Contratos Civis - Teóricas
Contratos Civis - Teóricas
Contratos Civis - Teóricas
Bibliografia: “Direito das Obrigações – Volume III”, do Dr. Menezes Leitão, 14º Edição
E Livro de Casos Práticos, da Dr. Sandra Passinhas
Contratos:
- Compra e venda – aquela que demorará mais tempo
- Doação
- Locação
- Empreitada – se houver tempo
1. COMPRA E VENDA
1.1. Definição
A definição encontra-se no art.874º CC.
Normalmente, fala-se deste contrato a propósito da transmissão do direito de
propriedade mediante o pagamento de um preço, mas não é só esse o efeito
produzido. Esse é o efeito mais comum, mas a compra e venda não o implica, ou seja,
este não é o único efeito produzido pelo contrato de compra e venda.
Mais uma vez, salienta-se que não é só a transmissão de direitos reais que está em
causa neste contrato. Muitos outros direitos são transmitidos.
Por vezes, o contrato de compra e venda não implica uma aquisição derivada ou
translativa de um direito real que já existisse na esfera jurídica do vendedor.
Pode haver outro direito real a ser transmitido, como um direito de crédito, ou um
direito potestativo, ou mesmo uma posição contratual, uma situação jurídica concreta
(ex: venda de um jogador de futebol – é uma compra e venda, mas existe, apenas, a
transmissão de uma posição contratual; venda de informações).
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- Menezes Leitão diz que, ainda assim, nem sempre a compra e venda de imóveis está
sujeita à forma a que estamos habituados – decreto-lei nº263º-A/2007. Daqui consta
um procedimento especial, que implica que as partes do contrato apresentem um
pedido aos serviços de registo competentes, no qual escolhem um dos vários modelos
contratuais previstos nesse decreto-lei. Depois, os documentos que constituirão título
bastante para a constituição desse contrato, serão lavrados pelos serviços
responsáveis.
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- Existe, também, compra e venda de coisas móveis, que fogem há regra da falta de
forma. Ex: compra e venda de estabelecimento social; contratos celebrados fora do
estabelecimento comercial, quando o operador seja um consumidor.
Ex: A compra e venda de automóvel, que não está sujeita a forma, apesar de sujeita a
registo.
No que toca aos efeitos reais do contrato de compra e venda, vigora, no nosso
ordenamento jurídico, o princípio da consensualidade. Um contrato de compra e
venda, no que toca a um direito real, produz, por si só, o efeito dessa transmissão, ou
seja, pelo mero consenso do comprador e do vendedor, opera a transmissão do direito
de propriedade.
Numa série de sistemas jurídicos europeus, isto ainda não é assim, nomeadamente em
Espanha.
A compra e venda é condição necessária e ao mesmo tempo suficiente para a
produção dos efeitos que o comprador e o vendedor pretendem.
Nota: No Direito Romano isto não era assim. A compra e venda era um contrato, mas
não produzia efeitos reais por si só. Ela era um título de aquisição, mas, a este, era
necessário acrescentar um outro negócio posterior – o modo de aquisição, que tinha
mais que um figurino, sendo o mais comum, a traditio, que transmitia, essa, a
propriedade.
Este sistema tem vantagens e desvantagens. Tem a vantagem de trazer uma certa
segurança, porque o comprador, ao tornar-se proprietário, torna-se consumidor. Por
outro lado, o facto de, só através do modo de aquisição se transmitir o direito de
propriedade, dá mais segurança a terceiros.
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Existem outros dois sistemas para além dos nossos, nomeadamente em Espanha, que
é o sistema do título e do modo. A transmissão da propriedade depende tanto do
título como do modo, ao contrário do nosso que depende, apenas, do título.
Ou seja, não basta que haja a celebração do contrato de compra e venda, é necessária
a prática posterior de um ato. Ao depender das duas coisas, isto significa que a sua
causa não é só a entrega. Não basta esta para que se produza o efeito real. Este filia-
se, também, na compra e venda.
Se existir um vício no título, não pode operar a entrega, isto é, não se pode produzir o
efeito real. Isto porque, apesar do efeito real depender, também, do modo, não deixa
de depender, igualmente, do título.
O Dr. Menezes Leitão pergunta se não haverá casos, no direito português, em que se
possa considerar que a compra e venda, não é uma venda real, mas obrigatória, ou
seja, se há casos em que o nosso sistema não seja de título, mas sim de título e de
modo?
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O Dr. Menezes Leitão responde que não e o Dr. Pinto Monteiro concorda que
não existem exceções. Poderia pensar-se na existência de exceções em alguns casos,
como:
- situações em que a lei separa cronologicamente, a celebração do contrato e a
produção de efeitos reais;
- situações de reserva de propriedade;
Porém, Dr. Pinto Monteiro diz que não há exceção, visto que, em qualquer um destes
casos, o cumprimento da obrigação, não depende de uma prestação de dare. Basta
enterdermos, por exemplo, que numa compra e venda com reserva de propriedade, a
transmissão do direito de propriedade nada tem a ver com o cumprimento de uma
obrigação de entrega, como o é nos sistemas de título e modo.
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que a coisa seja destruída, o comprador tem que pagar o preço na mesma. Ele não se
pode defender, afirmando não ter que cumprir a obrigação de pagar o preço.
2 - O LUGAR DA ENTREGA?
Aqui, há uma regra supletiva – art.772ºCC. A regra geral é de que a obrigação deve ser
cumprida no domicílio do devedor.
Mas existem exceções, nomeadamente, no que diz respeito a coisas móveis, segundo a
qual a obrigação deve ser cumprida no local em que a coisa se encontrava ao tempo da
conclusão do negócio – art.773ºCC.
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O Dr. Menezes Leitão diz que esta regra presume que o direito relativo à coisa a
entregar já foi transmitido. Só faz sentido esta coincidência, se o domínio jurídico já
tiver sido transmitido.
Esta regra aplica-se, na medida em que o direito sobre aquela coisa, já tenha sido
transmitido.
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Para que haja uma proibição de venda, o comprador tem que ter estas
características.
Esta proibição também se aplica a juízos diferentes, uma vez que o que está em
causa é a área geográfica.
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Para proteção dos credores proíbe-se a alteração do regime de bens, seja por força da
lei ou de convenção entre os cônjuges.
A pessoa vende uma coisa que não é sua, como não sendo sua, efetivamente. Mas
vincula-se a adquirir a coisa, para a vender a outro.
Esta aquisição por parte do comprador, é automática. A partir do momento em que o
vendedor adquire o objeto da compra e venda, o comprador não precisa de fazer mais
nada.
O Dr. Menezes Leitão diz que é uma modalidade futura de venda obrigatória, porque
não basta a celebração do contrato de compra e venda, para se transmitir o direito.
O Dr. Pinto Monteiro não concorda com esta posição. Diz que, a venda obrigatória,
para poder receber essa denominação, tem que implicar o cumprimento de uma
obrigação de dare (dependente da entrega). Tem que ser a entrega do comprador ao
vendedor que tem efeito translativo. Mas isto não acontece nos casos da venda de
bens futuros. O comprador torna-se imediatamente tutelar, a partir do momento em
que o vendedor adquire o objeto da coisa. Aqui, não é a entrega que produz o efeito
real.
Art.880º/2CC – existem duas modalidades da venda de bens futuros. O que estas têm
em comum é que o comprador e o vendedor celebram o contrato de compra e venda
sabendo que a coisa não está na titularidade do vendedor.
A compra e venda é, essencialmente, um contrato cumutativo, mas pode ser aleatório.
A venda de bens futuros é um caso em que a compra e venda pode ser um contrato
aleatório, mas isto tem que ser convencionado entre as partes.
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Também não podemos dizer que haja, aqui, uma venda de bens alheios. Nesta, o
comprador não tem qualquer certeza quanto à titularidade por parte do vendedor, do
direito a transmitir.
Também não podemos confundir com os problemas de negócios nulos por
impossibilidade física, porque, aí, a coisa vendida, a coisa é vendida na possibilidade de
existir. Isto não sucede na venda de bens de existência ou titularidade incerta, visto
que existe esta incerteza.
Ter natureza aleatória significa que o comprador se vincula a pagar o preço sempre,
quer se venha a apurar que a coisa existe e é da titularidade do vendedor, quer se
venha a apurar que ou a coisa não existe ou não pertence ao vendedor. É o comprador
que corre o risco da incerteza vir a ser apurada contra os seus interesses.
Ex: Dr. Menezes dá exemplo de alguém que vende um tesouro que pode ou não estar
enterrado num determinado terreno.
Dr. Menezes Leitão levanta a questão do momento em que o preço deve ser pago?
Nesta modalidade, não fazemos ideia se vai haver alguém a entregar ou não
(incerteza). Portanto, Dr. Menezes Leitão diz que deve ser pago logo no momento da
celebração do contrato. Não deve depender da entrega, porque essa é incerta. Só nos
casos em que é celebrada como cumutativa é que deve o preço ser pago no ato de
entrega.
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cumprir a sua obrigação. O vendedor poderia fazer duas coisas: ou resolver o contrato
e aí, reavê o direito que transmitira para o comprador. Mas, segundo o art.886º, se já
houve entrega da coisa e não houve reserva da propriedade, o vendedor não pode
resolver o contrato. Ou recorrer à ação de cumprimento? Pode o devedor fazê-lo, mas
pode suceder que o comprador já nem seja proprietário da coisa ou então, que nem
tenha património para pagar ao credor/credores.
Então, o vendedor precavem-se deste risco, através da cláusula de reserva de
propriedade. Dr. Menezes Leitão levanta aqui uma questão. Pode a cláusula ser aposta
posteriormente à celebração do contrato? Não, porque não é possível produzir, à
posteri, o efeito da reserva de propriedade. O Dr. Pinto Monteiro concorda,
plenamente.
A posição do Dr. Menezes Cordeiro é a caracterização da venda com reserva de
propriedade, como sendo uma venda, cujo efeito translativo é diferido para um
momento posterior, muito embora, entretanto, antes desse momento posterior, já ser
transmitida, ao comprador, uma posição jurídica diversa do direito de propriedade,
que se deve caracterizar como uma expectativa real de aquisição.
No fundo faz duas coisas: verdadeiramente, a partir do momento, a compra e venda
transmite para o comprador a expectativa real de adquisição de um direito de
propriedade (logo de imediato) e, posteriormente, no momento convencionado, essa
expectativa real de aquisição, transmuta-se no próprio direito de propriedade. A partir
desse momento posterior, o comprador torna-se titular de um direito de propriedade,
em relação ao qual, até esse momento, só tinha expectativa de adquirir.
A reserva de propriedade serve para garantir o vendedor, para que este possa resolver
o contrato, caso haja incumprimento. Esta é a única garantia – o poder de resolver o
contrato – que o vendedor tem neste contrato, visto que ele não tem nenhum
verdadeiro poder.
Por isso, o Dr. Menezes Cordeiro diz-nos que, em caso de perecimento ou destruição
da coisa vendida sob reserva de propriedade, este risco ocorre por conta do
comprador, o que não ocorreria na regra geral do art.796ºCC.
A propriedade que é conservada na esfera jurídica do vendedor é uma propriedade
conservada apenas com funções de garantia e, portanto, o risco assumido pelo
vendedor, deve respeitar, unicamente, a essa função. Já o risco da destruição ou
perecimento da coisa, deve ocorrer por conta do comprador, porque ele é titular de
poderes de gozo, ainda antes mesmo de se tornar proprietário da coisa.
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registada. À contrário senso, geralmente é entendido que isso significa que a cláusula
de reserva de propriedade, não se tratando de coisa móvel sujeita a registo, é sempre
oponível a terceiros. O legislador não nos diz concretamente isto, mas é a leitura que
retiramos da norma.
Isto gera um problema - ex: se A vende a B uma coisa móvel sujeita a registo e, antes
deste, B vende a C, o que C pode ter adquirido é a expectativa real de que B é o
proprietário. E, se B não cumprir a sua obrigação de pagar o preço, os poderes de
aquisição voltam à esfera jurídica de A. Aqui, não são protegidos terceiros de boa-fé. O
que C adquiriu é restituído à esfera jurídica de A.
Há uma venda aprestações, pode o vendedor exigir ao comprador, quando este falte a
uma prestação, o vencimento antecipado das restantes, ou tem que esperar? O
vendedor só pode exigir uma parcela da totalidade a pagar, porque foi convencionado
que o comprador pagasse em parcelas diferidas no tempo.
Isto depende, claro, da confiança que o vendedor ainda possa ter na aptidão do
comprador para cumprir a sua obrigação nos termos temporalmente acordados. A
partir do momento em que ele falte ao cumprimento de uma parcela, poder-se-ia dizer
que o vendedor perde confiança na aptidão do comprador. Portanto, deve-se
considerar que o comprador perca o benefício do prazo. Daí que, a regra geral do
art.781º nos diga que o incumprimento de uma das parcelas, importa o vencimento
antecipado das restantes.
Porém, o art.934º diz algo diferente, este quer proteger o comprador. Este dá-nos uma
regra diferente para a venda a prestações: ou o comprador faltou a mais do que uma
prestação (mesmo que isso corresponda a menos de 1/8 do preço) e nesse caso
justifica-se a perda do benefício do prazo, ou, a prestação única a cujo pagamento ele
faltou, excedia 1/8 da totalidade do preço e aí, também se justifica a perda do
benefício do prazo.
A parte final do art.934ºCC pode ser entendido de várias formas. Há quem entenda
que possa ser afastado pela vontade das partes, que é o que o Dr. Pinto Monteiro
defende. Já o Dr. Menezes Leitão chega à conclusão oposta e diz que a norma não
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pode ser afastada no caso de uma convenção em contrário. Diz que a finalidade desta
norma é proteger o comprador, a parte mais fraca.
Mas isto não convence o Dr. Pinto Monteiro, visto que o comprador não deve ser
entendido como parte mais fraca. Esta ideia faria sentido se este artigo se aplicasse à
compra e venda a prestações em que o comprador é um consumidor. Mas isto não é
assim, porque a esta última se aplica o decreto-lei nº 133/2009.
Art.935ºCC – este artigo visa resolver um problema, que é o facto do vendedor voltar a
adquirir, no caso de incumprimento, a coisa, mas esta tem um valor inferior ao que
tinha. O que acontecia muitas vezes, além da cláusula de reserva de propriedade, é
que se estipulava uma cláusula penal, que correspondia ao preço convencionado.
O legislador achou isto abusivo e entendeu que o valor da cláusula penal deveria ser
limitado, estipulando, então, que, na venda a prestações, a cláusula penal não pode
ultrapassar metade do preço.
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Vamos supor que, afinal, o terreno tinha 900m2. Neste caso, tem que existir uma
correção, isto porque a tónica assenta na medida.
É diferente se celebrasse o contrato, mas só estipulasse o valor global. Neste caso, C
compra o terreno por 300.000€, terreno esse que tem 1000m2. É fixado um preço
global e é esse que importa. Tem uma importância incidental e não principal. Isto não
significa que não haja lugar, a uma correção também, nos casos de venda a corpo.
Mas essa só é admitida se a discrepância ultrapassar 1/20, 5%.
6 - Venda a Retro – art.927º e ss. É uma venda na qual se pode voltar atrás. É uma
venda em que ao vendedor é atribuída a faculdade de resolver o contrato. Neste caso,
o vendedor não reserva o direito de propriedade, ele transmite-o ao comprador, mas
pode voltar atrás, exercendo o direito de resolver o contrato que lhe é atribuído.
Porque é que alguém se sujeitaria a comprar uma coisa nestes termos? Qual é a
utilidade desta compra e venda? O comprador paga o preço e fica sujeito a que o
vendedor resolva, resolver o contrato, restituindo o preço que foi pago.
Esta figura, historicamente, servia como forma de obtenção de crédito a curto prazo. O
vendedor transmite o direito de propriedade, o comprador entrega o preço, depois, o
vendedor restitui o preço e mais um valor, para poder reaver a coisa – resolve o
contrato, desde que pagasse o preço de resolução.
Caso, o vendedor não exercesse o seu direito de resolução, durante algum tempo, a
transmissão da propriedade torna-se definitiva.
O Dr. Menezes Leitão diz que esta venda a retro não se deve entender ela própria por
proibida. Defende que é uma figura que funciona como uma espécie de crédito. O
vendedor não tenha a obrigação de resolver o contrato, existe uma espécie de
alternativa.
O Dr. Menezes Leitão diz, no livro, que esta operação, hoje em dia, não faz grande
sentido, porque a sua operação não só se pode sustentar, além disso, hoje em dia, o
legislador proíbe que o comprador seja compensado pela sua prestação.
Ou seja, o legislador proíbe que o vendedor pague um preço de resolução superior ao
preço que o comprador pagou. Ao ser a venda a retro uma operação de
financiamento, ela não pode dar lucro. Está limitado o valor do preço de resolução, ao
valor que o comprador pagou ou menor.
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A venda a retro era proibida no Código de Seabra, por aparentar ser um pacto
comissório.
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Aqui, a única dificuldade está quanto à questão de saber se é uma condição suspensiva
ou não, segundo o Dr. Menezes Leitão. O legislador diz-nos, abertamente, que sim. O
Dr. Menezes Leitão, não concorda. Diz-nos que é uma modalidade especifica de venda
cujos efeitos finais estão dependentes de um teste. Ao Dr. Pinto Monteiro, isto parece,
de facto, uma condição suspensiva.
Alguns autores defendem que é uma condição suspensiva imprópria, visto que as
qualidades que resultarão confirmadas no teste, já existiam quando a coisa foi
vendida. É uma condição, porque depende de um resultado do teste, mas reporta-se a
qualidades contemporâneas e não futuras.
O Dr. Pinto Monteiro defende que é, de facto, uma condição suspensiva, mas nada
tem de imprópria.
Venda de Bens Alheios: o Dr. Menezes Leitão diz-nos que para a venda de bens
alheios – arts.882º e ss. só contam bens alheios que sejam vendidos como
próprios e sejam presentes, específicos e fora do âmbito das relações
comerciais. Ou seja, é nulo todo o contrato de compra e venda pelo qual se
vende um bem alheio.
O bem transmitido tem que ser alheio, e, para isso, tem que faltar legitimidade ao
vendedor. Tratando-se da transmissão de um direito de propriedade, a legitimidade
cabe ao proprietário. No fundo, é necessário que falte legitimidade ao vendedor, por
este não ser titular do direito transmitido.
há um caso excecional em que se permite ao vendedor vender alguma coisa que não é
dele. E o Estado também o pode fazer através de uma venda executiva.
Existem ainda outros casos, para além destes: art.291º - proteção de terceiros de boa-
fé.
Não basta que o bem seja alheio, ele tem que ser presente. Mas, isto ainda não basta.
Poderia estar em causa a venda de bens alheio presentes, mas em que o bem alheio
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não é uma coisa genérica, tem que ser específica. Dr. Menezes Leitão diz que, neste
caso, não faz sentido que o contrato seja nulo, nos termos do art.892ºCC.
Ex: Se eu vender 20kg de maçãs da colheita do meu vizinho, não está sujeito ao
art.892º? O Dr. Pinto Monteiro diz que não faz sentido que seja, pois, neste caso, não
estou a transmitir nenhum direito de propriedade. Não existe um direito real sobre
maças não especificadas. Não há nada a transmitir. Não se vai dizer ser nulo, porque
esta resulta do princípio nemo plus iuris.
Neste caso, num contrato de compra e venda de um bem que é alheio, mas é genérico,
não se pode transmitir nada. Não há qualquer direito, por isso, seria impossível que ele
estivesse a tentar transmitir.
O bem alheio, tem de ser, para além de presente, específico. Além disso, tem que
estar fora do âmbito das relações comerciais, em que a venda de bem alheio é
permitida – art.467º/2 Código Comercial.
O vendedor tem que vender o bem alheio sendo específico e próprio. Se ele o vender
como alheio, já o contrato de compra e venda não será nulo, porque o art.904º o
preceitua. Ex: venda feita por um representante sem poderes. Neste caso, o
representante vende uma coisa alheia e que representa como não sendo sua, não está
sujeito, no âmbito desse contrato à nulidade do art.892ºCC, podendo, desde logo, o
representado, sem poderes, até querer chamar a si os efeitos daquele negócio,
ratificando o contrato.
De uma forma ou de outra, a imposição da presença destas cinco notas, resulta da lei.
Verificados estes requisitos, temos que ver quais os efeitos. A sanção/efeito, será a
nulidade -art.893ºCC. esta solução, que provem do CC francês é questionável, segundo
Menezes Cordeiro, porque esta nulidade tem muitas coisas que não são características
da nulidade, desde logo, no que toca à legitimidade para a arguir. Na venda de bens
alheio há fortes limitações, no que toca a quem pode invocar a nulidade da venda –
existem 4 possibilidades: o comprador e o vendedor e a boa-fé e má-fé.
- vendedor e comprador de boa-fé – aqui, só o comprador pode arguir a
anulabilidade, independentemente do comprador estar ou não de boa-fé.
Esta nulidade, visa, como qualquer outra, a ausência de produção de efeitos, mas
pretende-se proteger, principalmente, as partes do contrato, e, principalmente, se
estiverem de boa-fé.
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Isto já nos mostra como esta nulidade já é inversa à solução regra, quanto a quem a
pode invocar.
Outra particularidade desta nulidade – art.894º. Em princípio, sendo um negócio
jurídico nulo, nos termos do art.289º, cada um dos sujeitos te que restituir o que tenha
recebido do outro. O que significaria, na venda de bens alheios, que o comprador
poderia sempre exigir a restituição do preço. Mas esta não é a solução seguida.
O art.894º diz-nos que, sendo nula a venda de bens alheios, o comprador de boa-fé,
pode exigir que o preço lhe seja restituído (mas só se estiver de boa-fé; se estiver de
má-fé, só se pode valer do enriquecimento sem causa). Isto é um desvio claro ao
art.289º.
A parte final do art.894º/1 diz que o comprador pode exigir, se estiver de boa-fé, não
só a restituição integral do preço, como pode fazê-lo ainda que, ele próprio, não esteja
em condições de restituir ao vendedor aquilo que dele recebeu, porque a coisa pode
ter perecido.
Para além da nulidade ser um dos efeitos da venda de bens alheios, apara além e se
impor a obrigação de convalidação, nos casos em que o comprador está de boa-fé –
art.897º, pode ainda haver lugar a uma indemnização – arts.898º e ss.
Indemnização em caso de dolo – esta só pode ser, em caso de dolo,
aquelas situações em que um está de boa-fé e outro de má-fé. Esta
indemnização pode ser pedida pelo comprador ou pelo vendedor.
Quando falamos aqui de má-fé, falamos dela como sinonimo de dolo enquanto
astucia, utlizada por um dos declarantes para, produzir, no espírito do outro, um erro.
Aqui existe dolo, enquanto vício da vontade – art.253ºCC. ou seja, estamos a falar de
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uma situação e que uma das partes representou erroneamente que o bem não era
alheio porque a outra a isso o induziu.
Normalmente, o dolo provirá do vendedor, mas é perfeitamente possível, o contrário.
A indemnização típica, normalmente cumulável com o dolo, está no art.227º. é
justamente essa, a solução que o Dr. Menezes Leitão vê no art.899º.
Art.902º - nulidade parcial do contrato. Pode suceder que aquilo que é vendido seja,
apenas em parte alheia. Este artigo visa regular essas situações, de forma a que se
possa manter a validade daquilo que foi vendido pela mesma pessoa, as não é alheio.
Ou seja, manter a validade da parte que, daquilo que é vendido, não seja alheio.
Ex1: alguém vende uma coisa quando é titular de parte material dela. O vendedor
vende uma coleção de quadros, mas, só alguns sãos seus. Esta coisa vendida é
parcialmente alheia.
Ex2: casos em que o vendedor vende uma só coisa quando é titular de uma quota
abstrata sobre ela. É o que sucede nos casos de compropriedade. A e B, irmão são
comproprietários de um terreno e A vende a C. O Dr. Menezes Leitão diz que, esta
situação, não pode ser abrangida pelo art.902º, porque o legislador já resolver esse
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Venda de Bens Onerados: qual é a patologia nesta venda? Art.905º diz que o
problema em causa não é a transmissão de um direito alheio, mas sim um
direito que está sujeito a ónus ou limitações. Isto quer dizer que o direito não
tem o conteúdo que o comprador representara que ele tivesse.
É em relação aos poderes que o conteúdo não tem o alcance que o comprador
representara que ele tivesse. O comprador representou que o direito que lhe é
transmitido contivesse poderes que, na realidade não tem. Ex: A vende a B um
apartamento. Quando lhe é entregue, B percebe que ele estava arrendado a X.
isto significa que os poderes de gozo foram cedidos a um terceiro, o
arrendatário, o que significa que quando B, o comprador, celebrou com A, a
compra e venda, B representou que o direito de propriedade sobre aquele
apartamento tinha uma extensão, que, na realidade não tinha, porque, parte
dos poderes foram transferidos ao arrendatário.
Não existe nenhum vício quanto ao objeto, àquilo que é vendido. A patologia
refere-se ao direito sobre o objeto.
No que toca ao contrato de locação, o comprador não pode despejar o
arrendatário que lá está.
Segundo o art.905º, o contrato é anulável por erro ou dolo, porque o
comprador respresentou, erroneamente, um certo conjunto de poderes
inerentes ao direito, quando, na realidade, esse direito está comprimido por
ónus, limitações ou encargos.
No entanto, não são quaisquer ónus ou limitações. O art.905º diz-nos que são
aqueles que excedam os limites normais. Existem normas que se impõe a todos os
direitos e que os comprimem.
Existem ónus ou limitações que são expetáveis e por isso, não faz sentido,
nesses, proteger o comprador.
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Também à semelhança da venda de bens alheios, pode aqui haver uma obrigação de
sanar o vício. Aqui pode haver uma obrigação de expurgar os encargos/ónus. Essa
obrigação, funcionalmente equivalente à convalidação, está prevista no art.907º.
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O erro é incidental se se puder afirmar que, sem ele, o declarante teria emitido a
declaração de vontade, mas apenas o teria feito, em termos diferentes. Ou seja, o erro
do comprador será incidental se, sem ele, ele tivesse comprado a coisa onerada, na
mesma, mas por um preço inferior.
Por isso, se o erro for incidental, nunca poderíamos atribuir ao comprador o poder de
anular o contrato de compra e venda. Isto não faria sentido, porque ele iria querer
sempre a validade do contrato, mas tê-la-ia querido em termos diversos.
- art.911º - não faria sentido o legislador dizer que poderia, na mesma, desfazer
a compra e venda, quando, o erro é incidental, porque ele queria sempre comprar e
queria sempre que o contrato produzisse efeitos, coisa que a anulabilidade rejeita. A
solução teria que ser apenas a redução do preço a pagar por ele (porque se a coisa
está onerada, ela vale menos).
Quando falamos da venda de bens onerados, dissemos que ela se trata de um vício
não daquilo que é vendido/transmitido, mas, antes, vícios dos poderes que incidem
sobre essa coisa (ex: alguém que adquire uma casa que está arrendada sem o saber).
Quando falamos da venda de coisa defeituosa, falamos de um vício da própria coisa,
ao contrário da venda de bens onerados, em que o vício respeita aos poderes. Não há
qualquer vício respeitante ao direito sobre a coisa transmitida, mas antes sobre a
própria coisa (ex: adquirir um relógio de parede que não dá as horas e eu julguei que
era porque faltavam pilhas, mas foi porque havia um problema mecânico).
Dito isto, há uma crítica muito grande feita ao regime do art.913º e ss., que diz que
este trata a venda de bens onerosos como um vício da vontade e não um problema de
execução contratual. Esta é uma grande crítica, que resulta e está associada ao facto
do nosso CC, no âmbito da venda de coisa defeituosa, tratar de forma diferente a
mesma realidade de venda de coisa defeituosa, dependendo do momento em que
surge o vício. Há um regime para a venda de coisa defeituosa, nos casos em que o vício
é contemporâneo no momento de celebração da compra e venda e um regime para os
casos em que o vício é superveniente.
O regime da venda de coisa defeituosa no momento em que o vício já existe no
momento da celebração (erro da vontade) – art.913 e ss.
O regime de vício superveniente (problema de incumprimento) – art.918º e ss.
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Isto leva a uma critica de Menezes Leitão, que nos diz que isto tudo depende de alguns
acasos da prática. O Dr. Pinto Monteiro concorda com esta crítica.
Se o mesmo comprador se dirigir a uma ourivesaria e encomendar um anel com
determinadas características e lhe entregarem um anel com um risco, já é tratado
como um vício superveniente, porque não se pode considerar um problema de
formação da vontade, porque não há divergência entre aquilo que o comprador
representa e o que acontece – art.918º.
Esta pequena divergência, que pode surgir na prática, pode gerar a aplicação de
regimes diversos.
Sempre que falamos de coisa defeituosa, falamos de falta de algo respeitante à coisa
que é transmitida. Essa falta é uma falta de determinadas utilidades. É isto que se
entende por defeito.
O legislador tenta falar de defeito como vício ou falta de qualidades, mas o defeito é
todo ele uma falta de qualidades.
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Portanto, aplicamos o art.913º e ss. sempre, que, tenhamos um defeito e, depois, que
o defeito se repercuta numa das três formas acima.
A primeira relação é uma relação de profissional para profissional. Esta relação é a tal
que é titulada pelo CC.
A segunda relação é uma relação de profissional para consumidor. Está vem regulado
no decreto-lei nº
Na compra e venda de coisas defeituosas, temos uma coisa que terá um defeito e, este
não surge depois da compra e venda ele pode é revelar-se depois da compra e venda.
À data da venda a coisa já tem o defeito, mas este pode apenas revelar-se depois.
Quando o defeito na coisa, ocorre depois da celebração do contrato, poderá existir o
regime de cumprimento defeituoso, se for imputável ao vendedor, ou, caso não seja
imputável ao vendedor, aplicamos as regras atinentes ao risco.
Para que seja aplicado o regime de venda de bens defeituosos, são necessários dois
pressupostos:
- tem que existir um defeito – são os vícios da coisa e a falta de qualidades asseguradas
ou necessárias.
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- desvalorize a coisa;
- situação de não correspondência com o que foi assegurado pelo
vendedor;
- uma inaptidão para o fim a que a coisa se destina.
Efeitos:
Encontram-se no art.913º, segunda parte, que nos diz que quanto à venda de bens
defeituosos, devemos remeter para a venda de bens onerados. Quando o regime de
bens defeituosos não diga nada em contrário, aplicamos o regime dos bens onerados.
Desta forma, aplica-se à venda de coisa defeituosa, as soluções da anulação do
contrato por erro ou por dolo e também a redução do preço.
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Ex: vamos imaginar que as partes estabelecem uma cláusula que diz
“este veículo será vendido no estado em que se encontra”. Se formos
comprar e tiver sido feita uma declaração por parte do vendedor que
diga isto, esta é válida e o vendedor será desresponsabilizado – art.912º
ex vi 913º.
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Art.13º - este artigo é uma das novidades. Este artigo fala de ónus da prova e diz-nos
que a falta de conformidade que se manifeste no prazo de 2 anos a contar da entrega
do bem, é presumida à data da entrega do bem.
Art.14º - também fala de ónus da prova, relativamente a bens digitais. É a transposição
direta da diretiva. Em princípio, os bens digitais não são tão tratados, porque não é tão
usual.
Art.15º - é muito importante, visto que fala dos meios de ressarcimento em caso de
falta de conformidade. Diz-nos que, em caso de falta de conformidade, o consumidor
tem direito à reposição da conformidade, através da reparação ou substituição do
bem. Para além disso, tem direito à redução proporcional do preço ou á resolução do
contrato.
O pedido de resolução ou de redução do preço só podem ser exercidos se as duas
primeiras opções, ou seja, se a reparação ou substituição do bem, não forem
efetuadas.
O consumidor pode sempre optar pela reparação ou pela substituição do bem.
Não haverá escolha na situação em que o meio escolhido para a reposição da
conformidade for impossível ou se, em comparação com outro meio, impuser ao
profissional, custos desproporcionados – esta é a exceção.
Existe uma situação em que o profissional pode recusar repor a conformidade dos
bens – art.15º/3: caso seja impossível ou caso os custos para o profissional sejam
desproporcionados.
Arts. 22º e ss. Entramos, aqui, numa secção que tem a ver com a compra e venda de
bens imóveis. No art.22º/1 fala-se do princípio da conformidade, segundo o vendedor
deve entregar ao comprador os bens imóveis conformes ao contrato.
O art.23º é muito importante, porque consagra prazos diferentes, que têm que ser
cumpridos. O profissional responde perante o consumidor por qualquer falta de
conformidade, quando o bem imóvel lhe é entregue e se manifeste nos seguintes
prazos: 10 anos em relação a faltas de conformidade, relativamente a elementos
estruturais; ou 5 anos relativamente às restantes faltas de conformidade.
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Concluindo, este regime protege muito mais o consumidor, porque alarga muito os
prazos de denúncia e de caducidade da ação e também é o regime que é importante
em termos de ónus da prova, visto que o inverte em algumas situações.
2.1. Conceito
Art.940º - o Dr. Menezes Leitão faz duas referências a este contrato. Uma delas é que
vai ser mencionada agora.
A doação é um contrato, mas, apesar disso, há casos em que isso não sucede. Aliás,
nem sempre o foi.
O facto de ser considerado um contrato, é, de certo modo, uma opção legislativa.
Consideramo-la como tal, porque há a ideia de que uma pessoa não pode impor um
benefício a outra, porque o outro pode não querer recebê-lo, devido a múltiplos
motivos.
É natural que se exija uma declaração de vontade do beneficiário para que a doação
produza efeitos jurídicos. Por esse motivo, podemos concluir que a doação é um
contrato. Mas diz-nos Menezes Leitão, que não é assim em todos os casos. Casos há
em que a doação não é um negócio bilateral, mas antes, um negócio unilateral, porque
se prescinde da vontade – casos em que o donatário é um menor ou maior
acompanhado, ou seja, pessoa sem capacidade de exercício.
Nestes casos, se a doação for pura (sem encargos), o legislador preceitua que não seja
necessária a aceitação. Não é necessário que o donatário declare coisa alguma.
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conta, elementos como a poupança que o donatário teria realizado ou que não teve de
suportar, em virtude da atribuição patrimonial e também não é necessário considerar
o facto do donatário poder ter obtido este enriquecimento, por outra via.
O Dr. Menezes Leitão diz que a ideia de poupança de despesa, associada à ideia de
enriquecimento patrimonial e que releva no âmbito do enriquecimento sem causa,
não é a ideia de enriquecimento, aqui, empregue. O que interessa é a atribuição
patrimonial em si (enriquecimento real) e não a forma como se repercutiu no
património (enriquecimento patrimonial).
Tudo aquilo que é concreto e importante no enriquecimento sem causa, aqui é
desnecessário.
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não tinha direito no momento em que a atribuição é realizada, mas que poderia vir a
ter.
Este empobrecimento de que aqui se fala, respeita ao património da pessoa que
realiza a atribuição patrimonial, única e exclusivamente, no momento em que ela é
feita.
Esta renúncia a que o património se expanda é irrelevante.
Por que motivo é que uma pessoa realiza uma atribuição patrimonial que a
empobrece, que não tenha espírito de liberalidade? Pode haver, na realidade, muitas
situações em que alguém realiza uma atribuição e gera um enriquecimento, mas sem
intenção de provocar esse enriquecimento.
A intenção de provocar esse enriquecimento é o centro do espírito de liberalidade e
essa intenção tem que ser espontânea, ainda que não tenha que ser altruísta.
Mas, em todos estes casos, seja qual for a intenção por trás da liberalidade, tem que
haver a intenção de gerar o enriquecimento.
Mas há casos em que isso não sucede. Ex: Menezes Leitão dá o exemplo da prestação
de garantia, embora o Dr. Pinto Monteiro não o considere acertado.
Existem vários motivos pelos quais uma pessoa pode fazer uma atribuição patrimonial,
sendo ela espontânea.
Existe uma exceção a esta regra – art.863º/2 (caso específico de remissão – que é uma
forma de extinção de obrigações). A remissão é aquilo a que na gíria, chamamos de
perdão. Esse é o único caso de renúncia de direito em que a renúncia configura uma
doação, porque resulta de um negócio entre credor e devedor, onde esteja
demonstrado o espírito de liberalidade.
- repúdio de herança – ao repudiar uma herança, quem repudia, tem como finalidade,
não suceder. A intenção de quem repudia a herança é não querer herdar. Não há
espírito de liberalidade, porque as consequências para as outras pessoas, não são
vistas e achadas para que tenha lugar o repúdio da herança.
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- quando haja donativos conformes aos usos sociais – ex:. gorjetas. Isto não é uma
doação porque alta o espírito de liberalidade. Não há a intenção de enriquecer a
pessoa espontaneamente. Estou a enriquecer alguém porque esse alguém me prestou
um serviço e, não tenho obrigação de o fazer, mas faço porque, socialmente, posso.
Portanto, não há um animus donandi, há um animus solvendi. Realizo esta atribuição,
não por vontade, mas por dever.
O donativo não é espontâneo, mas é socialmente expectável que o faça.
Quanto aos efeitos, como qualificar a doação? A doação produz efeitos reais e
obrigacionais, em certos casos. Ex: eu dei uma quinta a alguém. Produz o efeito real de
transmissão da propriedade e o efeito obrigacional de eu entregar a coisa.
Mas, há casos em que a doação ou só produz efeitos reais ou só produz efeitos
obrigacionais.
Ex1:. doação sobre bens incorpóreos.
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Ex2:. Ou então, vamos imaginar. A quinta que eu doei, já estava na posse do meu
amigo, aí, nasce um efeito real de transmissão da propriedade, mas, não nasce a
obrigação de entrega – aqui é um caso em que só produz efeitos reais.
Para que um contrato seja gratuito, temos que poder dizer que só há atribuições
patrimoniais a cargo de uma das partes. Nas doações puras, isso, efetivamente,
acontece. Mas, as dúvidas surgem nas doações modais, porque, aqui, também há uma
atribuição patrimonial imposta a outra parte, que corresponde ao modo, ao encargo.
Não se pode dizer que a pessoa que tem como encargo pagar uma renda mensal, a
quem lhe doou um prédio, não veja isso como um encargo.
O Dr. Menezes Leitão apresenta como argumento o facto de, na doação modal, o valor
do encargo, estar limitado ao valor daquilo que é doado.
Mas isso, não quer dizer que a doação não seja, ainda, onerosa. Uma doação modal,
que imponha um encargo ao donatário, não deixa de impor um encargo que tem valor
patrimonial.
Por isso, devemos entender que a doação tem que ser sempre parcialmente gratuita,
mas não tem que ser sempre, integralmente gratuita.
É um contrato sinalagmático ou não? O Dr. Menezes Leitão entende que não. O Dr.
Pinto Monteiro concorda que até possa não ser sinalagmático, mas não concorda em
dizer que a doação é um contrato unilateral. Também existem deveres impostos ao
donatário, não impõe obrigações a apenas uma das partes.
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Ao Dr. Pinto Monteiro não parece que a doação seja sempre um contrato unilateral.
Pode ser bilateral, ou bilateral imperfeita.
O legislador decidiu proibir a doação futura, precisamente porque iriamos abrir, mais
facilmente, mão das coisas.
O legislador, no art.942º/2, diz-nos que não se pode doar bens futuros, mas, nos casos
em que se doe uma universalidade de facto, consideram-se integradas no âmbito da
doação, as coisas que venham a integrar a universalidade. Ex: doação de uma
biblioteca, de um rebanho.
Uma universalidade de facto é uma coisa composta por vários elementos singulares,
mas que são aqui considerados, coletivamente, como sendo uma coisa só, porque
estão destinadas a um fim unitário.
Ex:. quanto ao exemplo do rebanho. Se uma pessoa doar um rebanho, não basta a
doação, é preciso que a universalidade de facto (o rebanho) continue no uso e fruição
do doador.
Pensemos num rebanho que é doado, mas continua a ser utilizado por quem o doou,
desde logo, existem elementos daquela unidade de facto que nascem ou morrem e, se
calhar, passado algum tempo, nenhuma das ovelhas era originária.
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Já o Dr. Menezes Leitão não concorda com Antunes Varela, assim como o Dr. Pinto
Monteiro. Em primeiro lugar o doador poderia sempre alcançar o resultado que
Antunes Varela vê como proibido. Este mesmo legislador, permite que o doador, no
testamento, inclua uma disposição que alcance esse resultado.
Ou seja, o argumento de Antunes Varela não faz grande sentido, porque se eu
convencionar com alguém que lhe dou, todos os meses, 1000€, após a minha morte,
alcanço o resultado que Antunes Varela entende ser proibido. Isto, desde que o
testamento cumpra os requisitos testamentários.
O legislador no art.944º diz que se trata de uma norma supletiva, de que não há direito
a acrescer, a regra é que a quota não aceite, continue na esfera do doador.
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- a razão de ser da forma: a maior parte dos contratos são onerosos. A forma permite a
reflexão das partes (a ideia de consciencialização). E, num contrato, em que uma das
partes realiza uma atribuição patrimonial, pelo menos, parcialmente gratuita, essa
reflexão é ainda mais necessária.
É este o motivo do contrato de doação ser primordialmente formal.
Porém, enquanto a proposta não for aceite, pode ser, livremente, revogada,
a todo o tempo. A aceitação, então, não é irrelevante, muito pelo contrário
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Por último, Menezes leitão faz uma referência ao art.952º dizendo que, nos
dias de hoje, esta norma é desnecessária, sendo que o Dr. Pinto Monteiro
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Por último, o nº2 deste artigo também não é muito relevante. Ex: eu doo
uma coisa ao meu filho que ainda nem sequer foi concebido, mas, enquanto
ele não nascer, eu sou o usufrutuário da coisa. Mas, o Dr. Menezes Leitão,
também considera isto desnecessário, porque entre 1966-1967, os pais
eram usufrutuários legais das coisas dos filhos e nessa altura, os pais, que
ainda nem tinham sido pais, estariam a usufruir da coisa, que seria do filho,
quando esse nascesse.
Com a reforma, eliminou-se esta regra.
O legislador estabelece uma proibição de celebrar doação por mandato, quando este
não comportar a faculdade de designar a pessoa do donatário ou do objeto da doação
– art.949º/1CC.
Então, o mandante tem que indicar o conjunto de pessoas que possam ser donatárias
e o conjunto de objetos a partir do qual o mandatário pode escolher.
Posso atribuir a alguém por procuração, que doe por mim, desde que determinadas as
pessoas e os objetos da doação.
O próprio mandatário pode escolher a pessoa a quem doar, mas este poder tem que
ser circunscrito pelo mandante. O mesmo quanto ao objeto.
Verdadeiramente, a doação por mandato, é permitida, o que a põe em causa, um
pouco, aquela ideia de Menezes Leitão de que uma pessoa não pode doar por outra.
Apesar de tudo, então, o legislador permite, em certos casos, a doação por mandato.
E, mais que isso, permite que o mandatário, até, escolha a pessoa a quem vai ser
doado, desde que o faça de entre uma lista de pessoas e objetos determinados pelo
mandante.
Em princípio não há nenhuma proibição. Mas coloca-se a questão se saber se isso não
põe em causa os elementos essenciais da doação.
Se eu celebro um contrato promessa de doação, onde está a espontaneidade da
doação?
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Então gera-se o problema de podermos aceitar este contrato. Há autores que são mais
céticos, e que dizem que só a promessa de doação é que é verdadeira doação, porque
há uma atribuição patrimonial (assunção de uma obrigação) e esta é feita com espírito
de liberalidade. Depois, também existe uma transmissão. No entanto, no momento da
celebração do contrato prometido, já não existe este espírito de liberalidade.
O Dr. Antunes Varela parte da mesma ideia base, mas diz que não é só a promessa que
é doação, ele diz que a doação prometida também é ainda doação, porque comunga
do espírito de liberalidade que existe na promessa.
Compreende-se, de certa forma, este entendimento, porque o contrato promessa, não
tem valor por si próprio. Todos os efeitos que produz são queridos como um meio para
atingir um fim – os efeitos do contrato prometido.
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promessa de doação de bens futuros, porque, também é muito fácil, aliás, tão ou mais
fácil doar aquilo que é futuro. O mesmo problema que leva à proibição da doação de
bens futuros, estende-se à promessa de doação de bens futuros.
Há casos em que uma doação é nula – ex: quando não observa a forma exigida no
art.947º; quando se viole uma das impossibilidades relativas, do art.953ºCC.
Há uma curiosidade quanto a esta nulidade, porque, para este regime, o legislador
permite que, o herdeiro do doador, confirme a doação. Ou seja, se tivermos uma
doação nula, ela ainda pode vir a produzir efeitos, desde que seja confirmada por um
herdeiro do doador, depois da morte deste. Mas, repare-se, não há aqui uma
verdadeira convalidação, não se sana a nulidade da doação. A doação não deixa de ser
nula, mas produz efeitos, porque apenas se preclude que o herdeiro do doador, dele
se possa valer, porque ao confirmar a doação, renunciam ao direito de invocar aquele
vício.
O Dr. Menezes Leitão não deixa de acrescentar uns pontos. A confirmação representa
uma renúncia ao direito de invocar a nulidade. Ela pode operar por uma declaração
expressa do herdeiro do doador ou, por exemplo, pela transmissão do objeto da
doação.
Ou o herdeiro do doador declara a vontade de declaração dos efeitos da doação nula.
Ou, este, através da execução, exprime essa vontade – declaração tácita.
Na parte final do art.968º, o legislador diz que é necessário que quando o doador
pratique estes atos - quando confirma a doação -, saiba que esse seu ato vai traduzir-
se na renúncia a um direito a pedir a declaração de nulidade.
A renúncia tem que ser feita por alguém que saiba que está a renunciar a um direito.
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