Literatura de Cordel
Literatura de Cordel
Literatura de Cordel
Ministério da Cultura
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
CENTRO NACIONAL DE FOLCLORE E CULTURA POPULAR
Divisão de Pesquisa do Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular
Em função do apoio oferecido pelo Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular (CNFCP)
desde a solicitação do registro, foram realizadas, em 2011, duas reuniões entre técnicos do
CNFCP e representantes da Academia Brasileira de Literatura de Cordel (ABLC), proponente
do pedido, além de Mônica da Costa, da Superintendência do Iphan no Rio de Janeiro. Foi
apresentado um panorama geral da política do PCI e discutidos os esforços envolvidos na
instrução técnica do processo. Para a segunda reunião, a ABLC aceitou a proposta do
CNFCP de convidar pesquisadores especializados em literatura de cordel para ajudar a
delimitar o recorte do bem, de grande complexidade, e determinar os sítios a serem
inventariados, já que a prática da poesia de cordel ocorre em vasta extensão do território
nacional. Contou-se então com as presenças de Vicente Salles, Bráulio do Nascimento e do
etnomusicólogo Edilberto Fonseca.
O plano de trabalho que foi esboçado nas reuniões especificava cinco regiões para o
levantamento preliminar: Juazeiro do Norte, Mossoró, Campina Grande, Caruaru e o eixo
Rio-SP-MG-Brasília. Cada núcleo no Nordeste cobriria seus arredores e estados vizinhos.
Todos concordaram com a configuração geral do território preliminar, tendo sido ressaltado
que as localidades escolhidas eram as mais dinâmicas.
Por fim, em 2013, o Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular contou com recursos
provenientes da emenda parlamentar 27840004, de autoria do Deputado Federal Jean
Wyllys/PSOL/RJ, voltada para apoio às atividades relacionadas à instrução técnica do
processo de registro da Literatura de Cordel como Patrimônio Cultural do Brasil.
Assim, o inventário da Literatura de Cordel foi realizado entre 2013 e 2017, supervisionado
pelo Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular, sendo documentada a descrição
detalhada do que os detentores consideram literatura de cordel. Especificou-se as práticas
A Prof. Dra. Rosilene Melo, consultora contratada para coordenar os conteúdos da pesquisa,
apresentou um mapeamento inicial dos acervos, instituições, detentores e pesquisadores
de cordel encontrados em cada estado das superintendências representadas na reunião. Os
técnicos participantes contribuíram com informações importantes para atualização e
complementação dos dados e fizeram sugestões sobre o acompanhamento de festivais,
programas de rádio e eventos que acontecem em seus estados.
A enorme difusão da literatura de cordel pelo território brasileiro requeria uma metodologia
de pesquisa que compreendesse sua diversidade e fosse exequível dentro dos limites da
pesquisa, sem expectativa de um inventário exaustivo, que cobrisse todas as localidades
onde essa prática é encontrada. Optou se então pela metodologia da História Oral, em
amplo diálogo com os praticantes em atuação na contemporaneidade.
Numa segunda frente de trabalho de campo, foram realizados três grandes encontros de
mobilização (em Brasília, no Rio de Janeiro e no Crato) e rodas de conversa com pequenos
grupos de detentores em diversas localidades, possibilitando a participação dos detentores
na construção coletiva da descrição da prática cultural, de suas matrizes históricas e
normativas, assim como do estado da arte na atualidade. Desse modo, foi possível contar
também com a colaboração substantiva de representantes de editoras, de pontos de
Por fim, em uma terceira frente de trabalho, a pesquisa documental buscou mapear os
acervos, fontes e documentos de referência que pudessem subsidiar a dimensão histórica
da literatura de cordel, tanto no que diz respeito à sua presença no Brasil quanto às
influências que amalgamaram uma criação poética peculiar.
Considerando que todos os requisitos para o Registro de um bem cultural como Patrimônio
Cultural do Brasil estão devidamente presentes nesse processo, em conformidade com o
Decreto nº 3551/2000 e a Resolução nº 001/2006, a solicitação do Registro está em condições
de ser submetida à apreciação e deliberação do Conselho Consultivo.
O Objeto de Registro
De modo geral, as pequenas brochuras impressas em papel barato eram colocadas à venda
em feiras e mercados penduradas em cordões. Portanto, a expressão literatura de cordel
significava inicialmente muito mais um modo de exposição para venda do que
propriamente um gênero literário. Por extensão, passou a se referir a edições de baixo custo
Parecer Técnico 1 (0573749) SEI 01450.008598/2010-20 / pg. 8
e adaptações de narrativas orais, peças de teatro e obras manuscritas para um público
pouco familiarizado com a escrita.
O dossiê descritivo destaca que, em Portugal, a expressão literatura de cordel foi empregada
a partir de 1865, quando o ensaísta Teófilo Braga a associou ao gênero de livros que
adaptavam o repertório de narrativas orais, relatos de acontecimentos, romances medievais
e canções de gesta.
A expressão literatura de cordel passou a ser empregada no Brasil em fins da década de 50,
quando o pesquisador francês Raymond Chantel, em artigos publicados e nas palestras e
conferências proferidas em instituições acadêmicas brasileiras, associou a poética brasileira
à dita literatura europeia em cordel. Essa expressão ganhou corpo e hoje em dia é
reconhecida, pelos detentores, como a que propriamente nomeia as composições em versos
de que trata a instrução deste processo.
A literatura oral e a poesia popular foram objeto de estudos sistemáticos desde o final do
século XIX, no âmbito do movimento folclórico brasileiro. Sílvio Romero definiu os folhetos
c o m o livretos de rua, identificando influências ibéricas, africanas e indígenas nas
composições poéticas. Em decorrência do Movimento Modernista de 1922 e a Missão de
Pesquisas Folclóricas de Mário de Andrade, o empenho em reconhecer, valorizar e
documentar as práticas culturais no Brasil tomou o folclore como categoria conceitual para
registrar um conjunto de crenças, costumes, folguedos, danças, músicas, celebrações, ao
lado das narrativas orais, cantorias e poesia popular.
O folclore como categoria conceitual nos estudos sobre a literatura de cordel contribuiu
para defini-la como expressão literária coletiva e anônima, em moldes semelhantes ao que
ocorria com o artesanato, por exemplo. Naquele contexto, a identificação de autoria, tanto
de poetas quanto de artesãos, não era considerada necessária ou mesmo viável, em função
de um repertório coletivo e tradicional de estilos, padrões e matrizes a que os artistas
recorriam. Ao longo do dossiê descritivo, a problematização da atribuição de autoria e a
A rima guarda estreita relação com a sonoridade das palavras. Embora a literatura de cordel
e a cantoria sigam regras semelhantes de versificação - uma das proximidades entre essas
manifestações - a literatura de cordel exige que as vogais e consoantes do final das palavras
rimadas sejam idênticas. No caso da cantoria, é possível admitir-se que apenas as vogais
sejam idênticas.
1. Parcela – versos de 4 a 5 sílabas. As parcelas foram muito utilizadas nas pelejas dos
repentistas e transmitidas para os folhetos impressos. A parcela visava ser cantada em
ritmo extremamente veloz com o objetivo de fazer o oponente errar a métrica ou a
rima e perder a peleja.
2. Quadra – estrofes de 4 versos com 7 sílabas, em um esquema de rimas no qual o
primeiro e o terceiro versos são livres enquanto que o segundo e o quarto rimam entre
si.
3. Sextilha – estrofes de 6 versos de 7 sílabas. A modalidade que se tornou a mais
utilizada pelos poetas hoje. Na forma mais comum, os versos ímpares são livres e os
versos pares rimam entre si, um estilo denominado ‘aberto’. No estilo ‘fechado’, os
versos ímpares rimam entre si e os versos pares também.
4. Setilha – estrofes de 7 versos com 7 sílabas.
5. Oitavas ou quadrão – estrofes de 8 versos de 7 sílabas, em um esquema de rima
bastante mais complexo. Os três primeiros versos rimam entre si, o quarto e o quinto
rimam com o oitavo, o sexto e o sétimo rimam entre si.
6. Décimas – estofes de 10 versos com 7 sílabas. O primeiro, o quarto e o quinto rimam
entre si; o segundo e o terceiro também; o sexto e o sétimo rimam com o décimo; o
oitavo e o nono rimam entre si.
7. Martelo agalopado – estrofes com 10 versos de 11 sílabas
8. Galope à beira-mar, estrofes com 10 versos de 11 sílabas em que o último verso acaba
com a expressão ‘beira-mar’
9. Alexandrinos – estrofes acima de 10 versos. São os mais longos e os menos comuns.
Nesse sentido, os embates travados quanto às formas corretas de rima e métrica são
O paraibano Leandro Gomes de Barros (1865-1918) foi o primeiro poeta a conciliar sua
atividade como autor e como editor de folhetos ao instalar a Tipografia Perseverança em
Recife.
Os poetas utilizam dois termos distintos para classificar os folhetos de acordo com o
número de páginas da brochura. O termo “folheto” é mais recorrente quando se refere aos
poemas impressos em 4, 8 ou 16 páginas. O termo “romance” é empregado para poemas
com número superior a 16 páginas. Atualmente, a maior parte dos poemas de cordel
publicados no Brasil tem 16 páginas.
O dossiê descritivo chama atenção para a vinheta, um filamento ao longo das margens,
impresso na cor preta, cujo efeito visual direciona o olhar do leitor para o centro da página
onde se encontram as informações para os leitores. As vinhetas contribuíram para a
identidade visual dos folhetos impressos no início do século XX e permanecem como um
recurso tipográfico e estético dos folhetos de cordel publicados nas editoras nordestinas.
Segundo depoimentos de poetas no Nordeste, nos folhetos publicados pela Editora Luzeiro,
em São Paulo, as imagens das capas são ‘sangradas’, isto é, ocupam toda a extensão da
página impressa, sem a margem branca que era considerada uma das características
gráficas mais recorrentes dos folhetos. Na década de 50, a Editora Prelúdio, em São Paulo,
A última folha, ou quarta capa, pode conter outras informações pertinentes: a fotografia do
autor, o local da edição, a listagem de obras anteriores do autor, orações, recados, além de
anúncios diversos, nos moldes dos “classificados” de jornal. Além da própria fotografia do
autor impressa na quarta capa, os poetas passaram a empregar, no próprio poema, o
acróstico como mecanismo para impedir a apropriação indevida de seus poemas. O
acróstico passou a ser utilizado para que o verso somente pudesse obedecer às regras de
rima e versificação por meio da manutenção das letras iniciais do nome do autor, o que não
impediu eventuais retiradas de versos na impressão para a ocultação do autor.
As informações editoriais essenciais para os leitores - título, autor, preço e, em alguns casos,
editora/tipografia onde o folheto foi impresso - também aparecem nas capas dos folhetos.
As capas, porém, merecem um destaque à parte em função da imagem que ilustra o folheto
e que condensa a trama da narrativa.
Os primeiros folhetos eram chamados de folhetos “sem capa” ou de folhetos de “capa cega”
porque não possuíam ilustrações. Mas os poetas e editores logo passaram a aproveitar as
capas dos folhetos como um espaço privilegiado para associar o texto escrito a uma
imagem, atingindo especialmente os leitores pouco familiarizados com a escrita. A imagem
presente na capa do folheto não é uma mera ilustração do texto, mas tem função
mnemônica, condensando a narrativa, e função metafórica, multiplicando sentidos e
significados que abarcam a observação do cotidiano e da vida social.
As imagens encontradas nas capas dos folhetos, ao longo de mais de 100 anos, constituem
uma memória visual da literatura de cordel no Brasil, numa trajetória estética e imagética
singular, especialmente após a introdução da xilogravura como técnica de ilustração.
Nas pequenas tipografias do interior, o alto custo das pedras calcárias utilizadas na
impressão litográfica e da zincogravura fomentou o uso da xilogravura que acabou
conferindo uma identidade visual ao folheto de cordel. Do ponto de vista técnico, a
xilogravura é descrita com um desenho escavado na madeira, em que o escavado é o branco
e o preto é o alto relevo. As superfícies de entalhe, os tacos, são obtidas da madeira de
espécies nativas, cedro, jatobá, pinho e cajazeira, entre outras. No entanto, a imburana se
consagrou como a madeira preferida pelos xilógrafos por ser mais maleável ao corte e
manter melhor fidelidade ao desenho. Cada um dos instrumentos de corte utilizados –
goiva, serrote, buril, canivete, lâmina de barbear, haste de guarda-chuva, bisturi, formão –
confere à imagem um efeito plástico distinto.
Estudos realizados por pesquisadores e pelos próprios cordelistas apontam que o primeiro
registro da xilogravura na literatura de cordel foi encontrado no interior do folheto A
história de Antônio Silvino, de autoria de Francisco das Chagas Batista, na edição de 1907.
José Soares da Silva, poeta de Caruaru conhecido como Dila, é apontado pelos
pesquisadores como introdutor da gravura a cores. A maior parte de suas capas, bem como
de seus poemas, se referem ao cangaço. Segundo o dossiê descritivo, a introdução da cor na
xilogravura foi uma tentativa de concorrer com as capas ilustradas em cores por meio da
técnica do offset utilizadas pela Editora Luzeiro, em São Paulo. Mesmo que tenha
representado uma reação aos processos mecânicos mais modernos de impressão das capas
dos folhetos, o emprego da policromia na xilogravura faz parte hoje do repertório de alguns
dos mais destacados gravadores.
Desde a década de 1960, a xilogravura produzida para os folhetos de cordel passou a ser
cada vez mais objeto de interesse de etnógrafos, galeristas, colecionadores e museus. O
dossiê descritivo ressalta que, em 1962, o Museu de Artes do Ceará encomendou ao santeiro
Mestre Noza, radicado em Juazeiro do Norte, uma série de 14 gravuras que foram reunidas
em um álbum publicado em Paris em 1965 pelo editor Robert Morel. Os elogios à obra pela
imprensa francesa despertaram a atenção de intelectuais e estudiosos, que se encantaram
com a força expressiva das imagens em branco e preto.
Com o passar do tempo, a arte da xilogravura alcançou reconhecimento cada vez maior em
outros circuitos sociais, ocupando espaços em museus, galerias e universidades, com
trabalhos encomendados por pesquisadores, colecionadores e instituições. Assim, os
xilógrafos conseguiram adquirir autonomia para uma arte que tinha, e ainda tem, a
literatura de cordel como linguagem de referência.
O dossiê descritivo problematiza a noção de autoria que emergiu nas primeiras décadas do
século XX e que também consolidou a figura do editor-proprietário, aquele que adquire o
direito de publicar a obra literária de outra pessoa. Numa das primeiras transações
comerciais desse gênero, João Martins de Athayde adquiriu os direitos de publicação da
obra de Leandro Gomes de Barros em 1921 e, aos poucos, foi suprimindo o nome do poeta
das capas dos folhetos, se convertendo, por fim, em autor dos poemas. A iniciativa de
garantir a propriedade editorial sobre o acervo que havia adquirido se mesclou ao lucro
comercial e ao prestígio como autor. A restituição da autoria de Leandro Gomes de Barros
foi possível devido a um exaustivo trabalho de pesquisa realizado por Sebastião Nunes
Batista – filho do poeta Francisco das Chagas Batista –, que publicou, a partir de 1961,
coleções de folhetos raros reunidos no acervo da Fundação Casa de Rui Barbosa, em uma
série de antologias dedicadas ao poeta.
Apesar disso, foi preciso esperar até o século XXI para que as pesquisas acadêmicas
problematizassem a presença feminina em um campo de atuação marcadamente
masculino. O dossiê descritivo sugere que isso em parte se deveu ao fato de as pesquisas
privilegiarem os acervos de folhetos impressos em detrimento da oralidade fundante. Esse
pormenor oculta uma maciça participação feminina na transmissão e consolidação da
literatura de cordel no contexto de oralidade. São muitos os poetas entrevistados que
remetem seus primeiros contatos com a poesia ao meio familiar, quando a família se reunia
com amigos, parentes e vizinhos para leituras em voz alta de folhetos adquiridos nas feiras.
São igualmente frequentes as menções a malas repletas de folhetos, guardadas pelas mães,
tias e avós, que formavam como que uma biblioteca de referência para as histórias
preferidas, lidas e relidas repetidamente, a ponto de serem recitadas de cor.
Estudos mais recentes determinaram que a primeira autora conhecida, Maria das Neves
Pimentel, usou, em 1938, o pseudônimo Altino Alagoano para se inserir numa produção
editorial masculina. A presença feminina na literatura de cordel se limitava, até então, a
representações sociais do feminino e das relações de gênero no repertório de temas das
narrativas. A mulher, representada de forma estereotipada e moralizante, se enquadrava ou
como modelo de virtude a ser seguido ou, pelo contrário, como modelo de perfídia a ser
evitado.
O dossiê descritivo explicita a trajetória percorrida pelas mulheres para se afirmarem como
autoras. Hoje atuam com regularidade, acrescentando suas próprias visões de mundo e das
desigualdades sociais. Para além da criação poética, tomam dianteira no gerenciamento de
sites e blogs dedicados à circulação e fruição da literatura de cordel e assumem a direção de
entidades representativas, associações e academias.
A luta por aceitação e reconhecimento obteve resultados mais robustos por meio de
organização em entidades representativas, associações e academias de poetas, cantadores,
repentistas, emboladores e folheteiros, assim como pela organização de festivais e
congressos e apresentações nos meios de comunicação, especialmente em programas de
rádio.
As narrativas em verso são cantadas, recitadas e declamadas nas casas, nas ruas, nas feiras,
nas praças públicas, nas escolas ou em festivais. São gravadas e transmitidas por programas
de rádio e de televisão ou por arquivos digitais. São por vezes manuscritas em folhas soltas
de papel e afixadas em janelas de trens de subúrbio ou em cartazes e murais em locais
públicos. São ilustradas e impressas em folhetos ou livros, que são lidos, relidos, vendidos,
trocados. No mais das vezes, são guardadas e conservadas em malas, gavetas, caixas,
prateleiras de estantes e acervos institucionais, no Brasil e no exterior. Em cada instância
dessa criação, circulação e fruição poética, uma extensa rede de pessoas e instituições é
mobilizada, articulando poetas, folheteiros, cantadores, declamadores, ilustradores,
Esse é o principal argumento daqueles que repudiam uma relação direta e reprodutiva da
literatura de cordel no Brasil e as práticas editoriais europeias ditas congêneres. Sua
natureza sistêmica e compósita, que alinhava a criação poética e os suportes impressos a
características sociais, editoriais, estéticas, literárias, plásticas e imagéticas próprias,
preserva, sobretudo, uma relação viva e interativa com um público leitor e ouvinte, por
meio das diversas práticas de leitura, da declamação, dos desafios e da crítica pronta e
oportuna.
A participação direta do público nas recitações, nos desafios, nos motes, nas declamações
constitui uma parcela da interatividade constituinte desta prática cultural. O repertório de
temas – romances, histórias de gracejo, de cangaço, de crítica social, noticiário,
religiosidade – se consolidou no feedback por parte do público, percebido inclusive pelas
sucessivas tiragens de um mesmo título e pelo compartilhamento em sites e blogs. Por esse
motivo, a temática literatura de cordel aparentemente se mostra redundante. Entretanto, o
dossiê descritivo argumenta que o exame das narrativas ao longo do tempo revela que os
poetas estiveram sempre atentos aos contextos da época e às experiências de vida de seus
leitores e ouvintes, abordando novas temáticas, novas linguagens e novos públicos. Isso fez
com que a literatura de cordel tenha se mantido ao mesmo tempo vinculada a um
repertório que se firmou nas primeiras décadas do século XX e atualizada constantemente.
Recomendações de salvaguarda
Proposição de Registro
Recomendamos também atenção à Feira de São Cristóvão, no Rio de Janeiro, local que
congrega o maior número de poetas e constitui a mais importante referência simbólica da
literatura de cordel na cidade. A Feira está em processo de Inventário de Identificação de
Bens Culturais sob a coordenação da Superintendência do Iphan no Rio de Janeiro.
Eis o parecer.
Elisabeth Costa
Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular/Iphan
Rio de Janeiro, 5 de julho de 2018