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SOUZA, A. A.de. O profissional liberal Nikkei médico: geo-história, mobilidade e técnica. In.

Simpósio Nacional de Geografia


da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina
Grande: UFCG, 2021. p.11-20. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com/ ISSN 1980-5829

O PROFISSIONAL LIBERAL NIKKEI MÉDICO: GEO-HISTÓRIA, MOBILIDADE E


TÉCNICA

SOUZA, Adriano Amaro de1

Resumo: A territorialização da imigração japonesa para o Brasil tenha se iniciado em 1908,


somente na década de 1930 é que, efetivamente, ocorreu a fixação dos nipônicos no
município de Presidente Prudente/SP. Posteriormente, muitos japoneses se tornaram
sitiantes estando balizado no labor familiar, enraizados no país, os imigrantes nipônicos
passaram a investir na educação dos filhos nikkeis para atingir status e prestígios sociais no
lugar de destino. Sendo assim, o objetivo desse artigo é analisar a geo-
história/mobilidade/técnica do profissional liberal nikkei médico na formação territorial do
município de Presidente Prudente/SP. Para tanto, os aspectos teórico-metodológicos da
pesquisa tem centralidade nos conceitos de história oral, formação territorial e profissional
liberal. A geo-história dos profissionais liberais médicos procurou ser analisada pela
memória de três nikkeis que perpassou pela mobilidade educacional no interior de São
Paulo, chegando à atuação profissional/empresarial via objetos técnicos (hospitais/clínicas)
em Presidente Prudente/SP.

INTRODUÇÃO
A territorialização da imigração japonesa para o Brasil tenha se iniciado em 1908,
somente na década de 1930 é que, efetivamente, ocorreu a fixação dos nipônicos no
município de Presidente Prudente/SP. Em 1918, por exemplo, havia duas famílias
localizadas na zona rural (ABREU, 1972). Somente uma década depois é que chegou um
contingente significativo. A territorialização dos imigrantes isseis foi favorecida pela dinâmica
econômica comandada pela produção agrícola, quando eles se inseriam como arrendatários
ou sitiantes, o que foi facilitado pela frente de expansão da cafeicultura. Com isso, o cultivo
do café possibilitou o avanço econômico da região para os pioneiros, atraindo migrantes de
várias nacionalidades e, entre eles, o trabalhador japonês. Porém, a crise internacional de
1929 paralisou a produção da lavoura cafeeira para o mercado internacional (SOUSA,
2007/2010).
Todos eram colonos na agricultura e almejavam acumular uma poupança para voltar
ao lugar de origem, o que não aconteceu. Nessa sua saga por mobilidade-permanência,
procuraram regiões com terras baratas e férteis na “boca do sertão” para comprar lotes
rurais no Brasil, criando raízes e se territorializando efetivamente no estado de São Paulo,
tornando Presidente Prudente como o território de oportunidades. A permanência do
imigrante japonês se deu pelo trabalho, que o mesmo realizou no cultivo do algodão
efetivando sua territorialização pelo habitat e pela plataforma de oportunidade, tendo
centralidade na pequena propriedade privada rural. Foi com esta cultura que alguns nipo-
brasileiros conseguiram ascensão social, alguns deles conseguiram se tornar capitalizados

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Doutor em Geografia pela FCT/UNESP; Professor da Fatec de Itaquaquecetuba-SP;
adramaro@yahoo.com.br.

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SOUZA, A. A.de. O profissional liberal Nikkei médico: geo-história, mobilidade e técnica. In. Simpósio Nacional de Geografia
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Grande: UFCG, 2021. p.11-20. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com/ ISSN 1980-5829

e investiram na educação dos filhos por meio de uma profissão especializada visando a
mudança de status e objetivando ganhar dinheiro em atividades urbanas (SOUSA, 2019).
Segundo Cardoso (1963), os sucessivos êxitos econômicos dos nipônicos trouxeram
novos estímulos e novos objetivos para o grupo: a) não retornar mais ao Japão; b) se
tornarem proprietários rurais; c) educar os filhos; e, d) ter status/prestigio social. Tudo isso,
favoreceu a ascensão social dos “nikkeis” por meio da: “[...] valorização do trabalho
intelectual, que trouxeram do Japão, e o propósito de proporcionar aos jovens uma vida
melhor, fizeram com que esses “issei” incentivassem os “nisseis” o desejo de conseguir uma
profissão urbana e bem categorizada socialmente. A vida rural brasileira é difícil e
desconfortável. A inexistência de comunicações, as grandes distâncias entre os núcleos
povoados, a preponderância da monocultura, entre outras razões, faz(em) do homem do
campo um ser isolado que devem enfrentar sozinho as grandes dificuldades. Essas
condições de vida vieram reforçar o valor atribuído pelos japoneses aos trabalhos
intelectuais, e o empenho que fizeram em ver os filhos diplomados” (CARDOSO, p. 56,
1963). Para a autora, os japoneses e seus descendentes viviam uma dualidade no Brasil
tendo centralidade na colônia: valoriza-se abertamente a vida rural ao mesmo tempo que se
estimula a carreira intelectual para os jovens capazes de abarcar as profissões liberais.
Essa dualidade foi importante para a reterritorialização dos nipo-prudentinos auxiliando nos
novos objetivos destes no país: posse da terra (rural/urbana), diploma e status sociais.
Sendo assim, o objetivo desse artigo é analisar a geo-história/mobilidade/técnica do
profissional liberal nikkei médico na formação territorial do município de Presidente
Prudente/SP. Iremos dividir o artigo em duas partes: a) aspectos teóricos e metodológicos
da pesquisa; b) a geo-história do profissional liberal nikkei pela memória, mobilidade e
técnica. Por fim, o artigo apresenta uma nota de introdução e conclusão.

Aspectos teóricos e metodológicos da pesquisa


Os aspectos teórico-metodológicos estão balizados nos conceitos de mobilidade,
redes/técnicas e profissional liberal a partir da história de vida/estudo/profissional dos nikkeis
na área da saúde pelo procedimento da história oral. Conforme Meihy (2002, p.13),
[...] a história oral é um recurso moderno usado para a elaboração de
documentos, arquivamento e estudos referentes à vida social de pessoas”.
As modalidades da história oral são: historia oral de vida, historia oral
temática e tradição oral. Nessa perspectiva, utilizaremos o procedimento da
história de vida que “se define como o relato de um narrador sobre a sua
existência através do tempo, tentando reconstituir os acontecimentos que
vivenciou e transmitir a experiência que adquiriu (QUEIROZ, 1988, p. 20).

De modo geral, compreendemos a mobilidade na geografia pelo território e pelas


redes/objetos técnicos articulado com o trabalho (a informação/comunicação e energia) em
Raffestin e o meio técnico-científico-informacional de Santos. No processo de mobilidade
espacial, a formação territorial auxilia na explicação da sociedade e do território no tempo.
Isto quer dizer que a trama histórica da formação territorial explicita a complexidade espacial
por meio do processo de dominação e apropriação do espaço geográfico. Por outro lado,
Santos (1977) apresenta o conceito de formação socioespacial, procurando explicar
teoricamente que uma sociedade só se torna concreta através de seu espaço. Espaço este

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que a sociedade produz e só é inteligível por ela mesma. Todavia, a categoria Formação
Econômica Social elaborada pelos economistas e sociólogos não incluía o espaço na
análise da dinâmica social. Por isso, Milton Santos chama atenção para a Formação
Socioespacial, pois não existe sociedade sem espaço. Desse modo, entendemos o território
pelo espaço e pela sociedade. Ele é definido pelas relações de poder articulada pelos
pontos, nós e redes (RAFFESTIN, 1993; HAESBAERT, 2004; SAQUET, 2007). Dominação
e histórias estão embricados no território. Assim, a Formação Territorial pode ser analisada
pela leitura dos processos geo-históricos da abordagem do território tendo centralidade nos
ambientes construídos (paisagens e rugosidades) e nos símbolos-culturais (signos).
Para Santos (2009), existem duas matrizes de redes: a) as redes técnicas são todas
as infraestruturas que permite o transporte de matéria por pontos terminais; b) já a rede
social compreende as pessoas, mensagens e valores. Nesse sentido, a rede é uma mera
abstração criada pelo homem estimulando a produção e circulação, não sendo uniforme em
todos os espaços. "E onde as redes existem, elas não são uniformes. Num mesmo
subespaço há uma superposição de redes, que inclui redes principais e redes afluentes ou
tributárias, constelações de pontos e traçados de linhas. Levando em conta o seu
aproveitamento social, registram-se desigualdades no uso e é diverso o papel dos agentes
no processo de controle e de regulação do seu funcionamento" (SANTOS, p. 2009, 268).
Segundo Vasconcelos (2012), na linguagem jurídica “o profissional liberal, que
originalmente significa o trabalho de um homem livre, hoje designa a atividade do indivíduo
cujo trabalho não depende senão das capacidades técnicas e intelectuais dele mesmo” (p.
30). [...] “o profissional liberal como alguém que adquiriu uma certa preparação cultural,
normalmente através de cursos ou estágios e que, em decorrência da profissão que
abraçou, passa a prestar um serviço de natureza específica, na maioria das vezes
regulamentado pela lei” (p. 30). [...] “podem se enquadrar nessas profissões regulamentadas
ou não por lei; as que exigem formação universitária ou habilitação técnica equivalente e
ainda aquelas reconhecidas no mercado de trabalho e nas relações sociais” (p.30).

A geo-história do profissional liberal: memória, mobilidade e técnica


No Brasil, a dinâmica de mobilidade espacial e social dos nipônicos aconteceu
inicialmente quando eles se tornaram sitiante e se organizaram em associações nipo-
brasileiras, configurando territórios e redes técnicas/sociais no Oeste Paulista, procurando
se territorializar de vez no país receptor. Essa territorialização foi assentada dentro da lógica
do modo de produção capitalista, quando adquiriu sua pequena propriedade rural ou montou
seu pequeno comércio, posteriormente estabilizado passou a investir na educação dos
filhos. Tal educação dos filhos é o estopim para a mobilidade dos nikkeis na busca por se
tornar um doutor (profissional liberal urbano).
Foi a partir desse contexto de estabilidade/permanência que quem passou a ter mais
mobilidade na família nipo-brasileira foi o filho nikkei escolhido para o estudo, como no caso
do médico nissei o Sr. Sizuvo Iamada que nos narrou esse fato com bastante clareza e
consciência:
“Meu pai, por exemplo, veio para se instalar no Brasil. Procurou educação e
tudo isso. E prometia assim para gente “olha, quando eu puder vou fazer
vocês estudarem, porque eu quero que tenha muitos doutores na família.
Viu”. E nesse intuito, sabe, acabou chegando a minha vez. Porque meus
irmãos tinham também a vontade de estudar, mas não conseguiam essas

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facilidades para poder sustentar. Quando chegou à minha vez. Minha


família já tinha o suficiente para arcar com isso. E me mandar estudar”.
(ENTREVISTA, DR. SIZUVO IAMADA, 14/09/18).
Portanto, o filho escolhido para se dedicar a educação da família Iamada competiu
ao quarto filho dentre os outros cinco irmãos (Yassu, Fumio, Katsui e Mitsuko) tendo o
privilégio de estudar.
Nesse sentido, o sr. Sizuvo foi o primeiro filho nascido no Brasil em 1932, pois seus
pais vieram do Japão com três filhos, desembarcando em 1929 no porto de Santos, logo em
seguida se dirigindo para o povoado denominado de Nicolândia/SP. Tal povoado se
configurou no atual município de Bilac/SP situado na região Noroeste do Estado de São
Paulo. Local em que a família arrendou terras e, posteriormente, comprou uma pequena
propriedade no bairro rural Barreiros, para continuar trabalhando com a lavoura de café e de
algodão.
As famílias nipônicas no país, em especial a família Iamada, se deparam com uma
situação nova que era a escolha do filho que teria a oportunidade estudar, enquanto o
restante da família trabalhava para garantir o sucesso desse projeto familiar, sendo que o
filho escolhido migrava para outros municípios onde o estudo era ofertado e mais
consolidado, almejando ser doutor. Migrar para o estudante nikkei significava se distanciar
espacial e afetivamente da família, sendo que desde criança tinha a responsabilidade de se
destacar no ensino, para obtenção do título de letrado. Não sendo uma missão fácil para o
estudante nipo-brasileiro pelas expectativas depositadas nele. Logo, a família sonhava com
o título de doutor do filho escolhido, na perspectiva de atrair o dinheiro e a visibilidade social,
dando notoriedade para o sobrenome da família no lugar de origem do nikkei.
No início raramente as filhas eram escolhidas, mas com o passar do tempo e da
melhoria nas condições financeiras da prole, lá pelos idos das décadas de 1970/80, as filhas
e os outros membros da família também tiveram a oportunidade de finalizar o ensino básico.
Todavia, apenas alguns deles/delas cursariam o ensino superior na cidade natal ou em
outros lugares, se colocando prontamente em mobilidade espacial para o estudo e para a
carreira profissional, exceto o filho mais velho que continuou no seio da família.
Conforme Cardoso (1998), o que permaneceu razoavelmente por um tempo na
tradição japonesa de algumas famílias era obrigação do filho mais velho de cuidar da
herança econômica/cultural da prole e de ficar junto aos pais na lida do campo ou do
comércio. Por tal obrigação, o irmão mais velho do dr. Sizuvo (2018), o sr. “Yassu se formou
depois, ele não pode usufruir assim dos estudos em nível superior, porque ele teve que
tomar conta da propriedade”. Tanto o sr. Yassu quanto as suas irmãs fizeram somente o
primário básico rural, bem mais tarde já no espaço urbano cursaria o ginásio e o colegial no
pequeno município de Bilac/SP, dando a oportunidade dos nikkeis finalizarem os estudos
básicos. Já o ensino superior necessitava buscar centros urbanos maiores. Porém, antes da
chegada do ensino público ginasial e colegial a família Iamada já havia encaminhado o filho
escolhido para realizar os estudos fora do município.
Nesse sentido, a mobilidade espacial do médico Sizuvo Iamada tem haver com o
desejo da família em educar o filho mais novo, como as condições eram adversas e as
escolas para avançar nos estudos se localizavam fora do lugar de origem, coube ao
pequeno estudante migrar. Pois a educação oferecida aos nikkes era o ensino primário rural
municipal. No entanto, o entrevistado nos descreveu os seus percursos espaciais para o
acesso ao ensino básico até a sua entrada na universidade, deixando evidente que a família

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investiu exclusivamente nele, sendo que com o passar do espaço-tempo os seus


irmãos/irmãs foram terminando os estudos.
Doravante,
[...] todos os meus irmãos/irmãs tiveram o primário completo, entendeu.
Todo mundo estava pensando em estudar, fazer curso superior e etc., mas
chegou esse momento justamente na minha vez, só que eles conseguiam
me manter nos estudos. [...] Já a escola japonesa não tinha assim
oficialmente era algo mais familiar que se aprendia de criança paralelo ao
curso do primário rural. [...] Aí para dar continuidade aos estudos eu fui para
Araçatuba/SP em 1944 fazer o ginásio, depois estudei em São Carlos/SP o
primeiro e o segundo do colegial em 1949, sendo que o terceiro ano do
colegial resolveu fazer em São Paulo/SP. [...] Fiz um ano de cursinho em
São Paulo/SP quase que passei lá na USP. Resolvi fazer cursinho no Rio
de Janeiro/SP e nessa segunda vez prestei somente a Faculdade Nacional
de Medicina a antiga Universidade do Brasil que hoje é a UFRJ. E passei no
curso que eu queria em 1953 e me formando em 1959. Morou em uma
república com amigos da faculdade no bairro Catete e, também, em
Botafogo que ficava uns três ou quatro quilômetros da universidade.
(ENTREVISTA, DR. SIZUVO IAMADA, 14/07/18).

Compreendemos os múltiplos deslocamentos espaciais para o estudo do médico


Sizuvo como um projeto da família Iamada de territorialização no Brasil, em que parte da
família trabalhava para sustentar o “embrionário” doutor nikkei. Tal apoio fizera progredir nos
estudos devido aos sacrifícios da prole para poder sustenta-lo.
Percebemos pelo depoimento que o doutor era grato ao pai e a família por ser o filho
escolhido e, também, por terem arcados com os custos dos estudos (moradia,
deslocamentos, alimentação, etc). Por sua vez, ele fizera a mobilidade desde criança para
ter acesso aos estudos, passando por várias cidades dentro de uma rede de solidariedade
que incluía casa de amigos, alojamento das associações nipo-brasileira e pensão para
estudante nikkei. Essa experiência espacial foi de suma importância para a formação do
doutor que passou a conhecer as formas híbridas da realidade dos municípios do interior
paulista e dos grandes centros urbanos (São Paulo e Rio de Janeiro) até se territorializar na
região da Alta Sorocabana (Presidente Venceslau/SP e Presidente Prudente/SP.
Naquela época todo mundo, por exemplo, um hospital particular chamava
para trabalhar. Funcionava dessa maneira, porque precisava de mão de
obra. Isso, estudante. Era tão fácil nessa época para aprender. Muito fácil.
Não tinha profissional, na verdade, nessa época. Numa cidade
superpopulosa como o Rio de Janeiro/RJ com uma quantidade de médico
muito pequena. Escolhi a especialidade da obstetrícia porque a maternidade
era algo assim, que dava mais serviço (IAMADA, 2018).

Desse modo, já formado médico obstetra em 1961 o sr. Sizuvo resolveu vir para o
Oeste Paulista, escolhendo como lugar de trabalho a promissora cidade de Presidente
Venceslau/SP, nela tinha vínculos afetivos familiares que daria inicio a sua rede social e de
negócios no lugar. Eu “vim para Venceslau porque minha irmã residia na cidade e, também,
a princípio era uma região próspera. Apontava-se. Venceslau na época tinha voo direto para
o Rio de Janeiro/RJ” (ENTREVISTA, DR. SIZUVO IAMADA, 14/07/18). Posteriormente, por
volta de 1969, mudou-se para Presidente Prudente/SP com a família (esposa e duas filhas e
um filho), montando seu consultório particular e iniciando a construção do Hospital

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Maternidade Iamada, concretizando o sonho do jovem e empreendedor médico. Ademais, o


médico Sizuvo sempre foi ligado às novas tecnologias e equipamentos em medicina, sendo
pioneiro em ultrassonografia no Estado de São Paulo, buscou a máquina de ultrassom no
Japão no período da substituição de importações.
Como era aquele depósito compulsório, minha esposa foi lá no
Japão comprar e trazer para cá. Ela veio junto, esse aparelho veio
junto com o avião. Naquela época ultrassom não tinha em Prudente,
quando o doutor Iamada trouxe, esse daqui chegou antes do da
USP. E o Instituto de Cardiologia de Prudente não tinha ultrassom,
foi ter ultrassom muitos anos depois (IAMADA, 2018).
Seguindo os passos do pai o sansei Neiw Oliveira Iamada também se tornou médico
obstetra em 1991, ambos pela mesma Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),
fazendo residência pela Universidade Federal Fluminense (1992) e mestrado pela UFRJ
(1999). Foi médico do exercito, depois preceptor da empresa Johnson & Johnson, enquanto
residia no município do Rio de Janeiro/RJ. Como executivo desenvolvia, lançava e dava
treinamentos sobre os produtos médicos para a empresa multinacional supracitada.
Portanto, o sr. Neiw era o filho caçula do médico Sizuvo, nascido em 1965, no
município de Presidente Venceslau/SP na região da Alta Sorocabana, migrou criança com a
família para Presidente Prudente/SP, em 1969. Iniciou seu estudo aqui, como nos relata
Neiw (2018), “eu fiz o primário lá na escola do bairro do Bosque em 1972, depois até a
oitava série na escola E. E. Hugo Mielle no bairro Jardim Paulista, posteriormente o colegial
particular no Colégio Joaquim Murtinh no centro (antigo prédio da ACAE) em 1982”. Logo,
chegou a fase do pré-vestibular e o mesmo se sentiu motivado a fazer medicina. Contudo,
eu não fiz escolinha japonesa, pois o ensino da língua e cultura era mais familiar e com os
avós isseis, pois como os meus avós paternos moravam em outro município tive pouco
contato, mas foram marcantes pelo idioma, cultura e valores.
Sendo assim, a mobilidade espacial para o estudo do médico Neiw aconteceu
quando ele resolveu fazer o último ano do ensino médio e o cursinho pré-vestibular no Rio
Janeiro/RJ. Lá inicialmente ficaria hospedado na casa dos avós maternos. Esse
deslocamento aparentemente “simplório” Prudente-Rio e Rio-Prudente não representava a
totalidade da mobilidade e das redes complexas traçadas pelo doutor. Entretanto, o Rio de
Janeiro/RJ era o local de permanência para os estudos e para a vida profissional, sendo que
ao mesmo tempo tivera eminentemente múltiplas mobilidades como profissional da
medicina, como pesquisador-estudante-congressista, como funcionário do exercito e como
preceptor de uma multinacional, se deslocando no Brasil inteiro e no exterior. Nessas idas e
vindas do Rio de Janeiro/RJ o médico Neiw destacou que o seu lugar de formação e de
pesquisa na área de obstetrícia teve centralidade junto a Escola de Saúde de Manguinhos.
Em 1999, depois de um longo período de formação e de experiência profissional no
Rio de Janeiro/RJ, o sr. Neiw territorializou novamente em Presidente Prudente/SP, como
mestre em medicina pela UFRJ. Retornou para trabalhar na empresa da família o Hospital
Iamada, veio como profissional liberal assumir a área da obstetrícia e ginecologia junto com
o pai o médico Sizuvo, inovando em métodos e utilização de novas tecnologias. Aos poucos,
juntamente com os outros sócios, passou a acompanhar a administração do hospital ao lado
da irmã mais velha. Em 2003, passou a ser professor universitário assumindo as disciplinas
de ensino de ginecologia (cirurgia, ambulatório e vídeo laparoscopia) na Universidade do
Oeste Paulista (UNOESTE).

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Hoje com a aposentadoria do seu pai, o médico Neiw Iamada mantém a tradição do
hospital atrelado à maternidade, mesmo o hospital tendo diversas especialidades
(cardiologista, dermatologista, neurologista, entre outros) em clínicas, internações e
cirúrgicas. De modo geral, a família Yamada relata sobre o conceito de profissional liberal,
segundo Neiw: “Eu acho que, não sei se é o mesmo conceito que o meu pai tem de ser
profissional liberal. Não sei se a gente expressa esse ser liberal. E eu não entendo mais isso
como autonomia, como acho que era”. O pai médico Sizuvo acrescenta que, o profissional
liberal “acaba não sendo um empregado do convênio. A sensação que eu tenho é que a
liberdade não acontece de jeito nenhum” (2018). Contudo, o que percebemos pela narrativa
é que o médico particular mesmo que liberal trabalha dentro de um contrato “amarrado” e a
tomada de decisão depende da liberação do convênio. Isso de certa forma limita a
autonomia conceitual do profissional liberal na configuração do capitalismo contemporâneo
atual.
Já o sr. Tadashi Uchida também era filho de médico, seu pai o dr. Ritoji Uchida se
formou na Universidade de Nipon Daigaku em Tóquio no Japão, veio sozinho para o Brasil
em 1924, através do Ministério das Relações Exteriores do Japão como médico bolsista do
Gaimusho para cuidar dos imigrantes japoneses. Ficou cerca de três anos no Rio de
Janeiro/RJ estudando o curso de português e de doenças tropicais para revalidar seu
diploma e poder clinicar no país. Em seguida foi mandado para o Estado de São Paulo, por
volta de 1927, para trabalhar como médico no município de Bastos/SP, atendendo as
famílias dos nipônicos na região e, sobretudo, ajudando no combate das doenças locais
(bicho-de-pé, verminoses, malária, tracoma, tuberculose, etc.) para diminuir o número de
enfermos e de mortes entre os nipo-brasileiros. A dura vida dos colonos nas fazendas de
café e dos pequenos sitiantes na “Boca do Sertão” se apresentava para o nipônico como um
traço efetivamente marcante da sua des-territrorialização, sendo o Brasil um território bem
diferente do lugar de origem o Japão, logo tendo dificuldades com a adaptação em terras
tropicais e muitos adoeciam.
Diante desse contexto, o governo do Japão enviou médicos para atuarem nas
regiões que tivessem a colônia japonesa, em especial para Presidente Prudente/SP,
auxiliando os enfermos nipônicos para que não houvesse a migração de retorno para o
Japão. A família do dr. Tadashi Uchida aterrizou no município de Presidente Prudente/SP
em 1932, vindo de Bastos/SP recém casados, o médico. Ritoji Uchida com sua esposa a
enfermeira Yoshiko Suehiro, ambos funcionários do governo japonês. Antes, porém, em
1931 o sr. Ritoji foi enviado para assumir a assistência à saúde dos imigrantes japoneses na
região da Sorocabana que se estendia de Avaré/SP até Presidente Epitácio/SP. No mesmo
ano, o médico Tadashi nos relatou que, [...] minha mãe ficou em Bastos/SP, lá ela ajudava o
meu avô que era do serviço de saúde do exercito japonês, veio para cá como colono, mas
como tinha prática de enfermagem passou a auxiliar os médicos do Gaimusho (2017).
De modo geral, somente em 1932, que o sr. Ritoji retornou em Bastos/SP, para se
casar com a sra. Yoshiko e fixar residência em Presidente Prudente/SP, dando continuidade
ao trabalho de assistência médica aos imigrantes nipônicos. Esse programa de atendimento
junto às famílias dos imigrantes pelo governo do Japão permaneceu no país até o inicio da
Segunda Guerra Mundial, conforme nos conta Shicasho (S/D), que “quando iniciou a guerra,
foi obrigado a deixar as consultas fora do perímetro da cidade de Presidente Prudente/SP”
(p. 334).

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Chegando em Presidente Prudente/SP, o médico Ritoji em sua residência montou


um consultório no centro da cidade que, posteriormente, viraria uma clínica com salas de
cirurgias e de internações. Nesse ambiente nasceria o filho primogênito o sr. Tadashi Uchida
em 1936. Tal filho é o nosso entrevistado que ficou em Presidente Prudente /SP, na fase da
infância e da adolescência convivendo numa atmosfera de ambulatório, com o pai médico e
a mãe enfermeira. Seu percurso educacional (privado/público) na cidade e fora dela, levou
mais para um deslocamento espacial bilateral entre Presidente Prudente/SP e São
Paulo/SP, como demonstra o sr. Tadashi em depoimento oral,
Fiz o jardim de infância no colégio Cristo Rei quando tinha de 4 a 5 anos, eu
ia lá para brincar, o Cristo Rei era mais ou menos onde está o atual Correio
central agora, ia todo dia levava lanchinho e ia brincar. [...] Depois fiz o
primário na escola Arruda Melo, já o ginásio no Colégio São Paulo que era
particular, ali onde era a ACAE, posteriormente fiz um ano do científico no
IE Fernando Costa. Vi que o estudo era muito fraco aqui. E eu fui para São
Paulo fazer o colegial na escola estadual Presidente Roosevelt no bairro da
Liberdade. Ele era o mais famoso naquele tempo. [...] Quando fiz o colegial
morava na vila Mariana na casa de um conhecido. E fiquei o colegial todo
lá. Depois fui prestar o vestibular, aí sai de lá, e fui morar perto do cursinho
numa pensão de brasileiros ali no Aclimação. [...] Em 1955, acabei entrando
na Faculdade de Medicina de São Paulo - USP indo morar em Pinheiros
(ENTREVISTA: DR. TADASHI UCHIDA, 14/08/17).

Portanto, o sr. Tadashi se formou no curso de medicina em 1961, no mesmo ano que
a sua irmã concluía a graduação em Nutrição na USP, logo em seguida iniciou a
especialização em cirurgia e gastroenterologia no Hospital das Clínicas - USP.
Posteriormente, estagiou cerca de três meses no Instituto de Gastroenterologia Tokio-
Japão. O sr. Tadashi foi para o Japão fazer um estágio em cirurgia sobre endoscopia em
1968. E, posteriormente acabou importando o equipamento de gastrocâmera da marca
Olympus que tirava fotografia de dentro do estomago. E em 1972, o doutor foi de novo e
trouxe outros equipamentos de endoscopia. O período da ditadura para o doutor foi
importante para a importação porque tinha isenções de impostos para produto médicos
(UCHIDA, 2017).
Em 1964, retornou para Presidente Prudente/SP visando administrar e consultar na
clínica da família. Contudo, seu pai o médico Ritoji faleceu em 1942, sendo que a clínica foi
arrendada e, depois, administrada pelo médico Takaoka em nome da família. Seu pai
montou a clínica trabalhou nela cerca de 10 anos e faleceu, posteriormente, por
complicações de diabetes. Ademais, o médico Tadashi comandou a clínica de 1964 a 1984,
porém resolveu fechar a clínica pelos altos custos e dispêndio de tempo, ficando apenas
com o consultório particular e prestando serviços em hospitais como profissional liberal,
atendeu seus pacientes até 2018 quando ocorrera o seu falecimento. Como profissional
liberal Prestou serviços em diversos lugares no município, como: no Hospital Nossa
Senhora das Graças, na Santa Casa, no São Luiz, entre outros como médico particular.
Assim, o sr. Uchida descreve o processo de prestação de serviços da seguinte
forma, “vou como profissional liberal mesmo, eu vou lá e presto o meu serviço, não sou
chamados por eles, ai eu vou lá e levo o meu cliente para atender lá, de certa forma os
hospitais são como se fossem os instrumentos de trabalho da gente” (ENTREVISTA: DR.
TADASHI UCHIDA, 14/08/17). Ademais, na Santa Casa o doutor também prestou serviço
voluntário quando jovem.

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SOUZA, A. A.de. O profissional liberal Nikkei médico: geo-história, mobilidade e técnica. In. Simpósio Nacional de Geografia
da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina
Grande: UFCG, 2021. p.11-20. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com/ ISSN 1980-5829

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Podemos sintetizar que, os três entrevistados médicos acima supracitados, tiveram
múltiplos deslocamentos espaciais no território brasileiro, em especial no Estado de São
Paulo, como estudante e como profissional liberal. Esses deslocamentos fizeram com que
os entrevistados nikkeis alcançassem ascensão social no território prudentino. Nesse
sentido, o médico Sizuvo Iamada de 87 anos era filho de agricultor e fez o ensino rural local,
mas para continuar os estudos entrou em processo de mobilidade espacial realizando
diversos movimentos do ginásio até a universidade, sendo o filho escolhido para se tornar
doutor. Já o médico Tadashi Uchida de 82 anos falecido era filho de médico ligado ao
Ministério de Relações Exteriores do governo japonês, quando jovem urbano realizou a
mobilidade após terminar o ginásio no lugar de origem, indo fazer o colegial/cursinho e a
graduação em São Paulo, por fim fez cursos de especialização no Japão. O médico Neiw
Iamada de 54 anos também era filho de médico, criado no ambiente urbano terminou o
ensino básico (primário, ginásio e colegial) junto aos pais, migrando somente para fazer
cursinho e graduação em medicina no Rio de Janeiro/RJ. Todavia, o médico Sizuvo
juntamente com o pai do médico Tadashi o sr. Ritoji, foram os pioneiros e empreendedores
na medicina prudentina, pois ambos instalaram no município os objetos técnicos como
hospital e como clínicas particulares nos idos da década de 1970. Já o médico Neiw Iamada
e o médico Tadashi Uschida vêm dando prosseguindo as atividades médicas das
respectivas famílias, sendo que o sr. Tadaschi atuava como cirugião e gastroenterologia na
clínica herdada do pai, enquanto o sr. Neiw era obstetra e ginecologista no hospital da
família e dava aula professor universitário na UNOESTE. Contudo, o médico Sizuvo não era
originário de Presidente Prudente/SP, mas escolheu essa cidade para trabalhar,
empreender e morar. Por sua vez, no caso dos médicos o sr. Tadashi e o sr. Neiw ambos
têm Presidente Prudente/SP, como lugar de origem e são filhos da classe média/alta local,
terminaram a faculdade/residência e, paulatinamente, retornaram ao município natal como
médicos para assumir os negócios da família.

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brasileiras. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.21-32. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com.
ISSN 1980-5829

OFERTA DE DISCIPLINAS SOBRE GEOGRAFIA E SAÚDE NAS UNIVERSIDADES


PÚBLICAS BRASILEIRAS

LOFRANO-PORTO, Bruno1
GURGEL, Helen-orientador2
CATÃO, Rafael-orientador3

RESUMO
Nesse trabalho busca-se demonstrar a importância e a capilaridade do ensino de Geografia da Saúde
no nível superior de ensino, bem como entender a realidade do ensino dessa temática nas
universidades públicas do Brasil. A temática de Geografia da Saúde, ou Geografia Médica, termo que
vai eventualmente cair em desuso por conta da evolução epistemológica da disciplina nos anos mais
recentes, é bastante enriquecedora para a formação de geógrafos porque expande as dimensões da
ciência geográfica para a área da saúde que não costuma ser imediatamente associada à análises
geográficas. A pesquisa bibliográfica realizada para a produção desse artigo demostrou várias
potencialidades que o pensamento geográfico oferece para questões de saúde. Por outro lado, os
dados produzidos indicam uma relativa falta de ensino sobre geografia da saúde no Brasil, visto que a
tendência é de que os cursos de Geografia nas universidades públicas não ofertem disciplinas nessa
temática.
Palavras-chave: Geografia da Saúde, Geografia Médica, Ensino.

ABSTRACT
This article intends to show the importance and capillarity of teaching Health Geography at
college/university level, as well as understanding the reality of the teaching of this thematic at public
universities in Brazil. Health Geography, or Medical Geography, such term should eventually fall into
disuse due to the recent epistemological development of this subject, is extremely enriching for
geographers since it expands the limits of the geographical science to the area of health, which is not
commonly associated with geographical analysis. The research conducted to write this paper
showcased numerous benefits for a geographical approach to health issues. On the other hand, the
data generated in this research highlighted a relative lack of health geography teaching in Brazil, since
it is not common for the public universities to offer a Health Geography-related subject.
Key words: Health Geography, Medical Geography, Teaching

INTRODUÇÃO
Em 1984 o Professor de Geografia e Epidemiologia Jonathan Mayer da University
of Washington em Seattle publicou o artigo “Medical Geography: An Emerging discipline”, no
qual ele argumenta justamente que a, então, Geografia Medica, era uma disciplina emergente,
além de demonstrar várias potencialidades e possíveis temáticas de pesquisa, argumentando
principalmente que a Geografia Médica já era utilizada em pesquisas, especialmente
epidemiológicas, mesmo que isso não se desse de forma explícita.
Como Barcellos et al mostram em seu artigo de 2018 “Geografia e Saúde: O que
está em jogo? Histórias, temas e desafios”, não só o termo mais utilizado para a disciplina
mudou, de Geografia Médica para Geografia da Saúde, como o próprio pensamento científico
da área evoluiu consideravelmente. Dentre alguns dos novos estudos na área destacam-se:

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LEFRANO-PORTO, B.; GURGEL, H.; CATÃO, R. Oferta de disciplinas sobre Geogrfia e saúde nas Universidades públicas
brasileiras. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.21-32. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com.
ISSN 1980-5829

os de Jean-Pierre Hervouët sobre as relações entre ambientes e sociedades mostrando o


surgimento de áreas de risco à saúde; os trabalhos de Peter Gould sobre doenças sem um
nicho específico de difusão, principalmente a AIDS, dentre outros. Esse mesmo texto traz que:
A geografia da saúde procura compreender o contexto em que ocorrem os
problemas de saúde, para poder atuar sobre territórios, não sobre os
indivíduos, nem sobre organismos. Diferente de outras disciplinas, a
geografia busca uma perspectiva macroscópica dos problemas de saúde,
permitindo compreender a dinâmica do processo saúde-doença e de doença-
atenção à saúde. A diversidade de temas da geografia da saúde é também
resultado dos diversos campos de atuação da Saúde Coletiva, que reúne as
ações de vigilância de doenças e seus determinantes, a atenção e
organização dos serviços de saúde, e a promoção de saúde, esta última de
desenvolvimento relativamente recente. Estudar estes problemas requer uma
visão ampliada de saúde, que abarque desde a prevenção de doenças até o
acesso a serviços de saúde, isto é, reconhecendo a inseparabilidade do
processo de saúde-doença-atenção.(Barcellos et al, 2018.)

Portanto, A Geografia da Saúde é uma disciplina que já evoluiu muito desde sua
condição de “emergente” e, é hoje amplamente utilizada no âmbito das tomadas de decisões
públicas e nos estudos de atenção e de prevenção de doenças, exemplos claros disso são os
boletins epidemiológicos disponibilizados pelo ministério da saúde que atualmente sempre
possuem mapas, tabelas de distribuição espacial e outros dados amplamente utilizados na
Geografia da Saúde. O volume 52 de janeiro de 2021, por exemplo, apresenta um mapa de
casos confirmados de sarampo por estado brasileiro e uma tabela de casos confirmados e
óbitos distribuídos por cada estado. Porém, no Brasil ainda há, nas universidades públicas,
uma considerável falta de disciplinas na área.

METODOLOGIA
Dado o objetivo do presente artigo de demonstrar a importância do ensino de
Geografia da Saúde e compreender a realidade dessa temática no Brasil, a pesquisa foi
dividida em múltiplas fases.
A primeira foi o levantamento de todos os cursos de Geografia das universidades
públicas brasileiras. Esse levantamento foi feito a partir do portal e-MEC. Então foi elaborado
um mapa com a distribuição estadual de todos esses cursos catalogados.
Posteriormente, foi elaborado um formulário eletrônico sobre a oferta de disciplinas
na temática de Geografia da Saúde que foi enviado para os coordenadores dos cursos de
geografia de universidades públicas brasileiras via e-mail, durante o período de junho e julho
de 2020. O nome dos coordenadores foi obtido através do portal e-MEC, a partir disso buscou-
se o contato destes por duas vias principais, o site da instituição ou publicações encontradas
no currículo Lattes do professor ou da professora. O link para o formulário foi enviado para
mais de 350 coordenadores de cursos de Geografia. O formulário continha dezenove
perguntas, algumas com respostas fechadas outras com respostas abertas e buscava
entender se o curso de Geografia coordenado pelo respondente ofertava ou não alguma
disciplina na temática de Geografia da Saúde e, em casos positivos, quais as características
da oferta e da disciplina em si. A partir dos dados obtidos, foi produzido um mapa com a
distribuição estadual dos cursos com oferta de pelo menos uma disciplina na temática de
Geografia da Saúde, bem como vários gráficos para demonstrar algumas das repostas

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LEFRANO-PORTO, B.; GURGEL, H.; CATÃO, R. Oferta de disciplinas sobre Geogrfia e saúde nas Universidades públicas
brasileiras. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.21-32. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com.
ISSN 1980-5829

obtidas. Todos os mapas foram confeccionados pelo SIG QGIS em sua versão 3.8 Zanzibar
e os gráficos pelo Excel.
Em seguida, foi realizada uma revisão bibliográfica de textos na área de Geografia
da Saúde para ajudar na compreensão dessa área de pesquisa e sua realidade no Brasil. Por
fim, foram elaboradas e enviadas cinco perguntas abertas para professores da área da saúde
com o intuito de compreender um pouco do escopo da Geografia da Saúde no nível de ensino
superior. Essas perguntas foram enviadas para quase todos os professores de disciplinas de
epidemiologia da Universidade de Brasília (UnB). Essa universidade foi escolhida por
questões de praticidade, já que, por ser aluno dessa universidade o autor desse artigo teve
fácil acesso à oferta de disciplinas e contato dos professores.

RESULTADOS
Foi encontrado um total de 354 cursos de Geografia disponíveis em universidades
públicas brasileiras em junho de 2020, distribuídos espacialmente pelas unidades federativas
brasileiras da seguinte forma (figura 1):

Figura 1. Distribuição dos cursos de Geografia no Brasil.

Espirito Santo, Rondônia e Tocantins foram os estados que apresentaram o menor


número de cursos, com apenas três cursos à disposição nesses estados. O Pará foi o estado

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LEFRANO-PORTO, B.; GURGEL, H.; CATÃO, R. Oferta de disciplinas sobre Geogrfia e saúde nas Universidades públicas
brasileiras. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.21-32. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com.
ISSN 1980-5829

com maior número de cursos ofertados, com 32, seguido de perto pela Bahia, que teve 30
cursos ofertados.
O questionário elaborado foi enviado para mais de 350 coordenadores de cursos
de Geografia de universidades públicas brasileiras e foram obtidas 95 respostas (27%). Os
participantes dessa pesquisa estão distribuídos por praticamente todas as unidades
federativas do Brasil, sendo o Acre o único estado do qual não foi obtida nenhuma resposta
ao questionário on-line. Os resultados detalhados desse levantamento também foram
divulgados publicamente e podem ser acessados no site do Laboratório de Geografia,
Ambiente e Saúde (LAGAS) da Universidade de Brasília (UnB), ou diretamente pela seguinte
URL: lagas.unb.br/index.php/disciplina-geografia-da-saude-no-brasil.
Dentre as 95 respostas, 37 (38.9%) afirmaram que sim, o curso oferta pelo menos
uma disciplina na temática de Geografia da Saúde (figura 2). Apenas um coordenador de
curso informou oferta de mais de uma disciplina de Geografia da Saúde. Pois, o curso, ABI
(área Básica de Ingresso, são cursos que não possuem diferenciação de bacharelado ou
licenciatura no ingresso), da UFSP, que apresentou oferta de duas disciplinas. Assim, entre
95 cursos, tem-se a oferta de 38 disciplinas na temática de Geografia da Saúde. O mapa a
seguir (figura 2) mostra a distribuição estadual dos cursos que ofertam pelo menos uma
disciplina na temática de Geografia da Saúde, de acordo com o levantamento realizado.
Destaca-se o estado do Rio Grande do Norte que tem a oferta em 4 cursos de geografia.

Figura 2. Distribuição dos cursos que ofertam pelo menos uma disciplina
na temática de Geografia da Saúde

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LEFRANO-PORTO, B.; GURGEL, H.; CATÃO, R. Oferta de disciplinas sobre Geogrfia e saúde nas Universidades públicas
brasileiras. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.21-32. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com.
ISSN 1980-5829

As perguntas seguintes do questionário foram direcionadas a compreender as


características da oferta das disciplinas de Geografia da Saúde. Primeiramente, quanto ao
próprio nome das disciplinas. Em síntese, foi interessante notar que: 26 disciplinas se
chamam, justamente, “Geografia da Saúde”; 4 possuem a palavra “ambiente” no nome; 2
ainda utilizam o termo “Geografia Médica”; um outro nome que chamou muita atenção foi
“Geografia da Saúde e Geologia Médica”.
Quanto ao tipo de disciplina (figura 3), ou seja, a obrigatoriedade ou não de cursar
a disciplina para completar o curso, identificou-se que a grande maioria das disciplinas era de
caráter optativo, 29 disciplinas (76.3%), 8 eram de caráter obrigatório (21%) e ainda foi
registrada uma disciplina que havia sido criada em caráter experimental para atender às
demandas de discussão a respeito da pandemia de COVID-19.

Figura 3. Tipo de disciplina

Em relação à carga horária das disciplinas (figura 4), observou-se que 23


disciplinas possuem uma carga horária de 60h (60%); 9 disciplinas possuem carga horária
acima de 60h (23.6%), sendo que a maior carga registrada, que foi registrada em dois casos,
foi de 75h; 2 disciplinas apresentam carga entre 30h e 60h (5.2%); 4 disciplinas possuem
carga de 30h (11.2%).

Figura 4. Carga horária das disciplinas

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LEFRANO-PORTO, B.; GURGEL, H.; CATÃO, R. Oferta de disciplinas sobre Geogrfia e saúde nas Universidades públicas
brasileiras. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.21-32. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com.
ISSN 1980-5829

Com respeito à frequência de oferta (figura 5), observou-se que é comum que a
oferta se dê de forma anual ou a cada dois anos; apenas duas disciplinas são ofertadas de
forma semestral. Outras duas disciplinas são ofertadas esporadicamente, e 4 disciplinas
possuem oferta irregular, baseada na demanda.

Figura 5. Frequência de oferta

Por fim, outras informações para caracterização das disciplinas são as seguintes: 34
disciplinas são ofertadas de forma presencial, apenas 3 são ofertadas na modalidade à
distância; quase metade das disciplinas obrigatórias possuem carga horária abaixo de 34h;
Apenas duas disciplinas, dentre as obrigatórias, possuem oferta semestral, outras duas
possuem oferta baseada na demanda.
Dentre os 10 e-mails enviados para professores de disciplinas de epidemiologia da
Universidade de Brasília, obteve-se apenas duas respostas. Um professor informou que
leciona as disciplinas de “Epidemiologia Aplicada à Educação Física” na graduação e
“Epidemiologia e Atividade Física na Promoção de Saúde” na Pós-Graduação, o outro mestra
as disciplinas “informação e informática em saúde 2” e “epidemiologia analítica”. Os relatos
apresentados por esses professores corroboram a tese de que a Geografia da Saúde é uma
área do conhecimento já muito utilizada, dentro da área da saúde, porém não de forma
institucionalizada, ou “consciente”. Um professor diz
“Em ambas [as disciplinas] eu utilizo mapas com distribuição (normalmente
de prevalências) de doenças ou de características sócio-demográficas, de
condições clínicas ou de fatores de risco para doenças com alta prevalência.
Em particular, são muito comuns mapas que apresentam distribuição do nível
de atividade física na população e também mapas de equalização de
densidade (density-equalizing maps), que começam a ser muito comuns na
apresentação de dados do nível de atividade física da população mundial em

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LEFRANO-PORTO, B.; GURGEL, H.; CATÃO, R. Oferta de disciplinas sobre Geogrfia e saúde nas Universidades públicas
brasileiras. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.21-32. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com.
ISSN 1980-5829

associação com outra variável, como a renda ou a quantidade de programas


de intervenção existentes em cada país”

Além disso, um dos respondentes faz uma conexão entre fatores Geográficos e a
prática de atividade física (saúde preventiva):
“Ao apresentar o conteúdo da disciplina eu usualmente me reporto às três
questões básicas da epidemiologia: quem, quando e onde. Nesta abordagem,
eu apresento desfechos que têm conhecidos determinantes ligados a fatores
geográficos e ambientais. Essas duas questões são bem identificadas no
nível de atividade física da população, que sobre influência de questões
territoriais e climáticas, como áreas e períodos do ano que favorecem mais
ou menos à prática de atividades físicas. Essas relações são bem exploradas
nas disciplinas”

Ambos os respondentes comentaram que um tópico de análise em suas aulas é a


relação entre fatores ambientais e agravos de saúde, em um caso esses agravos foram
doenças e no outro a limitação da prática de atividade física.
Os professores ressaltam a importância do estudo da Geografia para a Saúde, um
inclusive comenta já ter trabalhado na produção de mapas de distribuição espacial de
indicadores de demanda e gravidade de doenças e até oferece suplementos na nota para
alunos que façam um curso sobre QGIS específico.
As duas respostas ressaltaram os benefícios que uma disciplina na temática de
geografia da saúde pode trazer para seus alunos, um deles comenta:
“tendo em vista que muitas questões em saúde são afetadas por questões
geográficas, tanto nos temas mais afeitos à geografia física, quanto àqueles
ligados à geografia humana. Seria interessante que [uma disciplina sobre
Geografia da Saúde] fosse optativa para todos os cursos da saúde da UnB”

Para finalizar, gostaríamos de ressaltar o seguinte comentário feito por um dos


respondentes:
“Até pouco tempo eu não tinha conhecimento da existência desta disciplina
[Geografia, Ambiente e Saúde, ofertada pelo departamento de geografia da
UnB] na UnB, assim como não havia focado minha atenção nas
possibilidades de interação entre a geografia da saúde e minha área de
atuação, a despeito de saber do impacto de inúmeras questões ligadas à
geografia, tanto física quanto humana, na saúde humana. Seria interessante
uma maior divulgação da área e da disciplina”

A IMPORTÂNCIA DA GEOGRAFIA DA SAÚDE NO BRASIL


Apesar da Geografia Médica já existir, provavelmente, desde 1792 (BARCELLOS,
et al. 2018), ela só começa a aparecer no Brasil em meados do século XX, com as
contribuições do médico Josué de Castro que fez doutorado em geografia humana. Seus
estudos sobre a subnutrição e fome demonstraram que há um caráter geográfico e geopolítico
na manifestação de doenças, e foram uma espécie de primeiro passo para o desenvolvimento
da geografia da saúde no Brasil (MENDONÇA et al. 2014). Esses mesmos autores ainda
apontam lentidão na disseminação de visões mais amplas para saúde, dentro dos sistemas
de saúde brasileiros, mas podemos observar o aumento das intenções de pesquisa em

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LEFRANO-PORTO, B.; GURGEL, H.; CATÃO, R. Oferta de disciplinas sobre Geogrfia e saúde nas Universidades públicas
brasileiras. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.21-32. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com.
ISSN 1980-5829

geografia da saúde no Brasil por meio do levantamento feito pelo laboratório LAGAS-UnB,
que mostrou a criação de pelo menos 21 novos grupos de pesquisa em Geografia da Saúde
desde a publicação desse artigo em 2014. Portanto a Geografia da Saúde no Brasil está em
estágio de franco desenvolvimento e pode-se dizer que é uma temática estabelecida e de
reconhecimento considerável (GURGEL e BELLE, 2020), pelo menos dentro do meio
acadêmico. A figura 6, abaixo, foi produzida com base no artigo de BARCELLOS, et al. 2018
e mostra algumas importantes contribuições em teorias de geografia da saúde ao longo dos
anos.

Figura 6. Linha do tempo de contribuições para geografia da saúde

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LEFRANO-PORTO, B.; GURGEL, H.; CATÃO, R. Oferta de disciplinas sobre Geogrfia e saúde nas Universidades públicas
brasileiras. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.21-32. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com.
ISSN 1980-5829

Por volta de 1970, observou-se a mudança de nome, de geografia médica para


geografia da saúde, isso se deu por conta da evolução das pesquisas, que mudaram o foco
da análise geográfica, passaram a entender saúde de forma mais holística, e deixaram de
analisar apenas a doença (MENDONÇA et al. 2014). No Brasil, esse movimento foi também
muito forte, nas décadas de 1970 e 1980, a corrente crítica brasileira deu um certo “boom” no
desenvolvimento da geografia da saúde nacional principalmente com análises de questões
de saúde decorrentes da atividade capitalista (MENDONÇA et al. 2014).
Além disso, a criação do SUS e a preocupação com a saúde coletiva tiveram e
seguem tendo importante papel no desenvolvimento e importância da Geografia da Saúde no
Brasil. São múltiplos os estudos de avaliação de efetividade de atendimento ou estudos de
vigilância epidemiológica no território brasileiro, dentre diversos outros subtemas da Geografia
da Saúde, disponíveis hoje, muitos, inclusive, com contribuições de autores estrangeiros.
Atualmente, percebe-se que existe uma tentativa de expansão de pesquisas na
área de Geografia da Saúde, tanto por parte das universidades como por partes de instituições
dedicadas à pesquisa como a Fundação Oswaldo Cruz que, de acordo com levantamento do
Laboratório de Geografia, Ambiente e Saúde (LAGAS-UnB), possui três grupos de pesquisa
dedicados à Geografia e Saúde e sita no seu site temas de pesquisa como “políticas públicas
para saúde em territórios” e “ambiente, ecologia e saúde”. Consulta realizada utilizando os
termos “geografia” e “saúde” na base de dados Scielo resultou em 583 artigos, sendo 373
publicados desde 2010, além disso, a base informa que 349 foram publicados no Brasil. A
mesma consulta com os termos em inglês (“geography” e “health”) em uma das maiores bases
bibliográficas da área da saúde (pubmed/medline, na National Library of Medicine dos Estados
Unidos) resultou em 24.337 artigos, sendo o primeiro registro no ano de 1.857, praticamente
90% deles publicados a partir de 2000. Sendo que quase 80% do ano de 2010 em diante, o
que mostra o crescimento de publicação na área nos anos mais recentes. Porém, é
compreensível que a importância da Geografia da Saúde tenha tendência de ser notada
somente pelas pessoas que atuam nessas pesquisas, por conta da baixa divulgação e
institucionalização dessa temática. Geógrafos fora desse nicho e pessoas da área da Saúde
tendem a não perceber a importância da Geografia da Saúde, ainda que muitas vezes utilizem
conhecimentos dessa ciência de forma inconsciente.

O ENSINO DE GEOGRAFIA DA SAÚDE NO BRASIL


Primeiramente, é importante ressaltar que essa análise foi feita com base em
dados da amostra de respondentes e não do total da população pretendida. Como foi citado,
nem todos os cursos de Geografia ofertados no Brasil responderam à pesquisa. No total, um
quarto dos cursos disponíveis, segundo o MEC, responderam ao questionário. Os dados
obtidos, apesar de não caracterizarem uma amostra aleatória, não possuem nenhum fator
que afete a validade dos mesmos visto que todos foram igualmente convidados a participar e
todas respostas foram incluídas. Há que se admitir a possibilidade de viés de participação,
visto que os coordenadores de curso que possuem alguma disciplina de Geografia da Saúde
poderiam ser mais propensos a responder o questionário do que os coordenadores de cursos
que não tem ligação com essas disciplinas. Entretanto, esta possibilidade provavelmente não
afetou demasiadamente a participação, uma vez que menos de 30% dos respondentes
afirmaram que o curso oferta alguma disciplina do tipo. É também interessante lembrar que
não houve respostas oriundas de todas as unidades da federação. Além do Acre não ter

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LEFRANO-PORTO, B.; GURGEL, H.; CATÃO, R. Oferta de disciplinas sobre Geogrfia e saúde nas Universidades públicas
brasileiras. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.21-32. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com.
ISSN 1980-5829

retornado nenhuma resposta, houve estados que apresentaram apenas um respondente.


Dessa forma, as próximas análises serão feitas a partir de uma escala mais abrangente,
considerando o Brasil como unidade de análise.
Como citado anteriormente, dentre as respostas recebidas, 37 de um total de 95
coordenadores responderam que o curso possui pelo menos uma disciplina na temática de
Geografia da Saúde. Assim, de modo aproximado e extrapolando nossos dados para todo o
território nacional, é plausível estimar que deva existir cerca de 40% dos cursos de geografia
no cenário nacional que contemplem esta temática em disciplinas. Considerando essa
hipótese, deve haver no Brasil algo entre 140 e 150 cursos de Geografia com disciplinas na
temática de Geografia da Saúde.
Então, mesmo com a importância que a Geografia da Saúde tem hoje no âmbito
das decisões públicas, e dentro da academia, ainda há uma considerável lacuna no ensino
dessa subárea da Ciência Geográfica.
É notório também que, dentro do contexto do ensino superior em nível de
graduação, a Geografia da Saúde tende a ter mais importância para o Bacharelado do que
para a Licenciatura, já que é mais comum os formandos licenciados trabalharem ao nível de
ensino básico e médico, onde a Geografia da Saúde talvez seja considerada menos relevante,
até por não ser contemplada na Base Nacional Comum Curricular, ainda que existem vários
benefícios ao ensino de Geografia da Saúde no ensino médico, como mostram PASTORIZA
e SILVA (2014) no texto “O Ensino Interdisciplinar do Tema Dengue: Uma Proposta para a
Geografia” e SOARES e BEZERRA (2019) em “Saúde urbana no ensino de geografia: um
relato de experiência no município de Olinda, Brasil”. Ainda assim, um bom número de cursos
que ofertem disciplinas nessa temática seria algo em torno de 250, ou mais, já que ainda é
muito interessante pelo menos a opção dessa disciplina mesmo para cursos de licenciatura.
Os resultados desse estudo mostram que a Geografia da Saúde ainda é pouco
disseminada, assim, há um grande campo para a expansão dessa temática, em especial
através da rede de ensino. Apesar dos conhecimentos desse campo já serem utilizados,
poucos ainda o relacionam com a geografia e a potencialidade que se teria em fazer parceria
com essa ciência. Nesse contexto, para que a Geografia da Saúde seja mais disseminada,
recomenda-se o fortalecimento dos grupos de pesquisa, assim como uma maior publicização
dos congressos e conferências e que a disciplina seja institucionalizada nos cursos de
geografia.
Ressalta-se que os temas da Geografia da Saúde tendem a ser abordados e
discutidos em outras disciplinas dos cursos, tanto de Geografia como da área da Saúde. Deste
modo, o ensino de Geografia da Saúde já pode estar um pouco melhor institucionalizado do
que esses números sugerem. Ou seja, é bastante provável que os alunos de Geografia, por
exemplo, estudem técnicas, trabalhos ou temas relacionados à Geografia da Saúde dentro de
outras disciplinas, tais como, disciplinas sobre cartografia, geoprocessamento, climatologia,
planejamento urbano, geografia agrária, dentre várias outras.
Um último comentário, apesar do levantamento realizado sobre disciplinas de
Geografia da Saúde não ter obtido dados do estado do Acre, vale mencionar que um estudo
de 2014 teve justamente como objetivo a avaliação do ensino de Geografia da Saúde no Acre.
A conclusão foi de que não havia nenhuma disciplina nessa temática nos cursos de
bacharelado e licenciatura em Geografia na Universidade Federal do Acre (UFAC), além
disso, pouquíssimos alunos entrevistados já tinham ouvido falar sobre Geografia da Saúde.
O estudo fez a divulgação da temática e promoveu um minicurso (DE FARIAS, 2014). Isso é

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LEFRANO-PORTO, B.; GURGEL, H.; CATÃO, R. Oferta de disciplinas sobre Geogrfia e saúde nas Universidades públicas
brasileiras. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.21-32. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com.
ISSN 1980-5829

bastante significativo já esses dois cursos analisados no estudo representam 66% dos cursos
de geografia do estado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os levantamentos realizados, bem como as entrevistas feitas, sugerem que a
Geografia da Saúde, área de pesquisa dentro da Ciência Geográfica já está francamente
estabelecida no Brasil e tem sua importância evidenciada no âmbito acadêmico e da saúde
pública e coletiva. Entretanto, carece de disciplinas específicas nos cursos de geografia das
universidades públicas brasileiras. Dessa forma, recomenda-se uma maior divulgação da
temática junto aos formadores dos futuros geógrafos e professores de geografia brasileiros, a
fim de institucionalizar a Geografia da Saúde, através da oferta de disciplinas, de modo a
consolida-la como área de pensamento e pesquisa específica da Geografia no Brasil.

AGRADECIMENTOS
O presente trabalho foi realizado com apoio do CNPq través do financiamento de bolsa
PIBIC; do Laboratório Misto Internacional | LMI-Sentinela em parceria entre o IRD-UnB-
Fiocruz e do Laboratório de Geografia, Ambiente e Saúde (LAGAS) da UnB.

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brasileiras. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
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SIMON, C.R.; BORSOI, B.F.G. Por uma geografia para todas as saúdes: feminismo como direção para a promoção
da saúde. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.33-44. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

POR UMA GEOGRAFIA PARA TODAS AS SAÚDES:


FEMINISMO COMO DIREÇÃO PARA A PROMOÇÃO DA SAÚDE

SIMON, Carolina Russo1


BORSOI, Bruna Fernandez Guimarães2

RESUMO

Este trabalho é fruto de discussões e aprendizados de duas pesquisadoras e de suas


análises geográficas feministas. Tivemos como objetivo, discutir como a ciência
geográfica, principalmente na área da saúde, necessita utilizar de metodologias
feministas para compreender as iniquidades sociais, bem como os determinantes de
saúdes, pois é a partir do olhar dessas teorias, como o conceito de interseccionalidade,
que será passível de compreender todas as formas de opressão-dominação existentes
nas sociedades, pois é o alicerce do sistema patriarcal-capitalista-racista que determina
desigualdades nos sujeitos sociais. Entendendo que para promovermos saúdes
necessitamos dos feminismos, como luta, movimento social e metodologia, para que
seja possível atingir o objetivo na busca de uma sociedade mais igualitária. Para isso,
foram utilizados relatos orais de entrevistas e grupos focais realizadas pelas autoras nos
trabalhos de monografia e dissertação de mestrado; o que contribui para a análise da
interseccionalidades existentes entre as diferenças e semelhanças nas produções
acadêmicas em que uma Geografia para a Saúde Feminista pode oferecer.

Palavras-chave: corporeidades, interseccionalidade, contexto, iniquidades.

ABSTRACT

This work is the result of discussions and learning from two researchers and their feminist
geographical analyzes. Our objective was to discuss how geographic science, especially
in the area of health, needs to use feminist methodologies to understand social
inequities, as well as the determinants of health, as it is from the perspective of these
theories, such as the concept of intersectionality, that it will be possible to understand all
forms of oppression-domination existing in societies, since it is the foundation of the
patriarchal-capitalist-racist system that determines inequalities in social subjects.
Understanding that to promote health we need feminisms, such as struggle, social
movement and methodology, so that it is possible to fulfill the objective in the search for
a more egalitarian society. For this, oral reports of interviews and focus groups carried
out by the authors in the monograph and master's dissertation work were used; which
1
Doutoranda em Geografia, Mestra e Licenciada em Geografia, FCT UNESP- Presidente
Prudente, carolina.simon@unesp.br.
2
Mestranda em Geografia, Bacharel em Geografia, FCT UNESP- Presidente Prudente,
bruna.borsoi@unesp.br

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SIMON, C.R.; BORSOI, B.F.G. Por uma geografia para todas as saúdes: feminismo como direção para a promoção
da saúde. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.33-44. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

contributes to the analysis of the intersectionalities existing between the differences and
similarities in academic productions that a Geography for Feminist Health can offer.

Keywords: corporeality, intersectionality, context, inequities.

INTRODUÇÃO

A Geografia da Saúde latino-americana tem avançado cada vez mais nas


análises espaciais de iniquidades de saúde e a relação entre a saúde e a promoção da
vida. A partir das muitas contribuições do campo das Geografias Feministas e das
Sexualidades, conseguimos avançar nas análises para o entendimento das condições
de saúde e doença numa perspectiva coletiva, através das vivências de diversas
corporalidades. De forma que, “a Geografia acompanhou a tendência e deslocou o
conceito de doença para o de saúde, compreendida como um estado de bem-estar
completo, físico, mental e social e não simplesmente marcado pela presença da
enfermidade” (GUIMARÃES, 2015, p. 32).
Este texto foi produzido por duas mulheres jovens, militantes feministas, que
compartilham há mais de oito anos uma amizade e, também, parceria na produção de
pesquisas preocupadas com a melhoria da qualidade de vida, de mulheres latino-
americanas, dentro do Laboratório de Biogeografia e Geografia da Saúde (BIOGEOS).
Com o caminhar das nossas pesquisas, individuais e coletivas, identificamos a
centralidade do conceito de contexto e da potência que as análises interseccionais de
opressão e dominação nas pesquisas acerca das iniquidades em saúde, bem como, a
necessidade de aprimorar as técnicas e metodologias de pesquisa qualitativa,
especificamente sobre grupos focais e relatos orais, para compreender como a saúde e
a doença se manifestam nos diferentes corpos, produzindo “uma geografia que tem o
lugar de cada um como ponto de partida para olhar o mundo” (GUIMARÃES, 2015,
p.42).
Desta forma, o objetivo maior deste texto é demonstrar como os feminismos
promovem a saúde e como a Geografia da Saúde pode e deve contribuir na construção
de uma sociedade radicalmente diferente da sociedade classista, mas, principalmente
patriarcal e racista, através da operacionalidade do conceito de interseccionalidade em
suas análises de contexto de iniquidades. Para exemplificar a potência do feminismo
que operaciona o conceito de interseccionalidade para compreender os contextos,
trazemos para fomentar o debate as falas das entrevistas da monografia BORSOI
(2018) e da dissertação de SIMON (2020).
Este artigo foi estruturado inicialmente pela Introdução, seguida de dois
tópicos: Interseccionalidade como análise de iniquidades em saúde; Feminismos
e a promoção da saúde – que abordam e aprofundam o debate de forma organizada
e sistematizada a partir do objetivo central do artigo, contando também com as
Considerações Finais, Agradecimentos e Referências Bibliográficas.

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SIMON, C.R.; BORSOI, B.F.G. Por uma geografia para todas as saúdes: feminismo como direção para a promoção
da saúde. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.33-44. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

INTERSECCIONALIDADE COMO ANÁLISE DE INIQUIDADES EM SAÚDE

“Será que estamos visibilizando em nossos territórios de estudo com


a suficiente claridade o quê ou quem provocam os padrões de
distribuição de doenças e morte, e suas mudanças, o quê ou quem
determina os processos que melhoram a saúde, e reduzem as
iniquidades?” (Luiza ROJAS, 2019, p.24)

As iniquidades em saúde vividas por diferentes pessoas são as


desigualdades de saúde que, além de sistemáticas e relevantes são, também, evitáveis,
injustas e desnecessárias, segundo Margareth Whitehead (1992). Desta forma, o termo
iniquidade tem uma dimensão ética e social. Porém, as preocupações dos geógrafos e
das geógrafas para com as iniquidades em saúde são relativamente recentes, cerca de
30 anos (DUTRA, 2011).
Estas análises foram (e ainda são) muito impulsionadas pelas contribuições
da Geografia Crítica, principalmente do Professor Milton Santos (ROJAS, 2003) e,
também, dos estudos de epidemiólogos latino-americanos como Breilh (2007), a partir
da teoria da determinação social da saúde, onde se propõem a diferenciação entre
determinação da saúde e determinante da saúde (GUIMARÃES, 2019).
Segundo Guimarães, Pickenhayn e Lima, para promovermos a saúde “é
preciso, então intervir sobre os determinantes de saúde” (2014, p.83) os quais se
marcam como determinados por modos sequentes de condições socioeconômicas,
culturais, ambientais, redes sociais e comunitárias, estilo de vida dos indivíduos, idade,
sexo e fatores hereditários - os contextos nos quais as sujeitas e sujeitos experienciam
o espaço. Segundo os mesmo autores, na Geografia da saúde temos duas
“preocupações”: a episteme e o método, “mas o sentido maior é o contexto operacional
que justifica a ciência em ação” (GUIMARÃES, PICKENHAYN E LIMA, 2014, p.125).
Desta forma, o conceito de contexto tem sido amplamente utilizado, porém
ainda tem sido pouco definido, segundo a geógrafa cubana Luiza Rojas (2019), “o
contexto é chave para entender e andar na Geografia, se interna no complexo, na
procura de totalidades, que incluem as várias escalas e, no nosso caso, os vários
recortes que podem abranger” (ROJAS, 2019, p.17). Desta forma, o contexto serve para
buscar “uma perspectiva macroscópica dos problemas de saúde, permitindo
compreender a dinâmica do processo saúde-doença e de doença-atenção à saúde”
(BARCELLOS, BUZAI e HANDSCHUMACHER, 2018, p.09).
Milton Santos (1996), em sua concepção de espaço enquanto um conjunto
indissociável de sistemas de objetos e sistemas de ação, a base da perspectiva
macroscópica dos contextos nos trabalhos de Geógrafos e epidemiologistas
(CZERESNIA e RIBEIRO, 2000) afirma que “é sempre por sua corporeidade que o
homem participa do processo de ação” (Milton Santos, 1996, p. 65). E, realmente, a
corporeidade masculina, principalmente branca, é um traço de opressão histórica para
os corpos não masculinos.
Quando olhamos a estrutura patriarcal que gestou nossa formação
socioespacial capitalista, é perceptível que o homem tem o poder apenas pelo fato de
ser homem (SAFFIOTTI, 1987). Logo, é necessário compreender que apesar dos
avanços teóricos e metodológicos acerca dos contextos da falta de acesso a serviço de

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SIMON, C.R.; BORSOI, B.F.G. Por uma geografia para todas as saúdes: feminismo como direção para a promoção
da saúde. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.33-44. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

saúde pelas classes menos abastadas das sociedades latinas, a classe tem corpos, que
vivenciam as opressões e dominações por avenidas identitárias diversas, como classe,
gênero, raça, sexualidade, idade, religião e etc3. Para superarmos esses determinantes,
devemos ter o olhar a partir de um posicionamento fundamentado em uma Geografia
da Saúde Feminista, pois só assim poderemos lutar efetivamente contra o sistema-
patriarcal-capitalista-racista causador das mazelas atuais, (SAFFIOTI, 1969) o qual vem
negando os diversos sentidos coletivos da saúde.
A geógrafa feminista Doreen Massey (2008, p. 29), ainda pouco conhecida
e pouca utilizada nos estudos que remetem ao campo da geografia da Saúde brasileira,
convida-nos a imaginar o espaço como “simultaneidade de estórias-até-agora”. Sendo
o espaço plural, aberto e relacional, num constante processo de devir: não se encontra
fechado em si mesmo. Assim, a generificação e racialização do espaço refletem no
modo como gênero e raça são construídos e compreendidos na sociedade (MASSEY,
1994, 2008). Desta forma, descortina-se a potencialidade do conceito de
interseccionalidade para compreender como as iniquidades espaciais em saúde
brasileiras como produtos injustos, pautados principalmente na diferença corporal fruto
da formação socioespacial brasileira.
A interseccionalidade é um conceito que vem sendo trabalhado há muitos
anos, principalmente por mulheres feministas negras intelectuais (acadêmicas e
militantes), para demonstrar que não há hierarquia de opressões, a classe não é uma
opressão maior que o sexismo e o racismo. Assim, a partir da experiência de se viver o
espaço com um corpo marcado pela opressão-dominação patriarcal e racista, as
mulheres negras têm produzido potentes teorias que nos mostram que ainda hoje, elas
são as outras das outras. Sendo imprescindível olhar para o corpo delas, pois é quando
“Mulheres, Raça e Classe” se entrecruzam, como trabalhado no livro de Angela Davis
em 1981.
O conceito de interseccionalidade foi cunhado somente em 1989 por
Kimberlé Crenshaw, uma jurista professora da University Columbia, que correlaciona às
consequências estruturais com eixos de subordinação. A interseccionalidade proposta
por Crenshaw nos convida a pensar as avenidas identitárias dos corpos de forma
metafórica, onde eixos de poder se estruturam em grandes avenidas percorridas ao
longo da vida, que estruturam áreas sociais, econômicas e políticas. Segundo a autora,
“ a interseccionalidade trata da forma como ações e políticas específicas geram
opressões que fluem ao longo de tais eixos, constituindo aspectos dinâmicos ou ativos
do desempoderamento (CRENSHAW, 2002, p. 117).
Especificamente na Geografia, temos como referência o artigo “Theorizing
and researching intersectionality: a challenge for feminist geography” de Gill Valentine,
que demonstra que o espaço, objeto geográfico, é o elemento fundamental para as
interseccionalidades de opressão, e que, a potência da Geografia em operacionalizar
esse conceito é tão grande que as demais ciências sociais devem considerar a
dimensão espacial da interseccionalidade (SILVA e SILVA, 2011).
A dissertação de mestrado de Simon (2020) demonstrou, a partir dos relatos
orais de 12 mulheres camponesas, no Brasil e na Argentina, como a luta pela terra e

3
O uso do ‘etc.’ reflete a possibilidade de situações interseccionais que são impossíveis de
nomear, como argumenta Platero (2012).

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SIMON, C.R.; BORSOI, B.F.G. Por uma geografia para todas as saúdes: feminismo como direção para a promoção
da saúde. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.33-44. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

pela água, fomentada pela Via Campesina, abarca bandeiras de lutas interseccionais.
A luta de caráter internacional culminou na produção de contraespaços, a partir das
materializações das práticas de saúde feministas dentro dos movimentos camponeses.
Como se pode ver abaixo, as mulheres entrevistadas trazem nitidamente em suas falas
os reflexos das lutas contra o sistema de opressão que além de capitalista também é
patriarcal:

"o mais concreto e cotidiano de todos os dias, qualquer situação


daqueles em estado de crise as primeiras afetadas são as mulheres"
(Entrevistada M. Mendoza- ARG, 2018- tradução da autora)

O patriarcado é um sistema de opressão com idade superior há 5.000 anos,


sendo datado no período do neolítico, onde, a partir da divisão sexual do trabalho,
iniciada pelo sedentarismo humano, foi feito “um contrato entre homens, cujo objeto são
as mulheres” (SAFFIOTI, 2004, p. 57). O fato de viver em uma sociedade que se
estrutura em práticas de poder que institui os homens como superiores das mulheres
está diretamente relacionado às práticas culturalmente desenvolvidas pela divisão de
gênero masculino e feminino. Está no seio da família – primeiramente através da figura
do pai, e posteriormente do marido - mas atravessa a sociedade como um todo
(SAFFIOTI, 2004; 2015). Sendo assim, as formas de opressão-dominação ocorrem de
diversas formas nos corpos de diversas mulheres, seja das mais ‘sutis’ até as mais
violentas, como pode ser identificado nas falas de diversas entrevistadas, e ainda mais
evidentes na fala de EMI, outra entrevistada da pesquisa de Simon (2020):

“Lembro-me que, em um momento, em um tempo, eu já estava


separada e ele vinha, entrou em minha casa, chutou tudo, e me bateu,
capaz; então alguém sempre tinha que estar comigo e alguns dias eu
tinha que sair da minha casa. Então, eu ia para a casa de uma
companheira, ficava lá por alguns dias e bem, em um desses dias ele
entrou e tacou fogo em todas as minhas roupas, jogou fora toda a
comida, tudo ... bem, muito difícil. Até que lhe disseram [militantes da
UST] para deixar a província [Mendoza] e retornar a Buenos Aires. E
se foi. Até aí. Bem ... E então eu fui capaz de sair de toda essa
situação”. (Entrevistada EMI, Mendoza-ARG, 2018- tradução da
autora)

Na monografia (BORSOI, 2018), ao estudar meninas jovens do terceiro ano


do Ensino Médio, foi possível apontar que “são as formas de poderes encontradas no
espaço que (trans)formam os corpos sociais” (p.52), pois a construção cultural e social
nos corpos ocorrem a partir de normas e padrões para que, principalmente mulheres e
adolescentes, possam ser controladas-dominadas por um sistema patriarcal-classista-
racista. O estudo teve como objetivo, buscar entender como meninas jovens e as
normas heteronormativas funcionavam em seus espaços sociais a partir de um querer
consumir procedimentos estéticos, com foco nas cirurgias plásticas estéticas e como os
processos da padronização da beleza refletiam nessas decisões de mulheres tão
jovens. Para isso foram utilizadas entrevistas e grupos focais para as análises, o que
fez com que as entrevistadas pudessem juntas discutir e argumentar sobre esses
processos, a partir do que elas viam e entendiam enquanto sujeitas. Podemos ver na

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SIMON, C.R.; BORSOI, B.F.G. Por uma geografia para todas as saúdes: feminismo como direção para a promoção
da saúde. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.33-44. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

fala de uma das entrevistadas, que foi possível, enquanto pesquisadora, acompanhar
as sujeitas em um processo de re-conhecimento e de crítica às regras e normas
impostas, e que, de certa forma, as jovens foram absorvendo aquelas questões trazidas,
a partir das críticas feministas do trabalho da autora.

eu acho que é muita utopia [falar] que não sente a pressão, porque
talvez a pressão pra ela vem até indiretamente, mas ela tem, e a
gente tá em uma sociedade que tudo parte da mídia, que nem a
roupa (apontando para a entrevistada) que de certa forma a pessoa
vai no lugar comprar a roupa ela sofre uma certa pressão, lógico
que a pessoa não falou pra você na sua cara direto, foi de uma forma
indireta, foi uma pressão… (Entrevistada Deméter, grupo focal 3, 2018-
grifo das autoras)

Já na dissertação de mestrado de Simon (2020) as mulheres que


participaram dessa pesquisa, além de serem mulheres mais velhas que as jovens
entrevistadas pela pesquisa de Borsoi (2018), quase todas eram mães, organizadas em
movimentos camponeses. Suas falas enunciavam uma consciência maior sobre o
sistema de opressão-dominação que geravam as iniquidades em saúde vividas por elas
e pelas suas famílias, sendo explícito em suas falas a necessidade de lutar de forma
organizada contra o capitalismo e também contra o patriarcado, como se pode ver:

“Não há como ter uma reforma agrária real sem enfrentar o patriarcado”
(Entrevistada V. Mendoza-ARG, 2018- tradução da autora)

De acordo com SILVA e ORNAT (2016), os corpos podem incorporar ou


resistir às significações socialmente construídas, e vemos a partir das nossas pesquisas
essa resistência latente das mulheres. Assim, entendemos que não há formas de
produzir pesquisas aplicadas em Geografia da Saúde sem que se busque a redução
das iniquidades espaciais, todas elas.
Logo, a interseccionalidade é uma ferramenta de análise importante, pois
para se compreender as iniquidades em saúde a partir da formação socioespacial,
precisamos evidenciar em nossas pesquisas as bases estruturantes de opressão-
dominação da sociedade evidenciando o corpo das mulheres e os ‘outros corpos’
que são oprimidos, em diversos lugares, com diversas idades etc. Sendo nosso
dever enquanto mulheres militantes re-afirmar com as nossas pesquisas que: a
Geografia da Saúde precisa ser Feminista, também.

FEMINISMOS E A PROMOÇÃO DA SAÚDE

“Quando uma pessoa é saudável? Quando ela tem perspectiva de


vida, quando se alimenta bem, quando tem a capacidade de sonhar,
então as pessoas são saudáveis, porque quando ela perde a
capacidade de sonhar ela não é mais saudável, ela perdeu a alegria a
esperança, aí entra vários fatores”
(Entrevistada D. Paraíba- BRA, 2018).

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SIMON, C.R.; BORSOI, B.F.G. Por uma geografia para todas as saúdes: feminismo como direção para a promoção
da saúde. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
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https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

A saúde como processo pode ser também uma construção social, política e
cultural, e, por isso, é urgente utilizarmos abordagens que façam jus à “natureza
complexa e múltipla dos processos concretos relativos à vida, aflição, sofrimento, dor,
doença, cuidado, cura e morte- a saúde, que ocorrem em agregados humanos
históricos” (ALMEIDA FILHO, 2011, p.13) socioespacializados desigualmente.
Tendo em vista que o feminismo é ao mesmo tempo movimento social e
filosofia política (GARCIA, 2015), é método de pesquisa e teoria (SILVA, 2013).
Entendemos que existem diversos Feminismos, por ser constantemente construído por
pessoas, pois, “entre o discurso, a reflexão e a prática é no feminismo que ocorre a
busca ética e uma forma de se estar no mundo” (GARCIA, 2015, p.13),
independentemente de qual abordagem se acredita ou utiliza.
Partimos do pressuposto de que o feminismo luta em busca de um mundo
melhor a partir da igualdade entre gêneros, por equidade social e por direitos humanos.
Assim, devemos nos atentar então que o feminismo faz saúdes, diversas e múltiplas.
Afinal:

A saúde não constitui campo separado da realidade social; pelo


contrário, faz parte de uma realidade complexa que expõe
simultaneamente problema e intervenção, o que demanda
conhecimentos distintos e ao mesmo tempo integrados. Isso torna a
análise qualitativa em saúde especialmente importante (MOEDO,
LAROCCA, CHAVES e MAZZA, 2008, p.649)

A luta feita diariamente por militantes feministas é a luta por vidas, por
direitos, pela natureza, pelo corpo e pelo desejo de quebrar as amarras sociais. Taliría
Petrone (2019), no Prefácio ao livro “Feminismo para 99% um manifesto”, já nos adianta
que o feminismo é uma urgência no mundo, na América Latina e no Brasil. Estamos
aqui neste trabalho, tentando trazer luz a essa urgência na Geografia para a Saúde, e
para que isto ocorra “devemos nos unir a outros movimentos anticapitalistas e contrários
ao sistema [...] [pois] apenas dessa forma o feminismo pode se mostrar à altura dos
desafios atuais” (CINZIA ARRUDA, BJATTACHARYA TITHI, NANCY FRASER, 2019,
p.29).
Como Silvia Federici argumenta em o Calibã e a Bruxa (2017), a busca e o
controle incessante do capitalismo aos corpos de mulheres, teve como função
deslegitimar e explorar esse gênero, com intuito de retirar o controle dos nossos
próprios corpos, - reprodução humana - as práticas e saberes populares, acusando-nos
e nos caçando, estigmatizando-nos de bruxas, assim

as mulheres … foram reconhecidas por uma compreensão particular


dos segredos da natureza, que as capacitava, supostamente, a
proporcionar vida e morte e a descobrir as propriedades ocultas das
coisas. Praticar magia (na condição de curandeiras, médicas
tradicionais, herboristas, parteiras, criadoras de poções de amores)
também foi, para muitas mulheres, uma fonte de emprego e,
indubitavelmente, uma fonte de poder … (FEDERICI, 2017, p.65)

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SIMON, C.R.; BORSOI, B.F.G. Por uma geografia para todas as saúdes: feminismo como direção para a promoção
da saúde. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.33-44. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

E quando pensamos em Saúdes como uma construção social, espacial e


política, a saúdes no plural, são assim:

um campo de saberes e de práticas resultado da complexa e rica


trama de atos humanos e instituições socialmente organizadas e
coletivamente estabelecidas para enfrentar, nos planos simbólico e
concreto, os efeitos de fenômenos, eventos, fatores e processos
relativos à vida e morte, a satisfação e sofrimento, normalidade e
patologia, enfermidade e saúde. ” (ALMEIDA FILHO, 2011, p.139- grifo
das autoras)

Como nos traz Stotz e Araújo (2004, p. 07), é a promoção que “define como
requisitos e condições para a saúde: paz, educação, moradia adequada, alimentação
saudável, renda suficiente, ecossistema estável, justiça social e equidade”. Uma vez
que, “a promoção da saúde é o processo que dá ao sujeito maneiras de garantir maior
controle sobre sua própria saúde” (LIMA; MALACARNE; STRIEDER, 2012, p.195). E,

... o protagonismo social e político da mulher nas ações de promoção


da saúde, presente na maioria das declarações e documentos
contemporâneos referentes ao tema aproximam, em definitivo este
campo com o movimento feminista (BUSS, 2009, p.20).

Em seu livro, bell hooks (2019), nos encaminha para compreensão de que,
a luta feminista precisa de uma teoria libertadora na qual só assim irá produzir um
movimento feminista efetivo e para que isso ocorra precisamos direcionar nosso
conhecimento às massas a partir da educação coletiva visando uma consciência crítica.
Pois é a começar pela alfabetização que poderemos criar estratégias de combate aos
sistemas opressores e dominantes, e mesmo “o que não pode ser lido pode ser falado,
e falar, … é uma maneira efetiva de compartilhar sobre teoria feminista” (p.95) e
promover saúdes.
Assim, escolas são espaços estratégicos de práticas de promoção da saúde
revolucionárias e feministas. Portanto, são a base da construção do contraespaço -
como ação coletiva das excluídas (SIMON, 2020) - é por consequência o lócus da
promoção da saúde (SANTOS e LIMA, 2017). É onde as políticas educacionais
espacializam-se, o que tem implicações diretas sobre o bem-estar individual e coletivo.
Se concretiza como um espaço de socialização de conhecimentos acerca da saúde
coletiva e feministas por produzir elementos chaves para perpetuar as lutas por
equidade social. A escola fomenta atitudes e ideias emancipadoras (FREIRE, 1999),
para o ser, para a família e para comunidade como um todo.
Por isso, a Monografia de Borsoi (2018) partiu das análises de meninas
jovens em uma escola pública na cidade de Presidente Prudente. Já na dissertação de
Simon (2020) foi possível evidenciar que as escolas camponesas, tanto no Brasil quanto
na Argentina são espaços estratégicos para prosperar as práticas revolucionárias de
promoção da saúde feministas, pois é nas escolas que espacializam-se as ideias que
fomentam a contrarracionalidade ao modelo capitalista mas, principalmente, patriarcal,
e assim, são poderosos instrumentos fomentadores do contraespaço, como resistência
das excluídas que promove a suas vidas e de suas comunidades (SIMON, 2020).

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SIMON, C.R.; BORSOI, B.F.G. Por uma geografia para todas as saúdes: feminismo como direção para a promoção
da saúde. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.33-44. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

É também em decorrência “desses” espaços que as jovens entrevistadas na


monografia, puderam manifestar e construir novas perspectivas de falas e opiniões nas
dinâmicas que eram colocadas em evidências durante os grupos focais, diante do
objetivo da pesquisa. É importante ressaltar que o discurso das jovens foram se
transformando em um discurso mais crítico, numa perspectiva feminista, já que o debate
fomentado nos grupos focais eram sobre beleza, estética, saúde e corpo nas suas
vivências e persepções. Dessa forma, o contato das participantes, entre as entrevistas
e grupos, continuavam no espaço escolar, contribuindo para a formação de seus
diálogos, pensamentos e posições, levando-as até esses espaços de discussão
oferecidos pela pesquisa.
Por isso é na fala de Deméter que podemos nos atentar como sua
percepção de mudanças físicas e estéticas estão associadas ao bem “comum” e social,
já que sua crítica foi-se construindo para uma conclusão de como os corpos das
pessoas, até o seu, eram postos diante dos processos e mudanças socialmente e
culturalmente construídos:

eu acho que nós estamos numa época que tudo é muito normal, se os
outros não me aceitam é muito mais fácil eu [me] mudar do que eu
mudar o pensamento dos outros, então eu acredito que nós vivemos
muito no senso comum, porque mais que às vezes a gente fala que
não, “mas eu mudei porque eu quis” normalmente, a gente muda pelo
senso comum, eu acho que toda mudança é bem vinda mas […] a
pessoa tem que parar pensar e acho que é muito importante a pessoa
se conhecer, porque ela tá fazendo uma coisa porque ela realmente
quer ou se é pelo o que os outros querem, porque às vezes começa
por uma coisa que os outros querem aí depois porque os outros
querem ela [também] quer, eu acho que é um pouco confuso pra
pessoa, tem que ter muito autoconhecimento (Entrevistada Deméter,
Grupo Focal 3, 2018)

Então o Feminismo, para nós, produz saúdes. Porque não é um movimento


ou uma teoria individual entre poucos, mas é, em si, um movimento coletivo que luta por
um mundo diferente para todas, todos e todes (TIBURI, 2019), imprescindível para
mulheres, jovens e mais velhas, da cidade e do campo, tendo a escola como ponto
chave de atuação. Logo, nós geógrafas devemos não só expor diversas desigualdades
vividas pelos corpos não masculinos, através do sistema de opressão patriarcal, mas
também operacionalizar o conceito de interseccionalidade como elemento chave dos
contextos de iniquidades, para assim alcançar a promoção de todas as vidas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este texto teve a intenção de demonstrar que não há mudança da sociedade


sem uma ciência comprometida, verdadeiramente, em mudar as bases da estrutura de
opressão-dominação, que nos enferma e nos mata. Não há mais formas de sustentar
uma Geografia que olha somente para a outra, como objeto de pesquisa, que transforma

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SIMON, C.R.; BORSOI, B.F.G. Por uma geografia para todas as saúdes: feminismo como direção para a promoção
da saúde. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.33-44. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

a morte em frios números. É urgente avançar e entender as corporeidades que fazem


geografias, mas, principalmente, que necessitam de respostas geográficas para viver.
Assim, reconhecemos juntas, como pesquisadoras que partilham trajetórias
dentro do mesmo laboratório, que o fato de seremos mulheres estudando saúde na
Geografia, fez com que nossas pesquisas avançassem no debate sobre
interseccionalidade como análise espacial das iniquidades em saúde e como o
feminismo é um movimento social e político, na promoção da saúde. Nossa Geografia
para Saúde deve, assim, englobar o Feminismo como teoria reflexiva e aplicável, pois
a partir das categorias de análise descobertas pela interseccionalidades de opressão
nos contextos dos quais as sujeitas estão inseridas, as nossas pesquisas demonstram
que o feminismo “se define na capacidade de lutar, até a morte se for o caso, por outro
desejo, que nos livre dos sistemas de opressão objetivos e subjetivos aos quais estamos
assujeitados” (TIBURI, 2019, p.38). E se nossa Geografia também está em busca de
um mundo melhor e assim, mais equitativo, ela deve ser também feminista, porque
sozinha não conseguirá responder todas problemáticas, já que é pelo feminismo que
temos uma visão mais ampliada dos estigmas de classe, gênero e raça.
Por isso acreditamos que enquanto mulheres, homens, pesquisadoras e
pesquisadores, podemos buscar produzir uma Geografia para todas as Saúdes, com o
olhar e metodologias feministas, porque é na construção de uma ciência e de
movimentos sociais que podemos mudar e revolucionar nossos espaços, sejam pelos
nossos corpos ou fora deles.

AGRADECIMENTOS

Ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Faculdade de Ciência e


Tecnologia – FCT/UNESP (Campus de Presidente Prudente. A Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pelo financiamento da pesquisa sob o
processo nº 2017/07058-5 e também ao processo 2018/08455-0. Ao Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq Processo nº 133133/2019-2.
Agradecemos também as contribuições das discussões provenientes do
Grupo de Trabalho de Saúde da Associação dos Geógrafos e Geógrafas do Brasil
(AGB).

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44
TORRES, C.F.L.F; PEREIRA, M. P.B. Plataforma digital relacionada à Geografia da saúde: um espaço de comunicação
virtual. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.45-53. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com/
ISSN 1980-5829

Plataforma Digital relacionada à Geografia da Saúde: um espaço de


Comunicação Virtual

TORRES, Cleverton Felipe Lúcio Fernandes1


PEREIRA, Martha Priscila Bezerra2
RESUMO:
A pandemia da Covid-19 no ano de 2020 fez com que fossem cancelados vários eventos
científicos e instigou profissionais de várias áreas da ciência a intensificar a comunicação de
outras maneiras, como grupos de Facebook, Instagram, canais de Youtube, etc.. Ainda que
já existissem, estão ocorrendo com maior frequência após o início dessa pandemia. Todavia,
tanto essas formas de comunicação, como outras tem suas informações perdidas na vasta
quantidade de informações que circulam na internet. Em meio a essa situação, este trabalho
teve como objetivo elaborar uma plataforma digital relacionada a Geografia da Saúde como
forma de comunicação científica virtual. Para atingir esse objetivo foram realizados os
seguintes procedimentos: a) levantamento de referências; b) organização dos espaços para
possíveis formas de comunicação científica virtual; c) implantação das informações do
Simpósio Nacional de Geografia da Saúde e Mostra Regional de Geografia da Saúde (um
evento nacional e outro local). Até o momento os principais resultados foram: a organização
dos anais dos eventos supracitados; a comunicação através de grupos de whatsapp com os
participantes desses eventos. Percebeu-se que se iniciou a consolidação de uma rede de
comunicação mais próxima entre os que fazem a Geografia da Saúde no Brasil.

Palavras-chave: Geografia da Saúde, redes, comunicação.

ABSTRACT:
The Covid-19 pandemic in 2020 caused several scientific events to be canceled and instigated
professionals from various areas of science to intensify communication in other ways, such as
Facebook groups, Instagram, Youtube channels, etc. already existed, they are occurring more
frequently after the start of this pandemic. However, both these forms of communication, as
well as others, have their information lost in the vast amount of information that circulates on
the internet. In the midst of this situation, this work aimed to develop a digital platform related
to Health Geography as a form of virtual scientific communication. To achieve this objective,
the following procedures were carried out: a) survey of references; b) organization of spaces
for possible forms of virtual scientific communication; c) implantation of information from the
National Symposium on Geography of Health and Regional Exhibition on Geography of Health
(a national and a local event). So far, the main results have been: the organization of the annals
of the aforementioned events; communication through whatsapp groups with the participants
of these events. It was noticed that the consolidation of a closer communication network began
between those who make up the Geography of Health in Brazil.

1
Estudante de graduação em Geografia na UFCG; bolsista PIBITI/UFCG/CNPq; clevertonufcg@gmail.com
2
Docente da Unidade Acadêmica de Geografia/ UFCG; mpbcila@yahoo.com.br

45
TORRES, C.F.L.F; PEREIRA, M. P.B. Plataforma digital relacionada à Geografia da saúde: um espaço de comunicação
virtual. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.45-53. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com/
ISSN 1980-5829

Keywords: Health geography, networks, communication.

INTRODUÇÃO:
As plataformas digitais são ambientes que conectam pessoas por meio da
tecnologia na internet (PATEL, 2020). Quando se trata de eventos científicos, muitas
plataformas são elaboradas em sites gratuitos, que servem para colocar a programação de
um evento e outra anexa para colocar os anais de acordo com as normas do International
Standart Serial Number (ISSN). O código ISSN refere-se ao “número internacional
normalizado para publicações seriadas, é o código aceito internacionalmente para
individualizar o título de uma publicação seriada” (ISSN, 2020, p. 1). Apesar da ótima
qualidade dos trabalhos e dos eventos diversos, devido à falta de manutenção da plataforma,
muitas áreas do conhecimento são perdidas, ficando apenas a possibilidade de resgatar os
trabalhos através do Digital Versatile Disc – DVD (disco digital versátil) ou do famoso pendrive.
Essa realidade ocorre também com cursos on-line e outras atividades que grupos de pesquisa
ou áreas de determinada ciência realizam e se torna inviável o resgate devido estarem
perdidos nas várias redes sociais de maneira desordenada. A partir da constatação dessa
situação, como reunir as atividades de determinada área da ciência em uma plataforma
apenas? Como manter essa plataforma para que seja acessível de forma indefinida de acordo
com a tecnologia disponível? Como fazer isso na área da Geografia da Saúde?
Dessa forma, este trabalho teve como objetivo elaborar uma plataforma digital
relacionada à Geografia da Saúde como forma de comunicação científica virtual.
Este texto está dividido em quatro partes. Na “metodologia” foram apresentados
os procedimentos metodológicos utilizados. Na fundamentação teórica trabalhou-se com a
questão da formação das redes sociais e as personas envolvidas. No item “Organização de
espaços para possíveis formas de comunicação científica” foi realizada uma busca na internet
sobre o tema para entender os perfis das pessoas que estão relacionadas à Geografia da
Saúde e áreas afins. E no item “Organização de informações de eventos” foi mostrada a
organização inicial dos anais dos eventos ‘Simpósio Nacional de Geografia da Saúde’ e
‘Mostra Regional de Geografia da Saúde’

METODOLOGIA
Os procedimentos metodológicos utilizados foram: a) levantamento de
referências; b) organização de espaços para possíveis formas de comunicação científica
virtual; c) implantação das informações do Simpósio Nacional de Geografia da Saúde e Mostra
Regional de Geografia da Saúde.
No que diz respeito ao levantamento de referências destacaram-se Azevedo e
Moutinho (2014), Andrade (2014) e Castro (2006). Em geral esses autores defendem que a
partir da perspectiva da informação e dos impactos da distribuição dela em larga escala pelos
meios digitais, sua influência para o debate científico e criação de um ambiente social de fonte
de informações científicas para o público (acadêmico ou não) convergem com as novas
tecnologias criando redes de informações confiáveis principalmente na distribuição de dados

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TORRES, C.F.L.F; PEREIRA, M. P.B. Plataforma digital relacionada à Geografia da saúde: um espaço de comunicação
virtual. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.45-53. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com/
ISSN 1980-5829

para saúde para que se tenha um maior alcance para as pessoas tanto na academia quanto
para o público em geral, e de modo incisivo beneficiando a ciência através da contribuição de
diversos profissionais na construção do conhecimento científico.
Constitui-se do período de pesquisa acerca das informações e trabalhos sobre as
edições dos eventos anteriores bem como da constituição até o mais antigo de modo de se
estabelecer um banco de dados estruturados de dados constando informações do evento,
participantes, isto é, das comissões tanto organizadora quanto científica, em virtude da
natureza de que tais eventos com exceção dos locais eram de localidades e instituições
diversas.
A organização de espaços para possíveis formas de comunicação científica foi
realizada a partir da pesquisa na internet de exemplos semelhantes que foram organizados
na pesquisa de Pereira e Pereira (2020).
A implantação das informações dos referidos eventos na plataforma passou por
algumas etapas. Inicialmente ocorreu a partir da escolha da plataforma em que seriam
colocadas as informações. Depois de pesquisa na internet e treinamento em duas plataformas
foi escolhida a Wix.com (WIX.COM, 2021). Esta empresa oferece um serviço tanto pago
quanto gratuito de fomento a páginas on-line, além de ser simples para alimentação de
informações no futuro por outras pessoas que possam ter ou não um conhecimento mais
aprofundado em desenvolvimento de sites.
Após a escolha de tal plataforma analisou-se os serviços oferecidos sendo feito o
planejamento de qual serviço escolher para a páginas de armazenamento dos dados sobre o
evento no caso os anais, de modo de garantir uma melhor assistência e qualidade de suporte
afim de obter-se seguridade quanto a integridade destes. Ao obter tais recursos se seguiu
continuamente a construção destas plataformas, garantindo-se assim resultados quanto a
questões estéticas quanto a questão funcional.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
A discussão sobre redes sempre retorna quando surge uma nova rede a ser
entendida. Na geografia, quando se considera uma rede espacial pode entender que seria um
conjunto de localizações geográficas que são interconectadas entre si por ligações (CORREA,
1997 apud SOUZA, 2015).
Essas redes também podem ser entendidas de maneira semelhante quando se
trata da internet. Apesar dessas redes aproximarem os distantes e distanciarem os próximos
(fragmentando pessoas), as redes, de acordo com Souza (2015): a) ainda buscam alguma
forma de contiguidade; b) apesar de muitos trabalharem em casa (especialmente agora nesse
período da pandemia da Covid-19), sempre haverá os que irão para a rua (a exemplo do
serviço de delivery, os que trabalham na rua); c) ainda que as redes sociais na internet
impulsionem um movimento, ele é apenas um complemento, pois só é efetivado e validado
nas ruas.
Quando se trata as redes como teoria, pode-se trabalhar com a Teoria das Redes
Sociais. Recuero (2005) afirma que as redes sociais no ciberespaço podem ser estudadas

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TORRES, C.F.L.F; PEREIRA, M. P.B. Plataforma digital relacionada à Geografia da saúde: um espaço de comunicação
virtual. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.45-53. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com/
ISSN 1980-5829

através de três grandes elementos: sua estrutura, sua organização e sua dinâmica. A estrutura
seria analisada a partir dos laços e capital social, em seu núcleo há laços fortes, enquanto na
periferia esses laços são mais fracos. A organização pode ser cooperativa, competitiva ou
geradora de conflito. Quando a mesma é cooperativa pode gerar “a sedimentação das
relações sociais, proporcionando o surgimento de uma estrutura” (RECUERO, 2005, p. 20).
Corrêa (2018) apresenta um conceito de redes geográficas semelhante às redes
sociais, afirmando que envolvem poder, cooperação e relações sociais de toda ordem e em
várias esferas da vida. Algo parecido com o que ocorre com as redes encontradas na internet.
No caso das plataformas digitais, para que elas formem uma rede cooperativa elas
precisam ter uma sede em uma das redes, porém comunicando-se com outras formas de
difusão desse conhecimento para chegar aos vários tipos de público por faixa etária, renda,
nível de estudo, entre outras possibilidades de diversificação em busca de suas personas.
Personas “são composições de informações realísticas e representativas que incluem
detalhes fictícios para caracterização mais completa do usuário” (COOPER e REIMANN,
2003, apud AQUINO JÚNIOR e FILGUEIRAS, 2008). Essas personas, voltando o olhar para
a cooperação e não exatamente na visão de mercado, poderia ser a busca de pessoas que
tenham perfil semelhante para trocar informações entre si, no sentido da cooperação.
A partir desse olhar os tipos de produtos a serem elaborados seriam os que
possam colaborar para que o aluno, o professor ou técnico da Geografia e/ou áreas afins
possa ter acesso tanto a trabalhos científicos publicados nos eventos quanto ao seu histórico,
as pessoas relacionadas ao evento, os cursos e eventos que esses participantes estão
realizando, o que está sendo publicado, dentre outras possibilidades.
Dentre as ramificações e aplicações do conceito e teoria das redes sociais tem-se
as redes sociais como um objeto que responde à complexidade da Teoria Social (MARTINS
e FONTES, 2004). Esta teoria da rede social possui a necessidade de explicar o fato social a
partir de um coletivo que se impõe às vontades individuais sem eliminar a liberdade dos atores
de participarem de diversos círculos de trocas. Essa situação também ocorre quando as redes
chegam a um nó que comanda uma série de nós que ficam no seu entorno. No caso dos
eventos, através da eleição de temas, conceitos e teorias que passam a ser mais bem
discutidos em detrimento de outros.

ORGANIZAÇÃO DE ESPAÇOS PARA POSSÍVEIS FORMAS DE COMUNICAÇÃO


CIENTÍFICA.
Com base na pesquisa de Pereira e Pereira (2020) foi possível observar que os
grupos de pesquisa em Geografia da Saúde se expressam de diversas formas na internet,
semelhante a outras áreas científicas. Entre outras coisas observou-se que as principais
formas de comunicação são: E-mail, Site, Facebook, Instagram e Youtube.
A partir da pesquisa na internet em geral observou-se também a utilização do
Telegram, o Whatsapp web que fica disponível no site, no facebook e no Instagram sendo
facilitada a comunicação com o usuário, além de um sistema de postagem de conteúdo que
obedece às características das personas relacionadas.

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TORRES, C.F.L.F; PEREIRA, M. P.B. Plataforma digital relacionada à Geografia da saúde: um espaço de comunicação
virtual. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.45-53. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com/
ISSN 1980-5829

O E-mail, o Whatsapp e o Telegram são meios de comunicação mais pessoais. O


site seria um meio de dispersão da informação de um modo mais estático. O Instagram, o
Facebook e o Youtube são meios mais fluidos ou dinâmicos, que atingem um número muito
maior de pessoas. Desta forma, o planejamento da informação para cada tipo de comunicação
deve ser diferenciado.
A partir desse ponto está se organizando possibilidades de postagens que tenha
relação com os principais grupos relacionados ou personas:
A primeira persona seria relacionada a faixa etária entre 18 e 25 anos, que gosta
de usar principalmente o Instagram, o youtube e o whatsapp. Quer informações rápidas e se
desinteressa facilmente do conteúdo se estiver muito demorado ou com linguagem mais
rebuscada.
A segunda persona teria idade a partir dos 25 anos, busca plataformas mais
antigas (Facebook) ou fixas (Sites), precisam de conteúdos mais consolidados e/ou confiáveis
para utilizar em suas atividades profissionais e aceita conteúdos mais demorados se estiver
relacionado a autores ou assuntos de maior interesse.
Essas personas foram construídas a partir de levantamento na internet, mas que
em pesquisas futuras pretende-se trabalhar melhor com elas para o público específico.
Um dos resultados interessantes dessa busca foi sobre as possibilidades atuais
de comunicação científica. Uma delas é a criação de um ambiente social de fonte de
informações científicas para o público em geral, ocupando o espaço das redes sociais com
conteúdo científico e que seja útil.
Estas comunicações teriam como base um site e a partir das redes sociais ideias
e conteúdos seriam disseminados.

ORGANIZAÇÃO DE INFORMAÇÕES DE EVENTOS


No que diz respeito a “organizar os anais dos eventos do Simpósio Nacional de
Geografia da Saúde” e “organizar os anais dos eventos da Mostra Regional de Geografia da
Saúde” foram realizadas uma série de ações para se iniciar essa atividade.
Inicialmente foi necessário realizar um levantamento dos anais de todos os
eventos ocorridos até o momento. Conversou-se com os coordenadores dos eventos e
participantes, sendo possível a conclusão da obtenção desse material até janeiro de 2021.
Enquanto se estava obtendo esse material, foi necessário organizar a plataforma
digital. A partir dos critérios do Centro Brasileiro de ISSN (ISSN, 2020) o site se apresenta
com um organograma definido que contém os trabalhos publicados na edição mais atual; o
que foi publicado nas edições anteriores, as notícias principais do momento, Sobre o evento
(foco e escopo; processo de avaliação pelos pares; periodicidade; política de acesso livre;
histórico; comitê editorial; indexação; licença de contatos; fontes de apoio), submissões
(normas para submissão); equipe editorial; declaração de privacidade e informações para
contato (figura 1).

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TORRES, C.F.L.F; PEREIRA, M. P.B. Plataforma digital relacionada à Geografia da saúde: um espaço de comunicação
virtual. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.45-53. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com/
ISSN 1980-5829

FIGURA 1: ORGANOGRAMA DOS SITES

Fonte: ISSN (2020). Organizado por: Pereira e Torres (2021)

Organizada a plataforma digital e realizados treinamentos foi possível começar a


implantar as informações. Estas começaram a ser inseridas a partir de dezembro de 2020.
Até o momento está completo o site da Mostra (figura 2), porém o do Simpósio estão sendo
plotadas as informações.
Pretende-se finalizar esse material para disponibilizar aos profissionais e
estudantes que lidam com a Geografia da Saúde e áreas afins.

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TORRES, C.F.L.F; PEREIRA, M. P.B. Plataforma digital relacionada à Geografia da saúde: um espaço de comunicação
virtual. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.45-53. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com/
ISSN 1980-5829

FIGURA 2: PRINTSCREEN DO SITE DOS ANAIS DA MOSTRA REGIONAL DE GEOGRAFIA DA SAÚDE

Fonte: https://www.anaismrgeosaude.com.br/. Acesso em 30mar2021.

CONSIDERAÇÕES FINAIS:
Apesar de ter-se definido as personas a partir de levantamento na internet,
especificamente nas redes sociais mais usuais, percebeu-se a necessidade de pesquisa mais
aprofundada sobre o tema, mas como não era o objetivo neste projeto, não foi realizada essa
atividade.
Quanto ao site dos anais, entende-se a necessidade dessa ferramenta devido a
disponibilização para todo o público interessado nessas informações. Todavia, as outras
redes sociais são importantíssimas para a atualização desse conhecimento e de eventos que
possam auxiliar na formação dos envolvidos.

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TORRES, C.F.L.F; PEREIRA, M. P.B. Plataforma digital relacionada à Geografia da saúde: um espaço de comunicação
virtual. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.45-53. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com/
ISSN 1980-5829

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de ciência aberta para o Brasil. 2014, 227f. Tese (doutorado) – Departamento de
Comunicação social. Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2014. Disponível em:
https://repositorio.ufpe.br/handle/123456789/13158. Acesso em 20jan2021.

AQUINO JÚNIOR, Plínio Thomaz; FILGUEIRAS, Lúcia Vilela Leite. A expressão da


diversidade de usuários no Projeto de Interação com Padrões e Personas. In: SIMPÓSIO
BRASILEIRO DE FATORES HUMANOS EM SISTEMAS COMPUTACIONAIS, 10, 2008,
Porto Alegre – RS. Anais [...] Porto Alegre: Comunidade Brasileira de Interação Humano-
Computador – IHC, 2008, p. 1-10. Disponível em:
https://www.researchgate.net/profile/Plinio-Aquino-
Junior/publication/220737351_A_expressao_da_diversidade_de_usuarios_no
_projeto_de_interacao_com_padroes_e/links/5f0c779292851c38a519bf5f/A-expressao-da-
diversidade-de-usuarios-no-projeto-de-interacao-com-padroes-e.pdf. Acesso em 25 mai.
2021.

AZEVEDO, J; MOUTINHO, N. A comunicação de ciência em plataformas digitais: as


implicações da cultura participativa e da convergência tecnológica. Congreso
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https://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/115190/2/281403.pdf. Acesso em 20 jan.
2021.

CASTRO, M. R. de. A contribuição da Geografia Médica e da Saúde na pandemia do


COVID 19: uma reflexão sobre a cidade do Rio de Janeiro. P2P E INOVAÇÃO, v. 7, n. 1, p.
230-240, 26 set. 2020.

CORRÊA, Roberto Lobato. Caminhos paralelos e entrecruzados. São Paulo – SP:


EDUNESP, 2018, 321p.

ISSN. O que é ISSN? Brasília – DF: 2020. Disponível em: http://www.cbissn.ibict.br/


index.php/issn. Acesso em 20 de outubro de 2020.

MARTINS, P. H.; FONTES, B.. Redes sociais e saúde: novas possibilidades teóricas.
Recife: Ed universitáia UFPE, 2004.

PATEL, Neil. Plataformas digitais: o que são e quais as melhores para a sua empresa.
Londres, UK, 2020. Disponível em: www.neilpatel.com.br/blog/plataformas-digitais/. Acesso
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PEREIRA, Emanuel Hiuri Xavier; PEREIRA, Martha Priscila Bezerra. Situação do Grupo de
Pesquisa em Geografia para Promoção da Saúde em relação aos grupos de pesquisa
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UFCG).

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TORRES, C.F.L.F; PEREIRA, M. P.B. Plataforma digital relacionada à Geografia da saúde: um espaço de comunicação
virtual. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X.,
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RECUERO, Raquel da Cunha. Comunidades virtuais em redes sociais na internet: uma


proposta de estudo. Revista da Associação dos Programas de Pós-graduação em
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SOUZA, Marcelo Lopes de. Os conceitos fundamentais da pesquisa sócio-espacial.


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PEREIRA, E.H.X.; PEREIRA, M.P.B. situação do grupo de pesquisa em geografia para promoção da saúde em relação aos grupos de
pesquisa em geografia e saúde no Brasil. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e
desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.54-70. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

SITUAÇÃO DO GRUPO DE PESQUISA EM GEOGRAFIA PARA PROMOÇÃO DA SAÚDE


EM RELAÇÃO AOS GRUPOS DE PESQUISA EM GEOGRAFIA E SAÚDE NO BRASIL.

PEREIRA, Emanuel Hiuri Xavier1

PEREIRA, Martha Priscila Bezerra2

RESUMO

Grupo de pesquisa é um conjunto de indivíduos organizados em conjunto que


desenvolvem trabalhos que se encaixem nas linhas de pesquisa previamente
estabelecidas pelo líder deste grupo. Dentre esses grupos, há os que trabalham com a
Geografia da Saúde ou temas afins e nesta categoria está inserido o Grupo de Pesquisa
em Geografia para Promoção da Saúde – PRÓ-SAÚDE GEO. A partir desse contexto
esta pesquisa teve como objetivo geral analisar a posição do PRÓ-SAÚDE GEO em
relação a outros grupos da Geografia da Saúde e áreas afins no território brasileiro.
Como metodologia foram realizados: a) levantamento na internet, iconográfico e
cartográfico, de referências e documental; b) espacialização dos grupos de pesquisa no
Brasil e das redes do Pró-Saúde Geo. Obteve-se como resultados um total de 32 grupos
de pesquisa registrados na plataforma, e por isso nota-se que esta área da Geografia
está em constante crescimento visto que, mais da metade foi fundado após o ano de
2010, tendo um pico entre os anos de 2013 a 2018, e que a maioria desses grupos estão
conectados com a rede nacional de grupos de pesquisa de Geografia da Saúde.

Palavras-chave:Geografia da Saúde, Grupos de pesquisa, Pro-SaúdeGeo.

ABSTRACT

Research group is a group of individuals organized together that develop works that fit the
lines of research previously established by the leader of this group. Among these groups,
there are those that work with Health Geography or similar themes and this category
includes the Research Group on Geography for Health Promotion - PRÓ-SAÚDE GEO.
From this context, this research had as general objective to analyze the position of PRÓ-
SAÚDE GEO in relation to other groups of Health Geography and related areas in the
Brazilian territory. As methodology were carried out: a) survey on the internet; Iconographic
and cartographic, of references and Documentary survey b) spatialization of research groups
in Brazil and Pro-Saúde Geo networks. As a result, a total of 32 research groups registered

1 Graduando do Curso de Geografia, Unidade Acadêmica de Geografia, aluno PIVIC/UFCG, Campina Grande,

PB, hiuri32@gmail.com
2Docente da Unidade Acadêmica de Geografia/ UFCG;mpbcila@yahoo.com.br

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PEREIRA, E.H.X.; PEREIRA, M.P.B. situação do grupo de pesquisa em geografia para promoção da saúde em relação aos grupos de
pesquisa em geografia e saúde no Brasil. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e
desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.54-70. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

on the platform were obtained, which is why it is noted that this area of Geography is in
constant growth since more than half was founded after the year 2010, with a peak among
years from 2013 to 2018, and that most of these groups are connected with the national
network of health geography research groups.

Keywords: Health Geography, Research Groups, Pro-Saúde Geo.

INTRODUÇÃO

Grupo de pesquisa é um conjunto de indivíduos organizados em conjunto que


desenvolvem trabalhos que se encaixem nas linhas de pesquisa previamente
estabelecidas pelo líder deste grupo, também se têm uma hierarquia dentro do grupo e os
seus integrantes fazem uso de uma sala, laboratório ou cômodo definido para ser a sede
do grupo de pesquisa no qual há os equipamentos e materiais pelos integrantes desse
grupo.
O Diretório de Grupos de Pesquisa é formado por uma relação de grupos de
pesquisa científica e tecnológica que estão ativos no país, constituindo um inventário. Os
itens que integram o diretório são os seguintes: a) recursos humanos constituintes dos
grupos; b) linhas de pesquisa; c) especialidades do conhecimento; d) setores de aplicação
envolvidos; e) produção científica, tecnológica e artística; f) parcerias estabelecidas entre
os grupos e as instituições. Tem por objetivo promover o intercâmbio e troca de
informações, pode dar respostas sobre quem são as pessoas componentes do grupo, o
que estão fazendo e o que estão produzindo recentemente. Essas informações são
fornecidas pelos próprios pesquisadores (BRASIL,2019).
As séries históricas dos grupos de pesquisa foram elaboradas a partir de 1993, e
como resultado tem-se que houve um aumento de 755% até 2016. A região que lidera
desde o início é a região sudeste, mas talvez por saturação, está diminuindo sua
porcentagem de grupos no território nacional ao longo dos anos (gráfico 1). Até o ano de
2016 esta plataforma contava com 37.640 grupos de pesquisa (BRASIL, 2019).
Dentre esses grupos, há os que trabalham com a Geografia da Saúde ou temas
afins. O Grupo de Pesquisa em Geografia para Promoção da Saúde – PRÓ-SAÚDE GEO
teve início em 22 de abril de 2010 no âmbito do curso de Geografia da UFCG, campus
Campina Grande. O objetivo deste grupo é “realizar pesquisas relacionando os conceitos e
metodologias próprias da Geografia ou apropriadas por esta ciência para entender
questões relacionadas à saúde” (PEREIRA, 2017, p. 148).

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PEREIRA, E.H.X.; PEREIRA, M.P.B. situação do grupo de pesquisa em geografia para promoção da saúde em relação aos grupos de
pesquisa em geografia e saúde no Brasil. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e
desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.54-70. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

GRÁFICO 1: PORCENTAGEM DA DISTRIBUIÇÃO DOS GRUPOS DE


PESQUISA SEGUNDO A REGIÃO GEOGRÁFICA DO BRASIL

Fonte: Série histórica dos grupos de pesquisa / Diretórios de Grupos de pesquisa / Plataforma Lattes/
CNPq (BRASIL, 2019). Organizado por PEREIRA, MPB (2019)

Ele surgiu um ano após o início do curso de Geografia ser implantado neste
campus, curso que surgiu como fruto do projeto REUNI, que tem por base o Decreto 6.096
de 24 de abril de 2007 que estabelece o Programa de apoio a Planos de Reestruturação e
Expansão das Universidades Federais–REUNI (PROJETO PEDAGÓGICO DO CURSO
DE GEOGRAFIA, 2018). É um grupo composto atualmente por 10 pesquisadores e 22
alunos (PEREIRA, 2019). Este grupo está cadastrado no Diretório de Grupos de Grupos
de Pesquisa do CNPq.
A partir desse contexto esta pesquisa teve como objetivo geral analisar a
posição do Grupo de Pesquisa em Geografia para Promoção da Saúde em relação a
outros grupos da Geografia da Saúde e áreas afins no território brasileiro. Este documento
está dividido em cinco partes. Na primeira “metodologia” foram apresentados os caminhos
percorridos na pesquisa. No “perfil dos grupos de pesquisa em Geografia da Saúde e/ou
temas afins”, foram mostrados os resultados da pesquisa na internet. No item
“Experiências exitosas dos grupos de pesquisa na área da Geografia da Saúde e afins”
foram buscadas as experiências exitosas e suas redes, como elas se configuram. No item
“O Pró-saúde Geo e suas conexões” foi apresentada a situação deste grupo de pesquisa
nessas redes. E no item “síntese teórica: a estrutura das redes sociais” foi realizada uma
associação das redes sociais encontradas na internet com as redes sociais apresentadas
em textos.

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PEREIRA, E.H.X.; PEREIRA, M.P.B. situação do grupo de pesquisa em geografia para promoção da saúde em relação aos grupos de
pesquisa em geografia e saúde no Brasil. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e
desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.54-70. Disponível em
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METODOLOGIA

Para viabilizar a pesquisa seguiu-se as seguintes etapas: a) levantamento na


internet; b) localização dos grupos de pesquisa no Brasil e das redes do Pró-Saúde Geo; c)
Levantamento iconográfico e cartográfico; e) levantamento de referências; f) Levantamento
documental.
O levantamento na internet está relacionado ao Diretório de Grupo de Pesquisas na
Plataforma Lattes/ CNPq, comunidades do Facebook, sites de grupos, Instagram, fotos, etc.
Estes serviram para conhecer os grupos existentes na área de Geografia da Saúde e afins,
onde atuam, com quem atuam, quais suas possíveis conexões com outros grupos e
instituições e experiências exitosas. Foram feitas buscas de todas as informações que
estiverem publicadas na internet. Os descritores iniciais foram: Geografia da Saúde,
Geografia e Saúde, Saúde e Ambiente, Geografia Médica, Geografia da Atenção à Saúde,
Desenvolvimento, Ambiente e Saúde, Território, Ambiente e Saúde.
Ao realizar a busca com cada um destes descritores, foi feita uma análise mais
detalhada sobre os grupos de pesquisa encontrados para se certificar de que se trata de
grupos relacionados ou pertencentes à Geografia da Saúde. Depois desta seleção inicial, foi
feita a coleta e o registro das informações disponíveis na internet sobra cada grupo de
pesquisa. Após esta fase de coleta de dados, realizou-se uma pesquisa dentro do currículo
Lattes dos líderes de cada grupo de pesquisa, no qual foi utilizado como descritores de
busca o nome de líderes de outros grupos de pesquisa a fim de encontrar algum tipo de
relação entre os líderes pesquisados.
A localização dos grupos de pesquisa no Brasil foi realizada a partir do resultado do
levantamento inicial na internet, no qual foi possível localizar suas sedes, a localização dos
territórios onde atuam e possíveis redes a partir dos nomes dos pesquisadores, estudantes
e técnicos em comum. A espacialização a partir do Pró-Saúde Geo, e a partir deste, traçou-
se outras redes com outros grupos e territórios.
O levantamento iconográfico e cartográfico esteve em sintonia com as experiências
exitosas que foram realizadas pelos grupos e publicizadas na internet.
O levantamento de referências, associado ao levantamento na internet já realizado,
teve como meta entender os fundamentos teóricos.
O levantamento documental teve relação com documentos e publicações que foram
disponibilizados em sites e que possam contribuir para a organização do dossiê e do
histórico do grupo de pesquisa PRÓ-SAÚDE GEO.
Em síntese, em atendimento a cada objetivo específico, as atividades foram
realizadas da seguinte forma (quadro 1).

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PEREIRA, E.H.X.; PEREIRA, M.P.B. situação do grupo de pesquisa em geografia para promoção da saúde em relação aos grupos de
pesquisa em geografia e saúde no Brasil. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e
desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.54-70. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

QUADRO 1: SINTESE DOS PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

OBJETIVO COLETA E ORGANIZAÇÃO ANÁLISE DAS


ESPECÍFICO DE INFORMAÇÕES INFORMAÇÕES
a) Elaborar um Levantamento de referências Revisão da literatura.
levantamento dos Levantamento na internet (Diretório Análise estatística;
Grupos de Pesquisa do Grupo de Pesquisas, traçar os nós e as redes;
que trabalham com a comunidades do facebook, sites de verificar possíveis
Geografia da Saúde grupos, instagran, etc.) relações espaciais.
e/ou temasafins; Localização dos grupos Análise espacial

b) Destacar as Levantamento dasexperiências Análise territorial


experiências exitosas exitosas disponibilizadas na internet
dos Grupos de Levantamento de fotos e mapas que Análise da paisagem.
Pesquisa na área da tenham relação com ações dos
Geografia da Saúde e grupos – levantamento na internet
afins das fotos e mapas que tem relação
com experiências
exitosas.
c) Elaborar um dossiê Levantamento na internet (Diretório Traçar a evolução
do Grupo de Pesquisa do Grupo de Pesquisas e site do histórica, as redes e a
em Geografia para grupo PRÓ-SAÚDE GEO) possíveis
Promoção da Saúde – relações espaciais.
PRÓ-SAÚDE GEO; Levantamento documental Análise de conteúdo

Localização dos grupos relacionados Análise espacial


ao PRÓ- SAÚDE GEO de alguma
forma (participação em mais de um
grupo, organização de eventos,
participação em bancas, publicações,
etc.)
Recontar o histórico do grupo a partir Síntese dos resultados
dos resultados da pesquisa e realizar
uma análisedepossibilidades de
ações.
Organização: PEREIRA, MPB (2019)

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PEREIRA, E.H.X.; PEREIRA, M.P.B. situação do grupo de pesquisa em geografia para promoção da saúde em relação aos grupos de
pesquisa em geografia e saúde no Brasil. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e
desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.54-70. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

PERFIL DOS GRUPOS DE PESQUISA EM GEOGRAFIA DA SAÚDE E/OU TEMAS


AFINS:

A base dessa pesquisa foi o Diretório dos Grupos de Pesquisa do Brasil da


Plataforma Lattes, a partir disso, foi utilizado como ferramenta de pesquisa sobre os grupos
de pesquisa de Geografia da Saúde atuantes no Brasil, para tal foram usadas palavras-
chave que se referem a este tema, tais como: Geografia da Saúde, Cartografia da Saúde,
Saúde Espaço, Território Saúde. A partir dos resultados fornecidos pela plataforma, foi
elaborada uma lista (quadro 2) com as características básicas de cada um dos 32 (trinta e
dois) grupos de pesquisa que pertencem ou se relacionam com a Geografia da Saúde.

QUADRO 2: GRUPOS DE PESQUISA DE GEOGRAFIA DA SAÚDE

NOME DO GRUPO LÍDER (ES) SEDE (UNIVERSIDADE) ANO DE


CRIAÇÃO
Saúde Coletiva e Denecir de Almeida UNIANDRADE - CURITIBA 2015
Geografia da Saúde Dutra
SIGSaúde - Geografia Emerson Soares dos UFMT - CUIABÁ 2012
e Análise Espacial em Santos
Saúde
Violências, Direitos Valdeir Ribeiro de UFMT - CUIABÁ 2014
Humanos e Geografia Jesus
da Saúde -
GEOSVIDIH
ANÁLISE ESPACIAL, Micheline Pimentel CELUP-ULBRA – PALMAS 2014
GEOAMBIENTE E Ribeiro Cavalcante,
SAÚDE - GEO Tássia Silvana Borges
SAÚDE
GREGS_UEM Maria Eugênia Moreira UEM - MARINGÁ 2019
Costa Ferreira
Grupo de Pesquisa Jane Kelly Oliveira UFFS - CHAPECÓ 2018
Geografia e Saúde Friestino, Pedro
GeoSaúde Germano Murara
Laboratório de Marília Brasil Xavier, UFPA – BELÉM 2018
Epidemiologia, Anderson
Territorialidade e RaiolRodrigues
Sociedade - LETS
Núcleo de Pesquisa Rivaldo Mauro de UFSM - SANTA MARIA 2017
em Geografia da Faria
Saúde - NePeGS
Grupo de Pesquisa em Martha Priscila UFCG - CAMPINA GRANDE 2010
Geografia para Bezerra Pereira
Promoção da Saúde -
Pró-saúde Geo

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PEREIRA, E.H.X.; PEREIRA, M.P.B. situação do grupo de pesquisa em geografia para promoção da saúde em relação aos grupos de
pesquisa em geografia e saúde no Brasil. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e
desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.54-70. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

QUADRO 2: GRUPOS DE PESQUISA DE GEOGRAFIA DA SAÚDE (CONT.)


NOME DO GRUPO LÍDER (ES) SEDE (UNIVERSIDADE) ANO DE
CRIAÇÃO
Laboratório de Raul Borges UNESP - PRESIDENTE 2004
Biogeografia e Guimarães PRUDENTE
Geografia da Saúde -
BioGEOS
Política, Avaliação e Rafael Gomes UFPR - CURITIBA 2016
Gestão em Saúde Ditterich,
(PAGS) SolenaZiemerKusma
Geografia da Saúde e Nelcioney José de UFAM - MANAUS 2015
Vigilância Souza Araújo
Socioambiental
GeoSaúde Manaus AntonioEstanislau UEA - MANAUS 2010
Sanches
Climatologia Juliana Ramalho UFG - GOIÂNIA 2018
Geográfica e Barros
interfaces com a
saúde
Grupo de Pesquisa ZulimarMárita Ribeiro UFMA - SÃO LUÍS 2015
Saúde e Ambiente Rodrigues
Grupo de Pesquisa Adeir Archanjo da UFGD - DOURADOS 2015
GESF - Saúde, Mota
Espaço e Fronteira(s)
LAGAS - Laboratório Helen Gurgel UnB - BRASÍLIA 2014
de Geografia,
Ambiente e Saúde
Laboratório de Rafael de Castro UFES - VITÓRIA 2020
Geografia da Saúde Catão
Tratamento da Paulo Fernando Braga PUC MINAS - BELO HORIZONTE 2018
Informação Espacial Carvalho
DemSA: Democracia, Juliana Pereira da UFU - UBERLÂNDIA 2019
Saúde e Ambiente Silva Faquim
Labvirus.UFU.MG JonnyYokosawa UFU - UBERLÂNDIA 2018
Vigilância em Saúde Boscolli Barbosa UFU - UBERLÂNDIA 2013
Ambiental Pereira
LABOCLIMA - Francisco de Assis UFPR - CURITIBA 2014
Laboratório de Mendonça
Climatologia
LASA - Laboratório de Renata Libonati dos UFRJ - RIO DE JANEIRO 2015
Aplicações de Santos
Satélites Ambientais
LMI- Sentinela | Emmanuel Roux IRD - Institut de 2017
Laboratório Misto recherchepourledéveloppement -
Internacional RIO DE JANEIRO
Núcleo de Fiocruz - Fundação Fiocruz - Fundação Oswaldo Cruz 1994
Geoprocessamento Oswaldo Cruz - RIO - RIO DE JANEIRO
DE JANEIRO

60
PEREIRA, E.H.X.; PEREIRA, M.P.B. situação do grupo de pesquisa em geografia para promoção da saúde em relação aos grupos de
pesquisa em geografia e saúde no Brasil. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e
desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.54-70. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

QUADRO 2: GRUPOS DE PESQUISA DE GEOGRAFIA DA SAÚDE (CONT.)

NOME DO GRUPO LÍDER (ES) SEDE (UNIVERSIDADE) ANO DE


CRIAÇÃO
Geotecnologias na Carolina Larrosa De IFRS - INSTITUTO FEDERAL DO 2013
Gestão Municipal Oliveira Claro RIO GRANDE DO SUL - RIO
GRANDE
Grupo de Pesquisa Eduardo Augusto IFC - INSTITUTO FEDERAL 2014
Multidisciplinar em Werneck Ribeiro CATARINENSE - SÃO
Ciências e FRANCISCO DO SUL
Geotecnologias
LiSS - Laboratório de Antonio Miguel Vieira INPE - Instituto Nacional de 2010
investigação em Monteiro Pesquisas Espaciais - SÃO JOSÉ
sistemas DOS CAMPOS
socioambientais
EU&S - Espaço Lígia Vizeu Barrozo USP - SÃO PAULO 2016
Urbano e Saúde
NEFRONS - Núcleo Paulo Peiter Fiocruz - Fundação Oswaldo Cruz 2012
de Estudos sobre
Fronteirase Saúde
Laboratório de Samuel do Carmo UFU - Universidade Federal de 1998
Geografia Médica e Lima Uberlândia
Vigilância em Saúde
Fonte: Magalhães e Pereira (2017); Plataforma Lattes/ Diretório de Grupos de Pesquisa (2020);
Organização: PEREIRA, EHX (2020).

Nota-se que a criação de grupos de pesquisa nesta área da Geografia ainda é


crescente e mais da metade foi fundado após o ano de 2010, tendo um pico entre os anos
de 2013 e 2018 (gráfico 2).

Gráfico 2: Quantidade de Grupos de Pesquisa criados por ano.

QUANTIDADE DE GRUPOS DE
PESQUISA CRIADOS POR ANO
8
6
4
QUANTIDADE DE
2
GRUPOS DE PESQUISA
0
CRIADOS

Organização: PEREIRA, EHX (2020).

61
PEREIRA, E.H.X.; PEREIRA, M.P.B. situação do grupo de pesquisa em geografia para promoção da saúde em relação aos grupos de
pesquisa em geografia e saúde no Brasil. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e
desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.54-70. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Além deste notório, e recente, crescimento do número de grupos de pesquisa


em Geografia da Saúde, também é explícito que existe uma grande concentração de grupos
de pesquisa nos estados da região Sul e Sudeste do Brasil (Gráfico 3)

GRÁFICO 3: DISTRIBUIÇÃO DOS GRUPOS DE PESQUISA DE GEOGRAFIA DA SAÚDE


NO BRASIL POR REGIÃO.

QUANTIDADE DE GRUPOS DE
PESQUISA
CENTRO-
OESTE
SUL 16%
25% NORDESTE
SUDESTE NORTE 6%
41% 12%

Organização: PEREIRA, EHX (2020).

EXPERIÊNCIAS EXITOSAS DOS GRUPOS DE PESQUISA NA ÁREA DA GEOGRAFIA


DA SAÚDE E AFINS:

Depois de realizada a busca por grupos de pesquisa de Geografia da Saúde, foi


feita uma análise detalhada de cada um dos grupos de pesquisa encontrados com a
finalidade de encontrar sites, blog ou redes sociais de cada grupo de pesquisa, visto que
nestes locais virtuais pode conter informações adicionais sobre os respectivos grupos.
Entretanto, nem todos os grupos pesquisados possuem sites próprios, dificultando assim o
acesso à informação sobre eles. Contudo, dos grupos que foi possível obter informações, foi
notável que a maioria costuma realizar eventos e atividades extras, além da pesquisa
desenvolvida por eles, como: minicursos, seminários e eventos amostras regionais (quadro
3).

62
PEREIRA, E.H.X.; PEREIRA, M.P.B. situação do grupo de pesquisa em geografia para promoção da saúde em relação aos grupos de
pesquisa em geografia e saúde no Brasil. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e
desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.54-70. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

QUADRO 3: GRUPOS DE PESQUISA DE GEOGRAFIA DA SAÚDE QUE ESTÃO


LIGADOS A REDES SOCIAIS.

NOME DO GRUPO EMAIL SITE FACE INSTA YOUT


BOOK GRAM UBE
Saúde Coletiva e Geografia da dutradenecir@gmail.com NÃO NÃO NÃO NÃO
Saúde
SIGSaúde - Geografia e Análise emer@ufmt.br NÃO NÃO NÃO NÃO
Espacial em Saúde
Violências, Direitos Humanos e NÃO NÃO NÃO NÃO NÃO
Geografia da Saúde -
GEOSVIDIH
ANÁLISE ESPACIAL, NÃO NÃO NÃO NÃO NÃO
GEOAMBIENTE E SAÚDE -
GEO SAÚDE
GREGS_UEM eugeniaguart@hotmail.c NÃO NÃO NÃO NÃO
om
Grupo de Pesquisa Geografia e jane.friestino@uffs.edu.b NÃO NÃO NÃO NÃO
Saúde GeoSaúde r
NOME DO GRUPO EMAIL SITE FACEB INSTA YOUTU
OOK GRAM BE
Laboratório de Epidemiologia, NÃO NÃO NÃO NÃO NÃO
Territorialidade e Sociedade -
LETS
Núcleo de Pesquisa em rivaldofaria.geo@gmail.c NÃO SIM NÃO NÃO
Geografia da Saúde - NePeGS om
Grupo de Pesquisa em mpbcila@yahoo.com.br https://www.prosa NÃO SIM NÃO
Geografia para Promoção da udegeo.com.br/
Saúde - Pró-saúde Geo
Laboratório de Biogeografia e raul@fct.unesp.br http://biogeos.fct.u SIM NÃO NÃO
Geografia da Saúde - BioGEOS nesp.br/
Política, Avaliação e Gestão em ufprsaudecoletiva@gmail http://www.saude. NÃO NÃO NÃO
Saúde (PAGS) .com ufpr.br/portal/pags
/
Geografia da Saúde e Vigilância nelcionaygeo@gmail.co NÃO NÃO NÃO NÃO
Socioambiental m
GeoSaúde Manaus grupogeosaude.manaus NÃO SIM NÃO NÃO
@gmail.com
Climatologia Geográfica e juliana@ufg.br https://climageo.ie NÃO NÃO NÃO
interfaces com a saúde sa.ufg.br/p/20438-
grupos-de-estudo
Grupo de Pesquisa Saúde e zmarita@usp.com NÃO NÃO NÃO NÃO
Ambiente
Grupo de Pesquisa GESF - gesf.ufgd@gmail.com NÃO SIM NÃO SIM
Saúde, Espaço e Fronteira(s)
LAGAS - Laboratório de lagas@unb.br http://lagas.unb.br SIM SIM SIM
Geografia, Ambiente e Saúde /
Laboratório de Geografia da labgeosaudeufes@gmail. NÃO SIM SIM SIM
Saúde com
Tratamento da Informação contato@nis.org.br http://nis.org.br/ NÃO NÃO NÃO
Espacial

63
PEREIRA, E.H.X.; PEREIRA, M.P.B. situação do grupo de pesquisa em geografia para promoção da saúde em relação aos grupos de
pesquisa em geografia e saúde no Brasil. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e
desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.54-70. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

QUADRO 3: GRUPOS DE PESQUISA DE GEOGRAFIA DA SAÚDE QUE ESTÃO


LIGADOS A REDES SOCIAIS (CONT.)

NOME DO GRUPO EMAIL SITE FACE INSTA YOUT


BOOK GRAM UBE
DemSA: Democracia, julianafaquim@ufu.br NÃO NÃO NÃO NÃO
Saúde e Ambiente
Labvirus.UFU.MG jonny.yokosawa@ufu.b NÃO NÃO NÃO NÃO
r
Vigilância em Saúde boscolli86@hotmail.co NÃO NÃO NÃO NÃO
Ambiental m
LABOCLIMA - chico@ufpr.br http://www.terra.ufpr. SIM SIM NÃO
Laboratório de br/portal/laboclima/
Climatologia
LASA - Laboratório de eugeniaguart@hotmail. https://lasa.ufrj.br/ SIM SIM NÃO
Aplicações de Satélites com
Ambientais
LMI- Sentinela | emmanuel.roux@ird.fr http://lmi- NÃO NÃO NÃO
Laboratório Misto sentinela.unb.br/
Internacional
Núcleo de xris@fiocruz.br https://www.icict.fiocr NÃO NÃO NÃO
Geoprocessamento uz.br/nucleo-de-
geoprocessamento/
Geotecnologias na geotecnologias@riogra NÃO NÃO NÃO NÃO
Gestão Municipal nde.ifrs.edu.br
Grupo de Pesquisa Eduardo.ribeiro@ifc.ed NÃO NÃO NÃO NÃO
Multidisciplinar em u.br
Ciências e
Geotecnologias
LiSS - Laboratório de miguel@dpi.inpe.br http://www.obt.inpe.br NÃO NÃO NÃO
investigação em /OBT/assuntos/labora
sistemas torios/LiSSLaboratrio
socioambientais deInvestigaesSocioa
mbientais.pdf
EU&S - Espaço lija@usp.br https://espacourbano NÃO NÃO NÃO
Urbano e Saúde esaude.iea.usp.br/
NEFRONS - Núcleo de paulopeiter@gmail.com NÃO NÃO NÃO NÃO
Estudos sobre
Fronteirase Saúde
Laboratório de samuel@ufu.br http://lagem.blogspot. NÃO NÃO NÃO
Geografia Médica e com/p/pesuisadores.h
Vigilância em Saúde tml
Fonte: LAGAS (2020)/ Pesquisa ampla na internet com os nomes dos grupos de pesquisa (2020);
Organização: PEREIRA, EHX (2020).

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PEREIRA, E.H.X.; PEREIRA, M.P.B. situação do grupo de pesquisa em geografia para promoção da saúde em relação aos grupos de
pesquisa em geografia e saúde no Brasil. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e
desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.54-70. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Com base no quadro 3, observa-se que dos 32 (trinta e dois) grupos de pesquisa de
Geografia da Saúde apenas 13 (treze) deles possuem um site ou blog específico do grupo,
e apenas 9 (nove) grupos fazem uso, de pelo menos uma das principais mídias sociais
digitais (Facebook, Instagram, Youtube) e os demais grupos de pesquisa possuem apenas o
e-mail de contato do líder do grupo, e os seus dados vinculados ao DGP da plataforma
Lattes.

A partir desse ponto, foi feita uma análise das redes sociais desses grupos de
pesquisa com a finalidade de descobrir qual o tipo de conteúdo eles vinculam em suas redes
sociais. Então, foi notório que todos os canais do Youtube fazem transmissão de lives com
discussões de temas da Geografia e da Saúde, essas lives consistem em mesas redondas,
reuniões do grupo de pesquisa e palestras.

Em relação às publicações vinculadas no Facebook e no Instagram, elas possuem


certo padrão. Em sua maioria, são divulgados banners de eventos, congressos, vídeos
sobre temas de interesse do grupo, resultados das pesquisas desenvolvidas pelo grupo,
notícias do mundo acadêmico e científico, e da atualidade.

O PRÓ-SAÚDE GEO E SUAS CONEXÕES:

No decorrer da pesquisa percebeu-se que alguns grupos de pesquisa possuíam


relações entre si pelo fato de que, em algum momento, os seus líderes já se tiveram contato
ao trabalhar juntos em algum projeto, pesquisa, troca de experiências exitosas entre outros
fatores que permitiram que tal encontro ocorresse. A partir disso, estas conexões remeteram
ao conceito de relê desenvolvido por Fontes e Martins (2004) que, em síntese, afirma que
um indivíduo possui a tendência de se relacionar com outros e formar círculos de trocas de
informações, e então este indivíduo pode participar de uma ou mais círculos e até mesmo
criar conexões formando, assim, um complexo sistema de redes sócias que está em um
constante processo de renovação.

Quando aplicamos esse conceito ao objeto de estudo desta pesquisa, percebe-


se que existe uma grande conexão entre os grupos de pesquisa de Geografia da Saúde no
Brasil (fluxograma 1). Esta rede é composta por alguns grupos, que podem ser
denominados de centrais e dos demais grupos denominados de periféricos. Nesta rede, os
grupos centrais são aqueles que possuem mais conexões com os demais grupos de
pesquisa, já os grupos periféricos são os demais que constituem essa rede, entretanto, vale
salientar que existem alguns grupos de pesquisa que estão fora deste círculo de troca por
não possuírem nenhuma relação com qualquer outro grupo de pesquisa. Também é
importante mencionar o fato de que um grupo considerado periférico não precisa ter relação
direta com um determinado grupo central, pois os grupos periféricos também podem estar
conectados entre si e, assim, formam novas conexões, redes e círculos de troca.

65
PEREIRA, E.H.X.; PEREIRA, M.P.B. situação do grupo de pesquisa em geografia para promoção da saúde em relação aos grupos de
pesquisa em geografia e saúde no Brasil. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e
desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.54-70. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Fluxograma 1: Fluxograma das principais redes de grupos de pesquisa de Geografia da


Saúde no Brasil.

Organização: PEREIRA, EHX (2020).

Com base neste fluxograma 1, nota-se que três grupos de pesquisa constituem
no topo da rede, sendo assim os grupos centrais, são eles: Grupo de Pesquisa
Multidisciplinar em Ciências e Geotecnologias (cor azul), o LAGAS (cor amarelo), e o
BioGEOS (cor vermelho). Cada um desses grupos possuem suas próprias conexões com
outros grupos de pesquisa (representados pelas linhas de suas respectivas cores),
entretanto, alguns grupos periféricos (cor cinza) possuem conexão com dois grupos centrais
simultaneamente, a exemplo temos o caso do Pró-SaúdeGeo, que está conectado tanto
com o BioGEOS quanto com o Grupo de Pesquisa Multidisciplinar em Ciências e
Geotecnologias, e que por sua vez possui a sua própria rede de conexão (fluxograma 2)
com outros grupos de pesquisa.

66
PEREIRA, E.H.X.; PEREIRA, M.P.B. situação do grupo de pesquisa em geografia para promoção da saúde em relação aos grupos de
pesquisa em geografia e saúde no Brasil. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e
desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.54-70. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Fluxograma 2: Fluxograma da rede do grupo Pró-SaúdeGeo.

Organização: PEREIRA, EHX(2020).

Salienta-se que no fluxograma1está representado apenas os grupos de


pesquisa que possuem ligação direta com os grupos centrais, existem outros grupos de
pesquisa que fazem parte desta rede nacional de Geografia da Saúde, (quadro 4) e que
possuem as suas próprias redes e ligações com outros demais grupos de pesquisa.

Quadro 4: Mostra de todos os grupos de pesquisa conectados à rede.*

GRUPO DE PESQUISA QUANTIDADE DE LIGAÇÕES DE SUA UF


REDE
Grupo de Pesquisa Multidisciplinar em Ciências e 10 SC
Geotecnologias
LAGAS 8 DF
BioGEOS 6 SP
LABOCLIMA 5 PR
Pró-saúde Geo 4 PB
NePeGS 4 RS
Núcleo de Geoprocessamento 4 RJ
SIGSaúde 3 MT
GeoSaúde (UFFS) 3 SC
Grupo de Pesquisa Saúde e Ambiente 3 MA
Laboratório de Geografia da Saúde 3 ES
Climatologia Geográfica e interfaces com a saúde 2 GO
GESF 2 MS
LMI 2 RJ
LiSS 2 SP
EU&S 2 SP
Saúde Coletiva e Geografia da Saúde 1 PR
GREGS_UEM 1 PR
Geotecnologias na Gestão Municipal 1 RS
Organização: PEREIRA, E. H. X. (2020).

*Nota: no quadro só está listado 19 do total de 32 grupos de pesquisa, pois nos demais não foi
observado nenhuma conexão com qualquer outro grupo registrado na internet.

67
PEREIRA, E.H.X.; PEREIRA, M.P.B. situação do grupo de pesquisa em geografia para promoção da saúde em relação aos grupos de
pesquisa em geografia e saúde no Brasil. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e
desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.54-70. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Como observado no quadro 5, 12 (doze) dos 19 (dezenove) grupos de pesquisa


que possuem uma rede pequena estando conectado diretamente com apenas 3 (três) outros
grupos. Entretanto, isso não significa que essas “minis redes” tenham pouca circulação e
troca de informações visto que, indiretamente, todos esses 19 (dezenove) grupos de
pesquisa estão conectado na rede principal de grupos de Geografia da Saúde do Brasil.

SÍNTESE TEÓRICA: A ESTRUTURA DAS REDES SOCIAIS

O conceito de Redes não é um conceito novo, nem tampouco a preocupação em


compreendê-lo, pois segundo a autora Dias (1995) os primeiros trabalhos científicos
realizados no qual este conceito começou a surgir datam do século XIX na França, mais
precisamente em 1863, quando um engenheiro desenvolveu um esforço de teorização de
redes, com base na rede ferroviária da França.

No pós segunda guerra mundial, a aceleração da urbanização, a redefinição da


divisão internacional do trabalho, as novas articulações funcionais e mudanças na rede
urbana fez surgir a discussão sobre a rede urbana (CORREIA, 1989).

Enquanto isso, no Brasil este conceito tem seu primeiro registro no trabalho de
Pierre Monbeing que em 1952 escreveu sobre o papel das redes ferroviárias e a
organização espacial da região produtora de café do estado de São Paulo. Ao longo dos
anos este conceito foi evoluindo, sendo aprimorado e aplicado em diversas áreas da Ciência
em especial nas Ciências Humanas, mesmo após um breve período de estagnação de seu
desenvolvimento de cerca de 30 anos (DIAS, 1995) retornando ao centro dos debates
científicos no final do século XX. Com o advento e as complexidades do processo de
globalização, a questão das redes adquiriu novas funções e processos, dentre os quais Dias
(1995) afirma que eles são processos de múltiplas ordens, de integração e de
desintegração, pois as redes atualmente, em sua maioria, objetivam integrar as diversas
localidades do mundo ao mesmo tempo em que fazem a exclusão de outros vários pontos
superfícies do globo.

Dentre as ramificações e aplicações do conceito de Redes, tem-se a rede social


que segundo Martins e Fontes (2004) a rede social é um objeto que responde à
complexidade da Teoria Social. Esta teoria da rede social possui a necessidade de explicar
o fato social a partir de “uma injunção coletiva que se impõe às vontades individuais (mesmo
que esta injunção não elimine a liberdade dos atores de participarem de diversos círculos de
trocas)” (MARTINS E FONTES, 2004, p. 22,).

Como afirmado por Martins e Fontes (2004) que a rede social se sobrepõe às
vontades individuais, entretanto não as elimina dando-lhes espaço para estar presente em
outros tipos de redes. Este conceito explica que o indivíduo possui a tendência de estar
conectado a diferentes círculos de troca, em que esta ação permite a criação de novas
redes a partir das antigas que, por sua vez, se renovam com uma determinada frequência e
assim tanto as antigas redes quanto as novas possuem a capacidade de se expandir e de

68
PEREIRA, E.H.X.; PEREIRA, M.P.B. situação do grupo de pesquisa em geografia para promoção da saúde em relação aos grupos de
pesquisa em geografia e saúde no Brasil. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e
desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.54-70. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

se renovar constantemente, originando uma grande e complexa rede social. Corrêa (2018)
já apresenta o conceito de redes geográficas de forma semelhante às redes sociais, porém
acrescenta que seriam redes sociais especializadas, que envolvem poder, cooperação e
relações sociais de toda ordem e em várias esferas da vida. Algo parecido com o que ocorre
com as redes encontradas, são várias as formas de contribuição entre um grupo e outro e
entre os vários grupos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS.

Com base nos resultados alcançados percebe-se que a criação dos grupos de
pesquisa de Geografia da Saúde no Brasil acompanha a evolução desta área da Geografia,
e que ainda está em uma fase de constante expansão de suas atividades científicas e
acadêmicas por todo o país. Também é notório que existe uma grande rede nacional no
qual a maioria dos grupos de pesquisa, dessa área, estão conectados neste círculo de troca
de experiências em seus trabalhos realizados, e de ideias, temas e novas metodologias que
estão sendo aplicadas nesses trabalhos.

Por fim, é notável que o Pró-SaúdeGeo possui uma boa conexão com os outros
grupos de pesquisa do país, dentre eles estão alguns grupos centrais, como outros grupos
periféricos. Esta rede do Pró-SaúdeGeo também se deve ao fato de que ele possui o seu
próprio círculo de trocas, e por ser um grupo relativamente antigo se comparado a maioria, o
que lhe proporcionou desenvolver uma estrutura mais consolidada e experiência com os
seus trabalhos e atividades já desenvolvidas.

AGRADECIMENTOS

A Deus pela oportunidade de realizar a pesquisa e ter sido concluída. Ao CNPq


pelo apoioa existência do PIVIC e aos integrantes dos grupos de pesquisa Pró-Saude Geo e
Gids.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Plataforma lattes: Diretórios de Grupos de Pesquisa. Brasília – DF: CNPQ/


Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, 2019, 1p. Disponível em:
lattes.cnpq.br/web/dgp/o-que-e/. Acesso em 06 de junho de 2019.

CORRÊA, Roberto Lobato. A rede urbana. São Paulo – SP: Ática, 1989, 96p.

CORRÊA, Roberto Lobato. Caminhos paralelos e entrecruzados. São Paulo - SP:


EDUNESP, 2018, 321p.

69
PEREIRA, E.H.X.; PEREIRA, M.P.B. situação do grupo de pesquisa em geografia para promoção da saúde em relação aos grupos de
pesquisa em geografia e saúde no Brasil. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e
desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.54-70. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

DIAS, L. C. Redes: emergência e organização. In: Geografia: conceitos e temas. Rio


de Janeiro: Bertrand Brasil, 1995, p.141-162.

MAGALHÃES, Sandra Célia Muniz; PEREIRA, Martha Priscila Bezerra. Pesquisa e


extensão em Geografia da Saúde: entre a teoria e a prática. Montes Claros – MG:
Editora UNIMONTES, 2017, 251p.

MARTINS, P. H.; FONTES, B.. Redes sociais e saúde: novas possibilidades


teóricas. Recife: Ed universitáia UFPE, 2004.

PEREIRA, Martha Priscila Bezerra. PRÓ-SAÚDE GEO: estreitando laços entre o espaço e
a saúde. Disponível em: www.prosaudegeo.com.br. Acesso em 07 de junho de 2019.

PROJETO PEDAGÓGICO DO CURSO DE GEOGRAFIA. Campina Grande – PB: Unidade


Acadêmica de Geografia/ Centro de Humanidades/ Universidade Federal de Campina
Grande, 2018, 81p.

70
GONZAGA, E.A.R.; LIMA, S. C. Determinação social à luz do realismo crítico e da totalidade. In. Simpósio Nacional de Geografia da
Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande:
UFCG, 2021. p.71-84. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

DETERMINAÇÃO SOCIAL DA SAÚDE À LUZ DO REALISMO CRÍTICO E DA


TOTALIDADE

GONZAGA, Eunir Augusto Reis 1


LIMA, Samuel do Carmo 2

RESUMO:

A saúde é um tema que vem historicamente sendo tratado a partir de uma perspectiva
hospitalocêntrica, que privilegia os aspectos biológicos em detrimento dos aspectos sociais.
No entanto, como a saúde é resultado do modo de vida das pessoas, sendo esse, por sua
vez, determinado pela realidade social, é necessário considerar essa questão em sua
historicidade. Para isso, propõe-se um método dialético, que considere os contextos em uma
totalidade, e rompa com a lógica funcionalista sob a tutela do modelo biomédico de saúde.
Nele, não se pensa a saúde a partir de influências que afetem exclusivamente o corpo, mas
sim em como o corpo se insere na vida e no contexto de sua existência. Isso pode ser
explicado pela teoria da determinação social da saúde, que aqui apresentamos. A partir deste
ponto de vista, o ensaio científico visa compreender, à luz do realismo crítico, de que forma é
possível propor um novo paradigma não apenas para a epidemiologia, mas para quaisquer
disciplinas, o que é um desafio, porque envolve um embate que além de teórico, também é
político e ideológico.

Palavras-chave: determinação social; realismo crítico; saúde; totalidade.

ABSTRACT:

Health as an object of research is normally treated in a hospital-centric view, in which biological


aspects are privileged at the cost of social ones. But health is the result of the way of life a
person has, and this by its turn a result of the social reality. For this reason, we have to consider
history. To do that, we propose a dialectical method that considers people's contexts as a
totality, leaving the functional logic prevalent in the biomedical model of health. This can be
explained by social determination theory hereby explained. From this point of view, this essay
is an attempt to understand through critical realism which way can we build a new paradigm

1
Estudante de pós-graduação em Geografia na UFU; eunir@ufu.br
2
Docente do Instituto de Geografia na UFU; samuel@ufu.br

71
GONZAGA, E.A.R.; LIMA, S. C. Determinação social à luz do realismo crítico e da totalidade. In. Simpósio Nacional de Geografia da
Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande:
UFCG, 2021. p.71-84. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

for epidemiology and other sciences. This is a challenge, not only for theoretical reasons but
also for political and ideological ones.

Keywords: social determination; critical realism; health; wholeness.

INTRODUÇÃO

A saúde pública, iniciada no século XVIII, consolidou-se no século XX a partir de


um paradigma epidemiológico pautado no funcionalismo empírico, ou seja, um olhar para o
processo saúde-doença como resultado da ação de fatores e variáveis do ambiente,
primeiramente pela influência dos miasmas e depois pela exposição aos micro-organismos
patógenos, porque o que mais adoecia e matava as pessoas eram as doenças infecciosas.
No princípio, buscava-se uma causa para a doença. Era o início da microbiologia,
que procurava pela lente do microscópio qual era o micro-organismo que deveria ser
incriminado pelo adoecimento ou morte do indivíduo. Depois, a causa era definida por três
fatores, a tríade causal: o patógeno, o hospedeiro e o ambiente. Nota-se que os fatores são
todos biológicos. Já na metade do século XX, incorporam-se outros fatores e tem-se a
multicausalidade, incorporando inclusive fatores sociais, que são colocados como
externalidades ao sistema de causação, porque o modelo continua sendo o de determinação
biológica, ainda sob a tutela do modelo biomédico de saúde. O que pode parecer
complexidade é na verdade simplificação da realidade. As múltiplas causas selecionadas são
colocadas em modelos estatísticos multifatoriais, agrupando e ordenando variáveis para
identificar aquelas mais fortemente correlacionadas, para que uma delas possa ser
responsabilizada.
Como reação ao modelo biomédico de saúde, surge nos anos de 1960 a teoria
dos determinantes sociais da saúde, indicando que o processo saúde-doença é o resultado
de múltiplos fatores, sociais, econômicos, culturais, ambientais e genético/biológicos.
Segundo Carvalho (2012), em relação ao modelo biomédico, o modelo dos determinantes
sociais da saúde é uma evolução, porque desloca o foco da questão dos fatores biológicos
para os fatores sociais. Mas ainda se mantém fatorial, e essa epistemologia positivista
continua funcionalista e, por isso mesmo, fragmentária. O pensamento funcionalista é linear,
organizado a partir do relacionamento de causas, que são diagnosticadas por fatores
categorizáveis.
Segundo esse modelo, é possível traçar uma relação causal, por exemplo, entre
a pobreza e a saúde, observando que as pessoas com menor renda podem apresentar
maiores índices de adoecimento. No entanto, é preciso ter em mente que tudo o que acontece

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GONZAGA, E.A.R.; LIMA, S. C. Determinação social à luz do realismo crítico e da totalidade. In. Simpósio Nacional de Geografia da
Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande:
UFCG, 2021. p.71-84. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

à volta do indivíduo o afeta, inclusive o lugar onde ele vive. É preciso transcender a
identificação de causas e buscar novas formas de compreender esta problemática.

O principal desafio dos estudos sobre as relações entre determinantes


sociais e saúde consiste em estabelecer uma hierarquia de
determinações entre os fatores mais gerais de natureza social,
econômica, política e as mediações através das quais esses fatores
incidem sobre a situação de saúde de grupos e pessoas, já que a
relação de determinação não é uma simples relação direta de causa-
efeito (BUSS; PELLEGRINI, 2007, p.81).

Corrobora com esse desafio o fato de os profissionais que reconhecem, lidam e


tratam as doenças serem formados sob a ótica do binômio “saúde x doença”, ou seja, a
formação dessas pessoas não direciona seus olhares para a vida, mas sim para as
enfermidades, o que justifica a necessidade de se desconstruir o modelo funcionalista, que é
baseado em fatores categorizáveis, como citado anteriormente. Nessa perspectiva, contrária
ao pensamento empírico e higienista, mais especificamente no ano de 1974:

[...] a Conferência Mundial da Saúde de Alma-Ata, na República do


Cazaquistão, marcava uma posição, de que a saúde é equivalente a
qualidade de vida e que para elevar o nível de saúde da população é
necessário reduzir as iniquidades, as desigualdades e a exclusão social,
a partir do desenvolvimento local e comunitário com ações de saúde
primária (LIMA; LIMA, 2020, p.7)

De fato, é possível perceber uma busca continuada pela compreensão da saúde3,


que além de ser comunitária, também contemplasse a justiça social. Por este caminho, a partir
da segunda metade do século passado, pesquisadoras e pesquisadores retomaram o debate
filosófico, metodológico, pragmático e teórico sobre os conceitos correlatos à saúde e também
às enfermidades, até que, em meados dos anos de 1970, formatou-se uma ideia de
epidemiologia social, centrada em três pressupostos: a reprodução social; a relação entre a
sociedade e a natureza; e a determinação social da saúde.

3
Em 1946, talvez buscando alívio para o espírito depressivo do pós-guerra, a Organização Mundial
da Saúde (OMS) reinventou o nirvana, chamando-o de ‘saúde’: “estado de completo bem-estar físico,
mental e social” (ALMEIDA FILHO, 2011, p.7).

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GONZAGA, E.A.R.; LIMA, S. C. Determinação social à luz do realismo crítico e da totalidade. In. Simpósio Nacional de Geografia da
Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande:
UFCG, 2021. p.71-84. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

O primeiro pressuposto da epidemiologia social está relacionado à compreensão


de como se processam os sucessivos contextos para a reprodução social. Nesse sentido, a
situação de saúde da população em cada sociedade, em geral, está estreitamente relacionada
com seu modo de vida e com os processos que o reproduzem e transformam (PETTRES; DA
ROS, 2018, p.187). Assim, é preciso não apenas entender as desigualdades sociais, mas de
qual maneira elas afetam a vida das pessoas, tanto em termos de saúde ou de adoecimento,
como também pelas limitações existentes para se ter acesso aos serviços prestados por meio
de equipamentos públicos.
Para o segundo pressuposto, considerou-se neste estudo a relevância do espaço
geográfico como tema para compreender a relação entre a sociedade e a natureza, o que
inclui a historicidade. Na proposta de Milton Santos, o território em si não é uma categoria de
análise, mas sim outra, denominada pelo pesquisador como território usado. A partir desse
ponto de vista, quando quisermos definir qualquer pedaço do território, deveremos levar em
conta a interdependência e a inseparabilidade entre a materialidade, que inclui a natureza, e
o seu uso, que inclui a ação humana, isto é, o trabalho e a política (SANTOS, SILVEIRA, 2016,
p.247).
Todos os elementos acima compõem uma totalidade, na qual a soma das partes
resulta em algo maior do que o todo. A relação entre a sociedade e a natureza contempla nos
seus múltiplos aspectos a organização da sociedade, que determina o modo de vida das
pessoas. Esta relação inclui aspectos culturais, sociais e econômicos, que resultam em uma
condição que produz também um modo de adoecer, sendo os motivos deste adoecimento
determinados a partir do comportamento dos indivíduos. Trata-se da totalidade negligenciada
quando se separam os fatores, mas que afeta cada parte da realidade, no caso de análise
deste estudo, a própria saúde.
A ideia de epidemiologia social, pautada na reprodução da sociedade e na sua
relação com a natureza, leva em consideração um terceiro pressuposto: a saúde a partir da
determinação social. A promoção da saúde compreende a concepção ampliada de saúde e a
sua determinação social, dentre eles o enfrentamento dos fatores sociais, econômicos,
políticos e culturais, coletivos e individuais, entre outros, de maneira dinâmica, para favorecer
a qualidade de vida (PETTRES; DA ROS, 2018, p.193). Nesta organização da sociedade
existe uma relação com a natureza, na qual há uma predominância do sistema social sobre o
sistema natural, que deve ser compreendida a partir da noção de totalidade. Neste ínterim, a
saúde está determinada por um contexto que é a sociedade. Por conseguinte, na
determinação social não se considera apenas fatores, mas sim os múltiplos contextos.
Formatada a proposta acima, um caminho viável para a compreensão destes
pressupostos fundamentais parte de uma reflexão epistemológica baseada no realismo
crítico, com um olhar para a saúde direcionado à ideia de reprodução social, ou o modo de
viver, adoecer e morrer das pessoas em seus contextos de vida, alinhado à ideia de

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GONZAGA, E.A.R.; LIMA, S. C. Determinação social à luz do realismo crítico e da totalidade. In. Simpósio Nacional de Geografia da
Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande:
UFCG, 2021. p.71-84. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

determinação social da saúde, que rompe com o causalismo adotado pelos modelos clássicos
da epidemiologia para pensar além dos fatores, comumente nomeados como variáveis.
Ressalta-se que, por meio de uma concepção lógica funcionalista não se pode
perceber as relações da saúde que a viabilizem no contexto da vida. O conceito de promoção
da saúde é baseado na crítica ao modelo biomédico de atenção à saúde, que interpreta o
processo saúde-doença a partir de relações causais biológicas (LIMA; LIMA, 2020, p.7). Trata-
se, por conseguinte, de romper com esse modelo positivista, que reforça a relação da saúde
com fatores, com variáveis, e não com a vida em sua totalidade.
Para isso, é necessário ter em mente que a forma como a sociedade se organiza
determina de que maneira se vive, adoece e morre. Na atual conjuntura, considerando o
sistema capitalista vigente, há um contexto de vida negligenciado nas propostas
funcionalistas, que é o modo de vida precário das populações em vulnerabilidade social,
porque a epidemiologia clássica atende aos interesses das classes dominantes e funda-se no
comportamento individual e biológico, ou seja, considera que a saúde é atributo do corpo
biológico do indivíduo. Neste ângulo, observa-se que o social surge apenas como uma
influência sobre ele e o seu corpo. Romper com esta lógica funcionalista é o que se busca
neste trabalho, ou seja, não pensar a saúde a partir de influências externas, que afetam o
corpo, mas inserir o corpo e a vida no contexto de sua existência, o que pode ser explicado
pela teoria da determinação social da saúde.
A partir deste ponto de vista, propor um novo paradigma não apenas para a
epidemiologia, mas para quaisquer disciplinas, torna-se um desafio, porque envolve um
embate que além de teórico, também é político e ideológico. O presente estudo corrobora com
o questionamento norteador proposto por Almeida Filho (2011, p.9): “Como avançar em
direção a uma concepção integrada de saúde, contemplando a historicidade do conceito e
sua aplicabilidade como noção capaz de subsidiar processos de transformação das situações
e condições de saúde”?

O REALISMO CRÍTICO PARA COMPREENSÃO DA SAÚDE

Na perspectiva do realismo crítico, uma questão é a existência da saúde, que é


real e concreta, na qual suas partes se relacionam e há uma totalidade que afeta cada uma
dessas partes. Outra é a sua compreensão, ou seja, de que forma se dá a construção do
conhecimento sobre os seus contextos. Trata-se de olhar epistemologicamente a realidade
concreta, por meio de um método que busque compreender essa saúde como objeto, que ao
mesmo tempo é real, atual e empírico.

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GONZAGA, E.A.R.; LIMA, S. C. Determinação social à luz do realismo crítico e da totalidade. In. Simpósio Nacional de Geografia da
Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande:
UFCG, 2021. p.71-84. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Perceber a saúde a partir do realismo crítico vai além da relação linear causal, em
que os elementos são separados e classificados a partir de seus graus de influência.
Transcende o modo de produzir conhecimento empírico, no qual a realidade é dividida em
fatores, ou seja, em elementos relacionáveis que podem influenciar sobre o objeto de estudo,
tendo como causa a saúde.

No caso da Geografia, os conceitos devem nos aproximar ao máximo


das relações socioespaciais que concretamente coexistem ao longo do
processo dinâmico, complexo, contraditório e contínuo de produção do
espaço geográfico. Os conceitos são formulados para explicar
fenômenos e situações que existem, de fato, na realidade (TRINDADE
et al., 2017, p. 31).

No modo de construir conhecimento a partir do realismo crítico, a realidade


efetivamente é analisada sobre a sociedade e a natureza, como uma realidade total. A
realidade da saúde também é, sobretudo, uma realidade social, onde há a preeminência dos
elementos da sociedade sobre a natureza, ou seja, sobre as questões biológicas. Neste ponto,
é possível perceber a proximidade entre a proposta filosófica realista de Ram Roy Bhaskar e
o pensamento de Milton Santos, a partir da imposição do sistema social sobre a natureza.
Mas, é bom lembrar que o território da saúde não é aquele do higienismo do século XIX, mas
deve ser compreendido como uma totalidade, expressa por contextos de vida, historicamente
e socialmente produzido (LIMA; LIMA, 2020, p.9). Como consequências das ações da
sociedade no território usado, destacam-se poluição, superexploração de recursos,
degradação ambiental, entre outros, o que exige um olhar para a realidade de forma crítica,
envolvendo a sociedade e a natureza em suas totalidades.
É possível perceber a influência que cada elemento exerce sobre os outros
elementos que compõem uma determinada realidade. Uma análise cartesiana averigua esta
influência, no entanto, é um paradigma que não consegue perceber qual a relação que o todo
exerce sobre cada uma das partes. Este é o ponto de virada que o realismo crítico permite:
compreender a relação das partes com o todo, pois partindo-se da ideia de que o todo não
representa apenas a soma das partes, fica evidente que não é possível compreender a
relação entre a sociedade e a natureza a partir dessas partes.
Neste ponto, observa-se a importância da análise geográfica, por se tratar de uma
ciência que sintetiza e busca relacionar os elementos analisados. O desafio é gerar conexão
entre esses fatores, saindo da proposta de determinantes da saúde em busca da influência
que a totalidade promove, não apenas sobre os elementos que estão conectados, mas à rede
de saúde em que estão inseridos. Neste ponto, a análise em rede viabiliza a compreensão de

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que forma dois elementos mais próximos se afetam, e como sua influência diminui na medida
em que se tornam mais distantes.
Além disso, para compreender as causas de um determinado fenômeno é preciso
considerar a historicidade. Não é apenas o contexto atual que afeta o objeto de estudo, pois
há uma influência histórica, ou seja, um contexto passado que afeta as condições de saúde
agora, em uma comunidade. Em países com elevada desigualdade social, a maioria da
população encontra-se em situação de vulnerabilidade. É preciso conhecer desde os índices
de escolaridade, níveis de violência, desemprego, acesso a água potável, moradia adequada,
serviços públicos disponíveis, o que inclui transporte coletivo, áreas livres para lazer, unidades
básicas de saúde e outros equipamentos públicos, sem esquecer eventuais catástrofes
antrópicas ou naturais, para citar alguns elementos que compõem a historicidade no lugar
estudado.
A epidemiologia é objeto real e pode ser caracterizada por quatro situações, ou
movimentos: gênese e reprodução; a ordem social (condição atual); espacialidade
(localização, conexão); e a temporalidade, que é a história. Dessa forma, é preciso entender
que a totalidade não é apenas o contexto atual. Ela vincula as situações com a gênese, que
não é uma condição imutável, como se fosse uma fotografia. É um movimento, que determina
a reprodução espacial das relações humanas. Devido à espacialidade, é possível localizar as
conexões, ao mesmo tempo que essas são temporais, a partir das suas histórias em seus
contextos.
Porém, o todo, menos uma parte não é o tudo, e enquanto isso subsistir, não
existe o todo, senão duas partes desiguais: donde se deduz que a vontade de uma não é
geral com referência a outra (ROUSSEAU, 2016, p.49). Entende-se então que a saúde a partir
dos contextos se torna um desafio, devido ao fato de os métodos científicos mais utilizados
adotarem um modelo positivista, que separa as partes do objeto de estudo e busca
compreender a relação entre elas. É preciso pensar a complexidade, não elegendo partes
deste objeto como sendo de maior relevância, mas substituindo a procura pelas causas por
um entendimento dos contextos, em busca da totalidade.
Constata-se, nesse ínterim, que a organização da sociedade deve ser analisada,
no que se refere à saúde, juntamente com o contexto em que ela se apresenta. Quando se
analisa fatores isolados, criando relações entre eles em uma perspectiva funcionalista, as
estruturas sociais acabam sendo negligenciadas e o movimento histórico não é considerado
na análise. A sociedade se organiza, por exemplo, a partir do processo de acumulação e da
exclusão social, que produzem todas as situações de desigualdades que devem ser
analisadas em um embate político-ideológico, que para a manutenção do status quo acaba-
se evitando.

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GONZAGA, E.A.R.; LIMA, S. C. Determinação social à luz do realismo crítico e da totalidade. In. Simpósio Nacional de Geografia da
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Encontrar uma forma de associação que defenda e proteja a pessoa e


os bens de cada associação de qualquer força comum, e pela qual, cada
um, unindo-se a todos, não obedeça, portanto, senão a si mesmo,
ficando assim tão livre quanto dantes. Tal é o problema fundamental
que o contrato social soluciona (ROUSSEAU, 2016, p.28).

Assim, a estrutura social se impõe sobre cada indivíduo, e faz com que seus
comportamentos sejam determinados por esta imposição. Um arranjo epidemiológico
convencional, que é baseado em fatores (sobretudo fatores individuais), não incorpora os
processos sociais e coletivos. Para isso, é preciso uma proposta de pensamento que
contemple tanto os contextos quanto as realidades, considerando efetivamente a totalidade
epidemiológica, o que inclui o modo de vida e os comportamentos nos mais diversos
contextos. Entender a determinação social a respeito dessa temática é um dos alicerces deste
trabalho.
Nesse entendimento, para superar o modelo da tríade causal (agente etiológico,
ambiente e hospedeiro) e a determinação biológica das doenças, a epidemiologia clássica
acrescentou no estudo os fatores sociais, a partir de um modelo de análise denominado
multicausalidade. Reconhecendo a maior importância dos fatores sociais sobre os biológicos,
surge a ideia de determinantes sociais da saúde. Porém, ainda é mantida uma lógica linear,
que busca fatores isolados, relacionados em uma matriz para identificar a causa das
enfermidades.
Tal compreensão está de acordo com a crítica feita à epidemiologia dos fatores
de risco, que busca reduzir a realidade em fatores preditivos baseados em modelos
estatísticos (LIMA; LIMA, 2020, p.10). Um caminho é renegar esse pensamento e partir para
uma lógica dialética, por meio da qual considera-se o indivíduo dentro de um contexto, vivendo
em coletividade, onde os fatores não são os protagonistas da análise, mas o sistema social,
que inclui a natureza em sua totalidade.
Como dito anteriormente, a teoria da determinação social se apoia em três
categorias centrais, que estão vinculadas: a reprodução social, o protagonismo da sociedade
e da natureza, e a determinação social da saúde. Para compreender este vínculo por meio da
dialética, parte-se da compreensão da realidade além da relação existente apenas entre cada
uma dessas categorias, observando a relação do todo com essas partes. A totalidade afeta
as categorias, mas não somente umas sobre as outras, porque a dialética rompe com a
relação linear, ou seja, constrói e afeta cada uma dessas categorias de análise, o que remete
aos fatores de reprodução social.

DETERMINAÇÃO SOCIAL COMO ESTRATÉGIA PARA PROMOÇÃO DA SAÚDE


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UFCG, 2021. p.71-84. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

No Brasil, a Constituição Federal, promulgada no ano de 1988, definiu em seu Art.


196: A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e
econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso
universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação (BRASIL,
1988, s/p). A partir dessa definição, iniciou-se um movimento social no país, juntamente com
as instituições de pesquisa científica, na busca da compreensão da saúde, e também como
medi-la e promovê-la.

[...] esse movimento implica enorme demanda epistemológica


resultante de ampla pressão social, política, institucional e ideológica.
Para atendê-la de modo sério e responsável, o saber científico sobre
causas de doenças, que insiste em manter-se bio-médico-clínico em
forma e conteúdo, aparentemente pouco teria a contribuir (ALMEIDA
FILHO, 2011, p.9).

Desse modo, surge no país uma área de conhecimento denominada saúde


coletiva, que busca compreender a saúde, os adoecimentos e suas determinações sociais.
Trata-se de um campo de práticas orientadas para a promoção da saúde, que segundo Silva,
Paim e Schraiber (2014) contemplam também a prevenção dos adoecimentos e o cuidado
com as pessoas e suas enfermidades. Toma-se por objeto não apenas os indivíduos, mas,
sobretudo, a coletividade a partir dos grupos sociais, de maneira multiprofissional e
interdisciplinar.
No âmbito da práxis, a saúde coletiva deve participar ativamente na transição
epistemológica, começando por se contrapor radicalmente ao paradigma mecanicista e
individualizador hegemônico no campo (ALMEIDA FILHO, 2011, p.66). O pensamento
baseado em definições positivistas para os processos patológicos não consegue contribuir
para a compreensão da promoção da saúde, que surge a partir de um equilíbrio instável e
complexo. Enfim, qualquer tratamento heuristicamente eficiente da questão da saúde deverá
certamente ancorá-la em modelos explicativos de maior complexidade e em espectros
conceituais mais amplos (ALMEIDA FILHO, 2011, p.67).

O paradigma dos determinantes sociais é a perspectiva do sujeito


institucional, atuante no poder público ou em agências internacionais,
com o intuito de alcançar realizações técnicas (como os Objetivos do
Milênio) e se propõe a melhorar uma governança, corrigindo distorções

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UFCG, 2021. p.71-84. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

de grande impacto, ou estruturais, que ameacem a legitimidade da


ordem social vigente (BREILH, 2013, p.21, tradução própria).

Percebe-se que a ideia de metas (ou objetivos) é retificar quaisquer disformidades,


que por ventura possam deslegitimar a ordem vigente. Por este motivo, é necessário um
paradigma de determinação social que rompa com a ideia de construir estratégias para a
manutenção do status quo. No modelo vigente, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável
(ODS), assim como foram os Objetivos do Milênio, de fato são um avanço nos modelos de
governança, porque propõem uma visão alinhada aos determinantes de saúde. No entanto, é
preciso pensar além, para compreender os motivos pelos quais os sistemas econômicos
apresentam esse tipo de instrumento histórico para produção da igualdade entre as pessoas.
Na prática, o nome saúde é usado para designar atos ou ações que, no máximo, se
transformam em prestação de serviços. Há todo um campo de estudo “da saúde”, com um
olhar direcionado a estratégias para lidar com a doença, ou seja, há um processo de valoração
daquilo que é denominado saúde.

O paradigma etno-social corresponde a uma identidade acadêmica


crítica, ou seja, não considera o metabolismo sociedade-natureza como
parte da determinação. Enfatiza o poder explicativo dos modos de vida
e uma etnografia ligada à reprodução social (movimento da cultura de
vida socialmente determinada; destaca a noção probabilística de risco
no esquema explicativo; e assume assim como critério a transformação
do padrão de desigualdade e riscos (BREILH, 2013, p.21, tradução
própria).

A ideia da determinação social da saúde, portanto, trata-se de uma crítica a esse


metabolismo entre sociedade e natureza, a essa ordem social que determina modos de vida
que não são saudáveis, para atender aos interesses dos grupos de poder. No mundo pós-
guerra, a abordagem espacial da saúde coletiva será relegada ao segundo plano, com o
deslocamento do enfoque ecológico para o debate a respeito do estilo de vida, enquanto
conjunto de comportamentos, hábitos, atitudes dos diferentes segmentos sociais
(GUIMARÃES, 2015, p.33). Trata-se, portanto, de uma ideia revolucionária, que questiona
além da manutenção da ordem, alinhada aos interesses econômicos, pautada em corrigir
distorções para manter essa ordem social vigorante.
De acordo com as informações apresentadas no Quadro 1, existe a sociedade em
geral, os modos de vida dos grupos que estão relacionados com essa organização da
sociedade, e há também os estilos de vida individuais, que estão determinados pelos modos
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de vida, ou seja, o indivíduo não escolhe o seu estilo de vida. Não se trata de uma escolha
pessoal: há uma história de vida, hábitos e influência dos grupos sociais aos quais ele
pertence. Os estilos de vida dos indivíduos são determinados pelos modos de vida já
estabelecidos.

Quadro 1 – Perfil Epidemiológico.


Processos de proteção Processos destrutivos
/ suportes / valores / insalubres / contravalores

Sociedade em Geral Processos de cooperação; Lógica de acumulação;


complementação; dominação e alienação;
Metabolismo S-N4 protegido Metabolismo S-N destrutivo

Modos de Vida (Grupos) Processos saudáveis no modo Processos insalubres ou


de vida patogênicos no modo de vida

Estilos de vida (Individuais) Processos saudáveis no estilo Processos insalubres ou


de vida patogênicos no estilo de vida

Psiquismo (Organismo) Fisiologia Fisiopatologia


(Bem-estar e Decisão) (Mal-estar e Frustração)
Fonte: Adaptado de Breilh (1977), com tradução própria.

A partir do entendimento deste perfil, é possível perceber que o modo como uma
pessoa age e se comporta tem relação com o grupo social do qual ela faz parte. Entende-se
por grupos as pessoas com quem os indivíduos trabalham ou estudam nos mesmos lugares,
ou então os encontros religiosos, as práticas de esportes coletivas, os grupos formados por
seus amigos e familiares, entre outros, que influenciam suas atitudes, ou seja, o seu
comportamento foi determinado por estes grupos sociais.

A situação de saúde dos indivíduos e populações é determinada pelo


modo de vida, que, primeiramente, representa o estilo de vida, que não

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S-N é um acrograma utilizado em diversos trabalhos de James Brailh, ao se referir à relação existente entre o
sujeito (S) e a natureza (N).

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depende da vontade dos indivíduos. É uma construção social da cultura


do grupo social no qual o indivíduo está inserido. De outra parte,
depende também das circunstâncias de vida que representam as
condições socioeconômicas da existência do indivíduo. Portanto, as
condições de vida e o estilo de vida são determinações sociais do
cotidiano, que, por meio do hábito e das normas sociais, moldam
comportamentos que, em última análise, determinam a situação de
saúde de uma população (RAMOS; LIMA; SILVA, 2018a, p.177).

O comportamento do indivíduo, portanto, é construído socialmente, a partir das


suas relações. Está vinculado à sua história de vida e aos seus hábitos, que são formados ao
longo do tempo e são frutos de sua relação com os grupos sociais, primeiramente, ao núcleo
familiar. Desde quando o sujeito nasce ele incorpora hábitos e comportamentos de pais, mães,
irmãos e pessoas ligadas à família, em outros graus de parentesco ou laços afetivos. Na
medida em que sua idade avança, suas relações são ampliadas por meio do relacionamento
com amigos e pessoas com quem interagem na escola, por exemplo, de forma que não
escolhem o comportamento adotado, ou seja, os seus próprios valores.

TOTALIDADE COMO PROXY DE REALIDADE

Como se pôde ver, o conflito entre saúde pública e medicina e entre os enfoques
biológico e social do processo saúde-doença estiveram no centro do debate sobre a
configuração desse novo campo de conhecimento, de prática e de educação (BUSS;
PELLEGRINI, 2007, p.79). É preciso desvendar as nuances que existem no ciclo de
reprodução dos sistemas político e econômico vigentes, sendo esse campo uma possível
forma de entendimento da diferença sutil entre os processos socioespaciais que lhe são
inerentes.
Seguindo a ideia do positivismo cartesiano, há um modelo multicausal, no qual
diversos fatores formam um conjunto, que reúne as causas do evento, mas a ideia de
causalidade torna-se um obstáculo para compreender a saúde em sua totalidade, isso porque
a percepção de partes e a relação linear entre os fatores assumem que o todo pode ser
representado por elas.
Uma forma de superar este impedimento, segundo o pensamento dialético, é
perceber que o sistema social não é uma influência, mas é a própria essência na qual a saúde
e o indivíduo estão vinculados. Esse pensamento redimensiona o sujeito na epidemiologia
para além do modelo dos determinantes que inclui fatores sociais como elementos

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externalizados, não percebendo o contexto de saúde. É preciso pensar a saúde e a qualidade


de vida, relacionando os processos de adoecimento e de morte ao território usado, para se
configurar socialmente uma nova proposta de entendimento da totalidade, em múltiplas e em
diferentes escalas (TRINDADE et al., 2017, p. 162).
Deste modo, a promoção da saúde pode ser estruturada a partir da perspectiva
da determinação social, considerando não apenas os indivíduos, mas os grupos sociais e
seus modos de vida, no lugar em que vivem. Deslocar-se o foco da atenção à saúde exclusiva
individual, própria do modelo biomédico, para incluir ações de saúde coletiva, para prevenção
e promoção da saúde. A partir desse modo de pensar e agir sobre a saúde, descartam-se os
métodos positivistas e fragmentários de analisar a realidade por meio de fatores e variáveis
para se utilizar o território e a totalidade como explicação para o processo de produção social
da saúde e da vida. Considera-se o indivíduo na relação com os grupos sociais no lugar da
vida e trabalho, as redes sociais e a história. Configuram-se, dessa forma, realidades únicas
de ser e de estar no mundo, e com elas os contextos trazem a totalidade no olhar para a
saúde.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos ao Grupo de Trabalho em Saúde, vinculado à Seção Local de


Presidente Prudente/SP da Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB) pelos encontros com
leitura e discussão de textos científicos sobre a temática, que contribuíram para a
fundamentação teórica e construção do raciocínio apresentado neste trabalho.

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GONZAGA, E.A.R.; LIMA, S. C. Determinação social à luz do realismo crítico e da totalidade. In. Simpósio Nacional de Geografia da
Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande:
UFCG, 2021. p.71-84. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

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2021. p.85-93 Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

GEOGRAFIA E PSICOLOGIA:
A EXISTÊNCIA GEOGRÁFICA NO MEIO AMBIENTE

LOPES, Jahan Natanael Domingos1

RESUMO:

Delineou-se este estudo na perspectiva que relaciona a geografia com a psicologia; logo,
entende-se o meio enquanto elemento geográfico que conecta ambas as ciências. Nesse
caminho, teceu-se a relação para com a existência geográfica na abertura ao mundo. Desta
forma, perscrutou-se, além da acurácia para com as bases da psicologia existencial, uma
enfática às relações, na diferencialidade temporal da consciência, aos lugares e sua
capacidade motriz das patologias mentais e corporais. Ainda, pensou-se, com mais
detalhamento, na questão da natureza do meio e o corpo que, por meio dele instaura, na
mentalidade, a náusea, sendo que a abertura do mundo geográfico trama uma relação das
habitações salubres e insalubres. Assim, refletiu-se, sobretudo, sobre a política relacionada
com a configuração do meio e a racionalidade intencional embutida na desigualdade, ainda
que, força-se, que o atento às noções existenciais permita uma melhor perspectiva quanto ao
estímulo organizado e acurado de políticas públicas para a melhoria da saúde pública devido
à relação para com o geográfico. Visou-se, ainda, à relação do meio, tanto enquanto topofílica
quanto topofóbica, pontuando, mais especificamente, a náusea, conceito a acoplar, à
existência, as doenças dos ambientes insalubres e a consciência dos residentes dos lugares
salubres. A percepção da humanidade, como totalidade no mundo, tem a necessidade de
inserir-se nessa coletividade à busca de uma sociedade mais sadia à existência.

Palavras-chave: Pensamento geográfico; Geografia psicológica; Ontologia; Meio.

ABSTRACT:

This study was outlined in the perspective that relates geography to psychology; therefore, the
medium is understood as a geographical element that connects both sciences. In this way, the
relationship with the geographical existence in the opening to the world was woven, in this
way, it was scrutinized, in addition to the accuracy with the bases of existential psychology, an
emphatic relationship, in the temporal differentiality of consciousness, places and its motor
capacity for mental and bodily pathologies. Still, the question of the nature of the environment
and the body was thought in more detail, which, through it, introduces nausea in the mentality,
with the opening of the geographical world plotting a relationship between healthy and
unhealthy dwellings. Thus, it was thought, above all, about the policy related to the
configuration of the environment and the intentional rationality embedded in inequality,

1
Graduando na licenciatura e bacharelado em Geografia na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP);
Jahan_natanael@hotmail.com

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LOPES, J.N.D. Geografia e psicologia: a existência geográfica no meio ambiente. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde:
dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG,
2021. p.85-93 Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

although, it is forced, that the attentive to existential notions allows a better perspective
regarding the organized and accurate stimulus of public policies for the improvement of public
health due to the relationship with the geographical. It was also aimed at the relationship of the
environment, both as topophilic and topophobic, pointing out, more specifically, nausea, a
concept that couples the illnesses of unhealthy environments and the awareness of residents
of healthy places to existence. The perception of humanity, as a totality in the world, has the
need to insert itself in this collectivity in the search for a healthier society for existence.

Keywords: Geographical thinking; Psychological geography; Ontology; middle.

INTRODUÇÃO
A coisa que estava à espera, alertou-se, precipitou-se sobre mim, penetra em
mim, estou pleno dela. – Não é nada: a Coisa sou eu. A existência, liberada,
desprendida, reflui sobre mim. Existo.

(Sartre, 2019, p. 117)

É-se importante destacar que a epistemologia da geografia está aberta a amplas


interconexões e, entre elas, a psicologia. A fim de perscrutar essa relação, historicamente,
considera-se, como ponto de partida, o meio – um complexo entre homem e natureza – o qual
interessa às duas ciências: à geografia pela espacialidade (pelo modo de ser espacial) e à
psicologia pela psique que se realiza em um contexto geográfico. Assim, constrói-se uma
ponte pelo conceito de meio entre as duas ciências e que produz uma síntese analítica,
percebendo-se uma tarefa de perpasse mútuo e inclusivo para, deste modo, pensar-se em
uma geografia psicológica e em uma psicologia geográfica. Nessas dimensões, adentrar-se-
á, mais especificamente, na primeira proposição, privilegiando um olhar geográfico e,
posteriormente, em um percurso histórico, recortar-se-á para a psicologia existencial como
proposta teórico-metodológica ao conteúdo dessa área conceitual.

Ao percorrer essa síntese, torna-se importante retomar o início da discussão com


a apresentação das primeiras conexões, projetadas pelo determinismo geográfico, dos
primeiros trabalhos que propunham a um encontro de geografia e psicologia, começando pelo
contexto alemão do século XIX: “Ritter considerava que o meio natural era determinante do
desenvolvimento da personalidade dos povos, no entanto, Ratzel, à mesma época,
considerava [...] inicialmente individual e, a seguir, coletivamente ”. (TORRES, 2009, p. 59)
Deste modo, percebe-se uma evolução entre uma massificação da psique na geografia para,
na antropogeografia, ter-se uma dimensão de escalaridade humana em sua desenvoltura
psíquica. Essa, pois, é a primeira experiência para com a relação psicológica, antiquada para
um visionamento atual da relação.

No desenvolvimento histórico, abre-se, no século XX, uma perspectiva nomeada


como “Geografia psicológica” a partir de Sorre (1954) que erige um estudo o qual perpassa a
geografia médica. Nele, o autor embrenha-se em uma ampla gama de influências do meio na
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2021. p.85-93 Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

relação com a psique, estipulando uma interação intercomunicada de construção biossocial.


Com mais especificidade, na obra, encontra-se o conceito de “Complexo patogênico” na
interação homem e meio, percebendo que, em certas situacionalidades, a gênese das patos
está inserida no meio, comumente por marginalização de investimento, ou seja, pela
insalubridade sociointencional. Com isso, ele constrói um profundo estudo de doenças
infecciosas e parasitárias que afligem a população devido à precariedade do meio habitado.
Disso, alude-se a um estudo que perscruta os enlaces das duas ciências e, ainda, provoca
uma área da geografia que relembra, na relação homem e meio, não apenas a natureza vil,
mas a vilania da natureza transformada, podendo ser ainda mais perversa. Nesses
fenômenos patológicos espacializados, no complexo patológico, a partir do homem,
acometendo-os desigualmente em seu Espaço vivido. Elucida-se, no aprofundar do conceito,
que:
Os complexos patogênicos propostos por Sorre receberam o nome da
doença, tais como o complexo malárico, da peste, da doença do sono, dentre
outros. Na abordagem ecológica de Sorre, o papel do homem na gênese e
desintegração dos complexos não se restringia a sua atuação como
hospedeiro ou vetor das doenças. Sorre preocupou-se com a ação humana
de transformação do ambiente e seu possível impacto epidemiológico.
(JESUS, 2010, p. 217).

Nessa prospecção, tem-se uma breve linha histórica da orientação do fluxo que
percorre as dinâmicas da interação da geografia psicológica na modernidade. Vistos os
ditames já elucidados dessa interação, aproximar-se-á da psicologia de cunho existencial
como vertente possível da geografia que visiona à psique humana em sua logia rumo a uma
concepção contemporânea. Nisso, delineia-se uma posição fenomenológica, ou seja,
captando o fenômeno, no caso, a existência, para inserir, em seu modo de ser, uma tessitura
existencial situada no meio geográfico enquanto constituinte da factualidade do mundo pela
especialidade que acomete o existir. Aponta-se, no horizonte de coesão, o existir em geral
enquanto uma ontologia fenomenológica e no existir mais específico da humanidade – a
existência enquanto existir humano – uma psicologia geográfica sob essa epistemologia do
caso geral. Essa última é o foco deste estudo.

Adentra-se, portanto, mais especificamente, na “Existência geográfica” (LOPES,


2019) que permite uma dinâmica própria do ser geográfico. Desse modo, entender-se-ão as
visões da ontologia fenomenológica na posição fenomenológico-existencialista –
especificamente a de Sartre (2015), pela fenomenologia do ser e a de Merleau-Ponty (2018),
com a fenomenologia da percepção do ser – à guisa de uma psicologia existencial enquanto
uma geografia psicológica existencial, haja vista a inserção da espacialidade do meio na
interconexão. Entranhar-se-á, pois, em recorte, no hipônimo da questão: o meio geográfico
enquanto conteúdo do mundo em profusão com a existência geográfica. Nesse passo,
salientar-se-á sua dinâmica na relação da geografia com a psicologia sob a égide de um meio
enquanto fato social locus de possíveis marginalização e insalubridade.

GEOGRAFIA E EXISTÊNCIA

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2021. p.85-93 Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

E se tivesse morrido... Esse pensamento me ocorrera. É bem o tipo de ideia


que o tempo de nevoeiro estimula.

(Sartre, 2019, p. 91)

Neste percurso, ao passo da psicologia existencial, torna-se necessário,


sumariamente, explicitá-la. Há, com mais acurácia, uma similaridade, ou melhor, uma
inspiração provinda da psicanálise, pois considerável porção de sua estrutura é semelhante à
das visões freudianas em sua objetivação terapêutica e na ponderação psicossocial –
contudo, sem fragmentar a mente, como produzido na segunda tópica freudiana, além de
rejeitar o postulado do inconsciente, considerando-o coextensivo à consciência, e o postulado
da sexualidade, conjurado pela liberdade. De antemão, atenta-se que quem preconiza a
sistêmica dessa vertente é o filósofo existencialista Jean-Paul Sartre (2015, p. 682), o qual,
no capítulo “A psicanálise existencial”, da obra “O Ser e O Nada: ensaio de Ontologia
Fenomenológica”, apresenta as seguintes proposições:

• “O princípio desta psicanálise consiste na assertiva de que o homem é uma totalidade


e não uma conexão; [...] não há um só gosto, um só tique, um único gesto humano
que não seja revelador. ” (SARTRE, 2015, p. 696, grifo nosso). Isso revela a noção
oposta ao inconsciente velador, absoluta-se em expressão, mas manifestações da
consciência, quer seja ela tética (de si mesma e daquilo que intenciona) ou não-tética
(não de si, mas somente daquilo que intenciona);

• “O objetivo da psicanálise é decifrar os comportamentos empíricos do homem, ou


seja, clarificar ao máximo as revelações que cada homem contém e determiná-las
conceitualmente. ” (SARTRE, 2015, p. 696, grifo nosso). Aqui, pensa-se na
estruturação da linguagem a ser construída por essa psicologia, correspondendo a
utilização de conceitos que remetam às expressões, sobretudo às que incomodem o
paciente;

• “Seu ponto de partida é a experiência; ” (SARTRE, 2015, p. 696, grifo nosso). Aqui
entende-se a enfática fenomenológica partindo da experiencialidade cotidiana, quer
seja a aportada nas memórias (passadas), intenções (futuras) ou na totalidade
temporal da corporalidade (presente), atentando-se que a divisão do tempo (ser) não
o fragmenta, apenas serve, como visto nos objetivos, para análise;

• “Seu método é comparativo: uma vez que, com efeito, cada conduta humana
simboliza à sua maneira a escolha fundamental a ser elucidada, e uma vez que, ao
mesmo tempo, cada uma delas disfarça essa escolha sob seus caracteres ocasionais
e sua oportunidade histórica [...]” (SARTRE, 2015, p. 696, grifo nosso). Dito isso,
verifica-se a experiência em sua temporalidade, marcando, com mais ênfase, os
momentos destoantes, cerne para investigação psicoexistencial.

Essas posições pontuam, com clareza, os elementos que constituem a orientação


de psicologia que transpassa, para sua análise, a existência. Tal proposta não

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necessariamente favorece apenas as ciências da saúde, haja vista que a geografia


psicológica pode se utilizar desses princípios para compreender o ser humano. Ao ser, o
homem, tratado enquanto uma totalidade factual, pressupõe-se uma visão mais sintética que
analítica, o que se permite pensar de maneira a perceber a manifestação humana sem uma
fragmentação em descontinuidade, mas a seleção de elementos que possam ser partidas
metodológicas para se construir uma conexão em rede cada vez maior, por meio da
interligação dos momentos dos lugares que se aglutinam na consciência. Assim, associando
essa proposição com a geografia, a partir do conceito de meio, Sartre (2015, p. 700) diz: “O
meio só poderia agir sobre o sujeito na medida em que este o compreende, ou seja, em que
este o transforma em situação ”. Isso permite entender que o meio, enquanto confronto com
a natureza circundante, também faz parte da perscrutação da psicologia existencial.

Prossegue-se, inclusive, o pensar que a leitura existencial acopla-se em uma


posição de externalização visceral do ser, de forma a assentir um Em-si que recai no
esvaziamento do nada e no voltar-se Para-Si em uma nadificação com tudo o que contorna o
específico ser-no-meio-do-mundo. Isso, geograficamente, permite relacionar os lugares de
ação neurótica ou traumáticos com a conexão dos lugares que, por conta deles, reforçam um
quadro crônico de doenças mentais. Assim sendo, nos conceitos sartreanos, aprofunda-se a
posição nauseante do personagem Roquentin que a percebe, no romance epigráfico deste
trabalho, “A Náusea” de Sartre (2019, p. 105), quando diz: “Minha existência começava a me
espantar seriamente. Não seria eu uma simples aparência? ” Essa questão encontra uma
resposta afirmativa a qual admite afirmar que o aparecer do Para-Si é uma abertura para o
não-ser si, assim como o ser-Em-si é nada aparente. Propõe-se, portanto, um direcionamento
“para” fora de si na manifestação pura; isso se dá rumo à espacialidade do mundo,
angustiando espacialmente, pelo confronto com a liberdade móbil, os lugares internos de si,
inclusive os originários das patologias.

O que há no fora de si que não é si mesmo? A Gé (Terra) a ser grafiada


(compreendida), corresponde ao elemento em que a existência está perpetuamente aberta
em sua geograficidade. Deste modo, “há seriedade quando se parte do mundo e se atribui
mais realidade ao mundo do que a si mesmo; ” ainda “já não tem qualquer recuso em si
mesmo; sequer encara mais a possibilidade de sair do mundo, pois deu a si próprio o tipo de
existência do rochedo, a consistência, a inércia, a opacidade do ser-no-meio-do-mundo ”.
(SARTRE, 2015, p. 709) Nesse compasso, a experiência do mundo geográfico tem como
fundamento uma externalidade que acomete profundamente sua existência, o meio, e que,
portanto, está no plano de constituinte da percepção humana (na forma de Para-Si). Logo,
acomete-o mais do que a si mesmo, estrangula a consciência pensar no seu horizonte ao
redor e além (sua experiência) havendo lugares e tudo que os acomete – pessoas, objetos,
ausências... – que reforçam neuroses, psicoses e, no reforçar intencional, perversidades.

É importante salientar que não se recai no determinismo, mas na liberdade de ser


no mundo factual factualmente e na impossibilidade de se destituir do mundo que é aberto ao
ser si mesmo. O mundo não limita, ao contrário, ele liberta na mais extrema liberdade, por
vezes, parecendo limitar, pois é abertura constituinte do ser para se autodeterminar. Ser no
mundo é ser a totalidade do mundo, uma parte si mesmo e outra parte e, não sendo o si
mesmo, que é verídico ao si, projetam-se as máximas: “a realidade-humana é seu próprio

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nada. Ser, para o Para-si, é nadificar o Em-si que ele é. [...] a liberdade não pode ser senão
esta nadificação. [...] a existência precede a essência [...] Para-além dos móbeis e motivos de
meu ato: estou condenado a ser livre”. (SARTRE, 2015, p. 543). Disso, concebe-se que a
liberdade e a angústia assemelham-se, ou melhor, alimentam-se mutuamente; a liberdade
geográfica tanto impulsiona para uma vida melhor quanto também provoca sentimentos em
graus de medo, horror e terror para com o horizonte de possibilidades e de impossibilidades.

Assim, na liberdade de ser a si, o mundo experenciado é nauseante; entende-se,


o mundo afere ao ser - na facticidade de provocar na corporalidade humana, totalizado para
o mundo - doenças devido à sua abertura exposta ao meio ambiente; alude-se, portanto, ao
Quadro 1, que exemplifica essas condições. Isso, atenta-se, é uma reviravolta, pois têm-se
não somente a problemática dos lugares no horizonte psíquico, até então perscrutado, mas
também - em seu conteúdo natural - a influência ao corpo, provocando não apenas as
doenças mentais, bem como as doenças corporais. Pensar na abertura da existência ao
mundo geográfico é, pois, uma condição complexa, já que o meio aberto provoca tanto os
seus horizontes representativos – de outros experienciados – quanto os reais nas entidades
que promovem focos para doenças. As habitações, sobretudo impróprias, pela falta de
investimento governamental, são os horizontes nos quais mais pulsam a náusea para com as
possibilidades dadas, tanto que quem possui uma habitação salubre se nauseia com existir
(no mundo aberto) de insalubres, assim como os de habitação insalubre se nauseiam com o
existir da própria morada e com seus entornos ainda com maiores precariedades e, na revolta,
com as habitações salubres.

Citar-se-á outro autor, situado enquanto amistoso à psicologia existencialista, que


possibilita adensar a discussão e explicar, com mais enfaticidade, a questão do corpo que se
totaliza ao mundo e que, também, exibe tanto relações topofílicas quanto topofóbicas,
expressões que promulgam a posição de Tuan (1982, p. 143), ao passo em que “procura um
entendimento do mundo humano através do estudo das relações das pessoas com a
natureza, do seu comportamento geográfico, bem como dos seus sentimentos e ideias a
respeito do espaço e do lugar [...].” A topofobia é um epifenômeno da topofilia e ambos os
fenômenos são distintos. O segundo conceito marca o amor ao lugar e o primeiro, aversão,
ambos tanto em condições psicológicas quanto corpóreo-nauseantes. Portanto, entender-se-
ia, sobretudo na aversão, a originalidade da náusea, haja vista que as condições precárias,
como marcadas no Quadro 1, também influenciam, negativamente, a saúde psíquica.
Quadro 1. Relação potencial entre condições de exposição a fatores ambientais e condições de
saúde

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Fonte: WHO (World Health Organization (1997); modificado por Jesus (2010).

Aqui, situa-se Merleau-Ponty (2018, p. 175) na seguinte proposição: “o corpo é


definido pela existência em si, ele funciona uniformemente como um mecanismo; na medida
em que a alma é definida pela pura existência para si, ela só conhece objetos desdobrados
diante de si ”. Contempla-se uma conexão entre os conceitos sartreanos, firmando uma
proposta de acrescimento das definições, situando a alma humana disposta ao mundo
enquanto o Em-si, em vez de vazio, apresenta-se enquanto corporalidade. Politicamente,
sabendo disso, o planejamento espacial deve contabilizar as relações do meio com o corpo,
para corrigir a desumanidade da insalubridade, por vezes evitada a partir de uma atenção
maior de políticas públicas. O corpo, como presença factual no mundo, então, está aberto a
uma percepção de mundo que pode, ou não, nauseá-lo, sendo o modo de aparecimento do
mundo que promove a reação, podendo, no extremo, matá-lo. A situação do corpo como
caminho para a mente, não só pode debilitá-la inteiramente - em situações graves de
esquizofrenia – como também - talvez ainda mais comum - sequelar ou falecer o corpo. Isso,
retoma-se, não pode ser pensado como fator natural, pois a natureza transformada por um
meio de existência possui uma intencionalidade raciocinada. Assim sendo, existir ao mundo
é perigoso, já que pode ser considerável uma guerra entre a existência com outras existências
que trabalham para tornar, as primeiras, desamparadas.

Ao se considerar ser, a liberdade, comum a todas as existências que compartilham


factualmente um mesmo mundo, percebe-se que tal experiência torna-se uma questão
fortemente política, compartilhada do mundo geográfico, configurando o complexo patológico
do meio geográfico e instigando a náusea tanto aos marginalizados quanto aos privilegiados.
Entende-se que “corpo é veículo do ser no mundo, e ter um corpo é, para um ser vivo, juntar-
se a um meio definido, confundir-se com certos projetos e empenhar-se continuamente neles
”. (MERLEAU-PONTY, 2018, p. 122) Nesse fluxo de alerta sobre a importância da
corporalidade, corresponde a necessária posição do corpo em seus direitos de viver
dignamente, pois, se o mundo é todos, logo, todos possuem o dever, para com os outros, de
instaurar uma sociedade que felicite a humanidade. A perspectiva de um mundo

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dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG,
2021. p.85-93 Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

compartilhado só acontece quando a percepção da corporalidade substituir o individualismo


pelo coletivismo. Necessita-se do sentimento existencial de ser-para-com-os-outros, visado
para se conjurar o projeto no qual a náusea, introjetada pelas condições desumanas na
geograficidade da vida coletiva, não seja tão comum em uma vastidade perversa para com a
humanidade promovida pela própria (des)humanidade.

Considerações finais

Adentrando-se nas proposições da geografia e da psicologia, aprofundou-se em


suas dinâmicas que se conectam pelo conceito de meio. Assim, conheceu-se a geografia
psicológica enquanto possibilidade sorreana de perpasse de ambas as ciências em um
imbricar favorável a elas, engendrando, em conjunto, tanto a noção existencial do estar
situado geograficamente em uma espacialidade, quanto, e principalmente, a posição de que
a espacialidade é uma construção transformada e intencional. Com isso, possibilita-se pensar
em uma geografia psicológica de cunho existencial, ou seja, uma geografia psicológica
existencial, na perspectiva, sobretudo, sartreana, em que a instigação da experiencialidade
geográfica alude aos lugares, na diferencialidade temporal, e suas conexões para com as
patologias, tanto psíquicas, quanto, na analítica dos sentidos, corporais devido ao meio
geográfico racionalmente estipulado e orientador das desigualdades, provocando náusea
tanto aos marginalizados (por sua situação) quanto aos privilegiados (por estarem em um
mundo cujas insalubridades, por vezes, são por eles provocadas ). Nesse visionamento,
alude-se a uma construção epistemológica da geografia como psicologia que permite,
inclusive, pensar em uma psicologia geográfica de forma social de cunho não apenas
terapêutico, mas também, político. Pontuou-se, então, que o ser e o meio possuem uma
ligação que se abre tanto para topofilias quanto para topofobias, sendo a corporalidade
responsável pela trama da relação que convoca à mente suas questões.

O corpo, enquanto direito existencial de ser lançado no mundo factual, necessita


de um visionamento compartilhado para uma sociedade coletivista; isso se dá pela moralidade
das políticas públicas acerca da melhoria ou do agravo da qualidade de existência.
Apresentaram-se as diversas náuseas, sobretudo pela espacialidade corporal, representando
as doenças tabuladas em um quadro relativo às insalubridades geográficas, marcando
situações que escancaram problemáticas possíveis de resolução. Assim, percebe-se a
carência de humanidade para com o coletivo humano, haja vista a desigualdade de
investimentos – por exemplo, a gentrificação de certos meios estimulando as expulsões –
domínio da imagem de um mundo geográfico perverso quanto à vivência com saúde. Atenta-
se, por fim, que a geografia psicológica não só atesta a náusea à totalidade humana, à
experiência compartilhada, provocada pelos meios aversos à vida saudável e para com o
existir desses meios, mas também afirma-se enquanto possibilidade de compreensão em
análise da psique pela existência geográfica, fornecendo maior empatia ao psicanalista e,
ademais, proporcionando caminhos para alteridade cívico-política.

92
LOPES, J.N.D. Geografia e psicologia: a existência geográfica no meio ambiente. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde:
dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG,
2021. p.85-93 Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

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cidade. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.94-112 Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

ENTRE LIMITAÇÕES E SUPERAÇÕES: AS PERCEÇÕES DE SUJEITOS


CEGOS AO VIVER A CIDADE

GUIMARÃES, Leandro Buzzo Mourão1

GUIMARÃES, Raul Borges2

Resumo
Este artigo tem como objetivo entender como os sentidos do corpo podem se
aperfeiçoar de acordo com as condições impostas a cada sujeito. Nesse caso
específico, nos interessa compreender como pessoas com limitação visual podem
explorar as potencialidades de cada sentido - tato, olfato, paladar, audição para a
construção de uma memória espacial e percepção do lugar. Além disso, aparecem no
texto outros elementos que são externos ao corpo, mas que podem ajudar a descoberta
do mundo pelas pessoas com cegueira, como é o caso dos cães guias, ou de corpos
ciborgues como é o caso do uso da bengala para cegos. Para a realização da pesquisa
utilizamos a abordagem qualitativa, além da construção de figuras geoespaciais para
dar ênfase aos dados.
Palavras Chaves: pessoas cegas, sentidos do corpo, lugar, Presidente Prudente-SP.

Abstract
This article aims to understand how the body's senses can be improved according to the
conditions imposed on each subject. In this specific case, we are interested in
understanding how people with visual limitations can explore the potential of each sense
- touch, smell, taste, hearing for the construction of spatial memory and the perception
of the city. In addition, other elements that appear in the text that are external to the body
can help discover the world by people with blindness, such as guide dogs, or cyborg

1
Doutorando pela Universidade Estadual Paulista, campus de Presidente Prudente
(UNESP/FCT) pelo Programa de Pós-graduação em Geografia (PPGG).
leandro.buzzo@unesp.br
2
Professor Titular do Departamento de Geografia pela Universidade Estadual Paulista, campus
de Presidente Prudente (UNESP/FCT). raul.guimaraes@unesp.br

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GUIMARÃES. L.B.M.; GUIMARÃES, R.B. Entre limitações e superações: as percepções de sujeitos cegos ao viver a
cidade. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.94-112 Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

bodies. To carry out the research we used the qualitative approach, in addition to the
construction of spatial figures to emphasize the paper.
Keywords: Blindness people, senses of the body, place, Presidente Prudente-SP

Ultrapassando os limites do corpo

Você já parou para pensar na importância que os sentidos possuem na sua


vida? Ouvir uma música de olhos fechados é privilegiar a pureza que a audição pode
nos oferecer. Fechar os olhos para beijar quem se ama é privilegiar a pureza que o
tato pode nos oferecer. Ao sentir aquele cheirinho de comida de avó, muitas vezes
fechamos os olhos resgatando uma memória afetiva, privilegiando a pureza que o
olfato pode nos oferecer. Para saber identificar mesmo se gostamos de uma comida
muitas vezes fechamos os olhos para tentar valorizar seu sabor, isto é, privilegiar a
pureza que o paladar pode nos oferecer.
Todos os sentidos contribuem de uma maneira ou outra para nossa
construção espacial e localização geográfica, uma geografia construída a partir da
exploração dos sentidos do corpo possibilita a apreensão de novos conteúdos
geográficos. Os sentidos não só despertam sensações, mas também nos ajudam a
construir a percepção de um objeto, um ser ou até mesmo do espaço e lugar, obtendo
nossas experiências e formação de uma memória subjetiva.
É evidente que todo sentido sensorial nos desperta algo em nosso cotidiano
e viver sem a presença de qualquer um deles é algo que afeta a nossa percepção.
Todavia, o objetivo deste artigo é evidenciar as qualidades dos outros sentidos, suas
possíveis potencialidades de desenvolvimento e maneira com que podemos ampliar
nossa percepção através de corpos ciborgues e até outros elementos vivos valorizando
uma geografia da saúde e não uma geografia do sofrimento.
É por isto, que sujeitos com cegueira ganham evidência em nossas análises,
uma vez que sem a visão, acabam por desenvolvem ou ampliar as sensações e o
sentidos do corpo no espaço geográfico, assim, o artigo tem como objetivo entender
como três sujeitos cegos percebem a cidade de Presidente Prudente-SP sem a visão.

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GUIMARÃES. L.B.M.; GUIMARÃES, R.B. Entre limitações e superações: as percepções de sujeitos cegos ao viver a
cidade. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.94-112 Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Este trabalho está vinculado aos resultados da dissertação de mestrado financiada


pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo processo (2018/05967-
0).
Gostaria de enfatizar, que os sentidos das imagens é oferecer aos videntes e
aos não videntes a perspectiva de percepção dos sujeitos cegos em relação aos
diferentes sentidos do corpo. A imagem fotográfica tem pouco ou nenhum significado,
já que este trabalho visa compreender a relação destes sujeitos com o espaço.

Os sentidos do corpo na cidade: uma experiência sem a visão

Para compor a pesquisa utilizamos três sujeitos, dois deles com perda da
visão por algum acometimento durante a vida e um deles que já nasceu cego. De
acordo com o comitê de ética, seus nomes foram alterados e suas características serão
detalhadas a seguir.

Garota Dinamarquesa
O nome Garota Dinamarquesa foi dado a partir do nome de uma obra literária
de David Ebershoff que conta a história do primeiro homem a se submeter a uma
cirurgia de mudança de sexo e suas dificuldades enfrentadas a partir desta escolha. A
garota dinamarquesa nasceu como Einar Mogens Wegener e, posteriormente à
cirurgia, adotou Lili Elbe como nome oficial. História essa, com aspectos semelhantes
vivida pelo sujeito da pesquisa. A entrevistada residiu na cidade de São Paulo duas
vezes, mas hoje se encontra em Presidente Prudente-SP, 43 anos com perda da visão
em 2015.

Dom Quixote de La Mancha


Seu nome está diretamente ligado ao título do livro “Dom Quixote de la
Mancha”, a escolha do nome foi pelo caráter desbravador da vida, sempre recheada
de muitas histórias e amigos. Dom Quixote nasceu em Estrela do Norte/SP. Cresceu
sobre influências rurais, mas também frequentava com bastante intensidade a área

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GUIMARÃES. L.B.M.; GUIMARÃES, R.B. Entre limitações e superações: as percepções de sujeitos cegos ao viver a
cidade. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.94-112 Disponível em
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urbana de Estrela do Norte/SP e de Presidente Prudente/SP, sua residência atual com


seus avós, 33 anos e está sem a visão desde 2011.

Evangelista
O nome foi dado, principalmente, pelas relações com a igreja evangélica, e pelo
fato de que sua vida tem como premissa seguir os ideários protestantes. O forte papel
da igreja em sua vida o faz ter posicionamentos contrários com referência as relações
entre pessoas do mesmo sexo ou mesmo fazer sexo antes do casamento. Ainda
segundo ele, várias vezes considera-se como O Servo de Deus. O sujeito da pesquisa
já nasceu com cegueira congênita na cidade de São Paulo - SP e se mudou para a
cidade de Santo Anastácio-SP ainda muito pequeno residindo ainda hoje neste local,
contudo, possui uma relação íntima com Presidente Prudente -SP pelos diversos
cursos que realiza, incluindo uma graduação, possui 36 anos, nasceu com ausência
de visão.
Estes sujeitos foram protagonistas da pesquisa realizada na cidade de
Presidente Prudente –SP, a aplicação metodológica foi pensada para cada sujeito
almejando estimular as capacidades desenvolvidas por cada um dos integrantes da
pesquisa. Assim as análises e os procedimentos metodológicos serão abordados
conjuntamente às análises.

A audição e a linguagem

Embora algumas pessoas achem monótono ouvir uma pessoa mais velha
falando da sua vida, outras pessoas se incomodam em ouvir fofocas! A audição é um
elemento essencial em nossas vidas, eu por exemplo, adoro ouvir música, mas poucas
vezes fico prestando atenção nos diferentes instrumentos que compõem a música e
suas diferentes vibrações.
O fato é que ouvir pode nos trazer diversos elementos para entender as
relações sociais e espaciais, suas subjetividades e uma construção mental dos
ambientes. Para entender todo esse processo, diálogo neste tópico com Murray

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GUIMARÃES. L.B.M.; GUIMARÃES, R.B. Entre limitações e superações: as percepções de sujeitos cegos ao viver a
cidade. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.94-112 Disponível em
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Schafer em seu livro “O ouvido pensante”, escrito em 1999, o qual nos traz muitos
pontos relevantes e nos coloca a pensar sobre tudo o que ouvimos, particularmente os
elementos simples, presentes no nosso cotidiano.
É mais interessante ainda que o livro todo está baseado em aula para o
primeiro ano de graduação e apresenta os diálogos dessa interação professor – aluno,
facilitando no processo de raciocínio.
Segundo o autor, devemos saber distinguir alguns elementos quando falamos
sobre ato de ouvir, sendo eles: som, silêncio, ruído, timbre, melodia, amplitude e ritmo.
O mais comumente falado por nós é a palavra som, que significa “cortar o silêncio
através de uma vibração (SCHAFER, 1999 p.59) ”, ou então pode ser entendido como
“uma linha que se movimenta de modo regular (SCHAFER, 1999 p.59) ”. A ausência
de som é chamada, portanto, de silêncio, e o ruído é o som indesejável que pode variar
de acordo com os sujeitos ou cultura que está inserido (SCHAFER, 1999)
O timbre, por sua vez, é um som que distingue um instrumento de outro,
em uma frequência e amplitude. Segundo o autor, o timbre pode ser entendido como
a cor do som. A amplitude é a força que vai do mais fraco ao mais forte, do mais grave
ao mais agudo. A melodia pode ser qualquer combinação de som, é como o ato de
palavras cada letra tem seu som, juntas formam a melodia das palavras. Por fim, o
ritmo divide o todo em partes podendo elas ser regulares, irregulares, longas ou breves,
um exemplo de marcação de ritmo em nosso cotidiano é o tic-tac do relógio
(SCHAFER, 1999).
Todas essas variantes estão presentes de uma forma ou outra em nossas
vidas. É evidente que ao perder algum sentido do corpo, nosso cérebro tenta suprir a
falta encontrando novas formas de perceber e compreender a realidade. Alguns
sujeitos cegos desenvolvem a capacidade distinguir com maior facilidade os sons que
estão presentes por não terem a visão. Enfim, enxergar é uma ação socialmente
construída pelos seres humanos, e a visão é utilizada, principalmente, como meio de
verificação.

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GUIMARÃES. L.B.M.; GUIMARÃES, R.B. Entre limitações e superações: as percepções de sujeitos cegos ao viver a
cidade. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.94-112 Disponível em
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Os videntes, quando ouvem algum barulho estranho ou não, rapidamente


param para olhar o que está acontecendo. Para quem é cego o som, o tato, olfato e
paladar devem oferecer elementos sólidos que ajudam neste processo de verificação
da realidade, principalmente quando não é possível utilizar os outros sentidos do
corpo.
Tomemos a batida de carro como, exemplo, com e sem a visão:
I)Sujeitos com capacidade de enxergar: quando você ouve a batida de
um carro como exemplo que está relativamente longe e fora do seu campo de visão,
qual é a primeira coisa que faz depois de ouvir o som? Certamente é olhar e procurar
onde foi a batida para ver se está realmente aconteceu
II) Sujeitos sem a capacidade de enxergar: ao ouvir a batida do
carro em uma distância relativamente longe e não tendo a certeza do que aconteceu,
certamente começa a ouvir gritos, pessoas correndo, algumas pessoas expressando
espanto, e se esperar alguns minutos poderá até ouvir o barulho da ambulância.
O que importa aqui não é quanto tempo demora a identificação da realidade,
porque, dependendo do que acontece, os sujeitos com cegueira podem identificar e
verificar elementos muitos antes que qualquer pessoa. O fato é que na maioria das
vezes ela ocorre com ou sem a visão, pois somos altamente adaptáveis às realidades
que nos são expostas, embora alguns (mas) sujeitos mais e outros menos.
As combinações de todos esses elementos integram uma imagem sonora do
espaço e produzem uma paisagem. A construção cartográfica a partir do som elucida
como os sujeitos com cegueira constroem uma paisagem sonora a partir de um ponto
fixo.
O mapa abaixo foi construído a partir de aportes teóricos elucidados na obra de
Schafer (1999) e adaptados à realidade da pesquisa. O sujeito participante desta
técnica foi Dom Quixote de la Mancha.
Foi solicitado a ele que identificasse e classificasse todos os sons presentes
em um espaço público em um tempo de trinta minutos. A partir de sua percepção
informou se o som estava perto, médio ou longe.

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GUIMARÃES. L.B.M.; GUIMARÃES, R.B. Entre limitações e superações: as percepções de sujeitos cegos ao viver a
cidade. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.94-112 Disponível em
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Por estar em um espaço aberto, houve uma grande diversidade de elementos


que ajudaram a compreensão da paisagem. Os sons identificados nas menores
distâncias foram o balançar das folhas nas árvores, os pássaros cantando, pessoas
conversando ou andando de skate, músicas e toques de celular. Por estar em uma
área verde o barulho dos carros foi ouvido a maior distância, juntamente com mais
pássaros cantando e cachorros latindo, além de crianças brincando no parque. Os
sons a grande distância foram ouvidos apenas com a passagem de um helicóptero
da polícia e o sino da igreja central, na qual toca de meia em meia hora e pode ser
ouvido em grande parte da cidade.
Figura 1 – Paisagem Sonora – Dom Quixote de la Mancha

Elaboração: O Autor (2020)

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GUIMARÃES. L.B.M.; GUIMARÃES, R.B. Entre limitações e superações: as percepções de sujeitos cegos ao viver a
cidade. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.94-112 Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Tato
O tato é um mecanorreceptor3, assim como a audição, mas diferentemente do
ouvido, que está concentrado em apenas dois pontos, o sentido do tato está espalhado
pela maior parte da pele e mucosa. Os receptores destas diferentes sensações são
chamados de corpúsculos sensitivos responsáveis pelas diversas associações como
calor, leveza, frio, frescor, suavidade dentre outros nas quais não estão distribuídos
uniformemente pelo nosso corpo. É importante salientar ainda que a sensibilidade está
intimamente ligada ao contato, portanto objetos extremamente grandes ou distantes
da pele são de difícil distinção (MARTINI, TIMMONS, TALLITSCH, 2009)
Os corpúsculos sensitivos estão subdivididos em quatro categorias explicados
brevemente neste trabalho, a. Corpúsculos de Meissner são responsáveis pelas
impressões do contato se localizam na superfície da pele, principalmente em regiões
como as palmas das mãos, dedos, lábios, margem da pálpebras, mamilos e genitália
externa; b. Corpúsculo de Pacini ficam nas camadas mais profundas da pele e
são responsáveis pelo estímulos de pressão e estão distribuídos em
diferentes regiões do corpo; c. corpúsculos de Krause são responsáveis pelas
sensações térmicas do frio e o d. Corpúsculo de Ruffini pela sensação térmica de
calor, este dois últimos corpúsculos também estão distribuídos pelas diferentes partes
do corpo (MARTINI, TIMMONS, TALLITSCH, 2009).
O tato desenvolvido nas palmas das mãos, associado aos movimentos finos,
são os principais instrumentos utilizados pelos videntes para ter contato com os objetos
e seres vivos, assim como os sujeitos cegos, que conseguem identificar diferentes
características do resto de outras pessoas, diferentes formas da cidade, mesmo que
seja um processo que leve um maior tempo quando comparado com a visão.
A importância dada ao tato o torna importante, principalmente, no sistema de
educação em âmbito mundial com o desenvolvimento do sistema braile e também no
âmbito brasileiro através da inclusão de crianças cegas utilizando maquetes e ou
elementos que permitem uma compreensão da realidade por parte destes sujeitos
sociais.

3
Um receptor sensorial que responde a pressão ou outro estímulo mecânico.

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GUIMARÃES. L.B.M.; GUIMARÃES, R.B. Entre limitações e superações: as percepções de sujeitos cegos ao viver a
cidade. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.94-112 Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Para entender a realidade da pessoa com cegueira e sua construção do


mundo através do tato, fizemos um croqui de tudo aquilo que era possível identificar
em uma praça pública através do tato e uso da bengala como uma extensão do tato.
Na primeira imagem representada através do croqui, são os elementos presentes na
praça, na segunda imagem as partes que não estão presentes no croqui foram os
objetos em que o evangelista não conseguiu identificar, são principalmente objetos
altos.

a) Croqui representando a paisagem

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GUIMARÃES. L.B.M.; GUIMARÃES, R.B. Entre limitações e superações: as percepções de sujeitos cegos ao viver a
cidade. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.94-112 Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

b) Croqui com manchas não perceptíveis aos cegos

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GUIMARÃES. L.B.M.; GUIMARÃES, R.B. Entre limitações e superações: as percepções de sujeitos cegos ao viver a
cidade. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias.
X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.94-112 Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

SILVA, L.P.; SILVA, G.R. Geografia da Saúde: fundamentos, conceitos e discussões na perspectiva da Covid-19. In. Simpósio
Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande.
Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.113-125. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

A GEOGRAFIA DA SAÚDE: FUNDAMENTOS, CONCEITOS E DISCUSSÕES NA


PERSPECTIVA DA COVID-19
SILVA, Liliane Pereira1
SILVA,Gilcileide Rodrigues2

RESUMO:
Este artigo traz uma análise da geografia da saúde desde a antiga Grécia até os dias atuais, expondo suas
contribuições para a sociedade. A metodologia utilizada parte do princípio da abordagem sistêmica,
possibilitando a análise da totalidade sem dissipar as partes que estão sempre conectadas, interagindo com o
todo. Contribuindo com o tema proposto, trazemos para essa discussão autores que tratam não só da
Geografia da Saúde, mas de toda essa rede que a envolve, como: JR. Zomighani (2012), Capra (1982), Faria
e Bortolozzi (2013), Hasbaert (2007), entre outros. Tornando pertinente pautar a conjuntura política, onde os
Esta- dos e as instituições públicas ou privadas, cada uma com sua peculiaridade, busca elaborar normas e
políticas que precedem a técnica, no que tange atualmente, a pandemia da Co- vid-19. Assim se faz
necessário uma análise do contexto político da pandemia no Brasil, que interfere no enfrentamento da crise
política e sanitária que o país está vivenciando. Assim contribuindo com o Sistema Único de Saúde, que
mesmo com todas dificuldades, demonstra sua importância no enfretamento da pandemia, atuando em
diversos âmbitos na promoção, proteção e prevenção da saúde pública.

c) Imagem fotográfica do local


Palavras-chave: Geografia, Saúde, Pandemia

ABSTRACT:
Figura 2 – Paisagem tátil – O Evangelista
This article presents an analysis of the geography Elaboração: O autor
of health from ancient(2020)
Greece to the presentday, exposing its
contributions to society.
Olfato e paladar The methodology used is based on the principle of the systemic approach,
enabling the analysis of the totality without dissipating the parts that are always connected, interacting with
the whole. Contributing to the proposed theme,we bring to this discussion authors who deal not only with the
Geography of Health, Asbut
patologias
with the sensoriais maisthat
entire network comumente conhecidas
involves it, such as: JR.estão relacionadas
Zomighani (2012), Capra
(1982), Faria and Bortolozzi (2013), Hasbaert (2007), among others. Making it pertinent to guide the political
aos setores da visão, da audição e da fala. Porém há várias patologias relacionadas
situation, where States and public or private institutions, each with its own peculiarity, seek to elaborate
norms andao policies
paladarthat
e ao olfato,
precede thevariando
technique,entre
in whatníveis de acometimento,
concerns dos parciais
currently the Covid-19 pandemic.aosThus, it is
necessary to analyze
integrais; the political
incluindo context
também of the pandemic
a deficiência táctilinque
Brazil, which
ocorre deinterferes in facing
forma mais the political and
esporádica
health crisis that the country is experiencing. Thus contributing to the Unified Health System, which despite all
(PALHETA NETO, TARGINO, PEIXOTO, et al, 2011)
the difficulties, demonstrates its importance in dealing with the pandemic, acting in different areas in the
promotion, protection Oandolfato não necessita
prevention do toque direto para atender aos seus objetivos,
of public health.
absorve para si através do ar substâncias químicas que dele emanam, o que
Keywords: Health, Geography, Pandemia Covid-19.
ocasiona uma alteração de sua percepção na medida em que os objetos atingem o
olfato e se afastam. Tal como o paladar, o olfato é um sentido químico. O mecanismo
de percepção dos odores começa pelas células olfativas encontradas na região
1 Estudante de pós graduação em Geografia na UFAL; liliane.silva@igdema.ufal.br
2 Professora (orientadora) do IGDema na UFAL; gilsilvaxxi@yahoo.com.br
104
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LOPES, J.N.D. Geografia e psicologia: a existência geográfica no meio ambiente. In. Simpósio Nacional de Geografia da
Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina
Grande: UFCG, 2021. p.86-94 Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

INTRODUÇÃO

Para entender a sistematização da Geografia da Saúde é necessário fazer um resgate


histórico de como aconteceram as primeiras observações do comportamento huma- no e o meio, e
como o homem transforma e se adequa a cada lugar, considerando o clima, relevo e a forma de
subsistência. O conhecimento adquirido ao longo da História da Grécia Antiga até a atualidade
demonstra como estamos evoluindo, e como isso foi decisivo para o aumento populacional no
mundo. A produção científica em várias áreas do conhecimento foi decisiva na produção de
iniciativas e projetos relacionados à saúde e ao mundo do trabalho, assim como a apropriação do
espaço urbano, e o que isso trouxe de retorno para a cidade, que fomenta a formação econômica
social capitalista e, consequentemente, todas as mazelasque a acompanha até os dias atuais, como
o desmatamento, que ocasiona o aquecimento global e as pandemias que matam milhões de
pessoas.
A Geografia da Saúde trata de questões relacionadas não somente à dissemina-ção e a
origem de doenças, mas também às questões relacionadas à acessibilidade ao trata- mento, dando,
consequentemente, ênfase à distribuição espacial e à eficácia dos serviços de saúde. Em razão
disso, faz-se necessária a análise dos fundamentos e a sistematização des- sa área da geografia
que envolve território, regionalização e todo poder surgido das relações políticas, haja vista que
esse poder influencia a dinâmica complexa entre geografia e saúde. Ao analisar-se a conjuntura
política, registra-se a importância de políticas públicas voltadas amaior parte da população brasileira
pertencente à classe trabalhadora que movimenta a má- quina financeira de toda sociedade global,
num regime perverso que exclui e mata milhares de pessoas pelo uso irresponsável dos recursos
naturais.
A Geografia da Saúde é resultado de grandes trabalhos sobre as condições da saúde
humana em relação ao ambiente. “Há uma grande coleção heterogênea de escritos médicos, em
dialeto iônico, produzida durante um período de quase sete séculos, e que con- têm saberes que
foram utilizados nas escolas de medicina até os fins do século XVIII” (JU- NIOR ZOMIGHANI 2012,
p.18).
Segundo Junior Zominghani (2012), a obra de Hipócrates constitui parte dos fun-
damentos do campo de investigação da Geografia da Saúde. Encontrou-se no considerado o Pai
da Medicina Ocidental, nascido em 460 a.C (NOVELLI, 2008), em um de seus livros intitulado “De
ares, águas e lugares”. Nessa obra, o autor identificou o modo como a localiza- ção, o clima e a
disponibilidade de água influenciavam a saúde das pessoas. O médico grego descrevia a diferença
entre a Ásia e a Europa em todos os aspectos e sobre a compleição dos povos que se distinguem,
sem qualquer semelhança entre si.
Para Ribeiro (2005), a Ásia difere mais da Europa no que concerne às naturezas de
todas as coisas que brotam da terra e dos homens, e os aspectos físicos e naturais do ter- ritório
interferem até no comportamento humano. Homens asiáticos eram mais desanimados e mais

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LOPES, J.N.D. Geografia e psicologia: a existência geográfica no meio ambiente. In. Simpósio Nacional de Geografia da
Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina
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dóceis em relação ao caráter e inaptos para a guerra, diferentemente dos europeus. As estações
do ano são as principais causas, visto que a teoria Hipócrates destaca a interfe-rência do meio
sobre o homem. Para o autor, parte da técnica especulativa e argumentativa por ele empregada,
refletida na literatura médica que chegou até nós, fora aprendida dos filó- sofos pré-socráticos; em
contrapartida, muitos filósofos incorporaram conceitos de fisiologia e medicina aos seus sistemas
filosóficos. No final do século V a.C., porém, os médicos se empenhavam energicamente em
desvincular a medicina da filosofia e em reconhecê-la como uma TÉXU “arte” autônoma (CH, DA
ARTE; IRWIN, 1989).
Para Rebollo (2006), de acordo com a coleção hipocrática, as concepções ser- viram de
pano de fundo da teoria humoral, uma vez que cada humor resulta na interação das dynámeis
(objeto de observação do médico hipocrático, podendo ser: a dynámeis das estações, dos climas e
das regiões) ou das virtudes operativas, pois nos tratados sobre a na- tureza do homem e dos
humores, a doutrina humoral é sistematizada com maior clareza. “Os elementos primários
constituintes do corpo são a água, o fogo, o ar e a terra. Tais elementos geram as qualidades
(quente, frio, seco e úmido) que, organizadas em pares, dão origem aos quatro humores (chymós).”
(REBOLLO,2006.p.56)
Para Junior Zominghani (2012), das contribuições de autores clássicos da geo- grafia
destaca-se o conceito de gênero de vida, desenvolvido por Paul Vidal de La Blache na passagem
do século XIX para o XX, e que poderia ser utilizado para o estudo das questões que envolvem
território e saúde. Na Geografia científica, principalmente com o uso da carto- grafia para
monitoramento da distribuição regional das doenças e orientação das práticas de saneamento
básico, resultou-se um atlas de mapeamento das doenças como forma de com- preensão de seus
mecanismos de difusão e as relações com as fronteiras internas e externas, que são questões
bastante estudadas na Geografia brasileira.
Ainda de acordo com Junior Zominghani, a própria Geografia transformou-se ao longe do
século XX, tanto do ponto de vista do enfoque temático quanto da gama de proce- dimentos
metodológicos que acabaram levando a interações com outros ramos do conheci- mento científico.
Segundo Rodrigues (2015), a relação entre saúde, ambiente e cidade não é umaideia nova.
O paradigma hipocrático, considerado a matriz do pensamento médico do mun- do ocidental, já
compreendia o ambiente das cidades como um foco de agravos à saúde. O médico inglês John
Snow foi o primeiro a comprovar que um organismo vivo era a fonte da disseminação de alguma
doença no meio urbano. Ele estudou a distribuição espacial de óbi- tos por cólera na pandemia que
atingiu Londres em 1854, demonstrando a correspondência entre o número de mortes e o grau de
poluição das fontes de água de cada bairro da cidade. Para Guimarães (2015), Max Sorre foi o que
mais se aproximou da pesquisa geográfica da perspectiva ecológica da saúde. Os problemas
ecológicos trouxeram a necessida- de de considerar o tempo de ocupação humana; o maior ou
menor ajustamento aos gêneros de vida, e as condições específicas de vida em ambientes sociais,
econômicos e políticos. A obra de Sorre inspirou-se em rumos já delineados por La Blache,

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Demangeon, Jean Brunhes e de De Martonne entre outros, conservando-se fiel aos princípios
gerais da ciência geográ- fica da época, e colocando a Geografia no centro de interesse de muitos
pesquisadores mé
dicos. Sorre permitia a instrumentalização para a apreensão da doença como um fenômeno
localizável e passível de delimitação em termos de área. A maior urgência em sua época era a
valorização da produção cartográfica, considerando as áreas de extensão dos principais problemas
de saúde. Era preciso mapear os lugares onde ocorriam as doenças. Isso co- locava o tamanho
das unidades territoriais em pauta nos estudos como uma das maiores dificuldades para a análise
da distribuição das enfermidades. Desse modo, ele concluiráque as áreas de extensão dessas
enfermidades eram muito diferentes, conforme consta em “Fundamentos biológicos de la
geografia humana” (1955, p.301). Não há dúvidas que Sorre contribuiu para a delimitação clara e
precisa do campo de investigação em Geografia médica, circunscrita à aplicação do método da
Geografia regional ao estudo das doenças, em que a região era o complexo patogênico,
compreendido a partir de análises de dados físicos e humanos, com o objetivo de demonstrar a
individualidade do fenômeno espacial.
Segundo Guimarães (2015), no mundo emergente urbano-industrial, o sane- amento
urbano era o único “remédio” para o controle dos processos de transmissão das doenças
infectocontagiosas, resultando no processo de embelezamento e de melhorias das condições de
vida nas cidades. Durante o chamado “sanitarismo”, período delimitado por Rosen (1994) entre
1830 e 1875, a saúde pública e o planejamento urbano foram conside- rados uma mesma
entidade.
A partir de inúmeras comissões de inquérito formadas por médicos e represen- tantes dos
governos, trazendo a público um quadro completo das condições sanitárias dos bairros de
trabalhadores da Inglaterra, os médicos passaram a controlar o espaço social por meio das
estatísticas de saúde e dos inventários de distribuição das habitações, pessoas e doenças pelo
território. As chamadas topografias médicas transformaram-se em um poder político dos médicos
na realização dessa tarefa.
Mendonça e Fogaça (2014) afirmam que Josué de Castro, ao estudar e pesquisar a
subnutrição e a fome, e os problemas a elas relacionados, desnuda a ideia de sua gênese como
um fenômeno meramente natural. Ao colocar em evidência a Geografia da fome no Brasil e no
mundo, Castro oferece uma grande contribuição para a compreensão geográfica da manifestação
das doenças, observando-se a passagem de uma concepção hegemônica da Geografia médica
para uma perspectiva da Geografia da Saúde.
De acordo com Guimarães (2001, p.11), a origem da Geografia da Saúde deu-se no
Congresso da União Geográfica Internacional (UGI), realizado em Moscou em 1976. A própria
Geografia transformou-se ao longo do século XX, tanto do ponto de vista do enfoque temático,
quanto da gama de procedimentos metodológicos que acabaram levando à discipli- na a interação
com outros ramos do conhecimento científico. Essa evolução, ainda nas pala- vras de Guimarães

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(2000) e Santos (2007), encontrou, no âmbito da geografia brasileira, um ambiente fortemente fértil,
com amplo emprego de novas perspectivas sociológicas críticas, como o marxismo dialético, na
ciência geográfica produzida no Brasil, mudando o perfil desse conhecimento no país. Para Faria e
Bertolozzi (2009), a influência do geógrafo Milton Santos para a saúde pública brasileira pode ser
evidenciada em sua participação em um dos eventos do Centenário da Fundação Oswaldo Cruz
(Fiocruz), em 2000, com a temática intitulada: Saú- de e Ambiente no Processo de Desenvolvimento.
Milton Santos fez uma crítica relacionada ao determinismo que ainda acompanha as pesquisas
acerca do ambiente e saúde, ao mesmo tempo em que destacou o desvirtuamento da teoria e da
prática científica. Ainda segundo os autores, a conferência subsidiada pelo geógrafo tratou de expor
a importância do pensamento livre e da produção intelectual, preocupando-se com as questões
humanitárias, ao mesmo tempo que fez uma dura crítica à privatização do saber e da universidade,
acompanhada tam- bém pela privatização da cidade. Ao compreender o espaço a partir do
desenvolvimento do meio técnico-científico-informacional, o campo da saúde passa a abordar a
doença e não apenas a presença do vírus e/ou bactérias, mas, sim, como resultado pertencente a
uma dinâmica social complexa. Essa talvez tenha sido a grande contribuição de Milton Santos à
saúde pública brasileira, motivando uma grande quantidade de pesquisadores e intelectuais a se
apropriarem da teoria desse geó- grafo e professor baiano nos estudos sobre doença e saúde
(Guimarães, 2015 p.38).
De acordo com Pareja et al (2016), para se compreender o processo saúde-do- ença, sob
a ótica de mundo moderno, é necessário entender o conceito de espaço associado com o tempo
(história) e o contexto (sistemas), e não apenas relacionado com o espaço físi-co, ações, eventos e
processos de forma isolada. Deve-se compreender que o espaço dessa discussão é considerado,
segundo Santos (2014), como uma categoria de análise mediante um conjunto indissociável de
sistemas e ações geográficas, objetos naturais e objetos sociais, acolhendo uma produção socio-
historicamente construída a partir da realidade política, eco- nômica e cultural.
Na análise de Guimarães (2015 p.69), a globalização está acelerando o processo de
exclusão social nas megacidades dos países pobres, onde a miséria e a fome sempre existiram,
mas a falta do mínimo de condições dignas de sobrevivência alcançou uma par- cela jamais vista
pela população urbana. À vista disso, a saúde é causa e consequência da produção da pobreza
urbana: de um lado, a proliferação de atividades de sobrevivência (ca- racterística do que Milton
Santos denominou “circuito inferior”) permite a manutenção da vida dos mais pobres da cidade; de
outro lado, essa situação de saúde é perpetuadora da pobreza urbana. Pessoas que vivem nas
periferias urbanas, carentes de infraestrutura e residindo em habitações precárias, onde as
variações de temperatura ao longo do dia já são enormes, assim como o acesso à água potável é
limitado, estão desenvolvendo capacidades de adap- tação às mudanças globais em curso.
Submetidos aos eventos extremos, essas pessoas vivem, permanentemente, provas de tolerância
produzidas por relações de tempo lento, da ci- dade percorrida a pé, das redes sociais tecidas pelos
laços de vizinhança e de pertencimento à comunidade. Esse novo mundo está em fermentação

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dentro do velho, daquele que não tem sustentabilidade. Para imaginar como será futuro, observe as
periferias urbanas, um espaço de aprendizado feito por pessoas capazes de superar e de aprender
diante das situações mais adversas (Guimarães,2015. p.72).
Conforme Werna (1996), a legitimação do direito de morar em favelas e cortiços, desde
que devidamente urbanizados, e inúmeras experiências de construção da casa própria por meio de
programas de mutirão e autoajuda, organizados e incentivados pelo poder públi- co municipal,
romperam com a ideia de que o planejamento urbano devia concentrar-se em planos de larga
escala, racionais e eficientes. A saúde foi um dos temas que ganharam es- paço cada vez maior na
agenda social de muitos países, com enfoque na integração da rede de serviços, segundo
princípios de hierarquização e regionalização. “Criaram-se condições objetivas de maior ênfase na
atenção primária e no fortalecimento do setor público como umtodo (GUIMARÃES,2000. p.73)”.
Dessa maneira que, para Guimarães (2015), as inovações técnico-científicas acu- mulam a
capacidade de longevidade dos indivíduos, sejam crianças nascidas com malforma- ção congênita,
que passam a ter uma expectativa de vida maior do que teriam há algum tem- po; sejam adultos,
que conseguem o diagnóstico e tratamento de um câncer precocemente, como também
detectarem fatores de risco de doenças cardiovasculares, tornando possível medidas preventivas
jamais imaginadas, ampliando, portanto, o topo da pirâmide etária. Tudo isso gera novas questões a
serem analisadas, demandando mudanças, seja no ordenamento das cidades, no perfil da
alimentação, nas formas de lazer, no convívio social, dentre outras.A primeira tarefa de um geógrafo
da saúde é estabelecer os recortes espaço temporais mais adequados para dar visibilidade a essa
geografia das mudanças, que começa a ganhar corpo nesse novo período denominado “período
demográfico”. Nesse novo período, além das questões populacionais (envelhecimento com
dignidade, banalização da violência, fome e miséria), nos desafiam a demanda crescente pelo uso
da água potável, o esgotamen- to das fontes energéticas e o acúmulo de resíduos sólidos. Para
compreender o conceito de saúde, do ponto de vista geográfico, é preciso relacionar as categorias
que o conformam, como: extensão, ordem e conexão. O termo extensão refere-se à dimensão
do espaço e, ao mesmo tempo, implica a habilidade de localização dos objetos geográficos na
superfície terrestre. O termo ordem é atributo espacial relacionado à distribuição dos elementos
geográ- ficos no espaço, enquanto o termo conexão diz respeito ao elo existente entre os objetos e
as ações humanas num sistema de relações no qual nenhum elemento é isolado dos outros
(SILVEIRA,2006). Atualmente, os estudos em várias áreas do conhecimento, no Brasil e no mundo,
estão voltados para encontrar respostas para a pandemia. Na Geografia não poderia ser diferente,
especificamente na Geografia da Saúde.
Para Oliveira (2020), o compromisso epistêmico do campo da Geografia busca entender o
espaço e suas variantes, os processos e as associações, partindo para a análise dos seguintes
tópicos da Geografia e suas relações com o cenário encontrado a partir da Pandemia da Covid-19:
globalização; espacialização/cartografia; demografia; urbanização; economia e política. Assim
sendo, se buscará compreender a análise espacial mais ampla dofenômeno, uma vez que é a partir

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do entendimento estrutural de cada uma das possibilidades analíticas que se constrói a leitura da
conjuntura momento atual.
A saúde pode ser considerada, para Barcellos, et al (2006), como um estado em que o
nível individual pressupõe a sensação de bem estar. Já no nível coletivo, populacional, a saúde
insere-se na noção mais ampla de condições de vida. A saúde e os problemas refe- rentes à saúde
são processos que possuem fatores gerais que atuam em uma teia: a biologia humana, o ambiente,
os modos de vida e o próprio sistema de serviços de saúde. Conforme for o problema de saúde,
um fator pode ser mais decisivo que o outro, como: nas doenças diretamente associadas a
malformações congênitas, cujo peso da biologia é maior; nas do- enças sexualmente
transmissíveis, em que o modo de vida são mais importantes; nas intoxi- cações por agrotóxicos,
em que os fatores ambientais são mais relevantes, embora todos os fatores interajam e atuem
sobre todos os problemas de saúde de forma integrada.
Para Barcellos, et al (2006), a exposição às situações que afetam a saúde, geral- mente,
não são escolhas de indivíduos nem de famílias, mas o resultado da falta de opções para evitar ou
eliminar as situações de vulnerabilidade. Também participa dessas situações de vulnerabilidade
que afetam a saúde,em geral, não são escolhas de indivíduos nem de famílias, mas o resultado da
falta de opções para evitar ou eliminar as situações de vulne- rabilidade. O que participa também
dessas situações é o desconhecimento sobre a própria vulnerabilidade. É dessa maneira que as
condições de vida de grupos sociais nos territórios definem um conjunto de problemas,
necessidades e insatisfações que dependem da partici- pação de instituições de governo e da
própria população, ou seja, a situação de saúde de um grupo populacional em um território é
definida pelos problemas e necessidades em saúde, assim como pelas respostas sociais a esses
problemas.
De acordo com Guimarães (2015), as melhorias de infraestrutura, a disseminação dos
meios de diagnóstico e todo desenvolvimento dos sistemas técnicos tornaram possível o aumento
da expectativa de vida, avançando nas questões que envolvem o envelhecimento da população,
embora essas transformações sejam desiguais, no que se refere ao acesso, seja entre regiões ou
entre diferentes classes sociais, exigindo explicações geográficas, pois cada lugar é o acúmulo
desigual de tempos. Dos circuitos do tempo rápido, conectados pela gran- de máquina da produção
global, observa-se o risco crescente da disseminação de doenças antes confinadas a algumas
regiões do globo.

Além da reemergência das doenças infectocontagiosas erradicadas ou sob con- trole há


décadas, tal situação criou a possibilidade de novas doenças e de pandemias. Esse é um risco real
que está exigindo um outro tipo de organização e cooperação entre os povos. É sabido que uma
considerável parcela da população, a que procura atendimento médico, é portadora de
necessidades que nunca serão plenamente satisfeitas no plano da assistência médica individual,
visto que há dificuldade em assegurar atendimento rápido para os casos que exigem urgência. São

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esses os desafios constantes do poder público: a otimização do uso dos leitos hospitalares,
necessitando de uma atualização contínua do mapa de vagas; o estabelecimento de mecanismos
que desobstruam a comunicação, e o intercâmbio de infor- mação entre as unidades de serviços de
saúde.
Do outro lado, há a população e a luta de diversos movimentos sociais que exi- gem
saúde mais conectada às necessidades do dia a dia. Nos dizeres de Bakhtin (1995), o mecanismo
de produção das representações sociais sempre está presente na comunicação social. Segundo
Gesler (1999), o lugar tem papel central na construção desses significados sociais, e as metáforas
geográficas são utilizadas para estabelecer diferentes identidades à vida comunitária (BARNES;
DUNCAN, 1992), mediante um processo que não é harmonioso, mas repleto de conflitos e
residências.
Para Guimarães (2000), a designação sobre saúde e doença pode ser usada tanto para
revelar quanto para encobrir significados das relações sociais e das relações as- simétricas de
poder, o que torna o seu estudo necessário e ainda mais fértil. Na análise de Guimarães (2015), a
Geografia da Saúde no Brasil tem como principal discussão conceitual a relação entre espaço e
território, pois demanda a análise dos desafios operacionais da ter-ritorialização da política nacional
de saúde, desde a implantação do Sistema Único de Saúdee sua expansão físico-territorial (GODIM
et al, 2008).
O conceito de região no planejamento da política nacional de saúde não é de fá- cil
apreensão. Não basta a leitura direta dos documentos oficiais, como Norma Operacional de
Assistência à Saúde (BRASIL,2002) ou Pacto pela Saúde (BRASIL,2006), sem alguns parâmetros
da análise do discurso. O que vem a ser e o que pode vir a ser a regionalização da saúde é algo
em aberto e em disputa por diversos atores políticos, conforme Guimarães (2005) e Pessoto (2010)
puderam mapear a partir das diretrizes estabelecidas pelo Plano Nacional de Saúde em vigor.
De acordo com análise de Barata (2009), a desigualdade social na saúde vem sendo
documentada desde o século XIX, devido às péssimas condições de vida da classe trabalhadora
ou pelo ideário político associado às revoluções burguesas. A contradição entre os valores de
igualdade, fraternidade e liberdade, e a dura realidade de vida da maioria dapopulação nos países
industrializados possibilitou aos chamados reformadores sociais, socia- listas utópicos e comunistas
um farto material para denunciar as injustiças sociais em vários campos, dentre eles a saúde, tendo
em vista a situação de risco, os comportamentos relacio- nados à saúde e o estado de saúde físico e
mental tenderem a variar entre os grupos sociais.
Para a autora, uma das frequentes explicações para a desigualdade social na saúde
costuma ser o acesso aos serviços de saúde, que é diferenciado para os vários gru- pos. Portanto,
os efeitos são decorrentes de problemas na utilização dos recursos disponí- veis, seja por
incapacidade do indivíduo, seja por características da organização dos próprios serviços. Essa
explicação, todavia, é rapidamente derrubada pela seguinte constatação: as desigualdades não
desaparecem naqueles países em que existem sistemas nacionais de saúde que garantem acesso

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universal para todos os grupos sociais, tal qual ocorre em diver- sos países da Europa, no Canadá,
na Austrália e outros. Nas comparações entre países, as desigualdades tendem a ser atribuídas a
diferentes graus de desenvolvimento da assistência médica. Entretanto essa elucidação, ainda que
possa responder por parte do perfil de morta-lidade observado, não é capaz de justificar o porquê
as desigualdades vêm aumentando com o passar do tempo (BARATA, 2009).
No começo de 2020, entra para a história a pandemia do Covid-19, de modo que, para
Young (2020), houve uma enorme subestimação do número de casos e óbitos no Brasile em outros
países, especialmente os em desenvolvimento. Essa foi uma das falhas mais evidentes dos
governantes brasileiros em lidar com uma pandemia. Tendo a pandemia che- gado no país
relativamente tarde em relação à Europa, não houve preparação técnica para a pandemia. Sem
estratégia, equipamentos, material de teste e coordenação de ações, o Brasil tornou-se presa fácil
para a propagação do Coronavírus (Covid-19), tornando-se o país com maior número diário de
novos casos de contaminação (epicentro), mesmo com grande subnotificação.
Na tentativa de desviar a atenção da incapacidade técnica e falta de propostas concretas
para lidar com a pandemia, criou-se uma falsa divisão entre proteger a saúde ou a economia,
surgindo o jargão: “É preciso salvar vidas, mas também o PIB.”
Contudo o PIB não se salva, apenas se mede, e não é uma medida de desen- volvimento,
bem-estar ou mesmo riqueza. O PIB é simplesmente uma métrica para saber se o conjunto teve
maior ou menor atividade em relação ao período anterior. O governo federal vem insistindo em
negar os preceitos da comunidade científica e acabar com o isolamento social e as medidas de
restrição econômicas, almejando o imediato retorno a uma suposta “normalidade pré-pandemia”.
Segundo Matta, et al 2021, a pandemia da Covid-19 colocou luz sobre as desi- gualdades
sociais que já existiam, talvez esquecidas ou não vistas. As populações já vulnera- bilizadas são,
comprovadamente, afetadas de forma negativa nesse contexto. As diferenças são inúmeras: na
exposição ao vírus; no acesso ao diagnóstico e ao tratamento; no acessoa habitações adequadas;
nas tecnologias; no saneamento e água; na alimentação e nutriçãoapropriadas etc.

Um balanço dos seis meses de pandemia feito pelo observatório Covid-19 da Fiocruz
(FIOCRUZ, 2020), com participação de pesquisadores da Rede Zika, destacou que essas
desigualdades são demonstradas em diversos domínios, com destaque para o étnico racial. Nesse
contexto, os povos indígenas, as populações urbanas que vivem em favelas e territórios
vulnerabilizados, as relações de gênero com o impacto sobre as mulheres e a sig- nificante
presença feminina na força de trabalho em saúde mereceram importante destaque. A minimização
dos direitos e políticas de proteção social geraram uma crise humanitária de proporções
alarmantes.
Para Matta et al 2021, o SUS foi capaz de detectar e responder aos primeiros casos de
Covid-19 no país, colocando em marcha um sistema de vigilância que já havia se mostrado eficaz
em surtos e epidemias passados (HENRIQUE; VASCONCELOS, 2020) e em consonância com as

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recomendações da OMS. O espaço urbano é desigual, bastante heterogêneo, e apresenta uma


dinâmica muito intensa de transformação, como o crescimento acelerado das favelas,
apresentando mudanças que nem sempre conseguem ser apreendidas pela forma como os dados
da saúde são disponibilizados. Nesse caso, a forma como os dados epidemiológicos estão
disponibi- lizados não é suficiente para produzir uma análise epidemiológica mais próxima à
realidade das favelas. Temos como exemplo os casos confirmados e óbitos por Covid-19, no
município do Rio de Janeiro, que estão sendo disponíveis pela divisão territorial dos bairros e pelo
Có- digo de Endereçamento Postal (CEP). Essa forma de disponibilização dos dados, apesar de
sua importância para se conhecer diferenças intramunicipais, torna invisível a realidade de muitas
favelas. A análise por CEP é ainda mais complexa, se considerarmos que em grande parte das
vielas e becos essa numeração não existe e, quando existe, trata-se de um ou pou-cos códigos para
uma mesma favela. Tais códigos podem se referir ao bairro mais próximo e não necessariamente à
favela.
A informação sobre qual bairro o paciente reside é passada por ele mesmo ao profissional
de saúde, durante a consulta que subsidia o preenchimento da ficha de notifica- ção. Contudo, em
decorrência dos estereótipos e preconceitos que envolvem a condição de ser um “favelado”, é
bastante comum o paciente informar o nome do bairro de maior poder aquisitivo mais próximo da
sua casa, ou então informar o CEP mais próximo de sua residên- cia, que pode ser identificado
como um CEP do bairro adjacente e não, obrigatoriamente, dafavela que ele vive.
Produzir uma análise de Covid-19 que consiga dar visibilidade às áreas de favelasna cidade
do Rio de Janeiro ainda é um grande desafio metodológico. Como mencionado an- teriormente, os
dados do Painel Rio Covid-19, da prefeitura da cidade do Rio de Janeiro, estão disponíveis somente
na escala de bairros e CEP. Esse é apenas um exemplo das diversas dificuldades em realizar
estudos, como monitoramento ou mapeamentos, que representem fielmente as favelas brasileiras,
tendo em vista que essas comunidades estão inseridas entre bairros, em lugares com difícil acesso
nos aspectos urbanístico e geográfico. Essa é uma in-visibilidade produzida pelo sistema capitalista
mediante a divisão do trabalho que tem nome, cor, endereço e se refere à maioria da população do
Brasil.
Para Barcellos, et al 2006,

A análise da situação de saúde permite a definição de perfis de necessidades e


problemas com a identificação de uma hierarquização de prioridades a partir do
conhecimento dos diferentes atores sociais que estes são capazes de organizar e
articular frente aos problemas apontados. (BARCELLOS, 2006. P.29).

Existe uma variedade de perfis e situações para diferentes grupos de população. É


imprescindível identificar quando essas diferenças são redutíveis ou evitáveis, muitas ve- zes,
pelas condições de vida, ou seja, em áreas e situações de risco. Assim sendo, essas condições
podem ser modificadas a partir da mobilização da comunidade e de ações inte rinstitucionais,

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buscando identificar maneiras de reforçar as ações de caráter preventivo e de promoção de saúde,


como: saneamento, serviços de infraestrutura e educação como forma curativa e preventiva.
Os indicadores socioambientais apontam as desigualdades entre grupos de popu- lação em
territórios específicos, já que de nada serve um indicador que não apresente varia- bilidade entre
diferentes unidades de análise, sabendo distinguir as noções de desigualdade e iniquidade.
Segundo Castellanos (1997), “nem toda diferença na situação de saúde pode ser considerada uma
iniquidade. Mas toda diferença ou desigualdade redutível, vinculada a condições heterogêneas de
vida, constitui iniquidade.” (BARCELLOS, et al. .2006).
Segundo Barcellos, et al (2006), a escolha de indicadores, tanto socioambien- tais quanto os
epidemiológicos, adquire papel primordial na identificação de desigualdades que possam ser
reduzidas. Ao demonstrar-se a correlação entre grupos de indicadores, são apontados caminhos e
estratégias de ação para o seu enfrentamento, determinando áreas e grupos socioespaciais sob
maior risco, e para a tomada de decisões. A descentralização do sistema com a decorrente
responsabilidade de estados e municípios é um dos fundamentos do SUS, mas não dispensa uma
coordenação nacional. De maneira que causou uma desor- dem no pacto federativo em 2020. A
coordenação sefaz necessária por inúmeras razões, uma delas é o fato de que ao nível central
cabe esse papel na gestão nacional do SUS (Bra- sil,1996). Outra é econômica Como país
continental, com 200 milhões de potenciais usuários do SUS, o Brasil tem um poder de compra de
vacinas e outros insumos de saúde que propor- cionam ao país uma economia de escala bastante
significativa, que, entretanto, pode não ser considerada em razão da demora em tomar decisão
práticas concretas na preparação para oenfrentamento da pandemia.

Ainda na análise de MATTA et al, 2021, a pandemia foi atravessada por disputas políticas e
narrativas importantes, que afetaram a boa condução da resposta nacional. Algu- mas políticas
econômico-sociais acionadas para mitigar os efeitos da pandemia não foram suficientes para
atender às necessidades de populações há muito vulnerabilizadas. O ano de 2020 foi marcado
pela reabertura precoce e por uma influência importante da resposta europeia nas ações locais. Foi
um ano de aprendizado para todos os segmentos, cientistas, governo e sociedade. Entramos em
2021 com a continuação e a exacerbaçãode uma crise que não é apenas sanitária, mas com
elementos sociais e econômicos, tendo a oportunidade de olhar para trás e tirar lições aprendidas e
boas práticas para mudar o rumo da resposta com coordenação nacional, com especial destaque
para comunicação, o acesso a vacina via PNI e um olhar voltado para as pessoas em
vulnerabilidade social.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A geografia da saúde vem promovendo análises sobre todos aspectos que envol- ve a saúde

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LOPES, J.N.D. Geografia e psicologia: a existência geográfica no meio ambiente. In. Simpósio Nacional de Geografia da
Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina
Grande: UFCG, 2021. p.86-94 Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

humana na perspectiva do ambiente pelo qual ele está inserido e seus desdobra- mentos.
Compreendendo as causas a partir da ocupação dos territórios, buscando mitigar soluções para as
consequências do avanço da urbanização, como aumento demográfico, aspectos econômicos e a
conjuntura política, questões que só fortalecem sua importância. Sem a geografia da saúde não
aprenderíamos a lidar com as pandemias que a humanidade vem enfrentando ao longo dos
tempos. O advento da globalização tornou as pandemias um alcance planetário nunca antes vistos,
dado aos meios de circulação avançados. Embora o Brasil venha passando por um retrocesso no
que se refere aos investimentos em ciência associado a um governo negacionista que diverge do
conhecimento científico, que desvaloriza e ataca todas as medidas de isolamento social como
forma de conter a pandemia que o mundo está enfrentando. É necessário combater denunciando
esse tipo de política desumana que só agrava a situação pandêmica. E isso só pode ser sanado
com políticas públicas efetivas, com o compromisso e a responsabilidade de considerar o uso do
território essencial para uma boa gestão em saúde pública. As condições de excelência dos
serviços de saúde, assim como a universalização, serão dificilmente alcançadas se a saúde pública
continuar sendo tratada como mercadoria, a discussão sobre as demandas sociais no Brasil
precisam ser continuamente pautadas, para garantir que todo cidadão brasileiro sem distinção de
classe social, tenha garantia e acesso a um atendimento de igualitário.

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LOPES, J.N.D. Geografia e psicologia: a existência geográfica no meio ambiente. In. Simpósio Nacional de Geografia da
Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina
Grande: UFCG, 2021. p.86-94 Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

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MEDEIROS, M.L.; SANTOS JÚNIOR, J. S.; ANDRADE, M.V. A influência da gripe espanhola e Covid-19 na transformação
do espaço geográfico recifense. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios
das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.126-134. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

A INFLUÊNCIA DA GRIPE ESPANHOLA E COVID-19 NA TRANSFORMAÇÃO DO


ESPAÇO GEOGRÁFICO RECIFENSE
MEDEIROS, Marina Loureiro 1
JUNIOR, Jessé de Souza SANTOS2
ANDRADE, Maria Vitória3

RESUMO: Na cidade do Recife a pandemia mais recente do Coronavírus Vírus trouxe já de


início uma pequena transformação socioespacial através dos isolamentos, o que ocasionou
uma intenção de modificação nas estruturas políticas e econômicas. É importante destacar
que este mesma situação já se repetiu na cidade, mas específico a quase 100 anos atrás,
com uma das primeiras pandemias do século XX(A Gripe Espanhola) os impactos foram
bastante similares, trazendo mais uma vez a tona as desigualdades socioespaciais vividas e
acentuadas especialmente dentro do Recife em seus bairros e suas periferias. Dessa
maneira, o presente trabalho buscou traçar um paralelo das transformações ocorridas na
cidade do Recife ao longo dos tempos transando paralelos e divergência exaltados
especialmente pelos aspectos políticos e midiáticos ,através do método crítico ( Santos,1999)
e das metodologia acessórias histórico documentais, que mostram o quanto pandemia na
cidade do Recife se torna sempre uma Sindemia no sentido de acentuar mais as
desigualdades existentes, necessitando um olhar diferenciado para as ações dentro da
própria cidade o que implicaria em reestruturações específicas a cada locus específico dentro
dos meandro urbanos da cidade.

Palavras-chave: Transformação Espacial, CoVID-19, Gripe espanhola, Recife

ABSTRACT: In the city of Recife, the most recent pandemic of the Coronavirus Virus has
already brought a small socio-spatial transformation through isolations, which has led to an
intention to modify political and economic structures. It is important to highlight that this same
situation has already been repeated in the city, but specific to almost 100 years ago, with one
of the first pandemics of the twentieth century (The Spanish Flu) the impacts were quite similar,
bringing to light the socio-spatial inequalities experienced and accentuated especially within
recife in its neighborhoods and its peripheries. Thus, the present work sought to draw a parallel
of the transformations that occurred in the city of Recife over time by transanding parallels and
divergence exalted especially by the political and media aspects, through the critical method
(Santos,1999) and the documentary historical , which came to show how much pandemic in
the city of Recife always becomes a Sindemia in order to accentuate more existing inequalities
, requiring a differentiated look at the actions within the city itself, which would imply specific
restructurings to each specific locus within the city's urban meander.

1
Mestra em Geografia pela UFPE; marinalou93@gmail.com (orientadora)
2
Estudante de graduação em Geografia na UFPE; jessesantosdesouzajunior@gmail.com
3
Estudante de graduação em Geografia na UFPE: mariavitoria.andrade@ufpe.br

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MEDEIROS, M.L.; SANTOS JÚNIOR, J. S.; ANDRADE, M.V. A influência da gripe espanhola e Covid-19 na transformação
do espaço geográfico recifense. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios
das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.126-134. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Keywords: Spatial Transformation, COVID 19, Spanish flu, Recife

INTRODUÇÃO:
Ao pensarmos no período histórico social e espacial que vivemos na contemporaneidade é
inevitável falar da doença que vem atingindo a mais de 7 bilhões ou parte de sua maioria no
planeta que é COVID-19. Especialmente em nosso país esta doença, que já matou mais 400
mil brasileiros, vem transformando as realidades existentes em nosso volta, transformando o
espaço, modificando as relações de trabalho, e especialmente colocando a luz a grande
desigualdade social existente em nosso país. No entanto, é primaz, entender que as
pandemia do COVID-19 não foi a primeira, pandemia de grande porte que atingiu e trouxe
modificações em escala global para o mundo, a Gripe Espanhola em 1918-1920 trouxe pela
primeira vez na história este mesmo sentimento: estamos todos vivendo um mesmo mau.
A partir de pontos em congruências e diferenças entre os dois momentos históricos
analisados, o trabalho em questão, trabalho desenvolvido a partir da leituras e interesses em
comum de uma mestranda e os alunos de graduação em tempo pandêmico pertencentes a
DCG da UFPE, vem analisar as questões pertinentes que envolveram as modificações
histórico e espacial do diferentes períodos, a questão midiática e da necropolitica analisando
de maneira critica, e se utilizando das metodologias auxiliares bibliográficas e documentais,
seus impactos e especialmente denotando o como esses aspectos acentuaram, nos
diferentes períodos históricos, essa desigualdade e colocaram a luz a necessidade de
transformar as políticas públicas e valorizar sem anular as ações feitas pela saúde públicas,
valorizando-a, em nosso pais. Dessa maneira, o trabalho vem tentar trazer uma pequena
contribuição para o eixo 6 : Dimensões Históricas, Metodológicas da Geografia da Saúde, a
partir dessa analise espaço temporal feita, entendendo assim que o entendimento do passado
e essencial para desvendarmos o futuro, e aprendermos com ele.

METODOLOGIA
Para atingir o objetivo deste trabalho foi utilizado o metodologia de pesquisa
bibliográfica e documental. Está última metodologia, em especial, foi base para as pesquisas
do aspecto da pandemia espanhola, e considera que os documentos constituem uma fonte
rica e estável de dados, sendo algo com presidência jurídica que perdura tornam-se muito
importante para um estudo de natureza histórica (GIL,2002, p. 46). Com isso, foi realizado um
levantamento de instituições e jornais os quais circulavam em Recife, para compor o
panorama da gripe espanhola 1918, a extração dessas informações fora feita pela plataforma
online da Bliblioteca Nacional (BND). Somado a isto usou-se de base os capítulos do livro da
historiadora Lilian Schwarz (2020) a Bailaria da Morte como fonte base para as reflexões
tecidas ao longo de resultados obtidos. A parte contemporâneas do trabalho sobre a Covid-
19 foram utilizadas as metodologias de base bibliográficas de artigos, e matérias de jornais
atuais online como fonte documental. É importante salientar que a partes do passado e do
futuro das pandemias possuem como fio condutor o método critico de analise defendido por

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MEDEIROS, M.L.; SANTOS JÚNIOR, J. S.; ANDRADE, M.V. A influência da gripe espanhola e Covid-19 na transformação
do espaço geográfico recifense. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios
das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.126-134. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Milton Santos (2000), passando assim a ter uma visão de crítica social dos acontecimentos
de ambas as épocas tratadas . Sendo assim, este método junto as metodologias auxiliares
utilizadas contemplar a diversidade e complexidade do tema com profundidade.

RESULTADO E DISCUSSÃO:

A Espanhola foi descoberta pelo mundo, no final de 1918, quando jornais espanhóis,
noticiaram a doença dentro das trincheiras europeias no decorrer da Grande Guerra. Com o
fim desta, muitos ex-soldados americanos adoecidos já tinham contaminados outros saldados
que de volta a seus lares ou em visita a parentes, passaram transmitir a doença. Um tempo
depois, em meados do ano o navio Demerara aporta nos principais portos do Brasil,
distribuindo a doença aonde chegava e infectando as capitais litorâneas (SWARTZ,2020).
Devido a Espanha ser o primeiro país a noticiar a doença e as pessoas contaminadas estarem
ligadas aos mundos portuário (estivadores, trabalhadores e prostitutas) a gripe ficou com
apelido do primeiro país a se divulgar, sendo apelidada então de espanhola (SWARTZ).
Já a COVID-19, chegou através dos portos e aeroportos no período de festivo
carnavalesco no ano de 2020. Inicialmente ligada a China, em uma província interiorana, mas
de um pais hoje com as relações capitalistas e tecnológicas avançadas, a doença se espalhou
com rapidez atingiu todos os recantos do mundo, através do fluxo de pessoas que circulavam
hoje dentro dessa grande potência mundial (FIOCRUZ,2020).
Ao falar da cidade objeto de análise, Recife observa-se semelhanças e diferença com
relação a doença. Na Espanhola, a cidade estava passando por processo de reestruturação
espacial, muito parecido como de outras capitais, projeto esse que aglomerou os alagados e
criou os principais morros da cidades. A desigualdade que parecia agora se esconder, nos
subúrbios acentuava-se ao longo dos dias, era só dos pontos do abismo sanitários que se
fazia entre áreas ricas e pobres da cidade, somado a inexistência da saúde pública, a
espanhola chegou abarrotando os poucos cemitérios, multiplicando os empregos de coveiro
e colocando em xeque o elitismo da saúde no pais, auxiliando para necessária organização
de uma saúde pública local. Se destacam nesse período a criação do Hospital Pedro II,
Servidores e atuação do secretário da saúde Otávio de Freitas( SILVA,2017).
Já na COVID-19, a cidade vinha de um período pôs eleições e de uma acentuada
precarização de trabalhos, o que fez com a transformação espacial de locais cheios se
transformassem em zonas vazias e desemprego, acentuando a violência a pobreza em toda
a cidade especialmente, nas periferias nascidas entre o início do século XX. Com a COVID-
19, viu-se a necessidade de melhoria dos hospitais públicos, criação de hospitais de
campanha e criação e ampliação de redes de solidariedade para além das ações políticas. As
estruturas trabalhistas já precárias, precarizaram mais ainda, mas a rede de economia criativa
junto as tecnologias de venda e os entregadores a domicilio, atenuassem a já grande

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MEDEIROS, M.L.; SANTOS JÚNIOR, J. S.; ANDRADE, M.V. A influência da gripe espanhola e Covid-19 na transformação
do espaço geográfico recifense. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios
das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.126-134. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

disparidade social da cidade, que junto aos auxílios governamentais, fazem com que a
população sobreviva aos tempos difíceis ( BBC,2021).
Ao buscaremos discutir a importante vertente da comunicação nesse trabalho é
necessário qual verdadeiramente é o papel dos meios de comunicação diante um cenários
pandêmicos, nos diferentes tempos com um foco relevante nas mídias sociais. De acordo
com o Site de Pesquisa Educa mais Brasil, os meios de comunicação, são veículos que
propagam informações sobre diversos temas do mundo e apresentam um tipo específico de
linguagem.Logo, percebe-se a grande influência que eles têm sobre a circulação de notícias
sejam verdadeiras como falsas.
De acordo com um estudo relizado pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts
(MIT, na sigla em inglês), dos Estados Unidos, publicado na revista Science, "Fake News se
espalham 70% mais rápido que as notícias verdade. Com isso, torna-se importante tanto
discutir a diferença entre fatos e "fake news" quanto compreender seus desdobramentos em
relação ao cenário pandêmico atual
O termo Fake News, do inglês "fake" de "falso" e "news" de notícia. São
informações falsas divulgadas que intencionalmente podem enganar seus leitores. Com isso,
a notícia circula sem precedentes causando graves impactos em vários níveis de acordo com
as situações relacionadas.
Já os fatos, tardiamente chegam à população de forma precisa e eficaz. No
presente século da COVID-19, assim como a cerca de 100 anos atrás com a gripe espanhola,
torna-se cada vez mais difícil em quem confiar a averiguação duma verdadeira notícia. Por
causa disso, principalmente agora com o avanço das mídias sociais e veículos de informação,
é necessário ampliar cuidados no que tange compartilhar notícias. Sendo assim, fica claro e
evidente a importância de verificar as informações antes de divulgar a outros, checar a fonte
a qual foi produzida, atentar-se a data e o horário da publicação.
Ao tratar do aspceto histórico é necessário também não esquecer os a análise os
aspectos políticos junto com as pandemias, especialmente em seus respectivos contextos
históricos e espaços. Ao entrar em contato com o acervo iconográfico aos alardes da gripe
espanhola no Estado, observa-se que não se tinha infraestrutura na época para garantir
serviços de necessidades básicas e muitos territórios ainda estavam em seu primórdios de
desenvolvimento, levando em consideração que a fase de urbanização vinha a se desenvolver
apenas em 1930 com as políticas de Getúlio Vargas. Com isso, para esse contexto de 1919
durante a propagação da gripe, as políticas públicas da época advindas tanto do Governo
Federal quanto Estadual, reconhecendo que não haveria como o Estado oferecer toda uma
infraestrutura, serviços à saúde a maioria da população, recorrem às instituições de cunho
sociais para ajudar com os casos. A parcela da população pobre ia em busca destas
organizações que ofereciam serviços voltados à saúde, um dos destaques é da Santa Casa
de Misericórdia que na época, a instituição divulgou um ofício pedindo ajuda ao Presidente
para manter e oferecer uma estrutura para o combate da gripe espanhola e auxiliar as pessoas
mais pobres da sociedade. A Santa Casa de Misericórdia prestou assistência ao Estado de
Pernambuco com os casos os quais foram transferidos para lá, e o Governo ressaltou a
importância da instituição e de seus serviços voltado aos menos favorecidos da sociedade
Recifense principalmente durante a ocorrência Influenza, foi fundamental suas assistências
para que não ocorresse tantos óbitos ( Jornal do Recife 1919) .

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MEDEIROS, M.L.; SANTOS JÚNIOR, J. S.; ANDRADE, M.V. A influência da gripe espanhola e Covid-19 na transformação
do espaço geográfico recifense. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios
das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.126-134. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Com registros do Jornal do Recife (no final do ano 1919) sobre a Gripe Espanhola na
capital, o contexto apresentado foi de insatisfação da população com a medidas de prevenção
e controle da doença do Prefeito Moraes Rego e Governador Manoel Borba. O fracasso
dessas medidas, levou a uma revolta popular contra a Prefeitura e Estado pois não havia
medicamentos suficientes a estrutura de saúde precária, um ponto interessante é que houve
fechamento das farmácias dos bairros e quando abertas havia aglomerações. No mês de
Outubro, foi divulgado os números de morte, com uma alta mortalidade, divulgada pelo Jornal
do Recife(Figura 1), foi exposto no Jornal como consequência da falha dos planos do
Governo, como também, que os alguns dados tinham sido ocultados e “maquiados”, para
diminuir a revolta é o desgosto da população com os poderes Estaduais e Municipal.

Figura 1 - Gráfico à direita com dados de mortalidade no mês de outubro de 1918 na


cidade de Recife.

Fonte: Jornal do Recife, 7 de novembro de 1918.

Desta forma, os recifenses esperavam um posicionamento dos poderes políticos


Estadual e Municipal mais coerente e técnica com a situação. É necessário destacar que a
maioria das medidas de combate à doença são muito parecidas com as do Covid- 19 que
utilizamos hoje, distanciamento social, ocorreu também a paralisação de algumas atividades
e serviços, como dos estabelecimento de diversões, aula de faculdade, paralisação dos
serviços dos correios, e o fechamento um pouco incoerente do comércio ( as farmácias e os
bens essenciais), o que não foi bem recebido pela população. Outra atitude do Governo foi a
problemática dos médicos, pois foi organizado dos médicos irem ao atendimento dos

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MEDEIROS, M.L.; SANTOS JÚNIOR, J. S.; ANDRADE, M.V. A influência da gripe espanhola e Covid-19 na transformação
do espaço geográfico recifense. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios
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https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

pacientes em casas, porém nem todos os profissionais queriam atender a população mais
distante e pobre em domicílio, levantando o debate da questão da desigualdade socioespacial
que é nítida durante um contexto de pandemia, e como a doença chega de maneiras
diferentes no corpo espacial.

Em paralelo, as atitudes políticas nas esferas sociais no contexto novo vírus o Covid-
19 (2020) . O cenário político brasileiro ficou muito caótico com a chegada do COVID -19,
além do mundo estar impactado com a dimensão de propagação deste vírus, a sociedade se
deparou com novos comportamentos tanto de forma individual como em pró da coletividade.
A Organização Mundial de Saúde (OMS)4 fez recomendações a todos os países seguindo o
percurso de isolamento social, medidas sanitárias e compartilhamento de informações e
pesquisas científicas. Entretanto, o Presidente do Brasil, Jair Messias Bolsonaro se manteve
descredibilizando as medidas de isolamento, sanitárias e científicas, e em muitos de seus
pronunciamentos carregavam essa simbologia, não usando máscaras e afirmando o discurso
de que a economia não poderia parar (SANCHES, 2020). Com isso, a maioria população
presenciou a crise da saúde pública e do Sistema Único de Saúde (SUS), em seu pior
momento com a troca de três Ministro da Saúde em menos de quatro meses, durante a subida
de casos de mortes da coronavírus no país ultrapassando a China país de origem da
pandemia, com 5 mil mortos, dados retirados do site G1, e entrevista na porta do Palácio da
Alvorada, a declaração do Presidente foi essa:

E daí? Lamento. Quer que eu faço o quê? Eu sou Messias, mas não faço milagre.
(G1,2020)

Desta maneira, a população brasileira encontrou uma dualidade de discursos e


atitudes, pois o Governo Federal tomou essa posição de descrença, enquanto a maioria dos
países tomaram outro rumo. Além disso é necessário destacar, que uma das preocupações
do Governo foi a queda econômica do país e a ampliação da desigualdade social, com isso
houve o desenvolvimento de um suporte financeiro o Auxílio Emergencial, benefício destinado
a autônomos e desempregado como proteção e enfrentamento da crise causada pelo COVID,
com operador o banco CAIXA e parcelas no valor de R$ 600 reais ( CAIXA, 2020). Porém
uma das grandes problemáticas do benefício foi as aglomerações feitas em frente aos banco
da CAIXA (Figura 2) tanto para receber quanto para tratar das falhas do sistema no site e
aplicativo.

Figura 2 - Movimentos os quais causaram aglomerações para o recebimento das


parcelas do auxílio emergencial em 2020.

4
Ver em: WORLD HEALTH ORGANIZATION (USA). Recomendações sobre o uso de máscaras no
contexto da COVID-19: Orientações provisórias. Conselhos para o uso de máscaras no contexto da
COVID-19: orientações provisórias, p. 1-17, 5 jun. 2020. Disponível em:<
https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/332293/WHO-2019-nCov-IPC_Masks-2020.4-por.pdf.
Acesso em: 3 maio 2021.>

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MEDEIROS, M.L.; SANTOS JÚNIOR, J. S.; ANDRADE, M.V. A influência da gripe espanhola e Covid-19 na transformação
do espaço geográfico recifense. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios
das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.126-134. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Fonte: G1, 2020

Em paralelo, as atitudes do Governo Federal mencionadas acima, os Governos


Estaduais nesse contexto tiveram que impor suas autonomia em combate a doença, e muitos
Estados brasileiros seguiram as recomendações da OMS, Pernambuco foi um deles. O
Governo do Estado criou um portal na internet PE contra Covid 5 disponibilizam dados e
entrevistas das mídias locais, e em comparação com outros estados houve o fechamento do
comércio local e só foi permitido o acesso a estabelecimento dos bens de consumo essenciais
sem aglomerações (G1, 2020). Apesar disso, no recorte espacial da cidade do Recife, uma
marca que ascendeu junto com a doença foi a desigualdade social, um estudo do Instituto de
Cidades Sustentáveis (G1, 2020) , no nordeste, Recife lidera com o maior número de
desproporção de renda do país, sendo também a segunda capital da região com maior taxa
de mortalidade de Covid- 19 sendo quase o triplo da nacional. Durante esse contexto também
foi ressaltado a importância dos trabalhos sociais como linha frente à fome, desemprego e
vulnerabilidade social, assim como no período da Gripe Espanhola, as atitudes de cunho
sociais são o escape da população mais pobre brasileira e principalmente recifense, com
auxílio básico de marmitas, banhos e insumo básicos, chegam mais rápido as necessidades
da população carente e periférica.
Além disso, buscamos trazer para esse debate também, um termo da ciências sociais
que está em grande ascensão, o da Necropolítica de Achille Mbembe (apud SILVA, 2020), o
conceito está ligado ao poder decisório sobre as vidas das pessoas, e esse poder se constrói
em uma sociedade hierarquizada, como produto que favorece e mantém as estruturas
capitalistas. Como também, Mbembe usa como fundamento o conceito de Biopolítica de

5
Ver em: SECRETARIA DE SAÚDE DE PERNAMBUCO. Pernambuco contra Covid-19. Disponível em: <
https://www.pecontracoronavirus.pe.gov.br/>.

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MEDEIROS, M.L.; SANTOS JÚNIOR, J. S.; ANDRADE, M.V. A influência da gripe espanhola e Covid-19 na transformação
do espaço geográfico recifense. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios
das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.126-134. Disponível em
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Foucault sendo " o biopoder é estratégia de técnicas com sua face política que tem o objetivo
de fazer o controle dos corpos e ações dos indivíduos, disseminando assim a regulação do
dominador” (SILVA, 2020, p. 73). Com isso, contextualizando a situação brasileira com o
Covid-19, quem detém o principal poder hierarquizado é o Presidente Jair Messias Bolsonaro,
e analisando seus discurso e atitudes, pode-se afirmar que existe uma necropolítica que se
amplia neste contexto de pandemia. Segundo o boletim de conjuntura:
Além do desrespeito com as entidades de saúde, ele ( O Presidente ) entra em debate
político com os governadores e prefeitos que seguem as recomendações em seus territórios
através de decretos estaduais e municipais. Ele não oferece propostas para desacelerar a
propagação do vírus, a única coisa que faz é explanar suas ideias políticas e econômicas que
nada beneficia na atual conjuntura. . (SILVA, 2020, p. 79)
Para elucidar melhor, o caso da COVID, as dualidades de informação, saneamento
básico, a pouca ajuda do governo, o aumento da taxa de desemprego alcançou mais a
população menos favorecida. Muitos que não perderam seus empregos, mas que não tiveram
a opção de trabalhar em casa, por falta de alternativas tiveram que fazer uso do transporte
público e enfrentar aglomerações para poder trabalhar, e isso também se encaixa no termo
abordado. Desta forma, a conjuntura brasileira nestes acontecimentos de pandemia e crise
na saúde, refletem praticamente o mesmo comportamento mesmo que períodos diferentes,
com um país ainda sem estruturas para fornecer um sistema saúde eficaz e funcional. Como
também, uma ampliação da vulnerabilidade social presente em ambos os momentos, como
grande divisor como a doença chega para todos, mas por serem contextos econômicos e
sociais distintos existe uma grande desigualdade e assistência que se reflete no nível de
mortalidade do vírus. Enteando-se assim que mais do que uma pandememais, estamos diante
de fenômenos, sindêmicos, ou seja, uma doença que massacra especialmente as população
mais empobrecidas no mundo todo, mostrando assim o quanto globalmente e espacialmente
o mundo e dividido entre pobre e ricos até na questão das doenças (SANTOS,2004).

CONSIDERAÇÕES FINAIS:
As pandemias enquanto processo de espalhamento atingem as mais diversos tipos
de pessoas e transformam os cotidianos, a maneira de trabalhar e maneira de se comunicar
e de pensar no futuro. Especialmente a partir dos pontos aqui analisados fica cada vez mais
evidente o quanto as pandêmicas globais, frente a sociedade capitalista em que vivemos
estas doenças afetam mais profundamente as populações de maior vulnerabilidade do
planeta, as já doentes empobrecidas, evidenciando a questão sindêmica desses casos.
Dessa maneira, e importante tratar das doenças investindo sobretudo na
minimização das desigualdade sociais anteriores a elas garantindo, de maneira mínima o
acesso a saúde publica de qualidade, dando dignidade as vidas humanas em nosso locus e
em nosso planeta.

133
MEDEIROS, M.L.; SANTOS JÚNIOR, J. S.; ANDRADE, M.V. A influência da gripe espanhola e Covid-19 na transformação
do espaço geográfico recifense. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios
das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.126-134. Disponível em
https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

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<https://g1.globo.com/pe/pernambuco/noticia/2020/03/20/coronavirus-governo-de-
pernambuco-determina-fechamento-de-comercio-servicos-e-obras-de-construcao-
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SWARTZ. LILIAN. A BAILARINA DA MORTE : A GRIPE ESPANHOLA NO BRASIL. SÃO
PAULO. 2020.

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PEDROSO, M.F.; GUIMARÃES, R.B. Entre o normal e o patrológico existe Geografia: contribuições teóricas da Geografia da
Saúde. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021,
Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.135-144. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN
1980-5829

ENTRE O NORMAL E O PATOLÓGICO EXISTE GEOGRAFIA: CONTRIBUIÇÕES


TEÓRICAS DA GEOGRAFIA DA SAÚDE

PEDROSO, Mateus Fachin1


GUIMARÃES, Raul Borges2
Resumo
No presente texto, tratamos de questões que partem do debate acerca dos padrões das
normatividades vitais (normal e patológico) problematizadas pelo filósofo e médico francês
Georges Canguilhem (1904-1995). Dado que esta construção teórico-metodológica emerge
como um ponto crucial para o debate da Geografia da Saúde, tivemos como objetivo central
desenvolver e aprofundar construções que pautem as categorias espaço e saúde como centro
da compreensão dos fenômenos que afetam as pessoas e seus corpos, de modo que analise
o conjunto e proponha ações que estejam diretamente ligadas ao processo de saúde-doença.
Esse raciocínio geográfico abre a possibilidade de compreensão sobre como se configuram
as normatividades vitais, entendendo que tal processo torna o ser humano um resultado-
resultante que se relaciona, produz e transforma o contexto geográfico em que se encontra.
Palavras-chave: Geografia da Saúde; Normal-patológico; Georges Canguilem.

Abstract
In the present text, we deal with questions that arise from the debate about the standards of
vital norms (normal and pathological) problematized by the French philosopher and physician
Georges Canguilhem (1904-1995). Since this theoretical-methodological construction
emerges as a crucial point for the debate on the Health Geography, our main objective was to
develop and deepen constructions that guide the space and health categories as the center of
understanding of the phenomena that affect people and their bodies, in order to analyze the
whole and propose actions that are directly linked to the health-disease process. This
geographical reasoning opens up the possibility of understanding how vital normativities are
configured, understanding that this process makes the human being a result-result that relates,
produces and transforms the geographic context in which it finds itself.
Keywords: Health Geography; Normal-pathological; Georges Canguilem.

Introdução

As construções teóricas aqui apresentadas são frutos das interpretações que


emergem das experiências produzidas por mulheres que vivem com o HIV/AIDS em
Presidente Prudente – SP3. Deste modo, a presente problematização do conhecimento toma

1 Doutorando em Geografia da FCT/UNESP – Presidente Prudente/ mateus_fachin@hotmail.com


2 Professor Titular do Departamento de Geografia FCT/UNESP – Presidente Prudente/ Orientador/
raul@fct.unesp.br
3 As construções teóricas apresentadas neste trabalho advêm do desenvolvimento da tese de
doutorado em Geografia do primeiro autor. Esta pesquisa usufrui de financiamento da CAPES e se

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PEDROSO, M.F.; GUIMARÃES, R.B. Entre o normal e o patrológico existe Geografia: contribuições teóricas da Geografia da
Saúde. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021,
Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.135-144. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN
1980-5829

como medida a realidade, o que torna viável propor como objetivo central a compreensão de
um raciocínio geográfico que se debruça sobre as questões de saúde e doença a partir das
contribuições das normatividades vitais.
É preciso expressar que existem diferentes esforços das mais variadas áreas do
conhecimento que dedicaram reflexões acerca do que é a saúde e doença. Tais elaborações
foram pensadas ao longo da história da humanidade e tiveram como prerrogativa inicial o
emparelhamento antagônico entre saúde e doença, isso como tentativa de definir a
concepção de saúde como ausência de doença manifestada (CZERESNIA; MACIEL;
OVIEDO, 2013).
Esse raciocínio primário foi de extrema importância para os desdobramentos
posteriores (LAURELL, 1982), dado que outros elementos passaram a compor o conjunto de
análise, pois já não era mais possível desconsiderar as questões biológicas, sociais e culturais
que recaiam sobre os corpos quando evocadas as questões sobre saúde e doença
(SAFATLE, 2011). Foram estas demandas que fomentaram o olhar crítico sobre o objeto da
medicina, o que reorganizou seu conhecimento elevando o nível reflexivo acerca dos métodos
e dos conceitos construídos até então (FOUCAULT, 1977).
Diante desta complexidade, Almeida Filho (2011) exprime alguns esforços e destaca
quatro vieses possíveis para compreender saúde: 1) saúde como conceitos, sendo estes
respaldados tanto pela filosofia do conhecimento como pela linguagem; 2) saúde por meio do
seu valor empírico, comumente realizada nas ciências biológicas; 3) saúde como elemento
analisável, do ponto de vista lógico, matemático e probabilístico; e 4) saúde perceptível,
apreendida através das condições de vida das pessoas. Essas são algumas das
possibilidades pelas quais se pode conceber a saúde, dado que “[...] percebemos que falar
sobre saúde não equivale a falar sobre não-doença e falar sobre doença não equivale a falar
sobre não-saúde, rastreamos, por meio de um simples exercício de linguagem, um aspecto
prático da maior importância” (AYRES, 2007, p. 45).
No presente texto, trataremos dessas questões a partir do debate acerca dos padrões
de normal e patológico problematizado pelo filósofo e médico francês Georges Canguilhem
(1904-1995). Para ele, é desta forma que a linguagem possibilita a interpretação da plural
dimensionalidade da saúde que não a esvazia enquanto conceito (CANGUILHEM, 1990), pelo
contrário, reforça e demonstra a potência que a saúde tem sobre a vida nas mais diferentes
interfaces, já que “[...] envolve a construção compartilhada de nossas ideias de bem-viver e
de um modo conveniente de buscar realizá-las na nossa vida em comum. Trata-se, assim,
não de construir objetos/objetividades, mas de configurar sujeitos/intersubjetividades”
(AYRES, 2007, p. 50).
Assim, as dimensões da vida carregam seus sentidos biológicos, sociais e existenciais,
que estão em constante interação frente aos acontecimentos presentes na realidade dos
sujeitos (CANGUILHEM, 2012). Isso expressa a relação universal que se constrói por meio
dos conhecimentos humanos, que analisam os diferentes modos de organizar e interpretar a
vida, dado que esta é considerada como uma constante “formação de formas” que não se
encerra em seus próprios resultados, o que a caracteriza como “[...] uma atividade polarizada

encontra vinculada ao Programa de Pós-graduação em Geografia (PPGG) da Faculdade de Ciências


e Tecnologia (FCT – UNESP), Campus de Presidente Prudente, SP.

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PEDROSO, M.F.; GUIMARÃES, R.B. Entre o normal e o patrológico existe Geografia: contribuições teóricas da Geografia da
Saúde. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021,
Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.135-144. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN
1980-5829

contra tudo que é da ordem da inércia e da indiferença” (NEVES; PORCARO; CURVO, 2017,
p. 630). Em outros termos, a vida é movimento que se ajusta.
Ao entendermos a vida enquanto um fenômeno metabólico, consequentemente,
compreendemos que as pessoas ao longo da vida vivenciam diversos acontecimentos que se
desdobram diretamente sobre a capacidade de desfrute, seja por meio de vivências
prazerosas e/ou dolorosas, que surgem enquanto categorias valorativas pelas quais as
qualificamos antes mesmo de racionalizá-las (GÓMEZ-ARIAS, 2018). Esse movimento da
vida, junto às decorrentes experimentações, é mediado pelos símbolos linguísticos que os
representam e diferenciam, uma vez que estes “[...] são o resultado de processos
particularmente complexos e criativos que produzem conceitos e envolvem a sociedade como
um todo; neste sentido podemos falar do processo social de produção de conhecimento”
(GÓMEZ-ARIAS, 2018, p. 68, tradução nossa)4.
Assim sendo, a produção do conhecimento acerca da vida nos aproxima de diferentes
experiências fundamentais da humanidade que, por vezes, são escamoteadas pelo receio da
possibilidade de dor e sofrimento, como é o caso da doença e da morte em nossa sociedade
ocidental que, culturalmente, nos faz “esquecer” que estas próprias experiências fazem parte
da vida (CZERESNIA, 2012). É por este ângulo que “a racionalidade da vida é idêntica à
racionalidade daquilo que a ameaça. Elas não estão, uma com relação às outras, como a
natureza está com a contra-natureza; mas se ajustam e se superpõem em uma ordem natural
que lhes é comum” (FOUCAULT, 1977, p. 06), fazendo com que seja mantido o esforço pela
valorização da vida por parte do vivente, que insiste em resistir e transformar as intempéries
encontradas durante o processo do viver (KOIDE, 2019).
É nesta acepção que as interfaces aqui destacadas representam uma parcela da
complexidade da vida enquanto categoria, entendido que esta se mantém lastreada no social
em movimento [lê-se espaço e tempo]. Assim, quando pautadas as distintas relações,
sobretudo aquelas relacionadas às questões de saúde e doença, a vida toma o corpo como
ponto de partida, e muitas vezes de chegada (CANGUILHEM, 1998).

Saúde e Doença: princípios geográficos e a construção de normas vivíveis

São questões como essa que nos desperta pensar os sujeitos sociais - como sugere
Ayres (2001; 2007) -, e ao fazê-lo nos deparamos com a necessidade de compreender o que
e quais são as normas5 que arregimentam a vida dos sujeitos, e como são as relações

4“[...] son el resultado de procesos particularmente complejos y creativos que producen conceptos y
que involucran a la sociedad en su conjunto; en tal sentido podemos hablar del Proceso social de
producción de conocimientos” (GÓMEZ-ARIAS, 2018, p. 67-68).

5 Abbagnano (2007, p. 716-717) define norma a luz do neocriticismo alemão que “[...] formou-se através

da distinção e da contraposição entre o domínio empírico do fato (da necessidade natural) e o domínio
racional do dever ser (da necessidade ideal). Sua validade não deriva do fato de ser ou não aceita ou
aplicada, mas apenas do dever ser que exprime [...]. As normas exprimem, habitualmente, a disciplina
mais conveniente de determinadas atividades, com vistas a conferir-lhes a maior eficiência e precisão
possíveis. Portanto, se elas nem sempre são generalizações daquilo que já está sendo feito ou

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PEDROSO, M.F.; GUIMARÃES, R.B. Entre o normal e o patrológico existe Geografia: contribuições teóricas da Geografia da
Saúde. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021,
Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.135-144. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN
1980-5829

contextuais que se organizam junto à concepção de saúde, visto que, vale memorar que é a
saúde a detentora da capacidade de estabelecer, rearranjar ou mesmo mudar de norma, não
estando à mercê da simples adaptação ou conformação (SAFATLE, 2011; 2015).
É sob este conjunto que se fazem válidas as contribuições de Canguilhem (1990), já
que o autor dedicou grande parte de sua construção teórica sobre a distinção entre saúde e
normalidade, afirmando que “[...] a normalidade enquanto norma de vida é uma categoria mais
ampla, que engloba a saúde e o patológico como distintas subcategorias, numa visão de
conjunto. Nesse sentido, tanto a saúde quanto a doença são normais” (COELHO; ALMEIDA
FILHO, 1999, p. 29), ao ponto que ambas conjunturam a normalidade de vida, na qual a saúde
é considerada uma norma superior e a doença uma norma inferior, em outras palavras, são
graus da normatividade vital (CANGUILHEM, 1990; COELHO; ALMEIDA FILHO, 2002).
Diante do exposto, a relação entre os graus de normatividade está arraigada aos
valores e significados socialmente construídos que perpassam a concepção de vida dos
sujeitos (DONNANGELO, 2014), uma vez que as normatividades vitais podem se atrair, se
alternar, se misturar, competir, complementar e mesmo coexistir, estando a complexidade do
arranjo sob a égide das condições de vida dos sujeitos ou dos grupos a que pertencem
(GOMÉZ-ARIAS, 2018).
Isso faz com que determinadas compreensões passem a ser mais ou menos aceitas
no movimento de busca por uma elaboração conceitual, como acontece com a “saúde
perfeita” que se transforma em um conceito normativo, idealizado e utópico, como propõe
Canguilhem (1990), ao argumentar que a saúde perfeita não existe, já que o “[...] conceito de
saúde não é o de uma existência, mas sim o de uma norma cuja a função e cujo o valor é
relacionar esta norma com a existência a fim de provocar a modificação desta”
(CANGUILHEM, 1990, p. 54).
Destarte, cabe lembrar que esses graus de normatividade vital não o são em si, já que
as normas que os pressupõem estão atreladas e contextualizadas nas relações sociais (e
também espaciais) em que se organizam, fazendo com que não haja “uma continuidade
quantitativa entre normal e patológico, mas [uma] descontinuidade qualitativa” (SAFATLE,
2011, p. 18). É isto o que traz para o centro narrativo a perspectiva dos sujeitos que vivenciam
os graus de normatividade já que tal processo antecede o saber científico por meio da
experiência (PEDROSO; GUIMARÃES, 2015), exigindo assim que a possibilidade de outros
graus normativos (como o patológico) sejam respeitados enquanto novas condições
(COELHO; ALMEIDA FILHO, 2002).
É sob esta perspectiva que a elaboração de Canguilhem (1990) sobre o normal e o
patológico toma como base a interação relacional do ser humano (vida e corpo) com seu
respectivo meio6, visto que ele considera “que a saúde se realiza no genótipo e na relação do
indivíduo com o meio, opondo uma saúde filosófica a uma saúde científica. Enquanto que a

realizado — porque inclusive podem inspirar-se em uma ordenação completamente diferente —


tampouco são alheias aos campos de atividade humana que visam a regular”.
6Essas proposituras são resultantes de extensos e históricos debates que foram construídos a partir
de teorias que buscaram compreender a saúde e as causas de doenças. Exemplo disso, são as
contribuições de Hipócrates de Cós (460-377 a.C.) que pautava o equilíbrio dos fluídos dos indivíduos
e as relações que estabelecia com o meio (SCLIAR, 2007).

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PEDROSO, M.F.; GUIMARÃES, R.B. Entre o normal e o patrológico existe Geografia: contribuições teóricas da Geografia da
Saúde. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021,
Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.135-144. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN
1980-5829

saúde filosófica é a saúde individual, a saúde científica teria sido a saúde pública, ou seja, a
salubridade e a doença” (COELHO; ALMEIDA FILHO, 1999, p. 25-26).
Deste modo, as considerações de Canguilhem (1990) ampliam a interpretação do
processo de saúde-doença, a partir de como os seres humanos se relacionam, produzem e
transformam o contexto geográfico em que se encontram. Esse feito abriu a possibilidade de
compreensão sobre como se configuram as normatividades vitais, entendendo que tal
processo torna o ser humano um resultado-resultante que está diretamente conectado aos
movimentos da vida (CANGUILHEM, 1998; 2012; CAPONI, 1997).
Este foi um grande marco na ciência da saúde, que seguiu sendo amplamente
difundido e debatido por diferentes autores, clássicos e contemporâneos, que refletiram e
contribuíram com as proposições de Canguilhem (1990), a citar nomes como Foucault (1977);
Coelho e Almeida Filho, 2003; Safatle (2006; 2011; 2015); Czeresnia, 2010; Almeida Filho
(2011) entre outras(os), que no movimento de construção aprofundaram os argumentos
outrora apresentados.
Assim, foram iniciadas reflexões que se debruçaram sobre uma complexidade que se
fazia crescente e acelerada, oriunda dos desdobramentos presentes nestas relações. Não
obstante, se faz necessário destacar que as contribuições das(os) autoras(es) acima
mencionados salientam para além da simples relação do indivíduo-meio, uma vez que
expressam os elementos que medeiam o processo no qual esta relação de estruturação
acontece. Esta interação constante distancia os indivíduos de uma compreensão meramente
mecânica e/ou físico-biológica, ao modo que a dinamicidade da vida passa a ser entendida
enquanto um metabolismo social de produção em que se constitui a organização da história
humana como um todo societário (GÓMEZ-ARIAS, 2018).
É neste decurso que a discussão empregada por Canguilhem (1990) traz uma valiosa
contribuição, que a nosso ver têm importantes lastros com a Geografia, uma vez que o autor
constrói sua teoria sobre o normal e o patológico estabelecendo vínculos geográficos, dado
que emprega o uso do termo ‘meio’ para se referir à produção do espaço geográfico.
No âmbito deste estudo, cabe dizer que a ciência não mimetiza a complexidade da
vida de forma restrita às questões bio-fisiológicas, mas também não descarta o elo existente
entre o material e simbólico, o que torna esta relação paradoxal do ser humano, visto que “na
realização do metabolismo mais básico está presente uma dimensão de ‘escolha’ entre
impulsos de agregação e desagregação; de assimilação e de excreção” (CZERESNIA, 2012,
p. 05), ou seja, uma contínua simbiose do estar vivo, do ser e existir, já que a vida é dimensão
do ser.
Assim sendo, as colocações de Czeresnia (2012) fomentam um debate ontológico que
está ancorado no corpo para além do orgânico, quando pensamos as questões de saúde,
uma vez que ressalta a importância da existência corporificada que capta, produz e consome
os fenômenos experienciados, pois considera que o corpo “não é destituído de pensamento
que o caracteriza, sua condição material e orgânica não é separável da linguagem. A
emergência do humano provém de uma anterioridade, origem da própria vida” (CZERESNIA,
2012, p. 124).
Esta construção teórico-metodológica traz um ponto crucial para o debate da
Geografia que temos empenhado por meio da interpretação do contexto geográfico, uma vez
que tomamos como ponto referencial os cursos de vida das mulheres vivendo com HIV/AIDS
e os decorrentes processos constituídos. Deste modo, o presente assunto nos aproxima da

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Saúde. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021,
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Teoria da dupla determinação geográfica da saúde, especificamente, ao que se dedica o eixo


da determinação ontológica que toma como questões estruturantes o conceito de trabalho
num todo societário, e a reintegração do corpo no espaço como modo espacial de existência
(GUIMARÃES, 2019).
Estes pressupostos estão fundamentados na concepção filosófica do realismo crítico,
que a nós serve enquanto base interpretativa para os problemas reais de saúde, uma vez que
os entendemos enquanto modalidades ontológicas do ser, passíveis de leitura geográfica,
visto que “[...] as categorias espaço e saúde apresentam-se como universais abstratos dos
conceitos geográficos, que são objetos reais que podem ser apreendidos a partir da análise
da reprodução do espaço vivido” (GUIMARÃES, 2016, p. 873), argumento este que traz
concretude e permite a elaboração de sínteses acerca dos fenômenos.
Neste ínterim, estas modalidades ontológicas do ser - saúde e espaço - acabam sendo
percebidos diretamente pelos corpos dos sujeitos que, em específico, reconhece a saúde em
seu sentido ontológico, uma vez que considera que o corpo vivido em movimento não se
restringe apenas como objeto, pois viver de forma real-corporificada para os seres humanos
é experienciar, conhecer e saber (CANGUILHEM, 1998).

Desenvolvimento e discussões

Ao elaborarmos tal raciocínio com base nos pressupostos metodológicos de


Canguilhem, partirmos das interações entre Geografia e Saúde enquanto pilares primários
para interpretarmos a realidade dos sujeitos sociais. Com isso, nos respaldamos nas
colocações de Silva (1991), que nos alerta para as interações que estruturam as formas de
organização social, ou seja, os modos de existência (político e cultural), que garantem a
incorporação de elementos interdisciplinares e, portanto, ampliam a discussão para além do
corpo clínico-anátomo-fisiológico. Em outras palavras, funda-se nesse processo o ser-aí, um
ser projetado no mundo.
Logo, a construção interpretativa de um ser-no-mundo não está descolada da
concretude material, pois há coexistência entre ser, pensar e estar, sobretudo, no que se
refere ao corpo que produz e percebe a relação saúde-doença a partir das suas formas de
inserção no mundo (GUIMARÃES, 2006; 2015). Isto porque tal relação parte da projeção da
“[...] experiência clínica que se arma para explorar um novo espaço: o espaço tangível do
corpo, que é ao mesmo tempo esta massa opaca em que se ocultam segredos, invisíveis
lesões e o próprio mistério das origens” (FOUCAULT, 1977, p. 139). Essa conexão exprime
autoprodução dos seres humanos por meio de seu complexo bio-ontológico (MARTINS,
2007), que expressa o conjunto de relações “[...] entendidas em seus imbricamentos com o
texto e o contexto, que são capazes de revelar o movimento do real, transpondo ao
pensamento como objeto pensado” (SILVA, 1992, p. 108).
Deste modo, compreendemos que é esta anterioridade que permanece e mantém o
movimento de (re)constituição do corpo que o faz interagir com os elementos que o
contextualizam em posições interativas e relacionais no espaço (MOREIRA, 2012). Isso torna
observável “uma determinação ontológica imposta pela mudança de olhar geográfico para o
espaço enquanto um modo espacial da existência humana, isto é, como resultado da relação
metabólica” (GUIMARÃES, 2019, p. 128) que nos faz entender que junto ao corpo e suas
questões ontológicas estão algumas condições do ‘ser e existir’ - sendo a saúde uma delas -

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1980-5829

que não necessariamente se refere às regularidades operacionalizantes, mas à busca pelo


fazer, por sempre estar em movimento, processos de ressignificações e transformações. Isso
tudo
porque somos finitos no tempo e no espaço e não temos a possibilidade de
compreensão da totalidade de nossa existência, individual ou coletiva, é que
estamos sempre, a partir de cada nova experiência vivida em contato com o
desconhecido e buscando reconstruir o sentido de nossas experiências
(AYRES, 2007, p. 50, grifo nosso).

Assim sendo, o corpo quando lançado ao mundo enquanto ser-aí se torna veículo para
as interpretações acerca da Geografia, Saúde e Doença intrínsecas a sua existência
(GUIMARÃES, 2019). Por isso é imprescindível que tenhamos a capacidade de olhar para
além do corpo, para que estabeleçamos com fidedignidade o que vem a ser normal e/ou
patológico para esse mesmo corpo (CANGUILHEM, 1990).
Considerar isso, automaticamente implica em relacionar os elementos gregários que
compõem a complexidade da vida dos sujeitos, suas dores, ações, gozo, reprodução; desde
seus aspectos físico-biológicos até os que garantem a corporeidade, gênero, etnia, condições
econômicas e culturais (GOMÉZ-ARIAS, 2018), que se constituem mutuamente de forma
contínua, uma vez que “os espaços de programação genética e de programação cultural
interagem produzindo o espaço da personalidade. O espaço da personalidade, uma vez
produzido, tende a reproduzir-se gerando referências de necessidade, conduta e motivação”
(SILVA, 1986, p. 127).
Tais colocações contribuem enquanto um marco que serve como ponto de partida para
outras reflexões, questionamentos e tensões que propõem distintas formas de pensar a saúde
(SEGRE; FERRAZ, 1997). É neste sentido que são válidos alguns esforços que se debruçam
sobre a saúde e suas conexões, visto que à saúde pode ser compreendida como valor e, por
sua vez configura o poder de decisão na elaboração de normas que interacionam e compõem
a produção do espaço (GUIMARÃES, 2019).
Isso nos direciona a pensar que, tanto as concepções de saúde como a de doença
não se constroem apenas no abstrato, ou seja, sem um lastro espacial e temporal que esteja
calcado no plano vivido (individual ou coletivo), pois “os sentidos da saúde e da doença são,
ainda, configurados social, histórica e culturalmente. Eles não estão isentos de crenças,
hierarquias, juízos de valores, conhecimentos e atitudes compartilhados em grupo”
(CZERESNIA; MACIEL; OVIEDO, 2013, p. 15). Estas interpretações assim colocadas
permanecem ancoradas no acontecer do fenômeno da vida interpretada pela confluência
existente entre a Saúde Coletiva e a Geografia (GUIMARÃES, 2016), que acabam sendo
percebidas pelos sujeitos a partir das posições que ocupam no mundo.
Segundo Guimarães (2015), essa se torna uma questão primordial que reposiciona os
sujeitos no centro do conhecimento geográfico, uma vez que entende que o centro do mundo
é uma construção social não definida e,
portanto, o que é Geografia, o que é Saúde e qual a relação entre esses
termos depende do contexto histórico e geográfico. Os meios são
contextos culturais e técnicos que expressam modos espaciais de existência.
O ente que é o homem tem a saúde como sua objetivação. Tal objetivação
se realiza na produção do meio geográfico (GUIMARÃES, 2015, p. 48, grifo
nosso).

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PEDROSO, M.F.; GUIMARÃES, R.B. Entre o normal e o patrológico existe Geografia: contribuições teóricas da Geografia da
Saúde. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021,
Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.135-144. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN
1980-5829

Essa construção nos apresenta outras perspectivas que trazem consigo inúmeros
significados, o que acaba por reforçar a legitimidade de interpretarmos os contextos
geográficos produzidos e vivenciados pelos sujeitos, ao mesmo tempo em que possibilita
questionarmos de modo mais amplo sobre quais normas estão sendo pautadas? Quais são
as concepções de saúde e doença? E em quais contextos geográficos estão situadas e se
realizam?
Portanto, é partindo destes pressupostos que elaboramos reflexões acerca do normal
e do patológico tendo aporte empírico a interpretação da realidade de mulheres que vivem
com HIV/AIDS, visto que nos debruçamos sobre os problemas reais de saúde enfrentados
pelas pessoas (ALVES; PEDROSO; GUIMARÃES, 2019). Isso porque para nós o que
realmente importa é a contínua luta pela vida, dado que cremos que “[...] os sujeitos produzem
a sua própria geografia. Independentemente de pensarmos sobre as coisas, elas existem.
Aliás, só podemos estruturar nosso pensamento geograficamente porque na vida real há uma
geografia vivida” (GUIMARÃES, 2015, p. 47-48). Assim sendo, priorizamos o entrelaço das
vozes dessas mulheres que quando evocadas constroem diferentes saberes que, por vezes,
transitam e transcendem o científico.

Considerações finais

Por assim ser, a concepção de saúde e doença, sobretudo a de saúde, se torna algo
de difícil generalização, já que não adota um modelo cientificamente fundamentado (BASTOS,
2011), evidenciando assim um alto grau de complexidade no que tange seu entendimento,
pois a concepção de saúde, inerentemente, se mantém refletida pela “[...] conjuntura social,
econômica, política e cultural, ou seja, saúde não representa a mesma coisa para todas as
pessoas. Dependerá da época, do lugar, da classe social. Dependerá de valores individuais,
dependerá de concepções científicas, religiosas, filosóficas” (SCLIAR, 2007, p. 30), que em
constantes e distintas interações proporcionaram diversificados conceitos de saúde. Em
outros termos, saúde se concebe de forma relacional no espaço-tempo, situada no contexto
geográfico.
A proposta desse trabalho foi expressar a possibilidade de se desenvolver e
aprofundar construções que pautem as categorias espaço e saúde como centro da
compreensão dos fenômenos que afetam as pessoas e seus corpos, de modo que analise o
conjunto e proponha ações que estejam diretamente ligadas ao processo de saúde-doença e
a fundamentação das normas que regem as vidas dos sujeitos (GUIMARÃES, 2015; 2016).
Esta perspectiva contribui para compreendermos cada contexto geográfico que as
pessoas vivenciam, dado que a relação entre os corpos e espaços junto aos processos de
saúde-doença configuram o que vem a ser normal e/ou patológico, uma vez que a “[...]
distinção entre normal e patológico está claramente ancorada na reconstrução da experiência
do corpo, constituição de uma tecnologia de normatização do corpo a partir de uma estrutura
valorativa que guia a racionalidade clínica” (SAFATLE, 2011, p. 17-18). Deste modo, tais
reflexões nos fazem evidenciar pontos importantes, pois levantam questões acerca da
construção daquilo que entendemos por saúde no decorrer da vida, e quais são os modos
pelos quais fazemos isso.

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PEDROSO, M.F.; GUIMARÃES, R.B. Entre o normal e o patrológico existe Geografia: contribuições teóricas da Geografia da
Saúde. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021,
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Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande.
Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.145-155. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

METODOLOGIA DA PESQUISA E ENSINO: pesquisas realizadas pelo Pró-Saúde Geo


entre 2010 e 2020
PEREIRA, Martha Priscila Bezerra1
RESUMO:
Esse texto trata de uma síntese dos trabalhos de pesquisa de iniciação científica realizada
pelo Grupo de Pesquisa Pró-Saúde Geo entre 2010 e 2020 e suas aplicabilidades na
graduação em Geografia da UFCG – campus Campina Grande; Desta forma, tem como
objetivo fazer uma síntese das pesquisas realizadas entre 2010 e 2020 relacionadas à linha
“Metodologia da Pesquisa e ensino” pelo grupo de Pesquisa Pró-saúde Geo; Para viabilizar
esta síntese optou-se pelos seguintes procedimentos: a) levantamento de referências; b)
análise de pesquisas de iniciação científica realizadas entre 2010 e 2020 na linha de pesquisa
“Metodologia da pesquisa e ensino” e c) levantamento documental; Como principais
resultados para o grupo de pesquisa percebeu-se que essas pesquisas trouxeram uma maior
dinâmica no uso de teorias, de opções metodológicas e em relação a organização de um
trabalho de campo melhor planejado. Para as disciplinas houve uma melhoria na qualidade
de seu conteúdo teórico e viabilizou maior qualidade na relação teórico-prática, principalmente
na execução de trabalhos de campo. Em síntese, percebe-se que essas pesquisas,
inicialmente básicas, possuem aplicabilidades tanto para o ensino quanto para o próprio grupo
de pesquisa e potencialmente serve de base para projetos de extensão.

Palavras-chave: Pesquisa, Metodologia, Iniciação Científica.

ABSTRACT:
This text is a synthesis of the scientific initiation research work carried out by the Geo Pro-
Health Research Group between 2010 and 2020 and its applicability in undergraduate studies
in Geography at UFCG - Campina Grande campus; In this way, it aims to summarize the
research carried out between 2010 and 2020 related to the “Research Methodology and
Teaching” line by the Geo Pro-Health Research group; To make this synthesis feasible, the
following procedures were chosen: a) survey of references; b) analysis of scientific initiation
research carried out between 2010 and 2020 in the research line “Research and teaching
methodology” and c) documentary survey; As the main results for the research group, it was
noticed that these researches brought a greater dynamic in the use of theories, methodological
options and in relation to the organization of a better planned fieldwork. For the subjects, there
was an improvement in the quality of their theoretical content and enabled greater quality in
the theoretical-practical relationship, mainly in the execution of fieldwork. In summary, it is clear
that these researches, initially basic, have applicability both for teaching and for the research
group itself and potentially serve as a basis for extension projects.

Keywords: Research, Methodology, Scientific Initiation.

1
Docente no curso de Geografia na UAG/ CH/ UFCG; mpbcila@yahoo.com.br.

145
PEREIRA, M.P.B. Metodologia da Pesquisa e Ensino: pesquisas realizadas pelo Pró-saúde Geo entre 2010-2020. In. Simpósio
Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande.
Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.145-155. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

INTRODUÇÃO:
Este texto trata de uma síntese dos trabalhos de pesquisa realizados pelo grupo de
Pesquisa Pró-Saúde Geo na linha de pesquisa “Metodologia da pesquisa e ensino” e a
aplicação desses resultados no ensino da graduação entre 2010 e 2020 no âmbito do curso
de Geografia da UFCG, no campus de Campina Grande – PB. Este trabalho estaria mais
relacionado ao eixo “Dimensões históricas, teóricas e metodológicas da Geografia da Saúde”.
Quanto a classificação geral de pesquisas, estas estariam inseridas nas ciências humanas,
são pesquisas básicas e variam entre exploratórias e descritivas (GIL, 2010).
O Pró-Saúde Geo, ou Grupo de Pesquisa em Geografia para Promoção da Saúde
tem como principal objetivo elaborar projetos em caráter transdisciplinar na área de Políticas
Públicas e Saúde Ambiental aproximando o conhecimento geográfico com a saúde coletiva
(PRÓ-SAUDE GEO, 2021).
Ao longo de sua existência (2020-2021), tem elaborado trabalhos em quatro linhas
de pesquisa: a) arte de cuidar da saúde; b) metodologia da pesquisa e ensino; c) Políticas
Públicas voltadas à saúde e; d) Território, ambiente e saúde.
Este trabalho teve como objetivo fazer uma síntese das pesquisas realizadas entre
2010 e 2020 relacionadas a linha “Metodologia da pesquisa e ensino” pelo grupo de Pesquisa
Pró-Saúde Geo. Foram relacionados apenas os trabalhos dessa linha de pesquisa que foram
aprovados pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) e Programa
Institucional de Voluntários de Iniciação Científica (PIVIC).
Este texto está dividido em duas partes, além desta introdução e das considerações
finais. Na primeira parte “Fundamentos teórico-metodológicos” foram apresentados os
procedimentos realizados na pesquisa e apresentados os fundamentos teóricos gerais das
pesquisas. No item “Resultados” foram apresentados os resultados de cada pesquisa, seus
fundamentos teóricos específicos e apresentadas as aplicabilidades destas pesquisas para o
próprio grupo de pesquisa e para algumas disciplinas do curso que tem maior relação com a
área teórico-metodológica ou com a Geografia da Saúde.

FUNDAMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS:
As pesquisas escolhidas destacaram-se por evidenciarem delineamentos (GIL, 2010)
e métodos de procedimento (MARCONI & LAKATOS, 2010).
Com base em autores como Cervo, Bervian e Silva (2007), Marconi e Lakatos (2010),
Gil (2010) e Chizzotti (2011) os delineamentos e métodos de procedimento variam conforme
a fundamentação teórica, quantidade de locais ou instituições estudadas, quanto ao ambiente
em que são coletados, quanto ao envolvimento dos sujeitos pesquisados e quanto ao grau de
controle de variáveis. Devido a essa variedade de classificações é que se tem a possibilidade
de utilizar vários métodos ao mesmo tempo em uma única pesquisa e utilizar em vários tipos
de pesquisa, assim como não necessariamente se utiliza de todos esses critérios ao mesmo
tempo.

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PEREIRA, M.P.B. Metodologia da Pesquisa e Ensino: pesquisas realizadas pelo Pró-saúde Geo entre 2010-2020. In. Simpósio
Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande.
Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.145-155. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Os delineamentos seriam o planejamento de pesquisa em uma dimensão ampla, que


envolve os fundamentos teórico-metodológicos, objetivos, ambiente da pesquisa, técnicas de
coleta, análise de dados, entre outras possibilidades. Esse delineamento expressaria a ideia
de um modelo, de um plano geral a ser seguido (GIL, 2010).
Os métodos de procedimento têm relação com etapas menos abstratas da pesquisa,
mas que igualmente delineiam as ações do pesquisador durante o processo de execução da
pesquisa (MARCONI & LAKATOS, 2010).

Para viabilizar esta síntese, optou-se pelos seguintes procedimentos: a)


levantamento de referências; b) análise de pesquisas de iniciação científica realizadas entre
2010 e 2020 na linha de pesquisa “Metodologia da pesquisa e ensino” e c) levantamento
documental.
O levantamento de referências foi realizado para aprofundar um pouco mais sobre o
tema, os procedimentos metodológicos e a fundamentação teórica.
A análise das pesquisas deu uma maior ênfase a questão metodológica e suas
possibilidades de aplicabilidade reais e potenciais, além de destacar as que abrangeram
também Campina Grande.
O levantamento documental foi realizado a partir dos relatórios de pesquisa. Foram
ao todo cinco pesquisas pelo Programa Institucional de Voluntários e Iniciação Científica
(PIVIC) e 2 pesquisas pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC).

RESULTADOS:
Os resultados das pesquisas consideradas foram distintos, sendo reunidas em um
quadro para melhor esclarecer o leitor (quadro 1). Dentre esses trabalhos, os que estão menos
relacionados à Geografia da Saúde seriam as pesquisas 1 “Desafios e potencialidades do
trabalho de campo nos cursos de Geografia nas Instituições de Ensino Superior da Paraíba”,
3 “Desafios e potencialidades do trabalho de campo nos cursos de Geografia em Instituições
de Ensino Superior no Brasil” e 7 “Trajetórias epistemológicas da Geografia: uma análise do
conceito de território nos estudos agrários”. Devido estarem mais distantes da proposta do
evento estes não serão considerados neste trabalho.
Desta forma, os trabalhos que estariam mais próximos à Geografia da Saúde seriam:
a) 2 “Conhecimento geográfico aplicado aos roteiros de campo em Geografia da Saúde no
município de Campina Grande – PB e municípios circunvizinhos”; b) 4 “Conhecimento
geográfico aplicado aos roteiros de campo em Geografia da Saúde no município de Campina
Grande – PB”; c) 5 “Teorias aplicáveis à Geografia da Saúde: uma revisão da literatura” e; d)
6 “Situação do Grupo de Pesquisa em Geografia da Saúde para Promoção da Saúde em
relação aos grupos de pesquisa em Geografia e Saúde no Brasil.” Estes trabalhos serão
denominados por números a partir deste momento.
QUADRO 01 – PESQUISAS REALIZADAS ENTRE 2010 E 2020 NO ÂMBITO DO PRÓ-SAÚDE GEO NA
LINHA “METODOLOGIA DA PESQUISA E ENSINO”

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PEREIRA, M.P.B. Metodologia da Pesquisa e Ensino: pesquisas realizadas pelo Pró-saúde Geo entre 2010-2020. In. Simpósio
Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande.
Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.145-155. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

TÍTULO/ PROGRAMA/ PERÍODO/ PRINCIPAIS RESULTADOS REFERÊNCIAS


OBJETIVO PROCEDIMENTOS
METODOLÓGICOS
1. Desafios e 2012-2013/ a) Há relato de problemas externos para Xavier e
potencialidades do levantamento de realização do trabalho de campo devido à Pereira (2013);
trabalho de campo nos referências; b) burocracia e ausência de condições Pereira (2017)
cursos de Geografia das levantamento logísticas; relacionado às disciplinas foi
Instituições de Ensino documental; c) demonstrada falta de planejamento no que
Superior da Paraíba/ realização de diz respeito a ausência do uso do método
PIVIC/ Entender os entrevistas individuais; científico para sustentar a utilização deste
desafios e potencialidades d) espacialização dos método de procedimento. Enfatiza-se que
do trabalho de campo em resultados. o trabalho de campo é uma metodologia
cursos de graduação em que deve se perpetuar na Geografia. As
Geografia no Estado da análises do solo, a geomorfologia, a
Paraíba geologia, a biogeografia, elementos
presentes no urbano, só podem ser
entendidos, quando ultrapassamos o
conceito e partimos para e experiência.
2. Conhecimento 2013-2014/ a) Considera-se que o conhecimento Silva e Pereira
geográfico aplicado aos levantamento de geográfico é fundamental para a (2014); Silva
roteiros de campo em referências; b) visualização dos roteiros de campo (2014); Silva e
Geografia da Saúde no levantamento identificando os elementos de prevenção, Pereira (2015).
município de Campina documental; c) promoção e risco à saúde e a necessidade
Grande – PB e municípios aplicação de de novas pesquisas no âmbito da
circunvizinhos/ PIBIC/ formulários; d) trabalho Geografia da Saúde.
Utilizar o conhecimento de campo; e)
geográfico na definição de elaboração dos
roteiros que possibilitem a resultados
visualização de elementos
de promoção, prevenção e
risco à saúde no município
de Campina Grande e
municípios circunvizinhos.
3. Desafios e 2014-2015/ a) Como principal resultado ficou evidente Souza e
potencialidades do levantamento de que os professores expressam suas ideias Pereira (2015)
trabalho de campo nos referências; b) com relação ao trabalho de campo de
cursos de Geografia em levantamento forma genérica como mediadora entre a
instituições de Ensino documental; c) teoria e a prática no meio estudado.
Superior no Brasil/ PIVIC/ aplicação de
Entender os desafios e questionário via e-mail;
potencialidades do d) elaboração de
trabalho de campo em mapas voltados para
cursos de graduação em espacialização da
Geografia em instituições situação das atividades
de ensino superior no de campo no âmbito do
Brasil Ensino Superior.

148
PEREIRA, M.P.B. Metodologia da Pesquisa e Ensino: pesquisas realizadas pelo Pró-saúde Geo entre 2010-2020. In. Simpósio
Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande.
Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.145-155. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

QUADRO 01 – PESQUISAS REALIZADAS ENTRE 2010 E 2020 NO ÂMBITO DO PRÓ-SAÚDE GEO NA


LINHA “METODOLOGIA DA PESQUISA E ENSINO” (CONT.)

TÍTULO/ PROGRAMA/ PERÍODO/ PRINCIPAIS RESULTADOS REFERÊNC


OBJETIVO PROCEDIMENTOS IAS
METODOLÓGICOS
4. Conhecimento 2015-2016/ a) Além dos possíveis roteiros de campo, foi Lima e
geográfico aplicado aos levantamento de possível compreender a ‘dinâmica’ da cidade e, Pereira
roteiros de campo em referências; b) em que afeta ou ajuda a população às ações dos (2016);
Geografia da Saúde no levantamento gestores. Também se pode compreender a Lima e
município de Campina documental; c) importância desse trabalho para tomada de Pereira
Grande – PB/ PIVIC/ aplicação de decisões, em apoio a sociedade e para o uso do (2018)
Utilizar o conhecimento formulários; d) trabalho conhecimento geográfico e científico.
geográfico na definição de de campo; e)
roteiros que possibilitem a elaboração de um
visualização de elementos banco de informações
de promoção, prevenção e e; f) espacialização dos
risco à saúde no município roteiros.
de Campina Grande - PB
5. Teorias aplicáveis à 2016-2017/ a) Como resultados, a partir das leituras e Santos e
Geografia da Saúde: uma levantamento de levantamentos de algumas teorias foi possível Pereira
revisão da literatura/ PIVIC/ referências; b) conhecer mais sobre as temáticas da Geografia (2017)
Analisar as aplicações de levantamento na da Saúde. O inventário foi eficaz para a
teorias para a Geografia da internet; c) avaliação das teorias. Neste primeiro momento,
Saúde levantamento as teorias analisadas foram relacionadas
sistemático de teorias; diretamente à Geografia da Saúde, contudo,
d) elaboração de um serviu como piloto para estudos em outros
inventário. âmbitos da Geografia.
6. Situação do Grupo de 2019-2020/ a) A criação dos grupos de pesquisa de Geografia Pereira e
Pesquisa em Geografia da levantamento de da Saúde no Brasil acompanha a evolução Pereira
Saúde para Promoção da referências; b) desta área da Geografia, e ainda está em (2020)
Saúde em relação aos levantamento na constante expansão de suas atividades
grupos de pesquisa em internet; c) científicas e acadêmicas por todo o país.
Geografia e Saúde no espacialização dos Também é notório que existe uma grande rede
Brasil/ PIVIC/ Analisar a grupos de pesquisa no nacional no qual a maioria dos grupos de
posição do Grupo de Brasil e das redes do pesquisa estão conectados neste círculo de
Pesquisa em Geografia Pró-saúde Geo; d) troca de experiências em seus trabalhos
para Promoção da Saúde Levantamento realizados, e de ideias, temas e novas
em relação a outros grupos iconográfico e metodologias que estão sendo aplicadas nesses
da Geografia da Saúde e cartográfico; e) trabalhos. O Pró-Saúde Geo tanto se conecta
áreas afins no território levantamento tanto com grupos centrais quanto periféricos e
brasileiro documental. devido ser relativamente antigo, se comparado
a maioria, está conseguindo fazer uma boa
conexão com os grupos no sentido de uma
contribuição científica.
7. Trajetórias 2019-2020/ a) revisão O conceito de território é central como categoria Silva e Lima
epistemológicas da bibliográfica; b) revisão analítica tanto da Geografia quanto da (2020)
geografia: uma análise do da literatura; c) análise Geografia Agrária. Foram variadas as matrizes
conceito de território nos documental teóricas que influenciaram os artigos analisados
estudos agrários/ PIBIC/ nos Simpósios Nacionais de Geografia Agrária,
Analisar a aplicação do sendo a perspectiva crítica a mais presente. Os
conceito de território nos resultados podem contribuir tanto para a
estudos da geografia epistemologia do conceito quanto para o
agrária brasileira conhecimento da produção científica que vem
sendo desenvolvida e discutida.

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PEREIRA, M.P.B. Metodologia da Pesquisa e Ensino: pesquisas realizadas pelo Pró-saúde Geo entre 2010-2020. In. Simpósio
Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande.
Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.145-155. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

A pesquisa sobre teorias (5) buscou inicialmente resgatar o conceito de teorias e


suas características buscando possibilidades de identificação do que realmente poderia ser
considerado uma teoria em meio a tantas ideias propostas no fazer científico.
Em síntese, a teoria seria uma maneira de viabilizar o entendimento de determinados
fatos ou uma abordagem do mundo sensível a partir da organização de ideias, sendo
expressos através de conceitos, classificações, princípios, generalizações, dentre outras
formas. A teoria possui várias características (quadro 2).
QUADRO 02 – CARACTERÍSTICAS DAS TEORIAS
CARACTERÍSTICA REFERÊNCIAS
a) é elaborada em um contexto histórico definido Chauí (2001)
b) está em busca de uma explicação causal de certo acontecimento Popper (2013) e Demo
(2014)
c) deve estar preparada para não se enganar com qualquer aparência Carvalho (2013)
d) precisa ser posta à prova, sendo necessárias revisões periódicas das teorias Demo (2014), Popper
(2013) e Kuhn (2013)
e) possui uma distinção formal entre fato e valor, meio e fim, abstrato e concreto Demo (2014)
f) está sempre em busca de explicações mais universais Carvalho (2013) e
Popper (2013)
g) as teorias particulares são verificáveis, porém, quanto mais universal se torna uma Popper (2013)
teoria, menor a possibilidade de verificação
h) uma teoria pode englobar outra Carvalho (2013)
i) o falseamento de uma conclusão acarreta o falseamento de tudo o que deriva desse Popper (2013)
sistema falseado
j) pode-se falsear uma nova teoria particular sem abalar as hipóteses mais gerais, mais Popper (2013)
universais
k) o declínio de regras existentes é a sinalização para a busca de novas regras Kuhn (2013)
l) os axiomas de uma teoria são formulados de tal forma que todos os outros enunciados Popper (2013)
pertencentes ao sistema teórico possam ser derivados desses axiomas
m) um sistema teórico deixa de ser hipotético e passa a ser axiomático se estiver livre de Popper (2013)
contradição, for independente, a partir dele se deduz os outros enunciados
n) possui um sistema de conceitos Santos (1997), Popper
(2013) e Ferreira (2013)
o) todo e qualquer evento pode ser causalmente explicado Popper (2013)
p) para cada evento pode-se elaborar mais de uma construção teórica Kuhn (2013)
Fonte: Pesquisa bibliográfica realizada pela autora (2016)

Essas características seriam norteadoras da análise das teorias que foram


escolhidas no projeto, foram elas: Teoria dos focos naturais, Teoria dos complexos
patogênicos, Teoria da História Natural das Doenças, Teoria da Saúde-doença como
processo social, Teoria do clima e criminalidade e Teoria dos germes. Em relação aos
métodos de procedimento, esta foi uma pesquisa bibliográfica, de gabinete e que utilizou o
método tipológico.
A pesquisa sobre os grupos de pesquisa (6) teve duas teorias a serem tratadas como
principais: a Teoria das Redes Sociais e a Teoria da Interdependência Espacial. Na Teoria
das Redes Sociais é defendido que: a) no núcleo há laços mais fortes e na periferia os laços
são mais fracos; b) a organização dessas redes pode ser cooperativa, competitiva ou geradora
de conflito. Quando ela é cooperativa, é capaz de gerar uma estrutura (RECUERO, 2005). A
partir dessa teoria buscou-se, a partir dos grupos de pesquisa que estão também no
ciberespaço, quais seriam as organizações mais cooperativas.
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PEREIRA, M.P.B. Metodologia da Pesquisa e Ensino: pesquisas realizadas pelo Pró-saúde Geo entre 2010-2020. In. Simpósio
Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande.
Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.145-155. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Ao observar a possibilidade de geração de padrões de sincronismo e de


clusterização, pode-se remeter a Teoria da Interdependência espacial. Ao se considerar essa
teoria há a necessidade de se considerar a distribuição relativa dos objetos, que seguem
padrões e arranjos espaciais (se for uma informação espacial), assim como que quanto mais
próximos geograficamente os objetos ou um evento, maior a probabilidade de eles serem
semelhantes (FERREIRA, 2007). No caso da pesquisa 6, foram trabalhadas propriedades não
espaciais, que se transformam em layers no espaço geográfico para representar a relação
entre pesquisas de maneiras variadas. Sendo possível tanto a representação da localização
no nó (localização da sede do Grupo de Pesquisa) e de sua área de abrangência, assim como
das redes formadas a partir de cada nó, dentre outras possíveis variações. No que diz respeito
aos métodos de procedimento, esta foi uma pesquisa bibliográfica, documental e realizada
em gabinete.
As pesquisas relacionadas ao trabalho de campo (2 e 4) tiveram como
fundamentação teórica a discussão entre o empirismo e o racionalismo, enquanto grandes
orientações da teoria do conhecimento, que, segundo Chaui (2005), evidencia as ideias de
Descartes (racionalista) e Locke (empirista). A partir dessas concepções tentou-se entender
como o trabalho de campo se adequa na discussão. No cotidiano o trabalho de campo é
associado ao empirismo, sendo entendido até mesmo como algo não científico
(ABBAGNANO, 2012). Porém, tanto através do racionalismo quanto do empirismo há
necessidade de ir a campo. Assim sendo, a partir de um pensamento racionalista, o trabalho
de campo passa a ser apenas a verificação de algo que já foi pensado, estudado, portanto,
diminui a possibilidade da percepção ser ilusória. Já a partir do pensamento empirista, a
experiência sensível é a fonte e fundamenta esse conhecimento, determina o valor e o sentido
da atividade racional.
Ao observar essas duas características, é possível compreender que em geral,
apesar de haver uma tendência por um ou por outro pensamento, há uma mescla dessas
duas orientações, fazendo com que se estude e pense o local antes de visitá-lo, mas que
também haja abertura para o novo, quando se está em campo, sendo a perspectiva utilizada
para as pesquisas relacionadas ao trabalho de campo neste trabalho. Em relação aos
métodos de procedimento, estas foram pesquisas que utilizaram o método comparativo, foi
de natureza quali-quantitativa e utilizou-se a metodologia da pesquisa de campo.
No que diz respeito ao aproveitamento destes resultados para as disciplinas
ministradas pela autora do trabalho e no grupo de pesquisa Pró-Saúde Geo percebeu-se que
essas pesquisas trouxeram uma maior dinâmica no uso de teorias (pesquisa 5) tanto no
processo do Trabalho de Conclusão de Curso quanto nas pesquisas de Iniciação Científica o
qual os alunos passaram a discutir melhor sobre a escolha, a hierarquia, a abrangência de
cada teoria e sua relação com a problemática atual.
Em relação ao trabalho 6, finalizado em 2020, já houve discussão no grupo sobre a
Geografia da Saúde ser muito maior do que eles imaginavam, começaram a visualizar
possibilidades de possíveis orientadores para pós-graduação nas Universidades em que
estes grupos estão vinculados, além de uma maior possibilidade de conexão com alunos que
participam de outros grupos de pesquisa para troca de experiências. No que diz respeito às

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PEREIRA, M.P.B. Metodologia da Pesquisa e Ensino: pesquisas realizadas pelo Pró-saúde Geo entre 2010-2020. In. Simpósio
Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande.
Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.145-155. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

pesquisas sobre trabalho de campo (2 e 6), alguns dos locais incluídos já foram objeto de
Iniciação científica e mesmo de TCC.
Para as disciplinas entendeu-se que essas pesquisas foram fundamentais para a
melhoria da qualidade delas, ainda que não fossem diretamente a Geografia da Saúde. O
aproveitamento da pesquisa sobre teorias (5) foi que os alunos das disciplinas mencionadas
passaram a entender melhor as teorias e a se motivar a procurar teorias aumentando o acervo
de teorias que já eram trabalhadas nas disciplinas. Há discussão sobre sua aplicabilidade por
área de atuação da Geografia, em relação às problemáticas, e especificamente as teorias que
foram trabalhadas na pesquisa mencionada neste trabalho, eles buscam aplicabilidade para
suas pesquisas principalmente na área da Geografia Ambiental. No que diz respeito à
pesquisa sobre grupos de pesquisa (6) houve a possibilidade de mostrar a metodologia de
trabalho e, devido a pandemia, eles entenderam como uma ótima possibilidade de uso
aplicado às suas áreas de atuação como possibilidade de ter resultados consistentes, ainda
que tenha como base informações provenientes da internet. Com relação ao trabalho de
campo (2 e 4) tanto em sala de aula como em campo essas pesquisas trouxeram muitos
resultados positivos, seja por ter alunos que moravam em algumas dessas áreas, por inspirar
possibilidade de TCCs, por passarem a entender que o trabalho de campo deve ter uma base
teórico-metodológica inicial e um bom planejamento para que se aproveite melhor essa
metodologia no ensino (quadro 3).
QUADRO 03 – APLICABILIDADE DAS PESQUISAS ENTRE 2010 E 2020 DO PRÓ-SAÚDE GEO NA LINHA
‘METODOLOGIA DA PESQUISA E ENSINO’
ÁREA DE PESQUISAS
APLICABILIDADE PESQUISA SOBRE TEORIAS PESQUISA SOBRE GRUPOS PESQUISAS SOBRE
(5) DE PESQUISA (6) TRABALHO DE CAMPO (2 E
4)
GRUPO DE Auxílio aos alunos do grupo Identificação dos grupos de Identificação de novos
PESQUISA - PRÓ- de pesquisa a se pesquisa que atuam na área potenciais locais para
aprofundarem em relação às da Geografia e Saúde para realizar pesquisas.
SAÚDE GEO
teorias que se aplicam à buscar formas de conexão
Geografia da Saúde com esses grupos no futuro.
DISCIPLINA – Melhora do conhecimento de Identificação de Grupos de Identificação de locais para
GEOGRAFIA DA teorias e temáticas Pesquisa que estão atuando realização de visitas em
estudadas na disciplina na área da Geografia e da trabalho de campo
SAÚDE
Saúde no Brasil
DISCIPLINA – Aprimoramento sobre as As teorias utilizadas para a Utilização da discussão
TEORIA E MÉTODO características da teoria e pesquisa são apresentadas teórica sobre trabalho de
como diferenciar as teorias também aos alunos da campo na disciplina
EM GEOGRAFIA
mais bem elaboradas de disciplina, buscando novas
teorias incompletas ou sem aplicabilidades
fundamento adequado.
DISCIPLINA – Aproveitamento de algumas A metodologia utilizada na Utilização da discussão
PROJETO DE teorias trabalhadas na pesquisa compõe um dos metodológica do trabalho de
pesquisa para projetos exemplos de pesquisa. campo na disciplina
PESQUISA
específicos.

Fonte: Experiência da autora do trabalho no grupo e nas disciplinas citadas; Organização: a autora.

CONSIDERAÇÕES FINAIS:

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PEREIRA, M.P.B. Metodologia da Pesquisa e Ensino: pesquisas realizadas pelo Pró-saúde Geo entre 2010-2020. In. Simpósio
Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande.
Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.145-155. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Percebe-se que essas pesquisas, inicialmente básicas, possuem aplicabilidades tanto


para o ensino quanto para o próprio grupo de pesquisa, apesar de potencialmente servir
também para projetos de extensão, especialmente as pesquisas sobre trabalho de campo (2
e 4) em que se observarem locais passíveis de se realizar projetos dessa natureza.
As pesquisas realizadas nessa linha de atuação do Pró-saúde Geo entre 2010 e 2020
ainda não foram abrangentes o suficiente para trabalhar uma grande variedade de
metodologias de procedimento e/ou delineamentos, pois ficaram em torno do método
tipológico, método comparativo, pesquisa de gabinete ou de campo, pesquisa documental ou
bibliográfica, e pesquisas quali-quantitativas, algo que deve ser mais bem trabalhado em
pesquisas futuras.

AGRADECIMENTOS:
Agradeço a todos os alunos que participaram destas pesquisas de Iniciação
Científica e contribuíram tanto para a melhoria do Grupo de Pesquisa quanto para o próprio
curso de Geografia no campus I da UFCG – Campina Grande – Paraíba - Brasil.

REFERÊNCIAS:

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo – SP: Martins Fontes, 2012, 1210p.

CARVALHO, Marcelo. Teoria e experiência. São Paulo – SP: Martins Fontes, 2013, 76p.

CERVO, Amado L.; BERVIAN, Pedro A.; SILVA, Roberto da. Metodologia Científica. 6.ed. São
Paulo – SP: Pearson Prentice Hall, 2007, 162p.

CHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo – SP: Ática, 2005, 424p.

CHAUÍ, Marilena. O que é ideologia. 2.ed. São Paulo – SP: Editora Brasiliense, 2001, 143p.

CHIZZOTTI, Antonio. Pesquisa qualitativa em ciências humanas e sociais. 4.ed. Petrópolis – RJ:
Vozes, 2011, 142p.

DEMO, Pedro. Metodologia científica em ciências sociais. 3.ed. São Paulo – SP: Atlas S.A., 2014,
296p.

FERREIRA, Alice Maria Araújo. Prefácio. In: HARDY-VALLÉE, Benoit. Que é um conceito? São
Paulo – SP: Parábola, 2013, 127p.

FERREIRA, Marcos César. Considerações teórico-metodológicas sobre as origens e a inserção do


sistema de informação geográfica na geografia. In: VITTE, Antônio Carlos (org). Contribuições à
história e à epistemologia da Geografia. Rio de Janeiro – RJ: Bertrand Brasil, 2007, 294p. P. 101-
125.

GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 5.ed. São Paulo – SP: Atlas, 2010, 184p.

153
PEREIRA, M.P.B. Metodologia da Pesquisa e Ensino: pesquisas realizadas pelo Pró-saúde Geo entre 2010-2020. In. Simpósio
Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande.
Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.145-155. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

KUHN, Thomas. A estrutura das revoluções científicas. Tradução de Beatriz Vianna Boeira e
Nelson Boeira. 12 ed. São Paulo – SP: Perspectiva, 2012, 323p. (Debates, 115)

LIMA, Ednaldo Soares de; PEREIRA, Martha Priscila Bezerra. Roteiro de campo aplicado à
Geografia da Saúde e disciplinas afins: percursos em Campina Grande – PB. Campina Grande –
PB: 2016. 15p (relatório PIVIC/ UFCG)

LIMA, Ednaldo Soares de; PEREIRA, Martha Priscila Bezerra. Trabalho de campo aplicado à
Geografia da Saúde e disciplinas afins: locais de visita em Campina Grande – PB. In: PEREIRA,
Martha Priscila Bezerra; MAGALHÃES, Sandra Célia Muniz (org.). Perspectivas geográficas da
saúde humana. Campina Grande – PB: EDUFCG, 2018, 167p, P. 69-84. PDF. Disponível em:
https:// editora.ufcg.edu.br/components/com_booklibrary/ebooks/90D44400-F086-ECB4-0339-
6779732AAD21_ff2fac_b3589350eb02485296ccda14d90dcf5b.pdf. Acesso em 20 de abril de 2021.

MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Fundamentos de metodologia científica.


7.ed. São Paulo – SP: Atlas, 2010, 289p.

PEREIRA, Emanuel Hiuri Xavier; PEREIRA, Martha Priscila Bezerra. Situação do Grupo de
Pesquisa em Geografia para Promoção da Saúde em relação aos grupos de pesquisa em
Geografia e saúde no Brasil. Campina Grande – PB: 2020. 23p. (relatório PIVIC/ UFCG).

PEREIRA, Martha Priscila Bezerra. Trabalho de campo na Geografia: desafios práticos e teóricos no
estado da Paraíba. In: SILVA, Anieres Barbosa da; GUTIERRES, Henrique Elias Pessoa; GALVÃO,
Josias de Castro (org.). Paraíba: pluralidade e representações geográficas. Campina Grande – PB:
EDUFCG, 2017, 227p. P. 209-221, PDF. Disponível em: https://4a85131a-e81f-4037-875a-
4c013c98a63c.filesusr.com/ugd/e4bfdf_121c3ab1c07e44799b0eba6df40c561e.pdf. Acesso em 25 de
abril de 2021.

POPPER, Karl. A lógica da pesquisa científica. São Paulo – SP: Cultrix, 2013, 454p.

PRÓ-SAÚDE GEO. Quem somos? Campina Grande – PB, 2021. Disponível em:
www.prosaudegeo.com.br. Acesso em 20 de maio de 2021.

RECUERO, Raquel da Cunha. Comunidades virtuais em redes sociais na internet: uma proposta de
estudo. Revista da Associação dos Programas de Pós-graduação em Comunicação – COMPÓS,
p. 1-27, dezembro de 2005. Disponível em: www.compos.com.br/e-compos. Acesso em 07 de junho
de 2019.

SANTOS, Glaciane Maria da Silva; PEREIRA, Martha Priscila Bezerra. Teorias aplicáveis à
Geografia da saúde: uma revisão da literatura. Campina Grande – PB: 2017. 17p. (relatório PIVIC/
UFCG)

SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. 2.ed. São Paulo – SP:
Hucitec, 1997, 273p.

SILVA, Alexsandro Bezerra da. Conhecimento geográfico aplicado aos roteiros de campo em
Geografia da Saúde no município de Campina Grande – PB e municípios circunvizinhos. 2014.

154
PEREIRA, M.P.B. Metodologia da Pesquisa e Ensino: pesquisas realizadas pelo Pró-saúde Geo entre 2010-2020. In. Simpósio
Nacional de Geografia da Saúde: dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande.
Anais [...]. Campina Grande: UFCG, 2021. p.145-155. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Monografia (graduação em Geografia) - Unidade Acadêmica de Geografia, Centro de Humanidades,


Universidade Federal de Campina Grande, Campina Grande, 2014, 48 f.

SILVA, Alexsandro Bezerra da; PEREIRA, Martha Priscila Bezerra. Conhecimento geográfico
aplicado aos roteiros de campo em Geografia da Saúde no município de Campina Grande- PB
e municípios circunvizinhos. Campina Grande – PB: 2014. 16p (relatório PIBIC/ CNPq/UFCG).

SILVA, Alexsandro Bezerra da; PEREIRA, Martha Priscila Bezerra. Roteiros de campo em Geografia
da Saúde no município de Campina Grande – PB e municípios circunvizinhos. Hygeia, vol. 11, n. 21,
p. 20-34, Dez/ 2015. Disponível em: http://www.seer.ufu.br/index.php/hygeia/article/view/30116/
17593. Acesso em 20 de abril de 2021.

SILVA, João Emerson Cunha; LIMA, Aline Barboza de. Trajetórias epistemológicas da geografia:
uma análise do conceito de território nos estudos agrários. Campina Grande – PB: 2020. 20p.
(relatório PIBIC/ CNPq/UFCG).

SOUZA, Maíra Suênia Cavalcante de; PEREIRA, Martha Priscila Bezerra. Desafios e
potencialidades do trabalho de campo nos cursos de Geografia em Instituições de Ensino
Superior no Brasil. Campina Grande – PB: 2015, 15p (relatório PIVIC/ UFCG).

XAVIER, Polyanna Priscilla da Silva; PEREIRA, Martha Priscila Bezerra. Desafios e potencialidades
do trabalho de campo nos cursos de Geografia das instituições de Ensino Superior da Paraíba.
Campina Grande – PB: 2013, 20p (relatório PIVIC/ UFCG).

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ROCHA. P.H. A saúde como elemento de uma geografia da dominação. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde:
dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG,
2021. p.156-167. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

A SAÚDE COMO ELEMENTO DE UMA GEOGRAFIA DA DOMINAÇÃO

ROCHA, Pedro Henrique1


RESUMO:
Este artigo tem por objetivo fazer uma discussão teórica acerca da Geografia da Saúde a
partir do entendimento da Geografia e da Saúde como elementos de dominação e controle
social ao longo da história humana. Buscou-se demonstrar, assim, o vínculo entre a Geografia
e a Saúde e a influência colonial no desenvolvimento da Geografia da Saúde até os dias
atuais.

Palavras-chave: Geografia da Saúde, dominação, colonialidade.

ABSTRACT:
This article aims to make a theoretical discussion about the Geography of Health from the
understanding of Geography and Health as elements of domination and control throughout
human history. Thus, it was sought to demonstrate the link between Geography and Health
and the colonial influence on the development of the Geography of Health until the presente
day.

Keywords: Geography of Health, domination, coloniality.

INTRODUÇÃO:
Atualmente a busca por uma interpretação geográfica dos fenômenos da saúde tem
se tornado um assunto de maior relevância e de maior interesse pelos estudantes e
profissionais de Geografia. Sobretudo após a eclosão da pandemia de COVID-19 em 2019.
Porém, atrelado a esse crescente interesse também surge um usual questionamento: “a
saúde é um elemento geográfico?”.
A fim de compreender a relação da saúde, enquanto formas de cura, saberes e seu
desenvolvimento social-científico, e a geografia, enquanto ciência ergueu-se o trabalho de
conclusão de curso, submetido ao Curso de Geografia da Universidade Federal Fluminense
ainda nesse ano de 2021. O presente trabalho compõe uma parte da pesquisa realizada e foi
desenvolvido junto ao Eixo de Estudos sobre Geografia da Saúde, Curas e Saberes, do
Laboratório de Estudos de Movimentos Sociais e Territorialidades – LEMTO/UFF, sob a
supervisão do Professor-Doutor Carlos Walter Porto-Gonçalves. Assim, por meio de uma
revisão bibliográfica de obras sobre o desenvolvimento da Geografia enquanto ciência e sobre
o desenvolvimento do pensamento em saúde/da geografia da saúde, pode se afirmar que a
saúde é um elemento geográfico desde os primórdios da ciência geográfica e seu
desenvolvimento caminha em conjunto com o desenvolvimento da Geografia.

1
Estudante de graduação em Geografia na Universidade Federal Fluminense, membro do Laboratório de
Estudos de Movimentos Sociais e Territorialidades – LEMTO/UFF; pehenrique@id.uff.br

156
ROCHA. P.H. A saúde como elemento de uma geografia da dominação. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde:
dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG,
2021. p.156-167. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

O presente trabalho, em especial, busca dar ênfase na relação da geografia com a


saúde por meio da utilização de ambas como elementos de dominação ao longo da história
humana. Desse modo, o texto se divide em um primeiro momento de retorno às bases da
Geografia enquanto um elemento de conformação da estrutura do saber e do poder; um
segundo momento de retorno a trajetória de desenvolvimento da Geografia da Saúde,
comumente descrita pelos autores do campo; e por fim a identificação da marca colonial que
atravessa toda a narrativa e desenvolvimento da Geografia da Saúde e que possibilita, assim,
o surgimento de uma forma moderna de controle social, o modelo biomédico.
Por conta disso, acredita-se que o presente trabalho se vincule ao eixo temático
“Dimensões históricas, teóricas e metodológicas da Geografia da Saúde”.

A CIÊNCIA DA DOMINAÇÃO:
Pensar a Geografia enquanto parte da conformação da estrutura de saber e de poder
é retornar a célebre frase/título do clássico trabalho de Yves Lacoste, A Geografia – isso serve,
em primeiro lugar, para fazer a guerra (2011). Baseado nos ensinamentos de Lacoste,
sobretudo a diferenciação entre uma geografia do Estado-maior e uma geografia universitária,
para entender a real origem da Geografia, vemos que a ciência que nos pariu (e parimos)
existe “desde que existem os aparelhos de Estado” (2011:26). E que colocar a guerra como
ponto de partida das premissas epistemológicas da nossa ciência não implica afirmar que ela
só serve para conduzir operações militares, mas que ela também serve para organizar os
territórios, colocar as coisas em ordem (ordenação espacial). Ou, nas palavras do autor, “não
somente como previsão das batalhas que é preciso mover contra este ou aquele adversário,
mas também para melhor controlar os homens sobre os quais o aparelho de Estado exerce
sua autoridade” (2011:23).
Nesse sentido, entender que a geografia do Estado-maior de Lacoste é a
representação (científica) de uma forma de dominação de cima para baixo pelo poder Estatal
é, também, compreender que a Geografia foi criada num contexto de reorganização das
formas de controle social pelo Estado Territorial (Porto-Gonçalves, s/d). Lopes de Souza
(2007) e Porto-Gonçalves (s/d) nos atentam que o surgimento do geógrafo está vinculado a
uma atribuição criada pelo soberano, o Rei, para a composição das cidades e que o olhar de
sobrevoo, ou numa perspectiva de “voo de pássaro”, constitui uma prática de controle
populacional para uma melhor gestão do espaço geográfico. Espaço esse que carrega em
sua etimologia heranças/referências às relações sociais entre espaço e poder, como em
principado, reinado, régio/região, polis/política, burgo/burguês (Haesbaert, 2010; Porto-
Gonçalves, s/d).
Ainda que caminhando por outros trilhos, Moreira em Para onde vai o pensamento
geográfico (2017) também busca situar o nascimento e a evolução da Geografia, porém com
a atenção mais voltada ao que o mesmo denomina de geografia moderna. Recorrendo a
Tatham, Moreira expõem que a Geografia passa por três fases diferenciadas por fundamentos
filosóficos e paradigmas, a qual as denominou como: (I) o paradigma holista da baixa
modernidade, (II) o paradigma fragmentário da modernidade industrial e (III) o paradigma
holista da hipermodernidade.

157
ROCHA. P.H. A saúde como elemento de uma geografia da dominação. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde:
dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG,
2021. p.156-167. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Por meio desses paradigmas, Moreira apresenta o caminho percorrido pela ciência
geográfica desde a sistematização científica no plano teórico-metodológico por J. R. Foster
(1729-1798) e Immanuel Kant (1724-1804), a qual originou o conceito de espaço geográfico
por meio das diversas informações que haviam sido colhidas em todos os cantos do mundo e
a conversão delas pela noção empírica da superfície terrestre; passando pelo período de crise
do holismo e a fragmentação generalizada da ciência, o que resultou em um número crescente
de geografias sistemáticas (a qual é maior simbolizado pela dicotomia Geografia Humana e
Geografia Física); até chegar na “hominização do homem pelo próprio homem” e todo o
debate em torno da teoria e método que deveria ser empregado na ciência, que resultou na
“Geografia Crítica” como maior exemplo do período (atual).
Entretanto, a nós interessa nesse momento o primeiro paradigma de Moreira (2017),
pois por meio desse caminho também se confirma a tese de Lacoste (2011). Se unirmos isso
com o pensamento de Moraes (2005), compreendemos ainda mais que o paradigma holista
da baixa modernidade (ou, então, o primeiro pressuposto de sistematização e formação da
Geografia, nas palavras de Moraes) significa a reunião das mais variadas informações sobre
os mais variados lugares para a composição de um grande repositório com uma margem de
confiança razoável para a realização de estudos espaciais. Estudos esses, que num segundo
momento, são convertidos em cartas e mapas para auxiliar na formação de táticas, práticas e
estratégias para fazer a guerra e/ou exercer o poder (Lacoste, 2011).

A GEOGRAFIA DA SAÚDE: UMA NARRATIVA DATADA E LOCALIZADA:


Abordamos, aqui, uma parcela da ciência geográfica, aquela em que o pensamento
geográfico voltado para a saúde será desenvolvido em conjunto com o próprio
desenvolvimento da Geografia enquanto ciência. Dessa maneira, analisar em paralelo o
desenvolvimento da Geografia enquanto ciência e o desenvolvimento do pensamento
geográfico voltado para a saúde é uma maneira de reforçar os laços entre essa “geografia
sistemática” e a ciência matriz.
E assim, vemos que, tal qual é comumente evocado pela cultura moderna ocidental,
o pensamento geográfico voltado para saúde tem na sociedade grega seu berço histórico-
geográfico. Por meio da figura de Hipócrates (460 a.C. – 370 a.C.), nascido na ilha de Cós
(considerado um dos principais centros de medicina do século V a.C.), inaugura-se uma nova
compreensão das doenças. Se antes entendia-se a tríade saúde-doença-cura por meio da
religiosidade e pelo desequilíbrio dos fluídos internos (água, ar, sangue, etc.), a partir do
pensamento hipocrático há uma desvinculação das causas das doenças das explicações
mitológicas e a difusão da teoria de que as mesmas são causadas pela natureza e os sintomas
corporais são reações do organismo, além de que a cura para esses eventos estariam
relacionadas ao meio geográfico (DUTRA, 2011; GUIMARÃES; PICKENHAYN; LIMA, 2014).
A base de pensamento constituída por Hipócrates perdurou como hegemônica até a
Idade Média europeia, quando o domínio da Igreja e a rejeição da cultura clássica fizeram
com que as doenças voltassem a ser pensadas pelo viés religioso e místico (DUTRA, 2011).
Entretanto, com a Expansão Marítima e o crescente número de trabalhos realizados pelos
médicos que viajavam nas comitivas, a qual utilizavam de uma metodologia similar à da

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ROCHA. P.H. A saúde como elemento de uma geografia da dominação. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde:
dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG,
2021. p.156-167. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Geografia Descritiva, observa-se uma reformulação do pensamento em saúde. A partir das


pesquisas de Junqueira (2009) e Mazetto (2008) vemos como esses trabalhos expõem o
estreito vínculo entre o campo da saúde e as práticas coloniais europeias, pois a identificação
e explicação da distribuição das doenças pelo espaço, em especial as infecciosas,
contribuíram para a criação de estratégias militares que visavam proteger as tropas coloniais
dessas cepas e assim auxiliar na dominação dos territórios não-europeus. Nesse sentido,
Mazetto (2008) ainda afirma que a necessidade de criação de um repositório de dados sobre
as doenças a fim de proteção das tropas europeias levou o Estado colonizador a financiar
projetos de pesquisas.
Com o passar do tempo e com a eclosão de diversas revoluções no século XVIII2
uma nova etapa da construção da racionalidade europeia é instituída. Por meio da
industrialização e da crescente introdução de técnicas que visavam o aumento da produção
com o aumento da produtividade vê-se de maneira mais clara a ruptura da concepção mítica
da doença resgatada na Idade Média, a ascensão da Teoria dos Miasmas e a estruturação
do caminho para o movimento sanitarista (DUTRA, 2011; MAZETTO, 2008). Por outro lado,
esse mesmo momento também apresenta que a geografia e a saúde passam a ser formas de
controle/organização da própria população (biopolítica e geopolítica).
As marcas do tempo industrial evidenciada no espaço e nos corpos pelo aumento
das cidades e das populações, assim como da sujeira, do mau cheiro, das epidemias, da
miséria e etc. (GUIMARÃES; PICKENHAYN; LIMA, 2014) acabam sendo o contexto histórico-
geográfico para que, mais tarde, Michel Foucault (2008) formularia suas teorias sobre a
medicina social e nos apresentar as novas classificações corpóreas em seus diferentes
níveis/categorias: da população, do urbano e dos proletários. Em meio a esse contexto
revolucionário e de criação de novas técnicas de dominação, a resposta das populações às
novas condições precárias de vida assustava as elites políticas e, assim, cobrava do Estado
uma intervenção, o que acabou gerando melhoria nas condições de vida (redução da jornada
de trabalho, nutrição, salubridade e etc.). Entretanto, essas melhorias das condições de vida
acabaram gerando uma gradual substituição da visão holística e multicausal pela ascensão
do modelo unicausal, pois passou-se a entender que os melhores resultados na saúde
estavam vinculados aos acontecimentos ligados à Revolução Bacteriológica e não
necessariamente às melhorias nas condições de vida da população (GUIMARÃES;
PICKENHAYN; LIMA, 2014; NOGUEIRA, 2018).
A partir disso, o saber biomédico, que está(va) amparado na descoberta dos
organismos microscópicos e na anatomoclínica, passou a figurar como uma espécie de
“medicina oficial” e, assim, passou a valorizar o conhecimento individual e biológico. Todavia,
algumas perguntas permaneciam sem explicação, como a não infecção de um indivíduo
mesmo entrando em contato direto com o infectado. Fato que levou ao retorno da
consideração do ambiente como um espaço de relações e de desenvolvimento das doenças,
sobretudo com os trabalhos de E. N. Pavlovsky (1884-1965), com seu “foco antropúrgico”, e
Maximilian Sorre (1880-1962), com seu “complexo patogênico”.

2
Exemplos como o Iluminismo, a Revolução Estadunidense, a Revolução Francesa e a Revolução Industrial.

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ROCHA. P.H. A saúde como elemento de uma geografia da dominação. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde:
dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG,
2021. p.156-167. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Por meio dessa adaptação científica do saber geográfico (Santos, 2010) e da


Segunda Guerra Mundial, a Geografia da Saúde, enfim, “surge de forma oficial” em 1949 no
Congresso da União Geográfica Internacional – UGI, ainda denominada como Geografia
Médica e compreendida “como o estudo da distribuição e prevalência das doenças na
superfície da Terra” (SANTOS, 2010 apud PESSOA, S. 1960). Contudo, sua consagração só
irá ocorrer em 1968 com a instalação de um grupo de trabalho no Congresso de Nova Délhi
(GUIMARÃES, 2015).
Já nas décadas de 1960/1970 em meio ao debate em torno da teoria e método a ser
empregado pela ciência geográfica, as transformações econômicas geradas pela indústria e
pelo crescimento das cidades, bem como as mudanças provocadas no quadro patológico
(GUIMARÃES, 2015), fizeram elementos como qualidade de vida, educação, moradia,
saneamento básico e infraestrutura emergirem nas análises espaciais. Assim, no contexto de
surgimento da Geografia Crítica, a Geografia Médica incorpora essas discussões e altera seu
nome para Geografia da Saúde no Congresso da UGI de 1976.

A COLONIALIDADE NA GEOGRAFIA (DA SAÚDE):


Como descrito anteriormente, a trajetória de desenvolvimento da Geografia (da
Saúde) apresenta marcas histórico-geográficas muito bem delimitadas ao ponto de inibir o
questionamento sobre a formulação de táticas/estratégias de outras sociedades/espaços
geográficos, tal qual formas de cura, que não fossem originários da Europa. Será que somente
os povos europeus entravam em conflitos com os demais e por isso somente eles deveriam
criar estratégias de combate? E o mundo inteiro aprendeu técnicas de cura com Hipócrates?
Ninguém se curava em outros espaços geográficos e tempos históricos?
Questionar a narrativa hegemônica sobre o desenvolvimento da Geografia da Saúde
é, aparentemente, adentrar numa disputa pelo poder da cura, ou seja, uma geopolítica de
produção de conhecimento que a nós se traduz como um embate entre Ciência X
Fé/Misticismo (LIMA JUNIOR, 2014), entre diferentes povos e culturas e suas matrizes de
racionalidades próprias. A hegemonia imposta pela tradição europeia, pela burguesia, não
deve ser desprezada, afinal é a partir da constituição de sistemas atrelados à lógica científica
que se implantou políticas públicas. O questionamento central é que o discurso evidenciado
pelo desenvolvimento desse saber promove uma inibição e apaga os vestígios de produção
e manuseio de outros saberes sobre a cura: epistemicídio. Nesse sentido, a supressão,
hierarquização e desvalorização de outros modos de saberes não-europeus está vinculada

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ROCHA. P.H. A saúde como elemento de uma geografia da dominação. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde:
dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG,
2021. p.156-167. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

ao desenvolvimento do que Boaventura de Sousa Santos (2002) denomina de razão


metonímica3 e razão indolente4.
Esse movimento fundante da razão moderna sobre as demais (OLIVEIRA, 2018) se
enraizou na sociedade moderna-colonial em seus mais diversos níveis sociais, hierárquicos e
subjetivos. A colonialidade do ser5, caracterizada por Maldonado-Torres (2008), pode ser
entendida na saúde pela marca do senso comum em preferir as formas de cura e tratamentos
presentes em hospitais, farmácias e remédios (enquanto comprimidos vendidos em farmácias
e receitados por médicos hospitalares) em oposição a outros tipos de remédios (agora
classificados como “naturais”, como as rezas, as plantas, as ervas – e outros elementos
disponibilizados pelo meio). Os elementos classificados hoje como místicos ou religiosos
sofreram esse deslocamento em virtude da expansão do pensamento moderno europeu, seja
no próprio território europeu com a caça às bruxas e a discriminação dos camponeses, ou na
nossa sociedade, com a desqualificação de funções como curandeiros, benzedeiras,
parteiras, entre outros.
Para compreender a modernidade partimos do conceito de pensamento abissal,
proposto por Santos e Menezes (2010), como um sistema definido por uma linha que separa
a realidade social em dois universos – forjando a visibilidade de um saber sobre a invisibilidade
de outro – e da exposição de Lander (2005) sobre as ciências sociais e seus saberes coloniais
e eurocêntricos. Como entendemos que a Geografia é uma ciência para a sociedade, por seu
objeto ser uma condição primária para realização de qualquer sociedade (LOPES DE SOUZA,
1988), conseguimos enquadrá-la na fala de Lander sobre o seu campo de saber.
De acordo com o venezuelano a modernidade está fundada em múltiplas separações
ocorridas no ocidente, a qual sintetiza em três: (1) a separação religiosa – a religião judaico-
cristã expõe o homem como a semelhança de Deus e o separa da natureza, legitimando
qualquer alteração do homem na natureza; (2) a separação mente-corpo, e a separação entre
a razão e o mundo – o que possibilitou entender o corpo enquanto um elemento vazio e o
mundo não mais como uma ordem significativa ou integrada aos cosmos, qualificando-o agora
como um mecanismo desespiritualizado a ser capturado pelos conceitos e representações
construídos pela razão; e por fim (3) as separações que Weber conceitualizou como

3
A razão metonímica, tal como entendemos como figura de linguagem, corresponde a substituição da parte
pelo todo. Nas palavras de Santos (2002), a razão metonímia é aquela que a partir da cisão da totalidade “se
reivindica como a única forma de racionalidade e, por conseguinte, não se aplica a descobrir outros tipos de
racionalidade ou, se o faz, fá-lo apenas para as tornar em matérias primas”. Ou seja, é o tipo de racionalidade
que é obcecada pela totalidade sob a forma de ordem e que sempre a organiza de forma hierárquica
privilegiando a sua própria racionalidade.
4
A razão indolente, primariamente, é o tipo de razão que não sente dor. Mas além disso, é o tipo de razão que
não sente necessidade de aprender mais, pois se considera sabedor de tudo, uma racionalidade única e
hegemônica, e por isso perpetua sua forma de pensar desconsiderando qualquer alternativa contra
hegemônica, pois “o que está posto não é passível de luta” (SANTOS, 2002).
5
De acordo com Maldonado-Torres (2007), a colonialidade do ser é a forma de dominação e hierarquização
mais subjetiva entre todos os tipos/níveis de colonialidade. Assim, a colonialidade do ser está relacionada às
experiências vividas com a colonização e seus impactos na linguagem, no comportamento social e na visão de
mundo dos povos colonizados.

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ROCHA. P.H. A saúde como elemento de uma geografia da dominação. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde:
dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG,
2021. p.156-167. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

constitutivas da modernidade cultural com a criação de uma cultura geral e uma cultura de
especialistas.
Tais separações se apresentam, na autoconsciência europeia, como ponto de partida
na constituição de uma narrativa universal (ou metarrelato) que organiza todas as culturas e
povos sob um entendimento de direitos, propriedade e o próprio papel do homem enquanto
agente no espaço geográfico. O contraste entre o moderno (europeu) e os outros (o restante
dos povos e culturas do planeta) ocorre a partir da negação do direito do colonizado pela
afirmação do direito do colonizador e/ou da negação do direito coletivo por um direito individual
(LANDER, 2005 apud CLAVERO, 1994). Nesse sentido, Lander (2005) afirma que as Ciências
Sociais nascem da derrota de uma resistência a esse direito do colonizador e se relacionam
a uma tentativa de cientificizar as sociedades, ou melhor, identificar quais espaços possuem
direitos.
A Geografia (da Saúde) também possui em sua história características coloniais. O
repositório de dados, referidos anteriormente - e também apontado por Kant como
possibilitador da compreensão do espaço geográfico - constitui as bases para a criação dos
mapas-múndi, a qual cumpre o papel de classificar os povos partindo de seu referencial
espacial (MALDONADO-TORRES, 2008) e indicar as populações/saberes que devem ser
enquadrados pela razão metonímica (LANDER, 2005; SANTOS, 2002).
Enrique Dussel (2005) contribui para o nosso entendimento pois compreende a
modernidade como sinônimo de eurocentrismo e a divide em dois conceitos: um provinciano
e regional - por se tratar de uma emancipação da imaturidade europeia pelo esforço da razão
como processo crítico, e por indicar os fenômenos europeus como pontos de partida –; e o
outro em uma visão de sentido mundial – consistida na determinação dos Estados, exércitos,
economia, filosofia e etc. europeus como centro da “história mundial”. Ambos os conceitos
validam a afirmação da modernidade como responsável pelo ocultamento de culturas e
saberes, seja por uma classificação forjada e/ou pelo uso da violência.
Aos olhos dessa modernidade, compreendida tal qual Mignolo (2005) expõe6,
construiu-se um culto exacerbado ao cientificismo como projeto de emancipação e única
explicação possível do real. “A afirmação da ciência como única forma de conhecimento válido
tem em sua origem não apenas razões de ordem epistemológica, mas também razões de
ordem econômica, social e política” (NOGUEIRA, 2018). Tal origem possibilitou a associação
com o projeto expansivo europeu e concedeu a ciência moderna ocidental, por meio de um
desenvolvimento técnico, o privilégio de definir o que é conhecimento válido e o monopólio da
verdade (OLIVEIRA, 2018; NOGUEIRA, 2018).
É nesse contexto sociocultural de produção do pensamento/ciência moderno(a) que
a saúde passa a se readequar ao contexto de controle/dominação de outrora e, assim,
apresenta a sua forma “moderna”, o modelo biomédico. Tal qual aponta Nogueira (2018), sua
consolidação ocorrer no seio dessa dita racionalidade nos permite apontar a ligação umbilical
que esse saber tem com a colonização e, por isso, a necessidade de resgatarmos as raízes
para entendermos as técnicas e tecnologias que foram construídas e legitimadas

6
“não pode haver modernidade sem colonialidade, a colonialidade é constitutiva da modernidade e não
derivativa” (2005:78)

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ROCHA. P.H. A saúde como elemento de uma geografia da dominação. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde:
dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG,
2021. p.156-167. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

institucionalmente para geografar7 os territórios com as ações de violência, subordinação e


expropriação dos corpos.
Nesse sentido, a saúde moderna exibe os espaços considerados “vazios jurídicos”
por uma cartografia abissal (OLIVEIRA, 2018; SANTOS, 2002) e os corpos enquadrados por
práticas de biopolítica e biopoder (FOUCAULT, 2005) como suas formas para superar as
diversas geografias e deixar suas marcas (modernas) nos territórios não-europeus (SANTOS,
2014). Em outras palavras, nem todos os espaços têm acesso à saúde e esse não-acesso
não deve ser entendido como obra do acaso, é significativo, pois esses espaços usualmente
são compostos por pessoas com uma cor definida, por um gênero predominante, por
ocupação de posições inferiores na hierarquia/relações de trabalho8 - elementos que, vale
destacar, podem atuar em conjunto na geografia do território ou não. A não presença ou a
baixa presença do poder público promovendo a saúde nesses espaços é uma forma de negar-
lhes um direito básico, a vida. E, além disso, a negação da vida acaba sendo uma forma de
controle/domínio territorial, pois se não há vida não há resistência.

CONSIDERAÇÕES FINAIS:
Resgatar a trajetória de construção e desenvolvimento da Geografia enquanto
ciência e do pensamento voltado para a saúde se mostra importante pois se há interesse em
analisar a saúde pelos olhares da geografia e utilizar da geografia como uma ciência do e
para o social é mais importante ainda saber de onde partimos. Toda essa trajetória nos mostra
ao menos três períodos históricos-geográficos de utilização da saúde na geografia como uma
forma de dominação: (1) o período colonial e a construção dos repositórios de informações
para o auxílio na construção de táticas e estratégias do outro; (2) o período das revoluções e
da construção da medicina social de Foucault, onde as táticas e estratégias de dominação
passam a ser realizadas para o domínio da própria população e não necessariamente do
outro; e (3) o período de consolidação das tecnologias médicas e a afirmação do modelo
biomédico via colonialidade do poder, do saber, do ser, enfim, da colonialidade e da
modernidade.
Ainda que a narrativa hegemônica priorize e indique a Europa como berço do saber
e, consequentemente, berço do pensamento em saúde, não podemos ignorar o fato que a
afirmação disso só ocorreu em função da dominação da África, da América e da Ásia. Tal qual
Dussel (2005), Mignolo (2005) e Quijano (2005) apontam. Pois sem a dominação desses
continentes (de saber, de pessoas, de riquezas, etc.) a Europa não se consolidaria como
centro do mundo, não teria construído uma “autoconsciência europeia” e não conseguiria se
viabilizar e, assim, invisibilizar/inviabilizar outras formas de ser e de saber. É por meio desse
movimento que propomos esses três cortes espaço-temporais para compreender as formas
de dominação.

7
Em consonância com o pensamento de Porto-Gonçalves sobre a Geografia, a entendemos como verbo. Ou
seja, a Geografia é o ato de grafar (marcar) a Terra/Geo.
8
Exatamente os elementos que Quijano (2005) elege como constituintes da colonialidade do poder: raça,
trabalho e gênero.

163
ROCHA. P.H. A saúde como elemento de uma geografia da dominação. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde:
dimensões geográficas dos impactos e desafios das pandemias. X., 2021, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: UFCG,
2021. p.156-167. Disponível em https://www.anaisgeosaude.com. ISSN 1980-5829

Se voltarmos ao período colonial veremos que os repositórios de informações


emergem como a principal marca para uma geografia da dominação, mas devemos ir um
pouco além. É a partir desses repositórios que conseguimos entender a construção de
argumentos que serviram para a linha abissal ser traçada. Um exemplo disso é o
determinismo geográfico e outro são as “doenças tropicais”, ambos estavam muito presentes
no período e se tornaram importantes argumentos para justificar a hierarquização e
subalternização de povos. Sobre as “doenças tropicais” vale a pena destacarmos e falarmos
um pouco mais. De acordo com Peixoto (1975) o que se entendia como uma exclusividade
patológica dos trópicos não era bem uma exclusividade, a Europa já apresentava essas
mesmas doenças antes do contato entre as populações. Além disso, Crosby (2011) nos indica
que o contato entre as populações nesse período pode ser entendido como uma espécie de
dominação biológica, ou imperialismo biológico (título de sua obra), pois “o intercâmbio de
doenças infecciosas entre o Velho Mundo e suas colônias americanas e australianas foi
espantosamente unilateral, tão unilateral e unidirecional quanto o intercâmbio de pessoas,
ervas e animais” (2011:224). Assim, a conquista dos territórios foi facilitada já que muitos
foram assolados por epidemias e por mortes, além das fugas de suas populações para áreas
mais distantes por medo de novas doenças.
O período das revoluções e da construção da medicina social, ainda que pareça ser
mais ligado à Europa do que os outros territórios tem que ser entendido, primariamente, como
uma requalificação/adequação do saber dos povos dominados no período anterior. Não
esqueçamos que ainda no século XVI as tecnologias mais modernas para a produção
estavam localizadas aqui nas Américas com os moinhos de açúcar, não na Europa (Moreira,
2012). Não esqueçamos, também, que a dominação dos povos do continente africano
ocorreu, em grande parte, pelos seus conhecimentos sobre a agricultura e mineração. Dessa
forma, ainda que as tecnologias e maquinarias europeias representem, de fato, um novo
momento para a sociedade mundial não podemos achar que elas não tiveram influências dos
saberes usurpados anteriormente. E, por isso, ignorar que a dominação da própria população
acaba sendo uma união da experiência bem sucedida no período anterior, até mesmo e via
doenças infecciosas, pois se não fosse isso não teria surgido a “medicina social” de Foucault
(2008); com o uso e monopólio da força do Estado, que Weber afirmou; com as informações
censitárias/georreferenciadas que a Geografia sempre ofereceu ao estado desde sua
formação.
Por fim, o modelo biomédico merece ser destacado pois, entre tantas coisas, é a
forma de controle/dominação que está em curso; expôs uma noção de corpo-espaço-saúde
cada vez mais individualizada/personalizada9, a qual representa mais uma etapa do
paradigma atomístico-individualista da ciência moderna10 apontado por Porto-Gonçalves
(2018); tem na forma hospitalar um dos principais pilares de sustentação do seu modelo
(FOUCAULT, 2006; NOGUEIRA, 2018); exibe, por meio da medicalização/patologização, a
transformação do corpo em mercadoria e a incessante busca pelo lucro (BARROS, 2002); e
também mostra suas fragilidades como um elemento possuidor da “verdade absoluta” pois a

9
Vide os avanços da chamada 4ª Revolução da Medicina.
10
Baseado no pensamento de Enrique Leff, Porto-Gonçalves expõe que esse paradigma constitui uma
incessante busca pela unidade menor, mais simples, indivisível da matéria/do conhecimento/da vida.

164
ROCHA. P.H. A saúde como elemento de uma geografia da dominação. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde:
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presença/integração de saberes “tradicionais/periféricos” nas políticas públicas (como as


PICS, a Saúde da Família, as políticas de promoção de saúde e etc) acabam sendo uma
forma de apontamento da limitação epistêmica.
Dessa forma, o estudo sobre o modelo biomédico se mostra de fundamental
importância para os nossos dias, ainda mais por meio da Geografia. Porém, devemos ter em
mente que além de entendermos a Geografia como uma ciência da dominação, fato que
aproxima o nosso conhecimento das bases biomédicas, devemos entender a ciência
geográfica como uma ciência holista (Moreira, 2017). Mesmo que a saúde represente um
olhar específico dentro da abrangência do olhar geográfico, ela não se limita às fronteiras
biológicas do corpo humano, pelo contrário, ela transcende essas fronteiras e expõe a natural
relação do corpo com o meio. Um metabolismo único e interdependente que é traduzido pelas
relações que constituem o espaço geográfico, ou melhor, o espaço-corpo geográfico.
Assim, acredita-se que por meio de um esforço científico voltado para o entendimento
do fenômeno pelo todo conseguiremos avançar em busca de melhores respostas ao momento
em que vivemos. Coisa que não é simples, visto que aprendemos a “pensar cientificamente”
por uma universidade fragmentada e sem conexões entre os seus saberes, mas, é importante
destacar, que a universidade não é a única forma de conhecimento disponível que temos.
Exemplos de populações que resistem aos ataques do mundo de lá (se nos permitirem
parafrasear Milton Santos) não faltam, inclusive populações que utilizam da saúde para se
afirmarem territorialmente11. Quem sabe assim, enfim, entenderemos o que a OMS definiu
como saúde e lutamos por ela.

REFERÊNCIAS:
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biomédico?. Saúde e sociedade, São Paulo, v.11, n. 1, p. 67-84, 2002.

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DUTRA, Denecir. Geografia da Saúde no Brasil: Arcabouço Téorico-epistemológicos, Temáticas e


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FOUCAULT, Michel. A microfísica do poder. 26ª edição. Rio de Janeiro: Graal, 2008

FOUCAULT, Michel. Aula de 17 de março de 1976. In: FOUCAULT, Michel. Em defesa da


sociedade: Curso no Collège de France (1975-1976). São Paulo: Martins Fontes, 2005. p. 285-316.

FOUCAULT, Michel. O nascimento da clínica. 6ª edição. Rio de Janeiro: Forense Universitária,


2006.

11
Consultar a cartilha “Tejiendo Nuestro Camino Colectivo por la Salud con el Territorio en La Macarena”
(2021)

165
ROCHA. P.H. A saúde como elemento de uma geografia da dominação. In. Simpósio Nacional de Geografia da Saúde:
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