Crónica de D. João I

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Fernão Lopes, Crónica de D.

João I
Idade Média

Século XV
Fernão Lopes (c. 1380 – 1460)
Crónica de D. João I (c. 1450)
São escassos os dados biográficos conhecidos sobre Fernão Lopes. Os testemunhos
documentais de que dispomos informam, sobretudo, sobre os cargos que ocupou ao
serviço dos primeiros reis da dinastia de Avis. Por certidões de 1418, sabe-se que
exercia as funções de “guardador das escrituras do Tombo” e “escrivão dos livros” de
D. João I e D. Duarte.
Enquanto cronista oficial sob as cortes de D. João I, D. Duarte e regência de D. Pedro,
redigiu as crónicas de D. Pedro, D. Fernando e D. João I. As suas funções simultâneas
como guardador das escrituras e cronista-mor do reino acabam por favorecer o seu
legado como historiador, visto que a composição das crónicas dependeu do
conhecimento e seleção do material a que tinha acesso.
Mas é acima de tudo pelas crónicas de D. Pedro, de D. Fernando e de D. João I (que
chegaram até nós por apógrafos do século XVI) que o talento e excecionalidade como
historiador e como escritor, relativamente aos cronistas medievais, se afirmou. Não se
trata para o cronista de refundir textos historiográficos anteriores, mas de elaborar em
novos moldes a narração do devir histórico, individualizando os protagonistas na sua
compleição psicológica denunciada em ato, encenando os episódios históricos no
mesmo momento da sua ocorrência, emprestando tanto quanto possível verosimilhança
no encadeamento dos factos.

1383 1384 1385

Morre D. Fernando, nono O bispo da Guarda facilita Início do reinado


rei de Portugal. Regência a entrada naquela cidade de D. João I.
de D. Leonor Teles. do monarca castelhano.
Revolução de Lisboa. O João I de Castela chega a
Conde Andeiro é Santarém, onde se
assassinado pelo Mestre encontra com D. Leonor
de Avis. Teles.
O Mestre de Avis pede João I de Castela cerca
auxílio a Ricardo II de Lisboa. Epidemia de peste.
Inglaterra.
É elevado a regedor e
defensor do reino.
Afirmação da consciência coletiva
Crise política de 1383-1385
Período histórico em que o país esteve sem rei/período de tomada de consciência de
liberdades e responsabilidades.
Povo

• Papel decisivo na fase de nomeação do Mestre;


• Vivência heroica dos grandes momentos da revolução (preparação do cerco, de
forma empenhada e valorosa; vivência da miséria associada à falta de
mantimentos durante o cerco).

Atores individuais e coletivos


O facto de o povo ser o protagonista por excelência das crónicas de Fernão Lopes, e
em particular da Crónica de D. João I, não invalida, porém, a existência de atores
individuais. Na verdade, na crónica em questão, podemos identificar alguns e com
papéis relevantes, como é o caso de:

Mestre de Avis
Um homem que se mostra receoso, no seguimento do assasinato
do conde Andeiro; acarinhado e apoiado pelo povo - um líder
resoluto, mas também solidário com a população.

Álvaro Pais
O burguês que espalha pelas ruas de Lisboa que estão a matar o
Mestre, influenciado o povo a correr em seu auxílio.

D. Leonor Teles
A mulher que gera ódios na população e que é apelidade de
"aleivosa" (traidora) (capítulo 11).

Todas estas figuras são apresentadas pelo cronista na sua densidade psicológica, nos
dramas, nas angústias e nos anseios e, por isso, ainda que muito diferentes (em termos
de motivações, comportamentos, atitudes), aproximam-se pelo seu lado humano.
Mesmo quando o cronista foca a sua atenção nestes atores individuais, fá-lo, porém,
apenas no sentido de os integrar num todo, na sociedade à qual pertencem. Daí a
consciência coletiva ser tão marcante na sua obra.
População (massa coletiva)
A ideia de pátria em Fernão Lopes é diferente da dos seus antecessores: não é um
espaço geográfico delimitado que é necessário defender dos invasores, mas uma
sociedade de abrigo, que gera, defende e salva os seus habitantes. Uma salvação
coletiva que se situa acima dos interesses particulares e só obedece a um imperativo
do bem comum. A manta retalhada do domínio feudal dá lugar à consciência nacional e
a Nação já não pertence ao rei, mas o rei é que pertence à Nação.
Crónica medieval – género da tradição historiográfica e literária
Características comuns a outras crónicas medievais

• Texto em que se registam acontecimentos históricos por ordem cronológica.


Características inovadoras de Fernão Lopes

• Articulação entre a compilação de fontes e a investigação original e crítica.


• Dimensão interpretativa e estética.
• Visão global e integradora de várias perspetivas.

Estrutura global
Crónica dividida por duas partes (divididas em capítulos):

1ª parte 2ª parte
Relato dos acontecimentos Relato dos acontecimentos
ocorridos entre a morte de D. ocorridos durante o reinado de D.
Fernando e a subida ao trono de D. João I até 1411 (ano em que foi
João I. assinada a paz com Castela).

Estrutura, linguagem e estilo


Articulação entre objetividade e subjetividade
A objetividade está presente no rigor da pormenorização (por exemplo, as descrições
pormenorizadas com valor descritivo e informativo). A subjetividade está presente na
apreciação crítica e emotiva dos factos relatados (interrogação retórica, frase
exclamativa).
Coloquialismo
Interpelação do interlocutor (narratário), recorrendo à 2ª pessoa do plural e à apóstrofe.
Utilização do verbo ouvir, sugerindo a interação oral. Reprodução de cantigas populares.
Uso de palavras/expressões de sabor popular e/ou arcaizante.
Visualismo e dinamismo
Articulação entre planos gerais (focalização da cidade e dos atores coletivos que nela
intervêm) e planos de pormenor (incidência em grupos de personagens e/ou em
situações particulares). Recriação dos acontecimentos de forma dinâmica.
Emprego de vocábulos que marcam o sensorialismo da linguagem (atos de ver e ouvir).
Emprego de recursos expressivos que conferem visualismo ao relato: comparação,
personificação, enumeração, hipérbole.

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