Nucci 03 - Sistemas Do Processo Penal
Nucci 03 - Sistemas Do Processo Penal
Nucci 03 - Sistemas Do Processo Penal
1. SISTEMA INQUISITIVO
É caracterizado pela concentração de poder nas mãos do julgador, que exerce,
também, a função de acusador; a confissão do réu é considerada a rainha das provas;
não há debates orais, predominando procedimentos exclusivamente escritos; os
julgadores não estão sujeitos à recusa; o procedimento é sigiloso; há ausência de
contraditório e a defesa é meramente decorativa.
Esse sistema foi utilizado com sucesso em parte da Idade Média para combater os
abusos cometidos pelos senhores feudais e pela aristocracia em detrimento de vassalos
e pessoas pobres. Diante disso, os reis podiam enviar os juízes inquisidores, em seu
nome, com poder suficiente para se voltar contra os ricos, autores de delitos graves,
que não podiam ser tratados com absoluta igualdade. Aliás, aplicava-se a ideia da
isonomia – tratar desigualmente os desiguais.
Atuando contra ricos e poderosos, o processo penal jamais poderia lastrear-se, à
época, em plena igualdade. Eis o motivo pelo qual o juiz inquisidor consegue
amealhar provas, sem que as testemunhas se furtassem aos depoimentos, com temor
de represálias, fazendo-o de maneira sigilosa, até que ficasse pronta a instrução.
Assim, vítimas pobres poderiam ver a justiça ser realizada mesmo quando seus
algozes fossem nobres ou afortunados.
Por óbvio, o sistema inquisitivo, mesmo servindo a um lado positivo, apresentou
várias falhas e deu ensejo a abusos. Um dos principais custos do referido sistema deu-
se, justamente, no âmbito da inquisição promovida pela Igreja, à cata de hereges. Em
lugar de combater a injustiça social, terminou por promover uma autêntica caça às
bruxas (literalmente), sem a menor chance de defesa.
O advento da Revolução Francesa, com as ideias iluministas, torna o sistema
inquisitivo incompatível com a nova realidade. Isso jamais significou que seus
postulados fossem completamente despropositados e inválidos para garantir a
eficiência de uma investigação criminal. Tanto é verdade que, no mundo atual, vê-se o
sistema inquisitivo permear a persecução penal em vários momentos. No caso do
Brasil, é o sistema eleito para a investigação do delito, antes que a peça acusatória seja
apresentada em juízo.
2. SISTEMA ACUSATÓRIO
Possui nítida separação entre o órgão acusador e o julgador; há liberdade de
acusação, reconhecido o direito ao ofendido e a qualquer cidadão; predomina a
liberdade de defesa e a isonomia entre as partes no processo; vigora a publicidade do
procedimento; o contraditório está presente; existe a possibilidade de recusa do
julgador; há livre sistema de produção de provas; predomina maior participação
popular na justiça penal e a liberdade do réu é a regra.
Pode-se apontar a prevalência do sistema acusatório na época romana antiga, ao
mesmo tempo em que se pode encontrá-lo na legislação atual de vários países. Não é
uma criação inédita do Iluminismo, tampouco um sistema infalível. Mesmo os
ordenamentos jurídicos mais modernos, que adotam a prática acusatória como regra,
terminam por acolher alguns aspectos do inquisitivo, no mínimo para a primeira fase
da colheita da prova, pois mais eficiente e célere.
3. SISTEMA MISTO
Surgido após a Revolução Francesa, uniu as virtudes dos dois anteriores,
caracterizando-se pela divisão do processo em duas grandes fases: a instrução
preliminar, com os elementos do sistema inquisitivo, e a fase de julgamento, com a
predominância do sistema acusatório. Num primeiro estágio, há procedimento secreto,
escrito e sem contraditório, enquanto, no segundo, presentes se fazem a oralidade, a
publicidade, o contraditório, a concentração dos atos processuais, a intervenção de
juízes populares e a livre apreciação das provas.
Conforme bem atesta Gilberto Lozzi, na realidade, não existe um processo
acusatório puro ou um processo inquisitório puro, mas somente um processo misto, de
onde se possa perceber a predominância do sistema acusatório ou do inquisitivo
(Lezioni di procedura penale, p. 5). Essa é, sem dúvida, a realidade da maioria dos
ordenamentos jurídicos do mundo atual.
SÍNTESE
Sistema inquisitivo: ausência de contraditório e ampla defesa; sigilo no procedimento; ausência ou limitação de
recursos; inviabilidade de recusa do órgão investigador/julgador; confusão no mesmo órgão das funções acusatória
e julgadora; predomínio da linguagem escrita.
Sistema acusatório: enaltecimento do contraditório e da ampla defesa; publicidade dos atos; duplo grau de
jurisdição assegurado; possibilidade de recusa do julgador; impossibilidade de confusão no mesmo órgão de
acusador e juiz.
Sistema misto: início da investigação contando com os princípios regentes do sistema inquisitivo; processo-
crime instruído pelos princípios condutores do sistema acusatório; predomínio da linguagem oral.