Soc Libras Socioling
Soc Libras Socioling
Soc Libras Socioling
da Libras
Indaial – 2022
1a Edição
Elaboração:
Prof.ª Danielle Vanessa Costa Sousa
Prof.ª Mariana Correia
216p.
ISBN XXX-XX-XXX-XXXX-X
“Graduação - EaD”.
1. Sociolinguística 2. Libras
CDD XXXXX
Bibliotecário: João Vivaldo de Souza CRB- 9-1679
Impresso por:
APRESENTAÇÃO
Prezado acadêmico, seja bem-vindo ao Livro Didático de Sociolinguística! É com
muita satisfação que o apresentamos para você. Nesta edição, procuramos apresentar
as discussões basilares da área e relacionar os estudos da Sociolinguística às discussões
das línguas de sinais num geral e à Libras em específico. Para que possamos organizar o
debate que envolverá essas questões, o livro está dividido em três unidades, que serão,
brevemente, apresentadas a seguir.
QR CODE
Olá, acadêmico! Para melhorar a qualidade dos materiais ofertados a
você – e dinamizar, ainda mais, os seus estudos –, a UNIASSELVI disponibiliza materiais
que possuem o código QR Code, um código que permite que você acesse um conteúdo
interativo relacionado ao tema que está estudando. Para utilizar essa ferramenta, acesse
as lojas de aplicativos e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar essa facilidade
para aprimorar os seus estudos.
ENADE
Acadêmico, você sabe o que é o ENADE? O Enade é um
dos meios avaliativos dos cursos superiores no sistema federal de
educação superior. Todos os estudantes estão habilitados a participar
do ENADE (ingressantes e concluintes das áreas e cursos a serem
avaliados). Diante disso, preparamos um conteúdo simples e objetivo
para complementar a sua compreensão acerca do ENADE. Confira,
acessando o QR Code a seguir. Boa leitura!
LEMBRETE
Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma
disciplina e com ela um novo conhecimento.
REFERÊNCIAS...................................................................................................................... 86
REFERÊNCIAS.....................................................................................................................143
REFERÊNCIAS.................................................................................................................... 205
UNIDADE 1 -
O QUE A
SOCIOLINGUÍSTICA ESTUDA?
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
• associar os conceitos presentes nos estudos dos contatos linguísticos aos estudos
das línguas de sinais;
PLANO DE ESTUDOS
A cada tópico desta unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de
reforçar o conteúdo apresentado.
CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.
1
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 1!
Acesse o
QR Code abaixo:
2
UNIDADE 1 TÓPICO 1 -
Bons estudos!
Desse modo, a autora salienta que a ligação entre linguagem e sociedade é, não
apenas, evidente, mas está, também, na base da formação do ser humano como tal,
logo, ao se viver em sociedade, pela e através da língua e da linguagem que se dão as
relações entre os seres humanos, ou seja, na sociedade. Além disso, podemos destacar
que, a partir da estrutura do sistema de comunicação, ou seja, da língua, os seres
humanos organizam o próprio pensamento. Logo, o sistema da língua é a forma através
da qual as pessoas ordenam as relações externas (entre seres humanos) e internas
(em si mesmas). Em outras palavras, a língua é estrutura e estruturante da linguagem
humana, pois, por ela, e através dela, as relações de sentido se arranjam.
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Vamos aos destaques em relação à figura?! Então, podemos ver que são
apresentadas cinco silhuetas coloridas, e, a partir delas, é interessante notar que o
uso da cor cria uma ideia de diversidade, explicita que são pessoas diferentes, mesmo
que o desenho não tenha elementos que diferenciem, além de uma noção de gênero
pautada no tamanho do cabelo. Veja, também, que, na extrema esquerda, aparecem as
únicas duas pessoas que estão conversando entre si, já as demais não parecem estar
em contato com mais nenhuma em específico, contudo, a partir dos balões de conversa
que estão inseridos na parte de cima da figura, são evidenciadas as relações e inter-
relações estabelecidas a partir do diálogo da esquerda.
Essa relação entre língua e sociedade é bem complexa, pois abarca discussões
que envolvem as variações internas de uma língua e a relação entre as diferentes línguas
e o modo através do qual essas ligações alteram as línguas que estão em contato. Sobre
os estudos da Sociolinguística, Borin (s.d., p. 8) coloca que
Assim, a língua, não apenas, está relacionada à sociedade, mas a uma entidade
que se manifesta em sociedade, logo, não pode ser estudada sem que os fatores sociais
sejam levados em conta. Por consequência, o contexto de enunciação, a cultura e a
história do povo que utiliza a língua, incluindo a história pessoal dos indivíduos que
se utilizam dela, devem ser levados em consideração para o estudo dos fenômenos
linguísticos. Desse modo, “[...] é, precisamente, a DIVERSIDADE linguística, o objeto de
estudos da Sociolinguística” (BRIGHT, 1964, p. 18, grifo do autor), ou seja, nesse amplo
espectro de possibilidades, está o propósito dos estudos que observam a relação entre
o uso da língua e os aspectos sociais.
5
Acadêmico, nesta seção, foi apresentado o modo através do qual a língua e a
sociedade estão relacionadas para os estudos da Sociolinguística. No próximo subtópico,
serão apresentados alguns dos aspectos históricos que levaram à delimitação desse
campo de estudos dentro da linguística. Após, veremos como são organizadas as
correntes teóricas que estruturam as perspectivas das pesquisas em Sociolinguística.
NOTA
O termo “comunidade linguística” será trabalhando mais adiante, nas
discussões desta unidade, mas, por enquanto, vamos entendê-lo como
apresentado no dicionário de Linguística, de Dubois et al. (1973, p. 133,
grifo dos autores): “Chama-se comunidade linguística um grupo de seres
humanos que usam a mesma língua ou o mesmo dialeto, num dado
momento, e que podem se comunicar entre si”. Ou seja, uma comunidade
linguística é aquela que compartilha as mesmas experiências linguísticas.
6
Sobre isso, Alkmim (2011, p. 23) coloca que
Isso quer dizer que a definição do objeto de estudo de uma ciência, como
da Linguística, foi delimitada a partir de uma visão específica que enfatiza um modo
específico de delimitar aquilo que é percebido como parte dos estudos linguísticos.
Assim, a partir da observação dos eventos linguísticos e do modo através do qual eles
são observados, será feita a compreensão daquilo que foi observado. Para exemplificar
isso, observe o seguinte esquema:
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Ademais, como já discutimos, as teorias se estabelecem a partir do momento
histórico e das correntes de pensamento da época. Assim, quando Saussure (1981)
propõe que a língua, em oposição à fala, seja o objeto da Linguística, ele dá origem à
visão estruturalista da língua, opondo-se aos estudos históricos e filológicos anteriores
a ele, e à visão que percebia a língua como resultado de substâncias naturais do cérebro
e do aparelho fonador, ou seja, aproximava a compreensão linguística do entendimento
biológico. Logo, quando Saussure (1981) afirma que o objeto de estudos da Linguística é
a língua em sua forma e estrutura, ele transforma o pensamento linguístico da época e
inaugura toda uma vertente de estudos sobre a linguagem (ALKMIM, 2011).
Para explicar a que linguística a sua teoria se vincula, Saussure (1981) divide a
Linguística em Linguística Interna e Linguística Externa, divisão que, ainda, mantém-
se no campo dos estudos linguísticos, mesmo na contemporaneidade: a Linguística
Interna se ocupa das estruturações formais, e a Linguística Externa estuda as relações
contextuais. Por isso, as áreas a que a Linguística está relacionada, a outros campos
de estudo, encontram-se inseridas na Linguística Externa, como a Sociolinguística, a
Etnolinguística, a Psicolinguística, dentre outras (ALKMIM, 2011).
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3.1 HISTÓRIA DA DELIMITAÇÃO DO CAMPO DE ESTUDOS DA
SOCIOLINGUÍSTICA
Segundo Alkmim (2011), o termo Sociolinguística foi estabelecido em 1964, e isto
se deu a partir do Congresso feito na UCLA (Universidade da Califórnia, em Los Angeles),
organizado por William Brigth. A esse evento, compareceram muitos pesquisadores
que acreditavam na estruturação desse campo de estudos interdisciplinar. Ao fazer a
publicação dos anais desse Congresso, o organizador escreve um texto introdutório
chamado de “As dimensões da Sociolinguística”, a partir do qual ele delimita o campo de
estudos e caracteriza a nova área de pesquisas. O autor afirma que a Sociolinguística
pretende “[...] demonstrar a covariação sistemática das variações linguística e social. E,
talvez, até mesmo, demonstrar uma relação causal numa e noutra direção” (BRIGTH,
1964, p. 17). Assim, as pesquisas, nessa área, partem do pressuposto de que as
línguas variam e que essa variação pode ser relacionada às características específicas
percebidas na estrutura social, pela qual os falantes dessas línguas circulam. Logo,
essa compreensão observa como as estruturas linguísticas são modificadas a partir dos
diferentes contextos sociais nos quais as línguas estão inseridas.
NOTA
O conceito de interdisciplinaridade pressupõe a relação entre áreas do conhecimento,
sendo que uma delas estabelece o rumo da pesquisa com o suporte dado pelas demais
áreas envolvidas, ou seja, a coordenação das ações se dá a partir de uma das áreas
envolvidas. No caso da Sociolinguística, a ideia é, exatamente, a de que a discussão da
relação entre língua e sociedade se fixe dentro do campo das discussões linguísticas.
Assim, a Sociolinguística é um campo interdisciplinar no qual as discussões se darão
a partir do estudo da língua e da sociedade, mas com a coordenação dos estudos da
linguagem. A figura a seguir demonstrará, graficamente, o que foi explicado:
Observe que a área que está no nível mais acima coordena esforços com as demais,
pois as flechas são nos dois sentidos, logo, essa cooperação não acontece, apenas, de
cima para baixo, mas ela se estabelece entre os níveis estruturantes, mesmo que uma
das disciplinas envolvidas esteja, hierarquicamente, posicionada em um estágio acima
das demais.
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Ainda, nesse mesmo texto fundador da área de pesquisas, Brigth (1964) delineia
um conjunto de elementos definidos socialmente, os quais ele acredita estarem,
diretamente, vinculados às variações observáveis na diversidade linguística, ou seja,
o autor desenha aquelas que, para ele, são as possibilidades de estudo vinculadas à
língua(gem), abarcadas pelas perspectivas teórica e metodológica da Sociolinguística.
De acordo com Alkmim (2011, p. 28-29), as possibilidades citadas pelo autor são:
Desse modo, os estudos sobre língua e sociedade não nasceram em 1964, mas
foi, naquele momento, que vários pesquisadores encontraram o campo de atuação
deles, a partir das perspectivas interdisciplinar, antropológica e social que tinham sido
desvinculadas no início do século XX, da Linguística, por Saussure, que reconhece o
aspecto social, mas que diz que, dele, a ciência da linguagem não se ocupará. Ainda,
dos estudiosos que não concordavam com a perspectiva da Gramática Gerativa de
Chomsky, que percebia a faculdade da linguagem como uma característica mental
nascida com o ser humano.
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língua(gem), cultura e sociedade, a partir de uma perspectiva interdisciplinar que refuta
a noção de língua como entidade autônoma, apenas, estrutural ou mental, mas, ao
mesmo tempo, reconhece a Linguística como o lugar de debate do fenômeno linguístico
com diferentes dimensões e entrecruzamentos.
ESTUDOS FUTUROS
No último tópico desta unidade, apresentaremos alguns exemplos de
trabalhos a partir das perspectivas da Sociolinguística e dos Estudos Surdos,
por isso, apenas, citamos os fatores linguísticos, sem abordar detalhes
quanto aos estudos específicos.
NOTA
Nesta unidade, estamos usando o termo língua(gem) quando queremos
fazer referência aos conceitos de língua e de linguagem ao mesmo tempo.
Quando a ideia é remeter ao conceito de língua como entidade mais
específica, usamos, apenas, essa palavra, porém, quando é necessário fazer
referência à capacidade de simbolizar, utilizaremos linguagem.
11
É necessário destacar que a fixação do campo de estudos da Sociolinguística
tem um evento e uma data específicos, contudo, não quer dizer que os estudiosos e
os pesquisadores da relação entre língua e sociedade existiram, apenas, a partir desse
momento, ao contrário, foi, exatamente, a existência de trabalhos que conectavam os
estudos da linguagem e os estudos da sociedade que acabou por provocar o surgimento
de um campo de pesquisas interdisciplinar dentro da Linguística, que abrangia
essa compreensão dos fenômenos linguísticos. Dito de outro modo, não é a área do
conhecimento que faz surgirem estudos, mas é a quantidade, a qualidade e a divulgação
dos estudos que fazem com que um campo de pesquisas seja delimitado. Contudo,
é inegável que, depois do estabelecimento do campo de pesquisas, a divulgação
e a estruturação darão origem a mais divulgação, assim, isso levará mais pessoas a
conhecerem esse modo de compreender os fatos da língua, logo, surgirão estudiosos e
serão feitas mais pesquisas dentro da mesma compreensão, e tentando refutar aquilo
que a área de pesquisas menciona, ou seja, muita gente entende o fenômeno de jeito
semelhante, e isso faz com que se estabeleça uma perspectiva teórica que dará origem
a diferentes compreensões que podem ser reunidas sob o mesmo entendimento, ou,
podem, inclusive, provocar dissidências que darão origem a outras áreas de pesquisa.
12
FIGURA 2 – ESQUEMA DA COMUNICAÇÃO VERBAL DE JAKOBSON
13
característica muito importante das pesquisas em Sociolinguística: a necessidade de
recolhimento de dados para a análise, ou seja, é um tipo de pesquisa que é feito a
partir do estudo das formas de uso na sociedade, e, para isso, faz-se preciso captar as
informações para analisar com a própria sociedade.
• Benveniste (1968 apud ALKMIM, 2011): para ele, a língua só existe no interior de
uma organização linguística específica e em uma sociedade, também, específica,
assim, não se pode compreender a língua sem a sociedade, e vice-versa. O estudioso
reconhece que a língua e a sociedade são dimensões estruturais diferentes, mas,
ao mesmo tempo, elas têm características que as aproximam: “[...] são realidades
inconscientes, representam a natureza, são, sempre, herdadas, e não podem ser
abolidas pela vontade do homem” (ALKMIM, 2011, p. 27). Ou seja, ao mesmo tempo em
que funcionam em organizações diferentes, essas duas grandezas são aproximáveis,
devido às peculiaridades que têm em comum. Para o autor, a língua é uma ferramenta
de análise da sociedade, pois, no interior da língua, está contida a sociedade, por
isso, esta última pode ser interpretada através da primeira, ou seja, a língua é um
estruturante da sociedade, através de designações e fenômenos linguísticos ligados
às questões vocabulares. Desse modo, a língua é a maneira pela qual o indivíduo se
localiza na natureza e na sociedade, pois, através dela, podem ser observados os
usos específicos que cada grupo, ou classe social, faz através da língua. Assim, o ser
humano, e, por consequência, a sociedade, estruturam-se por e através da língua, de
maneira indissociável.
• Hymes (1962 apud ALKMIM, 2011): este autor propõe uma área de estudos
interdisciplinares chamada de Etnografia da Comunicação, a qual envolve a Etnologia,
a Psicologia e a Linguística. No artigo no qual propõe esse modo de organizar os
estudos da linguagem, o autor, também, destaca que a ideia desloca o estudo
linguístico da compreensão de código e estrutura e joga o foco para “[...] descrever e
interpretar o comportamento linguístico no contexto cultural [...]”. Com esse objetivo,
ele propõe a definição das “[...] funções da linguagem a partir da observação da fala e
das regras sociais próprias de cada comunidade” (ALKMIM, 2011, p. 30).
• Labov (1963 apud ALKMIN, 2011): este pesquisador foi o responsável por estabelecer
as bases teórico-metodológicas da Sociolinguística Variacionista. O trabalho dele, a
respeito da comunidade de Martha’s Vineyard, tornou-se célebre, devido ao modo
através do qual ele “[...] sublinha o papel decisivo dos fatores sociais na explicação
da variação linguística, isto é, da diversidade linguística observada” (ALKMIM, 2011, p.
30). Assim, ele relaciona as especificidades da pronúncia de determinados fonemas,
em inglês, dos habitantes, às categorias de idade, sexo, ocupação, origem ética e
atitude. Isso ocorre porque “[...] as pressões sociais estão operando, continuamente,
sobre a língua, não de algum ponto remoto no passado, mas como uma força social
imanente agindo no presente vivo” (LABOV, 2008, p. 21). Assim, os estudos dele
têm uma perspectiva sincrônica, pois estudam a relação entre a língua e como as
pressões sociais sofridas por ela geram variações, socialmente, determináveis.
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Assim, nós vimos, de modo sintético, alguns dos pesquisadores que relacionaram
língua(gem) e sociedade, de maneira a compreender o fenômeno linguístico e o fenômeno
social como pares indissociáveis. Alkmim (2011) chama atenção para a obviedade e a
complexidade de se estabelecer uma relação entre o linguístico e o social. No próximo
subtópico, trataremos das vertentes, ou das correntes teóricas de compreensão dessa
relação, de modo a entender como se estruturam os estudos na Sociolinguística.
4.1 DIALETOLOGIA
A dialetologia, ou, também, geografia linguística, faz parte daqueles estudos
anteriores à fixação do campo da Sociolinguística, os quais estudavam a relação entre
língua e sociedade. De acordo com Dubois et al. (1973), ela é a disciplina que assumiu
a tarefa de descrever, comparativamente, os diferentes sistemas, ou dialetos, a partir
dos quais uma língua se diversifica no espaço, além de estabelecer limites. Para
compreender essa afirmação, precisamos, primeiramente, definir o que é um dialeto,
após, retomaremos essa citação.
15
Ainda, segundo Dubois et al. (1973, p. 185), dialeto é
Assim, a delimitação entre língua e dialeto não é algo muito simples, pois engloba
elementos que fogem da percepção linguística em si mesma, ou seja, é, exatamente,
o assunto de estudos dessa área que envolve língua e sociedade, pois são elementos
de percepção das leis, da sociedade e da compreensão dos falantes que acabam por
estabelecer a diferença entre língua e dialeto.
Ainda, com relação às discussões dialetais, McCleary (2009, p. 15, grifo do autor)
exemplifica a questão que envolve língua e dialeto a partir da noção de que o português
brasileiro e o português europeu são considerados dialetos da Língua Portuguesa, porém,
mesmo que, muito semelhantes na escrita, a fala apresenta diferenças que dificultam
a compreensão entre eles. Por isso, “os linguistas consideram que, atualmente, as duas
variedades são tão diferentes que constituem dois sistemas linguísticos distintos, ou
seja, que são duas línguas diferentes”. O português brasileiro e o português europeu,
ainda, apresentam traços que permitem perceber a proximidade entre eles, contudo,
os sistemas deles são, reconhecidamente, distintos, e, por isso, percebidos como duas
línguas diferentes. Com relação à Libras, o mesmo autor coloca o seguinte:
16
A libras é um dialeto da ASL (língua de sinais americana)? É um dialeto
da língua de sinais francesa? Qual é o grau de inteligibilidade entre as
três? Historicamente, a libras e a ASL são línguas irmãs (duas "filhas"
da língua de sinais francesa), mas cada uma tem sua autonomia, e,
portanto, são consideradas línguas diferentes (MCCLEARY, 2009, p.
15, grifo do autor).
Por fim, podemos afirmar que a Dialetologia é uma área de estudos que tem uma
história particular e específica como campo de estudos, anterior à fixação do campo da
Sociolinguística. Para delinear a relação entre elas, Macêdo (2012, p. 36-37) coloca que
“[...] a dialetologia tem, como base de descrição, a localização espacial, configurando-
se como, eminentemente, diatópica. A Sociolinguística, por sua vez, centra-se na
correlação entre os fatos linguísticos e os fatores sociais”. Ou seja, a Dialetologia se
preocupa mais com fatores geográficos, e, a Sociolinguística, com fatores sociais, mas
ambas estudam como esses fatores influenciam a língua. Além disso, a autora chama
a atenção para o fato de que as duas disciplinas têm o mesmo propósito de estudar a
língua e as forças sociais que a modificam, porém, utilizam métodos diferentes para a
análise desse objeto de estudos.
17
Conforme Coelho et al. (2010, p. 22), a visão laboviana, acerca da relação
entre língua e sociedade, é a de que “não existe uma comunidade de fala homogênea,
nem um falante-ouvinte ideal. Pelo contrário, a existência de variação e de estruturas
heterogêneas nas comunidades de fala é um fato comprovado”. Dito de outro modo, é
uma realidade da língua a diversidade de usos, incluindo a organização estrutural nos
grupos linguísticos de fala, assim, a pluralidade linguística faz com que não exista um
padrão homogêneo de usuário da língua.
Essas variações, e a compreensão do que foi dito, ficam bem evidentes quando
se compreende que a comunicação acontece mesmo não havendo “[...] dois falantes
que se expressam do mesmo modo, nem mesmo um falante que se expresse da mesma
maneira em diferentes situações de comunicação”, conforme Coelho et al. (2010, p. 22).
Para ilustrar isso, pense em duas pessoas sinalizando o sinal de OI em Libras. O modo
de articular o léxico poderá variar, de acordo com a personalidade e com a situação na
qual está interagindo: com o chefe, com os amigos, sóbrio, bêbado, feliz, triste, em uma
entrevista de emprego. Cada uma dessas possibilidades poderá interferir na sinalização,
pois mudará o modo através do qual a língua é utilizada.
18
obtidos. Dito de outro modo, Labov (1972) afirma que é necessário observar a língua em
uso através da coleta de dados, pois os pesquisadores precisam perceber aquilo que
acontece no uso da língua, assim, os fenômenos linguísticos observáveis darão o rumo
das descobertas teóricas.
NOTA
A palavra corpus é um termo que remete a todo o conjunto de materiais
para a análise linguística, ou seja, o conjunto de dados para a investigação
em uma pesquisa.
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QUADRO 2 – RESUMO DAS TRÊS ONDAS DE ANÁLISE NA SOCIOLINGUÍSTICA VARIACIONISTA
20
da estrutura, ou seja, como a estrutura se molda no cotidiano, com os condicionamentos
sociais impostos e as relações de poder estabelecidas atuando sobre ela”. Assim, a
terceira onda dos estudos da Sociolinguística Variacionista, proposta por Eckert (2012
apud VELOSO, 2014), está relacionada à compreensão de como a estrutura da língua
varia em uso estilístico e de que modo isso influencia no uso diário dessa mesma língua
a partir das forças externas sociais que a pressionam.
21
que sustenta as relações entre os usuários da língua. Segundo Witkowski (2013, p. 90),
“nesse processo, a intenção comunicativa é a questão principal, e, para acessá-la, os
interlocutores devem ir além do que está aparente, e se concentrar, não apenas, no que
é dito, mas nas suposições que sustentam a negociação”. Assim, o objetivo é perceber
esses pressupostos que estão subjacentes à comunicação, além de observar como
eles são, socialmente, compartilhados, de modo a ser um problema quando os falantes/
sinalizantes não compartilham os mesmos códigos subjacentes.
Observe que, no exemplo dado, o pressuposto fica claro pelo léxico utilizado, pois
quem não fuma mais é porque era fumante, mas o subentendido depende de informações
que não se ancoram no posto nem no pressuposto, pois partem da dedução feita pelo
indivíduo para quem a frase foi dita, podendo estar relacionada ao senso comum de
que todo mundo que para de fumar engorda e do conhecimento compartilhado, com
o interlocutor, de que Pedro era gordo. Assim, a Sociolinguística Interacional pretende
estudar como se dá o processo de construção dessas informações subjacentes e como
elas afetam o processo de compreensão do que foi dito.
NOTA
Para acesso aos links dos materiais disponíveis on-line,
serão colocados, ao longo do livro, QR-Codes, basta
apontar a câmera do seu smartphone através de um
dos aplicativos de leitura desses códigos que você será
encaminhado, diretamente, ao site do material. Além
disso, as referências completas estão colocadas no fim
de cada unidade.
22
INTERESSANTE
O artigo Reflexões Sociolinguísticas sobre a Libras (Língua Brasileira de Sinais), de Rodrigues
e Silva, apresenta uma síntese muito interessante a respeito do estudo da Libras na
perspectiva da Sociolinguística, por isso, sua leitura, na íntegra, está colocada neste livro
didático, dividida em dois momentos distintos como Leitura Complementar, divididos de
acordo com os elementos abordados ao longo do texto. Aqui, no fim do Tópico 1, está
posta a parte do texto dos autores que discutem os aspectos abordados neste tópico.
No fim do Tópico 2, será colocado o restante dos autores, desse modo, retomando
os conceitos e os debates efetuados no Tópico 2 e inserindo a temática abordada ao
longo do Tópico 3. Assim, o texto tem, exatamente, a ideia de, não apenas, acrescentar
elementos às discussões apresentadas, mas, também, de servir como uma forma de
síntese do caminho teórico estabelecido ao longo desta unidade. Boa leitura!
Angelica Rodrigues
Anderson Almeida da Silva
Resumo
[...]
Introdução
Se a linguística pode ser considerada uma ciência nova, a linguística das línguas de sinais é
ainda mais recente e pouco conhecida até mesmo entre os linguistas que historicamente
têm se voltado mais fortemente para a análise de línguas faladas. No Brasil, os estudos
linguísticos de línguas sinalizadas ganharam força nos anos 1990, depois dos trabalhos
pioneiros de Ferreira-Brito (1984, 1995), Felipe (1989) e mais recentemente Quadros
(2003) e Quadros e Karnopp (2004), que publicaram, dentre outros, dissertações, teses e
livros sobre a língua dos surdos brasileiros.
Nesse contexto, a Libras tem ganhado, a partir da última década, principalmente, destaque
nos debates voltados para questões tanto pedagógicas quanto linguísticas relativas à
educação de surdos. No entanto, no que diz respeito ao ensino e à aprendizagem de
Libras por surdos e ouvintes, é possível encontrar referências às noções de "erro" e
aos conceitos de "certo" e "errado" como um reflexo tanto do sentimento dos próprios
falantes em relação a sua própria língua quanto de práticas pedagógicas tradicionais
que elegem um padrão de língua a ser seguido por todos os membros da comunidade
de fala. Esse "sentimento" e esse debate não divergem do observado em contextos de
ensino e aprendizagem da língua oral, todavia, para o português, esses "pré-conceitos"
23
são amplamente discutidos na literatura, inclusive nos PCN, há mais de três décadas. Por
ser uma língua silente, não sonora, muitos acreditam que as línguas de sinais estariam
de certa forma “imunes” aos efeitos da estigmatização de formas linguísticas largamente
estudados nas línguas orais, principalmente a partir de Labov (2008). Portanto, neste
artigo, que é um resumo das ideias apresentadas no minicurso Reflexões sociolinguísticas
sobre a Libras (Língua Brasileira de Sinais) durante o 64º.Seminário do GEL, nossa
intenção é destacar, a partir da revisão dos pressupostos clássicos da Sociolinguística, os
processos relacionados à variação e mudança presentes nas línguas de sinais, visando,
sobretudo, apontamentos que possam fomentar trabalhos futuros nesse campo.
O que é língua?
Uma das principais demandas das comunidades surdas é o reconhecimento das línguas
de sinais como línguas naturais, assim como as línguas orais. Esse reconhecimento é
fundamental porque apenas com a legitimação de sua língua e, consequentemente, de
sua cultura, os surdos podem ter garantidos seus direitos relacionados à sua identidade
linguística.
Embora a língua seja descrita como um fato social no Curso de Linguística Geral (SAUSSURE,
2002), a metodologia da pesquisa estruturalista retira da língua tudo o que é social,
concentrando as análises nos fatos de língua que podem ser usados para demonstrar a
sistematicidade da língua, como o sistema de oposições fonológicas, por exemplo.
24
É fato pacífico que não há língua sem gramática, isto é, não há língua em que não se
possam depreender aspectos fonológicos, morfológicos e sintáticos. Todavia, é preciso
refletir sobre uma questão fundamental: nosso entendimento daquilo que seria uma
língua está restrito à descrição de sua estrutura gramatical? O que é, afinal, a língua?
25
seus falantes. Considerando que não há língua com apenas um falante, as línguas devem
ser analisadas no contexto social em que falantes de diferentes idades, origem social,
etnia, graus de escolaridade, sexo e gênero interagem. A gramática não é produto acabado
e fechado que esses falantes devem aprender. A gramática é construída justamente por
esses falantes em situações de interação em que sentidos são negociados. Desse modo,
a história interna de uma língua não se desvincula da sua história externa, ou seja, da
história de seus falantes.
• No ser que fala, no que chamamos de usuário da língua, está, então, a gramática.
• A imagem do usuário – que é o homem que fala – precedeu a da gramática.
• Ela está nele: na sua fala há uma gramática, que ele possui.
Se a gramática está no usuário, ele não é um aprendiz, pois não é possível aprender o
que já se sabe. Não existe gramática como produto acabado que se configurou num
determinado tempo e espaço e assim permanecerá a despeito de reconfigurações
sociais a que seus falantes sejam submetidos. A gramática está num movimento contínuo
de estruturação e reestruturação motivado pelas necessidades comunicativas de seus
usuários. E sendo as necessidades comunicativas e a identidade dos falantes diferentes,
não podemos esperar que a língua seja a mesma para todos os falantes em todas as
situações de comunicação. Por isso, não podemos dizer, por exemplo, que a Língua
Portuguesa ou Inglesa ou a Libras sejam únicas e homogêneas. Elas são todas, na verdade,
um conjunto de variedades a que se atribui um rótulo. Se pensarmos, por exemplo, nas
variedades brasileiras do português, não é possível dizer onde começa e onde termina
a variedade mineira ou paulista (caipira). Aquilo que chamamos de português constitui-
se como um conjunto de regras mais ou menos regulares que são compartilhadas por
falantes. O que garante a unidade dessa língua, a despeito da intensa variação dialetal, é
a normatização. A norma, difundida na escola através do material didático, na imprensa
e nos documentos oficiais, garante um certo nível de unidade, que é mais perceptível
na escrita formal. O que deve ser destacado, no entanto, é que, apesar da diversidade
linguística, todos os falantes de português são capazes de se entender mutuamente.
Como afirmam WLH, a variação dialetal faz parte da competência monolíngue do falante.
No que diz respeito à Libras, pesquisas, como a de Xavier e Barbosa (2014) e Andrade
(2013), mostram que há variação no nível fonológico da sinalização dos surdos de diferentes
dialetos, e considerando diferentes variáveis. Todavia, apesar dos avanços das pesquisas
sociolinguísticas, é comum ouvirmos na comunidade surda sinalizadores se referirem
negativamente a outros sinalizadores que usam uma espécie de Libras misturada com
o Português, comumente denominada de Português sinalizado Há também casos em
que sinalizadores realizam, com uma mão só, sinais feitos, a priori, com duas mãos – o
que pode soar como um deslize fonológico, a exemplo de expressões como "os menino",
"praca", "bicicreta", "nóis vai" tão repreendidas pelos falantes de Português, e que acabam
sendo objeto de preconceito linguístico. Utilizando-se do mesmo "argumento" de que
“isso não é Português”, muitos sinalizadores dizem “isso não é Libras” ao se depararem
com efeitos dialetais. Esse preconceito usa a variedade padrão como referência única de
língua e atribui aos falantes das variedades não-padrão o estigma do "analfabeto" ou o
dos "sem gramática".
Se toda língua se constitui a partir de uma gramática, não é possível que qualquer
produção linguística inteligível seja produzida fora de uma gramática. Todavia, se toda
língua é constituída de variedades, então entre seus falantes circulam várias gramáticas
sendo todas elas igualmente complexas e completas.
26
A sociolinguística, nesse sentido, pode ser usada para desconstruir esses
preconceitos que sustentam as orientações pedagógicas e o senso comum
no que diz respeito à língua. Nesse sentido, discutiremos nas próximas
seções deste artigo dois conceitos importantes para a sociolinguística,
a saber, contato linguístico e variação e mudança linguística, buscando
correlacioná-los à realidade sociolinguística da Libras no Brasil.
27
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu:
• A partir da observação dos eventos linguísticos e do modo através do qual eles são
observados, é feita a compreensão daquilo que é observado.
• A pluralidade linguística faz com que não exista um padrão homogêneo de usuário
da língua.
28
• A palavra corpus é um termo que remete a todo o conjunto de materiais para a análise
linguística, ou seja, o conjunto de dados para a investigação em uma pesquisa.
• Uma pessoa surda, que tenha nascido surda, tem um estilo de uso da Libras diferente
de um surdo que perdeu a audição quando adulto e que aprendeu a língua de sinais
após já ter adquirido a língua oral-auditiva.
• Dentro dessa teoria, são estudados os conceitos de posto (aquilo que é, expressamente,
dito), pressuposto (aquilo que aparece como sugestão durante a comunicação) e
subentendido (aquilo que o indivíduo precisa deduzir a partir da interpretação).
29
AUTOATIVIDADE
1 A partir da observação dos eventos linguísticos e do modo através do qual eles
são observados, relacione, de forma CORRETA, Coluna I, Característica, à Coluna
II, Justificativa:
Coluna I Coluna II
(1) Estruturalismo ( ) A língua é propriedade da comunidade de
fala, existindo diversas variedades que sofrem
diversas pressões internas e externas, causando
variações que, como o tempo, podem vir a se
tornar outras línguas, de acordo com o status
que atingem, com a comunidade linguística de
falantes e com a complexidade estrutural.
(2) Gerativismo ( ) A língua é um sistema subjacente à fala e,
socialmente, adquirido no convívio entre os
falantes de determinada língua. Ou seja, a
estrutura de cada língua é adquirida através
do contato, mas esse contato não é o foco
dos estudos da linguagem, pois estes devem
se pautar no estudo dos caráteres formal e
estrutural da língua.
(3) Variacionismo ( ) A língua é um sistema mental que nasce com
os seres humanos, tendo parâmetros universais
que são ativados, ou não, de acordo com a língua
específica. Ou seja, as línguas são diferentes
porque cada uma delas aciona, ou não, um
parâmetro da Gramática Universal interna da
mente dos seres humanos.
30
2 Brigth (1964) delineia um conjunto de elementos definidos, socialmente, que ele
acredita estarem, diretamente, vinculados às variações observáveis na diversidade
linguística, ou seja, o autor desenha aquelas que, para ele, são as possibilidades de
estudo vinculadas à língua(gem), abarcadas pelas perspectivas teórica e metodológica
da Sociolinguística. De acordo com Alkmim (2011, p. 28-29), as possibilidades citadas
pelo autor são:
( )
Grandes estudos de levantamento de comunidades, geograficamente, definidas.
( )
Estudos etnográficos de comunidades definidas geograficamente.
( )
Hierarquia socioeconômica como um mapa do espaço social.
( )
Variáveis, como marcadores de categorias sociais primárias, e carregando traços de
prestígio/estigma.
( ) Estilo, como atenção prestada à fala, e controlado pela orientação em direção ao
prestígio/estigma.
31
4 Dentro da análise do discurso são estudados os conceitos de posto (aquilo que é
expressamente dito), pressuposto (aquilo que aparece como sugestão durante a
comunicação) e subentendido (aquilo que o indivíduo precisa deduzir a partir de sua
interpretação). A partir disso, estabeleça o que se pede sobre a seguinte sentença:
Posto:
Pressuposto:
Subentendido:
32
UNIDADE 1 TÓPICO 2 -
1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, neste tópico, estudaremos os conteúdos referentes à variação
linguística e às mudanças linguísticas. Deste modo, veremos como a Sociolinguística
estuda as variações da língua para compreender os fenômenos observados a partir do uso
que os falantes/sinalizantes fazem durante as interações em um dado contexto social.
33
Então, acadêmico, neste momento, é importante destacar que é uma confusão
que mistura duas concepções da palavra norma, aliás, duas concepções que nós,
falantes/sinalizantes, sabemos bem, pois conseguimos nos movimentar tranquilamente
na língua a que tivemos acesso e, por isso, sabemos quando algo é apenas imposto e
quando é necessário à compreensão.
34
fonemas e, mesmo assim, permanecem reconhecidas pelos falantes/sinalizantes no
momento da conversação. Desta maneira, esses exemplos ilustram a ideia de que o
conceito de norma pode ter duas compreensões, como paradigma de correção ou como
uso corrente na comunidade linguística.
NOTA
A maioria das discussões linguísticas atuais utiliza os conceitos semelhantes
para fazer referência aos fenômenos da língua, desse modo, utilizaremos
fonema para fazer referências às partes que formam os sinais.
NOTA
A correspondência entre duas línguas nunca é exata, contudo, é possível
observamos os mesmos fenômenos linguísticos, levando-se em conta as
devidas peculiaridades de cada modalidade.
35
Observe na figura que as duas perspectivas têm pontos de vista opostos em
relação ao modo como analisar os fenômenos da língua e, com base, nestas perspectivas
também se depreende o entendimento sobre o uso que os usuários fazem da língua,
por exemplo, na perspectiva de uso corrente, o verbo “estar” reduzido à forma “tá” é
perfeitamente aceitável e funcional, já no ponto de vista normativo, este fenômeno
é percebido como um desvio da normal, ou seja, um erro. Assim, a noção de erro
está vinculada à visão normativa, em que existe uma regra a partir da qual os usos
são avaliados.
36
O segundo aspecto é o preconceito pautado no uso da Libras, pois o maior
ou menor domínio da língua de sinais acaba por proporcionar, também, situações e
que a sinalização de alguém pode ser classificada como menos adequada ou apenas
vinculada a uma região, ou ainda, demonstra o uso da língua feito por um surdo que
sabe Libras e um ouvinte, ou entre surdos que tiveram e os que não tiveram o acesso à
Língua de Sinais. Para ilustrar este tipo de situação, trazemos o exemplo de uma situação
em uma pessoa surda se recusava a estabelecer um diálogo a não ser que o interlocutor
soubesse Libras com fluência, ou do surdo que não sabe Libras e a dificuldade de
comunicação tanto na língua majoritária quanto em Libras.
ESTUDOS FUTUROS
Na Unidade 2 também serão discutidos alguns aspectos vinculados ao
debate sobre preconceito linguístico.
DICA
Você sabia que o professor Marcos Bagno escreveu um texto ficcional em
que a ideia é escrever uma novela sociolinguística? O nome do livro é A
Língua de Eulália, a seguir apresentamos a capa e a sinopse deste livro
muito interessante!
37
CAPA E SINOPSE DO LIVRO A LÍNGUA DE EULÁLIA, DE MARCOS BAGNO
38
3 O QUE É VARIAÇÃO LINGUÍSTICA?
Acadêmico, a palavra variação já traz em si a noção mudança, alteração e
diversidade, e, ao fazermos a ligação com a Linguística, podemos depreender que a
variação linguística está relacionada à diversidade de usos que os falantes/sinalizantes
demonstram em sua utilização da língua. A fim de introduzir a discussão sobre variações
linguísticas convidamos você a ler o verbete Variação Linguística do glossário on-
line do Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita (CEALE) reproduzido a seguir, pois ele
apresenta uma síntese bastante interessante sobre o assunto:
Variação linguística
O termo variação se aplica a uma característica das línguas humanas que faz
parte de sua própria natureza: a heterogeneidade. A palavra língua nos dá uma ilusão
de uniformidade, de homogeneidade, que não corresponde aos fatos. Quando nos
referimos ao português, ao francês, ao chinês, ao árabe etc., usamos um rótulo único
para designar uma multiplicidade de modos de falar decorrente da multiplicidade das
sociedades e das culturas em que as línguas são faladas. Cada um desses modos de
falar recebe o nome de variedade linguística. Por isso, muitos autores definem língua
como “um conjunto de variedades” e substituem a noção da língua como um sistema
pela noção da língua como um polissistema, formado por essas múltiplas variedades.
39
Com os avanços das ciências da linguagem, essa visão foi abandonada: o
exame minucioso de cada variedade linguística revela que ela tem sua própria lógica
gramatical, é tão regrada quanto a língua literária idealizada, e serve perfeitamente
bem como recurso de interação e integração social para seus falantes. Diante
disso, um novo projeto de educação linguística vem se formando: é preciso ampliar
o repertório e a competência linguística dos aprendizes, levá-los a se apoderar da
escrita e dos muitos gêneros discursivos associados a ela, sem [,] contudo, desprezar
suas variedades linguísticas de origem, valorizando-as, ao contrário, como elementos
formadores de sua identidade individual e social e como patrimônio cultural do país.
Verbetes associados: Dialeto, Gêneros do discurso, Língua,
FONTE: BAGNO (s.d., s.p.)
Neste texto, vemos uma síntese da noção de variação como parte inseparável
do estudo das línguas, além disso, o autor chama atenção para a percepção de que
o termo língua nos dá uma falsa sensação de uniformidade, mas dentro da realidade
linguística cabem inúmeras variedades que estão no interior de uma língua. Após,
Bagno (s.d.) nos apresenta que a variação pode ser desde o nível entre línguas até o
estágio individual, a ponto de afirmar que existem tantas línguas quanto o número de
usuários de determinada língua, a seguir, ele destaca que a percepção de que as línguas
variam é antiga, mas que esta diversidade era vista como negativa, por isso, surgiram
os estudos gramaticais que estabeleceram regras de uso da língua que acabaram por
colocar todos os demais usos dentro da perspectiva do erro, por isso, serve até os dias
de hoje como parâmetro de inserção social. Por fim, o autor apresenta a visão atual dos
estudos linguísticos, aquela que percebe as variantes como formas válidas de utilização
da língua, também, coloca que esta compreensão traz para o ensino da língua a
perspectiva de aprendizagem das diferentes formas de uso da língua e da valorização da
diversidade linguística dos aprendizes. Dessa forma, o verbete é bastante interessante
por trazer uma visão ao mesmo tempo sintética e abrangente da compreensão sobre a
variação linguística.
40
FIGURA 5 – VARIAÇÃO FONOLÓGICA SINAL DE ESTUDAR EM LIBRAS
VIDEOAULA YOUTUBE
41
Variação lexical: mudança de léxico de acordo com a região geográfica e
escolhas vocabulares de acordo com a formalidade ou informalidade da situação, por
exemplo, os diferentes sinais de MÃE em Libras, no sinal à Esquerda, a realização é feita
com o dedo na configuração em D que toca a lateral do nariz duas vezes, já o sinal à
Direita é formado pela junção dos sinais de MULHER + BENÇÃO;
FONTE: As autoras
42
FONTE: Adaptada de Quadros e Karnopp (2004)
[ela ou a menina] sentiu vontade de estar [...] e até que [ela] viu aquela neve [ela]
brincando e [ela] fez uma bolinha apertou observou e [ela] começou a apertar
[a bolinha] de vários modos [...] [ela] faz fazendo uma bolinha [...] [ela] juntou uma
uma bola de neve e [a bola] precisa ficar bola de neve e [...] [ela] brincava fazendo
bem compacta bolinha de neve,
FONTE: Anater e Passos (2009, p. 63-65)
43
Observe que, de acordo com os autores, a partir da mesma imagem motivadora
cada um dos sinalizantes organizou o discurso em Libras de modo diferente,
demonstrando a variação discursiva possível a partir do discurso dado.
Em relação às variações externas, Coelho et al. (2010) colocam que elas estão
vinculadas à fatores externos ao funcionamento da língua, ou seja, os fatores sociais
estudados pela Sociolinguística que também trazem alterações nos usos da língua, é
interessante destacar que as variações serão, normalmente, observáveis em relação
aos fatores internos e aos fatores externo ao mesmo tempo, observemos a listagem a
seguir foi adaptada dos autores citados no início deste parágrafo:
44
de usuários que sinalizam e escrevem em língua de sinais através de um sistema
de escrita, acreditamos, que, com o tempo talvez possamos enxergar um fenômeno
semelhante ao que é visto entre a LP falada e a LP escrita, que é a fixidez maior do
texto escrito, mas ainda é uma hipótese neste contexto.
DICA
Num vídeo bimodal a TV Unesp apresenta um UNESP
notícias em que dois especialistas falam sobre a
variedade linguística em Libras, o interessante é que
os dois professores falam sobre os mesmos aspectos,
mas cada um em uma modalidade. A professora
Angélica Rodrigues é ouvinte e apresenta em LP oral, já o professor
Rimar Segala apresenta, mesmo tempo, em Libras. Assim, além
de estar relacionado a nossa discussão também é um vídeo bem
interessante em relação à organização da apresentação em duas
modalidades ao mesmo tempo.
45
outros grupos que têm especificidades linguísticas peculiares, por exemplo, uma pessoa
que sabe português e Libras está inserida, minimamente, em duas comunidades
linguísticas diferentes, neste caso, comunidade é igual a línguas diferentes, mas se esta
pessoa também tem uma profissão específica, como ser médica, ela ainda compartilhará
do jargão específico dos médicos e participará desta comunidade linguística. Dito de
outro modo, assim como as línguas variam entre si, elas também variam e seu interior
a partir de grupos de pessoas que interagem linguisticamente e compartilham das
normas de uso específicas destas comunidades.
46
Assim, neste subtópico, vimos que uma comunidade linguística é um grupo de
indivíduos que compartilham de regras de uso de uma língua e se relacionam com as
variações linguísticas e com a Sociolinguística por ser em seu interior que se realizam
os fenômenos linguísticos observáveis que são objeto do estudo da Sociolinguística. A
seguir, vamos debater as mudanças e variações linguísticas.
DICA
Na atualidade, as nossas relações linguísticas ganharam a dimensão digital, ainda
mais depois do aumento formidável do uso das Tecnologias Digitais de Informação e
Comunicação (TDICs) em nosso cotidiano. No artigo Comunidades Virtuais, Comunidades
Linguísticas, Carmem Pimentel apresenta a compreensão de que as comunidades
linguísticas têm, agora, uma dimensão virtual que se enquadra na concepção de
comunidades linguísticas. A seguir, é colocado o Cr-code e link que que levam diretamente
à página em que o trabalho está disponibilizado, bem como o resumo do artigo para você
ter uma noção do que a autora apresenta. Vale a pena a leitura!
Acesse: http://www.institutodeletras.uerj.br/idioma/numeros/29/Idioma29_a05.pdf.
Carmen Pimentel
RESUMO
A era da informação ou a era do conhecimento é caracterizada pela mudança na maneira
de comunicação da sociedade e pela valorização crescente da informação, que circula
a velocidades e quantidades até então inimagináveis. Nesse contexto, que possibilita a
comunicação mais ágil entre os indivíduos, independentemente da localização geográfica
e em meio a um quadro de mudanças sociais confusas e incontroláveis, manifesta-se
uma tendência nas pessoas de se reunirem em grupos sociais visando compartilhar
interesses comuns. Passou-se a viver uma realidade diferente, em que as barreiras
espaciais, temporais e geográficas já não são tão significativas, quando as redes globais
de intercâmbios conectam e desconectam indivíduos, grupos, regiões e até países sob os
efeitos globalizantes provenientes da pós-modernidade. O indivíduo, assim, desprovido
de referências tradicionais saiu à procura de pessoas com as quais pudesse compartilhar
interesses em comum, uma vez que é da natureza humana se relacionar socialmente.
Nos últimos tempos, tal prática parece intensificar-se com a presença das redes mundiais
de computadores, que aproximam os indivíduos e possibilitam o surgimento de novas
formas de relações sociais: as comunidades virtuais, espécie de agrupamentos humanos
constituídos no ciberespaço ou no ambiente virtual.
47
5 DIFERENÇAS ENTRE VARIAÇÃO E MUDANÇAS
LINGUÍSTICAS
Os conceitos de variação e mudanças linguísticas são relacionados porque “[...]
a mudança linguística marca diferentes fases ou período na variação diacrónica.
Por outro lado, a mudança constitui uma selecção das formas linguísticas em variação
geográfica ou social, abandonando umas e generalizando outras à comunidade” (ROCHA,
2008, s.p., grifo nosso). Assim, a variação que pode ser percebida ao longo do tempo dará
origem às mudanças linguísticas, dito de outro modo, as variações ao longo da história de
uma palavra ou sinal nos mostrarão como a mudança dele ocorreu na língua.
NOTA
Sincronia e diacronia são maneiras de se perceber e estudar o fenômeno
linguístico, na sincronia, ele é estudado em um dado momento histórico,
fazendo um recorte histórico; já na diacronia o objeto de pesquisa é
estudado ao longo do tempo para perceber a evolução que sofreu ao longo
da história. Para fins de compreensão dos tipos de estudos, podemos
pensar que a sincronia é uma foto e a diacronia, um filme; na foto vemos
um instante específico no tempo, já no filme, acompanhamos uma história
ao longo de certo tempo.
48
Ao observarmos o caso das línguas de sinais, podemos perceber que muitos dos
vocábulos tiveram origem no contato com as línguas orais, por exemplo, o sinal de AZUL
(STROBEL; FERNANDES, 1998, p. 3) demonstra claramente o processo de mudança de
um léxico, inicialmente datilológico, em direção à simplificação e especificação mais
adequada às línguas de sinais.
49
Observe que o primeiro sinal faz referência direta à moagem do café, que era
feita num pilão, já o sinal mais atual faz referência à xícara de cafezinho e ao movimento
de tomar o café, esta diferença demonstra a capacidade da língua de se atualizar de
acordo a forma como a sociedade também muda. Neste exemplo, vemos claramente
uma modificação de comportamento social que aparece no uso da língua, pois,
atualmente, raras são as pessoas que moem seu café em casa, muito menos com um
pilão, logo, o sinal de 1875 não encontra mais referente na realidade e, talvez por isso, os
usuários da língua adotaram, ao longo do tempo, um novo sinal que faz mais sentido na
realidade vivenciada pelos indivíduos que utilizam a Libras.
Observe que o sinal inicial era formado pela sinalização das letras E e M, que
faziam a referência às letras iniciais da palavra E-MAIL, na sua realização o sinal trazia o
movimento em que o M era passado no meio do E para dar a ideia de envio. Já no sinal
mais atual, a vinculação à escrita da palavra foi deixada de lado, dando mais ênfase ao
sentido de comunicação por mensagem, utilizando a configuração em C e mantendo
o movimento que é característico dos sinais que envolvem sentidos de algo que é por
meio de ou através de. Assim, esta mudança fez com que o sinal de deslocasse de um
vínculo com a escrita e passasse a ter um sinal mais adequado às regras estruturais e
semânticas da Libras.
50
Acadêmico, neste subtópico, estudamos que as variações linguísticas ao longo
da história acarretam as mudanças linguísticas que serão observadas através do estudo
diacrônico da língua. Além disso, vimos que as mudanças estruturais das línguas são
mais demoradas do que as mudanças lexicais e fonológicas, ou seja, as mudanças
que modificam a gramaticais, que podem dar origem a outras línguas, são muito mais
demoradas do que as mudanças que ocorrem em relação à criação e apropriação
de palavras/sinais ou aquelas que modificam algum dos parâmetros fonológicos de
sinalização, ou seja, que mudam partes dos sinais. A seguir iremos discutir os contatos
linguísticos entre as línguas e a influência destes nas estruturações e reestruturações
das línguas em contato.
DICA
A dissertação de Diniz (2010) é bastante pertinente
para a discussão apresentada nesta seção, por isso,
recomendamos a leitura na íntegra de “A história da Língua de
Sinais Brasileira (Libras): um estudo descritivo de mudanças
fonológicas e lexicais”. Acesse: Link: https://repositorio.
ufsc.br/bitstream/handle/123456789/93667/282673.
pdf?sequence=1&isAllowed=y.
ESTUDOS FUTUROS
No próximo tópico, estudaremos mais detidamente os contatos entre
línguas diferentes e as mudanças linguísticas mais profundas que
acarretam, inclusive a emergência de outros sistemas linguísticos que
podem, oportunamente, serem reconhecidos como línguas diferentes. Dito
de outro modo, quando a mudança atinge os níveis estruturais da língua ela
dá origem a outros fenômenos que estudaremos mais adiante.
INTERESSANTE
Conforme combinamos no final do Tópico 1, a seguir será disponibilizada
a parte final do artigo Reflexões Sociolinguísticas sobre a Libras (Língua
Brasileira de Sinais). Nela, os autores discutem a questão do contato
linguístico, após debatem as noções de variação linguística e apresentam
alguns argumentos quanto à existência ou não de uma língua dita
“pura”. Por fim, tecem considerações finais em que retomam os pontos
levantados durante o artigo. Boa leitura!
51
REFLEXÕES SOCIOLINGUÍSTICAS SOBRE A LIBRAS (LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS)
Angelica Rodrigues
Anderson Almeida da Silva
[...]
Contato linguístico
A Libras existe no Brasil há pelo menos 159 anos, pois no ano de 1857 foi fundado
no Rio de Janeiro o primeiro Instituto Nacional para Educação de pessoas Surdas, o
INES. Anteriormente à criação do instituto, a língua já existia nas ruas, nas casas, com
menor difusão e estabilidade, no seio das comunidades surdas. Somente a partir da
institucionalização da educação de surdos, surgiram os primeiros registros lexicográficos
da língua e o interesse de profissionais em garantir a sua sobrevivência e difusão.
Atualmente, a Libras não é um idioma oficial da nação brasileira, mas é reconhecida
oficialmente pela Lei 10.436/2002 e pelo Decreto 5.626/2005. Ela existe e pode ser
utilizada ampla e indistintamente pelos surdos brasileiros, que tiveram, com a aprovação
dessas leis, suas especificidades linguísticas reconhecidas.
Seja como for, o fato de os surdos estarem inseridos num contexto em que o português
figura como língua majoritária faz com que a Libras, assim como outras línguas minorizadas,
se constituam como uma ilha linguística num mar de português. Desse modo, o contato
com o português é inevitável.
Segundo Thomason e Kaufman (1988), há duas pré-condições para que haja empréstimos
entre línguas, quais sejam, contato social intenso e falantes bilíngues. Considerando
que, além dos surdos, há também ouvintes usuários de Libras, podemos concluir que a
situação sociolinguística da comunidade surda no Brasil é de bilinguismo, em maior ou
menor grau. Como afirma Adam (2012), há consenso, atualmente, de que a comunidade
surda é uma comunidade bilíngue com indivíduos surdos com vários graus de fluência
na língua oral e de sinais da comunidade. Ainda segundo esse autor, em contextos
sociolinguísticos similares, o efeito do contato entre línguas orais e sinalizadas é igual ao
do contato entre línguas orais (ADAM, 2012).
52
Com relação ao uso da datilologia na Língua Americana de Sinais (daqui em diante,
ASL) alguns trabalhos apresentam perspectivas diversas. Battison (1978), por exemplo,
baseou-se no fato de que datilologia era inglês, não ASL. Outros pesquisadores, porém,
como Davis (1989), argumentam que datilologia não é inglês. Davis sustenta que
datilologia é ASL porque os morfemas em ASL nunca são emprestados de um contexto
ortográfico do inglês, eles são usados para representar um contexto ortográfico. Valli
e Lucas (1992) enfatizam que empréstimos de datilologia são reestruturados para se
adequar à fonologia da língua de sinais.
Evidências psicolinguísticas acerca desse fenômeno são oferecidas por Waters et al.
(2007) que investigaram a ativação de zonas cerebrais (lateralidade) de palavras escritas,
imagens, sinais e datilologia, buscando verificar se a datilologia era processada como
escrita ou sinalização. Os autores observaram que a datilologia era processada em áreas
do cérebro similares às usadas para os sinais da LS e distintas das envolvidas em escrita.
No que diz respeito à aquisição, Padden e LeMaster (1985), Akamatsu (1985) e Blumenthal-
Kelly (1995) apontam que crianças reconhecem palavras soletradas manualmente muito
antes de aprenderem a “soletrar”, o que pode evidenciar que essas palavras soletradas
são consideradas sinais e não palavras emprestadas da língua oral.
Ademais, itens lexicais podem ser criados, segundo Brentari e Padden (2001) e Sutton-
Spence (1994), através da composição de datilologia e sinais, como, por exemplo,
soletrado manualmente como -P- C e o sinal de mouth (boca) para Portsmouth (nome
de uma cidade).
Um dos principais valores associados à língua está presente fortemente na escola e, por
conta disso, é assumido pela grande maioria dos falantes como sendo verdadeiro. Esse
pré-conceito prevê que a língua é uma entidade homogênea e pura e está representada
completamente nas gramáticas tradicionais e na obra dos escritores clássicos da nossa
literatura. Expressões e palavras que estejam em desacordo com a norma prevista nessas
obras consistiriam em uma ameaça à pureza da língua. Essa ameaça pode se configurar
tanto em estruturas observáveis na fala e na escrita de brasileiros e identificada como
um erro ou desvio em relação àquilo que é convencionalmente chamado de norma
culta, quanto em palavras e expressões estrangeiras. Nos dois casos, esses usos são
condenados por gramáticos tradicionais, cabendo à escola a sua "correção".
53
Há uma associação forte entre língua e homogeneidade e pureza (língua pura),
estando a língua sujeita a ameaças externas (estrangeirismos, empréstimos) e internas
(variedades populares).
Por que dizemos que essa ideia é equivocada? O português é uma língua românica,
descendendo, portanto, do latim. Embora muitas palavras da nossa língua tenham
origem latina e grega, num exercício rápido de consulta aos dicionários de português,
encontramos inúmeras palavras estrangeiras, cuja origem é ignorada pela maioria dos
brasileiros. As palavras almofada, almoxarifado, alfaiate, por exemplo, são de origem árabe
e representam o registro linguístico do período que os árabes dominaram a Península
Ibérica entre os séculos VIII e XV d.C. As palavras cavalo, gato, cabana e cerveja são de
origem celta. Já as palavras guerra, albergue, fralda e branco são de origem germânica.
Apesar disso, nós como falantes não analisamos estes fatos no momento de fala, e
eles somente interessam a uma pesquisa histórica da língua. Percebe-se, então, que
os empréstimos linguísticos não ameaçam a existência de nenhuma língua no mundo,
do contrário, dão sinais de sua vitalidade e constituem registros linguísticos da história
externa de uma língua.
Se, por um lado, não podemos encontrar evidências sobre a primeira ou primeiras
línguas, por outro, temos descrições sobre o surgimento de novas línguas e a partir disso
somos capazes de entender melhor como nasce uma língua.
Aquilo que identificamos como português, por exemplo, nasce no século XI, sendo sua
história interna reflexo de sua história externa. A partir da instauração do Reino de
Portugal por D. Afonso Henriques, a Língua Portuguesa começa a se configurar de modo,
inclusive, a se distinguir da Língua Castelhana. A passagem do latim para o português
não é, entretanto, abrupta. Até que o português fosse normatizado, no século XVI, com
a publicação das primeiras gramáticas portuguesas, podemos entender que inúmeras
variedades eram faladas na região de Portugal. Dessas variedades restaram algumas
evidências, como as poesias trovadorescas, que apontam fortemente para um contato
linguístico. Considerando os séculos iniciais da emergência do português, podemos
concluir, desse modo, que essa língua nasce da mistura de diferentes línguas e variedades
e que sua configuração lexical e morfossintática emerge num contexto sociocultural
marcado pela diversidade linguística. Portanto, o português não tem uma origem "pura"
como muitos defendem.
54
vale tanto para as línguas orais quanto para as línguas sinalizadas. Souza e Segala (2009)
fazem um histórico do surgimento de várias línguas de sinais, inclusive a Libras. O que
todas essas línguas têm em comum considerando sua origem é o contexto multilingual e
multidialetal que precederam sua emergência.
Considerações finais
A partir desta exposição, pode-se afirmar que a fixação de quaisquer mudanças que
tenham se iniciado por questões de contato entre línguas diferentes é de responsabilidade
total da sua comunidade de fala.
Essa discussão é oportuna também para esclarecer aos profissionais da área de línguas
de sinais sobre a intolerância que, muitas vezes, se fomenta sobre os diversos ‘falares’
da Libras no Brasil. Muitos sinalizadores, pautados na ideia de que a sua forma de falar
é a correta, estimulam a intolerância às questões da variação, e acabam por impor um
julgamento daquilo que seriam para eles sinais "certos", "errados", "melhores" e "piores".
Esse processo é idêntico ao que vivenciamos nas línguas orais, identificado como
preconceito linguístico.
55
Concluímos que reconhecer a realidade sociolinguística da Libras, atestando o que há de
consenso e dissenso entre seus falantes, também é uma forma de legitimar a língua da
comunidade surda brasileira como uma língua natural, sujeita, portanto, à variação e à
mudança linguística.
56
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu:
• A tradição do estudo escolar sobre a língua nos deixa com a visão de que a norma
determina o uso, assim, dá a entender que não sabemos aquilo que efetivamente é
nosso: a língua.
• A noção de erro está vinculada à visão normativa, em que existe uma regra a partir da
qual os usos são avaliados.
• O preconceito pautado no uso da Libras é aquele em que aquelas pessoas que têm
menor fluência na Libras, surdas ou ouvintes, sofrem ao serem excluídas devido a
esta caraterística.
57
• As variações externas podem ser regionais, sociais, estilísticas e na fala e na escrita.
• Assim como as línguas variam entre si, elas também variam e seu interior a partir de
grupos de pessoas que interagem linguisticamente e compartilham das normas de
uso específicas destas comunidades.
• Ao mesmo tempo que as línguas variam, elas não variam de qualquer modo, mas
apenas das maneiras que o próprio sistema permite, tendo em vista a necessidade de
se manter uma conexão linguística proporcionada e controlada pelo próprio código
verbal compartilhado.
• A variação que pode ser percebida ao longo do tempo dará origem às mudanças
linguísticas, dito de outro modo, as variações ao longo da história de uma palavra ou
sinal nos mostrarão como a mudança dele ocorreu na língua.
• As mudanças lexicais são menos lentas e muito importantes para que a língua siga
viva e se apropriando/elaborando vocabulários para as novas tecnologias que surgem
no dia a dia, para as modificações das relações sociais e para a agilidade necessária
para a comunicação.
• A língua se atualiza de acordo com o modo como a sociedade muda, pois são
intrinsicamente ligadas. As modificações na língua ocorrem aos poucos, sempre e
seguem as regras estruturais da língua envolvidas.
58
AUTOATIVIDADE
1 As discussões sobre norma linguística se estruturam em duas compreensões da
noção da palavra norma, numa delas temos uma vinculação mais atrelada a regras
e na outra temos uma maior valorização do modo como os usuários fazem uso da
língua. Dentro destas discussões sobre as duas concepções de norma linguística, a
forma como os falantes/sinalizantes se expressam é percebido dentro de qual delas?
3 O modo como os sinais são feitos podem sofrer variações de acordo com diversos
fatores externos e internos à língua. Observe a figura a seguir, retirada de Strobel e
Fernandes (1998, p. 3) nela estão apresentados três sinais referentes à palavra VERDE:
59
Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) Somente a sentença I está correta.
b) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
c) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.
BRANCO SINAL
5 Os falantes de uma língua são agrupados de acordo com fatores sociais que
estruturam comunidades linguísticas, sobre as Comunidades Linguísticas, classifique
V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:
60
UNIDADE 1 TÓPICO 3 -
CONTATO LINGUÍSTICO
1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, nos tópicos anteriores, estudamos, inicialmente, o campo de
estudos da Sociolinguística e como ele percebe a relação entre língua e sociedade.
Além disso, debatemos sobre a história da delimitação e fixação da área de estudos
que percebe o fenômeno linguístico relacionado às características sociais, por fim,
estudamos alguns dos teóricos e das teorias que estudam essa perspectiva de análise
da língua a partir da observação das características geográficas, das variações sociais e
das teorias que percebe a interação entre discursos na língua.
Pois bem, agora, neste nosso último tópico da Unidade 1, iremos discutir alguns
dos fenômenos linguísticos que ocorrem quando duas ou mais línguas entram em
contato, ou seja, veremos como a Sociolinguística observa e conceitua a diversidade
linguística que nasce do contato entre falantes de diferentes línguas em situações de
tensão em que é necessário estabelecer uma forma de comunicação entre os envolvidos.
61
Assim, esta é uma das características marcantes do contato linguístico, ele
se faz entre indivíduos usuários de línguas diferentes que necessitam se comunicar,
esta necessidade cria uma tensão comunicativa que irá ocasionar diferentes níveis
de tensões e interações entre os indivíduos, logo, é uma situação de conflito que se
estabelece na e através da língua. Isso não quer dizer que esteja ligado a situações de
guerras, mas sim no sentido de que o contato linguístico ocorre em situações tensas
em que o indivíduo é obrigado a encontrar modos de estabelecer formas que propiciem
a comunicação com indivíduos que se comunicam através de outro código linguístico.
Assim, por ser nascida da necessidade, esta é uma circunstância que envolve diferentes
discussões sobre grupos humanos e comunidades linguísticas em contato que trazem
pressões lexicais, semânticas e estruturais sobre as línguas e, consequentemente,
sobre os usuários delas.
62
já nascem inseridas em uma comunidade linguística em que a modalidade da língua
não é capaz de prover os elementos linguísticos adequados para a sua comunicação.
É neste contexto que se origina um dos grandes dilemas quanto à inserção da língua
de sinais no cotidiano da criança surda desde o nascimento, pois muitos são filhos
de pais ouvintes e passam, muitas vezes, por diferentes profissionais, diagnósticos e
estágios até, talvez, terem acesso à sua língua de sinais, aquela que deveria ser sua
língua materna ou L1.
NOTA
Língua materna ou L1 é a língua de primeiro contato de uma pessoa, no caso dos
surdos, a L1 deveria ser a língua de sinais, pois ela é aquela cuja modalidade é
adequada para este indivíduo, porém fatore sociais, médicos, familiares, dentre
outros, acabam por retardar ou impossibilitar a aprendizagem da língua de
sinais, acabando por deixar várias pessoas em um limbo linguístico em que estabelecem
a comunicação por meio de mímicas e gestos caseiros, ou até por arremedos de língua
portuguesa e partes de oralização e leitura labial que são ineficientes e não são línguas,
mas formas de se comunicar, mesmo que precariamente.
ESTUDOS FUTUROS
As discussões sobre bilinguismo têm um lugar especial dentro das
pesquisas sobre surdez devido à vivência surda ser, a priori, uma vivência
bilíngue devido à prevalência da língua majoritária no contexto de inserção
social dos surdos, por isso, os debates sobre plurilinguismo e bilinguismo
serão tratados com mais detalhes mais adiante neste livro didático. Agora
vamos compreender o indivíduo bilíngue como aquele que se apropriou
do sistema linguístico de mais de uma comunidade, ou seja, aquelas
pessoas que são capazes de utilizar com proficiência mais de uma língua.
63
NOTA
McLeary (2009) elenca uma espécie de glossário da língua que resume bem
as mudanças linguísticas vistas ao longo desta unidade, por isso, ele será
reproduzido a seguir:
Interferência: pessoas bilíngues introduzem a palavra estrangeira na sua fala em
português.
Gírias e jargões: grupos de pessoas que convivem ou trabalham juntos começam a usar
a palavra estrangeira regularmente na sua fala diária. A pronúncia começa a mudar para
o padrão do português, mas a ortografia se mantém fiel ao original estrangeiro.
Estrangeirismo: a palavra começa a "vazar" para um público maior, nos jornais, TV e
rádio. A pronúncia continua a mudar para o padrão brasileiro. Na escrita, aparece com a
ortografia original, grafada em itálico. Começam a aparecer alternativas ortográficas mais
próximas ao padrão do português.
Aportuguesamento: uma ortografia aportuguesada começa a aparecer com frequência
nos meios de comunicação para competir com a ortografia original. A ortografia original
perde a grafia em itálico. A palavra é usada por pessoas que desconhecem sua origem.
Empréstimo: a palavra é usada normalmente como qualquer palavra no português,
com ortografia aportuguesada. Ela começa a sofrer flexão e derivação pelas regras do
português.
Dicionarização: a palavra começa a aparecer nos dicionários, ou com a grafia original
(como estrangeirismo), ou com a grafia aportuguesada (como empréstimo) ou com as
duas simultaneamente.
Absorção: a palavra perde sua identidade "estrangeira" completamente e começa a ser
considerada simplesmente como mais uma palavra legítima do português, sem questão
de origem.
64
FIGURA 13 – SINAL DE NUNCA
65
FIGURA 15 – ANO SINAL
e) DE ORDEM FONÉTICA: que são obtidos pela tentativa de representação visual do som
que constitui a palavra em português, tal como são percebidas pelo surdo. [Observe
que o sinal SE é sinalizado como “si” o que nos permite pensar que a elaboração
deste sinal foi baseada na percepção articulatória da palavra, tendo em vista que a
vogal “e” em final de palavra se torna uma semivogal com o som semelhante ao “i].
FIGURA 17 – SE SINAL
66
DICA
O artigo de Machado e Quadros (2020) apresenta uma discussão bastante
pertinente para o que discutimos nesta seção, por isso, colocaremos o resumo
a seguir e recomendamos a leitura na íntegra.
RESUMO
Este artigo tem como objetivo apresentar um estudo descritivo sobre a ocorrência do
fenômeno linguístico “empréstimos linguísticos” de diferentes línguas de sinais para a
língua brasileira de sinais – Libras – em videoaulas de disciplinas do curso de Letras Libras
(turma de 2006), da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) baseado no estudo
de Machado (2016). Como metodologia de pesquisa foi feita uma comparação dos sinais
encontrados nas videoaulas com sinais extraídos de dicionários online de outras línguas
de sinais, além de entrevistas realizadas com os sinalizantes dos DVDs e os sinalizantes
estrangeiros para confirmar se havia alguma relação entre eles. O objetivo foi verificar
quais sinais eram efetivamente empréstimos de outras línguas de sinais. A pesquisa
compilou um corpus lexical de “empréstimos linguísticos entre línguas de sinais”. Esse
corpus foi analisado com o suporte do programa Elan, utilizado nesta pesquisa para
identificar os sinais, coletados nos vídeos. Como proposta teórica, seguimos a tipologia
de empréstimos de línguas em contato proposto por Carvalho (2009). Os resultados
evidenciam que o fenômeno estudado é produtivo na Libras, uma vez que apresenta
vários empréstimos linguísticos de outras línguas de sinais.
67
consequência, recorrentes e compartilhados socialmente pelos usuários. Para
exemplificar, pense em um aprendiz ouvinte de língua de sinais, ele poderá utilizar a
soletração manual para perguntar o sinal de algo no meio de um discurso em Libras,
mas esta datilologia não passará a fazer parte da língua de sinais, já os sinais de AZUL
e NUNCA, foram empréstimos da Língua Portuguesa que sofreram adaptação durante
o uso e se tornaram mais adequados ao modo de sinalização da Libras, mesmo assim,
ainda são reconhecidamente emprestados da grafia em LP. Neste exemplo, o primeiro
uso é uma estratégia de mistura de códigos (code-mixing) em que soletração da palavra
em LP foi inserida no meio do discurso em Libras e os sinais de AZUL e NUNCA são
exemplos de empréstimos.
Além disso, para utilizar um sinal que foi emprestado de outra língua não
é necessário que o indivíduo conheça a língua de onde veio a palavra, pois, existe
uma infinidade de sinais e palavras das quais não sabemos a origem, mas que utilizamos
sem problemas, pois elas passaram a fazer parte do léxico da língua. Porém, para ser
capaz de utilizar estratégias linguísticas que alternam, misturam ou sobrepõem códigos
é necessário saber utilizar mais de uma língua, ou seja, ser bilíngue em algum nível.
68
necessária para utilizar as duas línguas de modo perfeito, deste modo, a alternância
no discurso seria uma “[...] simples troca de vocábulos ou estruturas sintáticas, feita de
maneira aleatória [...]”. Ou seja, o usuário alternaria entre a língua A e a língua B porque
não saberia como comunicar o que pretendia na língua A.
69
razão, podem ser usados ao mesmo tempo”. Desta maneira, a sobreposição
é um fenômeno linguístico observável, principalmente, no contato entre
línguas de diferentes modalidades, tais como as línguas de sinais em contato
com as línguas orais, pois uma é oral-auditiva e a outra visuoespacial, logo,
é possível sobrepor partes do discurso quando utilizadas ao mesmo tempo.
Ainda segundo Xavier (2019, p. 51), o autor destaca que nas pesquisa sobre
línguas de sinais, a maioria dos estudos se dedica a estudar a relação entre estas e
as línguas orais devido ao contexto de bilinguismo bimodal em que os surdos estão
inseridos, assim sendo, alternância, misturas e sobreposições são aquelas “[...]
situações em que sinalizantes usam o vocabulário e/ou a gramática da língua
oral durante a produção de enunciados em línguas de sinais (e vice-versa) de
forma intersentencial, intrassentencial e simultânea, respectivamente.
[...]”. Desta maneira, a alternância se dá entre sentenças, a mistura, no interior
das sentenças e a sobreposição, por sua vez, acontece de modo paralelo nas
duas línguas quando as características das línguas envolvidas permitem a
realização ao mesmo tempo dos dois códigos linguísticos envolvidos.
70
O pidgin é uma estruturação linguística que é resultado de extenso contato
entre, no mínimo, duas línguas que possuem valor socioeconômico distinto. Além
disso, ele também tem a particularidade de ser aprendido por adultos em situações de
emergência, ou seja, momentos em que a comunicação é necessária, mas as pessoas
envolvidas não têm uma língua em comum. De acordo com McCleary (2009, p. 21, grifo
do autor):
FONTE: As autoras
71
Observe que na sentença feita em português sinalizado as palavras da
LP são apenas convertidas para os sinais com a estrutura ainda em LP, sendo feito
um sinal para cada palavra, o que não responde ao uso da Libras, já na sentença em
Libras, temos o uso apenas do sinal de nome, pois os demais elementos das sentenças
se encontram implícitos nas normas de uso da língua brasileira de sinais não sendo
necessária a sinalização específica deles.
Estas características fazem do pidgin uma língua franca, ou seja, um idioma que
é utilizado por pessoas que se utilizam de outros códigos linguísticos. Todo pidgin é uma
língua franca, mas nem toda a língua franca é um pidgin, pois essa pode ser qualquer
língua que pessoas que têm outras línguas maternas para a comunicação, tal como o
latim na Idade Média, o francês no século XVIII e o inglês na atualidade (McCLEARY, 2009).
72
Em contraponto, os autores destacam como se deu a emergência da língua de
sinais na Nicarágua. Um caso curioso devido ao processo de escolarização dos surdos
ter se dado a partir de 1946, em plena época de proibição da sinalização. Assim, é assunto
de pesquisa como aconteceu o pidgin, que originou a língua nicaraguense de sinais,
pois não existia a língua franca sinalizada, a conclusão das pesquisas apresentadas
pelos autores é de que, ao serem colocados num mesmo espaço de aprendizagem,
os surdos trouxeram seus sinais caseiros, sendo que estes são o início de “[...] uma
comunicação simbólica. Quando as crianças surdas têm oportunidade de usar esses
gestos na comunicação com outros surdos, eles sofrem elaborações que acabam
resultando em uma língua natural, da mesma forma que uma língua crioula nasce de
uma língua pidgin”. Assim, a língua se desenvolveu a partir da estruturação feita pelo
contato entre crianças surdas e os sinais caseiros delas, mesmo num momento de
proibição. Depois foi estabelecida uma associação de surdos em que a língua de sinais
era utilizada de modo mais livre e menos gramatical pelos surdos mais velhos. Assim, na
interação dos adultos e das crianças a estrutura da língua se estabeleceu e especializou,
dando origem à língua de sinais nicaraguense.
73
Sintático Ordem própria da Versão simplificada Língua oral
língua de sinais, da ordem da língua
uso do espaço e oral, uso reduzido
das expressões do espaço e das
não manuais expressões não
manuais
FONTE: Xavier (2019, p. 51)
74
Assim, a área das relações entre a linguagem e sociedade é um local bastante
interessante para os estudos sobre a Libras, pois entende a diversidade como
constituinte do fenômeno linguístico e não dentro da noção de erro/acerto. Além disso,
os conceitos e noções teóricos da Sociolinguística, que estudam as variações entre
diferentes usos da língua e dos modos como a língua é lugar de poder e tensão entre os
indivíduos e os demais sujeitos, os indivíduos e a própria língua, os indivíduos e a língua
do outro, são bastante relevantes para a área dos estudos sobre as línguas de sinais,
pois os usuários destas línguas acabam por viver em ambientes de tensão linguística
deste o nascimento, tendo em vista as discussões sobre aquisição de língua materna
e inserção da língua de sinais como um direito da pessoa surda desde seu nascimento.
76
QUADRO 4 – PESQUISAS EM SOCIOLINGUÍSTICA
Fatores Estudos sobre Sugestões de pesquisa em Língua de Exemplos de pesquisa em LS
linguísticos Sinais
socialmente
determinados
Identidade Características linguísticas Diferenças dialetais entre grupos de surdos OLIVEIRA, R. G. de. A variação articulatória em libras e a orientação
Social do específicas de um grupo linguístico usuários da Libras, tais como, cruzamento sexual do surdo: estudo sobre captura de movimentos e percepção
emissor ou que existe do interior do grupo de de dados entre surdos oralizado, linguística. 2017. Dissertação (Mestrado em Linguística) - Faculdade de
falante falantes de uma língua (dialeto) de alfabetizados, de diferentes classes sócias, Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São
classes sociais e das diferenças de diferentes lugares, etc. Paulo. Disponível https://teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8139/tde-
entre falas femininas e masculinas 10042018-132609/pt-br.php. Acesso em: 5 out. 2021.
Identidade Estudo das formas de tratamento, Estudos comparativos para estudar como DUARTE, L. R. Code-blending: análise sociolinguística de
social do da baby talk (fala utilizada por a baby talk se materializa nas famílias de procedimentos técnicos da tradução aplicados ao par linguístico
receptor ou adultos para se dirigirem aos surdos e nas famílias de ouvintes que (Libras e português). 2020. Dissertação (Mestrado em Estudos da
ouvinte bebês) tenham filhos surdos, discussões sobre Tradução) – Programa de Pós-Graduação em Estudos da Tradução,
aquisição de língua materna. Estudos sobre Universidade Federal de Brasília, Brasília. Disponível https://repositorio.
estratégias de tradução em relação aos unb.br/handle/10482/39022 Acesso em: 5 out. 2021.
elementos de contato entre línguas.
Contexto Social; Estudo das diferenças entre a Observação do contexto social de COSTA, F.R. Variação linguística na língua brasileira de sinais:
forma e a função dos estilos formal enunciação e os diferentes estilos de uso um estudo a partir de narrativas autobiográficas surdas. 2018.
e informal, existentes na grande da Libras Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Santa Catarina,
maioria das línguas. Centro de Comunicação e Expressão, Programa de Pós-Graduação
em Linguística, Florianópolis, Disponível https://repositorio.ufsc.br/
handle/123456789/194323 Acesso em: 5 out. 2021.
O julgamento Os falantes fazem juízos de valor do Julgamento dos interlocutores sobre as DELGADO, I. C. Uma análise estilística da língua brasileira de sinais:
social distinto próprio comportamento linguístico atitudes linguísticas dos demais. Variações de seu uso no processo interativo. 2012. Tese (doutorado
e sobre o dos outros, isto é, as em Linguística) - Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes (CCHLA)
atitudes linguísticas. - Programa de Pós-Graduação em Linguística. Universidade Federal
da Paraíba, João Pessoa. Disponível https://repositorio.ufpb.br/jspui/
bitstream/tede/8426/2/arquivo%20total.pdf. Acesso em: 5 out. 2021.
77
DICA
As pesquisas sobre as teses e dissertações que se encaixam nos estudos em
Sociolinguística foram feitas na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações, o
link da pesquisa feita por nós é o seguinte: https://bdtd.ibict.br/vufind/Search/
Results?lookfor=libras++sociolingu%C3%ADstica&type=AllFields&sort=year.
78
LEITURA
COMPLEMENTAR
A VARIAÇÃO ARTICULATÓRIA EM LIBRAS E A ORIENTAÇÃO SEXUAL DO SURDO
Estudo sobre captura de movimentos e percepção linguística
CONCLUSÃO
O arcabouço teórico que fundamenta esta pesquisa foi apresentado para que
déssemos os primeiros passos à luz de recentes e relevantes estudos da sociolinguística,
fonética e fonologia das línguas de sinais. Em seguida, explicamos os métodos utilizados
nos dois estudos desenvolvidos nesta pesquisa, apresentamos os resultados obtidos e
discutimos esses resultados embasados em estudos da área.
Estudo 1
79
• organizar o corpus elaborado com os ângulos-alvo desta pesquisa, conforme o
modelo proposto por Barbosa, Temoteo e Rizzo (2015). Identificamos, na lista de
ângulos (Figura 10) gerados pelo programa Nexus (parte integrante do sistema Vicon),
aqueles referentes aos cinco movimentos de interesse deste estudo: ShoulderAngles
(eixos X Y e Z), ElbowAngles (eixo X) e WristAngles (eixo Z), conforme Quadro 3;
Estudo 2
80
A pesquisa que desenvolvemos partiu de algumas hipóteses que retomamos
abaixo, com suas devidas conclusões:
• surdos gays são percebidos como mais femininos quando comparados com surdos
heterossexuais. Esta hipótese foi confirmada. Os dados mostraram que houve
diferença estatisticamente significante na percepção de feminilidade entre os
sujeitos gays (avaliados como mais femininos) e os sujeitos heterossexuais (avaliados
como menos femininos).
• surdos gays são percebidos como gays quando comparados com surdos
heterossexuais. Esta hipótese não foi confirmada. Os dados mostraram que não
houve diferença significativa na seleção da opção de resposta gay´ entre os sujeitos
gays e os heterossexuais.
Cabe ressaltar que a pesquisa que se iniciou com este trabalho busca contribuir
para o conhecimento linguístico das línguas de sinais - sobretudo no que diz respeito
ao fenômeno da variação linguística nesta modalidade de língua - e motivar futuras
pesquisas a utilizarem novos recursos como a captura de movimentos.
81
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu:
• Estas discussões sobre contato linguístico são relevantes para os debates sobre os
direitos linguísticos do povo surdo e sua inserção social.
• Uma pessoa bilíngue é um indivíduo que tem o domínio de mais de uma língua,
ou seja, ele é capaz de estabelecer um diálogo através de mais de uma estrutura
linguística.
82
• O pidgin é um registro simplificado, precário, variável, sem gramática estabelecida
e não natural, pois surge a partir da imposição da necessidade de uma forma
de comunicação em contextos nos quais é urgente estabelecer algum modo
linguisticamente compartilhado de comunicação.
• O pidgin é um processo anterior ao do surgimento de uma língua crioula, pois não tem
a organização e estrutura que caracteriza uma língua, mas permite a comunicação
entre línguas diferentes e, este contato linguístico faz emergir uma comunidade
linguística que se utiliza deste código, a partir do nascimento de crianças que terão o
pidgin como vivência linguística este registro simplificado se torna língua ao ganhar
alicerces linguísticos regulares se tornando uma língua que nasceu da simplificação
de várias outras línguas.
83
AUTOATIVIDADE
1 Estão inseridas no contexto de contacto linguístico as pessoas surdas, pois elas já
nascem inseridas em uma comunidade linguística em que a modalidade da língua
não é capaz de prover os elementos linguísticos adequados para a sua comunicação.
É neste contexto que se origina um dos grandes dilemas quanto à inserção da língua
de sinais no cotidiano da criança surda desde o nascimento, pois muitos são filhos
de pais ouvintes e passam, muitas vezes, por diferentes profissionais, diagnósticos e
estágios até, talvez, terem acesso à sua língua de sinais, aquela que deveria ser sua
língua materna ou L1. Avalie as asserções a seguir e a relação proposta entre elas:
PORQUE
2 De acordo com o que foi estudado neste Tópico 3, pidgin são as línguas que surgem
do contato entre duas línguas através das quais os usuários precisam se comunicar,
por isso, não têm as características que estruturam uma língua. Assim, explique por
que o chamado Português Sinalizado é um exemplo de pidgin?
84
COR AZUL SINAL
I- Na primeira etapa, vemos que o sinal de AZUL foi um empréstimo direto da Língua
Portuguesa através da datilologia.
II- Na segunda etapa, vemos que a realização do sinal de AZUL sofreu alterações
que suprimiram parte das letras, mas mantiveram o movimento da Esquerda para
a Direita.
III- Na terceira etapa, vemos que o sinal de AZUL foi ampliado em sua movimentação.
IV- Na terceira etapa, vemos que o sinal de AZUL mantém traços de ter sido um
empréstimo do português.
85
REFERÊNCIAS
ALKMIM, T. M. Sociolinguística: parte I. (p. 21 – 47). In: MUSSALIN, F.; BENTES, A. N. (Orgs.).
Introdução à linguística: domínios e fronteira. V. 1, 9. ed. São Paulo: Cortez, 2011.
BAGNO, M. Norma linguística, hibridismo & tradução. In: Traduzires, [S. l.], v. 1, n. 1, p.
19–32, 2018. Disponível em: https://periodicos.unb.br/index.php/traduzires/article/
view/20891. Acesso em: 27 set. 2021.
86
CASTRO, J. et al. Níveis de interação entre os saberes. Natal: SESI, 2010. Projeto
SESI - Curso Currículo Contextualizado. Disponível em: https://pt.slideshare.net/
marianacorreiail/11-tc-niveisdeinteracao-36438457. Acesso em: 19 set. 2021.
87
MACHADO, V. L. V., WEININGER, M. J. As variantes da língua brasileira de sinais
Libras. In: Transversal – Revista em Tradução, Fortaleza, v. 4, n. 7, p. 41-65, 2018
Disponível em: http://www.repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/38106/1/2018_art_
vlvmachadojweininger.pdf. Acesso em: 29 set. 2021.
PORTO EDITORA. Pidgin. Dicionário Infopédia da Língua Portuguesa. [s.d., s.p.] Porto:
Porto Editora. Disponível em: https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/
pidgin. Acesso em: 4 out. 2021.
SAUSSURE, F.de. Curso de linguística geral. 3.ed. São Paulo: Culrix, 1981.
STROBEL, K. L.; FERNANDES, S. Aspectos linguísticos da Libras. Curitiba: SEED/
SUE/DEE, 1998. Disponível em: http://www.librasgerais.com.br/materiais-inclusivos/
downloads/Aspectos-linguisticos-da-LIBRAS.pdf. Acesso em: 2 out. 2021.
88
SOARES, M. S. A alternância de códigos no contexto da educação bilíngue: code-
switching, code-mixing e as transferências linguísticas. In: Revista Gatilho. Juiz
de Fora. V. 15. [s.n.]. Páginas 1 – 14. 2012. Disponível em: file:///C:/Users/maril/
Downloads/27015-Texto-106572-1-10-20190616.pdf. Acesso em: 4 out. 2021.
89
90
UNIDADE 2 —
LINGUAGEM E
SOCIOLINGUÍSTICA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
PLANO DE ESTUDOS
A cada tópico desta unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de
reforçar o conteúdo apresentado.
CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.
91
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 2!
Acesse o
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92
UNIDADE 2 TÓPICO 1 —
AS CONCEPÇÕES DE LINGUAGEM
1 INTRODUÇÃO
Ao longo da leitura e dos estudos da Unidade 2, você perceberá que esta
disciplina tem, como interesse, abordar o que a Sociolinguística estuda, direcionada
para a Língua Brasileira de Sinais-Libras, por isso, o título da disciplina, Sociolinguística
da Libras. É importante ressaltar que esse tema é perpassado por vários outros, os quais
envolvem outras linguagens e diferentes visões e interlocutores presentes nas situações
sociais. Daí a necessidade e a relevância de falarmos das concepções de linguagem,
uma vez que elas regem a nossa constituição como sujeitos, as nossas visões do outro
e do mundo, no qual interagimos cotidianamente.
A língua materna pode ser definida como a primeira língua que adquirimos,
também, chamada de L1 (GORSKI, 2010). Ainda, é nomeada de língua de casa, a depender
da visão de linguagem. No que se refere à língua adicional, envolve as línguas aprendidas
após a língua materna. Não se trata, apenas, de um novo termo na área da educação
linguística, mas de um novo olhar, o qual envolve práticas de ensino que consideram as
outras línguas que o ser humano aprende (LEFFA; IRALA, 2014; SCHLATTER; GARCEZ,
2012). Para tanto, para compreendermos melhor os papéis desses termos nas situações
de ensino e aprendizagem de línguas, dedicaremos o próximo tópico às concepções de
linguagem. Vamos lá?!
NOTA
Neste livro, o termo língua é usado como equivalente de linguagem,
pois entendemos a linguagem como uma forma de comunicação, seja de
modo verbal ou não verbal. Logo, no presente texto, a língua é estudada e
compreendida no contexto de comunicação verbal, e, socialmente, situada.
93
IMPORTANTE
Neste livro, trazemos a concepção de língua materna como a primeira
língua que aprendemos. No entanto, essa não é a realidade de muitos
surdos em relação à Língua Brasileira de Sinais, visto que a maioria deles
nasce em famílias de ouvintes, e acabam tendo contanto com a Libras de
forma tardia.
Para explorar mais esse assunto, recomendamos a leitura, na íntegra, do artigo de Zilda
Maria Gesueli, Língua(gem) e identidade: a surdez em questão. Para você ter uma
ideia do que ele trata, segue o resumo do artigo.
94
A linguagem é o fundamento das sociedades. Ela constitui culturas, valores e
histórias de grupos sociais; cria e amplia a tecnologia; e possibilita, ao indivíduo, dar
significado ao mundo, transformar a visão sobre o universo, sobre si mesmo, ao perceber
e interagir com a realidade, de acordo com a própria necessidade comunicativa.
NOTA
De acordo com Porfírio (2018, s.p.), o estruturalismo é uma metodologia
de análise utilizada nas ciências humanas, sendo que tem, como objetivo,
“[...] entender o modo como uma estrutura geral perpetua em todos os
graus de uma base. Ao se compreender essa base, é possível entender
como o conhecimento se dá naquela área [...]”. Desse modo, a perspectiva
estruturalista, na linguística, pretende compreender a estrutura através da
qual a língua se organiza.
95
FIGURA 1 – CONCEPÇÃO DE LINGUAGEM COMO EXPRESSÃO DO PENSAMENTO
Compreendemos que o ensino da língua materna, na escola, por meio dessa visão
de linguagem, está pautado nas normas gramaticais, visto que a língua é considerada um
sistema de regras imutável. Nesse sentido, a diversidade e a variação linguística não são
fenômenos necessários e importantes para o ensino, já que conflitam com a regularidade
da língua, que é tão marcada nessa concepção, o que abre espaço para o preconceito
linguístico e para invisibilização das línguas minoritárias (CAVALCANTI, 2011).
96
FIGURA 2 – A LINGUAGEM COMO INSTRUMENTO DE COMUNICAÇÃO
NOTA
O termo minoritário tem um sentido ideológico, e não se refere à quantidade
de falantes da língua. A língua minoritária não é falada por uma quantidade
específica, ela é minoritarizada na sociedade, diante de ideologias que
destacam um falante e uma língua ideal (CAVALCANTI, 2011).
97
FIGURA 3 – LINGUAGEM COMO UM PROCESSO DE INTERAÇÃO
98
Ao analisarmos a síntese apresentada neste quadro, podemos compreender
que as três concepções percebem a linguagem de maneira diferentes. Estes modos
diversos de entender a linguagem estão relacionados à forma como cada uma das
vertentes observa facetas diferentes do fenômeno linguístico, pois tentam explicar
como se dá a estruturação a partir de visões que valorizam aspectos diversos. A seguir,
falaremos do purismo linguístico, tema em destaque nas duas primeiras concepções.
Faremos uma reflexão de o quanto essa ideologia de linguagem pode não corresponder
à realidade, tão diversa, linguística, e, culturalmente, presente na sociedade.
DICA
Para aprofundar os seus conhecimentos de concepção
de linguagem, assista ao vídeo Concepção de Linguagem,
disponibilizado na plataforma YouTube, pelo link: https://
www.youtube.com/watch?v=xidEFjMrmes.
99
Segue um exemplo de preconceito linguístico em relação à Libras. Apesar
do uso e da difusão da Língua Brasileira de Sinais, ainda, encontramos falas que
relacionam a Libras à mímica. De acordo com Gesser (2009), essa ideia que permeia
a sociedade tem a ver com a forma por meio da qual os ouvintes veem os surdos,
tratando-os de forma exclusiva e pejorativa. Apresentaremos uma figura que fará
referência à afirmação da autora, a de que Libras não é mímica, mas uma língua natural
que emergiu da comunicação entre surdos, e que, assim como as línguas orais, possui
uma gramática própria.
100
Para Bagno (2007), o preconceito linguístico produz diferentes mitos. O autor
pontua alguns mitos relacionado com a Língua Portuguesa, os quais podem ser, também,
pensados em relação à Libras e ao ensino de Português para os surdos, a saber: o
Português é uma língua muito difícil, pois se reduz ao ensino e à aprendizagem de regras
gramaticais; saber gramática é essencial para escrever e falar bem; o domínio da norma
culta é, extremamente, importante e necessário para a ascensão social. Esses mitos podem
ser um grave entrave se reproduzidos no contexto de ensino de Português para surdos,
visto que muitos deles, conforme já mencionado, aprendem a língua de sinais tardiamente,
e isso traz consequências para a aprendizagem da língua portuguesa como língua adicional
(GESSER, 2009). Desse modo, em um contexto de educação de surdos e/ou de pessoas
ouvintes, é preciso repensar nesses mitos, pois se deve considerar a singularidade do aluno
e as realidades social e educacional dele, para que o processo de escolarização não seja um
ensino voltado ao padrão, à norma e ao purismo da língua.
Sobre esta discussão podemos destacar que Milroy (2011) acrescenta que o uso
da norma, com o intuito de padronizar a língua, com base em um purismo linguístico,
evitando que ela se “misture” com outras línguas, é uma imposição que consiste em
eleger determinadas estruturas, ou variedades da língua, como as únicas, corretas e
aceitáveis. Nessa visão de língua, não existe a possibilidade de usar duas variedades
da língua, pois, somente, uma está certa, e a língua deve manter o próprio purismo,
deixando de lado os empréstimos linguísticos e os neologismos.
NOTA
Como vimos anteriormente na Unidade 1, os empréstimos linguísticos são
palavras ou partes de palavras que são incorporadas em uma língua a partir
do uso de palavras ou expressões pertencentes ao léxico de outra língua. Por
exemplo, o uso da palavra o sinal referente à cor AZUL que carrega traços da Língua
Portuguesa em sua configuração.
Já os neologismos são palavras ou sinais novos criados a partir de palavras que existem
na língua, de acordo com Rosa e Potin (2012) este seria um fenômeno observável no uso
do sinal de passarinho para fazer referência ao Twitter, alterando a referência do sinal de
acordo com o contexto para abarcar a necessidade de referência à rede social.
101
INTERESSANTE
Na leitura que apresentaremos a você a seguir, recortaremos um trecho
do livro O Texto na Sala de Aula, de João Wanderley Geraldi. Nesse texto,
o autor situa a linguagem como o lugar de constituição de relações
sociais, onde os falantes se tornam sujeitos, e destaca a importância
de a escola ser um espaço democrático para as diferentes variedades
linguísticas presentes na Libras na Língua Portuguesa.
[...]
A interação linguística
A democratização da escola
102
A democratização da escola, ainda que falsa, trouxe, em seu bojo, outra clientela,
e, com ela, diferenças dialetais bem acentuadas. De repente, não damos aulas
só para aqueles que pertencem ao nosso grupo social. Representantes de outros
grupos estão sentados nos bancos escolares, e eles falam diferente. Sabemos que
a forma de fala que foi elevada à categoria de língua nada tem a ver com a qualidade
intrínseca dessa forma. Fatos históricos (econômicos e políticos) determinaram
a “eleição” de uma forma, como a língua portuguesa. As demais formas de falar,
que não correspondem à forma “eleita”, são todas postas em um mesmo saco e
qualificadas como “errôneas”, “deselegantes”, “inadequadas para a ocasião” etc.,
entretanto, uma “variedade linguística “vale” o que “valem”, na sociedade, os
falantes dela, isto é, vale como reflexo do poder e da autoridade que eles têm nas
relações econômicas e sociais. Essa afirmação é válida, evidentemente, em termos
internos, quando confrontamos variedades de uma mesma língua, e, em externos,
pelo prestígio das línguas no plano internacional (GNERRE, 1978). A transformação
de uma variedade linguística em “culta”, ou “padrão”, está associada a vários fatores,
dentre os quais Gnerre aponta:
Agora, dada a situação, de fato, em que estamos, qual poderia ser a atitude
do professor de língua portuguesa? A separação entre a forma de fala dos alunos
e a variedade linguística considerada “padrão” é evidente. Sabendo-se que tais
diferenças são reveladoras de outras diferenças, e que a “língua padrão” resulta de
uma imposição social que desclassifica os demais dialetos, qual é a postura a ser
adotada pelo professor?
103
instrumento legítimo do discurso escolar (dos professores, dos alunos e do material
didático). Por outro lado, há os que afirmam a necessidade de que as classes
populares aprendam a usar a variedade linguística, socialmente, privilegiada, própria
das classes dominantes, e aprendam a manter, com a linguagem, a relação que as
classes dominantes, com ela, mantêm, pois a posse dessa variedade e dessa forma
específica de relação com a linguagem é instrumento fundamental e indispensável
na luta pela superação das desigualdades sociais.
Não estou afirmando que, por meio das aulas de língua portuguesa,
processar-se-á a modificação da estrutura social. Estou, tão e somente, querendo
dizer que o princípio “quem não se comunica se trumbica” não pode servir de
fundamento para o nosso ensino: afinal, nossos alunos se comunicam com o dialeto
deles, mas têm se trumbicado que não é fácil... É claro que esse “se trumbicar” não
se deve, apenas, à linguagem.
104
Parece-me que o mais caótico da atual situação de ensino de língua
portuguesa, em escolas de primeiro grau, consiste, precisamente, no ensino para
alunos que nem sequer dominam a variedade culta, uma metalinguagem de análise
dessa variedade – com exercícios contínuos de descrição gramatical, estudo de
regras e hipóteses de análise de problemas que, até mesmo, especialistas não estão
seguros de como resolver.
Um exemplo menos caótico, mas, nem por isso, menos triste, e, infelizmente,
mais frequente, são páginas e páginas de conjugações verbais em todos os tempos
e modos, sem que o aluno suspeite do que significa indicativo, subjuntivo ou mais-
que-perfeito.
105
Gostaria de encerrar essas breves considerações de concepção de
linguagem, variedades linguísticas e ensino de língua/ensino de metalinguagem,
reafirmando que a reflexão a respeito do “para quê” do nosso ensino exige que
pensemos no próprio fenômeno de que somos professores – no nosso caso, a
linguagem –, pois tal reflexão, ainda que assistemática, ilumina toda a atuação do
professor em sala de aula.
FONTE: GERALDI, J. W. et al. O texto na sala de aula. 5. ed. São Paulo: Ática, 2011, p. 35-37.
106
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu:
107
AUTOATIVIDADE
1 A linguagem pode ser compreendida a partir de três concepções que destacam
modos diferentes de se conceber a linguagem: a linguagem como expressão do
pensamento; a linguagem como instrumento de comunicação; e, por último, a
linguagem como processo de interação. Essas concepções podem nortear o ensino
de Libras como língua materna para os surdos, e o ensino do Português como língua
adicional. Dentre estas concepções de linguagem, qual delas destaca a norma padrão
e se alinha à visão inatista da língua?
108
4 Apesar da oficialização da Libras como língua da comunidade surda dos centros
urbanos, do uso e da difusão, ainda, encontramos falas equivocadas que relacionam
a Libras à mímica. Por que isso, ainda, acontece?
109
110
UNIDADE 2 TÓPICO 2 -
UM OLHAR SOCIOLINGUÍSTICO SOBRE A
HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DE SURDOS
1 INTRODUÇÃO
A inclusão dos surdos, nas escolas, coloca diversos desafios aos sistemas de
ensino, em virtude das mudanças que ocorreram desde a década de 1980. A história da
educação de surdos foi marcada por diferentes momentos, os quais envolveram desde a
invisibilização da Libras e dos surdos, pela sociedade, a uma fase de resgate dos direitos
deles, momento em que a comunidade surda se posicionou a respeito do uso da língua
de sinais e do reconhecimento como pessoas com direitos, a fim de mostrar as próprias
culturas e identidades.
111
A concepção clínico-terapêutica compreende a surdez como uma patologia,
como déficit biológico. Esta concepção traz como mote a medicalização e esforços
no sentido de “normalizar” a pessoa surda, isto é, ações que contemplam estratégias
reparadoras e corretivas sobre o surdo, para que se assemelhe sócio e linguisticamente
à pessoa ouvinte (SKLIAR, 2000).
112
As informações apresentadas no quadro acima mostram as características
de duas concepções sobre os surdos que se destacam na literatura da história da
educação de surdos. É importante ressaltar que podem existir outras visões sobre os
surdos, considerando a dinamicidade social, ideológica, política e linguística presentes
nas comunidades linguísticas. Observe que as duas visões apresentam compreensões
bastante divergentes sobre todas as questões pertinentes ao ensino e aprendizagem
da língua para os alunos surdos, tendo em vista que a perspectiva clínica tem como
perspectiva norteadora a reabilitação auditiva, ou seja, é uma forma compreensão da
surdez que inviabiliza o desenvolvimento pleno do estudante enquanto indivíduo, tendo
em vista que não respeita as particularidades comunicativas dele. Por outro lado, a
visão Socioantropológica percebe os sujeitos a partir de suas características pessoas
de modo a compreender a surdez como uma peculiaridade que deve ser respeitada
e compreendida dentro das possibilidades linguísticas do sinalizante, desta maneira,
nesta visão a língua de sinais é percebida como a primeira língua dos surdos e a cultura
surda como parte da identidade.
DICA
Para ampliar a visão sobre as concepções sobre a
pessoa surda, sugerimos o filme “Filhos do silêncio”.
Aproveite para perceber os modos de interação entre
uma pessoa ouvinte e uma pessoa surda e a visão que
emerge na relação. Acesse: Link: https://www.youtube.
com/watch?v=JnjIp4XYSeY.
113
FIGURA 6 – IMAGEM QUE FAZ ALUSÃO AO ORALISMO, COMUNICAÇÃO TOTAL E BILINGUISMO
Ao analisarmos a imagem podemos perceber que, mais uma vez, estamos diante
de duas compreensões antagônicas sobre a surdez, na primeira figura da esquerda, temos
uma mão infantil remetendo a uma sinalização inicial do sinal referente à expressão
Eu te amo, dando a entender o entendimento de que a aprendizagem da língua de
sinais é um direito desde a primeira infância para que os indivíduos possam desenvolver
as suas potencialidades linguísticas desde pequenos. Já na imagem da direita temos
a referência a equipamentos e exames que determinam a aferição da audição, ou,
no caso do aparelho, uma aparelhagem para melhora da recepção de sons. Neste
contexto, os elementos apresentados na parte Direita da figura estão representados as
filosofias que procuram valorizar a audição mesmo em relação à educação linguística
de indivíduos surdos. A seguir comentaremos sobre o oralismo, comunicação total e
bilinguismo. Conforme a imagem acima, destacaremos as características de cada
abordagem educacional, com vistas a destacar as suas diferenças no que se refere ao
desenvolvimento social, linguístico e educacional da pessoa surda.
3.1 O ORALISMO
Quando refletimos sobre a educação de surdos, historicamente percebemos
que o olhar que se teve do surdo e da surdez esteve inicialmente voltado para práticas
reparadoras e homogeneizantes de normalização, que baniram o uso da língua de sinais
pelo surdo, para focar no ensino e uso da língua oral.
114
Lamentavelmente, embora os surdos estivessem presente nesse congresso,
apenas os ouvintes tiveram o direito de votar e decidir o destino dos surdos do mundo
inteiro. Esse grupo de ouvintes defendia o oralismo, e naquele momento esta abordagem
de ensino se tornou a filosofia de educação de surdos da época. Após a votação, a língua
de sinais foi banida completamente da educação dos surdos, o que obrigando ao surdo
se render à modalidade de comunicação oralista (GUARINELLO, 2007; SACKS, 2010).
Entretanto, a qualidade da educação ofertada aos surdos caiu, pois essa filosofia
educacional foi considerada como um retrocesso na educação de surdos, uma vez que,
segundo Strobel e Perlin (2008) teria que se evitar ao máximo o uso da língua de sinais
para que o surdo tivesse êxito em seu aprendizado através do treinamento da fala oral,
buscava integrar os surdos na comunidade de ouvintes por meio da fala oral, e priorizava
a reabilitação em direção à normalidade exigida pela sociedade.
115
Como o próprio nome sugere, essa filosofia educacional visa, sobretudo, a
comunicação e a interação entre surdos e ouvintes. Nela, ocorre o uso da língua
oral e da língua de sinais de modo concomitante, o que de certa forma trouxe certo
desprestígio para essa filosofia educacional, por continuar trazendo práticas oralistas
para as interações, não focando unicamente na comunicação em língua de sinais.
3.3 BILINGUISMO
Após o declínio da comunicação total, devido à insatisfação de educadores
e surdos com os resultados educacionais da pessoa surda, ocorreu na década de
1970 um movimento de reivindicação contra o modo como os surdos estavam sendo
alfabetizados, que culminou com no surgimento da proposta de educação bilíngue.
Diferente do oralismo e da comunicação total, a proposta de educação bilíngue tem
como pressuposto que os surdos devem ser bilíngues, adquirindo a língua de sinais como
primeira língua e a língua oral de seu país, como segunda língua, na sua modalidade
escrita (CAPOVILLA, 2000).
116
I- escolas e classes de educação bilíngue, abertas a alunos surdos e
ouvintes, com professores bilíngues, na educação infantil e nos anos
iniciais do ensino fundamental;
II- escolas bilíngues ou escolas comuns da rede regular de ensino,
abertas a alunos surdos e ouvintes, para os anos finais do ensino
fundamental, ensino médio ou educação profissional, com docentes
das diferentes áreas do conhecimento, cientes da singularidade
linguística dos alunos surdos, bem como com a presença de
tradutores e intérpretes de LIBRAS – Língua Portuguesa.
§ 1º São denominadas escolas ou classes de educação bilíngue
aquelas em que a Libras e a modalidade escrita da Língua Portuguesa
sejam línguas de instrução utilizadas no desenvolvimento de todo o
processo educativo (BRASIL, 2005).
DICA
Para melhor compreender as características da Libras, bem como a
importância da educação bilíngue na educação de surdos do Brasil,
sugerimos que assista ao vídeo “Libras: o que é esta língua?”, publicado
na revista Roseta, da Associação Brasileira de Linguística, cujas
autoras são Ronice Müller de Quadros e Marianne Rossi Stumpf e o
vídeo “Minuto Libras Educação Bilíngue de Surdos”, produzido pela
professora Ronice Müller de Quadros.
Os links para acesso são: https://www.youtube.com/watch?v=Q6B-
6nm9VnE e https://www.youtube.com/watch?v=-Mr0kKQ_4Z8.
117
FIGURA 8 – MINUTO LIBRAS EDUCAÇÃO BILÍNGUE DE SURDOS
118
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu:
• A literatura sobre a educação de surdos aponta que existem duas concepções sobre
a surdez e os surdos: clínico-terapêutica e socioantropológica.
119
• Diferente do oralismo e da comunicação total, a proposta de educação bilíngue
tem como pressuposto que os surdos devem ser bilíngues, adquirindo a língua de
sinais como primeira língua e a língua oral de seu país, como segunda língua, na sua
modalidade escrita.
120
AUTOATIVIDADE
1 As concepções sobre a surdez podem oscilar entre dois polos principais, aquelas
compreensões que procuram achar formas de solucioná-la através de métodos
que priorizam os atendimentos clínico-terapêuticos e aqueles entendimentos que
percebem a surdez como parte das características dos indivíduos. A partir disso,
assinale a alternativa que melhor define a concepção clínico-terapêutica:
2 Esta questão envolve o tema “filosofias de educação de surdos”, deste modo, devemos
lembrar das discussões que apresentam os modos através dos quais a Educação dos
Surdos é percebida numa perspectiva em que a língua oral majoritária da comunidade
ou nas compreensões que evidenciam o respeito pela cultura e pela comunidade
surdas, bem como a valorização da língua de sinais. Na figura a seguir, podemos
ver duas pessoas com as mãos escondidas, perto de um cartaz que deixa clara a
proibição da língua de sinais, além disso, estão claramente desenhadas as bocas
que fazem um esforço fonológico para se manifestar oralmente, como os perdigotos
voando deixam em evidência. Tendo em vista contextualização anterior, a descrição
da Figura a observação da figura a seguir, escolha a alternativa que corresponda à
Filosofia da Educação que a imagem procura deixar explícita:
121
Essa imagem exemplifica:
a) ( ) A filosofia educacional oralista.
b) ( ) A concepção socioantropológica.
c) ( ) A comunicação total.
d) ( ) A comunicação bilíngue.
FONTE: QUADROS, R. M. de. Bilinguismo. In: Educação de surdos: aquisição da linguagem. Porto Alegre:
Artmed, 1997. p. 21-43.
122
UNIDADE 2 TÓPICO 3 -
LÍNGUAS EM CONTATO
1 INTRODUÇÃO
O cenário sociolinguístico brasileiro é marcado por uma diversidade linguística,
social e cultural. No Brasil, estima-se que coexistem cerca de 330 línguas, destas, 274
são línguas indígenas (IBGE, 2010) e 56 línguas de imigração (ALTENHOFEN, 2013).
Além desses dados, destacamos ainda a Língua Brasileira de Sinais – Libras, além das
línguas de sinais emergentes. Sabe-se que, além da Libras, oficializada pela Lei Federal
Nº 10.436, de 24 de abril de 2002, o Brasil possui pelo menos duas línguas que já foram
documentadas: a língua de sinais de Urubu-Kaapor no Estado do Maranhão e a língua
de sinais conhecida como “Cena”, falada na cidade de Jaicós, no povoado de Várzea
Queimada, no interior do Piauí, ambas na região Nordeste do Brasil.
Diante destes dados, percebemos que o Brasil é um país com uma ampla
diversidade linguística, o que possibilidade a interação entre diferentes línguas,
pessoas, em diferentes contextos sociais e culturais, possibilitando assim, um contato
linguístico. De acordo com os autores, Raso, Mello e Altenhofen (2011, p. 47), “[...] todo
uso da língua em interação pressupõe um contato linguístico, e que o que entra em
contato são, antes de tudo, modos de falar individuais (idioletos) identificados com
variedades linguísticas específicas”.
123
Assim, Quadros e Karnopp (2004), destacam que as línguas naturais estão
relacionadas à capacidade inata da mente humana compreender e de desenvolver a partir
de uma organização que se divide em uma estrutura imaterial que apresenta normas,
regras e delimitações amplas e, ao mesmo tempo, limitadas, ou seja, a língua permite
que falemos ou sinalizemos muitas coisas de inúmeras maneiras, mas não de qualquer
maneira. Dito de outro modo, mesmo que tenhamos diversas maneiras para formar
frases, as línguas apresentam certas limitações para as sentenças que são adequadas
ou não em relação aos parâmetros de cada língua específica. Ainda nesta citação, as
autoras destacam que a língua tem a finalidade social de permitir a comunicação entre
os usuários de um mesmo idioma, assim sendo, as línguas naturais surgem a partir
da necessidade dos indivíduos em ter um sistema estruturado e compartilhado para
comunicação entre si.
Brito (1998, p. 19) faz a seguinte afirmação sobre considerar as línguas de sinais
como naturais:
Nesta mesma direção está a Língua Brasileira de Sinais-Libras, que por ser
natural, possui todos os elementos necessários para se desenvolver e estruturar
como língua natural, desta maneira tem todos os níveis linguísticos que precisa para
a expressão plena dos sinalizantes, por exemplo, alfabeto manual próprio, conforme
a imagem a seguir, gramática própria, não descende e nem depende da estrutura da
língua portuguesa. Além disso, a língua de sinais não é universal, cada país possui a sua.
Logo, cada língua de sinais em cada país possui sua própria estrutura gramatical.
124
FONTE: <https://bit.ly/3fpwR1B>. Acesso em: 14 jul. 2020.
Podemos afirmar também que as línguas de sinais não são pantomimas e nem
universais. Elas possuem gramática própria, além dos níveis linguísticos, fonológico,
morfológico, semântico, sintático e pragmático, o que possibilita aos seus usuários
expressarem diferentes tipos de significados, dependendo da necessidade comunicativa
e expressiva do indivíduo. Além disso, as línguas de sinais não descendem e nem
dependem das línguas orais, visto que possuem seus níveis linguísticos, fonologia,
morfologia, semântica e sintaxe, tal como as línguas orais.
Quanto à fonologia das línguas de sinais, Quadros e Karnoop (2004) afirmam que
este nível linguístico determina quais são as unidades mínimas que formam os sinais,
e estabelece quais são os padrões possíveis de combinação entre essas unidades e as
variações possíveis no ambiente fonológico. Essas unidades mínimas, sem significado,
são chamadas de fonemas e elas correspondem aos parâmetros da Libras.
125
Conforme mencionamos no início do texto, além do Português e da Libras,
são faladas, no Brasil, as línguas de sinais emergentes. Além dessas línguas, citamos
também o contexto social de Roraima, Norte do Brasil, e sua diversidade linguística
na qual, além do Português, em seu cenário sociolinguístico as línguas indígenas, de
imigração e línguas de sinais também estão presentes nessa região. Quanto às línguas
indígenas destacam-se: Carib, Aruaque e Yanomami, além das línguas de sinais: Libras
e a Língua de Sinais Venezuelana-LSV (ARAÚJO; BENTES, 2020).
DICA
Para melhor compreender a Língua de Sinais
Venezuela sugerimos que assista ao vídeo, “Direitos
Humanos e a Pessoa Surda Migrante”, organizado
e apresentado pela Profa. Dra. Silvana Aguiar dos
Santos – UFSC, pela Assistente Jurídica Angélica
Ribeiro – PUC-SP e pelas discentes Lais Priscila
Almeida – UFRR e Paula Bernardes – UFRGS. O
link para acesso é: https://www.youtube.com/
watch?v=Dr6fnCcXkHY.
126
3 CONTATO LINGUÍSTICO
Os comentários supracitados sobre a diversidade linguística brasileira reiteram
que o país não é monolíngue, isto é, não possui apenas uma língua, no caso, o Português.
Ao contrário disto, a discussão no tópico anterior mostra a existência de outras línguas
em contato com o Português.
Nós conceituamos bilíngues aquelas pessoas que usam duas (ou mais)
línguas (ou dialetos) em suas vidas cotidianas. Assim, a nossa definição
inclui pessoas que vão desde o trabalhador migrante que fala com
alguma dificuldade a língua do país de acolhimento (e que não sabe ler
e escrever), até o intérprete profissional, em uma situação totalmente
distinta, que é plenamente fluente em dois idiomas. Encontramos entre
nós o cônjuge estrangeiro que interage com os amigos em sua primeira
língua, o cientista que lê e escreve artigos em uma segunda língua
(mas que raramente fala a segunda língua), o membro de uma minoria
linguística que usa a língua minoritária em casa e a majoritária em todos
os outros espaços da vida, a pessoa surda que usa a língua de sinais
com seus amigos, mas oraliza com uma pessoa ouvinte, etc. Apesar da
grande diversidade que existe entre essas pessoas, todos compartilham
uma característica comum: eles conduzem suas vidas com duas (ou
mais) línguas (GROSJEAN, 1996, p. 1-2).
127
Assim, de acordo com o autor, ser bilíngue não significa ter domínio de modo
idêntico das habilidades ler, ouvir, falar e escrever para as línguas orais, e as habilidades
produzir e compreender relacionadas às línguas de sinais. Para Grosjean (1996), os
indivíduos conduzem as suas vidas com duas ou mais línguas, e isso não significa
que elas dominam as línguas de uma mesma maneira, e nem por isso, deixam de ser
pessoas bilíngues.
DICA
Para melhor compreender o assunto Contato linguístico
sugerimos que assista ao vídeo, “Contato de línguas”,
organizado e apresentado pela Parábola Editorial e com
a fala de Marcos Bagno. O link para acesso é: https://
www.youtube.com/watch?v=L3KatEz2z0E.
INTERESSANTE
Outra sugestão que trazemos é a plataforma
“Localingual”. Uma plataforma on-line que mostra
sotaques de diferentes regiões. Através da “Localingual”,
você pode ouvir e conhecer pronúncias de diferentes
países e estados brasileiros. O link para acesso é: https://
localingual.com/?ISO=BR.
128
LEITURA
INTERESSANTE
A seguir, trazemos um trecho do artigo “Línguas de sinais de fronteiras:
o caso da LSV no Brasil” de Paulo Jeferson Pilar Araújo e Thaisy Bentes.
Neste texto, os autores abordam os estudos sobre a Língua de Sinais
Venezuelana-LSV, propondo seu estatuto de língua de fronteira no
Brasil, sendo um acréscimo interessante para as discussões efetuadas
até este momento de nosso Tópico.
[...]
129
Na proposta original das Quadros e Silva (2017), as comunidades surdas
contempladas são apenas aquelas consideradas como originárias do Brasil. Ficam
de fora as possíveis situações de LSs de fronteira e migração. Compreende-se
perfeitamente tal exclusão por focalizarem as línguas do Brasil e não no Brasil,
além de ser de difícil informação a situação de LSs em contexto de fronteira ou
migração tanto no contexto brasileiro como internacional. Por outro lado, entende-
se que atentar para a existência de LSs exógenas no território brasileiro é justo
para complementar o quadro de línguas de herança e de migração presentes no
território brasileiro, a exemplo das línguas pomerana, talian e hunsrückisch, para
mencionarmos as mais conhecidas. Como língua de fronteira podemos apontar
o espanhol fronteiriço e sua variedade de contato mais conhecida: o portunhol
(STURZA, 2019).
130
sinalizantes, além de chamar a atenção dos estudiosos para a existência de línguas
na modalidade visuoespacial na categoria de línguas de fronteira e imigração no
Brasil. Tomando como premissa o estatuto de língua de fronteira e de migração
para a LSV, nos detemos sobre a situação dessa língua em seu contexto nacional
e transnacional.
131
de verbos são os verbos espaciais, subdivididos ainda em verbos de trajetória, de
ação-processo e de locação. Os classificadores da LSV receberam uma descrição
de Oviedo (2004). A LSV conta possivelmente com cerca de 114 configurações de
mão (CM) e 43 marcadores com diversas funções no discurso.
132
venezuelanos busquem aprendê-la como L2. Portanto, o contato entre surdos das
duas nacionalidades é também o contato entre a Libras e a LSV. Dessa forma, ambas
as línguas estão propensas a passar por processos típicos do contato linguístico,
como detalhamos na seção que se segue.
[...]
FONTE: ARAÚJO, P. J. P.; BENTES, T. Línguas de sinais de fronteiras: o caso da LSV no Brasil. Revista
Humanidades e Inovação v. 7, n. 26, 2020. Disponível em: https://revista.unitins.br/index.php/hu-
manidadeseinovacao/article/view/3214. Acesso em: 6 jun. 2022.
NOTA
Apresentamos a você um trecho do livro “Ideias para ensinar português
para alunos surdos”, das autoras Ronice Müller de Quadros e Magali L. P.
Schmiedt. Nesse texto, as autoras focam nas línguas que fazem parte do
cotidiano do aluno surdo, destacando a importância da língua de sinais na
vida da pessoa surda, bem como da educação bilíngue.
133
LEITURA
COMPLEMENTAR
EDUCAÇÃO BILÍNGUE NO CONTEXTO DO ALUNO SURDO
Há, ainda, estados em que professores desconhecem libras e a escola não tem
estrutura ou recursos humanos para garantir aos alunos surdos o direito à educação, à
comunicação e à informação.
134
Independentemente do contexto de cada estado, a educação bilíngue depende
da presença de professores bilíngues. Assim, pensar em ensinar uma segunda língua,
pressupõe a existência de uma primeira língua. O professor que assumir esta tarefa
estará imbuído da necessidade de aprender a língua brasileira de sinais.
A língua de sinais vai ser adquirida por crianças surdas que tiverem a experiência
de interagir com usuários de língua de sinais. Se isso acontecer, por volta dos dois
anos de idade, as crianças estarão produzindo sinais usando um número restrito de
configurações de mão (sugere-se que tal número corresponda a sete configurações de
mão), bem como simples combinações de sinais expressando fatos relacionados com o
interesse imediato, com o “aqui” e o “agora”.
135
Também se observa que as crianças começam a introduzir classificadores nos
seus vocabulários.
Por volta dos três anos de idade, as crianças tentam usar configurações mais
complexas para a produção de sinais, mas frequentemente tais tentativas acabam
sendo expressas através de configurações de mãos mais simples (processos de
substituição). Os movimentos característicos dos sinais continuam sendo simplificados,
embora já se observe o uso da direção dos movimentos com êxito em alguns contextos.
Classificadores são usados para expressar formas de objetos, bem como o movimento
e trajetórias percorridos por tais objetos. Aspecto começa a ser incorporado aos sinais
para expressar diferenças entre ações (por exemplo, CORRER devagar, CORRER rápido).
A criança começa a estender as marcas de negação sobre sentenças assim como os
adultos fazem, inclusive omitindo o item lexical de negação. As crianças, também,
já utilizam estruturas interrogativas de razão (POR QUE). Nesse período, as crianças
começam a contar estórias que não necessariamente estejam relacionadas aos fatos
do contexto imediato. Elas falam de algum fato ocorrido em casa, sobre o bichinho de
estimação, sobre o brinquedo que ganhou etc., no entanto, às vezes, não fica claro o
estabelecimento dos referentes no espaço, o que dificulta o entendimento das estórias.
136
que garante a compreensão do discurso da criança durante este período tão precoce.
O contexto em que esse processo de aquisição acontece é aquele em que as crianças
têm a chance de encontrar o outro surdo, ou seja, além de ver os sinais, ela precisará ter
escutas em sinais (Souza, 2000).
137
Nesse processo, há vários momentos em que se faz necessária a análise
implícita e explícita das diferenças e semelhanças entre a língua de sinais brasileira e o
português. Nesse sentido, há processos em que ocorre a tradução dos conhecimentos
adquiridos na língua de sinais, dos conceitos, dos pensamentos e das ideias para
o português.
FONTE: QUADROS, R. M. de; SCHMIEDT, M. L. P. Ideias para ensinar português para alunos surdos.
Brasília: MEC, SEESP, 2006. Págs. 18 a 24.
138
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu:
• Além da Libras, oficializada pela Lei Federal Nº 10.436, de 24 de abril de 2002, o Brasil
possui pelo menos duas línguas que já foram documentadas: a língua de sinais de
Urubu-Kaapor no Estado do Maranhão e a língua de sinais conhecida como “Cena”,
falada na cidade de Jaicós, no povoado de Várzea Queimada, no interior do Piauí,
ambas na região Nordeste do Brasil.
• As línguas de sinais não são pantomimas e nem universais. Elas possuem gramática
própria, além dos níveis linguísticos, fonológico, morfológico, semântico, sintático
e pragmático, o que possibilita aos seus usuários expressarem diferentes tipos de
significados, dependendo da necessidade comunicativa e expressiva do indivíduo.
• De acordo com os autores, Raso, Mello e Altenhofen (2011, p. 47) “todo uso da língua
em interação pressupõe um contato linguístico, e que o que entra em contato são,
antes de tudo, modos de falar individuais (idioletos) identificados com variedades
linguísticas específicas”.
139
• Existem pelo menos seis tipos de contato linguístico: a) Português e línguas autóctones
(indígenas), b) Português e língua afro-brasileiras, c) Português e línguas alóctones
(de imigração), d) Português como língua alóctone em contato com línguas oficiais,
e) Português e línguas co-oficiais em contato, f) contatos linguísticos de fronteira
com países vizinhos e contatos entre falantes de variedades regionais do Português.
140
AUTOATIVIDADE
1 Nos debates sobre contato linguístico, estão inseridas as discussões que tratam das
diferentes variedades relacionadas ao local em que os indivíduos vivem, tendo isso
em mente, analise a história em quadrinhos abaixo em que o diálogo apresentado
mostra uma situação de contato linguístico:
3 As línguas naturais são aquelas que surgem a partir da capacidade inata da mente
humana compreender e de desenvolver a partir de uma organização que se divide
em uma estrutura imaterial que apresenta normas, regras e delimitações amplas e,
141
ao mesmo tempo, limitadas, ou seja, a língua permite que falemos ou sinalizemos
muitas coisas de inúmeras maneiras, mas não de qualquer maneira. Assim, DISSERTE
sobre o porquê de as línguas de sinais serem consideradas línguas naturais.
a) ( ) Bilinguismo.
b) ( ) Monolinguismo.
c) ( ) Interlíngua.
d) ( ) Separação das línguas.
5 De acordo com os autores, Raso, Mello e Altenhofen (2011, p. 47), “todo uso da língua
em interação pressupõe um contato linguístico, e que o que entra em contato são,
antes de tudo, modos de falar individuais (idioletos) identificados com variedades
linguísticas específicas”. Essa afirmação dos autores está relacionada às discussões
sobre o contato entre as línguas, disserte sobre as questões referentes aos modos de
sinalizar individuais em relação à Libras e à discussão sobre contato linguístico, tendo
em vista as diferenças encontradas nas diferentes sinalizações para um mesmo
referente, por exemplo, PAI que tem diferentes maneiras de ser realizado, conforme
as sinalizações a seguir, retiradas de Silva (2015), p. 4-5:
FONTES: RASO, T.; MELLO, H.; ALTENHOFEN, C. V. Os contatos linguísticos e o Brasil – Dinâmicas pré-histó-
ricas, históricas e sociopolíticas. In: MELLO, H.; ALTENHOFEN, C. V.; RASO, T. (Org.). Os contatos linguísti-
cos no Brasil. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011. p. 13-56.
SILVA, S. G. de L. Variação sociolinguística na língua brasileira de sinais: o caso dos sinais mãe e pai em Florianó-
polis. In.: Revista Linguasagem: Revista Eletrônica de Popularização Científica em Ciências da Linguagem
- Edição 22 - v. 22 n. 1 (2015). Departamento de Letras e do Programa de Pós-Graduação em Linguística da
Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Disponível em: https://bit.ly/3SCJKDS.Acesso em 10 jun. 2022.
142
REFERÊNCIAS
ALTENHOFEN, C. V. Bases para uma política linguística das línguas minoritárias no
Brasil. In: NICOLAIDES, C. et al. (Orgs.). Política e Políticas Linguísticas. Campinas,
SP: Pontes Editores, 2013, p. 93-116.
APPEL, R.; MUYSKEN, P. Language contact and bilingualism. New York: Edward
Arnold, 1987.
BAGNO, M. Preconceito linguístico: o que é, como se faz? 49. ed. São Paulo:
Loyola, 2007.
143
BRITO, L. F. Integração social e educação de surdos. Rio de Janeiro: Babel, 1993.
CAVALCANTI, M. 2011. Multilinguismo, transculturalismo e o (re)conhecimento de
contextos minoritários, minoritarizados e invisibilizados. In: MAGALHÃES, M. C.
C.; FIDALGO, S.S. (Orgs.). Questões de Método e de Linguagem na Formação
Docente. Campinas: Mercado de Letras. p. 171-185.
GERALDI, J. W. et al. (Orgs.). O texto na sala de aula. 3. ed. São Paulo: Ática, 2011b.
GROSJEAN, F. Living with two languages and two cultures. In: Chapter in Parasnis,
I. (Ed.). Cultural and Language Diversity and the Deaf Experience. Cambridge:
Cambridge University Press, 1996.
144
LACERDA, C. B. F. Um pouco da história das diferentes abordagens na educação
dos surdos. Caderno CEDES [on-line], Campinas. v. 19, n. 46, p. 68-80, set. 1998.
Disponível em: https://www.scielo.br/j/ccedes/a/wWScZsyPfR68rsh4FkNNKyr/
abstract/?lang=pt Acesso em: 20 jan. 2021.
LEFFA, V. J.; IRALA, V. B. (Orgs.). Uma espiadinha na sala de aula: ensinando línguas
adicionais no Brasil. Pelotas: Educat, 2014.
145
SAUSSURE, F. de. Curso de linguística geral. 28 ed. São Paulo: Cultrix, 2012.
SACKS, O. Vendo vozes: uma viagem ao mundo dos surdos. São Paulo: Companhia
das Letras, 2010.
SKLIAR, C. Uma análise preliminar das variáveis que intervém no projeto de educação
bilíngue para surdos. Espaço (INES-MEC), v. 4, n. 6, p. 49-57, 1997.
STOKOE, W. C. Sign Language Structure: an out line of the visual communication systems
of the american deaf. Studies in Linguistics, University of Buffalo, n. 8, 1960.
146
UNIDADE 3 —
POLÍTICAS LINGUÍSTICAS,
AQUISIÇÃO, LÍNGUA E LÉXICO
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
• debater a respeito da aquisição da Libras por surdos e ouvintes sob uma perspectiva
social;
PLANO DE ESTUDOS
A cada tópico desta unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de
reforçar o conteúdo apresentado.
CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.
147
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 3!
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148
UNIDADE 3 TÓPICO 1 —
1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, neste tópico, veremos algumas das questões que envolvem os
debates e os embates que ocorrem na relação da língua com a sociedade, a partir da
perspectiva das políticas públicas. Inicialmente, debateremos a respeito de alguns dos
aspectos relacionados ao modo através do qual as políticas públicas estão relacionadas
ao planejamento linguístico. Dito de outro modo, procuraremos compreender as bases
das discussões que envolvem políticas públicas e a compreensão linguística da relação
que se estabelece através da presença de diferentes línguas em uma sociedade. Ainda,
estudaremos como se dá o reconhecimento dessa ligação a partir da compreensão
linguística presente nos documentos que norteiam as políticas públicas que versam
sobre esse tema.
149
este tópico, e, de certo modo, esta unidade final do Livro Didático de Sociolinguística
da Libras, pretende estabelecer um caminho teórico que relacionará tudo o que foi
estudado até o momento, a fim de organizar as discussões que envolvem língua e
sociedade, através de diferentes aspectos e elementos apresentados até aqui.
150
Assim, podemos perceber as necessidades de se delimitarem e gerirem os
diferentes aspectos que envolvem o cuidado com um bichinho, de modo que ele
tenha todas as necessidades dele identificadas e atendidas pelo grupo que o adotou.
Também, conseguimos notar que, mesmo um exemplo simples como esse, permite-nos
compreender que existem vários aspectos que precisam ser levados em consideração
e que se entrelaçam para o atingimento do objetivo comum, que é cuidar do cachorro
comunitário, pois, mesmo que a ração seja comprada, se não houver uma pessoa
responsável por servi-la ao cão, o alimento será desperdiçado e o animal ficará com
fome. Assim, com o exemplo do cãozinho adotado coletivamente, percebemos que
existe todo um apanhado de combinados, processos e recursos que precisam ser
estruturados, de maneira adequada, para que todas as partes que compõem a meta
comum sejam organizadas, satisfatoriamente, para o cão e os donos dele.
151
Assim, ao observarmos o esquema anterior, podemos perceber que existem
diferentes fatores envolvidos para que metas complexas, do contexto social, sejam
percebidas e atingidas. Mesmo assim, a noção das políticas públicas permanece
semelhante ao que vimos em relação ao cãozinho compartilhado, sendo um complexo
de processos que tem em vista a solução de uma necessidade social, e, para isso,
precisa abarcar o maior número de possibilidades, compreensões e recursos.
152
Além disso, são elencados pontos que deverão ser desenvolvidos como parte
da Política Linguística, como o fomento para o atendimento adequado aos surdos e
deficientes auditivos, e estabelecidos pontos a serem observados pelos sistemas
educacionais. No seguinte artigo, veremos que a Libras passa a compor os currículos
para a formação de profissionais de Educação Especial, Fonoaudiologia e Magistério:
CAPÍTULO SÍNTESE
Delimita a compreensão de surdez a partir do
uso da Libras e da vivência da cultura surda,
I - Das disposições preliminares
bem como define os parâmetros audiométricos
para deficiência auditiva.
Reforça a Libras como disciplina curricular
obrigatória nos cursos de licenciatura e
II - Da inclusão da Libras como
fonoaudiologia, delimita quais cursos são
disciplina curricular
compreendidos nestes grupos e coloca a
disciplina como opcional nos demais cursos.
153
Delimita as normas específicas para a formação
de professores de Libras, determina a criação
de cursos superiores para licenciatura em
Letras/Libras, destaca a formação bilíngue para
o curso de licenciatura, destaca a diferenciação
entre as modalidades falada e escrita da LP
III - Da formação do professor de em relação ao público surdo, evidencia a LP
libras e do instrutor de libras como segunda língua ou língua de instrução,
dando ênfase à necessidade da formação
de profissionais docentes surdos e/ou que
reconheçam as necessidades linguísticas
específicas do público surdo. Delimita a
prioridade do público surdo nos cargos de
professor e instrutor de Libras.
Delimita os modos como as instituições de ensino
deverão promover “[...] acesso à comunicação, à
IV - Do uso e da difusão da Libras
informação e à educação nos processos seletivos,
e da língua portuguesa para o
nas atividades e nos conteúdos curriculares
acesso das pessoas surdas à
desenvolvidos em todos os níveis, etapas e
educação
modalidades de educação, desde a educação
infantil até à superior” (BRASIL, 2005, s.p.).
Determina a formação superior para o tradutor
intérprete de Libras e delimita as estratégias
que deverão ser utilizadas pelo período de
V - Da formação do tradutor
dez anos a fim de suprir a necessidade de
e intérprete de libras – língua
profissionais enquanto os cursos superiores são
portuguesa
estruturados, autorizados e cursados. Define
o período de um ano para que as instituições
tenham tradutor intérprete de Libras.
Determina as regras para inclusão de alunos
surdos nas instituições de ensino a partir de
escolas e classes bilíngues para alunos surdos
VI - Da garantia do direito à
e ouvintes em todos os níveis de ensino e com
educação das pessoas surdas ou
o suporte de profissionais especialistas da área,
com deficiência auditiva
bem como o direito ao Atendimento Educacional
Especializado. Também são citadas a literatura, a
cultura e os direitos linguísticos surdos.
Priorização dos alunos matriculados na rede
de educação básica nos serviços públicos
VII - Da garantia do direito à
de atendimento em saúde, de modo a sanar
saúde das pessoas surdas ou com
as necessidades de diagnóstico, tratamento
deficiência auditiva
e acolhimento das pessoas com deficiência
auditiva.
154
VIII - Do papel do poder público
e das empresas que detêm
Garantia às pessoas surdas do atendimento em
concessão ou permissão de
Libras e tradução/interpretação em LP/Libras.
serviços públicos, no apoio ao uso
e difusão da Libras
Inclusão de verbas para políticas púbicas que
IX - Das disposições finais visem à difusão e utilização da Libras nos
orçamentos em todos os níveis de governo.
FONTE: Adaptado de BRASIL (2005)
155
Observe que, neste artigo, as escolas bilíngues de surdos estão em primeira
posição na listagem de locais citados, assim, reconhece e valida o impacto de outras
legislações, mesmo aquelas que causaram polêmica, como a Política Nacional de
Educação Especial, instituída pelo Decreto nº 10.502/2020, para uma mudança de foco,
que coloca a educação especial e, por consequência, os debates do ensino de surdos
como parte do sistema de ensino que não mais irá priorizar a matrícula em escolas
regulares (BRASIL, 2020; 2021).
Assim, a alteração, na LDB, colocou a educação bilíngue como foco das políticas
públicas linguísticas do ensino e aprendizagem para o público surdo, surdo-cego e
deficiente-auditivo que utilizam a língua de sinais. Contudo, como vimos anteriormente,
neste subtópico, é, apenas, um dos passos da proposta bilíngue para a educação de
surdos, tendo em vista a necessidade de uma normatização semelhante àquela feita
pelo Decreto nº 5.626/2005, em relação à Libras como língua, legalmente, utilizada
com meio de comunicação e expressão (BRASIL, 2005). Desse modo, ainda, deverão
ser elaborados outros documentos norteadores dessa proposta para que tenhamos
uma visão mais clara do rumo que a educação bilíngue de surdos tomará a partir dessa
alteração na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Entretanto, é possível
perceber que essa alteração, com certeza, também, terá impactos interessantes para a
inserção, cada vez maior, da língua de sinais nos debates acadêmicos e sociais, os quais
envolvem a educação que se dá através das línguas que estão em jogo nesse contexto:
a Libras e a LP.
156
Com relação às políticas públicas, estamos falando de para onde serão
destinados os recursos limitados que existem para as instituições públicas de todas
as instâncias. Assim, ao existir uma legislação que deu ênfase à Libras como língua
válida no território nacional, e que a inseriu nos cotidianos administrativo e escolar,
tivemos um destaque que gerou a inclusão da Língua de Sinais nos debates de língua
e sociedade, os quais a área da Sociolinguística estuda, e se permitiu que tivéssemos,
cada vez mais, estudos que pretendem compreender o modo através do qual a Libras
se insere na sociedade a partir de usuários, incluindo a percepção da necessidade de
entendermos como ela se estrutura internamente, em relação à variação e aos demais
aspectos estudados pela Sociolinguística.
157
enunciação, ou a forma através da qual a estrutura da língua portuguesa é mais ou
menos presente na sinalização. Logo, ainda, podemos perceber elementos referentes
ao grau de surdez, à experiência de sinalização, ao contato com outros surdos e ao
maior ou menor contato com a língua portuguesa escrita ou oralizada.
158
É necessário compreender que, se as leis, sozinhas, não mudam nada, sem elas,
tampouco, as situações mudam, quando pensamos na história das línguas de sinais.
Isso fica ainda mais relevante, tendo em vista que as principais discussões a respeito
da educação de surdos, ao longo da história, pautaram-se, principalmente, no debate
entre a permissão, ou não, do uso das línguas de sinais, ou seja, se a política vigente iria,
ou não, proibir, ignorar ou fomentar o uso de uma língua, especificamente, estruturada,
a partir do uso feito pelas pessoas surdas. Cabe destacar que, independentemente das
leis ou das políticas públicas específicas, as línguas existem em função da necessidade
enunciativa dos falantes/sinalizantes dessa língua, ou seja, a existência das línguas de
sinais (ou quaisquer outras) não está relacionada a leis, mas a pessoas que a utilizam,
independentemente das leis vigentes.
159
no ambiente acadêmico, no qual a presença, cada vez maior, de alunos e professores
surdos faz com que sejam necessárias novas formas de se organizarem reuniões, de
se pensarem em políticas internas das instituições, em adaptações dos espaços, e,
exatamente por isso, ocorrem, também, maiores contextos, nos quais a interferência
entre as duas línguas é latente, posto que estão em contato frequente.
160
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu:
• O Decreto nº 5.626/2005 tornou a Libras uma das línguas reconhecidas como meio
legal de comunicação e expressão, sendo um dos documentos básicos para que
compreendamos o papel das Políticas Públicas Linguísticas para a Educação de Surdos.
• A alteração na LDB colocou a Educação Bilíngue como foco das Políticas Públicas
linguísticas do ensino e aprendizagem para o público surdo, surdo-cego e deficiente-
auditivo que utiliza a língua de sinais.
161
• O plurilinguismo como a relação entre discursos diferentes que se misturam a partir
das diferentes experiências e perspectivas linguísticas dos usuários da(s) língua(s)
que tecem os discursos a partir das diferentes vivências linguísticas.
• É através dos investimentos feitos pelas diferentes esferas do poder público que o
uso da Libras se tornou obrigatório em vários contextos.
• As Políticas Públicas criaram condições para que a língua de sinais se tornasse parte
das discussões sociais e acadêmicas bem como para que ganhasse relevância em
diferentes contextos educacionais, culturais e sociais.
• A existência das línguas de sinais (ou quaisquer outras) não está relacionada a leis,
mas sim às pessoas que a utilizam independentemente das leis vigentes.
162
AUTOATIVIDADE
1 As políticas públicas têm influência sobre o modo como as línguas se relacionam
no interior das sociedades, bem como são elas que delimitam as regras a partir das
quais terão maior ou menor poder político e cultural. A partir disso, cite três questões
linguísticas relacionadas às Políticas Públicas sobre planejamento linguístico.
163
III- As pessoas se relacionam através dos discursos produzidos nas diferentes línguas
e através das infinitas experiências discursivas vivenciadas pelos indivíduos
envolvidos em um diálogo.
IV- O plurilinguismo se manifesta na interação pelo diálogo que se dá através tanto das
línguas e quanto do modo como estas se manifestam.
a) ( ) V, F, F, F.
b) ( ) V, F, V, F.
c) ( ) V, F, V, V.
d) ( ) F, V, F, F.
e) ( ) V, F, F, V.
Carlos nasceu em 1960, ele era o único surdo em uma família de ouvintes, por isso, até
os 39 anos não havia tido contato com a Libras, dependia de sua mãe para se deslocar
pela cidade, se comunicar com pessoas fora de sua família e poder realizar qualquer
interação ele utilizava-se de sinais caseiros ou de um bloquinho em que rascunhava
as poucas palavras que havia aprendido em casa, tendo em vista que não conseguiu
se adaptar à escola regular e a única escola para surdos da cidade era longe de sua
164
casa. Porém, quando estava com 39 anos, ele conheceu a Libras em uma igreja que
a família havia começado a frequentar e se encantou com a possibilidade de poder se
expressar em uma língua que fazia sentido para ele. A partir daí, ele não parou mais de
aprender a língua de sinais e ganhar cada vez mais independência, inclusive, com a
inserção de Sala de Recursos na escola mais perto de casa, conseguiu fazer o Ensino
Fundamental e Médio, após, cursou Pedagogia e, em, 2009 estava cursando o mestrado
em Pedagogia pela Universidade Federal mais próxima de sua casa, era instrutor de
Libras em uma grande empresa e havia tirado a sua carteira de motorista com o suporte
do intérprete e o aval da quantidade de avaliadores específica para seu caso.
165
166
UNIDADE 3 TÓPICO 2 -
PERTENCIMENTO SOCIAL MEDIADO PELA
LÍNGUA NA FORMAÇÃO DA
IDENTIDADE SURDA
1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, para dar seguimento aos debates que abarcam a sociolinguística, em
geral, e em relação às questões, especificamente, relacionadas aos estudos que envolvem
a Língua de Sinais Brasileira e a presença dela na sociedade, iniciaremos este tópico
destacando as noções de macro e microssociolinguística, de modo a compreendermos
esses termos nos contextos dos estudos de Linguística e Sociolinguística. Ainda, neste
trecho, veremos a comparação conceitual entre os termos Diglossia e Bilinguismo.
Bons estudos!
167
2 MACRO E MICROSSOCIOLINGUÍSTICA: BILINGUISMO
E DIGLOSSIA
Acadêmico, iniciaremos o nosso debate com o entendimento de que os
estudos linguísticos podem ser divididos, didaticamente, em dois grandes grupos. Essa
classificação é pautada no enfoque dado para a análise dos fenômenos linguísticos
observados pelos estudiosos. Desse modo, a macro e a microlinguística não são
correntes de estudos, ou teorias, pois são agrupamentos destas a partir da estrutura da
língua. Caso o enfoque dado pretenda perceber e analisar o aspecto estrutural, será um
estudo micro, ou seja, levará em consideração os detalhes organizacionais da língua.
Já em uma pesquisa na qual a estrutura seja o ponto de partida para a compreensão
de um quadro mais geral das relações que se estabelecem através da língua, aí, serão
percebidas pesquisas no grupo da macrolinguística (BARBOSA, 2022). Observe o
esquema a seguir, no qual aparecerão as principais áreas de pesquisa da linguística:
168
FIGURA 3 – SINAL GATO, VARIAÇÃO UTILIZADA NO RIO GRANDE DO SUL
169
Acadêmico, agora que já vimos as noções de macro e microlinguística,
podemos transpor um raciocínio semelhante para a área específica da sociolinguística
que, também, “[...] pode ser compreendida a partir de duas perspectivas diferentes
de estudo: a macrossociolinguística e a microssociolinguística” (MONTEIRO, 2000
apud EWALD; SOUSA, 2019, p. 68). Assim, com relação à área da linguística na qual
pretendemos estudar as relações entre língua e sociedade, as noções de micro e
macro, também, são formas de se categorizarem os diferentes pontos de vista da
conexão entre língua e sociedade. De acordo com Santos (1999, p. 36-37, grifo nosso),
“a distinção dos dois níveis, micro e macrossociolinguística, levou a Sociolinguística
a buscar caminhos teóricos alternativos, embora esses dois níveis se inter-relacionem
por apresentar aspectos diversos da mesma realidade”. Assim, ao se categorizarem os
estudos da Sociolinguística em relação a aspectos da realidade sociolinguística, foram
desenvolvidos modos diversos de se explicarem os mesmos fenômenos linguísticos,
que demonstram diferentes ângulos da mesma realidade linguística.
Microssociolinguística Macrossociolinguística
Relações socialmente
Relações face a face
constituídas
Variedades faladas por
Políticas Públicas
diferentes comunidades
Fatores sociais Multilinguismo
Significado sócio simbólico do
Conflitos linguísticos
uso linguístico
Língua materna Planificação linguística
Indivíduo bilíngue Mudança linguística
Bilinguismo Diglossia
FONTE: adaptado de Ewald e Souza (2019) e Santos (1999)
170
Como inserido no quadro anterior, o bilinguismo e a diglossia estão localizados
em estágios de análise diferentes, tendo em vista que o primeiro é referente aos estudos
que procuram compreender, pelo nível do indivíduo, como as pessoas adquirem e
utilizam mais de uma língua no cotidiano e em interações através das diferentes
línguas que domina.
NOTA
Antes de prosseguirmos, é importante compreender que, ao falarmos
de estudos do uso individual, não estamos, necessariamente, fazendo
referência a uma pessoa, apenas, mas ao modo por meio do qual os
indivíduos ou grupos de indivíduos manifestam o fenômeno linguístico em
interações através da língua.
A respeito do caso da interação entre Libras e LP, McCleary (2009) coloca que é
um caso de diglossia complexa que não pode ser compreendido dentro da perspectiva
clássica de Diglossia, pois a maioria dos surdos nasce em famílias ouvintes e só tem
contato com a língua de sinais quando se insere na comunidade surda. Além disso,
difere-se, também, da Diglossia típica porque a “[...] Libras precisa assumir um papel
de mediadora com o polo público e formal, na escola (com a educação bilíngue) e na
sociedade (com o crescimento do bilinguismo em português e Libras por parte de
ouvintes)” (MCCLEARY, 2009, p. 51).
171
Acadêmico, neste subtópico, vimos os conceitos de macro e microlinguística,
e compreendemos como esses entendimentos são utilizados didaticamente. Além
disso, relacionamos, à área da Sociolinguística, as noções de micro e macro, e vimos os
elementos teóricos conectados a elas. Por fim, encerramos este subtópico com alguns
apontamentos do bilinguismo e da diglossia em relação à LP e à Libras.
Strobel (2008, p. 24, grifo nosso) coloca que “os sujeitos surdos não se
diferenciam um do outro de acordo com o grau de surdez, mas o importante, para eles,
é o pertencimento ao grupo que usa língua de sinais e cultura surda, que ajuda
a definir identidades surdas”. Desse modo, a língua tem grande importância para o
entendimento das identidades e da sensação de pertencimento, ou não, aos diferentes
grupos linguísticos e culturais relacionados à surdez. Com relação às diferentes
identidades surdas, Perlin (1998) delimita oito diferentes identidades, porém, a autora
deixa claro que é, apenas, uma classificação de algumas possibilidades existentes, sem
o objetivo de segregação, ou diferenciação, mas para a compreensão de alguns dos
diferentes entendimentos de si e da surdez.
172
Observe que a cor em gradiente, utilizada na seta, procura demonstrar,
através da concentração de cor, a presença maior ou menor da língua de sinais para
o entendimento da referida percepção identitária. Assim, temos um modo de perceber
a identidade a partir da língua de sinais e de como ela é utilizada pelos indivíduos no
cotidiano. Desse modo, a identidade surda é aquela na qual a língua de sinais é mais
presente, e flutuante/intermediária são aquelas nas quais a língua portuguesa tem um
forte uso no cotidiano. Já a embaçada é aquela na qual, por diferentes motivos, a pessoa
não teve acesso nem à LP nem à Libras, de maneira a ser fluente em qualquer uma das
duas línguas (PERLIN, 1998). A pesquisadora, ainda, coloca a identidade de diáspora
para aqueles surdos nos quais uma mudança de local ocasiona uma tensão entre os
referenciais linguísticos existentes e os que a pessoa traz do lugar de origem dela. Logo,
na compreensão de Perlin (1998), a língua, o acesso, o uso e a fluência, em Libras, são
os traços principais para a delimitação das identidades surdas, o mais importante para
o entendimento da constituição das identidades surdas.
DICA
Acadêmico, na Biblioteca da UNIASSELVI, você encontra o
livro de Estudos Surdos, escrito por Mariana Correia (uma
das autoras deste livro didático) e pelo professor Cristian
Sardo. Nele, é debatido, com mais detalhes, o modo
como os estudos culturais e linguísticos compreendem
a formação das identidades surdas. Recomendamos que
você dê uma olhada nesse material!
174
Para o ensino de surdos, as movimentações que a Sociolinguística trouxe para
o campo da educação, fizeram com que os debates se descolassem da permissão, ou
não, do uso da língua de sinais e da aquisição da língua majoritária oralizada, em direção
ao bilinguismo, como proposta prioritária para a educação de surdos. Desse modo,
a noção da língua de sinais como investimento linguístico principal para o ensino de
surdos, além da língua portuguesa, na modalidade escrita, como segunda língua, está
conectada às contribuições da Linguística e da Sociolinguística para os debates que
englobam a educação de surdos.
175
O letramento, na língua oral, como L2, é condição e ponto de partida na aquisição
da língua oral pela criança surda, por ter acesso à representação gráfica da língua,
uma vez que há impedimento sensorial auditivo, ressaltando que cabe desenvolver
estratégias de ensino que levem em consideração a situação psicossocial do surdo,
a condição multicultural, e, principalmente, a capacidade dele de utilização da língua
de sinais.
176
FONTE: Freitas (2020, s.p.)
177
sistema de grafia das línguas de sinais estabelecido para uso. Contudo, acreditamos que
esse é um debate que deverá ganhar relevância nos próximos anos, devido às políticas
públicas que serão delineadas a partir da perspectiva bilíngue, para a qual o ensino de
surdos está se encaminhando.
DICA
Acadêmico, caso você tenha ficado interessado em conhecer mais a
respeito da escrita de sinais pelo sistema Sign Writing, recomendamos que
consulte, em sua Biblioteca da UNIASSELVI, os livros Introdução à Escrita
de Sinais e Escrita de Sinais, ambos escritos pelos professores Mariana
Correia e Cristian Sardo. Disponíveis nos links https://bibliotecavirtual.
uniasselvi.com.br/livros/livro/37389 e https://bibliotecavirtual.uniasselvi.
com.br/livros/livro/238182. A seguir, colocamos as capas dos livros e os
Qr-codes para acesso direto. Lembre-se de que você deverá estar logado
como aluno para acesso à biblioteca da instituição.
178
DICA
A fim de aprofundar as discussões a respeito da inserção da escrita de sinais para a
alfabetização de surdos, recomendamos a leitura do artigo Alfabetização de Surdos: Para
Além do Alfa e do Beta, de Isaac Figueredo de Freitas. Nele, o autor faz uma revisão teórica e
uma problematização bem interessantes do ensino da língua escrita para alunos surdos,
a partir de uma perspectiva que problematiza e sustenta a alfabetização em escrita de
sinais e LP. Disponível em: https://www.redalyc.org/journal/275/27563097036/html/. A
seguir, colocaremos o resumo do artigo e um Qr-code para acesso direto. Boa leitura!
RESUMO:
179
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu:
• O entendimento das partes que constituem um sinal são parte dos estudos que
procuram entender o modo como se dá a formação estrutural dos sinais para perceber
qual o conjunto de parâmetros que, ao ser utilizado, irá formar o léxico específico.
• Os estudos em que são comparados os modos como um mesmo referente pode variar
dependendo da região em que são utilizados é relacionado às formas de perceber a
língua em uso a partir da estrutura.
• A interação entre Libras e LP é um caso de diglossia complexa que não pode ser
compreendido dentro da perspectiva clássica de diglossia.
180
• Os sujeitos surdos não diferenciam um do outro de acordo com o grau de surdez, e
sim o importante para eles é o pertencimento ao grupo usando língua de sinais e
cultura surda que ajudam a definir suas identidades surdas.
• Os indivíduos são formados pelos diferentes discursos a que teve acesso, pelas pessoas
com quem dialogou e pelas experiências linguísticas compartilhadas socialmente.
• É necessário debater como alfabetizar surdos de modo que sejam capazes de ler e
compreender os textos lidos em LP.
181
AUTOATIVIDADE
1 Ao se categorizar os estudos da Sociolinguística em relação ao modo de análise dos
fenômenos linguísticos de acordo com aspectos da realidade sociolinguística, foram
desenvolvidos modos diversos de se explicarem os mesmos fenômenos linguísticos
que demonstram diferentes ângulos da mesma realidade linguística. A partir disso,
preencha a coluna de elementos linguísticos de acordo com a legenda.
LEGENDA
1- Microssociolinguística
2- Macrossociolinguística
ELEMENTOS LINGUÍSTICOS
( ) Relações face a face
( ) Políticas públicas
( ) Conflitos linguísticos
( ) Bilinguismo
( ) Língua materna
( ) Diglossia
182
3 A língua, dentro da perspectiva da Sociolinguística, é um dos traços constituintes da
identidade dos sujeitos e do modo como estes se percebem em relação à surdez e ao
ser surdo. Deste modo, como a Libras está relacionada à delimitação das identidades
surdas proposta por Perlin (1998)?
FONTE: PERLIN, G. Histórias de vida surda: identidades em questão. 1998. Sem paginação. Disponível
em: http://www.porsinal.pt/index.php?ps=artigos&idt=artc&cat=20&idart=153. Acesso em: 18 out. 2020.
183
5 A alfabetização está relacionada à aquisição do código de representação escrita da
língua, o letramento está relacionado aos usos sociais deste código aprendido, desta
maneira, o debate sobre este processo é muito importante para o entendimento do
ensino de Língua Portuguesa em sua modalidade escrita para alunos surdos. Tendo
isso em vista, avalie as asserções a seguir e a relação proposta entre elas:
PORQUE
184
UNIDADE 3 TÓPICO 3 -
SINAIS INTERNACIONAIS
1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, chegamos à última parte da nossa jornada através da Sociolinguística
da Libras. Ao longo deste livro didático, estudamos diversos conceitos e debatemos
noções, pontos de vista e perspectivas que envolvem a área de estudos linguísticos
que se propõe a analisar como as relações linguísticas se estabelecem em sociedade,
através da língua e das línguas em contato.
Já nesta última unidade, estudamos o papel das políticas públicas nos debates
linguísticos e debatemos a respeito da construção de identidades mediadas pelo
pertencimento linguístico. Ainda, brevemente, refletimos a respeito do caso da língua
de sinais em relação às identidades surdas, delimitadas por Perlin (1998).
Assim, chegamos a este último tópico, com uma bagagem teórica que
dará suporte aos debates a serem realizados pela perspectiva da tradução entre as
línguas de sinais. Para isso, inicialmente, apontaremos algumas noções que retomam
características das línguas naturais e dão suporte à percepção do porquê de não
existir uma língua única no mundo, a partir do entendimento da relação entre língua
e sociedade, compreendido através dos debates estabelecidos ao longo deste livro
didático. Após, veremos alguns dos elementos que delimitaram o debate das línguas
naturais e artificiais e traremos o exemplo do Esperanto, para compreender o motivo
pelo qual a criação de línguas não naturais é pouco efetiva para o desenvolvimento
de uma língua franca que permitisse a comunicação, sem impedimentos, entre povos
de diferentes línguas. Encerraremos as discussões com a origem, a conceituação e a
evolução do Gestuno e dos Sinais Internacionais.
185
Acadêmico, o objetivo deste tópico é que você compreenda como as discussões
da Sociolinguística trazem as perspectivas teóricas que nos permitem compreender o
porquê da impossibilidade da criação ou delimitação de uma língua única, manutenção
de línguas artificiais em grande escala, e possibilidades que os Sinais Internacionais
trazem para a difusão do conhecimento das línguas de sinais.
Bons estudos!
NOTA
Acadêmico, estes conceitos referentes às línguas de fronteira e
desenvolvimento de outras línguas foram abordados com maior
detalhamento na Unidade 1 deste material. Assim, caso você ache
necessário retomar esta discussão, por gentileza, consulte a parte
referente a contatos linguísticos nessa parte do livro didático.
Dito de outro modo “[...] uma língua unificada teria vida breve. Em pouco
tempo, cada grupo selecionaria os termos adequados ao seu ambiente e à sua cultura,
diferenciando novamente as linguagens” (SUPERINTERESSANTE, 2016, s.p.), ou seja,
nossa experiência teria mostrado que as línguas são utilizadas pelas pessoas em
diferentes contextos sociais compartilhados (comunidades linguísticas) e isso é o
mesmo que dizer que é impossível que uma única língua evolua de mesmo modo do
deserto do Saara ou entre os esquimós, tendo em vista, por exemplo, que as 40 palavras
diferentes que estes últimos utilizam para a cor branca não teriam a mínima utilidade
para quem vive num lugar em que neve não é uma realidade.
Desta forma, não existe uma língua única ou unificada porque as línguas são
partes que constituem os seres humanos e estes são extremamente heterogêneos,
vivem em contextos socioculturais diferentes, acessam referencialidades diversas e
são adaptáveis e maleáveis a um sistema complexo de forças sociolinguísticas que
provocam mudanças específicas de acordo com as situações a que são expostos estes
mesmos indivíduos que compartilham uma estrutura linguística socialmente constituída
que é, ao mesmo tempo, moldável às situações e mais rígida na estruturação e nos
parâmetros compartilhados por seus usuários.
187
português de Portugal. Também estão conectados a estas discussões, os debates
sobre as línguas artificiais que são aquelas construídas para “[...] atender a uma
necessidade em particular, como um grupo social, como no caso do esperanto, ou
para criar uma identidade específica” (MOSALINGUA, 2017, s.p.), ou seja, as línguas
artificias são criadas de maneira não natural para finalidades específicas que podem
ser derivadas de necessidades específicas da realidade quanto terem sido criadas para
o desenvolvimento ficcional e acabarem ganhando falantes fora das obras literárias ou
cinematográficas das quais se originaram, tais como o Klingon, de Jornada nas Estrelas;
o Dotrhaki, de Game of Thrones ou o Sindarin, do Senhor dos Anéis.
Ainda podemos destacar que uma das principais diferenças entre as línguas
naturais e as línguas artificiais é que as línguas naturais “não têm necessariamente um
objetivo. Elas surgem espontaneamente [da interação entre usuários e das modificações
decorrentes desta interação]” (MOSALINGUA, 2017, s.p., grifo nosso). Porém em relação às
línguas artificiais têm “[...] suas regras definidas antes de ser posta em uso, enquanto
as línguas naturais se desenvolvem enquanto são usadas [e] se desenvolveram de
idiomas pré-existentes, que passaram por um processo de transformação e evolução
significativo” (MOSALINGUA, 2017, s.p., grifo nosso). Em síntese, pode-se afirmar que
a principal diferença é que as línguas artificias são planejadas, não tendo um local
específico de origem, nem falantes nativos ou uma relação de parentesco linguístico
com outras línguas.
Segundo Oliveira e Silva (2014), o Esperanto foi criado pelo médico Ludwik Lejzer
Zamenhof, tendo sido publicada uma versão inicial em 1887, “[...] com a intenção de criar
uma língua de mais fácil aprendizagem, que servisse como língua franca internacional,
para toda a população mundial”. Ou seja, o objetivo era a criação de uma estrutura
linguística que facilitasse a comunicação entre as pessoas de maneira simplificada e
acessível. Embora não tenha conseguido servir completamente para este propósito,
tendo em vista que acabou ficando relacionada a alguns contextos, em relação às
demais línguas artificiais, ela foi a que mais se destacou por ter passado pelos estágios
de “[...] projeto (publicação de instruções) e semilíngua (uso em algumas poucas esferas
da vida social)” (OLIVEIRA; SILVA, 2014, p. 12). Inclusive, existem diferentes matérias,
cursos, programas de TV e materiais impressos e on-line que são disponibilizados
em Esperanto.
188
Observe, então, que o Esperanto mescla diferentes partes de línguas naturais
diferentes, de modo a estruturar-se a partir de variações combináveis e recombináveis,
a seguir, colocamos um exemplo de vocabulário relacionado a bebidas e comidas:
Observe que algumas das palavras são parecidas com a escrita da língua
portuguesa sendo, por isso, facilmente identificáveis. Contudo, o objetivo de ser uma
língua franca internacional não chegou a ser atingido, pois, mesmo com a projeção que
o idioma artificial ganhou ele ainda não teve a inserção socioeconômica, acadêmica e
cultural necessária para ser utilizado por pessoas de diferentes línguas maternas como
meio de comunicação, não chegando ao patamar de uso do Inglês, que é a língua franca
mais evidente na atualidade.
189
Assim, dando seguimento aos estudos sobre as línguas em contato internacional,
podemos dizer que, de acordo com Sanderson (2020), o Gestuno é uma forma anterior
de se referir aos Sinais Internacionais, tendo sido feita uma tentativa de organização de
sinais das diferentes línguas de sinais que seriam utilizados de maneira internacional.
Segundo Gonçalves (2021, s.p.), “O Gestuno é um sistema artificial padronizado de sinais
que foi usado sem êxito na década de 1970 pela WFD, juntamente com a Associação
Britânica de Surdos, na tentativa de criar uma “língua de sinais internacional”. Deste
modo, os Sinais Internacionais estão relacionados ao Gestuno em relação a uma
compreensão histórica das tentativas de estabelecimento de uma língua de sinais
franca que seria utilizada entre usuários de diferentes línguas de sinais.
Assim, os sinais internacionais não são uma língua, pois não apresentam
estrutura gramatical completa nem têm falantes nativos ou uma organização estrutural
fixa, sendo, pois, mais aproximados a um código formado por sinais provenientes de
diferentes línguas de sinais que serve como forma de facilitar a comunicação entre
surdos provenientes de diferentes lugares e usuários de diferentes línguas de sinais.
Sobre o uso dos sinais internacionais, de acordo com Gonçalves (2021, s.p.,
grifo nosso):
191
sobre Sinais Internacionais está sendo feita em ASL (American Sign Language –
Língua Americana de Sinais), muitos dos sinais que estão em processo de se tornarem
convencionais entre os surdos estão relacionados a esta língua de sinais, inclusive porque
a utilização dos Sinais Internacionais é feita com maior frequência pelos pesquisadores
da Universidade Gallaudet, que fica em Washington (DC) e é conhecida como polo
de pesquisas desenvolvidas por surdos, com alunos de mais de 52 países, tendo em
vista ser a única instituição do mundo que tem programas e serviços desenvolvidos
especificamente para surdos (MATTJIE, 2020, s.p.). Assim, o desenvolvimento, a
pesquisa e o uso de Sinais Internacionais acabam sendo muito necessários e, por isso,
frequentes no local, o que contribui para que o léxico seja difundido a partir da Língua
de Sinais Americana, tendo em vista a localização da instituição.
INTERESSANTE
Acadêmico, para maiores informações sobre o debate acerca dos Sinais Internacionais,
recomendamos a leitura da dissertação Identificação de estratégias de interpretação
simultânea intramodal – Sinais Internacionais para Libras, de Letícia Fernandes Garcia
Wagatsuma Granado. Nela, a pesquisadora apresenta o debate sobre o assunto da
interpretação simultânea com mais aprofundamento. Vale a pena a leitura!
A seguir, colocamos o link para acesso à dissertação, o resumo e o Qr-code para acesso
direto, boa leitura!
RESUMO
192
como um intérprete profissional tanto quanto os ouvintes.
No Brasil, os intérpretes surdos passaram a ser reconhecidos
na comunidade surda a partir de 1993, onde iniciaram
nas conferências (CAMPELLO, 2014) mas, geralmente,
além de ter um certificado de proficiência – ProLibras,
ainda não há formação profissional de interpretação para
os mesmos. Recentemente, os intérpretes surdos são
encontrados nas conferências brasileiras e têm interpretado
simultaneamente em Sinais Internacionais (SI) para Língua
de Sinais Brasileira (Libras) e vice-versa. SI não é considerado
uma língua oficialmente, pois ele não tem uma comunidade
de origem definida. Mesmo assim, serve como uma espécie
de língua franca equidistante em encontros internacionais
de surdos. Alguns autores como Adam et al (2014), Bienvenu
e Colonomos (1991), Boudreault (2005), Moody (2002;2008),
Stone (2009) são citados como base nesta pesquisa e
destacam a importância da formação para os intérpretes
surdos. Esta pesquisa tem como objetivo analisar exemplos
de interpretação intramodal de conferência simultânea de
SI para Libras e vice-versa para verificar se há estratégias
específicas na interpretação intramodal simultânea
entre SI e Libras na configuração da interpretação com
espelhamento, onde cada um tem o seu trabalho diferente:
intérprete interlingual, intérprete intralingual e intérprete de
apoio. Foram encontradas através dos resultados da análise
três categorias de estratégias: 1) estratégias linguísticas; 2)
estratégias de colaboração; e 3) estratégias de preparação.
Os resultados da pesquisa podem contribuir para 1) tornar
a interpretação intramodal por intérpretes surdos mais
evidentes; 2) discutir possibilidades de formação, preparação
e segurança do profissional para desenvolver as suas
habilidades práticas; 3) colaborar com as futuras pesquisas
na área dos Estudos da Interpretação para os Surdos; e
4) incluir os intérpretes surdos no campo de tradução e
interpretação de Língua de Sinais.
DICA
O Centro de Apoio ao Surdo (CAS) de Curitiba realizou
um evento transmitido on-line em que proporcionou
uma Oficina de Sinais Internacionais com a professora
Helenne Sanderson. Vale a pena assistir! Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=fUnMgse4PKs>.
193
INTERESSANTE
O Canal Disney Brasil disponibilizou vários vídeos em que apresenta de
maneira resumida em Sinais Internacionais a história de várias princesas,
como a Branca de Neve, Cinderela, dentre várias outras. O nome da Playlist é
Descobrindo Disney Princesas em sinais internacionais e vale a pena assistir
para conhecer e reconhecer alguns dos sinais utilizados pelos intérpretes.
A Playlist completa está disponível no seguinte link: https://www.youtube.
com/playlist?list=PL4n4i6GrObGA74PSPtR6LGU0-A5Xtr9HG>.
A seguir colocaremos a capa do vídeo em que o desenho da Branca de Neve é narrado
em Português e sinalizado em Sinais Internacionais, junto com o Qr-code que levará
você diretamente para a Playlist completa. Acesse: FONTE: Disponível em: https://www.
youtube.com/watch?v=c8k-kPyDhxg. Acesso em: 4 jul. 2022.
194
LEITURA
COMPLEMENTAR
A coleção Referenciais para o ensino de Língua Brasileira de Sinais como
primeira língua na Educação Bilíngue de Surdos: da Educação Infantil ao Ensino
Superior, organizada por Stumpf e Linhares, foi lançada em abril de 2022 e trouxe
a estruturação, mais que necessária, para o ensino de Libras como L1. O material é
composto por cinco livros em que é abordado o processo de curricularização da Libras
em todos os níveis de Ensino desde a Educação Infantil até o Ensino Superior. Deste
modo, a coleção se apresenta como uma resposta às necessidades educacionais do
povo surdo, sendo pautada pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e, ao mesmo
tempo, complementando, estruturando e organizando a documentação oficial bem
como as práticas de pesquisa clássicas da área bem como apresentado alguns dos
estudos mais recentes.
195
COMPETÊNCIAS DA ÁREA DE CONHECIMENTO DE LINGUAGEM PENSADA NA
PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO BILINGUE DE SURDOS
1 Compreender o lugar das línguas de sinais e da produção simbólica das
comunidades surdas no conjunto geral que compõe as linguagens como
construção humana, histórica, social e cultural, de natureza dinâmica,
reconhecendo-as e valorizando-as como formas de significação da realidade
e expressão de subjetividades e identidades sociais e culturais tanto nas
especificidades das comunidades surdas como em outros contextos.
2 Conhecer e explorar diversas práticas de linguagem (artísticas, corporais e
linguísticas) em diferentes campos da atividade humana por instrução em
Libras e considerando as produções simbólicas das comunidades surdas para
continuar aprendendo, ampliar suas possibilidades de participação na vida
social como pessoa surda e colaborar para a construção de uma sociedade
mais justa, democrática e inclusiva.
3 Utilizar diferentes linguagens – verbal da Libras (sinalizada, registrada em vídeo
e/ou escrita), corporal, visual, rítmica e digital –, para se expressar e partilhar
informações, experiências, ideias e sentimentos em diferentes contextos
e produzir sentidos por meio da Libras que levem ao diálogo, à resolução de
conflitos e à cooperação.
4 Utilizar diferentes linguagens associadas à Libras e a Cultura Surda para
defender pontos de vista que respeitem o outro e promovam os direitos
humanos, a consciência socioambiental e o consumo responsável em âmbito
local, regional e global, atuando criticamente frente a questões do mundo
contemporâneo no contexto de suas temáticas gerais e das formas de saberes
circulantes nas comunidades surdas.
5 Desenvolver o senso estético afirmativo na condição de pessoa surda bilíngue
para reconhecer, fruir e respeitar as diversas manifestações artísticas e
culturais, das locais às mundiais, inclusive aquelas pertencentes ao patrimônio
cultural da humanidade, considerando as memórias e bens simbólicos das
comunidades surdas, bem como participar de práticas diversificadas, individuais
e coletivas, da produção artístico-cultural, com respeito à diversidade de
saberes, identidades e culturas surdas e não surdas.
6 Compreender e utilizar tecnologias digitais de informação e comunicação
associadas à visualidade da Libras de forma crítica, significativa, reflexiva e
ética nas diversas práticas sociais (incluindo as escolares), para se comunicar
por meio das diferentes linguagens e mídias, produzir conhecimentos, resolver
problemas e desenvolver projetos autorais e coletivos em contextos bilíngues
e interculturais.
[...]
196
Análise e conhecimento das estruturas linguísticas e sociolinguísticas da
Libras e de outras línguas de sinais brasileiras
197
Nascimento (2009), ao descrever os elementos que compõem a morfologia
dos itens lexicais da Libras, analisa a expansão desses itens e de terminologias nessa
língua. Dentre várias questões abordadas em sua pesquisa, defende a tese de que
entidades morfológicas bases (léxicon-constituintes) atuam na construção do léxico
como princípio ordenado de expansão lexical e terminológica.
Ressalta-se que essas pesquisas podem estar para o professor como pano de
fundo no ensino da Libras, não sendo necessário verbalizá-las aos estudantes. E quando
se diz que não devem ser prescritivas, enfatiza-se que os professores não devem
ensinar esses elementos linguísticos como padrões a serem utilizados ou alcançados
pelos estudantes surdos, pois para que o processo de ensino/aprendizagem da Libras
ocorra, deve fazer sentido na vida dos estudantes surdos.
198
Assim, quando se fala em contextos de uso, entende-se que, embora se refira
ao ensino da Libras como L1 neste referencial, os professores devem levar em conta
o multilinguismo monomodal que abrange as línguas de sinais brasileiras, que abarca
as línguas de sinais indígenas, de fronteira, de comunidades surdas isoladas, sinais
convencionados entre familiares de surdos (sinais caseiros), a própria Libras e/ou algum
fenômeno ainda não observado e/ou descrito.
A Libras foi chamada por Ferreira-Brito, em 1988, como a Língua de Sinais dos
centros urbanos, compreensão da riqueza variacional que as comunidades linguísticas
de surdos apresentam em si e entre si. A estabilidade da variante “sinais dos centros
urbanos” (Libras) se manteve ao ponto de seu uso ser afirmado por essas comunidades
como um possível padrão linguístico (escolha dessa variante como padrão), assim como
sua(s) variante(s) dialetal(is) é(são) reconhecida(s) pelas comunidades regionais e/ou
pelas diferentes faixas etárias que as validam por seu uso.
Sendo fato que a maioria dos familiares de surdos não é fluente ou faz um uso
pouco elaborado de uma língua de sinais, a escolaridade se torna a principal variável
que determina os contextos de aprendizagem e de uso das línguas de sinais brasileiras.
As escolas de/com surdos que utilizam a Língua de Sinais como língua de instrução, as
escolas inclusivas com interpretação envolvendo uma Língua de Sinais, os atendimentos
educacionais especializados que almejam o ensino de Libras como L1 têm sido espaços
de aprendizado dessas línguas sinalizadas. Para esses surdos, seu primeiro contato ou
uma percepção de estruturas mais elaboradas de uma língua de sinais se dará nas
escolas. Nesses espaços as referências (modelos) de adultos e crianças sinalizantes
são variadas.
199
Dessa maneira, professores de línguas de sinais devem levar em conta a faixa
etária dos surdos; o contexto de aprendizagem dessa língua, que geralmente inicia-
se no contexto educacional; as diferentes línguas de sinais que os surdos podem
trazer como herança consigo que devem ser o meio pelo qual ressignificarão novos
aprendizados. Logo, conduzirão os estudantes surdos à compreensão dos diferentes
gêneros discursivos/textuais e dos diferentes níveis de registro para acessarem o
conhecimento nos mais diversos campos da vida.
[...]
200
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu:
• As línguas variam desde o nível mais simples e individual até os mais complexos
e coletivos.
• Não existe uma língua única ou unificada porque as línguas são partes que constituem
os seres humanos e este são extremamente heterogêneos.
• As línguas artificias são planejadas, não tendo um local específico de origem, nem
falantes nativos ou uma relação de parentesco linguístico com outras línguas.
• O esperanto foi criado pelo médico Ludwik Lejzer Zamenhof, tendo sido publicada uma
versão inicial em 1887, com a intenção de criar uma língua de mais fácil aprendizagem,
que servisse como língua franca internacional, para toda a população mundial.
201
• Existem diversas línguas de sinais no mundo e, inclusive, um mesmo país pode ter
mais de uma língua de sinais, portanto, a língua de sinais não é universal, assim como
ocorre com as línguas orais que conhecemos.
• O gestuno é uma forma anterior de se referir aos Sinais Internacionais, tendo sido
feita uma tentativa de organização de sinais das diferentes línguas de sinais que
seriam utilizados de maneira internacional.
• Os sinais internacionais não são uma língua, pois não apresentam estrutura
gramatical completa nem tem falantes nativos ou uma organização estrutural fixa.
• A sinalização que utiliza sinais internacionais pode ser categorizada através do modo
como os sinais utilizados em uma conversa entre surdos usuários de diferentes
línguas de sinais se dará, podendo ser através de sinais convencionalizados ou
comunicação informal.
202
AUTOATIVIDADE
1 As línguas variam desde o nível mais simples e individual até os mais complexos e
coletivos, com situações em que é necessário utilizarmos de vocabulário e estruturas
mais ou menos formais, em nível individual, ou em espaços de fronteira em que duas
línguas convergem para a utilização de uma terceira estrutura mais maleável. Tendo
isso em vista, observe a seguinte situação:
Marta está conversando por mensagem de aplicativo com seu aluno que está com as
atividades escolares atrasadas, durante a conversa, o adolescente manda um áudio
com a seguinte frase:
A partir das discussões feitas como você interpretaria a necessidade sentida pelo aluno
de enviar um de pedido de desculpas e reelaborar a frase falada?
203
3 As mudanças e variações que os usuários realizam de acordo com os fatores
sociolinguísticos compartilhados por uma comunidade linguística impossibilidade do
estabelecimento e manutenção de uma língua única compartilhada. Relacionadas
a esta discussão estão as noções de línguas naturais e línguas artificiais, tendo em
vista que a variação linguística está envolvida no processo de surgimento, extinção e
modificação das línguas. Tendo isso em vista, numere a coluna das características de
acordo com a legenda:
LEGENDA
1- Línguas naturais
2- Línguas artificiais
CARACTERÍSTICAS
( ) Surgem organicamente ao longo do tempo e de acordo com as variações ocorridas.
( ) São planejadas, não tendo um local específico de origem, nem falantes nativos ou
uma relação de parentesco linguístico com outras línguas.
( ) São criadas de maneira não natural para finalidades específicas.
( ) Surgem a partir do contato entre usuários e das modificações decorrentes desta
interação.
4 Os Sinais Internacionais ainda estão em uma fase em que as estruturas são variáveis
e maleáveis, por isso, não se estabeleceram como língua completa, estando em uma
fase em que os sinais adotados pertencem a diferentes línguas de sinais, sendo, em
sua maioria icônicos, pela facilidade de compreensão ser mais facilitada quando o
sinal remete diretamente ao objeto. Sobre os sinais internacionais, marque a opção
CORRETA:
5 Sinais Internacionais não são reconhecidos como língua porque a sua estrutura
pode variar de acordo com as características da situação linguística das pessoas
envolvidas na sinalização. Qual é o impacto desta variação para os sinais e a estrutura
da conversação através destes sinais internacionais?
204
REFERÊNCIAS
BARBOSA, W. Microlinguística e acrolinguística. 2022. Som. Cor. 18’28min. Disponível
em: https://www.youtube.com/watch?v=MP3SCrPEQTw. Acesso em: 2 jul. 2022.
205
EWALD, L.; SOUSA, D. V. C. Sociolinguística. Indaial: UNIASSELVI, 2019. Disponível em:
https://bibliotecavirtual.uniasselvi.com.br/livros/livro/203185. Acesso em: 2 jul. 2022.
OLIVEIRA, L. N. S.; SILVA, G. O. Libras. Natal: Instituo Federal do Rio Grande do Norte
(IFRN), 2014. Disponível em: chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/
https://memoria.ifrn.edu.br/bitstream/handle/1044/779/Libras%20AULA%2004%20
-%20DF.pdf?sequence=4&isAllowed=y. Acesso em: 4 jul. 2022.
206
SANDERSON, H. Oficina de sinais internacionais. 2020. Som. Cor. 76 min. Disponível
em: https://www.youtube.com/watch?v=fUnMgse4PKs. Acesso em: 4 jul. 2022.
TODA MATÉRIA. O que é uma política pública e como ela afeta sua vida? 2020.
Sem paginação. Disponível em: https://todospelaeducacao.org.br/noticias/o-que-e-
uma-politica-publica-e-como-ela-afeta-sua-vida/. Acesso em: 20 jun. 2022.
TODOS PELA EDUCAÇÃO. O que é uma política pública e como ela afeta sua
vida? 2020. Disponível em https://todospelaeducacao.org.br/noticias/o-que-e-uma-
politica-publica-e-como-ela-afeta-sua-vida/. Acesso em: 26 jul. 2022.
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