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De joelhos: a posição inevitável do crente ao estudar Teologia Bíblica

POR ESTUDANTE DO INC


EM 12/07/2023
Escrito por Anne Calland, estudante do Programa de Tutoria Essencial 2023

Todo mundo conhece um intelectual orgulhoso, alguém com ar de superioridade,


altivez e soberba em excesso. E quanto a teólogos com esta postura? A sua
satisfação máxima está em expor conhecimentos e doutrinas difíceis que aprenderam
em seus estudos de teologia, com atitude narcisista, revelando o desejo de admirar
a si mesmos e às suas próprias capacidades. Nada poderia ser mais contraditório!

Jonas Madureira, em seu livro Inteligência Humilhada, descreve esse teólogo


egocêntrico como tolo, afinal, ele apenas ilustra o que Provérbios 18.2 diz: “o
tolo não tem prazer no entendimento, mas apenas em externar o que pensa”. O autor
expõe, ao longo da obra, que “diante de Deus, toda a inteligência criada está sob a
condição da humilhação. Em contrapartida, o que verdadeiramente existe é a
consciência ou não desse fato” (MADUREIRA, 2017, p. 67).

Em primeiro lugar, ao se entender teologia como ciência concernente a Deus, é


indispensável que haja, antes de tudo, a revelação da parte dEle (VOS, 2019, p.
13). Se Deus não se autorrevelar no tempo e no espaço, ninguém pode saber nada
sobre Ele. Ninguém sequer existiria! Nas palavras de Geerhardus Vos: “A criação,
portanto, foi o primeiro passo para a produção de um conhecimento extradivino”
(VOS, 2019, p. 14).

O teólogo holandês define teologia bíblica como “o ramo da teologia exegética que
lida com o processo da autorrevelação de Deus registrada na Bíblia” (VOS, 2019, p.
16). Assim, estudar essa disciplina é deparar-se com a realidade de que “a Bíblia é
mais do que uma coleção de dizeres sábios dos quais obtemos nossa orientação, é uma
história unificada que abrange toda uma realidade” (VANHOOZER, 2022, p. 151).

Entretanto, Deus não se revelou de uma única vez, em forma enciclopédica, ditando
todo o conhecimento sobre si de forma ordenada, metódica ou temática. O processo de
revelação se deu através da história, de forma que os próprios fatos e
acontecimentos possuem importância revelacional. Isso aconteceu de forma orgânica,
progressivamente, de modo que foi do estado germinal até atingir o crescimento
pleno.

Nesse sentido, cada aspecto da realidade que conhecemos é resultado da graça


divina. Deus criou todas as coisas pela palavra do seu poder e a criação é mantida
pela constante atuação divina sob a regência de sua providência (MIGUEL, 2021, p.
54). Após a Queda, o pecado danificou a relação entre Deus e o homem, fazendo-se
necessário um conteúdo de revelação especial para a redenção e ainda para mudar a
forma como enxergar corretamente a realidade.

Assim, Deus deseja que o conhecimento d’Ele ocorra não apenas intelectualmente, mas
no entrelaçamento entre a sua autorrevelação e a vida íntima das pessoas. Isso é o
que o teólogo Geerhardus Vos chama de adaptabilidade prática da revelação (VOS,
2019, p. 19). Nas palavras de Kevin Vanhoozer: “Não basta afirmar a verdade do
ensino bíblico ou mesmo viver pelas metáforas bíblicas. (…) Os discípulos precisam
aprender a habitar a história da Bíblia” (VANHOOZER, 2022, p. 151).

A promessa de Deus é feita a Adão de que esmagaria a cabeça da serpente e a Abraão


de que todas as famílias da terra seriam abençoadas por meio de seu descendente.
Deus entrou, repetidamente, em relação de aliança com indivíduos: Noé, Abraão,
Israel, Moisés e Davi. Sobre isso, O. Palmer Robertson descreve que aliança é um
pacto de sangue que demonstra o caráter absoluto do compromisso entre Deus e o
homem no contexto da aliança. As implicações de suas alianças estendem-se até às
últimas consequências de vida e morte (ROBERTSON, 2011, p. 16). Ademais, formam uma
unidade:

A evidência cumulativa das Escrituras aponta definitivamente em direção ao caráter


unificado das alianças bíblicas. Os múltiplos pactos de Deus com o seu povo unem-se
basicamente em um único relacionamento. Os detalhes particulares das alianças podem
variar. Pode-se notar uma linha definida de progresso. Todavia, as alianças de Deus
formam uma unidade. A estrutura de aliança da Escritura manifesta uma maravilhosa
unidade. (…) Deus, ao juntar um povo a si mesmo, jamais muda. Por essa razão, as
alianças de Deus relacionam-se organicamente umas às outras. De Adão a Cristo, uma
unidade de administração pactual caracteriza a história do tratamento de Deus com o
seu povo (ROBERTSON, 2011, p. 31, 45).

Desse modo, com a teologia bíblica, compreendemos como todas as peças se conectam e
culminam naquilo que o Pai estava fazendo no Filho, por meio do Espírito, para
renovar e reconciliar a humanidade e toda a criação (VANHOOZER, 2022, p. 151). Com
o nascimento de Cristo, a segunda pessoa da Trindade eterna entra na história,
concretizando de forma tangível as esperanças geradas pela revelação anterior.
Segundo Igor Miguel: “Jesus Cristo é o ‘discurso divino’ presente na forma humana,
a Sabedoria Encarnada. Sua biografia dramatiza a vida do Reino, a nova humanidade e
a retomada do destino humano em direção ao que significa ser a imagem de Deus”
(MIGUEL, 2021, p. 164).

Neste ponto, ressaltamos o método de ensino de Cristo. Uma característica marcante


é o seu uso de parábolas. Geralmente, são citadas algumas razões pelas quais Cristo
poderia ter utilizado essa forma de ensinar: simplicidade, identificação entre o
conteúdo e as circunstâncias da vida comum dos ouvintes, por exemplo. No entanto,
deve-se considerar que esse método de ensino era cumprimento de profecia prevista
no Salmo 78.2: “Abrirei em parábolas os lábios e publicarei enigmas dos tempos
antigos”.

As parábolas de Jesus cumprem o plano eterno de revelar a verdade de Deus ao povo,


de uma forma tão penetrante que tem o propósito de diferenciar os ouvintes: aroma
de vida para os que creem e cheiro de morte para os que rejeitam, como explica o
apóstolo Paulo em 2 Coríntios 2.14-16 (KAISER; SILVA, 2014, p. 107). Ele mesmo
disse aos discípulos, citando Isaías 6.9-10: “A vós outros vos é dado conhecer o
mistério do reino de Deus; mas, aos de fora, tudo se ensina por meio de parábolas,
para que, vendo, vejam e não percebam; e, ouvindo, ouçam e não entendam; para que
não venham a converter-se, e haja perdão para eles” (Marcos 4.11-12).

Além disso, as parábolas sugerem um relacionamento próximo entre criação e


redenção. Jesus não olha despretensiosamente para a natureza em busca de
ilustrações para o seu argumento. Ele é tanto Criador quanto Redentor e extrai da
criação os paralelos que Ele mesmo determinou que assim o fossem. Geerhardus Vos
explica:

Seria mais correto chamá-las de descobertas espirituais, porque estão baseadas em


certo paralelismo entre as duas camadas da criação, a natural e a espiritual
(redentora), porque o universo tem sido construído desse modo. Pelo princípio da
‘Lei espiritual no mundo natural’, as coisas e processos naturais refletem como num
espelho as coisas supranaturais, e não era necessário que Jesus inventasse
ilustrações. Tudo o que ele tinha que fazer era chamar a atenção para o que estava
por trás, escondido, mais ou menos, desde o tempo da criação (…). A familiaridade
maravilhosa da mente de Jesus com todo o compasso da vida natural e econômica,
observável em suas parábolas, pode ser explicada por ele ter sido o Mediador divino
para trazer este mundo com tudo contido nele à existência, e mais uma vez ele foi o
Mediador divino para a produção e o estabelecimento da ordem da redenção (VOS,
2019, p. 427).

O livro de Hebreus exalta a pessoa e obra de Jesus Cristo como a revelação plena e
final de Deus ao seu povo e como o Mediador da nova aliança. Nos primeiros
versículos, o autor mostra a extensão e a amplitude da Palavra de Deus: na época do
Antigo Testamento, Deus falou por meio de seus profetas; no Novo Testamento, Ele
falou por meio de seu Filho (KISTEMAKER, 2013, p. 21). Ele é a culminação da obra
salvadora de Deus na História. Realizou a plena expiação pelo pecado sendo superior
a todas as administrações anteriores:

Havendo Deus, outrora, falado, muitas vezes e de muitas maneiras, aos pais, pelos
profetas, nestes últimos dias, nos falou pelo Filho, a quem constituiu herdeiro de
todas as coisas, pelo qual também fez o universo. Ele, que é o resplendor da glória
e a expressão exata do seu Ser, sustentando todas as coisas pela palavra do seu
poder, depois de ter feito a purificação dos pecados, assentou-se à direita da
Majestade, nas alturas, tendo-se tornado tão superior aos anjos quanto herdou mais
excelente nome do que eles (Hebreus 1.1-4).

Após ressurgir dos mortos, Cristo afirma que enviaria o Consolador para guiar o seu
povo em toda a verdade. Kevin Vanhoozer afirma que “esse drama é uma história que
se fez carne: primeiro, por Jesus Cristo, em quem a história atinge seu clímax;
depois, por seus discípulos que continuam a corporificar e encenar a história no
poder do Espírito de Cristo” (VANHOOZER, 2022, p. 170). Portanto, o estudo da
teologia bíblica produz não somente conhecimento intelectual, mas nos ajuda a
compreender a nós mesmos e a nos conscientizar da nossa função nesta grande
história da redenção: “manifestar a nova vida em Cristo na liberdade do Espírito e,
assim, glorificar o Pai” (VANHOOZER, 2022, p. 174).

A cada página de estudo de teologia bíblica, nos maravilhamos com um Deus soberano
em todas as instâncias, conduzindo metanarrativas e detalhes íntimos da mente
humana, até atingir todos os seus propósitos e cumprir todas as suas promessas. Não
há como manter-se altivo diante de uma fonte inesgotável de conhecimento. A
finalidade principal das Escrituras não consiste em fornecer informações
teológicas, mas, sim, em promover a transformação do coração e da vida. Quanto mais
conhecemos a Deus, percebemos a infinitude de sua grandeza e impossibilidade de
conhecê-lo plenamente. Isso nos humilha e escancara a verdade de que Ele só pode
ser conhecido porque se revela e opera em nós, através de sua Palavra e da
iluminação de seu Santo Espírito.

Diz a Bíblia em Tiago 4.6: “Deus resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes”.
Assim, sujeitemo-nos a Deus e estudemos teologia bíblica, de joelhos, com oração e
súplica, diante do Senhor, para que Ele nos guie na vida e nos pensamentos.

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Referências Bibliográficas

BÍBLIA DE ESTUDO HERANÇA REFORMADA. Almeida Revista e Atualizada. Barueri, SP:


Sociedade Bíblica do Brasil; São Paulo: Cultura Cristã, 2018. 2240p.

KAISER, Walter C.; SILVA, Moisés. Introdução à Hermenêutica Bíblica: como ouvir a
Palavra de Deus apesar dos ruídos de nossa época. Tradução: Paulo C. N. dos Santos,
Tarcízio J. F. de Carvalho e Susana Klassen. 3ª ed. São Paulo: Cultura Cristã,
2014. 288 p.

KISTEMAKER, Simon. Hebreus: Comentário do Novo Testamento. Tradução: Marcelo


Tolentino e Paulo Arantes, 2a ed. São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2013. 640
p.

MADUREIRA, Jonas. Inteligência Humilhada. 1ª ed. São Paulo, SP: Vida Nova, 2017.
336 p.
MIGUEL, Igor. A escola do Messias: fundamentos bíblico-canônicos para a vida
intelectual cristã. 1a ed. Rio de Janeiro, RJ: Thomas Nelson Brasil, 2021. 208 p.

ROBERTSON, O. Palmer. O Cristo dos pactos. Tradução: Américo Justiniano Ribeiro,


2.ª ed. São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2011. 240 p.

VANHOOZER, Kevin J. Discipulado para a glória de Deus: um guia pastoral para fazer
discípulos por meio das Escrituras e doutrina. Tradução: Francisco Wellington
Ferreira. São Paulo, SP: Vida Nova, 2022. 320 p.

VOS, Geerhardus. Teologia Bíblica: Antigo e Novo Testamentos. Tradução: Alberto


Almeida de Paula. 2ª ed. São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2019. 496 p.

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Vestígios da Trindade no Antigo Testamento
POR ESTUDANTE DO INC
EM 03/04/2024
Escrito por Yvis Freire Santos, estudante do Pocket Essencial 2023

Introdução

Geralmente, uma das críticas à doutrina da Trindade aponta para uma suposta
descontinuidade em relação ao que é apresentado na Bíblia Hebraica. Argumenta-se
que esta doutrina seria uma quebra do monoteísmo judaico, uma inovação posterior ou
um reflexo da influência da filosofia grega. Diante disso, este artigo visa
elucidar e discutir os sinais de diversidade na unidade da natureza divina,
destacando a unidade e continuidade da autorrevelação de Deus nos dois Testamentos.

O Shemá

Uma das afirmações mais emblemáticas do monoteísmo judaico no Antigo Testamento


está contida no Shemá: “Ouça, ó Israel: O Senhor, o nosso Deus, é o único Senhor”
(Dt 6:4, NVI). Embora, à primeira vista, o texto não pareça indicar a possibilidade
de um Deus trino, com uma análise mais aprofundada é possível observar que este não
é o caso.

Primeiro, dada a tendência idólatra de Israel, é vital entender que a ênfase na


singularidade de Deus não é meramente quantitativa, mas qualitativa: Yahweh é o
único verdadeiro Deus e digno de adoração1. Segundo, o termo hebraico para “único”
(echad) não implica necessariamente absoluta singularidade, mas permite uma
pluralidade dentro dessa unidade2. Um exemplo deste conceito pode ser visto em
Gênesis 2.24, onde o homem e sua mulher, em sua pluralidade, se tornam uma só
carne, uma unidade: “Por essa razão, o homem deixará pai e mãe e se unirá à sua
mulher, e eles se tornarão uma só carne” (Gn 2:24, NVI). Ou seja, a passagem não
contradiz a noção de um Deus trino.

O Anjo de Yahweh

O “Anjo do Senhor”, ou “Anjo de Yahweh”, é uma das figuras mais proeminentes dentre
as teofanias no Antigo Testamento. O Anjo de Yahweh é um representante/mensageiro
de Deus que tem um papel de destaque ao longo da narrativa veterotestamentária. Ele
tanto se distingue de Yahweh, falando dele na primeira pessoa3, como também se
identifica com YHWH, falando dele na primeira pessoa, além de compartilhar de seus
atributos e receber adoração4. Portanto, como Geerhardus Vos sugere: “nós devemos
assumir que, por trás da dupla representação, existe uma multiplicidade real na
vida interior da deidade” (VOS, 2010, p. 97).
Uma leitura trinitária das Escrituras

Ao interpretar textos aparentemente trinitários no Antigo Testamento, corre-se o


risco de cair em anacronismo, ou seja, ler o texto bíblico do AT fora de seu
contexto e de seu lugar na história da redenção. Embora a revelação plena em Cristo
ilumine nossa compreensão, é essencial reconhecer o desenvolvimento progressivo da
revelação divina. Ao longo do AT, o texto bíblico tem por foco enfatizar a
unicidade de Deus ao povo de Israel, pois muito provavelmente este tomaria a
revelação prematura de um Deus em três pessoas como uma tentação ao politeísmo5.
Portanto, tais textos não devem ser lidos como declarações explícitas da Trindade,
mas, sim, como uma preparação da mentalidade do povo judeu para a plenitude de quem
Deus é tal como o conhecemos por meio do NT. Os judeus não tinham a identidade de
Deus bem resolvida, havia um suspense, uma sede por quem Deus é, seu nome, sua
face, sua glória. Tudo isso culminou e foi satisfeito na pessoa de Cristo6.

Conclusão

Em conclusão, a revelação neotestamentária da natureza de Deus continua, cumpre e


esclarece o que foi revelado no Antigo Testamento. A doutrina da Trindade não
apenas encontra respaldo em ambos os Testamentos, como também não foi completamente
estranha à mentalidade do povo de Deus na antiga aliança. O Deus que se revelou no
Antigo Testamento é o mesmo que se manifesta de forma mais completa no Novo
Testamento. Em Deus não há mudança nem sombra de variação, mas, no progresso de sua
revelação, Ele se torna cada vez mais claro e mais glorioso ao seu povo7.

1 TRINDADE NO ANTIGO TESTAMENTO. Locução de Rodrigo Bibo. BTCast | Bibotalk, 22


jun. 2022. Podcast. Em 25:05.

2 PETERLEVITZ, Luciano R. A Trindade no Antigo Testamento. In: Edições Vida Nova.


Teologia Brasileira. 12 ago. 2009.

3 VOS, Geerhardus. Teologia bíblica: Antigo e Novo Testamentos. Tradução: Alberto


Almeida de Paula. 2.ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2010. p. 96.

4 BAVINCK, Herman. As maravilhas de Deus: instrução na religião cristã de acordo


com a confissão reformada. Tradução: David Brum Soares. 1. ed. São Paulo: Pilgrim
Serviços e Aplicações; Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2021. p. 198.

5 VOS, op. cit., p. 98.

6 TRINDADE NO ANTIGO TESTAMENTO, op. cit. Em 19:53.

7 BAVINCK, op. cit., p. 194.

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Bibliografia

BAVINCK, Herman. As maravilhas de Deus: instrução na religião cristã de acordo com


a confissão reformada. Tradução: David Brum Soares. 1. ed. São Paulo: Pilgrim
Serviços e Aplicações; Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2021. 736 p.

JONES, Michael. The Trinity in the Old Testament. InspiringPhilosophy. 2012. 1


vídeo (14:18). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=BNt5NKSse0Y

PETERLEVITZ, Luciano R. A Trindade no Antigo Testamento. In: Edições Vida Nova.


Teologia Brasileira. 12 ago. 2009. Disponível em:
https://teologiabrasileira.com.br/a-trindade-no-antigo-testamento. Acesso em 31
dez. 2023

TRINDADE NO ANTIGO TESTAMENTO. Locução de Rodrigo Bibo. BTCast | Bibotalk, 22 jun.


2022. Podcast. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=ngpmDwYclJg. Data de
acesso: 31 dez. 2023

VOS, Geerhardus. Teologia bíblica: Antigo e Novo Testamentos. Tradução: Alberto


Almeida de Paula. 2.ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2010. 496 p.

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Abra os olhos e veja, Ele sempre esteve lá


POR ESTUDANTE DO INC
EM 10/05/2024
Artigo escrito por Cristiano Araújo, estudante do Programa de Tutoria Essencial
2024

“E começando por Moisés e todos os profetas, explicou-lhes o que constava a


respeito dele em todas as Escrituras.”

(Lucas 24:27)

Durante o trajeto entre Jerusalém e Emaús, caminhando com dois de seus discípulos,
Jesus Cristo ensinou a respeito de si próprio nas “páginas” descritas naquilo que
hoje chamamos de Antigo Testamento. Foram nitidamente impactantes os efeitos de tal
experiência na vida daqueles discípulos: “Não estava queimando o nosso coração,
enquanto ele nos falava no caminho e nos expunha as Escrituras?” (Lucas 24:32).
Ainda assim, e com certa facilidade, por diversas vezes vemos e ouvimos — quando
não mesmo praticamos — a leitura da Bíblia como um conjunto de livros com uma
“clara” separação: Enquanto o Novo Testamento fala de Cristo, o Antigo possui, no
máximo, uma citação aqui e outra ali sobre Ele.

No entanto, ver e expor as Escrituras dessa forma contradiz o próprio texto


bíblico. Jesus olhava para o Antigo Testamento e se via não só em partes, mas no
todo. A existência de Cristo em toda a Escritura — Antigo e Novo Testamentos — é,
inclusive, essencial para a correta interpretação da mesma. Nas palavras de John
Stott: “O principal objetivo da pregação é expor as Escrituras com tal fidelidade e
relevância que Jesus Cristo seja percebido em toda sua adequação para suprir a
necessidade humana” (STOTT apud GREIDANUS, 2019, p. 38).

Nesse sentido, é perceptível, em nossos dias, a falta de pregações sobre Jesus


tendo como base o Antigo Testamento. Por isso, Sidney Greidanus, em sua obra
Pregando Cristo a partir do Antigo Testamento, aborda pelo menos três razões para
este problema, sendo: (1) a tentação da pregação centrada no homem, (2) a
preocupação quanto à interpretação forçada e, por fim, (3) a separação do Antigo
Testamento do Novo (GREIDANUS, 2019, p. 67). Contudo, apesar dos motivos apontados
acima, há, em contrapartida, e diríamos até que mais fortes do que eles, diversas
razões para prevalecer a pregação de Cristo também a partir do Antigo Testamento,
dentre elas:

(1) o Antigo Testamento faz parte do cânon cristão; (2) ele revela a história da
redenção que conduz a Cristo; (3) ele proclama verdades não encontradas no Novo
Testamento; (4) ele nos ajuda a entender o Novo Testamento; (5) ele evita uma
compreensão errada do Novo Testamento e (6) ele oferece uma compreensão mais
completa de Cristo (GREIDANUS, 2019, p. 52).
Além disso, a Bíblia que Jesus e os apóstolos possuíam até então era, de fato, o
Antigo Testamento, uma vez que o Novo ainda não havia sido escrito. Cristo se via
nas Escrituras, os seus discípulos o viam nas Escrituras. Assim, por que deveria
ser diferente para nós? Ao olhar os Evangelhos no Novo Testamento, particularmente
nos chama muito a atenção o fato de como João inicia seus relatos: “No princípio
era aquele que é a Palavra. Ele estava com Deus, e era Deus” (João 1:1). É como se
o mesmo quisesse deixar bem claro que o que se seguiria dali para frente teria como
base o início de tudo, e que lá estava Jesus, o Cristo, o Verbo, a Palavra.

João prossegue, no versículo 3 do mesmo capítulo, dizendo: “Todas as coisas foram


feitas por intermédio dele; sem ele nada do existe teria sido feito”. Como olhar
para esse texto e não se render à verdade de que Cristo não só estava nos relatos
do Antigo Testamento como também por meio dele tudo se fez? Já em Mateus 3:3, o
apóstolo descreve João Batista como aquele que prepararia o caminho do Senhor,
sendo esta uma clara referência e cumprimento a Isaías 40:3 (Antigo Testamento),
que profetizou a respeito de Jesus Cristo. No que diz respeito aos atos redentores
de Deus, Greidanus afirma que:

Não encontramos esse longo histórico dos atos salvíficos de Deus no Novo
Testamento, que simplesmente assume essa história como fato e constrói sobre ela.
Como somente o Antigo Testamento revela essa história da redenção, ele é
indispensável para a igreja cristã (GREIDANUS, 2019, p. 54).

Por fim, não temos a intenção de esgotar todas as evidências de que nosso Senhor
Jesus está presente e atuante também nos relatos do Antigo Testamento, não teríamos
sequer tal capacidade; mas certamente podemos concluir que uma leitura,
interpretação e pregação de Cristo inevitavelmente precisam passar por toda a
Escritura – Antigo e Novo Testamentos. Abra os olhos e veja, Ele sempre esteve lá.

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Referências bibliográficas

BÍBLIA DE ESTUDO NVI. Nova Versão Internacional. São Paulo. Editora Vida. 2003.
2424 p.

GREIDANUS, Sidney. Pregando Cristo a partir do Antigo Testamento. Tradução:


Elizabeth Gomes. 2ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2019. E-book. 571 p. Disponível
em: https://www.amazon.com.br/dp/B0C5K2W527?
nodl=1&ref_=k4w_ss_store_lp&dplnkId=c829c4ae-da30-4761-8e2f-e18a727a57b2. Acesso em
04 fev. 2019.

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Não passe sua Bíblia por uma fragmentadora de papel


POR ESTUDANTE DO INC
EM 14/04/2021
Escrito por Kaiky Fernandez, estudante do Programa de Tutoria – Turma Essencial
2021

Se você já trabalhou em um escritório ou já assistiu alguma produção audiovisual


que é ambientada em um, provavelmente já viu em ação uma fragmentadora de papel. É
um objeto elétrico que serve para triturar papel, tendo como resultado várias tiras
de uma ou mais folhas. Isso serve tanto para questões de segurança, evitando que
importantes documentos caiam em mãos erradas, quanto para auxiliar em processos de
reciclagem.
Um problema muito comum no nosso meio é que muitos de nós, intencionalmente ou não,
acabamos passando nossas Bíblias por fragmentadoras de papel. Claro que não estou
falando em termos literais. Mas os resultados finais são bem similares!

Quando eu digo isso, me refiro à forma comum – e até mesmo contraditória – com a
qual os evangélicos normalmente lidam com as Escrituras.

No primeiro nível, é a leitura e tentativa de interpretação de versículos isolados,


sem considerar o contexto imediato. Esse é um recurso muito usado para, ainda que
sem essa pretensão, distorcer o texto e forçar aplicações que não são coerentes com
o todo.

No segundo nível, é a leitura de trechos maiores, mas de forma fragmentada.


Geralmente, essa prática é adotada em alguns planos de leituras bíblicas que tem
uma meta temporal. Então é feito um arranjo dos livros para que as leituras diárias
tenham aproximadamente as mesmas porções.

No terceiro nível, que considero mais sutil e sobre o qual quero dar mais ênfase, é
dissociando o Antigo Testamento, do Novo Testamento, como se fossem duas coisas
distintas. Nesse sentido, o autor Michael Horton (2000, p. 20) nos alerta:

“O Antigo Testamento não é apenas a parte de nossa Bíblia que predisse a vinda de
um Messias e que passou a ser irrelevante quando o Messias veio; é parte de um
drama completo de redenção em curso, e começar com o Evangelho de Mateus é como
começar a assistir a um filme no meio da história. É como pensar que você está
contando uma boa piada quando tudo de que se lembra é o auge da mesma.”

O que o autor nos diz é que quando pensamos que o cânon bíblico é composto de dois
livros diferentes, um antigo e outro novo, como se fossem duas histórias diferentes
de uma mesma franquia de filmes, nós cometemos um grande erro.

O Antigo Testamento, assim como o Novo, formam um todo integrado e orgânico da


revelação de Deus na história. Essa divisão, embora tradicional no nosso meio, tem
uma finalidade muito mais organizacional em termos editoriais, do que
necessariamente instrutiva em termos teológicos.

Geerhardus Vos (2019, p. 361), ao apresentar a estrutura da revelação no Novo


Testamento, enfatiza que ela já estava indicada no Antigo Testamento, mostrando a
unidade que há entre ambas: “O Antigo Testamento, por meio de sua atitude
profética, postula o Novo Testamento.”

Ele continua enfatizando essa continuidade ao apresentar que a diferença não está
na forma da revelação divina, ou seja, o Deus do Antigo Testamento não é um Deus
diferente do Novo. É equivocado pensarmos assim, como se no primeiro houvesse um
Deus vingativo, sanguinário e justiceiro, enquanto no segundo houvesse um Deus
amoroso, gracioso e compassivo.

“Deve-se notar ainda que o contraste estabelecido aqui não é, em primeiro lugar, de
revelação. As palavras falam de uma nova era em termos de acesso religioso a Deus.
Elas não falam de um novo período de autorrevelação divina, apesar de que, é claro,
está pressuposto sob a Lei geral de que o progresso na religião segue o progresso
na revelação.” (Vos, 2019, p. 363)

Vos enfatiza que a mudança testamentária não está relacionada com uma nova forma de
revelação da parte de Deus, como se Ele se revelasse de duas formas distintas. A
mudança se encontra no acesso religioso a Deus, que agora é intermediado pela obra
redentora de Cristo.
Assim, olhando para as próprias atitudes de Jesus em relação às Escrituras do
Antigo Testamento, vemos mais uma vez a confirmação dessa continuidade. O Messias
não apenas fez citações diretas dele ao longo dos evangelhos, como também seus
ensinamentos estavam em plena conformidade.

Portanto, de igual modo deve ser nossa conduta ao lermos, interpretarmos e


aplicarmos o texto bíblico. Não devemos fragmentá-lo, muito menos fazer a separação
testamentária como se um tivesse expirado, e apenas o outro fosse válido para os
nossos dias.

Obviamente, é claro, que existem leis e ordenanças no Antigo Testamento que eram
específicas para aquele povo e naquele contexto, não se aplicando a nós hoje. Um
bom estudo hermenêutico irá nos evidenciar isso.

No entanto, isso não significa que o conteúdo da revelação de Deus, ou o próprio


Deus, tenha mudado! A aliança que o Senhor faz com o seu povo – com nós – é a mesma
desde a queda. A mudança que existiu está na forma de administrar essa aliança, que
agora é através do sangue do nosso Senhor Jesus Cristo.

Não passe sua Bíblia por uma fragmentadora de papel – seja ela física, ou a nível
interpretativo. Considere a Palavra de Deus por inteiro!

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REFERÊNCIAS

HORTON, Michael. A Lei da Perfeita Liberdade: a ética bíblica a partir dos dez
mandamentos. Tradução: Denise Meister – São Paulo: Cultura Cristã, 2000.

VOS, Geerhardus. Teologia Bíblica – Antigo e Novo Testamentos. Tradução: Alberto


Almeida de Paula. 2ª ed. – São Paulo: Cultura Cristã, 2019.

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