PEQUI: Do Cerrado Ao Bistrô
PEQUI: Do Cerrado Ao Bistrô
PEQUI: Do Cerrado Ao Bistrô
PEQUI:
do cerrado ao Bistrô
ATAÍDE, Thalita Hévillin de Carvalho Jorge1; HORTA, Patrícia Maia do Vale2; MAIA,
Haline Aparecida de Oliveira3.
RESUMO
1 INTRODUÇÃO
O pequi faz parte das tradições, canções e alimentação das comunidades rurais
do cerrado, e atualmente, o fruto é bastante apreciado também nas cidades. O consumo
está se difundindo para outras regiões do país, principalmente em forma de conserva. Os
pratos típicos, em sua maioria salgados, são preparados com a polpa, que tem sabor e
cheiro bem característicos (ALMEIDA; SILVA, 1994).
Sabendo que o pequi é um fruto utilizado em preparações salgadas, na sua
maioria, como é possível aproveitar tal fruto na confeitaria? O Objetivo geral deste artigo
foi experimentar as possibilidades da utilização do pequi em sobremesas mais
elaboradas, bem como divulgar mais este fruto do cerrado brasileiro que por muitos é
desconhecido. Para tanto foi desenvolvido um pudim de pequi servido com uma calda
feita com a polpa do mesmo, um brownie4 de chocolate com castanhas de pequi e
também foi elaborada uma farofa de castanha de pequi com açúcar mascavo numa
apresentação contemporânea confirmando assim sua versatilidade e potencial na
confeitaria.
Este artigo encontra-se dividido em outras quatro partes, a primeira apresenta um
breve histórico sobre os frutos do cerrado e as características do pequi, sua utilização na
culinária e sua amêndoa pouco conhecida. A segunda parte, denominada Material e
Métodos, descreve a metodologia utilizada para elaboração deste artigo e a ficha técnica
de preparo. Em seguida o texto traz os resultados e a discussão da pesquisa, e as
conclusões.
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Bolo de chocolate, normalmente quadrado ou redondo, de forma achatada e que é servido em pequenas
quantidades (FERREIRA, 2010).
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Diz-se dos animais que vivem em bandos ou em grupos. Que faz parte de grei ou rebanho (FERREIRA,
2010).
4
são colhidos no solo e certos pequizeiros produzem mais de 6.000 frutos (ALMEIDA;
SILVA, 1994).
Os frutos jovens e maduros, com coloração verde, possuem geralmente um caroço,
mas podem ter até quatro caroços por fruto. Cada caroço é protegido por uma camada
espinhosa, contém uma amêndoa comestível e pouco explorada (BARRADAS, 1971;
POZO, 1997).
A polpa do fruto, parte mais importante em termos de utilização, possui teores
médios de vitamina C, em torno de 72,27 mg/100 g (SANO; ALMEIDA, 1998). Este valor é
superior aos encontrados em frutos cítricos como a laranja-da-bahia (47,0 mg), o limão-
galego (11,8 mg), a tangerina (46,8 mg). Com relação ao teor de óleo, os valores
relatados foram superiores aos contidos no abacate (16,0%), babaçu (19,50%) e
amendoim cru (48,46%). Em relação às proteínas, os teores encontrados variam de
6,71% a 13,5%, superiores aos encontrados no abacate que é, em média, 1,80%
(FRANCO, 1992).
Na amêndoa, o teor de proteína varia de 24% a 54% e no óleo, de 42,2% a 47%.
Como os minerais são encontrados mais na amêndoa do que na polpa, é importante a
atenção em termos de seu aproveitamento na nutrição humana (FERREIRA et al., 1988).
O fruto se distingue ainda dos demais pela quantidade de espinhos, de estrutura
muito fina, presente na sua polpa. Esse fato, aliado às características intrínsecas da sua
polpa, de textura dura, pegajosa, constituindo-se de uma fina camada de 2 a 3 mm de
espessura fortemente aderida ao seu caroço reniforme, dificulta muito a sua despolpa
pelo fato do risco de quebrar o caroço e expor os espinhos para se misturarem com a
polpa (OLIVEIRA, 2009).
A qualidade dos frutos depende, além de outros fatores, do estágio de maturação
por ocasião da colheita, o qual influencia muito na vida útil pós-colheita. Colheitas
realizadas antes que os frutos atinjam completa maturação fisiológica, prejudicam o
processo de amadurecimento, afetando a sua qualidade. Por outro lado, colheita de frutos
totalmente maduros reduz a vida útil, dificulta o manuseio e transporte, devido sua baixa
resistência física, causando perdas quantitativas e qualitativas (CHITARRA; CHITARRA,
1990).
Ainda segundo Chitarra e Chitarra (1990), os frutos de pequi são normalmente
coletados no chão, logo que amadurecem e caem das árvores, quando são considerados
maduros. Após a queda natural, caso não seja realizada a coleta imediata, os frutos
tornam-se macios em dois ou três dias e rapidamente entram em processo de
deterioração. Em função da crescente demanda e quando os preços estão altos, muitos
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coletores realizam a coleta na árvore, ‘pequi de vara’, que consta da derrubada dos frutos
sem que tenham completado o processo de maturação, considerado um dos principais
problemas do extrativismo atual do pequi, reduzindo a qualidade do fruto comercializado.
O congelamento na entressafra, um dos principais métodos de conservação de frutos,
tem sido bastante utilizado na conservação de pequi. Durante a safra, os frutos são
descascados, e os putamens (polpa ou mesocarpo interno + semente = caroço),
acondicionados em saco plástico e conservados em freezer para o consumo na
entressafra.
Hoje em dia, a exploração econômica do pequi é considerada prática
ambientalmente sustentável. A importância socioeconômica é verificada no conjunto de
atividades que incluem a coleta, transporte, beneficiamento, comercialização e consumo,
tanto do fruto in natura quanto dos produtos derivados (ROCHA et al., 2008).
O pequizeiro é uma planta muito versátil no que diz respeito às suas utilidades,
pois dela se aproveita praticamente tudo. A madeira de cor amarelo-parda é bastante
resistente, sendo usada em casos que se exige uma alta durabilidade, como na
fabricação de dormentes, esteios de curral, mourões e pilões (PAULA; ALVES, 1997).
Devido à sua propriedade de alto poder calorífico e teor de carbono fixo, a árvore é usada
na produção de carvão para siderurgias (LABORIAU, 1966).
Devido a altos teores de taninos nas folhas e casca, essas vêm sendo utilizadas
como matéria-prima na fabricação de tinturas, resultando em corantes de cor amarela de
excelente qualidade, que vêm sendo utilizadas no tingimento de vários produtos, como
couro, lã e algodão (SILVA FILHO, 1992).
O fruto também é ingerido pelos bovinos, no entanto, esses podem apresentar
riscos para os animais devido à presença do endocarpo espinhoso. Animais silvestres,
como a paca, o veado-campeiro e o mateiro, ainda têm as flores do pequizeiro como
alimentos e os locais de alimentação desses animais silvestres são tidos como pontos de
espera de caça (ALMEIDA et al., 1998).
Como planta medicinal, o óleo da polpa do pequi tem efeito tonificante, sendo
usado contra bronquites, gripes e resfriados. Comumente, o óleo é misturado ao mel de
abelha ou à banha de capivara e é usado como expectorante (ALMEIDA et al., 1998).
O chá de suas folhas, que é considerado adstringente, é usado como estimulante
da secreção da bílis e regulador do fluxo menstrual (BRANDÃO et al., 1992). Na indústria
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cosmética, fabricam-se cremes e sabonetes para a pele, tendo o pequi como componente
(ALMEIDA et al., 1998). Silva (1994), estudando as propriedades cosméticas do óleo do
fruto do pequi, encontrou um componente natural da emulsão epicutânea, ou seja, rico em
ácido oleico e também em beta-caroteno (pró-vitamina A), com funções de absorver
radiação ultravioleta e associado aos anti-radicais livres. Além de todos esses usos, o
pequizeiro também é uma árvore ornamental, devido ao porte de sua copa e beleza de
suas flores, que atraem diversos tipos de abelhas, sendo considerada uma árvore
melífera (ALMEIDA et al., 1998). A maior utilidade do fruto, porém, está no uso alimentar,
sendo muito apreciado na culinária.
regiões de cultivo de pequi e cai muito bem como digestivo depois das refeições. A bebida
leva mais tempo para ficar pronta, até dois meses porque os pequis precisam ficar dentro
de um recipiente de vidro fechado, com pinga, para a mistura das essências (ALMEIDA,
1994).
Atualmente, chefes importantes do cenário gastronômico brasileiro têm
diversificado o uso do pequi em preparações diversas pois ele pode ser facilmente
combinado com outros alimentos tanto para pratos doces, quanto para pratos salgados.
Como exemplo tem-se o chef Agenor Maia, do restaurante Olivae, que acredita que a
rejeição do pequi por algumas pessoas se deve ao uso exagerado do fruto nas receitas
tradicionais, para tanto ele desenvolveu um delicado frango frito, servido com gema de
ovo caipira cremosa, cozida em óleo de pequi servido com um pouco de castanha de
pequi ralada por cima (PINHO, 2014).
A chef Helena Rizzo apresenta um menu completo tendo o pequi como inspiração.
[...] de entrada ela serve um bacalhau com purê de taioba e farofinha preparada
com óleo de pequi. “Essa fruta é sempre polêmica, ou você a ama, ou a odeia. O
pequi tem muita personalidade”, diz a chef, referindo-se ao intenso perfume e
sabor da fruta. Na sequência, Helena ensina o preparo de um arroz de pato com
pequi, elaborado com a variedade espanhola bomba. Os grãos são cozidos em
um caldo dourado feito com os ossos da ave. “Gosto desse arroz porque consigo
obter uma textura muito uniforme e, ao mesmo tempo, al dente”. Para completar, a
chef serve um flan de chocolate usando o pequi fresco para perfumar
(MASTROROSA, 2013, on line).
3 MATERIAL E MÉTODOS
Fonte: O autor.
Fonte: O autor.
Fonte: O autor.
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Após vários testes, chegou-se ao prato apresentado, tendo como componentes um pudim
de pequi servido com uma calda do fruto, um brownie de chocolate contendo as
castanhas do pequi e uma farofa de castanha de pequi triturada com açúcar mascavo.
Inicialmente, cada componente do prato, o pudim de pequi e sua calda, o brownie
de chocolate com castanhas de pequi e a farofa de amêndoa de pequi e açúcar mascavo,
foi trabalhado individualmente, visando facilitar a percepção de mudanças necessárias
bem como aumentar a probabilidade de acerto. Depois de realizadas todas as avaliações,
optou-se por testar todos os componentes da sobremesa em conjunto, podendo assim
avaliar a harmonia do prato proposto.
Primeiramente, trabalhou-se o pudim buscando encontrar uma textura lisa e uma
cor amarela semelhante ao fruto, bem como testou-se a temperatura e tempo ideal para
cozimento do pudim. Foram necessários dois testes para atender aos critérios citados
acima. O primeiro teste utilizou a polpa do pequi amassada na massa, porém constatou-
se grumos e o pudim ficou poroso, já a cor amarela desejada foi encontrada, o tempo de
cozimento de 40 minutos a uma temperatura do forno convencional de 180ºC foram
satisfatórios. Buscando corrigir a textura do pudim, optou-se por passar a polpa por uma
peneira, obtendo um creme liso, que ao ser misturado aos outros ingredientes resultou em
um pudim bem homogêneo. Após obter a consistência, cor e textura satisfatórias,
começou-se a pensar em uma calda para servir por cima do pudim e foram feitos dois
testes para isso.
A primeira calda preparada, foi a tradicional mistura de água e açúcar reduzida ao
fogo, porém constatou-se que ela não agregou sabor ao doce, apenas brilho. Na segunda
tentativa misturou-se 5g do creme da polpa do pequi a calda tradicional, que ao ser
colocada sobre o pudim, além de trazer brilho, trouxe também mais cor e agregou mais
sabor de pequi ao pudim.
Após a conclusão do pudim, passou-se para a elaboração do brownie com as
castanhas do pequi. No primeiro teste, o chocolate utilizado era muito açucarado o que
provocou um excesso de açúcar no brownie, o segundo problema esteve no fato da forma
ter sido pequena para a quantidade de massa o que ocasionou o transbordo da mesma
no forno convencional. No segundo teste, trocou-se a marca do chocolate e o tamanho da
forma, estes requisitos foram resolvidos, porém constatou-se que a quantidade de
fermento foi superior a necessária, uma vez que o brownie ficou com uma textura de bolo
leve e seco e não cremoso e úmido como deve ser um brownie. O terceiro teste serviu
para regular a fermentação substituindo todo o fermento químico (11 gramas) por 10
gramas de bicarbonato de sódio. Constatou-se a melhora da textura, porém o brownie
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não ficou tão cremoso quanto desejado. Ainda buscando regular a fermentação, foi
realizado um último teste, no qual reduziu-se os 10 gramas de bicarbonato de sódio a
metade, 5 gramas, o que provocou uma leve fermentação e aeração na massa sem,
contudo, transformá-la num bolo. Percebeu-se que a textura cremosa e úmida e o sabor
estavam dentro do esperado, corrigiu-se a receita e passou para o teste da farofa de
castanha de pequi.
Para a farofa de castanha de pequi, foi necessário apenas um teste. Ao se misturar
a castanha triturada ao açúcar mascavo e levá-los em frigideira ao fogo médio, por cerca
de cinco minutos se obteve uma mistura bem crocante e saborosa, com um leve gosto de
pequi oriundo da castanha.
Com as preparações prontas, o próximo passo foi a montagem da sobremesa.
Buscando um empratamento moderno e com harmonia visual entre os elementos, no qual
se pudesse distinguir formas, cores e texturas diferentes, optou-se por um prato
retangular, distribuindo os componentes de forma linear. Para finalizar, sentiu-se a
necessidade de um praliné6 de castanha de pequi, que foi feita para proporcionar altura
ao empratamento, como pode ser observado na figura 1.
FIGURA 1 – Pudim de pequi, Brownie com castanha de pequi e farofa de pequi e açúcar mascavo
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Confeito de amêndoas cobertas por açúcar caramelizado (GOMENSARO, 2011).
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5 CONCLUSÃO
O pequizeiro é uma planta muito versátil no que diz respeito às suas utilidades,
pois dela se aproveita praticamente tudo, madeira, folhas, cascas, o fruto, e até sua
castanha. O fruto pequi é consumido pelas populações que habitam as regiões nas quais
são produzidos. O consumo está começando a se difundir para o restante do país.
Pode-se perceber que o objetivo geral deste artigo foi cumprido pois se
experimentou as possibilidades da utilização do pequi em preparações doces, no caso o
pudim de pequi servido com uma calda feita com a polpa do mesmo, um brownie de
chocolate com castanhas de pequi, valorizando assim a amêndoa do fruto, e a farofa de
castanha de pequi com açúcar mascavo, assim este trabalho se torna, a partir de então,
uma fonte de divulgação deste fruto do cerrado brasileiro que por muitos é desconhecido
e mostra uma aplicação diferenciada das comumente usadas, que trabalham o pequi em
pratos salgados, explorando aqui, o pequi na confeitaria.
ABSTRACT
The Pequi, symbol of the Brazilian cerrado, is a fruit widely consumed by the population of
the central-west region and north of Minas Gerais, but a little unknown by the rest of the
country. Typical dishes, mostly salty, are prepared with the pulp, which has a very
characteristic taste and smell. As an example, the traditional rice of pequi, chicken with
pequi, bean with pequi or even just the fruit cooked in water and salt. Knowing this, the
objective of this article was to try out the possibilities of the use of pequi in desserts, as
well as to divulge more this fruit of the Brazilian cerrado, which by many is unknown. To do
so, the methodology was based on a bibliographical research, in books and articles, and
on an experimental research, to prepare a dessert that put this proposal into practice. After
some tests, the final dish was prepared in which pequi was applied to two desserts
appreciated by Brazilians.
Keywords: Gastronomy. Confectionery. Dessert. Pequi Almonds
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REFERÊNCIAS
FLÁVIA Quaresma celebra comida de botequim em jantar. Prazeres da Mesa. São Paulo,
10 abr 2018. Disponível em: http://prazeresdamesa.uol.com.br/flavia-quaresma-celebra-
cozinha-de-botequim-em-jantar/. Acesso em: 15 Maio 2018.
PINHO, F. G. Uso exagerado do pequi faz chef propor novos usos para o fruto. Prazeres
da Mesa. São Paulo, 13 ago. 2014. Disponível em: http://prazeresdamesa.uol.com.br/uso-
exagerado-do-pequi-faz-chef-propor-novos-usos-para-o-fruto/. Acesso em: 15 Miao 2018.
RIBEIRO, R.F. Pequi: o rei do cerrado. Belo Horizonte: Rede Cerrado, 2000.