Teoria Da Arte (2012)
Teoria Da Arte (2012)
Teoria Da Arte (2012)
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TEORIA DA
MODERNISMO NO SÉCULO XX
VANGUARDA
NEOVANGUARDA
PÓS-MODERNISMO
ISABEL NOGUEIRA
IMPRENSA DA
UNIVERSIDADE
DE COIMBRA
COIMBRA
UNIVERSITY
PRESS
(Página deixada propositadamente em branco)
1
E N S I N O
2 EDIÇÃO
Imprensa da Universidade de Coimbra
Email: imprensauc@ci.uc.pt
URL: http://www.uc.pt/imprensa_uc
Vendas online http://www.livrariadaimprensa.com
CONCEPÇÃO GRÁFICA
An t ó n i o B ar r o s
INFOGRAFIA
Carlos Costa
EXECUÇÃO GRÁFICA
Sersilito
ISBN
978-989-26-0144-1
ISBN Digital
978-989-26-0932-4
DOI
http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-0144-1
DEPÓSITO LEGAL
342264/12
MODERNISMO NO SÉCULO XX
VANGUARDA
NEOVANGUARDA
PÓS-MODERNISMO
ISABEL NOGUEIRA
Sumário
Prefácio..................................................................................................................... 7
Introdução.............................................................................................................. 13
Conclusão............................................................................................................. 141
Bibliografia .......................................................................................................... 147
(Página deixada propositadamente em branco)
7
P r e fác i o
Jacinto Lageira
I n t r o d u ç ão
3 Cf., por exemplo, ROUGE, Isabelle de Maison – A arte contemporânea. Mem Martins:
Editorial Inquérito, 2003, p. 118-119; CALINESCU, Matei – As cinco faces da modernidade:
modernismo, vanguarda, decadência, kitsch, pós-modernismo. Lisboa: Vega, 1999, p. 93-95.
4 Cf. WEIGHTMAN, John – The concept of the avant-garde: explorations in modernism.
London: Alcove Press Limited, 1973, p. 20.
5 Cf., por exemplo, CORAZON, Alberto (ed.) - Cine sovietico de vanguardia: Tinianov,
Kulechov, Dziga Vertov, Nedobrovo, Eisenstein. Madrid: Alberto Corazon Editor, 1971; HUESO,
Angel Luis – El cine y el siglo XX. Barcelona: Editorial Ariel, 1998.
6 Ver, por exemplo, BORIE, Monique [et al.] – Estética teatral: textos de Platão a Brecht.
Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1996.
sentido e com esta consciência não terá sucedido antes do século XIX . Ma-
tei Calinescu acredita (1987) que, do ponto de vista histórico, a vanguarda
começou por dramatizar determinados elementos constitutivos da ideia de
16
modernidade, acabando por transformá-los na “pedra angular do ethos re-
volucionário”. Segundo o mesmo autor: “Assim, durante a primeira metade
do século XIX e até mais tarde, o conceito de vanguarda — tanto política
como culturalmente — era pouco mais do que uma versão radicalizada da
Modernidade, fortemente utopianizada” 7. E, de facto, pela sua natureza o
espírito da modernidade é vanguardista na sua condição de auto-superação8.
Pensemos em primeiro lugar, de um modo relativamente sucinto, nas
ideias de moderno e de modernidade. Um Dicionário etimológico dir-nos-á
que a palavra “moderno” é oriunda do latim modernus, que significa recente,
actual, e relaciona-se com modo — agora, exactamente neste momento.
Remete-nos, pois, para uma ideia de avanço, de novo por oposição ao
antigo. Neste sentido, é aceitável que nos possamos considerar modernos
desde há muito tempo, ou até mesmo desde sempre, tomando como pa-
radigma o momento em que se concebe ou imagina algo que, de algum
modo, se situa no momento presente ou procura, inclusivamente, ultrapassar
a própria contemporaneidade. Quando falamos de “moderno” não falamos
necessariamente de Época Moderna nem de modernidade. Não obstante a
ligação entre os conceitos seja evidente, o primeiro vocábulo remete para
uma qualidade, o segundo para um período histórico 9 e, finalmente, o ter-
ceiro para um estado político, social, económico e tecnológico.
Os teóricos renascentistas italianos foram responsáveis pela aplicação do
esquema formatio/deformatio/reformatio à evolução cultural do Ocidente, que
fizeram corresponder à Antiguidade Clássica (“luminosidade resplandecente”),
17
Os séculos quinze e dezasseis constituíram um período de inovação
no domínio artístico; novos géneros, novos estilos, novas técnicas. Este
período foi fértil em “primeiras” experiências (…). A inovação era algo
de consciente apesar de, por vezes, ter sido vista como um revivalismo.
A posição formal face à inovação e ao progresso no domínio das artes
visuais é a de Vasari, com a sua teoria dos três estádios de progresso. De
um modo menos formal, este orgulho na inovação pode ser percepcionado
na sua descrição da sua própria obra em Nápoles, “os primeiros frescos
em Nápoles pintados à maneira moderna (lavorati modernamente)” 10.
(...) não tem tais vacilações; sabe perfeitamente que a teoria das artes
visuais — no sentido estrito e completo do termo — é um produto da
época renascentista. Também sabe que esta teoria da arte dos séculos XV e
XVI difere marcada e claramente das ideias que, sobre pintura e escultura,
se difundiram na Idade Média e que também se afasta, embora não tão
deliberadamente, da evolução posterior neste terreno 13.
12 Cf. BARASCH, Moshe – Teorías del arte. De Platón a Winckelmann. Madrid: Alianza
Editorial, 1999. p. 95-136.
13 Idem, ibidem, p. 95.
14 Apud PANOFSKY, Erwin – Renascimento e renascimentos na arte ocidental. Lisboa:
Editorial Presença, s.d., p. 40.
15 Escrito provavelmente em Pádua, cerca de 1398, conheceu a primeira edição em 1437.
16 Cf. CENNINI, Cennino - Le livre de l´art. Paris: Éditions Berger-Levrault, 1991, p. 30-31.
17 Cf. CHALUMEAU, Jean-Luc – As teorias da arte: filosofia, crítica e história da arte de
Platão aos nossos dias. Lisboa: Instituto Piaget, 1997, p. 31-32.
humanismo italiano. Este foi, na sua primeira fase, um movimento literário
e formal que se pautou, não só pela redescoberta da Antiguidade e das
línguas clássicas, mas também pela própria consciência da modernidade,
19
dito de outro modo, pela consciência do Renascimento18. De facto, nesta
primeira fase, ser moderno teve o mesmo significado que ser renascentista,
não obstante saibamos que a modernidade se prolongou através dos tem-
pos enquanto o Renascimento, como movimento cultural, conheceu limites
temporais relativamente específicos. De qualquer modo, assumiu enorme
importância a questão da autoconsciência do homem renascentista, que se
viu como protagonista de um novo ciclo da história e acreditou que esta
teria uma direcção única, específica 19. Na opinião de Paul Faure (1949):
28 Comparação das artes. Leonardo entendia que a pintura era superior às restantes
formas artísticas.
29 Embora Leonardo da Vinci não tenha finalizado os seus escritos, deixou-lhes uma
estrutura. Ver VINCI, Leonardo da – Tratado de la pintura. 2.ª ed. Buenos Aires: Editora
Espasa-Calpe, 1947; MAcCURDY, Edward – Les carnets de Léonard de Vinci. Paris: Éditions
Gallimard, 1987. 2 vols; ver também LESSING, Gotthold Ephraim – Laocoön: an essay on the
limits of painting and poetry. Baltimore/London: The John Hopkins University Press, 1984.
30 PANOFSKY, Erwin – Renascimento e renascimentos na arte ocidental. Op. cit., p. 39.
31 Idem, ibidem, p. 41.
Com estas reflexões não se pretende minorar a complexidade do pro-
cesso de emancipação da arte e da estética. Efectivamente, a história e a
teoria da arte estão pontuadas por avanços, retrocessos e contradições.
22
Nesta esteira, podemos tomar como exemplo a Contra-Reforma32, quando
colocou a arte ao serviço da propaganda católica. Todavia, e mesmo neste
contexto, foi inegável a desenvoltura que as obras conheceram, nomeada-
mente nos domínios das cores e das formas33. Apesar dos avanços e recuos,
como afirma Gianni Vattimo (1989): “(...) a modernidade é a época em que
se torna valor determinante o facto de ser moderno” 34. Este pressuposto
afigura-se determinante, e terá conhecido a sua origem no Renascimento.
O sentimento de modernidade e o orgulho de se acreditar ser realmen-
te moderno, culminou num aceso debate na França dos finais do século
XVII, conhecido como Querelle des anciens et des modernes35, que envolveu
personalidades como Charles Perrault 36 , Nicolas Boileau 37 e Bernard de
Fontenelle 38. O despoletar da celeuma ocorreu a 27 de Janeiro de 1687,
com a leitura do poema de Charles Perrault, Le siècle de Louis, le Grand, no
qual o autor espelhou uma crítica à adoração aos antigos, nomeadamente
a Homero e a Virgílio. Perrault e Fontenelle acreditavam na superioridade
do seu tempo, embora este último de um modo menos excessivo e mais
ponderado. O progresso das artes e das ciências no tempo de Luís XIV — o
Grand Siècle francês — tinha sido notável. Já Boileau, membro da Academia
Francesa e um dos principais representantes do classicismo, considera-
va esta posição insultuosa face aos antigos e aos escritores de mérito 39.
46 Ver CASSIRER, Ernst – Filosofia de la Ilustración. 2.ª ed. México: Fondo de Cultura
Económica, 1950.
47 BAYER, Raymond – História da estética. Op. cit., p. 157.
48 Ver APOSTOLIDÈS, Jean-Marie - Le Prince sacrifié. Théâtre et politique au temps de
Louis XIV. Paris: Les Éditions Minuit, 1985; idem - Le Roi-machine. Spectacle et politique au
temps de Louis XIV. Paris: Les Éditions Minuit, 1981.
século XVIII, com o alicerçar da sociedade burguesa e a conquista do poder
político por uma burguesia economicamente fortalecida, se originará uma
estética sistemática como disciplina filosófica, que irá produzir um novo
25
conceito de arte autónoma” 49.
Pensemos um pouco na crítica moderna de arte. O século XVIII e as
exposições de arte, os Salons – exposições oficiais das obras dos membros
da Real Academia Francesa de Pintura e Escultura, iniciados em 1667 –,
incentivaram a crítica de arte em forma de crónica escrita, ultrapassando
a tratadística classicista e as vidas dos artistas 50 . Como escreve Lionello
Venturi a este respeito (1948):
53 Ver DIDEROT, Denis – Essais sur la peinture: Salons de 1759, 1761, 1763. Paris:
Hermann, 1984.
54 Ver idem – Salon de 1765. Paris: Hermann, 1984.
55 Cf. VENTURI, Lionello – História da crítica de arte. Op. cit., p. 136; CHALUMEAU,
Jean-Luc – As teorias da arte: filosofia, crítica e história da arte de Platão aos nossos dias.
Op. cit., p. 52-53.
56 Cf. VENTURI, Lionello – História da crítica de arte. Op. cit., p. 142-143.
57 DIDEROT, Denis – Oeuvres esthétiques. Paris: Classiques Garnier, 2001, p. 532.
Quanto à razão, esta permitiria discutir os sentimentos do crítico ao
mesmo tempo que apelaria ao bom senso, estando na base da conquista
da realidade e da renovação da vida social. Em todo o juízo de gosto esta-
27
riam reunidas as experiências anteriores. O gosto seria, portanto, objectivo,
porque se basearia num conjunto de experiências individuais, ao mesmo
tempo que seria subjectivo, uma vez que assentava no sentimento do su-
jeito. A arte retiraria o ser humano da apatia e apresentava-se com uma
função educadora e moral, por conseguinte, o juízo estético estaria ligado
ao juízo moral. Os escritos dos Salons permitiam não só aferir as opiniões
dos críticos, mas também as próprias condições da arte do momento e os
prognósticos sobre as tendências do gosto. De um modo diferente dos
seus contemporâneos Joachim Winckelmann 58 e Raphäel Mengs 59, Diderot
não via a beleza absoluta, imutável e eterna na estatuária grega, ao mesmo
tempo que admirava os antigos como primitivos, não como modernos 60.
O conceito de modernidade em Friedrich Schiller, fortemente influenciado
por Kant61, prendeu-se com uma ideia de novo caminho, distinto do regres-
so à Antiguidade preconizado, por exemplo, por Winckelmann. O homem
tinha de ser educado do ponto de vista estético, nomeadamente por meio
da intervenção do instinto lúdico, para se situar harmoniosamente no mun-
do circundante, contribuindo deste modo para o progresso civilizacional 62.
De facto, segundo Elio Franzini (1995):
58 Escreveu Gedanken über die nachahmung der griechischen werke in der malerei und
bildhauerkunst (Considerações sobre a imitação das obras gregas na pintura e na escultura,
1755) e Geschichte der kunst des Alterthums (História da arte da Antiguidade, 1764).
59 Autor de Gedanken über die schönheit und über den geschmack in der malerei
(Reflexões sobre a beleza e o gosto na pintura, 1762).
60 Cf. VENTURI, Lionello – História da crítica de arte. Op. cit., p. 144.
61 Ver KANT, Immanuel – Crítica da faculdade do juízo. Lisboa: Imprensa Nacional -
Casa da Moeda, 1998.
62 Ver SCHILLER, Friedrich – Sobre a educação estética do ser humano numa série de
cartas e outros textos. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1993.
arte, território de uma forma clássica, que persiste, também no âmbito
de um estado de separação impossível de eliminar, e que constitui um
impulso formativo capaz de restituir ao homem uma unidade privada da
28
estaticidade contemplativa teorizada pelos neoclássicos 63.
71 Ver BATAILLE, Georges – Manet. Murcia: Institut Valencià d’Art Modern, 2003.
72 ZOLA, Émile – Écrits sur l’art. Paris: Gallimard, 2003, p. 133-134.
73 Cf. ALMEIDA, Bernardo Pinto de – O plano de imagem: espaço da representação
e lugar do espectador. Lisboa: Assírio & Alvim, 1996, p. 177-187.
Le déjeuner sur l’herbe, Édouard Manet, 1863.
Óleo s/tela (208 x 264cm). Colecção Musée d’Orsay,Paris.
quando ela viver por ela e para ela, o homem, — até aqui abominável,
— tendo-lhe rendido a vez, ela será poeta, também ela! (...) Trabalho
assim para me tornar visionário 74.
32
74 RIMBAUD, Arthur – Cartas do visionário e mais nove poemas. Coimbra: Fora do Texto,
1995, p. 26-31.
75 Cf. CALINESCU, Matei – As cinco faces da modernidade: modernismo, vanguarda,
decadência, kitsch, pós-modernismo. Op. cit., p. 49-52.
76 ARGAN, Giulio Carlo – Arte e crítica de arte. Op. cit., p. 27-28.
transformado radicalmente e o modo secular de ver o mundo seria obso-
leto 77. Como escreve Eric Hobsbawm (1998): “A “modernidade” reside no
carácter mutável dos tempos e não nas artes que tentaram exprimi-los” 78.
33
Na óptica de historiadores como Roland Stromberg (1988), a segunda
metade do século XIX :
77 Cf. HOBSBAWM, Eric – Atrás dos tempos: declínio e queda das vanguardas do século
XX. Porto: Campo das Letras, 2001, p. 11.
78 Idem, ibidem, p. 18.
79 STROMBERG, Roland N. – Historia intelectual europea desde 1789. Madrid: Editorial
Debate, 1990, p. 259.
80 Ver RÉMOND, René – Introdução à história do nosso tempo: do Antigo Regime aos nossos
dias. Lisboa: Gradiva, 1994; WILLIAMS, Neville; WALLER, Philip; ROWETT, John - Cronologia
do século XX. Lisboa: Círculo de Leitores, 1999.
81 Neste sentido, destacaram-se os trabalhos de Saint-Simon, Charles Fourrier, Robert
Owen, Etienne Cabet, Ebenezer Howard, entre outros.
82 ARACIL, Alfredo; RODRÍGUEZ, Delfín - El siglo XX. Entre la muerte del arte y el arte
moderno. 3.ª ed. Madrid: Ediciones Istmo, 1998, p. 21.
por isso, no entender Henri Meschonnic, exitirá um pós-modernismo mas
nunca uma pós-modernidade 83. Voltaremos a esta questão.
Do ponto de vista espiritual, a crença na esfera racional estava defi-
34
nitivamente abalada. A realidade circundante apresentava-se demasiado
abrangente e complexa para ser totalmente abarcada pelo domínio da razão,
ao mesmo tempo que o tema da “morte de Deus”, isto é, da separação da
modernidade e do cristianismo, explorava novos domínios e consequên-
cias 84 . Friedrich Nietzsche tinha sido um dos críticos mais mordazes da
filosofia tradicional, mediante uma linguagem corrosiva85. Foi também uma
influência notável para escritores modernistas, como Robert Musil, Thomas
Mann, André Gide, Paul Valéry, T. S. Eliot, entre outros 86. Mas, como se sabe,
a sensibilidade modernista estendeu-se vários domínios, como a música,
nomeadamente com Arnold Shöenberg, Igor Stravinsky, Sergei Prokofiev,
ou a dança, com Isadora Duncan, Sergei Diaghilev, entre outros. Era funda-
mental ter consciência do carácter limitativo das categorias e das estruturas
unificadoras — “ser”, “verdade”, “unidade” — intrínsecas à faculdade do
conhecimento. Por outras palavras, a razão e o sujeito não eram absolutos,
“donos de si”. Sigmund Freud, em larga medida influenciado por Arthur
Schopenhauer 87, caracterizara a vontade como ser interior, externo à razão
e, contudo, determinante da própria acção. Era deste modo demonstrado
o poder do inconsciente.
Henri Bergson, principal representante do espiritualismo francês, rejeitou
o princípio racionalista da ciência por considerá-lo estático e hostil à pró-
pria vida, apresentando como alternativa o impulso vital. Na obra Essai sur
les données immédiates de la conscience (1889) iniciou a filosofia da vida
83 Cf. MESCHONNIC, Henri – Modernité, modernité. Lagrasse: Éditions Verdier, 1988, p. 13.
84 Ver o capítulo “Modernidade, morte de Deus e utopia”. In CALINESCU, Matei – As
cinco faces da modernidade: modernismo, vanguarda, decadência, kitsch, pós-modernismo.
Op. cit., p. 64-70.
85 Ver NIETZSCHE, Friedrich – Assim falava Zaratustra: livro para todos e para ninguém.
Lisboa: Relógio D’Água, 1998; idem – Crepúsculo dos ídolos ou como se filosofa com o martelo.
Lisboa: Edições 70, 1988.
86 Cf. FOKKEMA, Douwe W. - História literária, modernismo e pós-modernismo. Lisboa:
Vega, [1983], p. 32-34.
87 Autor da obra Die welt als wille und vorstellung (O mundo como vontade e represen-
tação, 1819).
sob a forma de evolucionismo do espírito e das intuições. O impulso vital
— “élan vital” — encontrar-se-ia por toda a parte, seria a essência da alma
e do universo. O ponto mais elevado situar-se-ia na consciência humana.
35
A apreensão do mundo dar-se-ia, directamente, pela intuição — fenómeno
revolucionário e determinante para o mundo da arte, pelo seu carácter di-
recto, imediato, sem mediação. Sem recorte. Bergson refere-se a sensações
afectivas e representativas. Há uma ligação clara entre a vida do corpo e a
vida da alma, isto é, entre corpo e consciência 88. Como escreve Bergson:
“O que faz da esperança um prazer tão intenso é que o vindouro, no qual
depositamos a nossa vontade, apresenta-se-nos, ao mesmo tempo, sob uma
variedade de formas igualmente sorridentes, igualmente possíveis. (…)
A ideia do futuro possui uma infinidade de possibilidades”89. Uma primeira
definição de vanguarda?
O respeito pela autoridade pré-estabelecida entrava em declínio,
levando-nos a concordar com Peter Faulkner quando afirma (1977):
“O modernismo constitui parte de um processo histórico a partir do qual as
artes se dissociaram das convenções de Oitocentos que, progressivamente,
se assemelharam a convenções moribundas” 90. Também o crítico america-
no Clement Greenberg, colaborador activo da publicação Partisan Review
e um dos principais teóricos do modernismo, observou nesta senda (1961):
88 Cf. BERGSON, Henri – L’âme et le corps (1912). In L’énergie spirituelle: essais et con-
ferences. Paris: Hatier, 1992, p. 63.
89 Idem - Essai sur les donnés immédiates de la conscience. Op. cit., p. 7.
90 FAULKNER, Peter – Modernism. London; New York: Methuen, 1985. p. 1.
91 GREENBERG, Clement – Modernist painting. In FRASCINA, Francis; HARRIS, Jonathan
(ed.) – Art in modern culture: an anthology of critical texts. Op. cit., p. 308.
Em suma, o ponto de partida do modernismo e da vanguarda foi a própria
percepção e incorporação do moderno e da modernidade, num contexto
de crítica ao absolutismo da razão, à ordem social burguesa do século XIX
36
e ao modo tradicional de representação, directamente relacionados com a
busca de novos códigos visuais. Todavia, não se pode ignorar que diversos
artistas deste período se afastaram deliberadamente do processo social e
político, procurando apenas dentro da forma artística a modernidade. Assim,
se por um lado encontramos o comprometimento social e político de John
Ruskin, fundador do Aesthetic movement, e de William Morris; por outro
situamos o impressionismo. O Aesthetic movement surgiu como resultante
do Aesthetic discontent, pautado pelo descontentamento face ao eclectismo
artístico e ao excesso de ornamento das formas. Mas esta crise não afec-
tou somente o universo da arte. Ruskin — escritor e ideólogo socialista,
fortemente influenciado pela educação puritana e pela pintura moderna
de William Turner — sentiu-se afectado pela agressividade da civilização
industrial e pela burguesia dominante. Como tal, tornava-se imperativo lu-
tar pela dignidade da classe trabalhadora, ao mesmo tempo que se devia
valorizar o trabalho artesanal 92. A arte era algo próprio do ser humano e,
por conseguinte, devia estar expressa em todos os momentos da vida do
homem. Ruskin considerou que na Idade Média o homem teve verdadeiros
ideais artísticos. A obra The seven lamps of architecture (1849) — a sua obra
fulcral sobre arquitectura, a par de The stones of Venice (1851-1853) 93 —
evidencia a ideia do artístico como fundamental para a felicidade e para a
elevação moral da humanidade. Segundo Nikolaus Pevsner (1936):
92 Cf.
FAHR-BECKER, Gabriele – El modernismo. Barcelona: Könemann, 1996. p. 25-52.
93 Ver
RUSKIN, John – As pedras de Veneza. São Paulo: Martins Fontes, 1992; idem – The
seven lamps of architecture. London: J. M. Dent, 1956. As lâmpadas são do Sacrifício, da Ver-
dade, da Vida, da Força, da Beleza, da Recordação e da Obediência. Todas elas se revelam
profundamente simbólicas.
fundamentos sociais da arte se tinham tornado frágeis e decadentes desde
a época do Renascimento, e sobretudo desde a revolução industrial 94.
37
A beleza e a arte provinham do prazer do trabalhador no desempenho
da sua actividade. A industrialização mordaz impedia o homem de realizar
alegremente o seu ofício 95. The red house — encomendada por Morris a
Philip Webb e terminada em 1858 — foi decorada pelo próprio Morris, em
parceria com o pintor Edward Burne-Jones. Emergia o movimento Arts and
Crafts96, bem como a primeira publicação destinada a difundi-lo, a revista
The Hobby Horse. Mas, como realça Terry Eagleton (1985):
101 Cf. EISENMAN, Stephen F. – The intransigent artist or how the impressionists got their
name. In FRASCINA, Francis; HARRIS, Jonathan (ed.) – Art in modern culture: an anthology
of critical texts. Op. cit., p. 189-198; DENVIR, Bernard (ed.) – The impressionists at the first
hand. New York: Thames & Hudson, 1995, p. 9-11; THOMSON, Belinda – Impressionism:
origins, practice, reception. New York: Thames & Hudson, 2000, p.121-125.
102 Cf. CLARK, Timothy J. – The painting of the modern life. In FR ASCINA, Francis;
HARRIS, Jonathan (ed.) – Art in modern culture: an anthology of critical texts. Op. cit., p. 40-50;
SHIFF, Richard – Defining “impressionism” and the “impression”. In ibidem, p. 181-188.
A percepção imediata do momento era vital, daí o seu apreço pela fotografia
— em franco desenvolvimento desde a década de quarenta — e pela pin-
tura en plein air. Compreendiam que os resultados desta percepção rápida
40
eram distintos na fotografia e na pintura e, contrariamente aos académicos,
acreditavam que havia um lugar para a fotografia e para a pintura — para
esta nova pintura, cujo objectivo já não era a representação da realidade,
mas a recriação desta mesma realidade. Na verdade, os impressionistas
pretendiam mostrar a pintura simplesmente como pintura, como arte em si,
independente do objecto representado, tornando-se na primeira grande cisão
ao nível da arte moderna: a passagem do figurativo à abstracção. Estava-
-se perante a chamada “crise da representação”, fortemente determinada
pela fotografia e, já no final do século XIX , pelo cinema — final da função
realista/mimética da pintura e do carácter irreprodutível da obra de arte.
Num conhecido ensaio, publicado pela primeira vez em 1936 – Das
kunstwerk im zeitalter seiner technischen reproduzierbarkeit (A obra de arte
na era da sua reprodutibilidade técnica), escrito em 1935, em Paris, com
versão definitiva em 1939 –, Walter Benjamin explicou as modificações sociais
da arte, no início de Novecentos, como consequência da reprodutibilidade
técnica 103. O autor introduziu o conceito de “aura artística” — ou “relação
aurática” estabelecida entre criador e receptor/público — que, com estas
inovações, se diluiu. Esta dissolução aparecia em virtude de uma espécie
de mito que se quebrava perante a acessibilidade da singularidade e da
autenticidade — categorias fundamentais da recepção aurática. Esta nova
situação da arte foi, efectivamente, determinante na mudança do modo de
apreensão da própria obra de arte, bem como do carácter da dita obra de
arte, o que não significa necessariamente, como entendeu Benjamin, um
retrocesso. Mas denota, certamente, uma consciência de modernidade, no
repensar da vida do homem moderno, consciente da sua mortalidade e ligado
à evolução tecnológica. Mas trata-se, essencialmente, de um ensaio sobre
103 Cf. BENJAMIN, Walter – The work of art in the age of mechanical reproduction. In
FRASCINA, Francis; HARRIS, Jonathan (ed.) – Art in modern culture: an anthology of critical
texts. London: Phaidon Press, 1992, p. 297-307.
o humanismo 104. Quase numa consciência existencialista. Aliás, Benjamin
é redescoberto na sequência dos movimentos estudantis dos anos sessenta
do século XX . O próprio escreveu:
41
104 Ver KIEFER, Bernd – Crucial moments, crucial points: Walter Benjamin and the recog-
nition of modernity in the light of the avant-garde. In SCHEUNEMANN, Dietrich – European
avant-garde: new perspectives. Amsterdam/Atlanta: Editions Rodopi, 2000, p. 69-79.
105 BENJAMIN, Walter – The work of art in the age of mechanical reproduction. Op. cit., p. 302.
106 Cf. ADORNO, Theodor W. – Art, autonomy and mass culture. In ibidem, p. 74-75.
107 Cf. PALMIER, Jean-Michel – Walter Benjamin: le chiffonnier, l’ange et le petit bossu.
Préf. par Florent Perrier. Paris: Klincksieck, 2006, p. 633-635.
moderna108. Debrucemo-nos mais especificamente sobre estes movimentos
que integraram o início da corrente do modernismo.
É fulcral a questão da busca de novos códigos visuais, particularmente no
42
domínio da pintura. O pós-impressionismo caracterizou-se por ter partido
da decomposição cromática — preconizada pelos impressionistas — para
depois se debruçar sobre o valor da própria cor. A denominação foi apli-
cada pelo teórico Roger Fry, em 1910, no sentido de conseguir englobar
numa exposição por si organizada, nas Grafton Galleries (Londres), uma
geração de pintores que procuraram explorar as potencialidades cromáticas
do impressionismo 109. A pintura tornava-se definitivamente independente
do objecto retratado. Paul Cézanne, tomando o impressionismo como ponto
de partida, acabaria por desenvolver novas formas de expressão artística,
influenciando fauvistas, cubistas e expressionistas. A sua pintura pautou-se
por uma simplificação das formas — esferas, cones e cilindros — através de
pinceladas largas, firmes e vibrantes, bem como da mistura de tons quentes
com tons frios, e do contorno. Segundo Walter Hess (1961):
108 Cf. HOBSBAWM, Eric – Atrás dos tempos: declínio e queda das vanguardas do século
XX. Op. cit., p. 22-43.
109 Cf. THOMSON, Belinda – Pós-impressionismo. Lisboa: Editorial Presença, 1999, p. 6-10.
110 HESS, Walter – Documentos para a compreensão da pintura moderna. Lisboa: Livros
do Brasil, 2001, p. 25.
Sainte-Victoire, que se ergue sobre a planície de Val d’Arc. Aqui residiria
até falecer, em 1906. Esta foi a fase madura de Cézanne. O pintor procurou,
persistentemente, captar a paisagem a partir de diferentes perspectivas, mas
43
nunca imitando simplesmente. Na opinião de Rosa Alice Branco (1993),
o quadro de Cézanne tornou-se imortal, porque retém o essencial e dispensa
o acessório 111. Segundo o próprio Cézanne:
111 Cf. BRANCO, Rosa Alice – O que falta ao mundo para ser quadro. [Porto]: Edição da
Limiar, 1993, p. 9.
112 Apud HESS, Walter – Documentos para a compreensão da pintura moderna. Op. cit.,
p. 36-37.
113 CHIPP, Herschel B. [com a colaboração de Peter Selz e Joshua C. Taylor] – Teorias da
arte moderna. 2.ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 9.
Na sua correspondência podemos encontrar várias referências à predilecção
pela pintura de exterior e à necessidade de aplicação da teoria ao contacto
com a natureza. Na opinião do pintor, os museus — concretamente o Musée
44
du Louvre — seriam importantes para a documentação do artista, mas so-
mente como intermediários. A natureza seria, pois, o grande professor 114.
Georges Seurat foi outro notável pintor pós-impressionista. As suas com-
posições caracterizam-se pela grande dimensão, assim como pela utilização
da técnica do pontilhismo ou divisionismo — como o próprio preferia
chamar-lhe. Seurat empenhou grande parte dos seus esforços no estudo
da cor e na procura de um sistema teórico no qual a sua pintura pudesse
assentar. Efectivamente:
114 Ver CÉZANNE, Paul – Cézanne: os artistas falam de si próprios. Lisboa: Dinalivro,
D. L., 1993.
115 ARACIL, Alfredo; RODRÍGUEZ, Delfín - El siglo XX. Entre la muerte del arte y el arte
moderno. Op. cit., p. 42.
116 Ver GOGH, Vincent van - Correspondance complète de Vincent van Gogh, enrichie de
tous les dessins originaux. Paris: Éditions Gallimard, 1960. 3 vols.
Estas experiências artísticas, acompanhadas pela teoria e pela crítica,
foram determinantes para a constituição e fortalecimento da arte moderna
– ou modernista –, particularmente no domínio da pintura, que se convertia
45
num instrumento expressivo, libertando-se da representatividade. Deve-
mos ainda recordar a influência dos Nabis — simbolistas, continuadores
de Paul Gauguin 117 —, de Pierre Bonnard — um mágico da luminosidade
do colorido —, de Gustav Klimt — o qual, fortemente influenciado pela
ornamentação da art nouveau, revolucionou o conceito de espaço pictórico
e de perspectiva, através da fragmentação e da sobreposição de elementos
—, de James Ensor e de Edvard Munch 118 — a estonteante expressividade
e exteriorização dos sentimentos mais recônditos —, entre outros. Os três
movimentos da Sezessionen (Munique, 1892; Viena, 1897; Berlim, 1899),
desencadeados contra o academismo, o racionalismo, o naturalismo e o
próprio impressionismo – entretanto já aceite pela crítica mais conserva-
dora –, evidenciaram as rupturas de fim de século. Como observa Arthur
Danto (1997):
117 Ver GAUGUIN, Paul – Noa Noa: voyage de Tahiti. Lisboa: Assírio & Alvim, 2003.
118 Em 1892, as obras de Munch geraram grande celeuma ao serem expostas em Berlim.
A exibição seria encerrada uma semana depois de abrir, em sinal de protesto.
119 DANTO, Arthur C. – After the end of art: contemporary art and the pale of history.
Princeton: Princeton University Press, 1997, p. 8; ver também SMITH, Terry – Pour une histoire
de l’art contemporain (prolégomènes tardifs et conjecturaux). In FRONTISI, Claude (coord.)
– Histoire et historiographie. L’art du second XXe siècle. Paris: Centre Pierre Francastel, 2007.
Vol. 5/6, p. 191-215.
Portrait de l’artiste au Christ jaune, Paul Gauguin, 1890-1891.
Óleo s/tela (38 x 46cm). Colecção Musée d’Orsay, Paris.
(Página deixada propositadamente em branco)
3.
A s c at e g o r i a s d e m o d e r n i s m o e va n g ua r da
135 Cf. OSBORNE, Harold – Estética e teoria da arte. São Paulo: Editora Cultrix, 1968,
p. 265-278.
136 HARRISON, Charles – Modernismo. Op. cit., p. 19.
137 Idem, ibidem, p. 29.
138 Cf. CALINESCU, Matei – As cinco faces da modernidade: modernismo, vanguarda,
decadência, kitsch, pós-modernismo. Op. cit., p. 91-92.
diversas figuras e movimentos — de ruptura consciente com o passado
e que se projecta de modo assertivo no futuro. Contudo, os movimentos
de vanguarda caracterizaram-se pela radicalização destes pressupostos. Dito
53
de outro modo, a vanguarda espelhou o fim último do modernismo, uma
vez que se revelou de um modo mais radical e menos tolerante — em todos
os aspectos — do que a modernidade e do que o próprio modernismo.
Não esquecendo, porém, que o desconforto em relação à novidade da arte
moderna vinha-se sentindo, pelo menos, desde Gustave Courbet 139.
Podemos considerar que existiu um caminho, dentro do modernismo,
conducente à rebelião, à desconstrução, à abstracção e ao relativismo 140.
A arte torna-se crítica de si própria. Para Clement Greenberg, seria van-
guardista toda a prática artística que procedesse de uma clara intenção
consciente de chocar, de romper com determinada convenção 141. A vanguar-
da estabelecia-se como promessa de infinito, de mito de renovação total,
marcando, inclusivamente, a crise do conceito de obra de arte. O facto de
determinados movimentos artísticos irem buscar elementos a outros anteriores
não é necessariamente sinónimo de conservadorismo 142. Efectivamente, já
nos anos cinquenta do século XX Herbert Read observava (1952): “(...) um
novo contacto com a tradição pode ter um significado tão revolucionário
como qualquer originalidade de estilo ou de técnica. A validade de uma
tradição depende da retenção do elemento de sensibilidade” 143. Se num
primeiro momento, a sensibilidade modernista criticou a imitação do real,
num segundo momento evoluiu da crise da representação da realidade para
a própria abstracção. O nível da autoconsciência artística elevou-se como
nunca e a arte serviu de chamada de atenção para si própria.
139 Cf. BATTCOCK, Gregory – A nova arte. 2.ª ed. São Paulo: Editora Perspectiva, 1986,
p. 246.
140 Cf. BALAKIAN, Anna – A triptych of modernism: Reverdy, Huidobro, and Ball. In
CHEFDOR, Monique; QUINONES, Ricardo; WACHTEL, Albert (ed.) – Modernism: challenges
and perspectives. Op. cit., p. 111-112.
141 Cf. DUVE, Thierry de – Clement Greenberg entre les lignes. Op. cit., p. 81.
142 Cf. GROSS, Harvey – Parody, reminiscence, critique: aspects of modernist style. In
CHEFDOR, Monique; QUINONES, Ricardo; WACHTEL, Albert (ed.) – Modernism: challenges
and perspectives. Op. cit., p. 128-145.
143 READ, Herbert – A filosofia da arte moderna. Lisboa: Editora Ulisseia, s.d., p. 18.
A explosão vanguardista pressupôs, antes de mais, uma enorme liber-
dade expressiva, mas com um fim absolutamente determinado, ou seja,
a sensação de liberdade criadora foi direccionada na recusa do tradicional,
54
do conservador, do académico, bem como na vontade — que talvez pos-
samos classificar de indómita — de trazer algo de novo ao mundo. Esta
liberdade conquistada foi aplicada construtivamente a situações artísticas
específicas. O que salvou muitas vezes a vanguarda do niilismo foi justa-
mente este carácter destrutivo mas com um fim construtivo. Os movimentos
vanguardistas, por mais extravagantes que tenham sido, apresentaram solu-
ções que tiveram em comum o desejo de libertar o homem dos obstáculos
redutores da sua essência. A arte já não servia a religião nem o Estado,
embora, como sabemos, em alguns momentos tenha estado com este co-
nectado. Mas, sobretudo, o objecto artístico valia por si próprio e, neste
sentido, estava justificada a sua existência e necessidade144 . Na opinião
de Carlos Vidal (2002), existe na vanguarda uma vontade de verdade que
se concretiza como necessidade de contradição, ou seja, a materialização
da vanguarda ou a vanguarda tornada objecto real145. A vanguarda culmi-
naria sempre num tempo exponencial das contradições nos domínios da
produção e da recepção artísticas 146.
Theodor Adorno, na sua Aesthetische theorie (Teoria estética, 1970),
apresenta a categoria do “novo” como intrínseca à arte moderna. O “novo”
seria sinónimo de renovação dos processos evolucionistas da arte desde
a consciência da modernidade. Esta renovação apresenta-se como uma
ruptura face à tradição. Mas este “novo” não é suficientemente especificado
para poder caracterizar a arte de vanguarda. Como o mesmo autor afirma:
“O Novo obedece à pressão do Antigo que precisa do Novo para se realizar. (...)
A arte radicalmente fabricada reduz-se ao problema da sua elaboração” 147.
O “novo”, relativamente à arte de vanguarda, não conseguiria distinguir
144 Cf. ISAAK, Jo-Anna – The revolution of a poetics. In CHEFDOR, Monique; QUINONES,
Ricardo; WACHTEL, Albert (ed.) – Modernism: challenges and perspectives. Op. cit., p. 159-179.
145 Cf. VIDAL, Carlos – A representação da vanguarda: contradições dinâmicas na arte
contemporânea. Oeiras: Celta Editora, 2002, p. 3-4.
146 Cf. idem, ibidem, p. 65.
147 ADORNO, Theodor W. – Teoria estética. Lisboa: Edições 70, 1993, p. 34-39.
a moda da inovação historicamente necessária 148. O olhar sobre a arte van-
guardista tornar-se-ia livre, sem ser capaz de indicar uma saída da eventual
fatalidade do progresso. Adorno identifica a modernidade com o modernismo.
55
Como já foi anteriormente referido, a afirmação da burguesia vai permitir
um novo conceito de arte autónoma, ou seja, desvinculada da vida prática,
independente da sociedade, realizando-se a sua produção/criação e recep-
ção/fruição de modo individual 149. Os chamados movimentos históricos,
ocidentais, de vanguarda vão justamente colocar-se contra este conceito
de arte autónoma, reclamando um regresso da arte à praxis vital do seu
humano. Como adverte, no entanto, Peter Bürger (1974): “A exigência não
se refere ao conteúdo; é dirigida contra o funcionamento da arte na socie-
dade, que decide tanto sobre o efeito da obra quanto sobre o seu conteúdo
particular”150. A atitude vanguardista não se insurge especificamente contra
um estilo do passado, mas contra o afastamento e a independência entre a
arte e a vida. O objectivo da vanguarda é o de, partindo da arte, organizar
uma nova praxis vital, de modo a que a arte constitua um fim em si e não
seja propriamente portadora de uma função social, uma vez que é anulada
a separação entre a arte e a vida. Os movimentos históricos de vanguar-
da recusam ainda a produção e a recepção individual da obra de arte 151.
E é neste sentido que surge a ideia orientadora: “a arte é a vida e a vida
é a arte”.
148 Cf. BÜRGER, Peter – Teoria da vanguarda. Op. cit., p. 110. Ver JIMENEZ, Marc – Adorno
et la modernité: vers une esthétique negative. Paris: Éditions Klincksieck, 1986.
149 Cf. BÜRGER, Peter – Teoria da vanguarda. Op. cit., p. 87-88.
150 Idem, ibidem, p. 90.
151 Cf. idem, ibidem, p. 91-96.
(Página deixada propositadamente em branco)
4.
D a a r t e c o m d i r e c ç ão ú n i c a à a n t i a r t e :
fau v i s m o , e x p r e ss i o n i s m o , c u b i s m o ,
f u t u r i s m o , s u p r e m at i s m o e da da í s m o
58
O grupo fauvista recusava-se a seguir os pressupostos impressionistas
ou as determinações académicas. Ao invés, a inspiração adveio dos pós-
-impressionistas – Cézanne, Gauguin, Seurat, Van Gogh —, levando as suas
disposições ao limite 153, nomeadamente ao nível da exaltação do colorido
puro e quente aplicado em pinceladas separadas, do traçado desenfreado,
da abolição da perspectiva linear através da interpretação arbitrária dos
meios-planos de luz e de sombra, ou da negação das cores naturais dos
objectos. Henri Matisse destacou-se dos restantes companheiros ao procu-
rar estudar separadamente cada elemento da construção, a cor, o desenho,
a composição 154. Esta acabou por assentar, a partir de determinada altura,
sobre a superfície plana. Os ideais a atingir eram a pureza e a serenidade,
tornando a pintura numa “boa poltrona”. A pintura devia transportar a feli-
cidade, o prazer, e o sentimento vital com que era executada 155. Segundo
Walter Hess (1961): “As cores não pretendem exprimir nem significar nada
senão cor, mas, na medida em que representam de um modo inteiramente
puro o seu próprio valor, acentuado pelo prazer, provocam simultaneamente
de uma forma artística um fenómeno (o motivo), a partir da superfície”156.
A cor e a forma eram detentoras de uma expressividade própria, indepen-
dente do modelo. A natureza — tema principal — não estaria reproduzida
mas interpretada através da composição pictórica. As sensações subjectivas
assumiam-se como significantes do mundo real, representadas na obra
pictórica. Possivelmente as disposições radicais que serviram de base ao
fauvismo estiveram na origem do seu desaparecimento, sensivelmente dois
152 ARACIL, Alfredo; RODRÍGUEZ, Delfín - El siglo XX. Entre la muerte del arte y el arte
moderno. Op. cit., p. 75.
153 Cf., por exemplo, CHIPP, Herschel B. [com a colaboração de Peter Selz e Joshua C.
Taylor] – Teorias da arte moderna. Op. cit., p. 125-142; BÉNECH, Jean-Émile – Fauves de
France. Paris: Librairie Stock, 1954.
154 Ver MATISSE, Henri – Matisse: os artistas falam de si próprios. Lisboa: Dinalivro,
D.L., 1993.
155 Ver LUZI, Mario - L´opera di Matisse dalla rivolta “ fauve” all´ intimismo (1904-1928).
Milano: Rizzoli, 1971.
156 HESS, Walter – Documentos para a compreensão da pintura moderna. Op. cit., p. 67.
anos após o seu aparecimento: a energia fulgurante, a estética algo vaga
e incerta, o carácter experimental. Todavia, e tal como observa Herbert Read
(1952): “A possibilidade de criar uma realidade através da arte converte-se
59
realmente num aspecto importante da filosofia, porque implica em absoluto
um método positivo de reivindicação da individualidade da pessoa. A arte,
neste sentido, torna-se a evidência de liberdade mais preciosa” 157.
Sensivelmente ao mesmo tempo que o fauvismo se incrementava em
França, na Alemanha surgia o expressionismo, apesar de a denominação ter
sido inicialmente reportada a um grupo de pintores franceses associados
a Henri Matisse e, só em 1914, ter sido aplicada pelo crítico Paul Fechter a
artistas alemães, na obra Der expressionismus 158. Este movimento pautou-
-se, basicamente, pelo uso da deformação anatómica na representação
expressiva159. Devemos, no entanto, notar que esta característica existiu em
variadas formas de arte — no gótico ou no maneirismo, por exemplo —, mas
o vocábulo aplicado especificamente a um movimento estético foi apanágio
do século XX . Por outro lado, o expressionismo foi o primeiro movimento
a alcançar os terrenos da pintura, da escultura, da arquitectura, da músi-
ca, do teatro, da literatura e do cinema 160. O expressionismo reivindicava
a liberdade criativa, contra o conservadorismo e o statu-quo vigente.
Estas premissas assinalavam o ponto de partida do expressionismo alemão:
o movimento “Die Brücke” (“A Ponte”), fundado em Dresda, em 1905.
Estes artistas manifestavam-se abertamente contra a burguesia e contra
as convenções académicas. Em 1906 o grupo apresentou o seu programa:
uma declaração de intenções. O agrupamento de artistas foi fundado por
Ernst Ludwig Kirchner, Erich Heckel, Fritz Bleyl e Karl Schmidt-Rottluff,
a quem se juntariam outros, como Emil Nolde 161. Todos eles viviam inten-
samente as tensões sociais de uma Alemanha em franco desenvolvimento.
Eram inquietos, boémios e atormentados. As suas composições espelhavam
162 ARACIL, Alfredo; RODRÍGUEZ, Delfín – El siglo XX. Entre la muerte del arte y el arte
moderno. Op. cit., p. 83.
163 Ver, por exemplo, DUBE, Wolf-Dieter – The expressionists. New York: Thames &
Hudson, 2001.
Tentar ressuscitar os princípios da arte dos séculos passados só pode
conduzir à produção de obras abortadas. Assim como é impossível fazer
reviver em nós o espírito e as formas de sentir dos antigos Gregos,
61
todos os esforços tentados no sentido de aplicar os seus princípios – por
exemplo, no domínio da plástica – apenas levarão ao aparecimento de
formas semelhantes às gregas. A obra assim produzida jamais possuirá
uma alma. Esta imitação assemelha-se à dos macacos 164.
164 KANDINSKY, Wassily – Do espiritual na arte. 6.ª ed. Lisboa: Publicações Dom Qui-
xote, 2003, p. 21.
165 FOUCAULT, Michel – This is not a pipe. Berkeley [etc.]: University of California Press,
1983, p. 34.
das formas — na esteira de Arts and Crafts. O expressionismo, ao conferir
independência à cor e à matéria, foi determinante para as correntes artísticas
vindouras. Segundo Pierre Francastel (1954): “O que aparece no início do
62
século XX não é (...) o problema — negativo — da deslocação dos planos,
das formas e dos objectos tradicionais; é o da constituição de um novo
sistema de representação, positiva e integral, dos fenómenos sensíveis” 166.
O cubismo, com as suas bases teóricas e críticas, constituiu-se como um
movimento avant-garde determinante no contexto da arte do século XX .
Considera-se que uma das primeiras obras cubistas foi o célebre qua-
dro inacabado de Picasso, Les demoiselles d’Avignon, de 1907. Esta obra
parece ter surgido como crítica ou paródia a Le bain turc (1862) de Jean-
-Dominique Ingres e a Le bonheur de vivre (1905-1906), de Henri Matisse.
169 Cf. CHIPP, Herschel B. [com a colaboração de Peter Selz e Joshua C. Taylor] – Teorias
da arte moderna. Op. cit., p. 195-284.
170 Grupo de pintores franceses que trabalharam em associação informal entre 1912 e
1914. O grupo dissipou-se com o começo da I Grande Guerra. Do grupo faziam parte Picabia,
Duchamp, Gris, Delaunay, entre outros. Tinham em comum o interesse pelas questões da
proporção e da disciplina pictórica, assim como um grande apreço pelo cubismo.
171 Cf. CHIPP, Herschel B. [com a colaboração de Peter Selz e Joshua C. Taylor] – Teorias
da arte moderna. Op. cit., p. 222-223.
172 APOLLINAIRE, Guillaume – Os pintores cubistas. Lisboa: Alexandria, 2003, p. 15-16.
O quadro conheceu um impacte notável. O modelado foi praticamente abolido,
os rostos foram assemelhados a máscaras angulosas e frontais — influência
da arte africana e da arte ibérica primitiva —, as figuras foram deslocadas
64
e o espaço foi fragmentado em várias perspectivas. O conceito cubista de
reprodução de volumes como ritmos de superfícies, isto é, a representação
pictórica do tempo, tornava-se visível. A ideia de Cézanne do “observador
móvel”, ou seja, a coexistência bidimensional de vários pontos de observa-
ção, bem como a representação da natureza partindo do cilindro, da esfera
e do cone encontram-se presentes no retrato do quinteto de mulheres do
bordel no Carrer d’Avinyó.
O cubismo analítico revelou a própria problemática cubista: o questionar
da linguagem pictórica ao questionar a relação figura/fundo. Esta contradição
foi resolvida com a eliminação da figura. A tela representava o espaço no
qual o pintor organizava, pintava, riscava. O quadro deixava, deste modo,
de ser a representação do objecto para ser o próprio objecto artístico em
si. Nestas circunstâncias, tornava-se difícil identificar o título da obra com
a representação. A figura acabava por ser identificada com o universo grá-
fico. A gramática pictórica assumia-se como um fim e uma manifestação de
sentimentos. Possivelmente a invenção mais marcante foi a do papier collé
(papel colado). Picasso e Braque, entre outros cubistas, realizaram uma série
de obras com esta técnica, integrando nos seus quadros objectos achados,
tais como recortes de jornais ou bocados de papel de parede. Em 1911,
com Braque, nascia a colagem, ou montagem, que marcava a passagem da
fase analítica — a desintegração dos objectos para voltar a compô-los — à
fase sintética — síntese de vários elementos no mesmo espaço pictórico.
Na óptica de Peter Bürger (1974):
173 Serguei Eisenstein, por exemplo, atribuiu grande importância à montagem cinematográfica.
a montagem — descontando os “precursores” sempre descobertos a
posteriori — aparece historicamente ligada ao cubismo, o movimento
que dentro da pintura moderna destruiu conscientemente o sistema de
65
representação em vigor desde o Renascimento 174.
179 Cf. CHIPP, Herschel B. [com a colaboração de Peter Selz e Joshua C. Taylor] – Teorias
da arte moderna. Op. cit., p. 285-312.
180 Cf. idem, ibidem.
181 Cf. GOLDBERG, RoseLee – Performance art: from futurism to the present. [Rev. and
expanded ed.] London: Thames & Hudson, 2001, p. 11-49; GLUSBERG, Jorge – A arte da
performance. São Paulo: Editora Perspectiva, 1987, p. 11-23.
182 Cf. HUMPHREYS, Richard – Futurismo. Lisboa: Editorial Presença, 2001, p. 75-76.
183 Ver CALVESI, Domenico – Marinetti e il futurismo. Milano: Edizioni di Luca, 1994.
ortodoxo, no campo da representação, mas de uma representação mais do
que de objectos, de conceitos procedentes do campo da física, como “po-
tência”, “velocidade”, “dinamismo”, etc.” 184.
68
A obra literária/plástica de Marinetti, Zang tumb tumb (1914) teve grande
influência na orquestração das cores, dos sons e dos rumores 185. O fascínio
pelos ruídos pretendia representar-se nas próprias telas, ao mesmo tempo
que os futuristas davam concertos “ruidosos”. Os pintores futuristas tinham
por objectivo reintegrar na imagem todas as sensações, percepções, estados
de alma, vivências, associações, etc. 186. Umberto Boccioni acreditava que
a pintura devia evocar os ritmos interiores, inerentes ao sujeito. Após a
sua morte prematura, em 1916, o futurismo paulatinamente perdeu conti-
nuidade. Possivelmente o maior interesse que o futurismo teve tanto para
a vanguarda como para o pós-modernismo prendeu-se com a estreita rela-
ção com a sociedade progressista — como reacção e reflexo —, bem como
com a defesa do movimento, da acção, da interacção e da performatividade.
A posição mais radical no que se refere à busca do absoluto na arte
deveu-se possivelmente à vanguarda russa, mais especificamente, a Kasimir
Malevitch. O círculo intelectual e artístico de Moscovo, no qual Malevitch
se inseria, tinha profundo conhecimento da arte de Picasso, Matisse e
Marinetti 187. Os vanguardistas russos colocaram em causa a função da arte.
Esta serviria para denunciar, reflectir e permitir ultrapassar os conflitos
e mudanças da sociedade de então. Na sua grande maioria eram artistas
politicamente comprometidos. Malevitch foi o principal representante do su-
prematismo, ao rejeitar todo o tipo de representação e ao pretender provocar
emoções através de formas elementares e puramente geométricas. Foi com
este objectivo que pintou, entre 1913 e 1915, Quadrado negro sobre fundo
184 ARACIL, Alfredo; RODRÍGUEZ, Delfín – El siglo XX. Entre la muerte del arte y el arte
moderno. Op. cit., p. 117.
185 Ver MARINETTI, F. T. – Les mots en liberté futuriste. Lausanne: L‘Age d’Homme, 1987.
186 Cf. LISTA, Giovanni – Les avant-gardes: le futurisme. Paris: Fernand Hazan, 1985.
Vol. 1, p. 19.
187 Cf. CHIPP, Herschel B. [com a colaboração de Peter Selz e Joshua C. Taylor] – Teorias
da arte moderna. Op. cit, p. 311-369. Foi determinante o papel de coleccionadores como
Ivan Morosov e Serguei Tschoukine na divulgação das obras de arte dos fauvistas, cubistas
e futuristas.
branco, assumido como um “manifesto do suprematismo”. Arthur Danto
informa-nos que Malevitch a descreveu assim: “”No interior do quadrado
da moldura encontra-se um quadrado representado com a maior expressi-
69
vidade e de acordo com as leis da nova arte” (isto é, Suprematismo)” 188.
Aquando da Última Exposição Futurista 0,10 (1915), Malevitch publicava o
Manifesto suprematista, no qual apelidava o suprematismo de “estado supremo
da pintura”. Este manifesto dava uma resposta às críticas de Vladimir Tatline
que, com Alexander Rodtchenko fundava o construtivismo russo, mediante
o qual o artista seria colocado ao serviço da sociedade e da política, em
nome do “objectivismo”189, com a pretensão de aplicar a arte geométrica e
cinética à tipografia, à arquitectura e à produção industrial, servindo um ideal
social e político, que se materializaria na Revolução Bolchevique de 1917190.
Contudo, no entender do suprematismo, a arte não servia a religião nem
o Estado. As obras de artistas como Natalia Goncharova, Mikhail Larionov,
Olga Rozanova, valiam por si próprias e, neste sentido, estava justificada a
sua existência e necessidade191. Fugia-se, deste modo, à identidade objec-
tiva da imagem para se penetrar na criação verdadeira, na arte autónoma e
viva, plena de liberdade. A pintura pautava-se, portanto, por uma plástica
não objectiva que afirmava a sua supremacia. Esta supremacia implicava
leis próprias do novo “estado plástico”, ou seja, o novo realismo na pintura.
A vanguarda russa foi bastante profícua, interagindo nos domínios literário,
teatral, cinematográfico e, com particular evidência, no das artes gráficas.
Sabemos, na esteira de Adorno, que a obra de arte inorgânica é conotada
como vanguardista. O dadaísmo talvez seja a forma de expressão artística
que melhor cumpre esta função. A palavra “dada” 192 apareceu impressa
pela primeira vez na publicação Cabaret Voltaire, um in-quarto lançado
188 Apud DANTO, Arthur C. – After the end of art: contemporary art and the pale of
history. Op. cit., p. 166.
189 Segundo o Programa do grupo construtivista, publicado em 1920.
190 Cf. TUROWSKI, Andrzej – Modernité à la russe. Les Cahiers du Musée National d’Art
Moderne. Paris: Centre Georges Pompidou. N.º 19-20 (juin 1987), p. 110-129.
191 Cf. ISAAK, Jo-Anna – The revolution of a poetics. Op. cit.
192 Nome escolhido, ao que parece, casualmente pelo poeta romeno Tristan Tzara. Deste
autor ver TZARA, Tristan - Lampisteries précédées des sept manifestes dada. [Paris]: Éditions
Pauvert, [1963].
em Zurique — local de relativa pacatez política — a 15 de Junho de 1916.
A publicação foi, como sabemos, homónima do entretanto rebaptizado
café-concerto, dirigido pelo actor e escritor alemão, Hugo Ball que, com
70
a sua companheira, a poetisa e cantora Emmy Hennings, fundava o grupo
que aglutinaria artistas imigrados de vários pontos da Europa em guerra,
tais como Erik Satie, Hans Arp, Hans Richter, Marcel Janco, Richard Huel-
senbeck, Sophie Taeuber, Tristan Tzara, entre outros. O “Cabaret Voltaire”
tornar-se-ia no espaço das manifestações vanguardistas e radicais dos “dadas”
e, quando o espaço foi fechado, em 1917, os artistas desta comunidade
abriram uma galeria na artéria principal de Zurique – a Bahnhofstrasse –,
onde prosseguiram com as suas apresentações, e onde foram expostas obras,
por exemplo, de Wassily Kandinsky e Paul Klee 193.
A motivação destes artistas teve origem na revolta contra a guerra e
contra os valores estéticos e culturais da época. O dadaísmo foi o ponto
de encontro de algumas tendências anteriores, particularmente espelhadas
no futurismo, mas assumiu-se como atitude crítica de negação face à cres-
cente aceitação crítica e estética dos movimentos de vanguarda dos anos
anteriores, assim como perante os envolvimentos sociais e políticos destes
movimentos – nacionalismos, comprometimentos políticos. Dada foi uma
antiarte. Como escreve Herschel Chipp (1968):
193 Cf. LEMOINE, Serge - Les avant-gardes: dada. Paris: Fernand Hazan, 1986. Vol. 2, p.
23; RICHTER, Hans – Dada: art and anti-art. New York: Thames & Hudson, 2004.
194 CHIPP, Herschel B. [com a colaboração de Peter Selz e Joshua C. Taylor] – Teorias
da arte moderna. Op. cit, p. 372.
bem como da instalação plástica — nomeadamente a utilização de objectos
do quotidiano em colagens satíricas (fatagaga), fortemente incrementadas
por Max Ernst ou por Hannah Höch, as quais transformavam um pintor em
71
actor —, da mímica ou da projecção de imagens. Aliás, o cinema conheceu
obras assinaláveis, tais como, Rhythmus 21 (1921), de Hans Richter, Le retour
à la raison (1923), de Man Ray, Le ballet mécanique (1924), de Fernand
Léger e Dudley Murphy, ou Entr’acte (1924), de René Clair e Francis Picabia.
O critério dadaísta foi a transgressão de todas as fronteiras literárias e artísticas,
colocando-se a antiarte no lugar da arte. Na verdade, além da arte existiriam,
sobretudo, artistas195. Segundo o depoimento de Hans Richter (1965): “Dada
não teve uma característica formal particular, como outros estilos, mas uma
nova ética artística da qual nasceram, se bem que de uma maneira inesperada,
novas formas de expressão”196. Em Berlim, onde seria publicado em 1920 o
Almanach Dada, o movimento assumiu uma posição vincadamente política,
ao declarar-se antiprussiano, antiburguês e antiliberal, contra a República de
Weimar197. O dadaísmo estendeu-se ou surgiu em simultâneo noutras cidades
artisticamente importantes, tais como Paris, Barcelona, Genebra ou Nova Ior-
que. A Anthologie Dada seria lançada em Maio de 1919, cuja versão francesa
conheceria a colaboração de André Breton, Louis Aragon, entre outras futuras
personalidades do surrealismo, que entretanto emergia em França198. De entre
os principais movimentos de vanguarda, o dadaísmo talvez tenha sido o único
possuidor de um certo niilismo, devido ao seu carácter destruidor e iconoclasta.
Estas particularidades radicais serviriam de ruptura com a lógica convencional.
Pelos mesmos motivos que a comunidade de artistas imigrados se tinha
encontrado em Zurique – a guerra –, Marcel Duchamp e Francis Picabia
195 Cf. LYNTON, Norbert – The story of modern art. New York: Phaidon Press, 2006, p.
126-127.
196 RICHTER, Hans – Dada: art and anti-art. Op. cit., p. 9.
197 Cf. LEMOINE, Serge - Les avant-gardes: dada. Op. cit., p. 30-52.
198 O surrealismo tomou a forma de movimento a partir do Manifeste du surréalisme,
de André Breton, publicado em Dezembro de 1924 no primeiro número de La Revolution
Surréaliste. Ver BRETON, André – Manifiestos del surrealismo. Madrid: Visor Libros, 2002. Se-
gundo vários autores, a denominação “surrealismo” foi usado pela primeira vez por Guillaume
Apollinaire na apresentação do bailado Parade (1917) – coreografado por Léonide Massine,
com argumento de Jean Cocteau, música de Erik Satie e figurinos, cenários e adereços de
Picasso – quando se referia a uma arte que ultrapassava a superficialidade da aparência.
tinham partido para Nova Iorque, em 1915. Marcel Duchamp, apesar de
não se considerar propriamente dadaísta, identificou-se consideravelmente
com os pressupostos daqueles artistas no que respeita à antiarte e, entre-
72
tanto, já tinha enviado a sua obra Nu descendant un escalier n.º 2 (1912)
ao Armory Show – International Exhibition of Modern Art (1913, Nova
Iorque; mostra reduzida em Boston e Chicago), e iniciara as suas pesquisas
em torno dos ready-made, ou seja, objectos encontrados já prontos, aos
quais era acrescentado um detalhe ou um título insólitos, ou mesmo um
contexto diferenciado. Como o próprio Duchamp afirmou numa entrevista
com Pierre Cabanne (1966):
Foi sobretudo em 1915, nos Estados Unidos, que fiz outros objectos
com inscrições (…) A palavra ready-made ocorreu-me naquele momento,
e parecia bastante conveniente para essas coisas que não eram obras de
arte, não eram desenhos, e não se encaixavam em nenhum dos termos
aceites no mundo da arte 199.
199 DUCHAMP, Marcel – Marcel Duchamp: engenheiro do tempo perdido: entrevistas com
Pierre Cabanne. 2.ª ed. Lisboa: Assírio & Alvim, 1990, p. 70.
20 0 O conhecido urinol assinado “R. Mutt” – Fontaine – foi enviado ao Society of
Independent’s Show (Nova Iorque, 1917) e, apesar de as obras não poderem ser recusadas, o
júri de selecção, no qual se incluía o próprio Duchamp, resignou a obra a um local inacessível
à vista dos visitantes e não a colocou no catálogo. Fontaine, na verdade, nunca foi exposto.
O tempo convertê-lo-ia em algo substancialmente diferente.
201 BOYERS, Robert – After the avant-garde: essays on art and culture. Pennsylvania: The
Pennsylvania State University Press, 1988, p. 12.
pela vontade de reduzir o acto criativo às intenções do artista, isto é, a
arte primava sobretudo pela ideia que lhe estava subjacente, e não pelas
considerações de gosto ou pela forma plástica em que se concretizava,
73
instituindo-se como obra protoconceptual 202. Os dois números da revista
The Blind Man (1917), editada por Henri-Pierre Roché, Beatrice Wood e
pelo próprio Duchamp, propunham-se justificar os ready-made 203, tendo
conseguido também um considerável apoio por parte do coleccionador de
arte Walter Arensberg.
Thierry de Duve propõe uma releitura da Crítica da faculdade do juízo,
de Kant, pelo intermédio de Duchamp, substituindo o termo “belo” por
“arte”. Duve entende que fazer e julgar seriam equivalentes 204. O ready-made
é uma nova categoria ou um jogo? O ready-made apaga a distinção entre
o fazer a arte e o julgar a arte. O artista incorpora ambos. Ou, a obra de
arte já existe, sem o artista, sendo elevada a obra de arte pelo observador.
O fazer é escamoteado. Está feito. Entra no domínio da estética pelo ob-
servador. Contudo, o gosto é uma faculdade de julgar, não uma faculdade
produtiva. A arte é distinta do julgamento estético. A atitude que esteve
subjacente aos ready-made confrontou criticamente a sociedade burguesa
e materialista, o academismo, assim como, e principalmente, a própria noção
de obra de arte. Como escreve Dominique Chateau (1999): “Certamente,
é possível observar no gesto de exposição de Fontaine uma prefiguração
da decisão pós-moderna ou na decisão tomada pelo artista de interromper
a série dos ready-made (…) uma fulgurante antecipação da dolorosa ruptura
com a “tradição do novo”” 205.
Na verdade, a arte não dependia somente de si própria enquanto
objecto mas do contexto em que era apresentada, isto é, do seu contexto
de produção e de recepção. Peter Bürger considera (1974) que
202 Cf. SMITH, Roberta – Conceptual art. In STANGOS, Nikos (ed.) – Concepts of modern
art: from fauvism to postmodernism. 2 nd ed. London: Thames & Hudson, 2003, p. 256-270.
203 Na publicação The Blind Man aparecem várias páginas dedicadas a “The Richard
Mutt case”.
204 Ver DUVE, Thierry de – Kant after Duchamp. Cambridge [etc.]: The MIT Press, 1997.
205 CHATEAU, Dominique – Duchamp et Duchamp. Paris: L’Harmattan, 1999, p. 8.
A provocação de Duchamp não só revela que o mercado da arte, ao
atribuir mais valor à assinatura do que à obra, é uma instituição controversa,
como ainda faz vacilar o próprio princípio da arte na sociedade burguesa,
74
segundo o qual o indivíduo é o criador das obras de arte 206.
77
(...) uma desestetização do estético, entendida como esta apropriação
de realidades não artísticas tão característica desde a experiência de M.
Duchamp. Trata-se de uma recuperação teórica e prática de aspectos
extra-artísticos, incluindo os aspectos antropológicos e sociológicos 221.
220 Cf. GUASCH, Anna Maria – La crítica dialogada. Entrevistas sobre arte y pensamiento
actual (2000-2006). Murcia: CENDEAC, 2006, p. 57; VIDAL, Carlos – A representação da
vanguarda: contradições dinâmicas na arte contemporânea. Op. cit., p. 4-5.
221 MARCHÁN-FIZ, Simón – Del arte objetual al arte de concepto: epílogo sobre la sensi-
bilidad “postmoderna”. Op. cit., p. 155.
222 Cf. ROSENBERG, Harold – La dé-définition de l’art. Nîmes: Éditions Jacqueline Cham-
bon, 1992, p. 29-30.
223 Cf. idem, ibidem, p. 35.
224 Cf. GUASCH, Anna Maria – La crítica dialogada. Entrevistas sobre arte y pensamiento
actual (2000-2006). Op. cit., p. 106.
evidência não a vontade de revolucionar mas de assumir a possível pulve-
rização da arte, ou seja, o fim da sua jornada unívoca e unidireccionada da
“época dos manifestos”225. A arte descentralizara-se, fragmenta-se e tornara-se
78
establishment, a qual, apesar de desligada de uma certa utopia, continuaria
a revolucionar as gramáticas artísticas 226 . Passava-se do heroísmo a um
anti-heroísmo. O termo pop parece ter começado a ser usado pelo crítico
inglês Lawrence Alloway, em 1954, para designar os produtos da cultura
popular da civilização ocidental e, posteriormente, em 1962, para denominar
a actividade de artistas que procuravam utilizar estas imagens populares
num contexto de high/fine art227. Por outras palavras, o kitsch, enquanto
obra ou actividade que constitui o alimento estético da grande maioria do
público, ao qual o crítico profissional muitas vezes nem sequer lança um
olhar nefasto, pode ser resgatado e convertido em matéria positivamente
artística, ou seja, tornar-se camp, através da acção de um artista, galerista,
marchand, crítico ou teórico 228.
Debrucemo-nos um pouco sobre a questão do kitsch. A palavra nasceu
na Alemanha, tendo começado a ser usada em Munique, nas décadas de
sessenta e setenta do século XIX, por pintores e comerciantes de arte quando
se referiam a material artístico barato 229. A palavra surge com uma clara
conotação depreciativa, implicando uma “inadequação estética”, uma eventual
paródia, directamente reportada ao contexto de produção e de recepção do
objecto (sub)artístico 230. Na verdade, o kitsch nada tem que ver com a arte
genuinamente popular, aproximando-se a um certo hedonismo e vontade
de consumo, próprios das sociedades contemporâneas. Pode afirmar-se que
existirá uma espécie de culto do mau gosto conscientemente reconhecido
225 Cf. HOBSBAWM, Eric – Atrás dos tempos: declínio e queda das vanguardas do século
XX. Op. cit., p. 43.
226 Cf. FABBRINI, Ricardo Nascimento – A arte depois das vanguardas. Campinas: Editora
da Universidade Estadual de Campinas, 2002, p. 23.
227 Cf. LUCIE-SMITH, Edward – Pop art. In STANGOS, Nikos (ed.) – Concepts of modern
art: from fauvism to postmodernism. Op. cit., p. 225.
228 Cf. DORFLES, Gillo - As oscilações do gosto: a arte de hoje entre a tecnocracia e o
consumismo. Op. cit., p. 25-27.
229 Cf. CALINESCU, Matei – As cinco faces da modernidade: modernismo, vanguarda,
decadência, kitsch, pós-modernismo. Op. cit., p. 208.
230 Cf. idem, ibidem, p. 209.
como tal, tornando-se, assim, no seu oposto. Nos anos sessenta, Susan
Sontag define o camp, ou o kitsch resgatado, como um tipo particular de
estilo, como o amor pelo excesso, um certo espírito de extravagância, uma
79
arte apaixonada que não pode ser levada completamente a sério, enfim,
como o bom gosto do mau gosto. Oscar Wilde, Jean Genet e Antonio Gaudí
seriam camp231. Camp poderá ser o começo da arte pós-moderna, afastada
já de uma qualquer revolução social ou de um comprometimento político
e ideológico.
A moda camp nasceu nos círculos intelectuais/homossexuais de Nova
Iorque, ao mesmo tampo que a civilização comercial e capitalista foi as-
sumida como matéria-prima da pop art americana, a qual foi precedida
pela pop art britânica, que partiu de outros pressupostos, e pelo nouveau
réalisme. Dentro destes movimentos podemos destacar, respectivamente,
Richard Hamilton e Pierre Restany – artista e teórico – e Yves Klein. A pop
art conheceu algumas derivações, nomeadamente a funk art e a schocker
pop, que se apresentaram com um teor mais crítico e taciturno, mas sempre
conhecendo um notável impacte no público. A arte tornava-se hedonista e até
narcísica. O modernismo tinha-se afastado da vida real, desobjectivara-se232.
A pop art poderá ser remetida para os ready-made de Marcel Duchamp,
embora tenha acabado por subverter essa mesma ideia ao reconhecer uma
estética nestes ready-made. Não era intenção de Marcel Duchamp fomentar
a repetição do seu acto provocatório. Pelo contrário, esta atitude era, na
verdade, irreprodutível. A ideia de Duchamp foi desmistificar a obra de
arte; o objectivo dos artistas pop foi elevar as imagens do quotidiano a arte.
A representação da realidade concreta foi substituída pelo objecto, isto é,
pela realidade objectual, a qual exige apenas uma “curiosidade instrumental”.
A pop art pode ser passível de se contemplar como uma espécie de “Livro
de horas do consumo” 233.
Como se sabe, os meios artísticos utilizados por Allan Kaprow, Andy
Warhol, Claes Oldenburg – ou Ray Gun, se preferirmos –, George Segal, James
231 Cf. SONTAG, Susan – “Camp” – algumas notas. In Contra a interpretação e outros
ensaios. Lisboa: Gótica, 2004, p. 315-336.
232 Ver McCARTHY, David – Pop art. Lisboa: Editorial Presença, 2002.
233 Cf. BAUDRILLARD, Jean – A sociedade de consumo. Lisboa: Edições 70, 1995, p. 126.
Rosenquist, Jasper Johns, Jim Dine, John Cage, Larry Rivers, Robert Indiana,
Robert Rauschenberg, Roy Lichtenstein, ou Tom Wesselmann, expandiam-se
pelos domínios da serigrafia, da reprodução na tela de fotografias divulgadas
80
pela imprensa, da litografia, do assemblage, dos happenings — nos quais era
solicitada a intervenção do público —, ou da utilização dos restos da socieda-
de de consumo — vidros, latas, cartões, arames, artefactos vários. A palavra
happening terá começado por ser utilizada por Allan Kaprow entre 1958 e
1959, no intuito de designar as suas experiências intituladas 18 happenings
in six parts, apresentadas na Reuben Gallery, em Nova Iorque234. Tratou-se
do primeiro happening público235. Nas palavras de Theodor Adorno (1970):
234 Cf. VERGINE, Lea – Art on the cutting edge. A guide to contemporary movements.
Milano [etc.]: Skira Editore, 2001, p. 39.
235 Cf. SONTAG, Susan – Happening: uma arte de justaposição radical. In Contra a in-
terpretação e outros ensaios. Op. cit., p. 300-314.
236 ADORNO, Theodor W. – Teoria estética. Op. cit., p. 288.
é alienado de si próprio” 237. O próprio cinema, dito underground, conhe-
ceria pressupostos interessantes, como recusa dos circuitos tradicionais,
a apropriação de temáticas marginais, a ausência de narrativa, a utilização da
81
câmara fixa, etc. Neste domínio, destacaram-se Andy Warhol – Sleep (1963) e
Empire (1964) –, Bruce Baillie, Jean-Luc Godard, Ken Jacobs, Stan Brakhage,
entre outros. O objecto estético apareceu descontextualizado do local onde
se encontrava exposto ou os objectos, tomados em conjunto, definiam
um ambiente que envolvia o espectador. Este, em diversas situações, era
convidado a intervir, a modificar o que lhe era dado a percepcionar pelos
diversos sentidos — audição, tacto, visão. A arte e a vida estariam, deste
modo, ligadas. Como escreveu Claes Oldenburg, em 1961:
242 Cf.
GREENBERG, Clement – Avant-garde et kitsch. Op. cit.
243 Cf.
CALINESCU, Matei – As cinco faces da modernidade: modernismo, vanguarda,
decadência, kitsch, pós-modernismo. Op. cit., p. 225.
244 DORFLES, Gillo - As oscilações do gosto: a arte de hoje entre a tecnocracia e o con-
sumismo. Op. cit., p. 29.
ocidental pelo facto de ter tornado autoconsciente a verdade filosófica
da arte 245.
83
A narrativa formalista – baseada na eliminação gradual da ilusão da
tridimensionalidade – preconizada por Clement Greenberg chegaria, portanto,
ao seu final 246. Ainda nesta senda, é oportuno referir o posicionamento de
Susan Sontag que, em 1964, escreveria o conhecido ensaio Against interpre-
tation, advertindo para a necessidade de na atitude crítica não prevalecer
a interpretação – elementos de conteúdo –, no sentido de se valorizar
a experiência sensorial, isto é, “sentir a luminosidade da coisa em si” 247.
Paralelamente e no seguimento da pop art, emergiram uma série de mo-
vimentos e de tendências que tiveram em comum a superação das fronteiras
disciplinares da arte – o também denominado “campo expandido”, em alguns
momentos, assumindo forte inspiração dadaísta –, buscando novos limites
e abordagens, muitas destas de carácter performativo, fílmico, videográfico
e fotográfico248. É neste contexto que podemos encontrar importantes ma-
nifestações, como a arte povera, a land art, a op(tical) art, a arte minimal
– particularmente vocacionada para as formas escultóricas, tridimensionais,
na sua relação com o seu meio, desenvolvidas, por exemplo, por Sol LeWitt
ou Carl Andre 249 –, a body art, a poesia visual, a arte-processo, a arte
conceptual, ou a arte de acção, com particular relevância para as acções
de “arte viva” e “arte total” de Yves Klein, “Fluxus” – nome inventado por
George Maciunas em 1961 para apelidar a reunião de dança, artes visu-
ais, teatro, poesia, música, etc. –, as “esculturas vivas” Gilbert & George,
as performances de Marina Abramovic, de Gina Pane, de Herman Nitsch,
de Otto Muehl, de Günter Brus, de Rudolf Schwarzkogler, de Meredith
245 DANTO, Arthur C. – After the end of art: contemporary art and the pale of history.
Op. cit., p. 122.
246 Cf. idem, ibidem, p. 125.
247 Cf. SONTAG, Susan – Contra a interpretação. In Contra a interpretação e outros en-
saios. Op. cit., p. 27-32.
248 Ver BUSKIRK, Martha – The contingent object of contemporary art. Massachusetts:
The MIT Press, 2005.
249 Cf. CHAVE, Anna C. – Minimalism and the rhetoric of power. In FRASCINA, Fran-
cis; HARRIS, Jonathan (ed.) – Art in modern culture: an anthology of critical texts. London:
Phaidon Press, 1992, p. 264-281.
Monk, ou de Hélio Oiticica, a exploração do objecto enquanto extensão
do corpo por Rebecca Horn, entre outros. Vive-se a pulsão do desejo,
a presença do ritual e o retorno à origem na esperança de uma libertação
84
capaz de inventar o futuro 250.
Na verdade, ao longo dos anos sessenta e no correr da década seguinte,
tornar-se-ia visível tanto o incremento da arte como ideia – conceptualis-
mo –, como da arte enquanto acção, num certo espírito de revisitação do
dadaísmo e de Marcel Duchamp. O termo “arte conceito” seria utilizado
pela primeira vez em 1961, por Henry Flynt, no âmbito das acções do grupo
“Fluxus” de Nova Iorque 251, enquanto “arte conceptual” foi primeiramente
empregue, em 1967, pelo minimalista Sol LeWitt, evidenciando a diferente
apropriação do termo. Os elementos do grupo “Fluxus” americano, consti-
tuído no bairro nova-iorquino do Soho, tinham, na sua maioria, estudado
com John Cage, entre 1957 e 1959, na New School for Social Research, Nova
Iorque. De entre os quais, podem nomear-se Allan Kaprow, Al Hansen, Dick
Higgins, Jackson Mac Low, ou George Brecht. Importa estabelecer uma
outra interessante referência, que se prende com o facto de Cage ter sido
aluno de Arnold Shöenberg, quando este se mudara para Nova Iorque, o
que coloca em evidência a ligação do modernismo e da vanguarda musical
dos anos vinte com os movimentos da neovanguarda de meados do século,
inclusivamente do ponto de vista musical – a evolução da música serial.
De modo semelhante, na Europa o movimento “Fluxus” inicia-se em redor
de outro compositor: Karlheinz Stockhausen – que desenvolve pesquisas
em torno da música serial electroacústica –, em Darmstadt e em Colónia,
e que aglutina LaMonte Young, Nam June Paik, Emmett Williams, Ben-
jamin Patterson, Ludwig Gosewitz, George Maciunas, Wolf Vostell, entre
outros. Joseph Beuys 252, apesar da sua individualidade, integrou também o
255 THWAITES, J. A. – Der philosoph und die katze. Deutche Zeitung. N.º 84 (April
1963), p. 10.
256 Cf. WOOD, Paul – Inside the whale: an introduction to postmodernist art. In PERRY,
Gill; WOOD, Paul (ed.) – Themes in contemporary art. London: The Open University, 2004,
p. 10-11.
257 Cf. MARCHÁN-FIZ, Simón – Del arte objetual al arte de concepto: epílogo sobre la
sensibilidad “postmoderna”. Op. cit., p. 249.
258 Cf. HARRISON, Charles – Conceptual art, the aesthetic and the end(s) of art. In PER-
RY, Gill; WOOD, Paul (ed.) – Themes in contemporary art. London: The Open University,
2004, p. 49.
a personalização das características da obra tende a deslocar-se para a
assinatura 259.
88
Detenhamo-nos um pouco sobre a noção de “conceito”. Por definição,
o termo resulta de um acto de generalização intelectual, em virtude das
impressões sensíveis e das representações concretas, elevando-as a um
significado universal. Na arte conceptual o “conceito” identificou-se com
os processos e jogos, os projectos, as associações mentais — muitas vezes
denominadas project art. Embora se reconhecesse a falta de uma forma
estética, no sentido tradicional, na obra conceptual, verificava-se o enfati-
zar da importância do projecto, da ideia, da mensagem que se pretendia
transmitir ao receptor, bem como do canal escolhido para a sua transmissão
– fotografia, entrevista, mapa, lista de instruções, representação pública,
telegrama, revista, filme, texto 260. A arte fica cindida da visualidade, mas
provoca uma dicotomia entre o conceito e a percepção.
A arte conceptual acarretou consigo uma forte base documental como
modo de expressão, inclusivamente ao nível de publicações, tais como,
Art-Language: The Journal of Conceptual Art (Reino Unido), publicação do
grupo “Art & Language”, constituído em 1968 por David Bainbridge, Harold
Hurrell, Michael Baldwin e Terry Atkinson, também autores do Índex 01,
mostrado na Documenta 5 (1972). Não devemos entender a arte conceptual
propriamente como antiarte, mas essencialmente como arte antiobjectual, nas
disposições, por exemplo, de Daniel Buren, Joseph Kosuth, Mel Bochner,
ou Victor Burgin – “art as idea as idea”. Deve também destacar-se a impor-
tante exposição de 1969, When Attitudes Become Form: Works – Concepts
– Processes – Situations – Information. Live in your head (Kunsthalle, Berna;
Museum Haus Lange, Krefeld; Institute of Contemporary Arts, Londres),
com curadoria de Harald Szeemann, na qual foram apresentadas obras de
arte conceptual, arte minimal, arte povera, land art, mas, acima de tudo,
onde se fomentou a experiência em torno da obra antiobjectual e das
259 HEINICH, Nathalie – Le triple jeu de l’art contemporain. Paris: Les Éditions de Minuit,
2002, p. 169.
260 Cf. SMITH, Roberta – Conceptual art. Op. cit.
intenções do artista, num vasto movimento internacional ainda por definir261.
O historiador português, José-Augusto França, dedicaria um dos seus “folhe-
tins” (1969) justamente a esta mostra, afirmando que estes artistas estariam
89
mais empenhados na procura da antiarte, necessariamente condicionada pela
arte, e que o “conceito aberto” já se impunha há muito tempo, no âmbito
de uma “criação poética pós-romântica” 262.
A reflexão sobre a arte devia evidenciar a relatividade da realidade,
nomeadamente da realidade contaminada pelo elitismo e pelo sistema ca-
pitalista. Mel Bochner, no final dos anos sessenta, acabaria por criticar a
denominação “conceptual” quando aplicada de um modo generalista à arte:
Por uma série de razões a mim não me agrada o termo Arte Conceptual.
A conotação de uma fácil dicotomia com a percepção é demasiado óbvia
e inadequada. Uma implicação infeliz é que existe uma espécie de salto
mítico e mágico de um nível de existência para outro; como se mediante
a criação da ficção original, a sua existência não empírica essencial se
convertesse num valor positivo (transcendente) a ser alcançado 263.
261 Cf. GUASCH, Anna Maria – El arte del siglo XX en sus exposiciones (1945-1995). Bar-
celona: Ediciones del Serbal, 1997, p. 173-177.
262 Cf. FR ANÇA, José-Augusto – Quando as atitudes se tornam forma. In Quinhentos
folhetins. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1984. Vol. 1, p. 13-15. Texto original-
mente publicado em Diário de Lisboa. Lisboa (25 Set. 1969).
263 BOCHNER, Mel – Especulaciones (1967-1970). In MARCHÁN-FIZ, Simón – Del arte
objetual al arte de concepto: epílogo sobre la sensibilidad “postmoderna”. Op. cit., p. 413.
264 Ver GALE, Peggy (ed.) – Artists talk: 1969-1977. Nova Scotia: The Press of the Nova
Scotia College of Art and Design, 2004.
265 FORMAGGIO, Dino – Arte. Lisboa: Editorial Presença, 1985, p. 69.
dentro dos quais a obra de arte pode ter o máximo de ambiguidade sem
deixar de ser ela/obra, isto é, sem deixar de ser objecto com propriedades
estruturais definidas, que marca o ponto de chegada de uma produção e o
90
ponto de partida, que volta a dar vida a uma forma inicial, através de várias
perspectivas. A obra de arte aberta implica, portanto, uma colocação em
determinada relação fruidora com os seus receptores 266.
Na verdade, o final dos anos sessenta implicou o fim de uma certa nar-
rativa da história da arte, unidireccionada, da “época dos manifestos” 267.
O objecto da actividade artística relacionava-se com a antiarte, ou seja, com
a morte da arte ou até algo mais, uma presença contrária, uma arte sem
obra de arte 268. A vontade vanguardista e neovanguardista de inovar na
arte poderão estar na base da sua própria aniquilação. No capítulo “Morte
ou ocaso da arte” (La fine della modernità, 1985), Gianni Vattimo entende
que o fim da arte é algo com que temos de contar, quase com um carác-
ter profético. A arte já não existe como fenómeno específico, recusando
enquadrar-se nos limites preconizados pela tradição:
266 Cf. ECO, Umberto – Obra aberta: forma e indeterminação nas poéticas contemporâ-
neas. 2.ª ed. São Paulo: Editora Perspectiva, 1971, p. 22-29.
267 Cf. DANTO, Arthur C. – After the end of art: contemporary art and the pale of history.
Op. cit., p. 37.
268 Cf. ARGAN, Giulio Carlo – Arte e crítica de arte. Op. cit., p. 119-120.
269 VATTIMO, Gianni - O fim da modernidade: niilismo e hermenêutica na cultura pós-
-moderna. Lisboa: Editorial Presença, 1987, p. 47.
justamente a hipótese do fim da história da arte, no sentido da sua narra-
tiva tradicional e ocidental, na obra Das Ende der Kunstgeschichte? (1983),
avançando a hipótese de novos enquadramentos, não tradicionalistas 270.
91
Na opinião de Luc Ferry (1990) a este respeito: “Com as exposições sem
quadros e os seus concertos de silêncio, as vanguardas moribundas ridicu-
larizaram a arte e prepararam, sem o saber, o eclectismo pós-moderno: a
pretexto de chocarem ou subverterem, as obras de arte tornaram-se modestas.
As colunas de Buren já não subvertem: divertem suscitando sentimentos
de irritação ou de aquiescência” 271; ou, como afirma Suzi Gablik (1984):
270 Ver BELTING, Hans – The end of the history of art? Chicago; London: University of
Chicago Press, 1987.
271 FERRY, Luc – Homo aestheticus. A invenção do gosto na era democrática. Op. cit., p. 215.
272 Ver HOWE, Irving – Mass society and post-modern fiction. Partisan Review. New
York. N.º 26 (Summer 1959), p. 420-436.
273 GABLIK, Suzi – Has modernism failed? 2 nd ed. London; New York: Thames & Hudson,
2004, p. 21.
274 Cf. DEBORD, Guy – A sociedade do espectáculo. 2.ª ed. Lisboa: Mobilis in Mobile,
1991, p. 153-154.
275 Cf. GULLAR, Ferreira – Argumentação contra a morte da arte. Rio de Janeiro: Editora
Revan, 1993, p. 133-134.
A arte aparentemente deixou de depender de qualquer autoridade ou
tradição e o radicalismo foi perdendo a sua capacidade de chocar. A liberdade
artística conquistou terreno de tal modo que a vanguarda e os pressupostos
92
do experimentalismo radical se diluíram. A arte tornou-se plural, ecléctica
e afirmativa. Os estilos deixaram de ter lugar numa espécie de tirania da
liberdade. Devemos concordar com Gablik quando, apesar de entender que
o modernismo não falhou, afirma: “Podemos ver agora, no entanto, que
a rebelião e a liberdade não são suficientes: o modernismo colocou-nos
demasiado longe, na direcção de uma subjectividade radical e de um rela-
tivismo destrutivo. (…) Somente quando as regras tradicionais existem, e
estamos habituados a lidar com elas, podemos ter prazer em quebrá-las”276.
A crítica determinaria a morte da arte no sentido hegeliano 277. Podemos
colocar a questão: será que a inovação consiste — na arte dita pós-moderna
— em retornar a um certo classicismo, a um antivanguardismo? Num ensaio
de 1967, Ernst Fischer chamava justamente a atenção para o facto de há
décadas se falar da “crise da arte”, eventualmente materializada no vanguar-
dismo – “última mobilização” do que foi a vanguarda. Contudo, o autor
acreditava que um novo período histórico na arte estaria a despontar 278.
O próprio grupo “Art & Language” regressaria à pintura no final dos anos
setenta, muitas vezes em jeito de paródia, apesar de entender este regresso
como um pós-conceptualismo e não como um pós-modernismo revisionis-
ta 279. O crítico e historiador Bernardo Pinto de Almeida chama a atenção
(2007) para a ideia de a pós-modernidade poder ser vista como um luto
pelo desaparecimento do paradigma moderno, isto é, quando se passa de
uma simples verificação de perda de um modelo para o processo de luto 280.
Em conclusão, devemos entender o movimento modernista/vanguardista
— em sentido lato — como um ciclo determinante, pautado pela experimen-
282 Cf. WOOD, Paul; FR ASCINA, Francis; HARRIS, Jonathan; HARRISON, Charles –
Modernism in dispute: art since the forties. Op. cit., p. 237.
283 Ver VENTURI, Robert – Learning from Las Vegas. Cambridge: The MIT Press, 1977.
284 Cf. MELO, Alexandre – Obsessão e circunstância. Revista de Comunicação e Lingua-
gens. Lisboa: Edições Afrontamento. N.º 6/7 (1988), p. 203-205.
architecture (1977) 285 , e, em 1980, colaboraria com Paolo Portoghesi 286
na organização da Bienal de Veneza, subordinada à temática geral A presença
do passado. A arquitectura virava-se agora para a tradição e para o verná-
96
culo. Charles Jencks identificaria o pós-modernismo com a combinação de
técnicas modernas, principalmente técnicas construtivas, com construções
tradicionais, compostas por elementos sóbrios e populares, no intuito de ser
possível comunicar não apenas com uma minoria – designadamente arqui-
tectos –, mas com o público em geral. Trata-se de uma espécie de “duplo
código” 287 . Ao longo dos anos oitenta, o termo aparece frequentemente
nos estudos teóricos e críticos sobre arte. No intuito de compreender este
conceito, debrucemo-nos, primeiro e brevemente, sobre o debate a respeito
da modernidade/pós-modernidade – base histórica e filosófica sobre a qual
assenta o conceito de pós-modernismo, ou, segundo Bernardo Pinto de
Almeida (2007), a condição para o espaço cultural do pós-modernismo288.
O debate filosófico que se debruça sobre a pós-modernidade e as suas
questões mais proeminentes tem sido, desde finais da década de setenta, pre-
conizado, entre outros, por dois autores: Jean-François Lyotard – fortemente
influenciado pela filosofia da linguagem moderna de Ludwig Wittgenstein,
situa o indivíduo numa complexidade de fragmentos e descontinuidades –
e Jürgen Habermas – considerado um continuador da Escola de Frankfurt.
Os escritos tanto do filósofo francês como do alemão não se debruçam
exclusivamente sobre o domínio artístico mas, ao tentarem encontrar uma
periodização cultural, assumem considerável importância para o esclareci-
mento do pós-modernismo na arte. Ambos discutem a unidimensionalidade
da razão 289. Mas, antes de mais, o que é, afinal, a modernidade? Segundo
Manuel Maria Carrilho (1989):
285 Ver JENCKS, Charles – The language of post-modern architecture. 5 th ed. London:
Academy Editions, 1987; idem – Post-modernism: the new classicism in art and architecture.
London: Academy Editions, 1987.
286 Ver PORTOGHESI, Paolo – Depois da arquitectura moderna. Lisboa: Edições 70, 1999.
287 Cf. JENCKS, Charles – What is post-modernism? London: Academy Editions, 1989, p. 14-20.
288 Cf. ALMEIDA, Bernardo Pinto de – La posmodernidad: entre las décadas de 1960 y
1980. Arte y Parte: Revista de Arte. Op. cit., p. 42.
289 Cf. PITA, António Pedro – A modernidade de A condição pós-moderna. Revista Crítica
de Ciências Sociais. Coimbra: Centro de Estudos Sociais. N.º 24 (Mar. 1988), p. 88.
A modernidade consagra, sobretudo através da construção da ciência
e da economia políticas, a vitória da razão filosófica, agora inspirada em
Descartes e na sua metodologia: a evidência talha o discurso verdadeiro
97
e eficaz, ao mesmo tempo que dispensa o recurso à retórica 290.
290 CARRILHO, Manuel Maria - Elogio da modernidade. Lisboa: Editorial Presença, 1989,
p.20.
291 Cf. GIDDENS, Anthony – As consequências da modernidade. 4.ª ed. Oeiras: Celta
Editora, 2002, p. 1.
292 Cf. SILVA, Isidro Ribeiro da – Compreensão crítica da modernidade (II). Brotéria:
Cultura e Informação. Lisboa. Vol. 119, n.º 6 (Dez. 1984), p. 498.
293 Cf. idem, ibidem, p. 502-507.
294 Cf., por exemplo, LYOTARD, Jean-François - A condição pós-moderna. 2.ª ed. Lisboa:
Gradiva, 1989, p. 8.
o nacionalismo, conducente ao abandono da tradição da Época Moderna 295.
Do mesmo modo, a expressão “pós-modernismo” parece ter aparecido pela
primeira vez em Letters do artista britânico John Watkins Chapman, ainda na
98
década de setenta do século XIX , quando este se reportava a uma pintura
pós-impressionista 296 ou, posteriormente, com Federico de Onís na obra
Antologia de la poesia española e hispanoamericana (1934), quando o autor
aludia a um certo modernismo conservador e talvez exausto 297.
Na verdade, é inegável que o prefixo “pós” significa o que vem depois,
implicando uma não definição positiva do que é exactamente esse depois –
continuidade ou ruptura –, ao mesmo tempo que, e nas palavras de
António Pedro Pita (1988), “(...) pode também traduzir a desconfiança recen-
te em relação ao princípio optimista — o optimismo moderno, iluminista,
claro — do progresso geral da humanidade” 298; ou segundo Eduardo Prado
Coelho (2004), “(…) a pós-modernidade espera um rosto que a desminta.
O resultado é por enquanto a experiência de uma certa monotonia da
história acompanhada por um toque de leveza” 299. Todavia, é paulatina-
mente reconhecido ao pós-moderno o estatuto de conceito300. Na opinião
de Jacques Leenhardt (1988), o pós-moderno articula-se com o moderno
de modo invertido face à maneira como este se articula com o antigo301,
isto é, o moderno ultrapassa o antigo; o pós-moderno escapa à já referida
visão unilinear do tempo e do progresso. Devemos recordar a diferente
acepção, pelo menos no âmbito deste estudo, entre pós-modernidade e
pós-modernismo. Quando se fala da primeira, pretende-se aludir às teorias
295 Cf. TOYNBEE, Arnold – A study of history. London: Oxford University Press, 1954.
Vol. 9, p. 182 e ss.; p. 235.
296 Cf. APPIGNANESI, Richard; GARRATT, Chis – Pós-modernismo para principiantes.
Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1997, p. 5; BERMEJO, Diego – Posmodernidad: pluralidad
y transversalidad. Barcelona: Anthropos Editorial, 2005, p. 129-130.
297 Cf. ANDERSON, Perry – As origens da pós-modernidade. Op. cit., p. 10-11.
298 PITA, António Pedro – A modernidade de A condição pós-moderna. Op. cit., p. 78.
299 COELHO, Eduardo Prado – O fio da modernidade. Lisboa: Editorial Notícias, 2004, p. 49.
300 Cf. CASAL, Adolfo Yanez – Modernidade, post-modernidade e antropologia. Revista
da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas. Lisboa: Universidade Nova de Lisboa. N.º 6
(1992/1993), p. 121.
301 Cf. LEENHARDT, Jacques – A querela dos modernos e dos pós-modernos. Revista de
Comunicação e Linguagens. Lisboa: Edições Afrontamento. N.º 6/7 (1988), p. 120.
sociais, históricas e filosóficas; quando se refere o segundo, reportamo-nos
especificamente aos domínios cultural e artístico.
A perspectiva de Jean-François Lyotard lançou-se de um modo expla-
99
nado em La condition postmoderne: rapport sur le savoir (1979). Trata-se
de uma obra que apresenta uma viragem filosoficamente importante face
ao problema da linguagem, e que se caracteriza pela reacção a uma teoria
objectiva do conhecimento, já que este é historicamente condicionado e
acidental. La condition postmoderne trata sobretudo o programa da moder-
nidade — questão tão importante para a cultura ocidental desde o “Século
das Luzes” —, assumindo uma reflexão sobre o estádio presente da cultura
e das sociedades mais desenvolvidas, isto é, pós-modernas. E o seu autor
começa por definir a palavra “pós-moderna”:
302 LYOTARD, Jean-François – A condição pós-moderna. 2.ª ed. Lisboa: Gradiva, 1989, p. 11.
humanidade inteira através dos progressos da tecnociência capitalista”303 –,
fruto do progresso das próprias ciências, estas metanarrativas, diferente-
mente dos mitos e das fábulas, procuram legitimar-se numa ideia ainda a
100
realizar e que orienta todas as realidades humanas: os ideais do Iluminismo
de liberdade, igualdade e progresso. O modo característico da modernidade
é, por conseguinte, o projecto da realização da universalidade, projecto
esse destruído e esgotado 304 . Os dogmas constitutivos da modernidade
encontram-se, portanto, derrubados.
As transformações tecnológicas das últimas décadas — à medida que
as sociedades entraram na era pós-industrial — foram de considerável
importância para o acesso ao saber e à informação. A informática, as te-
lecomunicações, os transportes conheceram uma evolução mais rápida do
que a própria identidade do sujeito; do que a sua preparação para tantas
mudanças e tão repentinas; do que o uso correcto e construtivo das novas
informações. É neste sentido que Madan Sarup afirma (1988): “O velho
princípio segundo o qual a aquisição de conhecimento é indissociável do
adestramento da mente, ou mesmo dos indivíduos, tornou-se obsoleto.
O conhecimento já deixou de ser um bem em si” 305. E como se processa
este fenómeno? Lyotard explica: “O saber é e será produzido para ser ven-
dido numa nova produção: em ambos os casos para ser trocado. Ele deixa
de ser, para si mesmo, a sua própria finalidade, perdendo o seu “valor de
uso”” 306. Quem dirige e decide é quem detém as informações: os vários
especialistas, levando-nos a questionar os limites e a consciência da razão.
O pós-modernismo, nas artes, abandona a perspectiva universal e ne-
cessária de emancipação e de progresso. O desaparecimento da ideia de
um progresso na racionalidade e na liberdade explicará, no entender do
101
O eclectismo é o grau zero da cultura geral contemporânea: ouve-se
reggae, vê-se western, come-se McDonald ao meio-dia e cozinha local à
noite, usa-se perfume parisiense em Tóquio, e roupa “retro” em Hong-Kong,
o conhecimento é matéria para concursos televisivos. É fácil encontrar
público para as obras eclécticas. Tornando-se kitsch, a arte lisonjeia a
desordem que reina no “gosto” do amador 307.
307 Idem - O pós-moderno explicado às crianças: correspondência 1982-1985. Op. cit., p. 19.
308 Idem, ibidem, p. 97.
309 Idem, ibidem, p. 98.
assumir uma responsabilidade face aos erros do passado, examinando-os,
reflectindo sobre eles, evitando a sua recorrência.
Numa perspectiva antagónica à de Jean-François Lyotard, situa-se a de
102
Jürgen Habermas, que procurou fundamentar a sua visão filosófica da pós-
-modernidade no estabelecimento de uma fronteira legítima entre o Estado
e o mundo complexo da comunicação310. O filósofo crê que é possível um
conhecimento universal e necessário, aplicado à vida em sociedade e às
formas de desenvolvimento311. Habermas entende que Lyotard incorreu num
equívoco, já que a modernidade continua a ser um projecto não esgotado,
mas inacabado, que é necessário incrementar, procurando decifrar os erros
em que se incorreu e repensá-lo no contexto da cultura das sociedades
pós-industriais. A modernidade é uma época que tem um programa, o das
“Luzes” da razão, programa que ainda não foi cumprido. As causas poderão
estar, possivelmente, no capitalismo desenfreado.
A solução passará por acreditar nas pequenas narrativas, na fragmen-
tação temporal como critério para a compreensão da contemporaneidade.
A sociedade tida como um todo orgânico é rejeitada, porque não é possível
uma concepção marxista — enquanto grande narrativa ou metanarrativa
— da história dos nossos dias 312. Será necessário apelar a uma reflexão
sobre a sociedade e preparar a sociedade do futuro. Um dos escritos que
claramente evidencia a oposição de Habermas a Lyotard é o ensaio, pro-
ferido oralmente em 1980, e publicado no ano seguinte na revista New
German Critique, com o título Modernity versus postmodernity. O autor
coloca a questão: “(...) devemos tentar manter as intenções do Iluminismo,
eventualmente falíveis, ou devemos declarar a totalidade do projecto da
modernidade uma causa perdida?” 313.
318 Cf. GIDDENS, Anthony; HABERMAS, Jürgen; JAY, Martin [et al.] – Habermas y la
modernidad. Madrid: Ediciones Cátedra, 1988, p. 305-310.
319 Cf. COELHO, Tereza - Gianni Vattimo: da crise da razão ao “pensamento frágil”
[entrevista com Gianni Vattimo]. Expresso/Revista. Lisboa. N.º 757 (30 Maio 1987), p. 58-60.
320 Cf. VATTIMO, Gianni - O fim da modernidade: niilismo e hermenêutica na cultura
pós-moderna. Op. cit., p. 9.
321 Idem, ibidem, p. 12.
nuarão os ideais de progresso e de superação a conduzir o trajecto? Gianni
Vattimo acredita que este debate é não só pertinente como fundamental.
No entanto, é necessário superar esta dicotomia extrema e procurar o que
105
está para além dela, encontrando uma terceira via, percebendo como e por-
quê a modernidade acabou, mas como constitui ainda um problema, mesmo
acabado. A dissolução das estruturas racionais da modernidade ainda não
se realizou, como acredita Lyotard, e deve ser realizado, contrariamente ao
que pretende Habermas 322.
Na opinião de Richard Rorty (1991), filósofo e crítico norte-americano,
a ligação entre Habermas e Lyotard reside no facto de ambos acredita-
rem que a história da filosofia moderna constitui uma parte determinante
das várias tentativas de auto-afirmação das sociedades democráticas 323 .
Segundo o mesmo autor: “Aqueles que querem a sublimidade estão a
apontar para uma forma de vida intelectual pós-modernista. Aqueles que
querem belas harmonias sociais querem uma forma de vida social na qual
a sociedade, como um todo, se afirma a si mesma sem se preocupar em
se fundamentar” 324. A filosofia deverá, num certo sentido, estar imbuída
de pragmatismo, no intuito de conseguir resolver os problemas complexos
das sociedades contemporâneas.
Retomemos a tentativa de definição de pós-modernidade, já que esta
é a base histórica e filosófica na qual o pós-modernismo assenta e ganha
significado. Segundo David Harvey (1989):
322 Cf. COELHO, Tereza - Gianni Vattimo: da crise da razão ao “pensamento frágil” [en-
trevista com Gianni Vattimo]. Op. cit.
323 Cf. RORTY, Richard - Ensaios sobre Heidegger e outros. Lisboa: Instituto Piaget, 1999,
p. 257-275.
324 Idem, ibidem, p. 275.
325 HARVEY, David – Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança
cultural. 9.ª ed. São Paulo: Edições Loyola, 2000, p. 97.
Podemos resumir a acepção do termo “pós-modernidade” fundamental
mente a três formas: a que apela à ruptura face à modernidade, a que
defende uma ideia de continuidade e a que reconhece e pondera as virtudes
106
e os problemas da modernidade. Não se pretende, com esta visão tripartida,
anular a complexidade que se reconhece a este termo controverso e que
tem vindo a ser alvo de estudo nas ciências sociais e humanas, nas artes,
na economia, na crítica literária, etc., todavia, torna-se necessária uma certa
organização das ideias mais proeminentes, a que se seguirá uma consideração
final, embora não necessariamente definitiva. Temos de concordar com Barry
Smart quando afirma (1993) que se trata de um “termo muito pesado” 326.
Sabemos que Hegel e Karl Marx admitiram o “fim da história” — num
sentido teleológico — que ocorreria no momento em que as sociedades
atingissem a sua plenitude evolutiva. Para o primeiro, este estádio coincidiria
com o liberalismo; para o segundo, com o comunismo. Daqui podemos aferir
que a metanarrativa marxista terminou, como também entendeu Lyotard,
já que a meta das sociedades pós-industriais é o triunfo do liberalismo eco-
nómico e político nas sociedades ocidentais, como Francis Fukuyama de um
modo auspicioso observou num artigo de 1989 327. Quando falamos de “fim
da história” não falamos de fim da historicidade. Marx, com o materialismo
histórico e dialéctico, identificou uma com a outra. Deste modo, o processo
histórico é visto unilinearmente — tese, antítese, síntese. A historicidade,
diferentemente, apresenta-se como um modo de aprender com o passado
e prever o futuro. Admite e insurge-se contra os erros do passado, critica,
questiona, compara. Uma outra postura, distinta da de Fukuyama, tinha
assumido o sociólogo Daniel Bell na obra The cultural contradictions of
capitalism (1976), ao conferir particular ênfase às mudanças sociais e tecno
lógicas ocorridas nas sociedades pós-industriais, do “consumo de massa”,
mas temendo o critério de eficácia da pós-modernidade 328.
326 Cf. SMART, Barry – A pós-modernidade. Lisboa: Publicações Europa-América, 1993, p. 13.
327 Ver FUKUYAMA, Francis – O fim da história e o último homem. 2.ª ed. Lisboa: Gradiva,
1999; idem – O fim da história? Risco. Lisboa. N.º 13 (Primavera 1990), p. 23-41.
328 Ver BELL, Daniel – Las contradicciones culturales del capitalismo. Madrid: Alianza
Editorial, 1987.
Na verdade, temos de reconhecer a importância das inúmeras transforma
ções que melhoraram a qualidade de vida do homem, que fomentaram o
progresso civilizacional e a democracia, na procura do cumprimento dos ideais
107
de raiz iluminista. O projecto da modernidade e, nas palavras de Boaventura
de Sousa Santos (1988): “(…) é um projecto ambicioso e revolucionário.
As suas possibilidades são infinitas, mas, por serem-no, contemplam tanto
o excesso das promessas como o défice do seu cumprimento”329. Mas, por
outro lado, nunca como agora — início do século XX I — as desigualdades
foram tão notórias, as tragédias tão repentinas, a opressão económica tão
evidente, a violência tão crua, a indiferença tão perturbadora. A crise do
humanismo é manifesta. Nas palavras de Gianni Vattimo (1985): “Deus
morreu, mas o homem não está lá muito bem” 330. Este grau de consciên-
cia histórica atormenta o ser humano e assume um carácter escatológico.
Esta consciência, no entender do autor italiano,
108
A pós-modernidade como forma de vida, como forma de reflexão
e de resposta à acumulação de indícios sobre os limites e as limitações da
modernidade. A pós-modernidade como forma de viver com as dúvidas,
as incertezas e as ansiedades que parecem cada vez mais ser o corolário
da modernidade, o preço inescapável a pagar pelos ganhos, os lucros
e os prazeres associados à modernidade 332.
335 VAT T IMO, Gianni [et al.] – En torno a la posmodernidad. Barcelona: Editorial
Anthropos, 1991, p. 68-69.
336 Ver GELLNER, Ernest – Pós-modernismo, razão e religião. Lisboa: Instituto Piaget, 1994.
Na obra Can modernity survive? (1990), Agnes Heller explica o âmbito
da sua questão:
110
A pergunta “A modernidade pode sobreviver?” é uma questão pós-
-moderna, mas não é formulada acerca da pós-modernidade, a partir do
momento em que como “época”, pelo menos na minha ideia, não existe.
Também não existem quaisquer sinais de que estará para ser. A questão
é colocada à modernidade do ponto de vista da consciência histórica
pós-moderna 337.
337 HELLER, Agnes – Can modernity survive? Cambridge: Polity Press, 1990, p. 6.
338 Idem, ibidem, p. 159.
a um tipo novo e distinto de ordem social”339. O que se vive não é uma nova
idade histórica, mas sim uma radicalização da modernidade. Esta radicalização
vai ser responsável pela definição de uma ordem social multidimensional,
111
assente na vigilância, no capitalismo, no industrialismo e no poder militar.
O autor considera que as três fontes primordialmente responsáveis pelo
dinamismo da modernidade são a separação do tempo e do espaço, o de-
senvolvimento de mecanismos de contextualização, e a apropriação reflexiva
do conhecimento. Estas fontes encontram-se inter-relacionadas:
355 Cf. BAUDRILLARD, Jean – A sociedade de consumo. Op. cit., p. 47; 114-115.
356 Cf. idem, ibidem, p. 116.
357 Idem – Simulacros e simulação. Lisboa: Relógio D’Água, 1991, p. 64.
358 Ver também idem – As estratégias fatais. Lisboa: Editorial Estampa, 1991. Nesta obra
o autor coloca o problema do relacionamento do ser humano com o mundo circundante, em
rápida e constante transformação.
a aceleração devorou o recurso do tempo 359. Já não se conseguem impor
limites ao próprio mundo, que se transformou num ecrã, num “ponto de
convergência de todas as redes de influência” 360.
117
Na obra La societá transparente (1989) Gianni Vattimo propõe a tese de
que na sociedade dos mass media – que caracterizam a “sociedade trans-
parente”, na verdade pós-moderna, caótica, contaminada – se abre caminho
a um ideal de emancipação, que tem por base a oscilação, a pluralidade e,
por fim, o desgaste do próprio “princípio de realidade”, isto é, o homem
pode tornar-se consciente de que a liberdade não consiste em conhecer
a estrutura do real e adaptar-se a ela. A nossa esperança de emancipação
e de liberdade reside neste relativo caos, nesta perda de sentido da reali-
dade, na capacidade de desenraizamento – libertação das diferenças, das
minorias, fim da ideia de uma realidade histórica totalizadora –, embora
sem o abandono de todas as regras. Na verdade, “(…) com a multiplicação
das imagens do mundo perdemos o “sentido da realidade”, como se diz,
talvez isso não seja afinal uma grande perda”361, até porque somos capazes
de viver na experiência de oscilação pós-moderna 362.
A ideia de uma certa nostalgia de fim de século caracteriza-se por um
misto de quatro ideias fundamentais: o declínio da história, o sentimento
de perda da unidade, a sensação de perda da expressividade e da esponta-
neidade, e o sentimento de perda da autonomia individual 363. Nos dias de
hoje é comum falar-se do “declínio do Ocidente”, ou pelo menos num certo
esgotamento da criação contemporânea, isto é, a recusa do “novo” torna-se
numa condição de princípio 364. O pensamento pós-moderno problematiza,
como nenhum outro, a realidade circundante, mas esta problematização
365 L A SH, Scot t – Postmoder nism as humanism ? Urban space and social theor y.
In TURNER, Bryan S. (ed.) – Theories of modernity and postmodernity. London [etc.]: Sage
Publications, 1990, p. 73.
366 DORFLES, Gillo – Elogio da desarmonia. Lisboa: Edições 70, 1988, p. 95.
367 Cf. idem, ibidem, p. 99.
368 Idem, ibidem, p. 105.
“pós-modernidade”, torna-se fundamental a caracterização da modernidade
e a localização da pós-modernidade face à primeira: continuidade ou rup-
tura? Vivemos numa nova era ou apenas numa nova fase da modernidade?
119
Se preferirmos, o debate modernidade/pós-modernidade encontra-se cen-
trado na discussão entre um conceito unitarista e um conceito pluralista
da razão e do real 369.
Não obstante admitamos que os ideais iluministas foram traídos pelas
grandes catástrofes provocadas pelo homem e que, portanto, contrariam
a unilinearidade do progresso civilizacional, devemos considerar que o
processo histórico é pontilhado por avanços e retrocessos. O que talvez
ponha em evidência os grandes cataclismos do século XX é o seu carácter
mais abrangente, mais mediático e, possivelmente, mais programado. Como
afirma Warren Montag (1988):
369
Cf. BERMEJO, Diego – Posmodernidad: pluralidad y transversalidad. Op. cit., p. 2-10.
370 MONTAG, Warren – O que está em jogo no debate sobre o pós-modernismo?
In KAPLAN, E. Ann (org.) – O mal-estar no pós-modernismo: teorias e práticas. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Editor, 1993, p. 133.
Habermas; mas provavelmente se aproxime de um certo “pensamento frágil”,
proposto por Gianni Vattimo, ou de um “realismo utópico”, ensaiado por
Anthony Giddens. A pós-modernidade apresenta-se sobretudo como uma
120
perspectiva através da qual podemos e devemos questionar a modernidade
e, em particular, o mundo que nos rodeia. No que respeita ao domínio
das artes, concretamente ao pós-modernismo, este representará uma nova
forma artística — visto que desde o neoclassicismo que não podemos falar
de um estilo histórico propriamente dito — e, neste caso, quais as suas
características; ou será apenas uma continuidade relativamente às formas
artísticas precedentes?
7.
O “ f i m da a r t e ”, p ó s - m o d e r n i s m o e r e g r e ss o à p i n t u r a
371 Cf. FERRY, Luc – Homo aestheticus. A invenção do gosto na era democrática. Op. cit.,
p. 262-268.
372 Cf. DOCHERTY, Thomas – After theory: postmodernism/postmarxism. London; New
York: Routledge, 1990, p. 18-33.
373 Cf. MICH AUD, Yves – Critères esthétiques et jugement de goût. Paris: Hachette
Littératures, 2007, p. 28-47.
da diferença relacionada com o sentimento de opressão, a crítica do mito
da originalidade e a crítica às narrativas históricas 374. Por seu lado, Matei
Calinescu remete (1987) para a necessidade de uma teoria consistente
122
do pós-modernismo estar revestida de hipotética autoconsciência e de
especificidade de aplicação, tornando-se possível produzir novas visões,
eventualmente alguns aspectos de semelhança com o modernismo e com
a própria vanguarda, ao questionar os princípios de autoridade e de uni-
dade, e ao construir versões não minimalistas 375 . Como escreve Eleanor
Heartney (2001):
374 Cf. WOOD, Paul; FR ASCINA, Francis; HARRIS, Jonathan; HARRISON, Charles –
Modernism in dispute: art since the forties. Op. cit., p. 238-256.
375 Cf. CALINESCU, Matei – As cinco faces da modernidade: modernismo, vanguarda,
decadência, kitsch, pós-modernismo. Op. cit., p. 270.
376 HEARTNEY, Eleanor – Pós-modernismo. Lisboa: Editorial Presença, 2002, p. 6.
377 Ver TRODD, Colin - Postmodernism and art. In SIM, Stuart (ed.) – The Routledge
companion to postmodernism. 2 nd ed. London [etc.]: Routledge, 2005, p. 82-92.
378 Cf. COLLINS, Michael; PAPADAKIS, Andreas - Post-modern design. New York: Rizzoli,
1989, p. 65-80.
específico da história da cultura 379. De um modo geral, quando se fala em
pós-modernismo parte-se do negativo, isto é, por colocar em evidência uma
moda, portanto efémera; um tipo de arte que já não conhece um fio con-
123
dutor; a perda de centralidade; algo que se pauta pela fragmentação, pela
desconstrução, pela coexistência de vários pontos de vista, pelo pastiche380,
pelo caos, pelo efémero, pela colagem, pela paródia 381; que rompe com a
ideia modernista — particularmente no âmbito da arquitectura — dos planos
de grande escala; que é um marasmo382; que não tem critérios estéticos
definidos, enfim, que é quase uma fraude, um déjà vu383.
Além da já referida questão do prefixo “pós” implicar uma carência de
critérios de definição positivos – na verdade, ninguém parece estar satisfeito
com a designação “pós-modernismo/pós-moderno” 384 –, este negativismo
estará também possivelmente relacionado com uma certa confusão entre o
eclectismo pós-modernista e a errada, mas recorrente, crença na potencia-
lidade de qualquer objecto ser arte. Como afirma Andreas Huyssen (1987):
“O que não se pode continuar a fazer é elogiar ou ridicularizar o pós-mo-
dernismo em bloco. O pós-moderno tem de ser salvo dos seus defensores
e dos seus detractores” 385.
Numa atitude mais extrema e pessimista podemos colocar as afirmações
de Gilles Lipovetsky (1983):
379 Cf. CEIA, Carlos – O que é afinal o pós-modernismo? Lisboa: Edições Século X XI,
1999, p. 9 e ss.
380 Imitação criativa, máscara estilística.
381 Deformação, ridicularização, impulso satírico. Na opinião de Jameson, o pastiche
acaba por melhor caracterizar o pós-modernismo uma vez que se trata de uma prática neutra,
amputada do impulso satírico. Cf. JAMESON, Fredric – O pós-modernismo e a sociedade de
consumo. In KAPLAN, E. Ann (org.) – O mal-estar no pós-modernismo: teorias e práticas. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1993, p. 28-32.
382 Cf. LIPOVETSKY, Gilles – A era do vazio: ensaio sobre o individualismo contempo-
râneo. Op. cit., p. 78.
383 Ver, por exemplo, OLAGUER-FELIÚ Y ALONSO, Fernando de – Los grandes “ ismos”
pictóricos del siglo XX. Barcelona: Vicens-Vives, 1989.
384 Cf. WOOD, Paul – Inside the whale: an introduction to postmodernist art. Op. cit.,
p. 16-17.
385 HUYSSEN, Andreas – After the great divide: modernism, mass culture, postmodernism.
Indiana: Indiana University Press, 1986, p. 182.
O pós-modernismo não passa de um outro nome para designar a
decadência moral e estética do nosso tempo. Ideia que não é, aliás, nada
original, uma vez que H. Read escrevia já no início dos anos cinquenta:
124
“A obra dos jovens não passa do reflexo atrasado de explosões que datam
de há trinta ou quarenta anos” 386.
389 Sobre a questão da ironia é interessante ver BEHLER, Ernst – Ironie et modernité.
Paris: Presses Universitaires de France, 1997, p. 331 e ss.
390 SMART, Barry – A pós-modernidade. Op. cit., p. 17-18.
391 Cf. GABLIK, Suzi – Has modernism failed? Op. cit., p. 12.
392 Idem, ibidem, p. 128.
modernidade, já que o próprio modernismo, numa vertente crítica, poderá
ser o antídoto daquela 393. Edward Lucie-Smith também atenta (1984) que
não existe uma real quebra entre modernismo e pós-modernismo, já que,
126
mesmo a arte — da década de oitenta — que se pretendia opor aos cânones
modernistas, acabou por, implicitamente, continuar a tradição modernista.
A arte dos anos oitenta caracterizar-se-ia mais por levar ideias a extremos do
que por realmente inovar 394. Mas será que a pretensão do pós-modernismo
é realmente inovar? Bernardo Pinto de Almeida entende (2007) que é muito
mais o que une os anos sessenta e oitenta do que o que os separa, através
do sentido de abolição do original – mito da originalidade – agora por meio
de intermediações, da teatralidade e da presença da imagem 395.
Rosalind Krauss (1985), por seu lado, nega a continuidade entre moder-
nismo e pós-modernismo:
393 Cf. SPENCER, Lloyd – Postmodernism, modernity and the tradition of dissent. In SIM,
Stuart (ed.) – The Routledge companion to postmodernism. 2 nd ed. London [etc.]: Routledge,
2005, p. 143-154.
394 Cf. LUCIE-SMITH, Edward – Movements in art since 1945. 3 rd ed. London: Thames
& Hudson, 1987, p. 7-24.
395 Cf. ALMEIDA, Bernardo Pinto de – La posmodernidad: entre las décadas de 1960 y
1980. Arte y Parte: Revista de Arte. Op. cit., p. 58-59.
396 KRAUSS, Rosalind – L’originalité de l’avant-garde et autres mythes modernistes. Op.
cit., p. 148.
397 Cf. FOSTER, Hal – Introduction. In FOSTER, Hal (ed.) – The anti-aesthetic: essays on
postmodern culture. New York: The New Press, 2002, p. ix-xvii.
uma verdadeira clivagem entre modernismo e pós-modernismo, tornando-se
fundamental efectuar julgamentos teóricos activos, em vez de reactivos, e
não somente distintivos mas profícuos 398. Sabemos que a vontade de trans-
127
gredir esteve intimamente ligada ao modernismo e às vanguardas. É nesta
senda que Ann Kaplan coloca (1988) algumas reservas à divisão de Hal
Foster: “Assim, vê-se que o pós-modernismo e a transgressão são conceitos
teóricos incompatíveis” 399. E, efectivamente, muitas das características que
são usualmente atribuídas ao pós-modernismo são justamente a diferença,
a nuance, a complexidade dos lugares e das culturas, o reconhecimento
do díspar e do desigual — a nível geográfico, político, sexual, étnico400.
Na opinião de Dick Hebdige (1987) o pós-modernismo não é uma entidade
homogénea nem um movimento, mas um espaço, uma condição, que nos
ajuda a encontrar o poder que reside em pequenos detalhes, em fragmentos,
aforismos e alusões 401.
Terry Eagleton (1996), numa perspectiva neomarxista, entende o pós-
-modernismo no âmbito da falta de sistematização e do paradoxo das grandes
ilusões da actualidade, na crença no prazer e na comodidade proporciona-
da pela tecnologia. A arte tornou-se autónoma das esferas cognitiva, ética
e política, continuando paradoxalmente integrada no modo de produção
capitalista 402 . Na opinião do autor, o debate sobre o pós-modernismo
não é apenas do foro intelectual, já que se trata de uma categoria lata e
complexa, portanto, a sua crítica deverá ser dialéctica e nunca absoluta403.
De facto, o pós-modernismo pode, simultaneamente, ser radical e conser-
vador. Segundo Eagleton: “Se o pós-modernismo cobre tudo desde o punk
rock até à morte da metanarrativa, de fanzines a Foucault, torna-se difícil ver
398 Cf. idem - The return of the real: the avant-garde at the end of the century. Op. cit., p. 226.
399 K APLAN, E. Ann – Introdução. In K APLAN, E. Ann (org.) – O mal-estar no pós-
-modernismo: teorias e práticas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1993, p. 13.
400 Algumas destas ideias estão referidas em HARVEY, David – Condição pós-moderna:
uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. Op. cit., p. 109.
401 Cf. HEBDIGE, Dick – Postmodernism and the “politics” of style. In FRASCINA, Fran-
cis; HARRIS, Jonathan (ed.) – Art in modern culture: an anthology of critical texts. Op. cit.,
p. 331-341.
402 Cf. EAGLETON, Terry – The illusions of postmodernism. Oxford: Blackwell Publishing,
2004, p. 29; idem - The ideology of the aesthetic. Oxford: Blackwell Publishing, 2005, p. 366-415.
403 Cf. MACEDO, Ana G.; DUARTE, João F.; LOURO, Maria F. – Entrevista com Terry
Eagleton. Vértice. Lisboa. N.º 43 (Out. 1991), p. 97-101.
como um qualquer esquema expositivo poderá fazer justiça a tão bizarra e
heterogénea entidade” 404. Efectivamente, o pós-modernismo não pode ser
descontextualizado da sociedade complexa, tecnológica, hedonista, retro405.
128
Como escreve Carlos Ceia (1999):
412 Ver VENTURI, Robert – Learning from Las Vegas. Op. cit.
413 Ver GHIRARDO, Diane – Architecture after modernism. London: Thames & Hudson,
1996; MORGAN, Diane – Postmodernism and architecture. In SIM, Stuart (ed.) – The Routledge
companion to postmodernism. 2 nd ed. London [etc.]: Routledge, 2005, p. 71-81.
414 Cf. CALINESCU, Matei – As cinco faces da modernidade: modernismo, vanguarda,
decadência, kitsch, pós-modernismo. Op. cit., p. 248.
415 Cf. TORRES, Félix – Déjà vu. Post et néo-modernisme: le retour du passé. Paris: Édi-
tions Ramsay, 1986, p. 66.
guerras e a cultura de massas estarem integradas no nosso mundo de
imagens, não faz disto uma ideologia total 416.
131
Kenneth Frampton observa (1983) que a arquitectura só poderá suster-se,
do ponto de vista crítico, se assumir uma posição de afastamento tanto do
mito do progresso iluminista como do mito reaccionário do passado pré-
-industrial, através do “regionalismo crítico”, capaz de mediar o impacte da
civilização universal e os elementos oriundos de cada local 417.
Estas questões não são, contudo, absolutamente peremptórias. Apesar
de se poderem aplicar com evidência a determinados edifícios, por vezes
torna-se complexa a caracterização do estilo pós-moderno na arquitectura.
Neste sentido, o próprio Charles Jencks ensaiaria a hipótese das trinta va-
riáveis identificativas. Mas nas palavras de Matei Calinescu (1987):
416 JENCKS, Charles – Post-modernism: the new classicism in art and architecture. Op.
cit., p. 6-11.
417 Cf. FRAMPTON, Kenneth – Towards a critical regionalism: six points for an architec-
ture of resistance. In FOSTER, Hal (ed.) – The anti-aesthetic: essays on postmodern culture.
New York: The New Press, 2002, p. 17-34.
418 CALINESCU, Matei – As cinco faces da modernidade: modernismo, vanguarda, deca-
dência, kitsch, pós-modernismo. Op. cit., p. 250-251.
individuais, subjectivos, fragmentados, nacionalistas, assim como à iconografia
clássica 419. A transavanguardia correspondeu ao neo-expressionismo em
Itália. A denominada transvanguarda internacional identifica-se, em larga
132
medida, com o movimento neo-expressionista, o qual inclui uma série de
tendências como, por exemplo, além da transavanguardia italiana, a bad
painting norte-americana ou o neo-expressionismo alemão. Estava-se perante
o designado “regresso à pintura”, mais precisamente, o regresso à imagem
da pintura 420 , que volta a confrontar o rigor da fotografia, agora sem a
pretensão de competir pela verosimilhança, mas assumindo uma vontade
de discutir pictoricamente a imagem, centímetro a centímetro.
Do ponto de vista do tema, emerge uma necessidade de se expressarem
determinadas preocupações sociais, humanistas, políticas, sexuais, ou o
próprio problema da disseminação de doenças como a SIDA421, doença de
que morreu prematuramente, por exemplo, Keith Haring. O abstraccionismo
e o conceptualismo tinham determinado o fim de uma trajectória, focando-
-se agora as atenções na arte figurativa entre as duas guerras. E estas novas
tendências foram acompanhadas de exposições determinantes, de que são
exemplos New Image in Painting (Nova Iorque, 1978), Bienal de Veneza
(1980), A New Spirit in Painting (Londres, 1981), Zeitgeist (Berlim, 1982) ou
Documenta 7 (Kassel, 1982), organizada por Rudi Fuchs.
O neo-expressionismo implementa-se de um modo particularmente
consistente em Itália e na Alemanha – contra as regras da arte conceptual
e como espelho da apreensão face a um país dividido, respectivamente –,
por exemplo na obra de Carlo Maria Mariani, Francesco Clemente, Sandro
Chia, Anselm Kiefer, ou Jorg Immendorff, conhecendo também notável
impacte nos Estados Unidos da América da era conservadora de Ronald
Reagan, com David Salle, Eric Fischl, Julian Schnabel, Ross Bleckner,
entre outros. No Reino Unido, talvez de um modo mais contínuo, o neo-
422 Cf. KAPLAN, E. Ann – Feminismo, Édipo, pós-modernismo: o caso da MTV. In KA-
PLAN, E. Ann (org.) – O mal-estar no pós-modernismo: teorias e práticas. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Editor, 1993, p. 45-63; OWENS, Craig – The discourse of others: feminists and
postmodernism. In FOSTER, Hal (ed.) – The anti-aesthetic: essays on postmodern culture. New
York: The New Press, 2002, p. 65-92; THORNHAM, Sue – Postmodernism and feminism. In
SIM, Stuart (ed.) – The Routledge companion to postmodernism. 2 nd ed. London [etc.]: Rou-
tledge, 2005, p. 24-34.
das temáticas 423. O pós-modernismo mantém a sua identidade através de
uma nova mimesis, ou seja, através da contaminação entre a linguagem –
podemos entender em sentido lato – e quem a usa 424. No domínio musical,
135
além da música punk, nascida no Reino Unido na década de setenta 425,
podemos referenciar a música de inspiração minimalista ou performativa,
nomeadamente, de Steve Reich, Philip Glass ou Laurie Anderson. Mas, enfim,
é viável estender uma visão pós-moderna às peças teatrais de Peter Handke
ou de Thomas Bernhard, às encenações de Robert Wilson, às coreografias
de Pina Bausch, à literatura de Italo Calvino, de Jorge Luís Borges ou de
Thomas Pynchon. Nas palavras de David Harvey (1989):
423 Ver HILL, Val – Postmodernism and cinema. In SIM, Stuart (ed.) – The Routledge com-
panion to postmodernism. 2 nd ed. London [etc.]: Routledge, 2005, p. 93-102; DEGLI-ESPOSTI,
Cristina (ed.) – Postmodernism in the cinema. New York/Oxford: Berghahn Books, 1998.
424 Cf. ULMER, Gregory L. – The object of post-criticism. In FOSTER, Hal (ed.) – The
anti-aesthetic: essays on postmodern culture. New York: The New Press, 2002, p. 93-125.
425 Cf. DAVIS, Mike – O renascimento urbano e o espírito do pós-modernismo. In KA-
PLAN, E. Ann (org.) – O mal-estar no pós-modernismo: teorias e práticas. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Editor, 1993, p. 106-116.
426 HARVEY, David – Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança
cultural. Op. cit., p. 326.
427 Cf. GUASCH, Anna Maria – La crítica dialogada. Entrevistas sobre arte y pensamiento
actual (2000-2006). Op. cit., p. 40.
desde os anos sessenta, particularmente desde as experiências da pop art
e da arte conceptual – movimentos também designados de neovanguarda
ou vanguarda tardia e, em algumas situações híbridas, considerados retros-
136
pectivamente pós-modernos. Voltar-se para o passado pode, neste contexto,
assumir uma atitude mais inovadora do que o experimentalismo, tornando-se
inclusivamente possível a coexistência de várias tendências artísticas – neo-
-expressionismo alemão, transavanguardia, bad painting, revivals, etc. – no
seio do eclectismo pós-moderno, ao mesmo tempo que se tende para a
separação dos domínios ético e estético – formalismo. Precisamente porque
já não se crê na imanência do objecto, nem na incontingência do mundo.
Também no domínio da arquitectura é possível encontrar sobreposições,
ambiguidades, descontinuidades, imitações criativas, recuperação de his-
toricismos e de formalismos – dualidade entre fachada e estrutura/função.
Por outro lado, a produção artística depende cada vez mais de factores
exógenos à obra de arte e ao artista, tais como, o mercado da arte, os gale-
ristas, os críticos, a heterogeneidade do público receptor, a publicidade, os
media, etc. Apesar de se reconhecer alguma falta de critérios de definição
positivos ao pós-modernismo, ainda não é, talvez, possível construir outra
designação que não se afigure como referência ao seu grande movimento
predecessor – o modernismo. Todavia, e retomando esta questão, o pós-
-modernismo assume uma ruptura face ao modernismo, pelo seu eclectismo,
pela sua fragmentação, pela sua referência ao passado, pela sua liberdade
normativa, conceptual e formal, pela sua assumida separação da praxis vital do
ser humano, apesar de a criação artística implicar sempre algo de inovador, se
quisermos, vanguardista em sentido qualificativo. E, não obstante assumamos
uma ruptura entre modernismo e pós-modernismo, na senda de autores como
Rosalind Krauss, devemos entender o pós-modernismo essencialmente em
duas variantes, na esteira de Hal Foster: a de resistência e a de reacção; uma
desconstrutiva, a outra de retorno à tradição, ou seja, a um certo classicismo.
É como se assumíssemos uma ruptura artística e estética em relação a uma
esfera no limite da qual, temporalmente, ainda nos encontramos.
Do ponto de vista da crítica de arte, Hal Foster, numa entrevista reali-
zada pela crítica e historiadora de arte catalã, Anna Maria Guasch, afirma
(2000) que o que lhe interessou na pintura pós-moderna dos anos oitenta
foi a sofisticação das formas, o comprometimento político e a crítica face
à representação, às instituições artísticas e à economia política, provando
que o pós-modernismo não seria unicamente um conjunto de clichés ou um
137
conceito estilístico, mas uma via para reflectir sobre o passado e reperiodizá-
-lo428. Arthur Danto, numa entrevista com a mesma autora (2005), diria que
a crítica de arte moderna é formalista – exercício de formalismo –, enquanto
a crítica pós-moderna é relativista – falta de verdades absolutas em arte e
consequente pluralismo radical –, e uma não se opõe necessariamente à
outra 429. Na opinião deste crítico:
1. Bibliografia específica
1.1. Monografias
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Parte: Revista de Arte. Santander. N.º 70 (Ago./Set. 2007), p. 30-59.
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Linguagens. Lisboa: Edições Afrontamento. N.º 6/7 (1988), p. 49-52.
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Fundação Calouste Gulbenkian. N.º 85 ( Jun. 1990), p. 54-61.
BAUDRILLARD, Jean – O orbital. O exorbital. Revista de Comunicação e Linguagens. Lisboa:
Edições Afrontamento. N.º 6/7 (1988), p. 337-346.
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Moderne. Paris: Centre Georges Pompidou. N.º 19-20 (juin 1987), p. 6-19.
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Fundação Calouste Gulbenkian. N.º 11 (Fev. 1978), p. 13-17.
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CAVALCANTI, Gilberto – Aspectos do ritual na arte contemporânea. Colóquio/Artes. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian. N.º 22 (Abr. 1975), p. 36-43.
COELHO, Eduardo Prado – Fragmentos de um diálogo sobre crítica. Prelo. Lisboa: Imprensa
Nacional – Casa da Moeda. N.º especial (Maio 1984), p. 57-60.
COELHO, Tereza - Gianni Vattimo: da crise da razão ao “pensamento frágil” [entrevista com
Gianni Vattimo]. Expresso/Revista. Lisboa. N.º 757 (30 Maio 1987), p. 58-60.
COEN, Ester – Les futuristes et le moderne. Les Cahiers du Musée National d’Art Moderne.
Paris: Centre Georges Pompidou. N.º 19-20 (juin 1987), p. 60-73.
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Centre Georges Pompidou. N.º 19-20 (juin 1987), p. 52-59.
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National d’Art Moderne. Paris: Centre Georges Pompidou. N.º 19-20 (juin 1987), p. 20-51.
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preender. Revista de Comunicação e Linguagens. Lisboa: Edições Afrontamento. N.º 6/7
(1988), p. 273-279.
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Comunicação e Linguagens. Lisboa: Edições Afrontamento. N.º 6/7 (1988), p. 131-136.
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46 (Nov. 1978), p. 11-19.
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Lisboa. N.º 43 (Out. 1991), p. 97-101.
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n.º 5 (Nov. 1981), p. 404-408.
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Reflexão e Crítica. Lisboa. N.º 13 (Inverno 1993), p. 91-102.
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Século XX. Coimbra: CEIS20/Imprensa da Universidade. N.º 7 (2007), p. 337-347.
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Lisboa: Edições Afrontamento. N.º 6/7 (1988), p. 125-130.
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3. Bibliografia de apoio
166
(Página deixada propositadamente em branco)
SÉRIE ENSINO
IMPRENSA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA
COIMBRA UNIVERSITY PRESS
2012