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Conceitos básicos

Avaliação da TFG
• Usa-se a creatinina ou cistatina C (marcadores endógenos). Não se usa a inulina (marcador exógeno), porque,
embora seja melhor, é mais cara e difícil de usar
• 2 métodos
o Medição da clearance de creatinina com uma urina de 24h (+ recolha de soro). A TFG é sobrestimada,
por haver secreção tubular de creatinina
o Fórmulas para calcular a TFG/clearance de creatinina (não implicam colheita de urina): em geral,
recomenda-se a fórmula CKD-EPI 2009 (4 fatores – idade, género, raça, creatina sérica). Com as
seguintes exceções:
▪ Crianças -> Cockcroft-Gault
▪ Obesos mórbidos, extremos idosos -> clearance de creatinina ou eTFG com cistatina C
▪ O uso de fórmulas exige uma creatininemia estável, então não devem ser usadas na LRA, mas
podem ser usadas na DRC
• Declínio da TFG com a idade: 1mL/min/1,73m2/ano. Inicia-se após a 3ª década de vida

Creatinina sérica
• O valor de referência é sempre <1

Tempo de doença
• Aguda: <3 semanas
• Subaguda: 3 semanas a 3 meses
• Crónica: >3 meses

MCDTs
• Análise de urina
o Tira-teste: ideal para rastreios
o Urina tipo II: análise laboratorial da urina e do sedimento. Ideal para dx
• Eco renal: avaliação de quistos, malformações, diferenciação corticomedular, tamanho renal, sistema
pielocalicial, hidronefrose, calcificações papilares
• Biópsia renal: gold standard, mas costuma ser a última linha para dx. Permite fazer dx, prever o prognóstico
e guiar o tx. É ecoguiada
o Indicações
▪ Etiologia de dç renal não esclarecida
▪ Alteração do sedimento urinário (proteinúria >1g/dia ou hematúria associada a qlq grau de
proteinúria) + suspeita clínica
▪ Dç renal (ex: alteração do sedimento urinário, proteinúria) associada a dç sistémica (ex: doença
autoimune, LES)
o Contraindicações
▪ Rins pequenos e indiferenciados (é difícil biopsar, a fibrose dificulta a interpretação dos
resultados)
▪ HTA não controlada
▪ Diátese hemorrágica
▪ Obesidade mórbida
▪ Rim único ou quistos (pode fazer-se biópsia com técnica cirúrgica ou laparoscópica)
▪ Discrasia sanguínea
▪ Síndrome nefrótico nas crianças: pq é muito provável ser doença de alterações mínimas, e não
é diagnosticável por biópsia com MO. Fazer teste terapêutico
▪ Nefropatia diabética (CI relativa): é preferível fazer uma fundoscopia para inferir a presença de
nefropatia através da avaliação da presença de retinopatia
• Cintigrafia renal: para esclarecer situações vasculares e obstrutivas. São estudos dinâmicos
o Tc-99m DMSA: filtrado pelo glomérulo (por isso permite avaliar a TFG) e liga-se às células tubulares
(por isso permite avaliar o fluxo sanguíneo renal). Avalia a TFG diferencial de cada rim, cicatrizes
corticais, perfusão diferencial de cada rim
▪ Associar captopril para avaliar a presença de hipertensão renovascular
▪ Associar furosemida para avaliar a presença de patologia obstrutiva
o Tc-99m MAG3: secretado pelas células tubulares (por isso permite avaliar a excreção tubular). Usada
em situações obstrutivas para avaliar o grau e local da ectasia/dilatação
o EDTA: medição da TFG
• TAC e RM: situações específicas

Alterações da urina
• Alterações do sedimento urinário: presença de células inflamatórias pode indicar inflamação, presença de
gotículas lipídicas é comum no s. nefrótico, presença de eritrócitos dismórficos é frequente (mas não
patognomónico) no s. nefrítico, etc.
• Hematúria (>3 eritrócitos/campo)
o Macroscópica: + freq de causa não renal. Episódios sinfaringíticos (síncronos a uma faringite) são
típicos de algumas glomerulopatias (nefropatia de IgA, dç do colagénio tipo IV, glomerulonefrite pós-
infeciosa)
o Microscópica: assintomática, + freq associada a dç renal. Indica hematúria glomerular se:
▪ Associada a proteinúria; ou
▪ Presença de eritrócitos dismórficos; ou
▪ Presença de cilindros eritrocitários
o Intermitente: associada a ITU, após exercício físico extremo, menstruação
o Contínua: só indica causa renal se ocorrer ao longo de todo o jato urinário
• Proteinúria
o Valores de referência
▪ Proteinúria se >150mg/24h
▪ Proteinúria na faixa nefrótica se >3,5g/24h
• Não é patognomónica de s. nefrótico. Ex: nefropatia diabética dá proteinúria na faixa
nefrótica
▪ Microalbuminúria se albumina urinária >30mg/24h
• Relacionada com o risco de progressão de dç renal ou CV
o Proteinúria não patológica (intermitente/transiente): gravidez, após febre, convulsões ou exercício
vigoroso, proteinúria ortostática (jovens)
o Tipos de proteinúria
▪ Seletiva: proteinúria de proteínas de baixo peso molecular (albumina, cadeias alfa1). Ex: dç de
lesões mínimas
▪ Não seletiva: proteinúria de proteínas de baixo e alto peso molecular
▪ Glomerular: cadeias alfa1, albumina, outras Ig
▪ Tubular: não tem albumina; tem aminoácidos, transtirretina, proteína de ligação ao retinol,
albumina, beta2-microglobulina, proteinúria de Bence-Jones (monoclonal)
o Dx
▪ Urina 24h (gold standard)
▪ Rácio albumina/creatinina ou proteínas/creatinina
▪ Tira-teste (se +, confirmar com urina 24h)
• Alterações do débito urinário
o Precede alterações séricas (ex: subida da creatinina)
o Valores de referência
▪ Anúria: <50mL/24h
▪ Oligúria: <500mL/24h
▪ Poliúria: >3L/24h
• Alterações da capacidade de concentração da urina
o N: 1005-1030 (sendo que 1000 é a densidade da água)
o Hipostenúria: <1005. Osmolaridade muito baixa (ex: polidipsia, sobrecarga por líquidos hipotónicos
(cerveja))
o Isostenúria: 1005-1015. Inabilidade de concentração da urina, com valor constante (ex: nefrite
intersticial crónica)
o Hiperstenúria: >1030. Ex: desidratação
• Anomalia urinária assintomática
o Presença de qualquer uma das anomalias anteriores, na ausência de sintomas
o Se iniciarem sintomas, pode-se inserir num s. nefrítico ou nefrótico
o Pode evoluir para DRC

Distúrbios do sódio e volume

Conceitos básicos
• Osmóis = solutos
• Solutos efetivos: não se difundem livremente através da membrana celular (ex: Na, K, glicose); mais
predominantes no líquido extracelular
o Criam gradientes osmóticos através de membranas celulares
o Associam-se a movimento secundário de água (do compartimento intracelular para o extracelular)
• Solutos não efetivos: difundem-se livremente através da membrana celular (ex: ureia)
o Não criam gradientes osmóticos, não se associando a movimento de água
• Osmolaridade total = osmolaridade efetiva (concentração de solutos efetivos) + osmolaridade não efetiva
(concentração de solutos não efetivos)
o Então a osmolaridade total pode ser diferente da osmolaridade efetiva
• A hiposmolaridade é determinada apenas pela concentração de solutos efetivos

Mecanismos de regulação e fisiopatologia


• Regulação do volume (extracelular) = regulação do Na total
o Feita pelo SRAA
o Defeito na regulação de Na -> alteração da quantidade total/conteúdo de Na -> disvolémia
▪ Défice de Na -> hipovolémia
▪ Excesso de Na -> hipervolémia/anasarca
• Osmorregulação (regulação da água)
o Feita pela ADH
o Defeito na regulação de água -> alteração da concentração plasmática de Na -> disnatrémia (=
distúrbio da osmolaridade)
▪ Retenção de água -> hiponatremia
• Manifesta-se como urina demasiado concentrada
▪ Perda de água -> hipernatremia
• Manifesta-se como urina demasiado diluída
• As alterações da concentração plasmática de Na não nos indicam o estado volémico do doente (pq a volémia
baseia-se na quantidade total de Na)
o Hiponatremia =/= défice do conteúdo de Na (pq o 1º é a concentração plasmática e o 2º é a quantidade
total)

Hipovolemia
• Hipovolemia com contração de volume do líquido extracelular (LEC)
o Por perda extrarrenal de Na
▪ GI: vómitos, diarreia, aspiração por sonda nasogástrica, drenagem, fístula
▪ Pele/respiração: perdas insensíveis, suor, queimaduras
▪ Hemorragia
o Por perda renal de Na e água
▪ Diuréticos
▪ Diurese osmótica
▪ Hipoaldosteronismo
▪ Nefropatias perdedoras de sal
o Perda renal de água: diabetes insípida (está no ppt, mas não percebo como é que hipovolémia pode ocorrer por perda isolada de água, pq
isso levaria apenas a um distúrbio da osmolaridade, não do volume)
• Hipovolemia com volume do LEC normal (ou expandido): implica redução do volume circulatório efetivo (pode
evoluir para choque)
o Diminuição do débito cardíaco: dç miocárdica, valvular ou pericárdica
o Redistribuição: hipoalbuminémia (cirrose, s. nefrótico), extravasamento capilar (pancreatite aguda,
isquemia intestinal, rabdomiólise)
o Aumento da capacitância venosa: sépsis
• Resposta à hipovolémia
o CV: contração de volume -> barorrecetores (seios carotídeos e arco aórtico) -> SNS e SRAA ->
normalização da PA (volume circulatório efetivo) e perfusão cerebral e coronária
o Rim: SNS -> diminuição da TFG, aumento da reabsorção proximal de Na e distal de água (no ducto
coletor, pela aldosterona e ADH) -> normalização do volume de LEC
• Manifestações clínicas
o Fadiga, astenia, mialgias, dor torácica ou abdominal
o Sede, oligúria, prega cutânea, mucosas secas, sinais de hipoperfusão
o Diminuição da pressão venosa central, taquicardia postural, hipotensão postural, alteração do estado
de consciência
• Dx
o Razão ureia/creatinina >20 (N: 10:1)
▪ Pq a hipovolémia estimula a reabsorção renal de água e a ureia é reabsorvida por arrasto. Tb
acontece em desidratação e na LRA pré-renal
▪ Excluir hemodiálise (há uma aumento ligeiro rebound da ureia pós-diálise), corticoides (pq o
catabolismo proteico produz ureia) e dieta hiperproteica
o Na urinário <20 mEq/L
▪ Excluir NTA e vómitos ????
o Osm urinária >450 mOsm/Kg e densidade urinária >1015
▪ Excluir diabetes insipidus ????
• Tx
o Via oral se hipovolémia ligeira-moderada
o Soro NaCl 0,9%
o Soro NaCl hipotónico (0,45% ou com dextrose a 5%) se hiperNa
o Monitorizar peso corporal, diurese e balanço hídrico

Valores de referência
• Na: 135-145
• Osmolaridade plasmática: 280-295

Hiponatremia
• Tipos de hipoNa, de acordo com a tonicidade/osmolaridade
o HipoNa hipotónica (verdadeira): hipoNa com hiposmolaridade; 3 mecanismos:
▪ Estimulação contínua da secreção de ADH por mecanismos não osmóticos, apesar das
hiposmolaridade (+ freq)
• Défice (absoluto) de Na (= hipovolémia) -> estimulação não osmótica da ADH e sede -
> reabsorção de água -> hipoNa
▪ Fatores intrarrenais: diminuição da TFG, aumento da reabsorção tubular proximal de Na e água
▪ Defeito na reabsorção de Na/Cl no segmento espesso da ansa de Henle ou TCD (impermeáveis
à água)
o HipoNa hipertónica (translocacional): hipoNa com aumento da osmolaridade
▪ Aumento da osmolaridade efetiva -> água move-se do espaço intracelular para o extracelular
-> desidratação celular e hipoNa
▪ Ex: glicose (cetoacidose diabética), manitol (exógeno)
▪ Não reflete alteração da água corporal total, apenas o seu movimento para o espaço
extracelular
▪ O aumento da osmolaridade não efetiva (ex: ureia, na uremia, ou etanol, na intoxicação por
etanol) não leva a hipoNa translocacional, pq os solutos podem mover-se livremente através
de membranas celulares, não criando gradiente osmótico
o PseudohipoNa: hipoNa falsa com osmolaridade normal
▪ A hipoNa é falsa pq vem de um erro laboratorial causado por hiperproteinemia ou
hiperlipidemia
o HipoNa isotónica: hipoNa com osmolaridade normal
▪ Síndrome RTUP: hipoNa por absorção da solução hipotónica usada para irrigar a bexiga
(sorbitol ou glicina)
• Tipos de hipoNa, de acordo com o conteúdo corporal de Na (volémia); todas estas são hipoNa
hipotónicas/verdadeiras
o HipoNa hipovolémica (↓↓Na/↓H2O)
▪ Há uma perda de Na superior à perda de água
▪ Por libertação não osmótica de ADH devido à hipovolémia, mantendo a sua secreção num
estado hiposmolar
▪ Perda de Na e água cutânea, GI ou renal (nefropatia perdedora de Na, diurese pós-obstrutiva,
hipoaldosteronismo)
o HipoNa euvolémica (↑↑H2O/↓Na); é a + freq nos hospitalizados
▪ Há um ganho primário de água com natriurese secundária
▪ Polidipsia primária, diminuição da ingestão de solutos, SIADH, défice de glucocorticoides (leva
ao aumento da ADH), hipoT (diminuição do débito cardíaco e TFG -> estimulação da ADH), dç
pulmonares, neuropsiquiátricas, neoplasias, dor pós-op, fármacos, potomania da cerveja
▪ Hipouricémia
o HipoNa hipervolémica (↑Na/↑↑H2O)
▪ Ganho primário de Na com ganho secundário, maior, de água
▪ ICC, s. nefrótico, cirrose
• Manifestações clínicas
o Edema células, esp cerebral -> sintomas neurológicos
o Comuns à hiperNa: alterações do estado de consciência (obnubilação, letargia, coma)
o Característicos: alterações do movimento (mioclonias, convulsões), quedas (esp idosos)
o Mecanismos de adaptação: na hipoNa crónica (>48h); perda de osmóis do líquido intracelular cerebral
(Na, Cl, K, fosfato, osmóis orgânicos, como o inositol) para o interstício -> saída de água intracelular
-> diminuição do edema cerebral
• Dx
o 1º: determinar a osmolaridade sérica
▪ DD entre hipoNa hipotónica, hipertónica, isotónica, pseudohipoNa
o 2º: determinar a osmolaridade urinária
▪ A resposta renal normal a uma hipoNa deve ser diluição da urina para <100 mOsm/Kg
▪ Se osm urinária >100 -> polidipsia primária (distúrbio psiquiátrico com consumo excessivo de
água -> compromisso da diluição urinária)
▪ Potomania da cerveja (consumo excessivo): mantém-se a capacidade de diluir urina ->
osmolaridade urinária normal
o 3º: avaliar a volémia
▪ PA, turgescência jugular, crepitações nas bases, sibilos, hipotensão ortostática, desidratação
da pele e mucosas, prega cutânea, edemas
▪ DD entre hipoNa hipovolémia, hipervolémica e euvolémica
o 4º: determinar o Na urinário
▪ Distingue distúrbios renais de extrarrenais
• Causa extrarrenal: retenção de Na pelo rim -> Na urinário <20 mEq/L
o Ex: IC
• Causa renal: perda renal de Na -> Na urinário >20 mEq/L
o Ex: DRC, LRA renal, diuréticos, deficiência de aldosterona
• Tx (é um distúrbio da osmorregulação com excesso de água, então o tx não é dar Na)
o Elevação da natremia: restrição hídrica ou aumento da excreção de água
o HipoNa hipovolémica: soro NaCl 0,9%
o HipoNa hipervolémica: restrição de água e Na, diuréticos de ansa, correção de hipoK se existente (pode
ser causado pelo diurético de ansa)
o HipoNa euvolémica: restrição hídrica, antagonistas da ADH
o HipoNa aguda (<48h)
▪ Tx não urgente: soro NaCl para um aumento do Na em 0.5-1 mEq/L/h e <10-12mEq/L/24h
▪ Tx urgente apenas se sintomático (sintomas neurológicos, náuseas, vómitos, mal-estar)
• Soro NaCl 3% (hipertónico) para um aumento do Na em 1-2mEq/L/h nas primeiras 3-
4h ou até resolução dos sintomas
o HipoNa crónica (>48h)
▪ Doente sem sintomas neurológicos: soro NaCl para um aumento do Na em <8-10mEq/L/24h
e <18mEq/L/48h
• Subida lenta do Na, para evitar síndrome de desmielinização osmótica
▪ Doente com sintomas neurológicos: aumento de 1-2mEq/L/h até resolução dos sintomas e a
partir daí aumento de <8-10mEq/L/24h
o Síndrome de desmielinização osmótica: se a correção for demasiado rápida
▪ Lise dos neurónios -> paralisia flácida, disartria, disfagia. Elevada morbimortalidade
▪ Maior risco se hipoNa crónica, anóxia cerebral prévia, hipoK, desnutrição
▪ Dx: RM
Hipernatremia
• Indica hiperosmolaridade e contração do volume intracelular
• Mecanismos
o Perda de água (+ freq)
o Ganho de Na
• Causas
o Hipodipsia primária (lesão nos osmorecetores hipotalâmicos)
o Acesso limitado à água
o HiperNa essencial (regulação não osmótica da ADH)
o Perda de água livre
▪ GI: diarreia osmótica ou diarreia secretora
▪ Renal osmótica: diuréticos de ansa (isosmótica), hiperglicémia/glicosúria
▪ Renal não osmótica: diabetes insípida central (TCE, neurocirurgia, dç granulomatosa,
neoplasia, AVC, infeção, mutação no gene do precursor da ADH, idiopática) ou nefrogénica
(mutação no gene do recetor V2 ou da aquaporina 2, Li, hiperCa, hipoK, necrose papilar,
gravidez)
• Manifestações clínicas
o Contração do volume intracelular, esp no cérebro -> manifestações neurológicas
o Comuns à hipoNa: alterações do estado de consciência (obnubilação, letargia, coma)
o Característicos: aumento do risco de hemorragia cerebral ou subaracnoideia, défices neurológicos
focais, sede, poliúria, preferência por água fria
o Mecanismos de adaptação: na hiperNa crónica (>48h); síntese de osmóis nos neurónios (Na, Cl, K,
fosfato, osmóis orgânicos, como o inositol) -> entrada de água -> diminuição da concentração de
volume intracelular
• Dx
o 1º: avaliar a osmolaridade sérica
▪ Está sempre aumentada; não existe pseudohiperNa
o 2º: avaliar o débito urinário: a resposta renal normal seria conservação de água
▪ Volume mínimo de água maximamente concentrada: causa extrarrenal (perdas GI ou perdas
insensíveis pela pele)
▪ Poliúria: causa renal
o 3º: avaliar a osmolaridade urinária: a resposta renal normal seria conservar água -> urina concentrada
▪ Urina hiperosmolar (>750 mOsm/24h) -> indica diurese osmótica
• Diuréticos, SGLT-2i
• Cetoacidose diabética e coma hiperosmolar
▪ Urina hiposmolar (<750 mOsm/24h) -> indica baixa reposta renal à ADH
• Diabetes insípida
o DD entre diabetes insípida central e nefrogénica: teste com desmopressina intranasal
▪ Diabetes insípida central: correção do distúrbio, com aumento da osmolaridade urinária
▪ Diabetes insípida nefrogénica: sem alteração da osmolaridade urinária
o Nota: se houver hiperNa com hipervolémia, pode ser uma hiperNa iatrogénica por administração de
NaCl ou bicarbonato de Na hipertónicos
• Tx
o A hiperNa costuma ser acompanhada por um distúrbio da volémia. Temos de corrigir 1º isso, antes de
corrigir o défice de água (se não, não há resultados)
▪ HiperNa hipovolémica (+ freq): ingestão hídrica ou dextrose 5% + soro NaCl hipotónico (0,45%;
pq temos de dar algum Na para corrigir a hipovolémia)
▪ HiperNa hipervolémica: descobrir a fonte de Na e tratá-la
o Correção lenta do défice de água: ao longo de 48-72h, para prevenir edema cerebral
▪ Objetivo: baixar o Na em o,5mEq/L/h e <12 mEq/L/h nas primeiras 24h
o Diabetes insípida central: desmopressina IN + dieta pobre em Na + tiazídico +/- fármaco para aumentar
a ADH (clorpropamida, clofibrato, carbamazepina, AINEs)
o Diabetes insípida nefrogénica: dieta pobre em Na + tiazídico + amiloride (se a etiologia for tx com Li)
▪ Usam-se os tiazídicos para aumentar a excreção de Na (melhoria da hiperosmolaridade ->
melhoria da sede), embora levem ao aumento da poliúria

Distúrbios do potássio

Homeostasia/mecanismos de regulação do K - variação sérica <10%


• Excreção renal: principal mecanismo de regulação (excreta 50% do K total; responsável por 90% da
eliminação). Atua em 24-36h
o ENaC: canal que faz reabsorção de Na no ducto coletor (células principais).
Sensível a amiloride
o Canais BK e ROMK: permitem difusão passiva de K no ducto coletor (células
principais). Esta saída de K depende da quantidade de Na e água que chega a
essas células (fluxo tubular distal), pela estimulação da bomba Na/K
• Excreção pelas fezes e suor. São mecanismos de excreção secundários (eliminam 10% do K), estando mais
desenvolvidos em doentes com fx renal diminuída, que não consigam excretar K pelo rim (diálise, DRC
avançada). Podem causar hipoK se hipersudorese ou diarreia
• Shift intracelular pela bomba Na/K. Atua em minutos. Estimulada por:
o Insulina
o Catecolaminas (recetores beta2; stress)
▪ O K+ participa na vasodilatação muscular -> aumento da
oxigenação muscular.
▪ As catecolaminas fazem com que esse K libertado volte para o interior das células.
▪ HipoK -> vasoconstrição muscular -> isquemia -> rabdomiólise
o Mineralocorticoides (aldosterona)
o Alcalose
• Órgãos reservatórios de K: fígado e músculo. Não afetam a caliemia

Distúrbios do K de causa renal


• Aumento da aldosterona (devido a hipovolémia, hiperK, adenoma da suprarrenal, etc.): hipoK por 2
mecanismos. Ação nas células principais do ducto coletor
o Estimulação da bomba Na/K
o Estimulação do ENaC -> entrada de Na -> excreção de K
• Alcalose causa hipoK por 3 mecanismos
o Estimulação da bomba Na/K
o Entrada de K nas células por troca com H+ (bomba H/K; antiporte)
o Excreção renal de bicarbonato para corrigir a alcalose (bicarbonatúria) -> aumento das cargas
negativas (bicarbonato) no ducto coletor -> excreção de K+ para manter a eletroneutralidade
• Alcalose secundária a hipoK: a amoniogénese varia inversamente à caliemia
o Amoniogénese (= tampão de amónia): o rim secreta NH3 para o lúmen tubular, permitindo que se
excrete H+, formando-se NH4+. A formação de NH3 nos túbulos a partir de glutamina tb tem como
consequência a formação de 2 bicarbonatos (regeneração de bicarbonato), que vão para o sangue

o HipoK -> estimulação da amoniogénese -> aumento da excreção renal de H+ e da regeneração de


bicarbonato -> alcalose
• Acidose causa hiperK: excesso de H+ -> entrada de H nas células e saída de K (bomba H/K) -> hiperK
• Acidose secundária a hiperK: hiperK inibe a amoniogénese -> diminuição da excreção renal de H+ e da
regeneração de bicarbonato -> acidemia . Tx: bicarbonato
• Fx renal diminuída (TFG <45; a partir do estadio G3b)
o DRC estadio G3b (ou mais avançada) -> diminuição da filtração glomerular -> diminuição do líquido
filtrado -> diminuição do fluxo tubular distal -> diminuição da excreção de K -> hiperK
o Medição do K a cada 6 meses se DRC G3b ou pior

Distúrbios do K causados por diuréticos


• Diuréticos de ansa: criam hipoK por 3 mecanismos
o Inibição da bomba Na/K/2Cl -> diminuição da reabsorção de K
o Diminuição da reabsorção de Na e água -> Na fica no lúmen -> lúmen menos eletronegativo->
diminuição da reabsorção de K
▪ O mecanismo de reabsorção de K (no TCP e ansa de Henle) depende do lúmen eletronegativo
criado pela absorção de Na
o Diminuição da reabsorção de Na e água -> aumento do fluxo tubular distal -> aumento da excreção
de K (no túbulo distal)
• Tiazídicos: criam hipoK por 1 mecanismo. A hipoK é mais grave do que a causada pelos diuréticos de ansa
o Inibição da bomba Na/Cl do TCD -> diminuição da reabsorção de Na -> aumento de Na no lúmen ->
aumento do fluxo tubular distal -> estimulação da excreção de K
o Tb existe um sensor nas células do TCD que deteta hiperK e inibe a bomba Na/Cl. Por isso é que uma
dieta rica em K é boa para a HTA, pq diminui a reabsorção de Na
• Diuréticos poupadores de K (amiloride)
o Inibição do ENaC no ducto coletor -> menos entrada de Na -> menos excreção de K
• Síndromes genéticos que mimetizam os efeitos dos diuréticos
o S. de Bartter: defeito na bomba Na/K/2Cl -> hipoK
o S. de Gitelman: defeito na bomba Na/Cl -> hipoK
o S. de Liddle: aumento da função do ENaC -> hipoK

Valores de referência do K
• N: 3.5 a 5 mEq/L
1mEq = 1mmol

HipoK
o Ligeira-moderada: 3 a 3,5
o Severa: <3
• Etiologia
o Ingestão diminuída (raro): caquexia, anorexia
o Redistribuição celular: alcalose, aumento da insulina, B2-agonistas, paralisia periódica hipocalémica
(dç genética), intoxicação por cloroquina
o Perdas extrarrenais: diarreia e laxantes, perdas cutâneas (queimaduras, hipersudorese), resina
permutadora de iões
o Perdas renais: diuréticos de ansa ou tiazídicos, excesso de mineralocorticoides, s. de Gitelman, Bartter,
Liddle, hipoMg, poliúria, outros fármacos (anfotericina B, L-dopa)
• PseudohipoK: quando o sangue fica muito tempo à T ambiente após colheita, pelo consumo de K pelos
mieloblastos na amostra
• Manifestações clínicas
o GI: anorexia, náuseas, vómitos, obstipação, íleo paralítico, distensão abdominal
o CV: arritmias, aumento da sensibilidade à toxicidade dos digitálicos
▪ ECG: infraST, achatamento da onda T, surgimento de ondas U
o Neuromuscular: fadiga, fraqueza, parestesia, paralisia
• DD
o O exame físico é mais importante na hipoK do que na hiperK: avaliar volémia/hidratação (prega
cutânea) e PA, sinais de hiperT, Cushing, etc. (sinais de hiperaldosteronismo e hipercortisolismo)
o Diminuição do débito urinário pode indicar lesão renal -> hipoK de causa renal
o Medir o K urinário: na ausência de dç renal, o rim vai diminuir a excreção de K
▪ K urinário <20 -> o rim está a responder à hipoK -> causa extrarrenal
▪ K urinário >20 -> o rim não está a responder à hipoK, poupando K -> causa renal
o Medir bicarbonato, Cl e Mg
o ATR – acidose tubular renal

• Tx
o HipoK ligeira-moderada: citrato de K oral (30-40mEq)
o HipoK severa (<3mEq) ou sintomática: soro fisiológico com KCl
▪ Cateter periférico (risco de flebites) ou central (infundir longe do coração, para evitar
instabilidade cardíaca)
▪ Monitorização cardíaca
o Se hipoK + acidose, corrigir primeiro a hipoK. Pq corrigir a acidose vai agravar a hipoK
o Se hipoK + hipoMg (hipoK refratária ao tx), corrigir primeiro a hipoMg. Pq há perda da inibição do
ROMK pelo Mg
o Contraindicada a administração de dextrose IV em bólus. Causaria estimulação da insulina, agravando
a hipoK
o Perda crónica de K+ (s. Gitelman, Bartter, hiperaldosteronismo primário): diurético poupador de K e
dieta rica em K

HiperK
o Ligeira: <6
o Moderada: 6 a 6,5
o Grave: >6,5
• Etiologia
o Diminuição da excreção renal: diminuição da fx renal (ex: DRC)
o iECA/ARA + diurético poupador de K (amiloride, trianterenom espironolactona, eprenelona,
finerenona)
o Administração rápida de K (hiperK rebound apos tx de uma hipoK)
o Diminuição da aldosterona: Addison, fármacos
o Saída do K+ intracelular: lesão tecidual, queimaduras, trauma, exercício intenso, convulsões, acidose
• PseudohiperK: hemólise in vitro por alterações da temperatura ou efluxo celular em condições de
trombocitose, eritrocitose ou leucocitose extremas
• Manifestações clínicas
o GI: anorexia, náuseas, vómitos, diarreia
o CV: BAV, FV e paragem cardíaca
▪ Evolução do ECG (ritmo pré-paragem): onda T apiculada -> QRS largo -> bradicardia -> BAV
-> paragem cardíaca. Pode ocorrer desaparecimento da onda P
o Neuromusculares: parestesia, fraqueza
• DD: medir o K urinário para perceber se a causa é renal ou extrarrenal
o K urinário >40mEq/L -> resposta normal do rim à hiperK -> causa extrarrenal
o K urinário <40mEq/L -> o rim não está a excretar K suficiente -> causa renal
• Tx

(a resina impede a absorção intestinal de K)


o Urgente se hiperK grave (>6,5) e/ou alterações no ECG
▪ Dividido em 3 estadios
• Estabilização de membranas (antagonizar os efeitos cardíacos): gluconato de Ca
• Fazer o shift K+ para dentro da células: insulina (+ soro glicosado, para evitar
hipoglicémia) e salbutamol (b2 adrenérgico)
• Estimular a excreção renal de K+: furosemida
▪ Monitorização cardíaca contínua e determinação do K a cada hora após início do tx
o Diálise: situações mais complicadas

Distúrbios ácido-base

• Acidémia/alcalémia: referem-se ao pH do sangue


• Acidose/alcalose: referem-se às causas dos distúrbios (respiratória ou metabólica)

Valores de referência
• Acidemia: pH <7,35
• Alcalemia: pH >7,45
• CO2: 35-45 mmHg
• HCO3: 22-28 mEq/L
• Anion gap: 8-12 mEq/L

Distúrbios e causas (tratar sempre as causas)


• Acidose metabólica: diarreia, ATR, cetoacidose, choque, tóxicos, etc.
o Com AG normal (= hiperclorémica; há um aumento do Cl para compensar a perda de HCO3, por isso
é que não há anion gap)
o Com AG aumentado
• Alcalose metabólica: hipovolémia, diuréticos, vómitos
• Acidose respiratória: insuf respiratória, asma, DPOC, doenças musculares, obesidade
• Alcalose respiratória: febre, dor, ansiedade
• Distúrbio misto: pode ter pH normal ou alterado
o Delta/delta =/= 1

Anion gap (AG)


• Só é útil na acidose metabólica
• Definição: concentração de aniões no plasma (para além do Cl- e HCO3-)
o [Na+] + [outros catiões] = [Cl-] + [HCO3-] + [outros aniões]
<=> [Na+] = [Cl-] + [HCO3-] + [outros aniões] (outros catiões = 0, pq são maioritariamente intracelulares)
[Na+]- ([Cl-] + [HCO3-]) = [outros aniões] = AG
<=>

• Alterações do AG (N: 8-12 mEq/L)


o 2 causas de AG aumentado (>12)
▪ Diminuição de HCO3
▪ Aumento de substâncias ácidas (endógenas ou exógenas) em circulação (pq os ácidos
orgânicos são aniões) -> pq levam a uma diminuição do HCO3
▪ Se o aumento do AG for >5, traduz sempre acidose metabólica
o Diminuído na hipoalbuminémia (pq a albumina é um anião). Por cada diminuição de 1g/dL de albumina,
o AG diminui 2,5mEq/L

Delta/delta
• Só é útil na acidose metabólica com AG aumentado, para avaliar se há um distúrbio ácido-base misto
• Definição: razão entre a variação do AG (delta AG) e a variação do bicarbonato (delta bicarbonato)
o Normalmente, um aumento do AG é causado por uma diminuição proporcional do bicarbonato ->
delta/delta = 1

o Delta/delta =/= 1 -> indica distúrbio ácido-base misto


▪ Delta HCO3 > delta AG: acidose metabólica com AG aumentado + acidose metabólica com AG
normal
• O HCO3 diminui mais do que o esperado pq temos duas acidoses metabólicas. Mas
como o Cl aumenta (devido à acidose metabólica com AG normal), o AG aumenta só
um pouco

AG HCO3- Cl-
↑ ↓↓ ↑

• Nesta situação, o pH vai ser ácido


• Ex: diarreia + acidose lática
▪ Delta AG >> delta HCO3: acidose metabólica com AG aumentado + alcalose metabólica
• O AG aumenta pq temos uma acidose metabólica com AG. Mas o bicarbonato varia
pouco, pq temos uma acidose metabólica a diminuí-lo + uma alcalose metabólica a
aumentá-lo
• Nesta situação, o pH pode ser normal
• Ex: uremia + vómitos

Compensações e distúrbios mistos


• Compensações fisiológicas nunca normalizam o pH. Ex: uma acidose metabólica com compensação pulmonar
(hiperventilação -> diminuição do CO2) vai continuar a apresentar-se como uma acidemia (pH baixo na gaso)
• Podemos ter distúrbios mistos com pH normal ou alterado
• Métodos de dx
o Calcular o delta/delta
o Equações que avaliam se a resposta compensatória é adequada

Acidose metabólica Por cada ↓1mEq/L de HCO3, o CO2 diminui 1,25mmHg


Alcalose metabólica Por cada ↑10mEq/L de HCO3, o CO2 aumenta 6mmHg
Acidose respiratória Por cada ↑1mmHg de CO2, o HCO3 aumenta 0,1mmHg
Alcalose respiratória Por cada ↓1mmHg de CO2, o HCO3 diminui 0,2mmHg

▪ Ex: acidose metabólica com CO2 20mmHg e HCO3 15mEq/L


• O HCO3 baixou 7mEq/L; o CO2 baixou 15mmHg, mas pela equação devia baixar
8,75mmHg -> CO2 baixou demasiado -> alcalose respiratória

Acidose metabólica
• Todas as causas de acidose metabólica podem evoluir para insuf renal
• Algoritmo de dx: fazer gaso e ver logo AG
o Se AG >12, procurar a causa (gaso + urina II)
o Se Ag normal descartar em 1º diarreia, em 2º insuf renal e em 3º ATR
• Acidose metabólica com AG aumentado (substâncias ácidas (endógenas ou exógenas) em circulação)
o Causas endógenas
▪ Acidose lática
• Tipo A - produção excessiva (secundária a choque); tipo B – metabolização insuficiente
(fármacos, etc.)
• Dx: ácido lático elevado na gaso
• Tx da causa com ATB, adrenalina, aminas, volume, reposição de iões
▪ Cetoacidose diabética
• Dx: cetonúria na urina II
• Tx com insulina e corrigir K; HCO3 se pH <7,1
▪ Cetoacidose alcoólica
• O alcoólico não come (pq tem náuseas e vómitos) e o álcool inibe a gliconeogénese
• Dx: cetonúria na urina II
• Tx: alimentar o doente (vai aumentar a glicose)
▪ Insuf renal severa (LRA ou DRC)
• Por diminuição da amoniogénese (diminuição da excreção de H+) e retenção de sulfato,
fosfato e outros aniões (devido à diminuição da TFG)
• Tx depende da etiologia + bicarbonato, diálise
o Causas exógenas
▪ Intoxicação por álcoois (metanol, etilenoglicol – anticongelante)
• A acidose é criada pela metabolização dos álcoois em acetaldeído
• Apresentação clínica: depressão do SNC, insuf renal (por precipitação dos cristais)
• Dx: urina II (precipitação de cristais de oxalato de Ca)
• Tx: lavagem gástrica, hidratação, fomepizol ou etanol (competem com os álcoois,
inibindo a sua metabolização), hemodiálise, tiamina, contactar centro de intoxicações
▪ Intoxicação por aspirina
• Tx: hidratação, soro, HCO3, lavagem gástrica, medidas de suporte, contactar centro de
intoxicações
▪ Intoxicação por paracetamol: por depleção de glutationa e acumulação de ácido piroglutâmico
• Acidose metabólica com AG normal
o Diarreia
▪ Por perda de HCO3
▪ Tx: antidiarreico e dar HCO3
o Insuf renal ligeira-moderada: por diminuição da amoniogénese (diminuição da excreção de H+)
o Acidose tubular renal

Alcalose metabólica
• Mecanismos etiológicos
o Perda de volume (hipovolémia efetiva sustentada)
▪ Aumento da reabsorção de HCO3 no TCP
▪ Ativação do SRAA -> reabsorção de Na com excreção de K e H
o Perda de Cl -> o rim absorve bicarbonato para manter a eletronegatividade do sangue
o HipoK
• Causas
o Vómitos: por perda de volume e Cl
o Diuréticos de ansa e tiazídicos: por perda de Na e Cl
o Excesso de mineralocorticoides
o Administração exógena de HCO3: iatrogénica ou s. leite-alcalinos
o Alcalose pós-hipercápnica: doente com acidose respiratória crónica que começou ventilação mecânica
-> correção da hipercápnia, mas o HCO3 demora mais a corrigir pq tem excreção renal mais lenta
• Tx da causa (antieméticos, suspender diuréticos, etc.) + soro com NaCl; acetazolamida usada raramente
Lesão renal aguda (LRA)

Definição KDIGO
• Síndrome clínico definido por pelo menos uma das seguintes alterações funcionais, em <48h
o Aumento da creatinina
▪ Semivida de 48-72h, só começando a subir 2-3 dias após início da LRA
o Diminuição da TFG
o Alteração do débito urinário
▪ Surge mais precocemente do que o aumento da creatinina

• Podem acompanhar-se de alterações do equilíbrio ácido-base, hidroeletrolítico, excreção de fármacos,


retenção de metabolitos azotados
• Insuf renal aguda é o termo desatualizado que se refere apenas à diminuição da TFG

Etiologia
• A classificação etiológica é usada para DD. Não tem valor prognóstico

o Uma LRA pré-renal (hipovolémia) pode evoluir para uma LRA renal intrínseca isquémica (NTA)
o LRA renal intrínseca por lesão tubular tem 2 causas: isquémica (inclui sépsis) e tóxica

Epidemiologia
• Pré-renal: 60-70%; renal: 25-40%; pós-renal: 5-10%
• Maior incidência a nível hospitalar (5-7%, 30% em UCI)
o Pré-renal é a + comum; a 2ª é NTA isquémica e nefrotóxica
• Menor incidência na comunidade (1%): implica compromisso prévio da fx renal (DRC prévia; esta situação
chama-se LRA enxertada em DRC)
o Pré-renal é a + comum; a 2ª é pós-renal

Fatores de risco
• Idade >75 anos
• Hx de DRC
• Cirurgia major (devido à anestesia, vasopressores -> hipovolémia)
• AINEs (nefrotoxicidade)
• Outros
Fisiopatologia
• LRA pré-renal: por hipoperfusão renal (com diminuição da TFG, mas ainda sem lesão celular)
o Por redução do volume arterial efetivo; o rim recebe 20% do débito cardíaco
o Após correção, é a etiologia de LRA que tem normalização mais rápida da creatinina (48-72h =
semivida da creatinina)
o Se não tratada, pode evoluir para isquémica -> lesão celular -> LRA renal intrínseca
• LRA renal intrínseca: por lesão celular
o Após correção, é a etiologia de LRA que tem normalização mais lenta da creatinina (3 semanas a 3
meses = tempo de re-epitelização dos túbulos)
• LRA pós-renal: obstrução ao fluxo -> aumento da pressão na cápsula de Bowman -> diminuição da TFG

Avaliação da diurese
• LRA não oligúrica: DU >400 mL/dia
o NTA, diabetes insípida nefrogénica após obstrução, nefrite intersticial aguda
o Tem maior TFG ou menor reabsorção tubular do que a LRA oligúrica
o Indica lesão menos grave -> melhor prognóstico
o Diuréticos não têm benefícios
• LRA oligúrica: DU <400 mL/dia
o Pré-renal, obstruções simples
o Mau prognóstico
o Diuréticos e monitorizar apertadamente a necessidade de diálise
• LRA com anúria : DU <50 mL/dia (raro)
o Choque, obstrução completa bilateral/unilateral em rim único, enfarte renal bilateral, trombose da veia
renal, isquemia com necrose cortical, glomerulonefrite proliferativa ou vasculite severa
o Pior prognóstico
o Diuréticos e monitorizar apertadamente a necessidade de diálise

Dx etiológico
• 1º: excluir causas pré-renais e pós-renais (por serem + prevalentes e mais fáceis de diagnosticar)
o Pré-renal: hx cínica, EO e painel analítico
o Pós-renal infravesical (estenose da uretra, HBP): algaliação (revela um aumento franco do débito
urinário -> permite dx de LRA pós-renal)
o Pós-renal supravesical: eco renal (hidronefrose)
• 2º: avaliar causas renais intrínsecas
• Biópsia renal se não for possível esclarecer a etiologia e se houver condições

Manifestações clínicas
• Síndrome com 4 manifestações
o Distúrbios ácido-base: acidose metabólica
o Distúrbios hidroeletrolíticos: sobrecarga hídrica, hipoNa, hiperK, HiperP, hipoCa
o Retenção de metabolitos azotados: uremia
o Diminuição da excreção de fármacos -> aumento da sua toxicidade (ex: antiepiléticos – fenitoina)
• Manifestações sistémicas
o Cérebro: encefalopatia urémica, aumento da permeabilidade da BHE, aumento de citocinas
o Coração: sobrecarga de volume e aumento da pré-carga, depressão miocárdica, citocinas, apoptose
de cardiomiócitos
o Pulmão: sobrecarga de volume, aumento da permeabilidade vascular, citocinas
o GI: náuseas, vómitos, malnutrição
o Fígado: aumento da permeabilidade vascular com congestão, aumento das transaminases, colestase
o MO: disfunção imune, anemia, trombocitopenia

Tx
• Distúrbios ácido-base
o Se pH <7,2 -> bicarbonato IV +/- diálise temporária
• Distúrbios hidroeletrolíticos
o Fluidoterapia + vasopressores/vasodilatadores + diuréticos de ansa + inotrópicos
o Ultrafiltração (tipo de hemodiálise) se os diuréticos não resolverem a sobrecarga hídrica
• Retenção de metabolitos azotados
o +/- diálise temporária
• Diminuição da excreção de fármacos
o Evitar nefrotóxicos: agentes de contraste, AINEs, etc.
o Suspensão de fármacos que interferem com a autorregulação renal: iECA, ARA
o Ajuste de fármacos à função renal
• Indicações para diálise na LRA
o Indicações absolutas
▪ Sobrecarga hídrica refratária a diuréticos (para evitar edema agudo do pulmão, por exemplo)
▪ HiperK (>6,5) se débito urinário insuficiente
▪ Acidémia metabólica refratária (pH <7,1)
▪ Uremia ameaçadora de vida: encefalite, coagulopatia, pericardite
▪ Toxicidade por fármaco dialisável
o Indicações relativas
▪ Oligoanúria
▪ LRA em contexto de sépsis
▪ Urémia não ameaçadora de vida

Prognóstico
• LRA com recuperação total (ex: LRA pré-renal)
• LRA com recuperação parcial: 20% evolui para DRC terminal em 3 anos; necessário seguimento para DRC
• LRA enxertada em DRC: 30% ficam dependentes de diálise
• LRA sem recuperação da fx renal: 10% dos casos
• Mortalidade geral: 20-50%; 70% na LRA associada a sépsis

LRA pré-renal
• Etiologia: hipoperfusão renal sem lesão celular do parênquima renal
o Redução do débito cardíaco
o Redução da PA
o Redução do volume circulante efetivo (s. cardiorrenal (IC) e s. hepatorrenal (cirrose))
• Dados analíticos
o Sem perda da capacidade de concentração da urina
o Fração de excreção de Na <1%
o Razão ureia/creatinina >20
o Sedimento urinário normal ou com cilindros hialinos
• Responde rapidamente (<3 dias) ao tx (normalização da creatinina sérica)
• Síndrome cardiorrenal
o Tipo 1 (+ freq): disfunção cardíaca (diminuição do débito cardíaco) aguda que leva a disfunção renal
(por hipoperfusão)
▪ Mau prognóstico
▪ Tx: estabilidade hemodinâmica e controlar a volémia (hipovolémia piora a hipoperfusão renal;
hipervolémia piora a fx cardíaca)
o Tipo 2: disfunção cardíaca crónica (IC) que leva a disfunção renal
o Tipo 3: disfunção renal aguda que leva a disfunção cardíaca
o Tipo 4: disfunção renal crónica que leva a disfunção cardíaca
o Tipo 5: dç sistémica (LES, DM, etc.) que leva a uma disfunção de ambos
os órgãos
• Síndrome hepatorrenal
o Fisiopatologia: cirrose -> HT portal -> vasodilatação esplâncnica e sistémica -> vasoconstrição renal
-> hipoperfusão renal. Para além disso, a ascite aumenta a pressão intrabdominal, que fica superior à
pressão de filtração glomerular -> diminuição da TFG (síndrome compartimental)
o Tipo 1 (+ freq): LRA de progressão rápida. Duplicação da creatinina em 2 semanas para >2,5 mg/dL
▪ Mau prognóstico; mortalidade de 80%
▪ Tx: vasoconstritores, inotrópicos, controlo da volémia; aguardar transplante hepático
o Tipo 2: LRA de progressão lenta (tipo LRA enxertada em DRC). Aumento progressivo da creatinina

LRA renal intrínseca


• Etiologia
o Necrose tubular aguda (NTA): 75%
▪ Isquémica
▪ Tóxica
o Glomerulonefrite aguda: 10%
o Nefrite intersticial aguda (NIA): 10%; sobretudo alérgica
o Dç vascular aguda: 5%; ex: tromboses arteriais/venosas
• DD da etiologia pelo sedimento urinário; biópsia renal se sedimento não for esclarecedor
o Sedimento benigno: NTA tóxica (ausência de células), NTA isquémica (células tubulares epiteliais e
restos celulares)
o Sedimento ativo: GN aguda (hematoproteinúria, leucocitúria), NIA (leucocitúria, possível bacteriúria,
eosinofilúria), dç vascular (células tubulares epiteliais, eosinofilúria)
• NTA
o Fisiopatologia: progressão de LRA pré-renal -> lesão celular tubular -> consequências vasculares
▪ Efeitos vasculares da hipoperfusão: vasoconstrição (por diminuição da síntese de
vasodilatadores), expressão de moléculas de adesão para leucócitos, obstrução da
microcirculação
▪ Efeitos tubulares da hipoperfusão: perda de gradientes iónicos (disfunção das bombas Na/K) e
junções intercelulares. A reperfusão vai criar ROS, levando à destruição da borda em escova e
deslocação das bombas Na/K da parte basal para a porção apical das células (despolarização
celular) -> apoptose e necrose -> obstrução tubular com restos celulares. Tb ocorre backleak
do fluido tubular para os capilares peritubulares, pq a única barreira existente entre eles passa
a ser a membrana basal
o Fases: ocorrem independentemente de qual for a etiologia da NTA; dura 3 semanas a 3 meses
▪ Fase de iniciação: aumento da creatinina com diminuição do débito urinário. O tx neste fase
pode melhorar os outcomes
▪ Fase de extensão: já há lesão bem estabelecida
▪ Fase de manutenção: creatinina estável com débito urinário variável; cerca de 1 semana
▪ Fase de reparação: creatinina começa a descer, pode apresentar poliúria; cerca de 1 semana
o Dados analíticos e DD com LRA pré-renal
▪ Perda de capacidade de concentração da urina (pq há dano tubular) – isostenúria;
osmolaridade urinária <400 mOsm/Kg
▪ Fração de excreção de Na >2%
▪ Sedimento: células epiteliais, restos celulares,
cilindros granulosos ou epiteliais
▪ Razão ureia/creatinina <15
• NTA isquémica (50% das NTA)
o Mecanismo: isquemia, lesão por reperfusão
o Maior gravidade se idosos, DM ou DRC (pq têm menor reserva funcional)
o Por choque (ex: após pancreatite aguda), hipotensão intra ou pós-op (esp se cirurgia cardíaca ou
abdominal major), microangiopatia trombótica
o Vasopressores agravam a isquemia
o Em casos severos pode haver necrose cortical (irreversível)
• NTA tóxica (50% das NTA?); são causas evitáveis (iatrogenia)
o Idade, TFG diminuída, hipovolémia aumentam a predisposição para toxicidade
o Tóxicos endógenos: hiperCa, mioglobina, Hb, hiperuricosúria, hiperoxalúria, cadeias leves livres
▪ A reversibilidade é muito variável, dependendo da etiologia que leva ao aumento destas
substâncias. Ex: hiperK ou hiperuricemia secundárias a um urgência oncológica (lise tumoral)
têm um prognóstico renal que depende do próprio tumor; hiperoxalúria costumam ser
secundárias a malabsorção intestinal ou causas genéticas (dieta pobre em oxalato após
cirurgia bariátrica pode prevenir)
▪ Se estas alterações surgirem num contexto mais crónico, costumam ser irreversíveis
▪ Nefropatia pigmentar: tx de suporte. Bom prognóstico. A mioglobina tem toxicidade celular
epitelial direta e causa obstrução dos túbulos por cilindros de mioglobina; a Hb causa lesão
tubular por dano oxidativo
▪ Nefropatia de cadeias leves: reversibilidade depende do tx da dç de base, pq a toxicidade é
dose e duração-dependente
o Tóxicos exógenos (+ freq): agentes de contraste iodados, AINEs, ATB, gadolínio, enemas à base de
fosfato

▪ Todos os ATB podem causar NTA pq têm excreção renal (exceto ceftriaxona), mas os + freq
são aminoglicosídeos e anfotericina B. Vancomicina e anfotericina B têm toxicidade cumulativa.
Ajustar dose dos ATB à fx renal (a 1ª dose deve ser a normal, mas as subsequentes devem ser
reduzidas)
▪ As LRA por contraste iodado têm subida da creatinina 48-72h após administração e resolvem
em 7 dias se hidratação adequada (raro serem irreversíveis). Hidratar bem os doentes em risco
▪ Fibrose nefrogénica sistémica: acontece em doentes com TFG muito baixa (CI absoluta se TFG
<15; usar com cuidado se TFG 16-30). Acumula em vários órgãos (pele, músculos, pulmão,
fígado, coração) levando a fibrose, podendo ser fatal. O Gadolínio não é dialisável
▪ Nefropatia aguda de fosfatos: precipitação de cristais de fosfato nos túbulos ->
nefrotoxicidade. Parcialmente reversível com hidratação, mas depende da rapidez de atuação.
Enemas de fosfato têm CI absoluta em TFG <45
▪ AINEs: alteração da TFG por 2 mecanismos – inibição da síntese de prostaglandinas
(favorecendo a vasoconstrição renal) e bloqueio da síntese de renina com aumento da
angiotensina II (atenção à combinação de AINEs com fármacos que aumentam a renina –
diuréticos, iECA/ARA -> vasoconstrição renal desmedida). A toxicidade é dose, fármaco e
duração-dependente. CI de AINEs na insuf renal, hepática e cardíaca
• Tb associados a nefrite intersticial alérgica, nefropatia de analgésicos,
hipoaldosteronismo hiporreninémico (pq inibem a síntese de renina) com hiperK e
acidose metabólica
• LRA por sépsis: misto de pré-renal e renal intrínseca
o Fisiopatologia: alterações hemodinâmicas que levam a hipoperfusão + inflamação sistémica (interfere
com os mecanismos de autorregulação renal e promove inflamação tubulointersticial) + lesão
endotelial (ROS, tromboses microvasculares, inflamação)
o LRA ocorre em 50% dos doentes com sépsis; é fator de mau prognóstico
LRA pós-renal
• Fisiopatologia: a obstrução ativa mecanismos de hipoperfusão protetora do rim com redução da TFG -> LRA
• Só causa LRA se for uma obstrução total da saída de urina
o Obstrução infravesical
o Obstrução nos 2 ureteres
o Obstrução num ureter em rim único
• Obstrução supravesical: cálculos, coágulos (intraluminais) e abcessos, fibrose retroperitoneal (intraluminais).
Freq haver hx de nefrolitíase, neoplasias. Dor no flanco e Murphy renal+
• Obstrução infravesical (+ freq): HBP, disfunção vesical (bexiga neurogénica), sintomas de prostatismo ou
sinais de retenção urinária
• A recuperação renal é determinada pelo tempo de obstrução

Doença renal crónica (DRC)

Definição, classificação, gestão do doente


• Alteração estrutural e funcional do rim, irreversível e progressiva, por um período >3 meses. Pode definir-se
como:
o Lesão renal (com ou sem diminuição da TFG); ou
▪ Alterações do sedimento urinário, albuminúria >30, alterações séricas relacionadas com
disfunção tubular, na biópsia renal ou nos exames de imagem (hidronefrose, assimetria, DRPQ,
dimensão reduzida, indiferenciação)
• Se nefropatia diabética, amiloidose, nefropatia HIV ou DRPQ, os rins não são pequenos
e indiferenciados
o Diminuição da TFG <60 (com ou sem lesão renal); ou
▪ A inulina é o melhor marcador para medir a TFG. Mas usa-se a creatinina e a ureia para termos
uma aproximação
o Hx de transplante renal
• Classificação em estadios com base na TFG

o G0: >/=90 sem fatores de risco


o G1: >/=90 com fatores de risco (ex: LRA prévia, DM, HTA, baixo peso à nascença, hx familiar de DRC…)
o G5 é considerado falência renal com necessidade de TSFR = DRC terminal
o Na ausência de lesão renal, G0-G2 não é considerado DRC
• Estratificação do risco de progressão da DRC: medir a albuminúria. Só se pode usar num contexto crónico
(estabilização da creatinina)
• Critérios para referenciação
o DRC G4 ou G5
o Presença de macroalbuminúria (albumina urinária >300)
o Presença de hematúria, após exclusão de causas urológicas (ex: HBP)
o Declínio rápido da TFG (>5/ano ou >/=25% do valor base)
o HTA não controlada com tx médico otimizado
o Dç renal hereditária
o Anomalias estruturais (ex: estenose de a. renal)
o Nefrolitíase recorrente ou extensiva
o Anormalidade persistente do K sérico
• Rastreio
o Todos os adultos: medição da PA anual
o Indivíduos com fatores de risco para DRC: avaliação anual da creatinina sérica (para avaliar a TFG) +
avaliação da albuminúria (para estratificação de risco)

Patologia
• Etiologia
o As principais causas são DM (45%) e HTA (27%). Outras: glomerulonefrite, dç renal obstrutiva, DRPQ,
vasculites, neoplasias (ex: MM), indeterminada (19%; valor superior a outros países – EUA tem 5%)
• Fatores de risco: DM, HTA, dç autoimunes (ex: LES), infeções sistémicas ou ITU, litíase renal, neoplasias,
tóxicos, nível socioeconómico baixo, hx familiar, recuperação de LRA, baixo peso à nascença
• Fisiopatologia: perda de >50% de nefrónios -> ativação do SRAA -> hiperfiltração adaptativa (tentativa de
manter a TFG) com hipertrofia -> hipertensão glomerular e proteinúria, com inflamação e fibrose ->
glomeruloesclerose com fibrose tubulointersticial progressiva -> rins pequenos com pouca diferenciação
corticomedular
o A nível sistémico, o SRAA leva a vasoconstrição -> HTA, retenção de Na e água e isquemia renal
o Mecanismo de hiperfiltração (aumento da TFG de cada nefrónio pela ação do feedback
tubuloglomerular): chega pouco Na e um alto fluxo à mácula densa (devido à pouca filtração na DRC)
-> vasodilatação da arteríola aferente (ação das prostaglandinas) e vasoconstrição da arteríola
eferente (ação das angiotensina) -> aumento da TFG

Complicações da DRC
• Manifestações por estadios
o G1/2
▪ Reduzida capacidade de conservação de Na
▪ Sem sintomas atribuídos à etiologia de base
▪ Sem sintomas atribuíveis à diminuição da TFG
o G3/4 (é a partir de G3 que surgem os sintomas diretamente relacionados à perda de fx renal)
▪ Desequilíbrio hidroeletrolítico e ácido-base (ex: acidose e hiperK)
▪ Alterações do metabolismo do Ca e fosfato
▪ Anemia normo/normo
o G5
▪ Acumulação de toxinas urémicas -> síndrome urémico (MIA: malnutrição/caquexia, inflamação,
aterosclerose)
• Um doente com caquexia pode ter fx renal diminuída, mesmo se creatinina <1
▪ Necessidade de terapêutica de substituição da função renal
• Distúrbios hidroeletrolíticos
o Inicialmente (G1/2): perda da capacidade de conservação de Na e água -> hipovolémia
▪ Sintomas: diminuição do turgor cutâneo, hipotensão, diminuição do débito urinário
o A partir de G3: hiperativação do SRAA -> retenção hidrossalina -> sobrecarga hídrica com hipoNa
relativa (dilucional)
▪ Sintomas: cansaço, dispneia, edemas, HTA, diminuição do débito urinário
▪ Tx: restrição hídrica e diuréticos de ansa
• Distúrbios do potássio e ácido-base
o Aparecem a partir de G3, despoletados por algum insulto inicial
▪ Fármacos que diminuem a excreção de K (iECA, ARA, espironolactona)
▪ LRA, por causar uma diminuição abrupta da TFG e diminuir a excreção de H e K
▪ Outras situações sistémicas. Ex: rabdomiólise por queimadura, choque, outras situações que
causem acidose lática
o G3/4: acidose metabólica com hiperK sem anion gap
o G5: acidose metabólica com hiperK com anion gap (pq há diminuição da excreção de ácidos tituláveis
e exaustão dos sistemas tampão)
o A acidose agrava a doença óssea e promove o catabolismo proteico
o Tx crónico (se K >6 ou pH <7,3 -> tx urgente)
▪ Tx da hiperK
• Deita com restrição de K
• Resina permutadora de catiões (dificulta a absorção intestinal de K)
• Revisão de fármacos potenciadores de hiperK
▪ Tx da acidose metabólica
• Bicarbonato de Na oral em todas as DRC >G3, para atrasar a progressão e atenuar o
catabolismo proteico
• Anemia normo/normo
o A partir de G3, sendo que está presente em >75% das G5
o Etiologia: défice de EPO. Mas pode apresentar um componente ferropénico, devido à DRC ser uma
doença pró-inflamatória
o Leva a hipertrofia do VE e agravamento de IC
o Tx: EPO; evitar transfusões (causaria sobrecarga de Fe e hipersensibilização para futuro transplante).
Alvo de Hb: 10-12
• Distúrbios do fosfo-Ca (hiperfosfatemia + hipoCa + hiperPTH secundário)
o A partir de G3
o Fisiopatologia: hiperfosfatemia (evento principal) -> diminuição da vitD e estimulação do FGF23 ->
diminuição da absorção intestinal de Ca e fosfato, aumento da calciúria e fosfatúria, diminuição da
reabsorção óssea de Ca e fosfato -> hipoCa -> hiperPTH secundário
o Consequências: alterações da mineralização óssea com aumento do risco de fratura, calcifilaxia
(deposição de Ca nos tecidos e endotélio(calcificação vascular), hipertrofia do VE (pela ação do FGF23)
▪ Calcifilaxia = arteriolopatia urémica calcificada; risco de vida; exclusivamente em G5; é
promovida pela varfarina (suspender nestes casos)
o HiperPTH terciário: quando as paratiroides se tornam autónomas, mesmo após correção da hipoCa
(ex: após transplante renal)
• Dç óssea metabólica
o Fisiopatologia
▪ Alto turnover: aumento do volume ósseo (por aumento da atividade dos osteoblastos e
osteoclastos) -> síndromes de compressão (ex: síndrome do canal do carpo)
▪ Baixo turnover: maior risco de fratura. Há calcifilaxia e deposição sistémica de fosfato
o 4 tipos de osteodistrofia
▪ Osteíte fibrosa (+ freq): secundária ao hiperPTH secundário
• Alto turnover
• Mineralização normal
▪ Dç óssea adinâmica: nos doentes em hemodiálise, por inibição da PTH
• Baixo turnover
• Mineralização normal
▪ Osteomalácia: por inibição da vitD
• Baixo turnover
• Mineralização anormal
▪ Dç óssea urémica mista: misto entre a osteíte fibrosa e
a osteomalácia
• Alto turnover
• Mineralização anormal
o Tx
▪ Tx agressivo da hiperfosfatemia
• Dieta pobre em fosfato (evitar laticínios)
• Quelantes de fósforo (carbonato de Ca, sevelamero, lantânio)
• Diálise
▪ Tx do hiperPTH secundário
• Análogos da vitD ativa – calcitriol e paricalcitol
• Calcimiméticos: aumentam a sensibilidade dos recetores de cálcio das paratiroides
(CaSR) -> inibição da PTH. EA: hipoCa
• Manter a PTH no valor-alvo 150-600 (controverso, pq pode levar a dç óssea adinâmica
com calcifilaxia e pior prognóstico)
• Complicações CV
o A principal causa de morte nos doentes com DRC é a dç CV (não é a própria DRC). >50% tem doença
CV diagnosticada. A maioria morre antes de chegar a G5
o A mortalidade CV está diretamente relacionada com a diminuição da TFG e com o grau de proteinúria
o Fisiopatologia diferente da população geral
▪ Fatores de risco CV tradicionais
▪ HiperPTH secundário com aumento da FGF23 -> hipertrofia do VE e calcificação vascular
▪ Anemia -> aumento do esforço cardíaco
▪ Sobrecarga de volume extracelular (por diminuição da TFG) com diminuição do volume
circulante efetivo -> aumento do trabalho cardíaco e remodeling
▪ Urémia -> inflamação e catabolismo
o Complicações mais frequentes
▪ HTA: pode ser causa ou consequência da DRC; >80% dos doentes tem HTA
▪ IC com FE preservada (com disfunção diastólica), devido a calcificação difusa das coronárias,
sobrecarga cardíaca, uremia e ação do FGF23
• Diferente da IC na população geral, que é com FE reduzida devido a uma calcificação
das coronárias em placas
• Se anemia severa, pode levar a IC de alto débito
• Se uremia severa, pode levar a IC sem sobrecarga de volume por aumento da
permeabilidade capilar -> edema agudo do pulmão
▪ Hipertrofia do VE: devido a HTA, FGF23, sobrecarga de volume. Associa-se a uma progressão
mais rápida da DRC
▪ DAP: por calcificação vascular
▪ Pericardite urémica: só na uremia avançada
• É critério para diálise urgente
• Não dar heparina (risco de hemopericárdio)
• Pericardiocentese se tamponamento (apresenta taquicardia, hipotensão e dispneia)
▪ Arritmias (FA, morte súbita): alterações microestruturais cardíacas -> distúrbios iónicos
• Alterações da hemostase
o Muito freq em G5
o Aumento do risco hemorrágico devido a: aumento do tempo de hemorragia e TP, diminuição do fator
plaquetar III (fator tecidual?), alteração da agregação e adesão plaquetar
o Aumento do risco trombótico devido a: alteração do consumo de protrombina, estado pró-inflamatório
o Complicações hemorrágicas (discrasia hemorrágica, equimoses, menorragias, hemorragias GI) e
trombóticas (esp se proteinúria nefrótica)
o Tx: desmopressina nasal, plasma fresco congelado, estrogénios, transfusões, EPO, diálise,
anticoagulação (avaliar risco-benefício)
• Complicações GI: muito freq em G5; hálito urémico, anorexia, disgeusia, náuseas e vómitos, obstipação (pode
ser agravada pela medicação – resina, quelas de fósforo, etc.), hemorragias GI
• Complicações neuromusculares
o Estadios precoces de DRC: alterações da memória, insónia, neuropatia periférica sensitiva (em padrão
de meia-luva)
o Estadios avançados: cãibras, soluços, fasciculações, neuropatia periférica motora (síndrome das
pernas inquietas e pés/punhos caídos), asterixis, mioclonias, convulsões (estes 3 últimos indicam
uremia avançada), encefalite urémica e coma
• Complicações endócrinas
o Alteração da tolerância à glicose e do metabolismo da insulina -> reduzir doses de insulina nos
diabéticos
o Diminuição dos estrogénios -> alterações menstruais, infertilidade, risco de aborto; diminuição da
testosterona: disfunção sexual, oligoespermia; atraso do crescimento e maturação sexual
• Complicações dermatológicas: xerostose, prurido urémico
• Complicações imunológicas
o Defeitos na imunidade celular e humoral. Contagem de leucócitos normais, mas com alterações
funcionais
o Os doentes devem ser considerados imunodeprimidos; tb vão ter uma resposta variável à vacinação –
administrar vacina da gripe anualmente e vacina antipneumocócica se TFG <30

Tx
• Fármacos que atrasam a progressão da DRC: iECA/ARA, SGLT-2i, antagonistas de mineralocorticoides
• Tx geral
o Dieta e hábitos: restrição de sal (2-4g/dia), ingestão hídrica, restrição proteica (0,65-0,8g/Kg/dia, dos
quais 50% de alto valor biológico; 0,9g/Kg/dia se G5), exercício físico regular (30min 5x/semana)
o Tx da HTA intraglomerular e proteinúria
▪ 1ª linha: iECA/ARA. Outras opções: diltiazem, verapamil, lercanidipina
▪ Alvo de 130/80mmHg
▪ Mecanismo: diminuição da vasoconstrição da arteríola aferente -> diminuição da pressão
intraglomerular e proteinúria
o Controlo de outros fatores de risco para progressão
▪ Se DM: alvo de glicémia em jejum de 90-130 e HbA1C <7%
▪ Se dislipidemia: alvo de LDL <100mg/dL ou <70 se G4. Tx com estatinas (nunca fibratos se
G>3a)
▪ Se obesidade: alvo IMC <30
▪ Se dç autoimune: controlar a doença
o Ajuste de medicação para evitar insultos agudos
▪ ATB: sem necessidade de ajuste da dose de carga, mas ajustar dose de manutenção, esp se
excreção renal (tabelas definidas)
▪ Evitar iatrogenias e interações medicamentosas
▪ Educação para o doente: evitar contrastes, situações de hipovolémia ou sobrecarga hídrica
o Vacinação
• TSFR
o Modalidades: hemodiálise, diálise peritoneal ou transplante renal (cadáver ou dador vivo)
o Preparação: consulta de esclarecimento, apoio social, dieta, construção atempada de acesso vascular
para diálise, referenciação para consulta de pré-transplante
• Indicações para diálise (em geral: consequências de uremia, exceto a última)
o Pericardite urémica
o Encefalopatia urémica
o Alterações eletrolíticas severas (K, pH, Pi, Ca)
o Anorexia e náuseas sem outra causa
o Desnutrição severa
o Sobrecarga hídrica refratária a diuréticos (por risco de edema agudo do pulmão)

Técnicas substitutivas da função renal (TSFR)

Hemodiálise
• É a TSFR mais usada em situações agudas
• Objetivos: recuperar o equilíbrio intra e extracelular, manter o equilíbrio ácido-base, remover toxinas
urémicas, manter a homeostasia
• Não aumenta a probabilidade de recuperação renal, mas aumentam a sobrevida nos doentes com LRA e a
qualidade de vida
• É sempre preciso um acesso vascular de grande calibre: fístula AV ou veia central (jugular, femoral; diálise
veno-venosa)
o S. cardiorrenal não pode fazer fístula para a hemodiálise, pq ia aumentar a pré-carga e o coração não
ia conseguir bombear. Usar veia jugular ou cateter cardíaco
• Circuito extracorporal (fios onde passa o sangue) separado de uma solução dialisante por um filtro. Tudo pode
ser ajustado às necessidades do doente
• Durante 4h o sangue do doente (5L) entra em contacto com >120L de solução de diálise
o 400 ml/min (fluxo do sangue no circuito de diálise) x 60min x 4h = 96L / 5L (sangue da pessoa) = 6
(o sangue passa 6x)
• A membrana de diálise é permeável ao K, então a solução de diálise tem 2mEq de K, para que a pessoa não
fique com hipoK
• Técnicas
o Contínua (24h/dia): mais usada na LRA, sobretudo em doentes instáveis (UCI). Fluxo de sangue lento
(100mL/min), sendo necessário anticoagulação (heparina)
▪ Pode ser usada em doentes instáveis devido ao seu fluxo mais lenta
o Intermitente (2-4h/dia): mais usada em doentes estáveis. Maior fluxo sanguíneo (500mL/min), não
sendo necessária anticoagulação
▪ Como o fluxo é mais elevado, não pode ser usada em doentes instáveis, pq ia criar/agravar uma
hipotensão
o Híbrida (6-12h/dia)
• Mecanismos
o Hemodiálise (por difusão): é o + comum
▪ Cria-se um gradiente de concentração/osmótica entre o sangue e a solução dialisante -> os
solutos difundem para a solução de menor concentração até ao equilíbrio
▪ Usada para remover partículas pequenas (iões, creatinina, ureia) -> corrigir distúrbios iónicos
▪ Monitorizar com gasometrias seriadas
o Hemofiltração (por convecção/osmose inversa)
▪ Cria-se um gradiente de concentração/osmótica e um gradiente de pressão/hidrostática entre
o sangue e a solução dialisante (cria-se pressão no sangue para aumentar a pressão
hidrostática -> passagem de solutos e a água passem contra-gradiente)
▪ Usada para retirar substâncias grandes do sangue (ex: fármaco, tóxicos) ou para resolver
sobrecarga hídrica (pq há uma maior remoção de água)
o Hemodiafiltração = hemodiálise + hemofiltração
▪ Normalmente usa-se esta em vez da hemofiltração simples

Diálise peritoneal
• A membrana de filtração é o peritoneu do próprio doente
• Cabem cerca de 2L na cavidade peritoneal e a membrana tem a mesma área de superfície do corpo inteiro

Transplante renal
• Avaliação virologia (CMV, VHB, VHC, VEB, varicela-zoster, BK) DCV, neoplasias
• Transplante de cadáver, dador vivo (familiar ou não), ou antecipado/preemptive (de preferência)
• Tipagem HLA (Rh e AB0 não são muito importantes em transplante de órgão sólido)
o Imunossupressão se mismatch HLA: Ac antagonistas de IL-2, basilximab, ciclosporina e tacrolimus (se
vasoconstrição da arteríola aferente e atrofia tubular), azatioprina, micofenolato de mofetil,
prednisolona
• Procedimento: o rim não funcional não é retirado; o novo rim fica fora da cavidade peritoneal, na fossa ilíaca,
conectados aos vasos ilíacos externos
• Complicações
o Pós-op: hemorragia, trombose, extravasamento urinário
o Rejeição aguda (<6 meses): fibrose intersticial e atrofia tubular, aumento da creatinina, febre e dor no
enxerto. Tx: metilprednisolona e globulina antimitócito
o Rejeição crónica (>6 meses): atrofia e fibrose que não melhoram com imunossupressão
o Toxicidade: ciclosporina/tacrolimus
o Infeções: fúngicas, oportunísticas (PC, BK, CMV, HZ)
o Neoplasias: risco 5x superior de cancro da pele, linfoma, cancro anorretal
o Aterosclerose, HTA
• Prognóstico
o Sobrevivência ao 1 ano: 95% se HLA idêntico; 90-95% se 1 mismatch; 75-80% se mismatch completo
o Prognóstico melhor de transplante de dador vivo (20 anos) do que de cadáver (10 anos)

Doenças glomerulares

• Podem ser primárias (processo patológico limitado ao rim) ou secundárias (associadas a dç sistémica)

Fisiopatologia
• Camadas da membrana glomerular: endotélio fenestrado, membrana basal, podócitos. Esta membrana
separa o espaço endocapilar do espaço extracapilar
• Tipos de lesões
o Rotura da membrana capilar glomerular-> hematúria
o Lesão dos podócitos, perda da polaridade ou da integridade da membrana basal glomerular ->
proteinúria
• 4 tipos de insulto inicial
o Formação de imunocomplexos in situ (ex: nefropatia membranosa)
▪ Implica a passagem de um Ac ou antigénio através da membrana glomerular, sendo que os
imunocomplexos se formam no espaço extracapilar (in situ) -> deposição subepitelial ->
inflamação e proliferação extracapilar
▪ Envolve mais proteinúria (por lesão dos podócitos e da integridade da membrana glomerular)
▪ Envolve menos inflamação glomerular (por não haver tanta inflamação endotelial)
o Deposição de imunocomplexos circulantes (ex: LES, vasculites mediadas por imunocomplexos)
▪ Os imunocomplexos formam-se na circulação, sendo demasiado grandes para passarem a
membrana glomerular -> deposição subendotelial -> inflamação e proliferação intracapilar
o Atividade anómala do complemento
o Alterações bioquímicas ou estruturais da membrana glomerular (dç sistémica – ex: DM, amiloidose). É
o único destes 4 que é um insulto não imunológico

Síndromes clínicos, de acordo com as manifestações (hematúria, proteinúria, HTA, retenção de fluidos, redução de
TFG), não sendo diagnósticos histológicos
• Anomalia urinária assintomática: proteinuria ou hematúria com eritrócitos dismórficos
• S. nefrítico: oligúria, hematúria, proteinúria, edema, HTA, início súbito e autolimitada
• S. nefrótico: proteinúria nefrótica (>3,5g/dia), hipoalbuminémia, edema, hipercolesterolemia, lipidúria
• Glomerulonefrite rapidamente progressiva (GNRP) (= subaguda?): leva a IRA em dias/semanas, proteinúria,
hematúria, PA normal, +/- manifestações de vasculites
• Glomerulonefrite crónica: HTA, diminuição da fx renal, proteinúria, rins atróficos

DD s. nefrítico vs. s. nefrótico


• S. nefrótico tem início mais insidioso; s. nefrítico é mais abrupto
• S. nefrótico tem mais edema devido à proteinúria severa que
leva a hipoalbuminémia – edema generalizado; o edema do s.
nefrítico é afetado pela gravidade
• No s. nefrítico é que há hematúria (com eritrócitos dismórficos),
pela inflamação glomerular (sedimento urinário ativo). No s.
nefrótico há mais proteinúria devido à lesão dos podócitos (sedimento urinário benigno com proteinúria)
• Diminuição da TFG só no s. nefrítico
Causas de glomerulopatias primárias

• Cada uma destas causas pode levar tanto a s. nefrótico, como a s. nefrítico. Mas há causas mais frequentes
de um e de outo (faladas abaixo)

S. nefrótico

Manifestações
• Definição: proteinúria nefrótica (>/= 3,5g/dia), hipoalbuminémia (albumina <3,5), edema, hiperlipidemia
o Proteinúria nefrótica não é patognomónico de s. nefrótico (ex: nefropatia diabética)
• Outras complicações
o Hipogamaglobulinemia (por perda de Ac no filtrado glomerular) -> imunossupressão adquirida e
menor resposta à vacinação, mas é importante vacinar (ex: s. pyogenes, VHB)
o Défice de vitD (por perda da proteína de ligação) -> suplementação de vitD
o Anemia ferropénica (por perda de transferrina)
o LRA (embora não faça parte da definição de s. nefrótico) por vários mecanismos

o Tromboses (por perda de fatores antitrombóticos (ATIII, proteínas C e S) no filtrado e aumento de


protrombóticos (fibrinogénio, por síntese hepática). Ex: trombose da veia renal
▪ Esp se proteinúria >10g/24h e albumina <2,5g/dL)
o Distúrbios endócrinos (por perda de proteínas de ligação) - infertilidade, défice de crescimento, hipoT
subclínico

Tx
• Controlo da proteinúria
o PA alvo 130/80mmHg
o iECA/ARA
o Restrição proteína 0,8-1g/Kg/dia
• Controlo da hiperlipidémia
o Estatinas
o Dieta hipolipídica
• Controlo do edema
o Diuréticos
o Restrição salina <4g/dia
• Anticoagulação
o HBPM
o Varfarina
• Tx da causa subjacente: corticoides
Glomerulopatias primárias mais frequentemente associadas ao s. nefrótico

Dç de lesões mínimas (DLM)


• Definição: apagamento difuso dos pedicelos visível apenas na ME; ausência de alterações na MO ou
imunofluorescência
• É a causa de s. nefrótico + freq em crianças (70-90%), sendo menos freq em adultos (5-10%)
• Fisiopatologia: mecanismo mediado por células T, sem marcador imunológico identificado; associação com
reações de hipersensibilidade (atopias), infeções víricas ou vacinas
• Em crianças costuma ser idiopático; em adultos costuma ser secundária a fármacos (AINEs, IFN-alfa, Li, ouro),
alergias (pólen, pó, imunizações…), neoplasias (Hodgkin, micose fungóide, LLC)
• Características
o Proteinúria grave com sedimento urinário benigno
o Proteinúria seletiva para albumina (pq destrói-se a carga negativa do diafragma dos podócitos)
o Início agudo (ao contrário das outras causas de s. nefrótico)
o Resposta à corticoterapia
• Dx: a biópsia renal está contraindicada em crianças com apresentação típica de DLM (faz-se dx presuntivo),
sendo reservada apenas para apresentações atípicas ou ausência de resposta ao tx
• Tx: corticoterapia (prednisolona oral); outros imunossupressores em 2ª linha
o Crianças: resposta rápida ao tx (ciclo curto de 8 semanas = metade dos adultos), mas com maior risco
de recidivas; vigiar complicações de corticoterapia
o Adultos: resposta lenta ao tx (ciclo mais prolongado de 16-24 semanas), mas menor risco de recidivas
e maior resistência a tx subsequente
• Prognóstico: excelente, mas com risco de recidiva (esp crianças)
o 30% remissão espontânea ou remissão completa com 1 ciclo de corticoterapia
o 30% com recidivas frequentes, mas respondem bem ao tx
o 20% corticodependentes (recidivam quando a dose de corticoide é diminuída – desmame)
o 20% corticorresistentes - casos de podocitopatias hereditárias ou GESF em fase inicial

Glomeruloesclerose focal e segmentar (GEFS)


• Definição: esclerose e fibrose de forma segmentar (<50% do novelo capilar de cada glomérulo) e focal (<50%
de todos os glomérulos) – dx histológico
• É a glomerulopatia + freq na raça negra, devido a polimorfismos na APOL1 (apolipoproteína L1)
• Apresentação (não é um s. nefrótico puro – tem características de s. nefrítico - HTA e TFG diminuída)
o HTA
o Declínio da TFG
o Proteinúria variável e não seletiva
• Etiologia
o GEFS primária/idiopática
▪ Início súbito; pode atingir remissão completa (mas não espontânea)
▪ Apresentação aguda de s. nefrótico, mas não puro
▪ Histologia: variante tip lesion ou variante celular
o GEFS secundária: é muito freq (ex: em DM ou HTA); por vírus (HIV, parvovírus B19, CMV), drogas (IFN-
alfa, heroína), genética (mutações nos podócitos), por má adaptação do rim a uma lesão (situações
que levem a hiperfiltração glomerular crónica -> hipertensão intraglomerular; diminuição da massa
de nefrónios, agenesia renal unilateral, glomerulopatia relacionada com a obesidade, defeitos na
membrana basal, obesidade, anemia falciforme, nefrosclerose hipertensiva, microangiopatia
trombótica)
▪ Insidiosa
▪ Com proteinúria nefrótica, mas sem os restantes critérios de s. nefrótico
▪ Histologia: nem tip lesion, nem celular
• Classificação de Columbia: classificação histológica; tem valor prognóstico
o Clássica ou NOS (não especificada): + freq
o Perihilar: habitualmente por causas adaptativas
o Celular: habitualmente primária
o Tip: habitualmente primária; melhor prognóstico
o Colapsante: pior prognóstico (insuf renal rapidamente progressiva)
▪ Está especialmente associada à raça negra e a alguns fármacos (interferão, pamidronato)
• Tx e prognóstico (GEFS pode recorrer após transplante)
o iECA/ARA – tx de suporte em todos os s. nefróticos
o GESF primária
▪ Corticoterapia (1ª linha)
▪ Imunossupressores se corticorresistente
▪ Pode atingir remissão, mas não é espontânea como na DLM ou GN membranosa
▪ Recidiva imediata pós-transplante em 30%
o GEFS secundária
▪ Tx da causa subjacente
▪ Recidiva tardia pós-transplante se a causa subjacente permanecer
o Evolução para DRC terminal a 10 anos em 50% dos doentes

Glomerulopatia membranosa
• Definição: espessamento da membrana basal glomerular sem hipercelularidade (infiltrado celular)
o Normalmente são depósitos granulares de IgG e C3
• É a causa de s. nefrótico + freq me homens caucasianos >40 anos
• Apresentação
o S. nefrótico puro (70% dos casos) - sem hematúria, HTA, nem diminuição da fx renal (TFG)
o Proteinúria não seletiva (ao contrário da DLM)
o É a glomerulopatia mais associada a eventos trombóticos (trombose da v. renal, TEP, TVP)
• Causa primária (70%): Ac contra o recetor da fosfolipase A2 dos podócitos ou (raramente) Ac contra THSD7A
• Causa secundária (30%): infeções (VHB, VHC, sífilis…), dç autoimunes (LES, AR, Hashimoto, MG, Sjogren…),
fármacos (AINEs, ouro…), neoplasias sólidas (mama, cólon, pulmão, estômago, rim, esófago, neuroblastoma),
outras (Fanconi, drepanocitose, DM, Crohn, sarcoidose, Guillan-Barré…)
• Fisiopatologia
o Por formação de imunocomplexos in situ (pela presença de Ac circulantes) ou por depósitos
subepiteliais de imunocomplexos circulantes
o Depósitos entre a membrana basal e os podócitos -> espessamento da membrana basal -> formação
de spikes -> endocitose dos imunocomplexos pela membrana basal (imagens de subtração) ->
espessamento crónico
• Estadios (não tem valor prognóstico muito elevado; o gau de atrofia tubular ou de fibrose intersticial têm
melhor valor preditivo de progressão)
o I: formação/deposição de imunocomplexos
o II: formação de espículas/spikes
o III: envolvimento dos imunocomplexos pele membrana basal
o IV: reabsorção dos imunocomplexos pela membrana basal (imagens de subtração)
o V: desaparecimento dos imunocomplexos
• Tx
o Tx conservador para todos nos primeiros 6 meses – tx normal de s. nefrótico + anticoagulação
profilática
o Ao fim dos 6 meses -> avaliar quem beneficia de tx agressivo -> corticoides + ciclofosfamida
▪ Clearance de creatinina normal ou subnormal, com proteinúria persistente 4-8g/dia
o Exceção: começar logo com tx agressivo se agravamento da fx renal ou s. nefrótico com complicações
• Prognóstico (doença do 1/3)
o 1/3 entra em remissão espontânea em 12-24 meses
o 1/3 entra em remissão parcial com tx para s. nefrótico (proteinúria <3,5g/dia)
o 1/3 desenvolve insuf renal ou morre das complicações do s. nefrótico

Outras causas de proteinúria nefrótica (>3,5/dia)


• Podem, ou não, evoluir para s. nefrótico (podem ser causas secundárias)
• Nefropatia diabética
o 40% dos doentes com DM, esp DM2 (90%)
o Fatores de risco: hx familiar de nefropatia diabética, mau controlo glicémico, HTA, afro-americanos e
índios Pima
o É a causa + freq de necessidade de TSFR
o Rastreio anual: todos os DM2 após o dx e todos os DM1 5 anos após o dx
o Fisiopatologia
▪ Hiperglicémia -> glicosilação das proteínas e acumulação de produtos finais de glicosilação
avançada -> ligam-se ao endotélio e mesângio -> alterações da membrana basal glomerular
-> alteração da barreia de filtração -> proteinúria de proteínas de baixo peso molecular (ex:
albumina) e que têm carga negativa
▪ Alteração da fx renal -> hiperfiltração -> hipertensão glomerular -> espessamento da
membrana basal glomerular, expansão da matriz e glomeruloesclerose
▪ Nódulos de Kimmelstiel-Wilson (glomeruloesclerose intercapilar nodular): nódulos
esclerosantes que levam à expansão da matriz em 40-50% dos casos. São eosinofílicos e
PAS+. É um achado precoce. Se houver esclerose global (>50% dos glomérulos), evoluem para
esclerose diabética avançada
▪ Hialinose arteriolar: substituição do músculo liso das arteríolas aferentes e eferentes por
material hialino PAS+. Tb é um achado precoce. Maior gravidade se glomeruloesclerose global
(>50% glomérulos)
▪ Atrofia tubular e fibrose intersticial: associadas a progressão para alterações irreversíveis
o Classificação histológica/patológica/estrutural
▪ I: espessamento isolado da membrana basal
▪ II: expansão mesangial (IIa – ligeira; IIb – severa)
▪ III: esclerose nodular (lesões de Kimmelstiel-Wilson)
▪ IV: glomeruloesclerose diabética avançada (>50% dos glomérulos)
o Estadiamento clínico/funcional
▪ I: hiperfiltração
• Hipertrofia renal com hiperfunção (aumento da TFG) – são fatores de risco para
nefropatia diabética
• Excreção urinária de albumina (EUA) normal
▪ II: Nefropatia diabética silenciosa
• Lesões glomerulares estruturais – são fatores de risco para progressão
• EUA e PA normais
▪ III: nefropatia diabética incipiente
• Início da microalbuminúria (5 anos ou mais após início da DM (mais cedo, se mau
controlo da DM)). É a manifestações mais precoce da nefropatia diabética
▪ IV: nefropatia diabética evidente
• 10-20 anos após início da DM
• 1/3 evolui para proteinúria positiva na tira-teste (macroalbuminúria?) e 1/3 para EUA
normal
• HTA, redução da TFG, retinopatia e neuropatia, elevado risco CV
▪ V: DRC terminal
• 5-15 anos após o desenvolvimento da proteinúria
o Dx
▪ É clínico (microalbuminúria)
▪ Biópsia apenas se evolução atípica
▪ Pode ser usada fundoscopia, pq o envolvimento renal correlaciona-se bem com o ocular, esp
se DM2
o Tx: iECA/ARA na dose máxima, HbA1C <7%, LDL <100, sal <6g/dia, PA <130/80, IMC <30
o Prognóstico renal e CV é pior quanto maior for o grau de proteinúria e HTA. Mortalidade para todas
as causas aumentada, mesmo após início de TSFR
• Amiloidose renal
o Proteinúria maciça ou s. nefrótico completo (raramente)
o Amiloidoses
▪ Al (primária): cadeias leves de Ig (discrasia de plasmócitos)
▪ AA (secundária): reagentes de fase aguda (inflamação crónica)
o Morfologia/histologia semelhante entre os dois tipos: depósito de amiloide no mesângio (vê-se na ME)
-> diminuição da superfície de filtração. Cora com vermelho do Congo
o Prognóstico renal
▪ AL: depende da remissão da discrasia de plasmócitos
▪ AA: quando surgem manifestações renal (ao dx), o dano já é irreversível. Controlar a dç
primária para atrasar a evolução

S. nefrítico

Definição e manifestações
• Dç glomerular por inflamação do glomérulo
o Oligúria ou LRA
o HYA
o Sedimento urinário ativo
o Edema
• Hipercelularidade glomerular (células inflamatórias)
• 2 entidades causadoras
o Glomerulonefrite (GN) aguda: dias-semanas de evolução. Inclui GN pós-infeciosa, nefropatia IgA, GN
membranoproliferativa, nefrite lúpica e dç de Alport
o GN rapidamente progressiva (GNRP): perda de >50% da fx renal em 3 semanas a 3 meses

Causas mais frequentemente associadas a s. nefrítico

GN pós-infeciosa
Nefrite lúpica
Doença de Alport

GN pós-infeciosa
• S. nefrítico com início agudo
• GN proliferativa endocapilar (hipercelularidade glomerular com depósitos de imunocomplexos
subendoteliais)
• Fisiopatologia: deposição de imunocomplexos circulantes no subendotélio (com uma formação de
imunocomplexos in situ (subepiteliais) pouco dominante) -> ativação da via alternativa do complemento ->
hipocomplementemia sobretudo de C3, mas ocasionalmente tb de C4
• 3 etiologias
o GN pós-estreptocócica (forma clássica): início muito abrupto, + freq em crianças após infeção por step
beta-hemolítico grupo A
o GN associada a estafilococos: clínica menos aguda; em doentes com materiais externos infetados por
estafilococos
o GN associada a outras infeções

o DD através da hx clínica
• Tx
o ATB para tratar a infeção e tx sintomático/de suporta para a LRA
o Não está indicada imunossupressão
• Prognóstico
o Crianças: resolução da hematoproteinúria 3-6 semanas após tx. Evolução para DRC <5%
o Adultos: pior em idosos, se hipocomplementemia persistente ou se creatinina >2,7 à apresentação

Nefropatia IgA
• Definição: glomerulopatia com deposição dominante de IgA na imunofluorescência
o Diferente da púrpura de Henoch-Schonlein (vasculite com IgA)
• É a glomerulopatia + freq a nível mundial. + freq em homens, com pico de incidência aos 20-30 anos
• Apresentação clínica: grande variabilidade interindividual
o <30 anos: 75% hematúria macroscópica associada a infeção respiratória, GI ou exercício físico
o >30 anos: hematoproteinúria microscópica, HTA ou DRC G3-5 (50%)
o Apresentações raras: s. nefrótico, LRA ou rapidamente progressiva, HTA maligna
• Etiologia
o Primária (idiopática/autoimune): aparecem IgA1 deficientes em galactose (GD-IgA1) -> formação de
Ac anti-GD-IgA1 -> formação de imunocomplexos e deposição no mesângio -> inflamação com
ativação do complemento
o Secundária: doenças reumáticas e autoimunes (EA, AR, s. de Reiter, uveíte), GI (celíaca), hepáticas
(ASH, NASH, esquistossomíase), pulmonares (sarcoidose), dermatológicas (dermatite herpetiforme),
neoplásicas (gamapatia monoclonal IgA), infeciosas (HIV, VHB)
• Histologia: grande variabilidade interindividual
o Dx definitivo: dominância de IgA na imunofluorescência
o Tb tem hipercelularidade e expansão mesangial
o Classificação de Oxford (tem valor prognóstico renal)
▪ Hipercelularidade mesangial: M0 (se ausente) ou M1 (se presente)
▪ Hipercelularidade endocapilar: E0 (se ausente) ou E1 (se presente)
▪ Glomeruloesclerose segmentar: S0 (se ausente) ou S1 (se presente)
▪ Atrofia tubular/fibrose intersticial: T0 (se 0-25%), T1 (se 26-50%) ou T2 (se >50%)
• Tx
o iECA/ARA + medidas de atraso de DRC
o Corticoides + ciclofosfamida se GNRP ou GN crescêntica
• Prognóstico
o Depende do grau de proteinúria. Se >1g/dia -> risco de progressão para DRC terminal
o Remissão espontânea em 2-25% dos casos
o Recorrências frequentes após transplante renal, mas não costuma causar falência do enxerto
GN membranoproliferativa (GNMP)
• Definição: padrão histológico de lesão glomerular por deposição subendotelial e mesangial de
imunocomplexos ou complemento
o Por ser um padrão, engloba muitas patologias e tem apresentações clínicas variadas (a apresentação
+ freq é s. nefrítico)
• Dx histológico: identificação do padrão GNMP – duplicação da membrana basal com depósitos no meio
(aspeto de linha de comboio) + proliferação e interposição mesangiais
• 3 tipos de GNMP - muito semelhantes na MO; DD por imunofluorescência e ME
o Tipo 1 (clássica)
▪ MO: padrão GNMP
▪ ME: depósitos mesangiais e subendoteliais
▪ Imunofluorescência: imunocomplexos com C3 + IgG/IgM/C1
▪ Causas: infeção crónica (VHC), dç autoimunes (LES, crioglobulinas), neoplasia (gamapatias
monoclonais)
o Tipo glomerulopatia C3
▪ MO: padrão GNMP ou não
▪ ME: repósitos mesangiais e intramembranosos
▪ Imunofluorescência: depósitos de C3 apenas
▪ Causas: dç da via alternativa do complemento (autoimune ou hereditária)
o Tipo 3
▪ MO: padrão GNMP
▪ ME: depósitos mesangiais, subendoteliais e intramembranosos (todas as camadas)
▪ Imunofluorescência: C3 +IgG/IgM/C1
▪ Mais rara e de causa desconhecida (possivelmente autoAc-anti IgG, microangiopatias
trombóticas)
• Tx e prognóstico
o GNMP primária
▪ Imunossupressão + tx para atrasar a progressão de qlq dç renal
▪ Prognóstico depende da resposta ao tx
▪ Evolução para DRC terminal em >50% dos adultos
▪ Pode recidivar após transplante
o GNMP secundária
▪ Tx a causa subjacente + tx para atrasar a progressão de qlq dç renal
▪ Bom prognóstico

Nefrite lúpica
• Complicações renais em 60-75% dos doentes com LES. 30% têm envolvimento renal na apresentação inicial;
o resto desenvolvem dç renal nos primeiros 3 anos após o dx
• Fisiopatologia: 3 mecanismos possíveis; biópsia renal para identificar o predominante
o Deposição de imunocomplexos circulantes -> ativação do complemento -> GN proliferativa
o Formação de imunocomplexos in situ por ligação glomerular dos antigénios nucleares (++
nucleossomas necróticos) -> deposição subepitelial -> padrão membranoso
o Anticorpos antifosfolipídicos (- freq) -> padrões de microangiopatia trombótica sem inflamação
associada
• Manifestações clínicas: baixa especificidade para fazer o dx da classe renal (é preciso biópsia)
o Grande variabilidade: proteinúria (+ freq), anomalia urinária assintomática, s. nefrótico, s. nefrítico,
GNRP, disfunção tubular (por Ac anti-membrana basal tubular), DRC
o Não refletem a gravidade histológica
• Padrão full-house: imunofluorescência positiva para IgG, IgM, IgA, C3 e C1
o Comum a todas as nefrites lúpicas
o É diagnóstico de nefrite lúpica
• Classes histológicas (6): têm significado histológico; não são evolutivas nem estáticas (pode haver mudança
de classe espontânea ou após tx) -> pode ser preciso repetir biópsia várias vezes na vida
• Tx (informação extra à tabela)
o iECA/ARA em todos, hidroxicloroquina (manifestações extrarrenais de LES), vacinação e profilaxia de
infeções oportunistas (devido à imunossupressão)
o Imunossupressão nas classes 3 e 4
▪ Indução: dose alta de corticoide + ciclofosfamida/MMF/rituximab
▪ Manutenção: dose baixa de corticoide + MMF (mofetil micofenolato)
o Considerar imunossupressão nas classes 2 e 5
▪ Inibidor de calcineurina -> se proteinúria nefrótica
o Sem imunossupressão nas classes 1 e 6
• Prognóstico: depende da remissão da dç – determinado com base em critérios clínicos
o 20% evolui para DRC terminal
o Se DRC terminal -> transplante renal após 6 meses de dç inativa; baixo risco de recorrência

Doença de Alport
• Tem causa genética: mutação do colagénio tipo 4 (COL4) -> predispõe à glomeruloesclerose
• Apresentação clínica - depende da hereditariedade, mas pobre correlação genótipo-fenótipo nas mulheres.
A 1ª manifestação costuma ser um episódio de hematúria
o Ligada ao X (COL4A5): é a que está + associada a manifestações extrarrenais
▪ H: s. de Alport - DRC terminal <40 anos (em média dos 25 aos 30 anos), surdez
neurossensorial (órgão de Corti), anomalias oculares (córnea e mácula)
▪ M: clínica variável, desde hematúria microscópica até DRC terminal
o Autossómica dominante (COL4A3 ou COL4A4)
▪ H: s. de Alport
▪ M: clínica variável, desde hematúria microscópica até DRC terminal
o Autossómica recessiva (COL4A3 ou COL4A4)
▪ Ambos: s. de Alport
• Dx por ME – membrana basal glomerular fina que evolui para multilaminada -> aspeto final entrelaçado
• Tx:
o iECA/ARA é a única coisa que atrasa progressão
o Se DRC terminal -> transplante. Risco de desenvolver dç anti-membrana basal glomerular no 1º ano
pós-transplante
GNRP ou GN crescêntica
• Definição: síndrome clínico com rápida e progressiva perda da fx renal (diminuição da TFG em >50% em 3
semanas a 3 meses)
• Etiologia
o Primária (em geral vasculites): dç de Ac anti-membrana basal glomerular, s. de Goodpasture, mediada
por complexos imunes, Pauci-imune (normalmente ANCA+)
o Secundária (em geral GN agudas): GNMP, nefropatia IgA, púrpura de Henoch-Schonlein, GN pós-
estreptocócica, LES
• Padrão histológico comum – formação de crescentes
o 3 tipos de crescentes
▪ Celulares/agudos
▪ Fibrocelulares
▪ Fibrosos/crónicos – são irreversíveis
o Fisiopatologia: lesão grave da parede capilar glomerular -> resposta inflamatória -> proliferação
extracapilar de células parietais epiteliais da cápsula de Bowman, que migram para o espaço de
Bowman -> preenchimento do espaço de Bowman por células -> compressão do tufo capilar
glomerular -> rotura da cápsula de Bowman
o Biópsia renal obrigatória para o dx e decisão terapêutica (com base no grau de destruição)
• Prognóstico
o GNRP pós-infeciosa é a que tem melhor prognóstico, esp se criança. Pode ter resolução completa
o Prognóstico renal muito reservado, se não tratada
o Mortalidade muito elevada se associada a vasculite sistémica

Doenças vasculares renais

Aspetos gerais
• Macrovasculatura: Aa. renais, aa. segmentares e vv. renais principais
• Microvasculatura: o resto das artérias (interlobares, arqueadas, interlobulares, arteríolas), capilares
glomerulares e o resto das veias (vénulas, interlobulares, arqueadas, interlobares)
• Manifestações das dç dos grandes vasos: HTA renovascular, dç ateroembólica renal
• Manifestações das dç dos médios vasos: hemorragia intrarrenal, enfarte renal
• Manifestações das dç dos pequenos vasos: glomerulonefrites, vasculites

HTA renovascular
• Forma + freq de HTA secundária. Representa 45% das HTA refratárias. Prevalência aumentam com a idade
• Manifesta-se como uma HTA com padrão não dipper (não baixa durante a noite), lesão renal e proteinúria
• Causas
o Dç arteriosclerosa renovascular (+ freq): evidência de dç sistémica e fatores de risco CV
▪ Bilateral
▪ Envolvimento proximal das as. renais
o Displasia fibromuscular = fibrodisplasia vascular unilateral: vasos tortuosos -> estenose das artérias
▪ Pessoas mais jovens (esp mulheres 40-50 anos) sem fatores de risco CV
▪ Unilateral (ou bilateral?)
▪ Envolvimento cerebrovascular - malformações, tinite, cefaleias
▪ Envolvimento distal da renal ou envolvimento das aa. segmentares
o Vasculite de grandes vasos (Takayasu; - freq)
▪ Envolvimento proximal da a. renal
• Fisiopatologia
o Envolvimento renal unilateral
▪ Rim afetado: hipoperfusão renal (pode evoluir para nefrite isquémica) -> ativação do SRAA ->
HTA
▪ Rim contralateral: hiperfiltração (efeito do SRAA) e natriurese de pressão (pq a perfusão renal
aumentou nesse rim) -> nefroangioesclerose (remodeling devido ao SRAA)
▪ Não há hipervolémia nem aumento da creatinina, devido à resposta do rim contralateral
▪ Evolução da DRC terminal
o Envolvimento renal bilateral ou em rim único
▪ Hipoperfusão renal bilateral -> ativação do SRAA -> HTA
▪ Hipervolémia (pq não há possibilidade de hiperfiltração) por retenção de Na e água
▪ Risco de edema agudo do pulmão hipertensivo súbito/recorrente (por sobrecarga de volume)
▪ Risco de LRA por hipovolémia ou hipotensão (ex: tx com iECA/ARA/antagonistas da
aldosterona)
• DD com eco
o Rins pequenos bilateralmente (esp se fatores de risco CV) -> estenose bilateral -> dç aterosclerótica
o Um rim de grades dimensões e um rim atrofiado (esp se mulher 40-50 anos) -> estenose unilateral
-> displasia fibromuscular
• Tx
o Tx médico (todos os doentes): iECA/ARA/antagonistas da aldosterona, diuréticos, BCC dihidropiridina
▪ Monitorizar creatinina e débito urinário nos doentes com estenose bilateral, pq
iECA/ARA/antagonistas da aldosterona podem causar LRA por diminuição da PA e
hipoperfusão renal (com anúria e pode evoluir para edema agudo do pulmão hipertensivo)
o Revascularização (curativo; esp jovens): angioplastia percutânea com ou sem stent, revascularização
cirúrgica

Doença ateroembólica renal


• Por rotura de ateroma -> êmbolos de colesterol -> oclusão das pequenas artérias intrarrenais (aa. arqueadas
e intralobares. Pode haver manifestações sistémicas por migração dos êmbolos (pele, MI, GI, cérebro)
• Raramente é espontânea
• Fatores desencadeantes
o Intervenções com manipulação vascular (ex: angiografia, cirurgia da aorta) ou cardíaca (ex: bypass)
o Anticoagulação ou antiagregação por desestabilização da cápsula fibrosa do ateroma
• Apresentação clínica
o Aguda: embolização massiva
o Subaguda: embolização recorrente, devido a instabilidade de uma placa
o Crónica: embolização lenta e progressiva -> nefrite isquémica insidiosa
• Dx
o EO: manifestações sistémicas de embolização (ex: isquemia no MI)
o Histologia: conteúdo lipídico intravascular, glomérulos isquémicos com fendas de colesterol, sinais de
inflamação
• Tx: sintomático e de suporte com estabilização da dç ateroesclerótica (não se removem os êmbolos)

Vasculites de grandes vasos


• Manifestação comum: HTA renovascular
• Arterite de células gigantes: afeta preferencialmente os ramos das carótidas
o >50 anos, mulheres > homens, Europa do norte
o A. temporal (50%) -> cefaleias
o Relacionada com polimialgia reumática
o Envolvimento renal raro
o Tx: corticosteroides + aspirina
• Arterite de Takayasu: afeta preferencialmente ramos da aorta (risco de coartação da aorta)
o Maioritariamente mulheres asiáticas 20-30 anos
o Envolvimento renal raro (com HTA renovascular)
o Tx: corticosteroides
• Em nenhuma das duas doença se conhece o autoanticorpo responsável, por isso não se faz serologia

Vasculites de médios vasos


• São arterites necrotizantes de artérias viscerais -> manifestam-se como tromboses, aneurismas, estenoses,
rotura de vasos
• Incidência igual nos dois géneros
• Poliarterite nodosa
o 40-60 anos, prevalência não depende do sexo nem da raça
o Etiologia: primária (idiopática; + freq) ou secundária (VHB; + em África)
o Manifestações: mononeurite multiplex, nódulos eritematosos dolorosos, envolvimento GI (50%; colite
hemorrágica), rotura de aneurisma retroperitoneal (+ perigoso)
o Envolvimento renal é freq
▪ Hemorragia ou enfarte cortical renal (dor no flanco e hematúria); aneurismas intrarrenais nos
casos ligeiros, com risco de rotura
▪ HTA secundária à perda de nefrónios (SRAA)
▪ Tx: corticosteroides +/- ciclofosfamida
• Doença de Kawasaki: síndrome nódulo-linfático mucocutâneo
o Crianças <5 anos; predomínio nos asiáticos
o Manifestações: rash cutâneo eritematoso, linfadenopatia generalizadas, língua de morango, febre, dç
coronária por vasculite (+ perigoso)
o Envolvimento renal raro

Vasculites de pequenos vasos (manifestam-se como glomerulonefrites)


• Dç anti-membrana basal glomerular
o Incidência bimodal (20-30 anos e >70); homens > mulheres
o AutoAc IgG contra colagénio tipo IV (membrana basal glomerular e alveolar). Ac anti-MBG (anticorpos
anti-membrana basal glomerular)
▪ 2/3 tem envolvimento renal e pulmonar simultâneo (++ jovens)
▪ 1/3 tem envolvimento renal isolada (++ idosos)
o Fatores desencadeantes: infeção, tabagismo, oxidantes, vacinas (tudo o que fragilize a membrana
basal e exponha as fibras de colagénio)
o Apresentação clínica: s. nefrítico + hemoptise (síndrome pulmão-rim)
o Dx
▪ Biópsia renal: GN focal necrotizante crescêntica com depósitos lineares de IgG na
imunofluorescência
▪ Rx tórax: padrão algonodoso bilateral (por hemorragia alveolar difusa)
o Tx
▪ Plasmaferese + corticoides + ciclofosfamida
▪ Profilaxia para infeções oportunistas
▪ Possibilidade de transplante após negativação dos títulos de anti-MBG (para não recidivar)
o Prognóstico
▪ Fatores de mau prognóstico: creatinina >5mg/dL à apresentação, hemorragia alveolar, biópsia
renal com >50% crescentes
▪ Mortalidade até 90% no 1º ano
• Vasculites Pauci-imunes/pouco-imunes
o Associadas a ANCA (Ac anticitoplasmático de neutrófilos)
o Causam inflamação extracapilar muito exsudativa -> rotura da cápsula de Bowman
o A manifestação renal + freq é GN rapidamente progressiva; constituem 60% das GN crescênticas
o As manifestações pulmonares + freq são hemoptise e hemorragia alveolar (síndrome pulmão-rim)
o Policondrite (nariz em sela), devido ao crescimento de granulomas na cartilagem – na granulomatose
com poliangeíte
Granulomatose
Granulomatose com
Poliangeíte microscópica eosinofílica com
poliangeíte
poliangeíte
Homens = mulheres Homens = mulheres
Epidemiologia >50 anos >40 anos
Europa ocidental Norte da Europa
% ANCA+ 90% 50%
ANCA mais
ANCA MPO
frequentemente ANCA MPO ANCA PR3
50% seronegativo
associado
90% envolvimento renal 85% envolvimento renal 25% envolvimento renal
50% envolvimento pulmonar 90% envolvimento pulmonar
90% envolvimento trato
30% envolvimento trato 100% asma e eosinofilia
respiratório (+ severo)
respiratório superior periférica
40% mononeurite multiplex 50% polineuropatia
Manifestações
>50% linfadenopatia
Não associados a linfadenopatia generalizada
generalizada
30% envolvimento cutâneo (púrpura palpável)
60% osteoarticular (artrite)
50% GI
Arterite necrotizante com
Arterite necrotizante sem Arterite necrotizante com
Histologia granulomas na presença de
granulomas granulomas
asma e eosinofilia periférica

o Dx: biópsia renal - GN focal necrotizante crescêntica com ausência de depósitos na imunofluorescência
(pq os anticorpos são intracitoplasmáticos), rotura da cápsula de Bowman
o Tx
▪ Indução: corticoides + ciclofosfamida +/- rituximab
▪ Manutenção: azatioprina
▪ Indicações para plasmaferese: hemorragia alveolar; insuf renal grave (creatinina >5 ou
necessidade de diálise)
▪ Possibilidade de transplante se títulos de ANCA negativos
o Prognóstico
▪ Sobrevivência de 70% aos 5 anos
▪ A maioria da mortalidade ocorre no 1º ano por complicações infeciosas ou associadas ao tx
▪ Recidivas + freq nos doentes ANCA PR3+
• Púrpura de Henoch-Schonlein
o Crianças e jovens <20 anos
o Depósitos de complexos de IgA
o Geralmente é despoletada por infeção respiratória
o Manifestações
▪ Pode apresentar-se como s. nefrótico ou nefrítico
▪ Tríade clássica: púrpura, dor abdominal e artrite
▪ Pele (100%) - púrpura palpável
• Não relacionada com trombocitopenia
• Localização predominante no MI, atingir a cabeça, MS e tronco (raro)
• Quadro ativo dura 3-12 semanas/1-3 meses, com intervalos de uma semana ou mais
e recidivas
▪ Intestino (freq, mas não obrigatório) - colite microscópica com diarreia com sangue, perfuração
intestinal (raro)
▪ Rim (50%) - GN rapidamente progressiva com hematoproteinúria
▪ Adultos têm mais recidivas, HTA mais severa, maior envolvimento renal e pior prognóstico
renal
o Tx: se GN rapidamente progressiva -> corticoides + ciclofosfamida (é controverso)
o Prognóstico: 20% evolui para DRC; manutenção da proteinúria é fator preditivo para essa evolução
• Vasculite por crioglobulinas
o Por deposição de crioglobulinas na pele, rim, SNP e articulações
▪ GN aguda mediada por imunocomplexos -> padrão histológico de GN membranoproliferativa
tipo 1
▪ Púrpura palpável ulcerante: afeta os MI e sobe até ao tronco; paroxismos 1-2x/mês, duração
ativa de 1 semana
▪ Artrite inflamatória migratória
▪ SNP: alterações sensitivas
o 3 tipos de crioglobulinas

o Dx: a identificação das crioglobulinas é difícil e o seu valor correlaciona-se mal com a atividade da
doença
o Tx da causa
o Bom prognóstico renal

Doenças tubulointersticiais

Aspetos comuns das nefrites intersticiais


• Patofisiologia: evento inicial -> inflamação do interstício (citocinas, ROS, lipoproteínas) -> linfs T e monócitos
-> transformação de células epiteliais tubulares em fibroblastos -> fibrose intersticial e atrofia tubular ->
evolução para DRC -> necessidade eventual de diálise
o Podem ser secundárias a s. nefrítico
o Fase de inflamação (aguda)
▪ É reversível
▪ Há perda do feedback tubuloglomerular, diminuição da capacidade de concentração urinária
(densidade <1010) e poliúria (>3L/dia)
o Fase de fibrose (crónica)
▪ É irreversível
▪ Fibrose -> fecho dos túbulos -> formação de quistos com líquido tubular
▪ Há diminuição da TFG
• Histologia
o Fase aguda: infiltração de células inflamatórias no interstício, edema do interstício, áreas de necrose
tubular (com células espoliadas no seu interior). Não há glomérulos visíveis, devido à inflamação
o Fase crónica: fibrose intersticial, atrofia tubular com dilatação dos lúmens tubulares, espessamento
das membranas basais tubulares. Deixa de haver um epitélio cuboide simples íntegro
• Biópsia renal
o Apenas para prognóstico (ver se há fibrose ou não) e decidir tx (se vale a pena fazer corticosteroides
– só na aguda/ausência de fibrose)
o Não faz dx etiológico, pq a evolução da doença é independente o insulto inicial. A única exceção é a
nefrite intersticial aguda induzida por AINEs

Nefrite intersticial aguda


• Etiologia
o Secundária a fármacos (95% dos casos; >65 anos): reação de hipersensibilidade tipo IV, idiossincrática
▪ Antibióticos beta-lactâmicos +++
• Associados a reações alérgicas generalizadas com exantema e febre -> facilmente
detetada
▪ Sulfonamidas, vancomicina, quinolonas, aciclovir, rifampicina
▪ Diuréticos (esp furosemida) e IBPs
• Associados a reações indolentes e progressivas -> dificilmente detetada -> mais
evolução para nefrite intersticial crónica
▪ AINEs
• Podem induzir nefrite intersticial aguda com LRA e proteinúria severa
o Infeciosa (5% dos casos; mais em países em desenvolvimento)
▪ Bactérias com afinidade pela membrana basal dos túbulos -> pielonefrite com manifestações
tubulointersticiais
o Autoimune: afinidade pela membrana dos túbulos, não dos glomérulos
o Infiltrativa: sarcoidose e linfoma. Evolução indolente, para crónica
• Apresentação clínica
o Mais frequente: LRA com poliúria, urina diluída (<1010) e aumento da creatinina. Surge 7 a 10 dias
após exposição ao fármaco. Sedimento com células inflamatórias e proteinúria tubular subnefrótica
o <33% dos doentes apresentam a tríade: febre + exantema maculopapular + eosinofilia (reação
alérgica ao fármaco)
o Raro: dor no flanco (por inflamação que distende a cápsula), hematúria franca (por hemorragia nos
vasos peritubulares dos túbulos colapsados), oligúria (só em casos graves – pior prognóstico)
• Tx
o Suspensão do fármaco
o Corticoides em alta dose
▪ Apenas na nefrite intersticial aguda (ausência de fibrose). Pq a crónica já é irreversível
▪ CI na nefrite intersticial infeciosa (por serem imunossupressores -> risco de sépsis)

Nefrite intersticial crónica


• Etiologias variadas
• Irreversível. Evolui lentamente para DRC, mas costuma apresentar distúrbios ácido-base mais cedo do que
outras etiologias de DRC
• Apresentação clínica
o Mais frequente: poliúria e hipostenúria, sedimento com algumas células, proteinúria tubular,
hematúria ligeira e cilindros granulosos
o Menos frequente: defeitos tubulares seletivos (ver abaixo)
• Tx conservador, para prevenir a evolução para DRC. Para fármaco. Tx da causa subjacente, nalguns casos
• Nefrite intersticial crónica associada aos analgésicos
o Por uso prolongado de analgésicos em formulações combinadas (cafeína, codeína, aspirina, fenacetina
– paracetamol é um dos seus metabolitos). Hoje é rara, pq a fenacetina foi proibida, mas outras
combinações com os outros fármacos podem causar isto a muito longo prazo
o Lise celular (com saída de Ca) de predomínio distal (túbulo TCD e ducto coletor) -> hipostenúria e
defeitos na acidificação da urina, calcificação e necrose das papilas (sinal do anela na pielografia e
padrão de grinalda na TAC)
o Evolui para DRC terminal; é fator de risco para cancro do urotélio

Defeitos tubulares seletivos


• Túbulo contornado proximal (TCP): única parte do rim que faz reabsorção de glicose e aminoácidos; é onde
ocorre a maior parte da reabsorção de bicarbonato (90%). Causas: fármacos (ciclofosfamida, etc.), MM
(cadeias leves têm tropismo para o TCP)
o Glicosúria
o Aminoacidúria
o Raquitismo hipofosfatémico (hiperfosfatúria)
o Acidose tubular renal (ATR) tipo 2/proximal
▪ Bicarbonatúria
▪ O TCD (células intercalares beta) vai aumentar a sua capacidade de reabsorção de bicarbonato,
por isso a acidémia não vai ser muito grave
▪ Acidemia hiperCl hipoK com anion gap normal
▪ Tx difícil - requer muito bicarbonato (pq a maioria (~90%) do bicarbonato não vai ser
reabsorvido pelo TCP)
o S. de Fanconi: disfunção total do TCP (todas as alterações acima)
• Ducto coletor: tem células principais (reabsorvem K; com ENaC), intercalares alfa (excretam H+) e intercalares
beta (reabsorvem H+)
o ATR tipo 1/distal
▪ Defeito nas células intercaladas alfa (bomba H/K e/ou bomba de H) -> aumento do H+
plasmático -> consumo do tampão de bicarbonato e diminuição da regeneração de bicarbonato
-> diminuição do bicarbonato plasmático
▪ Acidémia grave (ao contrário da ATR proximal), pq o TCP não tem capacidade de adaptação;
não há bicarbonatúria; há incapacidade de acidificação urinária (pq o rim não consegue excretar
H)
▪ Polidipsia, poliúria, acidemia hipoK com anion gap sérico normal e anion gap urinário
aumentado
▪ Defeito na excreção de H e K a longo prazo -> hipercalciúria -> nefrolitíase, nefrocalcinose e
raquitismo
▪ Dx em criança (quando se começa a introdução alimentar), devido à clínica mais grave. Causa
congénitas (drepanocitose, Wilson) + freq do que na ATR proximal
▪ Tx: bicarbonato oral (solúvel) às refeições (menos bicarbonato necessário do que na ATR
proximal)
o ATR tipo 4
▪ Por défice de aldosterona, resistência à sua ação ou fármacos que inibam o SRAA. É frequente
▪ Diminuição da excreção de K e H -> acidemia hiperK com anion gap normal
• A aldosterona reabsorve Na em troca de K (bomba Na/K)
• O K excretado é reabsorvido em troca de H+ que é excretado (bomba H/K)
▪ Poliúria e polidipsia
o Diabetes insípida nefrogénica:
▪ O ENaC não responde à ADH
▪ Poliúria, polidipsia e hipostenúria
▪ Lítio é a causa + freq. Efeito dose-cumulativo (sintomas após 15 anos). Compete pela entrada
de Na pelo ENaC. Monitorizar níveis de Li e tx com amiloride (compete com o Li pelo ENaC) ->
única situação em que um diurético diminui o débito urinário

Doenças quísticas

Aspetos gerais
• Etiologia dos quistos
o Hereditários (especialmente ciliopatias): DRPQ autossómica dominante (++), DRPQ autossómica
recessiva, dç quística medular do rim, Von Hippel-Lindau, esclerose tuberosa
o Adquiridos: DRC terminal, quisto renal simples (aparecem normalmente com a idade)
▪ Na DRC terminal o rim não consegue excretar urina -> formação de quisto? Rastreio anual com
eco
o Associados ao desenvolvimento: dç renal quística localizada, rim multiquístico displásico, rim
esponjoso medular
• Fisiopatologia: degeneração tubular -> obstrução do túbulo -> dilatação tubular -> quisto com líquido tubular
• Classificação de Bosniak (quisto simples vs. complexo): baseia-se no aspeto em TAC trifásica com contraste
Doença renal poliquística (DRPQ) autossómica dominante
• É a dç monogénica + freq; incidência de 1:400-1000 nados vivos; variabilidade inter e intrafamiliar
• Etiologia
o Mutação da PKD1 (policistina 1) (85% dos casos): proteína dos cílios do TCP. Mutação leva à perda
da capacidade de indução de um fluxo unidirecional -> estase do líquido tubular e ectasia -> formação
de quistos
▪ + grave e + freq
▪ Necessidade de diálise aos 40-60 anos
o Mutação da PKD2 (15% dos casos): proteína dos cílios do TCP, mas menos importante do que a
policistina 1
▪ Necessidade de diálise aos 60-80 anos
o Mutação da GANAB: todos os doentes têm dç hepática poliquística, mas a dç renal é menos severa
• Fisiopatologia
o Morte de nefrónios (~5%) -> ativação do SRAA -> hipertrofia dos nefrónios restantes (aumento do
tamanho do rim) -> fase de hiperfiltração/compensação (para tentar manter a creatinina normal)
o Evolução insidiosa: diminuição progressiva da função renal (aumento da creatinina). Maior tamanho
renal está associado a um declínio mais acelerado da fx renal
o A ativação do SRAA tb leva a hipertensão de causa renal
• Complicações diretas dos quistos: suspeitar de quistos nestas situações (esp ITU em homens e litíase em
jovens)
o Dor lombar
o Hematúria por lise dos quistos e erosão de artérias
o Estase urinária -> predisposição para ITU e litíase renal
• Afetações multissistémicas: suspeitar de quistos nestas situações, fazer eco
o Quistos hepáticos: não leva a insuf hepática devido à capacidade de regeneração do fígado
o Insuf mitral
o Malformação AV -> aneurismas cerebrais, risco de rotura
o Diverticulose do cólon: assintomática; não aumenta o risco de diverticulite (cuidados alimentares)
• Dx: é clínico (idade + quistos visíveis na eco); ocorre entre os 15 e 30 anos; existe um teste genético, mas tem
uma taxa de 10% de falsos negativos (não deteta a mutação)
o <30 anos: pelo menos 3 quistos (uni ou bilateral)
o 30-59 anos: pelo menos 3 quistos em cada rim
o >/=60 anos: pelo menos 5 quistos em cada rim
• Tx: focado no atraso da progressão da doença
o iECA atrasa a progressão (impede a hipertrofia/hiperfiltração) – atrasa em 10 anos a necessidade de
diálise
o Beber >3L de água por dia para estimular o fluxo unidirecional, evitando estase -> limita o crescimento
dos quistos
o Transplante renal isolado; transplante duplo rim-fígado (raramente necessário)
• Prognóstico
o Evolução para DRC terminal
o Fatores de mau prognóstico: sexo masculino (estrogénios são fator protetor), proteinúria, rins de
grande volume, mutação da PKD1, presença de complicações
o A principal causa de morte são as complicações CV (os doentes não morrem da dç)

DRPQ autossómica recessiva


• Incidência de 1:20.000 nados vivos
• Etiologia: mutação na PKHD1 (gene da fibrocistina)
o Equivalente à policistina, mas na fase de metanefro (18ª-20ª semana de gestação). Detetável apenas
na eco do 2ºT (pq a 1ª faz-se antes da 18ª semana)
o Expressa no rim e fígado; essencial na diferenciação dos ductos renais e biliares
• Apresentação clínica: insuf renal terminal in utero, quistos hepáticos e s. de Potter
• Dx: eco do 2ºT; teste genético tem baixa sensibilidade
• Tx: parto prematuro com transplante renal

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