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Alberto Alves de Amorim 1, Tainara Silva Macêdo󠆮2, Thaline Cristina de Freitas Souza3 e
Catarina
Este artigo foi produzido para uma disciplina da Graduação em Psicologia da Universidade
Federal de Santa Catarina. Os autores desse artigo se encontram em processo de formação
superior. Correspondências relacionadas a esse artigo devem ser encaminhadas, por meio dos
endereços de e-mail alberto12345@gmail.com, tainarasilva108@gmail.com,
thalinecristina1999@gmail.com e/ou vivianefornari@hotmail.com.
Resumo
A temática deste trabalho está centrada nas reflexões sobre o excesso de preocupação
da mulher com o seu papel de mãe, visto que a maternidade promove e determina mudanças
presente artigo contribui para uma maior compreensão acerca da sobrecarga sofrida pelas
como descrever a relação entre o papel da mãe contemporânea e o foco e preocupação desta
filhos, assim como descrever a compatibilidade entre as responsabilidades que a mãe assume
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para com a casa e os filhos e o papel estereotipado da maternidade. Partindo disso, o material
utilizado na análise foi o filme Minha Mãe é Uma Peça (2013), desse modo cenas foram
definidas. Diante do obtido, concluiu-se que muitas responsabilidades são conferidas a quem
exerce o papel de mãe, tudo isso sob um forte estigma de “boa mãe”, o que afeta diretamente
essas, mudando-as e tornando-as demasiadamente preocupadas com a sua função para com os
Introdução
normatizam a sobrecarga do papel das mulheres na criação dos filhos, contribuindo para as
mesmas deixarem em segundo plano suas vidas sociais e profissionais para atenderem as
maternidade como a maior plenitude que uma mulher pode alcançar (Azevedo, 2017; Folino,
2014).
ser dependente do marido e sem quaisquer direitos. Segundo D’Ávila Neto (1980), “a mulher
do senhor se limitava à sua vida familiar, à procriação dos filhos e aos contatos com os
escravos e amas, aos parentes e, por vezes, aos padres” (p. 36). Em outras palavras,
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Revista de Pesquisa e Prática em Psicologia (UFSC)
porquê o mesmo se reduz a maternidade, uma vez que, a cultura é parte importante para o
sujeito compreender a maneira de organizar seu pensamento, suas relações interpessoais, seus
Dessa forma, compreende-se que os indivíduos estão sempre se definindo diante de uma
realidade histórica das relações sociais (Farias, 2014). Diante disso, é possível entender que o
sujeito - neste caso a mulher, tem a participação da construção de uma realidade percebida,
representada e interpretada por seus atores - que está de certa forma presente quando se nasce e,
da maternidade ser entendida como determinismo biológico e perdurável das mulheres. Tais
cultural e política, determinando que o lugar das mulheres na sociedade seria como dona de
casa e cuidadora dos filhos (Scavone, 2001). Além disso, esta delimitação imposta às
paterna não tem o mesmo peso que a materna, a mulher que deixa seus filhos sob o encargo
Existe uma ambiguidade de discursos sobre a função que a mulher deve exercer.
Enquanto há a narrativa de que a mãe precisa dar atenção integral aos seus filhos, deixando
de lado carreira e vida pessoal, na contemporaneidade, esta se depara com alguns conflitos.
Em primeiro lugar, a maioria das mulheres do século XXI estão inseridas no mercado de
trabalho, o ditado de “ser boa em tudo sem renunciar a nada” infere uma culpabilidade dupla
a estas mulheres por não deixarem sua vida profissional de lado em virtude dos filhos ou por
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(Marcello, 2005).
Nesse sentido, Halasi (2018), afirma que o tornar-se mãe inclui um luto de si, a
constante romantização da maternidade, reforçada tanto pela sociedade quanto pela mídia,
origina esse propósito de “dar conta de tudo”, trazendo prejuízos no âmbito social e
emocional para aquelas que não correspondem às expectativas do que foi imposto como o
Com toda a opressão exercida sobre a mulher, seu papel social é reorganizado e ela
será definida, em primeiro lugar, como mãe. A mudança na concepção social das mulheres,
requisitos que, segundo as representações sociais, elas devem seguir (Cozer 2013; Tourinho,
a mulher se crucifica todas as vezes que decide em prol de si mesma, estabelecendo uma
sistema, sobretudo em relação a desigualdade de gênero, vem conseguindo cada vez mais
a imagem da mulher “dona de casa”, algo comum na vida das mulheres, em especial por volta
terminantemente proibida, sendo que os homens são responsáveis pelo sustento da casa
Atualmente, surge o conceito de ‘terceira mulher’, criado por Lipovetsky (2000), num
cenário em que a mulher une em sua essência a figura materna e profissional. Logo, seria
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uma definição que caracteriza mulheres que conciliam trabalho, casamento e criação dos
filhos. Nesse sentido, sobrepõe-se a figura simplesmente de “mulher do lar”, aferindo assim a
tornam mães, invalidando alguns de seus interesses e valores pessoais neste processo. Faz-se
assim necessárias reformulações desses papéis sociais, na medida que estes diminuem o
apresenta, muitas vezes, uma sobrecarga para as mulheres nas atribuições. Com o fenômeno
reformulam suas rotinas e conciliam suas necessidades emocionais com as necessidades para
o desenvolvimento dos filhos. Sobre a responsabilidade legal, há uma divisão da guarda dos
filhos, mas, na prática, a predominância ainda é direcionada à mãe (Lamela et al., 2010).
Torna-se de relevância social discutir sobre como a mulher tem sua subjetividade afetada,
dado que a compreensão da maternidade como uma totalidade ao invés de um evento isolado
É importante ressaltar que antes de seguir com a escolha de ser mãe, existe uma
mulher, que tem a sua individualidade, sua construção como um sujeito social e seu
desenvolvimento como indivíduo tendo um eu ideal e o ideal do eu, o qual a partir de uma
Desse modo, assim como citado em Barroso (2012), Freud em (1914/1996) “Sobre o
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todo se constitui na sua subjetividade do “ser tudo” para o outro, sendo neste primeiro
rejeições, tornando para si a imagem do eu ideal, sobre suas perfeições do amor de si mesmo
que gozou na infância do seu eu real. Ao iniciar a vida materna, surge o ideal do eu, o qual
manifesta-se a imagem idealizada do eu, onde o indivíduo tem a imagem refletida do seu
próprio corpo, essa imagem é constituída em sua totalidade pelos pais, que projetam nos
filhos, retornando ao narcisismo que eles próprios tiveram que abandonar por exigência da
realidade e meio social no qual vivem. Com isso, entende-se que a maternidade não advém
do natural da mulher pelo simples fato de ela ser mulher, e sim pelo constructo social no qual
ela vive. Da mesma forma que, quando se segue com a escolha de ser mãe, outros fatores
mulher que cria os filhos sozinhos, contribui para a ausência do cuidado sobre a sua própria
Desse modo, o presente artigo visa, como objetivo geral, refletir sobre o excesso de
entre o papel da mãe contemporânea e o foco e preocupação desta sobre as demandas da casa
responsabilidades que a mãe assume para com a casa e os filhos e o papel estereotipado da
maternidade.
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Método
Uma Peça, uma produção brasileira aclamada pela participação do dileto Paulo Gustavo no
roteiro e na atuação. A obra conta a história de Dona Hermínia, mãe de três filhos, mulher,
dona de casa e divorciada. Escolheu-se quatro cenas específicas do filme para analisar as
situações, diálogos e circunstâncias que nos permitam refletir com objetividade sobre
Ademais, através de uma peça teatral de mesmo nome originou-se o filme, sendo a
peça também escrita por Paulo Gustavo, o qual inspirou-se em sua relação com sua mãe e, de
certa forma, configura uma homenagem a ela. O principal roteirista do filme - Paulo -
participou do programa Mais Você, da Rede Globo, em 2019, que é apresentado por Ana
Maria Braga e contou um pouco sobre como surgiu a personagem Dona Hermínia:
“Me formei, fiz minha primeira peça com Fábio Porchat, mas, de público, não deu
certo. Um dia teve um espetáculo em Niterói e a Samantha Schmütz falou para imitar
minha mãe. Coloquei um bob na cabeça, peguei uma vassoura e comprei um vestido.
Vi que deu certo. Quando fui ver, era o Minha Mãe É Uma Peça”.
Nesse sentido, foi lançado em 21 de julho de 2013, produzido pela Migdal Filmes
etária superior a 12 anos. Com a direção de André Pellenz, configurou recorde nacional
cinemas em sua terceira semana de exibição, tendo sido o filme mais assistido no Brasil no
ano de 2013.
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início do filme - mas acontece em Niterói, onde vivem cerca de 500 mil habitantes,
Hermínia, uma mãe "zelosa" com os filhos, que ao decorrer do filme reflete sobre sua
relação, falas e atitudes com os filhos e vice-versa. Por exemplo, ela não esperava um dia
ouvir dos próprios filhos que ela é uma mãe chata, a partir daí ela considera que seu papel
Minha Mãe é Uma Peça, possibilita ver a mulher na atualidade, as relações afetivas
conseguinte, o filme exige que o espectador tenha senso crítico e responsabilidade para
refletir sobre questões relacionadas a sobrecarga entre o papel da mulher - aquele que é aceito
e considerado padrão - e sua relação a maternidade, por meio disso passamos a entender as
Participantes
Dona Hermínia: Mulher, branca, de corpo midsize, olhos verdes, cabelo castanho claro com
corte rente aos ombros, sendo que na maior parte do tempo este está enrolado nos bobes, às
vezes até encontra-se o cabelo com os bobes cobertos por um bandana. Sua altura é
Garib: O primeiro filho de Dona Hermínia. Homem, branco, alto, de cabelo curto marrom
escuro e olhos castanhos. Casou-se cedo e com a esposa mudou-se para Brasília. Ele possui
agora uma clínica veterinária. Este personagem é caracterizado no filme como “certinho” e
muito amoroso.
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Juliano: É o segundo filho de Hermínia, branco, magro, de cabelo preto curto, de olhos
castanhos escuros e com aproximadamente 1,68m de altura. Ele adora dançar e possui um
Marcelina: É a caçula da família, com o índice corporal acima da média, olhos castanhos
escuros, cabelos castanhos escuros de corte rente aos ombros. Sua estatura pode ser
considerada entre baixa e média. É uma pessoa “falante”, tende a ser vista como extrovertida,
Procedimentos
ajudando na compreensão da descrição e análise das cenas descritas logo adiante. Após a
Foco e Preocupação com as Demandas da Casa: Ocorre quando a mulher fica bastante
focada na preocupação com as demandas da casa e dos filhos, mesmo longe deles. Podendo
chegar a ser às vezes caracterizada como excessiva ou até mesmo obsessiva. Logo, há uma
centralidade ampla de tais demandas, nesse sentido, pode-se dizer que demais demandas
longo do tempo. Nesse sentido, pode-se complementar afirmando que é quando a pessoa
ambiente (casa). Havendo até mesmo a ausência de uma divisão entre a família de tarefas,
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muitas vezes em decorrência da “necessidade”, mesmo que inconsciente, que uma das figuras
controlador exercido sobre os filhos pela mãe, com intuito de proteção, porém apresentada de
de decisão de suas proles. Tal controle tem relação com imposições e restrições. A título de
exemplo, tem-se desde a opção de vestimentas a serem usadas pelos filhos e alimentos a
serem ingeridos, até locais frequentados, horários das atividades e a seleção de amizades.
conhecimento psicanalítico sobre o narcisismo primário. Este conceito explica que, o sujeito
buscando traços do outro em si. Numa dimensão em contemplar o desejo do outro para se
sentir amado. Dessa forma, ocorre o investimento da libido que a mãe coloca em seu filho,
constituindo o que vem a ser o narcisismo primário, o qual o sujeito que investe, deseja ser
Resultados e Discussão
Descrição:
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eu comprei, minha filha. Esse é o próximo que eu vou cortar da lista. Cê não tem
vergonha não, minha filha? Imensa de gorda querendo mais presunto ainda”. —
Falava enquanto arrumava alguns itens na pia de louças. Pegou duas sacolas
plásticas e jogou no lixo e depois jogou o chihuahua também —. Marcelina se levanta
rapidamente em direção ao lixo para pegar o cachorro “Mãe, cê jogou o Átila na
lixeira!” “Ai meu deus, tira!” Respondeu Hermínia com tom de voz elevado. Estava
com a porta da geladeira aberta, observando seu interior. “Gente , cadê papai, hein?
Tá demorando” — disse Juliano colocando açúcar no café — “Teu pai nunca chegou
na hora pra nada na vida. Que até pra casa eu cheguei primeiro que ele na igreja! Eu
hein” Respondeu Hermínia enquanto se direcionava a uma prateleira atrás de
Juliano. Estava organizando uns potes à vista.
Nota-se que o exposto se relaciona com as colocações de Cozer (2013), Halasi (2018)
e Tourinho (2006), enquanto os autores apontam que a mulher, ao se tornar mãe, tende a
abraçar o propósito de “dar conta de tudo” mesmo que isso acarrete abandono da
subjetividade em prol das demandas da casa. Isso é demonstrado pela inquietação de dona
Abre a geladeira, mas não pega nada de fato; organiza a prateleira que já estava
que ela está sendo uma boa dona de casa e logo, está sendo uma boa mãe. Em Carneiro &
Daróz (2017) temos uma normalização desse foco direcionado aos filhos e as tarefas
domésticas, nesse sentido, podemos perceber que Hermínia não se senta para tomar café
junto aos filhos, as responsabilidades da casa viriam em primeiro lugar. Ademais, o fato de
ter jogado o cachorro no lixo representa a sobrecarga que Hermínia sofre ao longo do dia,
Assim como na cena anterior, a cena descrita a seguir demonstra como dona Hermínia não
percebe a sobrecarga que seu papel como mãe representa. Para ela, o excesso de tarefas em casa e a
Descrição:
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Carlos Alberto entra na cozinha onde se encontra Hermínia. Ele se aproxima dela
“Hermínia” — Agora, eles estão posicionados um em frente ao outro. “Que que é
Carlos Alberto? É segundo round agora?” “Eu acho que eu te devo desculpas” “ih,
Carlos Alberto” — disse Hermínia, mexendo com a mão direita em uma mecha do
cabelo, movimentando a cabeça e revirando os olhos. “Sei perfeitamente que não fui
um bom marido. Eu também não sou o melhor pai. Enfim, eu quero que você saiba
que, apesar de tudo, eu gosto muito de você” - Hermínia olha fixamente para Carlos
Alberto fazendo movimentando a cabeça pra esquerda e pra direita. “Carlos Alberto,
deixa eu te falar uma coisa, você foi um ótimo marido, você é um ótimo pai, as
crianças te adoram, tá tudo certo” — Falou gesticulando as mãos em um tom
elevado. “Mas a sua parte é muito difícil” “A minha parte não é difícil não, Carlos
Alberto. A minha parte é mole. A minha parte é o quê? É ir no supermercado, aí
compra um troço, aí volta, aí tem uma louça pra lavar, vai tem um tanque aí vê que
esqueceu o negócio no mercado, volta... a minha parte é difícil sim!” — disse
movimentando a cabeça e gesticulando as mãos.
Tendo em vista esta cena, infere-se que a responsável pela organização e cuidados da
casa é a Dona Hermínia. Há outras cenas que evidenciam Hermínia como principal
encarregada pela casa, como a parte em que quando ela sai de casa os filhos ficam sem
comida - evidenciando que ela era quem fazia as compras do supermercado. Nesse sentido, o
trecho do filme possibilita consonância com o exposto por Rapoport & Piccinini (2006), os
normatizam a sobrecarga sobre o papel de mãe quanto à criação dos filhos. Ademais, partindo
do exposto por Scavone (2001), nota-se que os cuidados pelos quais Hermínia é
responsabilizada partem de uma construção social histórica, que envolve ainda política e
cultura.
Outrossim, Tourinho (2006) acrescenta que atrelado ao papel da mulher enquanto mãe
existe a ideia de que esta deve demonstrar ser uma “boa mãe”, dedicando-se aos filhos ao
máximo, sendo então conveniente que esta tenha de renunciar a certas coisas e desejos. Desse
modo, o foco e preocupação com as demandas da casa presentes nas atitudes de Dona
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Além dos aspectos descritos acima, encontra-se como viés de análise o narcisismo,
logo após a descrição da cena abaixo, tem-se uma explicação psicanalítica com o objetivo de
Descrição:
Dona Hermínia está vestida com uma camisola amarela com flores vermelhas e bobes
na cabeça. Se encontra na sala do seu apartamento. As paredes são brancas, há um
quadro de flores à sua direita, acima de uma cômoda com fotos e jarras decorativas.
Atrás dela, na parede, há um espelho pequeno, redondo e logo abaixo do espelho uma
mesinha com uma jarra decorativa. À sua esquerda, há um quadro de paisagem que
está ao lado de uma luminária de parede e a mesma está posicionada acima de um
rack, contendo em sua superfície uma jarra de flores, sem flores. Com sua mão
esquerda está segurando o teclado do telefone fixo e com a direita está pressionado o
gancho na sua orelha direita. Conversa com Marcelina com gesticulações no rosto.
“Marcelina, não tem boate nenhuma, não tem noitada nenhuma, não tem — aumenta
o tom de voz — noitada! Marcelina você ... vem pra casa agora não ataca minha
disritmia. Não têm shop, não tem nada — Fala balançando a cabeça de um lado para
o outro — Porque eu não quero. Porque não. Porque não é... resposta sim — tom de
voz demorado, levanta e abaixa a cabeça — porque não. Porque eu sou maluca! —
tom de voz aumentado, inclina o corpo pra frente e se abaixa um pouco — Vem pra
casa. Não quero você aí. Ah me desacata, desliga esse telefone na minha cara pra cê
vê se eu não apareço nessa boate de camisola! Não têm shop — levou o corpo para
baixo novamente — não tem nada. Você..” — Vira-se para trás enquanto coloca o
gancho no telefone, o posicionando em cima da mesinha, verbaliza para Juliano:
“Vambora, eu vou atrás dela — diz isso enquanto caminha em direção a porta de
entrada do apartamento — Vem Juliano!” — aumenta o tom de voz —. Juliano se
encontrava no corredor. As paredes possuem tons marrons com luminárias e pinturas
expostas. Nas laterais, mesinhas com fotos e decorações. Ele vestia uma camisa
listrada vermelha com branco e uma calça caqui com cinto preto e sapato da mesma
cor. Ele apressa o passo para alcançar a mãe na porta do apartamento enquanto
verbaliza: “Mãe! Mamãe cê tá de camisola, amor!” — da porta, gesticula a mão ao
contorno do corpo da mãe enquanto ela já está em frente ao elevador. O corredor do
prédio tem paredes em tons amarelo e as portas dos apartamentos e do elevador são
em madeira — Hermínia responde na sequência com o tom de voz elevado: "Não
interessa! Cê acha que vou me arrumar pra dar na cara de Marcelina?” Entrou no
elevador, Juliano sai do apartamento, fechando a porta, e diz para a mãe: “Pera
aí!”.
Com base na perspectiva dos estudos sobre o narcisismo explicado por Freud, é
possível observar que o comportamento de Hermínia, pode ser uma oscilação da sua
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autoestima que visa em qualquer situação, chamar a atenção para si mesma, a fim de nutrir a
sua própria imagem vulnerável e instável que disfarça a sua dependência emocional com os
filhos em forma de “superproteção” (Sousa et al., 2019). Essa questão narcisista se trata da
parte estrutural que constitui o sujeito e a sua identificação, o qual também está relacionado
com fatores externos como a sobrecarga social sobre o papel de uma mulher acerca de como
ser uma boa mãe, podendo influenciar e resultar no seu comportamento superprotetor, porque
essa, investe todo o seu libido e autoerotismo em um objeto (podendo ser os filhos ou
trabalho). Sendo a libido a economia da energia da pulsão sexual regida pelo prazer, este que
conserva sua energia no “interesse”, a serviço do eu com o outro, sendo parte do narcisismo
primário, no qual, a mãe faz com que o filho se sinta amado e desejado. Por conseguinte,
para o outro, ocorre o narcisismo secundário que resulta no se tornar o centro do mundo para
de Hermínia em relação à filha, mostra como o excesso de preocupação pode ser entendido
com base na sua subjetividade narcísica como um sujeito, porém, voltado a filha que está
excesso do mesmo.
psicanalítica abordada acima, a seguir tem-se mais uma descrição, porém, aqui fez-se
necessário uma percepção coletiva e analítica sobre a cena em específico para que se tenha
Descrição:
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Winnicott (1980) tem outras funções, porém, dedica-se aos filhos de forma "ordinária" e
adequada. Uma mãe lembra-nos que, se uma mulher não se realizar de outras maneiras, ela
começará a exigir dos filhos. A diferença é que dessa forma, a transferência de Dona
realização feminina. Portanto, é preciso que se tenha um equilíbrio entre a função materna e
outras vivências. Todavia, o que vemos nesta cena, é uma dificuldade da parte de Dona
Hermínia para com os filhos; levando em consideração alguns aspectos e principalmente com
a notícia que ouviu dos seus filhos (Juliano e Marcelina), dado que ela é uma mãe que vive
para seus filhos, dona de cassa, onde essa realidade é vista por parte da sociedade como o
mundo “real” de muitas mulheres. A prioridade para Dona Hermínia é sempre a educação dos
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exemplo é quando Juliano esquece em sua moradia o remédio de asma. O pai (Carlos
Alberto) não é muito presente na vida dos filhos, ele está presente nos horários de visitação,
geralmente aos finais de semana, como é mostrado na cena, há um tempo definido pela mãe
em que Juliano e Marcelina podem ficar com o pai para as atividades de lazer. Por
conseguinte, Colling (2004) afirma que as mulheres, caracterizadas pela natureza, emoção,
amor e intuição, estão destinadas a entrar no espaço privado; os homens – cultura, política,
razão, justiça, poder, público. Essa dicotomia constitui uma oposição desigual entre homens e
mulheres, indicando sua subordinação aos homens numa ordem aparentemente universal e
igualitária.
portanto, D. Hermínia acaba representando esse lugar feminino de superproteção para com os
Considerações Finais
Por meio da análise da obra Minha Mãe é Uma Peça, evidenciou-se que é atribuída à
mulher muitas tarefas ao se tornar mãe, contribuindo para uma transformação psíquica na
vida desta que passa a se preocupar demasiadamente com o seu papel em relação aos filhos e
estigmas do que seria uma “boa mãe”, a mulher é aquela que deve servir o marido aos filhos
e a casa, que não deve trabalhar para se voltar integralmente ao bem-estar de sua família. Mas
que é atribuído à mulher durante a experiência da maternidade, tem sua importância para o
entendimento da sobrecarga sofrida pelas mulheres na criação dos filhos e cuidado da casa.
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Revista de Pesquisa e Prática em Psicologia (UFSC)
referentes às implicações impostas à mulher na sociedade. Por conseguinte, o filme exige que
o espectador tenha senso crítico e responsabilidade para refletir sobre questões relacionadas a
sobrecarga entre o papel da mulher — aquele que é aceito e considerado padrão — e sua
relação a maternidade, por meio disso passamos a entender as relações dos personagens,
Paulo Gustavo.
Além disso, abordar este tema é de suma importância para aprofundar-se na origem de
tal opressão, buscando formas de intervenções benéficas para que futuras mães não passem
por esse processo de extrema preocupação com seu papel desempenhado. Em relação às
intervenções, estas podem ser feitas junto a psicólogos, a psicoterapia, por exemplo, pode
mental, tendo em vista a promoção de uma relação saudável consigo, suas ambições e limites.
públicas que as beneficie, haja visto que ao exercer sua profissão podem coletar dados, o que
É necessário que esta temática seja discutida dentro e fora da psicologia, pois ao
e consciência sobre o papel da mulher na sociedade. Logo, partindo da ciência do fato, mais
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considerações a respeito do filme não terminam por aqui. Traz-se conceitos não somente para
serem lidos e debatidos, mas para que tenhamos o dever de refletir sobre eles. Falar sobre
senso comum da sociedade e o que a mídia tem a dizer sobre modos de ser e maneira de ser
de colocações mais explícitas por meio da análise da personagem principal – Dona Hermínia
–, observando que ela representa a mulher e mãe na sociedade contemporânea pela forma
expectativas de uma mãe no contexto da sociedade atual, ainda que desempenhe outras
funções que não a maternidade ou dona de casa. Ou seja, não estamos falando
especificamente de um único sujeito, mas de uma mulher que representa milhares de outras
têm uma dimensão narcísica, porque está muito atrelado ao desejo da mãe. Esta tem para si a
por vezes cuidando mais da casa do que de si mesma –, na alimentação, e na vida pessoal.
Tendo tais preocupações como o ideal do que é ser uma “boa mãe”, submetendo seus filhos a
um desejo e ideal que ela sempre busca alcançar. Por outro lado, é importante ressaltar a
ausência de uma figura e presença paterna, pois isso contribui para a sobrecarga do “ideal do
eu”, fazendo com que ela se prenda ao “eu ideal” do seu papel como mãe, por vezes, se
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Revista de Pesquisa e Prática em Psicologia (UFSC)
destaca-se que o exercício da maternidade e o ser mulher merecem total respeito. Dona
Hermínia, nos mostrou, nos emocionou e principalmente nos ensinou valores e princípios de
uma família que está longe de ser considerada uma família tradicional brasileira. Minha Mãe
é Uma Peça celebra a diversidade e seus sucesso nos cinemas e nas plataformas de
streaming, demonstram a identificação que as pessoas tiveram para com o filme e seu enredo.
Por fim, espera-se que assim como no filme, em que a configuração familiar, sua
à uma figura mais tradicional dessa, o papel da mulher enquanto mãe seja também afetado
por modificações, de modo a reduzir a incidência do estigma. Além disso, tais alterações na
figura e desempenhos maternos podem ainda contribuir para uma relação mais saudável da
mulher com si, a casa, família e ambições e, nesse sentido, proporcionando uma melhor
Referências
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