Depressão, Coimbra de Matos
Depressão, Coimbra de Matos
Depressão, Coimbra de Matos
De um ponto de vista dinâmico, o estudo geral das depressões mostra que existem:
A culpa tem duas origens que se cruzam entre si: 1) a idealização do objeto, relacionada à
tendência de o desculpabilizar; 2) a indução da culpa por parte do próprio objeto, que se
idealiza a si mesmo e faz-se idealizar.
O sujeito depressivo projeta a bondade e introjeta a maldade do objeto – “eu é que sou mau”
– processo de inversão da experiência vivida, que é influenciado pelo objeto e através do qual
é inflingida a culpa como punição. Existe a ideia de que a pessoa depressiva merece o que de
mau lhe acontece (teoria do mundo justo, Lerner, anos 60). Portanto, estamos perante um erro
cognitivo associado à lógica da apreciação da realidade.
Há depressão porque há objeto depressígeno: que não desculpa, mas culpa o outro. Que não
ama, mas capta o amor do outro. É um objeto culpabilizante e desamante, tornando esta culpa
em algo patológico e ilógico. É este raciocínio patológico que o terapeuta tem que corrigir,
através de recuperar a idealidade do sujeito na idealização do objeto, bem como a sua
inculpação. Inverter os sentidos.
Não há depressão sem culpa e sobretudo sem inferioridade porque a retirada de amor pelo
objeto – a causa principal da depressão – é só por si desnarcisante. O sintoma característico da
depressão é a baixa autoestima. É aí que a depressão se separa do luto, em que não existe
perda de autoestima (a não ser no luto infantil, em que a perda do objeto tende a ser sentida
como desafeto e abandono).
A disposição depressiva
autoestima e autovalorização (mas estes também podem ocorrer em caso de defesa maníaca,
onde entra a autoimagem de grandiosidade).
É um amor por dependência afetiva, e não porque existe realmente a capacidade de amar por
si só.
Culpabilidade inconsciente
O papel do terapeuta: conduta transferencial da culpa que deve ser percebida em conjunto
com a capacidade do sujeito lhe tomar consciência. Ao fazer este processo de interpretação,
emoções atuais podem coincidir com emoções e recordações do passado infantil, de uma
fantasia ou de um sonho. A interpretação eficaz requer um conjunto de dados de vários
contextos, de forma a trazer consistência à evidência. Se os elementos forem escassos são
insuficientes para produzir esse efeito.
A Depressão neurótica
Persiste uma ideia obcecante (medo delirante do abandono com raiva narcísica) e
sobrevalorizada, e contra a qual não se estabelece luta. É baseada na neurose histérica, e na
univalência do objeto: que ou é bom (idealizado), ou mau (tendencialmente abandonante).
Também é conhecida por neurose histérica e pelo seu narcisismo carenciado – necessidade de
estima, Kurt Schneider. Inércia.
Esta ideia obcecante associada ao medo do abandono, pode ser vista à luz da teoria edipiana
através do ciúme: o objeto é facilmente visto como alvo de manobras sedutoras de outra
pessoa. Esta pessoa traduz-se num terceiro elemento relacional e vai figurar uma ameaça
sexual ao sujeito depressivo, pois além de materializar o abandono, representa a sua fraqueza
sexual e o sentimento de castração.
Observamos não só uma regressão oral e narcísica, mas uma regressão fálica com deceção
edipiana. A neurose histérica é caracterizada pela dupla regressão aos objetos edipianos e ao
narcisismo primário.
Existe uma forte ligação a substâncias que alterem a consciência, como forma de se
aproximarem do objeto ideal ainda que temporariamente. Masoquismo e frustração precoces.
A criança foi investida narcísica e negativamente pela mãe, não foi valorizada porque não
correspondeu ao objeto idealizado pela própria mãe e que se projetou no filho – não
simbolizava o pénis invejado. Torna-se numa relação narcísica, pois a mãe é severa e exigente
com este objeto que se materializa no filho. A mãe quer que este filho seja um Eu Ideal e um
Ideal do seu próprio Eu, que acaba por experimentar metas dificilmente atingíveis, sente uma
sensação de insucesso real e falha constante. Partem para as conquistas já com o sentimento
de derrota, geralmente as suas conquistas mais desejadas.
2. A introjeção: período em o Self e o objeto se delimitam, e que remete para a fase anal
em que o bebé aprende a separar-se do mundo através do autocontrolo. É parcial e
dividida em dois: diz respeito ao objeto idealizado que se perde e que é fruto do
narcisismo primário; mas também é sobre um introjeto agressivo, que é origem do
Superego;
Nesse momento da vida, a adolescência, os investimentos objetais tendem a ser mais instáveis
onde pode ocorrer uma inversão narcísica – culpabilização do outro. Demarcação das
fronteiras do Eu.
Inveja do objeto dar e receber mais amor, quando na verdade o sujeito é que não o consegue
aceitar e gerir. É uma agravante ao sentimento de inferioridade e ciúme.
acontece à sua volta, relembra constante e persistentemente das perdas passadas, o que é um
fator de acréscimo à depressividade. A negação das partes más do objeto é um mecanismo de
não concretizar totalmente a sua perda e a das relações primárias. É uma forma de suportar a
depressão.
As relações passadas não tiveram lutos, e sim depressões. Não tem recordações agradáveis,
apenas insucessos geradores de raiva e desalento que alimentam a vontade de um dia as vir a
refazer com sucesso. A inibição fóbica ou comportamento introvertido, facilitam a fuga para o
diálogo com os objetos internos que são mortos-vivos, mortos a quem dá vida. Usa-se o termo
catexia para falar da energia psíquica concentrada numa representação mental.
O papel do terapeuta: não só desbloquear a agressividade das pulsões libidinais, mas tomar
consciência do investimento sexual do objeto – resolver o recalcamento sexual. Sem isto, não
há cura da condição depressiva ou da depressão clínica.
O objeto semiperdido:
1. Depressão primária, pré-edipiana, que deixa uma marca de défice narcísico e avidez e
propulsiona uma fantasia de compensação desenfreada;
2. Deceção edipiana intensa (que a experiência anterior prepara, dada a ferida narcísica,
a avidez, a omnipotência da fantasia e o desejo intenso de reconquistar o objeto
arcaico através do amor edipiano).
5. Deceção nos amores da infância e adolescência (quase inevitável pelo tipo de relação
fóbica, desmedida e idealizada que se forjou);
Ainda que o objeto primário do depressivo tenha sido até aqui descrito como idealizado, é
importante falar sobre a relação com o mau objeto interno. À malignidade apagada podemos
atribuir várias causas:
3. Projeção desses traços num terceiro elemento, que serve de separação da relação –
característica da paranóia;
O vínculo binário, seja o patológico, ou o patogénico, da relação é cada vez mais cerrado e é
cada vez mais difícil distinguir-lhes causas e efeitos.
Os primórdios da vocalização são, por princípio, uma expressão dos afetos e rapidamente se
tornam em chamamento que se traduz no atingir de uma mensagem. O narcisismo primário,
construção do self, a atividade autoerótica (que gera prazer) assumem que a vocalização
preenche o vazio depressivo, pois colmata o valor do abandono. A fala, bem como o seu
princípio, são uma ponte entre o sujeito e objeto. No que às emoções diz respeito, dá-se o
progresso de significação desta vocalização que converte, então, em significação e simbologia
do seu discernimento.
O papel do terapeuta: através dos signos vocais emitidos pelo sujeito, e da posterior
interpretação, o analista atribui-lhes significado de modo a retorná-los ao analisado com maior
clarividência. A mensagem codificada é transformada em palavra, que explica os desejos
ocultos. O diálogo é visto como fator-chave.
Por outro lado, o silêncio terapêutico (isto é, durante a sessão) pode ser essencial pois clarifica
um momento de reflexão. É importante que o terapeuta não interfira nesse silêncio, e que o
saiba compreender.
O masoquismo
O masoquismo apesar de ser uma situação muitas vezes ligada à depressão, também tem as
suas diferenças. Nesta linha de pensamento, o indivíduo vai mais longe: ao sofrer na relação
com o objeto, é para merecer ser amado, captar e manter esse amor. Serve para ser admirado
pelo seu sacrifício e sofrimento, ao mesmo tempo que, e muitas vezes de forma inconsciente,
satisfaz as necessidades sádicas do outro.
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Existe ainda uma diferença entre as personalidades depressivas, pois estas não
necessariamente são as pessoas que estão deprimidas e manifestam o sintoma de abandono e
tristeza, mas sim os indivíduos com tendência para deprimir-se.
Essas personalidades depressivas tendem a apreciar queixar-se da sua vida, assim como
respostas em eco por parte dos seus ouvintes. Procuram a mesma raiva narcísica e a mesma
deceção com o objeto.
Também gostam de encontrar a mesma faceta de grandiosidade nos ouvintes, que acabam por
admirar, de forma a aliviar parcialmente o afeto depressivo. Mas não altera a estrutura
depressiva.
O sujeito repete o padrão da relação primária com o objeto, em que foi amado na desgraça, no
desamparo e na doença, é admirado nas qualidades que interessavam a esse mesmo objeto,
não tendo sido considerados como um ser na sua autenticidade. Portanto, o sujeito depressivo
é visto como o objeto dos desejos (realização através do outro; domínio) dos próprios objetos.
O sofrimento é o mostrar a bondade, mesmo que esta só lhe seja reconhecida depois da sua
morte. Acredita inegavelmente que será reconhecido, pelo objeto, esse seu valor.
O suicídio é visto como o último ato masoquista, e que pode ser explicado pela euforia ou boa
disposição nos momentos que normalmente o antecedem. Isto acontece porque há uma ilusão
de trunfo pós-morte, o amor eterno do objeto finalmente ser-lhe-á concedido. O objeto
reconhecerá que o sujeito deu a vida por si.
Acha que frases como o “partiu cedo demais” ou “se ele fosse ainda vivo…” ser-lhe-ão
dirigidas. A saudade que terão de si será o seu maior prazer. Ao invés de se matar, o sujeito
também pode deixar-se morrer fruto da consequência do desleixo e negligência consigo
mesmo. Morrer é: uma solução para os insucessos; ou a rejeição de uma vida de sofrimento.
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2. Vulnerabilidade narcísica;
4. O orgulho ferido e a ideia de que não têm controlo sobre tudo, seja na realidade ou na
fantasia, não são suportáveis.
O Self diminuído também pode justificar o suicídio, por impedir o sujeito de amar e de sentir
prazer pela vida.