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RELEVÂNCIA DA METODOLOGIA HISTÓRIA DE VIDA PARA AS PESQUISAS DA

ÁREA DA EDUCAÇÃO ESPECIAL EM UMA PERSPECTIVA INCLUSIVA

Michell Pedruzzi Mendes Araújo


michellpedruzzi@ufg.br
http://lattes.cnpq.br/6141634183456644

RESUMO

Este artigo tem o objetivo de compreender a relevância da metodologia história de vida para o
desenvolvimento de pesquisas da área da educação especial em uma perspectiva inclusiva, por
intermédio da análise da dissertação de mestrado "Para além do biológico, o sujeito com a
síndrome de Klinefelter" e da tese de doutorado "Assim como as borboletas: Bianca e a síndrome
de Turner" desenvolvida pelo autor desse trabalho. Trata-se, portanto, de uma pesquisa
qualitativa do tipo bibliográfica com embasamento teórico em Bakhtin (2002; 2003). Como
resultados, destaca-se que a história de vida permite ouvir a voz das pessoas que constituem o
público-alvo da educação especial e potencializar a compreensão de indícios, resquícios e sinais
que podem desvelar aspectos concernentes à exclusão, processos de vulnerabilidade e
estigmatização a que essas pessoas estiveram/estão submetidas e vislumbrar caminhos possíveis
para processos de inclusão mais consistentes, ou seja, pautados nas especificidades dos
indivíduos.

Palavras-chave: História de vida; educação especial; educação inclusiva; metodologia da


pesquisa científica

INTRODUÇÃO

Este artigo objetiva compreender a relevância da metodologia história de vida


para as pesquisas desenvolvidas na área da educação especial e da educação inclusiva,
a partir da análise de uma dissertação de mestrado e uma tese de doutoramento 1, ambas
desenvolvidas no Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal do
Espírito Santo.

A metodologia história de vida permite a penetração nas entranhas e nas


entrelinhas das vozes dos sujeitos, captar sentimentos implícitos e sensações escondidas

1 "Para além do biológico, o sujeito com a síndrome de Klinefelter" (ARAÚJO, 2014) - dissertação de
mestrado- e "Assim como as borboletas: Bianca e a Síndrome de Turner" (ARAÚJO, 2020)- tese de
doutorado são estudos desenvolvidos por mim, autor desse trabalho.

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que se tornam visíveis e ganham destaque no processo de narrar, tanto para o
pesquisador quanto para o próprio entrevistado (DRAGO; SANTOS, 2013).

Como no processo de produção de dados das pesquisas das ciências humanas


deve-se entrar em empatia com esse outro indivíduo, ver axiologicamente o mundo de
dentro dele tal qual ele o vê, colocar-me no lugar dele e, depois de ter retornado ao meu
lugar, completar o horizonte dele com o excedente de visão que desse meu lugar se
descortina fora dele (BAKHTIN, 2003), entendo que a história de vida emerge como uma
metodologia promissora para as pesquisas da área da educação inclusiva.

Para Bertaux (1981), as histórias de vida, por mais particulares que sejam, são
sempre relatos de práticas sociais: das formas com que o indivíduo se insere e atua no
mundo e no grupo do qual faz parte. Michel (2009, p. 55), por sua vez, relata que “na
história de vida são analisadas reações espontâneas, experiências particulares, visões
pessoais que traduzam valores, padrões culturais e exemplos de épocas que auxiliem na
análise do objeto de interesse”.

Objetivando alcançar os objetivos delineados para essa pesquisa, foi


desenvolvida uma pesquisa de abordagem qualitativa do tipo bibliográfica. Essa
metodologia foi desenvolvida “[...] com base em material já elaborado, constituído
principalmente de livros e artigos científicos” (GIL, 2002, p. 44) e apresenta como principal
vantagem "[...] permitir ao investigador a cobertura de uma gama de fenômenos muito
mais ampla do que aquela que poderia pesquisar diretamente" (GIL, 2002, p. 45). Nesse
sentido, coloca-se o pesquisador em contato com pesquisas desenvolvidas a respeito da
temática que será estudada.

Para compor o corpus dessa pesquisa, foram utilizados dois estudos


desenvolvidos por mim, quais sejam: "Para além do biológico, o sujeito com a síndrome
de Klinefelter" (ARAÚJO, 2014) - dissertação de mestrado- e "Assim como as borboletas:
Bianca e a Síndrome de Turner" (ARAÚJO, 2020)- tese de doutorado.

Teoricamente, essa pesquisa está alicerçada nos pressupostos de Bakhtin (2002;


2003) e de outros autores que subsidiaram também a execução dos estudos

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supracitados. A escolha desses teóricos se deu, pois compreendem o homem como um
ser que, para além do biológico, aprende, apreende, se desenvolve e se constitui
subjetivamente a partir das relações alteritárias e dialógicas tecidas na coletividade.

POTENCIALIDADES DAS HISTÓRIAS DE VIDA PARA AS PESQUISAS DA ÁREA DA


EDUCAÇÃO

O professor Valdemir Miotello, importante pesquisador acerca dos estudos


bakhtinianos no Brasil, nos forneceu pistas, em uma entrevista concedida a nós
(ARAÚJO, DIAS, 2019) de como desenvolver narrativas de vida em uma perspectiva
bakhtiniana:

quando vamos a campo para pesquisar, para se colocar na escuta,


nesse caso, escutar é fundamental. Nós vamos numa perspectiva de
quem narra, de quem conta, de quem fala da própria vida, de quem
relata a experiência, o experimento aquilo que ele sente. Não temos lá
uma verdade objetiva, objetivada para ir buscar. Nós temos um pedaço
da vida para compreender, para captar, para entrar em contato para
tencionar. Portanto, a pesquisa narrativa é fundamental, porque ela
mantém essa perspectiva da pesquisa, da busca, da escuta e a
narrativa. Não é alguma coisa que vou buscar com perguntas pré-
prontas, pré-preparadas. Não! Eu vou lá, na hora com a pessoa, vou
escutá-la, vou ouvir as narrativas dela, vou ouvir o que ela tem para me
contar. O outro fala, eu escuto. Isso é fundamental. Uma terceira
questão que se levanta nessa questão da metodologia é a possibilidade
de eu prestar atenção naquilo que é o valor, a valoração, o ideológico,
onde o outro está colocando o acento de valor naquele evento, naquele
acontecimento, naquele pedaço de mundo (ARAÚJO, DIAS; 2019, p.
225).

Nesse contexto, inspirados em Drago e Santos (2013, p. 91), destacamos que

temos em mente que a nossa interpretação das histórias de vida dos


sujeitos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento ou
altas habilidades/superdotação é apenas uma dentro da vasta rede de
outras conclusões, indagações e interpretações possíveis à proposição
de novas/outras maneiras de se propor ações educativas que garantam
o acesso dessas pessoas aos bens culturais produzidos pela
humanidade, a partir daquilo que viveram, ou seja, pensando para as
gerações futuras modos de ressignificar a ação educativa, no sentido de
se reverem os conceitos já experienciados por outros sujeitos.

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Sabe-se que o método denominado história de vida foi negligenciado durante
décadas pela academia, no entanto, como ressaltam Silva et al. (2007, p. 34),

o método de História de Vida é um método científico com toda força,


validade e credibilidade de qualquer outro método, sobretudo porque
revela que por mais individual que seja uma história, ela é sempre,
ainda, coletiva [...].

Nesse processo de ouvir as histórias de vida, consideramos os sujeitos como


dialógicos, ou seja, que, numa perspectiva bakhtiniana, respondem ao presente
projetando o futuro a partir de suas experiências do passado. A partir da nossa
compreensão acerca da teoria bakhtiniana, entendemos que é justamente essa relação
com o futuro, a memória de futuro, que define ações do presente (GIOVANI, 2013).

Spíndola e Santos (2003, p. 125), por sua vez, relatam que na história de vida

é a voz do sujeito que queremos (e precisamos) ouvir! É a história deles


que vamos relatar, não a nossa. Nossas impressões aparecerão, sim,
no momento da análise. Na ocasião das entrevistas, é a voz dos
entrevistados que precisa ser ouvida. De certa maneira, a entrevista
com pergunta aberta, utilizada no método da História de Vida, mostrou-
nos que a entrevistadora não escutava as pessoas, ou melhor, não
sabia ouvi-las sem interferir, sem emitir a própria opinião a respeito.
Nem sempre as pessoas querem ouvir alguma opinião, às vezes, só
querem falar e que alguém as escute. Esse é um cuidado que merece a
atenção do pesquisador, quando elege a História de Vida como
metodologia a ser utilizada no estudo.

A fala anterior, de Spíndola e Santos (2003), acerca da metodologia história de


vida vai ao encontro das considerações de Cipriani, Pozzi e Corradi (1983). Para eles, por
meio das narrativas de sua vida, o indivíduo se preenche de si mesmo, se obrigando a
organizar de modo coerente as lembranças desorganizadas e suas percepções imediatas:
esta reflexão do si faz emergir em sua narração todos os microeventos que pontuam a
vida cotidiana, do mesmo modo que as durações, provavelmente comuns aos grupos
sociais, mas que, dentro da experiência individual, contribuem para a construção social da
realidade.

Chizzotti (2006) enfatiza que a história de vida é uma metodologia de pesquisa


que privilegia a coleta de informações contidas na vida pessoal de um ou vários

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informantes. Nesse contexto, o processo de contar sua história de vida pode levar o
indivíduo a compreender o próprio eu. De acordo com Thomson (1997, p. 57), “ao narrar
uma história, identificamos o que pensamos que éramos no passado, quem pensamos ser
no presente e o que gostaríamos de ser [no futuro]”.

Corroborando com o que já foi exposto, Gaulejac (2005) nos conta que o objetivo
do método da história de vida é ter acesso a uma realidade que ultrapassa o narrador.
Isto é, por meio da história de vida contada da maneira que é própria do sujeito, tentamos
compreender o universo do qual ele faz parte. Isto nos mostra a faceta do mundo
subjetivo em relação permanente e simultânea com os fatos sociais (BARROS; SILVA,
2002).

O objetivo fundamental da história de vida foi sempre o de penetrar,


pelo interior, uma realidade que ultrapassa o narrador e a modela. Pelo
fato dessa técnica se colocar no ponto de interseção das relações entre
o que é exterior ao indivíduo e o que ele traz no seu íntimo (o social e o
individual) busca-se, através dela, apreender o socialmente vivido, o
sujeito em suas práticas, tentando perceber de que maneira ele aborda
as condições sociais que lhe são particulares (FERNANDES, 2010, p.
29).

Posto isso, é importante dizer que, por meio da história de vida, é possível
adentrar na vida do sujeito pesquisado, estabelecendo relações entre o social e o
individual e buscando as miudezas, os pormenores que nos deram uma visão mais
completa, e mais global do processo.

Inspirados em Drago e Santos (2013), compreendemos que a utilização da


metodologia história de vida justifica-se pela escassez de pesquisas que resgatem a fala
desses indivíduos a partir de suas próprias vivências e pelo fato de que essas pessoas
com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e/ou altas
habilidades/superdotação possuem uma história de vida marcada por uma série de
eventos/experiências sociais, históricos e culturais de inclusão e de exclusão, que
foram/são negligenciadas e podem nos dar pistas interessantes de como pensar
novas/outras possibilidades de ações políticas e educacionais.

Nesse contexto, é importante destacar que

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[...] o método de História de Vida, aplicado em pesquisas sobre a
Educação Especial e/ou Educação Inclusiva, ou em outras áreas das
chamadas Ciências Sociais e Humanas Aplicadas, traz ainda uma
vantagem adicional, pois permite uma visão descritiva global da
situação ou grupo estudado. Não só das necessidades e anseios dessa
população, mas, sobretudo da forma como os serviços e profissionais a
eles destinados estão sendo (ou não) efetivados. Esse tipo de estudo,
portanto, além de trazer uma descrição da situação, embute em si
mesmo um impacto propositivo, já o sujeito ao relatar suas experiências
de vida, também aponta para suas necessidades e estratégias de
adaptação e superação das restrições impostas por sua condição
estigmatizada (GLAT; PLETSCH, 2009, p. 50).

Em minha dissertação de mestrado, relatei a história de vida de um jovem com a


síndrome de Klinefelter. Nesse contexto, a metodologia história de vida utilizada permitiu,
a partir da perspectiva sócio-histórica, a compreensão de um sujeito para além do
biológico, mas social e histórico. As pistas, indícios, resquícios e enunciados presentes
nas falas do sujeito com síndrome e de seus pares entrevistados permitiram compreender
uma realidade social e cultural específica e o entendimento dos processos de inclusão,
exclusão, vulnerabilidade, estigmatização e dos processos de subjetivação. das pessoas
com transtornos globais no município de Domingos Martins, região serrana do Espírito
Santo (ARAÚJO, 2014). Portanto, nesse estudo, verifiquei as potencialidades dessa
metodologia. O que foi destacado por mim neste estudo é corroborado pelo estudo de
Glat e Pletsch (2009, p. 37):

[...] é através da análise das práticas diárias dos indivíduos que se pode
chegar a uma compreensão da dinâmica da personalidade de uma
pessoa ou das características e atitudes de um grupo social. E, indo
mais além, é a partir dessa perspectiva que se pode entender melhor os
fenômenos sociais ou históricos globais.

Ao utilizarmos a metodologia história de vida imersa em uma perspectiva


histórico-cultural, devemos ter em mente que

o homem é, por essência, um ser social. Sua identidade pessoal é


determinada pelo espaço que ele ocupa nos diferentes grupos sociais
nos quais transita e pertence. Entre esses destacam-se a família —
grupo social primário que o inicia no processo de socialização, e a
escola – que completa o processo. Pode-se dizer, portanto, que a visão
que um homem tem de si — sua autopercepção- é constituída na
relação que ele estabelece com os demais e pela forma como é

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percebido pelos outros. Em outras palavras, sua identidade pessoal é
referendada por sua identidade social (GLAT; PLETSCH, 2009).

Em minha tese de doutoramento intitulada "Assim como as borboletas: Bianca e a


Síndrome de Turner" (ARAÚJO, 2020), a metodologia história de vida permitiu o alcance
dos objetivos delineados. O sujeito de pesquisa, uma jovem de 19 anos que possui a
síndrome de Turner, era muito comunicativa e estava inserida no ensino superior. Para
que os objetivos delineados nesse estudo fossem alcançados, ao entrevistarmos a jovem
Bianca, utilizamos como instrumentos de produção de dados as entrevistas biográficas.

Sobre esse procedimento para produção de dados, Kramer e Jobim e Souza


(2008, p. 28) destacam:

a entrevista biográfica se constitui a partir de uma relação dialógica


entre dois ou mais locutores que compreende tensões, expectativas,
sanções, proibições, conflitos, hierarquias de poder, confronto de
normas e valores implícitos ou explícitos.

A escolha por esse tipo de entrevista deve se dar para permitir maior liberdade ao
sujeito do estudo para expressar as suas ideias. Um roteiro estruturado poderia inibir a
memória e o fluir de ideias do entrevistado.

Utilizamos nas entrevistas biográficas, realizadas com Bianca, apenas perguntas


orientadoras e disparadoras para a entrevistada não ser influenciada pela própria
pergunta. Nesse sentido, fizemos adaptações das perguntas ao estilo individual de
Bianca, levando em conta as suas peculiaridades/subjetividades.

O supracitado é corroborado por estudos de Glat e Pletsch (2009), quando


enfatizam que

a característica mais importante desta abordagem, portanto, é que a


entrevista não é determinada a priori pelo pesquisador por meio de
perguntas padronizadas e/ou previamente formuladas, mas sim pelos
informantes (pesquisados): pela maneira como eles selecionam,
interpretam, valorizam e transmitem suas experiências de vida (p. 143).

Esse tipo de entrevista permite uma quebra da clausura acadêmica e transforma


um simples suporte documental, em uma pesquisa social e histórica, propiciando desvelar

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a riqueza inesgotável do depoimento, como fonte não apenas informativa, mas,
sobretudo, como instrumento de compreensão mais ampla e globalizante do significado
da ação humana, de suas relações com a sociedade organizada, com as redes de
sociabilidade, com o poder e o contrapoder existentes, e com os processos
macroculturais que constituem o ambiente dentro do qual se movem os atores e os
personagens deste drama ininterrupto – sempre mal-decifrado – que é a História Humana
(ALBERTINI, 1990 apud CASSAB; RUSCHEINSKY, 2004).

Nesse sentido, concordamos com Bakhtin (2002) quando destaca que é na


dimensão extraverbal que estão contidos os elementos ideológicos da fala e os
julgamentos de valor, que são, além de emoções individuais, atos sociais regulares e
essenciais. Assim, compreendemos que o discurso verbal é insuficiente para exprimir
tudo aquilo que na verdade estamos querendo ou deixamos escapar ao nos
comunicarmos com o nosso interlocutor (BAKHTIN, 2002).

Sintetizando os resultados, ressaltamos que, nos estudos analisados, os sujeitos


de pesquisa possuíam duas síndromes raras e o procedimento para produção de dados
foi a entrevista biográfica- um tipo de entrevista semiestruturada. A escolha por esse tipo
de entrevista se deu para permitir maior liberdade ao sujeito do estudo para expressar as
suas ideias. Um roteiro estruturado poderia inibir a memória e o fluir de ideias do
entrevistado. Por meio do processo de (re)visitar esses estudos, destaco que, a partir da
metodologia história de vida, é possível adentrar na vida do sujeito público-alvo da
educação que está sendo pesquisado, estabelecendo relações entre o social e o
individual, e buscando as miudezas, os pormenores que nos permitem ter uma visão
holística dos processos vivenciados. Ademais, as pistas, indícios, resquícios e enunciados
presentes nas falas do sujeito com síndrome e de seus pares entrevistados permitiram
compreender uma realidade social e cultural específica e o entendimento dos processos
de inclusão, exclusão, vulnerabilidade, estigmatização e de constituição subjetiva.

ALGUMAS TECITURAS

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Por meio da pesquisa bibliográfica empreendida e da minha vivência como
pesquisador da área, destaco que a história de vida é uma metodologia com grande
potencialidades para as pesquisas da área da educação especial em uma perspectiva
inclusiva, uma vez que permite ouvir a voz das pessoas que constituem o público-alvo da
educação especial e potencializar a compreensão de indícios, resquícios e sinais que
podem desvelar aspectos concernentes à exclusão, processos de vulnerabilidade e
estigmatização a que essas pessoas estiveram submetidas e vislumbrar caminhos
possíveis para processos de inclusão mais consistentes, ou seja, pautados nas
especificidades dos indivíduos.

Parece ser fundamental dizer também que, a partir do desenvolvimento da


metodologia história de vida valoriza-se a fala dos sujeitos que possuem deficiência,
transtornos globais do desenvolvimento e/ou altas habilidades/superdotação, por
intermédio dos seus próprios enunciados, relações alteritárias e dialógicas. Ademais,
essas pessoas possuem uma história de vida marcada por uma série de experiências
sociais, históricas e culturais de inclusão e de exclusão, que foram/são negligenciados e
podem nos dar pistas fundamentais de como se pensar novas/outras possibilidades de
ações políticas e educacionais.

REFERÊNCIAS

ARAÚJO, M. P. M. Assim como as borboletas: Bianca e a síndrome de Turner. 2020. 167 f.


Tese (Doutorado em Educação) - Programa de Pós-graduação em Educação, Universidade
Federal do Espírito Santo, Vitória, 2020.
ARAÚJO, M. P. M. Para além do biológico, o sujeito com a Síndrome de Klinefelter. 2014.
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SOBRE O AUTOR

Michell Pedruzzi Mendes Araújo


Possui graduação em ciências biológicas pela Universidade Federal do Espírito Santo, graduação
em pedagogia pelo Centro Universitário de Maringá, mestrado e doutorado em Educação pela
Universidade Federal do Espírito Santo. Realizou estágio de pós-doutoramento em Ensino de
Biologia (ProfBIO UFES/UFMG). É professor adjunto da Universidade Federal de Goiás. Realiza
pesquisas na área da educação especial numa perspectiva inclusiva e acerca do ensino de
ciências.

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