado no Programa de Pós-Graduação
da FACED/UFBA, e tiveram como campo empírico a turma do Departamento de Educação de Teixeira de
Freitas – Campus X, composta pelos militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST.
Outra dissertação defendida no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Minas
Gerais (UFMG) e uma no Programa de Pós-Graduação em Educação e Contemporaneidade (PPGEduC) da
UNEB, ambas sobre a turma de Pedagogia da Terra do Departamento de Bom Jesus da Lapa, Campus XVII.
Destacam-se os referidos estudos: SILVA, Fábio Dantas de S. Pedagogia da Terra: um encontro de saberes,
vivências e práticas educativas. 2009. 165f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal da
Bahia, Salvador, 2009; TITTON, Mauro. Organização do trabalho pedagógico na formação de professores do
MST: realidade e possibilidades. 2006. 154f. Dissertação (Mestrado em Educação)-Universidade Federal da
Bahia, Salvador, 2006; MARQUES, Tatyanne Gomes. Pedagogia da Terra: significados da formação para
educadores e educadoras do campo. 2010. 183f. Dissertação (Mestrado em Educação)-Universidade Federal de
Minas Gerais, Belo Horizonte, 2010; MOREIRA, Edna. Pedagogia da Terra: um exemplo de luta e resistência.
2010. (Dissertação em Educação e Contemporaneidade) - Universidade do Estado da Bahia, Salvador, 2010.
183
Esse cenário, no qual a UNEB, por meio de sua organização multicampi, vem
promovendo a inclusão dos sujeitos sociais do campo e da cidade por meio do tripé ensino,
pesquisa e extensão, em oposição aos paradigmas científicos e de conhecimento hegemônicos
instituídos historicamente, nos remete, mais uma vez, às reflexões de Arroyo (2008, p. 16) ao
acentuar: “O sistema escolar e a universidade fizeram parte da produção da diversidade em
desigualdades”.
Com vistas a atender à diversidade de sujeitos, no caso em estudo, dos monitores, que
desenvolvem suas práticas educativas, seus saberes e fazeres nas Escolas Famílias Agrícolas,
unindo teoria e prática, firmou-se o convênio com as duas redes das Escolas Famílias do
Estado da Bahia – AECOFABA/REFAISA e UNEB, por meio da Coordenação Geral de
Projetos Especiais, vinculada à Pró-Reitoria de Graduação, cujo objetivo foi elaborar e
implementar os cursos de licenciatura plena para os monitores das respectivas redes, em cinco
áreas do conhecimento: Letras, Geografia, História, Biologia e Matemática, objeto de estudo
desta tese de doutoramento.
184
Compreender o que está para além do dito, do prescrito nos projetos político-
pedagógicos dos cursos de licenciatura, como já destacado, é o propósito deste capítulo, ao
trazer as narrativas dos responsáveis pelo processo de elaboração e implementação dos cursos
de licenciatura para os monitores das Escolas Famílias Agrícolas do Estado da Bahia, ou seja,
dos sujeitos/colaboradores da universidade, instituição formadora, como também do olhar das
lideranças das duas redes sobre o objeto em estudo, cujos nomes serão os dos próprios
entrevistados em virtude de serem pessoas bastante conhecidas e deste modo, não vejo por
que o uso de nomes fictícios. Vale ressaltar que os entrevistados assinaram carta de
consentimento para tal.
Assim, com base no roteiro das entrevistas semiestruturadas, foi possível retirar o
perfil pessoal e profissional dos sujeitos/colaboradores, a saber: do lado da UNEB, optou-se
por entrevistar duas colaboradoras, com faixa etária acima de 45. A colaboradora, Profª
Norma Neide Queiroz, Coordenadora Geral de Projetos Especiais, tem vinte seis anos de
UNEB, e vinte nesta função; tem formação superior (graduação) em Matemática e
especialização também em Matemática. A outra colaboradora da pesquisa é Maria de Lourdes
Pinto, Vice-Coordenadora de Projetos Especiais, com vinte e sete anos na UNEB e quatorze
anos nesta função, tem formação em Ciências Sociais e especialização em Currículo.
Já por parte do movimento EFAs, optou-se por entrevistar duas lideranças, sendo uma
vinculada à rede REFAISA, e a outra à AECOFABA. São do sexo masculino, estão na faixa
etária acima de 45 anos e atuam no movimento CEFFAs há mais de trinta anos. O colaborador
Thierry de Burghgrave tem Mestrado Internacional em Ciências da Educação pela
Universidade Rabelais Tours (França) e Universidade Nova Lisboa (Portugal), área de
concentração em Formação e Desenvolvimento Sustentável, exercendo atualmente a função
de Assessor da UNEFAB. O colaborador Joaquim Nogueira tem formação superior em
Licenciatura Plena em História e exerce a função de Secretário Executivo da AECOFABA.
inicial por meio dos cursos regulares, seja dos cursos de formação inicial em exercício —
que, na maioria das vezes, caracterizam uma única oferta, caso dos cursos oferecidos pelo
Programa Rede UNEB 2000 —, foram os motivos considerados relevantes para o movimento
das Escolas Famílias Agrícolas da Bahia escolher a UNEB para elaboração e implementação
dos cursos de Licenciaturas Plena para os monitores dessas escolas, como destaca os
responsáveis por esta formação, tanto da UNEB como também por parte das lideranças desse
movimento educativo do campo da Bahia, expressos nas entrevistas.
Nesse contexto, Maria de Lourdes ressalta duas razões para a escolha da UNEB. A
primeira delas diz respeito ao Programa Rede UNEB 2000, voltado para a formação de
professores em exercício de primeira à quarta série do ensino fundamental, a exemplo dos
cursos de Pedagogia que naquela época se fazia presente na região de Riacho de Santana,
onde está localizada a sede da AECOFABA de que, provavelmente, segundo ela, as EFAs
tenham tomado conhecimento. A segunda razão que também pode justificar a escolha da
UNEB pelo movimento, segunda ela, foi:
A característica multicampi referenciada por Maria de Lourdes, como uma das razões
da escolha dessa instituição superior para ofertar os cursos de formação inicial também está
presente na fala de uma das lideranças do movimento, inclusive chama atenção para alguns
aspectos, entre os quais, a impossibilidade na época de os monitores cursarem nível superior
tendo em vista a distância das EFAs até as cidades consideradas centros universitários no
Estado da Bahia.
mesmo se ele tivesse disposto a fazer isso a noite, não tinha condição por
que não tinha um transporte que pudesse levar e trazer naquela distância,
naquela realidade nossa. Então ou ele afastaria do movimento por três anos
ou quatro anos para fazer essa formação ou então não teria condições para
afastar do movimento para fazer essa formação e voltar depois de três,
quatro anos era um problema, por que teria que colocar um professor no seu
lugar e teríamos que dar um jeito para mantê-lo por que não ia ficar três,
quatro anos fazendo um curso, sem nenhum recurso e nós não tínhamos essa
condição. Diante dessa necessidade de ter uma formação universitária,
diante da realidade do interior, as distâncias e essa necessidade para
respeitar a LDB, então foi por esse motivo que procuramos, corremos
atrás e encontramos a UNEB, que nos deu esse apoio e essa possibilidade
de resolvermos esse problema. (JOAQUIM NOGUEIRA). (Grifos
acrescidos)
Além dos motivos expressos acima, ficou evidente nas falas dos
sujeitos/colaboradores da pesquisa, por meio de entrevistas semiestruturadas em
profundidade, de modo especial com as lideranças desse movimento educativo (AECOFABA
e REFAISA), que a escolha quanto à elaboração e implementação pela UNEB para ministrar
essa formação, se deu, sobretudo, por conta das exigências da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional – Lei nº 9.394/96, nos artigos 61 a 67 que determinavam o ano base de
2007, como também as orientações do Plano Nacional de Educação (2001-2010) de que todos
os professores da educação básica teriam de ter formação superior para desenvolverem suas
ações docentes nos anos finais do ensino fundamental e médio.
Pelo fato de os CEFFAs, tanto em âmbito nacional como regional, ofertarem os anos
finais do ensino fundamental e médio integrados à educação profissional e tendo em vista o
número considerável de monitores com formação em nível médio profissional, de modo
especial em Técnico Agrícola, a maioria deles, inclusive, egressos das próprias EFAs, foi
necessário buscar uma alternativa que atendesse às exigências legais quanto à formação
desses profissionais da educação. Assim se expressaram as lideranças do movimento.
Norma Neide, entendeu, com o departamento dela, para ver quais seriam as
possibilidades de fazer uma parceria entre os movimentos das EFAs aqui na
Bahia e a UNEB em vista da realização de um curso que pudesse atender a
essa exigência da LDB. Então, a coisa foi realmente nos termos para atender
a LDB e nós temos que dar aos nossos monitores a possibilidade de se
formar, de ter o ensino superior, ai começou. (THIERRY DE
BURGGHGRAVE).
A LDB foi a que mais nos forçou a iniciar, correr atrás, de procurar a UNEB
outras possibilidades para essa formação, porque, como nós vimos, a LDB
quando foi promulgada, dizia que até em 2007 todos os professores que
estivessem em sala de aula teriam que ter uma formação universitária. Então
foi uma preocupação enorme para nós do movimento, nós estávamos na
época com 150/170/180 professores nas duas redes e pouquíssimos deles
tinha formação universitária, a grande maioria, te afirmo hoje, eram mais de
80% professores nossos que não tinham formação universitária. Tinham
apenas ensino médio. A grande maioria de técnicos agrícolas, fruto da
própria Escola Família. Então essa foi a preocupação maior, quando nós
vimos essa decisão dada pela LDB; então, nos corremos atrás procurando
uma forma de nossos professores fazerem essa formação para não ter
problemas no futuro com as nossas Escolas Famílias. (JOAQUIM
NOGUEIRA).
A gente já tinha uma relação aprofundada com a UNEB porque, quando nós
realizamos o Seminário Internacional sobre a Pedagogia da Alternância aqui
no Brasil, Salvador foi escolhido para sediar por várias razões: primeiro,
porque o Estado da Bahia era o Estado naquela época que tinha o maior
número de EFAs no Brasil, e que tinha uma história já bem longa de
convivência com o sistema EFA ou CEFFA, como é denominado hoje em
dia. Então, Salvador foi escolhido e nós escolhemos a UNEB porque
realmente a UNEB é que ofereceu naquele tempo as condições necessárias e
isso coincide um pouco naquela época do início do movimento da educação
no campo da Bahia e no Brasil. Então, naquele movimento de educação do
36
Esse Seminário ocorreu no Centro de Formação de Lideranças da Arquidiocese de Salvador – Bahia,
localizado no bairro de Itapuã.
188
Portanto, estudar esses cursos de formação inicial para os monitores das EFAs da
Bahia representa um desafio muito grande, se considerarmos as questões apontadas pelos
sujeitos/colaboradores, a saber: as exigências legais no tocante à formação de professores; o
número de monitores com formação em nível médio; o fato de essas escolas estarem
espalhadas em todo o interior baiano, ofertando os anos finais do ensino fundamental e médio;
as distâncias dessas escolas das cidades consideradas centros universitários para que os
monitores pudessem ter acesso a uma formação superior, sem comprometer o funcionamento
das EFAs. Estes são aspectos, a nosso ver, relevantes para entendermos esta formação inicial.
Nessa perspectiva, compreender todo o movimento que levou ao processo de criação e
implementação desses cursos, nos remete, entre outras questões, a uma reflexão acerca da
conjuntura política e educacional daquela época, fundamental para a Educação do Campo e
suas interfaces, entre as quais, a questão da formação de educadores do campo.
Em face dos motivos expostos, foi firmado o Convênio de nº 102/2001, tendo como
objeto de Cooperação Técnico-Administrativa e Financeira entre as partes – Associação das
Escolas Comunidades das Famílias Agrícolas da Bahia (AECOFABA), a Rede das Escolas
Famílias Integradas do Semiárido (REFAISA) e a Universidade do Estado da Bahia (UNEB)
– a criação e implementação dos cursos de licenciatura plena nas seguintes áreas do
conhecimento: Letras, Biologia, História, Geografia e Matemática.
Tais cursos tiveram um caráter especial, com uma única oferta, em sistema modular e
em regime de internato, para os monitores da AECOFABA e REFAISA que atuam nas EFAs
do Estado da Bahia, como também para os professores da Rede Pública dos Municípios de
Riacho de Santana, sede da AECOFABA, e Guanambi. Os referidos cursos foram
ministrados, entre os anos de 2002 e 2004, sob a responsabilidade da Coordenação Geral de
Projetos Especiais, em cooperação com os Departamentos de Educação, Campi II e XII –
Alagoinhas e Guanambi, respectivamente. Foram ofertadas 200 vagas, sendo 40 vagas por
curso, conforme autorização da Câmara de Educação Superior do Conselho Estadual de
Educação de 21 de outubro de 2001 (BAHIA, 2001).
189
5.2.2 Justificativa
37
Esse curso de especialização é uma conquista do movimento CEFFA do Brasil. Ele qualificou 40 educadores e
educadoras da alternância como Especialistas em Pedagogia da Alternância e Educação do Campo para atuarem
como assessores nas Equipes Pedagógicas Regionais e na Equipe Nacional, no âmbito das Escolas Famílias
Agrícolas (EFAs) e das Casas Familiares Rurais (CFRs). Tal curso é uma promoção da Rede CEFFA no Brasil
(UNEFAB e ARCAFAR). Já a realização e a certificação são da Faculdade de Educação da UFMG, através do
Núcleo de Ensino, Pesquisa e Extensão em Educação do Campo e Sustentabilidade, com apoio financeiro do
PROCAMPO-SECADI-MEC. A elaboração do projeto se deu nos meses de julho a outubro de 2010 e início em
novembro do mesmo ano. A conclusão do curso de especialização se deu em março de 2012, com um Seminário
Final e defesa do Projeto de Pesquisa e Experimentação Pedagógica (PPEP).
191
movimento realmente fez tudo que pôde para responder isso, foi um
esforço violento, além do esforço de poder compatibilizar o
funcionamento das escolas e o funcionamento do curso para monitores.
Além desse esforço de compatibilização, houve também um esforço
violento no que diz respeito ao financiamento, porque o Estado não
entrou com nada, a Universidade do Estado da Bahia não entrou com
absolutamente nada, isso também foi um grande problema para nós;
também, onde achar esse financiamento que não é pouco, e onde achar e
como fazer isso, esse foi um desafio muito grande, muito grande mesmo.
(THIERRY DE BURGGHGRAVE). (Grifos acrescidos).
Quanto ao processo seletivo, após a aprovação dos cursos pelo Conselho Estadual de
Educação, foram ofertadas 40 vagas por curso, totalizando 200 vagas, e as provas versaram
sobre as seguintes áreas do conhecimento: Língua Portuguesa e Redação, Matemática,
História, Geografia e Ciências. Segundo o projeto dos cursos, os conteúdos foram os mesmos
definidos nos Parâmetros Curriculares do MEC para o ensino fundamental e médio.
Contudo, somente 192 professores foram aprovados, sendo 157 monitores das EFAs e, destes,
125 da AECOFABA e 32 da REFAISA, além dos 35 professores das redes municipais de
ensino de Riacho de Santana e Guanambi, assim distribuídos por redes: AECOFABA,
REFAISA e pelas redes municipais de acordo quadro abaixo.
A UNEB, logo quando fechamos o convênio para essa formação, viu que
teria que fazer um vestibular, porque, você acolher esse pessoal por critério
disso e daquilo, poderia cometer alguns erros, então baixou o edital abrindo
a possibilidade de se inscrever para esta formação, para esse vestibular, esse
teste inicial para entrar neste curso, também não podia ser uma coisa fechada
só para as Escolas Famílias, isso ficava contra a lei. Por isso, então, abriu a
possibilidade para outras pessoas, então no curso não tinha só monitores da
194
Outra coisa também que eu acho que foram três (03) anos incluindo o
Trabalho de Conclusão de Curso que a gente chama de Trabalho
Monográfico. Acredito que se ficasse só esse componente no último módulo
como hoje nós temos no curso de Pedagogia, possivelmente fosse mais rico,
mais produtivo porque eles fizeram ainda com outros componentes, as
chamadas optativas. Então não ficou dedicação exclusiva ao trabalho
monográfico. Acho que seria essa uma das alterações no formato dos cursos.
(MARIA DE LOURDES).
Assim, por meio do quadro abaixo, é possível visualizar a matriz curricular na qual os
cursos forma organizados, como também a distribuição da carga horária dos componentes
curriculares comum a todos os cursos.
198
pela reforma agrária, questões indissociáveis da educação do campo, como assevera Molina
(2009). Diz a referida colaboradora:
A princípio, eu sempre falava para a professora Norma Neide: tem que ter
uma identificação desse professor com o programa, não pode ser
qualquer um, porque é diferente. Uma coisa é você ir ministrar aula
dentro de um curso de oferta contínua, o que eu chamo dentro dos
muros da universidade, outra coisa é você sair para ir para uma outra
estrutura, para ministrar aula, inclusive, para uma turma totalmente
diferente; tem a experiência que deve ser respeitada, a prática deles, a
vivência deles deve ser respeitada e, por outro lado, passar a
fundamentação teórica e fazer com que eles casem isso com o dia a dia
deles nas Escolas Famílias. (MARIA DE LOURDES). (Grifos acrescidos).
Por se tratar de cursos com uma organização curricular como também dos tempos-
espaços formativos diferenciados dos habituais cursos de formação, de licenciatura regular,
tive o interesse de saber como se deu o processo de reconhecimento destes pelos órgãos
normativos, a exemplo do Conselho Estadual de Educação, cuja função não é somente
autorizar, mas também reconhecer os cursos ofertados no âmbito do Estado pelas
universidades públicas estaduais.
Segundo os sujeitos/colaboradores, não houve nenhum problema por parte do referido
órgão quanto ao reconhecimento dos cursos, até porque, na visão de uma das entrevistadas, os
conselheiros foram informados desse convênio, dessa pareceria entre a universidade e as duas
regionais que congregam as EFAs aqui na Bahia. Ressaltou o olhar dos conselheiros que
apoiam o Programa Rede UNEB 2000 e, por este motivo, são conhecedores do que “[...]
representa um programa desses na vida das pessoas, a mudança e a esperança da melhoria da
201
De fato, as observações destacadas pelo autor são pertinentes, afinal, mantêm-se ainda,
no imaginário das pessoas que fazem parte dos órgãos reguladores do Estado, inclusive de
parte também de setores das próprias universidades, uma ideia de que tais cursos de formação
para os coletivos diversos são de menor valor teórico-epistemológico se comparados com os
cursos denominados de regulares.
Neste sentido, vale destacar a atuação de algumas universidades, entre as quais, a
Faculdade de Educação da UFMG, que, desde a década de 70, “[...] apostou na radicalidade
política de abrir-se aos movimentos sociais, e não apenas a pensamentos críticos” (ARROYO,
2008, p. 33); a Universidade de Brasília, que também tem sido parceira dos movimentos
sociais e sindicais desde a inauguração do debate em torno da educação do campo,
inicialmente nas áreas de reforma agrária e ampliado para outros territórios rurais; e a UNEB,
que também abraçou desde o início o PRONERA e outras ações denominadas de afirmativas,
entre outras instituições superiores, apostando em novas bases, em novas concepções de
educação na perspectiva de construção de novos conhecimentos oriundos desses coletivos
diversos, segregados ao longo do tempo pela história da educação deste país continental,
plural, diverso, entre outras singularidades.
Tendo em vista a complexidade desses cursos para os monitores das EFAs pelo fato de
essas escolas estarem espalhadas em todas as regiões do interior baiano, instigou saber como
se deu o processo de acompanhamento dos cursos pela Universidade através da Coordenação
Geral de Projetos Especiais, como também sob o olhar das lideranças do movimento.
Segundo as entrevistadas/colaboradoras da UNEB, o processo de acompanhamento foi
contínuo, avaliando e reavaliando a todo o momento o processo formativo, inclusive cobrando
203
diretamente dos coordenadores de cada curso. Além disso, ao final de cada módulo, eram
exigidos relatórios dos professores/formadores, sem contar os encontros com o conjunto de
supervisores de estágio e a supervisão in locu.
Essa questão do acompanhamento dos cursos também foi feita de perto pelo conjunto
das lideranças do movimento, incluindo as coordenadoras pedagógicas, muito bem pontuadas
nas falas dos entrevistados.
Por parte da AECOFABA ficou sempre o Padre João, Isabel e Sílvia essas
três, essas pessoas acompanharam o tempo todo, a formação, até em
Alagoinhas tiveram várias vezes, para encontrar o pessoal no período em que
estavam fazendo a sua formação presencial. Esse acompanhamento foi
constante durante esses três anos. Outro acompanhamento que aconteceu, no
período de alternância que não era presencial todo pessoal voltava para sua
base de trabalho, para sua Escola Família que trabalhava e quando voltava
para Escola Família que ele estava lotado, tinha o acompanhamento não só
Isabel, Padre João e Silvia mais da própria associação daquela escola
que o liberou, que o enviou, que estava investindo na formação daquele
pessoal, além da própria UNEB, que escalava professores para acompanhar
por que todo esse período foi considerado como período de estágio, como
dia letivo. Então, a UNEB tinha sempre alguém nas áreas certas,
acompanhando nas escolas a formação desse pessoal e seu desempenho em
sala de aula. Então, esse acompanhamento foi constante, foi bastante forte,
não só por parte da AECOFABA e REFAISA, mas também por parte da
UNEB. (JOAQUIM NOGUEIRA). (Grifos acrescidos).
muito agricultores que não tem uma formação registrada, mais mesmo assim
eles sabiam o que queriam e sabendo o que queria, acompanhava como
também exigiam acompanhamento, andamento do professor dentro da
formação esperada. (JOAQUIM NOGUEIRA).
Então esse foi um processo que exigiu muito e que desgastou muito as EFAs
e a gente sentiu isto, tanto que nas minhas avaliações posteriores eu disse: se
fosse para recomeçar não poderia ser a mesma coisa, tinha de inventar outra
coisa, outro sistema porque isso foi desgastante demais e certamente para os
próprios alunos, foi desgastante para os professores, monitores, para os
alternantes também, que sofriam com esse processo de desgaste dos
professores refletia com certeza nos alternantes. Então durante esse tempo,
foi um período muito duro para as escolas poderem continuar suas
atividades, muito desgastante.
Como em qualquer atividade formativa e esta não poderia fugir às regras, verificar se
os objetivos propostos foram alcançados, é parte integrante e de fundamental importância para
se avaliar todo o processo formativo. Assim, outra categoria de análise recaiu sobre o alcance
dos objetivos dos referidos cursos por parte da instituição formadora, como também por parte
das redes proponentes da formação.
Por parte da universidade enquanto instituição formadora, segundo os
sujeitos/colaboradores, os objetivos foram alcançados, principalmente por ter sido o primeiro
curso em formato modular e em regime de internato ofertado pela universidade e voltado para
um coletivo social que vivencia situações semelhantes de ensino-aprendizagem, pois os
CEFFAs, com seus pilares e ancorados em sua filosofia que dão vida a essas escolas do/no
campo, desde o seu nascedouro em território francês até os dias atuais. Entretanto, Maria de
Lourdes sugere que, para saber se realmente os objetivos foram alcançados, um estudo com os
egressos, pois talvez sejam eles os que possam realmente responder melhor essa questão:
“Seria interessante se alguém fizesse um trabalho para saber como é que está a situação atual
desses egressos”.
Aqui reside, portanto a importância desta pesquisa, ao buscar compreender o que os
educadores consideram como sendo singular na formação do ponto de vista pessoal e
profissional sobre o processo formativo. Do mesmo modo, busca compreender se os
professores/formadores identificaram singularidades nos de licenciatura e nos
206
Atenderam, foi muito bom, por que a gente ver até no próprio movimento o
crescimento que houve na formação desses monitores e consequentemente o
repasse que eles fizeram para os alunos. O conteúdo da formação melhorou
muito nas escolas e os próprios estudantes na época, professores nas escolas
hoje, a gente ver também o crescimento deles, eles mudaram muito depois
dessa formação, melhoraram muito a sua produção na escola, mais não só
nisso, mais também como pessoas, em compreensão e isso melhorou muito
no movimento. (JOAQUIM NOGUEIRA).
Além desses aspectos, as lideranças do movimento chamam atenção para dois outros
que, a nosso ver, são fundamentais para compreender essa formação voltada para um coletivo
de educadores do campo que praticam a pedagogia da alternância.
E depois do curso uma vez realizado, eu estou pra dizer que como o curso
não foi de alternância, não levou em consideração a pedagogia da
alternância, nem a filosofia das escolas famílias, isso teve um reflexo depois
também para os professores que fizeram os cursos, adquiriram uma
experiência, o conhecimento teórico muito bom, mas a parte da filosofia das
EFAs não foi trabalhada e isso resultou que muitos perderam a motivação e
viram em outras possibilidades profissionais melhores opções de vida. Essa é
a minha análise pessoal. (THIERRY DE BURGHGRAVE).
207
Outra questão que talvez não pode responder a altura foi aquilo que você
introduziu no início da entrevista, não foi um curso voltada para a pedagogia
da alternância especificamente, com seus instrumentos, etc... Isso nos faltou,
até por que era difícil na época, uma coisa nova que estava começando, para
implantar tudo assim como a gente queria não era fácil, poderia talvez até ter
uma dificuldade no reconhecimento dos cursos. Faltou-nos um pouco essa
preocupação e esse aprofundamento sobre a pedagogia da alternância.
Depois dos cursos concluídos a gente sentiu isso, realmente faltou, tanto é
que nós estamos tentando completar um pouco essa parte, com a formação
agora continuada de nossos monitores. A cada momento que temos um
encontro que são duas vezes por ano, a gente procura trazer alguém para
fortalecer um pouco no grupo essa questão da pedagogia da alternância.
Então, nos faltou um pouco aquilo, mas o curso como tal foi bom, ajudou
muito e desenvolveu muito o grupo e as escolas, conseqüentemente.
(JOAQUIM NOGUEIRA).
Como visto, na visão das lideranças do movimento, existem alguns aspectos que
necessitam de um olhar, de uma análise mais aprofundada sobre esse processo formativo. A
primeira delas, tratando-se das exigências da LDB quanto à formação superior para atuar nos
anos finais do ensino fundamental e médio, tais cursos atingiram os objetivos, pois parte
considerável dos monitores, muitos deles com formação em nível médio – Curso Técnico
Agropecuária – tiveram a oportunidade de se qualificarem em outras áreas e,
consequentemente, houve melhoria no ensino dos conteúdos trabalhados nos componentes
curriculares que ministram.
A segunda questão que merece uma reflexão é o fato de os cursos não levarem em
conta a pedagogia da alternância e seus instrumentos didáticos nem tampouco a filosofia dos
CEFFAs, como enfatizaram muito bem as lideranças do movimento. Essa questão remonta a
duas observações apontadas anteriormente. A primeira delas é o total desconhecimento por
parte das universidades brasileiras quanto à metodologia adotada pelos CEFFAs, presente em
nosso país há mais de quarenta anos, mas que só tem servido para o desenvolvimento de
pesquisas nos programas de pós-graduação.
A segunda observação que deve ser destacada diz respeito ao ano em que os projetos
desses cursos foram elaborados e o tempo de implantação após a aprovação pelo Conselho
Estadual de Educação, período que coincide com o nascimento do movimento nacional Por
uma Educação Básica do Campo, que depois passou a ser chamado Por uma Educação do
Campo, pelo fato de o movimento entender que os povos do campo têm direito a uma
educação em todos os níveis e modalidades de ensino. Esse momento corresponde ao final da
década de 90, quando da realização da I Conferência em 1998, considerada como um
208
momento de batismo coletivo na luta por um novo jeito de lutar e de pensar a educação para o
conjunto do povo brasileiro que vive e produz no campo (CALDART, 2004a).
Neste caso, se forem levados em consideração a conjuntura política e educacional da
época em que tais cursos foram implementados, e os aspectos já aqui sinalizados, além do
receio de que tais cursos não pudessem ser aprovados, recomendados pelos órgãos
reguladores, provavelmente se justificaria a ausência da pedagogia da alternância e de seus
instrumentos enquanto concepção filosófica e metodológica nos projetos político-pedagógicos
dos cursos. É que o fato de ter sido em sistema modular e em regime de internato não
caracterizou de fato uma formação PARA e PELA Alternância, como acontece na França,
coerente com as finalidades dos CEFFAs, ou seja, uma formação que dê conta de atuar nesse
sistema educativo, desenvolvendo competências que a própria função exige, conforme
ressaltado no Capítulo 2.
Para tanto, a formação pedagógica inicial ofertada pelas associações regionais, no caso
da Bahia, pela AECOFABA e REFAISA, ou pelas organizações em âmbito nacional –
UNEFAB e ARCAFAR SUL e NORTE-NORDESTE –, constitui uma atividade obrigatória
e, portanto, condição fundamental de aprendizagem do monitor no CEFFA. Daí ser uma
formação capaz de acompanhar a entrada do monitor, sua experiência ao longo do processo
formativo, ligando sempre a prática à teoria. Por esse motivo, a formação pedagógica inicial
não deve ser pensada e desenvolvida de ensinamentos nem tampouco de consumo de
conteúdos abstratos fora da realidade concreta dos monitores (GIMONET, 2007).
O formato é muito difícil de dizer, mais o espírito da coisa deveria ser outro.
A primeira coisa seria dizer para a universidade: vamos trabalhar juntos e
agora vamos elaborar juntos os grandes eixos e vamos priorizar, então, a
pedagogia da alternância e seus instrumentos. Hoje nós teríamos mais
condição de fazer isso e a universidade estaria, mas aberta para fazer isso
também (THIERRY DE BURGHGRAVE).
Esses cursos foram uma faca de dois gumes, pois de um lado você tinha,
vamos formar nosso pessoal, vamos melhorar a qualidade de ensino, mas de
outro lado você formava alguém que tinha uma arma na mão para dizer
agora eu também quero ser reconhecido profissionalmente, e isso implica em
que? Ser reconhecido profissionalmente? É questão de salário e todos nós
sabemos que sempre foi o grande problema dentro das Escolas Famílias
Agrícolas, é do salário pouco, e além de ser um salário pouco, muitas vezes
irregular, ou seja, com muitos atrasos, muitos problemas [...] os técnicos
agrícolas, estão de certa maneira felizes de ter um emprego e gostavam
porque a grande maioria deles foram ex-alunos de Escolas Famílias. Agora
uma vez que eles têm um diploma superior, não é que eles perderam a
motivação, é porque isso eles tem, e é humanamente justificável, de dizer
assim: também quero ser valorizado, afinal de contas, não posso ser mais a
mesma coisa do que era antes, entendeu? Também têm o direito de ter uma
perspectiva profissional. Com esse diploma na mão começaram a exigir,
quando viram que as Escolas não tinham, não por má vontade, mais por
condições às vezes de responder de uma maneira direta a essa exigência ou a
essa reivindicação. Daí começou a aparecer pelo fato de serem diplomados
210
Tem algumas entidades que ajudaram as EFAs por 30 anos com grandes
investimentos financeiros, esses também começaram a dizer: êpa, para aí o
estado brasileiro está aonde? A educação não é dever nosso não, a
educação é dever do estado, então porque o Estado não assume as
responsabilidades constitucionais para com essas escolas? E ai há todo
um mistério, a SIMFR que até hoje apóia as escolas [...] há vinte e tantos
anos que esse pessoal está ajudando as regionais, os CEFFAS [...]. Então,
isso também foi uma consequência um pouco desses cursos onde
percebemos que tínhamos de correr atrás de todos os nossos monitores,
então ai teve que começar a fazer seminários estaduais, nacionais, começar a
correr atrás de convênios com o município, com o Estado, com a Federação,
entendeu, com a União. Há toda uma preocupação, um envolvimento hoje
em dia com isso, não conseguiram ainda, mas, pelo menos, a conscientização
está aí de que precisa correr atrás. Isso eu vejo como um ponto positivo,
porque despertou no movimento o sentimento de que era necessário com a
diminuição do aporte externo e a fuga de certa maneira dos monitores mais
fixos, com mais perspectiva, isso levou o movimento a se armar e até ter
uma relação com eles. (THIERRY DE BURGHGRAVE). (Grifos
acrescidos).
[...] depois que esse pessoal recebeu essa formação, e lá no interior com as
dificuldades que existe e até por causa da própria LDB, nós tivemos uma
procura, uma “tentação” muito grande por parte das prefeituras procurando
pessoas com essa capacidade, com essas formações para os próprios colégios
das prefeituras. O colégio de 5ª a 8ª lá do distrito tal, não tem coordenador
pedagógico, não tem professor de Biologia, não tem professor de
Matemática, então tivemos essa “tentação” de nossos monitores serem
convidados e até com salários melhores e aí é difícil, mesmo com aquele
compromisso que tivemos no início de o monitor continuar pelo menos dois
anos, muito monitores conscientes que receberam essas propostas não foram
porque tinham a certeza e consciência da dívida com o movimento. Então,
essa foi uma dificuldade que enfrentamos de modo especial nos dois e três
primeiros anos. Hoje não, hoje já se firmou um pouco os que saíram, e os
que não saíram continuam no movimento; um bom número continua hoje,
não sei lhe precisar agora exatamente se é 60,70 ou 50% mais de 50% com
certeza continuam no movimento. Ainda existe escola nossa que tinha cinco
monitores, porque nossa escola gira em torno de cinco, seis ou sete
monitores e ainda temos escolas com cinco monitores que fizeram a
formação universitária nesse programa com a UNEB, e continuam até hoje
na própria escola, a exemplo de Caculé e de Paramirim [...]. (JOAQUIM
NOGUEIRA).
relação a esse movimento educativo do/no campo, que vem ofertando não só os anos finais do
ensino fundamental, mas também o ensino médio integrado à educação profissional, o que
acaba por exigir um número maior de monitores e professores. Isso resulta em mais custos
para as escolas, como ele mesmo diz:
[...] eu estou muito preocupado hoje em dia é com os CEFFAs em geral por
que estou vendo que o Estado não está respondendo a altura do esforço que o
movimento está fazendo. A resposta do Estado ainda está muito aquém
daquilo que deveria ser e isso é preocupante, porque isso provoca certo tipo
de esvaziamento do movimento, pois os nossos monitores não têm plano de
carreira, a maioria deles não tem perspectiva de futuro [...] você sabe que é
um movimento já em curso há vários anos para o ensino médio e educação
profissional? Você vai poder ver nesse trabalho (pesquisa desenvolvida por
Begnami) o trabalho de crescimento, tendência normal das EFAs de abrirem
o curso de ensino médio integrado à educação profissional. Então, para esse
curso de educação profissional de ensino médio, a legislação é muito
exigente, você precisa ter professores com formação específica em cada
disciplina e são muitas disciplinas então o que você tem hoje na maioria das
escolas? (THIERRY DE BURGHGRAVE).
Orientada por estas questões e tendo como referência essa mesma linha de
preocupação, ou seja, no tocante à concepção dos CEFFAs, esse sujeito/colaborador chama
atenção para a atuação dos monitores em um CEFFA de um lado, e, do outro, o fato de os
professores que só vão a essas escolas para dar suas aulas, sem compromisso com Pedagogia
da Alternância e o dia a dia dessas escolas, que têm o início de suas atividades às 05h00min
horas e encerram às 22h00min horas.
parte da universidade, como também das lideranças desse movimento educativo do campo, e
do não dito, revelaram a necessidade de compreender melhor esta formação inicial para um
coletivo de educadores sociais, comprometidos com a educação do campo, seja por meio de
suas vozes — professores/estudantes, seja por meio dos professores/formadores que
desenvolveram suas atividades docentes no núcleo básico, no núcleo específico e no estágio
supervisionado, a ser tratado no capítulo seguinte.
214
Biologia,
Geraldo EFA de 1992 Biologia Química, PPA, 12
Agricultor
Caculé Ed. Física
Familiar
Sandra EFA de
2005 Matemática Matemática 10 Professora
Caculé
EFA de Língua Associações
Letras
Geralda Caculé 1992 Portuguesa e 20 Comunitá-
Literatura rias
Geografia,
Vera EFA de 1991 Geografia Sociologia e Professora
Caculé Física 8
EFA de Agricultor
David 1999 História História 13
Caculé Familiar
Voluntária
EFA de em
Raimunda Ribeira 1995 Letras Português/In- 17 Educação
do glês Formal; Não
Pombal formal,
Movimentos
Sociais,
Pastoral
Rural,
Sindicatos,
Associações
EFA de
Militante
Eval Ribeira 1995 Geografia Geografia, Área 17 Mov. Sociais
do Produtiva
Pombal
EFA de EFA:
Jocicleide Ribeira 2001 Matemática Matemática 11 primeiro
do emprego
Pombal
Fonte: Elaboração própria (2013).
Em relação ao ano de ingresso nas EFAs, verificou-se que, com exceção de duas
professoras/estudantes que ingressaram no ano de 2000, os demais entre os anos de 1991 e
1995. Esse dado revela o grau de pertencimento, de enraizamento com a cultura camponesa
(ARROYO, 2007b; 2008) e compromisso desses profissionais com essa alternativa
diferenciada de educação do campo considerando o tempo de atuação desses sujeitos nessas
escolas, ou seja, de 10 a 21 anos na com dição de monitor/formador como são denominados
pelos Centros Educativos Familiares de Formação por Alternância (CEFFAs) e eles se veem e
se identificam como tal.
Prosseguindo na análise do Quadro, identificou-se que as disciplinas ou componentes
curriculares ministradas pelos professores/estudantes, estão em conformidade com a formação
inicial e, pelo visto, estão capacitados para lecionar tais disciplinas. Trata-se de áreas do
218
conhecimento com conteúdos específicos, tanto do currículo dos anos finais do ensino
fundamental quanto do currículo do ensino médio integrado à educação profissional, níveis de
ensino nos quais os CEFFAs desenvolvem suas práticas educativas.
Partindo dessa afirmativa, ou seja, de que os professores/estudantes estão aptos a
lecionar as disciplinas que compõem a organização curricular do ensino fundamental e médio
por conta dessa formação inicial, cursos de licenciaturas em áreas específicas do
conhecimento, busco em Marcelo García (1999) quando sustenta a ideia de que, além do
conhecimento pedagógico, os professores também têm de possuir conhecimentos sobre os
conteúdos das disciplinas que ensinam e isso influencia, por sua vez, no que e como ensinar.
Quanto às atividades por eles desenvolvidas antes de ingressarem nas EFAs,
evidenciou-se que todas têm uma relação com o movimento de criação/implantação de uma
EFA, pois tais escolas nascem exatamente da organização dos trabalhadores rurais e de outras
formas de existência e produção no campo brasileiro, quais sejam: dos movimentos sociais e
sindicais, das associações comunitárias, entre outras, com o apoio, na maioria dos casos, da
Igreja Católica. Como visto, são profissionais que tiveram e têm, em sua trajetória de vida-
formação, uma relação fecunda com a terra e com a luta pela reforma agrária; também, ao
trabalhar com a educação não formal, essa trajetória está imbricada com a educação
libertadora, emancipatória preconizada por Paulo Freire (1987), bastante diferente da
educação bancária, pois, para esse autor, esta nega às classes populares, aos camponeses, a
verdadeira práxis, ou seja, a capacidade dos sujeitos de praticar e teorizar.
Outra análise sobre as atividades desenvolvidas pelos professores/estudantes antes de
ingressarem nas EFAs evidenciou, de certo modo, uma relação com os quatro pilares que
sustentam essas escolas, já citados no Capítulo 3 deste trabalho, quando os trabalhadores, os
camponeses se organizam em torno de um projeto de desenvolvimento local sustentável e
solidário, ao contrário do projeto de desenvolvimento sustentável preconizado pelo
agronegócio.
Além do mais, por ter de certo modo uma relação muito próxima com a análise acima,
é fundamental destacar a participação desses professores/estudantes nas Associações
Comunitárias Locais, o que prontamente nos remete a pensar a Associação Local enquanto
um pilar e, portanto, uma atividade meio com vistas a alcançar os fins em um CEFFA,
conforme descrito e analisado no referido Capítulo 3. Daí que, antes mesmo da criação e
implantação de uma EFA, é necessária a criação de uma Associação Local, de base
participativa, na qual os sujeitos (famílias, instituições, sindicatos dos trabalhadores rurais,
entre outras formas de organização) sejam efetivamente os responsáveis pela gestão
219
Formação
Tempo Anos de
Local de Ano de Inicial Disciplina(s)
Nome de Trabalha
Trabalho Ingresso (Curso de que Ministra
Atuação na EFA
Licenciatura)
SEC Coordenadora
Angical/Coord. Área de
Terezinha Pedagógica 2011 História Humanas 2 15
a socialização entre eles com vista à elaboração do conhecimento e quais aspectos facilitaram
ou dificultaram essa forma de organização, a maioria das respostas se assemelha.
No caso da primeira questão, verifica-se que os professores/estudantes que foram
alunos de EFAs consideraram bastante tranquila a forma como esses cursos foram
organizados, por vários motivos: 1º) pelo fato de ter “acostumado” com as EFAs ao alternar
os tempos-espaços de formação; 2º) pela possibilidade de convivência com pessoas de
culturas diferentes; 3º) por ter estudado em EFAs do ensino fundamental ao ensino médio,
entre outros aspectos expressos nas falas deles.
Na verdade, não foi muito complicado, eu não achei tão estranho porque eu
já estudei em Escola Família no ensino fundamental, no ensino médio e,
como o regime era também de internato, então não tive dificuldades de
adaptar. É claro que ficava um período de 40 dias um pouco apertado, mais
não foi nada estranho, não, foi tranquilo. (DAVI). (Grifos acrescidos).
Foi uma vivência difícil para mim; foi difícil, porque eu vim de uma
realidade diferente. Quando iniciou o curso, a proposta de fazer a graduação
em uma região, uma cidade fora da nossa, eu ainda era muito jovem. Para
221
mim, foi muito difícil o fato de estar longe, de passar muito tempo longe da
família, de estar vivenciando, fazendo um curso intenso de horas por dia, de
estar em sala de aula, tudo era novo, ainda mais por ser Matemática, um
curso que exigia mais. No primeiro ano, o impacto foi maior, por conta da
distância, e porque as disciplinas do primeiro ano do curso foram mais
diversificadas, não foram tão específicas da área de Matemática. Mas o fato
de estar longe mesmo, de sair, se deslocar, passar muito tempo fora, dormir e
acordar no local que vai estudar foi difícil, mesmo [...]. (JOSCICLEIDE).
[...] a princípio, foi um desafio, foi difícil deixar a família, deixar toda a
nossa realidade aqui e encarar o curso, mas fomos com um objetivo. Claro,
foi difícil, mas com o objetivo de alcançar melhorias no aprendizado para
também trazer paro o nosso meio socioprofissional o aprendizado nosso que
adquirisse lá naquele período. (EVAL).
Analisando ainda parte dessa categoria, uma fala chama a atenção quando a
professora/estudante fala da dificuldade que viveu quanto ao formato dos cursos, pois, mesmo
com dezoito anos de trabalho em uma EFA, considerou difícil o fato de permanecer durante
muitos dias fora de casa e deixar suas filhas. Ainda que tenha feito tais observações, ressaltou
a relevância dessa formação inicial para a sua vida pessoal e profissional.
Essa narrativa merece uma reflexão quanto ao momento de chegada dos adolescentes,
jovens ou adultos nos CEFFAs, pois, provavelmente, eles chegam à escola com essa mesma
“carga de emoções”, afinal, deixam suas famílias, seu meio sociocultural, e passam a viver em
regime de internato, muitas vezes convivendo com pessoas de culturas diferentes, dividindo
os mesmos espaços, as mesmas tarefas, entre outras especificidades próprias do internato,
como também dessa faixa etária, sem desconsiderar o processo de formação/escolarização.
Pensando nas questões acima, Gimonet (2007, p. 105), ao tratar dos componentes de
uma situação em formação, entre os quais, a família e o ambiente de vida, afirma que cada
educando pertence a uma cultura, portanto: “A escola, a atividade pedagógica, não escapa
desta pertença. Quando não é considerada surge um corte entre a vida e a escola, e cria-se
222
uma distância entre elas do ponto de vista cultural, com todas as conseqüências conhecidas
como o fracasso escolar e a confusão que traz”.
Como visto, muito embora a professora/estudante tenha destacado suas dificuldades
no campo pessoal, para a maioria dos professores/estudantes a forma como os cursos foram
organizados não apresentou dificuldades e, desse modo, facilitou o processo de aprendizagem.
Todos destacaram que os conhecimentos aprendidos durante as aulas, no regime de
internato, ao retornarem para as suas escolas, eram colocados em prática e, por se tratar de
uma formação na qual eles se encontravam em plena atividade docente, uma entrevistada
destaca: “[...] uma coisa é estudar se preparando para futuramente assumir uma profissão,
outra coisa está se preparando dentro da profissão” (RAIMUNDA).
Além desse aspecto, evidenciaram a questão da convivência entre os colegas ao trocar
ideias, preocupações, experiências, e, o mais importante, o que havia de comum entre eles, o
que os unia: suas histórias de vida marcadas por resistências e não mais a história da opressão,
do silenciamento ou da segregação social, racial, étnica, territorial, mas “[...] histórias de
afirmação da diversidade, da memória, de identidades, valores e tradições coletivas”
(ARROYO, 2008, p. 27).
As narrativas dos entrevistados, por sua vez, também nos remetem às reflexões de
Molina (2009), ao afirmar que a educação do campo é indissociável da luta pela terra, pela
reforma agrária e, à medida que esses sujeitos sociais trazem consigo o sonho da posse da
terra e começam a romper com o latifúndio do saber construído historicamente por uma
parcela hegemônica da sociedade brasileira, constata-se, por meio dessa formação inicial,
outros sonhos, outros objetivos e, neste sentido, acabam impulsionando o desejo de aprender e
apreender ainda mais, expresso pelos entrevistados, quando questionados se o formato dos
cursos facilitou ou/não o processo de aprendizagem.
Sim, com certeza facilitou pelo convívio e por ser um grupo da minha
realidade, então eram pessoas que vinham do movimento, pessoas do
sindicato, pessoas que trabalham com a questão da terra. Então, essa
relação estava bem próxima, pessoas de cidades, de municípios
diferentes, porém com o mesmo objetivo. Eu não estava em uma turma de
pessoas que eram filhos de grandes produtores, não, pois todos tinham assim
a realidade, objetivos e sonhos parecidos. Então, isso impulsionou, deu mais
vontade de prosseguir, isso facilitou a aprendizagem, a realidade de todos
era bem semelhante e os sonhos também. Estávamos todos nós no mesmo
patamar, na mesma busca. Então, não tinha ninguém com algo maior que a
gente de local diferente, falávamos a mesma língua. (JOCICLEIDE). (Grifos
acrescidos).
223
Essas narrativas nos remetem, mais uma vez, às reflexões do Prof. Miguel Arroyo
(2008), quando ele trata das estratégias de formação oportunizadas pelos programas ou
projetos de formação: ofertar mais espaços às narrativas coletivas, visto que a tradição oral se
faz bastante presente na vida-formação desses coletivos diversos, ou seja, dos “velhos-novos
narradores”, como ele denomina os sujeitos dos movimentos sociais.
224
Ajudou bastante, até porque não ficava tão pesado para a gente como é nas
universidades hoje, nas faculdades que você tem a obrigação de estar todos
os dias naquele horário [...] Lá eu estava voltada só para isso, e meus
colegas também. Era tanto que a gente esquecia algumas coisas da escola, a
gente lá só lembrava de fazer as atividades de lá. Então, isso nos fortaleceu,
porque eu aprendi mais sobre meu trabalho. Se esse curso tivesse acontecido
como nas universidades comuns, em faculdade comum, não tinha dado tão
certo [...] (Grifos acrescidos) (ERIKA). (Grifos acrescidos).
Outra dificuldade, essa que estou colocando que é a parte mais político-
social dentro do curso, pois ela não existia, tanto que a gente teve alguns
atritos com alguns professores e foram atritos fortes porque, tudo bem, era
uma posição e parecia ser uma posição pessoal deles: a maneira de encarar
os problemas da sociedade, a maneira de encarar o enfrentamento desses
problemas. Todo mundo tem direito de ser como é mais numa sala de aula
quando a gente está trabalhando na questão de formação a gente tem que
compreender que a formação cidadã tem que estar além do meu interesse
pessoal, estou no trabalho e no trabalho tenho que pensar no interesse
coletivo. Então, nesse sentindo, houve alguns atritos porque alguns
professores eram um pouco, não sei, bem conservadores, um pouco contrário
à posição de muitos dos cursistas que já vinham de experiência que não tinha
essa característica de se fechar. [...] quer dizer, que tinham uma posição
crítica dentro da sociedade e, então, isso às vezes tinha confronto, tinha
atritos. Então, acho que, em um curso desse, precisa se pensar que tipo
de educador se adapta a essa proposta, [...] não porque se deva excluir
alguém, mas porque se a gente está trabalhando uma proposta com um grupo
que está diretamente ligada às comunidades, é um grupo crítico que se
preocupa em enfrentar o problema, [...] então, isso para mim foi outro
problema (Grifos acrescidos) (RAIMUNDA). (Grifos acrescidos).
.
As considerações acima se voltam mais uma vez para as críticas do Prof. Miguel
Arroyo (2008) quando discute a questão da formação e diversidade nos programas ou projetos
de formação inicial direcionados para os “Os Diversos”, “Os outros” (ARROYO, 2008, p.
15). Para ele, assumir a diversidade como ponto de partida, na perspectiva de solucionar as
questões de cursos de formação inicial, é de fundamental importância. Contudo, se esta
dimensão formativa não for considerada em um currículo de formação de educadores
oriundos de coletivos organizados diversos, entre os quais, os educadores do campo, tais
cursos não “trarão grandes novidades”. O autor ainda argumenta:
226
[...]
[...] Infelizmente essa história não faz parte do núcleo comum dos currículos
de educação básica nem de Pedagogia ou licenciatura, apesar de ser um
núcleo estruturante de nossa formação social, política, cultural e pedagógica.
Na medida em que os programas de diversidade e formação inovarem nessa
direção, estarão ressignificando concepções de Educação Básica, de
Pedagogia e de licenciatura e de Universidade. Por aí os programas vão além
deles mesmos, indagando as concepções de educação, de docência, de
currículo e de formação hegemônica em nossos programas de formação
docente. (ARROYO, 2008, p. 13;15).
Ainda que a entrevistada tenha chamado atenção para o tipo de educador que se
encaixasse nesta proposta de cursos de formação, cursos de licenciaturas, na perspectiva de
evitar “atritos” entre professores/formadores e professores/estudantes, tais críticas fazem
pensar nas observações tecidas pela colaboradora Maria de Lourdes, destacada no capítulo
anterior, quando ela afirma que sempre chamava a atenção da Coordenação Geral de que, para
ministrar aulas nestes cursos de licenciaturas, o professor/formador teria de ter uma
identificação com o programa dos cursos. Neste sentido, não poderia ser qualquer
professor/formador, afinal, tratava-se de cursos com outro formato, voltados para um público
totalmente diferente e dos cursos habituais que a universidade oferta, quer os cursos regulares,
quer os programas/projetos especiais. Para ela, a experiência, a vivência, a prática desses
professores, “estudantes-militantes” deveria ser respeitada no decorrer do processo formativo.
O segundo elemento dificultador apontado pela entrevistada quanto ao processo de
ensino-aprendizagem, diz respeito à metodologia adotada pelos professores/formadores, que
reforça, no entender dela, a visão de educador e, de certo modo, se assemelha à concepção de
Arroyo (2008), quando discute as representações que os coletivos diversos trazem para os
cursos de formação, entre estes, o de educador. Afirma ele (2008, p. 25-26): “[...] os
estudantes e os coletivos diversos levam aos programas seu olhar e suas representações sobre
sua diversidade, sobre sua história, sobre si mesmos e sobre os processos históricos em que
suas diferenças foram hierarquizadas como desigualdades”.
227
E outra crítica minha: existiam alguns professores que realmente tinham uma
dificuldade metodológica, de repasse, de dinâmica, enquanto tinham outros
que eram fantásticos. Olha, eu lembro que tinha alguns professores que perdi
o contato, mas são pessoas admiráveis não porque combinavam com aquilo
que eu pensava, mas porque eu sentia que havia um esforço de compreensão
da maneira como a gente trabalhava e havia um respeito a isso. Então, isso
para mim é o papel do educador. Educador não tem que concordar com
o que o outro pensa, mas tem que se abrir para ver se ele está fazendo
um trabalho. Esse trabalho tem que servir para a coletividade, ele não
pode estar preocupado em pensar só na individualidade dele, como é
que ele pensa as coisas, a tarefa da gente é motivar, é fomentar o
questionamento, [...] (RAIMUNDA). (Grifos acrescidos).
.
Um aspecto dificultador apontado por uma entrevistada está relacionado com a
organização curricular dos cursos, particularmente com as chamadas Atividades
Complementares. Diz ela:
ela destaca, sem intencionalidade, não só por conta da dificuldade de acesso aos textos,
artigos, entre outros materiais, mas, sobretudo, pela sobrecarga de trabalho quando
retornavam para as suas escolas, para o desenvolvimento de suas práticas educativas
conciliando com os momentos de estudos.
Sobre isso, é fundante o questionamento desenvolvido por Arroyo (2007a, p. 21), no
momento em que discute o repensar dos conteúdos da ação educativa, da nossa docência na
condição de professores/formadores. Pergunta ele: “Como os currículos afetam o trabalho de
administrar e de ensinar e o trabalho de aprender dos educandos?” Para esse autor, essa é uma
questão central para repensar e reinventar os currículos, ou seja, para repensar o que ensinar, o
que aprender e em que lógicas.
Finalmente no tocante a essa categoria de análise, trago a fala de uma entrevistada,
bastante interessante para compreender esta formação: a pedagogia da alternância. Diz ela:
[...] quando eu saía, deixava muita atividade programada, para a pessoa que
ficava no meu lugar, geralmente era estagiário que ficava no lugar. E eu
deixava muita coisa programada e, também, quando eu estava estudando, eu
tinha os dias livres que eu dedicava ao estudo da faculdade, às atividades
complementares que a gente trazia; final de semana, encontrava o pessoal
que era da minha mesma área e fazíamos trabalho em grupo, mais ou menos
isso. (GERALDA).
231
Para outros entrevistados professores/estudantes, não foi tão tranquila, tão fácil assim
essa conciliação – formação inicial e o trabalho nas EFAs –, como asseveram:
Para conciliar, foi um pouco trabalhoso, antes de a gente sair para estudar,
tínhamos que deixar tudo em ordem, então era pouco tempo que a gente
tinha para deixar as coisas em ordem na escola, além de fazer os
trabalhos acadêmicos. Então, a dificuldade foi essa só, eu não tive
dificuldade de relacionar, pois o que aprendi lá com o que a gente trabalha
aqui e nem tampouco mudei o meu comportamento em relação às pessoas
que eu já convivia, que eu continuei sendo a mesma pessoa, então foi só isso
mesmo. (ÉRICA). (Grifos acrescidos).
[...] mas na república que a gente ficava, a gente dividia as tarefas, cada uma
tinha o dia de lavar o banheiro, varrer a casa ou de ir à feira comprar alguma
coisa para a gente lanchar, a gente tinha essas tarefas sim na república, mas,
no geral, no campus não tinha. No início se tentou, mas não deu certo. Em
minha opinião, isso provou que a gente às vezes repete o que os nossos
alunos fazem. (ERIKA).
Não, lá eu percebi que não existiu porque com uma pequena exceção só
nas casas chamadas repúblicas onde nós estávamos porque lá nós
criamos nosso calendário de tarefas internas dos moradores, ou seja,
cada um lavava a casa, passava pano, organizava seus pertences, lavava
roupa naturalmente [...] isso dentro da república, porque na parte da
refeição assim a organização dos cursos os assessores e também o pessoal
das redes entrou em negociação com os monitores achando por bem
contratar uma empresa para servir almoço, janta e café da manhã [...]
(EVAL). (Grifos acrescidos).
Por fim, para compreender esse processo formativo, foi necessário entender a relação
entre essa formação inicial e a vivência deles nas EFAs. Para o conjunto dos entrevistados,
essa relação foi possível por conta de os cursos serem em regime modular e em internato, o
que, de certa forma, lembra um pouco a pedagogia da alternância praticada pelas EFAs.
Assim se expressam:
Os trabalhos que a gente exercia, lá, faziam muito a gente pensar nas
atividades que os nossos alunos exercem aqui, nesse sentido de estar fazendo
essas tarefas que são feitas fora de aulas e são atividades de responsabilidade
deles, depois o próprio ensino que era discutido em sala de aula, as
disciplinas, muita coisa a gente conseguia associar com a prática do dia a dia
da EFA. (DAVI).
ampliaram seus conhecimentos sobre as atividades que exercem nas EFAs; por fim, se eles
sentiram dificuldade em alguma disciplina e, em caso positivo, em quais e por quê.
Sobre o primeiro questionamento, praticamente todos os entrevistados se identificaram
com as disciplinas do próprio curso que fizeram, ou seja, quem cursou História se identificou
com História do Brasil, da Bahia e até mesmo com a História da África; quem cursou
Geografia, por exemplo, se identificou com Geografia Econômica ou Política, e assim
sucessivamente. Contudo, uma única entrevistada, que cursou Matemática, se identificou com
disciplinas que não fizeram parte dos componentes curriculares do núcleo específico e, sim,
do núcleo básico, como ela justifica:
Por incrível que pareça, a minha formação foi em Matemática, mas, no início
me identifiquei com a Psicologia, por trabalhar com questões que diz
respeito ao comportamento do ser humano. Como a gente trabalha
muito com jovens, Psicologia e Oficinas Pedagógicas foram duas
disciplinas fundamentais para o exercício da educação, do para ensinar. No
ensino médio fiz magistério, mas faltou alguma coisa e na Faculdade
ofereceu Psicologia e Oficinas Pedagógicas foram disciplinas que ajudou
bastante a perceber o comportamento, o modo de lidar com os jovens o
adolescente. (JOCICLEIDE). (Grifos acrescidos).
Observa-se que as disciplinas citadas como as quais eles mais se identificaram não têm
nenhuma relação com as histórias de vida-formação desses sujeitos, professores-estudantes
militantes, ou seja, com suas representações sobre a diversidade, sobre os coletivos diversos,
entre outros sentidos que marcam as suas existências enquanto homens e mulheres,
educadores(as) do campo. Provavelmente, isso se deva à ausência de disciplinas nas matrizes
ou organizações curriculares dos cursos que tratassem do conhecimento sobre o campo, das
tensões presentes no campo brasileiro entre o latifúndio, o agronegócio e a agricultura
familiar, o que resulta muitas vezes nas mortes matadas, dos modos de produção da vida, da
cultura, das identidades, da tradição do conhecimento. Desconsiderar esses saberes em um
currículo de formação específica de educadores do campo, “[...] está fora do lugar”, como
enfatiza Arroyo (2007 b, p.167), já aqui citado no corpo deste trabalho.
Nesse sentido, foi necessário saber se os conteúdos trabalhados nas disciplinas durante
a formação ampliaram os conhecimentos deles, como também quais dessas disciplinas se
aproximaram mais do trabalho docente, ou, como são chamados, monitores/formadores,
desenvolvidos por eles em uma EFA. Em relação à primeira questão, todos os entrevistados
afirmaram que, de fato, os conteúdos trabalhados nas disciplinas pelos
professores/formadores, ampliaram sobremaneira os conhecimentos dando-lhes mais
235
segurança, mais firmeza para o trabalho em suas escolas, para as suas atividades em sala de
aula, conforme ressaltado abaixo.
Bastante, com certeza, ampliou muito, ainda mais que a gente estava
estudando e depois voltava e continuava trabalhando aqui, ai ia alternando,
período lá no curso, período aqui na EFA. Então isso foi ajudando bastante,
a gente aprendeu mais, passou a ser mais capaz. Então se a gente tem mais
bagagem pode retransmitir com melhor qualidade. (DAVI).
Muito, muito, porque o curso técnico foi uma experiência imensa para mim
no segundo grau, e essa formação veio para ampliar, hoje trabalhando no
ensino médio, muita coisa que vi na faculdade, facilitou o meu trabalho e me
dá mais segurança para estar dentro da sala de aula. (SANDRA).
Além dos aspectos mencionados pelo conjunto dos entrevistados, destacam-se outras
abordagens no tocante à questão da ampliação dos conhecimentos possibilitados pelo estudo
dos conteúdos ministrados nas disciplinas que fizeram parte dos currículos dos cursos, afinal,
como pontua Arroyo (2007 a, p. 26): “[...] É urgente recuperar o conhecimento como núcleo
fundante do currículo e o direito ao conhecimento como ponto de partida para indagar os
currículos”. Neste caso, as duas primeiras entrevistadas chamam atenção para a dimensão
metodológica, ou seja, o fazer na sala de aula; uma terceira aponta de certa forma, uma
preocupação com o planejamento e; finalmente, uma que toca na questão da avaliação da
aprendizagem escolar.
Com certeza, a cada vez que íamos para o módulo e retornava, dava
para perceber que a forma como a gente ensinava, a forma como a gente
trabalhava em sala de aula era diferente e era uma diferença, reflexo do
que a gente aprendeu, que a gente partilhava e por aquilo que tinha dito
antes: por conviver com outras pessoas de Escolas Famílias Agrícolas e
outros que tinham experiências. Como fazíamos trabalhos juntos, aí
facilitava as trocas de experiências, a disciplina facilitava isso e
complementava com as pessoas que tinham experiências. Eu falo sempre
disso [...] (JOCICLEIDE). (Grifos acrescidos).
Verifica-se, por meio das narrativas acima, que os conteúdos presentes nos
componentes curriculares dos cursos, bem como a metodologia e a avaliação praticada pelos
professores/formadores, contribuíram, sobremaneira, para a melhoria da prática docente
desses sujeitos, professores/estudantes. Esse aspecto também é sinalizado pelas lideranças do
movimento (Thierry de Burghgrave e Joaquim Nogueira), como eles mesmos asseveram no
capítulo anterior, de que efetivamente esses cursos possibilitaram uma formação melhor aos
monitores/formadores, muito embora os cursos não tenham sido desenvolvidos nos moldes da
pedagogia da alternância e muito menos na filosofia dos CEFFAs.
Ao serem questionados sobre quais disciplinas cursadas se aproximaram do trabalho
que desenvolvem nas EFAs, já que o monitor exerce múltiplos papéis, é um polivalente no
dizer de Gimonet (2007), constatou-se que as disciplinas que integravam os próprios cursos
que eles fizeram se aproximaram do trabalho deles, sendo muito semelhantes. Quando
237
inquiridos sobre quais as disciplinas com que mais se identificaram nos cursos, uma das
respostas foi:
Eu acredito que tenha sido História do Brasil mesmo, porque aqui a gente
trabalha muitas questões que hoje passou a ser exigido, por exemplo, o
estudo afro-brasileiro, inclusive deve ser trabalhado e aí, como a gente
aprendeu bastante sobre essas coisas, aproximou do meu trabalho aqui na
escola. Eu já era professor de História, e depois do curso, da disciplina
de História do Brasil, o entusiasmo aumentou e muito (DAVI). (Grifos
acrescidos).
Contudo, duas entrevistadas destacaram que, além das disciplinas que compõem o
núcleo básico e o específico dos currículos dos cursos, são relevantes dois outros
componentes curriculares: o Estágio Supervisionado e a Oficina Pedagógica, como destacam:
É perceptível, por meio das narrativas, quão importante é o planejamento das ações
educativas e, desse modo, não cabe em um fazer, em uma ação docente comprometida com a
transformação da realidade, com a libertação e emancipação dos sujeitos sociais, de modo
especial, com os sujeitos do campo – para quem foi negado historicamente o direito ao
conhecimento construído pela humanidade, neste caso, os adolescentes, jovens ou adultos em
238
formativo. Destacam-se, a seguir, algumas falas, porque reforçam muito bem a questão em
pauta.
Olha, eu não quero generalizar, não quero ser leviano, mas tinha alguns
professores que realmente nós percebíamos que, ao repassar até na
ementa, ficavam na dúvida de falar da pedagogia da alternância. [...].
Mas dizer que alguns deles deixaram a desejar nesse aspecto, e a gente
sentia isso que eles... [...] [...] não tinham conhecimento, não tinham feito
uma leitura, ou talvez não buscaram, com os coordenadores dos cursos,
algum material para fazer essa ponte, sempre estar interligando o
conteúdo da disciplina com a pedagogia da alternância, que é isso que a
gente tem buscado fazer. Por exemplo, nós aqui trabalhamos com o tema
do método gerador, as famílias escolhem o tema e os alunos fazem um
questionário que a gente chama de Plano de Estudo, leva para casa e traz pra
responder. Isso daria muito bem pra fazer no módulo subsequente de uma
disciplina, e, ao retornar para a escola, levava uma pesquisa; no retorno do
240
Sobre as observações ou críticas tecidas pela entrevistada acima, cabe uma análise
mais aprofundada no tocante à pedagogia da alternância e seus instrumentos. No primeiro
momento, ela tece considerações aos cursos por não ter lançado mão dos instrumentos da
pedagogia da alternância, e agora ela considera que a EFA onde trabalhou não desenvolve
eficazmente os instrumentos da alternância de acordo com a formação que vivenciou e,
portanto, considerou a prática dos professores/formadores como mais avançada.
Aqui, existe uma confusão entre metodologias, técnicas ou dinâmicas de ensino-
aprendizagem no entender da entrevistada. Tal abordagem nos remete mais uma vez a Arroyo,
quando trata da pesquisa e da teorização e, na questão em particular, isso “[...] pode significar
novas indagações para a pesquisa, a reflexão, a produção teórica e para os cursos de formação
não apenas na área da docência, mas de outros perfis de profissionais demandados ou
redefinidos nessa dinâmica social” (ARROYO, 2008, p.14).
[...] com certeza mudou totalmente a minha prática, porque, quando eu vim
para cá [escola], minha formação era de magistério. Então, eu fui dando
aquilo que eu sabia, da forma que eu aprendi, como eu gostada de dar. [...] e,
depois da formação, com certeza abriu muitas janelas do conhecimento
e para os meus alunos eu percebi isso também. Inclusive, eu comecei a
fazer uma pesquisa para mim, pesquisinha com os meus alunos, para eu
mesma identificar se eu tinha mudado. Nunca escrevi isso, tenho vários
papéis guardados, mas nunca escrevi. (JOCICLEIDE). (Grifos acrescidos).
curiosidade epistemológica de que tanto fala Paulo Freire (1996) ao pesquisar e estudar, para
além do que está posto nos livros didáticos, entre outros aspectos. Daí que, ainda que tais
cursos não tenham sido ofertados nos moldes da pedagogia da alternância, já bastante
referenciada nas narrativas do conjunto dos entrevistados, tanto das lideranças do movimento
CEFFAs aqui representado pelas redes AECOFABA e REFAISA, quanto pelas narrativas dos
professores/estudantes, ficou evidente que foram muitas e significativas as mudanças
possibilitadas por esses cursos de graduação, licenciatura plenas.
Finalmente, as considerações esboçadas pelos entrevistados, expressas em suas
narrativas, dialogam com as ideias de Freire (1996) quando afirma que ensinar exige respeito
aos saberes dos educandos, reflexão crítica sobre a prática, bom senso e apreensão da
realidade. Assim, diz Freire (1996, p.30; 39; 64):
Por isso mesmo pensar certo coloca ao professor ou, mais amplamente, à
escola, o dever de não só respeitar os saberes com que os educandos,
sobretudo os das classes populares, chegam a ela saberes socialmente
construídos na prática comunitária — mas também, como há mais de trinta
anos venho sugerindo, discutir com os alunos a razão de ser de alguns desses
saberes em relação com o ensino dos conteúdos.
[...]
[...]
Não é possível respeito aos educandos, à sua dignidade, a seu ser formando-
se, à sua identidade fazendo-se, se não se levam em consideração as
condições em que eles vêm existindo, se não se reconhece a importância dos
“conhecimentos de experiências feitos” com que chegam à escola. O respeito
devido à dignidade do educando não me permite subestimar, pior ainda,
zombar do saber que ele traz consigo para a escola.
três anos foi bastante corrido, se fosse um período maior, em quatro anos, ajudaria melhor
[...]” (SANDRA).
Além dos aspectos acima evidenciados pela maioria dos entrevistados, destacam-se
outras abordagens presentes nas narrativas desses sujeitos/colaboradores da pesquisa. A
primeira delas diz respeito à mudança de alguns professores que foram ministrar aulas nesses
cursos, como asseveram: “[...] professores que compreendessem mais a pedagogia da
alternância, seus instrumentos, até para eles aproveitarem também desses instrumentos, dessas
ferramentas para dar o curso [...]” (JOCICLEIDE). A segunda abordagem está relacionada
com a pedagogia da alternância, pois, de acordo com Érika, “[...] a metodologia que os
professores/formadores usavam como eu já falei aqui, ela foi um pouco distante do que a
gente trabalha na escola”. Do mesmo modo, ressalta Terezinha:
[...] que o Estado banque isso. Porque parece que, mesmo sendo
reconhecida, (EFAs) parece que os monitores da EFAS são
extraterrestres que ninguém quer bancar. A gente tem que bancar, tem
que pagar para estudar e prestar um serviço à comunidade? É um
absurdo! Nós pagamos o primeiro curso, mas, a partir de agora, o Estado
também tem que estar envolvido, que banque porque é uma prestação de
serviço à comunidade. A gente vem prestando serviço à comunidade há
quantos anos nesta Bahia? Neste país? Tem Estados por aí que bancam
tudo, por que a gente tem que pagar para prestar um serviço às
comunidades rurais? Tudo bem se o Estado não tivesse condição, mas o
Estado tem condição de pagar outras coisas e por que não tem dinheiro
para bancar a educação para os agricultores? Agricultores que optaram
por essa maneira de estudar, porque os que estão aqui [alternantes] é
porque optaram, porque hoje nós temos escola em todo o canto. Mas os
247
jovens escolhem essa proposta porque entendem que essa proposta está
mais aproximada daquilo que eles precisam. [...] [...] [...]. (Grifos
acrescidos).
[...] eu não mudaria nada, para eu mudar, eu não deveria estar trabalhando,
para conciliar as duas coisas, pois o trabalho e o estudo foi o jeito perfeito
que encontrou, esse negócio modular, e assim exatamente comungando
com a nossa atividade; no período que a gente estava de férias, era o período
que tinha o módulo lá, exatamente para aproveitar as nossas férias e aí, no
decorrer do ano letivo, intercalava os módulos, mas tudo comungado, tudo
discutido com a nossa prática, nosso tempo na EFA. Eu acredito que foi
muito bem programado; esse formato foi ideal, deu conta de atender a
duas coisas: a formação no curso e a atividade da escola, a continuidade
da pedagogia da alternância na EFA. (DAVI). (Grifos acrescidos).
Verifica-se, através da narrativa acima, que, muito embora os cursos não tenham sido
concebidos e executados tendo como referência a filosofia dos CEFFAs, como destacaram os
diferentes sujeitos/colaboradores entrevistados, ressaltaram, no entanto, que a forma como
esses cursos de licenciaturas, voltados para o conjunto dos professores/estudantes das EFAs
da Bahia, foram organizados em regime de internato e modular, foi a possibilidade encontrada
248
para que esses sujeitos tivessem acesso ao ensino superior. Contudo, o conjunto dessas
narrativas nos remete a pensar na necessidade de construção de outro formato de cursos para a
formação de educadores do campo, especificamente para os monitores/formadores das EFAs,
que dê conta de assegurar a pedagogia da alternância e seus instrumentos didáticos enquanto
elementos norteadores de uma formação para educadores do campo.
Conforme já anunciado anteriormente, chegou-se, ao final da entrevista
semiestruturada em profundidade, solicitando dos sujeitos/colaboradores da pesquisa –
professores/estudantes – se tinham alguma consideração a fazer sobre esse processo formativo
organizado em regime modular e em internato, conciliando esta formação inicial (cursos de
graduação, nível superior) com as atividades que os monitores exercem nas EFAs, entre
outras singularidades de um curso de graduação ofertado para um conjunto de educadores que
trabalham com uma concepção de educação e de escola do/no campo diferenciada, se
comparadas com as denominadas escolas oficiais, isto é, que fazem parte dos sistemas de
ensino municipal, estadual ou federal.
Ainda que as narrativas evidenciem semelhanças quanto à melhoria dessa formação
inicial nas dimensões pessoais e profissionais, é emblemático destacar dada a sua
significância para se pensar um projeto de formação inicial para um público de educadores do
campo, seja por conta da exigência da legislação brasileira para a obtenção de um diploma de
nível superior, seja pela qualidade da formação desses profissionais que estão atuando nos
anos finais do ensino fundamental e médio integrado à educação profissional, e, mesmo com
as dificuldades já assinaladas, “[...] foi um momento valioso, vou levar para o resto da vida, o
convívio, a troca de experiência foi grande e valiosa demais, para mim enquanto pessoa,
enquanto professora, enquanto profissional, enquanto ser humano, foi muito bom mesmo”
(SANDRA).
Além da fala acima, destacam-se mais três outras narrativas, pois resume muito bem o
sentido dessa formação para o coletivo das EFAs na Bahia, evidenciado nas falas dos
professores/estudantes, sem desconsiderar as contradições e críticas aqui expostas neste
processo formativo – cursos de graduação, licenciaturas:
[...] eu acho que as considerações que vou fazer é a seguinte: foi uma
história muito bonita, mais foi muito sofrida, foi uma historia muito
bonita; agora que estamos usufruindo desse curso, dessa graduação.
Tenho usufruído bastante, até financeiramente; tenho conquistado
outros espaços, reconhecimento dentro da pedagogia da alternância, que
estou até hoje e fora. É tanto que muitos saíram, muito saíram para ter
a graduação, foi buscar a melhoria. No meu caso, não, optei por ficar,
249
Na verdade, uma coisa que deixou a gente entusiasmada foi que pessoas
de outro mundo, que não conhecia nada sobre a pedagogia da
alternância, buscou conhecer, estudou, aprofundou, passou a conhecer
de verdade e respeitavam as diferenças, respeitavam o nosso jeito,
porque passou a conhecer, porque, quando a gente conhece, a gente
respeita, tem mais facilidade de se relacionar. Eu acredito que foi uma
troca bastante interessante, porque eles também, os professores, a direção, a
coordenação, todos eles ficavam entusiasmado com o nosso trabalho, com o
trabalho da pedagogia da alternância, acredito que eles também tenham
aprendido com a gente da mesma forma que a gente aprendeu muito com
eles. Então, a mensagem é essa: foi uma troca interessante,
enriquecedora para ambos os lados. (DAVI). (Grifos acrescidos).
Confirma-se, por meio das narrativas dos entrevistados, que, apesar das dificuldades
vivenciadas durante o processo formativo, marcadas de um lado de “histórias sofridas” e, do
outro, por “histórias muito bonitas”, de trocas de interesses, de aprendizagem por parte do
coletivo, do respeito às diferenças, entre outras dimensões que um processo como esse exige,
250
foi destacada a melhoria que essa formação inicial possibilitou, tanto do ponto de vista da
vida pessoal como profissional.
Com o intuito de investigar esses cursos de formação inicial para os monitores das
EFAs, na perspectiva de ampliar os conhecimentos sobre essa alternativa de educação
diferenciada do campo, seja pela metodologia empregada de ensino-aprendizagem e, por
conseguinte, dos resultados no meio socioprofissional dos alunos/alternantes, seja na condição
de pesquisadora há uma década sobre as EFAs, não seria possível deixar de fora desta
investigação os egressos que fizeram os cursos, conforme justificado na introdução deste
capítulo, como também no capítulo metodológico.
Desse modo, buscou-se entender o que levou esses profissionais a se afastarem do
movimento EFAs após a conclusão dos cursos, como exemplificado a seguir:
elaboração de projetos de leis, de poder firmar convênios de toda ordem, inclusive, de repasse
financeiro para as EFAs. Além disso, ressalta a importância das EFAS que pratica uma
educação do campo diferenciada e que vem dando certo, entre outros aspectos, pela
proximidade com que essas escolas estabelecem com a realidade e as necessidades do homem
do campo. Por último, ressalta o seu compromisso neste primeiro semestre de retomar os
debates para revisão da lei que prevê o financiamento público para as EFAs da Bahia38, e, por
esta apresentar lacunas, necessita de uma revisão.
É oportuno ainda voltar às observações tecidas pelo colaborador Thierry de
Burghgrave, quando ele afirma que essa formação foi uma “faca de dois gumes”. Primeiro, o
movimento formou o seu quadro de monitores com vistas à melhoria do ensino nas EFAs;
segundo, havia agora um pessoal com uma arma na mão: o diploma de nível superior e o
reconhecimento enquanto profissional. Daí que, como as EFAs, do ponto de vista financeiro,
são bastante instáveis, pois praticamente sobrevivem de recursos oriundos da organização não
governamental Solidariedade Internacional dos Movimentos de Formação Rural (SIMRF), de
alguns convênios entre os Estados e a Federação, esse quadro possivelmente tenha
contribuído para muitos monitores buscarem novos empregos bem mais remunerados e de
forma regular, o que, sem sombra de dúvida, representou uma perda imensurável para o
movimento EFAs da Bahia.
Cabe aqui ainda, com base nas narrativas acima, uma reflexão sobre a questão da
formação dos educadores do campo, no sentido de evidenciar a relação da formação com o
vínculo com a terra, com os sujeitos do campo, com os processos de organização política das
comunidades. Desse modo, é importante analisar o compromisso político desses
monitores/educadores que “abandonaram” esse movimento educativo, por meio de alguns
questionamentos pertinentes para educadores vinculados às organizações sociais do campo: os
cursos reforçaram o compromisso político desses educadores? O vínculo com o movimento
foi fortalecido? A compreensão do trabalho dos educadores do campo foi problematizada?
Essas questões são emblemáticas para quem se dedica a compreender e analisar os
cursos de formação inicial, cursos de graduação, de licenciaturas, objeto desta investigação,
voltados para a formação dos monitores/formadores das EFAs, por se tratar de um movimento
educativo no qual o engajamento político, o compromisso técnico, a militância dos seus
educadores são essenciais para a transformação sociopolítica e cultural dos seus educandos.
38
A referida Lei Estadual nº 11.352, de 23 de dezembro de 2008, está citada no Capítulo 2 desta tese.
254
Conforme assinalado na introdução deste capítulo, ele está dividido em duas partes.
Nesta segunda, são analisadas as narrativas dos professores/formadores da Universidade do
Estado da Bahia (UNEB), que ministraram aulas nos cursos de formação inicial, objeto de
estudo desta tese de doutoramento. Para tanto, foi aplicado um roteiro de entrevista
semiestruturada em profundidade junto aos doze (12) professores/formadores,
sujeitos/colaboradores da pesquisa, que ministraram disciplinas nos referidos cursos de
graduação, licenciatura plena, a saber: Letras, História, Geografia, Matemática e Biologia,
sendo: quatro do currículo do núcleo básico, cinco do núcleo específico e três de estágio
supervisionado. Tais escolhas estão justificadas no capítulo metodológico e aqui retomadas.
Em relação ao núcleo básico, entrevistou os professores/formadores de Língua
Portuguesa I e II, Psicologia I e II, História da Educação e Filosofia, e, como visto, abarcou
professores com formação em distintas áreas do conhecimento. Ressalta que a professora que
ministrou História da Educação, com formação inicial em História, também foi professora de
Estágio Supervisionado nos referidos cursos e, portanto, uma conhecedora em potencial deste
processo formativo e, neste sentido, justifica mais uma vez sua escolha.
A escolha dos dois primeiros professores/formadores se justifica pelo fato de eles
terem contato por mais tempo com as turmas; contudo a escolha proposital do professor de
Filosofia justifica-se pelo fato de ele ter uma história de vida pessoal e acadêmico-científica
implicada com a luta em defesa da terra por meio da reforma agrária, uma das interfaces dos
CEFFAs.
Por sua vez, a escolha dos professores/formadores do núcleo específico se justifica não
só pelo tempo de convivência com os professores/estudantes, como também por tratar de
conteúdos específicos dos cursos ofertados, ou seja, com a formação inicial desses
profissionais em suas diferentes áreas do conhecimento: História, Geografia, Letras, Biologia
e Matemática.
Por fim, a escolha dos professores/formadores do estágio supervisionado deve-se ao
fato de esses professores/formadores terem acompanhado os professores/estudantes durante
todo o processo formativo visitando-os, inclusive, em suas escolas. Somados aos demais
professores/formadores, já citados, compõem um conjunto de sujeitos/colaboradores capazes
255
de responder aos objetivos que orientam esta pesquisa de doutoramento. A formação inicial
desses professores/formadores é a seguinte: Pedagogia, Letras e Matemática.
Desse modo, as narrativas desses sujeitos/colaboradores (professores/formadores)
evidenciariam o que representou de singular nessa formação inicial, cursos de graduação,
comparando com outros cursos de formação de que participam como professores/formadores.
E, caso tenha existido essa singularidade, como isso foi trabalhado nas disciplinas em que
atuaram, constituem elementos fundamentais para uma análise crítico-reflexiva que uma tese
de doutorado exige, como também para pensar, teórica e epistemologicamente, os cursos de
formação para educadores do campo, no caso aqui investigado, para os monitores/formadores
das EFAs da Bahia.
A idade dos professores/formadores varia de 41 a 66 anos, sendo oito (08) do sexo
feminino e quatro (04) do sexo masculino com estado civil variado: sete (07) casados, uma
(01) relação civil estável, duas (02) divorciadas e dois (02) solteiros. Quanto ao número de
filhos, vai de um a três.
No tocante à formação acadêmico-científica, os dados extraídos do roteiro das
entrevistas semiestruturadas revelam que todos cursaram Especializações (lato sensu) em
áreas correlatas com a formação inicial. Quanto à formação stricto sensu
(mestrado/doutorado), verifica-se que, do conjunto dos professores/formadores entrevistados
(12), apenas quatro tinham o título de mestre no período de desenvolvimento dos cursos. Cabe
destacar que, na atualidade, somente dois (02) professores/formadores ainda não têm o curso
de mestrado. Em relação à formação de doutorado, dois professores/formadores na época já
tinham o título de doutor e uma estava em fase de conclusão de doutoramento, concluído no
transcorrer desse processo formativo, ou seja, em 2003. Atualmente, uma
professora/formadora se encontra no doutorado com previsão de conclusão em 2015.
(ANEXO C).
Os dados descritos acima revelam que a formação acadêmico-científica dos
professores/formadores estava condizente com as exigências impostas pela legislação
educacional brasileira quando trata do nível de formação dos professores para ministrar aulas
em cursos de graduação, e, portanto, com qualificação teórico-epistemológica para formar
professores para atuarem na Educação Básica. No caso aqui, para os monitores/formadores
das EFAs que desenvolvem a prática educativa, o fazer docente em disciplinas que fazem
parte do currículo dos anos finais do ensino fundamental e do ensino médio integrado à
educação profissional, níveis de ensino ofertados pelos CEFFAs, sejam os componentes
curriculares da base nacional comum, sejam os da parte diversificada.
256
[...] como conselheira, foi eu que dei o parecer para a criação do curso
de Riacho de Santana, então, eu já conhecia informalmente, quando eu
peguei o processo... [...] [...] Conselheira do CONSU, pois eu era diretora
aqui e o projeto de criação dos cursos foi encaminhado para mim para ser a
relatora, fui eu que relatei. Aí, eu tive que aprofundar mais o estudo, fazer
uma relação entre a proposta do curso e o funcionamento dos trabalhos das
EFAs, foi assim que passei a conhecer melhor as EFAs. Inclusive, o projeto
tinha um parecer contrário da PROGRAD, e, como eu tinha uma
posição positiva em relação ao curso, o meu parecer foi analisado e o
parecer da PROGRAD derrubado, mostrando que ele devia acontecer e
como deveria acontecer. (MARIA ELVIRA). (Grifos acrescidos).
anos, ou seja, há quase quatro décadas. Chama ainda mais atenção a falta de conhecimento
sobre as EFAs por parte dos professores/formadores dos Departamentos de Educação de
Caetité e Guanambi, dada à proximidade com a sede da AECOFABA, localizada no
município vizinho de Riacho de Santana.
Por sua vez, ao serem convidados/selecionados para participarem desse processo
formativo, os professores/formadores dão início a um movimento de leitura, de pesquisa, cujo
objetivo foi conhecer a proposta político-pedagógica das EFAs e o processo de implantação
dos cursos na UNEB. Esse conhecimento se deu por meio de reuniões e seminários, contando,
inclusive, com a participação das lideranças do movimento EFAs da Bahia e do seu quadro
pedagógico.
Desse modo, são aqui trazidas várias narrativas, pelas particularidades como cada um
dos entrevistados (professores/formadores) se expressa sobre essa formação inicial e os
sentidos que cada um trouxe, ao serem selecionados/convidados para compor o quadro
docente dos cursos em um formato ainda não experienciado pela UNEB em virtude de serem
não só ofertados em regime de internato e modular, como também para um público
diferenciado.
exerce o magistério ou a prática docente nos anos finais do ensino fundamental e médio, de
que tratam as Diretrizes Curriculares citadas acima, cursos de licenciatura, de graduação
plena.
Como se vê, o conhecimento escolar enquanto um dos elementos centrais do currículo
tem sua importância na seleção e inclusão de conhecimentos relevantes e significativos, seja
para o processo de ensino-aprendizagem dos estudantes da educação básica, seja para os
cursos de formação inicial e continuada de educadores do campo ou da cidade. Contudo, não
se deve esquecer que cursos de Pedagogia ou de licenciaturas destinados aos educadores do
campo devem levar em conta, na sua organização ou reorientação curricular, “[...] as formas
de trabalho na produção camponesa, na agricultura familiar; a resistência dos povos do campo
à destruição dessas formas de produção e trabalho; a resistência a perder seus saberes sobre
essas formas de trabalho” (ARROYO, 2007 a, p. 28), em face da singularidade do público, no
caso aqui investigado, professores/estudantes das EFAs, como assinala a narrativa da
professora/formadora a seguir:
Por meio da narrativa acima, é perceptível que uma das singularidades mais marcantes
nos cursos foi exatamente o público para o qual foram destinados: os monitores/formadores,
aqui denominados de professores/estudantes. A preocupação com a formação cidadã dos
alternantes, com a formação integral personalizada, um dos pilares dos CEFFA, pois o
adolescente, o jovem, não pode ser visto como objeto da formação, mas como sujeito e autor
de sua própria formação em interação com outros elementos que ajudam na formação das
pessoas, seja no plano individual, do ‘eu’, seja no plano coletivo, do ‘nós’, sem desconsiderar
a dimensão política.
262
[...] como eles já eram pessoas que já davam aula, a facilidade que eles
tinham para dar exemplos das teorias que a gente estava discutindo
sobre Desenvolvimento e, sobretudo, sobre Aprendizagem, que foi a
segunda disciplina. Eles tinham uma facilidade surpreendente. (RITA
RAPOLD). (Grifos acrescidos).
263
[...] Esse foi um curso muito específico, ele tem uma personificação que
difere de todos os outros. Essa questão, primeiro a gente tinha alunos que
eram oriundos, alunos que eram monitores nas EFAs, eles já foram alunos
das EFAs e depois viraram monitores, o que o caracteriza aí como professor.
[...] Então, eles já vinham dessa experiência, [...]. A grande maioria foi
formada pelas próprias EFAs, mas não tinham essa formação superior.
Então, a diferença é essa. [...] O fato de eles serem alunos muito dedicados.
Acho que isso é algo que chama atenção. A própria diversidade que eles
passavam, de ter que sair de suas casas, de ter que ficarem muitos dias fora
de suas casas, trinta, quarenta dias durante o ano, era dividido em três
módulos. Às vezes até mais de trinta dias, teve módulos de mais de trinta
dias. [...] Só na fase inicial, mas a média era essa, trinta, quarenta. Durante o
ano, eram três módulos que tinham mais ou menos essa dinâmica, e eles
eram muito interessados e muito integrados entre si e empenhados no
trabalho. Com certeza, essa é uma diferença. (ANTÔNIO MUNIZ).
(Grifos acrescidos).
Bom, eram alunos, primeira turma, primeira disciplina, ou seja, eles estavam
chegando. [...] Então você imagina, eles chegavam para ficar mais de quinze
dias. Tinha professoras, tinha mães, por exemplo, que estava com crianças
muito pequeninas ainda, bebês. Eu lembro que eu dei aula com uma criança
no colo. Então, era no início, ou seja, era um grupo de professores/alunos
que estavam experimentando, que saía da condição de professor para
condição de aluno. Então, estavam experimentando. O nosso trabalho foi
muito mais nesse sentido de criar um ambiente, um ambiente que fosse
relativamente agradável para eles, que eles pudessem sentir bem dentro
daquele ambiente. Então, a gente teve muitos alunos com crise. Que
choravam, porque muito tempo fora de casa, e assim por diante [...]. Então,
foi esse o primeiro contato. Então, o que é que tem de diferente? Claro
que é bastante diferente o fato de ficarem morando lá, e intensivo, o
curso intensivo durante o período. [...] E isso foi de certo modo um
aprendizado para todo mundo, e eles começaram esse aprendizado
conosco. Bom, acho que isso que tem de particular, de diferente dos
outros cursos. Então, o início desse período de internato é traumático
frequentemente. Alguns deles têm crises, outros têm mais euforia, alguns
vão mais facilmente, outros não tão facilmente, mas eles começam a se
264
Desse modo, foi fundamental, seguindo o roteiro da entrevista, saber como essas
singularidades influenciaram na forma de os professores/formadores trabalharem as
disciplinas por eles ministradas. Identificou-se, por meio das narrativas dos entrevistados, que
foram vários os caminhos metodológicos traçados pelo conjunto desses profissionais que
ministraram os componentes curriculares nos cinco cursos, na perspectiva de dar conta dessas
singularidades.
Só para exemplificar, uma professora/formadora desenvolveu oficinas de leitura e
produção textual, como também “[...] projetos de intercâmbio cultural, porque eram
professores/alunos de lugares diferentes, com personalidade totalmente diferente e cada um
trazia o que era característico de sua terra, fosse através de poemas, fosse através de literatura
de cordel, fosse através de peça teatral” (LUCIETE). A intenção dessa atividade, segundo a
professora/formadora, “[...] era fazer com que eles [professores/estudantes] percebessem que
na obra, por exemplo, do escritor João Cabral de Melo Neto, a questão da terra estava ali
representada, como também de outros escritores e que servissem de referência para o trabalho
deles com as disciplinas de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira”. Afinal, essas obras
ressaltam a questão da luta pela posse da terra por meio de processo de reforma agrária, e,
consequentemente, seu rebatimento no cotidiano da escola, dos seus educadores e educandos
do campo.
Além das singularidades expostas acima, destaca-se outra, dadas as mudanças na
prática pedagógica da professora/formadora, provocadas pelos professores/estudantes-
militantes.
A narrativa se mostra compatível com as ideias de Freire (1996, p. 39) quando ele diz:
“[...] na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica
sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a
próxima prática”.
Constata-se aqui, mais uma vez, pelas narrativas desses sujeitos/colaboradores, o grau
de compromisso, de interesse, dedicação, camaradagem, companheirismo não visto com
muita frequência nos estudantes dos cursos regulares. Muito embora a narrativa do
professor/formador abaixo chame a atenção quanto ao nível de conhecimento desses
professores/estudantes no início dos cursos, no caso específico do curso de Biologia, todavia
percebeu mudanças significativas por conta do esforço e da dedicação por parte dos
professores/estudantes.
267
A diferença maior talvez, embora tivesse muita gente jovem na época, mas a
diferença maior era um pessoal mais vivido, digamos. Que tinham, vamos
dizer, não faziam o curso numa sequência, terminavam o segundo grau e
começavam. Ou seja, eram trabalhadores, e o curso então, ele se inseria num
processo que dividia a comida do trabalho. Eu também, quando fiz
graduação, fiz assim, ou seja, eu trabalhava. [...] Então, isso dá um outro
caráter, onde você tem que ponderar uma coisa, ponderar outra. Então, isso
de um lado faz com que a turma seja diferente. [...] Depois, vinha o
268
Destacam-se, ainda, duas falas sobre a questão em foco, por apresentar outra faceta: a
história de vida-formação e, de acordo com esses professores/formadores, essa dimensão
formativa facilitou imensamente a atividade deles.
[...] o que facilitou foi minha história de vida, pois não era diferente da
deles eu agora só estava do outro lado. Minha comunicação fluía
maravilhosamente com eles. Eu vim desse lugar e me considero privilegiada
em estar ali naquele momento porque é mais ou menos você estar de posse
de ferramentas trabalhando com alguém que, um dia, eu estive no mesmo
lugar e tinha muitas perguntas a fazer e não tinha quem responder e eu pude
responder muitas coisas a eles porque já tinha outras ferramentas me
auxiliando, que era o conhecimento maior; então, me facilitava explicar
algumas coisas [...] (EDILMA). (Grifos acrescidos).
270
Como visto, a história de vida-formação do Prof. Celso, da infância até a idade adulta
implicada com a vivência e o trabalho no campo, e o desdobramento do seu trabalho junto aos
movimentos sociais e sindicais, com a Pastoral da Terra, como ele mesmo afirma, facilitou
sobremaneira a sua atuação enquanto docente dos cursos voltados para um público que vem
dessa mesma trajetória de vida-formação, e mais, são professores de escolas do campo e
praticam uma pedagogia diferenciada bastante conhecida, familiar do entrevistado.
Já a Profª Edilma, apesar de desconhecer a proposta didático-pedagógica das EFAs,
como bem assinalou no início da entrevista, desta feita, ressalta a semelhança de sua história
de vida com os professores/estudantes, e, na condição de professora/formadora, só estava
agora do outro lado, com as “ferramentas” necessárias para responder aos anseios que um
processo formativo exige, nos moldes em que foram organizados e para os sujeitos a que
foram destinados, o que, de acordo com ela, facilitou no trabalho de formação.
Tais abordagens se voltam para a questão do conhecimento do contexto discutido por
Marcelo García (1999, p.91) quando trata da formação inicial de professores:
Ainda que a distância tenha sido considerada como um elemento dificultador por parte
dos entrevistados, é importante registrar a questão da remuneração dos professores/
formadores por hora/aula expressa nas suas falas.
[...] No mais eu acho que eles se integraram muito, não vi muitos pontos
negativos, não. A gente tinha uma remuneração que era boa, o pessoal
cumpria bem essa questão do acordo, essa questão da remuneração,
então isso ajudava pra que os professores se interessassem em ir pra lá.
(ANTÔNIO MUNIZ). (Grifos acrescidos).
[...] Outra coisa que estimulava muito a gente foi o pagamento que nós
tivemos. Eu não sei se já aconteceu de alguém se referir, mas nós fomos
muito bem pagos para aquela época, a despeito de estarmos fora da vida da
gente, quer dizer, era uma suspensão do cotidiano que nós tínhamos, era
dedicação absolutamente exclusiva para eles, porque também de noite a
gente atendia aluno, eventualmente, mas nós fomos assim, eu posso estar
enganada, mas eu acho que nós recebíamos por semana, naquela época em
2002, dois mil e quatrocentos, dois mil e seiscentos reais, era muita grana.
Acho que professor tem esse desvio de achar que “eu ensino por amor”.
Primeiro, eu ensino porque eu gosto, está certo, mas eu preciso de meu
271
dinheiro e se eu for bem paga, melhor ainda. [...] [...] [...]. (RITA RAPOLD).
(Grifos acrescidos).
O rendimento foi ótimo com seus diferenciais, mas assim, muitos que
chegaram com determinadas dificuldades nos surpreenderam nas
atividades acadêmicas; o rendimento não deixou nada a desejar de um
estudante do curso regular e, como eu disse, pelo interesse e pela
vontade, tem uns que até surpreendem e foram além do curso regular e
podem até dizer que estou desmerecendo o curso regular; não estou
desmerecendo, mas são experiências distintas que vivenciamos e vemos
que cada um possui características diferenciadas. (ANDRÉA VILAÇA).
(Grifos acrescidos).
aspectos bastante influentes na formação pessoal e profissional desses sujeitos, e isso, de certo
modo, contribuía para a participação e discussão dos temas em estudo na sala de aula, muito
embora, conforme destacou a Professora Maria Elvira, houvesse problemas com a língua culta
ou padrão.
Por sua vez, a professora/formadora abaixo destaca que a diferença está exatamente no
fato de esses professores/estudantes já estarem atuando em sala de aula, já tinham uma
caminhada, uma experiência com a docência, considerando ainda o nível de
comprometimento e responsabilidade por parte deles, diferentemente de parte dos alunos dos
cursos regulares.
Sim, porque eles vivenciavam aquilo, mas não como nossos alunos regulares
que vai lá e vive aquele momento, eles moram dentro e estão fazendo uma
coisa que é para a vida deles. [...] Outra diferença é que o curso para eles
veio para aprimorar e manter eles na EFAs, que eles precisavam fazer para
estarem atuando, e para o nosso aluno aqui é uma graduação, nem sempre
vão atuar em sala de aula. Então, o período de estágio supervisionado, para
muitos que já são professores veem como uma experiência de mudança de
atitude e outros, não, vem como uma coisa comum. O aluno daqui é mais
descomprometido e lá, não, tinha mais compromisso, aquela
responsabilidade pelo fazer dele, pois repercutia na vida dele e ela via
que uma falta dele comprometia não só a aula, mas um conjunto de
coisas. (ESMERALDA). (Grifos acrescidos).
Quando inquiridos sobre o que facilitou ou dificultou o trabalho nas EFAs, a narrativa
da Profª Maria Elvira é bastante carregada de sentidos por já ser conhecedora do
funcionamento dessas escolas por meio da sua relação pessoal com o “Trator”, o “Herói do
Sertão”, o “Gigante do Sertão”, o “Cidadão do Infinito”, como era conhecido Padre Aldo.
Contudo, ela destaca um aspecto dificultador que merece ser analisado.
Muito embora, tenha uma experiência de sala de aula, uma prática didático-
pedagógica há bastante tempo, e mesmo não se considerando uma professora que adote uma
pedagogia tradicional, tendo agora de trabalhar com esse público que trazia em sua bagagem
uma relação de pertencimento com a pedagogia da alternância, com a história de luta pela
terra, com os movimentos sociais e sindicais, de certa forma, segundo a referida
professora/formadora, isso acabou dificultando o trabalho. Por outro lado, essas questões
levaram a pensar na necessidade de ressignificar o seu saber-fazer pedagógico.
Para tanto, o movimento, marcado pela ‘escuta sensível’, pelo companheirismo de
professores/estudantes na perspectiva de encontrar “pistas” para os problemas do cotidiano da
sala de aula, contribuiu para a melhoria do processo de ensino-aprendizagem, fator
275
A narrativa da professora abaixo, embora não considere como uma questão que
dificultasse essa formação inicial, chama atenção para o papel do professor de estágio
supervisionado ao acompanhar, observar de perto a prática dos professores/estudantes em
suas salas de aula, já que o estágio aconteceu nas EFAs onde eles atuavam na condição de
professores, ou, como eles se denominam, monitores ou formadores. Desse modo, o
acompanhamento por parte dos professores/formadores de estágio supervisionado se deu
junto a todos os professores/estudantes e em todas as EFAs. Daí ela chamar atenção para o
percurso e a carga horária que tais professores/formadores fizeram para dar conta de suas
atribuições, conforme assinalado no projeto político-pedagógico dos cursos.
276
Olha, não vi dificuldades com as EFAs, porém o que era mais complicado
com os professores de estágio em Riacho de Santana, era a carga horária,
mas o trabalho era excelente. Aliás, talvez isso, a carga horária era intensa
durante o dia e isso era um ponto negativo para os alunos, para as
produções deles, embora eles estivessem dedicados integralmente àquilo.
mas não era tempo suficiente para trabalharem o texto, poderem dar
resposta a esses textos, ter aquela reflexão necessária, que precisa ler,
reler, construir e desconstruir e voltar a produzir seus textos e artigos, e
esse tempo era curto e intensivo. A carga horária de 8 horas por dia era
cansativa para os alunos e para o professor também. Nós ficávamos lá
internados, tanto alunos quanto professores. Eu, como professora de
estágio, chegava a uma EFA, tinha que observar não só o aluno de Língua
Portuguesa, mas todos os alunos de Matemática, de Biologia, de História, de
Geografia e de Letras. Se tivesse todas as áreas, eu ia e visitava todas e, em
outro momento, se chegasse o professor de Biologia, ele também observava
todos. Então, eu observava as aulas, mesmo que fosse de Matemática, não
importa, mas estava ali para observar a relação professor-aluno, eu podia não
ter conhecimento do conteúdo, mas tinha conhecimento dessas relações
práticas, de como ele estava construindo essa aula junto com o aluno, e todas
essas observações eram feitas nos planos. E aí uma coisa que dificultava era
que saíamos fazendo um city tour pelas cidades da Bahia. Eu estive, por
exemplo, de Ilhéus a Brejões, fui a Angical, vim para a região de Riacho de
Santana e fui para a divisa de Minas em uma EFA. Muitas vezes, a gente
saía durante 15 dias ou 8 dias, fazendo visitas. E isso dificultou e foi
cansativo, além do fato da interdisciplinaridade, de ter que dar conta de ir
para outra sala, e isso nos deixava preocupada porque você estava
trabalhando com o outro que não é aquele que você tem o domínio do
conteúdo. (ESMERALDA). (Grifos acrescidos).
Então o que facilitou foi esse desejo comum, eu queria ajudá-los com a
minha pouca experiência, e eles queriam receber e beber dessa pouca
experiência. Esse desejo mútuo facilitou o meu querer, porque é muita
decepção pra um educador quando ele tem uma proposta de trabalho e o
outro: – Ah, assim, não, ah, desse jeito não, ah! Pró, a gente tá cansado, ó
professora, diminua. Isso desanima, tira todo o estímulo. E eles não: –
Professora, o que é que tem mais? Manda mais que estamos pronto. Esses
gritos, assim, da liberdade, para querer aprender mais, foi muito..., colaborou
muito. Eu acho que a dificuldade pra eles e para nós também foi a questão
do deslocamento. Ter que viajar ... a distância geográfica. Acho que foi a
única coisa assim que dificultou um pouco, porque você fazer um trabalho
na sua sede é uma coisa muito simples, você sai no seu carro ou no carro do
motorista, visita dez escolas e no final da tarde você está acomodada no seu
lar. (URÂNIA). (Grifos acrescidos).
Pelo que se pôde perceber naquele momento, eles cresceram [...]; de modo
geral, eu considero muito produtivo o trabalho. Se você pegar o relatório que
vou mandar para você, como eles mudaram, porque eles tinham aquela
formação, em termo de conteúdo, em termo de pedagogia da alternância,
mas em termo de regência de classe, por exemplo, como direcionar uma
aprendizagem, eles não tinham muito. Eles eram muito leigos na questão
didática e você vê um crescimento muito bom nesse aspecto, considerando a
minha disciplina, que era na área de didática. De modo geral eles cresceram
muito, em termo de teoria e prática, se nós analisamos o curso, essa ligação
teoria/pratica, eles tinham muita prática, faltava uma teoria. (MARIA
ELVIRA).
Esse eu acho o ponto principal de todo o trabalho, porque eles traziam para
sala uma realidade, uma prática que é crua, que faltava ser lapidada, quando
você trabalha a teoria ele aprimora a prática, essa ação/reflexão/ação eu acho
que se deu de forma muito positiva no trabalho que foi feito. Acho que é o
ponto mais forte nessa formação, porque eles sabiam como fazer, mas
estavam fazendo de que forma? O pensar sobre, essa reflexão que foi
acontecer no trabalho da gente, eu acho isso o ponto máximo, eles voltarem,
e você perceber que eles traziam a vivência e depois voltavam bem
aprimorados. Eu acho isso bastante positivo. (MARIA ELVIRA).
278
Sim. Faria de novo com todo prazer, é claro que a gente teria que fazer
algumas reformulações. A experiência que nós tivemos foi muito boa, todas
essas experiências iniciais vão apontar algumas falhas que precisam ser
reformuladas, o que faz parte do processo. Então, a gente faria algumas
reformulações e também faríamos, na minha opinião, um processo mais
continuado, com a pós-graduação já atrelada a isso. Eu acho que deveria ter
outra versão desses cursos para os novos monitores das Escolas Famílias
Agrícolas, nos moldes que teve; modular, e se enclausurando durante um
período. Eu acho que foi uma experiência muito válida, com trocas de
culturas, de experiências pessoais e tudo o mais. Muito significativas tanto
para o professor, quanto para o aluno lá, o monitor, que era nosso aluno.
Então, acho que isso foi fantástico. Reformularia a estrutura curricular, acho
que isso é importante, que ainda foi feito no modelo antigo da estrutura que
nós tínhamos vigente na época, mas já passou por uma reforma do currículo.
Então, faria essa reforma curricular e mudaria algumas outras questões. E,
quem sabe, até faria isso não sendo exclusivamente em Riacho de Santana.
Acho que a gente poderia, a cada dois módulos, mudar de lugar. É claro que
seria muito complicado, mas seria muito interessante para se conhecer as
diversas experiências das Escolas Famílias Agrícolas na Bahia. (ANTÔNIO
MUNIZ).
Olha, na minha opinião, sempre a gente muda alguma coisa, não conseguiria
de fato fazer da mesma forma. Em essência, sim. Em essência, eu acho que
eu faria a mesma forma, mudaria, repensava algumas coisas que porventura
não tivessem dado certo, mas que no geral achei que tudo ali funcionou bem.
Acho que não mudaria muita coisa não. [...] Chegaram com desejo de
vencer, passar, vencer aquela batalha. Eu não sei se teria uma outra turma
que teria essa mesma disposição. [...] Quando eles se deram conta da
dificuldade que seria fazer esse curso e terminar esse curso, isso terminou
passando a ser um desafio pra eles também: “eu vou vencer e vou chegar lá”.
Aí eles contavam que os outros cursos que foram lá em Riacho de Santana e
era diferente, entendeu? Tava todo mundo lá, light, alegre, isso e aquilo, não
tinha esse sufoco que passavam aqui no curso de Matemática. Disse: Rapaz,
o outro curso é o outro curso lá, aqui é assim que a gente trabalha. Exige um
pouco mais. [...] [...] Eles já vêm com a responsabilidade grande, também. E
precisava dar resposta lá, também, à comunidade. Esse retorno. Investimento
foi feito, né? [...] [...] [...] Eu era claro para eles, dizia: Olhe, isso aqui a
gente tem que passar, não tem para onde correr, não. A gente vai passar por
isso. Passando por isso, eu me dou como feliz. Feliz, mas não satisfeito,
porque eu queria ir mais, mas, se não puder, esse daqui a gente tem que
cobrir isso, porque, para dar conta da disciplina, lá você vai precisar desses
resultados aqui e aí? O que eu sei é que eu me senti muito satisfeito em
trabalhar com eles, muito mesmo. Tinham pessoas de várias localidades
279
também. [...] [...] Então, eles formaram lá em Riacho e nós fomos para lá e aí
fizeram a festa, foi muito agradável. Foi cansativo, mas foi muito bom... E
que a gente, no dia a dia com a maioria dos alunos na graduação, a gente está
convivendo durante um curso inteiro, que o mais tempo que eles levam são
quatro anos aqui, às vezes não tem essa aproximação toda. Apesar de ter, nós
aqui somos muito assim, mas eles foram bastante diferentes. Foi muito
diferente. Aí eu fiquei muito satisfeito. [...] [...] [...] Não sei se é a
humildade, não tinha aquela coisa. Forma simples de ser, digamos assim: da
pessoa ser. É como deveria tratar todas as pessoas. Com simplicidade, com
igualdade, com respeito mútuo. Então, eu gostei muito. (LUIZ ROQUE).
Nem o dia é o mesmo, se eu dissesse que faria igual, estaria negando tudo
que eu acredito em termo de educação, eu acho que ninguém faz nada igual,
eu não sou a mesma Elvira daquela época, lógico que eu mudaria uma série
de coisas, agora não sei em relação a formato, a modalidade, poderia ser a
mesma. Agora, hoje eu já sou outra, esse ser outro me faria ser diferente, até
mesmo na minha disciplina, eu já cresci, eu falo com o pessoal que sou
idosa, mais não sou velha, então eu já mudei algumas coisas porque quero
ser nova, então, não seria exatamente nos mesmos moldes, talvez o projeto
pudesse ser modificado, elaborado, eu nunca vi em nenhum outro trabalho
um acompanhamento pedagógico tão bom quanto foi. Por exemplo,
professor de Geografia: eu não sou professora de Geografia, mas eu
acompanhei professores de Geografia, eu ia para Ribeira do Pombal, lá tinha
aluno de História, Geografia, Matemática, Ciência, e eu não sou professora
de nada disso, eu tenho uma licenciatura curta em Letras, que me dava
condições de ver mais Letras, mas eu sou pedagoga, eu ia lá ver a parte
pedagógica e o professor de Geografia, Matemática me dava um roteiro do
que eu deveria observar, eu ia para lá com esse roteiro e, mais, a análise que
o outro anterior a mim fez. Então, eu ia com uma visão, com a minha de
pedagoga e mais indicadores que o professor de Matemática me deu. Eu
nunca vi isso em lugar nenhum, eu acho que isso deveria ser mantido, pois
isso é muito singular do curso, o nosso curso é totalmente falho. (MARIA
ELVIRA)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Introduzi a escrita desta tese perguntando a mim mesma por onde começar. Agora, a
pergunta que me acompanha é: como e por onde concluir a escrita desta tese? Qual é mesmo a
minha tese? As reflexões em torno dessas questões me levaram a pensar que poderia iniciar
esta etapa final do trabalho pela minha história de vida-formação e minha implicação com o
tema e o objeto de estudo desta investigação acadêmico-científica.
Assim, minha história de vida, narrada na Introdução desta pesquisa, como visto, me
formou, do mesmo jeito que eu fui formada por ela. Foram práticas formativas marcadas,
sobretudo, por fortes escolhas, entre as quais, o pedido de demissão de uma empresa de
economia mista para tornar-me professora da educação básica e, mais tarde, o ingresso na
docência do ensino superior.
A condição de professora do curso de Pedagogia no mesmo Departamento onde fui
licenciada me instigou o desejo de penetrar no campo da pesquisa acadêmico-científica. Esse
desejo foi concretizado com a aprovação no Curso de Mestrado do PPGEduC/UNEB, na
época, pesquisando sobre as Escolas Famílias Agrícolas (EFAs), particularmente sobre a
EFA de Angical–Bahia, escola que conheci no período em que desenvolvi o Estágio
Supervisionado I do curso de Pedagogia, em um assentamento de reforma agrária nesse
mesmo município, conforme mencionado.
A vivência no campo da pesquisa estudando essa alternativa diferenciada de educação
do campo no curso de mestrado, somada às outras itinerâncias formativas no campo da
educação do campo, também já citadas, me instigou a vontade de continuar ampliando e
aprofundando minhas reflexões sobre formação de educadores do campo, em especial, sobre
uma experiência de formação inicial para os monitores das EFAs da Bahia em cinco cursos de
diferentes áreas de conhecimento – Letras, Geografia, História, Matemática e Biologia –,
bastante referenciados no corpo do trabalho, pois, afinal, trata-se do objeto de investigação
desta tese.
A opção metodológica que orientou a pesquisa foi a abordagem qualitativa ancorada
no Estudo de Caso e, mesmo não sendo um método específico de pesquisa, possibilitou lançar
mão de entrevistas semiestruturadas enquanto instrumento de pesquisa junto aos
sujeitos/colaboradores dessa investigação – professores/estudantes, professores/formadores e
coordenadoras da UNEB e do movimento EFAs da Bahia –, como também da análise
281
documental. Para tanto, foi utilizado o recurso da triangulação, que permite combinar diversos
métodos, recorrendo-se à técnica de análise de conteúdo, tendo em vista que essa abordagem
analítica possibilita que os achados da pesquisa ganhem relevância teórica por meio de
comparações textuais. Tais comparações revelam semelhanças e diferenças contidas nas
narrativas dos sujeitos/colaboradores da pesquisa, com vistas a responder às questões e aos
objetivos que orientaram a pesquisa, destacando-se, entre estes, compreender e analisar como
se deu, no percurso da história da educação brasileira, a problemática da educação do campo e
a formação de seus educadores.
A revisão da literatura que trata da educação rural no Brasil, descrita e analisada no
primeiro capítulo desta tese, revelou que a educação no meio rural se deu tardiamente e de
forma descontínua. Portanto, as primeiras iniciativas de formação escolar voltadas para as
populações que moravam e produziam no campo brasileiro, se deram nos níveis médio e
superior, em função da necessidade de mão de obra especializada para lidar com a evolução
socioagrária do País naquela época.
Como se viu, as atenções e discussões envolvendo a educação no meio rural se deram
nos anos 30/40, sob o patrocínio do Ministério da Agricultura, e, portanto, fora do alcance do
Ministério da Educação. Ainda assim, há que se destacar, nesse período, a ideia do grupo do
ruralismo pedagógico que pretendia criar escolas rurais integradas às condições locais, cuja
intenção era promover a fixação do homem ao campo, como se este fato fosse o responsável
pelo êxodo rural marcante nessa época da história brasileira.
Em relação à formação de professores como já mencionada, essa questão remonta aos
primeiros anos do tempo do Império, com os cursos de formação do magistério – as Escolas
Normais, voltadas para formar professores para atuarem tanto nas escolas da cidade quanto
nas do campo. Desse modo, os professores do meio rural, vindos da cidade, com uma visão
urbanocêntrica, identificados pelos modos de vestir, de falar, entre outras singularidades,
desenvolviam uma prática educativa que não se adaptava à vida e nem aos interesses das
comunidades rurais.
É nesse cenário que são criadas e implementadas as Escolas Normais Rurais, cuja
intenção era formar professores primários para atuarem nas escolas localizadas no meio rural,
na perspectiva de contribuir para o desenvolvimento desse lugar, por meio de ações
educativas voltadas para o homem do campo. Levavam-se em consideração as especificidades
da vida do campo, como também para o trato com a higiene e a profilaxia, elementos
importantes das discussões sobre educação e saúde desde o final do século XIX.
282
A ideia de criar escolas de formação de professores para o meio rural estava, conforme
já mencionado, ligada ao movimento denominado de ruralização do ensino, o qual teve início
nas primeiras décadas do século XX, por pensadores e intelectuais, defensores do
nacionalismo agrário. Entendiam esses pensadores ser esta a vocação histórica do nosso país
e, desse modo, viam, na educação e na formação dos professores, a alternativa para levar
adiante uma política de valorização do crescimento e do desenvolvimento de atividades
econômicas no meio rural, bem como a fixação do homem do campo no campo.
É, pois, com base nesses ideais, que nasce a experiência pioneira de formação de
professores para as escolas normais — a Escola Normal Rural de Juazeiro do Norte, no
Estado do Ceará, com início de suas atividades em 13 de março de 1934. Essa experiência
impulsionou a abertura de outras escolas, entre estas, duas no Estado da Bahia, sendo uma no
município de Feira de Santana e outra no de Caculé. No meado do século XX (1951), já
havia, em todo o território brasileiro, 112 Escolas Normais Rurais.
Constata-se, por meio dos dados descritos acima, um aumento significativo de Escolas
Normais Rurais em todo o País. Contudo, por conta da reforma do ensino de 1º e 2º Graus,
Lei nº 5.692/71, instituída no auge da ditadura militar, a maioria dessas escolas foi fechada
por conta da criação do Curso Técnico em Magistério de Nível Médio, que se manteve até a
aprovação da Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional – Lei nº 9.394/96.
Como se vê, a questão da formação de educadores do campo foi silenciada e colocada
às margens das políticas públicas de educação, por conta do fechamento dessas escolas e da
instituição de outro paradigma de educação e de formação de professores, ancorada na
pedagogia tecnicista de origem teórico-epistemológica norte-americana. Acrescenta-se ainda,
em meio a tantas aberrações cometidas pelo governo federal nessa época, a destruição da
concepção e da implementação da educação popular preconizada por Paulo Freire e pelos
movimentos sociais e culturais organizados, entre os quais o MEB e o CPC, que marcaram a
história da educação brasileira no início dos anos 60 do século XX, sobretudo pelos ideais de
educação que preconizavam, a saber: libertação, emancipação e conscientização.
Daí que somente a partir da segunda metade dos anos 90 do século passado, seja pela
aprovação da LDB 9.394/96, que trata da formação de professores, seja pela mobilização e
organização dos movimentos sociais e sindicais do campo, entre os quais, o Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a problemática em torno da formação de educadores
do campo começa a ganhar espaço. Isso ocorre tanto no âmbito da sociedade civil organizada
como das instituições, entre as quais, as universidades públicas, por meio de pesquisadores
283
sensíveis aos problemas das populações que moram e produzem no campo brasileiro, entre
estes, o do processo de escolarização e formação de professores.
Como fruto deste processo de organização e mobilização dos sujeitos sociais
residentes nos assentamentos e acampamentos das áreas de reforma agrária, nasce o Programa
Nacional de Educação na Reforma Agrária – PRONERA, em 1997, órgão ligado diretamente
ao INCRA, e este, por sua vez, integra o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).
Esse programa teve início com os cursos de alfabetização de jovens e adultos, passando
posteriormente pelos cursos de nível médio, inclusive de magistério, por conta das demandas
existentes nas áreas de reforma agrária. Tempos depois, o PRONERA passou a ofertar cursos
de graduação, seja de bacharelados ou de licenciaturas, entre os quais o de Pedagogia da
Terra. Considerado como o nascedouro do movimento brasileiro de formação de educadores
do campo, esse curso institui outra forma de organização curricular, que considera as
vivências, os saberes, os fazeres dos sujeitos do campo, imbricados com a luta pela terra, por
meio da reforma agrária e também da metodologia que orienta esses cursos de formação
inicial: regime de alternância, ou seja, Tempo-Escola e Tempo-Comunidade.
Nesse sentido, o PRONERA se tornou uma referência na construção do paradigma da
Educação do Campo, alimentando e retroalimentando os próprios movimentos sociais e
sindicais, além de setores do próprio Estado, entre estes, as universidades públicas. Há ainda a
considerar outro avanço que foi a aprovação das Diretrizes Operacionais para a Educação
Básica nas Escolas do Campo, por conta do movimento desencadeado nacionalmente,
denominado Por uma Educação do Campo. A referida diretriz traz em seus artigos várias
orientações, entre as quais, a formação de educadores do campo para o exercício da prática
pedagógica nas escolas do campo.
Ressalta-se também, quanto à formação de educadores do campo, a criação do
Programa de Apoio à Formação Superior em Licenciaturas em Educação do Campo –
PROCAMPO, enquanto uma ação da Coordenação Geral de Educação do Campo em
cumprimento às suas atribuições. Esse Programa é vinculado à Secretaria de Educação
Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI) do Ministério da Educação
(MEC), conforme tratado no Capítulo 1.
Como parte das discussões e ações materializadas por meio dos cursos de licenciaturas
do PRONERA e do PROCAMPO, é importante ressaltar o Programa Nacional de Educação
do Campo – PRONACAMPO. No conjunto dos quatro eixos que orientam essa política do
governo federal, ressalta-se o Eixo II – Formação de Professores, no qual se esboça um plano
de formação inicial, continuada e de pós-graduação para os professores das escolas do campo.
284
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Cursos de Licenciatura para os Monitores das Escolas Famílias Agrícolas do Estado da
Bahia. Salvador, 2001.
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(Org.). Pesquisas urbanas: desafios do trabalho antropológico. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,
2003. p.11-19.
VENDRAMINI, Célia Regina; AUED, Bernardete Wrublevski. Os desafios da relação
trabalho e educação na experiência do curso de especialização em Educação do Campo e
Desenvolvimento Territorial na UFSC. In: CARVALHO, Diana Carvalho; GRANDO, Beleni
Salete; BITTAR, Mariluce (Org.). Currículo, diversidade e formação. Florianópolis: Ed. da
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WEBER, Silke. Educação, Ciência e Desenvolvimento Social. In: BIANCHETTI, Lucídio;
MEKSENAS, Paulo. (Org.). A trama do conhecimento: teoria, método e escrita em ciência e
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WEREBE, Maria José. 30 anos depois: grandezas e misérias do ensino no Brasil. São Paulo:
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WERLE, Flávia Obino Corrêa; METZLER, Ana Maria Carvalho. Contextos,
institucionalização e práticas pedagógicas em Escolas Normais Rurais. In: WERLE, Flávia
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v.2. n. 1, 2006. p. 34-52.
299
APÊNDICES
300
APÊNDICE A
1. IDENTIFICAÇÃO
1.1 Nome:___________________________________________________________
( ) solteiro(a)
( ) casado(a)
( ) divorciado(a)
( ) viúvo(a)
( ) outro: ___________________________________________________________
2. FORMAÇÃO ESCOLAR
Outro ( ): ______________________________________
3. INFORMAÇÕES PROFISSIONAIS
________________________________________________________________
4. DADOS DA FORMAÇÃO
4.1.1 Como foi para você permanecer em regime de internato durante alguns períodos do curso?
4.1.4 O que você considera como dificultador dessa forma de organização do curso, ou seja, em
regime modular e em internato?
4.1.5 Como foi para você conciliar o trabalho na EFA com essa formação?
4.1.6 Existiu divisão das tarefas durante esse processo formativo da mesma forma que ocorre
nas EFAs?
4.1.7 Que relação você estabelece entre essa formação e sua vivência com a metodologia na
EFA?
4.2.1 Entre todas as disciplinas do curso, qual você mais se identificou? Por quê?
4.2.3 Das disciplinas cursadas, quais as que mais se aproximaram do seu trabalho
docente? Por quê?
4.2.4 Quais das disciplinas você sentiu mais dificuldades? Por quê?
4.2.5 O que mudou na sua prática docente após a conclusão desse curso?
4.2.7 Que relação você faz entre a metodologia ou a prática de ensino dos
professores/formadores e a sua prática docente com a pedagogia da alternância?
4.2.8 Se você tivesse que retornar a fazer esse curso, o que mudaria nele? Por quê?
4.2.9 Você tem alguma consideração a fazer sobre o curso que eu não perguntei?
Muito obrigada!!!!!!!
303
Apêndice B
1. IDENTIFICAÇÃO
a. Nome:___________________________________________________________
b. Idade: ________________
d. Estado Civil:
( ) solteiro(a)
( ) casado(a)
( ) divorciado(a)
( ) viúvo(a)
( ) outro: ___________________________________________________________
2. FORMAÇÃO SUPERIOR
Instituição: _____________________________________________________________
2.2 Pós-Graduação:
Especialização:
Mestrado:
Concluído ( ) Em curso ( )
Doutorado
Nome do Curso:_________________________________________________________
Concluído ( ) Em curso ( )
3. INFORMAÇÕES PROFISSIONAIS
3.1Instituição:
305
4.1 Você já conhecia a proposta pedagógica das EFAs antes de ingressar como
professor/formador nesses cursos de formação? Sim ( ) Não ( )
4.2 Se você respondeu sim, como foi o seu contato com essa proposta de formação inicial?
4.3 Você percebeu alguma singularidade nesses cursos comparados com outras licenciaturas
que você trabalhou ou trabalha?
4.4 Você poderia enumerar algumas dessas singularidades que lhe chamou atenção?
4.5 Como essas singularidades citadas por você influenciaram na forma de trabalhar sua
disciplina?
4.6 Como você organizou seu trabalho com a disciplina para dar conta da pedagogia da
alternância praticada pelas EFAs?
4.7 Em relação aos monitores/estudantes você percebeu alguma diferença comparados com os
estudantes dos outros cursos que você trabalha?
4.12 Se tivesse que repetir essa experiência você faria de novo no mesmo formato ou
diferente? Se diferente, como?
Muito obrigada!!!!!!!
Data: _________________________________________________________________
1.1 Ano em que deu início às primeiras conversas para a criação/fundação da Escola;
1.2 Nome das pessoas (lideranças) envolvidas no processo de criação/fundação da EFA;
1.3 Data de inauguração da EFA (ano, mês e dia);
1.4 Número de monitores, gestores que estiveram envolvidos nesta primeira fase de criação da
EFA;
1.5 Nível de ensino que a EFA oferta desde a criação/fundação da mesma (fundamental do 6º
ao 9º ano de acordo com a legislação atual?);
1.6 Pretensões futuras quanto ao nível de oferta do ensino e por quê.
2. Instalações físicas
3. Dos alternantes
4. Dos monitores
4.1 Vou extrair esses dados do questionário que apliquei quando da nossa visita no dia 16/05
à Escola. Caso que queira fornecer alguma informação quanto ao corpo docente, ou
melhor, sobre os monitores, pode ficar à vontade.
4.2 Quantos moram nas dependências da EFA.
5. Da administração/gestão
Muito obrigada!!!!!!
Sandra Regina Magalhães de Araújo
Professora da UNEB, Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação e
Contemporaneidade da UNEB
Fones: (71) 3232-1909/9687-6593
308
6.1 Ano em que deu início às primeiras conversas para a criação/fundação da Escola;
6.2 Nome das pessoas (lideranças) envolvidas no processo de criação/fundação da EFA;
6.3 Data de inauguração da EFA (ano, mês e dia);
6.4 Número de monitores, gestores que estiveram envolvidos nesta primeira fase de criação da EFA;
6.5 Nível de ensino que a EFA oferta desde a criação/fundação da mesma (fundamental do 6º ao 9º
ano de acordo com a legislação atual?);
6.6 Pretensões futuras quanto ao nível de oferta do ensino e por quê.
7. Instalações físicas
8. Dos alternantes
309
8.3 Tipo de atividades produtivas desenvolvidas pelas famílias dos alternantes/alunos (pecuária,
agricultura, etc, etc...).
9. Dos monitores
9.1 Vou extrair esses dados do questionário que apliquei quando da nossa visita no dia 07/02 à Escola.
Caso que queira fornecer alguma informação quanto ao corpo docente, ou melhor, sobre os
monitores, pode ficar à vontade.
10. Da administração/gestão
10.5 Informar outras questões/perguntas que não fizeram parte deste roteiro, mas que esta direção
considera fundamental.
Muito obrigada!!!!!!
Sandra Regina Magalhães de Araújo
Professora da UNEB, Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação e
Contemporaneidade da UNEB
Fones: (71) 3232-1909/9687-6593
310
ANEXOS
311
Anexo A
Anexo B
em anexo, tem por objetivo coletar, analisar e descrever o nível de formação dos monitores
dos CEFFAs — movimento social e popular de educação do campo — na perspectiva de
trazer para a pesquisa um panorama desta formação em âmbito nacional.
Devo esclarecer que todo o material coletado será utilizado única e exclusivamente
para fins desta pesquisa. Esclareço ainda que, em decorrência do zelo com o material a ser
coletado no desenvolvimento desta investigação, a mesma não oferece qualquer tipo de risco
para os sujeitos que dela participarão. Contudo, caso seja de vosso desejo, poderá desistir da
participação nesta pesquisa a qualquer momento sem prejuízo algum ou penalidade.
Esclareço por fim, que o meu projeto de pesquisa encontra-se devidamente aprovado
no referido Programa como também pela Banca Examinadora de minha Pré-Qualificação
ocorrida em novembro de 2010.
Portanto, para novos esclarecimentos sobre a referida pesquisa, pode entrar em contato
comigo por meio de telefones e endereço eletrônico que se encontram logo abaixo.
Na perspectiva de contar com seu consentimento para participação nesta pesquisa,
agradeço antecipadamente.
Sandra Regina Magalhães de Araújo Prof. Dr. Eduardo José Fernandes Nunes
Doutoranda do PPGEduC Orientador
Telefones: (71) 3232-1909/8184-8309
E-mail: magalhaes-araujo@uol.com.br
316
Anexo C
Formação Inicial
Nome Curso Instituição Sistema Ano de
Conclusão
Rita Rapold Psicologia UFBA Pública 1979
Fac. Filosofia,
Andréia Letras Ciências e Letras Privada 1991
de Colatina
Celso Fávero Filosofia PUC/BH Confessional 1985
Edilma Cotrim Pedagogia Univ. Fed. de Pública 1987
Viçosa
Luciete Letras UNEB Pública 1993
Lúcia Porto História Fac. Fil. Ciências Pública 1973
Antônio Muniz Geografia UFBA Pública 1996
Luiz Roque Matemática UFBA Pública 1985
Marcelo Ramos Biologia UFPE Pública 1970
Maria Elvira Pedagogia UFBA Pública 1981
Esmeralda Letras UESB Pública 1989
Urânia Matemática UESF Pública 1993
Formação Continuada
Especialização
Mestrado
Doutorado
Ano Previsto
Nome Curso Concluído/Em Ano de de Conclusão Instituição
Curso Conclusão
Rita Rapold Psicologia da Concluído 2003 PUC –
Educação SP/Confessional
Celso Fávero Sociologia Concluído 1997 Confessional
Marcelo Biologia Concluído 1991 Pública
Ramos Vegetal
Lúcia Porto História Em Curso 2015 USP/Pública
Social