L M - Filhos Da Lua 05 - Guerreiros Da Lua - (Rev. PRT)
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L M - Filhos Da Lua 05 - Guerreiros Da Lua - (Rev. PRT)
Lucy Monroe
Filhos da Lua 05
“Warrior’s Moon”
Resumo
O homem lobo Chrechte Caelis, deu as costas a sua amante humana Shona para se manter
leal a sua alcateia. Seis anos mais tarde, acha que ela está morta. Mas estava errado...
Ao ser rejeitada por Caelis, Shona foi obrigada a se casar com um barão inglês. Agora está
fugindo do herdeiro do falecido barão. Determinada a proteger seus filhos, se dirige para o norte, à
ilha Balmoral, para a única família que lhe restava. E em sua fuga encontra o único homem que
gostaria de nunca voltar a ver... e também o único que seria capaz de salvá-la.
Tão poderoso e carismático como sempre, Caelis recebeu a responsabilidade de salvar sua
alcateia do corrupto lorde que os governava. No entanto, nesta ocasião, negou-se a abandonar sua
companheira sagrada. Perdeu Shona uma vez e jura que nunca mais voltará a separar-se dela. A
paixão e o amor impulsionam Shona a unir-se a ele. Mas ela se pergunta se realmente está antes de
sua alcateia ou se nada mudou entre eles...
Prólogo
O Início
Milênios atrás Deus criou uma raça de pessoas tão ferozes que até suas mulheres eram
temidas em batalha. Essas pessoas eram guerreiros em todos os sentidos, recusando-se a se
submeter às regras de qualquer um que não fosse um dos seus... sem importar o tamanho das tropas
enviadas para subjugá-los. Seus inimigos diziam que lutavam como animais. Seus inimigos
vencidos nada diziam, pois estavam mortos.
Eram considerados primitivos e selvagens porque marcavam sua pele com tatuagens de tinta
azul. Os desenhos eram simples: uma única fera pintada rusticamente acima de seus corações. Os
líderes eram marcados com faixas mais elaboradas ao redor de seus braços. Os companheiros
carregavam tatuagens que revelavam seus vínculos.
E ainda assim, seus inimigos nunca foram capazes de descobrir os significados de quaisquer
tatuagens de tinta azul.
Alguns imaginavam que eram símbolos de sua natureza bélica e de fato, em parte tinham
razão. Já que as feras representavam uma parte deles mesmos, algo que aquele povo feroz e
independente mantinha em segredo sob pena de morte. Era um segredo que haviam guardado
através de séculos de existência, enquanto a maioria migrava por todo o território europeu até
instalar-se no inóspito norte da Escócia.
Seus inimigos romanos os chamavam Pictos, um nome aceito por outros povos de sua terra e
das terras ao sul... eles chamavam a si mesmos de Chrechte.
Seu gosto selvagem pela luta e conquista vinha de uma parte de sua natureza que seus
equivalentes completamente humanos não desfrutavam. Pois este povo feroz mudava de forma.
As tatuagens azuis em sua pele eram marcas concedidas como parte de um ritual de
passagem em sua primeira transformação. Alguns homens controlavam sua mudança. Alguns não, e
ficavam sujeitos ao poder da lua cheia até participarem do ato sagrado do sexo. As mulheres de
todas as espécies experimentavam sua primeira transformação em sua forma animal e ganhavam o
controle desta mudança logo depois de seu primeiro ciclo menstrual.
Alguns se transformavam em lobos, outros em grandes gatos predadores e ainda outros em
pássaros grandes — águia, falcão e corvo.
A única coisa que todo Chrechte tinha em comum era que não se reproduziam de forma tão
rápida ou prolífera quanto seus irmãos e irmãs totalmente humanos. Embora fossem uma raça muito
temida e sua esperteza estivesse realçada por uma compreensão da natureza que a maioria dos
humanos não possuía, não eram imprudentes e não os governava sua natureza animal.
Um guerreiro podia matar cem de seus inimigos, mas ele ou ela poderia morrer antes de ter
descendência, a morte ocasionaria uma inevitável redução da raça. Alguns clãs Pictos e aqueles
conhecidos com outros nomes em diferentes partes do mundo, já tinham se extinguido em vez de
sucumbirem aos inferiores, mas numerosos humanos, ao redor deles.
Os Faol das Terras Altas Escocesas eram muito inteligentes para enfrentar o fim de sua raça,
por isso preferiram se misturar. Estes lobos metamorfos vislumbraram o futuro. Com a chegada do
nono século DC, Keneth MacAlpin subiu ao trono escocês. Possuía descendência Faol por sua mãe,
porém, sua natureza humana era a dominante.
Ele não era capaz de se transformar, mas isso não o impediu de reivindicar também o trono
dos Pictos (como eram chamados então). A fim de garantir sua monarquia, ele traiu seus irmãos
Chrechte durante um jantar, matando toda a família real restante, e consolidou para sempre a
desconfiança aos humanos por seus pares Chrechte.
Apesar desta amarga desconfiança, produto da sempre presente traição de MacAlpin, os
Faol dos Chrechte perceberam que poderiam se extinguir lutando contra a sempre crescente e
invasora raça humana, ou poderiam se juntar aos clãs celtas.
Eles se juntaram.
Para o resto do mundo, ainda que muitos viveram para dar testemunho de sua antiga
existência, o que foi considerado o povo Pictos não existiam mais.
Não estava em sua natureza serem governados por qualquer um que não fosse de seu próprio
povo, em duas gerações, os clãs celtas que assimilaram os Chrechte foram regidos pelos chefes dos
clãs metamorfos, quem compartilhavam suas naturezas com lobos. Apesar da maioria dos
integrantes humanos não saberem, uns quantos confiaram seus segredos aos parentes. Aqueles que
sabiam eram conscientes de que trair o código de silêncio significava uma morte certa e imediata.
Histórias de outras raças metamorfas, os Éan e Paindeal, se contavam ao redor das fogueiras,
ou para as crianças antes de dormir. Porém, como a maioria dos lobos não haviam visto nenhum
outro metamorfo que não fosse de sua própria geração, começaram a acreditar que as outras raças
fossem apenas um mito.
Mas mitos não voavam no céu com suas asas negras refletindo um iridescente azul sob o sol.
Mitos não viviam como fantasmas na floresta, respirando ar da mesma maneira que qualquer outro
homem ou animal. Os Éan não eram um mito. Eles eram pássaros com habilidades além daquela de
meramente mudar sua forma.
Muitos podiam ser perdoados por acreditar que as histórias do príncipe sobre os Éan não
passassem de uma lenda. Pois quem ouviu falar de um homem que não apenas transformava-se em
um corvo, mas também em um dragão místico dos contos antigos?
Mas se o dragão era real, então também eram os conriocht? Este Faol sobreo qual haviam
rumores haviam defendido a raça na antiguidade e eram capazes de mudar não apenas me forma de
lobo, mas em uma terrível fera: um homem lobo.
CAPÍTULO 1
***
A fortaleza era um castelo, muito superior ao feudo MacLeod onde ela cresceu e muito mais
1
No original “sassy patch”.
formidável que aquele de seu falecido marido. A muralha alta que rodeava o castelo do laird era de
pedra, ainda que os edifícios em seu interior fossem feitos em sua maioria de madeira.
A fortaleza se encontrava no alto de um monte, a colina artificial apenas era acessível por
um caminho tão estreito que soube que Niall lhe diria que não poderiam levar seus cavalos.
Inclusive a esta distância, a fortaleza parecia grande o suficiente para acomodar facilmente
cinquenta ou mais no grande salão. A natureza imponente da edificação a fez desejar que a de sua
família fosse igual ao clã Sinclair. Apenas podia ter a esperança de que os Balmoral vivessem tanto
quanto seguros.
O pátio de armas estava ocupado por guerreiros e membros do clã por igual, muitos
pareceram interessados nos recém-chegados. E levemente perspicazes, se os cenhos franzidos que
seus companheiros e ela recebiam ao passar significavam algo, mas a hostilidade aberta que poderia
ter esperado por suas roupas inglesas estava surpreendentemente ausente.
Niall parou seu cavalo e os guerreiros o imitaram. Shona fez com que sua cansada égua
parasse, tão fadigada como ela mesma se sentia que não tinha certeza de como desmontar sem
deixar a si mesma e a Marjory cair.
— Nós devemos desmontar? — Audrey perguntou, seu tom não mostrando mais entusiasmo
pela ideia que Shona sentia.
Shona abriu sua boca para responder, apenas para perder qualquer esperança de falar quando
seu olhar caiu sobre o guerreiro de pé perto da área aberta diante da ferraria. O homem, que era
quase tão alto e fornido como Niall, usava as cores de seu antigo clã e não usava uma camisa sob o
plaid MacLeod para lhe dar alguma sugestão de civilidade.
Estava de costas para eles e sua falta de interesse pelos estranhos ingleses era mais que
óbvia.
Mas ela não sentia a mesma apatia.
Não quando cada centímetro de sua arrogante postura lhe era tão familiar como a crina de
sua égua depois de passar uma semana montada nela.
Seu cabelo preto estava um pouco mais longo do que a seis anos atrás, as tatuagens azuis
que cobriam seu ombro e braço esquerdo eram uma nova adição, e seus músculos estavam mais
inchados, mas não tinha absolutamente nenhuma dúvida sobre a identidade do guerreiro MacLeod
que se encontrava com tanta confiança entre os Sinclair.
Caelis. Seu amado. Seu traidor.
Inclusive o som do nome dele em sua mente fazia com seu coração batesse mais rápido e
que apertasse as mãos em punho.
Enganador, gritou a voz em sua mente que nunca foi completamente silenciada apesar de ter
sido forçada a se casar com outro homem. Meu, gritou o coração que aprendeu que não podia
confiar em amar nem colocar seu amor aos pés deste homem.
Ela deu a ele seu amor e sua inocência.
Ele pagou aqueles presentes com falsas promessas e, no fim, repúdio.
Acreditou que nunca o veria novamente, estava certa que mesmo seu retorno à Escócia não
faria seus caminhos se cruzarem.
Afinal, não voltou para seu antigo clã e foi cuidadosa ao evitar suas terras na jornada rumo
ao norte. Não queria encontrar seu antigo laird e muito menos seu antigo pretendente.
O quão cruel era o destino ao ditar e assegurar-se, que ao contrário do costume de seu antigo
clã de manter-se isolado, este estivesse ali no único dia que passaria pela fortaleza Sinclair.
A cabeça da égua de Shona sacudiu contra seu aperto nas rédeas e ela ficou grata por não
estarem mais se movendo. Segurar as rédeas assim era um jeito garantido de ser lançado por até
mesmo um cavalo leal.
Marjory dormia, inconsciente tanto de por quão pouco se salvou, assim como de seu novo
entorno e do cataclisma que acontecia no interior de sua mãe.
Como se Caelis pudesse sentir o peso da atenção de Shona, ele se se virou. Lentamente e
sem evidência de curiosidade, seu olhar violeta deslizou sobre ela, sua expressão era de desprezo
quando notou sua roupa inglesa.
Mas Shona pode dizer o momento exato em que ele a reconheceu, o segundo depois que
percebeu que não era apenas uma mulher inglesa, mas uma mulher de seu passado.
Ele ficou rígido, seus olhos se abriram amplamente com uma surpresa tão absoluta que teria
sido divertido se ela não se sentisse tão devastada por ele aparecer outra vez em sua vida já
tumultuada.
Ele tentou dar um passo e tropeçou.
Que estranho. Ele era um homem firme. Talvez um dos outros guerreiros o fez tropeçar?
Homens faziam brincadeiras entre eles desta forma.
Mesmo quando os pensamentos absurdos passaram por sua mente, medo gritou por seu
corpo. Caelis não podia ver Eadan. Seu filho nunca poderia conhecer o homem que negou sua
existência e rejeitou a mulher que declarou amar.
Eles precisaram partir. Agora. O laird dos Sinclair simplesmente teria que passar sem o
prazer de conhecê-los.
Aquele pensamento deu a ela força para afastar o olhar de Caelis enquanto girava sua cabeça
ao redor, procurando freneticamente por Eadan.
Ele já estava no chão, sua mão segura na mão gigante de Niall, um homem menor estava
muito perto do enorme guerreiro, conversando com ambos com um atraente sorriso.
Shona queria gritar com eles para, por favor, colocar seu filho de volta em seu cavalo e
então sair de seu caminho. Mas nenhuma palavra saiu de seus lábios. Não podia se mover, nem
falar, seu pânico a congelando tão forte quanto a morte.
Mesmo com a necessidade de escapar rasgando-a, ela soube que isto era quase impossível.
Ainda que pudesse se obrigar a mover para gritar à Niall que colocasse seu filho de volta em
seu cavalo, ela e seus companheiros não teriam permissão para deixar as terras Sinclair sem ver o
laird. Já havia sido decidido.
E como aconteceu muito frequentemente em seu passado, Shona sabia que estava sujeita aos
caprichos de homens que tinham autoridade sobre ela. Desta vez, era apenas por invadir as terras
dos Sinclair, mas isto não importaria a seu laird.
Ele era um homem com poder.
Exigiria obediência.
Assim era como se faziam as coisas.
Desespero encheu Shona quase a afogando.
O menino estava fora da linha de visão de Caelis, o que deu um pouco de conforto a Shona.
Tão logo o guerreiro visse seu filho logo sentiria o vinculo? Saberia a verdade, não
importava o quando negasse.
Mas o que ele faria com esta verdade, não podia adivinhar. Nada bom para ela. Descobriu
nos últimos seis anos que os homens raramente faziam escolhas para beneficiar as mulheres.
Mas mais particularmente a ela.
Caelis foi apenas o primeiro homem em uma longa lista em sua vida que exibiu esta
verdade.
— Shona...
Ela olhou para baixo e viu que ambos Audrey e Thomas estavam ali, de pé ao lado da égua
de Shona. Audrey estendeu as mãos para pegar Marjory para Shona poder desmontar.
Quando eles saíram de seus cavalos?
— Você está bem? — Thomas perguntou, seu tom claramente preocupado. Ele e Audrey
tinham expressões de preocupação. — Nós dissemos seu nome três vezes.
— Eu... não... — Ela respondeu com honestidade antes de pensar em controlar sua língua.
— O que foi? — De repente Niall estava lá, tendo se movido muito depressa. — Lady
Heronshire, precisa ajuda para desmontar?
Ele esticou os braços.
— Dê-me a menina.
Soltando as rédeas do cavalo, Shona envolveu seus braços ao redor da filha em um
movimento reflexo de proteção.
— Não toque nela. — O grunhido veio por trás de Niall e então Caelis estava lá,
empurrando o outro guerreiro para longe do cavalo de Shona.
Niall girou sobre o outro homem, deixando-o para trás e gritando.
— Que inferno!
— Ela é minha. — Caelis grunhiu, sua voz tão parecida a de um animal que mal se ouvia.
— Acalme-se. — Niall estalou, soando menos nervoso por algum motivo, entretanto não se
afastou. — A inglesa...
— Ela não é inglesa.
— Não vê como ela está vestida? Ela é uma lady, Caelis. Pare e pense.
Mas Caelis estava além da razão, sua agressividade não diminuindo em nada. E Shona não
entendia. Em nenhuma fantasia deste momento poderia ter imaginado que Caelis a reivindicaria...
ou era sua filha a quem reclamava?
Nada disso fazia sentido.
Marjory escolheu este momento para acordar, torcendo-se para sentar.
— Mami! Quero descer.
Caelis saltou como se uma flecha o houvesse atingido, seu olhar passou pela menina nos
braços de Shona. Uma grande emoção tocou suas feições, e então seus olhos azuis, tão parecidos
com os de seu filho, foram para ela, a acusação neles inconfundível.
Ela encarou de volta, desafiante, furiosa como não esteve desde a noite que ele disse a ela
que estava tudo acabado.
Todo o medo que sentiu durante os últimos meses, a raiva que experimentou ante a traição
dos homens desde que ele a traiu seis anos atrás, seguida pela deslealdade de outros, inclusive de
seu próprio e querido pai, avivou esta fúria de forma que se fosse possível, ela o teria queimado em
cinzas com seu olhar.
Sua cabeça foi para trás, surpresa novamente aparecendo em suas bonitas feições, desta vez
misturada com confusão.
Se possível, sua surpresa a deixou mais lívida. Ele pensou que ela esqueceu o modo que a
usou e a descartou? Ele achou que ela não usaria isto contra ele?
Então, ele era um idiota.
Nunca esqueceria. Passou cada dia com uma lembrança vívida.
Mas Shona ignorava o que confundia Caelis. Acreditava que apenas porque ele não a quis
nenhum outro homem iria pedi-la em casamento?
Canalha arrogante.
— Mamãe? — A voz preocupada de Eadan veio de onde ele estava ao lado de Niall.
Ela precisava dizer a seu filho que tudo estava bem, mas não podia afastar o olhar do rosto
de Caelis enquanto ele lançava seu primeiro olhar ao filho que eles fizeram.
A criança que ele disse que nunca aconteceria.
Ela foi ingênua e acreditou nele. Nunca cometeria aquele engano novamente.
CAPÍTULO 2
O guerreiro desmaiou.
Com um grande som de pancada enquanto seu corpo grande e super musculoso batia no
chão.
Caelis lançou um olhar para seu filho, abriu seus olhos azuis em reconhecimento que logo se
converteu em horror e então caiu na terra como uma pedra.
Várias pessoas, os Sinclair e amigos de Shona por igual, fizeram sons com vários níveis de
comoção e volume.
Como o coração na garganta, ainda sem saber porque estava preocupada com o canalha,
Shona não prestou nenhuma atenção neles até que seu filho falou.
— Ele está morto assim como milorde?
O fato de seu falecido marido ter insistido que o garoto se dirigisse formalmente a todos,
incluindo-o, nunca pareceu a Shona tão absurdo ainda que apropriado como neste momento em que
Eadan contemplava o corpo inconsciente do pai com quem compartilhava o sangue.
Niall balançou a cabeça e se afastou do outro grande soldado, como se um guerreiro
desmoronando fosse de pouca importância.
— Não, rapazinho. Ele está vivo, só está tirando um pequeno cochilo.
— No chão? — Eadan perguntou, piscando para Niall duvidosamente.
— Ele desmaiou. — Disse que o homem menor que tinha conversado com seu filho e Niall
mais cedo, uma certa satisfação em seu tom.
— Como a donzela nas histórias que Audrey conta para nós?
Niall bufou uma risada.
— Aye, exatamente assim.
— Audrey? — O homem ruivo menor perguntou. — Não sua mãe?
— Mamãe jamais conta histórias onde a donzela desmaia ou precisa ser salva. Em todas
suas histórias, os cavaleiros e princesas lutam lado a lado. Milorde dizia que eram tolices, mas
Marjory e eu gostamos. — Eadan disse com forte lealdade.
— Isto está bem. — Niall disse com uma batidinha na cabeça de seu filho. — Deixe Guaire
levar você e os outros para a fortaleza.
— E a mamãe? — Eadan fez uma careta preocupada, hesitando.
Ela não podia nem formar um sorriso de conforto para ele, mas conseguiu dizer por uma
garganta muito apertada.
— Vá com senhor Guaire, querido.
— Aqui. — Niall levantou os braços. — Dê-me a menina.
— Meu nome é Marjory. — Sua filha decidiu informar ao gigante.
— Aye, moça, foi o que ouvi e é um nome muito bonito. Você vem comigo?
Marjory virou seu rosto para o peito de Shona, sua natureza tímida predominando.
Thomas avançou.
— Venha, bolinho, tio Thomas levará você.
Marjory balançou a cabeça, sem desviar o olhar do casulo de segurança que ela criou para si
mesma.
Shona teria rido se pudesse. A teimosa timidez da sua filha era muito familiar.
— Como sua mamãe descerá do cavalo se você não a soltar? — Audrey adulou.
Mas sem resultado.
— Nós ficaremos aqui. É confortável. — Marjory reivindicou em uma voz amortizada pelo
corpo de Shona.
— Marjory, você não quer conhecer o laird? — Thomas perguntou.
Era exatamente a coisa errada para dizer porque Marjory agarrou Shona mais apertado e
exclamou uma negação muito clara.
Caelis gemeu e se mexeu no chão. Fatalmente, esta ação foi o que fez com que Marjory
soltasse seu tenso aperto sobre a cintura de sua mãe e virar-se para ver o grande homem sentado na
terra.
— Você caiu. — A observação de Marjory encontrou um aceno confuso com a cabeça. —
Eu tiro cochilos, mas Eadan não. Meninos grandes não tiram cochilos.
Marjory falou em uma mistura de inglês e gaélico, que Shona estava acostumada a
interpretar. O olhar perplexo no rosto de Caelis disse que ele não conseguia. Ela sabia que ele
aprendeu inglês rudimentar, portanto não sentiu-se surpresa quando a confusão masculina
finalmente terminou.
— Normalmente eu não cochilo, princesa.
— Eu não sou uma princesa.
Shona ofegou tão impressionada pela amabilidade de Caelis para com sua filha.
Ele lançou um olhar para ela, mas não se prolongou.
— Tem certeza? Você parece uma. — Caelis se levantou, tirando a poeira e ignorando os
fixos olhares curiosos dos Sinclair ao redor deles. Ele parecia completamente inalterado por ter
desmaiado na frente de uma muralha cheia de pessoas.
Seis anos atrás, ele não teria se sentido assim revelando alguma debilidade.
— Meu papai era um barão.
— Ele não é mais? — Caelis perguntou.
— Ele está morto. Meu irmão é barão agora, mas não acho que ele gosta de Eadan e de mim.
Da boca das crianças saia a verdades.
Desta vez quando Caelis olhou para Shona, sua atenção ficou com ela.
— Você é viúva?
— Sim.
— Bom.
— Esta dificilmente é uma resposta civilizada ao saber que o marido de uma mulher morreu.
— Ela protestou.
Apesar de não poder dizer que sentia pesar sobre o falecimento de Henry, o fato que foi
deixada sozinha no mundo, novamente, sem nem mesmo a mínima proteção do barão, dificilmente
era motivo para alegria.
— Eu não sou um homem civilizado.
Ela não argumentaria com ele nesse ponto. Houve um tempo em que o lado selvagem de sua
natureza atraía muito a ela. Não mais.
— Ainda assim, eu não consigo entender por que você acha minhas atuais circunstâncias
boas.
Ela livrou-se de uma união só para se encontrar em risco de ser presa em outra, muito mais
onerosa.
Caelis deu de ombros.
— É bom que eu não tenha que matá-lo.
Shona ofegou, incapaz de compreender porque expressava tal sentimento.
— Você não pode dizer tais coisas na frente dos meus filhos.
Os olhos de Caelis queimaram com arrependimento, mas em sua mandíbula apareceram
linhas de teimosia que ela se lembrava muito bem para seu próprio conforto.
— Por favor, me perdoe por dizer isto na sua frente, princesa.
Marjory deu uma risadinha.
— E eu? — Eadan exigiu.
— Você é um menino grande, cinco verões você tem, não? — Caelis perguntou.
Eadan concordou com a cabeça sem suas perguntas habituais sobre como o homem poderia
saber isto.
— Conversa de guerreiro não vai te incomodar. — Caelis disse com certeza.
Eadan estufou-se com o elogio e confirmou solenemente.
— Às vezes um homem deve fazer o que precisa ser feito.
Caelis lançou um olhar para ela.
— Isto é o que diz um guerreiro de um clã.
— Meu avô me disse.
— Onde está seu avô agora?
Os olhos de Eadan se encheram com pesar.
— O cavalo lhe deu um coice e ele morreu.
— Que cavalo?
— O meu.
— Não era seu cavalo, querido. Era só o cavalo no qual um idiota colocou você. — Shona
odiava a culpa que seu filho carregava sobre o falecimento do seu adorado avô. Ela disse a Caelis.
— O irmão mais velho de Eadan o colocou em um cavalo inexperiente. Percival alegou que não
percebeu que o cavalo era tão temperamental. Meu pai morreu salvando meu filho.
— Isso não é um irmão. — O tom de Caelis não permitia nenhum argumento.
Shona foi salva de responder por seu filho.
— Não, lorde Percival é um homem mau. Eu não o quero como irmão. A mamãe disse que
eu não tenho que chamá-lo assim se não quiser agora que nós estamos na Escócia.
— Bom.
Eadan concordou.
— Aye.
Oh, que o bom Senhor nas alturas lhe desse força. Ela não iria sobreviver a este encontro
com seu coração ou sua sanidade intacta.
O menino e o homem eram tão parecidos.
— Shona... — A chamada de Audrey lembrou a Shona que ela ainda precisava sair de seu
cavalo.
Ela olhou abaixo para Marjory. A criança parecia menos reservada sobre o ambiente.
— Você deixará Audrey pegá-la agora? — Ela perguntou.
O dedo de Marjory foi direto para sua boca e ela balançou a cabeça.
Caelis as observou e então olhou para baixo para o filho dela.
— Sua irmã não quer descer.
— Ela é tímida com estranhos.
— Entendo.
— Se eu fosse maior, ela viria comigo.
Caelis concordou com um semblante sério.
— Talvez se eu erguer você para ela?
Eadan considerou isto antes de acenar.
— Ela virá para mim. — Ele disse com certeza.
Caelis levantou o menino, uma emoção profunda cobrindo suas feições enquanto seu filho
colocava seu braço ao redor do pescoço do grande guerreiro para estabilidade. Shona queria gritar
com ele, dizer que ele, também, era um homem muito estúpido.
Se ele sentia a conexão tão profundamente, então por que negar até a possibilidade de uma
criança? Por que dizer a ela que eles não poderiam se casar?
Caelis abaixou a cabeça e inalou profundamente contra pescoço de Eadan, seu grande corpo
ficando rígido por vários segundos em resposta ao cheiro do filho dela. Ele costumava fazer isto
com Shona, e as lembranças que surgiram vendo-o fazer isto com seu filho não eram bem vindas.
— Caelis. — Ela disse rispidamente.
Ele ergueu seu olhar, os olhos azuis violáceos cheios de tal pesar que nem sequer ela podia
negar que este momento era realmente significativo para ele.
— Aye? — Sua voz saiu cansada, inclusive como se esta única palavra fosse muito difícil de
falar.
Ela negou com a cabeça, sua própria garganta muito apertada para falar.
— Vamos pegar Marjory. — Eadan lembrou o grande homem, claramente à vontade nos
braços de seu pai.
Caelis acenou com a cabeça, o movimento brusco.
— Aye, nós vamos. — Ele se aproximou da égua, segurando Eadan com firmeza.
O filho de Shona esticou seus braços para sua irmãzinha. Ele não disse nada, só olhou
esperançosamente para Marjory.
E seus minúsculos braços se esticaram para ele. Ela não pareceu notar o enorme guerreiro
sustentando aos dois enquanto era tirada do cavalo. Caelis colocou as crianças no chão juntas ao
lado de Niall e Guaire, em vez de perto de Audrey ou Thomas.
Shona achou aquilo revelador. Ele confiava no guerreiro escocês, mesmo de um clã
diferente, sobre os ingleses que ele não conhecia. O que significava que confiava em Niall, um
Sinclair. O que era estranho, mas não tão estranho quanto o fato que Caelis estar ali nas terras
Sinclair.
As viagens dele eram as últimas preocupações de Shona no momento. O que importava era
que Caelis se preocupava se seus filhos estavam protegidos.
Isso era mais interesse do que ele mostrou a ela seis anos atrás.
Guaire se ajoelhou e assim se nivelou aos olhos de Eadan e começou a conversar
suavemente com as crianças.
Shona suspirou, deixando seus músculos rígidos relaxarem. Uma dor apertava a parte baixa
de suas costas, subia por sua coluna e em seus ombros. Ela não pode abafar seu gemido de agonia,
apesar de ter tentado.
Sair da égua iria ser mais que complicado, seria impossível. Ela poderia muito bem apenas
sair por um dos lados e cair no chão como Caelis.
Antes de ter uma chance de se preocupar com isso, grandes mãos se fecharam ao redor de
sua cintura e foi erguida para o chão.
Porém, Caelis não a soltou uma vez que seus pés tocaram o chão. Ele a segurou, seu rosto
um feixe de emoções que ela não sabia mais como nomear com este homem.
— Você deve me soltar.
— Nay.
— É impróprio. — Sem mencionar que era completamente perigoso para sua forçada
compostura.
A fachada tranquila que usava para proteger aqueles que dependiam dela já estava
começando a rachar nas extremidades sob a tensão dos últimos meses.
Caelis fez um som de desgosto.
— Você não é uma inglesa para se preocupar com isso, independente do que veste.
— Se eu tivesse me preocupado com isso quando era mais jovem, muitas de minhas mais
difíceis escolhas não teriam sido forçadas a mim. — Ela apertou seu peito para afastá-lo, sabendo
que o toque adicional era arriscado.
E realmente, suas mãos queriam ficar contra a pele quente sobre os músculos fortes e um
plaid suave. Ela não podia ceder a tal debilidade e forçou suas mãos a soltarem quando sua tentativa
não teve nenhum efeito no grande homem.
Ao invés disso, Caelis reagiu a sua tentativa de se livrar puxando-a mais perto.
— Eu posso explicar.
— Explicar? — A princípio ela não podia compreender o que ele estava falando.
E então entendeu. Ele pensava que poderia explicar o que aconteceu seis anos atrás? Não
havia nenhuma explicação para aquele tipo de traição.
Ela balançou a cabeça veementemente, sua emoção ameaçando subjugar a tranquilidade a
qual se agarrava.
— Nada que você diga pode desfazer o que fez, o que tive que suportar nestes últimos seis
anos.
Um espasmo de remorso cruzou seu rosto, mas foi rapidamente substituído pela obstinação
que uma vez ela achou reconfortante.
— Ainda assim você escutará o que eu tenho a dizer.
— Eu farei isto. — Ela disse entredentes. — Exatamente quando os clãs Highlanders se
curvarem para o rei da Inglaterra.
Ela não podia imaginar nem em seus piores pesadelos este dia chegando e ela sabia que nem
Caelis.
Ele fez uma careta quando entendeu o que ela queria dizer.
— Mo toilichte. — Ele sussurrou como se as palavras tivessem o poder de curar a brecha
entre eles. — Existiam coisas que você não sabia, não podia saber naquela época.
— Eu não sou mais sua felicidade, e você não é mais meu guerreiro. — Ela balançou a
cabeça, tentando novamente se afastar. — Por favor. Deixe-me ir.
Quando Caelis notou o quanto lhe custava suplicar ou talvez simplesmente decidiu que já a
tinha segurado durante muito tempo, mas as grande mãos que cobriam seus ombros caíram e ela foi
capaz de se afastar.
— Qualquer conversa que você queira ter terá que esperar até que a lady inglesa fale com
nosso laird. — O tom de Niall não permitia argumento.
Surpreendentemente, Caelis não o fez. Ele simplesmente concordou.
— Eu acompanharei você até a fortaleza.
A lembrança de que sua discussão estava sendo ouvida por outros, muitos dos quais não
puderam deixar de notar a semelhança entre Caelis e seu filho, fez o calor do embaraço subir pelo
pescoço de Shona. Ela deveria estar acostumada a isso por agora, mas a fisgada de humilhação
ainda apertava profundamente.
Caelis olhou abaixo para ela, sobrancelhas escuras juntaram-se acima de seu olhar azul.
— Você está bem?
Responder a verdade era um luxo que Shona não podia dispor, então meramente concordou
e indicou que deveriam começar sua caminhada para a fortaleza.
Niall fez exatamente isto, levando a todos pelo caminho estreito, a mão de seu filho ainda
firmemente segura na grande mão do guerreiro. Tão cansada e rígida de dia após dia de montaria
seus membros não quiseram funcionar, mas Shona os seguiu.
Shona tropeçou. Seu esgotamento, misturado com o entorpecimento pelo encontro com
Caelis depois de seis anos e tudo o que aconteceu a deixava torpe.
Audrey pegou uma mão, dando a Shona um sorriso tranquilizante, e Thomas ofereceu seu
braço.
O grunhido por trás deles deveria ter feito o jovem inglês abaixar o braço oferecido.
Certamente enviou calafrios pela espinha de Shona.
Mas Thomas fez uma careta por cima de seu ombro para o grande guerreiro que se
posicionou atrás deles.
— Eu sei o que você é, e perdeu seus direitos sobre ela. Eu oferecerei ajuda a minha amiga e
se ela aceitar, darei.
Shona sentiu uma picada de humilhação ao perceber que seus amigos realmente perceberam
que este homem era o pai de seu primogênito, não o homem que ela chamou de marido por pouco
mais de cinco anos.
Pensou na estranha expressão de Thomas, dizendo o que ao invés de quem a Caelis, mas não
o mencionou. Preferia não reconhecer a mortificante verdade.
Talvez ele considerasse Caelis um monstro tão grande como o barão de quem era filho.
Durante seis anos, Shona certamente acreditou... ou ao menos se convenceu disto.
Sem considerar a debilidade de Shona e indiscrições passadas, o juvenil ímpeto e a firme
lealdade de Thomas a comoveu.
— Obrigada, Thomas. — Ela agarrou seu braço.
Mas a mão de Caelis estava ali, seu corpo empurrou o homem mais jovem para o lado da
mesma maneira que ele fez com Niall mais cedo.
— Ele não vai agradecer a você se eu tiver que desafiá-lo por meus direitos.
Thomas empalideceu. Pela segunda vez em poucos minutos, Shona se encheu de fúria por
este homem.
— Você não fará nada disto! Não tem nenhum direito sobre mim. Você os repudiou quando
me abandonou seis anos atrás.
— Foi sua família que deixou o clã, não eu.
Ela parou, puxando a pobre Audrey para uma parada ao seu lado para que Shona pudesse
encarar o homem.
— Nem mesmo tente fingir que foi o contrário. Eu ouvi suas mentiras uma vez, mas elas
nunca ditarão minha vida novamente.
Ele estremeceu como se suas palavras o ferissem, entretanto ela sabia que não era possível.
— Não cometa nenhum engano. Independente de meus erros passados, eu desafiarei este
jovem se ele tentar novamente vir entre mim e minha companheira.
Ele falou dela como um animal, e desejou que eles fossem. Os animais não abandonavam
aqueles que eles escolhiam para acasalar, mas este homem muito humano inegavelmente a
descartou.
Se Caelis se importasse, ele não teria rejeitado Shona perante seu próprio pai.
Sufocando a emoção que surgiu dentro dela pela lembrança, sentiu as lágrimas queimando
por trás de seus olhos. Piscou furiosamente, convencida de que elas não cairiam.
Caelis amaldiçoou, parecendo aflito, como se ela acreditasse.
Ela não iria.
— Eu não sou sua companheira. Eu não sou sua esposa. Eu nem mesmo sou sua antiga
noiva. — Os proclamas nunca foram feitos. — Eu não sou nada para você.
Sem outra palavra, ele tomou sua mão e deslizou a outra mão livre ao redor de sua cintura
com uma gentileza imprópria para um homem que ameaçava outras pessoas. Shona estava muito
cansada para continuar lutando contra ele.
Ele tomou tanto seu peso para que ela pudesse caminhar enquanto continuavam subindo.
Depois de vários passos em silêncio, ele disse calmamente.
— Nisto, Shona, você está muito errada. Você não é só a mãe de meu filho, você é minha. E
eu a convencerei disto. Com o tempo.
— Eu nunca serei sua novamente! — De onde veio a energia ou a vontade de gritar, ela não
sabia dizer, mas sua voz estava carregada com todo o desespero e convicção que sentia naquele
momento.
Marjory se virou para olhar para Shona de onde ela caminhava de mãos dadas com Guaire.
— Por que você está gritando com o homem gentil, mamãe?
Homem gentil? Sua filha perdeu a cabeça? Marjory não gostava de estranhos e agora decidiu
que Caelis, o homem que disse que teria matado seu pai se ele já não estivesse morto, era um
homem gentil.
Talvez a sanidade de Shona não estivesse tão intacta quanto achava que estivesse. Talvez
isto fosse algum pesadelo verdadeiramente estranho e ela despertaria logo.
Mal podia esperar.
CAPÍTULO 3
Considerando a grandeza da fortaleza e a força de suas defesas, era em si mesma bem mais
modesta. Não tinha nada da ostentação que o falecido esposo de Shona, o Barão de Heronshire, era
tão propenso em mostrar.
O grande salão podia acomodar facilmente uma grande assembleia do clã, mas as tapeçarias
de seda sobre as paredes, tão comuns na casa de um Barão inglês para denotar riqueza e status,
estavam claramente ausentes. Nenhum móvel supérfluo adornava o cavernoso lugar.
As largas mesas e os bancos que acomodavam o laird e seus guerreiros eram de madeira
clara; nenhuma talha especial, nem sequer na cadeira do laird.
Não havia duvida de onde se sentavam o laird e sua dama, porque estas duas cadeiras era as
únicas ante as mesas do salão. Não obstante, existia um agrupamento de outras cadeiras perto da
lareira, que tinha almofadas com as cores do clã. Mas Shona não tinha duvida de que as almofadas
eram para proporcionar comodidade, em vez de espetáculo.
Uma encantadora mulher loira tinha um pergaminho de contas diante dela, que Guaire olhou
franzindo o cenho ao entrar.
— Eu pensei que iríamos examinar isto juntos, lady Abigail.
— Eu quis poupar seu tempo, Guaire.
O homem pareceu aflito e Niall riu.
— Você sabe que ele sentirá a necessidade de examinar cuidadosamente ele mesmo
independentemente.
Lady Abigail sorriu, malícia brilhando em seus olhos castanho claro.
— Você acha?
— Você gosta de provocar, milady. — Guaire disse exasperado.
— Mamãe, você não deveria provocar. — Um menino disse do lado do laird. — Sempre fica
tão desapontada quando eu provoco Drost.
— Isto é porque você ainda não aprendeu a não pressionar tanto para que seu irmão recorra
às lágrimas ou a violência, Brian. — Abigail disse com uma risada musical.
Shona ouviu rumores de que lady Sinclair era surda, mas esta mulher parecia ouvir tão bem
como qualquer um ali.
— Eu não quero que ele me provoque mesmo que ele aprenda isto. — O menino que deveria
ser Drost disse do outro lado de seu pai.
Brian parecia sutilmente interessado na espada que seu pai estava afiando, enquanto seu
irmão, que era tão parecido com ele para não ser seu gêmeo, cuidadosamente desenhava com carvão
em uma tabua de argila.
Eadan marchou até a mesa e se apresentou.
— Eu sou Eadan. Você é Drost. — Ele apontou para o menino que dava a seu pai um pano
para enxugar o óleo da lâmina da sua espada. — E você é Brian. — Ele apontou para a outra
criança. — Eu ouvi você dizer.
Seu filho era tão inteligente, que Shona frequentemente se maravilhava em quão depressa
ele pegava o mundo ao redor dele.
Ambos os meninos pareciam impressionados. Drost observou de forma neutra.
— Você não está vestindo cores de clã.
— Suas roupas são engraçadas. — Brian adicionou com uma clara opinião.
Abigail ofegou e parecia pronta para se intrometer, mas Eadan não deu chance a ela.
— Elas são inglesas. — Ele disse com um dar de ombros.
Brian fez uma careta.
— Nós não gostamos dos ingleses.
Desta vez, Abigail ficou em pé e virou-se para enfrentar seu filho, uma expressão feroz em
seu rosto.
— Eu sou inglesa.
— Você era inglesa. — O laird, que permaneceu em silêncio até agora, inseriu. — Porém.
— Ele deu um olhar para o filho que teria intimidado Shona agora, e muito mais quando ela era
uma criança pequena. — Você sabe muito bem que nós não odiamos todos os ingleses.
O bufo de ofensa de Abigail apenas fez seu marido dar de ombros, como se dizendo que era
o melhor que ela podia esperar. Era claramente um argumento antigo.
— Você gostará de mim e de minha irmã. — Eadan disse com bravata, puxando Marjory
para seu lado.
O tremor de preocupação na voz de Eadan fez Shona querer envolvê-los em seus braços e
tirar aquele medo. E a Marjory também, que permaneceu com olhos arregalados e o dedo
firmemente entre seus dentes.
Mas Shona sabia que isto era apenas o início do que eles poderiam enfrentar em sua busca
pela segurança.
Os Highlanders não eram conhecidos por sua amável disposição para com os ingleses.
Respirando fundo para se fortalecer, ela fez uma reverência para o laird e sua lady.
— Eu sou lady Shona, viúva do segundo Barão de Heronshire. Estes são meus
companheiros e amigos Audrey e seu irmão, Thomas.
Ela deliberadamente não falou o nome do pai deles como não desejava reconhecer um
homem que os vendeu apesar de que sua própria riqueza não fizesse isso necessário.
Ela indicou seus filhos.
— Meu filho julgou conveniente apresentar a si mesmo, e esta é minha filha, Marjory.
Shona se endireitou, fazendo o melhor para esconder sua fadiga e ansiedade, sem se
surpreender quando Caelis a puxou para seu lado.
Ele segurou Shona por todo o caminho até o grande salão. Ele conseguiu manter-se próximo
mesmo quando abordaram o laird Sinclair, claramente na tentativa de dar todo tipo de impressão
errada.
Antes do laird ou de sua lady poderem responder, Niall disse para Eadan com muito mais
confiança que seu filho mostrou.
— Claro que eles gostarão de você, rapazinho. É um bom garoto escocês no coração.
Shona não se ressentiu da falta de modos do guerreiro Highland, não quando foi para
confortar seu filho.
— Eu sou? — Eadan perguntou.
O laird estava olhando com pensativo interesse para seu filho. O olhar do Sinclair deslizou
para Caelis, então de volta para Eadan. Quando a luz da compreensão se acendeu, Shona não pode
deixar de perceber.
Novamente, ela sentiu o calor do embaraço insinuar-se em suas bochechas. Ela nunca
pensou que encontraria Caelis novamente, muito menos ter seu passado exposto tão
inexoravelmente para qualquer um que se desse ao trabalho de olhar para ele próximo a seu filho.
— Você é, da mesma forma que sua mãe é uma boa moça escocesa. — Guaire respondeu
por Niall.
Shona deu a ele um olhar de gratidão, que ele retribuiu com um morno sorriso. Nenhuma
condenação nele, não como aos olhos de seus próprios pais até que primeiro sua mãe morreu dois
anos atrás e então muito recentemente o pai de Shona.
Nenhum jamais perdoou Shona por envergonhá-los como ela fez. Pelo menos eles não
transferiram sua insatisfação com ela para Eadan. Seus avós o amaram muito.
Entretanto ambos deixaram claro que pensavam que a vontade do barão de criar Eadan
como seu próprio filho completamente compensava quaisquer deficiências que ele mostrou como
pai.
Eadan acenou com a cabeça, como se ajustando algo dentro dela como ele frequentemente
fazia.
— Tudo bem então. Eu sou escocês. Nós podemos ser amigos.
— Você não fala como os ingleses. — Drost disse no idioma de sua mãe, talvez para provar
que como Eadan... ele podia.
— Mamãe diz que eu e Marjory devemos falar ambos os idiomas gaélico e inglês. Milorde
não gostava disto, mas mesmo quando batia na mamãe, ela não parava de conversar conosco no
idioma de seu povo.
Caelis grunhiu, sua raiva pulsando ao redor deles como trovão no céu.
— Ele batia em você?
— Isto não tem importância. — Seu marido não foi o pior dos homens, mas também não foi
o melhor.
Ele apenas a golpeou poucas vezes, e sempre foi gentil depois. Não que ele tivesse se
desculpado.
Entretanto, não achava que estivesse errado.
— Então é bom que sua mãe tenha voltado para as Highlands. Ninguém poderá bater nela
aqui. — A voz do laird continha autoridade absoluta.
— E eu? — Eadan perguntou com uma careta e um olhar revelador para sua irmã. —
Alguém terá permissão para me bater?
— O Barão bateu em você? — Niall perguntou, seu tom calmo, mas com uma expressão
gelada em seus olhos.
Eadan desviou o olhar.
— Uma vez, mas mamãe gritou com ele. Ela disse que iria estripá-lo enquanto ele dormia se
ele fizesse isto novamente. Eu não deveria ouvir. Eles pensaram que eu estava dormindo de bruços,
por que minhas costas e bumbum doíam demais. Mas eu não podia dormir. Estava chorando
quietinho.
— E ele não chicoteou você novamente? — Guaire solicitou.
Shona queria que a terra se abrisse e a engolisse. Se o custo para manter seu filho seguro era
seu orgulho, ela alegremente pagaria, mas isso não significava que cada parte de seu espírito não
doeria.
— Não. Ele vociferou um pouco. Disse que ela não podia falar com ele daquele modo, mas
nunca fez isto de novo. Ele ameaçou uma vez, mas eu disse a ele que meu verdadeiro pai era um
guerreiro gigante e ele viria e o mataria. Ele acreditou em mim.
— Seu verdadeiro pai? — O laird Sinclair perguntou cuidadosamente.
De repente Eadan ficou mudo, enviando um olhar aflito para sua mãe.
Ela olhou fixamente para ele, sem saber o que dizer. Ela nunca disse a Eadan que Henry não
era seu pai, apesar de ter se sentido tentada um vez ou duas.
Nem o filho odioso de Henry, Percival, sabia que Eadan não era seu parente de sangue.
Poderia ter adivinhado, enquanto Eadan crescia e a única semelhança entre ele e o barão era a cor
escura do cabelo que o homem mais velho tinha quando mais jovem.
Caelis finalmente a soltou.
Ela se recusou a reconhecer o abandono que sentiu, mas naquele momento estava mais
vulnerável do que quando teve que deixar a Escócia grávida de um homem que categoricamente a
rejeitou.
Audrey avançou para deslizar seu braço ao redor da cintura de Shona.
— Tudo ficará bem, querida.
Shona simplesmente concordou. Como isso seria possível? O maior medo que ela tinha e
nem estava preparada para encarar agora olhava fixamente em seu rosto com a ferocidade de uma
fera voraz.
No desespero de salvar a vida de seu filho, Shona agora se arriscava a perdê-lo para o pai
que negou até mesmo a chance de sua concepção.
O mesmo homem que agora se ajoelhava na frente de seu filho.
— Ninguém ficará bravo com você por dizer a verdade, você me reconhece, Eadan?
O menino concordou.
— Você disse verdadeiro pai. Por quê?
— Você sabe. — Eadan disse em um sussurro feroz que todos ouviram.
Frios arrepios atravessaram Shona e sua respiração ficou superficial. Seu filho sabia que
Caelis era seu pai? Como poderia?
Era impossível. Não só insustentável acreditar que seu filho sabia que Henry não era seu pai,
mas que Eadan tivesse de alguma forma predito que era Caelis, isso completamente a desconsertou.
— Aye. Eu sei. — Caelis disse, não exibindo a descrença que assolava Shona, um afeto
maravilhoso e terno brilhando em seus olhos azuis. — E meu coração regozija-se por este
conhecimento, mas preciso que você me diga como você soube.
— Oh. Então você gosta de mim? Você acha que eu sou um bom rapaz escocês?
O som partido que saiu de Shona deixou Caelis tenso, mas ele não se virou.
— Eu acho. — Ele assegurou com solenidade absoluta.
— Você quer um filhinho. Nos sonhos você chora por mim, desejando que eu estivesse com
você.
— Sonhos?
— Os sonhos reais. Aqueles que se tornam realidade.
— Você tem outros sonhos reais? — Caelis perguntou.
Eadan olhou para Shona, pedindo permissão para falar.
Ela concordou. Ela sabia sobre os sonhos reais. Ou ela pensava que soubesse, mas ele só
disse a ela sobre dois. E Shona sempre se perguntou se os sonhos não seriam mais desejo e
imaginação por parte de seu filho do que qualquer outra coisa.
Ela sempre considerou seu sonho sobre sua filha e a lagoa fortuita, não profético.
Claramente seu filho não compartilhou tudo com ela. Talvez fosse por sua descrença inicial
ter-se mostrado?
— Eu sonhei que milorde morreria e ele o fez. Eu sonhei que Marjory cairia na lagoa e
bateria sua cabeça. A mamãe a salvou de se afogado.
— Afogar. — Shona corrigiu automaticamente.
Eadan concordou e repetiu obedientemente.
— Afogar.
— Oh, céus, ele é outro Ciara. Você sabia que Caelis tem sangue real? — Abigail exigiu de
seu marido.
Ele não respondeu, mas com um olhar furtivo em Shona, Abigail retrocedeu como se ele
tivesse.
Shona não tinha ideia de quem era Ciara, ou que Abigail quis dizer por Caelis ser de sangue
real. Qualquer outro tempo, ela teria exigido respostas, insistido em compreender, mas mal estava
sendo capaz de manter sua compostura.
O esgotamento a golpeava mais implacavelmente que seu marido já houvesse feito, a
menção do “dom” de seu filho trazendo preocupação adicional a Shona que ela simplesmente não
podia aguentar.
— Eu sonhei com você. — Eadan disse para Caelis. — Muitas vezes. Especialmente desde
que deixamos o baronato. Eu sabia que encontraríamos você aqui.
Shona ofegou. Esta era uma informação que ela teria gostado de saber. Entretanto ela teria
acreditado em seu filho, ou acreditaria que fosse seu desejo novamente? Desta vez com uma
semelhança misteriosa entre realidade e seus sonhos?
— Eu fico muito contente que você tenha sonhado comigo. — Caelis disse a seu filho. —
Estou ainda mais contente que você veio para as Highlands para nós podermos ser uma família
novamente.
Os joelhos de Shona teriam se curvado se Audrey não a segurasse. Shona teve seus próprios
sonhos, mas eles não eram proféticos e sabia sem nenhuma dúvida que eles nunca poderiam se
realizar.
Mas ele estar lá e falar como se tudo houvesse sido decidido sem uma palavra dela... era
demais. Uma vez mais, um homem no qual não podia confiar procurava fazer suas escolhas. Como
ela lutaria com ele? Lei e tradição estavam firmes ao lado de Caelis.
Shona sentiu as águas se fecharem acima de sua cabeça enquanto se tornava cada vez mais
difícil o ar entrar em seus pulmões.
— Você tem que amar Marjory, também. — Eadan não tinha nenhuma dificuldade de fazer
suas próprias demandas. Não era a primeira vez que ela via semelhanças entre pai e filho. — Ela é
sua filha como eu sou seu filho. Meus sonhos disseram isso.
— Naturalmente.
Seu filho aceitou o fácil acordo de Caelis com um firme aceno de aprovação, mas Shona não
podia ser tão confiante. Ainda que ele dissesse a verdade, ela desesperadamente não queria ligar sua
vida a deste homem depois do modo que ele a machucou profundamente seis anos atrás.
Então, incrivelmente, a filha extremamente tímida de Shona, que se escondia nas saias de
sua mãe ao primeiro sinal de um estranho, soltou a mão de seu irmão e se voltou para Caelis.
Marjory levantou seus braços para que o grande guerreiro a pegasse.
Apesar de seu foco estar tão intenso em Eadan, Shona não podia acreditar que Caelis
houvesse visto o gesto, ele se virou e pegou a menininha em seus grandes braços sem vacilação ou
pausa.
O mundo escureceu ao redor, mas Shona não se daria ao santificado consolo da
inconsciência. Ela inalou mais profundamente, tentando agarrar-se à Audrey, suplicando
silenciosamente por ajuda para a outra mulher.
Audrey, a verdadeira amiga que era, apertou seu abraço e perguntou a lady Abigail se eles
não poderiam ter uma taça de vinho.
A atenção de Abigail mudou do espetáculo dos filhos de Shona agarrando-se ao homem que
eles encontraram apenas naquele dia. Quando seus olhos pousaram sobre Shona, eles se alargaram e
preocupação encheu ela olhar.
— Claro.
Caelis se virou, como se de alguma maneira afinado com a angústia de Shona. Ele
permaneceu com Marjory em seus braços.
Shona ergueu sua mão em um movimento para pará-lo e falou por lábios que mal se
moviam.
— Não se aproxime.
A mão que não segurava sua filha se fechou em punho a seu lado, sua expressão
endurecendo.
— Shona...
— Nay. — Era Thomas falando, surpreendentemente. Ele se movimentou de forma que seu
corpo fosse uma barreira física entre Shona e Caelis. — Você conseguiu isto com suas ações. Eu
não sei como nossa Shona ficou no apuro que está, mas você fez seus piores danos no passado,
quebrando a lei sagrada e desonrando sua própria natureza. O menino parado ao seu lado é
testemunha disto.
Incrivelmente, Caelis não fez nenhum esforço para negar. Na verdade, ele concordou, sua
mandíbula como pedra, um tormento que ela nunca entendeu nem quis ver passou por seu olhar.
O próprio semblante de Thomas era mais severo do que Shona já viu.
— Ela disse que se afastasse. Você se afastará.
— Então você é seu protetor? — Caelis perguntou com uma voz perigosa.
— Eu sou seu amigo.
Audrey adicionou.
— Um mais verdadeiro que você foi. Thomas e eu estávamos lá nas poucas vezes que o
temperamento do Barão superou seu bom senso. Meu irmão ensinou o menino que você reivindica
como seu a montar em seu primeiro cavalo. Como eu, ele ajudou a cuidar de Eadan e Marjory com
as febres da infância quando nem o Barão, nem seu filho, nem mesmo os empregados esnobes deles
estavam dispostos a erguer um dedo em ajuda.
Caelis abaixou sua cabeça, então ergueu-a para encontrar o olhar fixo de Thomas.
— Estou em dívida com você.
— Aye, você está, mas mais importante, você está com Shona.
Caelis concordou, seu olhar deslizando de volta para ela. O ardente desejo que ela viu lá
tinha que ser um truque da luz.
Ele foi a pessoa que disse que seu amor não significava nada. Que o casamento que ele
prometeu naquelas noites que eles compartilharam sua paixão não aconteceria.
Não contente com isto, Caelis fez uma declaração oficial de sua falta de interesse, dizendo a
ambos, sua mãe e seu pai que ele não mais a cortejaria.
Eles aceitaram sua rejeição sem nenhum comentário ou argumento, dizendo a Shona que era
para o melhor. Eles não sabiam que ela carregava seu filho então. Ela também não sabia.
Ela teve uma intuição e chamou Caelis de lado para expressar suas preocupações, mas ele
duramente negou qualquer possibilidade de que ela pudesse ter seu filho em seu ventre. Ele foi para
longe o suficiente para dizer que se ela estivesse grávida, deveria ser de outro homem.
Com seu coração doendo pelas lembranças e incapaz de aguentar a visão dele por mais um
momento, ela se virou.
Ele fez um som como negação e apelo juntos, mas ela ignorou. Da mesma maneira que ele
ignorou seu apelo e suas palavras desesperadas de amor seis anos atrás.
— Mamãe? — A pequeno mão de Eadan se arrastou para a dela.
Ela olhou para seu filho, sempre tão bonito para ela independente das lembranças que seu
semblante manteve vivo.
— Sim, querido?
— Você está triste.
— Não. — Ela não estava mentindo.
Era muito mais que tristeza. Desespero lutando por controle, mas ela não cederia. Era mais
forte que isto.
— Eu posso sentir o cheiro. — Eadan repreendeu.
Ele sempre dizia coisas assim.
Ela apertou sua mão.
— Eu estou bem.
— Você está cansada. — Audrey corrigiu. — Muito exausta pela preocupação e pela
viagem para esta discussão.
Agradecidamente, o cálice de vinho chegou, entregue por uma jovem mulher sorridente que
se parecia com a princesa que Caelis chamou Marjory.
— Bebida, irá ajudar. — Ela disse em tom calmante. — Eu sou Ciara, filha mais velha de
Talorc e Abigail.
Ela estava muito próxima da idade de Abigail para não ser adotada, mas Shona tinha modos
suficientes para não observar isto.
— Obrigada.
Ela não tinha condições para mais cortesias.
— Não há de quê. Mamãe está bastante excitada por ter uma inglesa visitando que pode
compartilhar notícias de sua antiga pátria.
— Nenhuma notícia da Inglaterra é boa em meus olhos. — O laird opinou.
Ciara riu.
— Cuide-se, pai, ou outro quarto de visita será usado hoje à noite, estou certa. E eu não acho
que será um com uma cama confortável.
Surpreendentemente, todo mundo riu disto, em lugar de tomar como ofensa, até o próprio
laird.
A brincadeira continuou ao redor de Shona, mas ela não prestou atenção. Bebendo o suco
em pequenos goles, ela estava orgulhosa por não pedir ajuda de Audrey para colocar o cálice de
madeira em seus lábios.
Em certo ponto, todo mundo parou de falar. E agora todos olhavam para ela, um ar de
expectativa indicando que alguém perguntou algo a ela que eles esperavam que ela respondesse.
— Desculpe? — Shona olhou para Audrey para que ela dissesse o que perdeu.
Mas a inglesa simplesmente balançou a cabeça.
— Qualquer conversa pode esperar. Está claro que lady Heronshire precisa descansar. Se
você permitir que seus filhos fiquem em minha companhia até que o jantar seja servido, poderá
descansar em seu quarto, milady. — Abigail disse com modos perfeitos e inglês claramente nativo.
Shona queria aceitar sem se preocupar, mas não conhecia estas pessoas, independente do
que ela achava. Também tinha Caelis para considerar e seu inegável desejo de agora reivindicar
Eadan como seu filho.
Shona podia confiar nos Sinclairs para impedi-lo de deixar a fortaleza com o menino?
— Não se preocupe, eu ficarei com eles. — Thomas ofereceu. — Brian e Drost vão gostar
do jogo de varetas que eu ensinei a Eadan no último inverno.
— Nós gostamos muito de jogos. — Drost concordou, tão obviamente tentando confortar a
mulher desmoronando no grande salão de seu pai, que Shona quis chorar.
Ela conseguiu dar um sorriso forçado.
— Obrigada.
— Eu irei com você. — Audrey disse, provando seu apoio incondicional de amiga e sua
habilidade de ver corretamente que Shona chegou ao fim de suas forças.
Depois que ela dormisse, estaria forte novamente, mas agora, Shona não tinha nada para dar
às circunstâncias que tanto a oprimiam.
— Posso ter sua palavra? — Ela disse para Niall, voltando aos instintos quando estava muito
difícil usar a razão. — Você não permitirá que Caelis leve meu filho. Eadan e Marjory estarão
seguros sob sua proteção e de Thomas.
Não tinha nada igual a lealdade do jovem naquela sala, mas ele era um jovem inexperiente
de dezenove anos. Não era páreo para o guerreiro endurecido que Caelis se tornou.
— Eu não faria isso. — Caelis reivindicou, tentando fazer soar como uma promessa.
Mas ela já não acreditava mais em suas promessas. Então, Shona o ignorou, exigindo com a
ferocidade de sua expressão que Niall fizesse seu juramento.
O guerreiro cicatrizado concordou.
— Aye. Você tem minha palavra.
— Vamos rezar para que tenha mais valor do que a última vez que um escocês me deu sua
palavra.
Niall colocou seu punho sobre seu coração e curvou sua cabeça para ela.
— Pela minha honra e pela de meu clã, eu manterei aos que você ama em segurança.
Um sorriso pequeno e genuíno alcançou seus lábios com essa promessa. Ele estava
assegurando a ela que manteria Thomas seguro também e ela estava agradecida até quase as
lágrimas. Uma reação fraca e tola para dizer a verdade, mas estava cansada.
Com um aceno de reconhecimento, ela se virou antes de alguém poder ver a evidência de
suas emoções.
Eadan, Marjory, Thomas e Audrey eram tudo o que lhe era querido e o que restou para
Shona no mundo inteiro.
Ela não só morreria para protegê-los, mas mataria também. E assim o vilão Percival, novo
Barão de Heronshire, descobriria se ele tivesse a imprudência e estupidez de procurá-la em meio a
seu próprio povo nas Highlands da Escócia.
CAPÍTULO 4
Não existe cama mais fria que uma sem sua companheira.
— BARR DOS DONEGAL
Caelis observou sua companheira sagrada deixando o salão, seu lobo uivou com a
necessidade de seguir a forma delicada, seu corpo formigava com o desejo de se transformar.
Mas como fez tantas vezes nos últimos seis anos, Caelis forçou sua fera a se acalmar.
Sua linda companheira não queria nada com eles.
O cheiro de Shona podia ser a mais deliciosa das fragrâncias tanto para ele como para seu
lobo, entretanto ela nunca conheceu a fera. Urze selvagem e chuva de verão, ele se sentou do lado
de fora da cabana de seus pais em sua forma de lobo, inalando por horas.
Agora o cheiro picante de amargura vinha em ondas quando ele estava perto.
Esta drástica mudança em sua companheira não era algo fácil de aceitar, sobre tudo se suas
próprias ações ocasionaram tudo.
Sobreviveu nos últimos seis anos guardando as promessas de amor eterno de Shona em seu
interior, onde ninguém pudesse vê-las, colocá-las em dúvida ou condená-las. Sabia que não merecia
seu amor depois de defraudá-la como fez, mas não teve opção.
Ainda que ela não soubesse, ele carregava toda culpa sobre seus ombros. Não queria
aumentar o ressentimento de seu laird por Shona, dando-lhe tempo para que percebesse o erro que
cometeu. Em grande medida porque quando seus pais decidiram deixar o clã, Shona se foi com eles
sem mostrar nenhuma vacilação.
Caelis nunca considerou que ela pudesse abandonar seu povo, ou a ele. Acreditou que teria
tempo para fazer seu alfa mudar de opinião sobre o acasalamento e assim compensar Shona do dano
que lhe causou.
Caelis acreditou em seu futuro ainda que dissessem que não tinha um. O fato de seu pai
abandonar o clã foi uma circunstância imprevista. O fato de Shona ter ido com ele impressionou o
coração de Caelis. Ela deu as costas a toda uma vida entre seu clã, amigos embora não a família.
O clã era sua família. Era o que lhes foi ensinado desde criança.
E Caelis acreditou que o amor de Shona fosse inclusive mais forte que a vontade de seu alfa.
Não havia amor em seus bonitos olhos verde quando pousavam agora em Caelis. No pior
dos casos estavam inundados de uma fúria cheia de dor e uma desconfiança tão aguda que cortava
em dois o centro de sua alma.
Estas profundidades esmeraldas nem sequer mostraram um piscar breve de alegria na
primeira vez que ele a viu no pátio, nada de alivio ou felicidade que ele sentiu ante este reencontro
acidental. Não compartilhava seu prazer por ter concebido um filho.
Se pudesse, Shona negaria a paternidade de Eadan. Caelis viu em seus olhos, mas o garoto
se parecia muito com Caelis para poder afirmar que não era seu.
Em Shona, Caelis percebia o ressentimento por ele.
Ainda que fosse merecido, ele odiava isto... quase tanto como o aborreceu cada segundo do
tempo em que estiveram separados.
Ele passou seis anos almejando nada além de se reunir com ela novamente. Ela passou estes
mesmos anos menosprezando-o completamente.
Mesmo quando acreditou em seu laird que ela não era sua companheira verdadeira e nas
mentiras posteriores (quando chegou a notícia de sua morte, que ele mais tarde veio a questionar
mas nunca pode ter certeza), Caelis nunca deixou de sentir dor por ela.
Nem um dia se passou nos últimos seis anos que ele não desejasse ter a companheira de seu
coração ao seu lado.
Mas estava claro que ela preferia ficar na presença de um rato doente que na dele.
Ela confiou nos dois lobos ingleses e até em Niall mais do que em Caelis.
Shona ficou com medo dele levar seu filho. Sua promessa pelo contrário não teve nenhum
impacto nela. Ela denegriu sua promessa como se tivesse menos valor do que os tratados de
fronteira assinados por um rei inglês.
Mas ele não foi o único que rompeu promessas.
Ela jurou que nunca deixaria de amá-lo e que sempre pertenceria a ele.
Talvez ele não tivesse nenhuma razão ou direito de esperar que ela mantivesse tal promessa,
mas ele e seu lobo compartilhavam um sentimento de traição que não sumiria simplesmente.
Também estava claro que Shona não entendia a determinação de Caelis de fazer todos eles
uma família.
Seu dever para com seu povo iria impedi-los de ficarem juntos por um tempo. Mas agora
que sabia onde ela estava, que ela era realmente sua companheira verdadeira, nada os manteria
separados permanentemente.
Caelis começou a duvidar da afirmação de seu laird, de que apenas Uven poderia identificar
o verdadeiro companheiro dos membros da alcateia, um ano após a partida de Shona. O lobo de
Caelis ficou cada vez mais difícil de controlar depois que ela se foi e apenas a dedicação a sua
alcateia e seus deveres o mantiveram entre os MacLeod em vez de persegui-la.
Mas Caelis acreditava que Uven, laird dos MacLeod e alfa da alcateia, fosse um grande
homem. Caelis aceitou as palavras do homem como verdadeiras quando elas não passavam de
mentiras malignas.
Foi difícil admitir que estivera tão errado sobre o outro homem e muito fácil duvidar de si
mesmo depois que o laird disse a ele que Shona morreu.
Seu lobo não era facilmente influenciado, apesar de se submeter ao mais poderoso (naquele
tempo) lobo alfa sem perguntas.
Ainda assim, a fera ansiava pela mulher que não estava mais em suas vidas. O desejo nunca
enfraqueceu e o lobo recusou o toque de qualquer outra mulher, não importando quão adorável
fosse a Faol que Uven colocasse diante dele. Apesar de Caelis ter acreditado por um tempo que
Shona estava morta, nem mesmo tentou se acasalar com outra.
Apenas começou a duvidar que fosse mentira no último ano, quando começou a questionar
muito mais sobre seu laird que sua clara predisposição em formar casais apenas entre Chrechtes.
Aquele estúpido homem preconceituoso custou a Caelis cinco anos da vida de seu filho.
Ainda que o dever não ditasse que Caelis deveria retornar ao clã e desafiar Uven pela liderança, o
conhecimento do custo das mentiras que o homem contou fariam o desafio necessário.
— Homem gentil. — Marjory disse pela segunda vez naquele dia, batendo levemente no
rosto de Caelis. — Não fique triste.
Ele sorriu para a pequenina.
— Tudo ficará bem, mo breagha.
Ela deu uma risadinha.
— Eu não sou bonita.
— Você parece exatamente como sua mamãe. — Entretanto o cabelo vermelho ondulado de
Marjory era mais um halo de cachos finos de bebê e o de sua mãe caia em longos cachos pelas
costas. — Você é realmente bonita.
— Meus sonhos dizem que nós somos uma família. — Eadan disse próximo ao seu quadril.
— Mas eu não acho que a mamãe quer ser uma.
Caelis agachou-se, cuidando para manter Marjory segura em seus braços, e encontrou o
olhar azul de seu filho.
— Então nós teremos que convencê-la, não é, meu filho?
Sua voz quase se rompeu com a palavra filho, mas ele era um guerreiro e não mostraria tal
debilidade. Já era ruim o suficiente ter desmaiado na muralha como uma mulher na corte.
— Nós podemos tentar. — Eadan disse duvidosamente. — Mamãe não muda de ideia com
facilidade.
— Eu me lembro disso sobre ela. — Embora suas teimosias não fossem tanto direcionadas a
ele, ele as viu muito frequentemente no modo como ela se relacionava com os outros.
— Ela não quis ficar com Percy. Ao invés disso nós fugimos. Eu também não gosto de
Percy.
— Quem é Percy? — Niall perguntou.
— Meu não-irmão.
— Percival. — Shona o mencionou, Caelis lembrou. — O novo Barão?
Eadan concordou.
— Ele tem uma esposa, mas nenhum filho. Ele queria que mamãe fosse sua limão2 e desse
filhos a ele. Mas não a deixaria ficar conosco.
— Amante, ele queria fazer dela sua amante. — Percival teria feito Shona, sua ex-madrasta,
sua concubina com todas as responsabilidades e nenhum dos privilégios de sua esposa.
Era monstruoso e asqueroso, e nada mais do que ele esperava de um Barão inglês, entretanto
nunca diria isto a Abigail.
Caelis se encheu de fúria, mas fez seu melhor para não deixar transparecer em seu semblante
e assustar as crianças.
— Em meus sonhos, os homens se transformam em lobos às vezes, mas as mulheres nunca
se transformam em limões.
Ele não corrigiu a pronúncia de seu filho, mas pensou sobre isto.
— O que é um limão? — Niall perguntou, porém.
Eadan franziu suas sobrancelhas como se estivesse surpreso com a pergunta.
— É uma fruta amarela. Azeda. Mamãe leu para mim sobre ela em um livro escrito por um
dos padres na Itália. Milorde era muito afeiçoado aos escritos da Igreja.
— Entendo. — Caelis não fez nenhuma tentativa de esconder seu sorriso. — Percy não vai
transformar sua mãe em seu limão, ou qualquer outra coisa.
Eadan acenou com a cabeça em completo acordo.
— Mamãe não o deixará.
— Nem eu irei.
— Bom. Mamãe não é tão grande quanto ela pensa que é.
Niall riu.
— Ela parece bastante grande para mim.
— Mamãe é minúscula, mas forte. — Eadan respondeu fielmente. — Eu serei mais alto que
ela logo. Ela sempre diz isso.
— Aye. — A emoção ameaçava sufocar Caelis.
Esta criança em frente a ele com olhos azuis do mesmo tom violeta e forma oval como os
seus, era seu filho. O fruto da paixão sagrada que ele compartilhou com sua companheira
verdadeira.
Porque só uma companheira verdadeira poderia ficar grávida de um Chrechte sendo
humana.
Todos os antigos argumentos de seu laird contra o acasalamento se romperam em face
àquela verdade. Ela não apenas deu a luz, mas a habilidade realçada do seu filho de sentir cheiros
indicava que ele iria se transformar em lobo quando alcançasse a idade.
Caelis estremeceu ao pensar o que teria acontecido ao seu filho se ele tivesse se
2
Do original: lemon = limão e lehman = amante, por isso a confusão de palavras do menino.
transformado sem um bando para protegê-lo. Entretanto, ele tinha um bando.
Um bando inglês.
Ele olhou para Thomas, que já estava ensinando um jogo com varetas para os filhos gêmeos
de Sinclair. A filha bebê deles dormia no andar de cima nesta hora da tarde.
Caelis levou Marjory para onde Thomas e as crianças jogavam no chão do grande salão. Ele
colocou a menina no chão e ela imediatamente agarrou a mão de seu irmão. Eadan a aceitou, como
se estivesse acostumado a fazê-lo e a levou aos outros.
Caelis também sentou-se no chão ao lado de Thomas.
— Ensine-me este jogo. — Ele exigiu.
O lobo jovem meramente concordou e explicou as regras. Eles jogaram um pouco, até
fazendo a pequena Marjory participar, quando Caelis perguntou.
— Como você acabou tão amigo de minha companheira?
— Seu pai nos procurou. Eu não sei como ele sabia de nossa verdadeira natureza, ou a de
nossa mãe, mas o administrador estava bem ciente e nos queria perto no caso de Eadan se
transformar.
— E sua própria família?
— Meu pai é um Barão inferior e não quis nada conosco, filhos de sua amante.
— Ele sabe que ela é Chrechte?
Pesar marcou as feições jovens de Thomas.
— Não. Ele nunca soube e agora ela se foi.
— Eu sinto muito. — Caelis perdeu seus próprios pais, e soube recentemente que foi pelas
mãos do mesmo homem que se insinuou em sua vida como um segundo pai.
Uven foi um mentor e pai para Caelis, ao mesmo tempo culpado das traições mais
abomináveis.
— Ela nos amava, mas o destino escolheu mal seu companheiro verdadeiro. — Thomas
continuou com voz suave enquanto ele dirigia o jogo das crianças. — Nosso pai é um homem duro
sem amor em seu coração para aqueles que ele usa cruelmente.
— Como ela morreu?
— Febre. Estava grávida novamente, mas muito velha para isto talvez. De qualquer maneira,
ela e o bebê morreram. Isso foi cinco anos atrás. Meu pai recebeu uma taxa do Barão de Heronshire
para irmos para sua casa como companheira pessoal e servo para sua lady.
— Os modos dos ingleses estão além da minha compreensão. — Caelis disse com desgosto.
— Foi o pai de Shona que instigou a transação. Como eu disse, ele queria que nós
estivéssemos perto se seu neto fizesse a mudança.
— Eadan fará. — Caelis e Talorc, laird dos Sinclair, disseram em uníssono.
O outros permaneceram no grande salão, olhando as crianças brincarem, permanecendo
quietos entre si, entretanto Caelis não duvidava que Abigail e Talorc conversavam através de seu
laço de companheiros.
Ciara acenou com a cabeça em concordância.
— Seu lobo já é forte nele.
— Shona ainda ignora a existência dos Chrechte. — Caelis observou.
— Sim. — Thomas não soou feliz sobre isto. — Não existia nenhum bando perto, mas nossa
mãe nos ensinou que nós não podíamos compartilhar nosso segredo a menos em caso de extrema
necessidade.
— Acasalamento constitui extrema necessidade, no caso de você estar se perguntando. —
Abigail disse com uma ferroada maior do que ela normalmente falava, e um olhar de censura para
seu marido.
— Aye. Entretanto como você não percebeu que ela era sua companheira verdadeira quando
está claro que vocês compartilharam os laços físicos do amor... — Talorc deixou a crítica diminuir,
mas não havia dúvida de sua desaprovação.
— Meu laird me disse que ela não era e eu não acreditei nela quando me disse que pensou
estar grávida. Eu perguntei a Uven e ele disse que não era possível. Que Shona não podia ser minha
companheira verdadeira, como meu alfa, ele saberia se ela fosse. Eu sabia que laços entre humanos
e Chrechte eram raros, mas esperei fervorosamente. Fiquei furioso por ter que deixá-la ir, não
estava pensando claramente naquele tempo.
A admissão era dura de se fazer.
Ciara fez uma careta.
— A menos que ele tenha o dom, um alfa não tem mais chance de predizer um companheiro
do que qualquer outro membro do bando.
— Eu sei disto. Agora. — Teria sido um grande benefício saber esta verdade sobre sua
herança seis anos atrás.
Havia muitas coisas que Uven dos MacLeod escondeu de seu povo em sua missão para
controlar o clã e o bando completamente.
— Você cometeu um terrível engano. — Niall observou sem rancor, mas sem piedade
também.
— Sim. — Mas Shona o perdoaria uma vez que entendesse.
A natureza indulgente de sua doce companheira estava tão entranhada nela como sua
teimosia.
Ele mudou sua atenção para conhecer seus filhos enquanto a mulher por quem ele e seu lobo
doíam para reivindicar dormia no andar de cima.
***
Shona despertou no escuro absoluto da madrugada em uma noite sem luar.
Passou-se tanto tempo desde que ela dormiu bem e profundamente, confortável em uma
cama onde sabia que não seria perturbada.
Não estava certa de como sabia que esta cama era absolutamente segura, mas sabia, naquele
lugar em seu cérebro que não influenciava muito o despertar. Então por que o desejo de se levantar?
A próxima pergunta que seu cérebro sempre evocava ao acordar respondeu de primeira.
A sensação de que algo não estava certo a colocou em estado de completa vigilância
enquanto seu corpo queria voltar a dormir.
Onde estavam seus filhos? Ela lembrava-se de ir para o quarto de hóspedes na fortaleza
Sinclair para um cochilo muito necessário, mas isso deveria ter sido a horas atrás.
Deve ter dormido na hora do jantar, a hora de dormir de seus filhos e durante a noite. Apesar
de Shona não estar certa de quão tarde era sem ver a posição das estrelas no céu, se sentiu renovada
por ter dormido toda a tarde e boa parte da noite.
Estendeu as mão para sentir ao redor até as extremidades da cama e percebeu duas coisas de
uma vez. A primeira era que ela estava no centro e a segunda que Audrey não estava mais no
quarto.
Isto a preocupou quase tanto como não saber onde seus filhos estavam. Apesar de Audrey
não ser nada boba, aos dezenove tinha uma visão menos amarga do mundo que Shona.
Isto a fazia mais vulnerável para aqueles que poderiam enganá-la e usá-la, como aconteceu
com Shona seis anos atrás.
Com movimentos cada vez mais urgentes, Shona usou suas mãos para encontrar seu
caminho pelo quarto. Em uma estante que sobressaía da parede próxima à cabeceira da cama, seus
dedos encontraram uma vela e pederneira para acender. Isto era uma extravagância inesperada, mas
rapidamente fez uso dela e acendeu a vela.
O brilho da única vela dispersou a escuridão, entretanto os cantos do quarto permaneceram
nas sombras. Shona observou uma forma escura que ela assumiu ser uma roupa que Audrey pegou
para ela do pequeno conjunto de bens pegos na fuga do baronato de Heronshire. Pegou o tecido, e
percebeu que Audrey escolheu o vestido de veludo verde de Shona.
Balançando a cabeça pela tolice de Audrey, Shona vestiu a roupa sem pó e sujeiras da
viagem, diferente do vestido com o qual chegou. Demorou um tempo precioso para arrumar as
mangas, mas andar pela fortaleza em nada além de sua roupa de baixo não era uma opção.
Especialmente depois dos últimos meses no baronato, quando os mais inocentes gestos eram
tomados como convites que ela nunca teve qualquer intenção de oferecer.
Não perdeu tempo escovando ou prendendo seu cabelo. Sequer procurou por seus sapatos.
Shona precisava encontrar seus filhos e esperava não despertar a fortaleza inteira fazendo
isto. Mas se fosse necessário, despertaria todo mundo.
Correu para fora do quarto e quase tropeçou com Caelis. Ele estava sentando diretamente em
frente a sua porta, olhando em volta como se procurasse de onde vinha o perigo. Seu grande corpo
ondulando com seus músculos, até mesmo sentado no chão.
— O que você está fazendo do lado de fora do meu quarto? — Ela exigiu em um sussurro,
desejando que não tivesse notado nada atraente em sua aparência física.
Ele se levantou com a graça fluida que ela trabalhou duro para esquecer.
— O que você está fazendo correndo por aí de madrugada? — Ele perguntou em vez de
responder.
— Procurando por meus filhos.
— Eles estão dormindo no quarto ao lado do seu. Seus defensores estão lá também,
guardando o sono das crianças. — O tom enfadado de Caelis implicava que ele não estava tão
contente sobre isso como Shona estava.
Seu próprio coração, que batia tão descontroladamente que quase saía de seu peito, voltou
para um ritmo normal.
— Qual?
Ele indicou uma porta à direita com uma inclinação de sua cabeça naquela direção.
Ela imediatamente se virou naquela direção, mas o braço de Caelis avançou, sua mão se
fechando em seu pulso.
— Onde você está indo?
— Vê-los. — Ela falou devagar como se fosse para uma criança não muito brilhante.
— Você os acordará.
Ela não pretendia, mas não era sua maior preocupação no momento.
— Eu serei silenciosa.
— Eadan ouvirá você. — A certeza no tom de Caelis implicava que de alguma maneira ele
já sabia sobre a aguda capacidade de seu filho em detectar som.
— Mesmo assim, eu vou vê-los.
— Por quê? Eu disse que eles estão descansando com seus amigos. Você não confia em
Thomas e Audrey para vigiar as crianças?
— Claro que confio, mas eu só tenho sua palavra de que Eadan e Marjory estão atrás
daquela porta, seguros e dormindo pacificamente.
A cabeça de Caelis estalou para trás como se ela o tivesse estapeado com toda fúria que
queria seis anos atrás. Naquela época, ela estava muito apaixonada para lhe fazer mal, apesar de sua
traição.
Agora, não hesitaria.
— Você não confia em minha palavra? — Ele perguntou com um choque muito real para ser
fingido.
Ela foi atingida por seu próprio senso de irrealidade.
— Você espera que eu confie?
— Aye.
— Então você é mais idiota do que eu era seis anos atrás.
— Eu disse que existiram motivos para o que aconteceu entre nós. — E ele soava como se
esperasse plenamente que ela o ouvisse.
— O que aconteceu foi que você fez promessas que não tinham mais substância que a névoa
da manhã. — E nenhuma explicação mudaria isto.
— Eu quis dizer minhas palavras quando eu as falei para você.
Isso deveria importar para ela? Puxou seu pulso de seu aperto.
— Mas não depois.
Ele rompeu seus votos e ela acabou casada com um homem velho cujo toque quase a deixou
louca. Se não tivesse seus filhos, Shona não teria sobrevivido aos últimos anos.
Estava certa disto.
Ela se afastou, na tentativa de encontrar Eadan e Marjory. Ele não tentou impedi-la
novamente.
Ela empurrou a porta, mas não se moveu. Se Caelis realmente estivesse dizendo a verdade,
então Audrey ou Thomas deveriam ter colocado a trava pelo outro lado. Apreciava a dedicação dos
seus amigos pela segurança, mas Shona não retornaria ao quarto de hóspedes sem confirmar o bem-
estar dos seus filhos.
Ela bateu suavemente na porta, sabendo que os irmãos tinham um sono até mais leve que o
de seu filho.
Só alguns segundos se passaram antes da porta abrir-se, revelando o semblante sonolento de
Thomas.
— Você quer ver os pequenos. — Ele adivinhou.
Ela concordou.
Thomas se afastou e Shona entrou no quarto. A vela que carregava espalhava um brilho
suave pelo espaço, revelando a forragem no chão onde Thomas obviamente estava descansado.
Além desta havia uma cama semelhante a que Shona dormiu, mas ali estava muito mais cheia com
Audrey no meio e Eadan e Marjory em cada lado dela.
Os olhos de Audrey estavam abertos, mas ela não se moveu. Obviamente não querendo
perturbar as crianças, ela enviou à Shona um pequeno sorriso tranquilizante. Eadan se moveu,
fazendo um barulho suave, mas não despertou, provando quão exaustivas as últimas semanas foram
para ele.
Shona não falou, mas simplesmente enviou um olhar interrogativo para Audrey. A mulher
loira deu um pequeno aceno com a cabeça, dizendo a Shona que tudo estava bem.
Thomas bateu levemente em seu ombro.
— Nós a acordaremos de manhã quando eles se levantarem, se você ainda estiver dormindo.
Ele falou em voz baixa, sua boca muito próxima de sua orelha.
Ela concordou, mandando aos dois um sorriso agradecido antes de voltar ao corredor. Caelis
continuava lá, de cara feia para Thomas enquanto Shona fechava a porta atrás de si.
Ela se virou para enfrentar o homem que ela estava começando a visualizar como seu
inimigo.
— Eu não posso imaginar o que você acha tão censurável sobre o jovem Thomas, mas ele
crescerá e será um bom guerreiro com grande honra um dia. Você parará de encará-lo então.
— Ele já é um homem.
— Ele tem apenas dezenove. — Que reconhecidamente era três anos mais que a chegada
geralmente aceita para a idade adulta, mas Thomas ainda era tão jovem. Apesar de suas próprias
experiências contrárias, ele via o mundo por olhos que acreditavam na bondade e honra inerente ao
homem.
— Ele é quase uma criança. — Ela sabia que ele não a agradeceria por dizer isso.
— Ele está muito familiarizado com você.
— Ele é meu amigo.
Caelis pareceu impassível.
— Foi o que ele afirmou mais cedo.
CAPÍTULO 5
Os Chrechte são mais fortes que os humanos, mas não superiores a eles.
Eles são irmãos, tal como os Faol são irmãos dos Paindeal e dos Éan.
— TRADIÇÕES DE CAHIR
O tom de voz de Caelis indicava que ele não estava mais feliz sobre sua amizade com
Thomas do que sobre a suposta familiaridade do jovem com ela.
Shona deu de ombros mentalmente. Os sentimentos de Caelis tinham pouca importância
para ela.
— É a verdade.
Ela considerava Audrey e Thomas os irmãos que seus pais não foram abençoados para
fornecer. Shona nunca olhou para eles como empregados como seu marido e o resto da casa fazia.
— Todo amigo homem que você tem sussurra palavras em seu ouvido como um amante
faria?
— Você é um idiota. Thomas é tão amante para mim como... como um peixe. Ele e Audrey
são meus mais queridos amigos. — Os únicos amigos verdadeiros de Shona, se ela fosse honesta
sobre isto.
Shona não permitiu a ninguém além daqueles dois a violar as paredes que ela construiu ao
redor de seu coração depois da traição deste homem e da rejeição de seus pais por causa disto. Ela
sentiu o desamparo dos gêmeos em face ao destino escolhido por eles por um pai indiferente tão
parecido com o seu próprio.
Seu pai havia se importado, mas ele tinha igual certeza de que sabia o que era melhor, e a
forçar a um casamento com o barão esteve no topo daquela lista.
— Eu tenho com eles uma dívida de honra por cuidar de você e das crianças.
Ele disse algo assim antes. Não fazia mais sentido agora do que fez antes.
Mas ela não tentaria demovê-lo desta ideia. Se ele sentisse certa obrigação para com Audrey
e Thomas, talvez ficasse mais propenso a ajudá-los a encontrar segurança, se Shona não pudesse
fazê-lo.
— Vou voltar para a cama. — Ela se virou para refazer seus passos para o quarto.
— Você ainda está cansada? — Ele perguntou, acompanhando os passos dela.
— Não. — De fato, ela não estava, mas não estava preparada para vagar pelas passagens da
fortaleza também.
— Então talvez nós possamos conversar? — Caelis perguntou, soando menos exigente do
que ela já o ouviu.
Shona parou em sua porta, olhando para o único semblante masculino que já havia
despertado desejo nela.
Até agora, depois de tudo, sua necessidade por ele era um estrondo baixo em seu estômago.
Ela tinha certeza que aquela parte dela estava morta, mas um dia em sua companhia e soube que
não estava. Ela o queria tanto quanto antes, mas ela não o teria.
Forçando a necessidade visceral para o lado, ela perguntou incredulamente.
— Você quer discutir nossos problemas agora, de madrugada?
— Aye.
— Dificilmente este é um comportamento apropriado. — Ela balançou a cabeça. Não para
negar, mas por sua audácia.
— Eu não me preocupo com o que é adequado.
— Você nunca o fez. — Mas ela pensou que ele tivesse a honra de corrigir seu
comportamento impróprio.
Ele não teve.
— Houve um tempo que você teria rido deste senso de decoro inglês no qual se esconde
agora.
— Eu aprendi por que se deve ter um comportamento adequado. — Como proteção para o
que aconteceu com ela, por exemplo.
— Por favor, Shona. Ouça-me.
Honestamente? Ela não tinha nenhuma intenção de fazê-lo, mas ela precisava de
informações sobre o que Caelis planejava fazer agora que descobriu que tinha um filho. Se ele
negasse Eadan, tudo seria tão simples. Ela iria para a ilha Balmoral como planejou e se lançaria à
mercê de relações familiares, mesmo que distantes.
Mas agora Shona temia perder seu filho para seu pai tanto quanto sua fuga da Inglaterra foi
estimulada por seu terror de perder Eadan para as maquinações malignas de Percival.
— Você não tomará meu filho de mim. — Ela prometeu a Caelis enquanto abria a porta de
seu quarto.
— Esta não é minha intenção.
Ela virou-se para enfrentá-lo, ainda no limite, não deixando-o entrar no quarto.
— Você me ridicularizou uma vez com palavras que não combinavam com suas ações.
Desta vez eu não serei facilmente enganada.
— Deixe-me explicar. — Caelis disse novamente, mais como um apelo que uma exigência.
Era tão incomum ouvir o forte guerreiro falar deste modo, que ela se pegou acenando e
movendo-se para trás para permitir sua entrada no quarto.
Havia um pequeno baú em forma de caixa contra uma parede e Shona o usou para se sentar,
ignorando a existência da cama e esperando que Caelis fizesse o mesmo.
Ela teria ido para o grande salão, mas temia mais que alguém escutasse sua vergonha do que
ser pega em uma posição comprometedora com Caelis.
— Eu acho estranho que você esteja dormindo do lado de fora de minha porta. — Ela disse
enquanto Caelis entrava no quarto, mas não começava esta grande explicação que ele falou.
— Eu não estava dormindo.
— Então o que você estava fazendo?
— Protegendo você. — Caelis parou na frente dela. — Lutando contra minha necessidade
de entrar.
Ela quase riu.
— Você quer que eu acredite que depois de me mandar embora seis anos atrás, sua paixão
por mim queima tão forte que o mantém acordado a noite em vigília fora do meu quarto?
Isto era um absurdo. Se ele estivesse tão aflito de desejo por ela como ela esteve por ele,
nunca a teria repudiado.
— Aye.
— Eu não sou mais aquela ingênua. — Ele achava que tinha que mentir para ela para ter
acesso a seu filho?
Por que ele queria Eadan agora, quando antes Caelis foi tão rápido em rejeitar até mesmo a
possibilidade dela estar grávida?
Seus pensamentos giravam em sua cabeça como a mais complicada dança da corte.
— Chega de teimosia. — Ele suspirou, correndo sua mão pelo rosto. — Eu não me lembro
de você ser tão teimosa comigo.
Porque ela quis ceder a ele e esta era sua própria vergonha para carregar. Pelo menos ele a
conhecia o suficiente para perceber que estava em sua natureza ser obstinada com os outros.
Quando ela não se dignou a responder, ele suspirou novamente, parecendo bastante confuso.
— Eu não tive conforto físico por seis anos. Mas você se casou com outro.
— Primeiro, eu não tenho absolutamente nenhuma razão para acreditar em você. E eu não
vou. — Ela inseriu para garantir. — Segundo, você não pode chamar o que aconteceu entre o Barão
e eu de conforto.
Não quando até o toque do homem velho fazia a pele de Shona se arrepiar e ele a usava
como a prostituta que sua mãe a chamou ao descobrir que Shona estava grávida e sem pretendente,
muito menos marido, em vista.
— Eu não quero ouvir sobre isto. — Caelis disse com profundo sentimento.
Ela não tinha nenhuma intenção de contar a ele qualquer coisa sobre sua vida que ele não
necessitasse absolutamente saber.
— Tenha certeza, você não irá.
— Marjory é dele.
Shona deu um único aceno em concordância.
— Eadan é meu.
Desta vez Shona meramente o encarou, recusando-se a concordar ou negar a declaração.
— Você negaria isto? — Caelis acusou, apesar dela não ter feito tal coisa.
— Foi você quem disse a mim que se eu estivesse grávida então teria que ser de algum outro
homem. — Seus dedos se enrolaram nas extremidades do baú, o aperto tão forte que ela podia sentir
os batimentos de seu coração neles. — Você não se lembra?
— Eu estava bravo por ter que deixá-la ir. Descontei aquela fúria em você. — A culpa
marcou suas feições cinzeladas. — Eu não quis dizer isto. Recebi ordens para cessar minhas
atenções a você. Eu sabia que aquelas palavras a afastariam como nada mais poderia. Sua lealdade e
determinação eram muito fortes para ceder em outro caso.
Ela não sabia o que ele queria dizer com ordens para cessar suas atenções, entretanto podia
imaginar, mas Caelis estava certo sobre seus métodos.
— Você teve um sucesso espetacular em seus esforços. Eu teria ficado satisfeita se não o
visse novamente pelo resto de meus dias.
Como ela desejava intensamente que aquilo fosse verdade, a frase saiu com toda a convicção
de seu coração partido.
O brilho da vela não era forte, mas iluminou o suficiente de seu bonito rosto para revelar a
dor que o atravessou e se estabeleceu em seu olhar azul.
— Para meu grande pesar.
— Eu não acredito em você. — Seria uma mentira se ela quisesse que fosse verdade?
Novamente, ele parecia surpreso... até ferido... por sua falta de confiança nele.
— Nosso laird negou meu pedido para me acasalar com você. — Havia um toque de
sinceridade em seu tom que ela não podia ignorar.
Mais importantes, as palavras soaram verdadeiras com as ações do laird de seu antigo clã.
Uven não era um homem gentil, ou mesmo justo. Ele tinha seus favoritos entre os membros do clã e
podiam esperar seu suporte e beneficência. Todos os outros tinham que se sacrificar para os poucos
preciosos.
A própria filha de Uven frequentemente sofria em suas mãos, não que Caelis acreditasse
nisto. Enquanto eles tiveram um namoro quase idílico antes de Caelis a rejeitar, a única coisa que
eles nunca concordaram era a verdadeira natureza de seu laird.
Sua falta de lealdade, como ela dizia, costumava enfurecer imensamente seu então amado
guerreiro.
Porque, diferente de sua família, Caelis nunca provou o lado feio do laird MacLeod.
— Você é um de seus preferidos. — Ela lembrou a Caelis.
— Eu era.
Ela não perguntou o que aconteceu para mudar isto. O simples fato de que ele estava entre
os Sinclair em vez de seu antigo clã significava um grande rompimento entre o laird e o servo. E ela
se lembrava dos modos verdadeiros de seu antigo laird. Nada que ele fizesse a surpreenderia.
Mas algumas coisas eram menos prováveis que outras.
— Você quer que eu acredite que nosso laird recusou algo a um de seus prediletos?
— Ele não achava que fôssemos um bom acasalamento. Ele estava inflexível de que você
não era minha companheira.
Lá estava aquela palavra novamente, como se eles fossem animais, mas não importava como
Caelis chamava isto. Companheira, esposa ou até amada, nenhum dos títulos a encaixava em sua
vida. Eles nunca o fizeram, independente do quanto ela desejou o contrário.
— Ele não achava que eu fosse boa o bastante para você. — Ela não entendia por que o laird
tinha tanta antipatia por alguns membros do clã, mas o fato não podia ser negado.
Ele acreditou que, depois de seu anúncio, a substituição de seu pai como seneschal foi
apenas uma de muitas ofensas contra a família de Shona.
Caelis não negou a interpretação dela dos eventos.
Ela suspirou.
— E esta é sua grande explicação?
Caelis estremeceu, seus olhos se alargando e depois estreitando como se sua reação o
surpreendesse.
— Eu não tive nenhuma escolha que não fosse negar você.
— Você tinha uma escolha. Poderia ter deixado o clã quando nós o fizemos.
— O laird nunca teria dado permissão para eu partir.
— E mesmo assim aqui está você. — Vivendo entre outro clã, mas ainda vestindo as cores
dos MacLeod.
Talvez o rompimento não fosse tão grande quanto ela pensou. Na verdade, poderia não
haver nenhum rompimento, independente do que Caelis dizia.
A sensação de desânimo que a atingiu não fazia sentido e ela escolheu ignorar.
— É complicado. — E ele estava claramente relutante em compartilhar a natureza daquela
complicação.
— Você pode me polpar dos detalhes.
Novamente pareceu como se ela o tivesse surpreendido.
— Você costumava ser tão curiosa.
— O que eu quero saber de você, Caelis, a única coisa que importa para mim, é se você vai
tentar roubar meu filho de mim.
— Eu não irei.
Ela queria acreditar nele, para seu próprio bem. Queria se sentir aliviada pela difícil
promessa. Mas ela não podia somente confiar em suas promessas, como ela não acreditava que isto
pudesse ser tão simples.
Caelis já havia reivindicado Eadan verbalmente. Ir embora agora seria contestar sua honra
de guerreiro. Ele não faria isto pelo bem dela, ou de seu filho. Disto, ela não tinha nenhuma dúvida.
— Então você não tem nenhuma objeção de nós viajarmos para a ilha Balmoral assim que o
laird Sinclair nos der sua licença para partirmos? — Ela não acreditava nisto, mas ela precisava
pressionar Caelis para ele revelar seus planos.
— Por que a ilha Balmoral?
— Eu tenho família lá.
— Eu não sabia disto.
Ela deu de ombros. Confidência que eles fizeram ou não seis anos atrás não tinham
nenhuma importância hoje.
— Quem é?
— Minha bisavó veio da ilha. Sua irmã também se casou e teve filhos. Da última vez que
tive notícias, alguns daquela geração ainda viviam bem como os da minha.
— Você não os conhece?
— Não houve nenhum contato direto entre os dois ramos da família em muitos anos, mas
estou certa de que minha família Balmoral receberá meus filhos e a mim em seu clã. — Pelo menos,
ela esperava com grande fervor.
Tudo o que ela sabia sobre o clã de origem de sua avó apontava para um povo que atribuía
grande valor à família e à lealdade. Um clã que poderia contar que manteria a ela e seus filhos
protegidos dos desejos gananciosos do inglês.
— O Balmoral é um bom clã. Eu passei o último ano treinando com um grupo especial de
seus soldados.
Pelo menos isso explicava o que ele estava fazendo longe das terras MacLeod. Apesar do
fato de seu antigo laird enviar um de seus soldados para treinar sob os cuidados de outro não
corresponder com a presunçosa arrogância como ela se lembrava.
— Então o que você está fazendo aqui? — Ela sabia que os Balmoral e os Sinclair eram
aliados, e Caelis ficar na fortaleza em seu caminho para o sul fazia sentido, mas ele era mais que um
convidado a longo prazo ali.
Isso parecia claro o suficiente.
— Mais treinamento com os Sinclair.
As coisas devem ter mudado bastante desde que ela deixou seu clã.
— Entendo.
Ele esperou por sua próxima pergunta com uma paciência que ela não se lembrava em seu
passado.
— Então seus planos são de retornar para o clã MacLeod? — Ela perguntou com
indisfarçada esperança.
A expressão de Caelis ficou muito séria.
— Aye.
— Você não tomará meu filho de mim.
— Eu disse a você, eu não tenho nenhuma intenção de separar mãe e filho.
— Mas? — Ela sabia que existia uma ressalva. Por que ele tinha que fingir que não tinha?
— Eu não posso viver entre os Balmoral. Eu tenho obrigações para com meu povo. Eu tenho
que retornar aos MacLeod.
— O que isso tem a ver comigo, ou meus filhos, no que diz respeito a esse assunto?
— Nossos filhos. — Ele enfatizou, finalmente revelando suas verdadeiras intenções. — Se
eu não estiver vivendo entre os Balmoral, naturalmente você e as crianças também não viverão.
— Eu não voltarei para aquele clã. — Seu antigo laird não era um bom homem,
independente do que Caelis pensava.
— Não imediatamente, não, mas uma vez que eu tiver cumprido meu dever, você e nossos
filhos se juntarão a mim.
Então ela riu, o som quase histérico. O homem era completamente maluco.
— Você fala como se houvesse promessas entre nós, planos de ficar juntos como uma
família. Nós não temos nenhum.
A voz dela se elevou e ficou mais próxima da histeria. Ela forçou ar dentro e fora de seus
pulmões enquanto afastava a sensação opressiva de pânico.
— Nós teremos o futuro que nós sonhamos seis anos atrás. — Ele se ajoelhou na frente dela,
suas grandes mãos engolfando as dela. — Eu não estou mais disposto a viver sem minha
companheira verdadeira por causa de um alfa corrupto.
— Você não está fazendo sentido, Caelis.
— Você pertence a mim. Simples assim.
Ele verdadeiramente acreditava nisto?
— Oh, não. Não é simples mesmo. Eu não pertenço a você. — Apesar de seu coração a
chamar de mentirosa. — Talvez eu pertencesse no passado, mas não agora. Nunca mais.
— Nunca é muito tempo, moça.
— E às vezes não longo o suficiente. — Quando se tratava de reencontrar Percival, o novo
Barão de Heronshire, nunca seria muito pouco.
Ela pensava o mesmo sobre Caelis, mas o coração que estava dormente quando ela deixou a
Escócia começou a tremular novamente. Na verdade, esse tremular não trazia nada além de dor
agora.
E ainda assim, uma pequena parte dela ficava contente por não estar completamente morta
por dentro. Ela sentia emoção por seus filhos, mas era um lugar diferente de seu coração que esteve
adormecido nestes últimos anos.
Um lugar que ao mesmo tempo deu a ela seu maior prazer e a tristeza mais devastadora.
— Eu mudarei sua opinião. — Ele prometeu. — Nós estamos destinados a ficar juntos.
— Eu costumava acreditar nisto. — Ela estava certa nas profundezas de sua alma que ela e
este homem teriam um glorioso futuro juntos.
Uma história de amor para escrever com seus corações e seus corpos tão profundamente,
que os netos de seus filhos contariam para seus bebês. Perder sua esperança no futuro machucou
quase tanto quanto perder o homem.
— Acredite novamente.
— Não. — Ela já foi machucada o suficiente por este homem e por seus próprios sonhos.
Nem ela daria rédea solta ao seu coração novamente.
Seus olhos impossivelmente azuis perfuraram os dela.
— Algumas coisas na vida nós não temos nenhuma escolha.
— Você quer dizer como seis anos atrás? — Ela perguntou docemente.
Uma expressão de alívio (sem dúvida ela finalmente entenderia) apareceu em suas feições.
— Exatamente como seis anos atrás.
— Então você é um homem muito ineficaz, Caelis de MacLeod. Seis anos atrás, você teve
uma escolha.
— Eu disse a você...
— Que nosso laird nos negou o direito de casar no clã. — Ela interrompeu. — Mas o que
isso significa? Só que seu amor pela consideração dele de longe excedida qualquer pequeno
sentimento que poderia ter por mim. Você me negou. Você negou nosso filho. Tudo por causa do
que disse um déspota pior que o homem de quem estou fugindo. Não diga que não teve nenhuma
escolha. Você teve uma escolha muito real, Caelis, e você a fez!
— Você não entende.
— Você acha que não? Eu sei disto. Se a escolha tivesse sido minha seis anos atrás, eu teria
abandonado o clã, abandonado minha família e seguido você através das águas se fosse necessário
para estarmos juntos. Você nem mesmo partiria comigo para outro clã.
— Eu não podia! — Seu grito foi mais alto que o dela, mas ela não se impressionou.
— Então eu digo novamente, Caelis, você foi um homem muito ineficaz. E eu acreditei que
tivesse um coração de guerreiro.
— Eu tenho. Como ousa duvidar de meu espírito de luta!
— Como você ousa reivindicar um quando nunca lutou pelo direito de ficar comigo! — Ele
levantou-se, ficando acima dela, sua ira uma força palpável ao redor deles.
Ela não ficou impressionada.
— Eu pensei que ele queria o melhor para mim. Como você disse, eu era um de seus
favoritos. Ele dizia que como meu alfa poderia dizer que você não era minha companheira
verdadeira. Como eu deveria saber que ele mentia?
— Você quis acreditar nele. Quis acreditar que alguém no clã era mais importante, superior
aos outros. Você quis ser um daqueles seres superiores. — Ela pôs todo escárnio que ela sentia
naquela palavra, deixando Caelis saber quão inferior ela considerava um homem que podia
abandoná-la como ele o fez.
Seu rosto se contorceu como se segurasse algo de grande importância. Finalmente, ele disse.
— Eu era.
— Eu diria que sinto muito por você ter perdido seu lugar, mas não sinto. Quanto mais
tempo você ficasse com aquele homem, mais perderia de sua humanidade para ele.
— Você não sabe o quão verdadeiras são suas palavras. — Caelis disse, seu tom derrotado,
ele estava nas sombras assim ela não podia ler sua expressão.
Não tinha nenhuma resposta para ele. Ele escolheu, não importava o que dissesse ele
escolheu mal.
Ele se sentou na beirada de sua cama, deixando seu cheiro para trás, mas ela não diria isso a
ele. Ela sempre foi sensível, revelando sua proximidade até quando ela não podia vê-lo.
Ele olhou para o chão, como se ali tivesse as respostas que ele procurava.
— Existem coisas que eu não disse a você naquela época. Coisas que deve saber agora.
— Você soa muito misterioso.
Ele concordou, sua expressão sóbria.
— É um grande mistério, um segredo que os humanos que o conhecem devem mantê-los
sob pena de morte.
— Você diz humanos como se você pensasse que é algo melhor. — Era este
verdadeiramente o homem que ela amou tão afetuosamente?
Seu senso de superioridade e vaidade excessiva poderiam até rivalizar com as de Percival.
— Não melhor, eu entendo isto agora, mas não igual também. — A expressão de Caelis
implorava para que ela compreendesse.
Mas mais uma vez, suas palavras eram mais confusão que explicação.
— Você vai começar a fazer sentido? — Ela exigiu com aspereza. — Não importa o que seu
exaltado laird o fez acreditar, você não é um ser superior.
— Eu sou Chrechte. — Caelis soltou com exasperação, ficando em pé e se virando como se
frustrado com seu comportamento obstinado.
Realmente? Se ele persistisse em tentar uni-los como uma família, logo descobriria que ela
era capaz de muito mais obstinação que isto.
E toda essa coisa mística de Chrechte? Não tão misterioso afinal. Todos no clã sabiam sobre
os guerreiros que se consideravam a elite entre os soldados.
Ela rolou seus olhos.
— Foi o que ouvi em mais de uma ocasião seis anos atrás de você e de outros. Vocês
consideram que suas habilidades como guerreiros os separam dos outros.
Ele girou de volta para enfrentá-la, sua expressão em crescente surpresa enquanto ela falava.
— Minhas habilidades como um guerreiro estão acima de outros homens, Chrechte também.
— Ele declarou com afronta.
— E sou uma dama inglesa com reivindicação ao título e pouco mais. Você sabe o quanto
isso me definiu à parte? — Ela perguntou mordazmente. — Nem um pouquinho. Eu ainda sou uma
mãe, uma amiga, uma mulher com menos poder em minha vida que o mordomo que controla as
propriedades de meu falecido marido.
— Você ignora tudo que não deseja ouvir. — Ele acusou, sua frustração obviamente
aumentando.
Ela o encarou, sua própria ira crescendo para combinar com a dele.
— Se quer que eu te escute, posso sugerir que tente falar a sério em vez dos delírios de
idiotice arrogante.
— Eu não sou nenhum idiota!
— Bem, você certamente não é um senhor de lógica, também.
— Eu sou um metamorfo. — Ele praticamente gritou. — Chrechte quer dizer que eu
compartilho minha natureza com um animal. O meu é um lobo.
Seu coração quase parou em seu peito. Ela o chamou maluco, mas não quis dizer isto. Não
acreditava verdadeiramente que ele perdeu sua habilidade de pensar e se comportar racionalmente.
Sua conversa agora a fez congelar de medo.
— Pare com esta tolice. Por favor, Caelis, não se mostre verdadeiramente insano. — Ela
pleiteou com ele.
Ele simplesmente balançou a cabeça e então removeu seu plaid com poucos movimentos.
Não fez nenhum movimento para se aproximar dela, mas ela saltou do baú mesmo assim, movendo-
se para o lado da porta para fugir.
— Não. Caelis. Eu não tomarei você em minha cama.
— Aye. Você irá, mas não agora.
Ela balançou a cabeça, seu coração batendo tão rápido em seu peito que machucava.
Ele ergueu a cabeça, cheirando o ar e então olhou com preocupação para ela.
— Você não tem nada a temer, Shona. Nunca de mim.
— Você me machucou mais do que qualquer outro. — Ela discordou francamente.
Esta era uma mentira que ela simplesmente não podia deixar passar.
— Deixe-me mostrar a você por quê.
O que ele esperava que ela fizesse? Desse permissão a ele? Ela apenas queria sair do quarto,
mas antes que pudesse fazer qualquer movimento para abrir a porta, um flash de luz apareceu ao
redor de Caelis.
Então, onde ele estava tinha agora um grande lobo de pelos escuros.
CAPÍTULO 6
Deve-se ter uma razão extrema para revelar a verdadeira natureza dos
Chrechte para um humano. Já que trair este conhecimento negligentemente
é convidar a uma morte certa.
— TRADIÇÕES ORAIS CHRECHTE
CAPÍTULO 7
***
Audrey abriu delicadamente a porta do quarto de Shona, transtornada por não estar trancada
pelo lado de dentro. Até agora, os Sinclair haviam se mostrado hospitaleiros e pouco prováveis a
causar algum dano, mas ainda eram um clã de estranhos.
A não ser aquele homem que vestia cores diferentes e era obviamente o pai de Eadan. Não
havia dúvida de que Shona conheceu aquele homem muito bem em um certo ponto no passado. E
embora não devesse, aquele fato chocou bastante Audrey.
Ela sempre soube que o Barão não era parente de sangue do primogênito de sua querida
amiga, mas nunca imaginou que o pai seria um guerreiro Highland.
Audrey tinha os pensamentos tão agitados que não percebeu o cheiro do Highland Chrechte
e aquele da inconfundível paixão até seu olhar pousar sobre a cama ocupada por uma pessoa mais
do que deveria ter.
O lobo estava acordado, olhando fixamente para ela com olhos escuros, insondáveis, seu
abraço na mais querida amiga de Audrey muito possessivo para ser engano. O ar de proteção não
era menos determinado.
— Como? O quê? — Ela gaguejou, em tão completo choque que quase perdeu a respiração.
Shona despertou naquele momento, seus olhos se alargando à visão de Audrey e então com
horror pelas circunstâncias de como acordou.
— Audrey! Eu... isto...
Audrey balançou a cabeça.
— Venha, nós tomaremos um banho antes do resto da fortaleza acordar e começar a cheirar
por aí.
Qualquer explicação que Shona quisesse, ela poderia dar mais tarde. Quando não estivesse
em uma posição inegavelmente e irremediavelmente comprometedora.
O coração de Audrey doía por sua amiga mesmo enquanto seu cérebro girava para encontrar
caminhos para ajudar a baronesa.
Shona acenou com a cabeça vigorosamente enquanto o lobo fez uma careta de desgosto.
Apesar de Audrey ter esperado que o guerreiro Faol aguardaria para fazer sua reivindicação,
ela não estava completamente surpresa de que ele houvesse feito um movimento para estabelecer
seu lugar na vida de Shona tão depressa.
De acordo com sua querida mãe falecida, o laço de acasalamento para um Chrechte era tão
forte a ponto de ser inegável. Caso contrário, sua mãe lhe disse, ela nunca teria se permitido tornar-
se amante de um homem casado.
Sua posição como tal era contrária aos ensinamentos de sua raça, ou era como a mãe de
Audrey insistia em dizer. Ela compartilhou o suficiente deles com seus filhos. Ambos, Audrey e
Thomas, eram quase completamente ignorantes aos costumes de seu povo.
A estupefação atual de Audrey estava no fato de Shona ter permitido este homem... qualquer
homem, na verdade... em sua cama. Como humana, ela não era dirigida pelos instintos de um
animal compartilhando sua natureza com seu companheiro.
Pelo menos, isso foi o que Audrey sempre acreditou. Ela nunca notou seu pai sendo
particularmente fraco de desejo em relação à sua mãe ou sendo muito atencioso com as crianças
Chrechte inglesas que nasceram por causa dele.
— A água pode ser trazida para seu quarto. — Caelis disse de mau humor, ignorando
Audrey completamente.
— Nay. — Audrey negou imediatamente, recusando-se a ser intimidada pelo enorme
Chrechte. Ela protegeria a reputação de Shona ainda que a baronesa não houvesse lhe dado a tarefa.
— Minha senhora tomará um banho no lago.
Shona poderia pelo menos lavar o cheiro da semente deste homem no muito. Apesar de que
era improvável que ela conseguisse remover completamente.
Os humanos não saberiam do visitante noturno de Shona, mas os lobos saberiam que Caelis
fez algum tipo de reivindicação.
Audrey sorriu para Shona, tentando dar à outra mulher uma mensagem de seu apoio
incondicional.
— Lady Abigail me disse sobre um perto daqui que é usado pelas mulheres do clã.
Ela não estava preocupada sobre encontrar o lago. Os sentidos de seu lobo a guiariam para a
água facilmente.
— Você não vai tomar banho do lado de fora destas paredes com apenas esta mulher inglesa
para te guardar. — Caelis anunciou.
Apesar do lobo não haver deixado sua marca no pescoço de Shona, seu ar possessivo era tão
forte como se tivesse.
Shona deu de ombros, fazendo o melhor para esconder seu desconforto ao levantar-se da
cama tão nua quanto no dia ela entrou neste mundo, mas se levantou e Audrey poderia ter
aplaudido.
— Então você pode nos acompanhar como nosso protetor.
Audrey fez uma careta. Ela não estava certa de que era uma boa ideia.
O guerreiro abriu sua boca para discutir e então fechou-a novamente sem dizer uma palavra.
Talvez ele tivesse percebido a vitória fácil com a teimosa Shona.
Audrey não estava tão otimista.
— Nós viajamos desde a Inglaterra sem a necessidade de sua proteção. Sua presença
dificilmente será necessária para nossa caminhada matinal ao lago dos Sinclair.
— Você arriscaria a segurança de sua lady? — Ele perguntou, dirigindo-se a Audrey pela
primeira vez.
— Não existe nenhum risco.
— Você é ingênua se acredita nisto.
Ela já foi acusada assim mais de uma vez. Isto nunca a fez sorrir.
— Eu não sou tão ingênua para acreditar que você tem intenção de defender os interesses
dela.
— Não é você que deve fazer este julgamento.
— Você acha que não?
— Chega. — Shona colocou sua roupa de baixo e um robe, o que lady Abigail havia
oferecido na véspera.
Audrey ficou surpresa por Shona ter decidido se vestir na noite anterior ao invés de usar este
robe. Talvez ela não tivesse visto?
— Eu já disse a Caelis que ele pode nos acompanhar como guarda, Audrey. Eu esperarei
que Thomas vá também. Você sabe que se eu tivesse escolha nestas últimas semanas, eu não teria
deixado a proteção de meus filhos com nosso pequeno bando.
Audrey não podia negar isto e a culpa a assaltou.
— Eu sei disto.
Caelis acenou para Audrey autoritariamente.
— Espere no corredor para nos juntarmos a você.
— Eu não vou. — Ele podia ter comprometido a virtude da outra mulher irremediavelmente,
mas nenhum dano adicional seria feito à reputação ou inocência de Shona nesta manhã.
— Não fale com ela dessa maneira. — Shona disse rispidamente antes que Audrey ou Caelis
pudessem falar algo mais. — Ela é minha amiga, não minha empregada e se você espera estar em
nossa companhia tratará Audrey com o devido respeito.
Choque após choque, o guerreiro inclinou sua cabeça em direção a Audrey com
aborrecimento.
— Perdoe minha ofensa. Você pode, por favor, esperar no corredor?
— Não.
Ele a fulminou.
Ela cruzou seus braços e fez uma careta de volta para ele.
— Eu não vou desonrá-la... novamente. — A diabrura em seus olhos diziam que havia mais
a caminho. — Pelo menos, não neste momento.
O som alto de um forte tapa veio só um segundo antes de seu estremecimento de dor. Ele
olhou sobre seu ombro para Shona.
— Para que foi isso?
Sua querida e doce Shona, que não tinha um osso violento em seu delicado corpo humano,
era o que Audrey sempre pensou, além de sua única ameaça ao Barão morto, esmurrou Caelis
diretamente na mandíbula.
— Eu não sou nenhum concubina para falar deste modo. Se suas palavras foram verdadeiras
ontem à noite, então sou muito mais importante para você. Nunca mais faça pouco dos privilégios
que eu dei a você contra meu melhor julgamento. Fez isto uma vez e quase destruiu minha vida e a
de nosso filho. Eu não suportarei isto novamente. Você me ouviu?
— Eu acredito que até Sir Percival ouviu claramente lá da Inglaterra. — Thomas disse da
entrada, Marjory e Eadan parados ao seu lado assistindo a conversa com olhos arregalados
espantados.
— Mamãe, você bateu no homem gentil. Não é legal bater. Você mesma disse. — Marjory
censurou sua mãe.
Em outra época, Audrey teria achado a conversa divertida. No momento, ela se preocupava
com o que Shona pudesse dizer em resposta.
Shona, claramente além da razão ou precaução deu um olhar venenoso para o guerreiro,
Caelis deveria ficar muito contente por não existiam serpentes metamorfas.
— Ele não é um homem gentil. Ele é um arrogante, sabe-tudo e inútil soldado MacLeod!
Marjory e Eadan olharam fixamente para sua mãe como se houvesse crescido cabeças
suficientes para transformá-la na Hydra da mitologia. Audrey não os culpava. Eles nunca viram sua
mãe irritada assim.
Nem mesmo quando ela estava enterrando seu pai e apavorada pela vida de seu filho.
Caelis ficou levemente divertido durante esse tempo, inclusive no surpreendentemente bem
colocado golpe em sua mandíbula, mas quando Shona o chamou de inútil, ele estremeceu, sua
expressão ficou tão sem vida que Audrey quase sentiu pena dele.
— Mamãe! — Marjory protestou, recuperando seu senso e não exibindo nada de sua timidez
habitual.
Embora reconhecidamente esse lado de sua natureza raramente ficasse entre Marjory e sua
mãe, a criança sabia, sem dúvida, o quanto a ex-escocesa a adorava.
Shona girou para enfrentar Marjory.
— Por que você acha que ele é tão gentil? — Ela perguntou com indisfarçada confusão.
Marjory deu de ombros. Ela se soltou de Thomas para cruzar o quarto e ficar próxima de
Caelis, que se sentou na cama, a parte de baixo de seu corpo coberta pelos cobertores.
A criança pegou a grande mão do guerreiro com sua pequena.
— Eu não sei como mamãe. Mas eu sei isto. Ele é bom. Não como Percy. Você não deveria
bater nele.
Os olhos de Shona ficaram úmidos, mas sorriu para sua filha.
— Eu fico contente que você ache isto. Talvez um dia sua mamãe também ache.
— Você tem que achar, mamãe. — O desespero no tom de Eadan era duro de ouvir. — Ou
nós não poderemos ser uma família.
A expressão desesperada que cruzou as feições de Shona disseram que ela não estava tão
certa daquele fato como seu filho estava. Quanto a ela, Audrey também não estava.
Se Caelis pressionasse no assunto, Shona teria pouco a dizer sobre isto. Particularmente
depois dela tê-lo permitido em sua cama novamente.
Audrey balançou a cabeça pela situação de sua amiga. Ela não sabia como consertar tudo.
— Venha, todos nós tomaremos banho no lago.
— Nós temos? — Eadan e Thomas perguntaram ao mesmo tempo.
Audrey sentiu um risada muito bem vinda borbulhando dentro dela. Seu irmão ainda era tão
menino às vezes.
— Sim. — Shona respondeu por ela firmemente.
Caelis se moveu para levantar e Shona se moveu com uma velocidade que Audrey não sabia
que os humanos eram capazes.
— O que você está fazendo? — Shona exigiu.
— Indo para o lago com vocês.
— Você não pode se levantar nu da cama na frente de Audrey e das crianças. —
Presumivelmente Shona deixou Thomas de fora da lista porque modéstia entre guerreiros era quase
inexistente.
Particularmente entre os Highlanders, onde aqueles com uma disposição mais selvagem
ainda entravam na batalha com nada além das pinturas de guerra marcando seus rostos e corpos.
— Por que não? Você se levantou. — Ele assinalou em um tom razoável que Audrey não
acreditou nem por um segundo.
Ele não era tolo, não importava o quanto fingisse.
— Isto é diferente.
— Aye, mas quando eu pedi para ela sair, você ficou muito brava comigo.
— Você não pediu, você ordenou.
Ele deu de ombros, mostrando que para ele era tudo a mesma coisa.
— Eu não me lembro de você ser um homem tão irritante.
— Isto é era para ser esperado. Seis anos atrás, você também não me considerava inútil.
CAPÍTULO 8
Foi a vez de Shona estremecer, entretanto Audrey ficou muito feliz por a baronesa não ter
feito nenhum pedido de desculpa por suas palavras.
Ela simplesmente pegou seu plaid de onde foi lançado no chão e o jogou para Caelis.
— Cubra-se decentemente.
— Mamãe?
— Sim, Eadan? — Shona respondeu, soando atormentada.
— Você não acredita que meu pai seja um homem gentil? Sério?
Shona parou de pegar agitadamente as roupas espalhadas pelo quarto. Ela tinha conseguido
colocar sua roupa de baixo e o robe antes da chegada das crianças e de Thomas, mas o resto de seu
vestido, para ser colocado depois que eles tomassem banho, estava em seus braços.
Shona olhou para seu filho, claramente desejando uma saída para evitar responder sua
pergunta honestamente.
— Houve um tempo que eu pensei que ele fosse muito gentil.
— Mas não agora? — Eadan pressionou.
— Ele provou ser cruel em uma ocasião importante.
Que sem dúvida foi quando Shona acabou grávida e sozinha na Inglaterra, Audrey pensou.
— Às vezes um homem tem que ser cruel pelo bem de sua família. — Eadan disse, citando
seu avô recentemente falecido.
Audrey sabia que Shona não concordava com aquele sentimento particular, entretanto ela
raramente discutia com seu pai em qualquer coisa.
— Neste caso, foi para seu próprio bem e não por sua família. Nós fomos deixados para
cuidar de nós mesmos. — Shona disse com relutante honestidade.
A honestidade não surpreendeu Audrey. Apesar de proteger seus filhos dos sofrimentos do
mundo ao seu redor tanto como ela podia, Shona não tinha o hábito de mentir para Eadan ou
Marjory.
Audrey não podia entender o flash de triunfo nos olhos de Caelis até que, enquanto afivelava
a túnica de couro que segurava seu kilt no lugar, ele disse.
— Então você admite que é minha família.
Em vez de focar no fato de que Shona evidentemente não confiava nele, ele declarou vitória
com suas palavras. Audrey podia ver agora que Shona teria que ser mais cautelosa quando lidasse
com este astuto Faol.
Claramente desgostosa, Shona deliberadamente deu as costas a Caelis, virando-se
completamente para seu filho.
— Você disse que teve muitos sonhos sobre ele.
— Sim, mamãe.
— E em seus sonhos, que tipo de homem era ele?
Esta era a Shona que Audrey conhecia e admirava tanto. Uma mulher que respeitava seus
filhos mesmo quando outros diziam que isto deveria ser raramente visto e nunca ouvido.
— Ele é um bom homem em meus sonhos, mamãe. Ele cuida de nós e nos protege de
Percival e de outros homens maus que nos machucariam.
— Eu fico contente por ouvir isto.
Eadan concordou.
— Eu acho que ele sente muito, mamãe. Por qualquer coisa que tenha feito antes.
As feições de Shona endureceram.
— O tempo dirá, Eadan.
— O vovô costumava dizer isto, também.
— Aye, ele dizia. — Pesar tomou conta das feições da baronesa brevemente. — Ele era um
bom homem.
Eadan concordou, entretanto não disse nada mais. Ele amou seu avô, mas até mesmo o
jovem menino notou como o idoso tratava seus netos muito diferentemente de sua única filha.
O amor do pai de Shona por ela foi atenuado por sua decepção com ela durante todo o
tempo que Audrey conheceu o teimoso escocês.
— Você não contou à sua mãe sobre seus sonhos. — Audrey disse, para tirar a mente do
menino e da mulher do lugar que agora estavam.
Eadan deu de ombros.
— Ela não acreditou neles.
— Eu sinto muito. — Shona lançou um olhar de soslaio para o guerreiro que tinha vindo
para ficar muito perto dela para ser considerado apropriado. — Eu acabei percebendo que existem
muitas coisas que eu acreditei impossíveis que são, de fato, verdade.
Caelis disse à Shona sobre sua natureza Faol? Audrey achava que não, pois Shona agia do
mesmo modo de sempre com ela e Thomas. Além disso, o lobo não esperaria até que ele estivesse
certo da fidelidade da mulher humana antes de arriscar se expor?
Tendo crescido sem um bando, havia muito sobre o modo de vida dos Chrechte que Audrey
e Thomas não conheciam, mas sua mãe foi muito inflexível sobre uma coisa.
Dizer seu segredo era como trair todos os seus irmãos e a eles mesmos.
***
CAPÍTULO 9
— Lobo? Eu não sei o que você quer dizer. — Thomas era um mentiroso tão ruim, que
Shona só imaginava como ele e Audrey puderam manter seu segredo por todos esses anos.
— Pare com a falsidade. Caelis me disse. Ele me mostrou. — Ela enfatizou, então eles não
pensariam que existia qualquer margem para dúvidas.
— Você mostrou a ela? — Thomas perguntou, claramente chocado. — Mas você é um
macho e não está na lua cheia.
— Nós ganhamos controle de nossa mudança uma vez que nos envolvemos em
determinados atos. — Caelis disse com um olhar significativo para as crianças.
Shona não tinha ideia do que ele quis dizer, mas Thomas pareceu entender muito bem
porque concordou e, em seguida, ficou vermelho.
— Você é um lobo branco, não é? — Caelis perguntou.
Thomas acenou com a cabeça, em dúvida.
Caelis olhou para Audrey, que fez uma afirmativa mais confiante.
— Então você já deveria ter controle de sua mudança. É o jeito de seu lobo. Outros não têm
tanta sorte.
— Eu posso impedir que aconteça na lua cheia. — Thomas disse. — Nossa mãe nos
ensinou.
— Se você pode evitar a mudança, você pode iniciá-la também.
— Eu posso? — Thomas perguntou, seus olhos brilhando de alegria com o pensamento.
— Aye.
— Você me mostrará como?
Caelis deu um pequeno aceno com sua cabeça em afirmativa.
Os olhos de Thomas brilhavam com tal adoração ao herói, que em outras circunstâncias,
teria trazido um sorriso ao rosto de Shona. Mas ele estava entorpecido pelo excesso de emoções que
a estavam atingindo.
— Você sabia sobre Eadan? — Shona perguntou a Audrey, sua voz tensa.
Embora ela se sentisse distante da dor de mais uma traição perfurando seu coração e a forma
como ela se manifestou.
O rosto de Audrey se enrugou e Shona teve sua resposta.
Não só os dois eram Chrechte, mas eles sabiam que seu filho era um também.
Por cinco anos, Audrey e Thomas souberam o segredo mais vergonhoso de Shona.
Eles sempre souberam que seu marido não era o pai de seu filho, e ainda assim eles
mantiveram seu próprio segredo sem nenhuma sugestão para a verdade.
Eles não contaram a ela a verdadeira natureza de seu filho.
— Como? Como você sabia?
Era algo sobre a forma que seu filho cheirava para eles? Ele estava sempre falando sobre
poder cheirar sua tristeza ou uma mentira quando ela tentava protegê-lo da verdade.
— Seu pai...
— Meu pai sabia? — Shona gemeu, rompendo-se por dentro. — Como? Por quê?
Ela olhou acusadoramente para Caelis.
— Você disse a ele e não contou para mim?
— Não. Eu não sei como seu pai soube de nosso segredo, mas não foi por mim.
Ela não entendeu o olhar de preocupação nas feições de Caelis. Apesar de nada fazer muito
sentido no momento. As duas pessoas que ela tinha certeza que nunca a enganariam
conscientemente, não fizeram nada além daquilo por cinco anos.
Revelação após revelação se desenrolava em seu atormentado cérebro. Seus mais queridos e
confiáveis amigos provaram além de qualquer dúvida que não confiavam nela. Além disso, eles não
eram tão confiáveis. Eles mentiram, esconderam a natureza do filho dela.
Era este o fato mais difícil de aceitar. Bem, quase.
O fato de que seu pai sabia era tão devastador quanto, mas não tão difícil de entender. Ele
provou sua falta de consideração por sua felicidade muito constantemente para que ela continuasse
fingindo, mesmo no mais profundo de seu coração, que ele a amava, além de seu julgamento severo
por suas ações.
Ele sabia da natureza de Caelis, embora ela não soubesse como. Se ela acreditasse na
afirmação de Caelis de que ele não disse a seu pai sobre sua natureza de lobo, então seu pai deve ter
descoberto de alguma outra forma.
Como antigo seneschal do clã, porém, seu pai teria conhecimento de segredos que outros
não tinham. No entanto o como era muito menos importante do que o resultado.
Seu próprio pai sabia da linhagem de seu filho e o que isso significava, e ele não a achou
digna de saber também.
Tinha pensado que merecia o destino que ele proporcionou para ela, o casamento com um
homem que tinha a idade para ser seu avô?
— Ele sabia... — Ela mal conseguia compreender o nível de traição batendo em seu coração
já pesado como a bigorna do ferreiro. — Se ele sabia sobre os Chrechte, então ele sabia o que
minha gravidez significava. Ele sabia que eu era sua companheira e mesmo assim me obrigou a
casar com o Barão.
Dizer que as palavras em voz alta não as fez mais fáceis de acreditar ou suportar.
— Seu pai forçou você a se casar?
— Você acha que eu queria o toque de outro homem? Acha que eu queria que algum
homem tivesse controle sobre a minha vida depois que você me usou e descartou? — A dor saindo
dela deixou seu tom estridente, seu gaélico arrastado.
Seu filho fez um som de angústia e a culpa encheu Shona. Ela nunca fingiu ser perfeita para
seus filhos, mas sempre, sempre tentou protegê-los de sua angústia.
Era um sinal de como as últimas semanas custaram caro para ela, a ponto de permitir-lhes
vê-la chateada neste nível. Seus filhos não tinham culpa da dor que a assolava e não iria deixá-los
pagar o preço por sua própria loucura em mais uma vez confiar imprudentemente.
Usando cada milímetro de sua coragem e vontade, ela empurrou para trás seus sentimentos
de traição e voltou com um sorriso no rosto para seu filho.
— Está tudo bem, Eadan.
— Você ainda me ama, mamãe?
— O quê? Claro que eu amo. — E com cinco anos de idade ou não, ela puxou seu filho para
um abraço feroz. — Eu te amo mais do que minha própria vida e sempre vou, eu prometo.
— Algum dia, eu vou ser um lobo. — Ele sussurrou contra sua clavícula, seus bracinhos de
menino envoltos firmemente ao redor de seu pescoço. — Meus sonhos me mostraram. Como meu
pai.
— Eu sei. — E bem no fundo, onde a verdade residida, ela o fazia. — Você será um lobo
incrível.
Ele se afastou, verificando seu rosto como se testasse a veracidade de suas palavras.
— Estou dizendo a verdade. Você não pode sentir o cheiro? — Ela conseguiu provocar.
Ele concordou, sua expressão indo da incerteza para um sorriso completo.
— Você não é um lobo. Nem Marjory, mas tudo bem. Nós protegeremos vocês, meu pai,
Thomas e eu.
Ela não podia olhar para os homens adultos sem gritar, então manteve seu foco inteiramente
em seu filho.
— Obrigada, mas até que você seja maior, eu continuarei protegendo você. Certo?
— Eu serei maior logo.
— Sim, eu tenho certeza que vai.
— Shona. — Era a voz de Audrey, implorando e preocupada.
Shona não podia lidar com a traição da outra mulher, ou o que isso implicava agora.
— Vamos voltar para a fortaleza e ver o que lady Sinclair preparou para o café da manhã?
— Shona perguntou a seus filhos com um sorriso tão brilhante quanto ela conseguiu fazer.
— Estou com fome. — Marjory anunciou melancolicamente.
— Então, vamos vê-la alimentada. — Caelis se inclinou para pegar a criança em seus
braços. — As cozinheiras de lady Sinclair fazem um delicioso pão escuro pesado.
— Eles têm manteiga? — Marjory perguntou, acariciando o rosto de Caelis. — Eu gosto de
manteiga.
— Oh, aye.
— O laird sustenta bem seu povo. — Thomas disse, com a voz falsamente relaxada, tensão
aparecendo em suas tentativas para disfarçar.
— Ele faz. Surpreendentemente. Em Balmoral é do mesmo jeito.
O testemunho da bondade do laird Balmoral não deu a Shona o conforto que teria dado no
dia anterior.
— E seu clã? — Thomas perguntou.
— O laird atual está mais interessado em construir um exército do que alimentar seu povo.
— Caelis disse, com desprezo em seu tom.
— As coisas pioraram então? — Shona perguntou, pensando que não faria mal algum
insistir em num assunto diferente destas novas traições em sua vida.
Não deveria se enganar, se seu pai sabia sobre os Chrechte, a mãe de Shona também sabia.
— Aye. Está muito pior do que quando sua família morava entre os MacLeod. Poucos
humanos permaneceram no clã. Aqueles que lutam para manter as fazendas produzindo, mas Uven
espera muito para nada.
— Ele sempre o fez.
— Eu não via isto.
— Assim como recusou-se a ver a forma como ele tratava sua filha. Ela ainda está viva? —
Houve vezes em que Shona pensou que a menina não sobreviveria ao mau humor de seu pai.
— Ela vive. Escapou e veio aqui em busca de refúgio.
— E foi recebida?
— Aye.
— Claro. Ela é Chrechte, não é?
— Nay. A primeira esposa de Uven, sua companheira verdadeira, era humana.
— Assim como eu.
— Quando um humano e um Chrechte se acasalam, os filhos de sua união tem tanta chance
de nascer completamente humano como Chrechte.
— Independente disso, se sabia sobre a primeira esposa de Uven, como pode acreditar nele
que eu não era sua verdadeira companheira?
— Eu não soube até mais tarde.
Será que acreditava nele? Shona não sabia. Muitas mentiras foram espalhadas sobre ela
como o mel, deixando-a exposta às feras atraídas por sua doçura.
Shona pegou a mão de Eadan e começou a caminhar de volta para a fortaleza.
— Estou contente por Mairi encontrar refúgio. Talvez ela até encontre a felicidade aqui.
— Ela está acasalada, com um curandeiro Chrechte. Eles estão na ilha Balmoral por agora.
Ela está treinando com um velho vidente do clã.
— Ela tem a visão? — Shona sempre acreditou em tais mitos de dons.
Agora sabia que alguns mitos tinham mais verdade do que o que ela sempre tomou como
verdadeiro.
— Ela tem. — Caelis confirmou.
— Como Ciara. — Thomas disse com timidez atípica. — A filha de laird Sinclair. Você a
encontrou ontem à noite.
— Eu me lembro. — Manter sua civilidade com Thomas não foi uma tarefa fácil.
— Ela acredita que Eadan também tem.
Shona agarrou a mão de seu filho firmemente, não disposta a exibir falta de convicção em
seus sonhos como fez no passado.
— Então talvez ela o ajude a aprender a usar seus dons.
Eadan sorriu brilhantemente para Shona, fazendo sua tentativa de compreensão valer o
esforço.
— Ela me disse que os sonhos são mais fortes quando são sobre algo importante.
— Como sobre seu pai.
— Milorde não teria aceitado meu lobo. — Eadan disse com uma sabedoria além de seus
cinco anos.
— Eu tenho certeza que você está certo.
— Esconder sua verdadeira natureza de seus pais é uma coisa dolorosa. — Thomas disse em
um tom suave.
Shona lançou-lhe um olhar de soslaio. Seus ombros estavam inclinados com desânimo.
Ela não pode impedir as palavras de saíram de sua boca mais do que o amor que ela sentia
pelos amigos que não a achavam merecedora da verdade, como seus pais.
— Eu disse à sua irmã, nem trinta minutos atrás, que seu pai é um homem estúpido, inútil,
que não é digno de nenhum de vocês.
Thomas abalançou a cabeça em reconhecimento, mas não disse nada.
— Nós não sabemos o que significa ser Chrechte além de manter os nossos lobos guardados
em absoluto segredo. — Audrey ofereceu em uma voz quebrada pela emoção.
— Então é uma boa coisa que você veio para as Highlands onde, aparentemente, outros
como você são abundantes. — O tom de Shona soou monótono, até mesmo para seus próprios
ouvidos.
Com outro olhar estranhamente preocupado para Shona, Caelis deu de ombros.
— Não tão abundante, mas existem bandos em vários clãs.
— Existem vários favoritos de Uven.
— O clã MacLeod é uma exceção. Os lairds daquele clã estiveram focados em aumentar a
população Faol por gerações, desde que o primeiro bando juntou-se ao clã. Uven tomou essa
dedicação ainda mais a sério do que seus antecessores.
— Por quê? — Ela perguntou, vagamente interessada na resposta.
Eles alcançaram a fortaleza e o barulho do grande salão impediu-a de ouvir a resposta, se é
que Caelis deu uma.
E Shona não conseguia se importar. Muitos pensamentos e emoções guerreavam por
supremacia dentro de sua cabeça e seu coração, a cacofonia tão grande dentro dela, que o agitado
grande salão parecia pacífico em comparação.
Olhando ao redor para as mesas de banquete cheias de soldados e outros membros do clã
tomando café, Shona não tinha esperança de distinguir quais eram Chrechte, e os que como ela,
eram humanos. Ela nem sabia que seu filho era um.
Nem tinha certeza de que se importava se qualquer um dos muitos sentados ali fossem
humanos com algo mais. Os que importavam, os que ela poderia ter esperado que revelassem este
novo e estranho mundo para ela, guardaram segredo.
Até seu próprio filho sabia, por meio de seus sonhos, o que ele era. Ele, pelo menos, ela
entendia completamente porque guardava seu segredo. Shona já tinha inadvertidamente revelado
sua falta de convicção em seus sonhos. E ao contrário de seu pai, Eadan ainda não tinha a
habilidade de provar suas alegações fantásticas.
Parte dela, aquela centelha de amor de mãe que nunca se extingue, estava surpresa pela
confiança de seu filho, não só nos sonhos, mas em si mesmo. Eadan tinha fé do tipo que Shona
perdeu no dia que Caelis a repudiou.
Ela não só deixou de acreditar na bondade dos outros naquele dia, mas ela deixou de
acreditar em si mesma. Shona não podia confiar em seu próprio julgamento, nem podia estar
absolutamente certa de seu próprio valor.
Ela queria acreditar que valeu mais do que apenas ser usada e descartada, mas seus próprios
pais deixaram claro que tinha diminuído a si mesma aos seus olhos. E a única pessoa que ela amou
e confiou acima de todos os outros a traiu completamente.
Talvez, se eles tivessem sido um novo caso de amor, Shona não teria questionado seu
próprio valor tão fortemente. Mas ela e Caelis cresceram juntos no mesmo clã.
Ela tinha se apaixonado por ele em tão tenra idade, que mal podia se lembrar de uma época
em que apenas a visão dele não fazia seu coração se acelerar.
Mas ele escondeu este seu lado surpreendente por todo esse tempo. E seu pai, que sabia
sobre os Chrechte, também.
Descobrir que as duas pessoas que ela deixou entrar em seu coração, que não eram seus
próprios filhos, nos últimos seis anos também esconderam este segredo dela, machucou tão
profundamente, que o ferimento residia em sua alma.
Todas as pessoas em sua vida, que ela pensou que a consideravam digna de confiança não a
haviam julgado assim.
Exceto seu filho. Shona nunca o culparia por esconder dela sua natureza que apesar de seus
sonhos serem mais misteriosos que compreensíveis para o menino de cinco anos de idade.
Mas seus amigos eram adultos, seus pais tiveram a sabedoria da idade e Caelis foi seu
amado. Jovem sim, mas não uma criança.
Nem mesmo tão jovem quanto Thomas era agora.
Todos os três, Caelis, Audrey e Thomas, continuavam olhando-a de soslaio. O que eles
procuravam, ela não sabia. Não tinha nada para lhes dar.
Nenhuma palavra de sabedoria, ou mesmo de condenação. Certamente não estavam
procurando algum tipo de absolvição?
Todos eles provaram, sem dúvida, que sua consideração significava menos para eles que
suas outras preocupações, independente de que essas preocupações pudessem ser.
Ignorando os olhares e até a tentativa primeiro de Audrey e depois de Caelis de tomar sua
mão, Shona caminhou pelo grande salão em uma névoa de dor que entorpeceu tudo ao seu redor.
Haviam lugares guardados para todos eles na mesa do laird e Caelis levou-os lá através dos
soldados tumultuosos e barulhentos.
— Esta é a lady inglesa? — Alguém gritou. — Ela é muito bonita para ser uma sassenach.
— Vista-a nas cores do clã e ela será bonita o suficiente. — Outro disse.
Normalmente tais comentários a fariam corar calorosamente e por ventura até rir. Hoje, eles
giravam ao redor dela sem mais substância do que a névoa.
As risadas continuaram, até que foram abruptamente interrompidos e ela olhou para onde
Caelis estava, um rosnado baixo retumbando em seu peito, seu rosto como um trovão.
— Shona é minha. — Ele rosnou.
Um soldado, próximo o suficiente para Shona tocar, somente porque eles tinham parado
perto do banco onde ele estava sentado, empalideceu e saltou para trás, quase caindo do banco para
colocar distância entre ele e ela.
— Você está fazendo um espetáculo de si mesmo. — Ela sussurrou. — Pare.
E, de repente aquele embaraço, ela pensou que estava muito preocupada pela dor emocional
para sentir. Estava ali, subindo pelas bochechas de Shona e fazendo seus olhos arderem, de tão
agudo.
— Estou fazendo a verdade ser conhecida.
Será que ela realmente precisava soletrar para ele?
— Você está me envergonhando.
— Envergonha você ser reconhecida como minha companheira? — Ele perguntou, soando
completamente ofendido.
Ela queria gritar com ele, perguntar que direito ele tinha de se sentir ofendido, mesmo se
esse tivesse sido o caso. O que não era.
Mas a única coisa que poderia imaginar tornar esta situação ainda mais insustentável seria
permitir que essa conversa fosse a público.
— Estou envergonhada por ser o centro das atenções. — Se isso não fosse uma explicação
boa o suficiente para ele, temia não ter os meios para manter a civilidade. E não seria Caelis o
incomodado por esse fato, ela tinha certeza.
Ela passou um pouco mais de cinco anos como baronesa, tendo sido inserido nela por seu
marido e seus pais que ela deveria se comportar com decoro em todos os momentos.
A moça escocesa que cresceu na parte mais ao sul das Highlands teria rido das restrições que
ela não só suportou, mas aceitou nos últimos cinco anos. Essa moça havia se escondido no fundo do
coração de Shona quando a vergonha foi lançada sobre ela por seus amados pais ao perceber que
carregava o filho de Caelis.
Caelis encarou os soldados mais próximos a ela e, em seguida, virou aquela careta para
Shona, entretanto suas feições se suavizaram um pouco quando seus olhos azuis pousaram nela.
— Você é minha companheira.
— Eu nunca, nem uma vez, neguei isto. — O que era mais do que podia dizer.
— Caelis! — O laird de Sinclair gritou. — Venha aqui com os seus. Estou com fome e
Abigail disse que terei que esperar para comer até que meus convidados estejam acomodados.
Lady Sinclair fez uma careta.
— Eu não sabia quantos gritos perdi quando eu era surda. Isto quase me faz desejar pelos
dias passados.
— Você não quer dizer isto. — O laird levantou uma criança agora chorando dos braços de
sua mãe e aconchegou o bebezinho. — Pronto, docinho. Está tudo bem. A voz do seu pai não é
razão suficiente para todo esse alarde, é?
— É quando ele usa em tal volume. — Lady Sinclair disse com aspereza.
Mas a criança se acalmou, gorgolejando para seu pai.
Shona não entendeu por que Caelis não se sentou imediatamente quando eles alcançaram a
cabeceira da mesa, entretanto ela notou a expressão presa no rosto de seu antigo amado.
Ele observava o laird e o bebê com tal olhar de desejo puro, que tocou o coração de Shona
mesmo através de sua névoa de dor.
Independente se acreditavasse nas palavras que ele compartilhou com ela na noite passada,
sempre valorizaria Eadan.
Shona permitiu que Caelis a acomodasse em uma cadeira em frente a de Lady Sinclair e não
se afastou quando se aproximou. Tinha certeza de que tudo o que ele queria dizer, ela não queria
que os outros ouvissem.
Com certeza, ele sussurrou com uma voz carregada emoção.
— Eu perdi a primeira infância de Eadan e de Marjory, mas estarei lá para o próximo.
CAPÍTULO 10
Regozije-se com os dons dados pelas pedras sagradas como bênçãos,
não como direito de nascimento.
— TRADIÇÃO DE CAHIR
Ele se sentou no banco ao lado dela, colocando Eadan à sua direita e deixando o lugar à
esquerda dela vago para Audrey e Marjory. Thomas rodeou a mesa e sentou-se em frente a Eadan e
ao lado dos filhos do laird.
Sem condição mental para lidar com a certeza de Caelis de que eles seriam uma família,
Shona simplesmente o ignorou.
— Bom dia, lady Sinclair. Sua filha é linda.
— Obrigada. — Lady Sinclair olhou ternamente para o bebê nos braços de seu marido e, em
seguida, se moveu para abranger todos os seus filhos, inclusive Ciara, que estava sentada à sua
esquerda. — Eu sou uma mulher muito abençoada.
— Você é de fato.
O sorriso de Lady Sinclair estava ofuscante em sua feliz intensidade.
— Você dormiu bem, lady Heronshire?
Descobrindo um pouco daquela moça escocesa que ainda habitava no fundo de seu coração,
Shona sentiu a rigidez do tratamento e não gostou disto.
— Por favor, me chame de Shona.
— E você deve me chamar de Abigail. Para ser honesta, uma das coisas que menos sinto
falta na Inglaterra é o hábito sufocante de chamar todos de lorde e lady.
— Seu clã chama você de lady.
— Parece diferente vindo deles.
Shona estava chocada que, em seu estado atual, ela pudesse achar algo mundano divertido,
mas se pegou rindo suave e brevemente da afirmação de Abigail. Era tudo muito fácil de entender.
Ela costumava comparar a vida na Inglaterra com a Escócia o tempo todo e, na maioria dos
casos, havia chegado a uma conclusão semelhante: as coisas feitas da mesma forma não tinham o
mesmo impacto. Independente do quanto ela trabalhasse para mudar a si mesma de modo que se
encaixasse ali, para o bem de seus filhos e de seus pais, Shona nunca sentiu que pertencesse àquele
tão civilizado país ao sul.
Ela não foi feliz, entretanto encontrou bastante alegria na maternidade. Fez seu melhor para
se contentar com sua sorte na vida, ainda que seu coração chorasse todas as noites pelo que ele não
podia ter.
Mas no final, Shona nunca se sentiu segura, ou em casa na Inglaterra como agora que voltou
para sua terra natal, mesmo fugindo do filho mal de seu falecido marido.
— Eu acho que não vou sentir falta de nada da Inglaterra.
— Você não quis deixar a Escócia?
Shona deu de ombros.
— Meus desejos não tinham nada a ver com as escolhas de meu pai.
— Entendo. — A expressão nos olhos de Abigail disse que a outra mulher realmente
entendia.
— Tornar-me mãe fez ficar mais difícil entender a falta de amor do meu pai por mim. —
Shona admitiu.
Caelis fez um som de discordância como fizeram os amigos de Shona, mas ela ignorou
todos eles.
Os olhos castanhos de Abigail brilharam com triste compreensão.
— Foi o mesmo comigo.
— Eu sinceramente duvido que você tenha feito algo tão grave quanto romper ilusões de seu
valor perante seus pais. — Shona se sentiu compelida a dizer.
— Você está errada. Minha mãe e meu padrasto acreditavam que eu não tinha nenhum valor
porque eu não podia ouvir.
— O que você quer dizer? Você ouve muito bem. — Pelo menos era o que parecia para
Shona.
— Eu ouço agora. E não ouvia então. Eu tive uma febre quando criança. Levou minha
audição e com ela, a consideração dos meus pais.
— Mas isso não foi culpa sua!
Abigail sorriu, mostrando que a antiga dor poderia, eventualmente, deixar de doer para
Shona também.
— Não, não era, mas eles tinham vergonha de mim do mesmo jeito.
— Eu sinto muito. — Naquele momento, Shona sentiu uma afinidade com Abigail que ia
além da nacionalidade ou dos fatos da vida.
— Isto me trouxe para Talorc e para a família que compartilho com ele, então eu não posso
lamentar meu passado.
— Você é uma mulher forte.
— Ela é. — Talorc disse com grande orgulho em seu tom.
Shona se viu sorrindo para ele.
Ele retribuiu o gesto, seu sorriso aumentando quando Caelis se mexeu ao lado dela.
Ela olhou para sua direita e viu que o soldado MacLeod tinha uma carranca feroz em seu
rosto. Ela não podia imaginar o que o tinha perturbado neste momento.
Então, novamente, ela optou por simplesmente ignorá-lo. Apontou o óbvio, mas era algo que
ainda a confundia.
— Você não é mais surda.
— Um milagre.
— Que os Santos sejam louvados.
— Aquele que os fez, com certeza.
Shona acenou com a cabeça, satisfeita de que pelo menos sua própria dor não a fez
totalmente alheia aos sentimentos dos outros.
— E fico muito contente que você tenha achado sua felicidade.
— Eu sou mais adequada para a vida aqui, embora nunca teria acreditado antes de me
mandarem para cá para me casar com um estranho.
Shona, que tinha alguma experiência com isto, estremeceu.
— Nem todo matrimônio arranjado pelos pais se torna agradável.
— Um casamento agradável é uma bênção por si só, não importando o que levou a ele, o
amor ou a política.
Shona não poderia contradizer aquele dito de sabedoria.
— E até as uniões menos agradáveis têm suas bênçãos. — Abigail passou a mão pelo cabelo
de sua filha.
Marjory, que estava comendo com obstinada determinação, parou no meio da mastigação
para sorrir cativantemente para sua mãe.
Shona sorriu de volta, um pouco de paz, que não tinha nada a ver com as revelações das
últimas vinte e quatro horas, enchendo seu coração.
E lembrando a Shona uma lição de grande valor que ela aprendeu nos últimos seis anos. A
vida não precisava ser perfeita para momentos de alegria colori-la com sua beleza.
Shona foi tirada de seus pensamentos com a chegada de outro guerreiro, vestido com as
cores de Balmoral. No entanto, o casaco de couro que ele usava com seu kilt dava-lhe uma
aparência tão bárbara quanto Caelis com seu peito nu (a não ser pela faixa xadrez que o cruzava
diagonalmente).
O Balmoral ficou perto demais de Audrey para ser considerado decente, entretanto, os
Highlands não estavam tão preocupados com trivialidades quanto outros clãs ou os ingleses.
Normalmente, os membros dos clãs das Highlands ficavam entre os seus. O fato de que
tanto um soldado MacLeod quanto um Balmoral pudessem ser encontrados entre os Sinclair era
bastante inesperado.
Shona sinceramente não sabia o que fazer com isto.
— Vegar, junte-se a nós. — Lady Abigail convidou calorosamente. — Eu pensei que você
estivesse caçando.
Então o soldado de Balmoral era bem-vindo e um convidado esperado.
Isto mostrava que as relação entre os Sinclair e os Balmoral eram boas. Mais uma vez,
Shona não sentiu nenhum entusiasmo sobre algo que deveria ter sido uma boa notícia. No mínimo
ela deveria estar considerando pedir para este Vegar que a levasse a Balmoral.
No entanto, nenhum de seus planos anteriores eram tão reais em sua mente como a virada
inacreditável de eventos que sua vida tomou quando ela e seus companheiros encontraram Niall e
seus guerreiros.
— Aye, eu fui caçar. E achei o que eu nem sabia que estava procurando. — O tom de Vegar
continha uma satisfação reverente e ele deu a Audrey um olhar tão caloroso, que Shona sentiu-se
corar por sua amiga.
Se Audrey podia ou não ainda ser chamada por aquele título não era algo que Shona queria
contemplar naquele momento.
Audrey apenas olhou para o homem, a expressão contida em suas adoráveis feições.
Shona não conseguia entender o que estava acontecendo. De qualquer maneira, esta reação
era ainda mais incomum para a inocente Audrey.
Shona não sabia se o guerreiro de Balmoral tinha o hábito de olhar para as mulheres deste
modo.
Abigail pigarreou, a diversão espreitando em seus lindos olhos.
— Vegar, esta é Audrey, amiga de lady Heronshire.
— Olá, querida. — O grunhido baixo de Vegar era ao mesmo tempo totalmente
inapropriado e preenchido com a mais estranha possessividade natural.
Audrey corou, sua pele ficando com um tom marcante de rosa.
— É um prazer conhecê-lo. — Disse ela em gaélico formal.
Audrey e Thomas fizeram seu melhor para aprender o idioma da pátria de Shona, mas como
Shona fazia com o gaélico, o casal mudava para o inglês nos momentos de tensão.
Vegar recuou, sua expressão indo de interessada, ferida e apavorada, para dura, num piscar
de olhos.
— Você é inglesa.
— Oh, pelo amor de Deus! — A exclamação frustrada de Abigail foi tão alta, que seu bebê
deu um grito de surpresa. — Sua tribo não teve relações com os ingleses por quantas gerações?
Você não tem inimigos suficientes em Fearghall? Você precisa ter antipatia por uma nação inteira?
— Quem está fazendo nossa bonita Emma se inquietar agora, esposa? — Talorc perguntou,
sua diversão maior do que Shona teria pensado que a situação justificava.
— Você não gosta dos ingleses? — Audrey perguntou a Vegar. O Balmoral estremeceu com
o som de sua voz falando inglês. Ela repetiu a pergunta em hesitante gaélico, sua expressão
desmoronando enquanto as palavras deixavam sua boca.
Vegar fez uma careta.
— O mais traiçoeiro entre os Fearghall clama ser da Inglaterra. Isto é bem conhecido.
— Interessante, ninguém da sua tribo compartilhou isso conosco. — Talorc disse.
As palavras dos homens não fizeram sentido para Shona, mas Audrey não parecia confusa.
Seus olhos cinzentos encheram-se de dor, enquanto sua boca tremia, embora ela mordesse o lábio
inferior para esconder.
— Por que você acredita nisto? — Laird Sinclair perguntou, aparentemente alheio ao
sofrimento de Audrey ou à raiva de Vegar.
— Isto é uma discussão para outra hora. — Vegar respondeu com um olhar ao redor do
grande salão.
Então, nem todos os Sinclair estavam cientes da verdadeira natureza dos Chrechte mais do
que Shona quando ela viveu entre os MacLeod.
— Talorc! — Abigail disse com exasperação.
Ela não estava surda para a angústia de sua companheira inglesa.
Shona também não estava, mas ainda não entendia. Vegar era um estranho. Enquanto sua
opinião baixa dos ingleses não era exatamente agradável para Audrey, ou para Thomas, escutar,
dificilmente seria um motivo de grande preocupação para eles.
Ou Audrey estava preocupada que a atitude de Vegar os impediria de encontrar refúgio entre
seu clã? Shona não podia acreditar que a mulher mais jovem estava convencida disto, não depois
que ela advertiu Audrey sobre essa mesma coisa antes deles iniciarem a viagem.
Vegar olhou para Audrey, balançando a cabeça com clara decepção.
— Inglesa.
Ele não disse qualquer outra coisa, mas aparentemente isso foi o suficiente para Audrey.
Seus olhos escureceram como nuvens de tempestade e umidade apareceu em suas pálpebras
inferiores.
— Isto é malditamente perfeito. Eu perdi o respeito de minha mais querida amiga no mundo
e meu companheiro me odeia porque eu nasci em um país diferente do seu próprio.
Shona não sabia o que estava acontecendo, mas a angústia na voz de Audrey a tocou como
nada mais poderia.
Porém, antes que ela pudesse estender uma mão reconfortante, Audrey saltou de sua cadeira.
— Não se preocupe, Vegar das Highlands. Eu não quero um selvagem sujo como
companheiro mais do que você quer uma inglesa.
Audrey girou nos calcanhares e saiu correndo pelo salão.
Shona não tinha ideia do que aconteceu, mas ela levantou-se de um saltou e olhou para o
recém-chegado.
— Bárbaro rude, como ousa perturbar minha amiga assim?
Vegar, que estava olhando para Audrey como um caçador privado de sua presa, estremeceu
e olhou de cara feia para Shona.
— Isso não lhe diz respeito, inglesa.
— Eu acredito que você tenha esquecido que eu sou inglesa. — Abigail disse em tom gelado
antes que Shona pudesse abrir sua boca para responder.
— Era inglesa. — O laird Sinclair corrigiu, mas lançou um olhar verdadeiramente
assustador para Vegar. — Insultar minha esposa é insultar a mim.
Vegar empalideceu com esse aviso.
Caelis estava atrás de Shona, seu grande corpo em uma posição claramente protetora.
— Desculpe-se.
— Por quê? — Vegar exigiu.
— Por levantar a voz para minha companheira. — Caelis respondeu em um tom mortal que
Shona não gostou nem um pouco.
E então algo atingiu Shona que ela não pode ignorar. Todo mundo continuava usando aquela
palavra ao seu redor. Companheira.
Ela sabia o que Caelis queria dizer quando falou isto. Ele acreditava que seu lobo precisava
da presença de Shona para sua satisfação.
Audrey chamou Vegar de companheiro. Será que ela quis dizer a mesma coisa?
E se ela o fez, como poderia saber tão depressa. E se ela soube no momento de seu encontro,
como Shona podia acreditar na alegação de Caelis de que ele não sabia?
Era tudo muito confuso.
Ela se virou para enfrentar Caelis e descobriu que gostava do olhar ameaçador no rosto
bonito ainda menos do que gostava de seu tom de voz que prometia violência e caos.
— Não leve isso tão a sério. Eu não sou tão fraca que não possa sobreviver a algumas
palavras duras. Além disso, eu não considero ser chamado inglesa um insulto. — Ela disse, tanto
para benefício de Abigail como por ser a verdade.
Ela aprendeu em seus seis anos vivendo no país mais ao sul que existiam pessoas boas e más
entre os ingleses, assim como entre os escoceses. Apesar deste Vegar parecer não perceber, isto
acontecia entre os Chrechte também.
Apesar de todos seus defeitos, ela preferia ficar com seu falecido marido como Barão a ter
Uven como laird.
— Uma mulher com sentido. — Abigail disse ruidosamente.
Caelis ignorou as palavras da esposa do laird, da mesma maneira que ele ignorou as de
Shona. Ainda estava muito ocupado encarando o outro homem.
— Desculpe-se. — Ele exigiu novamente.
— Ela ficaria entre mim e minha companheira.
Caelis não se sentiu tocado pelas palavras do outro homem.
— Se ela ficar, eu também ficarei.
— Você é meu amigo, nossos laços foram forjados ao longo do ano passado enquanto
treinávamos para ser Cahir.
— Ela é minha companheira verdadeira.
— Como a inglesa é minha. — Havia um pouco menos de desdém em sua voz quando ele
pronunciou a palavra inglesa do que antes.
Mas apenas um pouco.
— Você é Chrechte. — Shona disse. Não havia mais qualquer dúvida sobre o que este
homem e Audrey queriam dizer quando usaram essa palavra, companheiro.
O homem não se preocupou em responder.
Caelis rosnou.
— Eu sou. — Vegar grunhiu entre dentes.
— E você realmente acredita, após um encontro tão curto, que ela é sua companheira.
— Ela é minha. Inglesa ou Lowlander, Audrey pertence a mim.
— Talvez você devesse ter chegado a essa conclusão antes de insultar a doce mulher ao
ponto de lágrimas. — Abigail disse sarcasticamente.
— Então você se lembra de seu nome. — Shona acrescentou, não fazendo nenhum esforço
para esconder seu próprio desgosto com a reação de Vegar ao encontrar a mulher que ele dizia ser
sua verdadeira companheira.
E Shona ainda estava incerta sobre o que isso significava em face às explicações de Caelis
na noite passada. Se o resto da manhã continuasse assim, não seria nada bom.
Thomas continuava parado, sua expressão fascinada e preocupada. Uma combinação
estranha, Shona pensou, considerando que sua irmã era o assunto deste debate particular.
— Shona, você ainda confiaria seus filhos aos meus cuidados?
— Claro. — Ela disse antes de pensar sobre o assunto e, em seguida, franziu a testa, mas ela
não retiraria suas palavras.
Thomas e Audrey não confiaram em Shona, eles tinham dilacerado as pequenas partes de
seu coração que ainda não foram feridas pela vida com suas mentiras, mas ela confiava nele com
seus filhos? Sim.
Ela acreditava que ele daria sua vida para proteger Eadan e Marjory, mas isso era algo para
pensar mais tarde.
— Não mude de ideia agora. — Thomas disse, como se lesse os pensamentos de Shona. —
Audrey e eu ferimos você gravemente. E só peço uma oportunidade para explicar.
— Não aqui. — Talorc vociferou, mostrando que ele não estava nem metade alheio quanto
fingia estar.
— Nay. E não agora. — Thomas concordou.
O laird acenou com a aceitação da promessa, pois era uma promessa, dita em um tom muito
mais sério do que Shona normalmente ouvia do jovem. Mesmo durante sua fuga da Inglaterra.
— Você tem um ponto, eu presumo, em perguntar se eu confiava em você com Eadan e
Marjory.
Thomas assentiu vigorosamente.
— Eu tenho. Audrey precisa de você agora. Seu companheiro acabou de rejeitá-la.
— Eu não a rejeitei. — Vegar rosnou.
— Certamente foi o que soou para mim. — Abigail disse com uma careta para garantir.
Qualquer estima que a lady Sinclair tinha em favor do soldado, certamente decaiu por seu
comportamento com Audrey.
Vegar tinha ido de poderoso guerreiro bárbaro ao homem incômodo em poucos minutos.
Sua expressão agora era agressiva, mas por baixo Shona podia ver a preocupação em seus olhos à
medida que passavam de pálido castanho a verde em sua agitação.
— Não era minha intenção.
Thomas dispensou o homem maior com um dar de ombros e encontrou o olhar de Shona,
seus próprios olhos, que eram do mesmo tom cinzento de sua irmã, cheios de preocupação.
— Ela precisa de você e se for até ela, eu consideraria isto um grande favor, não que eu
mereça um vindo de você.
— Não é um favor confortar uma amiga.
A expressão de alívio nas feições de Thomas era duro de ver. Ele era ao mesmo tempo tão
jovem e tão adulto protetor naquele momento, que machucava o coração de Shona em um bom
sentido.
Ela o observou crescer de menino para homem, e apesar de suas decepções sobre sua
natureza verdadeira, ela estava contente com o resultado.
— Eu cuidarei de Eadan e Marjory. — Ele explicou no caso de Shona ainda ter alguma
dúvida do por quê de sua pergunta anterior.
— Eu também. — Caelis disse, seu mau humor parecendo ter piorado.
Apesar, de mais uma vez, Shona não ter nenhuma ideia do por quê. Os humores do homem
eram tão instáveis quanto o tempo na primavera.
Shona acenou para Thomas, incluindo Caelis com um curto olhar, em seguida, virou-se para
fazer uma reverência e saiu de perto do laird e sua lady.
— Eu vou subir para verificar vocês duas depois de ter cuidado de Emma. — A clara
preocupação de Abigail aliviou Shona mais do que teria um dia atrás.
Quando acreditou que conhecia Audrey melhor que qualquer outro. Agora, Shona sabia que
a vida de Audrey era ditada por circunstâncias que ela ainda achava fantásticas demais para
acreditar.
Presumivelmente, Abigail tinha mais experiência deste mundo de companheiros e Chrechte,
já que ela era casada com um.
Antes de Shona poder partir, no entanto, a mão de Caelis prendeu seu pulso como uma
algema. Ele olhou para Vegar.
— Desculpe-se.
Vegar suspirou e abaixou sua cabeça levemente.
— Eu não tinha a intenção de chatear você, lady Heronshire.
Caelis rosnou novamente.
Shona suspirou, completamente envergonhada agora.
— O que agora?
— Do que você queria que eu a chamasse? Shona? — Vegar exigiu de Caelis.
— Aye.
Shona bateu no braço de Caelis, estremecendo quando machucou a mão dela muito mais, ela
tinha certeza, do que os rígidos músculos.
— Essa liberdade é só minha para dar.
— Eu não quero ver você ser chamada pelo nome daquele desgraçado.
— Eu lhe asseguro que o Barão era inquestionavelmente legítimo.
— Você não pertence a ele.
Sem qualquer aviso, bile subiu pela garganta de Shona com a lembrança do quanto ela tinha
de fato pertencido ao velho.
Abigail ofegou como se soubesse e Caelis agarrou Shona, mas ela se afastou, voltando-se
para enfrentar Vegar.
Ela forçou a náusea para longe para permitir que as palavras passassem por sua garganta
apertada.
— Eu perdoo você pela pequena descortesia, mas não espere que as coisas sejam tão fáceis
com Audrey. Ela aprendeu muito bem em seu passado quão prejudicial pode ser o respeito de um
homem quando ele se acredita superior à natureza da mulher escolhida como sua companheira.
Ela não sabia toda a história da vida de Audrey e Thomas, mas podia assumir que sua mãe,
não o Barão, era Chrechte. Uma coisa Shona tinha certeza, mesmo que fosse apenas de forma
possessiva e superior que guiava Uven, nenhum homem Chrechte daria seus filhos metamorfos de
boa vontade para servir a um mestre humano.
Como sua mãe estava morta quando eles foram vendidos para servir, ela é que deve ter
compartilhado sua natureza com um lobo. A decisão para fazer isso foi inteiramente de seu pai.
Um pai que, sem dúvida, sentiu-se atraído por sua companheira como Shona por Caelis, mas
que tratou a mulher com pouco interesse e muito menos respeito como sua amante.
Thomas prendeu a respiração, como se o entendimento de Shona o chocasse. Talvez ele
devesse ficar surpreso. Ele e sua irmã não eram mentirosos profissionais e conseguiram manter seu
segredo de Shona por cinco anos.
Eles deveriam considerá-la uma idiota de primeira ordem.
— Como meu pai percebeu que vocês eram metamorfos?
— Ele disse que era pelo modo que nós nos movemos. — Thomas respondeu. — Ele soube
na primeira vez que nos viu.
Que estranho pensar em seu pai sendo tão perito em perceber a graça animal dos Chrechte
quando ele foi tão cego para ver o tormento de sua própria filha.
CAPÍTULO 11
Os segredos dos Chrechte devem ser mantidos até que chegue o dia em que todos os humanos
sejam considerados um e iguais aos olhos de todos os outros.
— PALAVRAS DA CELI DI
Shona não se preocupou em bater antes de abrir a porta do quarto em que ela tinha
encontrado Audrey com os filhos na noite anterior.
Sua amiga estava em silêncio e imóvel, olhando para o espaço. A expressão de Audrey era
sombria, seus olhos estavam úmidos e os caminhos das lágrimas se mostravam em seu rosto pálido,
mas ela não estava chorando. Pelo menos, não agora.
Shona suspirou, sua própria raiva e dor indo para o fundo enquanto ela observava a mulher
mais jovem.
— Ele é um idiota.
Talvez estas não fossem as palavras mais prudentes para serem ditas, mas na verdade não
eram nenhuma mentira.
Audrey saltou, como se não tivesse percebido que Shona entrou no quarto.
Isso era bastante incomum e Shona agora entendia por quê. Sua amiga inglesa
compartilhava sua natureza com um lobo e tinha a audição mais aguçada por causa da fera.
— Você está realmente tão angustiada pela opinião de um homem que acabou de conhecer?
— Shona perguntou quando Audrey permaneceu em silêncio, com a cabeça virada.
A mulher mais jovem virou-se abruptamente, seus longos cabelos loiros pálidos voando ao
redor dela.
— Ele não é o único cuja consideração eu perdi esta manhã.
Shona suspirou, não tendo certeza se ela estava pronta para entrar nessa confusão em
particular.
— Você não perdeu sua consideração. Ele simplesmente ficou surpreso por você ser inglesa,
isto é tudo. Ele já está lamentando sua estupidez.
— E a sua consideração? — O olhar cinzento de Audrey implorava. — Shona... você é a
irmã que minha mãe não pode suportar.
— Foi como me senti nestes últimos cinco anos. — Ela verdadeiramente o tinha, o que fez a
traição de seus amigos muito mais difícil de suportar.
— E agora? — Audrey perguntou, sua voz tremendo de emoção.
— Você escondeu a verdade sobre você... a verdade da natureza de meu filho... de mim por
todos esses anos.
— Nós não tínhamos certeza se ele se transformaria. Mamãe disse que nem todas as crianças
nascidas de um acasalamento misturado teriam a natureza Chrechte. Ela nem estava certa de que
Thomas e eu nos tornaríamos lobo. Ela morreu acreditando que a natureza de Thomas era
completamente humana.
— Como pode ser isso?
— Minha primeira transformação aconteceu um ano antes da de Thomas.
— Quando foi isso?
— Com a vinda de minha menstruação. Ela veio cedo e eu me transformei em lobo pela
primeira vez na lua cheia depois disto. Eu tinha apenas doze verões.
— Sua mãe morreu só um ano mais tarde.
— Sim. Ela nunca viu Thomas se transformar. — Audrey deu um suspiro trêmulo, de uma
dor antiga, que Shona entendia muito bem, nas profundezas de seu olhar. Seus amigos perderam
ambos os pais. — Sempre acreditei que foi a tristeza por sua morte, que trouxe a primeira
transformação dele para lobo.
— E seu pai não sabia de sua natureza, da de sua mãe?
— Nem Thomas sabia sobre mim, ou o que mamãe era, não... até ele se transformar pela
primeira vez. Eu quase o perdi naquela noite. Ele não sabia o que estava acontecendo. — O horror
da lembrança brilhou nos olhos de Audrey.
— Isto é terrível. Por que sua mãe não lhe disse a verdade? Por que você não o fez?
— É contra a lei Chrechte. Nós fomos ensinados que proteger nosso segredo é a coisa mais
importante. Nada mais se compara a isso. Nem a lealdade pela família, nem a lealdade de um
amigo. — A expressão de Audrey implorava pela compreensão de Shona.
Shona não sabia se ela poderia lhe dar isto.
— Mas ele era seu filho! — E irmão gêmeo de Audrey, entretanto Shona não assinalou
aquele fato óbvio.
— E eu era sua filha. Eu não sabia nada sobre ser um Chrechte, nem sequer havia ouvido
falar nessa palavra antes de minha natureza de lobo me reivindicar. Minha primeira transformação
não é algo que eu queira me lembrar, acredite. Eu pensei que estivesse cheia de demônios.
Shona não sabia o que dizer. Como uma mãe podia esconder algo tão elementar de seus
filhos e causar neles tão terrível angústia? Como ela pode ensinar aquelas mesmas crianças a
fazerem exatamente a mesma coisa? Isso não era legal pelo modo de Shona pensar.
— Pelo menos mamãe ficou de olho em minha primeira transformação. Ela fez questão de
estar perto quando a lua cheia veio. Eu acreditei que meu irmão nunca se transformaria e então não
estava observando-o com cuidado quando aconteceu. Foi horrível para ele. Ele não sabia o que
estava acontecendo mais do que eu, mas não havia ninguém ao seu redor para argumentar com ele,
para lhe dizer que o que estava acontecendo era natural. Ele acreditava que havia enlouquecido pela
dor, tinha pavor que pudesse matar. Se ele soubesse como fazê-lo, ele teria terminado sua própria
vida naquela noite.
— Proteger seu segredo é uma coisa, mas isso é monstruoso. Como poderia sua mãe achar
que tal coisa era aceitável? — Shona perguntava quase para si mesma.
— Não era responsabilidade de mamãe. Era minha e eu falhei com meu irmão naquela noite.
— Você tinha apenas treze verões.
— O que a idade tem a ver com isso?
— Tudo. — Por todos os Santos, como Shona podia manter sua raiva de uma mulher cujo
medo da descoberta já a havia levado a tanta dor pessoal?
Audrey soltou um suspiro agonizante.
— Eu quis dizer a você tantas vezes.
— Por que não o fez?
— Mamãe me fez prometer, tantas vezes... que eu nunca divulgaria o segredo de nossas
naturezas. Quando eu a conheci, estava enraizado em mim esconder a verdade a todo custo.
— O custo foi quase a vida de seu irmão. Eu não posso acreditar que sua mãe queria isto.
— Eu acho que não, mas ela era inflexível. Deixou sua alcateia para seguir meu pai. Eles a
deserdaram, mas ela disse que eles viriam atrás de nós se revelássemos a verdade dos Chrechte. Que
nos matariam sem pensar duas vezes, se os traíssemos.
Não havia dúvida de que a mãe de Audrey acreditou em suas terríveis advertências porque
passou esta crença inabalável para sua filha. Estava no tom de Audrey e no modo que ela se segurou
quando repetiu a ameaça.
— Você ainda acredita que está ameaçada por esse bando?
— Eu não sei. Mamãe me disse tão pouco. Eu me pareço com ela, e se alguém de seu antigo
bando me vir e souber quem eu sou? Ela achava que eles prefeririam matar a mim e a Thomas do
que permitir que vivessem o que eles chamavam de mestiços. O medo dela por eles era grande.
— Onde está o bando dela? — As palavras estavam na cabeça de Shona, mas ela não as
falou.
Elas haviam sido proferidas naquela profunda voz masculina que ouviu apenas recentemente
no grande salão.
Vegar ficou na porta, sua expressão escura, Caelis atrás dele, seu olhar azul buscando o de
Shona. Ela se recusou a fixar os olhos no homem decidido a reivindicá-la. Queria ter certeza de que
ele não teria agido como mãe de Audrey, e temia que ela não a tivesse.
— Eu não sei. — Audrey também estava se recusando a olhar para Vegar, seu olhar estava
fixo no chão de um jeito que perturbava Shona. — Minha mãe era de uma terra na fronteira, no
nordeste. Ela falou muito pouco de seu passado.
A expressão de Vegar escureceu.
— Existe um bando composto inteiramente de Fearghall e suas fêmeas naquela área.
— O que são os Fearghall? — Shona perguntou notando como o rosto de sua amiga
empalidecia.
Vegar respondeu.
— Eles são um bando secreto de Chrechte com a intenção de destruir todos menos os Faol.
Shona sabia que Faol era uma palavra antiga para lobo.
— Você está dizendo que existem outros Chrechte que não são lobos?
— Alguns são pássaros. Águias, corvos e falcões. — Caelis disse enquanto fechava a porta,
mantendo os quatro no quarto.
— Nós somos chamados de Éan. — Vegar acrescentou, seu olhar nunca deixando a cabeça
curvada de Audrey.
— Você não pode ser Éan. — Audrey sussurrou. — Os Éan querem destruir os Faol.
— Sua mãe era Fearghall. — O tom de Vegar não era acusatório, não como foi quando ele a
chamou de inglesa no andar de baixo. Ele falou como se as suas palavras explicassem as de Audrey.
Talvez elas o fizessem, mas Shona ainda estava confusa. Vegar não disse que os Fearghall
queriam destruir aqueles que não tinham natureza de lobo, e não ao contrário?
— Mulheres não são Fearghall. — Novamente Audrey falou sem olhar para nenhum deles.
— Se mamãe soubesse que Thomas seria um metamorfo, ela o teria mandado de volta para seu
povo. Ela me disse uma vez. Ele poderia ser um Fearghall. Embora ela tivesse dito que o bando
poderia matá-lo por ter um pai humano, independentemente dele se transformar. Ela ainda assim o
teria enviado e tido esperança. — Audrey disse como se admitindo um segredo vergonhoso.
E era vergonhoso, mas não da parte de Audrey. A mãe que ela e Thomas idolatraram era
muito diferente da mulher que Shona sempre foi levada a acreditar que era.
— Sua mãe não sabia que Thomas podia se transformar? — Caelis perguntou.
— Não.
— Aparentemente, isso não aconteceu até depois de sua morte. — Shona disse quando a
amiga permaneceu em silêncio.
Caelis balançou a cabeça, como se isso fizesse perfeito sentido para ele.
— Sua mãe estava chateada por você ser metamorfa e não ele. — Vegar adivinhou, soando
revoltado.
A cabeça de Audrey finalmente se levantou.
— Sim.
— Os Fearghall tem seus pensamentos distorcidos.
— Ela me amou. — Audrey afirmou, mas não com tanta convicção quanto Shona ouviu em
sua voz em ocasiões anteriores.
— Estou certo que sim, mas ela foi ensinada desde criança que seu valor era menor porque
ela nasceu fêmea. — Caelis parecia saber do que estava falando. — Eles a teriam afastado por
seguir seu companheiro porque ele era humano. Os Fearghall são claramente fortes entre seu bando
e consideram responsabilidade de todo lobo procriar com outro Faol, e ninguém mais.
Isso explicava as ações de Uven mais claramente, e talvez até a disposição de Caelis em
repudiar Shona. No entanto, isto não confortou seu coração ainda ferido em nada.
Vegar esfregou seu rosto, um som de clara frustração misturada com desgosto vindo dele.
Caelis deu ao outro homem um olhar irônico.
— Você se esquece às vezes.
— O que ele esquece? — Audrey perguntou calmamente.
— Que eu também fui Fearghall.
— Você era? — Shona perguntou, não feliz com a confirmação apesar de suas suspeitas.
Ela não sabia o suficiente sobre esta sociedade secreta para entender tudo ainda, mas o que
ela recolheu não a pintava em cores bonitas.
Caelis disse que que aqueles que se chamavam por aquele nome acreditavam que outros de
diferentes tipos não mereciam viver. Mesmo estando com muita raiva, ela nunca considerou Caelis
ignorante ou preconceituoso de um modo tão deplorável.
— Você está desapontada comigo. — Ele disse para Shona.
Ela assentiu com a cabeça, não vendo razão para negar.
— Vegar disse que conhecia um bando composto completamente de Fearghall. — E suas
fêmeas, mas ela não viu a necessidade de repetir aquele detalhe neste momento. — O que implica
que outros não são.
— Exatamente.
— Então você escolheu concordar com o modo distorcido de pensar de Uven.
— Não era apenas Uven. Ele acredita no que lhe foi ensinado, como fizeram gerações antes
dele.
— Mas você está enganada em acreditar que Caelis teve a opção de não seguir os costumes
dos Fearghall. — Vegar inseriu. — Se ele tivesse rejeitado os seus ensinamentos, teria sido morto
como outros Chrechte foram antes e depois dele.
Um calafrio passou pelo peito de Shona.
— Mas você disse...
— Os MacLeod são como os ingleses. Os homens são Fearghall, as mulheres Chrechte,
procriadoras, apoiando os homens sob o risco de serem afastadas ou algo muito pior. A mãe de
Audrey foi muito sortuda pois não foi morta por seu antigo bando por abandoná-los.
Audrey ofegou.
Shona acenou com compreensão, se não com aceitação e se virou para Caelis.
— Você escapou.
— Eu o fiz. — Ele não parecia orgulhoso, apenas determinado sobre aquele fato.
— Eu fico contente.
Caelis assentiu.
— Faz sentido, entretanto, sabendo como facilmente você me mandou embora. — Shona
meditou.
— Eu não mandei você embora.
— No fim deu no mesmo.
— Mas esta não foi minha intenção.
— Oh, então você pretendia que eu permanecesse no clã e me casasse com outro MacLeod?
— Ela perguntou, achando difícil acreditar por causa de sua possessividade.
— Não.
— Você pensou que eu deveria permanecer sozinha?
— Por que não? Eu fiquei. — Ele soou incomodado, como uma criança mal humorada.
— Por sua escolha.
Foi a vez de Caelis fazer aquele som de guerreiro frustrado.
— Sim, por minha escolha.
— Finalmente, você admite isto.
— É disso que você precisa? Ou será que apenas o derramamento do meu sangue fará sua
raiva por mim se aliviar?
— Eu não sou nenhum Deus para exigir um sacrifício de sangue.
— Então eu não sei o que você quer.
Isso era fácil demais.
— Sua admissão de que você escolheu o caminho que tomou.
— Eu já admiti que errei.
E para Caelis, isso foi difícil. Mas para Shona, não era o suficiente.
— Você não foi simplesmente enganado. Você estava aberto ao engano, porque acreditava
ser superior a mim. — Sua mandíbula cerrou e Caelis assentiu. Não havia dúvida de que ele não
estava mais feliz de fazer essa admissão do que estava da anterior.
Ela só podia esperar que isso significasse que ele não tinha mais tais visões inaceitáveis.
— Sua habilidade de se transformar em um lobo com certeza é uma coisa mágica, mas isto
não faz de você ou Uven, deuses entre os homens.
— Eu nunca disse isso. — Frustração e vergonha cercaram seu grande guerreiro como uma
nuvem.
Ele nunca disse isto, mas acreditava. E talvez Shona pudesse perdoar, se ele não acreditasse
mais, mas ela não fingiria que a praga em seu pensamento nunca esteve ali.
Audrey olhou para Shona, a desculpa em seus olhos cinzentos.
— Minha mãe acreditava. Ela se achava superior ao seu companheiro da mesma maneira
que ele acreditava ter mais valor do que ela. Mamãe chamava sua esposa e os filhos de seu
casamento legítimo de “miseráveis”. Quando eu era pequena, acreditava que era por ciúmes e dor
porque ela era apenas sua amante, mas quando descobri a verdade de nossas naturezas, percebi que
ela realmente acreditava que eles estivessem abaixo dela.
Claramente, as convicções de sua mãe machucaram Audrey.
— Você nunca mostrou os preconceitos dela. — Shona acalmou.
— Você era muito gentil para ser menos do que eu. Eu amei minha meia irmã e meio irmãos
e eles gostavam de mim e de Thomas. Eu sabia que minha mãe tinha que estar errada. Seu bando a
tinha rejeitado por seguir seu companheiro, mas você me aceitou como uma amiga querida quando
todos os outros em sua casa me olhavam como nada além de uma empregada.
— Eu fiz muitos poucos amigos entre os ingleses. — Shona brincou, querendo aliviar o
semblante sombrio de Audrey.
Funcionou e a mulher loira sorriu.
— Eu aprendi com a injustiça dos meus pensamentos. — Caelis disse entre dentes, nenhum
sorriso evidente em suas feições. — Uven é injusto em seus pensamentos. Ele não respeita os
costumes antigos apesar de alegar que vive por eles. — No tom de Caelis havia a dor de ser
enganado, sua expressão tensa. Shona se surpreendeu com a compaixão com que Vegar observava-
o, mas não com o fascínio com que Audrey fazia.
— Uven é um canalha em todos os sentidos. — Shona disse com toda convicção que sentia.
Caelis assentiu, sem defender seu antigo laird como costumava fazer.
— Mas você está certa. Eu me permiti acreditar e ao fazê-lo... eu traí minha verdadeira
companheira e rompi a lei sagrada Chrechte como Thomas me acusou de fazer. Assim como Uven
fez.
Ela apenas se lembrava vagamente de Thomas fazendo tal afirmação logo que ele descobriu
quem Caelis era. Ela podia ver que esta admissão era de grande importância para Caelis, mas teve
pouco impacto para ela.
— Você podia ter terminado suas explicações quando reconheceu que tinha o pensamento
errado. No momento, as leis Chrechte tem pouca importância para mim.
— Mas se eu tivesse...
— Não. — Shona levantou sua mão. — Neste momento, eu não quero ouvir mais sobre este
mundo do qual fui mantida ignorante por tanto tempo. Eu tenho assuntos mais importantes para
tratar.
Mais tarde, eles teriam muito para discutir. Independente do quanto ela preferiria evitar. Mas
não neste momento.
Caelis franziu a testa, seu choque claro no azul violeta de seus olhos.
— O quê?
Como se não pudesse existir nada mais importante do que as leis Chrechte. Custou toda a
paciência que Shona lutou para conseguir para não bater os dentes.
Aquelas mesmas leis Chrechte fizeram as pessoas que ela mais amava no mundo a
enganarem. Ela poderia ser perdoada por não acreditar nelas como grande fonte de sabedoria e
conhecimento como Caelis parecia achar.
— Amizade. — Ela disse sem culpa. — Minha querida amiga e eu temos palavras que
precisamos dizer e elas não necessitam a presença de dois guerreiros arrogantes.
— Você está nos expulsando do quarto? — Vegar perguntou, sua própria surpresa ainda
mais aguda que a de Caelis.
— Estou. — Ela assentiu com a cabeça e olhou fixamente para a porta.
— Mas eu devo falar com minha companheira.
— Eu não sou sua companheira. Ainda. — Audrey disse quando Vegar parecia querer
discutir. — Talvez nunca.
— Você não pod...
— O que eu posso e não posso fazer não é do seu interesse agora, bárbaro.
Caelis sorriu para isto, tendo algum tipo de diversão por seu amigo estar sendo repreendido.
Guerreiros. Não dava para entendê-los.
Shona apontou para a porta e olhou para os homens de forma hostil.
— Saiam.
— Mas...
Isso foi Vegar.
O braço de Audrey se levantou, sua força ressurgindo enquanto ela endireitava sua coluna.
Ela apontou para a porta também.
— Agora. Nós queremos privacidade.
Caelis cruzou os braços e se apoiou contra a porta.
— Seja razoável. — Ele ordenou, não sendo nenhum pouco. — Nós temos muito para
acertar e não temos muito tempo para isto.
Shona cruzou seus próprios braços, as longas mangas aveludadas farfalhando enquanto ela o
fazia.
— Pode até ser. Eu tenho apenas sua palavra para a urgência de tempo, mas te digo uma
coisa: eu vou falar com minha querida amiga antes de você e eu termos nossa discussão. Ela esteve
comigo nestes últimos cinco anos enquanto você não. O mínimo que pode nos dar é um momento
de privacidade.
Ela pensou que Caelis continuaria discutindo, mas ele não o fez, sua expressão indo de raiva
à tristeza, à estoica e à determinação tão rapidamente que cada emoção passou quase sem que ela
pudesse perceber.
Finalmente, o grande lobo metamorfo fez uma careta e acenou com a cabeça, saindo pela
porta sem outra palavra.
Vegar abriu a boca, como se para contestar a decisão do outro homem.
Mas Caelis cutucou o soldado Balmoral sem gentileza com seu ombro, sua carranca e a
firme sacudida de sua cabeça calando o outro guerreiro.
Audrey lançou seu próprio olhar e Vegar cedeu.
— Tudo bem. Nós iremos agora. De qualquer maneira já está na hora de praticarmos nossa
luta.
Shona e Audrey não responderam àquele comentário. De acordo com Abigail, os planos dos
homens pela manhã incluíam caça, não luta.
Honestamente, Shona simplesmente não se importava naquele momento. Ela só precisava de
um tempo afastada dos taciturnos guerreiros e suas demandas.
Caelis e Vegar viraram-se ao mesmo tempo e deixaram o quarto sem outro argumento.
Apesar do olhar que Caelis deu a Shona enquanto ele saia a fez pensar que ele desejava que ela
mudasse de ideia e o pedisse para ficar.
Ela não o fez.
CAPÍTULO 12
Uma vez que eles se foram e a porta foi firmemente fechada, Shona se virou para enfrentar
Audrey.
A inglesa se ocupou arrumando o quarto, dobrando a colcha de Thomas e colocando-a
debaixo da cama.
— É bastante surpreendente que este laird escocês tenha camas de verdade em seus quartos
de hóspedes.
— Isto não é comum. — Shona concordou, sem vontade, como Audrey, de tocar no assunto
principal. — Talvez seja a influência de sua esposa inglesa?
— Talvez. Apesar de que até na Inglaterra, só os mais ricos possuem múltiplos quartos
reservados.
— Eles não são decorados. — Shona observou.
Como a mobília no grande salão, os móveis nos quartos eram simples e funcionais. Era
bastante provável que contra todas as expectativas, o laird e sua lady tivessem frequentemente
muito mais convidados do que os Highlands usualmente tinham. A surpresa de Audrey, no entanto,
de que havia móveis era mais do que compreensível.
— A fortaleza em si é mais formidável que eu esperava das Highlands. — Audrey
adicionou.
— Eu, também.
De repente, rosto de Audrey se enrugou e lágrimas apareceram em seus olhos.
— É assim que vai ser agora? Toda essa formalidade entre nós?
— Deus do céu, espero que não.
Audrey riu, o som um pouco fraco.
— Eu não pretendia machucar você. Ou te trair.
— Você teria contado sobre a natureza de meu próprio filho?
— Na verdade, eu esperava encontrar outros Chrechte e buscar conselho. Eu não gostava de
pensar que a perspectiva de minha mãe era a melhor.
— Por que não procurou o conselho de seu povo na Inglaterra? — Mas se os únicos
Chrechte que ela conhecia fossem os do bando de sua mãe, então talvez fosse como se Audrey não
tivesse buscado.
— Os Chrechte vivem principalmente nas Highlands, ou foi o que minha mãe disse. Seu
pequeno bando foi para o sul gerações atrás, entretanto eu não sei o por quê. Talvez por causa dos
Fearghall entre eles.
— O que você quer dizer?
— Eu não tenho certeza. — Mais uma vez Audrey parecia aflita, mas não por causa dela
neste momento, Shona pensou. — Eu sei tão pouco sobre nosso povo. Eu não sabia que nem todo
Chrechte pensava como minha mãe até que viemos para cá.
— Seu mundo foi tão usurpado quanto o meu. — Shona observou pensativa.
— Foi, mas estou contente. Eu sempre quis conhecer outros de minha espécie... encontrar
meu companheiro. — As lágrimas transbordaram.
Shona não podia aguentar mais e puxou sua querida amiga para seus braços.
— Venha, nem tudo está perdido. Ele claramente deseja ser... — Sua voz diminuiu quando
percebeu que não tinha palavras.
— O termo é companheiro, mas eu não me acasalarei se ele pensar que eu não tenho
nenhum valor por causa do país que nasci. — A expressão de Audrey se tornou rebelde. — Isto não
é nada diferente dos Fearghall.
— Você está certa.
— E ele não pode mudar o que disse. — O brilho combativo nos olhos de Audrey era
realmente muito divertido.
Apesar de que Shona nunca a deixaria saber disso.
— Não, ele não pode.
— Ele disse que é um Éan. — Audrey parecia impressionada por esse fato.
— O que isso quer dizer?
— Ele se transforma em um pássaro.
Shona se lembrou de algo assim sendo dito.
— De que tipo?
— Eu não sei... — A voz de Audrey parou e então seus olhos se iluminaram com certeza. —
A águia esta manhã. Era ele. Seu animal, pelo menos, mostrou sua aprovação por mim.
— Ele viu você nua! — Shona exclamou, sem estar certa do que pensar sobre um mundo
onde os animais não eram tão simples como ela sempre acreditou. Ela puxou a outra mulher de
forma que elas ficassem sentadas lado a lado na extremidade da cama. — Caelis disse que existem
poucos Chrechte, mas eu sinto como se eles estivessem por toda minha volta.
Audrey riu. Era um som baixo, mas definitivamente um divertido.
— Isto é muito compreensível. Mas pense, na fortaleza de seu marido e nas outras ao nosso
redor, não existia nenhum outro de nossa espécie.
— Como você sabe?
— Nós o teríamos cheirado.
— Então você pode dizer?
— Sim, o cheiro de um animal é muito sutil, mas está lá. Mamãe disse que alguns dos mais
fortes podiam mascarar seu odor.
Que alegação intrigante.
— Gostaria de saber se vocês poderiam identificar uns aos outros.
Audrey acenou com a cabeça, sua expressão se tornando confusa.
— Você disse a Caelis que não queria falar sobre os Chrechte.
— Na verdade, eu queria um pouco de distância de guerreiros gigantes e taciturnos. E uma
oportunidade de trabalhar as questões entre nós.
— Sim? — A loira perguntou esperançosa.
— Sim. Você é a irmã do meu coração. Além disso, eu não quero discutir as leis que ele
mencionou. Ele foi rápido o suficiente em descartá-las.
— Fazer isso deve ter lhe custo muito... ele deve ter sido verdadeiramente convencido de
que você não era sua companheira sagrada. — A mulher mais jovem mordeu seu lábio, olhando
para Shona com uma mistura de preocupação e seriedade.
— Nosso laird mentiu para ele. Uven disse a Caelis que como seu líder, ele podia dizer
quem era a companheira sagrada de Caelis e que eu não o era.
— Acho que teria acreditado em meu alfa alegasse tal coisa. — Audrey franziu a testa. —
Eu nunca tive um alfa, mas sinto os instintos para me submeter o que eu não sinto tão fortemente
em minha natureza humana.
— Os homens acreditam que todas as mulheres têm esse instinto.
— Só os homens tolos acreditam em uma coisa dessas.
— Este é um ensinamento da Igreja.
— Não diga ao padre John, mas eu não acredito que a Igreja esteja sempre certa.
Shona deu uma risadinha, um pouco de seu desespero diminuindo.
— Eu não acredito que esta seja uma preocupação que você precise ter. O padre John
dificilmente viajará para o norte selvagem da Escócia.
Além de estar em sua velhice, o homem jovial de batina com uma surpreendente tendência à
bondade era tão redondo como uma pedra e duas vezes mais pesado.
— Sabe, ele costumava deixar Thomas e eu compartilharmos o Sacramento da Comunhão.
Particularmente, é claro.
— Eu nunca entendi por que você não participava durante a missa. — Mas Shona achava
muitas das maneiras dos ingleses misteriosas.
— Nós não nascemos filhos naturais e muitos, inclusive o Barão, consideravam-nos
impróprios para participar dos sacramentos.
Shona balançou sua cabeça, nem mesmo comentando sobre a estupidez de seu falecido
marido. Audrey sabia agora que Shona discordava do homem em tantas coisas que era impossível
numerar todas elas.
— Nós ainda somos irmãs? — Audrey perguntou, sua voz baixa, uma vulnerabilidade de
partir o coração.
Shona só podia responder de uma maneira. E apesar de sua própria dor pelas mentiras de
Audrey e Thomas, ela percebeu que só existia uma maneira de responder.
— Aye.
— Obrigada. — Audrey apertou sua mão tão forte que Shona ofegou, mas ela não se
afastou.
— A família pode machucar um ao outro e ainda ser família.
— Como seus pais?
— Sim. Eles não me negaram mesmo eu os tendo ferido tão gravemente com meu
comportamento vergonhoso.
Audrey fez um som de discordância.
— Eu não estava falando sobre eles reivindicarem você. Eu quis dizer que você continuou a
reivindicá-los.
— Mas é claro que sim. Eles eram meus pais.
— Eles machucam você muito mais do que você os machucou.
— Eu tenho certeza que eles não viam desse modo.
— Então eles eram cegos.
— Nay. Eu acho que eles viram como realmente sou e ficaram desapontados. Tentaram me
criar melhor. — Sua mãe dizia isto com frequência.
E enquanto Shona foi casada com o Barão, ela pensou talvez que sua mãe estivesse errada.
Que seu comportamento quando jovem era uma aberração.
Ela certamente nunca sentiu o impulso para copular com o Barão que tinha para receber
Caelis em seu corpo. Mas isso, por si só levou a sua própria culpa.
Ela tinha o dever de compartilhar a cama de seu marido, mas odiava cada momento.
— O que você quer dizer? — Audrey perguntou. — Você é uma mulher que qualquer um
pode admirar.
Shona riu, o som tão duro como a dor em seu coração.
— Eu permiti Caelis em meu corpo quando ainda nem éramos noivos, e então ontem à
noite... — Ela não podia continuar, sua própria decepção em si mesma muito grande.
— Ele é seu companheiro verdadeiro.
— No modo Chrechte isso pode significar muito. Mas eu sou humana.
— Sim, mas, bem... — Audrey deu a Shona um olhar interrogativo. — Você se sentiu
obrigada?
— Sim, mas Audrey, eu não sei se isso foi por causa do lobo de Caelis que eu o
reivindiquei, ou simplesmente pelas emoções que pensei que que não existissem mais.
— Será que isso importa?
— Só para mim.
— Eu quero dizer... você vai se casar com ele agora, não vai?
— Eu não sei.
— Você não tem escolha... tem? — Audrey olhou para Shona e então afastou o olhar,
corando. — Eu quero dizer, você pode estar grávida novamente.
— Se os Chrechte fossem tão raros quanto Caelis disse que eles eram, fazer uma criança não
poderia ser tão fácil, mesmo para companheiros. — Eadan era verdadeiramente um milagre.
— Oh, eu tenho certeza que você está certa, mas ainda assim...
— Nós não fizemos aquilo. Ele insistiu em se conter. — Shona admitiu, tão desconfortável
com esta discussão quanto Audrey.
Mas diferentemente de seis anos atrás, pelo menos ela tinha outra mulher para conversar
sobre isto. Shona nunca teria se confidenciado com sua mãe.
— Ele está mostrando seu respeito por você? — Audrey disse em dúvida.
— Eu não estou tão certa se foi por respeito a mim ou uma tentativa de me atrair para um
acordo de casamento.
— Como ele se conter faria com que você fizesse isto? — Audrey perguntou com toda a
inocência de uma mulher que nunca foi beijada.
Shona sentiu o calor subindo em seu rosto.
— Eu não sei o que sua mãe lhe disse sobre o ato, mas há grande prazer nele para uma
mulher.
Prazer demais para Shona, de acordo com sua mãe.
— De verdade?
— Aye.
— Mamãe... ela só falou sobre isso nos termos de seu lobo, como sua fera não podia viver
sem seu companheiro, independente do custo para seu orgulho.
— Oh. Isso parece horrível.
Audrey deu de ombros.
— Ela não me parecia infeliz, embora eu fosse muito jovem quando ela morreu tentando dar
à luz a outro filho de meu pai.
— Considerando a vida que ela deve ter tido entre seu próprio povo, deixa-los para seguir
seu companheiro pode não ter sido a tragédia que ela imaginou que fosse.
— Mas odiava viver sem um bando. Ela me disse tantas vezes, falando que sentia muito que
eu não tivesse outra escolha senão seguir seus próprios passos.
— Estou certa de que há benefícios. Eu também senti falta de meu clã quando deixei a
Escócia. Existe segurança em viver entre aqueles que são família mesmo quando não são parentes,
mas existem problemas também. Entre os MacLeod, os problemas eram muito piores que as
bênçãos para um mera humana como eu.
Na época, ela acreditava que era simplesmente porque não fazia parte do círculo íntimo de
Uven. Bem, realmente não era, mas não por causa de qualquer motivo que ela poderia ter
imaginado.
— O que você acha que teremos em nosso futuro? — Audrey perguntou com um olhar de
saudade para porta.
— Eu não sei, mas independente do que o futuro nos trouxer, nós o enfrentaremos como
uma família.
Audrey apertou a mão dela.
— Família.
***
Caelis não era um covarde de vontade fraca pouco disposto a lutar, mas quando abriu sua
boca para dizer isso, ele não conseguiu pronunciar as palavras. Porque ele tinha se recusado a lutar
por Shona seis anos atrás.
Ele deixou sua companheira sagrada cuidar de si mesma enquanto carregava seu filho.
Caelis queria tanto a aprovação de Uven que ignorou seus sentimentos por Shona e fez como o laird
ordenou, repudiando-a completamente.
Seis anos atrás, Caelis tinha se sentido preso entre seu dever com seu bando e alfa e a
mulher que ele queria fazer sua companheira.
Ele estava novamente dividido em dois sentidos agora. Como poderia lutar por Shona
quando isso significava forçá-la a voltar a um clã que ela tão claramente desprezava ou abdicar de
suas próprias responsabilidades e as promessas que fez aos Cahir?
— Que diabos vocês estão fazendo? — Sinclair gritou enquanto se aproximava deles.
— Lutando. — Vegar disse, seu tom também grosseiro.
O Éan não reconhecia nenhum alfa além de seu príncipe e ainda estava se acostumando a
viver sob a autoridade do laird dentro dos clãs.
Os Éan juntaram-se aos clãs recentemente, tendo vivido secretamente na floresta sob o
reinado de sua família real nos últimos séculos. Os Faol perderam sua família real, ou a maior parte
dela, pela traição de MacAlpin.
Porém, um alfa do bando não era tão diferente de um príncipe, de acordo com o modo de
Caelis pensar.
E eles descobriram recentemente que alguns de seu próprio povo ainda carregavam o sangue
real dos Faol. Ele mesmo inclusive, se a evidência dos dons de seu filho pudesse ser acreditada.
— Quando dois guerreiros treinados lutam, eles não derramam sangue. — Talorc olhou com
desaprovação.
Caelis teria dito algo cortante em resposta, mas o laird estava certo. Não havia desculpa para
seu descuido e o de Vegar.
Vegar fez uma careta, com os olhos fixos em um ponto a distância.
— Esse negócio de acasalamento não é tão simples. Não me admira o fato de minha tribo
encorajar laços sem buscar seu verdadeiro companheiro.
— Os Éan tinham pouca escolha em sua casa isolada, mas agora que vocês vivem entre os
clãs, se Deus quiser, muitos do seu povo irão encontrar seus companheiros.
Vegar não parecia animado com a perspectiva. Caelis não podia culpá-lo. Ele não tinha a
menor vontade de desistir de Shona ou de seus filhos, mas também não apreciava as dificuldades
que seu vínculo criou em sua vida.
Talorc suspirou, sua expressão marcada pela compreensão inesperada.
— Abigail me fez persegui-la bastante.
— Ela foi ordenada a casar com você por seu rei. — Caelis não via como o laird podia ter
que perseguir a mulher.
— Mas um Chrechte deseja o coração de seu companheiro verdadeiro, não meras promessas
de fidelidade.
— Eu aceitaria as promessas. — Ele teve o coração de Shona uma vez.
Ele não tinha dúvida de que não seria oferecido novamente. Aquele órgão agora residia atrás
de uma parede impenetrável de amoreiras-preta espinhosas.
— É o que você pensa.
— Um guerreiro não tem nenhuma necessidade de envolvimentos sentimentais. — Vegar
soou muito certo para um homem muito facilmente distraído por encontrar sua companheira.
— Um guerreiro luta melhor quando ele tem algo de grande valor pelo que lutar. — Talorc
disse, citando a antiga tradição Faol.
— Isso se refere a nossa tribo, ou bando. Um Chrechte não foi feito para uma vida solitária.
— Você citou mais um ensinamento Chrechte, mas não o entende. — Talorc desembainhou
sua espada, ficando em uma posição de combate. — Venha lutar comigo e eu verei se você pode
manter seu sangue em suas veias.
Vegar e Caelis se moveram para tomar posições opostas a Talorc. Logo o som estridente do
confronto de metal podia ser ouvido novamente, desta vez, com mais frequência e com ritmo mais
controlado.
— O que você quer dizer com que eu não entendo nossos ensinamentos? — Vegar exigiu
enquanto avançava para o laird.
Talorc manteve sua postura defensiva, sem perder terreno para o ataque de Vegar.
— A primeira preocupação do guerreiro não é com sua tribo ou bando.
Vegar parou de se mover, o choque mantendo seu corpo rígido.
— Você não ensina isto a seus guerreiros.
— Eu ensino. — Talorc arqueou sua espada, pegou a de Vegar e jogou a outra lâmina na
terra como um galho. — Acasalamentos sagrados sobrepõem-se até mesmo ao nosso dever com o
bando.
— Mas...
— Um Chrechte pode sobreviver sem um bando, mas apenas em tormento, sem o seu
verdadeiro companheiro.
Caelis acenou com acordo antes de pensar sobre isto. Porém ele sentiu a necessidade para
assinalar.
— Amor não é necessário entre companheiros.
— Nay, mas ele torna a vida mais alegre quando existe.
— Você soa como uma mulher. — Caelis acusou.
Então, ele passou os próximos quinze minutos lutando contra um guerreiro que poderia ser
melhor do que ele no campo de batalha quando se opunham, mesmo com sua nova forma obtida
pela pedra sagrada. Porque Talorc também foi presenteado e ele era um lutador formidável.
A conexão de Ciara com a Faolchú Chridhe acabou por ser uma incrível bênção para os
Faol, particularmente para aqueles comprometidos com a luta contra o Fearghall.
***
Caelis estava sentado nos degraus que levavam ao castelo e limpava sua espada enquanto
tentava decidir se queria voltar para o lago para um mergulho para enxaguar o sangue, suor e sujeira
da luta, quando Eadan apareceu correndo.
Com os olhos brilhando de empolgação, Eadan chamou.
— Papai!
O coração de Caelis se apertou em seu peito e ele sorriu para seu filho.
— O que você está aprontando?
— Nós vamos procurar insetos. — E então o menino se lançou num discurso de que tipo de
insetos poderiam ser achados e onde.
As palavras excitadas saindo de seu lábios cessaram quando o olhar do filho de Caelis
caíram sobre o corte em seu braço.
— Você está ferido!
Caelis balançou a cabeça.
— Isto não é nada.
Eadan voltou-se para sua mãe, que caminhava um pouco atrás com Audrey e a pequena
Marjory.
— Mamãe, papai está sangrando.
Os belos olhos verdes de Shona escureceram com preocupação.
— O que aconteceu?
Talvez nem tudo estava perdido. Ela respondeu ao seu toque com toda a fome que mostrou
há seis anos e tinha pelo menos alguma consideração por seu bem-estar.
— Treino. — Caelis teria preferido não responder, mas não era nenhuma criança para fingir
não ter ouvido o que ele não gostaria de dizer.
A confusão de Shona brilhou claramente em seu rosto adorável.
— Eu achei que não deveriam derramar sangue durante a prática?
— Acontece.
— Não deveria. — Eadan olhou para cima, a preocupação gravada em suas feições de
menino. — Thomas disse isso.
— Thomas está certo. Com quem você estava lutando para sair marcado assim? — Shona
exigiu.
— Vegar.
Shona colocou as mãos em seus quadris.
— E você chama este homem de amigo?
— Não foi de propósito.
— Como pode não ter sido de propósito? Foi a mão dele na lâmina, não foi?
Apesar de seu próprio embaraço por seu mau desempenho no campo de treinamento, Caelis
lutou com um sorriso.
— Aye.
— Bem, então? — Shona bateu o pé contra a terra batida em frente ao castelo.
— Vegar tem seus próprios ferimentos. — Caelis respondeu, imaginando que iria diminuir a
ira da pequena megera.
— Vegar? Ele está ferido? — Audrey perguntou, seu tom subindo com cada palavra. — É
um ferimento grave?
— Não é provável. — Caelis bufou em descrença. — Ele está bem, é só um corte pequeno
como o meu.
— Onde ele está? — Audrey exigiu, nenhum pouco satisfeita.
Ela se virou e olhou para o campo de prática, como se o guerreiro fosse aparecer
magicamente.
Caelis não tinha certeza se queria contar à agitada inglesa que Vegar foi para o grande salão
para limpar a espada e discutir planos para a formação contínua dos Cahir entre os Sinclair.
— Onde está quem? — Vegar perguntou por trás de Caelis. — Seu irmão está lá dentro,
falando com o Sinclair.
Caelis olhou para trás por cima de seu ombro.
— A mulher está perguntando sobre você.
Vegar sorriu, satisfeito.
— Ela está agora? — Então sua expressão tornou-se azeda. — Ela não está tentando me
evitar, não é?
Ignorando sua brincadeira, Audrey se virou e correu para ele.
— Deixe-me ver.
— O que é que você gostaria de ver? — Vegar perguntou, parecendo confuso, pela primeira
vez em suas lembranças.
Ele não fez nenhum movimento para bloquear as mãos da mulher loira enquanto ela virava
seus braços até que descobriu o corte pequeno em sua coxa.
Ela corou quando percebeu onde seu companheiro foi ferido, mas não recuou.
— Isto deve ser tratado.
Vegar respondeu.
— Eu planejava lavar no lago.
— Você também vai lá se lavar. — Shona informou a Caelis.
Ele deu de ombros.
— Se isso vai agradá-la. Não há muito com o que se preocupar. — Mas ele gostou do fato
de que ela estava preocupada.
— Mesmo assim nós ainda iremos limpar e tratar com hamamélis.
— Nós? — Ele perguntou.
Ela revirou os olhos.
— Eu não deixarei você por conta própria. Não mostrou suficiente autopreservação para
evitar ser machucado em primeiro lugar. Eu não confiarei em você para cuidar dos resultados. Isso
perturbaria as crianças.
Eadan estava de cócoras olhando sob uma grande rocha que ele virou e cutucando os insetos
que ele encontrou lá com um galho. A pequena Marjory perseguia uma borboleta. Caelis não
achava que as crianças estavam particularmente preocupadas sobre seu pequeno ferimento.
No entanto, ele não discutiu.
— Nós iremos para o lago.
— Eu vou buscar a hamamélis. — Audrey disse decisivamente e então sorriu para a
menininha que caiu para alcançar o inseto esvoaçante. — Você gostaria de vir comigo, querida?
Marjory balançou a cabeça e olhou timidamente para Caelis e levantou os braços.
— Quero subir.
Ele estendeu a mão para ela, levantando-a mesmo quando Shona argumentou que ele estava
muito sujo.
— Ela é uma criança, não um vestido de seda. É só ela se lavar.
Marjory deu uma risadinha quando ele fez cócegas em sua barriga.
— Não é verdade, pequenina?
Ela acenou com veemência.
Eadan sorriu, fazendo o seu melhor para esconder a expressão melancólica no rosto, mas
Caelis conseguiu ler com fácil precisão. Ele estendeu a mão para seu filho.
Eadan a pegou imediatamente e Caelis jogou seu filho para cima e o girou para que ele
pudesse se sentar nos ombros largos do guerreiro. O grito de alegria do menino partiu o coração que
Caelis disse a Sinclair que não precisava de compromisso.
Este ferimento o deixaria sangrando mais do que a ponta da espada de Vegar fez, Caelis
tinha certeza.
Quanto ele permitiu que seu próprio falso pensamento custasse?
***
Shona terminou de tratar o corte de Caelis com a agrimônia que Abigail mandou com
Audrey junto com a hamamélis que ela insistiu em levar.
— Pronto, isso deve parar o inchaço.
— Isto é apenas uma pequena lesão. — Sua proximidade chamava seu lobo e sua libido.
Ele queria levá-la para a floresta e reclamá-la totalmente. Então, ela admitiria que estavam
destinados a ser uma família.
Só ele poderia tocá-la para o prazer.
Sua respiração ficou presa como se ela soubesse sobre seus pensamentos. Talvez soubesse.
Seu sexo endurecido empurrava o kilt para longe de seu corpo.
Ela inalou como se fosse um lobo e seu odor a atraísse.
— Até mesmo a menor lesão pode piorar.
— Eu sou Chrechte. — Ele passou a mão pelo lado de seu rosto. — Nós raramente ficamos
doentes.
Ela estremeceu, mas se segurou para não inclinar em seu toque.
— Preciso lembrá-lo novamente? Você não é nenhum deus, Caelis. Se os Chrechte nunca
adoecessem, todos ainda viveriam desde o primeiro que caminhou pela Terra.
— Nossas naturezas são violentas. — E sexuais.
Ele a queria tanto que até seus dentes doíam com isto.
— Aye, sem dúvida. Seu povo certamente perdeu muita gente para a guerra, mas a verdade
é...
— Ninguém vive para sempre, entretanto nós tendemos a viver por mais tempo. E nossos
companheiros conosco.
— Até companheiros humanos?
— Eu não sei, mas seguramente você notou que Abigail não mostra o envelhecimento de
uma mulher com sua idade.
— Ela não é velha.
— Ela é mais velha do que sua aparência sugere.
Shona pareceu pensativa.
— Por que será, eu me pergunto?
Ele deu de ombros. Apenas estava feliz que fosse assim. Os últimos seis anos não foram
difíceis o suficiente? Ele não queria pensar em como seria a velhice sem sua companheira ao seu
lado.
Embora não pudesse ter certeza agora de que ela não mais tivesse a intenção de fazê-lo viver
sem ela. Apesar da última noite.
Ela pôs a culpa daquilo em seu lobo e sua resposta à natureza da fera em Caelis.
Independentemente disso, a vida era bastante tênue nas Highlands, mesmo para os Chrechte.
Nisto, Shona estava certa.
— Existem alguns que vivem mais que outros, por décadas inteiras. São todos Chrechte?
— Aye, a maioria. — Ele não podia pensar num único humano que viveu em sua velhice
entre os MacLeod, mas isso podia ter mais a ver mais com a atitude de Uven com os seres humanos
do que qualquer outra coisa.
Shona se sentou na grama, sua atenção dividida entre ele e as crianças que ainda procuravam
por insetos próximos à água rasa com a supervisão de Vegar e Audrey. A maneira que Shona se
apoiou em seus braços colocou seus adoráveis seios à mostra e Caelis fez o que podia para não
aceitar o convite inconsciente.
Ela ajeitou sua saia, o veludo verde, sem dúvida, impressionante para os padrões ingleses,
mas não era o que ele queria vê-la vestindo. Ele a preferiria nua, mas além disto, vestindo um plaid
escocês adequado.
Ela deu-lhe um olhar de soslaio, com as mãos torcidas no tecido pesado de sua saia.
— Você disse que nós não tivemos muito tempo para discutir assuntos importantes.
E aqui estava, o momento do acerto de contas.
— Nós não tivemos.
— Por quê?
— Caelis! — Um dos soldados mais jovens de Sinclair veio correndo. — Vegar! Vocês
devem retornar ao castelo.
Caelis saltou para seus pés e então estendeu a mão para Shona se levantar também.
— O que está acontecendo? — Ela exigiu quando caiu contra ele, pois não esperava seu
movimento.
A sensação de seu corpo contra o dele empurrou contra a urgência de seguir a ordem de
Talorc para insistir inteiramente em outra urgência.
— Você ouviu. O laird ordenou que voltássemos para a fortaleza.
Shona não estava tão aflita.
— Mas por quê?
— Soldados MacLeod foram vistos nas terras Sinclair. — O jovem soldado respondeu
amavelmente com um sorriso para Shona que fez Caelis querer quebrar seus dentes.
— O quê? Por quê? — O corpo de Shona ficou rígido. — Eles não são bem-vindos?
— Eles definitivamente não são bem-vindos. — Ele a puxou para perto, pegando Eadan em
seus braços no caminho. — Eu disse a você, a filha de MacLeod buscou refúgio aqui no ano
passado.
Vegar já levava Marjory, sua mão livre se prendeu ao redor do pulso de Audrey enquanto
ele a puxava em direção ao castelo.
— Mas ela está vivendo com os Balmoral.
— E estes soldados MacLeod podem muito bem estar a caminho da ilha Balmoral. — Não
que eles fossem alcançá-la.
Eles entraram nas terras Sinclair sem permissão depois que seu laird declarou inimizade com
o clã. Os guerreiros definitivamente seriam detidos, mas permitir que Shona e sua família
permanecesse fora dos muros da fortaleza não era uma opção.
— Por que estamos correndo assim? — Audrey perguntou sem fôlego. — Eles não foram
avistados ao longe, como nós fomos?
— Nós não sabemos o quão distante o inimigo está e não podemos ter certeza de que os
vigias de Sinclair viram todos os que cruzaram nossas fronteiras. — Vegar segurou Marjory com
mais firmeza contra seu corpo e aumentou o ritmo.
Audrey tropeçou e quase caiu. Vegar não diminuiu a velocidade, mas rodeou sua cintura
com seu antebraço, erguendo-a e a carregando como ele fez com a criança. Mas ele manteve a
frente da mulher longe dele, seu traseiro pressionado contra seu quadril.
O grito indignado de Audrey foi cortado com um oomph quando Vegar a mudou de posição
para uma mais segura também.
Caelis olhou para Shona e ela olhou para trás.
— Nem mesmo considere isto.
Ele conteve o sorriso, mas não fez nenhum movimento para levantá-la do chão.
Audrey estava ocupada reclamando, mas pelo que Caelis podia ver, seu amigo águia
ignorava completamente as demandas furiosas da Faol para ser solta.
— Vegar é um guerreiro forte. — Eadan disse, admiração no tom do menino. — Audrey é
maior que eu.
— Aye, ela é. E mais barulhenta. — Caelis respondeu depois da mulher em questão soltar
um grito frustrado.
Shona pigarreou.
— Você não sabe o quão barulhenta ela pode ser, mas seu amigo bárbaro descobrirá logo se
ele não tiver cuidado.
***
A risada de Caelis por seu aviso deveria ter irritado Shona, mas ela se viu querendo sorrir
também.
O homem já era muito arrogante. Então, por que ela achava tão difícil de permanecer irritada
com ele?
Talvez fosse pelo modo que seu filho se divertia com o pai.
Sem aviso, Vegar soltou Audrey e Marjory no chão, puxando sua espada da bainha quase no
mesmo movimento.
Caelis soltou o pulso de Shona e retirou sua espada da bainha em suas costas.
— Fique entre nós.
— O que está acontecendo? — Shona exigiu enquanto se movia para obedecer sua instrução
urgente.
— Problemas.
Ela imaginou isto quando ele pegou sua arma. Mas resistiu ao impulso de dizer aquilo.
Ela e Audrey instintivamente colocaram as crianças entre elas, segurando pequenos punhais
em suas mãos para enfrentar qualquer dificuldade que estivesse se aproximando. Nunca lhe ocorreu
duvidar de que algo perigoso estava realmente chegando. Se o homem que compartilhava sua
natureza com um lobo disse, e seu amigo que podia subir ao céu como uma águia concordou, não
poderia haver dúvida em sua mente.
O soldado de Sinclair parou e se virou.
— O que vocês estão fazendo? Nós devemos seguir as ordens do laird.
— Nós temos um pequeno problema para resolver primeiro. — Caelis respondeu, seu olhar
afiado fixo na linha das árvores à sua esquerda.
Os olhos do soldado se arregalaram e ele olhou em volta como se esperasse que o bicho-
papão saltasse de trás de uma rocha. Ele também parecia mais do que disposto a aceitar a palavra do
guerreiro.
Audrey gemeu e Shona esticou seu pescoço para ver o que deixou sua amiga tão chateada.
Não era o bicho-papão. Pelo contrário, eram seis enormes lobos vindo para eles de todas as
direções, cada um rosnando baixo.
— Estes são mais de seus irmãos, certo? — Shona perguntou, orgulhosa de sua voz não
vacilar com o medo que ela sentia.
— Eles não são meus irmãos. — Caelis disse. — Não mais.
Vegar cuspiu no chão.
— Nem meus.
O jovem soldado começou a orar, seus olhos ficando selvagem, seus músculos tensos para
voar. Ou talvez ele tivesse a intenção de lutar ao lado dos guerreiros Chrechte. Ele pegou sua
própria adaga, mas seu medo era muito mais pronunciado do que o de Shona.
— Venha ficar entre nós. — Caelis ordenou ao jovem. — Você protegerá as mulheres no
caso de que um destes malditos lobos passem por Vegar ou por mim.
Shona não achava que o obviamente inexperiente soldado poderia defendê-las, mas não
disse nada. Caelis estava dando ao homem um caminho de relativa segurança que pouparia seu
orgulho.
De alguma forma.
— Ele não pode correr para pedir ajuda? — Audrey perguntou, sua própria voz trêmula, o
terror dela transformando o próprio tremor de Shona em fúria.
Os últimos meses foram difíceis o bastante para a jovem inglesa, Faol ou não.
— Ele não conseguiria antes deles o rasgarem em pedaços. — Vegar rosnou.
Caelis assentiu sem tirar os olhos dos lobos.
— Ele não é Chrechte.
Ele deve ter dito isso por causa de Shona, pois saberia que Audrey já estava ciente daquele
fato. Sua amiga deveria estar verdadeiramente assustada para ter feito aquela sugestão, conhecendo,
como ela o fazia, as habilidades dos lobos melhor do que a maioria.
O soldado Sinclair ficou visivelmente abalado com a ideia de ser feito em pedaços por lobos
e rapidamente fez seu caminho para ficar com as mulheres. Shona não o culpou.
E ela o respeitou ainda mais quando ele ajudou a ela e Audrey a criar uma barreira em
triângulo ao redor das crianças, sua adaga a postos, e as palavras “em guarda” saindo de seu lábios.
Ela ficou surpresa pelas crianças estarem tão tranquilas. Ela deu uma olhadela para baixo e
seu coração se encheu de orgulho.
Eadan estava confortando Marjory, com os braços ao redor de sua irmã.
— Tudo vai ficar bem, Margie. Papai nos protegerá.
Então ele começou a cantar para ela e sua doce voz infantil partiu o coração de Shona. Como
incrivelmente abençoada ela foi por ter essas crianças maravilhosas?
Ela olhou ao redor, notando que os lobos... todos os seis... chegaram mais perto.
Independente do quão intimidantes eles parecessem, em tamanho e número, ela se recusava
a acreditar que Caelis e Vegar não ganhariam o confronto.
Quando estavam a poucos metros de distância, o maior dos lobos mudou para sua forma
humana. Bem diante de seus olhos. A expressão cínica em seu rosto era tão malévola quanto sua
fera.
— Por seus pecados contra os Fearghall, você morrerá hoje, Caelis o traidor, e todos aqui
junto com você.
Caelis manteve-se firme, nenhum sinal de medo ou até mesmo de raiva com o insulto,
mostrava-se em suas feições ou no tom de sua voz.
— Os Fearghall estão errados, Maon. Os Chrechte estão destinadas a serem irmãos, não
importando sua raça.
Maon rosnou.
— Só os Faol são fortes o suficiente para sobreviver.
— Então explique o meu povo vivendo por todas estas gerações apesar dos esforços mais
desprezíveis dos Fearghall. — Vegar estava claramente irritado, mas como Caelis, nenhum sinal de
intimidação se mostrava nele.
— Éan sujo! — O guerreiro grande, e nu, cuspiu.
— Eu sou um guerreiro Chrechte com muita honra. Algo de que seu laird não tem nenhum
conhecimento. Ele impediu Caelis de ficar com sua companheira verdadeira.
O Chrechte MacLeod zombou.
— Isto é o que você diz.
— Isto é o que eu digo. — Shona falou mais alto, toda a raiva que ela sentiu pela forma
como estes canalhas assustaram seus filhos e Audrey em seu tom. — Eu sou sua companheira
verdadeira e meu filho é prova disto.
— Você disse a um humano sobre nós? — Maon perguntou com desgosto. — Ela terá que
morrer.
— Você já disse isto. — Shona assinalou, seu próprio tom mordaz.
Audrey deu uma cotovelada nela.
— Não discuta com eles.
— Por que não? Eles estão dispostos a nos atacar, não estão?
— Eu não sei por que eles estariam. — Audrey disse e olhou para Maon. — A filha de seu
laird não está com a gente.
Ou Audrey esqueceu a denúncia que Caelis fez segundos atrás por sua agitação, ou ela
estava deliberadamente ignorando-a.
— Nós não estamos aqui pela fêmea. Ela não tem um lobo e nenhum valor para o bando.
Não como você. Nós levaremos você conosco e poderá procriar para o bando.
Vegar fez um som que enviou calafrios pela espinha de Shona.
Maon agiu como se ele não tivesse ouvido.
— Uven recebeu a notícia de que dois de seus soldados que foram enviados para cá viviam,
mas não eram mais leais.
— Eu ainda visto as cores do clã. — Caelis se manteve orgulhoso, de nenhuma maneira
intimidado pela acusação do outro homem.
— Você não tem direito a elas!
— Eu tenho mais direito que Uven, e em breve, você vai saber.
— Quando você estiver morto, eu vou rasgar o plaid que está usando e o queimarei em cima
do seu cadáver.
Agora ele soava como um homem que foi treinado por Uven. Entretanto Shona não disse
nada, uma vez que Caelis também foi, a princípio.
O som de seu filho cantarolando alto deu a Shona o conforto da esperança de que sua filha,
pelo menos, não podia ouvir as terríveis palavras faladas. Mas com sua audição aguçada, Eadan
ouvia tudo.
E ainda assim, ele se manteve forte e corajoso.
Amor e orgulho maternais queimaram em seu peito.
— Eu sou tão valioso que Uven enviou seis de seus guerreiros mais fortes para saciar sua
necessidade por uma justiça distorcida? — Caelis zombou.
— Um guerreiro não precisa ter honra para ser um inimigo formidável.
— Ele tem mais honra do que você. — Shona cuspiu. — Ele não ameaça inocentes e
crianças.
— Ele a lançou na sombra de sua culpa. Responsabilize o traidor por seu destino.
— Você soa como Uven, não se responsabilizando pelo mal que comete.
Os olhos de Maon escureceram com algo que poderia ser dúvida, mas ele se transformou de
volta em lobo antes que Shona pudesse ter certeza.
De repente, sem nenhum sinal que pudesse ver, todos os seis lobos pularam para o ataque.
CAPÍTULO 14
A batalha foi sangrenta, mas Vegar e Caelis eram guerreiros incríveis, jogando os lobos
gigantes para longe com uma mão e cortando-os com suas espadas com a outra. Eles derramaram
sangue, mas não fizeram nenhuma ferida profunda. Ficou claro que Caelis e Vegar estavam
realmente tentando não matar os lobos, mas os MacLeods não tinham tal compunção.
Um conseguiu acertar sua garra profundamente no peito de Caelis e outros três atacaram
Vegar ao mesmo tempo, fazendo-o rolar debaixo deles.
Audrey gritou, o horror que sentia provando o laço já formado entre ela e o metamorfo
águia.
Um dos lobos arranhou a coxa de Vegar, tirando sangue.
Audrey escapou de seu triângulo defensivo e correu em direção à pilha de lobos e guerreiros.
Ela apunhalou um dos lobos com seu punhal. Ele se voltou para ela com um grunhido e lançou um
golpe, mandando-a de volta aos tropeços com sangue encharcando seu vestido pelos cortes em seu
ombro e braço.
Uma polegada para cima e o lobo teria cortado sua artéria. A amiga mais querida de Shona
teria sangrado até a morte, Chrechte ou não.
Fúria vinda do horror atravessou-a, mas diferente de Audrey, Shona não sairia de sua
posição protetora para com seus filhos. Não podia.
Um golpe de qualquer das garras letais dos lobos e seus filhos morreriam.
Isso só aconteceria sobre seu cadáver, e nenhum segundo antes.
Audrey se transformou em lobo, uma bonita criatura branca quase metade do tamanho
daqueles que estavam tentando matá-los.
Seu vestido caiu longe dela e apesar da diferença em seus tamanhos, ela atacou o lobo
novamente, desta vez com dentes e garras.
Vegar irrompeu da pilha de lobos, um sonoro grito de guerra no ar ao redor deles. Um saiu
voando. O outro rolou na direção oposta. Sua espada desceu diretamente para o coração do lobo que
ainda lutava com Audrey. Muito maior, e obviamente com maior experiência, o agora morto lobo
MacLeod poderia tê-la matado em um momento, mas não o fez.
Shona não entendeu.
Apesar do caos da batalha ao redor deles, Vegar afastou Audrey suavemente.
— Retorne para sua irmã de coração. Eu agradeço sua ajuda.
O homem rude subiu levemente na opinião de Shona naquele momento.
O lobo de Audrey obedientemente trotou de volta, o sangue em seu pelo atestando que o fato
de ter se transformado não curou imediatamente seus ferimentos. Esta era uma pergunta que Shona
teria que guardar para outro dia. Estava claro, porém, que seus ferimentos já não sangravam tão
profusamente.
Ainda na forma de lobo, Audrey retomou a sua posição como protetora dos filhos de Shona.
Vegar já havia retornado à batalha, o brilho de morte em seus olhos para aqueles que
pudessem se aproximar de sua companheira novamente. Os dois lobos que ele lançou longe agora
lutavam por suas vidas, em lugar de tentar tomar a dele.
Caelis estava lutando com os outros três, mas seu óbvio desejo de não matá-los não estava
fazendo nenhum favor a ele. Haviam pequenos cortes por todo seu corpo das presas e garras, mas
nada grave. O coração de Shona se alegrou e fez o seu melhor para convencer a si mesma de que
era porque ele estava entre seus filhos e os lobos que poderiam prejudicá-los.
Enquanto dois o mantinham ocupado, o outro veio correndo em direção de Shona, suas
presas babadas e afiadas a mostra.
O jovem soldado Sinclair moveu-se para frente dela assim que o lobo os alcançou, levando a
primeira mordida em seu antebraço. Ele lutou com o lobo valentemente, mas Shona sabia que não
iria segurar a fera por muito tempo.
Ela preparou sua adaga. Não podia mandar seus filhos correrem, apesar da tentação ser
grande.
Não havia nenhuma maneira de que as perninhas deles pudessem superar aqueles com a
intenção de fazer-lhes mal. Eadan e Marjory ficaram quietos. Com os olhos redondos de choque,
eles se agarraram um ao outro e se amontoaram perto de Audrey.
Deviam estar apavorados, mas pareciam mais ofuscados e claramente não tinham nenhum
medo da mulher que tinha se transformado em lobo.
Embora o filho de Shona tenha visto essas coisas em seus sonhos, sabe Deus por quanto
tempo.
Audrey se aproximou das crianças, ficando de pé sobre eles de forma protetora. Seus
próprios dentes a mostra, rosnados soavam de sua garganta suspeitosamente semelhantes aos que
Audrey fazia quando estava zangada com o barão.
Isto colocou uma nova luz sobre as alegações que fazia de que estava com raiva o suficiente
para arrancar os olhos do homem.
Shona mudou sua postura, preparada para entrar na briga entre o lobo e o soldado que
tentava bravamente protegê-la.
Um rugido profano soou, e um segundo depois o lobo que lutava com o jovem soldado saiu
voando, caindo todo quebrado a quase quinze metros de distância. A grande fera estalou seu
pescoço e lançou o lobo gigante como se ele pesasse nada mais do que uma bola pelos, ele farejou
em direção a Shona, seus olhos o mesmo azul violeta de Caelis.
E ela percebeu isto, este... homem-lobo era seu antigo amor.
Mal podia acreditar no que seus olhos lhe diziam. Esta criatura não era nada como o lobo
que Caelis mostrou a ela e ainda assim não poderia haver nenhuma dúvida em seu coração de que
eram o mesmo.
Choque a atravessou, deixando seus pulmões sem ar e seu coração acelerado.
De pé com mais de dois metros de altura e duas vezes mais largo que até mesmo o maior
guerreiro... como o homem Caelis, pelos cobrindo seu rosto e corpo, suas feições um cruzamento
entre lobo e homem. Suas mãos tinham cinco dedos, como um homem, mas cada dedo terminava
em uma garra tipo adaga. Seus pés eram iguais: cinco dedos terminados em garras afiadas que
poderiam fazer um buraco em um homem ou fera com eficiência brutal.
Ele ficou em pé, como um homem, seu torso, braços e pernas muito parecidos com a forma
humana, mas maiores. Muito maiores.
Os caninos longos que apareceram quando ele rosnou para um dos lobos que avançavam
rastejando eram como os de sua parte canina, mas seu focinho era levemente saliente, o homem por
trás da fera lá para ver se alguém estava olhando.
E Shona estava olhando.
Ela queria estender a mão e tocá-lo. Muito.
Esta fera maravilhosa era o pai de seu filho. Filhos, se ela acreditasse em sua intenção de
reivindicar Marjory.
O jovem soldado ao lado dela fez o sinal da cruz com seu braço bom antes de embalar o
outro perto de seu peito e começar a murmurar fervorosamente Ave-Marias.
Os lobos pararam seu ataque, três dos quatro Chrechte sobreviventes rastejaram perante
Caelis. O último, ela pensou que talvez fosse Maon, permaneceu afastado, seus pelos eriçados, seu
rosnado baixo ao mesmo tempo amedrontado e ameaçador.
Caelis ignorou a todos eles enquanto se movia para bem perto de Shona. Ele não a tocou,
mas ela podia sentir seu desejo de fazê-lo.
Ela estendeu a mão e pegou uma de suas grandes mãos na dela e levou-a para seu rosto,
colocando os dedos com ponta de garras contra sua bochecha.
O enorme corpo se acalmou completamente, o ar mal movendo seu peito para dentro e para
fora.
— Companheira?
A voz gutural não era humana, mas a palavra era compreensível. O que ele estava
perguntando não era.
Ela não sabia o que ele precisava, então deu-lhe o que queria. Ficou na ponta dos pés e
estendeu a mão para tocar o pelo claro que cobria seu rosto. Era macio ao toque dela, e a mandíbula
sob ele, forte e firme
Ela arrastou seus dedos pelo seu pescoço e por seu enorme e musculoso peito, coberto pelo
mesmo pelo castanho curto e suave.
— Que monstro maravilhoso você é.
— Monstro? — Ele perguntou com a aquele voz enrolada.
— Maravilhoso.
— Você não teme.
— Eu não tenho nada a temer.
O som de um rosnado maligno fez Caelis ficar tenso.
— Ele desafia você. — Vegar disse.
Caelis assentiu, embora sua atenção permanecesse em Shona.
Ela deu um passo para trás.
— Você tem coisas para resolver.
Seu olhar finalmente se afastou do dela, mas não para onde estava Maon que deixava clara
sua raiva contínua. Não, Caelis olhou para Marjory e Eadan.
O filho deles estava olhando para ele com admiração e uma profunda felicidade que Shona
não tinha certeza se entendia. Marjory não parecia mais preocupada do que Shona estava.
Era como se sua filha pequena sentisse que a grande fera era seu aliado e parecia confortada
por ela.
Caelis se ajoelhou e Shona teve que reprimir a vontade de rir. Será que ele achava que o
fazia menos intimidante? Ele ainda ficava maior que ela, e muito maior que as crianças.
Marjory não parecia se importar. Ela soltou seu irmão e se aproximou de Caelis sem
nenhum sinal de apreensão.
O soldado Sinclair fez menção de pegá-la de volta, mas um rosnado de Caelis o fez fugir
correndo. Sua coragem se mostrou, no entanto, no fato de que ele não continuou, mas permaneceu
nas proximidades.
— Ele não sabe que você é bom. — Marjory declarou com uma careta para o soldado.
— Eu não sou sempre bom, princesinha. — As palavras saíram um pouco truncadas pelo
tom gutural de Caelis, mas Marjory não parecia ter dificuldade para entender.
— Você é bom para mim.
— Sempre. — Ele prometeu.
Ela assentiu com a cabeça, tirando o dedo de sua boca e alcançando um de seus dedos
mindinhos. Ele a deixou envolver a mão ao redor dele, dando a Shona um olhar confuso.
Com certeza era uma expressão estranha em um semblante tão temível.
Eadan se aproximou.
— Eu serei como você um dia, papai.
Shona virou a cabeça para olhar para Caelis.
— Isto é verdade?
— Eu não sei.
— Eu sei. — Eadan disse enquanto se movia para o lado direito de seu pai e subia sobre o
joelho curvado. — Meus sonhos me disseram.
— Então vai acontecer.
— Eu tenho que salvar a celi di Paindeal. — Eadan disse com naturalidade.
— O quê? — Shona perguntou, sua voz diminuindo.
Eadan sorriu tranquilizador para ela de onde estava o que o deixava quase da altura de sua
mãe.
— Não por muito tempo ainda, mamãe. Não se preocupe.
Ela assentiu, inexplicavelmente contente de que seu filho tivesse apenas cinco anos de idade.
Qualquer destino que o chamasse, ela ainda tinha anos para amar e viver com ele como seu menino
querido.
Os grunhidos não tinham parado por todo o tempo que Caelis interagia com as crianças e
agora eles ficaram mais altos, o desafio neles óbvio, mesmo para Shona.
Caelis levantou as crianças em seus grandes braços e virou-se para o lobo desafiador
restante.
— Submeta-se. — Ele disse em um inconfundível comando.
Maon balançou a cabeça de seu lobo, corajoso, seus dentes arreganhados em ameaça.
O estúpido Chrechte olhou Caelis nos olhos até o homem-lobo de Shona soltar um rosnado
de gelar os ossos. Os outros lobos, incluindo Audrey, gemeram, mas o maior apenas se virou e saiu
correndo.
Caelis desceu as crianças para o chão e ordenou a Vegar.
— Vigie-os.
— Aye. — O Éan não pareceu ofendido pelo tom imperioso do outro homem.
Caelis virou-se para os três lobos encolhidos e apontou para o chão.
— Fiquem.
Nenhum sequer levantou a cabeça para a ordem, mas todos caíram completamente em suas
barrigas e... ficaram.
Caelis começou a perseguição do outro Chrechte que retrocedia, correndo mais rápido do
que ela já viu no homem ou fera. Mesmo após a vantagem que Caelis deu a Maon, colocando as
crianças no chão, ele facilmente alcançou o grande lobo. Caelis agarrou o lobo ruivo pelo pescoço e
apertou o animal.
Maon ficou mole e Caelis levou-o de volta ao grupo, onde os outros três lobos não haviam
se movido nem um milímetro de sua posição de submissão.
Caelis lançou Maon para o chão e então disse.
— Transformem-se!
Todos os quatro lobos mudaram para sua forma humana. A transição não foi menos mágica
por ela tê-la visto antes.
Shona reconheceu dois dos guerreiros, um da idade dela e outro mais jovem. Maon, o líder
autoproclamado, era três ou quatro anos mais jovem. Não tinha reconhecido imediatamente o jovem
que conheceu seis anos atrás como o homem irritado que ele se tornou.
Era certamente um guerreiro imponente, liderava homens mais velhos e jovens que ele.
Apenas um homem parecia um completo estranho para ela.
Ele parecia mais jovem, também, mas Shona sabia por Caelis que podia estar enganada.
Todos olhavam para Caelis com diferentes níveis de respeito... mesmo Maon, ainda que
atenuado por esta fúria que mostrou desde o momento que chegou em sua forma de logo.
— Você é conriocht. Não é possível. — Maon grunhiu, seu desafio suave.
A sobrancelha de Vegar subiu ironicamente. — E no entanto aqui está ele.
— Não existe mais nenhuma pedra sagrada para os Faol. Os Éan roubaram nossa Faolchú
Chridhe. — Maon olhou para Vegar com aversão, seu desgosto com a situação clara. — E você é
amigo deste aqui.
Caelis estapeou o homem, mandando-o de volta vários passos. — Ele é meu amigo e faria
bem em se lembrar disto.
— Espere até Uven ouvir sobre isto. Ele encontrará uma maneira de pará-lo. Eu poderia tê-
lo feito, se estes tolos não se submetessem. — Maon olhou para seus companheiros Chrechte.
— Ele é conriocht, guardião dos Faol escolhido pela Faolchú Chridhe, nossa própria pedra
sagrada, para ser nosso protetor e líder. — Disse o homem mais velho que Shona reconheceu. Ela
achava que seu nome era Sean.
— Se ele for o escolhido, seria com um propósito de cumprir a ordem dos Fearghall, mas
está vivendo aqui entre os Sinclair e os Éan. Ele é uma vergonha.
Desta vez, Caelis chutou o homem estupidamente teimoso, o seu rugido de fúria parou até
mesmo Shona. Não que ela tivesse medo dele, mas era uma fera impressionante. E ele
definitivamente estava com raiva.
— O que é um conriocht? — Audrey perguntou, sua voz desigual.
Shona nem notou que sua amiga mudou de volta para sua forma humana.
— É um termo antigo para lobisomem... homem e lobo combinados. — Vegar disse, seu
grande corpo bloqueando a nudez de Audrey da visão dos outros.
Interessante. Considerando a reação de Caelis mais cedo e a resposta de Audrey por ter sido
vista nua no lago por Vegar em sua forma de águia, Shona assumiu que os Chrechte se
preocupassem menos com a nudez do que suas contrapartes humanas.
Audrey colocou sua roupa de volta e falou com o tecido branco ainda sobre sua cabeça. Ela
parecia igualmente nervosa e fascinada pela forma selvagem de Caelis.
— Eu nunca ouvi falar de tal coisa.
— Antes de ontem, eu nunca tinha ouvido falar de... — Do que Caelis se chamou? Oh sim.
— Metamorfos.
Audrey respondeu.
— Mas nenhum tem três formas.
— Isto não é verdade. — Vegar disse. — Chrechte com pais de duas raças podem às vezes
mudar entre os dois animais, ambos lobo e pássaro. É raro, mas acontece.
— Sério? — A amiga loira de Shona conseguiu colocar a roupa no lugar.
Mas, honestamente, fazia pouco por sua modéstia, transparente como o tecido era.
Vegar também não parecia impressionado com suas propriedades de cobertura, e encarou
um dos Chrechte MacLeod cujo olhar se desviou de Caelis para Audrey.
Vegar balançou a cabeça em resposta à pergunta de Audrey, fazendo seu melhor para colar
suas feridas, mesmo enquanto ele a ajudava a cobrir-se com seu vestido.
Caelis permaneceu em pé em seus mais de dois metros, elevando-se sobre todos eles.
— Eu sou conriocht e reivindico meu direito como alfa dos MacLeod. Sigam-me.
Sean e os outros dois soldados MacLeod que se submeteram em forma de lobo
imediatamente ajoelharam-se com os punhos direitos apertados contra seus corações e cabeças
curvadas em direção a Caelis.
Maon permaneceu de pé, sua postura desafiadora, mas manteve distância de Caelis.
— Ou o quê? — Maon perguntou com um tom apenas um pouco menos antagônico.
— Ou você morre. Minha natureza conriocht será revelada por escolha minha e a nenhum
outro.
Shona queria protestar. Não a morte do homem odioso. Maon teria matado Caelis sem o
menor escrúpulo, e Shona também. Pior, ele teria matado ou roubado seus filhos. Nenhum destes
destinos ela desejaria para eles.
Nay, ela queria protestar a oportunidade de viver.
— Como você pode confiar em seu voto de fidelidade? Ou o de qualquer um deles, aliás?
Como avaliar o valor de um lobo quando ele tinha o coração enganoso de um homem?
Caelis olhou para ela, seus olhos azuis a única coisa familiar em seu rosto conriocht.
— Eu posso sentir o cheiro de uma mentira.
— Você não sentiu o cheiro deles se aproximando. Eles mascararam seu odor. — Audrey
assinalou, o terror pela proeza em seu tom.
— Em minha forma humana, eu não posso sentir o odor mascarado. Na minha forma de
lobo, isto quase nunca acontece. Como conriocht, eles não podem mentir para mim, ou mesmo
mascarar seus odores.
— Impossível! — Maon parecia impressionado, apesar de sua negação. — Ninguém pode
cheirar nossa passagem quando não quisermos.
Caelis o ignorou e olhou para Shona.
— Você terá que confiar em mim.
Ele queria que ela acreditasse nele quando descobriu seis anos atrás que fazê-lo era se
preparar para uma dor incalculável.
— A vida de meus filhos está em suas mãos.
— Nossos filhos. — A ferocidade de seu tom não admitia recusa.
Ela não deu uma a ele.
— Então não os arrisque.
— Você preferiria que eu os matasse sem piedade?
Ela se afastou antes que as palavras que a condenariam mais do que os lobos MacLeod
pudessem passar por seus lábios. Mas quando alguém tinha lhe mostrado misericórdia?
Caelis não tinha. Seus pais não tinham. Certamente, o Barão não, usando seu corpo quando
ele bem entendesse, apesar de saber que ela não queria. E o Barão atual levaria o que queria, sem
remorso, se ela estivvesse dentro de seu alcance.
Você é mais forte do que todos nós. As palavras estavam na voz de Caelis, mas elas não
foram faladas em voz alta.
Ela as ouviu em sua cabeça.
Um medo que não tomou conta dela durante ou depois de todas as revelações estranhas dos
últimos dias agora cresceu sobre ela como um espectro. Ela poderia suportar muito, mas o que
aconteceria com seus filhos, se perdesse a razão?
Uma mão peluda enorme pousou em seu ombro.
— Isto é laço de companheiros.
— O que é um laço de companheiros? — Audrey perguntou.
— Ele... eu... não... — Ela balançou a cabeça sem a capacidade de aceitar mais uma coisa
inacreditável, especialmente uma tão íntima e invasiva.
Se Caelis tinha acesso a sua mente, ele sabia exatamente o quanto ele a machucou seis anos
atrás. E ainda assim ele a repudiou.
Ele conheceu seu desespero, suas esperanças, seus medos e a rejeitou, apesar de tudo.
— Não. — Ele disse, a expressão da fera gigante aflita de um modo que ela não podia
compreender. — Eu não leio seus pensamentos.
— Você os está lendo agora! — Ela acusou.
Ele balançou a cabeça, um som que não era nenhuma palavra humana que ela já ouviu
saindo de sua boca.
Ela olhou em volta, imaginando por um momento terrível se nada daquilo era real. Ou
estava vivendo um sonho distorcido?
O impossível não acontecia. Ela acreditou porque viu. Mas e se tudo o que tinha visto eram
imaginações febris de uma mente perdida para a realidade? Ela deveria estar louca. Talvez isso
explicasse tudo, esse novo mundo que era muito maravilhoso para a vida mundana que levava.
Ela nunca pensou em ver Caelis novamente. Ele não a queria. Como podia acreditar que ele
estava realmente ali, reivindicando-a, a Eadan e a filha de outro homem?
Isto estava além da imaginação.
Mas ela imaginou isto.
— Estou sonhando. Você não está aqui. — Ela não pode evitar que suas palavras saíssem
mais como acusação do que uma declaração.
Seu guerreiro fantástico a fez acreditar.
— Och, moça, pare com isto. Eu estou aqui. Você está aqui. Isto não é nenhum sonho.
— Mas...
Ele balançou sua grande cabeça, com uma ternura que ela não viu nessas profundidades
azuis violetas por mais de seis anos.
— Você não está sonhando.
— Você...
Uma garra pressionou contra seus lábios com a suavidade de uma borboleta.
— Shh...
CAPÍTULO 15
Lágrimas brotaram nos olhos de Shona, embora ela não soubesse de onde. Certamente
estava chorando para afastar sua tensão.
A mão de Caelis moveu-se para tocar seu rosto, a palma tão grande que cobria parte de sua
têmpora e pescoço.
— Você é minha. E não vou permitir que seja prejudicada.
Vegar bufou.
— Aye, você é certamente sua companheira. Sob nenhuma outra circunstância ele iria
revelar seu conriocht tão depressa.
— Mas... — Ela olhou para os olhos azuis hipnotizantes. — Eu ouvi sua voz. Dentro de
minha mente. Você sabe que eu ouvi.
— Aye.
— Isto não é normal.
— Estou diante de vocês como um conriocht. “Normal” não define sua vida agora, se é que
já o fez.
— Mas...
Você é minha. Ele disse novamente. Dentro de sua mente.
Ela se afastou dele, seu toque era demais naquele momento em que ela temia uma conexão
de tal magnitude que poderia muito bem perder-se nela.
— Você pode ouvir meus pensamentos?
— Só quando você os dirige a mim.
— Mas eu não o fiz... o que eu estava pensando. Você sabia.
Ele deu de ombros.
— Eu não entendo isto, mas era como se cada pensamento fosse uma acusação sua para
mim.
— Eu quis dizer isto, mas me contive.
Ele balançou a cabeça, como se isso explicasse tudo. Ela não sabia se o fazia, mas se essa
conversa pela mente entre companheiros era real, então Shona teria que ser muito mais cuidadosa
com o que ela pensasse ruidosamente ao redor dele.
— Então o que faremos com eles? — Vegar perguntou.
— Leve-os de volta para o castelo.
— E depois? — Audrey perguntou como Shona queria fazer.
— Então nós estendemos a clemência e a oportunidade para submissão, como as leis
Chrechte antigas ordenam.
— Eles não tiveram nenhuma clemência conosco. — E se a lei Chrechte era tão
misericordiosa, então como tantos de sua espécie morreram em guerras como ele alegou?
Claro, dois lobos jaziam mortos na clareira. Homens que nunca retornariam para suas
famílias ou casas. Homens, Shona de repente percebeu, que ela provavelmente conheceu.
O pensamento a deixou enjoada mesmo enquanto se preocupava que permitindo que os
outros vivessem colocaria seus filhos em risco.
— Mamãe, papai fará tudo certo. — Eadan disse.
Shona olhou para seu filho e tentou sorrir. O olhar preocupado dele indicava que sua
tentativa não foi bem sucedida.
— Estes homens foram ensinados a desprezar os modos honrados. — Caelis olhou com
remorso para seu filho. — Como eu fui. Eu aprendi uma nova maneira. Talvez eles também
possam.
Audrey não respondeu e Shona não tinha nada a acrescentar. Caelis alegou que ela era mais
forte do que a necessidade de retirar misericórdia.
Talvez ele estivesse certo.
Mas naquele momento, estava satisfeita que a decisão não fosse dela.
— Vamos para a floresta. Vegar, vá para a fortaleza e busque mais soldados Sinclair.
— E algo para cobrir os homens. Eles estão nus. — Audrey assinalou como se ninguém
mais houvesse percebido ainda.
Então, ela ainda tinha a modéstia que Shona sempre pensou ser uma parte profunda da
mulher mais jovem. Ela tinha simplesmente... o quê? Aceito Vegar vê-la nua porque eles eram
companheiros?
Ela ainda precisava de muitas respostas para este negócio de acasalamento.
— Leve as crianças com você. — Shona implorou para Vegar. — Por favor.
— Não, mamãe. Nós precisamos ficar com você e papai. — Eadan imediatamente negou,
agarrando seu pai com o primeiro sinal de medo verdadeiro que Shona viu em seu filho neste tempo
todo.
Caelis ergueu o menino sem hesitação, dizendo algo em uma voz baixa que trouxe um
sorriso aliviado para feições de Eadan e um aceno de concordância.
Marjory agarrou a perna do conriocht, seu dedo na boca. A mão gigante de Caelis descansou
cuidadosamente em sua cabeça, o gesto gentil e claramente protetor. Nenhuma das crianças mostrou
sinais de estarem chateadas pelo que testemunharam, entretanto ambos obviamente não queriam ser
separados de seu salvador.
Considerando que seu filho quase não sobreviveu às maquinações de seu meio-irmão e
Marjory passou duas semanas fugindo com sua mãe e amigos, eles poderiam muito bem estar
considerando este dia menos perturbador do que Shona.
— O cachorro grande nos mantém seguros. — Marjory disse ao redor de seu polegar.
Shona se pegou rindo e estava contente por ver que Caelis estava também. Era um som
estranho, mais gutural vindo de sua garganta conriocht, mas diversão reluzia em seus olhos. Ele
claramente não estava ofendido por ser chamado de cachorro.
Eadan franziu o cenho.
— Ele não é um cachorro, Margie. Ele é nosso pai.
Marjory não parecia muito preocupada com a reprimenda do irmão.
Não havia nenhum jovialidade na expressão de Caelis quando ele fixou seu olhar nos
Chrechte MacLeod.
— Nós entraremos na floresta e aguardaremos os outros soldados.
— Por quê? Você vai nos matar de qualquer maneira. — Era Maon, claro.
Incrivelmente, Caelis riu novamente.
— Não se atreva a falar por seus companheiros Faol. Eles já se ajoelharam para mim. Tudo
que falta é que eles falem seus votos. Você não é mais o líder e você nunca foi seu alfa. Foram
ensinadas mentiram para eles e para você, mas eles reconhecem a verdade quando a veem.
Maon se calou.
Por insistência de Vegar, Audrey concordou em partir com ele. Ele queria ver seus
ferimentos tratados imediatamente. O jovem soldado Sinclair também partiu, sua fervorosa oração
finalmente cessando, uma expressão de dor torcendo suas feições inexperientes.
Caelis colocou a mão no ombro do soldado e o Sinclair ganhou ainda mais o respeito de
Shona quando ele mal estremeceu com o contato.
— Diga a Sinclair que tenho uma dívida de gratidão e honra com este homem.
O soldado olhou para o volumoso conriocht com choque.
Caelis encontrou seu olhar.
— Você se colocou entre minha companheira e o perigo. Esta é uma dívida que jamais será
completamente recompensada.
— Ensine-me a lutar contra os lobos. — Disse o jovem soldado.
— Por quê?
— Para defender melhor o meu laird e nosso clã.
— No momento certo, você treinará com os Chrechte, assim como todos seus soldados
fazem.
— Isto não o mesmo. Nós não sabemos suas verdadeiras naturezas quando treinamos.
— Você acredita que pode aprender a vencer um guerreiro Chrechte em sua forma de fera na
batalha?
— Se você me ensinar, eu posso.
— Você tem o coração para isto. Eu o treinarei.
— Você não pode fazer isto! — Maon exclamou.
Caelis se virou e olhou para o homem, sua mão se apertou a seu lado.
— Não me desafie. Minha paciência com você está no limite.
Maon ficou em silêncio, sua expressão rebelde.
Shona não poderia deixar de admirar a teimosa determinação do outro homem, mesmo que
ele estivesse mais equivocado que seu enteado, Percival, e seu pai juntos.
Shona pegou a mão de Marjory e a levou em direção à floresta, surpresa, mesmo que
entendendo, quando os outros a seguiram, Caelis vinha atrás com Eadan ainda em seu braço.
Apesar da aparente submissão dos homens, Shona manteve Marjory bem longe dos
MacLeods que estiveram dispostos a matá-los.
Sua cabeça estava muito cheia com seus próprios pensamentos para ouvir Caelis enquanto
ele falava com aquela estranha voz gutural para os homens que ele costumava chamar de amigos.
Ela estava parcialmente ciente de que ele conversava sobre coisas como as leis sagradas Chrechte,
os Fearghall e algo que se referiu como Cahir.
Os três que já tinham mostrado submissão a Caelis em suas formas de lobo ouviam com
muito mais atenção do que Shona. Maon discutia e insultava e ainda assim, Shona começou a
perceber que ele queria acreditar.
E foi aí que ela colocou suas próprias preocupações de lado e começou a escutar também.
— Está chegando um tempo, que não será em nossa época, mas na dos filhos de nossos
filhos, que uma grande praga virá ao povo de nossas nações. Uma enfermidade tão grande eliminará
bandos inteiros como se eles nunca houvessem existido. Sem a nossa pedra sagrada e a ajuda dos
curandeiros, os Chrechte não existirão mais.
Maon franziu o cenho.
— Nós temos curandeiros entre os Faol.
— Não o suficiente. Nós precisaremos dos Éan e dos Paindeal.
— Os Paindeal. — Maon ridicularizou. — Eles são lenda e nada mais.
— Isso é o que a maioria dos clãs acreditavam sobre os Éan antes deles conhecerem a
verdade. — Caelis disse.
— O que você quer dizer? — Shona não podia deixar de perguntar.
— Até um ano atrás, os Éan viviam como fantasmas na floresta distante.
— Por quê?
— Por causa dos Fearghall. — Maon respondeu, entretanto ele não soava tão orgulhoso
desse fato como ela teria esperado.
— Eles não estão seguros, agora que estão entre os clãs?
— Os Éan somente estarão seguros quando os Fearghall deixarem de existir.
— Isso nunca acontecerá. — Maon ridicularizou.
— Você acha que não? — Caelis desafiou.
— Ele está certo. — Shona se moveu cautelosamente ao redor dos homens Chrechte para
que ela e Marjory pudessem se sentar do outro lado de Caelis. — Enquanto houver ódio entre os
homens, pessoas como os Fearghall existirão.
Caelis fez um estrondo infeliz em concordância.
— Mas nós faremos nosso melhor para expô-los entre os Chrechte e ajudar àqueles a quem
foram ensinados mentiras a conhecer a verdade.
Era um objetivo louvável, mas não acreditava que todos Fearghall estivessem mal
orientados. Uven era um excelente exemplo.
Aquele homem ficou muito contente de acreditar-se superior aos outros. Ele teria sido um
terrível laird mesmo se fosse inteiramente humano.
— Os Paindeal desapareceram antes dos Éan roubarem nossa pedra sagrada e os Fearghall
serem criados para encontrá-la e devolvê-la aos Faol.
— Os Fearghall passaram muito tempo caçando os Éan para estar caçando a Faolchú
Chridhe.
— Os Éan a destruíram. — Mesmo Maon não parecia convencido por seu próprio
argumento.
Claro, de acordo com o homem, Caelis não podia ser conriocht sem ela. Então, sua própria
existência era prova que esta pedra sagrada ainda existia e era acessível para os Faol.
— Os Paindeal e a Faolchú Chridhe existem. — Não havia dúvida de que Caelis acreditava
no que estava dizendo. — Assim como os Éan.
— Mas nós sempre soubemos que os Éan existiam.
— E os Éan nunca esqueceram os Paindeal, e nem alguns dos Faol.
— Então, o quê? Temos que correr atrás de um mito? — Maon exigiu.
— Aye, e encontrá-los se quisermos salvar os filhos de nossos filhos.
— Você diz que Uven o impediu de ficar com sua companheira verdadeira? — Sean
perguntou.
Maon olhou para o chão da floresta.
— Ele disse que você era muito teimoso para cumprir seu dever para com o nosso povo.
— Como posso eu, um homem Chrechte, cumprir este dever uma vez que eu acasalei e
forjei o laço sagrado? — Caelis perguntou.
— Você não podia. — Um dos outros homens disse. — E Uven sabia disto.
Aparentemente, pelo tom de voz do homem, este era um fato bem conhecido entre os
Chrechte.
Esta prova de que Caelis não mentiu para ela sobre seus últimos seis anos de celibato era
algo que ela guardou para contemplar mais tarde.
— Por isto ele me mandou não copular com Shona, mas já era tarde demais. — O enorme
braço de Caelis se prendeu nos ombros dela.
— Você mentiu para ele. — Sean disse num tom que Shona não entendeu.
Era quase como se ele admirasse Caelis por fazer isso.
— Aye. E ele nunca soube de meu engano.
— Isto é impossível. — Maon afirmou. — Nosso alfa poderia cheirar sua mentira
independente do quanto você tentasse mascarar.
— Ele não é mais seu alfa.
E Shona começou a entender intenções de Caelis e sua necessidade de retornar ao clã
MacLeod. Ele não iria voltar meramente para se vingar de um laird que mentiu e colocou as
necessidades de seu povo por último. Caelis queria salvar outros de ter o mesmo destino. Ele queria
liderar o povo MacLeod com a força, a coragem e abnegação que Uven deveria ter mostrado.
— Isto é o que você diz. — As palavras de Maon eram desafiantes, mas sua convicção
diminuía com cada declaração.
Shona quase sentiu pena dele. Até que ela se lembrou de que ele ameaçou matar seus filhos.
— Você realmente acha que ele vai sobreviver a meu desafio? — Caelis perguntou com
mais humor do que Shona sentia.
— De acordo com suas palavras, você nos permitirá viver.
— Uven é mais traiçoeiro. Ele conquistou sua morte, quando ela vier. — Não havia
misericórdia na voz de Caelis agora.
Aparentemente, a lei Chrechte de misericórdia não se estendia aos alfas déspotas.
— Porque ele afastou sua companheira de você? — Maon perguntou.
— Porque ele matou companheiros, não apenas os afastou. Porque ele assassinou Éan,
humanos e Faol indiscriminadamente sempre que eles entravam em seu caminho. Meus próprios
pais foram vítimas de sua deslealdade e ele ousou se colocar em minha vida como substituto de meu
pai. Porque ele mente e ensina mentiras como se fossem verdade, sabendo que são mentiras.
Ela não achava que os outros ouviram a dor nos tons graves do conriocht, mas ele alcançou
o coração que ela tentou tão duramente proteger nestes últimos seis anos. Não queria sentir
compaixão por ele, não queria sentir sua dor.
Mas não podia mais evitar, como quando Eadan ralou o joelho e o dela doeu em simpatia.
— Uven acredita no que ele ensina. — Sean afirmou.
Maon empalideceu e parecia prestes a perder tudo o que ele comeu no café da manha
naquele dia.
— Nay. Ele sabe a verdade. Nós somos tão fortes quanto nosso elo mais fraco. E sem nossa
pedra sagrada, os Faol eram o elo mais fraco na família Chrechte por séculos.
Maon balançou a cabeça. — Não.
— Aye.
Maon não discutiu novamente. Ele se calou, sua expressão ficando pensativa. De uma forma
completamente ranzinza. Como se ele estivesse reconhecendo suas ideias erradas, ainda que apenas
em sua mente, ele certamente não estava feliz com isso.
Era essa a resposta exigida para os homens Chrechte, ela perguntou-se. Ser irritado e mal-
humorado a maior parte do tempo? Shona se pegou rindo da ideia não tão absurda.
Caelis olhou para ela com preocupação e um desejo que ela não entendia.
— O que a diverte?
— A natureza dos Chrechte.
— Você quer dizer nossos lobos? — Sean perguntou, soando perplexo.
— Eu quero dizer o fato de todos vocês parecem muito rabugentos, ou pelo menos os
homens são. — Audrey não era tão intratável.
Caelis deu de ombros, seus ombros volumosos fazendo até aquele pequeno movimento
impressionante e quase derrubando-a no processo.
— Nós compartilhamos nossas naturezas com um lobo.
— Você compartilha a sua com mais. — E ele não disse a ela. Mais uma vez.
Novamente ele pareceu ler seus pensamentos.
— Você não tem medo de mim assim.
— Não. Você ainda é Caelis.
— Eu pensei que teria.
Assim, ele não mostrou o monstro maravilhoso. Por medo? Ela não podia imaginar este ser
mágico tendo tais preocupações.
Ou talvez, ele simplesmente não podia mostrar a ela como fez com o lobo.
— Você pode mudar para conriocht à vontade?
— Aye, entretanto mudar de volta não pode acontecer tão rapidamente.
— Por quê?
— Eu não sei. Pode ser porque quando nossa raça foi criada, um conriocht foi feito para
passar o tempo todo nesta forma, para melhor proteger o nosso povo.
— Você pode mudar de volta agora? — Ela quis saber.
— Não enquanto ainda existe ameaça.
— Nós nos submetemos a você. — Sean disse. — Nós não prejudicaríamos sua
companheira ou filho.
— Tanto Eadan quanto Marjory são meus. — Caelis grunhiu.
Sean assentiu rapidamente.
— Como deveria ser.
Maon fez um som de escárnio.
— Você não concorda? — Shona perguntou, pronta para defender seus filhos até mesmo
contra um homem que se transformava em um lobo.
Sua fera não era nada comparada a fera que afirmou lealdade a ela. E como com seu lobo,
Shona achava muito fácil confiar no conriocht de Caelis, ainda que ela ainda não pudesse confiar no
homem.
— Os Fearghall são ensinados que não há valor na humanidade. — Maon disse. — Uma
criança humana não seria reivindicada por um guerreiro Chrechte sob a sua autoridade.
— A própria filha de Uven era humana. — Caelis disse.
— Era? — Sean perguntou.
Caelis deu ao outro Chrechte um olhar avaliador.
— Ela se transforma agora, graças a seu companheiro Éan e nossa pedra sagrada.
— Como seu companheiro poderia atrair o poder de nossa pedra? — O guerreiro que Shona
não conhecia perguntou.
— Ele não o fez.
— Então por que dizer graças a ele? — Maon perguntou, por uma vez soando mais curioso
do que antagônico.
— Ele salvou sua vida depois que seu pai e Ualraig, o canalha que o pai dela designou que
se acasalasse com ela, bateram nela e deixaram-na para morrer.
Shona notou que nenhum dos homens parecia surpreso com a notícia, mas também não
pareciam confortáveis com isto.
— Foi ele quem matou Ualraig? — Maon perguntou.
— Você está tão certo que Ualraig está morto e não é um desertor como eu?
— Não restou nada além de cinzas dos nossos guerreiros, mas nós sabemos a diferença entre
cinzas humanas e sujeira.
— Aye, Laith o matou.
— Ualraig era o soldado mais poderoso de Uven.
— Nay, ele não era.
— Você o venceu muitas vezes nos treinos, mas Uven nunca promoveu você a seu segundo.
— Maon observou, novamente sem a raiva evidente.
— Aye. Eu não me acasalaria com outro Chrechte, muito menos com a pobre filha do
homem.
— Você não podia.
— Ele não sabia disto.
— Ele o teria matado se soubesse. — Não havia dúvida na voz de Maon, ou no rosto dos
outros três.
Shona estremeceu. Este mundo era novo para ela e havia muitas coisas sobre ele que ainda
não entendia, mas ela foi atingida com a certeza de que Uven teria matado seu companheiro se o
laird soubesse da união entre Caelis e Shona.
— Ele não poderia matar o meu pai. — Eadan disse resolutamente.
— Nay, ele não pode agora e o passado não importa. — Caelis concordou.
Maon assentiu, chocando Shona.
— Você é o novo segundo de Uven? — Caelis perguntou a Maon.
— Não.
— Por que não? — Shona não se conteve de perguntar.
A curiosidade muitas vezes a guiava quando ela deveria deixar para lá.
— Eu recusei a tarefa de ir atrás de sua filha.
— O quê? — Mesmo em sua voz não muito humana, o choque de Caelis era palpável.
— Ele não era um bom pai para sua filha humana.
— No entanto, você teria matado meus filhos. — Disse Shona com mais confusão do que
raiva.
Ela estava duvidando de suas próprias palavras, mesmo enquanto as falava.
— Chrechte não mata crianças.
— Você disse...
— O que eu acreditei que enfraqueceria meu oponente com emoção.
— Oh.
— Jon não matou a mulher.
— Audrey. Ele poderia. — Shona pensou nisso naquele momento.
— Aye.
— Vegar não iria correr o risco.
— Um homem protege sua companheira. — O encolher de ombros de Maon deveria ter sido
casual, mas havia um ar de tristeza nele.
E Shona se lembrou de algo de seu antigo clã.
— Jon era seu irmão mais novo.
— Muito jovem para vir nesta busca.
— Mas Uven o mandou de qualquer maneira. E você defende o homem. — Shona não
conseguia entender.
— Ele era meu alfa. Não era minha função questioná-lo.
— Você disse era.
Maon olhou para Caelis e então para longe.
— Um Chrechte de honra valoriza toda a vida. Um alfa merecedor de lealdade estende sua
proteção e sua consideração para aqueles que juram lealdade a ele. — Caelis falou guturalmente,
mas Shona nunca o ouviu dizer palavras mais humanitárias.
— Membros de nosso clã sofrem com fome enquanto Uven enche sua barriga com as presas.
Caelis grunhiu, mas não deu nenhuma outra resposta a essa afirmação.
Maon olhou para ele.
— Para ser conriocht, a pedra tinha que achar você merecedor.
— O fabricante da pedra, sim. A pedra é apenas uma maneira de nos conectarmos ao nosso
Criador.
— Você é Fearghall.
— Eu aceitei a verdade quando a ouvi.
Maon assentiu.
— Assumir o comando do clã não será fácil. Alguns deverão morrer.
— Menos do que se o clã ficasse nas mãos de um homem sem escrúpulos.
— Era disto que você estava falando mais cedo, não é? — Shona perguntou a Caelis, certa
em seu coração.
— Aye.
— Papai é alfa. — Eadan disse.
— Você está certo disto, não é, menino? — Sean perguntou com um sorriso.
Caelis grunhiu, entretanto Shona não entendeu o porquê.
Sean se encolheu, mas sorriu.
— Eu não estava questionando sua condição de alfa, conriocht.
De repente, Shona se viu sentada sozinha com os dois filhos, seu companheiro rosnando
sobre todos eles.
— Eu o adverti: posso cheirar uma mentira.
Sean levantou-se, mudando para a forma de lobo num piscar de olhos. Ele não atacou
Caelis, mas correu na outra direção.
Caelis olhou na direção dele, ela podia ver seu corpo inteiro tenso com a necessidade de
seguir.
— Vá atrás dele. — Ela instruiu.
— Não. — A fúria em seu tom fez a palavra soar mais um latido do que qualquer coisa
reconhecível.
Ele não deixaria a ela e as crianças desprotegidas.
— Os soldados Sinclair logo chegarão aqui. Então eu os seguirei.
De repente, um outro lobo listrado passou, que ela reconheceu como Maon. Ela pensou que
ele estivesse indo para o lado deles, entretanto também pensou que Sean já estivesse completamente
conquistado.
O som de um latido alto foi ouvido, então galhos se quebrando, grunhidos e ganidos,
seguido por um uivo cortaram seus pensamentos.
Maon apareceu de volta trotando um momento depois, seu focinho coberto de sangue, seus
pelos ainda eriçados.
Caelis agachou-se e recebeu o lobo com tapinhas das mãos em sua enorme fera, rosnados e
sussurros que não poderia ser nada mais do que elogios e agradecimentos. Embora Shona não
pretendesse falar a língua dos lobos.
Caelis levantou-se.
— Há um riacho por ali. Vá lavar o sangue da batalha.
O lobo obedeceu e Shona reprimiu o desejo de ressaltar que ele ainda não tinha jurado
fidelidade. Sean tinha, mas sem convicção.
Caelis virou-se para os dois lobos restantes.
— A lei Chrechte afirma que minha companheira e família são o mais importante. Falem de
sua intenção de nos seguir ou desafiem-me agora.
O homem que Shona nunca conheceu se levantou.
— Eu não sou do clã MacLeod.
— E ainda assim você faz o que o laird manda.
— Eu fui ordenado por meu alfa para acompanhar os outros nesta tarefa.
— Para me destruir.
— E o outro que Uven considera um desertor.
— Nós deveríamos levar você de volta. — Disse o outro Chrechte MacLeod.
— Para quê? — Shona tinha que saber.
— Para fazer seu companheiro e o outro de exemplo.
Ela franziu o cenho.
— Por que você não o nomeia?
Será que esse homem se achava bom demais para falar o nome de outro que ele considerava
um desertor?
— Nós não sabemos qual dos guerreiros vive.
— Oh.
Caelis não disse o nome de seu companheiro soldado. Ele olhou para baixo, para os dois
homens.
— Escolham agora.
— Eu não posso jurar lealdade. — Disse o que não era MacLeod, mas ergueu a mão em
súplica ao grunhido de Caelis. — Eu fui criado como Fearghall desde meu nascimento. Você exige
que eu abandone meus irmãos. O meu pai.
— Ele é o alfa do bando. — Shona adivinhou.
O homem pareceu surpreso por sua percepção.
Ela revirou os olhos.
— Eu sou uma mulher humana, não uma idiota.
— Eu dou minha palavra de que nenhum mal virá para você, sua companheira ou sua
família pela minha mão ou instigação. — O homem colocou a mão sobre o coração e inclinou sua
cabeça novamente. — Você é conriocht, abençoado por tudo o que é sagrado.
Caelis assentiu.
— Eu aceito, mas você não ficará livre.
O homem não pareceu nada surpreso pelo pronunciamento de Caelis.
— E vocês? — Caelis exigiu dos outros soldados.
Os dois homens se ajoelharam e curvaram suas cabeças, falando votos em que seu pai havia
dito uma vez era a língua antiga. Ela achou que fosse gaélico antigo. Agora sabia a verdade.
Era sem nenhuma dúvida o idioma original do povo deles.
Caelis relaxou levemente e grunhiu de volta para eles algo que ela não entendeu.
Ele se virou para ela.
— Não há mais perigo.
Ela não perguntou se ele tinha certeza, não depois da maneira como ele soube sobre o
coração de Sean, mesmo quando o homem apresentou a face de um amigo.
— O que acontece com eles agora? — Ela perguntou.
— Eles serão treinados por mim.
***
Caelis observava, sem surpresa, enquanto o Sinclair se aproximava, seu rosto sombrio.
Apesar de Shona e até mesmo os outros lobos parecerem alheios, Caelis tinha ouvido os outros
soldados movendo-se rapidamente pela floresta pelos últimos minutos.
Seu conriocht percebeu a aproximação do alfa também, embora Talorc se movesse com
discrição absoluta.
Caelis girou para o laird.
— Você ouviu tudo?
— Aye. — A carranca de Talorc era feroz. — Você é conriocht.
— Você faz soar como uma acusação. — Se o olhar de Shona estivesse dirigido a ele, teria
feito até mesmo Caelis se encolher. — Ele salvou nossas vidas.
— Ele revelou sua terceira forma para humanos e para os Faol que desconheciam o retorno
dos protetores de nossa raça.
Maon retornou de seu banho no riacho, tendo transformado se de volta em homem.
— Eu mudei primeiro.
Caelis não estava preocupado com a ira de Sinclair, embora ele respeitasse Maon por sua
honestidade e vontade de não ter essa ira dirigida a ele. Mas nada teria impedido Caelis de se
transformar em sua forma mais feroz quando sua companheira e filhos estavam em perigo. Talorc
deveria estar bem ciente desse fato.
Dispensando a ira do outro alfa de sua mente, Caelis se focou em recuperar sua forma
humana, agora que sua família já não estava mais em perigo iminente. Calor inundou seu corpo e o
ar se comprimiu ao seu redor de uma forma que não acontecia quando ele se transformava em lobo.
Um momento depois, ele balançou em seus pés, sua aparência de um homem de novo.
Shona correu e ofereceu-lhe o braço.
Ele não cometeu o erro de sorrir para o gesto ou recusar sua ajuda. A mulher tinha a metade
de sua largura, até mesmo como homem, e eram mais do que uma cabeça menor, mas mesmo assim
ele se apoiou levemente em seu ombro. A força de seu espírito mais do que compensava sua falta de
estatura. Se ela houvesse nascido Éan, Caelis não tinha dúvida de que Shona teria se tornado um de
seus guardiões como a princesa, Sabrine, foi antes de seu casamento com o laird Donegal.
Shona o guiou em direção a uma árvore.
— Apoie-se aqui.
Ele cambaleou para frente, grato quando suas costas se encostaram no tronco sólido.
Ele sempre ficava atordoado depois de mudar de sua forma conriocht... e com fome. Ele
poderia comer um javali.
Talorc deu a ele um olhar simpatizante que tinha certeza de que ninguém mais viu, e se
vissem, não entenderiam.
Mas Talorc e o alfa do bando Balmoral também foram escolhidos pela pedra sagrada como
protetores de seu povo.
Nem todo o conselho Chrechte estava ciente deste fato, o que só servia para provar que
apesar de seus esforços para viver como um só povo, a confiança entre eles não foi assegurada.
Até o momento, houve apenas a revelação total entre os lairds dos clãs Sinclair, Balmoral e
Donegal. Os outros no conselho só conheciam os fatos mais básicos sobre o retorno dos Éan para os
clãs.
Nenhum deles sabia sobre forma de dragão do Príncipe Eirik ou sobre o retorno da Faolchú
Chridhe para os Faol.
Ciara, a recém-nomeada celi di dos Faol, seguiu o conselho dado a ela por meio de visões de
uma antiga celi di. Ela foi insistente em dizer que o tempo para revelar o retorno da pedra sagrada
ainda não havia chegado.
Diferentemente dos Éan que só tinham um protetor por geração, os Faol podiam ter muitos.
Por enquanto, eles tinham três.
Porém, o príncipe dos Éan era uma fera temível em sua forma de dragão, mais do que capaz
de acabar com um bando inteiro de conriocht.
Era uma boa coisa que eles fossem todos aliados.
E se Caelis conseguisse o que queria, o clã de MacLeod se juntaria àquele grupo, seu bando
submetendo-se à autoridade do conselho Chrechte como os outros faziam.
Tanto quanto qualquer Highlander se submetia a outro.
Mais importante, os Faol MacLeod começariam a treinar nos verdadeiros caminhos antigos
Chrechte. Seus irmãos aprenderiam, como ele o fez, que não havia honra na matança dos Éan
simplesmente porque eles se transformavam em pássaros.
Muitos resistiriam à verdade de que eles não eram superiores a outros Chrechte ou à
humanidade, mas Caelis tinha fé em seus companheiros lobos.
Alguns estariam como Sean, mas a maioria mudaria seu pensamento da mesma maneira que
eles mudavam suas formas.
— Você está bem? — Perguntou Shona, seu tom cheio de preocupação.
Caelis se permitiu secretamente apreciar a preocupação em seu comportamento e se apoiou
mais fortemente contra a árvore.
— Aye.
— Ele vai ficar com muita fome. — Sinclair informou a ela, com um olhar de conhecimento
para Caelis.
— Por causa de sua transformação? — Ela perguntou.
— Aye. — Seu estômago deu um estrondo furioso. — É sempre pior depois que eu mudo de
volta a partir do conriocht.
— Então vamos voltar para o castelo. — Ela olhou esperançosamente para Talorc.
O laird sacudiu a cabeça com um sorriso.
— Eu tenho a sensação de que você será tão mandona como Abigail.
— Sua esposa me pareceu muito amável.
— Oh, aye. Quando ela quer ser, não há ninguém mais encantador ou agradável. — O
orgulho na voz de Talorc era inconfundível.
— Mulheres devem ser fortes neste mundo se não desejarmos ser esmagadas sob os planos
dos homens.
O laird grunhiu surpreendentemente em concordância, porém Caelis também não podia
negar as palavras de Shona. Ela pagou o preço das maquinações de Uven e, depois, pelos planos de
seu próprio pai. Mesmo que o homem pensasse que seus arranjos para ela eram para o benefício de
Shona, ele lhe causou muita dor.
Eles recuperaram sua espada e kilt a caminho da fortaleza, bem como os lobos mortos. Os
soldados de Sinclair embrulharam os corpos nas cores MacLeod para o transporte, como era
adequado. Eles acenderiam uma pira funerária conjunta quando a lua surgisse naquela noite.
A carcaça de Sean foi deixada na floresta para os animais e as aves carniceiras, sua traição
trazendo sua própria recompensa.
***
Audrey observou o homem que o laird Sinclair acabou de declarar seu marido antes que ele
permitisse que Vegar a acompanhasse para o andar de cima. As coisas tinham acontecido tão
rápido, mas, entretanto, eles podiam entre lobos.
Os Faol entendiam as bases que guiavam sua natureza e não lutavam contra aquilo que era
de suma importância, como o acasalamento.
Além disso, Audrey preferia “esposa” a amante.
Vegar se virou depois de colocar a barra na porta. Abigail saiu há algum tempo, mas ela
enviou Ciara com um chá curativo, que Vegar insistiu em provar antes de passar para Audrey.
Felizmente, a filha adotiva do laird, sem mencionar celi di dos Faol, não pareceu ofendida
pelas precauções de Vegar.
— Ela não estava tentando me envenenar.
As sobrancelhas de Vegar se uniram em confusão.
— Eu não disse que ela estava.
— Você insistiu em provar o chá antes de me permitir beber.
— Eu quis ter certeza de que não estava muito quente.
— Oh. Isso foi... incrivelmente doce.
E doce não era uma palavra que ela pensava em associação com seu companheiro.
— Você não é como eu esperava de nosso primeiro encontro.
Ele fez uma careta.
— Eu acredito que isto é uma boa coisa.
Ela se viu sorrindo.
— Sim, eu acredito que seja.
— Eu não sou um homem ruim. — Ele disse, claramente ofendido.
Os homens podiam ser tão sensíveis. Seu irmão ficava mais facilmente ofendido do que
Shona ou Audrey.
Decidindo que era melhor parar de falar por enquanto, Audrey tomou um gole da bebida
adoçada com mel feita com o que parecia uma combinação de raiz de valeriana e camomila. Ela
dormiria logo.
Ela se perguntou se Vegar percebia o que o chá deveria fazer.
Parecia que não.
Ele olhou para ela, seus olhos castanhos escuros com uma emoção que ela nunca antes
recebeu de um homem. Luxúria. Mas também não podia recebê-lo agora. Audrey segurou o copo da
bebida quente com as duas mãos. Ela não tinha certeza de como ele iria responder a esse
conhecimento.
CAPÍTULO 16
***
Quando eles retornaram ao castelo, Maon e o dois outros que haviam prometido fidelidade
foram levados para um retreinamento intensivo com aqueles designados para a tarefa por Sinclair.
Eles aprenderiam os modos da verdadeira honra Chrechte que Caelis mesmo aprendeu antes de ir
para a ilha Balmoral treinar com os Cahir.
O guerreiro que não era MacLeod foi levado para a torre dos prisioneiros. Ele ainda tinha
que revelar seu clã e Sinclair o declarou prisioneiro até que sua lealdade pudesse ser verificada.
Ao contrário de um ano atrás, Caelis já não ficava mais chocado pelo fato de Sinclair
simplesmente não matar os criminosos. Talorc também não ordenou a morte de Caelis.
Mas ele estava muito mais impressionado com a sabedoria e a força do caráter do laird
agora. Como Talorc lhe ensinou e mais tarde o Balmoral reiterou, era fácil matar. E não era tão fácil
convencer um homem a mudar de caminho.
Shona insistiu que Caelis e as crianças comessem, embora ela nem mesmo fingisse pegar a
comida que Abigail havia colocado diante deles.
— Como está Audrey? — Ela perguntou à Abigail logo que Marjory e Eadan começaram a
comer seus alimentos.
Não havia dúvida de que Shona desejava poder estar com sua amiga, verificando seu bem-
estar pessoalmente. Porém, ela colocava as necessidades dos seus filhos à frente de tudo.
O fato de que isso incluía ficar com Caelis era para o benefício dele.
— Audrey ficará bem. Ela se curará rápido, você verá. — Abigail prometeu. — Ela está
descansando com Vegar no quarto dele.
— Mas... — Shona parou, claramente sem saber como continuar. Depois de um olhar
culpado para Caelis, ela simplesmente mordeu o lábio e assentiu. O que foi aquilo?
E então ele entendeu. Shona estava chateada que sua amiga estivesse em uma situação
comprometedora com o guerreiro Éan, mas não sentia que tinha o direito de dizer qualquer coisa
depois do modo como Audrey a pegou com Caelis naquela manhã.
— Quando será a cerimônia? — Caelis perguntou à Abigail, sem dúvida tudo já devia ter
sido planejado.
— Hoje à noite.
— Que cerimônia? — Shona exigiu. — Você não quer dizer que Audrey e Vegar vão se
casar, esta noite? Está? — O olhar esmeralda de Shona rogou à Abigail. — Eles acabaram de se
conhecer.
Abigail mordeu seu lábio e olhou para Caelis como se fizesse a ele uma pergunta.
Ele não tinha ideia sobre o que poderia ser essa pergunta.
Depois de alguns tensos segundos, Abigail soltou um suspiro claramente frustrado e franziu
a testa para Caelis antes de sorrir timidamente para Shona.
— Talorc ouviu seus votos antes que ele deixasse Vegar levá-la lá para cima.
— Mas... — Parecendo perdida, Shona parecia afundar em si mesma. — Então, o que é a
cerimônia que vocês dois estão falando?
Caelis estendeu a mão e acariciou sua bochecha. Ele queria tocá-la o tempo todo. Foi apenas
mais agudo em sua forma conriocht.
Desta vez, porém, ele estava buscando dar conforto.
— É para seu acasalamento.
— Ela é minha melhor amiga e ela casou sem mim. — Shona deu a Caelis um olhar muito
hostil. — Eu não acredito que eu goste deste mundo Chrechte.
— As coisas não são feitas da mesma maneira nas Highlands, Chrechte ou não. — Abigail
ofereceu numa clara tentativa de acalmar as coisas.
O olhar que Shona dirigiu à lady Sinclair também não era exatamente caloroso. — Mesmo
nas Highlands, os casamentos não acontecem de uma forma tão sem planejamento.
— Você ficaria surpresa. — O tom de Abigail foi irônico, sua expressão conhecedora.
Shona cruzou os braços e voltou a encarar Caelis como se as circunstâncias fossem
inteiramente responsabilidade dele.
— Eu não o terei.
— Ela vai estar lá para o nosso. — Ele prometeu, na esperança de que o lembrete pudesse
melhorar rapidamente o humor deteriorado de Shona.
Seus olhos lançavam fogo verde.
— Nosso o quê, Caelis que deve ser laird do Clã MacLeod?
— Nosso casamento. — Ele tinha deixado suas intenções claras. Será que ela duvidava delas
agora?
— Eu não sou nenhum Chrechte que pode ser ditado por minha natureza animal. E ninguém
pode negar que eu ganhei o direito de escolher meu próprio futuro. Não existirá nenhum segundo
casamento ditado para mim.
CAPÍTULO 17
***
Vestida com as roupas empoeiradas e manchadas com sangue da batalha na floresta, Audrey
andou em passos silenciosos em direção à porta do quarto de Vegar.
Shona não foi vê-la durante toda a tarde e Audrey precisava saber como sua amiga tinha se
saído. Será que ela estava com raiva pelo casamento de Audrey ter acontecido assim?
Ela ficou muito traumatizada pela visão de Caelis em sua forma conriocht? Ela ainda estava
brava com Audrey por esconder sua própria natureza Faol pelos anos em que se conheciam?
Audrey ter revelando seu próprio lobo teria feito Shona ficar com nojo dela?
A porta se abriu assim que Audrey a alcançou, Vegar carregava uma bandeja de comida do
outro lado.
Ela saltou para trás, corando por ter sido pega mesmo que tivesse autorizada a sair do quarto
se quisesse.
— Vegar.
— Companheira. — Ele franziu a testa. — Você está vestida.
— Eu dificilmente poderia vagar pela fortaleza sem estar completamente vestida.
— Você não deveria estar vagando em lugar nenhum. Deveria estar descansando.
— Eu estava descansando. — Ela mordeu seu lábio e puxou as mangas, notando um rasgo
que não notou quando colocou seu vestido. — Agora estou indo para meu quarto.
— Este é o meu quarto, então, é seu quarto.
— Este não é um acordo aceitável. Eu não pude evitar notar que este quarto foi preparado
para vários soldados viverem. Eu não posso morar com um bando de homens estranhos.
— Você não irá morar com ninguém além de mim.
Ela olhou significativamente para os pertences nitidamente armazenados no outro lado do
quarto. O plaid amarelo e preto com faixas vermelhas estreitas na pilha eram da mesma cor que do
que Caelis vestia. Ela pensou que Vegar deveria compartilhar o quarto com o companheiro de
Shona, mas era bastante aparente que o pequeno quarto servia para alojar um grupo de soldados.
Cada uma das quatro paredes tinha um pequeno baú contra ela, que um único soldado poderia usar
ou compartilhar com outro. Havia espaço para vários colchonetes no chão, embora os soldados
ficariam apertados.
Vegar colocou a bandeja ao lado de suas peles de dormir.
— Caelis vai ficar com Shona.
— Eles não estão casados.
— Eles não estavam casados na noite passada, mas ele ainda assim a marcou com seu
cheiro.
Audrey bufou em consternação.
— Eu achei que nós tínhamos lavado seu cheiro.
— Um ser humano não saberia.
— Mas você não é humano.
— Nem o são um bom número dos soldados Sinclair.
— Os Chrechte são mais abundantes do que minha mãe me levou a acreditar.
Vegar deu de ombros.
— Eu não sei sobre isso, mas nossos números não são nem perto do que as histórias
afirmam que já foram.
— Eu nunca ouvi as histórias.
— Eu vou contá-las para você.
— Obrigada.
Ele balançou a cabeça.
— Não agradeça a seu companheiro por fazer tão pouco.
— Não é pouco para mim.
— Nossos filhos conhecerão estas pequenas coisas. — Ele prometeu.
Sua mãe nunca o faria.
— Volte para a cama, Audrey.
— Eu... — Pensando melhor sobre lhe dizer que queria ver Shona, Audrey disse. — Eu
pensei que você fosse resolver assuntos importantes.
— Eu fui, consegui comida para você.
— Você não é nada como eu imaginei que fosse.
Ele franziu o cenho.
— Você acha que há alguma coisa estranha sobre eu me preocupar com as necessidades da
minha companheira?
— Não, claro que não. Bem, talvez um pouco. Meu pai nunca se importou com as
necessidades da minha mãe e, honestamente, eu também não me lembro dela cuidando de seu
conforto.
— Este não é o tipo de acasalamento que eu espero ter.
— É o único que eu já vi.
— Então você deve acreditar em mim quando digo que até mesmo onde o terno sentimento
não existe, um acasalamento pode ser uma grande bênção para aqueles conectados pelo laço.
E para um acasalamento onde existia o terno sentimento? Porque Audrey tinha certeza de
que, a cada minuto que ficasse na companhia de seu bárbaro companheiro, o amor iria crescer nela
muito rapidamente.
Suas maneiras rudes de lado, Vegar era tudo o que Audrey poderia ter sonhado em um
companheiro... se ela se permitisse sonhar.
— Nem todos os acasalados apreciam seu vínculo sagrado. — Isto era o que ela conhecia.
— Nay, mas nós sim.
Ela concordou com ele, mas não entendia como qualquer um deles poderia ter tanta certeza.
Balançando a cabeça em acordo, ela olhou para a porta, perguntando-se se ela simplesmente saísse,
se ele iria segui-la.
E o que ele poderia fazer sobre isto.
— Eu vou buscá-la e trazê-la de volta para cá, onde vou despir você antes de jogar suas
roupas pela janela. — Ele apontou para a pequena abertura no alto da parede, através da qual o sol
minguante lançava sua luz fraca.
— Você não pode jogar fora minhas roupas.
Uma única sobrancelha castanha clara se levantou, mas ele não se preocupou em dar uma
resposta verbal.
— Eu preciso ver Shona.
— Por quê?
— Estou preocupada com ela.
— O que te preocupa?
— Ela acabou de descobrir a natureza verdadeira dos Chrechte, então a vida dela e das
crianças foi ameaçada, e ela não veio verificar como eu estava.
A última coisa era o que mais preocupava Audrey.
— Você acha que a baronesa vai convencer Sinclair a anular nosso casamento?
— O quê? — Ela olhou para ele, incapaz de compreender de onde a questão tinha vindo. —
Não! Eu te disse, eu aceitei o nosso acasalamento.
— Mas você não deseja consumá-lo.
— Você disse que não iria fazê-lo de qualquer maneira, porque eu preciso me curar.
— Não são meus motivos que estão em questão.
— Os meus estão?
— Eu não disse isto.
— Eu acho que você quis.
Ele moveu as coisas na bandeja, mas não teve efeito aos olhos dela.
— Eu ofendi você quando nos conhecemos.
— Eu pensei que eu o houvesse ofendido por ser inglesa.
Ele se virou para ela, seus traços rudes vincados em uma carranca familiar.
— Eu disse a você que me arrependi disso.
Ela movimentou a cabeça.
— Você está linda.
Ela começou, não tendo esperado ouvir essas palavras.
— Eu ainda sou inglesa.
Ele balançou a cabeça.
— Você não vai jogar isso entre nós pelo resto de nossas vidas.
— Eu poderia, na verdade. — Ela sorriu para ele, deixando-o saber que não seria com raiva.
— Você tem uma natureza provocante. — Ele não parecia chateado por essa descoberta.
— Meu irmão já me acusou disto, sim.
Ele a puxou para as peles no chão.
— Você precisa de mais descanso.
— Você não vai me proibir de ver Shona.
— Você a verá amanhã à noite em nosso acasalamento.
— Eu gostaria de vê-la agora.
Vegar parou, olhando para ela.
— Isto é importante você.
— Sim.
— E você não implorará a ela para ter nosso casamento anulado antes de nós o
consumarmos?
— Não. — Ela o deixou ver que ele não era o único que poderia franzir a testa. — Mas se eu
tivesse essa intenção, o que você faria? Tentaria me trancar nesse quarto até que tivéssemos
consumado o acasalamento?
Ela não podia acreditar que estava falando tão livremente, mas ele era seu companheiro.
Achava que isto lhe dava uma liberdade para falar que ela nunca antes experimentou. Não sentia
nenhuma hesitação em compartilhar seus pensamentos, independente do que eles pudessem ser.
— Não há benefício em especular sobre o que não é uma realidade.
— Você faria isso. — Ela respirou, chocada.
Olhos castanhos encontraram os dela, nenhuma desculpa neles.
— Você é minha companheira. Você falou seus votos, sem coação.
A definição de Vegar de “sem coação” podia não combinar exatamente com a dela, mas na
maior parte, ela concordava com sua avaliação.
— E eu não volto atrás em minha palavra.
— É bom saber.
— Você é impiedoso.
— Aye.
— Eu não estou certa se isto é bom saber.
— Eu serei tão impiedoso protegendo você e nossa família quando chegar a hora como sou
em proteger nosso acasalamento.
— Pelo menos isto é algo para ser grata, eu acho.
— Eu vou acompanhá-la ao quarto de Shona depois que comer seu jantar.
— Por que ela está em seu quarto? — Audrey achou que Shona estivesse comendo no
grande salão.
A menos que o mundo Chrechte tivesse se tornado demais para ela. A ansiedade de Audrey
por sua querida amiga aumentou.
Vegar deu de ombros, claramente despreocupado sobre o motivo da amiga de sua
companheira não estar compartilhando o jantar com o clã.
— Você pode perguntar a ela. Depois que comer.
— Você está muito focado em mim comendo.
— Você tem machucados. Um Chrechte precisa descansar e comer para ajudar na rápida
recuperação.
— Os seres humanos também.
— Aye, mas eu me acasalei com uma Faol.
— Você é muito cabeça dura.
— Você se acostumará com meu jeito.
— Será?
— Aye, é assim com os companheiros.
— Você também aprenderá meu jeito e o aceitará?
— Aye. — O sulco entre suas sobrancelhas mostrou confusão por sua pergunta.
Um homem sem igual realmente.
Vegar provou sua intenção quando ele a ajudou a comer o cozido de carneiro na bandeja,
depois a alimentou com pedaços de pão escuro que ele levou junto. Ele seduziu e incentivou até que
ela terminou toda a comida.
E só então ele a acompanhou até o quarto de Shona.
Homem único e teimoso.
Audrey bateu na porta do quarto de hóspedes, ouvindo os sons de dentro. Ela não podia
ouvir nenhuma voz, só movimentos silenciosos enquanto alguém se aproximava da porta. Parte dela
estava feliz por Shona estar, obviamente, sozinha, mas outra parte de Audrey se preocupava com
esse fato.
— Onde estão as crianças?
— Com seu irmão e Caelis.
— Oh.
Mais uma vez Audrey não conseguia decidir se isso era algo para ser grata, ou deveria
adicionar suas preocupações sobre a baronesa.
A porta se abriu, a maçaneta presa na mão de Shona.
Seus olhos incrivelmente verdes claros se arregalaram em surpresa.
— Audrey! Você está bem? Olhe para você, seu vestido está rasgado. Isto é sangue? Oh,
minha querida Audrey, eu mal posso acreditar que hoje foi mais que um sonho.
— Foi real o bastante. — Disse Vegar prosaicamente por trás de Audrey.
Shona olhou para ele.
— Eu não estou falando com você.
Audrey ofegou com o choque pela grosseria de sua querida amiga. Isto era tão diferente da
mulher com quem ela conviveu nos últimos cinco anos.
Shona corou e olhou suplicante para Audrey.
— Ele levou você para longe e... e... eu estou muito irritada com ele agora.
— Fique tão irritada quanto você precisar ficar, milady, mas o que está feito está feito e não
tem como desfazer. — A advertência gelou o tom de Vegar, sua carranca em evidência.
Audrey rolou seus olhos antes de dar a Vegar sua própria encarada.
— Nós já tivemos esta discussão. Eu dei minha palavra.
— Você está duvidando da integridade dela? — Shona perguntou, o aborrecimento
faiscando em seu olhar.
— Nay. — Vegar colocou a mão no ombro de Audrey. — Você está em boas mãos. Eu
estarei de volta para buscá-la em uma hora.
— Você está cronometrando nossas visitas? — Shona exigiu em indignação.
— Audrey ainda está se curando. Ela precisa descansar.
Audrey revirou os olhos de novo, mas ambos a ignoraram.
Shona estava muito ocupada movimentando a cabeça em um acordo relutante e Vegar estava
simplesmente indo embora.
Audrey suspirou. Ela supôs que não deveria esperar nada mais, não depois de tão pouco
tempo e no desfavorável início de seu acasalamento.
Além disso, ela se recusou a ter intimidade com o homem. Independente de seus próprios
planos, ele levou isto para o lado pessoal, ela finalmente percebeu.
Ela fez um movimento para entrar no quarto de Shona, mas uma mão forte em seu ombro a
segurou. Ela olhou para cima e rapidamente pegou uma expressão no rosto de Vegar antes que a
cabeça dele se abaixasse.
Sua boca cobriu a dela brevemente.
— Não se canse.
Ela balançou a cabeça e então assentiu, seus lábios formigando pelo beijo.
Seu rosto sisudo se vincou num pequeno sorriso que logo desapareceu.
— Você é um doce, minha companheira.
— Obrigada. — Ela sussurrou.
Ele se virou e se afastou novamente, desta vez desaparecendo pelo canto que levava até as
escadas.
CAPÍTULO 18
O dever para com o bando só é ofuscado pelo dever sagrado para com o verdadeiro companheiro,
mas, mesmo assim, o dever para com seus irmãos Chrechte não pode ser descartado totalmente.
— TRADIÇÕES FAOL
— Então ele superou sua aversão pela Inglaterra. — Shona disse com aspereza.
Audrey se voltou para a amiga, mas não teve nenhuma oportunidade para responder antes
que ela fosse agarrada pelos braços de Shona para um abraço esmagador.
— Eu estava tão preocupada. Você não pode permitir que homens estranhos a levem para
longe assim, mesmo que ele seja seu companheiro. Abigail disse que você estava bem com Vegar.
Você está casada? — Shona se afastou e encontrou o olhar de Audrey. — Como isto aconteceu?
Mas, novamente, Audrey não teve oportunidade de dizer nada, porque Shona a apertou com
força.
— Eu queria te encontrar e eu mesma verificar, mas Caelis disse que você e Vegar tinham
outra forma de ocupação. Isto me preocupou, eu posso te dizer. Eu sei que nós não discutimos essas
coisas e você era totalmente inocente. Ele te machucou?
Audrey sufocou uma risada enquanto sua pele aquecia com outro rubor.
— Não.
Alívio cobriu as feições de Shona.
— Eu ainda sou inocente. — Audrey admitiu.
Os olhos de Shona se arregalaram de novo e ela puxou Audrey para o quarto antes de bater a
porta.
— Por quê?
— Eu quis esperar. — Sentindo a dor de seus ferimentos em cura, Audrey se moveu para se
sentar na extremidade da cama. — Eu não me sinto casada. Você não estava lá para testemunhar
meus votos, nem Thomas. Vegar e eu nos casamos nos degraus, pelo amor de Deus.
Shona sentou-se ao lado de Audrey e pegou sua mão.
— Como foi que isso aconteceu?
— Vegar queria cuidar de meus ferimentos. Ele leva muito a sério o fato de sermos
companheiros.
— Isso é bom.
— Sim, mas eu tenho um pressentimento que também vai ser irritante às vezes.
Shona assentiu, uma grande dose de compreensão em seus olhos.
— Laird Sinclair não queria permitir que Vegar me acompanhasse para cima, e muito menos
me levasse para seu quarto porque eu sou... eu quero dizer, era... uma mulher solteira sob sua
proteção. Vegar se recusou a prometer que não me comprometeria. Ele continuava dizendo que eu
era sua companheira e ele podia fazer o que bem entendesse.
— Ele é um homem muito teimoso.
— Sim, mas estou bastante acostumada a lidar com teimosia. — Audrey deu a Shona um
olhar significativo.
A baronesa riu quando Audrey quis dizer sobre ela também.
— Sim.
— De qualquer forma, eu tinha certeza de que os dois homens teriam chegado às vias de
fato e isto era perturbador o suficiente, mas, em seguida, laird Sinclair ordenou que Vegar ficasse
embaixo. Vegar simplesmente se recusou. Ele iria desafiar o laird. Eu sabia que seria assim.
— Eu ainda não entendo como você acabou casada.
— Isso foi ideia de Vegar. Ele disse ao laird que poderia nos proclamar marido e mulher se
isso satisfizesse suas regras civilizadas de decoro. Eu nunca soube que civilizado podia ser
considerado uma palavra suja, mas o modo como Vegar disse... — Audrey balançou sua cabeça. —
Então, o laird perguntou se eu estava disposta a ser esposa de Vegar.
— E você estava porque não queria que ele desafiasse Sinclair.
— Exatamente.
— Homens!
— Eles são muito exigentes, não são?
— Ainda assim, eu acho que você vai desfrutar das demandas de Vegar mais do que eu fazia
com as do Barão.
Audrey estremeceu, lembrando o olhar assombrado nos olhos de sua amiga muitas noites
quando ela dizia boa noite para Audrey e as crianças.
— Eu tenho certeza que você está certa. Eu gostei muito de seus beijos.
— Eu notei.
Audrey deu uma risadinha, mas ficou séria bem rápido.
— Eu gostaria muito que tivéssemos aquela conversa que você mencionou sobre os atos do
casamento.
— Depois de eu ver, para minha própria satisfação, que seus ferimentos foram tratados e
colocá-la em roupas que não estão rasgadas ou manchadas com seu sangue. — Os olhos de Shona
brilhavam com lágrimas. — Eu não posso suportar a evidência de suas ações.
— Você tomou aversão de mim. — Audrey disse com o coração encolhido.
— Nay. Como se atreve a me julgar tão fraca. — A carranca de Shona teria derretido pedra.
— Você é a minha família, independente do sangue que corre em nossas veias. Ver você arriscar
sua vida e lutar com aquele lobo enquanto eu estava para trás, para proteger meus filhos, foi a coisa
mais difícil que eu já tive que fazer.
Os olhos de Audrey queimaram com lágrimas.
— Eu deixei você e os pequenos desprotegidos.
— Você fez o que seus instintos mandaram, assim como eu fiz. Nenhuma de nós poderia
fazer tudo o que queria.
Elas se abraçaram novamente antes de Shona ajudar Audrey a mudar suas roupas e verificar
suas contusões e escoriações.
— É bom que você não tenha começado as relações conjugais nesta tarde. Não está em boa
forma.
— Isso foi o que Vegar disse quando contei que queria esperar até depois de falar os meus
votos de acasalamento perante as testemunhas que importavam para mim.
— Ele não é de todo ruim.
— Eu acho que ele não é mau mesmo.
— Ele é grosseiro.
— Sim, mas debaixo disto, ele é amável, eu acho.
— Caelis o respeita.
— Vegar retorna esse respeito.
Shona assentiu, parecendo bastante irritada.
— O que foi? — Audrey perguntou.
— Caelis anunciou que nós vamos nos casar.
— E? — Audrey não estava certa do por que isso teria irritado a amiga assim. — Você não
quer se casar com o pai de seu filho?
— Ele insiste que é pai dos dois agora.
— Isso é bom.
— Ele é arrogante.
— Sim. — Disto não havia dúvida.
— Ele nem sequer se preocupou em pedir.
— Ele não parece o tipo de homem que se ajoelha.
— Eu me conformaria com a pergunta sem qualquer pompa ou circunstância.
— Você aceitaria?
— Aceitaria.
— Diria sim?
— Claro.
— Será que ele sabe disso? — Caelis não parecia, para Audrey, o tipo de homem que
arriscaria uma rejeição.
— Talvez não, mas ou ele pergunta ou ele não saberá.
Audrey sorriu.
— Teimosa, eu lhe disse.
— Aye, mas eu temo que Caelis não tenha ideia do quão intransigente eu posso ser.
Nem quanto tempo a mulher que era difícil de se encolerizar guardava a fúria uma vez
acesa, mas Audrey não disse isso. Sua irmã de coração e Caelis teriam que encontrar seu próprio
caminho para seu relacionamento.
— Você falou que tem coisas que quer me dizer antes de eu ir para minha cama de
casamento? — Ela perguntou, envergonhada mas determinada a aprender o que ela pudesse.
— Aye. — Shona franziu a testa, uma sombra do desespero que Audrey costumava ver em
seu olhar. — Pode ser tanto maravilhoso quanto terrível.
— Eu não acredito que Vegar seja como o Barão.
— Nay, e você não vai detestar seu toque como eu detestava o do Barão. Isso por si só vai
tornar as coisas mais fáceis.
— Você disse que havia grande alegria no ato para uma mulher.
— Eu tive muita com Caelis.
— Mas não com o Barão.
— Nay, mas existem maneiras de suportar.
— Eu não acredito que precisarei suportar com Vegar.
— Estou mais grata do que posso dizer por poder concordar com você. — A sinceridade no
tom de Shona não poderia ser questionada.
Audrey sabia que sua querida amiga achava seus deveres conjugais onerosos, mas ela viu
agora que eles haviam ferido Shona no fundo de sua alma.
— Caelis sabe?
— O quê?
— O quão terrível foi para você estar casada com o Barão?
— Isso não importa.
— Eu acho que importa.
Shona apenas balançou a cabeça e, em seguida, passou a contar à Audrey as coisas mais
improváveis sobre o prazer entre um homem e uma mulher. Ou, pelo menos, Audrey teria visto
assim antes de conhecer Vegar.
— Não era assim com o Barão.
— Nay.
— Como era?
Shona apenas balançou a cabeça.
— Se Deus quiser, você nunca vai saber e eu não vou lhe dar pensamentos para alimentar
seus pesadelos ou seu nervosismo na noite de núpcias.
— Percival teria sido pior. — Audrey achou.
— Aye. Submeter-me a ele poderia muito bem ter me quebrado.
Audrey concordou reservadamente. Mesmo a mulher mais forte só poderia se inclinar até
um certo ponto antes de se quebrar pela metade, para nunca mais ser inteira novamente.
***
Horas depois de Vegar ter ido buscar Audrey, Shona passeava por seu quarto, incapaz de
dormir. Caelis provavelmente sabia, também. Ele provavelmente poderia ouvir cada passo seu.
Sentidos Chrechte infernais.
Ela não era boba, independente do que seu passado com ele poderia levar o homem a
acreditar. Ela também não tinha perguntas sobre onde ele passaria a noite.
Do lado de fora de sua porta.
No salão... sem forragem, ou conforto.
Não que ela estivesse preocupada com isto. Não. Não era uma preocupação dela se um
homem crescido escolhia passar sua noite dormindo em um chão de pedra em vez de usar os
quartos perfeitamente bons fornecidos pelo laird Sinclair para seus soldados.
Realmente, não era.
Ela olhou para a porta, ainda furiosa com ele por sua suposição de que ela se casaria sem
nem mesmo o pedido mais rude. Muito menos uma proposta real.
Será que ele não acreditava que ela merecesse nem mesmo essa mínima consideração?
Talvez pensasse que ele tinha razão para fazer essas suposições, mas ela manteve a incerteza
de seu futuro desde o início. Mesmo após a loucura de permitir que ele entrasse em sua cama na
noite anterior.
Será que ele acreditava que sua disposição para matar por ela, ou mudar para sua forma
conriocht colocava o ônus da aceitação nela? De acordo com ele e todos os outros, não havia
nenhuma dúvida de que ela era sua companheira sagrada.
Isso poderia muito bem ser verdade, mas não significava que cairia a seus pés. Mesmo que
ela não conseguisse se impedir de cair na cama dele.
Sim, ele era o pai de seu filho, mas Caelis foi exatamente isso quando a tinha rejeitado em
favor das ordens de seu alfa seis anos antes. Mesmo que ele não soubesse.
Não, ela não poderia começar a pensar dessa forma.
Mas também não poderia ignorar certas verdades.
O mais importante: ele manteria seus filhos seguros.
Ela parou de andar e respirou profundamente. Mais do que qualquer outra consideração,
aquela a balançou.
O mundo era um lugar até mais cheio de perigo do que ela sabia quando fugiu do baronato,
que foi sua casa por toda a vida de seus filhos.
Caelis, como conriocht e eventualmente laird de seu próprio clã, porque ela estava certa de
que ele iria tomar o controle dos MacLeod de Uven, estava em melhor posição para proteger Eadan
e Marjory do que a maioria.
Casar-se com ele, no entanto, significava voltar para o clã que esteve muito disposto a vê-la
e a seus pais pelas costas. Porque eles eram humanos. Embora ela não soubesse que esta era a razão
naquela época.
Ela ainda seria uma humana em um clã com muitos que foram ensinados a vê-la como
inferior por sua humanidade, bem como seu gênero.
Era insustentável.
Ela não tinha, de repente, brotado asas de anjo, nem iria. Ela não tinha grandes habilidades
mágicas de mudar para uma outra forma e isto não iria mudar. Ou iria?
Caelis disse a Maon que Mairi agora podia mudar para a forma de lobo. Aparentemente, ela
não podia fazer isso antes. Era por isso que Uven a tratava tão mal.
Ele não ficou feliz por ter uma filha que não era totalmente Chrechte.
Será que ela podia se transformar agora só porque seu pai era um lobo? Ou isto era uma
resposta inevitável por ser acasalada com um Chrechte?
Entretanto, Caelis não disse que seu companheiro era um Éan? Isso faria de seu marido um
homem que mudava para pássaro.
E Mairi agora se transformava em um lobo. Não era isso que Caelis disse?
Teria Caelis destinado-a a se tornar como ele, sem dizer a ela? Será que ele estava
escondendo algo de grande magnitude dela?
Mais uma vez?
Ela correu para a porta e puxou a barra pesada para que ela pudesse abri-la.
— Por que você está aqui fora? — Ela exigiu do homem que estava exatamente onde ela
sabia que estaria.
— Onde mais eu estaria? — Ele perguntou, parecendo muito razoável.
— Em sua própria cama.
— Eu não durmo em uma cama. Vegar e eu preferimos peles.
— Você dorme com Vegar?
Ele revirou os olhos para a noção absurda.
— Nós compartilhamos um quarto. Como Cahir, é preferível aos aposentos dos soldados.
— Por quê? Você esconde segredos até mesmo de seus companheiros?
— Você sabe que sim. — Caelis parecia confuso com a pergunta dela. — Nem todos os
soldados da fortaleza são Chrechte.
— Mesmo os Chrechte não sabem tudo sobre os Cahir.
— Isso é tão como você.
— O que você quer dizer?
Ela olhou para a pele no chão.
— E você dorme no chão como um bárbaro?
— Os soldados não podem se dar ao luxo de uma cama.
Ela sabia disto, mas não disse nada. Ela sentia como se desse território a ele. E não podia
fazer isto.
— Onde você dormiu todos os anos em que viveu em nosso clã? — Ele perguntou, como se
fazendo um ponto.
Em uma pilha de cobertores próximos ao fogo na sala principal da pequena cabana de sua
família. O laird antes de Uven estava disposto a ter um humano como seu seneschal, mas isso não
se estendeu para a família de Shona ser convidada para viver dentro da fortaleza. Só agora ela
percebeu o por quê.
Não só o homem era Fearghall e, portanto, achava que os Chrechte eram superiores a
aqueles sem uma natureza animal, mas ele tinha um segredo para proteger.
Sinclair tinha soldados e empregados humanos vivendo em seu castelo, mas a casa de
MacLeod não era em nada como a de Sinclair. Não em tamanho e nem em segurança.
E se ela não estivesse enganada, Caelis esperava que voltasse para viver naquele mesmo
castelo.
— Isso é totalmente fora de questão.
— Se você diz que sim.
— Não seja condescendente!
— Eu não faria isso.
— Hah.
— Hah.
— Você está chateada.
Ela cruzou os braços sobre o peito e o encarou.
— E você ainda não descobriu o porquê, não é?
Seu olhar azul ficou cauteloso e ela notou que ele não respondeu imediatamente.
Tolo.
— Eu não me importo de você me insultar por nosso vínculo mental.
— Eu sinto muito. — Ela não queria que ele ouvisse isto, o que só a deixou mais brava. —
Até minha mente não é mais minha.
— Pare de gritar comigo dentro de sua cabeça e eu tenho certeza que vai ser. — Ele parecia
tão razoável, que ela queria bater nele.
Puxando o ar, ela afastou a vontade.
— Não me diga o que fazer em minha própria mente.
Este homem trazia um lado a sua natureza, que ela nem sabia que existia.
Ele suspirou e passou a mão sobre o rosto.
— Vou tentar não fazer isso.
— Apenas me diga uma coisa, oh grande homem Chrechte.
Sua mandíbula endureceu e o azul violeta de seus olhos ficou escuro. Ele não gostou de seu
sarcasmo e ela não o culpava, ainda que estivesse muito zangada para guardar sua língua.
— Aye? — Ele soltou.
— Você me transformou em metamorfo sem me dizer?
Ele parecia estar contando alguma coisa em sua cabeça, porque seus lábios se moviam
silenciosamente, formando números em sequência.
— Você acredita que eu faria isso?
— Você não disse a mim a verdade seis anos atrás. Você não disse a mim sobre seu
conriocht até que teve que me mostrar.
Todo o comportamento de Caelis passou de irritação mal contida à cansada frustração num
piscar de olhos.
— Vamos discutir isso em seu quarto.
— Eu acho que não. — Deixá-lo entrar no cômodo onde a cama estava não parecia ser o
movimento mais inteligente que poderia fazer esta noite.
— Então nós não vamos discutir. — Ele se afastou dela e se afundou de volta nas peles que
colocou no chão, deixando sua cabeça descansar contra a parede e seus olhos se fecharem. — Volte
para a cama, Shona.
— Eu não estava dormindo e sabe bem deste fato.
— Eu não posso fazer nada. —A cansada derrota em seu tom a confundiu.
— Você não vai simplesmente me dispensar.
— Nós não podemos ter essa conversa em um corredor.
Ele estava certo, claro. No que ela estava pensado para falar tão abertamente sobre seu
segredo numa passagem que alguém poderia passar?
— Eu peço desculpas.
Ela não tinha dúvidas, entretanto, de que ele saberia se alguém estivesse perto o suficiente
para ouvir suas palavras. Poderia perder de vista onde eles estavam, mas não acreditava que ele fez
isso.
Ele assentiu, embora seus olhos permanecessem fechados, sua cabeça se virou.
— Você não vai olhar para mim? — Ela perguntou, incomodada muito mais profundamente
do que queria estar.
Ele deve ter ouvido o estremecimento em sua voz e ela fez seu melhor para reprimir porque
seus olhos se abriram, suas profundidades azuis fixas nela.
— Você é minha companheira.
— E isso faz com que esteja tudo bem você me ignorar? — Se fosse assim, era um aspecto
do acasalamento que ela não iria estimar.
— Eu não estou ignorando você.
— Sério? — Ela perguntou ironicamente.
Ele levantou seu kilt, revelando seu sexo, escuro e inchado com necessidade.
— Eu quero estar naquele quarto com você debaixo de mim, nossos corpos unidos.
— Nós precisamos conversar, não copular. — Disse ela de uma garganta subitamente seca.
Ele não era o único afetado pela forte atração entre eles. Ela queria tocar e ser tocada, e era
exatamente por isso que se recusava a entrar no quarto para conversar.
— Você precisa voltar para o quarto e trancar a porta. Agora. — Suas mãos estavam
fechadas em punhos em seus lados, um belo brilho de suor em seu lábio superior e sua têmpora.
Sua dureza pesava contra sua coxa, o kilt esboçando-o lascivamente. Mas ela não ficou
horrorizada como uma adequada lady deveria ficar.
Não, ela queria tocá-lo, saborear a gota clara de fluido perolizado na ponta.
Seja lá o que ele estivesse sentindo, não havia dúvida de que Caelis a queria com uma
necessidade tão feroz que era tudo o que ela poderia fazer para negá-lo.
— Eu posso cheirar seu desejo, mo toilichte. Saia daqui antes que eu faça algo que você
possa reclamar de mim amanhã.
Antes que ela pudesse prometer que não iria, correu de volta para seu quarto e bateu a porta,
inclinando-se contra ela enquanto soltava respirações profundas, quase soluçando. Como podia ter
ido da raiva ao desejo faminto tão rapidamente?
Tranque a porta. Ele instruiu em sua mente.
Ela assentiu com a cabeça. Sim, isso era o que ela precisava fazer. Mas não se moveu.
Não podia.
O som de sua cabeça batendo na parede a fez saltar, embora não fosse um barulho alto.
Eu quero você. Ele disse em um tom quase incompreensível dentro de sua mente.
A própria intimidade de falar pela mente fazendo-a doer ainda mais pelo homem que estava
a beira de admitir que sempre seria seu amado. Mesmo esse conhecimento não foi suficiente para
esfriar seu ardor.
Estou me tocando e pensando em sua mão em mim, enquanto faço isso.
Ela gemeu, a imagem em sua mente quase impossível de resistir.
Ele fez os sons de prazer em sua mente ou ela os estava ouvindo pela porta? Um desejo
febril a queimou, fazendo suas coxas se fecharem apertadas, a umidade lá tão grande que ela não
podia ignorar.
Será que ele podia cheirar sua necessidade mesmo pelas barreiras de pedra e madeira? Ela
virou-se para a porta, mas não fez nenhum movimento para soltar a tranca.
Shona se inclinou para frente, suas mãos pressionadas contra a madeira.
Diga-me. Eu sou como você agora?
O suspiro que veio por seu vínculo mental estava cheio de aflição, mas era porque ele estava
bravo com ela ou frustrado por sua necessidade sexual?
Nay.
Você está dizendo a verdade? Ela não era um deles, não podia sentir o cheiro de uma
mentira.
Oh.
Eu não posso cheirar uma mentira.
Nay.
Eu ainda sou tão humana quanto eu era.
Aye.
Alívio verteu sobre ela, não por não ser Chrechte, mas porque ele não escondeu algo mais
dela.
Ou pelo menos ela achava que não. Como poderia saber? Tanta coisa foi negada a ela até
agora.
Existem mais segredos?
Ele disse algo em sua mente que soou como uma maldição, mas ela não sabia. Foi dito
naquela língua antiga que ele falou com o outro Chrechte.
O quê? Ela perguntou.
Cada palavra que você fala aumenta a minha excitação.
Mas isto não é possível.
O som de seu gemido definitivamente veio pela porta.
Eu lhe asseguro que é.
Você está ainda está se tocando.
Aye. Mas eu preferiria estar tocando você.
Havia algo errado com ela. Deveria estar escandalizada, mas o conhecimento a excitou.
Você deve parar.
Você não deve continuar conversando comigo tão intimamente.
Eu não estou dizendo nada de natureza íntima.
Cada palavra dentro da minha cabeça é a confirmação de nosso laço. — Sua voz estava
repleta de satisfação e urgência sexual.
Ele estava alcançando o clímax pela estimulação de seu vínculo mental. Novamente, deveria
estar chocada, mas só conseguia se sentir satisfeita pela possibilidade.
Segredos. Ela disse em uma tentativa desesperada de mudar a maré de seus próprios
pensamentos e desejos. Existem mais segredos?
Ela podia sentir a dor do desejo insatisfeito tão fortemente que parecia ser a sua própria dor,
mas sabia que era dele. Isto era outro efeito do vínculo verdadeiro de companheiros?
Você já descobriu por si mesma que eu planejo retornar a MacLeod e assumir o comando
do clã, certo?
Ela assentiu com a cabeça contra a porta, seu coração se contraindo com o pensamento de
Caelis lutando contra Uven pelo direito de liderar o clã. Mesmo numa luta levemente justa, não
havia nenhuma maneira de que Uven saísse vitorioso.
Mas o homem era sorrateiro e nenhuma briga com ele seria sem deslealdade.
Shona? Caelis perguntou em sua cabeça, com a voz tensa.
Ela sabia a fonte da tensão e fez seu melhor para ignorar.
— Eu estou aqui. — Ela disse em voz alta, sabendo que ele iria ouvi-la através da porta.
Eu tenho que fazer isso.
— Eu sei. — E ela sabia.
Uven tinha que ser parado, pelo bem de seu clã, mas também pelo bem de todo Chrechte.
Ele era um homem mal que causaria danos incontáveis se deixassem que ele continuasse seu
caminho atual. Ela não tinha certeza de como sabia que isto era verdade, mas havia uma certeza
dentro dela que não podia vacilar.
Você não colocou a tranca.
Não.
Se quiser que eu permaneça aqui fora, faça isso. — Seu desejo a alcançou pela madeira
grossa e achou uma necessidade correspondente em seu coração.
Ela não podia admitir isso, mas também não poderia deixar cair a prancha grossa de madeira
que manteria Caelis do outro lado. Ela não o queria tocando a si mesmo. Ela queria ser a pessoa a
lhe dar prazer.
A porta começou a se mover para dentro e Shona deu um passo atrás, seu coração na
garganta.
CAPÍTULO 19
Caelis entrou, o corpo grande de seu guerreiro vibrando com o desejo que escurecia seu
olhar violeta e as peles que ele tinha penduradas em um grande punho.
— Você deveria ter trancado a porta, companheira.
— Você deveria ter me pedido para me casar com você seis anos atrás. — Não era o que ela
queria dizer, mas não retiraria as palavras se pudesse.
Elas eram verdadeiras e ele tinha que saber isto.
A tensão que não achava que tinha alguma coisa a ver com a sua necessidade sexual
emanava dele agora.
— Aye.
— Eu teria dito sim então.
Ele fez uma careta.
— Eu sei.
Por todos os santos, onde ela iria com isto? Por que estava dizendo estas coisas? Seu desejo
físico por ele não tinha diminuído nada, e ainda assim, de sua boca jorrava coisas completamente
sem nexo.
Ou tinham?
— Eu vou para a ilha Balmoral amanhã. — Ela tomou a decisão enquanto as palavras
deixavam sua boca.
— Você está me rejeitando agora como eu fiz com você antes? — Ele perguntou, a fome
sempre presente guerreando com a raiva em seu olhar azul.
Shona balançou a cabeça de forma decisiva.
— Você pode vir conosco e fazer suas intenções conhecidas para a minha família.
— Você sabe que eu tenho outros compromissos.
Ela deu de ombros. Sim, ela sabia. Assim como seis anos atrás, Caelis tinha deveres e
intenções que substituíam suas promessas a ela.
— Você não vai mudar de ideia?
— Não. — Ela já tinha se comprometido com esse homem antes, e sua vida foi ainda mais
infeliz por isso.
Mais uma vez, sua mandíbula parecia talhada em pedra.
— Você sabe que eu preciso voltar para MacLeod.
— E você está completamente ciente de que isto é a última coisa que eu quero fazer. —
Parte dela sabia que poderia muito bem acabar vivendo entre seu antigo clã novamente, mas não
faria isso por capricho. E ela também não iria retornar para lá como nada menos do que sendo sua
esposa legalmente e totalmente.
— Eu não posso recusar meu destino. Eu sou conriocht. Isso significa que eu sou um
protetor para meu povo.
— E você acredita que proteger os Chrechte exige que assuma como laird do Clã MacLeod.
— Eu sei que sim. Foi previsto.
Ela deveria ficar impressionada? Estava. Um pouco. Talvez até mesmo muito mais do que
um pouco, mas isso não significava que iria dispensar o que sabia que precisava acontecer para dar
ao acasalamento entre eles uma fundação em que ela pudesse acreditar.
— Você sabe que se muita ou pouca areia e pedras soltas foram misturadas no solo de um
motte, com o tempo ele irá afundar e o castelo junto com ele. — Ela disse a ele.
Ele a olhou fixamente como se tivesse enlouquecido, mas não podia permitir que isso a
incomodasse.
— Eu sei disso porque o Barão me disse uma vez, muito alegremente, enquanto me contava
sobre o colapso da fortaleza de outro Barão. Toda a estrutura, que tinha demorado quatro anos para
ser erguida, foi totalmente destruída.
— Seu casamento com este velho homem é algo nós dois faremos bem em esquecer.
— Isso não é possível.
— Aye, é.
— Não.
Ele franziu o cenho para ela, claramente querendo discutir mais.
Ela adiantou-se.
— Eu odiei cada momento que o Barão me tocou, mas eu amo minha filha. Eu não posso
esquecer suas origens como também não podia esquecer as de Eadan.
E se Caelis não pudesse tolerar isto, então realmente não existia nenhuma esperança de um
futuro entre eles. Independente do que sua lei Chrechte dizia sobre companheiros sagrados.
— Ela é minha. — Caelis reivindicou ferozmente. — Da mesma maneira que você é, se
você não fosse tão teimosa para admitir.
— Não pode desfazer seu parentesco apenas porque deseja que seja assim. — Também não
poderia simplesmente decidir que Shona seria sua esposa.
— Ele está morto. Eu estou vivo. Eu sou seu pai, agora e para sempre. — Uma convicção
absoluta soou em sua voz.
Ela agitou sua cabeça em descrença.
— Você é um homem muito possessivo.
— Eu não fui possessivo o bastante seis anos atrás, mas não posso me arrepender desse fato
agora.
— Você não pode? — Perguntou Shona, chocada e bastante desanimada.
— Marjory deveria ter sido nossa, entretanto, ela veio a ser. Você pode lamentar sua filha?
Ele já havia perguntado isso uma vez.
Ela entendeu melhor o seu motivo para perguntar isso agora.
— Nunca.
— Aye.
— Construir uma família significa muito mais do que só exigir que todo mundo permaneça
junto. — Exigia mais do que mera documentação legal também.
— Aye, é preciso alguma cooperação de sua parte.
E da dele, se ele pudesse apenas reconhecer isto.
— Quando um motte afunda, as juntas da parede se soltam e, eventualmente, o castelo
inteiro vem abaixo.
— Estamos de volta nos mottes?
— Ouça-me, Caelis. Eu não serei a fortaleza que cai sob o fardo.
— Você não é um edifício. — Disse ele, exasperação densamente atando cada palavra.
— Não, mas nosso acasalamento é como a fortaleza que busca proteger àqueles que vivem
dentro dela.
— Você admite que nós somos companheiros.
— Eu nunca neguei isto. — Nenhuma vez.
Ele girou para longe, batendo a palma de sua mão aberta contra a parede de pedra grossa.
— Como nosso acasalamento pode proteger nossa família como nesta fábula da fortaleza se
você for viver na ilha Balmoral e eu com os MacLeod? Uma fortaleza não ocupa duas terras, muito
menos um mar inteiro.
— Seis anos atrás, você me negou perante minha família, retirando seu cortejo formalmente
para meu pai.
— Para minha vergonha. — Sua cabeça orgulhosa caiu, seus ombros se curvaram.
Não era a intenção dela fazê-lo se sentir envergonhado.
— Este não é o meu ponto.
— Qual é o seu ponto? — Ele perguntou com impaciência mal reprimida enquanto ele girou
para encará-la novamente.
— Que agora, para que nosso acasalamento aconteça, você precisa me reconhecer perante
minha família novamente. — Ela colocou a mão em seu antebraço, implorando com todo seu ser
que ele entendesse. — Se eu tiver valor em seus olhos, então você o reconhecerá perante os outros.
— Um acasalamento e um casamento não são suficientes para isto?
Falando sobre entidades lendárias. Ele continuava falando do deles como se já fosse algo
planejado, mas ela ainda nem sequer tinha concordado em se casar com ele.
Não que ele tivesse perguntado.
Porque ele não tinha.
— Até agora, seus modos Chrechte não foram nada além de irritantes para mim, se você
quer a verdade. Eu posso não acreditar num acasalamento, posso confiar menos ainda num
casamento depois do que eu experimentei com o Barão. Ficar de pé diante do homem e de Deus,
falando juras de fidelidade e honra de maneira nenhuma garante que um homem vai valorizar sua
esposa. — Ou que ele, ela e seus filhos viveriam juntos como uma família em harmonia.
— Ele era um péssimo marido.
— Existem piores. — O pai de Audrey e o atual Barão de Heronshire, para citar alguns.
— Nem todos os companheiros são exemplares, tampouco. — Caelis ofereceu como se fazer
isto o deixasse aflito.
— Sabendo o que sei agora sobre os Chrechte, estou bem ciente disso. A primeira esposa de
Uven deve ter sido sua verdadeira companheira para ele ter gerado um filho com ela. — Eles foram
casados e acasalados, mas isso não acabou bem para a pobre mulher.
— Aye.
— Meu pai sempre considerou as circunstâncias de sua morte suspeitas, apesar de que eu
não deveria saber. — Ela ouviu seus pais conversando.
— Depois de ver o quão fácil ele assassinou meus próprios pais por discordar dele, eu não
tenho nenhuma dificuldade de acreditar que ele mataria sua companheira humana.
— O antigo laird ainda estava vivo quando isso aconteceu, mas meu pai nunca expressou
suas preocupações. Agora, eu entendo que o antigo laird provavelmente não teria criticado ou
mesmo reprovado se soubesse que seu filho matou sua companheira. Porque ela era humana e eles
Fearghall.
Caelis movimentou a cabeça, sua expressão sombria.
— Acredite ou não, eu entendo que o clã precisa de você.
— Bom.
— Mas isso não significa que vou desconsiderar minhas próprias preocupações.
— Eu também não estou tentando fazer isto.
Foi sua vez de acenar e dizer.
— Ótimo. Você quer que eu tenha fé nas instituições quando eu preciso ser capaz de confiar
em você.
— Você não confia em mim? — Ele perguntou com a toda evidência de que realmente não
sabia a resposta.
Será que ele achava que as últimas vinte e quatro horas mudaram tudo?
Pela expressão ferida em suas feições bonitas, ela achava que ele poderia muito bem ter
acreditado.
— É só eu estalar os dedos e tudo será esquecido? Como posso confiar em você?
— Eu revelei minha natureza Chrechte para você.
Ela achava que deveria significar muito mais para sua raça do que para ela, especialmente
quando ele esperou tanto tempo para fazê-lo.
— Depois de escondê-lo por toda nossa vida, inclusive quando você estava me convencendo
a compartilhar suas peles sem casamento.
O conhecimento que os outros guardaram dela ainda doíam também, mas estava fazendo seu
melhor para não responsabilizá-lo pelas ações de seus pais, ou de Thomas e Audrey.
— Eu não pude evitar. Eu também acreditei que você seria minha. Não foi mentira quando
eu lhe prometi casamento.
— Seu lobo queria sua companheira.
E as necessidades da fera teriam convencido o jovem Caelis de seus planos futuros. Shona
conseguia entender isso um pouco melhor, especialmente considerando o quanto essas mesmas
necessidades a haviam influenciado e ela nem sequer era Chrechte.
— Aye. E eu era mais jovem, não tinha o controle. Nós já tínhamos esperado tanto tempo.
Ela assentiu, compreendendo e talvez até aceitando.
— Mas o que há nisso para eu confiar?
Ele abriu sua boca e então a fechou novamente, nenhuma palavra saía e as mais interessantes
expressões passavam por seu rosto.
Primeiro choque, depois consternação e finalmente o esclarecimento.
— Ontem à noite, eu não coloquei meu sexo dentro de você.
Ela queria que ele tivesse feito. E ele também sabia, provavelmente, tão intimamente como
ela.
— Você não arriscou uma gravidez e agradeço, mas não deixou minha cama, tampouco, e
permitiu que Audrey nos encontrasse juntos. Você não pode me dizer que não ouviu sua agitação no
quarto ao lado.
— Paredes de pedra são espessas. Eu não a ouvi até que parou de lado de fora de seu quarto.
— E então, já era tarde demais.
Então ele não a comprometeu de propósito. Outra ponto a seu favor.
— Aye. Você quer que eu me desculpe por ficar com a minha companheira? — A carranca
que ele fez dizia a ela que ele faria isso, mas não iria gostar.
Claramente ele acreditava que aquele título dava a ele todos os tipos de direitos e
privilégios. Não estava certa que não o fazia, não quando ela também sentia o quão fortemente eles
eram atraídos.
— Não.
Ele a olhou com expectativa. Ela simplesmente olhou de volta, esperando. Ou ele viria com
melhores argumentos para convencê-la de que ela podia confiar nele, ou perceberia o quão pouco
ele realmente fez para conseguir esse resultado.
— Mudei para conriocht na sua frente. — Ele disse depois de alguns segundos de silêncio,
com o ar de um homem que não deveria precisar chamar a atenção para um fato óbvio.
— Você mudou na frente de outros também.
— Eu fiz isso por você, para protegê-la e a nossos filhos.
Se ele apenas soubesse, toda vez que se referia à Marjory e a Eadan como seus, Caelis
adicionava força à fundação para seu acasalamento-casamento que ela estava tão preocupada.
E este era um ponto que achava fácil reconhecer.
— Estou convencida de que nossa segurança física é fundamental para você agora.
— Mas não era antes. Isso é o que você está pensando. — Ele se virou novamente, seu corpo
agora rígido com tensão.
— É? — Ela perguntou, não tendo tanta certeza de que ainda pensasse assim.
— Nunca ocorreu a mim que você e seus pais deixariam nosso clã. Era sua casa.
— Mas não uma na qual éramos bem-vindos, e você sabia disso melhor do que eu.
Sua mandíbula tencionou, ele balançou a cabeça em reconhecimento.
— E ainda assim você acreditava que iríamos ficar, que eu continuaria com o clã. Solteira.
Novamente aquele único movimento de cabeça.
Ele disse isso antes, agora ela acreditava. Não podia evitar, na verdade. Isto também
explicava muitas de suas ações e atitudes que de outra forma só poderiam ser justificadas se ela
acreditasse que ele era o monstro que imaginou por seis anos. Independente do que Caelis fosse,
conriocht ou humano, ele não era um monstro. Suas suposições seis anos atrás foram arrogantes,
mal pensadas e quase idiotas, mas ele havia acreditado nisso.
— Você achou que poderia cuidar de mim, eu tirei essa opção de você. — Ela estava agora
absolutamente certa de que era assim que ele viu.
Mas ele balançou a cabeça.
— Você não teria partido se eu tivesse feito o correto por você. — Suas mãos se fecharam
em punhos em seus lados. — Eu poderia ter ido com você. Eu deveria ter deixado o clã com sua
família.
E agora ele queria que ela voltasse. Ele não podia ver a ironia nisso?
Ela podia, da mesma forma que podia ver a ironia do que ela estava prestes a dizer.
— Eu amo você.
— O quê? — Ele se virou para ela tão rápido que o movimento pareceu um borrão no brilho
lançado pela única vela acesa ao lado da cama. Choque absoluto escrito em suas feições e na
maneira como ele segurava seu grande corpo. — O que você disse?
— Eu amo você. Eu nunca deixei de amar. — Ela queria, Deus sabia que ela queria, mas
nunca foi capaz de desligar suas emoções.
Ela tentou tanto se proteger, proteger seus filhos, mas o amor e o desejo queimavam mais
forte dentro dela agora do que há seis anos. E era por isso que não iria, simplesmente não podia, se
casar ou realizar a cerimônia de acasalamento com este homem se não confiasse nele para ser
correto com ela.
Ela tinha mais a perder do que ele, mas ele nunca iria entender isso. Seu lobo a havia
nomeado sua companheira antes que ela sequer soubesse o que era desejo. Eles haviam esperado
por ela, Caelis e seu lobo, mas ele não a amava.
Se ele a tivesse amado, não a teria repudiado. Independente do que ele sentisse por ela,
estava marcado por seu dever para com os Chrechte e sempre estaria.
Ela podia aceitar isso, porque não tinha outra escolha a fazer, mas não aceitaria vir sempre
por último.
Oh, Shona não tinha nenhuma dúvida que ele precisasse dela, mas ele sobreviveria se a
perdesse. Ele tinha mais do que sobrevivido nestes últimos seis anos, prosperou e encontrou um
destino com o qual poderia nunca ter sonhado.
Ela, por outro lado, tinha chegado perto de perder sua mente e só o amor e a determinação
de proteger e criar seus filhos a tinham salvado.
Ele passou seis anos celibatário. E enquanto ela tinha certeza de que tinha sido um teste para
ele, ela passou esses mesmos anos submetendo-se ao toque de um homem que matava um pouco da
sua alma cada vez que usava seu corpo para saciar sua luxúria. Ela passou cada um daqueles dias,
até suas mortes, sendo insultada pelos pais que ela amava com todo seu coração. A cada dia,
estoicamente sofria vários tipos de ofensas por ser a escocesa pretenciosa que se casou com um
homem que tinha três vezes a sua idade.
E nada disso se comparava com a ferida em sua alma que sangrava diariamente pela rejeição
e ausência de Caelis.
Amor tremendo tem poder tremendo.
— Você me ama, mas não confia em mim?
— Eu não posso. — Ela respondeu duramente.
Caelis engoliu em seco, suas mãos se fechando e abrindo ao seu lado como se quisesse
alcançá-la, mas ele se impedia.
— Você não acredita que eu te amo.
— Eu sei que você não ama e eu aceito isto. — Necessidade não era amor, nem a força do
acasalamento.
Como ele apontou, nem todos os companheiros se amavam. Uven não poderia ter amado a
companheira que ele matou, ele certamente não amou a filha que eles fizeram juntos.
— E eu devo ser grato por isso?
— Eu não sei. — Gratidão era melhor do que mero dever e ou desejo?
— Eu sou. — Ele suspirou, a expressão em seus olhos azuis ilegíveis. — Muito agradecido.
Lágrimas que ela não esperava queimaram seus olhos. Ela piscou, tentando dissipá-las, mas
a umidade continuou a crescer.
Ele disse outra daquelas maldições Chrechte e acabou com a distância entre eles.
Suavemente segurando suas bochechas com as mãos grandes de guerreiro, ele limpou as gotas que
transbordaram.
— Não chore mo toilichte. Por favor.
— Eu não quero.
Ele se inclinou para frente e sorveu a umidade, pressionando pequenos e infinitamente
suaves beijos sobre o rosto dela.
— Deixe-me tirar sua dor.
— Eu não posso. — Ela não correria o risco de uma nova gravidez e ter suas escolhas
tiradas dela agora que reconheceu seu amor por ele.
Isso a fazia muito vulnerável e ele não precisava de mais vantagens entre eles.
Ele movimentou a cabeça, como se não esperasse outra resposta.
— Existem muitas maneiras de eu proporcionar-lhe prazer para quebrar sua dor sem precisar
da copulação.
Ela não sabia o que ele queria dizer. Suas experiências de desfrutar da conexão entre um
homem e mulher havia passado todas com ele, incluindo a noite anterior, nunca conheceu o prazer
intimo sem ele terminando em seu interior.
— Eu...
— Nisto pelo menos, você vai confiar em mim? — Ele perguntou.
Ele estava dando aos dois uma oportunidade para avançar. Ela não sabia como construir sua
confiança nele exceto pelo tempo e por ele mostrando a vontade para corrigir o passado até onde
podia.
Mas ele estava lhe oferecendo uma oportunidade para construir a confiança nele. Se ela o
deixasse fazer isso, e ele mantivesse sua promessa implícita de não violar seu corpo, seria mais uma
rocha sólida na base para seu relacionamento. Não seria?
Os instintos que haviam gritado para ela mantê-lo fora de seu quarto antes, agora estavam
dizendo a ela que compartilhar da intimidade com ele ajudaria de uma maneira que pouco mais
podia fazer.
— Por favor. — Ele disse novamente.
E ela não podia negá-lo. Não queria negá-lo. Ela precisava desta oportunidade para construir
a confiança, tanto quanto ele.
— Sim.
Seu corpo enorme deu um tremor violento e um grunhido baixo de aprovação retumbou em
seu peito.
Caelis se curvou e a ergueu em seus braços, na altura de seu peito, sua camisola caindo pelo
corpo dele quase nu.
— Eu vou ofuscar cada lembrança de toque que você não queria com prazer. Somente eu
acariciarei seu corpo novamente.
— Promete? — Ela exigiu apesar de suas palavras soarem tanto quanto votos como nada
que ela já ouviu.
Ele olhou para baixo, a dor em seu próprio olhar combinando com as feridas em seu
coração, se ela pudesse se deixar acreditar.
— Prometo.
— Nunca mais. — Ela nunca mais se submeteria ao toque indesejado de outro.
Sua boca se definiu em uma linha sombria.
— Só eu.
— Só você.
— Esta é a minha promessa para você.
Ela assentiu com a cabeça, aceitando suas palavras, tanto quanto seu coração machucado
deixasse.
— Nunca mais minha promessa para você será posta de lado por causa da minha lealdade
para outros.
Sua respiração parou no peito.
— Você não quer dizer isso. Não diga se não quer realmente dizer isso.
Olhando seus traços cinzelados, não poderia haver dúvida da seriedade com que ele tomou
suas palavras.
Ele a deitou na cama, sem fazer nenhum movimento para remover sua roupa, e depois
recuou. Ele colocou a mão direita sobre o coração.
— Eu juro.
— Por sua honra como guerreiro? — Ela perguntou, incapaz de impedir a dúvida por suas
palavras.
— Por minha honra como Chrechte e conriocht.
E ele prometeu a ela que nenhum outro homem jamais a tocaria intimamente. O medo que
foi um fardo tão pesado, que ela nem o reconhecia mais, foi tirado dela, iluminando seu coração de
uma forma que ela não achava mais ser possível.
— Percival não pode me ter. — Disse ela, a alegria exuberante em seu coração e tom.
Caelis caiu de joelhos ao lado da cama, suas mãos agarrando as dela firmemente.
— Ninguém. Eu vou te proteger com minha vida.
— Não apenas seu filho.
— Eu não poderia ter meu filho ou filha, sem a dádiva de sua mãe. Nunca duvide disto, você
é de primordial importância para mim.
Ela queria acreditar em suas palavras. Muito.
E percebeu que a escolha era dela. Assim como a dele foi há seis anos.
Será que ela era menos responsável por suas próprias decisões agora?
Naquele momento, escolheu acreditar.
Ela acreditava que Caelis não a rejeitaria novamente, que ele a protegeria com sua vida. Não
a desperdiçando em seu favor, mas dando-a para ela.
— Obrigada.
Seu rosto se contorceu com grande emoção.
— Você me desmoraliza, Shona. Não me agradeça pelo que eu não posso evitar, como
também não posso parar meus próprios pulmões de respirar.
Ela passou a mão pelo rosto dele, amando a sensação de sua barba masculina contra sua
pele.
— Eu vou te amar para sempre.
Esse era o seu voto para ele.
E ela considerou que valeu a pena fazer quando seu sorriso assumiu suas feições e ele se
levantou.
— Obrigado.
— Não me agradeça pelo que eu não posso evitar, como também não posso parar meus
próprios pulmões de respirar. — Ela disse em uma imitação da voz dele.
— Eu sempre serei grato por isto mesmo assim. — O sorriso aqueceu a voz dele, alcançando
e curando seu coração.
— Você parece uma noiva.
Ela queria ser dele, mais do que ele poderia entender.
— Hoje eu sou apenas uma mulher apaixonada.
— Você nunca será apenas nada.
— Não serei? — Ela não pode evitar seu próprio sorriso em sua reivindicação.
Ele balançou a cabeça.
— Você não entende, mas um dia, irá.
Ela estendeu a mão para ele como convite.
— Caelis...
— Você é tudo, companheira. — Ele tirou seu kilt e armas, colocando-os a uma curta
distância da cama.
CAPÍTULO 20
Os ferimentos de mais cedo não eram nada mais do que as linhas rosas sobre a pele de
Caelis.
Shona olhou para ele com admiração.
— Você está curado.
— É o conriocht. Quando eu mudo para esta forma ou de volta dela, meu corpo se cura.
— Mas não quando você muda para seu lobo?
— Nay. Isto faz parte dos dons para os protetores de nosso povo.
— Eu fico contente. — Ela se preocupava menos, sabendo que ele tinha essa incrível
capacidade de curar suas lesões. — Será que funciona mesmo para danos graves?
— Eu não sei. — Ele girou em direção à cama, a graça de seu lobo em evidência.
— Eadan disse que vai ser conriocht um dia.
— Este é um dom para esperar ansiosamente.
Ela assentiu com a cabeça, as maravilhas de sua vida Chrechte empalidecendo diante do
desejo que queimava entre eles todo esse tempo. Através de cada palavra cheia de emoção de sua
conversa, a necessidade física entre eles não diminuiu.
— Eu quero você. — Ela disse a ele sem vergonha.
— Você me terá, agora e para sempre. — Ele prometeu.
À luz do que ele disse, seus votos tinham um significado mais profundo. E colocavam suas
próprias restrições em questão.
O que ela queria dele? Ser capaz de confiar. De alguma forma, nos últimos minutos,
enquanto ele fazia as promessas que ela precisava ouvir, mas não tinha pedido, ele deu a ela.
Ou talvez foi aquele tremendo poder de um amor incrível trabalhando, mas ela não duvidava
mais de seu lugar na vida de seu companheiro.
Ele podia não amá-la como ela o amava, mas se importava e precisava dela e ele iria
protegê-la com sua própria vida.
Ele poria os segredos de seu povo em risco por ela e isso era mais significante que qualquer
tarefa mundana que ela atribuísse para ele provar o que ele já tinha estabelecido.
Sem nunca afastar sua atenção dela, Caelis pegou a pele que deixou cair mais cedo e a
colocou na cama, movendo-a para que ficasse por cima da pele.
Ela sentiu a suavidade contra sua pele e a espessura, que se tornou uma almofada adicional
sob dela, mas tinha a sensação de que suas ações não eram para o conforto. Esta pele tinha um
significado especial para ele.
Ela não perguntou. Existiam questões de maior importância para resolver.
— Eu me casarei com você. — Ela disse a ele. — Gostaria que o casamento de Audrey e
Vegar recebessem a bênção do padre junto com o nosso.
Ele parou seus movimentos, sua expressão contida.
— Eu pensei que...
— Eu também pensei... que você ir comigo para a ilha Balmoral seria necessário. Não é.
— Não é? — Caelis soou estonteado.
Ela balançou a cabeça.
— Eu pensei que precisasse que você provasse algo para mim, que fizesse reparos pelo
passado.
— Mas não se sente mais assim?
— Não. Suas ações podem ter precipitado a perda do afeto dos meus pais por mim, mas eu
também fiz minha parte. Porém, principalmente, suas ações eram responsabilidade deles. Nós não
podemos desfazer o passado, nem eu iria querer. Uma coisa que aprendi é a capacidade de minha
própria força, e isto é uma coisa boa.
— Aye.
— Eu amo você, Caelis, protetor dos Chrechte. Meu protetor.
— Companheira. Mo toilichte. Minha. — Sua boca desceu sobre a dela com uma fome que
obscureceu qualquer coisa que veio antes.
Ela retribuiu o beijo, derramando seu amor e liberando a dor do passado através dele.
Suas línguas duelaram, enquanto seus lábios se consumiam e o corpo nu dele se pressionava
contra o dela, o calor passava entre eles como se o tecido de sua camisola nem estivesse ali.
Ele se afastou, movendo-se para beijá-la por todo seu rosto, ao longo de sua têmpora e pelo
pescoço. O tempo todo, ele sussurrava palavras contra sua pele.
Foi apenas quando ele acariciou a pele sensível atrás de sua orelha com os lábios que ela
entendeu as palavras que ele estava dizendo.
— Obrigado. Sempre minha. Meu presente. Obrigado.
As palavras e o sentimento fervoroso por trás delas trouxe umidade para seus olhos e uma
profunda emoção obstruiu sua garganta. Ela piscou para afastar as lágrimas incipientes e engoliu a
emoção, muito feliz com a resposta para deixar qualquer coisa estragar o momento.
Até mesmo seus próprios sentimentos de êxtase.
***
Caelis levantou a camisola de Shona sobre suas pernas, mostrando sua pele de alabastro para
seu olhar. A curva de suas pernas convidava seu toque, e a sombra no ápice de suas coxas mal
coberta pelo fino material atraía seu olhar e sua fome.
Fome construída pela necessidade voraz de suas palavras. Ela prometeu se casar com ele,
deu-lhe o presente de seu amor, quando ele tinha certeza de que nunca lhe seria oferecido
novamente.
O fato de que ela estava tão certa de que os sentimentos dele não eram iguais aos seus, não
era uma conclusão que ele poderia contradizer. Suas ações falaram muito alto para que meras
palavras a convencessem do contrário.
— Você é tão linda. — Ele respirou.
Ela riu suavemente, balançando a cabeça em negação.
— Eu sou apenas uma mulher com todas as marcas em meu corpo que dar a luz duas vezes
deixou para trás.
Ele sabia o que ela queria dizer. As linhas finas, onde seu corpo se esticou para acomodar
seu ventre inchado com a criança, a forma como os seios pesados pendiam mais como tentadores
pêndulos do que maçãs maduras.
Não, ela não tinha mais o corpo de uma menina intocada com apenas dezoito verões, mas
isso não diminuía sua beleza para ele. Na verdade, as marcas que o tempo e as circunstâncias
haviam deixado apenas o intrigavam e o lembravam que ele fazia amor com uma mulher, não uma
menina.
Uma mulher que deveria ser motivo de orgulho pela beleza oferecida a ela, em todas suas
formas.
— São cicatrizes de batalha que você deve usar com o mesmo orgulho que eu uso as
minhas.
Ela riu, o som obscuro.
— Essa é uma visão única sobre minhas imperfeições. O Barão não suportava vê-las.
— Idiota. — Ele odiava a ideia dela ser feliz com outra pessoa, mas descobriu que ele
desprezava a verdade de que ela foi infeliz ainda mais.
Caelis a ajudaria a se livrar daquelas lembranças, começando agora.
Ele colocou as mãos sobre suas coxas, roçando os polegares ao longo do interior e subindo
em direção aos cachos vermelhos espreitando de onde ele tinha empurrado a bainha de sua
camisola.
Shona estremeceu, arrepios de prazer se formando em sua pele sob o toque dele.
— Como pode um toque tão simples evocar um prazer tão profundo em mim?
— Nós fomos feitos um para o outro.
— O vínculo de acasalamento.
— Isto não é a única coisa entre nós. — Ela tinha que pelo menos acreditar nisso.
Ela poderia muito bem negar seu amor, mas tinha que acreditar que ele tinha sentimentos
por ela além da inexorável ligação de seu lobo a ela.
Ela não o contradisse e a expressão suave em seus belos olhos esmeralda também não dava
indicação de que ela queria.
Iria mostrar a ela que enquanto o vínculo os atraíam, isto era apenas o começo, e não os
limites de sua união.
Ele subiu mais para cima sua camisola, descobrindo os brilhantes cachos sedosos.
— Tão bonita.
— Bonito não é a palavra que penso quando eu vejo você nu. — Ela brincou.
— Naturalmente que não. Eu sou um guerreiro, não uma mulher.
O sorriso de malícia deveria tê-lo avisado do que estava por vir.
— Agora que penso nisto, uma parte de sua anatomia possui uma bonita forma. — Ela olhou
em direção ao duro sexo sobressaindo de seu corpo.
O riso e a alegria que só ela poderia trazer borbulharam dentro dele.
— Você acha que meu pau é bonito? — Ele perguntou, com uma sacudida de sua cabeça.
— Oh, sim.
Ele abriu mais suas coxas, para que ela tivesse uma visão desobstruída.
— Não me parece bonito agora. Dói.
— Dói?
— Aye. — E ela sabia muito bem, apesar de sua brincadeira sensual.
— Talvez eu possa ajudar com isso.
Ele queria que ela ajudasse, mas tinha planos e eles não incluíam seu sexo a uma curta
distância das mãos pequenas e femininas no momento.
— Mais tarde.
— Caelis?
— Deixe-me fazer do meu jeito, Shona. Isto é o que eu mais quero agora. — E apesar de sua
fome voraz para enterrar-se dentro dela, as palavras eram pura verdade.
E queria dizer que ele tinha certeza de que havia outra forma de que ela aceitasse, como
veria.
Ela se inclinou em um braço e tirou toda a camisola antes de voltar a se apoiar em seus
cotovelos, a pose deixava seus seios generosos para frente, o convite inconfundível.
— Sim.
Ele podia sentir o sorriso curvando sua boca e não fez nenhum esforço para detê-lo.
— Sua beleza é de tirar o fôlego.
Ela corou, seu embaraço um aroma picante entre eles, fazendo-o rir.
— Você revela sua nudez para mim, mas fica vermelha com um elogio? — Ele zombou
suavemente.
— Você é o único que já me considerou bonita.
— Nay. — Ele tinha certeza que ela estava errada. — Mas eu sou o único inteligente o
suficiente para dizer-lhe.
Ela balançou a cabeça, longos fios de seda vermelha ondulando sobre seus ombros e contra
a pele que ele curtiu e preparou há seis anos para uma cerimônia de acasalamento que nunca
ocorreu.
— Homem teimoso.
Apesar da cerimônia não ter acontecido, eles tinham usado a pele. Não que ele esperasse que
ela se lembrasse.
— Eu já fui chamado de coisas piores. — Ele bagunçou o bonito triângulo de pelos no ápice
de suas coxas. — Você está corando em outros lugares, eu me pergunto?
Ela deixou suas coxas ainda mais abertas, com tal confiança que ele queria gritar sua vitória.
Shona disse que não confiava nele, mas depois concordou em se casar com ele. Mas a verdade do
coração dela se mostrava em suas ações. Quaisquer reservas que ela ainda pudesse ter, confiava
nele completamente com seu corpo. Há seis anos, fazer isso lhe custou caro. Que ela oferecesse-lhe
este presente novamente fazia seu lobo uivar de alegria.
Ele cuidadosamente apertou as pernas para cima e mais separadas, para obter uma visão
desimpedida das pregas avermelhadas e inchadas de seu sexo. Lisa com a umidade, seu corpo
implorava silenciosamente por sua possessão.
Era uma visão incomparável.
— Você é linda, mesmo aqui.
— Você não deveria dizer essas coisas.
— Por que não? Se elas são verdadeiras. — Ele se inclinou e deu um beijo suave em seus
lábios inferiores femininos.
A carne macia contra a dele, o cheiro de sua excitação um afrodisíaco tão forte para ele e sua
fera que um pouco de ejaculação jorrou de seu pênis dolorido. Se ele apenas se esfregasse contra a
pele, atingiria o clímax como um garoto inexperiente. Precisando prová-la, ele colocou a língua
para fora e lambeu os sucos fragrantes. Doce com o sabor picante de seu desejo, o gosto chamando
tanto seu homem quanto seu lobo em um nível primitivo.
Ele gemeu seu prazer contra a carne inchada e continuou provando, lambendo, e chupando
sem pensar em nada, apenas compartilhando com ela o prazer que recebeu por sua submissão a ele.
Ela agarrou seu cabelo, seus dedos enrolados firmemente ao redor de suas tranças de
guerreiro.
— Isso é... o que você... você deve... Oh, Caelis.
O nome dele terminou em um gemido quando sua língua tocou seu clitóris. Satisfação
queimando por ele. Ele iria mostrar-lhe que ela estava segura agora, em todos os sentidos.
Ele sabia da importância de sua companheira.
Ela se contorcia nas peles, o corpo dela se pressionando contra sua boca, sons de êxtase
saindo de seus lábios como a cadência constante da chuva de primavera. Ele sorveu cada um deles
com a sede que apenas um homem que ficou seis anos no deserto podia sentir.
Deslizando um dedo dentro dela, seu senso de vitória aumentou à medida que o corpo dela
se agarrava ao seu dedo, seus músculos internos apertando-o com força surpreendente. Ela o queria
dentro dela talvez tanto quanto desejava estar lá.
Logo eles consumariam seu acasalamento e casamento, mas só quando ele tivesse se
provado merecedor da honra. Não como seis anos antes, quando ele tomou aquilo prematuramente,
o que ele provou não ter nenhum direito porque não honrou o presente dela, como era o certo.
Movendo seu dedo para dentro e para fora dela, ele lambeu e chupou-lhe os lábios inferiores
e clitóris até que ela estivesse rígida de necessidade. Ela balbuciou sua necessidade, enquanto seu
corpo se sacudiu contra sua boca exigente e suplicante. Seria preciso tão pouco para levá-la a este
ponto de êxtase que ela claramente queria, mas isso não seria suficiente.
Não o suficiente para apagar as lembranças antigas. Não o suficiente para suplantá-las
firmemente e de forma irrevogável com as novas. Não o suficiente para mostrar a ela o quanto ele
estimava o presente de seu corpo.
Ele recuou, sentando-se sobre os calcanhares enquanto planejava mentalmente deixá-la
ainda mais arrebatada.
— Não. — Ela clamou, tentando alcançá-lo.
— Shh. — Ele a acalmou, sua mão acariciando a coxa e seu lobo sussurrando em seu peito.
— Eu darei a você o que deseja, no tempo certo.
— Agora. — Ela exigiu.
Ele sorriu amando essa demonstração de confiança.
— Logo.
Ele retornou ao corpo dela, traçando as finas linhas prata, que ela ficou tão preocupada, com
sua língua. Ela se contorcia, gemendo suavemente. Ele iria mostrar-lhe o quão atraente achava essas
marcas de feminilidade. Ele acariciou seus seios também, mostrando com seu toque e boca o quanto
gostava de suas curvas e de sua ponta dura.
Ela se retorceu contra ele, mas ele cedeu ao desejo de terminar o que ele havia começado.
Ele iria levá-la ao limite do clímax, mas ela apenas iria atravessar esse precipício quando ele
tivesse dado a ela um excesso de prazer. Quando ele tivesse criado uma nova lembrança para o
corpo dela que substituiria todas as outras.
Shona respondeu a cada toque seu com uma paixão tão bonita, que tomou todo o
autocontrole de Caelis para não ter um orgasmo enquanto ele levava sua bonita companheira justo
ao limite uma e outra vez.
Quando finalmente a levou ao clímax, ela gritou seu prazer e as convulsões ao redor de seus
dedos duraram minutos, não segundos.
Seu corpo finalmente desmoronou de volta para a pele, mole, seus olhos semifechados,
curtas respirações ofegantes saindo de seus lábios entreabertos.
— Isso foi incrível. — Ela disse ofegante entre as respirações. — Como é que você... por
que você... — Ela parecia incapaz de completar um pensamento.
Isso o agradou indizivelmente.
— Você é incrível. — E ele estava tão duro que doía.
— Não. Você... você é a pessoa incrível. Não fez nada para si. — A confusão em sua voz e
olhos era doce.
— Dar-lhe prazer é um privilégio que eu nunca mais deixarei de valorizar.
Seus olhos brilharam novamente, mas desta vez a visão não o machucou.
— Eu quero você dentro de mim.
— Logo. — Quando os votos tivessem sido falados entre eles diante de testemunhas.
Ela precisava disto, mesmo que não percebesse mais. Talvez, ele também precisasse.
— Eu disse que me casaria com você.
— Aye, e nós seremos casados com um padre dizendo sua bênção sobre nós.
— Por que você não se une a mim então?
— Porque isso virá depois.
Ela sorriu, uma expressão intensa em suas profundidades esmeralda que dizia que talvez ela
estivesse plenamente consciente de que ela precisava dessa espera.
— Será que você... — Ela corou novamente, seu olhar se abaixando.
— O quê, mo gra? O que você quer?
— Não seu coração. — Ela se enrolou, sem a mínima convicção que mostrou anteriormente
quando alegou que ele não a amava. — Eu quero que você faça o que você fez na noite passada.
Ele queria isso também. Muito. Moveu o corpo dela para cima para que ele pudesse esfregar
seu sexo dolorido contra sua carne sensibilizada.
Ela se contorceu, mas não se afastou.
— Sim, assim. Sinto tão perto.
Aye. Ele disse através de seu laço mental.
Tão íntimo. Ela empurrou-se contra ele, apesar de sua evidente letargia.
Ele teria concordado, mas estava muito ocupado explodindo contra o corpo dela de forma
rápida, sua semente marcando-a novamente e fazendo seu lobo uivar com triunfo. Eles a queriam
muito e por muito tempo para durar uma vez que o prazer dela foi assegurado.
Ele desmoronou ao lado dela, seu abraço apertado, apesar de sua sensação de relaxamento.
Ela se aconchegou nele.
— Eu não vou a lugar nenhum.
— Amanhã, você vai partir para a ilha Balmoral.
Ela ficou tensa.
— O quê? Você está me recusando agora. — Ela perguntou, embora parecia que mesmo ela
não pudesse acreditar nisso.
Bom.
— Não seja boba, mo toilichte. Nós vamos partir após o café da manha. Depois de amanhã.
— Nós? — Ela perguntou, soando ao mesmo tempo esperançosa e ainda um pouco
preocupada. — Por que um dia depois? — Saiu mais como uma reflexão tardia.
— Como você pode duvidar depois do que acabamos de compartilhar? E porque a sua
querida amiga irá se acasalar numa cerimônia Chrechte tradicional amanhã à noite.
— Eu tinha me esquecido. — Os dedos de Shona se apertaram em preocupação contra o
peito dele. — Como eu posso ter esquecido?
— Foi um dia agitado.
— Foi. E não duvido de você.
— Bom.
— Quando você decidiu vir comigo?
— Assim que você anunciou suas intenções de ir.
Ela fez um som de escárnio.
Não tinha havido nenhuma decisão real para tomar.
— Eu não confiaria sua segurança a mais ninguém para a jornada.
— Oh.
Ele subiu até se debruçar sobre ela, seu coração de guerreiro preso na expressão de seu belo
rosto oval.
— Você vai se apresentar a sua família. Eu declararei minhas intenções sobre você para eles.
Mas preste atenção em minhas palavras, companheira, ninguém, nem mesmo você, minha querida
Shona, nunca mais vai mantê-la afastada de mim.
Seu sorriso era como o sol aparecendo inesperadamente através de um buraco num céu
cinzento.
***
Acordar firmemente segura nos braços de Caelis era muito mais confortável e agradável do
que Shona teria admitido, até para si mesma, no dia anterior. Parecia tão normal estarem abraçados
sob a pele, seus membros nus entrelaçados.
No entanto, ela não se lembrava de uma pele sobre eles na noite anterior. Não tinha um plaid
Sinclair em sua cama emprestada?
Caelis deve ter movido a que ele havia trago com ele de baixo deles para cobri-los, mas ela
não conseguia se lembrar dele fazendo isso. Apesar, de ter estado menos consciente quando
finalmente ele declarou que chegou o momento de dormir.
Na luz da manhã entrando pela janela alta, ela podia ver mais detalhes da pele e percebeu
que já a tinha visto antes.
E não apenas na noite anterior no corredor.
Ela levantou o canto da pele para olhar a parte de baixo do couro macio. Com certeza havia
um S e C queimado no couro com um nó celta intrincado juntando as letras.
Era a mesma pele na qual eles fizeram amor seis anos atrás. Traçando seu dedo sobre as
linhas dos símbolos, ela tentou imaginar o que significava ele ainda ter essa pele com ele na
fortaleza Sinclair.
A tensão no corpo ao lado dela lhe disse que Caelis acordou.
Ela olhou para seu rosto amado.
— Esta é a mesma pele.
Ele não perguntou nada, simplesmente inclinou a cabeça em concordância.
— É.
— Como?
— Eu sempre a uso para dormir.
— Até quando você foi para outra propriedade para devolver a filha de Uven? — Apesar da
prova a estar cobrindo com um calor delicioso.
— Mesmo assim.
— Mas por quê?
— É a nossa pele de acasalamento.
— Eu não entendo.
— Estas peles especiais são preparadas para o acoplamento de um Faol e seu companheiro
pela tradição Chrechte.
— Mas você não me fez sua companheira.
— Oh, eu fiz. Nosso laço foi formado quando você deu seu corpo para mim.
— Você realmente achou que eu iria ficar e que Uven mudaria seu coração.
— Aye.
— Você foi estúpido.
— Aye.
Ela sorriu.
— Eu amo você.
— Você disse isso ontem à noite.
— Eu achei que você poderia gostar de ouvir isto esta manhã também.
— Eu gosto.
— Bom. — Ainda que ele não a amasse, contanto que ele não desvalorizasse seu amor, ela
podia achar satisfação com ele.
Ela estava certa disso.
Ela viveu coisa pior e sentia apenas gratidão porque seu passado não seria mais seu presente.
CAPÍTULO 21
Shona ficou encantada ao descobrir Audrey esperando no grande salão com Thomas, as
crianças e Vegar, quando ela e Caelis desceram para o café da manhã.
A filha que foi tão tímida quando eles deixaram a Inglaterra estava contentamente abrigada
no colo de Vegar, conversando com a boneca de pano que Shona fez para ela quando Marjory era
um bebê. Ela ergueu a boneca para Vegar e disse algo que Shona não pode ouvir.
Mas fez Vegar parecer desconfortável, e isso trouxe um pequeno sorriso para o rosto de
Shona. Ela ficou chocada além da imaginação quando o obstinado guerreiro beijou a boneca em sua
cabeça de esfregão esfarrapado e fingiu alimentá-la.
Audrey riu levemente e Thomas disse algo, mas Vegar não pareceu aborrecido.
Ou, não tão aborrecido como o homem nunca tinha parecido em seu breve conhecimento.
— Eu fico contente de ver nossos filhos e seu tio Vegar se dando tão bem. — Disse Caelis
com um sorriso em sua voz.
Shona parou em seu progresso em direção à mesa principal e olhou para ele.
— Tio?
— Ele é companheiro de sua irmã de coração. Isso faz dele tio, mas ele também é o mais
próximo que eu tenho de um irmão.
— E quanto a Darren? — Ela perguntou, nomeando o irmão mais novo de Caelis.
Tristeza e raiva emanaram de Caelis.
— Ele morreu como Jon, em uma missão para Uven em que Darren não tinha nem a
experiência nem o treinamento necessários.
— Foi quando você começou a questionar os modos de Uven?
— Eu comecei a duvidar da onisciência de nosso lorde quando você deixou nosso clã.
Shona aceitou a alegação sem comentário, indo para frente novamente. Ela notou que os
guerreiros por quem passavam tinham o cuidado de não tocar nela.
Você me marcou com seu cheiro de novo, não é? Ela perguntou pela ligação de
acasalamento.
Uma risada rica soou em sua cabeça embora o rosto dele permanecesse impassível.
A maioria destes soldados são humanos e não têm nenhuma ideia de que você está com meu
cheiro.
Por que são tão cuidadosos para não me tocar, então?
Porque eu sou um guerreiro formidável e qualquer um que olhar para nós reconhece que
você é minha.
Eu nem sequer visto as cores MacLeod, muito menos um sinal que me proclame sua. Ela
ainda usava suas roupas inglesas, mas Caelis andava tão perto que não havia dúvida de que eles
estavam ligados de alguma forma.
Eu sou todo o sinal que estes homens precisam.
— Arrogante. — Ela disse em voz alta quando chegaram à mesa.
Desta vez, a risada dele foi alta e, por algum motivo, tanto Sinclair quanto Vegar se
juntaram a ele. Thomas sorriu, também, como se estivesse segurando a alegria.
Ela olhou para todos eles, mas virou um sorriso para Abigail e Audrey.
— Bom dia.
— Bom dia. — O sorriso de Abigail era amável. — Você parece bem descansada.
— Eu estou. Obrigada. — Ela olhou Audrey criticamente. — Você dormiu na noite passada.
— Shona alegrou-se. Ela estava preocupada que sua amiga pudesse ficar acordada em antecipação
nervosa pela cerimônia de acasalamento por vir.
— Eu dormi. — Audrey deu um olhar em direção a Vegar que não era difícil de interpretar.
Audrey poderia ainda ser virgem, mas ela já não era totalmente intocada. Shona ficou
profundamente grata que a experiência foi obviamente tão positiva.
Ela podia quase olhar com simpatia para o rabugento guerreiro Éan por causa disso.
— Você ainda está brava com o papai? — Eadan perguntou enquanto Caelis ajudava Shona
a se sentar antes de se juntar a ela no banco comprido.
— Não, querido. Eu não estou.
— Papai diz que não tem pudim todas as noites. — Marjory anunciou infeliz.
— Você é doce o suficiente para ficar muito bem sem sobremesa todas as noites.
Marjory suspirou, mas assentiu.
— Eu gosto mais daqui do que de casa, de qualquer maneira.
— Isto é bom, porque esta é a nossa casa agora.
— Aqui? — Marjory perguntou com um olhar duvidoso ao redor do grande salão.
Caelis se inclinou sobre a mesa e puxou a trança de Marjory.
— Nay, mo breagha. Nossa casa está para o Sul. Sua mamãe quis dizer a Escócia.
— A Inglaterra não está no Sul? — Eadan perguntou.
Os olhos de Marjory se estreitaram.
— Eu não quero andar a cavalo durante dias e dias e dias mais.
— A viagem até as terras MacLeod não é tão longa como para a Inglaterra. — Caelis
prometeu.
Era longa o suficiente, e ele descobriria que crianças da idade de Marjory não faziam
distinção entre poucos dias de uma única semana e duas semanas inteiras. Qualquer coisa de mais
de um dia iria ganhar seu desfavor.
— Nós estamos indo para a ilha. — Eadan disse para sua irmã. — Nós teremos que montar
cavalos para isto.
— Como você sabia sobre isto? — Shona perguntou.
Seu filho teve outro de seus sonhos?
— Você disse. Nossa família está na ilha. — Eadan olhou para ela como se estivesse
preocupado de que ela houvesse esquecido.
Shona se pegou rindo.
— Eu disse. Você está certo.
— Nós iremos para a ilha Balmoral amanhã de manhã. — Caelis informou ao laird Sinclair.
— Nós vamos com você. — Disse um homem grande, de aparência perigosa que se sentou
ao lado de Ciara, a filha do laird.
Ciara olhou para seu marido em dúvida.
— Eu pensei que nós não faríamos nossa viagem mensal para a ilha até a nova lua.
— Eu pretendo conhecer a companheira inglesa de Vegar e a mulher que vai domar o
MacLeod.
— Ele não é o laird ainda. — Shona assinalou, mas era claro que estes guerreiros ferozes
viam o lugar de Caelis no clã como preordenado.
— Você duvida que ele será? — Perguntou o guerreiro de cabelos escuros.
— Nay.
O homem acenou com aprovação para sua concordância.
Ciara fez um som muito grosseiro de diversão.
— Lady Heronshire, este é meu marido, Eirik.
Ele é o príncipe dos Éan. Caelis disse para Shona em sua cabeça.
Shona levantou o suficiente para dar uma meia reverência ao Chrechte real.
— É uma honra conhecê-lo.
Os olhos do príncipe se estreitaram.
— Não há nenhuma zombaria em seu cheiro.
— Nem deveria haver.
O olhar de Eirik mudou para Caelis.
— O vínculo de acasalamento já se formou?
— Começou seis anos atrás. — Caelis afirmou.
O aceno de Eirik foi tanto de aprovação quanto pensativo neste momento.
— Ciara disse que seu antigo laird o impediu de ficar com sua verdadeira companheira.
— Minha própria idiotice e lealdade equivocada fizeram isto.
Shona não queria nada além do homem admitir sua culpa, mas ela não apreciou nenhum
pouco a auto recriminação em seu tom.
Acariciando sua coxa, ela disse.
— Nós encontramos nosso caminho de volta um para o outro e isso é o que importa.
— Eu acho que certos membros dos MacLeod verão as coisas de forma diferente.
Confusão tomou conta de Shona. O aviso do príncipe foi sobre a oposição que ela
enfrentaria retornando ao seu antigo clã como companheira de um Faol?
Ele está falando dos Chrechte entre o clã. Um companheiro verdadeiro é sagrado e o fato
de que Uven a afastou de mim me dá o direito inquestionável de desafiá-lo como líder do bando e
laird.
Lançando um olhar de soslaio para o homem com quem prometeu se casar, Shona
considerou suas palavras.
— Meu retorno às Highlands foi fortuito, ao que parece.
— Aye, realmente fortuito. — Príncipe Eirik concordou.
Ciara balançou a cabeça, sua expressão tão pacífica que Shona identificava com
conselheiros espirituais que verdadeiramente buscavam trazer aqueles que os seguiram mais perto
de seu Criador.
— É imperativo que Uven seja deposto como laird dos MacLeod e pensamos que tínhamos
encontrado a resposta em Caelis.
— Mas? — Shona iniciou, tendo ouvido a vacilação na voz da celi di.
— Enquanto o rei escocês não vai se envolver em um problema do clã, desde que o
desafiante pelo direito de liderar seja um MacLeod, conquistar o apoio do clã é uma coisa
completamente diferente. A traição de Uven para Caelis e a prova da traição encontrada em ambos
você e seus filhos será suficiente para influenciar a maioria.
— Ambas as crianças? — Shona perguntou a Caelis.
— O próprio fato de que mo breagha não leva o meu sangue é uma afronta ao nosso laço
que pode ser colocado diretamente na porta de Uven.
— O que você disse, papai? — Marjory perguntou numa mistura infantil de inglês e gaélico.
— Eu disse que você é minha filha.
Marjory sorriu para o grande guerreiro.
— Você é meu papai.
— Aye.
— Meu papai, também. — Afirmou Eadan com firmeza.
— Absolutamente. — Respondeu Shona, ao mesmo tempo em que Caelis disse “Aye” em
sua profunda voz de guerreiro.
Feliz com a concordância deles, Eadan voltou para sua comida. Marjory, que comia
pequenas mordidas fornecidas por Vegar, continuava brincando com sua boneca, se contentando
mais uma vez em ignorar os adultos ao redor ela.
Audrey ficou pensativa enquanto conversavam e Shona ficou preocupada.
— Tem algo errado, querida? — Ela perguntou num sussurro.
Audrey olhou para Shona, depois para Vegar e de volta para Shona.
— O que será de nós?
Shona não entendeu a pergunta. Será que Audrey queria dizer ela e Thomas? Sinclair
prometeu treinar Thomas nos modos Chrechte e Audrey estava agora casada com Vegar.
Subitamente Shona ficou melancólica enquanto assimilava o que essas realidades realmente
significavam para ela. Ela estava para perder o resto de sua família, como ela perdeu primeiro sua
mãe e depois, mais recentemente, seu pai?
Caelis. Shona disse através de seu vínculo de acasalando, não muito certa do que esperava
que seu companheiro fizesse para ajudar.
Mas o pensamento de perder Audrey e Thomas era insustentável.
— Nós viajaremos para a ilha Balmoral com eles. — Vegar disse para Audrey. — Depois
disso, eu irei com Caelis desafiar Uven. Eu serei seu segundo.
A expressão de Audrey mostrou tanto alívio quanto Shona sentia. Eles não seriam
separados.
***
***
A cerimônia de acasalamento foi linda além da imaginação e ainda assim mais natural do
que qualquer casamento que Shona já assistiu.
Aconteceu nas profundezas das cavernas que os Chrechte consideravam sagradas, em uma
câmara impregnada com o poder de milênios de cerimônias espirituais Chrechte. A câmara brilhava
com uma luz inexplicável que emanava das paredes. A Clach Gealach Gra no pedestal de pedra no
centro queimava brilhantemente como se estivesse iluminada por dentro por uma chama tão quente
que queimava branco.
A luz brilhou vermelha enquanto o príncipe Eirik guiou Vegar e Audrey para colocar suas
mãos sobre ela e para dizer os votos um para o outro na língua antiga dos Chrechte.
Shona não entendia, mas Caelis traduziu os votos para que ela através do seu vínculo de
acasalamento. As promessas mútuas de cuidados ao longo da vida, proteção, respeito, fidelidade e
honra trouxe lágrimas aos seus olhos, enquanto ela se imaginava repetindo-as com Caelis.
Eles fizeram seus últimos votos e então um profundo silêncio caiu sobre a caverna, o ar tão
quieto que Shona podia ouvir seu próprio coração nos ouvidos.
A pedra brilhou um vermelho escuro profundo como um rubi e ambos, Vegar e Audrey,
soltaram uma respiração simultânea antes de olharem um para o outro com uma ligação tão forte
que Shona podia sentir seu poder de onde estava.
— Seu coração é puro. — Vegar pronunciou para sua companheira.
Audrey abaixou a cabeça.
— Ele é seu.
Deveria ser muito cedo para tais declarações, mas Shona tinha certeza de que ela não era a
única testemunha ali que sentiu a absoluta sinceridade de suas palavras.
— Irei para sempre guardar esse presente. — Vegar respondeu em um tom totalmente
solene.
Ciara deu um passo adiante, outra pedra erguida em suas mãos, esta brilhando como uma
esmeralda translúcida escura. Ela convidou Vegar e Audrey para colocar as mãos sobre ela também
antes de dizer uma bênção sobre sua união, que mais uma vez Caelis interpretou para Shona dentro
de sua cabeça.
A bênção soava como uma profecia e Shona guardou sua alegria por sua amiga em seu
coração.
A luz verde pareceu alcançar e cercar o casal acasalado e a celi di dos Faol, girando ao redor
dos três como uma névoa brilhante.
Shona sentiu-se atraída para a pedra, a vontade de tocá-la tão forte, que sua mão se ergueu
em direção a eles antes que ela se obrigasse a abaixá-la para seu lado. Com grande esforço,
segurou-se, cuidando para manter os pensamentos de quanto queria tocá-la longe de sua mente. Ela
não entendia essa necessidade, mas não iria ceder e estragar o momento especial de sua amiga.
CAPÍTULO 22
O príncipe Eirik pronunciou Vegar e Audrey companheiros por toda vida, responsáveis
primeiramente pelo laço sagrado entre eles.
Uma série de aplausos começou, ecoando nas paredes de pedra da caverna, ressoando com
triunfo e felicidade.
Quando criança, Shona testemunhou um casamento em seu clã que recebeu a mesma
resposta alegre. Ela se lembrava de pensar que um dia se casaria com seu guerreiro e o clã inteiro se
regozijaria. Mesmo naquela época, o único noivo que sua mente podia evocar era o menino Caelis,
apenas alguns anos mais velho mas um mundo à frente para os padrões de uma criança.
Laird Sinclair deu um passo à frente, uma pele negra sobre seu antebraço, e ofereceu-a a
Vegar.
— Para seu acasalamento.
Caelis se afastou de Shona e só então ela percebeu que ele também tinha algo em suas mãos.
— Que seu acasalamento comece como ele continuará, reconhecido por mim e por todos
Chrechte entre os MacLeod. — Seu companheiro ofereceu a Vegar e Audrey plaids nas cores dos
MacLeod.
Os outros soldados vestindo essas cores vieram para frente, todos caindo sobre um único
joelho e colocando seus punhos direitos sobre seus corações.
— Nós protegeremos seu acasalamento e sua companheira com nossas vidas como é o certo
entre nossa espécie. — Caelis disse num tom muito mais como seu conriocht do que o homem.
— Aye. — Disseram os soldados ajoelhados como um só.
Emoção oprimiu Shona, mas ela tinha seu próprio presente para oferecer. Ela se aproximou
do casal recém-acasalado e ofereceu sua escova de prata que ela trouxe entre os poucos pertences
que considerou absolutamente necessário quando fugiu do baronato.
— Que vocês encontrem alegria em seu trabalho um para o outro.
Vegar aceitou a escova de cabelo, o olhar terno que ele deu a Audrey dizendo que ele sabia
exatamente quem deveria estar oferecendo o ato de serviço. Em seguida, ela entregou a Audrey uma
bolsa cheia de ervas e remédios.
— Que você possa cuidar de seu marido e filhos por vir, curando arranhões bem como
corações.
Os olhos de Audrey transbordaram de lágrimas.
— Você estava preparada para isso, mesmo que não soubesse...
— Eu sabia que minha irmã de coração um dia teria um marido e que eu gostaria de estar
preparada para mostrar os meus bons votos para esta união.
Audrey abraçou Shona, um suave soluço soando em seu ouvido. Elas se abraçaram por um
longo momento antes de Shona recuar e Thomas tomar seu lugar. Ele ofereceu à sua irmã e ao
homem ao seu lado uma pele macia para cobrir sua cama de acasalamento.
Quando viu, Audrey novamente começou a chorar, mas Vegar simplesmente murmurou um
agradecimento sincero.
Depois disso, todo mundo ficou na câmara para a cerimônia de boas-vindas para a vida da
filha mais nova de Sinclair. A pedra verde brilhou novamente, envolvendo a criança trazendo
gorgolejos e risadas cheias de alegria do bebê antes de desaparecer.
Caelis e os outros soldados MacLeod acompanharam o casal acasalado para fora da caverna.
Minutos depois, os uivos de vários lobos ecoaram ao longo das passagens subterrâneas.
Caelis retornou à Shona e às crianças logo depois disso, exatamente onde ele as tinha
deixado. Ela não tinha a menor noção se ele mudou ou não.
— Parte do ritual de acasalamento? — Ela perguntou.
— Para os Faol, sim.
E Audrey era Faol, embora sua amiga inglesa tivesse pouca noção do que isso significava de
verdade.
Shona apenas balançou a cabeça em reconhecimento, não muito certa de que queria
detalhes, pois ela estaria enfrentando a sua própria cerimônia de acasalamento em algum momento
no futuro.
***
A viagem para a ilha Balmoral foi calma, se Caelis pudesse ignorar os olhares melosos entre
seu companheiro Cahir e a nova companheira do homem.
Quem saberia dizer que Vegar tinha aquela expressão em particular em seu repertório?
E a ex-inglesa passou tanto tempo cavalgando no colo de Vegar como ela fez em sua própria
sela.
Por alguma razão, os dois filhos de Caelis acharam isto muito divertido e suas risadas
ecoavam pela floresta enquanto os cavalos galopavam em direção ao mar.
Seu grupo chegou à margem onde os barcos eram mantidos em uma caverna pelos Sinclair
mais rápido do que ele teria esperado por viajar com crianças e um casal recém acasalado. A
travessia marítima passou rapidamente, com os quatro guerreiros robustos remando. As três
mulheres entretiam e vigiavam Marjory e Eadan, tendo a certeza de que especialmente o filho de
Caelis não tombaria pelo lado do barco nas águas.
Eadan tinha um senso de aventura destemperado pela cautela que deixava Caelis orgulhoso e
apavorado ao mesmo tempo.
De qualquer forma, o garoto não demonstrou mais medo da grande queda abaixo pelo lado
desprotegido da trilha que eles tiveram que subir para chegar ao castelo Balmoral do que ele fez ao
montar pela trilha na floresta. Caelis soltou um forte suspiro de alívio quando chegaram ao topo e
foi em direção ao imponente castelo no penhasco com vista para o mar.
Shona riu um pouco e ele se virou para ela.
— O que a diverte?
— Quando eu vi a fortaleza Sinclair pela primeira vez, eu tinha o desejo, mas pouca
esperança de que a de Balmoral fosse tão bem fortificada e imponente.
— É quase impenetrável.
— Eu posso ver isto. A minha família daqui, se eles quiserem, podem proteger Eadan das
tentativas malignas de Percival com pouco esforço.
— Ele não tem necessidade da proteção deles. Ele tem a minha. — Ela ainda duvidava
disto?
Shona sorriu para Caelis, seus adoráveis olhos verdes brilhando com o amor que ela tinha
admitido.
— Eu sei, mas com certeza você pode ver a ironia?
— Eu vejo. — Apesar dele não gostar do fato de que ela ainda estava pensando sobre outros
protegendo seu filho.
— Eu não estou. — Ela disse, exasperação torcendo seu sorriso.
— Eu não disse nada.
— Não? — Ela perguntou, seus olhos dizendo outra coisa.
Mas ele realmente não tinha. Ele não pensou seus sentimentos em voz alta, também. Estava
certo disso. Ele nunca antes ouviu a conversa mental ser tão parecida com leitura de mente. Sendo
este último um mito que os pais contavam a seus filhos nas histórias para dormir.
O seu grupo de viagem foi parado e interrogado no portão, mas deixaram que passassem
porque eles estavam com o príncipe Eirik. No entanto, um pequeno contingente de soldados
Chrechte os acompanhou até a fortaleza e não os deixaram até serem dispensados por Balmoral.
Caelis não tinha dúvida que o homem seria capaz de apontá-los na direção da família de
Shona. Lachlan conhecia seu clã desde o Chrechte mais antigo até o mais novo bebê humano, pela
aparência e pelo nome. O laird não só participava na formação de todos os soldados, Chrechte e
humanos, ele passava tempo treinando com os Cahir a cada semana também.
Sua esposa, lady Emily, tinha um interesse pessoal em todas as famílias do clã, independente
de suas origens e encorajava a amizade entre seus filhos e dos filhos do pessoal da cozinha tanto
como os dos mais alto escalão de guerreiros.
Momentos depois de explicar sua busca para encontrar os parentes de sangue restantes de
Shona ali na Ilha Balmoral, Caelis ficou sem palavras pelo conhecimento dado por Lachlan.
Shona não ficou tão afetada.
— Você é meu primo? — Ela perguntou ao laird, seus olhos brilhando com interesse
encantado. — Como pode ser isso?
Ela estava, sem dúvida, emocionada ao descobrir sua ligação familiar com o um dos mais
poderosos lairds Chrechte nas Highlands.
— A mãe dele era humana. — Emily, a esposa do laird, ofereceu. — Não é tão difícil
quanto você possa imaginar.
Balmoral sorriu com indulgência para a esposa, mas balançou a cabeça.
— Na verdade, minha tia-avó que deixou nossa ilha para se juntar ao seu companheiro entre
os MacLeod era Chrechte. Ela era irmã da mãe de meu pai.
Lachlan olhou para Shona em expectativa. Ela olhou fixamente de volta, sem entender.
— Você está dizendo que a avó dela era Faol? — Caelis perguntou sua voz fraca com o
choque.
Laird Balmoral assentiu.
— Aye.
— Mas eu sou humana!
— Aqueles de ascendência mista são tão propensos a nascer humano como Chrechte. —
Lady Emily ofereceu com um olhar interessante para seu marido.
— Mas meu pai era humano.
— Ele era. — Caelis afirmou. Ele teria sido capaz de dizer o contrário, teria sido revelado
no cheiro do homem.
Lachlan deu de ombros, aparentemente despreocupado pelo fato de que seu primo era
humano.
— Sua mãe era Faol.
Mas o próprio irmão de Lachlan era humano, sem lobo para compartilhar a sua natureza.
Pelo que diziam, a reação de seu pai ao seu primogênito ser incapaz de se transformar causou
ressentimento e, eventualmente, a morte de Ulf.
Era uma séria lição que não deveria ser dispensada por um homem que já tinha um filho
Faol e outro humano.
— Isso explica o antecessor de Uven nomear meu pai como seneschal. — Shona suspirou, o
som cheio de uma dor cansada. — Meu pai nunca me disse. Nada.
A traição em sua voz cortou o coração de Caelis.
Lachlan assentiu como se entendesse.
— Ele foi criado em um clã onde Fearghall tinha um profundo controle. Sem dúvida, ele
acreditava que estava protegendo você.
— Talvez ele foi ensinado assim, como nós fomos, que revelar a verdadeira natureza do
Chrechte significava morte? — Audrey ofereceu, sua preocupação por sua amiga aparente.
Claramente não aceitando nenhuma explicação, Shona olhou para Caelis, sua expressão
cheia de aflição desamparada.
— Por quê?
Ignorando os outros ao seu redor, ele se virou para ela, pegando em seu rosto, desejando ter
uma resposta que pudesse tirar a dor.
— Eu não sei, mas sei isso: não foi sua culpa. A falta foi de seu pai, não sua.
— Eu amava meus pais. Muito.
— Eles amavam você, também. — Nenhum deles foi efusivo em seus afetos, mas em seus
anos entre o clã, eles mostraram a alta estima que tinham por sua única filha.
— Não parece.
Ela tinha muitas lembranças para suplantar as de sua infância, quando ela tinha certeza de
seu amor e cuidado. E talvez isso explicasse a certeza que ela tinha de que Caelis não a amava.
— Eles cometeram erros, mas não pararam de te amar.
— Meu pai tinha que saber o quão horrível meu casamento seria para mim e mesmo assim
ele me empurrou para ele.
Porque seu pai teria sabido que Shona era a verdadeira companheira de Caelis ou ela não
poderia ter concebido um filho dele. O próprio Caelis não entendia por que o homem não retornou
ao clã para dizer-lhe de seu filho.
O pai de Shona deveria ter sabido que Caelis teria reivindicado sua verdadeira companheira
grávida de seu bebê, independente do que seu laird tinha ditado.
Em vez disso, o ex-seneschal de seu clã forçou sua filha a um casamento que ele tinha que
saber que seria difícil, se não impossível, para ela.
Só porque ela era mais humana que Chrechte seu corpo permitiu ser penetrado pelo Barão.
Caelis podia ser agradecido a isto, porque se seu corpo tivesse respondido como o de um Chrechte,
Shona teria sido submetida a muito mais dor.
Ele tinha certeza disso. O Barão morto foi um devasso e um patife.
— Ele pensou que você fosse completamente humana. — Caelis disse para Shona agora,
sabendo que seria de pouco conforto.
— Eu não sou.
Caelis não a contradisse naquela afirmação. Havia muito para sustentar a hipótese, embora
ele nunca tivessea ouvido falar de um Chrechte que não se transformasse exibindo outras
características de sua raça.
Incomodava-o que ele não pudesse dizer o que Shona pensava sobre o fato dela ser parte
Faol, mas também não poderia haver nenhuma dúvida. A reação dela para seu casamento com o
Barão era muito mais Chrechte do que humana e a estranha forma que Caelis e Shona, por vezes,
liam a mente um do outro podia muito bem vir de dons latentes Chrechte.
— Você não tem um lobo. — Ele estava certo disto.
Seus olhos brilhavam de malícia inesperada.
— Eu pensei que você disse que era meu, tanto quanto eu sou sua.
Alívio inundou Caelis. Se ela podia brincar, não estava muito devastada.
Ele nunca mais se deixaria surpreender com as profundezas da força de sua companheira.
— Então ele é seu companheiro? — Balmoral perguntou.
Caelis respirou fundo, surpreso com a tensão o enchendo tanto que teve que forçar-se a
ignorar. Chegou o momento de declarar suas intenções perante sua família.
Shona olhou para ele, seu olhar esmeralda questionando.
Ele se inclinou e beijou sua testa antes de se virar para encarar Lachlan.
— Você é seu parente mais próximo, não é?
Balmoral permaneceu de pé, apertando suas mãos atrás das costas.
— Aye.
— Shona é minha.
O laird não respondeu, mas sua expressão desafiou a reivindicação de Caelis sem palavras.
— Eu vou me casar com ela.
Vegar fez um som de ronco e se afastou. Caelis olhou para ele, só para mudar essa carranca
para Thomas quando um som muito parecido com uma risada saiu de sua boca também.
— Você vai? — Perguntou o Balmoral, o desafio em seu tom inconfundível.
Caelis abriu sua boca para fixar o homem diretamente quando ele viu por um momento
Shona em sua visão periférica. Ele estava fazendo isto por ela, para mostrar que ela tinha valor para
ele.
— Estou declarando a minha intenção para que você faça Shona tanto minha companheira e
minha esposa.
Balmoral inclinou a cabeça, mas não respondeu. Em vez disso, ele se virou para Eadan.
— Este soldado MacLeod é seu pai?
— Não.
Caelis sentiu aquela palavra como o poder do golpe de um dragão. Ele teve que firmar suas
pernas no lugar, ou ele teria tropeçado pela dor que sentiu.
— Ele não é? — Perguntou Lachlan, surpresa em seu tom.
— Ele não é um soldado. Ele é laird, e logo o clã inteiro saberá isto.
— Ah... e esse “quase” laird é seu pai?
— Sim. — Eadan cruzou seus braços, sua boca numa linha teimosa. — Ele e mamãe são
companheiros.
Lachlan balançou a cabeça, sua expressão pensativa. Ele concentrou sua atenção em
Marjory.
— E você, princesinha, você chama Caelis de “pai”?
— Eu o chamo de papai. — Marjory disse em sua voz estridente de menina. — Ele é um
cachorro grande.
Caelis encontrou-se sorrindo para a visão dela de seu conriocht, embora eles teriam de
ensinar-lhe discrição na forma como ela se referia a ele.
Ainda ignorando Caelis, Lachlan se virou para Shona.
— Você é minha prima, uma Balmoral pelo sangue, se não por nascimento.
— Obrigada. — Disse Shona.
O que isso significava? Por que ela o estava agradecendo? Ela queria ser uma Balmoral? Ela
disse que se casaria com ele. Ela não voltaria em sua palavra. Mesmo que ele tivesse feito isto seis
anos atrás.
Ele iria admitir livremente a si mesmo, se ninguém mais, que Shona era feita de um material
mais forte do que até mesmo um guerreiro Chrechte poderia reivindicar.
— Existe uma história atrás de um Chrechte de honra que não sabia que tinha uma
companheira, ou um filho, muito menos uma filha para reivindicar, da última vez que o vi um mês
atrás.
Shona assentiu.
— Existe.
— Que este mesmo homem que eu considerei amigo e guerreiro corajoso de alguma
maneira executou o laço entre companheiros sagrados e então permitiu que você se afastasse é uma
verdade indiscutível.
Caelis não negaria isto.
— Aye.
— Ele pretendia se casar comigo. — Shona ofereceu, surpreendendo Caelis. — Entretanto,
nosso laird negou o pedido de Caelis para fazê-lo.
— E em vez de partir com você, ele ficou com os Fearghall. — Lachlan deu Caelis um olhar
que o fez se sentir como se estivesse se contorcendo.
Mas nada se comparava àquele momento que ele pensou que seu filho o havia negado.
— Aye. — Respondeu Caelis, embora a questão não fosse para ele. — Por minha própria
estupidez, eu perdi minha verdadeira companheira por seis longos anos.
Não ficava mais fácil admitir com a repetição.
— Isso explicaria seu celibato. Eu me perguntava se você não era simplesmente um
guerreiro mais dedicado que a maioria. — Lachlan meditou.
Shona fez um pequeno som de angústia. Ele olhou para ela.
— Qual é o problema?
— O tempo acabou. Nós vamos nos casar agora. Isto é o que importa, não o passado.
— É? — Lachlan perguntou.
Shona assentiu fervorosamente a laird Balmoral.
— É.
— Você aceitaria seu pedido para sua mão?
— Eu já aceitei.
— E, no entanto, ele ainda trouxe suas intenções perante sua família.
Shona olhou para Caelis, seus olhos brilhando com prazer satisfeito.
— Aye.
Finalmente, ele tinha feito a coisa certa.
Lachlan balançou a cabeça e encontrou o olhar de Caelis.
— Você mudou de Fearghall para Cahir, abraçando todos os sacrifícios necessários,
treinando com total dedicação para proteger todos os Chrechte. Seus planos e destino são para servir
nosso povo com sua vida, mas nada disso justifica descartar as necessidades de sua companheira.
Lembre-se disso.
Lady Emily balançou a cabeça, dando a seu marido e companheiro verdadeiro um olhar
amoroso.
Caelis não poderia discordar do sentimento, mas questionou a sua verdadeira dedicação a
ele. Shona concordou em se casar com ele, mas ela também deixou claro que não tinha vontade de
voltar para o clã MacLeod.
Ele poderia abandonar um destino por causa de outro?
A resposta simples era que, se honestamente pretendia colocar as necessidades de Shona
acima de tudo em sua mente, se ele fosse honrar o acasalamento sagrado com o qual foi abençoado,
Caelis não tinha escolha.
— Não! — Shona girou para encará-lo. — Pare de pensar dessa maneira, Caelis. Eu insisto!
— Do que você está falando? — Perguntou Audrey, olhando de soslaio para Caelis e Shona.
Shona estava torcendo as mãos e franzindo a testa.
— Ele acredita que, a fim de servir melhor ao nosso acasalamento, deve desistir de seu
destino de tirar o clã MacLeod de Uven, mas isso não é verdade.
Caelis esperou que Lachlan ficasse com raiva por ele sequer considerar tal coisa, mas o laird
mais velho apenas perguntou.
— Por que você acredita nisso?
— Shona não quer retornar ao clã MacLeod. — E finalmente, ele devia parar de ignorar
aquela verdade.
— Isso não é verdade. — Sua companheira discordou imediatamente e com veemência.
Caelis se virou para ela em estado de choque. Ele não acreditava que ela mentisse, mas ela
não fez segredo de seus sentimentos. Então, como ele poderia acreditar em suas palavras agora,
independente do quanto seus sentidos lhe diziam que ela falava a verdade?
— Eu não queria voltar para o clã com Uven como laird. Mesmo em minha própria mente,
eu não fiz essa distinção até agora, mas Caelis, você deve acreditar em mim. Eu amava nosso clã, eu
adoro nosso povo e gostaria de servi-los com você, ao seu lado.
— Então, você se casaria com este homem apesar dele tê-la deixado sozinha com um filho?
— Lachlan pressionou.
Caelis bateria no laird, se não fosse pelo fato de que apreciava a recém-descoberta família de
Shona mostrando tal protecionismo por ela.
Shona movimentou a cabeça, seu corpo pequeno e feminino seguro com sinceridade.
— Eu iria.
— Nosso padre abençoará sua união antes da refeição da noite. — Lachlan anunciou.
Caelis esperou que Shona hesitasse. A tradição ditava que as missas de casamento fossem
realizadas de manhã. Ela era alguém que gostava de fazer seus planos e ela ficou chocada com a
velocidade e a falta de cerimônia associada com o casamento de Audrey e Vegar.
Mas sorriu largamente.
— Isso seria ótimo. Será que o padre faria uma bênção ao casamento de Vegar e Audrey
também?
Audrey sugou uma respiração animada.
— Oh, será que ele pode?
Lady Emily sorriu, seus olhos castanhos brilhantes.
— Tenho certeza de que ele faria. Ele está acostumado a casamentos não ortodoxos.
Shona e Audrey mostraram-se encantadas por esta resposta.
— Por que precisamos de uma bênção? — Perguntou Vegar, parecendo confuso.
Audrey cruzou os braços e deu um olhar que, sem dúvida, deixou Shona orgulhosa.
— Assim, podemos dizer aos nossos filhos sobre algo diferente das palavras de um laird,
enquanto você estava pronto para correr escada acima.
***
Shona ficou perante o padre dos Balmoral, pronta para falar seus votos com Caelis.
Conhecer Lachlan foi incrível e maravilhoso. Saber que ela tinha uma família que se preocupava,
saber que seus filhos tiveram opções para segurança mesmo antes que o destino trouxesse Caelis de
volta para sua vida deu-lhe uma sensação de paz.
Mas ela não queria ficar na ilha Balmoral, apesar da beleza e da óbvia proximidade do clã,
ou o fato de que seu laird a reivindicou como família.
Seu futuro e o futuro de seus filhos estavam com Caelis e seu destino para proteger seu povo
e os humanos do clã MacLeod das falsas doutrinas dos Fearghall. Era seu destino também. Ela
podia sentir a verdade disto no fundo de sua alma.
Seria necessário que aqueles que não eram Faol mudassem o pensamento dos Chrechte entre
o clã MacLeod dos ensinos equivocados dos Fearghall. Aqueles lobos metamorfos não veriam os
humanos ou os Éan como indivíduos merecedores da vida, menos ainda se Uven teve sucesso em
tirar todos do clã menos os Faol.
Ela e seus filhos fariam os Faol pararem e pensarem sobre tudo o que eles foram ensinados
por aquele patife enganador. A força e a honra de Vegar como guerreiro iria desafiar suas crenças
de que os Éan deveriam ser desprezados como Chrechte inferiores.
Mas, neste momento, seu destino não era primordial. Os votos que ela iria dizer eram. E
tudo dentro de Shona desejava fazer essas promessas diante de Deus e dos homens com seu
guerreiro, para uni-los com os laços da lei e honra.
O padre fez a missa do casamento com sentimento caloroso, sua atitude como a de um
amigo apesar deles nunca terem se encontrado antes de Lachlan apresentá-los.
O sermão que ele fez sobre o casamento era ao mesmo tempo comovente e engraçado, mas
todas as risadas desapareceram quando ele guiou Caelis para primeiro dizer seus votos e, em
seguida, Shona proferir os dela.
Caelis manteve contato com os olhos em cada palavra, lembrando a Shona que independente
de quem estava lá como testemunha, os únicos que realmente importavam eram ela e ele.
O padre falou sua bênção sobre ambos os casais recém-casados antes do clã celebrar o
casamento da recém-descoberta prima de seu laird.
***
Shona enfrentou Caelis no quarto da torre que lady Emily ofereceu para sua noite de
núpcias.
Seu grande corpo brilhava dourado à luz do fogo, seus músculos ondulando com poder e
força que tanto a excitava quanto a acalmava.
Este homem, este metamorfo, era seu companheiro, seu marido. E ela o amava.
Agora e para sempre.
— Você é meu presente. — Ele disse em voz baixa. — A bênção que nunca mereci, mas não
poderia viver sem.
— Você viveu sem mim.
— Eu sobrevivi sem felicidade, sem prazer. Todos os dias dos seis anos em que vivemos
separadamente, eu sofri por você. Os anos que eu acreditei que estava perdida para mim pela morte,
eu era pouco mais que uma concha. Meu único propósito com algum significado era servir meus
irmãos, mas eu não tinha nenhuma esperança de qualquer coisa para mim, ou para o futuro. Você
me dá um futuro com alegria, cheio de prazer, que vale a pena viver, e não apenas para meu povo,
mas para minha própria vida também.
Suas palavras caíram em seu coração como a chuva sobre o solo ressequido do verão.
— O nosso futuro é o que fazemos dele. O passado já não tem qualquer influência.
— Você realmente acredita nisso? — Ele questionou. — Você me perdoou?
— Sim. — Ela quis dizer isso com todas as fibras do seu ser, também.
Ele balançou a cabeça e seguiu em frente até que ficou diretamente na frente dela, o calor do
corpo dele a envolvendo como um toque.
— Esta é a última vez que você vai se vestir como uma baronesa inglesa.
— Eu sou a lady de um laird, mas não sou baronesa mais. — Ele não podia saber o quanto
aquilo a agradava.
CAPÍTULO 23
— Exatamente. — Caelis começou a despir Shona com movimentos eficientes, como se vê-
la com o traje inglês era demais para ele suportar por mais um momento. — Este é um lindo
vestido, mas eu ficarei feliz em não vê-lo novamente.
— Eu ainda tenho meu plaid MacLeod. — Ela o manteve por todos esses anos e o levou
com ela da Inglaterra, embora ela nunca teria admitido isso antes desta noite.
Ele parou, olhando fixamente para ela, sua expressão presa e iluminada com uma alegria
interior que ela nunca queria ver extinta.
— Você sabia.
— O quê?
— Que ainda era minha. — E ele começou a prová-lo, removendo sua roupa e tocando-a de
uma maneira que só ele já fez.
Desta vez, porém, ela estava determinada a fazer o mesmo. Momentos depois, os dois
estavam nus no centro do quarto, a dureza dele se projetando no ar entre eles, o corpo dela também
mostrando os seus próprios sinais óbvios de excitação.
Seus mamilos estavam duros como pedra, formigando com a necessidade de seu toque e sua
boca. Ela doía profundamente em seu ventre e a umidade se juntou entre suas pernas, o cheiro de
sua necessidade óbvia até mesmo para ela, humana... ou para sentidos quase humanos.
Ele cheirou o ar, inalando profundamente e sorrindo com uma luz feroz em seu olhar azul.
— Você está pronta para mim e nós mal nos tocamos.
— Eu não sou a única. — Ela projetou seu queixo em direção a ereção púrpura dele que
pingava.
Ele grunhiu baixo.
— Não, você não é.
— Isto é uma boa coisa. — Estarem juntos em seu desejo era mais surpreendente do que ele
poderia imaginar.
— Hoje nós consumaremos nosso casamento e nosso acasalamento.
— Sim. — Ela o alcançou para beijá-lo, necessitando a conexão íntima.
Ele não hesitou em dar a ela, tomando o controle da união de seus lábios com força suave,
mas inexorável. A língua dele varreu dentro da boca dela e uma imagem do sexo dele invadindo seu
corpo de uma forma semelhante passou pela sua cabeça.
Ela sabia que aquela imagem não veio dela. Era muito intensa, muito agressiva... muito
masculina em sua perspectiva.
Caelis? Ela perguntou por seu laço mental.
— Humm.... — Ele murmurou contra sua boca.
Ela perdeu o pensamento que pretendia seguir quando suas grandes mãos pegaram seu
traseiro em concha e a levantaram firmemente contra ele. A sensação de suas peles nuas tocando-se
pela primeira vez com o conhecimento de que estavam legalmente unidos, enviou arrepios de prazer
por todo o corpo dela.
Minha. Ela ouviu em sua cabeça. Mo toilichte. Mo gra.
O sentimento de possessividade que emanava dele a envolveu e preencheu de alegria
indizível, aumentando sua excitação. Mais imagens de relações sexuais entre eles, seu corpo envolto
no dele, ele aninhado nela, passavam como o mais precioso dos sonhos através de sua paisagem
mental.
Ela não sabia como ele estava lhe dando estas imagens mentais, ela nem se importava
naquele momento. Vendo o que ele queria, o que ele sonhava, a fez perceber que esta conexão física
entre eles era tão importante para ele como era para ela. Que ia além do físico para as almas
entrelaçadas.
Ela abriu suas pernas, envolvendo-as ao redor dos quadris dele, permitindo a Caelis ajustar-
se a seu corpo de modo que seu sexo endurecido se esfregasse contra sua carne mais íntima.
Ela viu uma imagem em sua cabeça de seu corpo tomando o dele em seu interior, enquanto
se inclinava para trás, seus seios completamente revelados para ele olhar, seus corpos se movendo
juntos em perfeita harmonia. Ela se moveu para que isso acontecesse, os dois gemendo de prazer
profundo enquanto se conectavam da maneira mais íntima possível, pela primeira vez em seis anos.
O beijo parou, ela não sabia qual dos dois fez isso acontecer, mas se inclinou para trás como
viu em sua cabeça, os seios arfando enquanto ele fazia amor com ela de pé.
Era a experiência mais incrível que poderia ter imaginado, a paixão dele tão honesta e
verdadeira, tão suavizada pela emoção que jamais poderia ser comparada ao toque egoísta e
luxurioso que suportou com o Barão.
— Você é minha! — Caelis gritou, seu tom intenso, seu corpo duro de tensão e seus olhos
brilhando como eles fizeram quando ele era conriocht.
Ele inchou dentro dela. Já grande, ele cresceu tanto que ela mal conseguia se mover sobre
seu sexo, suas dobras inchadas esticadas ao redor de seu pênis conriocht.
— Você está se transformando.
O suor escorria de sua fronte, o rosto contorcido com seu esforço para controlar sua forma.
— Não.
— Partes de você, sem dúvida. — Independente do quão enevoada estivesse sua lembrança,
ela não teria esquecido se tivesse sido tão grande seis anos atrás.
Ele não respondeu, simplesmente movendo-a em sua enorme excitação, causando-lhe prazer
que beirava a dor. Mas nenhuma dor veio e o prazer só cresceu até que explodiu através dela e
gritou sua conclusão, enquanto ele explodia dentro dela, sua semente quente e forte pulsando contra
seu útero.
— Minha companheira, minha esposa. — Ele disse no tom gutural de conriocht enquanto
seu corpo aumentava em tamanho e ela sentiu outro clímax fundamentar o prazer surpreendente do
último. Não havia fôlego para seu clímax quando ele veio dessa vez.
Seu corpo estremeceu, convulsão após convulsão apertando sua carne enquanto garras a
seguravam com cuidado intenso. Seu rosto não mudou, seu cabelo não cresceu... era Caelis, mas
com o corpo de quase um gigante e seu sexo combinando.
— Você vai carregar meu filho novamente. — Ele prometeu para ela. — E eu estarei lá
todos os dias até o parto.
Ela não tinha fôlego para responder com palavras, mas podia dizer as únicas três que
importavam através de seu vínculo de acasalamento.
— Eu te amo.
— E eu a você. Um dia você acreditará nisto.
Ela poderia acreditar nisto agora, mas ele não lhe deu nenhuma oportunidade para falar
quando começou a fazer amor com ela novamente, provando que uma espera de seis anos era
completamente muito tempo para homem ou lobo finalmente reivindicar sua companheira.
Eles continuaram a fazer amor até as primeiras horas da manhã, adormecendo sob sua pele
de acasalamento quando o céu começou a clarear.
***
Shona e Caelis não se juntaram ao clã Balmoral até o jantar do dia seguinte, e Shona ainda
se pegou abafando um bocejo enquanto se aproximavam da mesa principal.
Audrey sorriu conscientemente.
— Bom dia, dorminhocos.
Shona sabia que demoraria um pouco para se acostumar com a transição de sua jovem amiga
de mulher inocente para casada, mas ela sorriu mesmo assim.
— Obrigada por subir com as crianças esta manhã.
Audrey dispensou seus agradecimentos.
— Eadan e Marjory apreciaram conhecer sua nova família. Gail e Feth os fizeram se sentir
muito bem-vindos.
Shona mal conheceu a filha de dez anos e o filho de oito do laird e da lady no dia anterior,
entretanto ambos estiveram em seu casamento.
Ela sorriu para eles agora.
— Obrigada.
— São crianças muito agradáveis. — Gail disse com a maturidade de sua feminilidade
iniciante.
Ela ainda teria anos de sua própria infância, se Deus quisesse, mas o reflexo da mulher que
ela se tornaria estava lá.
Feth deu de ombros.
— Eu acho Eadan legal. Ele escuta melhor que Brian e Drost.
— Não fale mal de seus primos. — Emily advertiu.
— Eu não estou. — Feth franziu o cenho. — Dizer a verdade não é falar mal de alguém, é
papai?
Shona conteve um sorriso quando tomou seu lugar, feliz por não ser o “pai” que precisaria
responder a perguntas difíceis naquele momento. Ela estava muito privada de sono para ser tão
política como esse tipo de educação parental exigia.
— Quando vamos para casa? — Perguntou Eadan. — Precisamos ir logo. O homem mal
precisa ser parado, papai.
— Casa? — Shona perguntou, tentando entender as palavras que seu filho falou.
— Nossa fortaleza. — Eadan girou para Lachlan. — A sua é muito boa, laird, mas nós
precisamos ir para casa.
— O baronato? — Perguntou Shona, completamente perdida.
Sem dúvida isto tinha mais a ver com sua falta de sono do que seu filho não estar fazendo
sentido. Ele era um menino muito prático.
— O baronato não é a nossa casa, mamãe. Nós somos MacLeods.
— Você, sua irmã e sua mãe irão para as terras MacLeod uma vez que eu tenha confrontado
o laird e o derrotado. — Caelis respondeu, provando que estava mais ciente do que Shona sobre o
significado do que Eadan queria dizer.
— Nay, papai. Nós temos que ir com você agora. Devemos partir hoje. — Eadan falou com
grande seriedade.
E embora ela concordasse que os seus precisavam ser mantidos em segurança, Shona
também sentiu uma necessidade incômoda de partir para as terras MacLeod imediatamente.
— Você não pode vir comigo, filho. Não é seguro. — Caelis disse firmemente.
As feições de Eadan assumiram uma expressão teimosa que Shona conhecia muito bem.
— O dragão vai nos proteger.
— Dragão? — Shona perguntou fracamente, bastante certa que ainda existia muito mais do
mundo Chrechte que ela não sabia.
— Ele é o companheiro da celi di, mamãe.
— Eadan. — Caelis disse em advertência.
— A celi di deve vir, também. O conriocht em meu sonho disse isso.
Caelis franziu o cenho para seu filho.
— Eadan, cuidado com o que você diz.
— Ninguém que não deve ouvir entenderá nossas palavras. — Disse Eadan com tanta
certeza que Shona sentiu um arrepio de confirmação subir-lhe a espinha.
Ela olhou ao redor e notou que ninguém além do laird, sua esposa e seu pequeno grupo
prestava atenção à sua conversa. Nem mesmo o segundo do laird e sua esposa sentados na mesma
mesa.
Como isto podia ser?
— Eu entendo, eu acho. — Disse Audrey, parecendo assustada e impressionada ao mesmo
tempo. — Eu senti algo estranho e maravilhoso quando toquei a Faolchú Chridhe, mas eu não sabia
o que significava.
— Como? — Perguntou Shona.
— Eu não tenho certeza. Há histórias sobre dons Chrechte. Mamãe dizia que eram mitos,
mas agora que eu toquei a pedra sagrada eu posso senti-lo trabalhar em mim.
— Mas como você faz isso? — Ela ainda não entendia.
— Eu estava apenas sentada aqui, desejando que ninguém ouvisse os deslizes da língua de
Eadan.
— Por quê? — Shona perguntou.
Audrey deu de ombros, parecendo apologética.
— Mamãe enraizou em mim essa necessidade de sigilo.
— Então, ninguém além daqueles a par da discussão pode ouvi-la? — Ela perguntou, só
para confirmar.
Audrey parecia hesitante em responder, mas Eadan disse com toda a autoridade de um
menino de cinco anos de idade, que tinha certeza dos fatos que poderiam reunir.
— Exatamente.
— Isto é impossível.
— Ler mentes também. — Caelis disse para ela com um olhar significante.
— Você disse que era o vínculo de companheiros.
— O que nós experimentamos vai além do vínculo de acasalamento.
Recusando-se a considerar as implicações de suas palavras naquele momento, Shona virou-
se para seu filho.
— Você viu um conriocht em seus sonhos?
— Sim, mamãe. Ele é de muito tempo atrás, mas disse que iria me ajudar quando eu
precisasse dele.
— Existe uma celi di antiga que me guia. — Ciara ofereceu, o olhar que ela deu a Eadan
cheio de admiração. — Eu só a vi pela primeira vez no ano passado.
— Há muito a ser feito antes que eu seja maior de idade. — Disse Eadan como se citasse
outro e parecendo muito mais velho que seus cinco anos.
— Eu... — Shona não sabia se ela queria que seu filho fosse destinado a tais coisas,
entretanto que escolha tinha?
Ela era a mãe, não o Criador.
— Vocês todos podem vir para as terras MacLeod depois que eu já tiver derrotado Uven. —
Pelo tom de Caelis ele não cederia.
— Não. — Eadan disse com autoridade que nenhuma criança devia ter em seu tom. — Nós
devemos ir com você.
— Por quê?
— O conriocht disse isso. — Agora, pelo menos, Eadan soava como uma criança.
— Você estará mais seguro aqui, entre os Balmoral.
— Nay. Você deve manter a mamãe com você ou você vai perdê-la.
Caelis empalideceu.
— Você não pode saber disso.
— Você tem que proteger a mamãe.
— Balmoral não deixará ninguém se aproximar dela. Aqui na ilha... — Pela primeira vez em
sua lembrança Caelis soou incerto. — Vocês estão todos mais seguros aqui.
— Percival conhece pessoas más. — Era à maneira de uma criança de colocar as coisas, mas
havia tanta certeza na voz de Eadan que Shona não podia duvidar de seu pronunciamento.
— Percival não viria tão ao norte, com certeza. — Opinou Audrey com mais esperança do
que convicção.
De repente Eadan deu de ombros, parecendo exatamente como o menininho que ele era.
— Nós devemos ir para a fortaleza MacLeod juntos. A mamãe estará mais segura nas
cavernas sagradas.
— Além disso, Shona deve ficar com Caelis quando ele confrontar Uven, ou mais irão
morrer porque duvidarão das afirmações de seu companheiro Chrechte. — Ciara soou com tanta
certeza quanto Eadan.
Shona sentiu a pressão da necessidade empurrando contra ela também.
— Eles estão certos. Eu não entendo isso, mas tenho certeza que as crianças e eu temos que
estar com você quando for enfrentar Uven.
— Os Chrechte serão convencidos por meu conriocht que eu sou o escolhido como seu
líder.
— Nay. — Balmoral argumentou. — Alguns assumirão que você deve submeter seu poder
conriocht a Uven. Você deve mostrar para o bando que Uven desconsiderou a lei sagrada.
Caelis não parecia convencido, mas virou-se para Eadan, dando-lhe um olhar penetrante.
— Filho?
— Sim, papai?
— Você está certo disso?
— Eu acho que sim. — A confiança de Eadan deu lugar à incerteza de uma criança. — Eu
só conheço meus sonhos.
— Seus sonhos são um dom que nós nunca ignoraremos. — Caelis prometeu.
Shona acenou em concordância.
— Todos nós iremos.
Então ela olhou para Ciara e seu marido, percebendo que não tinha nenhum direito de falar
por eles.
Mas o dragão, sério, um dragão? Sua mente não conseguia processar, concordou com uma
leve inclinação de cabeça.
— Nós iremos e eu protegerei você e sua família enquanto seu pai luta para salvar o clã
MacLeod da maldade dos Fearghall.
— Obrigado. — Eadan disse formalmente.
O príncipe Eirik sorriu e estendeu a mão para apertar o antebraço de Eadan como os
guerreiros faziam.
— Você será um bom protetor para o nosso povo um dia.
— Sim. Todo Chrechte deve ser um. — Mais uma vez, Eadan soou mais como um profeta
do que uma criança.
Shona sentiu uma pontada no coração, mas não havia nada que pudesse fazer sobre a vida
que ele estava destinado a levar exceto apoiá-lo e amá-lo independente do que fosse exigido dele.
— Homens como Uven devem ser parados. Ele já causou danos incalculáveis. Talvez se eu
tivesse ido antes, vidas poderiam ter sido salvas. — Ciara suspirou, culpa em sua postura. — A celi
di vem me dizendo que eu preciso voltar para as cavernas sagradas, mas estava evitando ir.
— Você não pode se culpar pelas ações de homens maus. — Shona assegurou a Ciara.
A outra mulher lançou lhe um olhar agradecido.
— Por que você hesitou em retornar? — Seu companheiro perguntou.
— Você tem lembranças infelizes daquele lugar.
O príncipe Éan puxou sua companheira para perto e a beijou suavemente antes de liberá-la.
— Eu não tenho nenhum remorso daquele dia.
— Você odeia lançar fogo para matar.
— É menos sangrento do que a minha espada. — As palavras eram jocosas, mas Shona
ouviu o peso que sentava pesadamente na alma do dragão.
Um homem poderia matar em batalha, mas ter a habilidade de derramar a destruição do céu
deveria ser um fardo terrível de suportar.
Eles sorriram um para o outro e Shona não pode deixar de pensar na história por trás desse
olhar. Mas agora, ela tinha assuntos mais urgentes para tratar.
Eles estavam retornando à fortaleza MacLeod e seus filhos estariam com ela.
***
Shona sobreviveu à sua primeira vista de um dragão, mas não estava muito certa se viveria
depois de montar um.
Ela olhou para cima, e para cima, e mais acima para a grande fera voadora que o
companheiro de Ciara tinha se transformado sob o luar.
— Por que eu e as crianças devemos montar o dragão? Por que não podemos trazer nossas
montarias?
Caelis colocou sua mão quente na nuca dela, seu foco totalmente nela.
— Desta forma, é mais seguro para você e para as crianças.
— É mais seguro voar acima da Terra, onde nenhuma pessoa deveria ir, do que montar
nossos cavalos. — Ela zombou.
Ele sorriu com indulgência e seu coração foi capturado.
— Os Éan sobem aos céus o tempo todo.
— Isso é diferente.
— Há uma urgência sobre isso, temos que avançar rapidamente. Você mesma disse que
sentiu isto.
— Eu senti. Eu sinto. — Embora ela ainda não entendesse. — Mas isso não significa que eu
quero voar nas costas de um dragão.
— É bastante seguro, sem mencionar agradável. — Ciara opinou. — Meu companheiro é
uma montaria muito hábil.
Shona quase sufocou com a risada que brotou da insinuação involuntária de Ciara. A celi di
pareceu perceber naquele mesmo momento como suas palavras podiam ser tomadas e ela vibrou
com uma risada, quebrando um pouco da tensão que se fechava ao redor de seu grupo.
Ela balançou a dedo para Shona.
— Você é uma mulher muito impertinente.
— Eu não disse nada. — Shona se defendeu, mas foi bom sorrir.
O dragão bufou e Caelis balançou a cabeça, mas sua expressão estava aquecida com algo
que Shona só poderia nomear como amor. Se pudesse nomear.
Ainda não estando pronta para fazê-lo, ela permaneceu em silêncio.
Mas o fato de que o homem estava disposto a desistir de seu destino para mantê-la feliz?
Esse gesto revelador superou as dúvidas e certezas que ela tinha pensado que estivessem arraigadas
para sempre em seu coração.
— Mamãe, vamos lá. Nós temos que ir. — Eadan olhou para ela com a impaciência típica
de um menininho.
E ela estava grata por isso.
— Está tudo bem para você. Você quer montar o dragão. — Ela disse com uma carranca
fingida.
Parte dela invejava as crianças e seu otimismo sobre esta aventura. Marjory já estava sentada
nas costas do dragão e ignorando seus contínuos protestos. Eadan estava subindo, agora que
advertiu sua mãe para se apressar.
Não havia mais o que fazer. Ela tinha que subir nas costas da fera mítica, para, pelo menos,
cuidar de seus filhos. Uma vez que esteve no lugar, verificou se seus filhos estavam firmemente
atrelados à engenhoca, como uma sela de couro, nas costas de Eirik.
Ciara pegou os embrulhos de sua mãe e amarrou-os aos ganchos que aparentemente serviam
para esse propósito.
— Eu te amo. — Ela disse para lady Sinclair.
O laird e a lady repetiram as palavras e então acenaram para eles.
Shona olhou para Caelis enquanto o corpo de dragão de Eirik ficava tenso na preparação de
saltar para o ar.
— Eu te amo, companheiro. Tenha cuidado em sua jornada.
— Eu te amo. — Disse Caelis pela primeira vez em seis anos. — Vigie nossos filhos e
aprecie sua aventura!
Eirik saltou para o ar e a resposta de Shona se perdeu no vento, mas mesmo ela não tinha
certeza de quais tinham sido suas exatas palavras.
Caelis disse que a amava e ela pensou que poderia muito bem acreditar nele.
Subir aos céus não era como nada que ela já experimentou, chocante e assustador e
emocionante ao mesmo tempo. Após apenas um quarto de hora no passeio ela já estava realmente
muito agradecida de que Caelis insistiu para que ela e as crianças se embrulhassem em peles.
Eirik voou com velocidade vertiginosa, fazendo um fluxo constante de vento frio passar
sobre seus passageiros.
Ciara parecia amar o voo, acariciando e conversando com seu companheiro dragão
constantemente enquanto voavam.
Sempre que ela ficava em silêncio, Shona tinha certeza de que a outra mulher estava usando
seu vínculo de companheiro para se comunicar com o príncipe Éan.
Quando a lua começou a diminuir no céu noturno, eles aterrissaram em um vale que Shona
vagamente se lembrava de sua infância.
O clã foi desencorajado a visitar o lugar pois ele estava situado entre um córrego e colinas,
que bloqueavam os ventos fortes que muitas vezes atormentavam as Highlands, mesmo tão ao sul.
Uma localização idílica, mas que agora ela percebeu que Uven e os lairds antes dele o tinham
mantido claramente para o uso dos Chrechte.
Ciara desmontou primeiro e então estendeu suas mãos para o alto primeiro para Marjory e
então para Eadan. Shona esperou até que seus filhos estivessem seguros no chão antes de deslizar
pelas costas do dragão.
Uma vez que ela desmontou, Shona virou suas costas para o dragão para dar privacidade a
Eirik para mudar de volta para homem. Sua atenção foi imediatamente fisgada por Ciara enquanto a
outra mulher estendeu um punhal adiante e pressionou a pedra do cabo em uma marca sobre a
parede de pedra.
Enquanto o luar dava alguma iluminação para a área, não estava claro o suficiente para ver
nenhum detalhe da pedra. O som de pedra deslizando contra pedra veio e, em seguida, o lado da
colina se abriu para revelar a entrada escura de uma caverna.
Shona não poderia ter sufocado seu suspiro de surpresa mesmo que ela quisesse. As crianças
correram com animada admiração, mas ela segurou suas mãos com firmeza.
— Nós seguiremos Ciara. — Ela os repreendeu.
Eadan franziu o cenho, mas assentiu. Marjory apenas bocejou. A pobrezinha ficou sem
dormir esta noite e nem mesmo a emoção iria mantê-la acordada por muito mais tempo.
Ciara ergueu uma tocha e uma lufada de fogo passou por Shona para acendê-la.
Ela pulou para trás e olhou sobre seu ombro para ver que Eirik ainda não havia mudado.
— Ele não retornará à sua forma de guerreiro até que estejamos em segurança dentro da
caverna. — Ciara disse para Shona.
Isso fazia sentido, mas ainda assim o truque do fogo era bastante surpreendente e foi o que
ela disse.
Ciara riu e Shona sentiu que Eirik estava se divertindo também.
— Ele achou encantador que você se referiu a seu dom como um truque. Outros ficaram
muito mais impressionados. — Ciara explicou.
Shona sorriu e bocejou.
— Bem, claro que estou impressionada. O homem se transforma em uma fera mítica e
respira fogo, afinal, mas na verdade, minha capacidade para choque e temor está diminuída
ultimamente.
Ciara balançou a cabeça, parecendo muito séria de repente.
— Sim, eu imagino.
Ciara os guiou para dentro da caverna e para baixo por uma passagem longa, estreita, que se
abriu em uma caverna subterrânea. A celi di imediatamente começou a iluminar as tochas na parede
que ela deveria saber que estavam lá. Mas ela já tinha estado ali antes, não é?
À medida que cada nova tocha era acendida, era revelado mais da caverna em que estavam.
O espaço era enorme, maior do que qualquer grande salão em que Shona já esteve inclusive o da
fortaleza Balmoral. Bancos de pedra e assentos estavam intercalados ao longo das paredes e um
estrado de mármore enfeitava o centro da sala.
Outras aberturas escuras indicavam passagens que levavam para fora do que deveria ser uma
sala de reunião em algum momento no passado.
Shona não sabia se era sua imaginação, mas a grande caverna parecia acolhedora e como se
tivesse esperado por eles. Ela só sabia que se sentia segura ali, com um sentimento de paz que ela
nunca antes experimentou.
A tranquilidade da caverna afetou seus filhos também. Eadan e Marjory pareciam prontos
para adormecer em seus pés.
Shona perguntou a Ciara.
— Há uma câmara que eu possa usar para preparar as peles para eles dormirem?
— Por ali. — Ciara apontou para sua esquerda. — Existem várias câmaras pequenas que
estou certa de que foram uma vez usadas como quartos para as celi di que viveram aqui.
— Será que apenas celi di moraram aqui? — Shona perguntou.
— Eu sempre presumi isso, embora minha mentora não tenha dito isso especificamente.
— Hum... — Era algo para se contemplar.
Mais tarde. Neste momento, ela precisava colocar seus filhos num lugar para descansar.
Shona achou um provável quarto com o que parecia ser uma cama de pedra sobressaindo da
parede. Uma bacia rasa, que foi esculpida em cima, seria um bom lugar para empilhar urze para dar
mais conforto. Shona não tinha as urzes, mas ela tinha as peles. Ela colocou a que tinha envolvido
as crianças por baixo e, em seguida, ajudou Marjory e Eadan a deitarem-se por cima antes de cobri-
los com a pele de acasalamento dela e de Caelis.
Apesar da excitação de estar em um lugar estranho e maravilhoso, seus filhos adormeceram
antes dela alcançar a entrada da câmara.
Ela refez seus passos para encontrar Eirik e Ciara na câmara principal, agora iluminada com
inúmeras tochas. Ele ainda estava em sua forma de dragão.
Shona olhou interrogativamente para Ciara.
— Eu vou dormir melhor, se ele permanecer em sua forma de dragão esta noite.
— Oh.
— Os outros provavelmente não vão chegar até depois do nascer do sol. Seria melhor se
você conseguisse descansar um pouco. — Ciara acrescentou com um sorriso.
Shona bocejou novamente e pensou que a celi di teve uma ideia muito boa. Ela voltou para a
câmara com seus filhos e se aconchegou nas peles com eles, aquela estranha sensação de paz,
tornando mais fácil cair no sono.
Shona acordou algum tempo depois, quando ela foi levantada em braços fortes.
— Mmm... hmm... — Ela murmurou contra a coluna espessa do pescoço de Caelis.
— Shhh, mo toilichte. Estou apenas levando-a para nossa cama.
Ela não perguntou o que ele queria dizer, mas o deixou levá-la a uma curta distância para
outra pilha de peles que ele arrumou no chão. Ele a colocou nelas antes de enrolar seu corpo grande
ao redor do dela, fornecendo calor e proteção.
Shona não despertou completamente novamente, mas estava ciente quando o calor de Caelis
desapareceu algumas horas mais tarde e então Marjory foi colocada nos braços de Shona e outra
pele acima delas para dar mais calor.
CAPÍTULO 24
***
O som e cheiros de muitos Chrechte vieram de dentro da fortaleza, mesmo à distância que
Caelis e seus seguidores estavam na floresta.
Porém, ele não podia acreditar que eles não foram desafiados quando se aproximaram da
casa do laird. O castelo MacLeod não era uma fortaleza como as do Sinclair ou de Balmoral com
muros altos, torres e um pátio, mas Uven sempre manteve um posto de guardas de perímetro.
Normalmente paranoico, o laird Faol se tornou arrogantemente complacente. De acordo com
Maon, o homem fez disto uma prática no último ano, levar seus guardas de perímetro para o
banquete. Depois da morte de seu segundo um ano atrás e da perda dos soldados que ele enviou ao
norte para ir buscar sua filha, Caelis teria pensado que Uven iria querer aumentar a segurança, não
acabar com ela.
Mas, aparentemente, o laird acreditava que mostrar desprezo por seus inimigos era algum
tipo de proteção.
Ele veria que estava errado esta noite.
Havia apenas um único guarda na porta e dois que caminhavam bem em frente à grosseira
fortaleza.
Vegar pegou os dois sentinelas com pouco esforço, mergulhando como águia e mudando
para sua forma humana para incapacitar sem matar. Ele os deixou inconscientes e amarrados atrás
da fortaleza antes de retornar para os outros na floresta.
Uven estava tão confiante de que os Éan viviam com medo dos Faol, que ele não tinha
treinado seus guardas em guerra defensiva contra um inimigo que podia voar. Eles nem sequer
cuidavam do céu para ver a aproximação de um possível inimigo.
— Bom trabalho. — Caelis bateu nos ombros de Vegar antes de se virar para enfrentar
Shona. — Lembre-se do plano.
Ela assentiu com a cabeça, um pequeno sorriso se formando em seus lábios beijáveis.
— Ficar fora da vista com Thomas e os soldados MacLeod até que você dê o sinal.
Ele se abaixou e a beijou.
— Fique segura.
— Eu vou. — O olhar atordoado em seus olhos pelo beijo era mais reconfortante do que a
promessa.
E Caelis levou a lembrança com ele enquanto se aproximava do sentinela abertamente e
sozinho.
Excluído da festança do lado de dentro, o jovem soldado Faol sem dúvida tinha sido
atribuído à sua posição porque Uven estava bravo com ele. Era o modo que o laird conduzia seu
bando.
— Caelis? — O homem montando guarda ao pé dos degraus que levam até a entrada da
fortaleza perguntou, reconhecimento guerreando com surpresa em suas feições juvenis.
— Aye, sou eu.
— Uven disse que Sinclair matou-o
— Nay.
— Mas... — O jovem soldado não parecia saber o que dizer.
— Eu vou falar com Uven.
O homem mais jovem movimentou a cabeça e então pareceu perceber que ele deveria talvez
desafiar a afirmação de Caelis.
— Você tem permissão para estar aqui?
— Eu sou MacLeod. Eu sou Chrechte. Que permissão mais eu preciso? Você vai desafiar
meu direito de estar aqui?
— Eu... — O jovem engoliu em seco. — Onde você estava? Se Sinclair não o matou, por
que não voltou para o seu bando até agora?
— Eu tinha muito a aprender. Sinclair, um grande líder Chrechte, não me matou. Ele me
treinou para ser um verdadeiro Chrechte de honra.
— O que isso quer dizer? — Perguntou o jovem, parecendo confuso e estranhamente
esperançoso.
— Isso significa que Uven não fez nada além de usar este clã e bando para seus próprios
fins. Ele tem manipulado e torcido nossas leis sagradas para servir seus objetivos pervertidos. —
Disse Maon enquanto se adiantava.
Os olhos do jovem se arregalaram de choque.
— Maon! Você está em uma missão especial para Uven.
— Eu estava, até que essa tarefa matou meu irmão e me revelou a verdade dos ensinamentos
distorcidos de Uven.
— Você vai desafiar nosso alfa? — O jovem soldado perguntou com clara descrença.
— Não. — Disse Caelis, empurrando o sentinela para o lado inexoravelmente, mas sem
raiva. — Eu vou.
Ele soltou um assobio curto e momentos mais tarde, seus outros apoiadores se adiantaram.
Eles cercaram Shona, colocando-se entre ela e o perigo.
O guarda do portão olhou ao redor de si, sua tensão aumentando à medida que nenhum outro
guarda se adiantou para apoiá-lo.
— Você pode ficar aqui, ou pode vir e ver Uven derrotado como laird e alfa do bando. —
Caelis disse a ele antes de começar a andar.
Os outros o seguiram. Ele não se surpreendeu quando o cheiro do guarda da porta se juntou
ao deles.
Caelis tinha um plano de como pretendia lidar com o desafio, mas que desapareceria mais
rápido do que um Chrechte desafiador sob o fogo do dragão de Eirik se a segurança de sua
companheira fosse ameaçada.
Ele abriu a porta para a fortaleza e entrou, com os sentidos em alerta de uma forma que
aqueles lá dentro claramente não estavam.
Uven estava sentado na mesa principal, comendo com suas mãos, rindo em voz alta de
barítono tão familiar para Caelis.
Lembranças o assaltaram deste homem que foi um pai substituto, apenas para Caelis
descobrir que seu verdadeiro pai morreu nas mãos do alfa sedento de poder.
Ele roubou muito de você, mas você é mais forte do que ele. Ainda que não fosse Chrechte,
você seria mais forte. Shona disse para Caelis por seu laço de acasalamento.
Ele permitiu que suas palavras preenchessem sua mente e seu coração para que ele pudesse
fazer o que precisava ser feito. Uven, alfa do bando e laird, tinha que morrer.
O laird corrompido e todo seu círculo íntimo pareceram perceber que Caelis estava ali ao
mesmo tempo, sua festança morrendo com a velocidade de uma vela sendo soprada.
Uven levantou-se, soltando a perna de carneiro que ele estava mastigando.
— Então o filho pródigo retorna.
— Eu não sou seu filho. — Caelis não levantou sua voz, sabendo que seus companheiros
Faol podiam ouvir cada palavra sua mesmo que ele sussurrasse.
Ele não iria sussurrar, mas também não daria ao laird a satisfação de pensar que fez Caelis
gritar.
— Você diz isto, quando eu o criei como meu próprio?
— Depois que você matou os meus pais, tomou um lugar que não lhe pertencia. Mas esta
parece ser sua especialidade.
— Você ousa me acusar de assassinato?
— Você é culpado disto repetidas vezes.
Os murmúrios ao redor deles aumentaram de volume e Caelis estava chocado ao perceber
que ouvia críticas sobre Uven de várias direções. O quão cego ele esteve para as perfídias de Uven e
para o número de Chrechte que já estavam infelizes com a liderança do alfa?
Uven poderia estar alheio aos riscos que cercavam seu clã, mas estava ciente do desagrado
de seu bando, quando a careta de “aqui vamos nós de novo” apareceu em seu rosto.
— Não é assassinato quando você mata os desleais. — Ele anunciou com uma arrogância
repulsiva da qual Caelis nunca se permitiria ser culpado.
— Discordância não é infidelidade. Você é alfa, não um deus.
— O que somos nós senão deuses entre a humanidade? — Uven rebateu.
Caelis não respondeu, o cheiro de sua companheira chegando mais perto e distraindo-o. Ela
seria um terrível guerreiro. Não aceitava ordens muito bem, mas ela era a companheira perfeita.
— Você é um idiota. — Shona disse por trás de Caelis. — Um mentiroso convencido que
não tem nenhum direito de liderar.
Caelis sentiu um sorriso assumir a fúria em seu rosto. Sua companheira era franca e
destemida apesar de tudo que passou.
— Você acha o desrespeito dessa humana divertido? — Uven exigiu, sua própria fúria
crescendo.
— Minha companheira sagrada só fala a verdade.
— Ela é humana. Ela não é sua companheira verdadeira. Eu disse isso a você.
— Oh, sim, você me disse. Você também me disse que ela morreu, mas eram mentiras.
— Qualquer coisa que eu disse, foi para o seu benefício. — Uven afirmou, soando como se
ele acreditasse em suas próprias palavras.
Mas então, ele sempre foi perito na mentira. Muito perito.
— É contra a lei sagrada Chrechte separar companheiros verdadeiros um do outro.
Uven deu um murro na mesa, enviando pratos chacoalhando pelos ares.
— Eu faço as leis do nosso bando.
— Você é um Chrechte sujeito as nossas ordens antigas, da mesma maneira que qualquer
outro.
— Ela não é sua verdadeira companheira. — Uven repetiu.
Um baque pesado soou no telhado da fortaleza.
— O que foi isso?
O outro Chrechte estava olhando fixamente para o teto, perguntas subindo ao redor deles em
uma cacofonia cada vez maior.
— A prova de que Shona é minha companheira verdadeira.
O olhar de Uven teria impactado Caelis um tempo atrás, mas não mais.
Um minuto depois, Eirik entrou pela porta para o grande salão, Ciara e Audrey atrás dele,
Eadan e Marjory cada um segurando uma das mãos das mulheres.
— Quem é este? — Uven exigiu, mas a maneira como suas narinas incharam disse que
sabia.
— Este é Eirik, Príncipe dos Éan e protetor de sua raça. — Caelis prestou atenção para ver
se Uven entendia as implicações daquela declaração.
O líder do bando empalideceu e disse.
— Impossível.
— Possível. — Caelis discordou.
— Mate-o. — Uven apontou para Eirik. — Ele é nosso inimigo.
— Ele é meu amigo! — Caelis gritou agora, não com uma perda de controle, mas com uma
exigência absoluta para ser ouvido acima do barulho. — O primeiro que tentar tocá-lo terá que
enfrentar minha ira.
Uven tentou parecer indiferente, mas não conseguia esconder as linhas de preocupação que
vincavam sua testa.
Bom. Estava na hora do líder interesseiro enfrentar as consequências de seu egoismo.
Uma vez mais, Caelis deixa sua voz expandir ao longo do salão.
— Eu reivindico o direito de desafiar você pela liderança de nosso bando e nosso clã.
— Você não é MacLeod mais. — Mas, mesmo a criança mais jovem seria capaz de dizer
que Uven estava se segurando em uma corda puída para sua segurança.
— Eu visto nossas cores. Eu sou nosso clã, da mesma maneira que todo mundo aqui é.
E todos naquele salão eram Chrechte. Todos podiam cheirar os aromas tanto de Caelis
quanto de Shona misturados em Eadan, sem mencionar a marca de seu cheiro em Shona. Eles
também poderiam ouvir e cheirar a verdade porque Uven em sua vaidade fez muito pouco para
escondê-la.
O homem estava tão cego por seu egoísmo, que pensava estar certo.
— Você supõe que pode desconsiderar nossas leis, assassinar todos os que se opõem a você
e mentir para qualquer um que queira acreditar sem remorso ou responsabilidade. — Caelis
desembainhou sua espada e segurou o punho na frente de seu coração. — Eu o desafio.
— Você acredita que pode me vencer, garoto? Você é um tolo. — Uven olhou em volta,
mas até mesmo seu círculo íntimo não se levantou para negar o direito de Caelis em desafia-lo pela
posição de alfa.
O fato de que ele tinha guerreiros fortes de pé como uma parede viva em suas costas podia
muito bem ter impactado isso.
— Você me mataria por esta puta humana? — Uven latiu.
— Eu não sou puta e não me envergonho de ser humana. — Shona enunciou, justa
indignação atando cada palavra sua.
Caelis sabia o que Uven estava tentando fazer.
Ele pensou que conseguiria mexer com as emoções de Caelis e leva-lo a agir
precipitadamente, mas Caelis não questionava a força de sua companheira ou sua capacidade de se
manter firme contra a estupidez de Uven.
Ela não se importava com a opinião de seu antigo laird. Suas palavras não podiam machucá-
la mesmo que fizessem Caelis queimar com a necessidade de devolvê-las garganta abaixo do laird.
— Você o ameaçou. — Shona acusou Uven, mas Caelis não sabia do que ela estava falando.
Até agora, o laird fez pouco além de bufar e fazer pose. Sua afirmação de que Caelis não era
forte o suficiente para vencê-lo quase não constituía uma ameaça.
Ela se virou para Caelis.
— Uven ameaçou meu pai. Disse-lhe que se você e eu nos acasalássemos, ele me mataria
para dar-lhe a sua liberdade.
Fúria atravessou Caelis, mas ela não entendia como sabia.
— Eu posso ouvir seus pensamentos. — Disse ela com admiração. — Eu... eu acho que é o
meu dom Chrechte.
— Isto é impossível. Você é humana. — Uven menosprezou.
Shona olhou para ele, repugnância em seus olhos.
— Você matou sua própria companheira verdadeira, porque acreditava que Chrechte nunca
deveria se acasalar com seres humanos. Você viu meu pai como uma abominação, porque ele era
um ser humano nascido de um emparelhamento Chrechte-humano. Você estuprou minha mãe para
ensinar aos meus pais uma lição distorcida. Foi aí que ela mudou.
Shona girou para Caelis, seus olhos molhados com lágrimas.
— Não foi por mim. Foi por Uven e o que ele fez para ela. Ela não me odiava, ela me queria
longe dele a qualquer custo.
Ela me amava, mas ele a quebrou. As palavras vieram por seu vínculo de companheiro. As
ações dele quase me quebraram, mas não o fizeram.
Mesmo o orgulho feroz na voz de sua companheira não poderia controlar a raiva feroz que
se agarrava em Caelis, mas, em seguida, sua mulher mandou-lhe uma imagem que o puxou de volta
do limite de desrespeitar as leis Chrechte como Uven fez.
Era uma lembrança tão linda que tocou sua alma, a visão de seu filho bebendo no seio da
mãe pela primeira vez.
Caelis afastou seu conriocht e freou seu lobo.
— Aceite meu desafio, ou admita e deixe esta propriedade para nunca mais retornar. — Ele
falou para Uven.
Uven empalideceu e recuou, mas depois se recuperou e vangloriou-se de sua importância.
— Você vai morrer esta noite, arrivista.
Caelis riu e não se incomodou em responder.
Uven se transformou e atacou sem aviso e sem esperar pelo desafio formal começar.
Caelis não se preocupou em mudar. Ele foi treinado pelo melhor para combater um Faol em
sua forma Chrechte sem mudar a si mesmo.
Evitando as mandíbulas que visavam sua jugular, ele se afastou e se virou, caindo em uma
posição de combate, assim como Talorc lhe ensinou a fazer.
Uven rosnou, saliva escorrendo de suas presas, seus olhos amarelos com a loucura que
Caelis costumava confundir com o poder Chrechte. A fera pulou novamente, mas desta vez Caelis
estava pronto para ele. Ele fingiu que iria atacar e, então, pulou, pegando o enorme lobo pela nuca e
por uma pata dianteira.
Caelis torceu em um giro, esperando até que ele tivesse impulso suficiente para liberar. A
fera de Uven voou pelo ar para bater na parede com tanta força, que o barulho da rachadura de uma
viga pode ser ouvido.
Membros do clã gritaram, mas nenhum foi ajudar o laird corrupto.
O lobo escorregou a primeira vez que tentou se levantar. Entretanto, Caelis esperou que
Uven se colocasse em seus pés.
Ele mataria o velho bastardo com honra e teria orgulho em sua força para fazer isto.
Recuperando-se, a fera rosnou, rangendo os dentes enquanto caminhava para Caelis,
virando-se no último segundo para atacar Shona.
Caelis rugiu e saltou, as mãos de seu guerreiro se fechando ao redor do pescoço da fera antes
de mais uma vez lançá-la na parede.
Desta vez, Caelis não deu ao bastardo a chance de se recuperar, ele simplesmente atravessou
o salão em poucos saltos longos e aterrissou ajoelhado contra o peito do lobo.
Ele agarrou a cabeça do lobo e olhou nos olhos de Uven.
— Por seus pecados contra nosso povo, você foi julgado culpado e morrerá pelas mãos do
Cahir.
A faísca de reconhecimento nos olhos de Uven durou apenas o tempo que levou para Caelis
partir o pescoço do lobo.
Ele se levantou, um pé pressionado contra o pescoço do Chrechte morto.
— Eu sou seu laird. Eu sou seu alfa. Aceite, ou parta.
— E se nós quisermos desafiá-lo? — Um do círculo íntimo de Uven perguntou.
Caelis riu exatamente como ele riu da confiança arrogante de Uven.
— Então me desafie.
Dois o fizeram e dois Chrechte mais perderam suas vidas. Caelis deu a cada um a opção de
se submeter ou morrer. Ambos escolheram a morte.
Três Faol mortos estavam no chão do grande salão e Caelis girou para os restantes.
— Existe algum outro que queira desafiar meu direito de liderar?
— Você nem mudou para seu lobo. — Disse o jovem sentinela que estava guardando a
porta.
— Humanos não são fracos como Uven sempre alegou.
— Mas você não é humano.
— E, no entanto, como um homem, eu derrotei três lobos Chrechte.
Um homem caiu de joelhos, colocou a mão sobre o coração e jurou lealdade a Caelis. Ao
longo dos próximos minutos, todos os homens da sala seguiram o exemplo do primeiro Faol. Mas
as mulheres permaneceram de pé.
Shona veio para ficar ao lado de Caelis e olhou ao seu redor.
— Eu sou humana. Eu sou sua lady. Vocês juram lealdade a mim?
Levou um momento, mas um por um, os homens inclinaram suas cabeças para Shona.
Todos, menos um.
O sobrinho de Uven encarou Shona.
— Eu não juro fidelidade a nenhuma mulher.
Caelis se moveu tão rápido que quando chegou ao homem e bateu-lhe a cara no chão, o
outro Faol estava com uma expressão chocada.
— Você deixará esta propriedade se não se desculpar com minha esposa e também prometer
lealdade pessoal a ela.
Ele não se surpreendeu quando o homem se recusou. Caelis olhou para Vegar.
— Acompanhe-o fora de nossas terras.
Vegar assentiu, agarrando o homem pelo pescoço.
— Você é Éan. — O sobrinho de Uven gritou.
Vegar sorriu.
— Ainda bem que você percebeu, mas eu não posso dizer que estou impressionado com o
tempo que levou para perceber esse fato.
Eles deixaram o grande salão com o estúpido Faol ainda gritando sobre o Éan inferior,
mesmo quando Vegar puxou-o como um cachorro desobediente.
Caelis olhou ao redor da sala para as mulheres e, em seguida, para Shona. Ela sorriu e
acenou com a cabeça, compreendendo.
Ela dirigiu-se às fêmeas Chrechte.
— Vocês se recusam a jurar lealdade ao seu novo laird?
— Mulheres não fazem isto. Nossas juras não possuem nenhum valor. — Uma fêmea
Chrechte mais velha alegou.
— Mas a lealdade da mulher é tão poderosa quanto a do homem. — Shona argumentou. —
Por que você procuraria ter um clã fraco?
— Nós não o fazemos. — Disse a própria esposa de Uven.
— Você não. — Shona afirmou, parecendo surpresa e depois enojada por um momento. —
Eu sei o que é estar casada com um homem que não é seu companheiro. Uven está morto. O homem
que a libertou pede sua lealdade. Você a dará?
A mulher movimentou a cabeça e caiu de joelhos, curvando sua cabeça e fazendo um
juramento sincero de suporte para Caelis como alfa do bando e laird e Shona como sua lady. Logo
as outras mulheres seguiram e o salão ecoou com as vozes femininas.
— Este clã mudará. Para sobreviver e prosperar, nós devemos retornar aos modos
verdadeiros dos Chrechte. Uven mentiu para todos nós sobre quais são eles, mas acharemos nosso
caminho de volta para a honra, para um clã forte que respeita e aprecia todos os seus membros.
Um grito subiu que se transformou em rugidos ensurdecedores quando Caelis permitia seu
conriocht tomar forma.
Ele ficou perante seu povo e prometeu a eles que a vida seria diferente se deixassem de lado
as decepções do passado.
Cheia de alegria, Shona inspecionou a sala até seus olhos pousarem sobre um homem
esgueirando furtivamente em direção à porta do grande salão para entrar. Ele tinha uma arrogância
com a qual estava muito familiarizada.
— Percy!
— Onde? — Caelis grunhiu.
A mão de Shona não tremeu quando apontou para Percival, o medo já não a assolava na
presença do vil pretenso assassino de crianças.
— Pare e enfrente seu acusador, vira-lata! — Caelis ordenou.
Percival virou-se lentamente, sua expressão cheia com mais desdém do que terror.
— Eu não tenho nenhum acusador.
— Você tentou assassinar meu filho. — Caelis disse entre dentes.
O Barão abriu a boca para refutar a afirmação, mas Thomas estava lá, batendo em seus
ouvidos e derrubando-o no chão antes que ele pudesse.
— Ele veio aqui procurando por ela. — A esposa de Uven disse, apontando para Shona. —
Você costumava ser parte deste clã. Ele acreditou que você buscaria refúgio entre nós novamente. O
Barão inglês pagou generosamente a Uven para encontrá-la e devolvê-la para ele.
— Por que você não disse nada a princípio? — Caelis exigiu, fúria atando o tom do
conriocht.
— Eu não sabia que era esta mulher que ele procurava até que ela o reconheceu. — Disse a
esposa de Uven, implorando em sua voz e comportamento.
Shona esperou que seu marido provasse que valorizava as mulheres de seu clã e bando o
suficiente para acreditar. Ela sabia a verdade pelos pensamentos na cabeça da mulher, mas ele
precisava acreditar na esposa de Uven sem a interferência de Shona.
Caelis farejou o ar e, em seguida, assentiu.
— Obrigado por falar agora.
A mulher caiu, seu alívio por ter sido acreditada visível. O clã tinha um longo caminho a
percorrer para se curar, mas chegariam lá com seu marido como alfa e laird.
Percival estava de pé novamente, mostrando que tinha muito mais orgulho do que o senso
enquanto encarou todos eles.
— Eu deixarei você viver entre estes horrores. — Ele cuspiu em Shona. — Eu não vou ter
uma mulher que se deitou com um cachorro na minha cama.
Caelis se aproximou até que se elevou sobre o homem, que só agora mostrou inteligência
suficiente para expor o medo.
— Você tentou matar meu filho. Você vai morrer.
— Não, você não pode matar um Barão inglês.
De repente, um lobo branco estava lá e Shona soube que era Thomas.
Caelis indicou o homem apontando com uma única garra.
— Mate-o.
Thomas atacou, rasgando a garganta do homem e acabando com sua ameaça para seus filhos
de uma vez por todas.
Caelis chamou dois de seus soldados adiante.
— Devolva o corpo para o baronato. Morto por uma desventura com um animal.
Os soldados movimentaram a cabeça e embrulharam o corpo em um pano antes de levá-lo
para fora. Ciara avançou, sua expressão gentil.
— Nós temos uma cerimônia de acasalamento para executar.
Shona abriu sua boca, mas nenhum som saiu. Cerimônia de acasalamento? Agora?
— Quando seria melhor? — Perguntou seu companheiro, provando que ela estava gritando
seus pensamentos novamente.
— Quatro estão mortos.
— E por causa disso, muitos mais irão viver.
Esperança se desenrolou dentro dela. Era verdade. O reinado de terror exercido por Uven
estava terminado. O mal de Percival tinha terminado nesta noite também.
Mas uma cerimônia de acasalamento?
Olhando em volta para os rostos esperançosos do clã, ela percebeu que todos precisavam
deste símbolo de esperança, mas ainda assim Shona hesitou.
Caelis caiu de joelhos perante Shona, seu grande corpo ainda se elevando sobre ela como
um conriocht.
— Eu te amo, companheira, com tudo o que sou e posso sempre esperar ser. Você vai falar
os votos antigos comigo perante as pessoas que nos prometeram sua lealdade?
— Eu acredito em você. — Ela acreditava. Ela acreditava que ele a amava. Acreditava que
ele nunca mais a deixaria. Alegria incandescente brilhava através dela, aliviando um coração que
tinha visto muito sofrimento. — Você me ama. Você sempre me amou.
Finalmente, ela compreendeu. Seus erros não foram cometidos por falta de amor, mas pela
falta de compreensão do custo sobre ele. Ele nunca mais iria ignorar o custo potencial para sua
companheira para qualquer decisão que ele pudesse tomar.
— Eu o amo. Como lobo, como conriocht, como homem, meu coração e minha vida
pertencem a você.
Ela assentiu com a cabeça, as lágrimas transbordando, a felicidade liberando o perfume das
flores da primavera ao redor deles.
— Eu vou.
A cerimônia de acasalamento foi tudo o que Caelis sonhou que seria, nas muitas noites que
ele se deitou em uma pilha de peles solitário desejando a companheira que pensou que estivesse
perdida para ele. Ela prometeu-lhe tudo na língua de seu povo, seu olhar esmeralda plenamente
consciente do significado de cada palavra enquanto ele, mais uma vez, usou seu vínculo para
lembrá-la.
E eles compartilharam sua alegria com o bando MacLeod, aceitando os juramentos de seus
irmãos para apoiar e proteger seu acasalamento como era certo e justo.
Eles seguiram a cerimônia, que levou o bando da morte para a vida em poucas horas,
reunindo todos os membros humanos do clã e anunciando a nova posição de Caelis como seu laird.
A cada membro do clã foi dada a opção de jurar lealdade ou partir com a opção de ser
acolhido entre os clãs Donegal, Sinclair ou Balmoral. Todos escolheram ficar.
O peso dessa confiança pesava profundamente em Caelis.
Mas nada era mais importante do que a nova vida que Caelis começou com Shona naquela
noite, quando aceitou o seu amor e reafirmou o dela, provando para todo o clã como assuntos do
coração eram importantes, mesmo para o mais poderoso guerreiro Chrechte.
EPÍLOGO
O mesmo grupo que viajou com eles desde as terra de Sinclair ficou nas cavernas secretas
dos antigos Chrechte no dia seguinte. Caelis, Shona, seus filhos, Audrey, Vegar, Thomas, o príncipe
Eirik, Ciara, Maon e os outros soldados MacLeod que primeiro tinham jurado fidelidade ao novo
alfa.
Ciara os guiou para dentro da câmara da Faolchú Chridhe e agora instruiu Shona e Caelis a
colocar suas mãos sobre a pedra sagrada.
A cerimônia de acasalamento na noite anterior tinha sido uma afirmação pública de seu
relacionamento, mas hoje a celi di queria abençoar sua união com a pedra sagrada.
No momento em que os dedos de Shona tocaram a esmeralda brilhante gigante, ela sentiu a
ligação mais surpreendente. Os pensamentos e sentimentos que a bombardearam não eram seus
próprios, e ela percebeu por seu conteúdo que pertenciam às pessoas ao seu redor.
— Eu posso ouvir os pensamentos dos outros. — Ela disse com admiração. Ouviu as
contemplações de Uven no grande salão antes da morte do laird, mas elas foram abafadas e
desconexas.
Agora, era como se ela pudesse entrar na mente dos outros como andar em uma sala.
— É o dom de sua natureza. — Ciara disse suavemente.
— Mas eu sou humana.
— Com ascendência Chrechte.
— Você vai ajudar a identificar os Fearghall e ajudar a celi di tanto dos Éan quanto dos Faol
para servir nosso povo da maneira que devemos.
— Mas eu não sou nenhuma celi di.
Ciara sorriu.
— Você é. Você foi escolhida.
— Mas... — Shona olhou para Caelis.
Ele retornou o olhar com olhos azuis cheios de amor.
— Seu destino é seu para abraçar ou negar. Eu ficarei com você de qualquer maneira.
Felicidade impregnou nela.
— Com seu exemplo, como posso fazer menos do que abraçá-lo?
Em seguida, cada um na câmara colocou a mão sobre a Faolchú Chridhe com efeito
variável. Quando Maon tocou, porém, uma grande luz explodiu ao redor deles e quando Shona pode
ver novamente, um conriocht que não era seu companheiro estava entre eles.
Era Maon.
— Você deve encontrar os Paindeal. — Ciara entonou. — Seu destino está em reunir nossas
raças.
Maon não falou, sua expressão de choque estupefato.
Caelis colocou sua mão humana no braço do conriocht.
— Você não se sente digno. Nunca irá, mas foi escolhido como protetor do nosso povo. O
que você faz com seu grande presente é com você.
Caelis voltou-se para Shona e reiterou.
— Assim como você deve escolher o quanto de si vai dar ao nosso povo.
— Enquanto você estiver ao meu lado, eu vou servir os Chrechte de todos os clãs e os
humanos com o melhor de minha capacidade.
— Eu estarei sempre com você. Eu te amo mais do que minha vida, mais do que o meu
dever.
E ela acreditava nele.
Até a menor parte de seu espírito.
Fim
GLOSSÁRIO DE TERMOS