Fundamentos Da História
Fundamentos Da História
Fundamentos Da História
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1 FUNDAMENTOS DA HISTÓRIA
Fonte:www.google.com
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O estudo da História no Ensino Fundamental, vai fazer com que os alunos
consigam construir suas próprias histórias, vão conhecer fatos importantes, datas,
suas identidades, os antepassados. Mas temos que tomar cuidado, pois o ensino da
História não deve ser meras memorizações de fatos, datas e dados, mas sim um
ensino através de debates, pesquisas e conflitos. Assim nossos alunos vão se tornar
cidadãos participativos e críticos, abrindo seu próprio caminho em relação suas
curiosidades perante ao estudo da História.
Conforme as autoras, Gisele Thiel Della Cruz e Daniela dos Santos Souza, o
objetivo mais relevante no ensino de História é a noção de identidade, vinculada à
reflexão sobre cidadania. Por isso, os estudos históricos devem abranger três
aspectos: identidade social a partir da relação entre particular e o geral (cultura e
localidade), noções de diferença e semelhança – o eu e a percepção do outro – e,
finalmente, noções de continuidade e permanência. São relevantes para essa
compreensão do desenvolvimento de três conceitos básicos para a construção da
História: fato, sujeito e tempo históricos.
Nas décadas de 1960 e 1970, com o governo militar no poder, as disciplinas de
História e Geografia transformaram-se na disciplina de Estudos Sociais. Assim, o
espírito nacionalista, as ideias cívicas e moralizante tem um grande crescimento.
Com o passar do tempo a História volta a ser uma disciplina única, tem como
projeto, não só fazer História, mas também ensinar História. A História tem como
objetivo desenvolver pensamentos mais críticos, fazer com que os educandos
compreendam a realidade da sociedade em geral. Os currículos passaram por
modificações e a História passou a ser ensinada a partir da Educação Infantil.
Segundo as autoras, Gisele Thiel Della Cruz e Daniela dos Santos Souza, a
partir da década de 1960, sob a influência das teorias marxistas, surge uma tendência
cuja particularidade era a crítica da Geografia Tradicional. Absolutamente todas as
relações que eram estabelecidas e próprias do homem eram justificadas e
compreendidas por meio do viés marxista, num processo quase que militante da
disciplina. Não bastava explicar o mundo; era preciso transformá-lo. Para tanto, a
Geografia lançou mãos de conteúdos políticos, voltados para a formação do cidadão.
A Geografia nos últimos tempos tem por objetivo analisar e estudar as relações
entre o homem e a natureza. Faz com que os alunos busquem muito mais além da
sala de aula, a Geografia propõe assuntos críticos que enriquecem a vida escolar dos
nossos educandos.
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Conforme as autoras, Gisele Thiel Della Cruz e Daniela dos Santos Souza, há
muito tempo, os historiadores rumaram para uma nova concepção acerca da História
e da construção da Ciência Histórica. Essa nova abordagem apontava não mais a
velha exposição dos fatos e seus encadeamentos, que fez parte do ofício do
historiador no século XIX e parte do século XX, período esse denominado,
sinteticamente, de positivismo. Essa nova proposta voltou-se para novos discursos e
para um processo mais reflexivo e conjuntural de construção da História.
Até meados da década de 1980, no Brasil o ensino da História estava voltado
ao civismo e o poder do Estado. Tanto o professor como o aluno tinham que dominar
o conceito de tempo histórico. Deveriam entender o tempo cronológico, datas,
calendário e a sequência entre passado, presente e futuro.
Com o tempo, o estudo da História passou a estudar a sociedade de forma
mais ampla, o professor trazendo para a sala de aula imagens, informações,
descrições, músicas, textos, entre outros, faz com que o aluno consiga compreender
melhor o que se passa ao seu redor. O educando vai compreender de maneira mais
prazerosa o que se passou, o que se passa e o que pode se passar no tempo através
da História.
Segundo as autoras, Gisele Thiel Della Cruz e Daniela dos Santos Souza, por
muito tempo, o ensino tradicional da História se preocupou apenas com um grande
número de informações pautadas em datas e nomes. Longe das necessidades e
realidades da sala de aula e da comunidade, a disciplina se tornava árida e vinculada
à ideia de coisas antigas, “ amarelas” e desgastadas. Hoje, há outras discussões
pertinentes à significação da História. Uma nova visão pedagógica sobre a construção
do conhecimento, e mesmo uma nova dinâmica e perspectiva dos historiadores,
trouxe, à História um novo gás e um novo colorido. Para usar uma expressão mais
correta, um novo colorido que colocou fim ao amarelo pálido dos antigos livros.
A melhor forma de fazer com que o educando tome gosto pela História, é fazer
a diversidade das atividades através da criatividade. O professor pode usar os mais
variados recursos como fonte de trabalho, exemplo: jornais, revistas, filmes, internet,
músicas, fotos, entre outros. Através dessas fontes de pesquisas, os alunos vão se
socializar com a história da sociedade brasileira. Vão notar que nossa sociedade
carrega uma marca autoritária, existiu escravidão dos negros, foi e continua sendo
uma sociedade injusta e desigual. Mas também vão perceber que o Brasil teve várias
conquistas, direito ao voto para todos, democracia em geral, lutas pela melhoria de
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vida da população, etc. É nesse espaço que entra a escola, pois é através da mesma
que podemos transformar a visão e os pensamentos dos nossos alunos em relação a
sociedade em geral.
A História talvez seja uma das disciplinas que mais suporte pode dar para que
os alunos reconheçam a caminhada feita pelo povo brasileiro ruma à democracia. “A
visão de que a constituição da sociedade é um processo histórico permanente permite
compreender que esses limites são potencialmente transformáveis pela ação social”
(PCN, v.8, p.25). E que, portanto, o que temos aí é resultado da conquista e aquilo e
aquilo que ainda não foi possível passa também pela luta e pela utopia. (CRUZ,
SOUZA, 2009, p. 76).
Conforme as autoras, Gisele Thiel Della Cruz e Daniela dos Santos Souza, a
grande importância do conhecimento histórico em sala de aula relaciona-se também
com o quanto a História capacita os alunos para desenvolver uma consciência mais
crítica e, ao mesmo tempo, humana. É saber que por meio do ensino da História é
possível que os alunos possam estabelecer relações entre identidades individuais,
sociais e coletivas, relacionando o particular e o geral, dentro de uma perspectiva
temporal. Reconhecer a sua localidade e outras em diferentes tempos históricos. É
saber-se parte dessas transformações. É conhecer-se pelos elementos que são
comuns e tão diferentes em relação ao outro. É criar o senso de cidadania,
solidariedade e de respeito ao diferente. É reconhecer e ter admiração pelas
conquistas humanas.
O ensino da História é muito importante, pois vai fazer com que o aluno se torne
mais crítico perante a sociedade. As pessoas vão se dar conta que é através da
História bem trabalhada, que podemos mudar a realidade de um ambiente, pois as
pessoas vão saber e vão ter coragem de lutar pelos seus objetivos. Pois sabemos que
nossa História é marcada por grandes acontecimentos e revoluções.1
História é um componente curricular obrigatório no ensino fundamental, porém,
nem sempre desenvolvido de modo adequado, considerando sua importância para a
formação dos indivíduos e de modo que possibilitem a construção de conhecimentos
significativos. Em sua trajetória histórica, esta disciplina foi negligenciada em alguns
momentos como no período militar, quando as disciplinas História e Geografia foram
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2 A ESCOLA PÚBLICA E O ENSNO DE HISTÓRIA
Fontepedagogiaaopedaletra.com
Nesse último exemplo o Estado oferta a educação para o povo, pois financia
os custos com mão de obra, as despesas materiais, como manutenção das
instalações, e controla os conteúdos, os recursos pedagógicos, e os discursos que
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deverão ser apresentados para os educandos. Essa escola é entendida pelo senso
comum como educação pública por ser mantida pelo Estado, no entanto, segundo
Sanfelice, (2005) deve ser caracterizada apenas como “escola estatal”, pois é mantida
pelo Estado, e reflete seus interesses, e não os interesses do público, ou seja, das
camadas excluídas da sociedade.
Esta passagem é esclarecedora sobre o que realmente seria a escola pública
e o processo de ensino. Assim compreendemos a escola pública como aquela que
corresponde aos anseios dos setores excluídos da sociedade. Essa escola emana
dos movimentos sociais em resposta às demandas populares.
No Brasil, assim como na América Latina, a educação foi marcada pela
dualidade, de um lado uma formação profissionalizante, voltada para os proletários,
de outro, uma formação propedêutica destinada aos integrantes da classe burguesa.
Segundo Saviani (2007) a partir do momento em que a sociedade se constituiu em
classes sociais, mais precisamente na Antiguidade, com o escravismo e na Idade
Média, com o feudalismo, surge a dualidade educacional. A educação
institucionalizada voltou-se para formação intelectual e uma educação instrumental
assimilada no próprio processo de trabalho voltada aos trabalhadores.
Com as mudanças na estrutura da sociedade capitalista, percebemos
influencias também no campo da educação. A partir do século XIX em meio a
discussões sobre a universalização da escola pública, discutia-se também a relação
sociedade e educação. Ainda naquele momento se mantinha a educação dualista, no
entanto, o acesso do filho do trabalhador à escola era objeto de debate.
Adam Smith, em A riqueza das nações (1983), ao discutir a educação pública
na sociedade capitalista industrial do século XVIII, enfatizou que ela não deveria
onerar gastos ao Estado, ou seja, teria acesso à educação quem tivesse condições
de pagar. Porém, a educação das pessoas comuns requeria um pouco de atenção
por parte do Estado, o que não quer dizer que para Smith a educação dos pobres
seria mantida pelo Estado, mas que em cada distrito ou paróquia fosse criado escolas
que operassem com um custo tão baixo que qualquer pessoa tivesse condições de
pagar.
A qualidade do conteúdo ensinado nestes estabelecimentos de ensino também
seria reflexo do custo, pois para Smith essas escolas ensinariam apenas ler, escrever
e contar. Para Smith não haveria necessidade de uma formação de base humanística
para os pobres já que estes em suas atividades profissionais realizavam operações
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tão simples e em uma jornada de trabalho desgastante e longa que não lhes sobravam
tempo para o lazer e tempo para pensar.
Smith (1983) defende, porém, que a educação dos filhos de pessoas de
posição e de fortuna seja diferenciada, pois executam tarefas complexas e de cunho
intelectual, o que implica uma formação propedêutica, humanística, filosófica e
literária. Nesta perspectiva liberal, a educação pode ser entendida como mercadoria.
Alves (2001) considera que no século XIX, este modelo de formação escolar
não mais correspondia às demandas sociais da época, considerava-se que devido a
especialização do trabalhador, resultado do processo de desenvolvimento
tecnológico, as atividades manufatureiras desempenhadas dentro das fábricas, se
tornaram tão simples, não havendo a necessidade de formação escolar, pois a
aprendizagem acontecia por meio do trabalho. Assim, a força de trabalho se
reproduzia biologicamente, abrindo espaço para a escola única burguesa.
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em dois momentos, o primeiro até a Independência e o segundo do Primeiro Reinado
ao Estado Novo (ABUD, 2007).
Na década de 1950 e início dos anos de 1960, a preocupação com temas
sociais ganhava força. As Reformas de Base, propostas por João Goulart (1961-
1964), diante da pressão de setores da classe média, movimento estudantil, de
operários, pretendiam a modernização e democratização e a superação das
desigualdades sociais no Brasil. A história positivista ensinada nas escolas era
considerada reacionária, no entanto, o que ainda se viu de avanço quanto ao ensino
de história foram grupos de estudos entre os melhores alunos de obras de Caio Prado
Junior, Karl Marx e Celso Furtado. Ainda neste momento, segundo Pinsky os alunos
ainda tinham de decorar nomes de reis, faraós e a vitória dos brasileiros contra os
“ferozes paraguaios”, que reduziam “[...] o homem à categoria de objeto ínfimo no
universo de monstros grandiosos que decidem o caminho da humanidade e o papel
de cada um de nós, simples mortais. ” (2009, p. 20).
A partir de meados da década de 1960, com os governos militares, a educação
brasileira passou a assumir alguns dos princípios da escola tecnicista, no sentido da
obrigatoriedade das escolas profissionalizantes. Esta forma de atuação tinha o intuito
de diminuir a demanda por vagas em níveis de ensino superiores, e também fornecer
mão de obra especializada para as indústrias que estavam se instalando no território
brasileiro, principalmente as do setor automobilístico. Porém, o sistema de ensino
técnico, como o esperado, não conseguiu suprir as necessidades educacionais que
lhes eram atribuídas, daí surgiu a necessidade de se construir um novo método de
ensino capaz de adequar o ensino à realidade. Neste cenário, em relação ao ensino
de história, no Brasil, desde a década de 1980 discutiam-se os procedimentos teórico-
metodológicos da disciplina escolar de história, pois desde que começou a ser
lecionada no século XIX, no Colégio D. Pedro II, foi influenciada por pressupostos
positivistas.
Com as leis 4024/61 e 5692/71, os conteúdos de história continuaram a ser
trabalhados em ordem cronológica, sendo memorizados e com a prática cívica sendo
o seu principal objetivo, e com a hegemonia dos pressupostos positivistas. O conselho
nacional de educação recomendava o ensino de história geral e do Brasil, e quando
possível o ensino de história da América. Estas medidas resultaram em um ensino de
história com uma visão eurocêntrica, que quando muito articulava a revolução
francesa e industrial com os movimentos de independência dos países da América,
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em especial o Brasil. Neste período as disciplinas de História e Geografia foram
substituídas pelos Estudos Sociais. (HORN; GERMINARI, 2010).
Gramsci (1982) contrariando os pressupostos da Escola burguesa liberal de
Adam Smith, da Escola Nova e tecnicista, defende que toda atividade humana é
intelectual e exige reflexão filosófica. Defensor da escola unitária acreditava que a
escola tinha a função de elevar as pessoas do senso comum à consciência filosófica
o que elevaria o nível cultural da população, e a formação de intelectuais. Estes
intelectuais deveriam agir em seus setores no intuito promover uma revolução
processual. Segundo Geraldo Balduíno Horn (2003) o trabalho aparece como o
princípio educativo e a escola como mediadora para socialização do saber, além de
um espaço para a transmissão de conteúdos culturais. No final dos anos 1980, esses
pressupostos embasaram a formulação de propostas curriculares em alguns estados,
inclusive o Estado do Paraná, com repercussões no ensino de história.
A partir da década de 1980, o ensino de história, passou por discussões quanto
ao seu objeto. Os pressupostos da concepção positivista da história passaram a ser
negados, e aos poucos, os historiadores foram redescobrindo o homem como agente
do processo histórico, como o principal personagem de uma história que sem sua
presença não existiria. Dessas discussões resultaram a elaboração de propostas
curriculares, baseados em concepções filosóficas diversificadas em alguns Estados
como foi o caso do Paraná, e mais tarde com a elaboração dos Parâmetros
Curriculares Nacionais, que em comum tinham a proposição de rompimento com o
ensino de história tradicional.
Apesar de todas essas mudanças ocorridas nos currículos, alguns autores
salientam que não foram suficientes para quebrar o ordenamento cronológico dos
conteúdos, pois a sólida tradição escolar de base positivista, ainda imperava. Este
cenário podia ser visualizado nos livros didáticos, por exemplo, através de um ensino
que apresenta a população brasileira como fruto da relação harmônica e não
conflituosa entre índios e negros que contribuíram na obra colonizadora/civilizatória
conduzida pelo branco português/europeu e cristão (NADAI, 2009, p. 29).
No Brasil, o ensino de história tem recebido influência dos debates acadêmicos
acerca dos aspectos teórico-metodológicos. Como já mencionado a discussão teórica
sobre os métodos da pesquisa histórica pode ser considerada uma importante
dimensão do ensino de história.
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As discussões sobre os pressupostos teórico-metodológicos da ciência
histórica e consequentemente o seu ensino na educação básica, em geral, se
direciona à análise de questões filosóficas e ou epistemológicas sobre a história, seu
objeto, o fazer científico do historiador. Percebemos que de modo geral essas
discussões tendem a opor “idealismo” x “materialismo”, “realismo” x “ceticismo”,
“racionalismo” x “irracionalismo”, “objetivismo” x “subjetivismo”. José Claudinei
Lombardi (2006) desenvolve uma discussão acerca da história e historiografia da
educação brasileira, abordando o conceito de história, e posteriormente passa a
discutir o conceito de historiografia, definindo-a como apresentado nos dicionários, ou
seja, como a arte de escrever a história, ou como estudo e análise crítica acerca da
história ou dos historiadores de forma crítica.
Adam Schaf (1986) apresenta alguns elementos sobre as três principais
concepções: o marxismo, o positivismo e o presentismo. A concepção que é
denominada como presentismo, apresenta alguns elementos de uma concepção que
outros autores costumam chamar de fenomenologia, e especificamente na produção
do conhecimento histórico tem sido mais comumente conhecida como Nova história,
ou de acordo com Ciro Flamarion Cardoso, “paradigma pós-modernismo”. Devido às
diversas denominações para esta última concepção, e levando em consideração a
complexidade das discussões sobre as mesmas, adotaremos neste trabalho a
terminologia “Nova História”, pois tem sido a mais utilizada nos estudos
historiográficos.
Iniciaremos a discussão sobre as concepções historiográficas pela concepção
hegemônica neste momento: a Nova História. A orígens da Nova História está ligada
à fundação dos Annales d’histoire économique ET sociale, pelos historiadores Marc
Bloch e Lucien Febreve, em 1929. Em torno desta revista se formou um movimento
chamado de Escola dos Annales. A trajetória da revista geralmente é dividida em três
gerações, na primeira geração a revista esteve sob o comando de Marc Bloch e Lucien
Febreve; a segunda teve Fernand Brandeul, autor do clássico Mediterrâneo, como
diretor da revista, e a terceira geração tendo como um dos principais expoentes o
medievalista Jacques Le Goff. Esta é considerada a mais diversificada das gerações,
e a que Cardoso identifica que mais se aproxima do paradigma pós-moderno.
Segundo Peter Burke (1992), a nova história é uma história a francesa, assim
como a nouvelle cuisine, nouvelle vanguard, por isso acreditamos que foi um
movimento que se consolidou na França e acabou influenciando pesquisadores de
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vários países, inclusive no Brasil. Muito tem-se discutido sobre esse movimento
historiográfico, o que se tem de consenso, no entanto é a sua heterogeneidade. Desde
suas origens as abordagens de temáticas e os objetivos variaram bastante, por
exemplo, na primeira geração. Segundo Burke (1991), o principal objetivo era fazer a
contraposição à historiografia tradicional, com críticas fortes à temática política. Na
segunda geração podemos destacar a preocupação com os níveis de temporalidade,
com a preocupação com espaço geográfico. Na terceira geração a principal
preocupação, pelo menos ao que nos parece, são os procedimentos da pesquisa
histórica, ou seja, com a forma e não como o conteúdo do conhecimento produzido.
A Nova História se baseia no princípio que algumas teorias surgem em determinados
momentos como as “salvadoras da pátria”, solucionam determinados problemas, e de
repente começam a ser aplicados na tentativa de solucionar todos os problemas do
mundo. Com o passar do tempo percebe-se que essas teorias são incapazes de
realizar toda a sua ambição de redenção global e social da humanidade. Esse é um
discurso que pode caracterizar a nova história, ou seja, um discurso em oposição às
teorias globais.
A Nova História pode ser caracterizada pela “morte dos centros” e pela
incredulidade em relação às metas narrativas. Os seguidores desse paradigma
acreditam que qualquer teoria social global é insustentável. Este movimento tende a
transformar o particular, o microscópico, o fragmentário, a ideia, a subjetividade como
completude em si mesma, reivindicando ao particular status próprio – mas não
necessariamente científico.
Segundo seus críticos, para entendermos este movimento historiográfico é
necessário levar em consideração as formas de validação do conhecimento, pois
todas as formas são aceitáveis se satisfazerem aos critérios de validação, do que
Michel de Certeau denominou de seus pares. As posições variam da subjetividade de
um autor à do leitor, o que se tem é um processo de hermenêutico de interpretação.
Para a Nova História o conhecimento humano em todas as suas formas tem a ver com
linguagens e processos de significação. Nesse aspecto a Nova História recebem as
maiores críticas de seus adversários, pois este posicionamento implica um excessivo
relativismo.
Segundo Cardoso (1997), esse movimento historiográfico é o resultado da
trajetória individual de intelectuais da geração de 1968, que desiludidos abandonaram
as esperanças da transformação social global e assumem frentes de luta ou
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reivindicações (movimento gay, feminista, ambientalista, movimento negro, indígena).
Há um desejo na nova história de ser a porta voz do homem comum, das ruas, das
massas inarticuladas, e preferem enfocar as minorias discriminadas às exploradas.
Os historiadores adeptos da Nova História são constantemente acusados de
indiferença quanto às questões teórico-metodológicas. Pois segundo Geertz (2008)
para se entender o que é ciência não se deve olhar para as teorias ou as suas
descobertas e nem para o que os seus apologistas dizem sobre elas, mas se deve ver
o que os seus praticantes fazem, isto é, na valorização da forma sobre o conteúdo.
Com abordagens inclinadas para os temas econômicos e sociais, a primeira
geração da Revista dos Annales propunha a superação da história narrativa
cronológica, voltada para biografias e temas políticos2. A inclinação dos Annales pela
temática econômica segue a tendência dos estudos nas ciências sociais, pois a
década de 1920 foi dominada por “temas econômicos”.
Para os historiadores dos Annales ao discutirem o conceito de história,
definiramna como a ciência dos homens no tempo. Portanto, “[...] o bom historiador
se parece com o ogro da lenda. Onde fareja carne humana, sabe que ali está a sua
caça. ” (BLOCH, 2001, p. 54). Além de ter a humanidade como objeto de estudo a
história na perspectiva dos Annales tem a temporalidade como uma das principais
categorias de análise. Marc Bloch (2001) discute a imparcialidade histórica e a história
como tentativa de reprodução ou como tentativa de análise. Em sua análise o
historiador deve superar os pressupostos em que o cientista é convidado a se ofuscar
dos fatos, porém, sem cair no julgamento. Segundo o autor, por muito tempo os
historiadores foram os juízes do tempo, absolvendo e condenando os heróis e vilões
do passado. O historiador deve compreender os fatos, e compreender não significa
ser passivo, significa análise.
Portanto para o autor, o historiador não é imparcial, pois não consegue realizar
sua análise sem se pautar em pressupostos e valores que não dependam de uma
ciência positiva.
Cardoso (1997) sintetiza as principais características dos Annales como a
crença no caráter científico da história; debate crítico com as ciências sociais, sem
reconhecer fronteiras entre elas; ambição de formular uma síntese global do social;
abandono da história centrada em fatos isolados e também abertura para aspectos
coletivos; ênfase menor nas fontes escritas; níveis de temporalidades; preocupação
com o espaço; história vista como ciência do passado e do presente ao mesmo tempo.
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Como dito acima a nova história buscou a superação dos pressupostos que
caracterizam o positivismo3. “Sua maior contribuição à história foi a introdução de
conceitos, métodos e modelos das ciências naturais na investigação social, e a
aplicação à história, conforme parecessem adequadas, das descobertas nas ciências
naturais. ” (HOBSBAWN, 1998, p.158).
Para Hobsbawn (1998) o positivismo pode ser considerado como uma resposta
à filosofia estritamente idealista como a de Hegel e Kant. Percebemos que se coloca
no oposto à especulação pura e baseia seu objeto nos fatos e na experiência. Nesta
concepção a experiência é a fonte e critério de verdade, ou seja, nada pode ser
considerado para além da experiência, dos fatos concretos. O objetivo do
conhecimento científico é descobrir a regularidade dos fenômenos e como as leis
manifestam. Nesta concepção filosófica não há espaço para a subjetividade, ou seja,
rejeita todo o conhecimento metafísico. Por isso as pesquisas positivistas são em
geral quantitativas, ou seja, utilizam-se largamente da matemática para a
quantificação, mensuração, inferência estatística, probabilidade.
De acordo com Cardoso (1997), a temática do debate epistemológico da
produção do conhecimento histórico pode ser abordada a partir de dois grupos: o
Paradigma Iluminista ou moderno e o Paradigma Pós-moderno. No Paradigma
Iluminista ou moderno estão inseridas as abordagens marxistas e a Escola dos
Annales (no período de 1929-1969, pois o autor considera que após este período a
revista sofreu modificações substanciais e passou orientar-se para os enfoques do
paradigma pós-moderno), as quais durante décadas se opuseram com bastante
sucesso ao historicismo e ao método estritamente hermenêutico. Os integrantes
desses grupos tiveram o domínio, mas não total, nos estudos históricos entre os anos
de 1950 a 1968. A produção do conhecimento histórico dessas duas vertentes se
caracterizava por serem racionais e científicas, e são oriundas de tendências
filosóficas do século XVIII e XIX. Trata-se de uma história analítica, estrutural e
explicativa e apresentam-se como modelos macro históricos e teorizantes.
No marxismo pretende-se reunir ao mesmo tempo os enfoques genético e
estrutural das sociedades, ou seja, ter uma visão da totalidade e dinâmica da
sociedade. Não se trata de ver a floresta e esquecer as árvores, (como é
constantemente acusada), pois, como demonstrou Marx no método da economia
política, o real e o imediato fazem parte do mundo das aparências, e que a essência
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do objeto pode ser alcançada, fazendo-se o dessecamento do objeto, pois este é o
conjunto de múltiplos determinantes.
A produção do conhecimento baseada no MHD a relação sujeito/objeto é
baseada num modelo diferente tanto daquele em que o sujeito do conhecimento se
apresenta como passivo, limitado a refletir a realidade exterior, quanto do que limita
ao sujeito o aspecto ativo no processo do conhecimento. Partindo deste pressuposto
entendemos que no caso do ensino de história, o passado é visto como algo que não
pode ser modificado, no entanto, ocorrem transformações na forma como o
entendemos, baseados nas condições dadas em determinado momento. Assim a
teoria marxista do conhecimento caracteriza uma vinculação epistemológica dialética
entre o passado e o presente.2
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Nessa perspectiva, o ensino-aprendizagem da História Local configura-se
como um espaço-tempo de reflexão crítica acerca da realidade social e, sobretudo,
referência para o processo de construção das identidades destes sujeitos e de seus
grupos de pertença.
O ensino de História Local ganha significado e importância no ensino
fundamental, exatamente pela possibilidade de introduzir a formação de um raciocínio
de história que contemple não só indivíduo, mas a coletividade, apresentado as
relações sociais que ali se estabelecem na realidade mais próxima.
A História Local possibilita a compreensão do entorno do aluno, identificando
passado e presente nos vários espaços de convivência. Essa temática permite que o
professor parta das histórias individuais e dos grupos, inserindo o aluno em contextos
mais amplos.
Com a abordagem da História Local os alunos passam gradativamente a
observar e perceber o significado de outras matérias construídas no passado; a
compreender que as realidades históricas de determinada localidade e de seus
habitantes no tempo não se dão isoladas do mundo, mas como parte do processo
histórico em que populações locais constroem suas identidades culturais e sociais;
que estas identidades são diversas, mas todas merecem respeito.
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Os PCN (1997) têm também como pressuposto que o aluno pode apreender a
realidade na sua diversidade e nas múltiplas dimensões temporais. Destacam os
compromissos e as atitudes de indivíduos, de grupos e de povos na construção e na
reconstrução das sociedades, propondo questões locais e regionais.
Há também nos PCN uma forte ênfase na questão dos sujeitos históricos,
colocando como objetivo da educação esta construção, valorizando o papel de cada
um na construção da história de todos, possibilitando que a memória também possa
ser um instrumento para esta construção, quando diz que “O sujeito histórico pode ser
entendido, por sua vez, como sendo os agentes de ação social, sendo eles indivíduos,
grupos ou classes sociais”.
Para o ensino fundamental a LDB (1996, pág.17) em seu Artigo 22, estabelece
que:
A educação básica tem por finalidade desenvolver o educando, assegurar-lhe
a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornece-lhe meios
para progredir no trabalho e em estudos posteriores. (Lei nº 9.394/96)
Esta lei vem reforçar a importância de um ensino de História que valoriza o
senso crítico de seus alunos.
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5 VALORIZANDO O COTIDIANO NO ENSINO DE HISTÓRIA
Fonte:tattletot.com
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Uma articulação dessa natureza requer concepção de cotidiano que não se
apresente como mera motivação para o estudo do passado, selecionando as
experiências amorosas de reis e rainhas ou o dia a dia de pessoas comuns ou
famosas pautados por meras descrições curiosas e desligados do contexto social da
existência desses indivíduos.
A História do Cotidiano tem-se convertido em uma das correntes assumidas
por gerações de historiadores preocupados com uma história social capaz de
redimensionar a visão política. Historiadores inspirados nos pressupostos marxistas,
como Agnes Heller e E. Thompson, em suas reflexões reconheceram a necessidade
dos estudos do cotidiano a fim de fazer emergirem as tensões sociais do dia a dia, as
formas improvisadas de lutas, de resistência e de organizações diferentes das
estabelecidas pelo poder institucional.
O cotidiano pode ser utilizado como objeto de estudo escolar pelas
possibilidades que oferece de visualizar as transformações realizadas por homens
comuns, ultrapassando a ideia de que a vida cotidiana é repleta e permeada de
alienação. Perceber o cotidiano como espaço privilegiado das transformações
históricas também possibilita que os alunos percebam a si mesmos como sujeitos da
História. A opção pela História do Cotidiano merece uma reflexão a respeito de seus
pressupostos, para uma seleção de conteúdos coerentes com os objetivos centrais
da disciplina.
O tema “cotidiano” tem grande importância na área de História, pois o cotidiano
estabelece articulações com as grandes estruturas do poder políticas e econômicas.
Seu estudo possibilita que as tensões do dia possam emergir, dando voz a atores
sociais tradicionalmente excluídos e marginalizados, o que permite uma maior
compreensão das estruturas sociais e suas transformações.
De acordo com Bittencourt (apud SILVA, s/d), a História do Cotidiano pode ser
bastante útil em sala de aula, servindo como suporte fundamental para se
reconsiderar o papel dos agentes sociais nas transformações históricas, levar à
reflexão sobre a atuação dos sujeitos neste processo e rever concepções de tempo
histórico.
Para a autora, a História do Cotidiano deve ser utilizada como ferramenta no
ensino de História para romper a periodização clássica que consagra a ideia de
evolução e de progresso, sequência de eventos vitoriosos de determinados sujeitos,
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o que acaba por fomentar a existência de hierarquias de valores entre as sociedades
humanas.
Esta preocupação é também demonstrada por Le Goff (1997), para quem o
cotidiano só tem valor histórico e científico no interior de uma análise de sistemas
históricos que contribuem para explicar seu funcionamento, não se tratando de uma
simples descrição de determinada sociedade numa época qualquer, tampouco de
privilegiar histórias individuais.
Vários historiadores perceberam que o cotidiano não era apenas o lugar das
pessoas comuns, mas também poderia ser considerado lugar de resistência e
mudanças, exercendo papel central no acontecer histórico. O cotidiano estabelece
articulações com as grandes estruturas de poder, políticas e econômicas. Seu estudo
possibilita que as tensões e lutas do dia a dia possam emergir, dando voz a atores
tradicionalmente excluídos e marginalizados, o que permitiria uma maior
compreensão das estruturas sociais e suas transformações.
O cotidiano está relacionado com a possibilidade de que os alunos possam
perceber como suas vidas fazem parte da História como um todo. Nesse sentido, de
acordo com as expectativas de aprendizagem, é necessário “perceber criticamente os
vínculos entre história de vida e história”. A percepção é crítica e essencial para
perceber não apenas essa relação, mas entender os processos que estabeleceram
as articulações, entendendo sua produção social.
O ponto de partida para perceber esse vínculo é “analisar as relações entre
história de vida e história, compreendendo-se como sujeito da história”. As
expectativas estabelecem as articulações entre a vida dos alunos (experiência) e a
compreensão de contextos históricos diversos (perspectiva histórica). O eixo cotidiano
pode ser importante nesse sentido.
O tema cotidiano tem abrangência inusitada, colocando o homem no centro do
acontecer histórico, como aponta Agnes Heller (2008, p.17): A vida cotidiana é a vida
do homem inteiro; ou seja, o homem participa na vida cotidiana com todos os aspectos
de sua individualidade, de sua personalidade. Nela, colocam-se ‘em funcionamento’
todos os seus sentidos, todas as suas capacidades intelectuais, suas habilidades,
seus sentimentos, paixões, ideias, ideologias.
De acordo com Duarte (1993) baseado em Heller, “as atividades cotidianas do
indivíduo referem-se ao conjunto de atividades que caracterizam a representação de
cada indivíduo a partir da reprodução da sociedade”.
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Nessa ideia insere-se o conceito, que se apresenta na linguagem e nos
costumes. Outro conceito importante refere-se à formação de uma relação consciente
do indivíduo com sua vida cotidiana.
Nesse sentido, o cotidiano não pode ser entendido isoladamente. Aspectos
cotidianos e não cotidianos se interpenetram na realidade social. O objetivo não é
tratar de temas da vida cotidiana de forma isolada, mas articulados aos processos
históricos gerais.
Nas relações entre cotidiano e história, é necessário ter cuidado com a
abordagem do lado “pitoresco” da História. É preciso tratar do cotidiano em sua íntima
relação com as questões culturais, econômicas, sociais e políticas de cada época e
sociedade.
O cotidiano não é apenas a simples repetição do dia a dia de pessoas comuns.
Ele constitui a instância onde as relações sociais se realizam de forma concreta; a
dimensão na qual as práticas sociais assumem corpo e efeito dando formas aos
interesses em jogo.
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A História, como memória, também é uma representação do passado, porém
suas características a diferenciam, às vezes provocando um grave afastamento das
duas – memória e História.
A distinção entre memória e história, portanto, existe no próprio meio em que
ambas se propagam: a memória se propaga e se corporifica no mundo da via; a
História tem seu habitat na historiografia.
Um compromisso fundamental da história encontra-se na sua relação com
memória. É necessário chamar a atenção dos alunos para os usos ideológicos a que
a memória histórica está sujeita que muitas vezes constituem “lugares de memória”,
estabelecidos pela sociedade e pelos poderes constituídos, que escolhem o que deve
ser preservado e relembrado e o que deve ser silenciado e “esquecido”.
Enfatiza-se também a riqueza que o conceito de memória vem adquirindo no
âmbito da história. Evidencia-se, por exemplo, que os lugares da memória são
criações da sociedade contemporânea para impor determinada memória, que a
concepção de memória nacional ou identidade regional constitui formas de violência
simbólica que silenciam e uniformizam a pluralidade de memórias associadas aos
diversos grupos sociais.
Evidencia-se também o estudo da memória enquanto prática de representação
social e, portanto, para o estudo das formas de regaste de memórias coletivas durante
tempo esquecidas no espaço público pela memória oficial.
A ‘Memória’, no se sentido primeiro da expressão, é a presença do passado. A
memória é uma construção que acarreta de fato uma representação seletiva do
passado, que nunca é somente aquela do indivíduo, mas de um indivíduo inserido
num contexto familiar, social e nacional.
Conforme Peter Burke (2000), os historiadores se interessam ou precisam se
interessa pela memória, considerando dois pontos de vista: como fonte histórica e
como fenômeno histórico.
Sob o primeiro aspecto, além de estudarem a memória como fonte para a
história, os historiadores devem elaborar uma crítica da reminiscência, nos moldes da
operação de análise dos documentos históricos.
No que tange ao segundo aspecto, os historiadores devem estar interessados
no que o autor denomina “história social do lembrar”. Partindo-se da premissa de que
a memória social, como a individual, é seletiva, faz-se necessário identificar os
28
princípios de seleção e observar como os mesmos variam de lugar para lugar, ou de
um grupo para o outro e como se transformam na passagem do tempo.
Para Michael Pollak, a memória é um elemento constituinte do sentimento de
identidade, tanto individual quanto coletivo, na medida em que ela é também um fator
extremamente importante do sentimento de continuidade e de coerência de uma
pessoa ou de um grupo em sua reconstrução de si.
Pollak, Buker e Le Goff reforçam a importância do conhecimento histórico para
uma maior compreensão das identidades individuais e coletivas.
De acordo com Peter Buker (2000, pág.70), os indivíduos identificam-se com
os acontecimentos públicos relevantes para o seu grupo: “Lembram muito que não
viveram diretamente. Um artigo de noticiário, por exemplo, às vezes se torna parte da
vida de uma pessoa. Daí pode-se descrever a memória como uma reconstrução do
passado”.
Conforme Jacques Le Goff (1994) deve haver um vínculo entre a história e a
memória:
A memória, onde cresce a história, que por sua vez a alimenta, procura salvar
o passado para servir o presente e o futuro. Devemos trabalhar de forma que a
memória coletiva sirva para libertação e não para a servidão dos homens (pág.477).
Resgatar memórias por meios dos monumentos, histórias de seus moradores,
e pelos próprios acontecimentos locais. Para Circe Bittencourt (2004, pág.168), “a
memória é, sem dúvida, aspecto relevante na configuração de uma história local tanto
para historiadores quanto para o ensino”.
A história, para Le Goff (ibidem) “consiste na escolha e construção de um
objeto, operação que pode dar-se a partir de evocações de lembranças”, e exige, na
análise das memórias, um rigor metodológico na crítica e na confrontação com outros
registros e testemunhos.
Conforme Montenegro (2001) a memória tem como característica fundante o
processo relativo que a realidade provoca no sujeito. Ela se forma e opera a partir da
reação, dos efeitos, do impacto sobre o grupo ou o indivíduo, formando um imaginário
que se constituiu em uma referência permanente de futuro. (pág.19).
Estes autores acima citados demonstram ser fundamental a valorização da
memória como forma de recuperar a história de vida individual e coletiva.
A questão da memória impõe-se por ser base da identidade, e é pela memória
que se chega à história local. Além da memória das pessoas, escrita ou recuperada
29
pela oralidade, existem “lugares da memória”, expressos por monumentos, praças,
edifícios públicos ou privados, mas preservados como patrimônio histórico. Os
vestígios do passado de todo e qualquer lugar, de pessoas e de coisas, de paisagens
naturais ou construídas tornam-se objeto de estudo.
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Um cuidado que se deve ter com o estudo da história local é a identificação do
conceito de espaço. É comum falar em História Local como a história do entorno, do
mais próximo, do bairro ou da cidade. Cada lugar tem suas especificidades e precisa
ser entendido por meio da série de elementos que o compõem e de suas funções.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais de História, para o 1º e 2º Ciclos,
destacam a importância de conhecer as características dos grupos sociais de seu
convívio diário, para que ampliem estudos sobre o viver de outros grupos da sua
localidade presente, identificando as semelhanças e as diferenças existentes entre os
grupos sociais e seus costumes.
Já os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental (1998),
em suas séries iniciais valoriza o estudo da localidade:
A preocupação com os estudos de história local é a de que os alunos ampliem
a capacidade de observar o seu entorno para compreensão de relações sociais e
econômicas existentes no seu próprio tempo e reconheçam a presença de outros
tempos no seu dia-a-dia. (pág.40)
Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, na área de
história, recentemente divulgados (1997 e 1998), foram construídos a partir de uma
ótica que devem ser tomados como referência para trabalhar a experiência e os
contextos mais amplos:
O ensino e aprendizagem de História estão voltados, inicialmente, para
atividades em que os alunos possam compreender as semelhanças e as diferenças,
as permanências e as transformações do modo de vida social, cultural e econômico
de sua localidade, no presente e no passado, mediante a leitura de diferentes obras
humanas. (Brasil/MEC/SEF, pág.49)
De acordo com o PCN: Os estudos da história local conduzem aos estudos de
diferentes modos de viver no presente em outros tempos, que existem ou que
existiram no mesmo espaço. Nesse sentido, a proposta, o estudo histórico é de
favorecer o desenvolvimento das capacidades de diferenciação e identificação, com
a intenção de expor as permanências de costumes e relações sociais, as mudanças,
as diferenças e as semelhanças das vivências coletivas, sem julgar grupos sociais.
Classificando-os como mais evoluídos ou atrasados. (Brasil/MEC/SEF, pág.52).
A História Local foi valorizada também como estudo do meio, ou seja, “como
recurso pedagógico privilegiado [...] que possibilita aos estudantes adquirirem,
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progressivamente, o olhar indagador sobre o mundo de que fazem parte”, segundo os
Parâmetros Curriculares Nacionais, (1998, pág. 9).
Estes parâmetros contribuem para o desenvolvimento de metodologias e
estratégias para uma maior compreensão da História Local.
A História Local permite ao educando perceber-se como sendo parte integrante
da história, não simples espectador do ensino desta, mas objeto e sujeito, construtor
de fatos e acontecimentos que não lineares, mas permeados de descontinuidades
próprias do processo histórico.
Enquanto estratégia de aprendizagem, a História Local, pode garantir o domínio
do conhecimento histórico. Seu trabalho no ensino possibilita a construção de uma
História mais plural, que não silencie a multiplicidade das realidades.
Para ensinar História a partir da experiência de vida do aluno, é necessária uma
perspectiva teórico-metodológica que fale da vida das pessoas, das memórias e
lembranças dos sujeitos de todos os segmentos sociais. É preciso dar voz a histórias
desses sujeitos que sempre estiveram excluídos dos conteúdos ensinados.
O trabalho com a História Local no ensino da História facilita, também, a
construção de problematização, a apresentação de várias histórias lidas com base em
distintos sujeitos da história, bem como de histórias que foram silenciadas, isto é, que
não foram institucionalizadas sob a forma de conhecimento histórico. Ademais, esse
trabalho pode favorecer a recuperação de experiências individuais e coletivas do
aluno, fazendo-o vê-las como constitutivas de uma realidade histórica mais ampla e
produzindo um conhecimento que, ao ser analisado e retrabalhado, contribui para a
construção de sua consciência histórica.
Como elemento constitutivo da transposição didática do saber histórico para o
saber escolar, a História Local pode ser vista como estratégia pedagógica. Trata-se
de uma forma de abordar a aprendizagem, a construção e a compreensão do
conhecimento histórico com proposições que podem ser articuladas com os interesses
do aluno, suas aproximações cognitivas, suas experiências culturais e com a
possibilidade de desenvolver atividades diretamente vinculadas à vida cotidiana.
De acordo com Neves (1997, pág.7), “[...] a construção do conhecimento a
partir da vivência, portanto, do local e do presente, é a melhor forma de superar a falsa
dicotomia entre a produção e a transmissão, entre pesquisa e o ensino/divulgação,
enfim, entre o saber e o fazer”.
32
A partir destas novas perspectivas historiográficas encontram-se também as
preocupações da utilização da História Local no ensino de História. Para Proença
(1990, pág.139): “Assiste-se presentemente ao desenvolvimento de uma História
Local que visa tirar partido das novas metodologias e cujos temas poderão ter um
aproveitamento didático motivador e estimulante”.
Segundo Giroux e Simon (1994, pág.99), são abordagens desse tipo que
apresentam um ganho pedagógico para os estudantes ao tornar disponíveis “aquelas
narrativas, histórias locais e memórias que foram excluídas e marginalizadas nas
interpretações dominantes da história”.
O novo interesse da História Local volta-se para uma abordagem social que
procura reconstruir as condições de vida dos diversos grupos sociais de uma
determinada localidade. Como afirma Goubert (1998, pág.73.): “A volta à História
Local origina-se de um novo interesse pela História Social – ou seja, a história da
sociedade como um todo”.
Para Neves, Proença, Giroux, Simon e Goubert, é relevante que o ensino de
História forneça estratégias teórico-metodológicas para o desenvolvimento em sala
de aula que valorizem a história de vida de seus alunos.
É preciso destacar que a utilização da história local como estratégia pedagógica
é uma maneira interessante e importante para articular os temas trabalhados em sala
de aula. O papel do ensino de História na configuração identitária dos alunos é um
dos aspectos relevantes para considerar ao proporem-se estudos da história local.
Para efetivar o estudo do local, a proposta fundamenta-se na história do
cotidiano e apropria-se de seus métodos, como objetivo de inserir as ações de
pessoas comuns na constituição histórica e não exclusivamente as ações de políticos
e das elites sociais.
A História Local no ensino não deve ser tratada apenas como um conteúdo a
ser ensinado, mas constituir-se em uma estratégia pedagógica que trate
metodologicamente os conteúdos a partir da realidade local. Ela deve ser escrita a
partir das novas fontes: a identificação das edificações antigas, do traçado das ruas,
da memória dos mais antigos, das mudanças do cotidiano urbano que só podem ser
observadas pelos olhares mais atentos ou orientados.
Seu estudo constitui o ponto de partida da aprendizagem histórica, uma vez
que permite a abordagem dos contextos mais próximos em que se inserem as
relações sociais entre os professores, os estudantes e o meio. Nessa perspectiva, o
33
ensino-aprendizagem da história local configura-se como um espaço-tempo de
reflexão crítica acerca da realidade social e, sobretudo, referência para o processo de
construção das identidades destes sujeitos e de seus grupos de pertença.
A história do “lugar” como objeto de estudo ganha, necessariamente, contornos
temporais e espaciais. Não se trata, portanto, ao se proporem conteúdos escolares
da história local, de entendê-los apenas na história do presente ou de determinado
passado, mas de procurar identificar a dinâmica das transformações do espaço e
articular esse processo às relações externas, a outros “lugares”.
Devemos valorizar a memória dos sujeitos históricos que constroem suas
histórias diariamente, pois o ensino de História Local permite que possamos dar vozes
àqueles autores que estiveram marginalizados pela História Oficial.
O ensino de História tem como principal pressuposto formar cidadãos que
possam ser críticos com a realidade na qual estão inseridos, devido ao fato de que
seus conceitos e conteúdos possam fazer com que os alunos debatam sobre o que
está acontecendo não somente sobre o passado, mas também sobre o presente.
É necessário que o ambiente escolar forneça condições para que os
professores possam desenvolver novas metodologias para que incorporem os
conteúdos de história local em seus componentes curriculares, pois poderão inserir
seus alunos como cidadãos críticos no ambiente em que vivem.
Como educadores, temos a responsabilidade de ensinar uma História que faça
parte do dia a dia do aluno, pois somente assim o ensino de História para eles, terá
outro significado e sua aprendizagem será reconhecida por todos.3
3
Extraído do link: meuartigo.brasilescola.uol.com.br
34
BIBLIOGRAFIA
BURKE, Peter. “História Como Memória Social”. In: Variedades de História Cultural.
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000.
CERRI, Luis Fernando; FERREIRA, Angela Ribeiro. Notas sobre a demanda sociais
de representação e os livros Didáticos de História. IN: O livro Didático de História:
políticas educacionais, pesquisa e ensino. (ORG) Margarida Maria Dias de Oliveira
e Maria Inês Sucupira Stamatto. EDUFRN, Natal: 2007.
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