Dissertação - Italo Bruno (2022)
Dissertação - Italo Bruno (2022)
Dissertação - Italo Bruno (2022)
Teresina-PI
2022
1
Teresina-PI
2022
2
FICHA CATALOGRÁFICA
Universidade Federal do Piauí
Biblioteca Comunitária Jornalista Carlos Castello Branco
Divisão de Representação da Informação
CDD 981.22
BANCA EXAMINADORA
____________________________________
Prof. Dr. Edwar de Alencar Castelo Branco
Universidade Federal de Piauí – UFPI
Orientador
______________________________________
Prof. Dr. Alcebíades Costa Filho
Universidade Estadual do Maranhão - UEMA
Examinador Externo
_______________________________________
Profa. Dra. Teresinha de Jesus Mesquita Queiroz
Universidade Federal do Piauí - UFPI
Examinador Interno
____________________________________________________
Prof. Dr. Francisco Gleison da Costa Monteiro
Universidade Federal do Piauí - UFPI
Suplente
Teresina-PI
2022
4
AGRADECIMENTOS
A caminhada durante o período de execução desse trabalho não foi nada fácil. Durante
o processo, por vezes, pensei seriamente em desistir. Sentia-me fraco, com o psicológico
abalado, sobretudo pelos tempos distópicos vividos nesses dois anos de mestrado.
Em meio a esse árduo percurso, porém, construí vínculos pessoais que foram
fundamentais para seguir em frente diante das dificuldades. As pessoas que fizeram parte do
meu processo acadêmico e que a seguir deixarei expressos os sinceros agradecimentos
contribuíram muito para que essa dissertação pudesse ser desenvolvida e para que eu pudesse
conquistar mais um objetivo em minha trajetória de vida.
Essa parte da escrita foi aquela que mais me renderam lágrimas, mas lágrimas de uma
felicidade gritante. Somente quem esteve perto sabe o quanto foi difícil para que eu pudesse
conseguir atingir esse objetivo. Agora com toda a felicidade que comporto no meu íntimo
posso dizer que conquistei o meu título de mestre! Contudo, faço considerações àqueles que
foram essenciais na minha caminhada para esse fim.
Um agradecimento mais que especial ao meu avô Raimundo que, como lavrador,
nunca deixou de acreditar no estudo como caminho para adquirir conquistas, e com suas
sábias palavras sempre externou a todos o valor que merece o educador: “O professor devia
ser o profissional mais valorizado, porque o professor é a base de tudo. Todas as outras
profissões, tudo passa pelas mãos do professor!” Meu avô, suas palavras foram as que mais
me motivaram a seguir em frente!
Dedico meus agradecimentos a minha vó Lúcia, que também sempre me apoio durante
esse percurso. Marcam-me as suas palavras toda vez que chegava para fazer uma visita em
casa, olhando para mim dentro do quarto, em frente ao computador, dizendo: “Tá só
estudando, né, meu filho?” E em resposta lhe falava: “Tô aqui pelejando!”. A peleja no estudo
rendeu os frutos de que hoje estou colhendo, minha vó! Obrigado pela força de sempre!
Agradeço imensamente aos meus pais, Francisco e Veridiana, que apesar das
dificuldades já enfrentadas, nunca deixaram de me prover o bem-estar e a educação. Foram
sempre pais presentes a mim e a meu irmão, Iago. Espero muito um dia poder recompensá-los
pelo que me fizeram e me fazem! Obrigado por tudo, minha base!
Sou grato ao meu irmão, Iago, que tem um coração enorme e, apesar de mais novo,
acaba me ensinando lições lindas. Acalmou-me por várias vezes com suas palavras
confortadoras nos momentos de aflição em meio à escrita das páginas deste trabalho.
Obrigado, meu companheiro!
6
Apesar de não ser irmão, a Romário emprego a consideração de como se fosse. Amigo
que tive a honra de adquirir na graduação, e aqui estamos nós novamente conquistando mais
um sonho juntos. Sou muito grato pelas palavras sábias e incentivo que a mim sempre deu,
não me deixando cair, mas antes dando forças para que eu pudesse prosseguir. Espelho-me
muito na pessoa que possui uma inteligência, sobretudo para a vida, admirável. Obrigado,
grande amigo!
Faço também um agradecimento ao meu amigo Caio. Nas nossas conversas
compartilhadas externamos um pouco dos pesares, mas também das conquistas da produção,
durante o processo de realização da dissertação. Valeu meu amigo! Nesse mesmo sentido
quero agradecer a outras colegas do curso. A Neta, Nara, Izadora e Tânia, pessoas com quem
foram trocados poucos contatos físicos, mas contatos virtuais importantes. Obrigado!
Institucionalmente, agradeço ao PPGHB da Universidade Federal do Piauí pela
possibilidade que me proporcionou de adquirir experiência como pesquisador dentro do seu
espaço acadêmico, em meio a um quadro docente amplamente competente. No mesmo
sentido quero agradecer ao financiamento proporcionado pela CAPES, incentivando no
desenvolvimento deste trabalho científico e valorizando assim a pesquisa.
Dentre os professores do programa faço agradecimento mais que especial a duas
mulheres incríveis que tive a honra de conhecer, profa. Dra. Elizângela e profa. Dra.
Teresinha. A primeira na disciplina de seminário de linha e a segunda pela sua participação
em minha banca de qualificação. Deram-me valorosíssimos ensinamentos e importantes
orientações para que esse trabalho pudesse seguir um rumo e chegar a uma conclusão. Meu
muito obrigado!
Faço um agradecimento não menos especial ao meu orientador na graduação e
integrante da minha banca de qualificação, prof. Dr. Gleison. Para além de excelente
profissional, um exemplo de ser humano. A você, professor, devo muito! Na graduação,
quando lhe procurei para me orientar, já atrasado, na disciplina de TCC I, acolheu-me de uma
forma calorosa. Apresentou-me o objeto de estudo sobre o qual me debrucei, conquistei com
ele a seleção do mestrado e sobre ele entrego agora este trabalho. Por tudo e por tanto, meu
muito obrigado!
Deixo aqui também registrada a gratidão ao meu orientador no mestrado, prof. Dr.
Edwar. Profissional com uma experiência salutar. Interessou-se na minha orientação apesar
de, aparentemente, a pesquisa ser de área diferente e recorte diverso do seu. No decorrer do
processo proporcionou-me a ampliação dos horizontes enquanto professor/pesquisador.
Obrigado, mestre!
7
Por fim, agradeço de maneira geral a todos aqueles que contribuíram direta ou
indiretamente para que essa dissertação fosse concluída. Muito obrigado!
8
RESUMO
ABSTRACT
The present work developed a study on Antônio Coelho Rodrigues, a Brazilian politician and
jurisconsult, who lived from 1846 to 1912. Coelho Rodrigues was one of the main political
representatives of Piauí as a deputy and senator, both in the Empire and in the Brazilian
Republic. His representation on the national political scene and his famous career as a
professor of law, especially civil law, allowed him, when the new regime was installed, to be
hired to write the first draft of the civil code of the Republic, in 1890. The problem of our
research revolves around a supposed silencing and relative historical oblivion of Coelho
Rodrigues, which opens the possibility of historiographical discussion, as a sign subject of
research, for the expansion of knowledge about national political disputes, and how in the
period of transformations that Brazilian society was going through, Coelho Rodrigues will be
important, especially as an intellectual in conducting a work of the time demanded by time,
the civil code, where the renewal of the legislative apparatus of private law became an urgent
need as a material and fundamental symbol for the construction of the nation that was
intended to be created. His political and legal movements somewhat favor the understanding
of the transition from Monarchy to Republic, and in this environment they reveal the
contradictions of a time that pushed Coelho Rodrigues to the condition of failure within his
space of action and, consequently, in historiography.
Keywords: Antônio Coelho Rodrigues; political disputes; civil code.
10
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura. 1. Coelho Rodrigues em sua juventude/Fonte: Acervo Digital da FUNDAJ 30
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 12
INTRODUÇÃO
político, jurista e, em linhas gerais, intelectual. Coelho Rodrigues pode ser considerado um
sujeito histórico onde as suas movimentações políticas e jurídicas colaboraram para a
construção da nação brasileira, em meio aos reveses políticos da viragem de um regime ao
outro, e onde as transformações exigiam mudanças políticas e legislativas necessárias para a
manutenção do sistema político e social brasileiro.
História relativamente pouco explorada, a vida e obra de Coelho Rodrigues foram
sendo esquecidas no decorrer do tempo não fossem aqueles que se interessassem por lembrá-
lo. Segundo Aguiar, os pesquisadores estão em débito com o sujeito, pois muitos
desconhecem o que o autor considera a grandiosidade da sua obra.4 Nesse sentido, a nossa
pesquisa tem como pretensão ampliar as discussões que não deixaram morrer, mas antes
contribuíram com as suas análises que giram em torno de Coelho Rodrigues no decorrer do
tempo, não permitindo cair no esquecimento um dos ilustres do Piauí da sua época, com
notoriedade nacional.
Para tanto a pesquisa torna-se um conhecimento que, acrescente-se, não pretende
erguer um mito como muito tente a cristalização e monumentalização das personalidades, mas
tornar visível nessa abordagem historiográfica suas contradições de sujeito, suas relações para
com os rumos da política e direito civil no Brasil, entre outros aspectos, de modo que a
visibilidade histórica aqui elencada diz respeito ao terreno fértil que Coelho Rodrigues, sua
trajetória e produção intelectual, contribuem para a historiografia.
A pretensão do trabalho não é esgotar o tema, o que é humanamente impossível, mas
antes contribuir com uma representação feita em torno de eventos explorados nos esfacelados
registros do passado de Coelho Rodrigues pelo olhar de um historiador por vezes desatento.
Buscamos no decorrer do texto construir uma proposta narrativa que foi devidamente
costurada pelos fios daquele que, como o tecelão, pretende dar sentido a um complexo
emaranhado de elementos imersos no seu estojo de materiais para uso. Por fim, entregamos
mais uma proposta com esforços empreendidos no sentido de costurar uma narrativa em torno
do notável político e jurisconsulto da sua época.
Tendo em vista a problemática, é necessário nos situarmos no tempo e no espaço que
compreenderam a vida e obra de Coelho Rodrigues. Como a pretensão do primeiro capítulo é
fazermos um estudo que contempla eventos da vida do sujeito, o recorte temporal inicial sobre
o qual nos debruçamos é o do seu nascimento, ano de 1846. Como recorte final, temos o ano
da sua morte, que ocorreu em 1912, quando, voltando ao Brasil depois de uma viagem que fez
4
AGUIAR, Antonio Chrysippo. Coelho Rodrigues e a ordem de silêncio. 1. ed. Teresina: 2006.
14
à Europa para tratar da saúde não pôde mais em vida visualizar a terra de onde se fez homem
de talento. Certamente que dentro desse período selecionamos momentos considerados
salutares para o desenvolvimento dos demais capítulos.
O recorte que compreende a sua atuação política, de que nos atemos no segundo
capítulo, se estabelece desde sua ascensão ao primeiro cargo como representante do Piauí no
cenário nacional, em 1869, até a escrita do seu livro de cunho político “A República na
América do Sul”,5 do ano de 1906. No terceiro capítulo damos ênfase ao recorte que
compreende a escrita e discussões em torno da sua maior obra legislativa, o projeto de código
civil,6 realizado na década de 1890, com início neste mesmo ano, até 1893.7 Em 1897, Coelho
Rodrigues publicou uma segunda versão do seu projeto com uma história documentada sobre
o processo de codificação, que também entrou na análise.8 Anos posteriores também são
considerados, foi onde se envolveu em amplos debates como convidado para dar parecer
sobre o projeto do seu sucessor na tentativa de dotar o Brasil de um código civil, Clóvis
Beviláqua, com discussão inédita no Jornal do Comércio.9
Quanto ao recorte espacial nos debruçamos sobre os principais percursos nacionais,
com eventuais considerações internacionais, de deslocamento de Coelho Rodrigues. Para
tanto, o estudo compreende desde o seu nascimento nos sertões do Piauí, e seus primeiros
passos e desenvolvimento dentro de localidades na então província. Quando jovem e
estudante do ensino superior, Coelho Rodrigues encontrou-se localizado no Recife, capital do
Pernambuco, um dos principais centros de ensino para onde convergiam os filhos de famílias
abastadas do Império. Após a formatura, retornou ao Piauí, onde se encontrou atuando
inicialmente como jornalista e advogado.
5
Utilizamos como fonte a edição do livro de Antônio Coelho Rodrigues publicada pelo Senado Federal no ano de
2016. Para mais informações, ver: RODRIGUES, Antônio Coelho. A República na América do Sul ou um pouco
de história e crítica oferecida aos latino-americanos, 1906. Brasília: Senado Federal, 2016.
6
O Código Civil é um conjunto organizado de leis que serve para regular os direitos dos cidadãos,
principalmente no tocante às questões de ordem nacional privada. No século XIX, com o liberalismo em
expansão e a instalação de um regime com princípios democráticos, a República, esse ordenamento civil foi
considerado de grande importância para a garantia dos direitos individuais, com relação à propriedade, direitos
de gerir seus negócios, liberdade de testamento e contrato, direitos familiares, além de significar a ampliação de
direitos para os setores sociais menos favorecidos, pelo menos em tese, dentro do quadro de relações da
sociedade em processo de aburguesamento. Para mais informações, ver: GRINBERG, Keila. Código Civil e
cidadania. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.
7
Quanto ao projeto de Código Civil de Coelho Rodrigues concluído neste ano, ver: RODRIGUES, Antônio
Coelho. Projecto do Código Civil Brazileiro precedido de um projecto de lei preliminar. Rio de Janeiro:
Imprensa Nacional, 1893.
8
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
9
O Jornal do Comércio foi um dos mais importantes e tradicionais periódicos nacionais, estabelecido no Rio de
Janeiro desde 1827. As informações colhidas nesse periódico foram retiradas do acervo da Biblioteca Nacional
Digital.
15
Assim que ingressou na política como deputado pelo Piauí foi na capital do Brasil à
época, Rio de Janeiro, onde encontramos Coelho Rodrigues. Sobretudo a partir década de
1870 deslocou-se bastante do Rio para o Recife, período em que se doutorava, além de
estabelecer morada na capital pernambucana quando esteve atuando como professor pela
Faculdade de Direito do Recife. Viagens ao Piauí eram recorrentes. O eixo então de onde se
deslocou foi, principalmente entre Piauí, Pernambuco e Rio de Janeiro. No início da
República, quando contratado para realizar o projeto de Código Civil, Coelho Rodrigues fez
morada por uns dois anos na capital da Suíça, Genebra, de 1890 ao final de 1892.
“A constituição do sujeito Antônio Coelho Rodrigues”. Abaixo do título que pensamos
para abrir a discussão do nosso trabalho no capítulo I, a ideia foi construirmos uma
representação histórica sobre quem foi o sujeito signo de nossa pesquisa. Alguns estudiosos
ocuparam-se de lembrar Coelho Rodrigues no decorrer do tempo, lançando suas
interpretações com base nas pesquisas que fizeram em torno do mesmo, a exemplo de
Carvalho,10 Castello Branco,11 e Coelho e Brandão.12 Nossa pretensão é contribuir com um
estudo que trata, sobretudo, da biografia de vida do ser humano que foi Coelho Rodrigues,
suas contradições dentro das condições de existência em que viveu, visto que as análises sobre
o mesmo são desordenadas e não contemplam a riqueza historiográfica em torno dessa
personalidade. Para tanto, buscamos embasamento nas informações que conseguimos por
meio da literatura construída sobre o seu percurso de vida e nos dados empíricos, muitos
inéditos, e disponíveis em jornais importantes do período, como o Jornal do Comércio,
Diário de Pernambuco, A Imprensa e O Piauhy.
“Os reveses políticos de Antônio Coelho Rodrigues no decorrer da Monarquia à
República”. A partir deste título, que encampana o segundo capítulo, buscamos compreender
as relações políticas de Coelho Rodrigues, sobretudo em torno do Piauí, território de onde
surgiu esta personalidade, e o qual vai representar no cenário nacional da política como
deputado e senador. Partindo das disputas político-partidárias, a pretensão é compreender de
que maneira Coelho Rodrigues vai localizar-se no cenário dessas lutas, e como vai
ascendendo na política até se tornar uma representação forte da sua terra. Isso é salutar para
pensarmos Coelho Rodrigues como detentor de um relativo poder e domínio como político no
10
CARVALHO, Abimael Clementino Ferreira de. Família Coelho Rodrigues: Passado e Presente. Fortaleza:
Impr. Oficial do Ceará. 1987.
11
CASTELLO BRANCO, Francisco de Assis Couto. Antônio Coelho Rodrigues: Vida e Obra. TERESINA:
UFPI, 1987.
12
COELHO, Celso Barros (Org.); FRANÇA, R. Limongi; BRANDÃO, Wilson de Andrade. et al. Coelho
Rodrigues e o código civil, comemoração do sesquicentenário de nascimento. Teresina/PI: Gráfica do Povo.
1998.
16
13
FREITAS, Clodoaldo. Os fatores do coelhado: Escorço de história. 2. ed. Teresina: Academia Piauiense de
Letras, 2018.
14
CARVALHO, J. M. Os bestializados: O Rio de Janeiro e a república que não foi. São Paulo: Companhia das
Letras, 1987.
17
a maneira como no decorrer da Monarquia à República brasileira o mesmo foi participe como
um dos sujeitos de ação pelas transformações do seu tempo.
18
Duas comunas piauienses podem reivindicar para si terem sido o palco de nascimento
de Antônio Coelho Rodrigues. Afirmamos isso pelo fato de que a Fazenda em que veio ao
mundo, conhecida como Boqueirão, fazia parte de uma região pertencente a Oeiras, no Piauí.
Essa condição mudou quando, com a resolução provincial n° 397, de 17 de dezembro de
1855, Picos-PI é elevado à categoria de município e são definidos seus limites, tornando-se
aquela Fazenda oficialmente pertencente a esta cidade.15
Hoje em dia o casarão da Fazenda Boqueirão, imerso no interior de Picos, num lugar
conhecido como Boqueirão dos Rodrigues, encontra-se quase totalmente esfacelado pelo
tempo. Passados mais de 175 anos do nascimento de Antônio Coelho Rodrigues,
evidentemente mais tempo ainda da construção do casarão, aquele local que foi o cerne da
vida de um dos ilustres piauienses, relativamente conhecido dentro da historiografia,
encontra-se abandonado pelas autoridades públicas. Um dos poucos registros físicos
memorialísticos da nossa história quase não pode mais ser apreciado como monumento
representativo do passado de uma das personalidades expressivas do seu tempo.
No estudo que se segue no decorrer desse capítulo pretendemos dar um sentido, a
partir dos esparsos registro do seu passado, à trajetória de vida de um dos sujeitos filhos da
terra, ilustre do Piauí, de destaque nacional, Antônio Coelho Rodrigues. Como a história é
pensada como representação em torno daquilo que se passou, o primeiro momento da
dissertação é uma tentativa de construir um sentido narrativo sobre a imagem lembrada e
celebrada de Coelho Rodrigues, casando bibliografia e empiria. Esse é um esforço com
pretensão de oferecer uma proposta inicial de valorização da história biográfica de uma
personalidade que merece ser lembrada por aquilo que legou à sociedade brasileira.
Ao fazer uma consideração inicial em torno de Coelho Rodrigues na sua obra Coelho
Rodrigues e a ordem de silêncio, Aguiar considera que os estudiosos estão em débito com o
sujeito. Afirma que a obra de Coelho Rodrigues é de grande valia para compreendermos a
história do Brasil, sobretudo os embates jurídicos em torno do processo de codificação das
leis civis, na viragem da Monarquia para a República, final do século XIX e início do XX.
Coelho Rodrigues, em linhas gerais foi advogado, jornalista, político, professor, jurista
15
CASTELLO BRANCO, Francisco de Assis Couto. Antônio Coelho Rodrigues: Vida e Obra. TERESINA:
UFPI, 1987.
19
16
AGUIAR, Antônio Chrysippo. Coelho Rodrigues e a ordem de silêncio. 1. ed. Teresina: 2006.
17
CARVALHO, Abimael C. Ferreira de. Família Coelho Rodrigues: Passado e presente. 1ª Ed. Fortaleza:
Imprensa Oficial do Ceará, OEIC, 1987.
18
Valério Coelho Rodrigues nasceu em 03 de setembro de 1713, na freguesia de São Salvador do Paço de Sousa,
Bispado do Porto, em Portugal, filho de Domingos Coelho e Águeda Rodrigues. Para mais informações, ver:
MIRANDA, Reginaldo. Piauienses Notáveis. Teresina: APL, 2019.
20
19
MIRANDA, Reginaldo. Piauienses Notáveis. Teresina: APL, 2019.
20
Era bandeirante paulista e patriarca da família Vieira de Carvalho, no Piauí. Para mais informações, ver:
CARVALHO, Abimael C. Ferreira de. Família Coelho Rodrigues: Passado e presente. 1ª Ed. Fortaleza:
Imprensa Oficial do Ceará, OEIC, 1987.
21
MIRANDA, op. cit.
22
BRANDÃO, Tanya Maria Pires. A elite colonial piauiense: familiar e poder. Teresina: FCMC, 1995.
23
MIRANDA, op. cit.
24
CARVALHO, op. cit.
21
primeira filha do patriarca Valério, de nome Ana Rodrigues de Santana, bisavó materna de
Coelho Rodrigues, e casada com Manuel de Souza Martins. Mediante diálogo com Silveira,
durante o decorrer do século XIX era bastante comum o entrecruzamento consanguíneo, onde
parentes próximos contraiam matrimônio com a finalidade de ampliação do exercício do
poder no território.25 Coelho Rodrigues adveio de uma relação ascendente em que um
tio/primo casou-se com uma sobrinha/prima.
O filho de Ana Rodrigues, seu avô materno, Joaquim de Souza Martins, exerceu
cargos administrativos de destaque dentro da província piauiense, como comandante das
armas do Piauí de 1823 a 1825, membro da Junta do Governo Provisório entre 1823 e 1824,
além de ser proprietário de fazendas, como as de Terra Nova e Carnaíba.26 O irmão do seu
avô Joaquim, portanto tio-avô de Coelho Rodrigues foi Manuel de Souza Martins Filho, o
Visconde da Parnaíba, considerado um dos políticos de maior representatividade dentro da
província na primeira metade do século XIX. O mesmo governou o Piauí dentre o período de
1823 a 1843. Além de ser responsável por organizar o Partido Conservador e garantir seu
domínio por um longo período no território piauiense, o Visconde da Parnaíba tornou-se
referência pela legitimação da ordem imperial na província.27
Com relação aos pais de Coelho Rodrigues poucos registros puderam ser encontrados
para melhor compreensão acerca de quem foram. O que podemos interpretar mediante a
análise feita em meio aos esparsos registros do passado é que certamente com as ampliações e
divisões das terras de Valério por suas gerações posteriores, aquela propriedade localizada no
interior da província piauiense, conhecida como Boqueirão, dentre tantas outras, inclusive em
outras províncias, acabou se tornando de posse de Manuel Rodrigues Coelho Filho, que era
capitão, e Ana Joaquina. Berço de seu nascimento, a Fazenda Boqueirão se tornou o lugar de
onde veio ao mundo e desenvolveu seus primeiros passos, dentro daquela sociedade
tradicional, Antônio Coelho Rodrigues.
Segundo Lima, historiador que trabalha o contexto econômico e social piauiense da
época, Coelho Rodrigues viveu um tempo infantil onde o Piauí era considerado pouco
25
SILVEIRA, Mona Ayala Saraiva da. As relações familiares e o matrimônio no Piauí oitocentista. IN: LIMA,
Nilsângela Cardoso (Org.). Páginas de História do Piauí colonial e provincial. 1. Ed. Teresina: EDUFPI, 2020.
p. 163 – 190. Disponível em:
https://educapes.capes.gov.br/bitstream/capes/570203/2/P%C3%A1ginas%20da%20Hist%C3%B3ria%20do%20
Piau%C3%AD%20colonial%20e%20provincial_livro_Cead%20%5BE-book%5D.pdf. Acesso em: 20/jul./2021.
26
CARVALHO, Abimael C. Ferreira de. Família Coelho Rodrigues: Passado e presente. 1ª Ed. Fortaleza:
Imprensa Oficial do Ceará, OEIC, 1987.
27
CASTELO BRANCO, Pedro Vilarinho. O Visconde da Parnaíba e a construção da ordem imperial na
província do Piauí. CLIO: Revista de Pesquisa Histórica, Recife-PE, vol. 38, ISSN: 2525-5649, p. 205 – 230,
Jul./Dez., 2020. Disponível em: file:///C:/Users/win10/Downloads/245738-181416-1-PB.pdf. Acesso em:
22/jul./2021.
22
28
LIMA, Solimar Oliveira. Fazenda: Pecuária, agricultura e trabalho no Piauí escravista (séc. XVII – séc. XIX).
Teresina: Edufpi, 2016.
29
QUEIROZ, Teresinha de Jesus Mesquita. Os literatos e a República: Clodoaldo Freitas, Higino Cunha e as
tiranias do tempo: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 1994.
30
Idem.
23
31
QUEIROZ, Teresinha de Jesus Mesquita. Os literatos e a República: Clodoaldo Freitas, Higino Cunha e as
tiranias do tempo: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 1994. p. 58.
32
BRITO, Itamar de Sousa. História da Educação no Piauí. Teresina: EDUFPI. 1996.
33
AGUIAR, Antônio Chrysippo. Coelho Rodrigues e a ordem de silêncio. 1. ed. Teresina: 2006.
24
adquirir notáveis habilidades, mediante a importância que a educação passou a ter na vida dos
futuros representantes da elite.
Mas certamente a sua infância não deve ser reduzida ao fator da sua educação. Assim
foram as representações que lembraram Coelho Rodrigues no decorrer do tempo. Para além
dessas versões da sua história, podemos pensar no mesmo como uma criança que gostava de
brincar ao relento com seus irmãos e amigos na fazenda em que viveu os primeiros anos da
sua vida. É possível imaginá-lo fazendo perguntas sobre tudo a sua volta, a tirar pelo fato de
que nessa fase todos são curiosos para conhecer os mais simples signos que os cercam. O
próprio Coelho Rodrigues ao relembrar sua infância em um discurso no Jornal do Comércio
apontou para a sua vivência na fazenda do interior onde se criou, em meio ao exercício do
trabalho escravo que acompanhou seus primeiros passos, nas condições da sua existência.34
Muito cedo Coelho Rodrigues foi acometido com a morte prematura do seu pai, o
capitão Manuel, em 02 de outubro de 1851. Com o abalo ocasionado pelo falecimento do
então patriarca, os seus estudos acabam sendo interrompidos.35 Não somente no quesito
educação, a sua própria vida tomou outro rumo. Esse acontecimento com certeza pôde ser
assimilado por Coelho Rodrigues no tempo em que se sucedeu.
Como o primogênito dos cinco filhos do casal o peso da ausência do patriarca foi
maior para aquele que próximo esteve de completar os seis anos e, mesmo sem entender
direito sobre a realidade da vida e do fim dela, não deixou de lamentar a perda do seu pai.
Certamente esse sentimento foi aflorado posteriormente, onde consciente da finitude do ser,
parou e refletiu acerca da morte daquele que lhe deu a vida, restando flashes de memórias
sobre momentos vividos com Manuel.
No ano seguinte à morte do seu pai, ao acabar de completar os seus seis anos, no mês
de abril, Coelho Rodrigues enfrentou um novo desafio para sua pouca idade. A matriarca,
dividida entre os cuidados com os irmãos menores e a administração familiar deixada pelo
patriarca ao falecer, optou por envia-lo aos cuidados de um tio, irmão da sua mãe, chamado
Elias de Souza Martins, que ajudou a cria-lo durante o período em que seu pai faleceu,
segundo o próprio Coelho Rodrigues relatou no Jornal do Comércio anos mais tarde, em
1890.
34
RODRIGUES, Antônio Coelho. Conferência da Glória. Jornal do Comércio, Rio de Janeiro, 10 de novembro
de 1883. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=9166.
35
CASTELLO BRANCO, Francisco de Assis Couto. Antônio Coelho Rodrigues: Vida e Obra. TERESINA:
UFPI, 1987.
25
Ainda no mesmo ano, Coelho Rodrigues acabou sendo mandado aos cuidados
pedagógicos do seu primo, o padre Joaquim Damasceno Rodrigues. Este era filho de Joaquina
Lindalva, irmã do pai de Coelho Rodrigues, o capitão Manuel Rodrigues. Foi estudando com
o seu primo Joaquim que Coelho Rodrigues passou parte da sua infância e juventude,
adquirindo conhecimentos importantes para uma formação primária e secundária.36 O padre
foi considerado um dos grandes educadores do Piauí na sua época e possuía uma instituição
de ensino na vila de Paulista, na fazenda do seu bisavô Valério.37
Quanto ao fato de que ainda muito dependente dos cuidados maternos Coelho
Rodrigues acabou sendo enviado para outra região, certamente foi algo difícil para o pequeno.
Não devemos pensar o acontecimento como total desvinculação da criança com a família, mas
conscientes da relativa distância regional, média de aproximadamente uns 150 quilômetros
entre Picos e Paulistana, e que nem sempre havia um encontro com a sua mãe, o peso da
separação foi grande.
Afastado dos cuidados e do carinho da sua mãe, a maior parte da sua infância
aconteceu em ambiente fora do lar doméstico. O pequeno Coelho Rodrigues teve que
acostumar-se com a vivência em outra região. Isso acabou contribuindo para o seu isolamento
em si mesmo, fator que posteriormente ele próprio apontou ser responsável pela fragilidade da
sua saúde. A vivência em outra região da província acabou acarretando problemas onde, já em
Pernambuco, afirmava que há cerca de vinte anos, ou seja, quando criança, vinha debilitada a
sua saúde.38
Coelho Rodrigues não foi um sujeito robusto na infância, nem mesmo na sua fase
adulta. Era de estatura baixa, um homem magro. Pelo que percebemos mediante
considerações no decorrer da sua vida, partindo da análise das fontes, sempre enfrentou
problemas com a sua saúde. Não que os seus problemas sejam resultantes exclusivamente da
sua separação quando criança do seio materno, mas é possível que isso possa ter contribuído
de alguma forma no seu processo de desenvolvimento. Apesar desse fator, supomos que um
dos reais motivos para a sua saúde frágil anos mais tarde foram acarretados por problemas
36
CASTELLO BRANCO, Francisco de Assis Couto. Antônio Coelho Rodrigues: Vida e Obra. TERESINA:
UFPI, 1987.
37
O padre Joaquim Damasceno Rodrigues, como muitos dos parentes de Coelho Rodrigues, descendentes de
Valério, foi uma personalidade de grandes posses e influente dentro dos espaços de poder político e econômico
na província piauiense. Mediante diálogo com Carvalho, esta aponta que o padre Joaquim, para além da sua
posição de pároco, foi o homem mais ilustre e poderoso da pequena vila de Jaicós no seu tempo. Para mais
informações, ver: CARVALHO, Mônica Valéria de. Senhores de gado: Relações de mandonismo no sertão do
Piauí, 1874-1888. Dissertação (Mestrado em história) – Universidade Federal do Piauí, Campus Teresina – PI, p.
110, 2015.
38
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
26
relacionados ao fumo. Coelho Rodrigues foi fumante durante muitos anos e somente parou,
segundo o mesmo, quando foi recomendado por seu médico ao encontrar-se já em 1890 na
Europa, quando redigia o seu projeto de código civil.
Passada a dura fase de adaptação em outra localidade, foi na instituição do seu primo
que Coelho Rodrigues estudou diversas matérias que compuseram o seu currículo em início
da jovem carreira educativa. Português, aritmética, francês, latim e filosofia foram as
principais disciplinas que cursou até a sua juventude, aos seus 13 anos de idade, no ano de
1859. Por ser considerado aplicado com essa idade, sua mãe foi aconselhada a mandá-lo à
cidade do Recife, no Pernambuco, para realizar os preparatórios de ingresso na Faculdade de
Direto daquela região.39
39
AGUIAR, Antônio Chrysippo. Coelho Rodrigues e a ordem de silêncio. 1. ed. Teresina: 2006.
40
ARAÚJO, Johny Santana de. Antônio Coelho Rodrigues: entre “o silêncio, a paciência e o tempo”. IN:
NASCIMENTO, F. A. S.; TAMANINI, P. A. História Culturas e Subjetividades: Abordagens e perspectivas.
Teresina: EDUFPI, 2015. p. 108 – 131.
41
QUEIROZ, Teresinha de Jesus Mesquita. Os literatos e a República: Clodoaldo Freitas, Higino Cunha e as
tiranias do tempo: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 1994.
27
Rio Branco, considerado dentro da historiografia o pai da diplomacia brasileira, vindo de uma
elite do Rio de Janeiro para estudar na Faculdade do Recife.42
A instituição do Recife ganhou notoriedade pela formação de sujeitos que exerceram
papeis fundamentais dentro da história política, intelectual, artística e filosófica do Brasil.
Foram contemporâneos de Coelho Rodrigues nos espaços de exercício do poder
administrativo, também formados nessa instituição, além do futuro Barão do Rio Branco,
Joaquim Nabuco, considerado um dos principais líderes abolicionistas da escravidão no
Brasil; Tobias Barreto, um dos principais propagadores da filosofia positivista, foi amigo de
Coelho Rodrigues, apesar de que este possuía um pensamento diverso do positivismo. Além
de outros, como Epitácio Lindolfo da Silva Pessoa, Nilo Procópio Peçanha, Clóvis Beviláqua,
Ruy Barbosa de Oliveira, Antônio Frederico de Castro Alves.
Interessante notar que dos mais de 55 alunos que iniciaram o curso de formação em
Direito com Coelho Rodrigues, apenas dois da sua turma advinham do Piauí além dele. Eram
eles: Eliseu de Souza Martins, seu primo, e Segismundo Antônio Gonçalves.43 A esmagadora
maioria dos formandos da sua turma vinha das províncias mais desenvolvidas, como do
próprio Pernambuco e Rio de Janeiro, por exemplo. Isso é um indicativo que contribui para
justificar o fato de que no Piauí da época poucas eram as elites que tinham condição de
proporcionar aos filhos base para uma formação acadêmica, quando comparado com o
número de educandos pelas maiores províncias.
Podemos afirmar que Coelho Rodrigues foi um privilegiado, por advir da elite
piauiense da sua época, mas que também se fez pela genialidade. Não foi atoa que ao término
da sua formatura, dos 55 alunos que estavam concluindo o curso, apenas ele e outro colega,
Raymundo Honório da Silva, da província do Pernambuco, tenham obtido resultados exímios
em todas as matérias da formação. Isso é reflexo do afinco que Coelho Rodrigues tinha pelo
seu curso, e da importância devida à sua formação acadêmica. Por conta do seu desempenho,
além de uma excelente oratória, reconhecida pelos professores e colegas, recebeu merecida
honraria por parte destes sendo aclamado orador da turma, segundo nos informa Castello
Branco.44
A sua formatura aconteceu no ano de 1866, onde recebeu o título de Bacharel em
Direito com seus 20 anos de idade. Na época era comum que os jovens chegassem cedo à vida
42
O Barão do Rio Branco em linhas gerais foi diplomata, historiador, político e jornalista brasileiro. Para mais
informações, ver: VIANA FILHO, Luís. A vida do Barão do Rio Branco. São Paulo: Editora UNESP, 2008.
43
CASTELLO BRANCO, Francisco de Assis Couto. Antônio Coelho Rodrigues: Vida e Obra. TERESINA:
UFPI, 1987.
44
Idem.
28
adulta, se comparado com os padrões dos dias atuais. Coelho Rodrigues foi um dos mais
novos a se formar da sua turma. Dos colegas citados o mais velho foi o seu primo, Eliseu, que
ingressou na faculdade com a idade que Coelho Rodrigues saia formado dela, 20 anos.
Paranhos Júnior e Segismundo tinham idades próximas à de Coelho Rodrigues, ambos
praticamente um ano mais velhos que este.45
Segundo João Horácio, um contemporâneo de Coelho Rodrigues do tempo da
Faculdade, que escreveu sobre ele no Jornal do Comércio anos mais tarde, em 1890, este era
bastante reservado. Seu relato aponta que tímido, Coelho Rodrigues preferia se relacionar na
privacidade. Não tinha apreço por festas e badalações, segundo seu contemporâneo dos
tempos de faculdade. Pelo que afirmava Horácio, este não se recordava de ter visto Coelho
Rodrigues nos teatros, em bailes, “nem que houvesse dirigido um madrigal a alguma dama
galante”.46
Coelho Rodrigues achava melhor ficar no seu momento com os livros, estudando as
matérias do curso de direito da época da faculdade, e também aquelas discussões do seu
interesse pessoal, mediante relatado. Era daqueles estudantes que amavam mais aos livros do
que até mesmo seus próprios colegas de turma, segundo Horácio. Este afirmou que não era de
surpreender que em determinados momentos ele (Coelho Rodrigues) deixasse a sua república
de estudantes para se alojar em uma “cella do convento de Santo Antônio, no Recife, onde era
mais observador da regra da entrada pontual à noite do que os próprios religiosos”.47
Isso nos leva a pensar que para além de ser reservado quanto aos estudos, Coelho
Rodrigues poderia ter sido uma pessoa metódica e prática. Mais do que os clérigos, conforme
nos informou Horácio, ele estava atento às regras. Regras essas que eram ampliadas até
mesmo às suas relações com as mulheres, segundo o mesmo Horácio. Mediante relato deste,
quando soube que Coelho Rodrigues havia se casado, por conhecê-lo, já imaginou logo “que
elle não foi levado pelo attractivo de um primeiro romance, mas pela seducção que tem para
um professor de direito civil os actos e contratos”.48
Horácio enfatizou essas características como marcantes de Coelho Rodrigues. Este foi
representado pelo seu contemporâneo como uma pessoa de timidez visível quanto aos
relacionamentos, homem reservado e de muito apreço pelos livros. Tais determinações então
45
Para mais informações a respeito dos formandos em direito da Faculdade do Recife à época, ver: MARTINS,
Henrique. Lista geral dos bacharéis e doutores que tem obtido o respectivo grau na Faculdade de Direito do
Recife, 1828-1931. Recife: Diário da Manhã, 1931.
46
HORÁCIO, João. Cartas do Rio. Jornal do Comércio, Rio de Janeiro, 17 de julho de 1890. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=1449.
47
Idem.
48
Idem.
29
49
Esse repúdio pessoal por jogos e apostas pode ser percebido em diversas falas de Coelho Rodrigues. No seu
próprio projeto de código civil ele destinou uma pequena parte para estabelecer o que seriam meios de controle
para o que considerava um mal da sociedade brasileira. Ver: RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do
Código Civil Brazileiro precedido de um projecto de lei preliminar. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1893.
30
Assim que Coelho Rodrigues concluiu a sua formação e com diploma em mãos,
regressou ao seu lugar de origem. Foi um período em que começou exercer a profissão para a
qual se preparou enquanto bacharel em direito. O mesmo passou a atuar como defensor
público, exercendo a profissão de advogado no Piauí. Muitas são as publicações nos jornais
piauienses da época, sobretudo no periódico O Piauhy divulgando o escritório de advocacia
de Coelho Rodrigues, oferecendo seus serviços de advogado, tanto criminal como quanto às
questões civis.50
Segundo relata Chaves, em um dos julgamentos públicos em que participou na capital
do Piauí, Teresina, no ano de 1866, pouco tempo após seu retorno do Recife, Coelho
Rodrigues foi observado pelo chefe do Partido Conservador da região à época, Simplício de
Souza Mendes, que teria destacado a sua genialidade.51 Simplício Mendes foi um dos
representantes mais respeitados da política conservadora no Piauí. Formado em medicina na
Faculdade da Bahia no ano de 1843, assumiu por quatro vezes o cargo de presidente da
província piauiense nas décadas de 1850 e 1860.
50
ANNUNCIOS. Jornal O Piauhy, Teresina, 10 de março de 1869. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=217204&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=1
7.
51
CHAVES, Joaquim. Obra completa. Teresina: FCMC, 1998.
31
52
QUEIROZ, Teresinha de Jesus Mesquita. Os literatos e a República: Clodoaldo Freitas, Higino Cunha e as
tiranias do tempo: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 1994.
32
53
ARAÚJO, Johny Santana de. Antônio Coelho Rodrigues: entre “o silêncio, a paciência e o tempo”. IN:
NASCIMENTO, F. A. S.; TAMANINI, P. A. História Culturas e Subjetividades: Abordagens e perspectivas.
Teresina: EDUFPI, 2015. p. 108 – 131.
54
RODRIGUES, Antônio Coelho. Câmara dos Deputados. Jornal O Piauhy. Teresina, 20 de agosto de 1869.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=217204&pasta=ano%20187&pesq=%22Coelho%20Rodrig
ues%22&pagfis=89.
55
“Voluntários da pátria” foi o termo adotado para designar os recrutas piauienses enviados para combater na
guerra contra o Paraguai. ARAÚJO, Johny Santana de. Bravos do Piauí! Orgulhai-vos... A propaganda nos
jornais piauienses e a mobilização para a guerra do Paraguai. 2. Ed. Teresina: EDUFPI, 2015.
33
Paranaguá, que da capital do Brasil exercia grande influência sobre o Piauí por um longo
período durante a década de 1860.56
Coelho Rodrigues exerceu certa militância ao criticar a administração provincial e
questionar a pouca visibilidade dos órgãos públicos para com a província nesse período de
crise ocasionada pela guerra, generalizada pelas frequentes secas que castigavam a população.
Em vários dos seus discursos, tanto da época dos acontecimentos como posteriormente são
acidas as denúncias que fez do que considerava uma tirania em voga na sua província por
conta dos supostos desmandos administrativos e do domínio liberal-progressista. Para além da
militância de Coelho Rodrigues sobre o governo da província, as críticas foram motivadas,
sobretudo pela adversidade política na época em que o Partido Conservador encontrava-se
derrotado, e os liberais dominavam os postos de mando.
Na época em que o jovem Coelho Rodrigues atuou no meio jornalístico
constantemente foi criticado pelas posturas que assumia diante de políticos adversários,
sobretudo com relação aos partidários do Marquês de Paranaguá. Não são poucas as
referências feitas ao mesmo nos anos finais da década de 1860 pelo Jornal Liberal A
Imprensa. Isso é determinante do quanto Coelho Rodrigues incomodava os adversários, a
ponto de sempre ter espaço no Jornal para considerações a seu respeito.
Sua jovem entrada no meio político se deu no ano de 1869, deixando então a
administração do Jornal O Piauhy. Nessa época concorreu à eleição para Deputado Provincial
pelo Piauí, e conseguiu manter o primeiro lugar na disputa com um total de 591 votos. O
segundo e terceiro lugares foram, respectivamente, ocupados por Aureliano Ferreira de
Carvalho, com 281 votos, e Antônio Francisco de Salles, com um total de 275 votos.57
Segundo Castello Branco, Coelho Rodrigues por um tempo resistiu a atuar na política,
porém, por incentivo dos seus familiares, amigos e partidários, acabou concorrendo às
eleições. O mesmo já era considerado uma personalidade de grande capacidade de
representação do Piauí. Tanto os mais novos como os mais velhos o tinham como um líder na
província.58 Reflexo disso foi que na época recebeu mais que o dobro do número de votos em
relação ao segundo colocado na disputa pelo cargo de deputado, não desconsiderando
56
RODRIGUES, Antônio Coelho. Câmara dos Deputados. Jornal O Piauhy. Teresina, 20 de agosto de 1869.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=217204&pasta=ano%20187&pesq=%22Coelho%20Rodrig
ues%22&pagfis=89.
57
PIAUHY. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 03 de maio de 1869. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=364568_05&pasta=ano%20186&pesq=%22Coelho%20Ro
drigues%22&pagfis=15425.
58
CASTELLO BRANCO, Francisco de Assis Couto. Antônio Coelho Rodrigues: Vida e Obra. TERESINA:
UFPI, 1987.
34
61
HORÁCIO, João. Cartas do Rio. Jornal do Comércio, Rio de Janeiro, 17 de julho de 1890. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=1449.
62
Idem.
63
DISCURSOS PRONUNCIADOS NA SESSÃO DE 09 DE AGOSTO DE 1870. Jornal do Comércio, Rio de
Janeiro, 28 de agosto de 1870. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=1190.
64
Idem.
36
empresariais por parte do poder público. Coelho Rodrigues criticava o fato de esses direitos
privilegiarem determinados indivíduos ou empresas em detrimento do bem geral, ou de
empresas menores. Para o mesmo o correto seria que fossem votadas medidas no sentido de
tornar esses privilégios isolados em uma lei que integrasse a sociedade de maneira comum.65
Nesse período em que esteve atuante como deputado geral com perfil militante, no ano
de 1870, Coelho Rodrigues muitas vezes esteve ausente nas sessões na câmara dos deputados.
Foi um período em que constantemente se deslocou do Rio de Janeiro para o Recife, em
Pernambuco. Isso se deu pelo fato de que o mesmo estava em processo de doutoramento pela
mesma instituição em que a pouco tempo havia concluído o curso de Direito. Assim que
acessou o cenário nacional como deputado pelo Piauí não demorou em aprofundar os seus
conhecimentos, por isso iniciou logo seu ingresso no doutorado.
A defesa de tese de Coelho Rodrigues aconteceu nos dias 03 e 04 de maio de 1870.66
A colação de grau foi marcada para o dia 07 do mesmo mês. No Diário de Pernambuco, um
dos principais periódicos do Recife, em Pernambuco à época, foi publicado o seu discurso
congrulatório após se tornar aquele que foi considerado o primeiro doutor de borla e capelo do
Brasil, tendo acabado de completar os seus 24 anos de idade no mês de abril.
No final do ano de 1870, Coelho Rodrigues fez uma viagem ao Piauí. Os jornais,
sobretudo o Jornal O Piauhy, fizeram a publicação da sua chegada.67 Mediante o que foi
relatado na publicação do Jornal citado, seus amigos quiseram lhe propor um baile de
recepção, acontecimento que não foi realizado no dia pretendido pelo fato de que Coelho
Rodrigues, ou Dr. Coelho, como era conhecido no Piauí principalmente pelos seus
correligionários, teria sido acometido com uma grave moléstia que o deixou impossibilitado
de participar do evento. Este acabou sendo adiado até a sua recuperação.68
Depois de alguns dias acamado, foi relatado no Jornal do Comércio que Coelho
Rodrigues havia se reestabelecido e com isso pôde então reunir-se com os amigos e
correligionários na festa preparada para a sua chegada. Segundo consta, houve uma
65
DISCURSOS PRONUNCIADOS NA SESSÃO DE 05 DE JULHO DE 1871. Jornal do Comércio. Rio de
Janeiro, 13 de julho de 1871. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=2867.
66
REVISTA DIÁRIA. Diário do Pernambuco. Recife, 28 de abril de 1870. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=029033_05&pasta=ano%20187&pesq=%22Coelho%20Ro
drigues%22&pagfis=745.
67
EMANCIPAÇÃO. Jornal O Piauhy. Teresina, 31 de outubro de 1870. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=217204&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=2
05.
68
INTERIOR. Jornal do Commércio. Rio de Janeiro, 15 de dezembro de 1870. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=1756.
37
arrecadação monetária por parte dos amigos do Dr. Coelho para a realização da festividade.
Parte do produto da arrecadação que havia sido feita foi requisitada por Coelho Rodrigues,
que pediu aos colegas que aplicassem a determinada quantia na libertação de seis a oito
crianças escravizadas do sexo feminino daquela localidade.69
Ainda segundo os relatores do Jornal, visto o aparente interesse de Coelho Rodrigues
em realizar o feito, seus colegas teriam o convidado para ser representante de uma sociedade
permanente em prol da libertação de escravos na província, a Associação Emancipadora
Piauiense. Mediante o que foi relatado pelos envolvidos ao Dr. Coelho, como proferido no
Jornal do Comércio, houve uma votação na sessão da assembleia legislativa provincial que
aprovou 5:000$ (Cinco contos de réis) para a finalidade da fundação desta sociedade. Constou
no relato que Coelho Rodrigues havia concordado em secundar os esforços da devida
associação, sendo ela criada, abaixo daquilo que a lei facultasse.70
Sobretudo a partir da segunda metade do século XIX no Brasil de maneira geral houve
grande aspiração pelo fim do regime escravo, gerando diversos movimentos associativos
criados nas províncias com essa finalidade, segundo informa Alonso.71 Pelo que se percebe
nas páginas do relato no Jornal do Comércio havia um interesse geral na capital do Piauí no
sentido de promover a fundação da Associação Emancipadora. Nesse sentido, resolveram
convidar por meio dos jornais além dos partidários cientes do que se planejava pela libertação
dos escravos, “a todos que desejassem auxiliar tão patriótico intento, para comparecerem no
dia 1° de novembro no paço da assembleia provincial, a fim de proceder-se alli à eleição dos
directores da Associação Emancipadora Piauhyense”.72
Como Coelho Rodrigues era considerado um dos principais representantes políticos
conservadores no Piauí nesse momento, foi um dos mais cotados para ser diretor da
associação e assinar com seu nome os convites que deveriam ser feitos pelos jornais aos
piauienses. A princípio teria havido uma recusa do Dr. Coelho em aceitar esse encargo,
segundo consta nos jornais. A sua justificativa foi de que sendo homem de ideias muito
definidas, e membro proeminente do seu partido, o Partido Conservador, era por isso o mais
suspeito perante os adversários de tomar a dianteira nesse convite. Posteriormente, por
69
INTERIOR. Jornal do Commércio. Rio de Janeiro, 15 de dezembro de 1870. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=1756.
70
Idem.
71
Para mais informações sobre os movimentos associativos em prol da abolição, ver: ALONSO, Ângela.
Associativismo avant la lettre – as sociedades pela abolição da escravidão no Brasil oitocentista. Sociologias,
Porto Alegre, ano 13, n° 28, set./dez. 2011, p. 166-199. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/soc/a/M5yHngkjXzwdQ6GFtfTtngN/?lang=pt&format=pdf. Acesso em: 02/jun./2021.
72
INTERIOR. op. cit.
38
insistência de Simplício Mendes, a pedido de Manoel José Espinola Jr., Coelho Rodrigues
teria assumido essa tarefa, oficiando um documento que o tornara principal idealizador do
movimento em prol da libertação dos escravos no Piauí.
Em pouco tempo de vigência da sociedade o Jornal do Comércio informou em
dezembro de 1870 que os números de escravos libertos no período foram significativos. Isso
fica perceptível em uma publicação onde foram apontados consideráveis números de escravos
alforriados por senhores na província piauiense:
Nesses últimos tempos foram libertados 41 escravos, a saber: por D. Rosaura
Moriz Barreto, de Marvão, 13; Pelo Sr. Francisco Xavier de Santo Euzébio,
de União, 14; pelo tenente-coronel José Amaro Machado, da Batalha, 8; pelo
cônego Mamede A. de Lima, 3; pelo major A. J. de Araújo Bacellar, 1; pelo
coronel Firmino Alves dos Santos, 1; pelo Dr. Francisco M. da Fonseca, 1;73
Apesar dessa iniciativa, Coelho Rodrigues não era partidário ao fim da escravidão
como uma medida imediata que deveria ser praticada oficialmente em todo o Império. Seu
feito em prol da libertação de escravos na província do Piauí não deve ser simplificado a
ponto de pensarmos que o mesmo foi um abolicionista, por exemplo. Sua maneira de pensar a
escravidão e o fim deste sistema não acompanhou a lógica do abolicionismo. Pelo contrário,
Coelho Rodrigues foi completamente adverso da maneira como os abolicionistas pensavam o
fim do regime. Mais adiante discutiremos esse ponto, quando na década de 1880 Coelho
Rodrigues, em discursos seus, fez criticas à maneira como a questão escravista estava sendo
tratada por aqueles que pretendiam o fim imediato do sistema.
Por hora pensemos a sua caminhada inicial dentro da política, percorrendo os espaços
do Rio de Janeiro, Pernambuco e Piauí, e os percalços da sua vida dentro desses espaços. No
ano de 1871, Coelho Rodrigues ainda na condição de Deputado Geral pelo Piauí, pretendeu
realizar no Recife o concurso que esteve aberto para a cadeira de lente substituto da Faculdade
de Direito daquela cidade, a mesma em que se formou, e a pouco se doutorou. Coelho
Rodrigues já figurava como um intelectual de sua época e deu mostras da sua capacidade
quando concorreu por uma das cadeiras mais disputadas na instrução, de professor do ensino
superior no Império.
O Jornal Diário de Pernambuco anunciou que em 07 de fevereiro de 1871, a
congregação dos lentes da Faculdade de Direito do Recife julgaram habilitados para
prestarem concurso para ocupar a cadeira de lente substituto, Antônio Coelho Rodrigues, José
73
INTERIOR. Jornal do Commércio. Rio de Janeiro, 15 de dezembro de 1870. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=1756.
39
74
FACULDADE DE DIREITO. Diário de Pernambuco. Recife, 11 de fevereiro de 1871. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=029033_05&pasta=ano%20187&pesq=%22Coelho%20Ro
drigues%22&pagfis=2636.
75
REVISTA DIÁRIA. Diário de Pernambuco. Recife, 31 de março de 1871. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=029033_05&pasta=ano%20187&pesq=%22Coelho%20Ro
drigues%22&pagfis=2900.
76
Idem.
40
como deputado. Neste cargo, permaneceu até o ano de 1872. Esse é um período instável
dentro da política nacional a ponto da câmara ter sido dissolvida por meio de decreto imperial
baseado no poder moderador. Com as atividades políticas suspensas na capital do Brasil, foi
um momento em que Coelho Rodrigues embarcou no vapor Paraná com destino ao Recife,
para lá permanecer boa parte da década de 1870.
Durante essa década em que esteve mais presente no Recife, Coelho Rodrigues acabou
conhecendo Alcina Caldas da Silveira Lins, mulher com quem casou-se em 09 de janeiro de
1873, vivendo com a mesma por toda sua vida desde então. Alcina Lins Coelho Rodrigues,
como passou a se chamar após o casamento, advinha de uma família de nobres fazendeiros da
província do Pernambuco. Segundo informações do Jornal do Comércio, a mesma era neta de
Henrique Marques Lins, o Visconde de Utinga, pelo lado paterno e bisneta por parte da sua
mãe de dona Francisca Barretto, irmã de Francisco Pais Barretto, o Marquês do Recife.77
Ambos os lados da família de Alcina Lins era formada por influentes políticos e grandes
senhores de engenho da província.
Do casamento entre Coelho Rodrigues e Alcina Lins foram gerados 12 filhos, dentre
os quais houve advogado, engenheiro, tenente da armada, dentre outras funções, segundo
informação do Jornal do Comércio.78 Os filhos de Antônio Coelho Rodrigues foram: Manoel
Coelho Rodrigues, Anita Coelho Rodrigues, Ester Coelho Rodrigues, Elias Coelho Rodrigues
(acabou falecendo quando ainda era criança), Valério Coelho Rodrigues, Rubens Coelho
Rodrigues, Carlos Coelho Rodrigues, Zelma Coelho Rodrigues, Maria José Coelho
Rodrigues, Paulo Coelho Rodrigues, Helvécio Coelho Rodrigues e Elias Coelho Rodrigues (o
segundo a quem foi atribuído o nome).79
Apesar de ter estabelecido laços e constituído família no Recife, Coelho Rodrigues
não deixou de lado a política piauiense. No final do ano de 1872, apareceu concorrendo
novamente às eleições para o cargo de deputado pela sua província natal. Nessas eleições o
mesmo acabou perdendo força diante da ascensão liberal ao poder. A virada dos ministérios
77
GAZETILHA: CONSELHEIRO COELHO RODRIGUES. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 02 de abril de
1912. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_10&Pesq=%22codigo%20civil%22&pagfis=993
7.
78
Enquanto anunciava a morte de Antônio Coelho Rodrigues em 1912, o Jornal do Comércio apresentava as
funções que os filhos homens do mesmo desenvolviam até aquele momento. Segundo apresentado, Manoel
Coelho Rodrigues era advogado nos auditórios do Rio de Janeiro; Rubens Coelho Rodrigues, engenheiro; Carlos
Coelho Rodrigues, 1° Tenente da Armada; Helvécio Coelho Rodrigues, aspirante da armada; Valério Coelho
Rodrigues, funcionário da Estatística Comercial; Paulo Coelho Rodrigues, empregado no comércio. Para mais
informações, ver: Idem.
79
CARVALHO, Abimael Clementino Ferreira de. Família Coelho Rodrigues: Passado e Presente. Fortaleza:
Impr. Oficial do Ceará. 1987.
41
de Conservador para Liberal acabou prejudicando a sua ascensão política para o mandato que
se iniciava. Coelho Rodrigues ficou em quarto lugar na disputa com 104 votos. Os três mais
bem votados na eleição e, portanto, eleitos foram: Manoel Pinheiro de Miranda Osório com
186 votos; Padre Tomás de Morais Rêgo com 178 votos; e Agesiláo Pereira da Silva com 147
votos.80 Mesmo sem força política, onde a derrota era certa, Coelho Rodrigues conseguiu
angariar uma quantidade significativa de votos.
Acabando por perder essa eleição, durante determinado período, de 1873 em diante,
até o ano de 1876, Coelho Rodrigues esteve mais dedicado a viver no Recife atuando
exclusivamente como professor. É um período pacato para o mesmo no âmbito da política
nacional. No Jornal do Comércio são quase nulas as considerações a seu respeito dentro desse
recorte. As maiores movimentações da sua atuação no Recife como lente foram colhidas
principalmente no Diário de Pernambuco, pois o Jornal em questão esteve sempre publicando
notas a respeito de Coelho Rodrigues atuando como professor na Faculdade de Direito.
Nessa instituição, Coelho Rodrigues vai ser professor de Direito Romano, Direito
Internacional, Direito Natural e Direito Civil, segundo Aguiar.81 No período em que esteve
como professor na Faculdade de Direito do Recife, especificamente em 1875, aconteceu uma
das discussões filosóficas mais interessantes envolvendo o professor Coelho Rodrigues. Por
ser uma personalidade de convicções fortes, desde o berço familiar o mesmo carregava
consigo a filosofia cristã, e diferentemente da adesão em massa de muitos dos seus colegas às
ideias materialistas, racionalistas e positivistas em expansão na época, Coelho Rodrigues se
manteve crente das suas concepções religiosas. Segundo Santana:
As simpatias filosóficas de Coelho Rodrigues são determinantes para
compreender a fratura entre ele e as tendências da moda de então, lhe são
antipáticas o positivismo, o determinismo e o cientificismo. As perspectivas
citadas vinham se firmando cada vez mais na academia, e nos círculos
intelectuais de então. Coelho Rodrigues, por outro lado, possuía crenças
religiosas profundamente enraizadas, que o empurrava para outras
concepções contrárias ao cientificismo.82
A divergência de pensamento foi um fator que contribuiu para o embate ocorrido na
Faculdade do Recife. No referido episódio, Coelho Rodrigues esteve participando, juntamente
com o também professor José Joaquim Tavares Belfort, da banca de defesa da tese de
80
ELEIÇÕES NO PIAUHY. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 31 de dezembro de 1872. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=6258.
81
AGUIAR, Antônio Chrysippo. Coelho Rodrigues e a ordem de silêncio. 1. ed. Teresina: 2006.
82
ARAÚJO, Johny Santana de. Antônio Coelho Rodrigues: entre “o silêncio, a paciência e o tempo”. IN:
NASCIMENTO, F. A. S.; TAMANINI, P. A. História Culturas e Subjetividades: Abordagens e perspectivas.
Teresina: EDUFPI, 2015, p. 108 – 131, pp. 123-124.
42
doutorado de Sílvio Vasconcelos da Silveira Ramos Romero.83 Este era um dos principais
propagadores da filosofia positivista e evolucionista na referida instituição, juntamente com
Tobias Barreto, além de Clóvis Beviláqua, formando a Escola do Recife com membros dessa
geração, sobretudo a partir da década de 1870.84 Na discussão, Silvio Romero criticou a
metafísica, apontando que a mesma já não existia mais, e nisso afirmou a predominância da
lógica, do progresso e da civilização, conceitos caros à filosofia positiva.85
No Jornal Diário de Pernambuco foi publicado o que teria se sucedido na defesa de
tese de Silvio Romero. Segundo consta nas suas páginas, no correr da discussão onde os
professores questionaram o doutorando quanto ao conteúdo do seu trabalho, este muitas vezes
deixou de responder. Em duas ocasiões Romero teria afirmado aos professores que a sua tese
era incompleta. Mediante o relato, assim que Coelho Rodrigues começou a argumentar
acabou colocando Romero em uma situação em que o mesmo, após diversas tentativas, não
conseguia sair.86
Em meio a retrucadas de uns e de outros, como sinal de protesto, Sílvio Romero teria
recolhido os livros e dito a Coelho Rodrigues “que fosse estudar para poder consigo
argumentar”87 e teria saído da sala chamando aos seus mestres de “canalhas ignorantes”. No
final, a congregação dos professores abriu processo contra o mesmo para que não obtivesse
aprovação.88 Foi enviada uma solicitação pela congregação dos lentes responsáveis pela
avaliação de Silvio Romero à presidência da província e ao governo para resolver se deveria o
examinando ser considerado reprovado.
Na Memória Histórica da Faculdade do Recife escrita por Coelho Rodrigues em 1876
acerca dos principais acontecimentos do ano letivo de 1875, o mesmo relembrou o ocorrido e
a lentidão do processo aberto contra Silvio Romero. Coelho Rodrigues apontou que o
ocorrido não deveria ficar impune como acabou se sucedendo. Afirmando não saber o motivo
83
DEFEZAS DE THESES. Diário de Pernambuco. Recife, 15 de março de 1875. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=029033_05&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=12364.
84
A Escola do Recife foi um movimento de difusão de um pensamento social calcado em concepções teóricas
que juntavam o positivismo com o evolucionismo determinista do darwinismo social e que tinha na questão da
raça e da miscigenação o foco de suas formulações doutrinárias, com pretensão de promover os melhoramentos
da nação partindo da mestiçagem como produto final da homogeneidade nacional. Para mais informações ver
em: SCHWARCZ, Lilia Moritz. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil —
1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.
85
Os propagadores da filosofia positivista na época, fortemente marcados pelo radicalismo científico, faziam
críticas à metafísica, à tradição supersticiosa e ao clericalismo conservador católico. Para mais informações ver
em: Idem.
86
DEFEZAS DE THESES, op. cit.
87
Idem.
88
AGUIAR, Antônio Chrysippo. Coelho Rodrigues e a ordem de silêncio. 1. ed. Teresina: 2006.
43
de o processo ter dormido longos meses, lamentou que a falta de provas tivesse sido utilizada
como justificativa para a não obrigatoriedade do réu se pronunciar pelo acontecido.89
Coelho Rodrigues na sua fala teria acrescentado com certa ironia que não soube como
tal justificativa foi possível. Isso pelo fato de que o comportamento de Romero apresentado
por Coelho Rodrigues como “descortês” foi presenciado por mais de cem testemunhas que
assistiam à ocasião solene. No fim das suas considerações, Coelho Rodrigues apelou para que
o novo ministro do Império conduzisse o caso com mais responsabilidade para que situações
como a ocorrida não tornassem a se repetir.90
Mesmo atuando como professor na Faculdade do Recife, no final do ano de 1876
Coelho Rodrigues concorreu às eleições para o cargo de Deputado Geral pelo Piauí. Esse foi
um período em que os conservadores estiveram divididos em facções. Considerados
dissidentes do Partido Conservador que concorreram às eleições, foram eles: Agesiláo Pereira
e Cônego Thomaz. Os dois membros oficiais lançados pelo Partido Conservador de centro
conseguiram se firmar nos primeiros lugares da disputa. Coelho Rodrigues com um total de
153 votos assumiu a primeira posição. O segundo lugar foi ocupado pelo seu correligionário,
Pires Ferreira com um total de 150 votos. Pelo Partido Liberal disputaram Franklin Dória e
Basson.91
Os anos posteriores da posse de Coelho Rodrigues em 1877 são de ampla participação
do mesmo em debates na câmara. Dentre um dos principais discursos proferidos, teria
criticado o fato de o governo imperial acabar destinando recursos para determinadas
províncias no norte que estavam enfrentando a seca desse período, enquanto outras não foram
contempladas com esses repasses. No Piauí, Coelho Rodrigues teria relatado que as
dificuldades quanto ao enfrentamento da seca foram enormes e existiu pouca ação do governo
ao olhar por aquela província.92
Em uma das sessões denunciou o estado de penúria por qual passavam alguns
municípios do Piauí. Não somente o Piauí, em linhas gerais o nordeste brasileiro enfrentava a
maior seca da sua história, por volta de 1876 a 1879. Secreto argumentou sobre o estado
89
RODRIGUES, Antônio Coelho. Memória Histórica da Faculdade de Direito do Recife. Rio de Janeiro:
Typografia Nacional, 1876.
90
Idem.
91
NOTÍCIAS DO NORTE DO IMPÉRIO. Diário de Pernambuco. Recife, 14 de dezembro de 1876. Disponível
em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=029033_05&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=16559.
92
CÂMARA DOS SRS. DEPUTADOS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 17 de maio de 1877. Disponível
em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=15886.
44
desolador pelo qual passava o nordeste e, sobretudo, a província do Ceará, em meio à seca.
Segundo a mesma, o número de mortos ocasionado pela fome e pela varíola foram
assustadores. Muitos retirantes saíam das zonas afetadas na tentativa de fugir da miséria.
Foram reclamadas pelos presidentes das províncias mais afetadas como Ceará, Rio Grande do
Norte, e pelo próprio Piauí, ajuda financeira ao governo imperial na tentativa de amenizar os
efeitos da seca.93
Segundo consta nas páginas do Jornal do Comércio, Coelho Rodrigues, em sessão na
câmara, afirmou ter recebido constantemente cartas particulares do presidente da província e
do chefe de polícia do Piauí nesse período, pedindo que na distribuição do socorro por parte
do governo imperial a província piauiense fosse contemplada. As consequências da falta de
ajuda do governo central e a seca na região foram, por exemplo, a diminuição das despesas
por conta da falta de dinheiro nos cofres provinciais, isso gerou redução das forças policiais,
extinção de diversas cadeiras de instrução primária, dentre outros fatores.94 Além disso, a seca
ocasionou a morte de grande número de piauienses, sobretudo aqueles que não tinham como
se alimentar por falta de recursos.
Em outra discussão, no ano de 1877, Coelho Rodrigues teria defendido aquilo que já
havia feito antes, quanto aos direitos individuais como empecilho para o desenvolvimento
nacional e prejudicial ao bem comum. Uma crítica feita ao governo foi com relação aos
privilégios destinados a determinadas empresas e indústrias que dominavam o mercado de
certos bens. Segundo consta no relatório do Jornal do Comércio da sessão da câmara dos
deputados, Coelho Rodrigues teria considerado essa ação do governo bastante prejudicial para
outras empresas concorrentes, sobretudo empresas nacionais, que não conseguiam se
desenvolver perante as grandes detentoras internacionais dos privilégios governamentais.95
Coelho Rodrigues foi favorável a um projeto discutido por Fernando Osório, segundo
relatado na sessão da câmara no mesmo Jornal, significativo para exemplificar as
considerações do parágrafo anterior. No seu discurso, Osório teria defendido que o governo
imperial devesse investir para que empresas nacionais desenvolvessem no Brasil a produção
93
SECRETO, María Verónica. A seca de 1877-1879 no Império do Brasil: dos ensinamentos do senador Pompeu
aos de André Rebouças: trabalhadores e mercado. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, Rio de Janeiro, v.27,
n.1, jan.-mar. 2020, p.33-51.
94
CÂMARA DOS SRS. DEPUTADOS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 17 de maio de 1877. Disponível
em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=15886.
95
CÂMARA DOS SRS. DEPUTADOS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 18 de maio de 1877. Disponível
em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=15894.
45
de enxofre e salitre, já que o país era rico nessas matérias primas. Segundo o mesmo, essa
seria uma oportunidade para que a nação se limitasse à dependência estrangeira, no caso às
empresas privilegiadas pelo governo, e assim desenvolvesse a sua indústria e,
consequentemente, o seu mercado interno.96
Já no final do ano de 1877, Coelho Rodrigues faltou em algumas sessões na câmara. O
motivo maior foi o falecimento da sua mãe, Ana Joaquina, em Picos, no Piauí. Tanto o Jornal
do Comércio como o Diário de Pernambuco lamentaram a morte da mãe de Coelho
Rodrigues. Foi um período em que deixou as suas atividades no Rio, se deslocando ao Piauí
para prestar homenagens no leito de morte àquela que lhe deu a vida.97
Retomando às suas atividades nos anos posteriores, Coelho Rodrigues passou a ser
pouco referenciado dentro da política. Foi um período em que esteve mais atuante na
Faculdade do Recife. No dia 20 de agosto de 1878 foi publicado no Diário de Pernambuco a
sua nomeação a lente catedrático da Faculdade de Direito daquela cidade, tornando-se
membro efetivo da instituição. Coelho Rodrigues se efetivou como professor de Direito Civil,
passando inicialmente a ocupar a primeira cadeira do quarto ano de ensino.98
Como catedrático e residente no Recife, Coelho Rodrigues passou a se dedicar com
apreço ao aprofundamento dos seus conhecimentos no campo do direito, sobretudo direito
civil pátrio, conforme observado nas publicações do Diário de Pernambuco. Partindo da
principal fonte tida como base para a consolidação de uma legislação nacional efetiva, o
Direito Romano, matéria de que era profundo conhecedor, Coelho Rodrigues foi responsável
pela tradução das Institutas do Imperador Justiniano, do latim, língua que como poucos na
época dominava bem, segundo as referências nos jornais, para o português.
A tradução das Institutas lhe rendeu merecido reconhecimento por parte de
personalidades importantes, e o alçou ao conhecimento do governo como um dos principais
intelectuais a contribuir com seus esforços em torno do aprimoramento legislativo da nação,
como veremos adiante. O fato é que pouco tempo depois de concluir a tradução, no Diário de
Pernambuco foi publicado um artigo onde Antônio Joaquim Ribas parabenizou Coelho
96
DISCURSO PRONUNCIADO NA SESSÃO DE 19 DE JUNHO DE 1877. Jornal do Comércio. Rio de
Janeiro, 29 de junho de 1877. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=16203.
97
NITHEROHY. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 05 de outubro de 1877. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=16902.
98
TELEGRAMMAS. Diário de Pernambuco. Recife, 20 de agosto de 1878. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=029033_05&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=20576.
46
99
REVISTA DIÁRIA. Diário de Pernambuco. Recife, 12 de agosto de 1879. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=029033_05&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=20576.
100
PARTE OFICIAL. Diário de Pernambuco. Recife, 20 de agosto de 1879. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=029033_05&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=22993.
101
CONGRESSO AGRÍCOLA. Diário de Pernambuco. Recife, 14 de novembro de1878. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=029033_05&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=21159.
102
CONGRESSO AGRÍCOLA. Diário de Pernambuco. Recife, 07 de dezembro de 1878. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=029033_05&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=21326.
47
103
CONGRESSO AGRÍCOLA. Diário de Pernambuco. Recife, 08 de dezembro de 1878. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=029033_05&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=21334.
104
Acerca das teorias do embranquecimento, sobretudo a respeito das políticas que viam um processo de
miscigenação como aspecto negativo para a formação nacional, ver: MUNANGA, Kabengele. Rediscutindo a
mestiçagem no Brasil: Identidade mestiça versus identidade negra. Belo Horizonte: Autêntica, 2020. Ver
também: SCHWARCZ, Lilia Moritz. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil
— 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.
105
GAZETILHA. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 03 de outubro de 1880. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=1730.
48
composta por: Conselheiros Lafayette Rodrigues Pereira e Antônio Joaquim Ribas, Francisco
Justino Gonçalves de Andrade e Antônio Ferreira Vianna.106 Lembrando que Joaquim Ribas
foi um dos políticos que havia reconhecido o feito de Coelho Rodrigues pela tradução das
Institutas de Justiniano, algo que certamente pode ter contribuído para a sua nomeação como
membro da comissão revisora.
Essa foi uma época de intensa mobilização no sentido de proporcionar ao Brasil uma
legislação renovada que contemplasse os direitos e obrigações civis da nação, e assim
atualizasse o seu sistema de leis baseado até então nas Ordenações Filipinas de Portugal. 107
Essa ampliação dos debates em torno da legislação civil encontrou um período também de
ampliação dos debates quanto à questão escravista. Como a discussão mais apurada em torno
do processo de codificação compõe o terceiro capítulo desse trabalho, nos atemos nesta parte,
sobretudo, aos eventos gerais em torno da participação de Coelho Rodrigues enquanto
jurisconsulto e, mais precisamente, aos seus pensamentos em torno da escravidão.
Segundo nos aponta Grinberg, durante muitos anos tanto no Império, desde a
Independência, como no início da República houve dificuldade no sentido de realizar um
projeto de codificação civil no Brasil. Isso se deu pelo fato das “disputas em torno da
definição do conceito de cidadania em fins do século XIX e início do XX”. 108 Enquanto na
sociedade a partir principalmente da década de 1870 havia uma grande aspiração pelos ideais
de liberdade e a construção de um Estado liberal e republicano,109 convivia-se
concomitantemente com um regime tradicional de trabalho escravo. Nesse sentido foi difícil
definir quem eram os cidadãos contemplados pela legislação civil na época.
Coelho Rodrigues foi um dos nomes da jurisprudência pátria e também da
intelectualidade jurídica, a fazer parte dos membros que tinham como finalidade prover a
nação de um projeto de legislação renovado. Por ser um dos principais professores de direito à
época, político e jurista reconhecido foi convidado a fazer parte, não somente da comissão
que deu parecer sobre o trabalho de Joaquim Felício, mas das duas comissões especiais
criadas posteriormente ainda no regime imperial para levar a efeito a execução da obra
106
GAZETILHA. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 05 de julho de 1881. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=3519.
107
As Ordenações Filipinas formavam a principal base teórica legislativa vigente no Brasil importada da Europa,
mais especificamente de Portugal e Espanha durante a União Ibérica, organizada para essas nações ainda no
século XVII, vigentes no Brasil até a promulgação do Código Civil pátrio, em 1916. Para mais informações, ver:
GOMES, Orlando. Raízes históricas e sociológicas do Código Civil brasileiro. 2 ed. São Paulo: Martins Fontes,
2006.
108
GRINBERG, Keila. Código Civil e cidadania. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001, p. 10.
109
ALONSO, Ângela. Ideias em movimento: A geração 1870 na crise do Brasil-Império. São Paulo: Paz e Terra,
2002.
49
legislativa, processo que compreende toda a década de 1880, até o final do regime, como
veremos adiante.
No ano de 1882, Coelho Rodrigues apareceu participando na fundação da Faculdade
Livre de Ciências Sociais e Jurídicas do Rio de Janeiro. Nessa instituição vai também atuar
como professor, assim como conferencista pela Associação Promotora da Instrução, na
condição de Comendador. Em uma das conferências populares que fez por essa associação,
publicada no Jornal do Comércio, Coelho Rodrigues mais uma vez teria exposto seu
pensamento contrário à imigração como fator positivo para o país. O mesmo teria apontado
que em vez disso a mão-de-obra nacional seria o melhor meio para garantir que a população
não caísse na miséria absoluta. Assim como fez pela Sociedade Auxiliadora da Agricultura
em Pernambuco, Coelho Rodrigues teria sustentado no Rio de Janeiro o que seriam os vícios
crônicos que perseguiam a população e a economia: A preguiça e o luxo.110
Em 1883, Coelho Rodrigues apareceu ao lado das personalidades políticas de destaque
à época na fundação da Liga do Ensino no Brasil na corte imperial. A Liga do Ensino foi uma
associação criada para proporcionar os melhoramentos científicos do ensino na capital, assim
como pensar em estratégias para melhorar as condições de trabalho dos professores. Fizeram
parte dessa associação 50 membros. Alguns deles, além de Coelho Rodrigues, foram: Ruy
Barbosa, Capistrano de Abreu, o seu ex-aluno Silvio Romero, dentre outros.111
Como membro dessa associação, Coelho Rodrigues fez diversas conferências, as quais
foram importantes para compreendermos sua opinião a respeito, por exemplo, da crise que
assolava o regime imperial e o sistema escravista. Em uma destas conferências, no ano de
1883, publicada no Jornal do Comércio, intitulada “Transição do trabalho escravo para o
trabalho livre”, Coelho Rodrigues teria exposto o seu pensamento a respeito daquilo que
pretendeu que fosse estabelecido quanto à legitimidade do regime imperial e o escravismo.112
Como já adiantado anteriormente, Coelho Rodrigues nunca foi afeito ao
abolicionismo, apesar de haver determinadas medidas tomadas pelo mesmo que podem
parecer confusas, como a criação da Sociedade Emancipadora Piauiense. Na verdade, muitos
110
CONFERÊNCIAS POPULARES. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 01 de agosto de 1882. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=6114.
111
GAZETILHA: A LIGA DO ENSINO NO BRASIL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 13 de outubro de
1883. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=8982.
112
CONFERÊNCIA DA GLÓRIA. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 10 de novembro de 1883. Disponível
em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=9166.
50
abolicionistas como, por exemplo, Álvaro de Oliveira, vão tachar Coelho Rodrigues de
escravocrata por conta dos discursos que proferiu quando como foi conferencista, participante
na então associação Liga do Ensino no Brasil.113
O fato é que Coelho Rodrigues possuiu uma postura relativamente singular diante das
questões referentes a esse amplo movimento em torno da vigência do regime escravista.
Enquanto de um lado estavam os abolicionistas em sua maioria com pretensões de abolir a
escravidão, por outro os mais conservadores, e principalmente, beneficiários do sistema,
queriam a sua vigência. Coelho Rodrigues manteve uma posição conciliatória, porém com
tendências à defesa dos senhores de escravos.
O mesmo acreditava que a radicalidade com que os abolicionistas pretendiam acabar
com o regime convulsionaria a nação. Coelho Rodrigues não negava o fim do sistema
escravista, mas pretendia que esse ocorresse de forma gradual e lenta. Sua estratégia consistia
em que o governo adotasse medidas que amparassem tanto os senhores como os egressos da
condição de escravidão. Na conferência que realizou sob o título citado acima, o mesmo teria
apontado que os escravos deveriam continuar na condição de escravidão e que no decorrer do
tempo adquiririam a liberdade, passando a receber salários pelos seus serviços, tornando-se
trabalhadores assalariados.114
Coelho Rodrigues acreditava que essa seria a melhor maneira para sair da crise sem
que a população sofresse as consequências. O fim do regime de maneira imediata e impensada
acabaria, segundo o mesmo, lançando à miséria uma população de indivíduos que até então só
foram ensinados a prestar serviços aos seus senhores. Os escravos, na sua visão, deveriam
aprender a viver na sociedade civil e adquirir meios por parte do Estado para manterem-se pós
o fim do regime que até então os reduzia à condição dos serviços obrigatórios.
Por outro lado, e mais pendente a este, Coelho Rodrigues fez ampla defesa dos
senhores de escravos. O mesmo adveio da elite e certamente não assumiria postura diferente
ao defender interesses dos quais partilhou. No Recife, enquanto associado à Sociedade
Agrícola, esteve do lado dos grandes fazendeiros em prol da agricultura e, portanto, do
sistema que operava essa atividade no norte. Os familiares da sua esposa eram donos de
engenho em Pernambuco. Certamente que o lugar social ocupado por Coelho Rodrigues vai
113
AO CLUB DA LAVOURA E DO COMÉRCIO. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 02 de julho de 1884.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=10698.
114
CONFERÊNCIA DA GLÓRIA. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 10 de novembro de 1883. Disponível
em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=9166.
51
ser definidor para que o mesmo também saísse em defesa das elites escravocratas. Nesse
sentido, posteriormente, veremos o mesmo reclamando ao Estado que indenizasse os senhores
pela perda da sua propriedade escrava.115
Em 1884, com a publicação das “Cartas de um lavrador”, o mesmo criticou aquilo que
considerou fraqueza do Imperador para lidar com os abolicionistas, principalmente no Norte.
Denunciou que a abolição decretada no Ceará acarretou uma negociata de escravos para o sul,
antes que a garantia em si da liberdade. Novamente defendeu que o fim do regime não deveria
ocorrer de maneira imediata, mas que era importante para ambos os lados, senhores e
escravos, que estratégias fossem adotadas baseadas na libertação lenta dos escravizados, e
assim a sua incorporação na sociedade civil sem que prejuízos fossem gerados, sobretudo para
os senhores que, na visão de Coelho Rodrigues, eram os motores da economia.116
Mesmo não sendo favorável ao fim imediato da escravidão, Coelho Rodrigues não
deixou de votar a favor da extinção deste regime. No ano de 1888 quando foi posta em
discussão para ser votada a lei Áurea na câmara Coelho Rodrigues esteve atuando novamente
como Deputado pelo Piauí, desde 1886, quando disputando contra Joaquim Antônio da Cruz,
venceu a eleição.117 Com a maioria votando pelo fim da escravidão, a lei acabou sendo
aprovada, incluindo voto de Coelho Rodrigues, apesar de vencido nas suas opiniões.118
Mesmo com o fim do regime, Coelho Rodrigues não deixou de expor seus
pensamentos quanto ao que defendia. Isso é notório em um discurso seu publicado no Jornal
do Comércio, onde teria feito uma comparação entre seus pensamentos do ano em que
escreveu as “Cartas de um lavrador” (1884) e os de 1888 para mostrar que não mudaram. O
mesmo se defendeu de críticas de abolicionistas que o consideraram um escravista pelas
posições que assumiu. Segundo relatado no dado Jornal, Coelho Rodrigues acabara afirmando
que não possuiu escravos, e que participou até mesmo de movimentos em prol da libertação
destes, como principal membro da Sociedade Emancipadora Piauiense. Sua postura foi de
conciliador, tornando mesmo a afirmar que a divida do Estado era dupla: “é divida para o
115
CONFERÊNCIA DA GLÓRIA. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 10 de novembro de 1883. Disponível
em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=9166.
116
RODRIGUES, Antônio Coelho. Manual do Súbdito Fiel, ou Cartas de um Lavrador a sua majestade O
Imperador. Rio de Janeiro, 1884.
117
GAZETILHA. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 24 de janeiro de 1886. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=14561.
118
ASSEMBLEIA GERAL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 10 de maio de 1888. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=20268.
52
senhor que ficou privado do seu bem, e para o liberto, que não pode ser votado ao
abandono”.119
Já no final do ano de 1888, em um discurso proferido na câmara dos deputados,
Coelho Rodrigues teria feito algumas considerações a respeito da crise do regime político por
conta do fim da escravidão. Tais considerações são importantes para pensarmos a sua postura
política diante da ampla discussão em torno da vigência do Império. O mesmo se mostrou
tendente ao republicanismo, pois, segundo consta em publicação do Jornal do Comércio, teria
afirmado ser mais simpático a este regime do que à própria monarquia, porém no Brasil, o
mesmo conseguia ter maior confiança no regime monárquico. Coelho Rodrigues tinha medo
da indefinição republicana. O Império de certa forma, por já ser conhecido, era mais
confortável, garantidor da ordem, e, portanto, da integridade nacional, algo muito prezado
pelo mesmo.120
Ao mesmo tempo em que lançou suas considerações a respeito da crise imperial,
Coelho Rodrigues teria criticado a maneira como foi feita a representação em torno da
imagem da princesa Isabel como a salvadora dos escravos. O mesmo teria afirmado que não
foi o amor pelos escravizados que motivou a libertação. Ainda segundo consta no Jornal do
Comércio, questionou onde estava a intervenção dos partidários do abolicionismo e a
iniciativa papal dentro desse processo. O Jornal mostra que Coelho Rodrigues teria finalizado
sua fala criticando a falta de assistência aos recém-libertos que ficaram desassistidos pelo
governo, o qual destinava boa parte de seus recursos à contratação de “estrangeiros de olhos
azuis e cabelos de ouro”, em vez de olhar pela sua população nacional, sobretudo a população
desassistida, os egressos da escravidão.121
Aproximando-se do fim do regime imperial, no ano de 1889, podemos pensar
mediante passagens no Jornal do Comércio, que Coelho Rodrigues se empenhou em
promover a sua imagem ao governo enquanto jurisconsulto preocupado com a organização da
legislação civil. Em um discurso do mesmo no referido Jornal, teria feito considerações sobre
a história da codificação, detendo-se mais na ultima tentativa, a que participou como revisor,
no trabalho de Joaquim Felício. Nessa história relatada e publicada no Jornal do Comércio,
Coelho Rodrigues quis promover a sua imagem como o sujeito que dentro da comissão que se
119
ASSEMBLEIA GERAL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 24 de junho de 1888. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=20562.
120
CÂMARA DOS DEPUTADOS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 18 de novembro de 1888. Disponível
em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=21636.
121
Idem.
53
criou após a tentativa de Joaquim Felício para a execução da obra de codificação, logo
realizou a sua parte referente aos direitos familiares, dando importância a essa matéria.
Além disso, o próprio sujeito teria narrado que criou um plano de execução da obra
por completo e tinha a intenção de apresenta-lo à ex-comissão, intitulado “Plano geral do
projeto de Código Civil Brasileiro”. Nesse plano, Coelho Rodrigues expôs em linhas gerais os
principais elementos necessários para a composição de um Código Civil, baseado na
experiência dos países que na sua visão seriam civilizados e as necessidades práticas do
Brasil, além da maneira como pretendia realizar o seu projeto. Dentre uma das ideias do
plano, o mesmo pretendia a eliminação de tudo que pudesse lembrar a escravidão.
Apresentando a proposta do plano na íntegra publicada no Jornal do Comércio, Coelho
Rodrigues teria afirmado ainda que caso o governo lhe confiasse a realização deste trabalho,
ele estaria disposto a se empenhar para a sua feitura.122
Adiante entraremos nessa discussão, para pensarmos o quanto Coelho Rodrigues foi
participe dentro do processo de codificação civil no Brasil. Apesar de relativamente
esquecido, o mesmo foi um dos principais responsáveis por dotar o Brasil de um corpo
legislativo renovado com direitos e obrigações aos cidadãos em um período onde as
codificações tornavam-se símbolo do progresso e do desenvolvimento nacional. No decorrer
do ano de 1889, Coelho Rodrigues vai participar de algumas reuniões com uma comissão de
jurisconsultos formada por: Ele (Coelho Rodrigues), Conselheiro Olegário Herculano de
Aquino e Castro, José da Silva Costa, José Júlio de Albuquerque e Conselheiro Affonso
Augusto Moreira Penna, sendo presidida pelo próprio imperador D. Pedro II e o Conselheiro
Manuel Pinto de Souza Dantas. É nesse período, bem próximo do fim do regime imperial, que
Coelho Rodrigues vai adquirir o título de Conselheiro de sua Majestade por conduzir um
trabalho de tanta importância à nação.123
Quando sobreveio o golpe que derrubou a monarquia o então Conselheiro Coelho
Rodrigues foi contratado pelo ministro da justiça Manoel Ferraz de Campos Salles, do
governo do Marechal Deodoro da Fonseca para a realização do projeto de código civil, o
primeiro da República no ano de 1890. Antes disso, Coelho Rodrigues já havia sido
122
JURISPRUDÊNCIA. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 18 de janeiro de 1889. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=22065.
123
GAZETILHA: CÓDIGO CIVIL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 11 de setembro de 1889. Disponível
em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=23578.
54
incumbido pelo mesmo ministro da redação do projeto de lei que instituía o casamento civil
no Brasil ainda no final do ano de 1889.
Quando contratado para a redação do projeto de código civil, o nome de Coelho
Rodrigues foi cotado pelos correligionários do Piauí para assumir o cargo de senador como
um dos principais representantes do seu mais novo partido, o Partido Federal. Por haver
fechado contrato com o governo para a realização da obra legislativa, acabou dispensando
com pesar a sua indicação naquele ano. Esse foi um dos cargos que mais almejou dentro da
política, segundo o mesmo, mas ao se encarregar do contrato fechado com o governo acabou
sendo impedido de assumi-lo.124
Anos mais tarde, e com a obra próxima de ser concluída, no começo do ano de 1892,
formulou requerimento ao governo para que pudesse assumir o cargo de senador pelo Piauí
para o próximo mandato, já que seu nome era o mais cotado, segundo consta no Jornal do
Comércio. Em resposta ao pedido a licença teria sido negada pelo governo. Os impasses
políticos para a impugnação deram-se, segundo afirmação de Coelho Rodrigues, pelas
disputas políticas e intrigas envolvendo o ministro Fernando Lobo Leite Pereira, como
veremos adiante.125 Em 1893, novamente Coelho Rodrigues lançou requerimento pedindo que
fosse reconhecido senador pelo Piauí para o mandato que se iniciaria nesse ano. Acabou
sendo reconhecido com o trabalho de codificação findo, tomando assento no congresso em 09
de maio de 1893.126 Coelho Rodrigues permaneceu como senador até o ano de 1896, sendo
este o último cargo político que ocupou na vida.
Ainda em 1896, ultimo ano do seu mandato no senado, Coelho Rodrigues apareceu
como lente na Faculdade Livre de Ciências Jurídicas e Sociais, instituição em que foi
fundador juntamente com outros nomes, como vimos anteriormente. Em 1897 participou
como acionista e membro da comissão responsável pela reorganização do Banco da
República.127 Seu nome ainda figurou, quando ex-senador, como um dos políticos principais
da época para assumir o cargo de ministro da pasta da Justiça e do Interior, o que não se
124
RODRIGUES, Antônio Coelho. Estado do Piauhy. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 19 de setembro de
1890. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=1949.
125
LICENÇA NEGADA. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 08 de abril de 1892. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=7113.
126
CONGRESSO NACIONAL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 10 de maio de 1893. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=10978.
127
VÁRIAS NOTÍCIAS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 26 de fevereiro de 1897. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=24078.
55
concretizou.128 Atuando na Faculdade Livre nesse período, Coelho Rodrigues foi professor na
primeira cadeira do segundo ano da disciplina de Direito Civil.129
Nesse mesmo ano de 1897, Coelho Rodrigues esteve atuando como sócio na
Associação Promotora da Instrução. Por essa associação foi nomeado superintendente da
Escola Santa Isabel. No ano seguinte, o nome de Coelho Rodrigues figurou dentre as
principais personalidades jurídicas, políticas e intelectuais que compuseram a Revista de
Jurisprudência da sua época. Dentre os principais nomes conhecidos na historiografia que
publicaram nessa importante revista jurídica e fizeram circular as principais ideias por meio
dela, podemos citar: Carlos de Carvalho, Ferreira Vianna, José Hygino, Lafayette Pereira,
Ruy Barbosa, Silvio Romero.130
No ano de 1898, Coelho Rodrigues apareceu em publicação do Jornal do Comércio
sendo convidado para dar parecer sobre o projeto do Direito da Família formulado pelo então
professor da Faculdade de Direito do Recife, Clóvis Beviláqua. 131 Este vai se tornar o sujeito
contratado pelo então ministro da Justiça e dos Negócios, Epitácio Lindolfo da Silva Pessoa,
no governo Campos Salles, para a execução da obra legislativa, o código civil. Veremos mais
tarde que houve uma relação entre Clóvis Beviláqua e Coelho Rodrigues que ultrapassou
reconhecimento. Este último, apesar de não constar na história sobre o processo de
codificação, foi partícipe como um dos principais jurisconsultos nacionais a fazer análise do
trabalho de Clóvis Beviláqua, que se amparou amplamente, segundo afirmação sua, no projeto
do seu antecessor.
128
VÁRIAS NOTÍCIAS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 08 de fevereiro de 1897. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=23593.
129
FACULDADE LIVRE DE SCIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS DO RIO DE JANEIRO. Jornal do
Comércio. Rio de Janeiro, 19 de maio de 1897. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=24823.
130
REVISTA DE JURISPRUDÊNCIA. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 20 de maio de 1898. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=28443.
131
HOMENAGEM AO DR. CLÓVIS BEVILÁQUA. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 22 de março de 1899.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=31616.
56
132
GAZETILHA: RELATÓRIO DO PREFEITO. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 02 de março de 1900.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=11.
57
pronunciamento, segundo consta nas páginas do Periódico, aquilo que seria um dos maiores
problemas que enfrentaria na sua gestão era o funcionalismo público concedido de maneira
desordenada, por meio de apadrinhamentos, onde a falta de compromisso dos servidores
acabava acarretando em prejuízos para a capital, antes que o seu desenvolvimento.133
Em cima disso o prefeito Coelho Rodrigues teria proposto soluções que acreditava
sanarem os problemas. Uma delas seria a reorganização das repartições municipais, reduzindo
o pessoal e suprimindo aqueles cargos públicos que fossem dispensáveis. Essa era uma
medida das quais acreditava que acabaria contribuindo para o equilíbrio das finanças do
governo municipal. Outro fator que considerou de suma importância, mesmo que forçada,
seria a necessidade da administração ter que recorrer o mais rápido possível a novas
operações de créditos com os bancos e capitalistas. Essa medida, juntamente com a reforma
administrativa, era de necessidade urgente.
Para além dessas questões, Coelho Rodrigues ainda planejou que seria preciso reduzir
os vencimentos dos servidores públicos. Essa reforma planejada pelo prefeito seria
acompanhada de supressão dos privilégios exorbitantes do magistério, das acumulações
remuneradas, da contagem do serviço em duplicata e das aposentadorias para funcionários
válidos.134 Tais medidas contribuiriam com o decorrer do tempo, na visão de Coelho
Rodrigues, para que o Rio de Janeiro melhorasse o seu crédito público e, portanto, saísse da
crise financeira de que relatou o prefeito.
Ainda no seu pronunciamento tocou em diversos pontos que pretendia fazer cumprir
no seu governo. Quanto aos cargos vitalícios, Coelho Rodrigues propôs a necessidade de
reformas. Ao discursar sobre a Diretoria do Interior e Estatística, afirmava que o órgão era de
suma importância para se ter uma ideia quantitativa por meio de dados estatísticos dentro da
capital para melhor compreensão dos erros e vícios da administração municipal, o que
proporcionaria saber para onde direcionar reformas. Coelho Rodrigues teria falado da
importância da criação de um Código Florestal no sentido de regular as atividades dos
abusivos desmatamentos operacionalizados principalmente por grandes proprietários.135
Um dos pontos fortes em que Coelho Rodrigues direcionou atenção foi com relação à
higiene e assistência pública, segundo consta no Jornal do Comércio. Foi um incentivador da
vacinação contra a varíola, que na época era uma das maiores epidemias do Brasil. Pretendia
133
GAZETILHA: RELATÓRIO DO PREFEITO. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 02 de março de 1900.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=11.
134
Idem.
135
Idem.
58
136
GAZETILHA: RELATÓRIO DO PREFEITO. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 02 de março de 1900.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=11.
137
CALDAS, Honorato. Carnes verdes. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 18 de março de 1900. Disponível
em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=169.
59
fosse evitado ter que pagar possíveis indenizações posteriores para membros desassociados,
por isso o contrato com a Salgado, Cardoso, Lemos e C, e não com a Salgado, Cardoso e C.138
A confusão quanto ao abastecimento de carne gerou uma série de criticas à sua
administração por parte dos membros dessa empresa por meio dos jornais. O Jornal O Paiz,
por exemplo, teria feito uma publicação criticando o prefeito por deixar na responsabilidade
da assinatura do contrato um dos sócios que pouco teria atuado, com poucas rezes (gado),
pouco capital na empresa, em detrimento dos demais membros atuantes na companhia. 139 O
Jornal da Rua do Ouvidor lançou criticas no mesmo sentido. Essas críticas acarretaram a
revogação do contrato que o prefeito Coelho Rodrigues havia estabelecido com Lemos.140
Para além desse caso, houve também atrito entre o governo municipal e empresas do
setor de coleta de lixo. O fato decorrido foi de que o prefeito estaria considerando fechar
contrato com uma empresa de coleta, a Companhia Industrial Brasileira, de responsabilidade
do Sr. Carmo, diferente daquela que o município tinha contrato até então, sob administração
de Luiz de Mattos, a qual não teve nome citado no relato. Essa tentativa de negociação de
uma nova companhia de limpeza gerou revolta por parte da empresa de Mattos, que até então
era responsável pelo serviço de Limpeza Pública e Particular da cidade do Rio. Isso acabou
gerando criticas tanto ao Sr. Carmo quanto à administração do prefeito Coelho Rodrigues.141
No período em que esteve como prefeito do Rio, Coelho Rodrigues teria formulado
um processo direcionado ao governo da República. Neste o mesmo requereu que fosse pago o
prêmio final de 100:000$ (Cem contos de réis) pela execução dos termos do contrato firmado
para a realização da obra legislativa de codificação civil. Foi enviada ao governo uma
procuração por parte de Godofredo Xavier da Cunha, no sentido de que recebesse o prêmio
pelo código feito.142 Apesar da tentativa, não houve nenhum retorno do governo a respeito da
sua reclamação.
138
CARNES VERDES. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 22 de março de 1900. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=207.
139
NO DOMÍNIO DO ABSURDO. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 29 de março de 1900. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=277.
140
A CHARADA DO PREFEITO. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 10 de abril de 1900. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=398.
141
MATTOS, Luis de. Questão do lixo. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 21 de abril de 1900. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=497.
142
CUNHA, Godofredo Chavier da. Justitia que sera tamen. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 29 de abril de
1900. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=568.
60
Durante a década de 1900, para além da sua frequente atuação em meio aos trabalhos
referentes ao código civil, contribuindo no projeto de Clóvis Beviláqua, Coelho Rodrigues
ainda exerceu profissões diversas. Dentre as quais, a de superintendente da Escola Santa
Isabel pela Associação Promotora da Instrução, cargo que se demitiu em 1902 por ter que se
mudar para Petrópolis, no Rio. Quem o substituiu foi o comendador Henri Raffard. Na época
Coelho Rodrigues obteve honraria de benfeitor, recebendo uma corrente de prata e medalha
de ouro, sendo esta a segunda que obteve. Tal atribuição simbólica era concedida aos
membros que se destacavam nos seus feitos pela instituição.143
O ano de 1904 foi bastante agitado na capital do Brasil. Esse foi o ápice da política
higienista do governo Rodrigues Alves no Rio de Janeiro, que acarretou uma crise social e
política por conta das ações da prefeitura e do governo federal com as reformas urbanas e
sanitárias na cidade, mediante nos informa Chalhoub.144 Tais reformas vão ser sentidas pelos
setores sociais que moravam nos centros, em cortiços. Ocorreu revolta em meio aos donos de
prédios e imóveis quanto às cobranças de multas e impostos por parte do governo para
aqueles que não cumprissem as normas sanitárias dos seus prédios. Coelho Rodrigues foi
proprietário de prédios no centro do Rio de Janeiro à época e apareceu como presidente da
Sociedade União dos Proprietários, fazendo defesa dos donos de imóveis no centro da capital.
Um dos seus argumentos ao proferir discurso por essa sociedade foi o de que os proprietários
não poderiam arcar com as despesas de normatização dos espaços privados em que residiam
seus inquilinos, os quais muitas vezes não pagavam os impostos com regularidade.145
Nesse mesmo ano Coelho Rodrigues fez a publicação da primeira edição do seu livro
A República na América do Sul, obra essa de grande importância para entendermos um pouco
sobre a política da época e, sobretudo, as cobranças feitas sobre o regime que na prática não
teria executado seus princípios.146 Esteve anunciando no Jornal do Comércio a venda de
exemplares na papelaria da Rua do Ouvidor, n° 57.147 Além disso, esteve exercendo a sua
143
ASSOCIAÇÕES. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 20 de fevereiro de 1902. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=4083.
144
Para mais informações sobre as políticas públicas e seu impacto no Rio de Janeiro, sobretudo durante o
governo do presidente Rodrigues Alves, ver: CHALHOUB, Sidney. Cidade Febril: cortiços e epidemias na
Corte imperial. São Paulo, Cia da Letras, 1996.
145
VÁRIAS NOTÍCIAS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 07 de março de 1904. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=7504.
146
RODRIGUES, Antônio Coelho. A República na América do Sul ou um pouco de história e crítica oferecida
aos latino-americanos, 1906. Brasília: Senado Federal, 2016.
147
ANÚNCIO. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 01 de julho de 1902. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=7952.
61
148
VÁRIAS NOTÍCIAS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 18 de dezembro de 1906. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=11800.
149
CONGRESSO JURÍDICO. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 12 de setembro de 1908. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=15768.
150
VÁRIAS NOTÍCIAS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 28 de abril de 1907. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=12501.
151
GAZETILHA: ELEIÇÕES FEDERAES. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 21 de fevereiro de 1903.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=5999.
152
THEREZINA. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 26 de fevereiro de 1909. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=16873.
153
GAZETILHA: AS ELEIÇÕES. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 06 de fevereiro de 1912. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_10&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=8941.
154
VÁRIAS NOTÍCIAS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 07 de maio de 1912. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_10&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=10545.
62
156
Fig. 3. Antônio Coelho Rodrigues idoso/Foto reprodução do livro “Coelho Rodrigues e a ordem de silêncio”.
155
DORIA, Escragnolle. Coelho Rodrigues. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 01 de maio de 1912. Disponível
em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_10&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=10439.
156
Capa de ilustração do livro “Coelho Rodrigues e a ordem de silêncio”. Ver: AGUIAR, Antônio Chrysippo.
Coelho Rodrigues e a ordem de silêncio. 1. ed. Teresina: 2006.
63
Antônio Coelho Rodrigues dentro da política foi um sujeito singular no sentido que
atribuímos à sua participação como representante da sua província/estado natal, o Piauí. A
partir dessa personalidade podemos enxergar como se estabeleceram as relações políticas no
decorrer da viragem do século XIX para o XX e, consequentemente, do regime monárquico
para a República. Aqui pretendemos nos atentar para os grupos políticos no Piauí, e,
sobretudo, em um contexto nacional, e a maneira como se deram as relações entre partidos no
período em que Coelho Rodrigues esteve atuando como representante da sua
província/estado, quanto aos cargos políticos em que o mesmo ocupou como deputado e
senador.157
Para tanto, a linha lógica que buscamos desenvolver no decorrer do capítulo é
pensarmos inicialmente Coelho Rodrigues e suas relações de caráter político, no decorrer da
sua, por vezes gloriosa, mas também acidentada, carreira como representante do Piauí,
sobretudo no cenário nacional brasileiro. Nesse sentido, a ideia é compreender sua imersão e
atuação na política no decorrer do regime imperial. Logo, partimos do interesse de
perscrutarmos pela rede de relações que estabeleceu ao longo desse período, com início no
final da década de 1860. Pretendemos visualizar os embates políticos envolvendo os partidos
monárquicos, Liberal e Conservador, bem como a luta que Coelho Rodrigues estabeleceu
contra o liberal Marquês de Paranaguá e seus partidários.
Posteriormente, em um período de ápice da vida pública do político que foi, onde o
mesmo manteve relações próximas com o poder central da recém-instalada República, mais
precisamente com o então ministro da justiça, Manuel Ferráz de Campos Salles, do governo
provisório do Marechal Deodoro da Fonseca, a Coelho Rodrigues teria sido atribuída, por
parte dos seus inimigos políticos, a tentativa de estabelecimento de um potentado no Piauí,
aquilo que Clodoaldo Freitas, opositor partidário do mesmo, intitulou como “coelhado”, em
referência ao sobrenome Coelho de Antônio Coelho Rodrigues. Este termo significaria, por
parte dos seus adversários, uma prática de dominação que afirmavam estar sendo empregada
157
Com o fim do regime imperial e a ascensão ao poder do governo provisório da República do Marechal
Deodoro da Fonseca começaram a ser redefinidas muitas das nomenclaturas. Antes províncias, com o regime
republicano temos os Estados nacionais. O Piauí passou de província a Estado em questão de nomenclatura. Os
presidentes de província passam a ser chamados de Governadores (de Estado). É importante essa explicação pelo
fato de que essa viragem na história da política acaba mudando muitos termos que no decorrer da pesquisa vão
sendo alterados.
64
no estado piauiense pelo grupo político que tinha Coelho Rodrigues como representante
máximo.
É com relação a esse regime que pretendemos fechar o capítulo apresentando um
Coelho Rodrigues não mais em um posto de sucesso dentro da política, pelo contrário.
Relativamente fracassado em meio a muitas das suas atuações, a proposta é pensarmos a
maneira como enxergou a política nacional em um momento posterior da sua vida, onde,
desiludido com os caminhos reais que a República estava traçando, escreveu seu livro “A
República na América do Sul”, com críticas ferinas ao regime que se estabeleceu totalmente
oposto ao que pregavam os seus princípios, e aos quais o próprio Coelho Rodrigues teria sido
adepto, regime que se mostrou na verdade mais centralizado e autoritário que o próprio
Império, divergindo da prática democrática de uma república.
158
HORÁCIO, João. Carta do Rio. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 22 de julho de 1890. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=1449.
65
partidos do Império, Liberal ou Conservador, estava no poder, até porque segundo Motta, o
Imperador tinha a plena liberdade para fazer circular os ministérios e, portanto, as facções
partidárias que se estabeleceriam no senado e na câmara dos deputados. Mediante o Poder
Moderador, como previsto na Constituição Imperial de 1824, ao Imperador era dada a
prerrogativa de indicar seus ministros, os quais eram responsáveis efetivos pela condução do
governo. “Escolhida a facção governante, enquanto ela gozasse da confiança de D. Pedro II,
continuaria no posto, ganhando as eleições para contar com maioria no parlamento.”159
Como vimos no capítulo anterior, Coelho Rodrigues despontou no meio político
inicialmente nas frentes de divulgação da propaganda conservadora. Como representante
máximo do Jornal O Piauhy, o sujeito fazia oposição à política liberal progressista que na
época em que atuou no periódico, de 1867 a 1869, dominava os postos de mando na província
do Piauí e, portanto, era o partido que encontrava maioria no ministério do Império e,
consequentemente, no parlamento, durante maior parte da década de 1860.
Araújo considera o período em que Coelho Rodrigues esteve à frente do periódico
como um momento de militância política do jovem piauiense.160 Sua militância política pelo
partido Conservador ao qual se filiou e manteve-se durante boa parte da sua vida, com
exceção de alguns momentos de dissidência como veremos mais adiante, foi reflexa da
maneira como a política se estabelecia em âmbito nacional e, sobretudo, local, e o modo como
o seu grupo esteve à mercê da política liberal que no Piauí era bastante forte como
organização partidária em torno da figura principal de João Lustosa da Cunha Paranaguá, o
Marquês de Paranaguá. Este esteve atuando como ministro da justiça, dos estrangeiros e da
guerra, de 1866 a 1868, pelo Gabinete Zacarias, que era liberal-progressista.
Como na época em que Coelho Rodrigues esteve como jornalista fazia parte do
Partido que se encontrava afastado da posição de liderança na província, empenhava-se em
expor as fragilidades políticas do partido oposto, o Partido Liberal. O fato narrado por
Horácio da oposição feita por Coelho Rodrigues ao Marquês de Paranaguá, que era uma
liderança liberal na província piauiense e político nacional de grande prestígio no Império, é
significativo para entendermos a posição de Coelho Rodrigues dentro da política no momento
em que exerceu a sua militância como jornalista pelo periódico O Piauhy.
159
MOTTA, Rodrigo Patto Sá. Introdução à História dos Partidos Políticos Brasileiros. Belo Horizonte: Editora
UFMG, 1999.
160
ARAÚJO, Johny Santana de. Antônio Coelho Rodrigues: entre “o silêncio, a paciência e o tempo”. IN:
NASCIMENTO, F. A. S.; TAMANINI, P. A. História Culturas e Subjetividades: Abordagens e perspectivas.
Teresina: EDUFPI, 2015, p. 108 – 131.
66
Burlamaque, José Manoel de Freitas e Franklin Américo de Menezes Dória.166 Este último,
além de liberal da facção política do Marquês de Paranaguá, foi seu genro, casado com Maria
Amanda Lustosa Paranaguá.
Quando Coelho Rodrigues assumiu uma das cadeiras na câmara em 1869 ao discursar
em uma das primeiras sessões retomou debates sobre a administração anterior, lançando
criticas que já fazia desde quando foi redator nas páginas de O Piauhy. Denunciando o que
considerava uma tirania em voga na sua província, Coelho Rodrigues acabou expondo a
deplorável situação pela qual supostamente teria passado o Piauí sob a liderança da facção
progressista do Marquês de Paranaguá. Essa foi a discussão na câmara que Horácio narrou e
que consideramos acima como uma das várias disputas pelo poder em que se envolveu
Coelho Rodrigues criticando seus adversários.
Foi enfática a maneira como o jovem político teria se expressado ao apontar para o
fato de que o Conselheiro Paranaguá, ao ter tido conhecimento da queda do gabinete
ministerial liberal, realizou práticas supostamente corruptas por meio dos seus
correligionários políticos no Piauí. Em uma das sessões da câmara, divulgada no Jornal do
Comércio e republicada n’O Piauhy, Coelho Rodrigues teria dito que a facção do
Conselheiro:
Vendo que o poder lhe ia escapar das mãos, e não tendo meio de conservar a
administração, quis ao menos empregar todos os recursos, embora
reprovados, para auferir os últimos reaes dos cofres públicos, e manter-se
mais alguns dias na falsa posição que ocupava de esbanjadora dos dinheiros
da província.167
Além disso, na mesma fala Coelho Rodrigues teria defendido o seu correligionário e
então presidente da província, Simplício Mendes. Este teria sido acusado de interferir nas
supostas leis que haviam sido estabelecidas na província por parte da facção política do
Conselheiro Paranaguá, quando esta ainda esteve organizada como Assembleia Provincial,
nos dias em que se soube da queda do gabinete progressista. Dentre as leis teria havido duas
que estabeleciam, segundo Coelho Rodrigues, a vitaliciedade de todos os cargos provinciais,
inclusive os da secretaria da presidência, o que acabou sendo considerado como uma
interferência à própria execução da administração de Simplício. O fato foi ridicularizado por
166
JORNAL DO COMMÉRCIO: PIAUHY. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 03 de maio de 1869. Disponível
em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_05&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=15425.
167
RODRIGUES, Antônio Coelho. O Piauhy. O Piauhy, Teresina, 15 de agosto de 1869. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=217204&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=8
5.
69
Coelho Rodrigues no seu discurso, pois era algo, mediante o mesmo, “fútil e não resiste à
análise”.168
Muitas das exposições dos políticos quanto aos seus adversários tinham mesmo o
sentido de ridicularizá-los perante as casas legislativas. Essa era uma forma de expor aquilo
de que os grupos eram capazes para burlar o sistema e tentar sustentar-se no poder. Foi a
partir de estratégias como essa que políticos, como no caso de Coelho Rodrigues e seu grupo,
fizeram para minar as bases do domínio do Marquês de Paranaguá e do então Partido
Progressista no Piauí nessa virada dos ministérios a partir de 1868.
Em outra das sessões na câmara, como forma de desestabilizar as bases políticas do
Marquês de Paranaguá no Piauí, Coelho Rodrigues teria denunciado as ações do ex-presidente
da província, o liberal Franklin Dória e o tenente-coronel da Guarda Nacional José Lustosa da
Cunha, irmão do Marquês de Paranaguá. Ambos fazendo parte da maquina burocrática no
domínio progressista estariam sendo acusados pela prática de desvios de verba destinadas
para a manutenção do corpo de “voluntários da pátria”, no período em que o Brasil estava em
guerra contra o Paraguai. Além disso, teria mencionado o superfaturamento na compra de 14
balsas que conduziriam os voluntários de Parnaguá a Teresina.169 José Lustosa foi partícipe na
guerra contra o Paraguai, e responsável pela condução do segundo corpo de voluntários da
pátria para o front de batalha.
Com os conservadores exercendo domínio no Piauí foi sendo estabelecido o
fortalecimento do partido e da sua influência. Isso se dava principalmente por meio das
substituições de funcionários públicos da oposição de cargos que ocupavam. Em 1870, por
exemplo, o Jornal A Imprensa fez publicação de artigo onde questionava a atuação do vice-
presidente da província, o conservador Manoel José Espinola Júnior, pela prática de
perseguição e demissão de pessoas dos cargos que ocupavam pelo fato de serem adeptas ao
partido de oposição.
Mediante relato do mesmo Jornal, Coelho Rodrigues estaria aplaudindo da câmara as
decisões do seu correligionário. Posteriormente, o Jornal relatou que Coelho Rodrigues
tomando as forças que possuía, de um lado do vice-presidente da província e do outro de um
suplente da delegacia de polícia, acabou apresentando queixas ao parlamento do Império
168
RODRIGUES, Antônio Coelho. O Piauhy. O Piauhy, Teresina, 15 de agosto de 1869. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=217204&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=8
5.
169
CÂMARA DOS SRS. DEPUTADOS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 08 de julho de 1869. Disponível
em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_05&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=15755.
70
contra outro desafeto político, José de Araújo Costa, o qual, mediante considerou o jornal
liberal citado, era perseguido por Coelho Rodrigues a mais de quatro anos.170
O fato que teria ocorrido e motivou as queixas prestadas foi a suposta morte de um
escravo por parte de Araújo Costa. Este, então residente na vila do Poty, personalidade
influente na província piauiense, teria comprado do Maranhão um escravo de nome Victorino.
Segundo relatado por Franklin Dória no Jornal A Imprensa em 1870, o escravo era de “maus
costumes” e teria supostamente roubado da loja da fazenda do seu senhor uma peça de pano
de algodão. Sabendo do ocorrido, Araújo Costa teria mandado um soldado do destacamento
policial da vila punir o seu escravo. O castigo, mediante relato, consistiu em açoites. O
próprio relator se mostrou ressentido pelo fato de no Brasil ainda serem assim tratados os
escravos, porém continuando a fala, e buscando amenizar os efeitos dos maus tratos, afirmou
ter sido “branda” a punição.
Franklin Dória teria acrescentado que meses depois o escravo acabara sendo
acometido pelas febres endêmicas das margens do rio Poty. Em uma noite de inverno teria
contraído uma febre aguda, e se levantou às dez horas da noite, passou pelo quintal de onde
morava para beber água na cozinha. Quando amanheceu foi relatado que seu estado era
crítico. Na suposta falta de médico, como alegado, foi chamado para atender o escravo um
curandeiro de nome Collatino Cidronio Tavares da Silva. Este teria aplicado ao enfermo um
purgante de ricino com enxofre, mas o escravo acabou não sobrevivendo.171 Esse caso teria
ocorrido anos antes, porém fazia parte da política de oposição tornar a imagem do opositor, de
alguma forma, manchada perante a sociedade dentro da política.
No mesmo ano de 1870 ocorreu a fundação da sociedade emancipadora piauiense.
Espinola Jr., depois de concorrer eficazmente para a fundação da sociedade, teria recusado o
cargo de representante máximo da mesma. Após sua recusa formal foi proposto a Coelho
Rodrigues que o substituísse. Depois da intervenção de Simplício Mendes, a pedido de
Espinola Jr., Coelho Rodrigues teria aceitado o cargo de presidente honorário da sociedade.
Nesse ocorrido, o Jornal oposicionista deixou de lado as criticas a Coelho Rodrigues e aos
conservadores, para louvá-lo pela sua adesão ao cargo de representante nessa investida
considerada de grande valia para a humanidade.172
170
DÓRIA, Franklin Américo de Menezes. A Imprensa. A imprensa, 12 de novembro de 1870. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=8
44.
171
Idem.
172
SOCIEDADE EMANCIPADÔRA PIAUHYENSE. A Imprensa. Teresina, 23 de novembro de 1870.
Disponível em:
71
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=8
52.
173
DISSOLUÇÃO DA CÂMARA. A Imprensa. Teresina, 26 de junho de 1872. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=1
141.
174
ONDE O CIVISMO? A Imprensa. Teresina, 06 de julho de 1872. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=1
145.
175
O MANIFESTO DO SR. DR. ANTÔNIO COELHO RODRIGUES. O Piauhy. Teresina, 14 de agosto de
1872. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=217204&pasta=ano%20186&pesq=%22Coelho%20Rodrig
ues%22&pagfis=453.
72
176
MANIFESTO. A Imprensa. Teresina, 11 de agosto de 1872. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=1
153.
177
DISSIDENTES. A Imprensa. Teresina, 31 de julho de 1872. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=1
149.
178
RODRIGUES, Antônio Coelho. Conclusão da sessão de 22 de fevereiro de 1877: O Sr. Coelho Rodrigues.
Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 23 de fevereiro de 1877. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=15290.
179
O MANIFESTO DO SR. DR. ANTÔNIO COELHO RODRIGUES. O Piauhy. Teresina, 14 de agosto de
1872. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=217204&pasta=ano%20186&pesq=%22Coelho%20Rodrig
ues%22&pagfis=453.
73
não fosse a ajuda que recebera dos liberais quase seria repelido da assembleia provincial em
1873.180
Apesar da tentativa, não logrou êxito na disputa como político dissidente. Gomes de
Castro, falando a respeito dessa eleição na câmara dos deputados já no ano de 1877, teria
afirmado que a dissidência no Piauí tendo por chefe Coelho Rodrigues não ganhou força. O
mesmo não teria tido apoio em várias administrações, desde 1872. A dissidência com Coelho
Rodrigues como chefe teria desaparecido após o processo eleitoral na província, ficando este
por um bom tempo de fora da política piauiense.181
Esse desaparecimento de que narrou Gomes de Castro teria se dado em partes,
mediante aquilo que relatou Coelho Rodrigues no Jornal do Comércio, por conta da oposição
que lhe teria feito na época o ministro do Império, Correia de Oliveira. Foi relatado que,
dissolvida a câmara em 1872, e tendo ele (Coelho Rodrigues) antes da partida de volta do Rio
ir falar com Oliveira, este teria comentado a respeito da organização da nova chapa do Partido
Conservador no Piauí. Na ocasião, o então ministro teria manifestado os melhores desejos a
respeito da reeleição de Coelho Rodrigues, mas não manifestou os mesmos desejos quanto à
reeleição dos outros dois colegas que com ele foram oposicionistas na moção de conferência
votada em 22 de maio de 1872, a que foi responsável pela dissolução da câmara.182
Coelho Rodrigues, continuando a fala, teria relatado que por negar a separação de seus
companheiros o ministro acabou o considerando inimigo e adversário. Afirmou que chegado à
província em 1872 o delegado a serviço do ministério acabara lhe hostilizando, estabelecendo
uma luta contra o mesmo desde então até 1875.183 De fato no período que compreendeu esse
mandato, Coelho Rodrigues esteve apagado na política, época em que se estabeleceu em
Recife, no Pernambuco, como professor na Faculdade de Direito. A situação mudou somente
quando novamente houve alteração no gabinete ministerial do governo imperial, passando a
ser composto de maioria conservadora, como veremos.
Gomes de Castro teria apontado que no período em que ascendeu ao poder o
ministério 25 de junho de 1875, Gabinete Caxias, em que o desembargador Delfino Augusto
180
RODRIGUES, Antônio Coelho. Conclusão da sessão de 22 de fevereiro de 1877: O Sr. Coelho Rodrigues.
Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 23 de fevereiro de 1877. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=15290.
181
ELEIÇÃO DO PIAUHY: O SR. GOMES DE CASTRO. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 21 de fevereiro
de 1877. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=15263.
182
RODRIGUES, op. cit.
183
Idem.
74
Cavalcanti foi presidir a província do Piauí, o mesmo procurou manter todos os meios para
que fosse possível a candidatura de um ex-deputado, que no caso seria Coelho Rodrigues. No
período da sua administração toda a maquina burocrática foi sendo substituída, o que
contribuiu para um fortalecimento inicial de um grupo de centro conservador, minando a
causa de Agesiláo Pereira da Silva, um dos candidatos que acabou se elegendo em 1872 pelo
Partido Conservador, com apoio de Simplício Mendes.184
No final do ano de 1876 ocorrem novamente eleições pelo Piauí para a composição da
câmara dos deputados em que Coelho Rodrigues, fazendo parte do Partido Conservador de
centro, teria disputado. O mesmo, juntamente com Gervásio Campello Pires Ferreira, estavam
recebendo apoio do presidente da província no período, Luís Eugênio Horta Barbosa, que
substituiu o desembargador Delfino e buscou continuar com a política de apoio ao grupo de
que Coelho Rodrigues e Pires Ferreira faziam parte. Eram os dois candidatos preferidos para a
ocupação dos cargos tendo em vista que estavam na situação do governo provincial.185
O Partido Conservador se encontrava dividido em facções, as quais sempre existiram
dentro desse grupo político. O centro, que como vimos, recebia influência do presidente de
província, Horta Barbosa, apoiando Coelho Rodrigues e Pires Ferreira. Como dissidentes de
facções opostas de dentro do Partido estavam, de um lado, Agesiláo, que recebia apoio de
Simplício Mendes, e o Cônego Thomás de Moraes Rêgo, que estava concorrendo por uma
facção conservadora com pouca influência visto que foi o menos votado na disputa eleitoral.
Enquanto isso o Partido Liberal neste ano de 1876 se encontrou unido com a pretensão de
eleger Franklin Dória. Esse partido era minoria nessa eleição, dividir-se entre mais candidatos
consequentemente acarretaria em derrota certa.
Com a eleição finda o Partido Liberal na representação de Franklin Dória teria
contestado a validade do processo eleitoral. Mediante publicação do Jornal do Comércio,
Dória teria afirmado que a Câmara Municipal de Teresina e o presidente da província em
acordo com os políticos adversários acabaram apurando “votos de uma eleição falsificada,
attribuída ao collegio de S. Raymundo Nonnato, e também incluiu no computo da apuração os
votos de uma eleição duplicada do collegio de Valença, manifestadamente nulla”.186
184
ELEIÇÃO DO PIAUHY: O SR. GOMES DE CASTRO. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 21 de fevereiro
de 1877. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=15263.
185
DÓRIA, Franklin. Eleição do Piauhy. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 10 de janeiro de 1877. Disponível
em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=14963.
186
Idem.
75
187
DÓRIA, Franklin. Eleição do Piauhy. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 10 de janeiro de 1877. Disponível
em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=14963.
188
Idem.
76
Pelo outro lado, na tentativa de provar a veracidade das eleições, Agesiláo escreveu
uma fala em defesa da sua candidatura no Jornal do Comércio. O suposto acordo que
Franklin Dória e os liberais afirmavam ter sido firmado entre as facções conservadoras foi
desmentido, na linha do que afirmava Agesiláo. Em sua fala, este teria apontado que seria
impossível um acordo entre as fações. De um lado, ele e Odorico Rosa teriam se afastado de
Horta Barbosa interinamente por este ter afirmado ser impossível sua candidatura, pois estaria
o presidente em favor de Coelho Rodrigues e Pires Ferreira. Afirmou que mais impossível era
um acordo com Coelho Rodrigues, de quem seria inimigo a perto de cinco anos. 189 Porém,
apesar da suposta inimizade, Coelho Rodrigues em discurso na câmara no período em que o
processo da apuração do caso estava em aberto mostrou-se relativamente do lado do candidato
da facção conservadora.190
Apesar da dificuldade de se conseguir reverter um processo eleitoral tido como
fraudulento, da maneira como pretendia provar o Partido Liberal a respeito da eleição de
Agesiláo em desfavor do liberal Franklin Dória, este partido conseguiu reunir os meios para
impugnar a eleição do político conservador. Foi formada uma comissão de inquérito
parlamentar para analisar o processo eleitoral da província. Posta em votação a validade ou
não da eleição na câmara, por dois votos de maioria foi anulado o diploma expedido pela
câmara municipal de Teresina no dia 08 de dezembro de 1876 a Agesiláo Pereira da Silva,
sendo reconhecido ao mesmo tempo Franklin Américo de Menezes Dória como um dos
deputados eleito pelo Piauí.191
No período, as facções imperiais se encontravam balanceadas dentro da casa
legislativa e do ministério. Apesar da pouca diferença para a decisão em torno da suposta
fraude, o fato do gabinete se encontrar formado em maioria por liberais nesse período pode ter
sido decisivo para a conclusão do inquérito. Mediante aquilo que nos informa Carvalho, o ano
de 1876 foi um período de transição de um ministério conservador para outro de tendência
189
SILVA, Agesiláo Pereira da. Eleição do Piauhy. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 11 de janeiro de 1877.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=14968.
190
CÂMARA DOS SENHORES DEPUTADOS: CONCLUSÃO DA SESSÃO DE 19 DE FEVEREIRO DE
1877. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 21 de fevereiro de 1877. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=15262.
191
CÂMARA DOS SENHORES DEPUTADOS: CONCLUSÃO DA SESSÃO DE 20 DE FEVEREIRO. Jornal
do Comércio. Rio de Janeiro, 28 de fevereiro de 1877. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=15270.
77
liberal.192 Não que o fato da mudança dos ministérios possa influenciar eminentemente nas
decisões políticas no Piauí, mas isso pode ser relativamente considerado como fator para que
a maioria no parlamento de tendência liberal tenha apoiado Dória, revertendo o processo
eleitoral tido como fraudulento.
No dia 05 de setembro de 1878 ocorreram novamente eleições para a composição da
câmara dos deputados. Nesse pleito concorreram muitos políticos conservadores, de facções
diferentes. Além de Coelho Rodrigues, foram os políticos que concorreram pelo Partido
Conservador: Agesiláo Pereira da Silva, Cônego Thomaz de Moraes Rêgo, Capitão Henrique
Carlos Santos e Helvídio Clementino de Aguiar. Enquanto isso o Partido Liberal se
encontrava unido indicando os três nomes dos políticos que obtiveram sucesso no pleito,
foram eles: José Manoel de Freitas, Franklin Américo de Menezes Dória e José Basson de
Miranda Osório.193
Segundo Carvalho, em 1878 o Partido Liberal se assentou na política nacional e
conseguiu ocupar maioria no gabinete ministerial, permanecendo os políticos dessa facção por
um bom tempo no poder, até 1885.194 Esse foi certamente um fator contribuinte para que no
Piauí acabasse sendo mudada a configuração dos políticos a assumirem os cargos
administrativos, de conservadores a liberais, como no caso para o pleito de deputados nesse
ano. A ascensão do Gabinete Sinimbu de orientação liberal no ministério do Império em 05 de
janeiro de 1878 teria sido motivo de desapontamento para Coelho Rodrigues como narrado
em carta particular no Jornal do Comércio.195 Quem estava na administração da província
piauiense no período dessa eleição era o político liberal Sancho de Barros Pimentel.
Mediante A Imprensa teriam comparecido no dia da votação para a eleição dos
deputados, no final de 1878, 70 eleitores, dentre os quais 50 eram liberais e 20 conservadores,
faltando nomes importantes desses últimos como Simplício de Souza Mendes, Gabriel Luiz
Ferreira e José Gonçalves Pedreira. Pelos dados percebe-se o domínio liberal para essa
192
CARVALHO, José Murilo de. A Construção da Ordem: a elite política. Teatro das Sombras: a política
imperial. 5ª edição – Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010.
193
ELEIÇÃO SECUNDÁRIA. A Imprensa. Teresina, 10 de setembro de 1878. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=1
488.
194
CARVALHO, op. cit.
195
O desapontamento narrado se deu pelo fato de que os conservadores se encontravam na oposição.
Desorganizados e sem bases fortes para se estabelecerem no poder com a ascensão do ministério liberal, o que
restava para Coelho Rodrigues e os seus correligionários era aceitar a derrota. INTERIOR: PIAUHY. Jornal do
Comércio. Rio de Janeiro, 13 de outubro de 1878. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=19434.
78
eleição, onde a grande maioria era de adeptos ao Partido da situação, o Partido Liberal. 196
Essa eleição, mediante carta particular de um político liberal que não assinou com seu nome,
teria se dado de maneira calma, sem uso da violência, apesar de ter havido suposta tentativa
de fraude por parte dos conservadores, com Coelho Rodrigues à frente:
Respeitada pois a liberdade do voto, a violência deixou de ser exercida, não
assim a fraude, porque esta appareceu em Oeiras, onde os conservadores
forgicárão uma duplicata, graças á formal intimativa do Dr. Coelho
Rodrigues, feita em uma originalíssima circular, em que o ilustre ex-
deputado, [...], aconselhava positivamente aos seus correligionários o
emprego deste e outros meios para vencerem a eleição.197
Apesar da suposta tentativa de fraude para vencerem as eleições da qual reclamou o
político do Partido Liberal no fragmento da carta, a vitória se deu eminentemente de políticos
ligados a essa facção. Na mesma carta particular teria sido feita uma consideração sobre
Coelho Rodrigues como político que reconhecia sua derrota, diferentemente de Agesiláo. Isso
pelo fato de que este último, vendo aproximar-se a derrota certa, deixou o seu partido no
período para tentar compensar os seus interesses no Pará, enquanto isso Coelho Rodrigues
acabou, mesmo reconhecendo que não venceriam, permanecendo no seu partido, deslocando-
se posteriormente à eleição para o Pernambuco, lugar em que ficou por um bom tempo
durante o domínio liberal no Piauí a partir de 1878.198
Coelho Rodrigues ainda tentou se eleger no pleito que aconteceu no final do ano de
1881 para a deputação geral pelo Piauí. Antes disso, mediante anunciado no Jornal A
Imprensa, teria ocorrido no dia 21 do mês de abril, dentre uma parcela dos membros do
Partido Conservador, na casa de Simplício de Souza Mendes, uma reunião. A principal pauta
da discussão que teria ocorrido foi uma votação dentre os 15 membros presentes para
deliberar sobre a chapa do partido que deveria concorrer às eleições que se aproximavam.
Feita a votação, os mais cotados para o pleito foram: Coelho Rodrigues, Coelho de Resende e
Agesiláo. Uma pequena parte dos votantes, vencidos, queria que o lugar de Coelho Rodrigues
fosse ocupado por Polydoro César Burlamaque.199
Mediante publicação do Jornal A Época, comentado n’A Imprensa, estaria, a partir dos
nomes mencionados, montado o esquema que o centro do Partido Conservador havia feito
196
ELEIÇÃO SECUNDÁRIA. A Imprensa. Teresina, 10 de setembro de 1878. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=1
488.
197
INTERIOR: PIAUHY. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 13 de outubro de 1878. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_06&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=19434.
198
Idem.
199
NOTICIÁRIO: REUNIÃO. A Imprensa. Teresina, 29 de abril de 1881. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%22&pagfis=2014.
79
200
NOTICIÁRIO: REUNIÃO. A Imprensa. Teresina, 29 de abril de 1881. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%22&pagfis=2014.
201
ELEIÇÃO GERAL. A Imprensa. Teresina, 29 de dezembro de 1881. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%22&pagfis=2155.
202
VOTOS PARA DEPUTADOS GERAES. A Imprensa. Teresina, 05 de novembro de 1881. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%22&pagfis=2124.
203
VOTOS PARA DEPUTADOS GERAES. A Imprensa. Teresina, 15 de novembro de 1881. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%22&pagfis=2130.
80
204
ELEIÇÃO GERAL. A Imprensa. Teresina, 29 de dezembro de 1881. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%22&pagfis=2155.
205
A IMPRENSA. A Imprensa. Teresina, 13 de abril de 1882. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=783765&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=22
12.
206
Idem.
81
a Miranda Osório, que não deveria ter sido considerado eleito. Reclamando por Pires Ferreira
estava também Machado Portella e Coelho Rodrigues, ambos tentaram provar por meio dos
dados quantitativos da eleição e mediante lei eleitoral que Osório não poderia ser
reconhecido, pois não teria conseguido atingir no primeiro escrutínio a maioria absoluta de
votos.207
Apresentada a contestação perante a comissão era esperado que o diploma pretendido
pelo candidato liberal fosse anulado. Apesar das tentativas, foram frustrados os esforços dos
adversários conservadores nesse pleito. A comissão acabou votando contra os apelantes.
Nesse caso foram validados os processos eleitorais que deram vitória aos liberais no Piauí, os
quais passaram a dominar a política na província por mais um mandato. A situação mudou
quando mais uma vez ascendeu ao poder do Império um gabinete ministerial de tendência
conservadora, com os quais conseguiram os políticos locais estabelecer acordos.208
Diante dos expostos até então, vimos que Coelho Rodrigues no decorrer da sua vida
política esteve em relativa estabilidade durante alguns mandatos, mas a grande maioria das
vezes acabava como derrotado. Isso pelo fato de que no Piauí os liberais sempre estiveram
mais organizados, além do mais contavam com uma representação nacional de grande poder
na província e de prestígio no Império, o Marquês de Paranaguá, que dominou a política
piauiense durante muitos anos. Os conservadores até então não conseguiam estabelecer força
para se sustentarem, sobretudo, com uma representação de peso e influência nacional.
Coelho Rodrigues somente irá retornar à política piauiense nas eleições para o
mandato de deputado do ano de 1886, momento em que os conservadores voltaram a dominar
o ministério, derrubando do poder o Gabinete Saraiva, estabelecendo o Ministério de João
Maurício Wanderley, o Barão de Cotegipe, fazendo reordenar as administrações provinciais.
Nesse ano Coelho Rodrigues disputou eleição contra o político liberal Joaquim Antônio da
Cruz. Os dois foram os candidatos mais votados para assumirem o cargo de representante
como deputado pelo primeiro distrito do Piauí, sobressaindo Coelho Rodrigues, vencendo o
pleito. Além dele foi eleito como representante pelo segundo distrito seu correligionário
Simplício Coelho de Resende.
Quanto à atuação pelo terceiro distrito, até então a vaga era preenchida pelo político
liberal Franklin Dória. Porém houve contestação dessa eleição perante a comissão de
207
PUBLICAÇÕES A PEDIDO: PIAUHY. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 07 de fevereiro de 1882.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=4949.
208
Idem.
82
inquérito da câmara, pois segundo acusação de Coelho Rodrigues teria ocorrido crime por
inclusões fraudulentas de eleitores das comarcas de Parnaguá e Corrente, localidades de
domínio do Partido Liberal sob a influência do conselheiro Paranaguá, então senador e a
maior representação dos liberais no Piauí, como vimos.209
Feita a verificação, foi aprovada a emenda de Coelho Rodrigues anulando o diploma
de Dória e sendo reconhecido deputado o político dissidente conservador Jayme de
Albuquerque Rosa. Este, apesar de ter ocupado a vaga como dissidente, já que o preferido
para o distrito pelos conservadores de centro era um primo de Coelho Rodrigues, Elizeu de
Souza Martins, não deixou de ser defendido por Coelho Rodrigues. Certamente que, como a
intensão dos conservadores para acabar com o domínio liberal no Piauí e também
reestabelecer a harmonia do Partido, no final das contas uniram-se para esse fim. Isso explica
a defesa de Coelho Rodrigues em prol de Albuquerque Rosa para que assumisse a vaga no
parlamento em detrimento do liberal Franklin Dória.210
Mediante publicação do juiz de direito responsável pela organização do alistamento
eleitoral da comarca de Parnaguá, José Lustosa de Souza, genro de José Lustosa da Cunha, o
Barão de Santa Filomena e irmão do Marquês de Paranaguá, não era de surpreender a
anulação do diploma pelo ato da câmara. Isso pelo fato de que, segundo apontava ter
observado Lustosa de Souza, a ascensão do Partido Conservador ao poder do Império,
consolidando-se em 1886, supostamente facilitava que acontecesse o que se sucedeu, a
respeito da impugnação do diploma do liberal Franklin Dória.211
Essa impugnação foi uma vitória para os conservadores no Piauí, pois era minado um
posto da administração liberal que resistia em se sustentar. O fato ocorrido contribuiu para a
fragilização dos liberais, sobretudo para a diminuição da influência e poder do conselheiro
Paranaguá sobre a província piauiense a partir desse período. Outros fatores foram
contribuintes nesse sentido. O Jornal A Imprensa narrou durante o ano de 1886 aquilo que
seriam práticas realizadas pelos conservadores para desfavorecerem os liberais de
conseguirem ascender na política por meio das eleições.
209
CÂMARA DOS DEPUTADOS: VERIFICAÇÃO DE PODERES. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 26 de
maio de 1886. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=15341.
210
Idem.
211
SOUZA, José Lustosa de. O juiz de direito organizador do alistamento eleitoral de Parnaguá. Jornal do
Comércio. Rio de Janeiro, 15 de julho de 1886. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=15711.
83
Diversas medidas teriam sido adotadas durante o período em que a facção política
conservadora se estabeleceu no poder a partir de 1886. O Jornal citado relembrou que no
propósito “firme e deliberado de favorecerem as candidaturas oficiais”, que no caso seriam as
conservadoras, teria sido praticado nas eleições “atos arbitrários, escandalosos e violentos”.212
Relatou-se que no governo do presidente de província Manuel José de Meneses Prado
ocorreram interferências no sentido de favorecer a eleição de Coelho Rodrigues, como
mediante a remoção do casal de professores de Picos, Raymundo Martins de Souza Ramos e
Maria Porcina dos Santos, influentes personalidades liberais.213
Os exemplos se multiplicavam em diversas outras práticas, consideradas pela
oposição, violentas e de ameaça. Dentre os atos teria sido deslocado o alferes do exército,
Cândido de Carvalho, para a corte, por não ter prestado voto ao candidato oficial; Aumento e
remessa de força policial para diversos destacamentos da província; A compra de votos,
tentada pelos agentes da polícia, em favor dos candidatos oficiais; Prisão e detenção em
cárcere privado do eleitor Pedro César Machado da Comarca da União, pelo delegado de
polícia do termo, por ter declarado que votava no candidato liberal; Ocultação do escrivão da
subdelegacia do Livramento, que tinha que servir na organização da mesa eleitoral, para que
não houvesse eleição ali, onde os liberais teriam maioria na votação, dentre outros exemplos
que o jornal apontou como prática dos situacionistas conservadores.214
O Jornal relatou ainda que Coelho Rodrigues assumindo o cargo de deputado em 1886
estaria conseguindo angariar forças importantes, forças essas que contribuiriam para o
estabelecimento dos seus interesses e do seu partido no Piauí. Segundo considerou José
Faustino da Silva, desafeto de Coelho Rodrigues que também concorreu à eleição em 1886,
em publicação n’A Imprensa, este último teria conseguido, “para satisfazer ódios pessoaes e
partidários”,215 estabelecer relações com ministros novos do Império e partidários no sentido
de realizar no Piauí a demissão de funcionários que seriam antigos e dedicados à causa
pública, os quais eram do partido da oposição. Faustino da Silva mencionou como teria se
212
A IMPRENSA: COMO CORRERÃO AS ELEIÇÕES ENTRE NÓS. A Imprensa. Teresina, 13 de fevereiro de
1886. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=3
084.
213
Raymundo Martins de Souza Ramos era chefe popular e prestigioso do partido liberal do município dos Picos.
Segundo A Imprensa Raymundo era “um grande estorvo à eleição do candidato oficial [que seria Coelho
Rodrigues], e, portanto, urgia que fosse ele deslocado [retirado da sua profissão]”. Ver: Idem.
214
Idem.
215
SILVA, João Faustino da. Ainda as eleições de 15 de janeiro. A Imprensa. Teresina, 20 de fevereiro de 1886.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=3
088.
84
216
SILVA, João Faustino da. Ainda as eleições de 15 de janeiro. A Imprensa. Teresina, 20 de fevereiro de 1886.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=3
088.
217
COLLABORAÇÃO: A ELEIÇÃO DO DR. COELHO RODRIGUES. A Imprensa. Teresina, 27 de fevereiro
de 1886. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=3
092.
85
Avelino, teriam sido retirados por ordem de Cotegipe ao então presidente Prado, dos cargos,
respectivamente, de procurador fiscal e tesoureiro na província.218
Estabelecido o domínio dos conservadores no Piauí, foram narrados pelo Jornal da
oposição indicativos de que Coelho Rodrigues estabelecia-se como um político influente na
província, aumentando seu poder a partir deste mandato. Em nota no Jornal A Imprensa teria
sido considerado que o mesmo estaria com poder para estabelecer nomeações de presidentes e
vice-presidentes de província para o Piauí. Mediante as considerações do Jornal citado, a lista
dos vice-presidentes de província nomeados por Coelho Rodrigues para a composição do
cargo em 1886 foi montada com os nomes de Firmino Licínio Soares da Silva, coronel
Raimundo José de Carvalho e Souza, capitão José Ribeiro Gonçalves, coronel Gervásio de
Britto Passos e coronel Miranda.219
O Jornal lançou criticas tentando demonstrar que essas nomeações eram irresponsáveis
pelo que consideravam o despreparo dos nomeados. Da mesma maneira com a posse do filho
de Gomes de Castro, Viveiros de Castro, do cargo de presidente da província em 06 de julho
de 1886, também nomeação atribuída a mando de Coelho Rodrigues, A Imprensa considerou
que o jovem Viveiros não tinha habilidades e nem responsabilidade para um posto de
presidente. Foi relatado que o mesmo vivia em festas intermitentes, e que na verdade a
província seria governada por Theodoro Pacheco e o Cônego Thomáz, considerados como
mentores da presidência, e partidários de Coelho Rodrigues.220
Além disso, fatos envolvendo a família de Coelho Rodrigues estariam sendo
considerados nos jornais, contribuintes para percebermos o que seria o aumento do seu
domínio e do seu partido no Piauí, sobretudo a partir desse período. Por um lado podemos
pensar que os oposicionistas sempre faziam relatar questões que fossem importantes para
denigrir a imagem do seu opositor. Por outro lado, os relatos servem para pensarmos o
estabelecimento de práticas por parte de familiares de Coelho Rodrigues no sentido de se
fazer ser temido na localidade.
218
NOTICIÁRIO: DEIXARÃO O EXERCÍCIO. A Imprensa. Teresina, 27 de fevereiro de 1886. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=3
095.
219
OS VICE-PRESIDENTES. A Imprensa. Teresina, 07 de agosto de 1886. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=3
188.
220
O SR. VIVEIROS DE CASTRO E A SUA CÉLEBRE PORTARIA. A Imprensa. Teresina, 14 de julho de
1888. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=3
584.
86
Em escrito no Jornal A Imprensa, Severino Camello da Silva apontou ter sido vítima
daquilo que considerou prepotência do irmão de Coelho Rodrigues, o capitão Ricardo
Rodrigues de Souza Martins. Este último, ao ter vendido o sitio Roque, no termo de Valença,
que havia sido arrendado para Severino dentro do tempo de 05 anos, acabou endereçando uma
carta a este para que desocupasse o tal sitio imediatamente, pois tinha o vendido ao capitão
Francisco da Cunha Sobreira. Por ter colheitas a fazer, Severino escreveu que teria se dirigido
a Ricardo com pretensão de se fazer cumprir o contrato firmado dos 05 anos do arrendamento.
Diante disso, o autor do escrito narrou que Ricardo teria mandado três capangas para se fazer
cumprir a desocupação do sitio, sem diálogo acerca do cumprimento do tempo do contrato.
Na sua fala, Severino acrescentou que Coelho Rodrigues e sua família estavam se
estabelecendo como um potentado, ou ditadores, na província.221
Outro fator que marcou esse período do que seria a expansão do poder de Coelho
Rodrigues no Piauí se deu pela suposta tentativa de compra de fazendas nacionais do
departamento de Canindé do Piauí. Em discurso no Jornal do Comércio, mediante citado n’A
Imprensa, Pedro de Barros teria criticado duramente o “enorme jurisconsulto” por considerar
tal prática ilegal, escandalosa e abusiva. Isso pelo fato de que a compra e venda de fazendas
nacionais era proibida abaixo de lei para membros do governo, como no caso de Coelho
Rodrigues, que seria representante da nação e da província na condição de deputado.222
Um fato interessante de ser analisado é que em muitos dos escritos de Pedro, o mesmo
não assinou com o seu nome. Isso se torna um indicativo do receio do que poderia acontecer
ao levantar críticas sobre uma personalidade política que encontrava-se com força na época,
caso de Coelho Rodrigues. Lembrando que do mesmo modo Coelho Rodrigues fez antes,
como vimos no capítulo anterior, deixando de assinar alguns dos seus escritos, como as cartas
de um lavrador, com críticas ao Império e a pessoas importantes no poder, como o próprio
monarca.
O fato é que no final do período imperial, mais precisamente no ano de 1889,
enquanto dominaram os conservadores no Piauí, adentrando a década de 1890, Coelho
Rodrigues começou a adquirir importante notoriedade, sobretudo no âmbito nacional da
política. Isso se deu por diversos fatores, como a sua participação em comissão responsável
221
SILVA, Severino Camello da. Publicações a pedido: Ao Público. A Imprensa. Teresina, 31 de dezembro de
1886. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=3
270.
222
BARROS, Pedro de. Abuso inqualificável: Fazendas nacionais. A Imprensa. Teresina, 24 de março de 1888.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=3
520.
87
pela revisão do projeto de Código Civil de Joaquim Felício dos Santos, no ano de 1881, onde
teria dividido escritório com o conselheiro Lafayette, este na condição de ministro da
justiça;223 Sua própria ocupação profissional enquanto professor de Direito, sobretudo Civil,
na Faculdade de Direito do Recife e na Faculdade Livre de Ciências Jurídicas e Sociais do
Rio de Janeiro; Seu contato próximo com políticos do centro da administração nacional tanto
ainda no Império como no início da República, dentre outros fatores.
Diante disso, passaremos ao tópico seguinte pretendendo perceber as relações,
sobretudo políticas, de Coelho Rodrigues na esfera nacional, realizando paralelo com a
política local piauiense. Com vistas ao que seria o sucesso do político, torna-se objeto
importante de análise questionar como a sua influência no espaço central do poder imperial
acabou dando brechas para que determinadas personalidades regionais intitulassem de
coelhado o que seria uma prática política de domínio de Coelho Rodrigues sobre a condução
dos negócios políticos no Piauí no despontar do regime republicano, desde que conseguiu
obter mais estabilidade na política, sobretudo a partir de 1886.
223
O DR. COELHO RODRIGUES E SEU DIPLOMA. A Imprensa. Teresina, 12 de junho de 1886. Disponível
em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=783765&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfis=3
152.
88
224
FERREIRA, Ronyere. Clodoaldo Freitas, historiador: história, política e ressentimentos. In: FREITAS,
Clodoaldo. História de Teresina. 2. ed. São Paulo: Mentes Abertas, 2020, pp. 377-419.
89
225
FREITAS, Clodoaldo. Os fatores do coelhado: escorço de história. 2. ed. Teresina: Academia Piauiense de
Letras, 2019, p. 37.
226
FERREIRA, Ronyere. Clodoaldo Freitas, historiador: história, política e ressentimentos. In: FREITAS,
Clodoaldo. História de Teresina. 2. ed. São Paulo: Mentes Abertas, 2020, pp. 377-419. p. 409.
227
FREITAS, op. cit.
90
228
FREITAS, Clodoaldo. Os fatores do coelhado: escorço de história. 2. ed. Teresina: Academia Piauiense de
Letras, 2019, p. 30.
91
229
FREITAS, Clodoaldo. Os fatores do coelhado: escorço de história. 2. ed. Teresina: Academia Piauiense de
Letras, 2019.
230
Apesar de não ter adquirido título de marquês, esse forjamento de um marquesado que Taumaturgo considerou
acerca do domínio de Coelho Rodrigues é interessante no sentido de percebermos a força deste na política em
início do regime republicano, força essa que não somente se igualou, mas ultrapassou no momento, como
veremos, o domínio que estabeleceu por muito tempo o político liberal, Marquês de Paranaguá, no território. O
Marquês de Paranaguá, na república, vai ser adepto discreto do Partido Democrata, partido esse de oposição ao
Federal.
231
AZEVEDO, Gregório Taumaturgo de. Estado do Piauhy. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 10 de agosto de
1890. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=1597.
92
Partido Democrata. Neste sentido, mediante acusação, Coelho Rodrigues teria se dirigido em
diversas ocasiões ao ministro Campos Sales para que intervisse nas nomeações para a
magistratura no Piauí. Exemplo salutar foi a suposta impugnação da nomeação de Clodoaldo
Freitas para o cargo de juiz de direito da comarca de Campo Maior, impugnação atribuída a
Coelho Rodrigues e certamente o principal fator que motivou Clodoaldo à escrita do livro
crítico “Os fatores do coelhado”.
Alegando justiça, Coelho Rodrigues justificou-se em publicação no Jornal do
Comércio quanto às acusações adversárias daquilo que reproduziam como práticas do
coelhado. Apontou que teria enviado diversas cartas ao governador Taumaturgo para que não
tomasse partido em situação de nomear ou fazer alteração na magistratura, senão quando se
pudesse contemplar conjuntamente um membro de cada um dos antigos partidos. Em
resposta, segundo Coelho Rodrigues, o governador teria lhe telegrafado recomendando que
não perturbasse nas suas combinações. Posteriormente, Taumaturgo teria pedido a nomeação
de Clodoaldo Freitas para o cargo acima mencionado. Como negativa da sua posse, Coelho
Rodrigues destacou o perfil de Clodoaldo como antigo radical, de escritos antirreligiosos, e
que o mesmo teria escrito uma biografia a seu respeito, publicada sem o conhecer, o que
certamente gerou intriga, pois o conteúdo seria ofensivo.232
Em carta publicada no Jornal do Comércio sob a epígrafe Estado do Piauí,
Taumaturgo deu mostras da maneira como o dito coelhado foi se estabelecendo. Relatou
desde o início da sua administração e a forma como teriam os federais se indisposto contra o
mesmo para que acabasse sendo retirado do poder. Muitos daqueles que estiveram próximos
do governo e do partido democrata foram destituídos de cargos e removidos para outros
estados. Podemos ver isso em parte do relato transcrito abaixo, onde, ao mesmo tempo em
que criticava as práticas do dito coelhado, Taumaturgo procurou defender os oposicionistas do
domínio do Partido Federal e de Coelho Rodrigues no Piauí:
O republicano conselheiro, em satisfação à sua nefasta política de ódio e
exclusões, para formar seu coelhado, removeu o Dr. Souza Lima de
Therezina para a Bahia e deportou de Amarante para a comarca de
Morrinhos, em Goyáz, elevada adrede de categoria, o Dr. Jesuíno José de
Freitas, magistrado honesto, circunspecto e digno da consideração do
governo, mas que tem o defeito de ser irmão do benemérito e sempre
chorado desembargador José Manoel de Freitas, que era liberal, bemquisto
232
Curiosidade sobre a escrita dessa biografia, mediante o que afirmou Coelho Rodrigues, foi de que o Marquês
de Paranaguá, considerando “de valor” a obra, pretendia premiar Clodoaldo Freitas pela sua realização com uma
vara de direito, mas teria sido impedido pela República. RODRIGUES, Antônio Coelho. Estado do Piauí III.
Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 27 de julho de 1890. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=1486.
93
por todos que com elle tratárão, tanto quanto o Dr. Coelho Rodrigues é
odiado pelos bons piauyenses, justa quibus est ira, e por quantos o
conhecem, excepção dos que delle precisão para algum fim.233
O citado Jesuíno José de Freitas, para além de ser irmão de um desafeto antigo de
Coelho Rodrigues, foi um dos nomes que Taumaturgo enviou como solicitação ao governo
provisório da República para ocupar o lugar de Theodoro Pacheco, como segundo vice-
presidente, como vimos anteriormente. No período das remoções citadas encontrava-se no
governo do estado do Piauí o já citado Joaquim Nogueira Paranaguá. O mesmo foi duramente
criticado por Clodoaldo Freitas no seu livro, sendo taxado de “inaugurador do coelhado”.234
Em publicação posterior de Taumaturgo, em agosto de 1890, o mesmo procurou
denunciar o levantamento daquilo que considerou intriga e mentiras contadas tanto por
Coelho Rodrigues quanto pelo primo deste, Eliseu de Souza Martins, no Rio de Janeiro.
Dentre as supostas mentiras contadas para a sua destituição estava a de tentativa
antirrepublicana de restauração do domínio do marquesado de João Lustosa da Cunha
Paranaguá, o Marquês de Paranaguá.235 Antes disso, em conversa com Eliseu, apresentada no
Jornal do Comércio, Coelho Rodrigues já tinha demostrado seu suposto receio de que o
governador tentasse manter o marquesado, e que, portanto, era preciso toma-lo do marquês.236
Esse foi um dos fatores que Taumaturgo apontou como mentiras difamadas a seu
respeito para que fosse minada a sua administração. Isso pelo fato de que com a queda da
monarquia e a posterior instalação da República os políticos do centro do governo provisório
do Marechal Deodoro tinham como pretensão acabar com determinadas forças imperiais
ainda persistentes. Paranaguá era um dos políticos mais influentes e respeitados do regime
imperial, isso lhe rendeu o título de marquês, porém com a instalação da República cessou o
poder de onde vinha sua força. As denúncias feitas por Coelho Rodrigues e Eliseu Martins
poderiam de fato prejudicar a administração de Taumaturgo ao ser este associado à suposta
233
AZEVEDO, Gregório Taumaturgo de. Estado do Piauhy IV. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 12 de agosto
de 1890. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=1613.
234
FREITAS, Clodoaldo. Os fatores do coelhado: escorço de história. 2. ed. Teresina: Academia Piauiense de
Letras, 2019, p. 37.
235
AZEVEDO, Gregório Taumaturgo de. Estado do Piauhy. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 14 de agosto de
1890. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=1628.
236
RODRIGUES, Antônio Coelho. Estado do Piauhy II. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 25 de julho de
1890. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=1474.
94
restauração do marquesado de Paranaguá no Piauí, pois assim passava a se tornar suspeito aos
princípios da nova ordem republicana.
Em complemento a essa suposta mentira que Taumaturgo afirmou ter sido levantada a
seu respeito, o empossamento de Joaquim Nogueira no seu lugar seria, mediante o que teriam
afirmado os seus acusadores, o melhor meio de barrar o marquês de Paranaguá, que
supostamente estava de acordos com o governo do estado. A substituição se faria importante
pelo fato de que teria sido afirmado que nenhum adversário intransigente já teve o marquês do
que seu próprio sobrinho Joaquim Nogueira. Este seria digno de substituir Taumaturgo no
governo, como republicano histórico e chefe do partido republicano do estado, minando assim
a suposta política de revitalização do marquesado no Piauí. Taumaturgo negou a acusação
afirmando que Joaquim Nogueira foi amigo e protegido do marquês, e não seu “adversário
intransigente”, como afirmavam os acusadores.237
A relação entre o Marquês de Paranaguá e Joaquim Nogueira teria sido respeitosa.
Ambos faziam parte da mesma família, porém estariam separados pelo fato de que defendiam
princípios opostos, segundo afirmação deste último. Nogueira seria republicano, enquanto o
marquês, monarquista. Em carta enviada a Coelho Rodrigues e Eliseu Martins, publicada no
Jornal do Comércio, Joaquim Nogueira teria declarado que, com o advento da República,
empregou esforços para que “o mais notável acontecimento da pátria” fosse recebido no Piauí
com satisfação geral. Segundo o mesmo, pretendia entender-se com seus parentes com a
esperança de vê-los unidos para o mesmo fim.238
Nogueira teria exposto que, com a formação dos novos partidos, pretendia o apoio da
família, consequentemente do próprio Marquês de Paranaguá, para a sua causa dita
republicana. Segundo um fragmento da carta, Joaquim Nogueira acreditava que Paranaguá “se
resignasse ao papel que representou no Império, deixando liberdade aos parentes que o
acompanhárão, e que provavelmente virião todos comnosco (referindo-se aos parentes), como
já estão em grande número, se o marquês se tivesse abstido”. 239 Foi afirmando pelo próprio
Joaquim Nogueira em carta ao Marquês de Paranaguá que se a divergência entre ambos era
determinada por princípios políticos, sendo este último monarquista, e tendo triunfado a
237
AZEVEDO, Gregório Taumaturgo de. Estado do Piauhy. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 14 de agosto de
1890. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=1628.
238
PARANAGUÁ, Joaquim Nogueira. Exms. Srs. Drs. Coelho Rodrigues e Elizeu Martins. In: RODRIGUES, A.
Coelho. Estado do Piauhy. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 20 de agosto de 1890. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Estado%20do%20Piauhy%22&p
agfis=1680.
239
Idem.
95
República, à qual Nogueira advogava, era conveniente a união da família em torno deste
último.
Porém, não foi isso o que teria se sucedido. Afirmou Nogueira que sabendo mais tarde
que o Marquês desejava continuar a influir na política do Piauí, teria tomado a posição de
levar a público os fatos políticos que supostamente se estabeleciam sob a inspiração do então
ex-governador Taumaturgo.240 Tais fatos, pelo que se percebe, seriam aquilo que os
acusadores Coelho Rodrigues e Eliseu Martins apresentaram como uma tentativa de
revitalização do marquesado de Paranaguá no estado, levando o governo da República a
intervir na administração piauiense, o que Taumaturgo e Clodoaldo atribuíram à obra do dito
coelhado.
Considerando os fatos narrados, no dia 04 de junho de 1890, após as recomendações
advindas da capital do Brasil, Rio de Janeiro, Taumaturgo foi exonerado do seu cargo,
passando a administração do estado do Piauí a Joaquim Nogueira Paranaguá. Estava
definitivamente estabelecida aquilo que Clodoaldo Freitas posteriormente narrou no seu livro
“Os fatores do coelhado” como sendo a inauguração do domínio do coelhado no Piauí. Esta
forma de se fazer política iniciada em Joaquim Nogueira, teria sido continuada por um bom
período mediante a administração dos seus sucessores, Gabino Besouro, João da Cruz e
Santos (Barão de Uruçuí), Álvaro Moreira de Barros Oliveira Lima, Gabriel Luiz Ferreira e o
início da administração de Coriolano de Carvalho e Silva.241
Na narrativa de Clodoaldo acerca das administrações do dito coelhado, ainda que
afirmasse estar pautado em documentos e assegurando fidelidade dos fatos, utilizou-se da sua
obra, segundo Ferreira, para “restaurar verdades, vingar os derrotados e expor os vícios dos
vencedores”.242 Nesse sentido, ao construir a história o autor, partindo da sua própria
experiência fracassada dentro do período de domínio do coelhado, selecionou acontecimentos
e levantou argumentos com pretensões de desfavorecer e hostilizar os seus opositores. Nesse
sentido, vejamos como o autor narrou as administrações do dito coelhado no Piauí.
Ao tratar da passagem administrativa para Joaquim Nogueira, Clodoaldo narrou que
“o infeliz estado estava entregue à horda famélica e selvagem” 243 do coelhado. Sua
240
PARANAGUÁ, Joaquim Nogueira. Exms. Srs. Drs. Coelho Rodrigues e Elizeu Martins. In: RODRIGUES, A.
Coelho. Estado do Piauhy. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 20 de agosto de 1890. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Estado%20do%20Piauhy%22&p
agfis=1680.
241
FERREIRA, Ronyere. Clodoaldo Freitas, historiador: história, política e ressentimentos. In: FREITAS,
Clodoaldo. História de Teresina. 2. ed. São Paulo: Mentes Abertas, 2020, pp. 377-419.
242
Idem, p. 414.
243
FREITAS, Clodoaldo. Os fatores do coelhado: escorço de história. 2. ed. Teresina: Academia Piauiense de
Letras, 2019, p. 33.
96
administração acabou resumindo-se, nas palavras de Clodoaldo, como um governo que estaria
destruindo tudo aquilo que Taumaturgo teria iniciado. Dentre algumas das medidas, teria
dissolvido a polícia e criado o corpo de segurança, realizado reformas no ensino público, além
do número citado de mais de 300 supostas demissões de empregados públicos.244
Foi relatado por Clodoaldo um ato de perseguição que teria ocorrido contra a sua
pessoa. Isso pelo fato de que teria proferido discurso na comarca da União onde apresentava
Coelho Rodrigues como “inimigo da pátria e fator de todos os males no Piauí”.245 O
governador Joaquim Nogueira sabendo do ocorrido supostamente acabou mandando o chefe
de polícia abrir inquérito contra Clodoaldo. No mesmo discurso, este acusou de estelionato o
ato da anulação do decreto que o nomeava Juiz de Direito de Campo Maior. Muitas das
críticas de Clodoaldo giravam em torno do ressentimento ocasionado pela perca do cargo que
almejava no estado.
Além do suposto caso ocorrido contra a sua pessoa, o autor relatou suposta fraude
eleitoral que teria ocorrido para fazer vencer o próprio governador Joaquim Nogueira, quando
concorria à vaga de deputado para a formação do primeiro Congresso da República. Dentre as
práticas para garantir a vitória teria espalhado pelo estado as forças de linha do 35° Batalhão
de Infantaria e a polícia. Segundo relatado, títulos de eleitores democratas não eram
entregues, além de que supostamente votaram policiais disfarçados de eleitores democratas.246
Com o sucesso na eleição de Joaquim Nogueira para ocupar a vaga que almejou de deputado,
foi empossado em seu lugar como governador pelo Piauí, o capitão de engenheiros Gabino
Susano de Araújo Besouro.
Clodoaldo narrou que um dos primeiros atos de Gabino Besouro ao assumir o governo
em 23 de agosto de 1890 foi realizar os melhoramentos dos desterros infligidos a diversos
magistrados pelo seu antecessor. Porém, pouco tempo depois a oposição novamente teria
sofrido as pressões do governo. Por meio de suposta fraude eleitoral, o governador teria
elegido os quatro deputados e três senadores da situação, logo o total de vagas como
representantes pelo Piauí para as casas legislativas na capital da República. Além disso,
Besouro teria aplicado a política de perseguição aos críticos de sua administração.
Um dos casos narrados foi da crítica que Coelho de Resende, político de oposição na
época e redator-chefe do Jornal A Democracia, teria feito ao governador neste periódico.
Julgando-se ofendido, Besouro teria mandado prender Coelho de Resende, o qual somente
244
FREITAS, Clodoaldo. Os fatores do coelhado: escorço de história. 2. ed. Teresina: Academia Piauiense de
Letras, 2019.
245
Idem, p. 36.
246
Idem, p. 38.
97
acabou solto por iniciativa dos seus colegas em irem ao Rio de Janeiro solicitar sua liberdade.
Segundo passagem do próprio Clodoaldo quanto ao ocorrido, afirmou que “o capitão Besouro
não tolerava os ataques da oposição e pretendia governar sem que, nestes escuros domínios do
coelhado, uma voz se erguesse destemida para censurá-lo. Por honra do jornalismo piauiense,
o déspota não conseguiu amordaça-lo [no caso, a Coelho de Resende]”.247
Com uma administração curta, resumida por parte dos seus opositores a tais práticas,
assumiu o lugar de Gabino Besouro, o bacharel Álvaro Moreira Barros de Oliveira. Enquanto
este vinha da capital para tomar posse do governo do estado, administrou o Piauí por um curto
período, de 19 de outubro a 26 de dezembro de 1890, o Barão de Uruçuí. Apesar de pouco
tempo, em seu governo foram narradas diversas práticas tidas como antidemocráticas pela
oposição.
Dentre atos destacados da sua administração, Clodoaldo citou a remoção do “honrado”
Cirilo Mota, de juiz municipal das Barras-PI e a rescisão da concessão do privilégio da
estrada de ferro do Amarante ao rio de São Francisco, dado aos engenheiros Newton
Burlamaqui e Benjamin Franklin. Clodoaldo apontou que o Barão de Uruçuí, em acordo com
Firmino Pires Ferreira e Eliseu Martins, conseguindo para si os privilégios da estrada de ferro,
vendeu por grandes somas obtendo o enriquecimento a partir de suposta prática corrupta.
As críticas de Clodoaldo não se limitaram aos supostos acima, o autor mencionou que
na sua política o Barão barrou a atuação de jornais de oposição e supostamente superfaturou
obras públicas. Quanto a esta última acusação, apesar da construção da estrada que ligaria a
capital Teresina à Colônia da Gameleira ser considerado um melhoramento, Clodoaldo não
deixou de apontar como prática para gasto de dinheiro público. Isso pelo fato de que a dita
estrada já existia e as somas destinadas para sua suposta construção teriam sido exageradas, o
que com quantidade menor de dinheiro poderia simplesmente ser batida, 248 segundo
Clodoaldo.
Sempre apresentado como o político perverso ao qual estava servindo o governo do
Piauí, Clodoaldo afirmou que as práticas de violência sofridas por diversas pessoas na época
eram obra da política de Coelho Rodrigues, o qual mesmo encontrando-se na Europa
redigindo seu projeto de código civil, supostamente influenciava com seus representantes na
política piauiense. Nesse sentido, o autor teria apontado que “o nobre Barão, como um dos
247
FREITAS, Clodoaldo. Os fatores do coelhado: escorço de história. 2. ed. Teresina: Academia Piauiense de
Letras, 2019, p. 46.
248
Na época as estradas que ligavam lugares relativamente distantes eram de terra. Aplicavam-se recursos para
que determinadas empresas batessem essa terra no sentido dela ficar mais firme, por isso a referência de
Clodoaldo à estrada ser simplesmente “batida”.
98
fatores do coelhado, não podia transigir e o seu governo, triste seguimento e triste
prosseguimento dos outros, não devia desviar-se uma linha da direção traçada pelo espírito
infernalmente perverso do malvado a cujas ordens servia”.249 Exemplo das supostas
violências praticadas na administração do Barão foram relatados em Jaicós, onde Benedito de
Alencar teria feito seus “mais terríveis desatinos” contra opositores políticos. Citou ainda a
prática de violência supostamente exercida pelo parente de Coelho Rodrigues, o coronel
Clementino de Souza Martins contra Aproniano de Barros Cavalcante. Todos praticando a
suposta política do “chefe supremo” do dito coelhado.
Enfim teria chegado ao Piauí o bacharel Álvaro de Oliveira Lima para assumir o cargo
de governador para o qual havia sido nomeado. Entrando em exercício no dia 26 de dezembro
de 1890, Clodoaldo narrou que o seu governo trazia uma única recomendação da capital, a
qual seria “ser compadre do conselheiro Coelho Rodrigues”.250 A oposição definiu o seu
governo como sendo ausente de princípios morais e cheio de velhos hábitos corruptos. Isso
pelo fato de que, por exemplo, para eleger o congresso do estado com representantes
escolhidos a dedo, sendo a oposição “radicalmente batida”, teria destacado praças de oficiais
do 35° Batalhão de Infantaria para os diversos municípios do Piauí.
Segundo Clodoaldo, Álvaro Lima era “uma joia inventada pelo patrão-mor do
coelhado”,251 servindo a todos os seus desejos. O autor relatou que, na sua administração,
policiais disfarçados ou capangas utilizavam-se dos títulos eleitorais de democratas em
Teresina, União, Barras, Amarante e outros lugares para votarem nos candidatos oficiais.
Teria feito ainda prevalecer o sistema de eleições a bico de pena, onde a junta apuradora
lavrava os resultados eleitorais de acordo com as determinações do poder local.
Foi dessa forma que a oposição definiu a maneira como Gabriel Luís Ferreira foi
eleito. Até então os governadores empossados teriam sido nomeados diretamente pelo
governo federal. Gabriel Ferreira foi o primeiro governador eleito pelo sufrágio universal do
congresso do estado. Tomou posse do cargo no dia 27 de maio de 1891. Até então as
administrações do Piauí governaram por pouco tempo, Gabriel Ferreira, por outro lado,
sustentou-se no poder até o final deste ano, a 21 de dezembro.
Segundo Clodoaldo, Gabriel Ferreira recebeu o poder do estado em um período de
relativa estabilidade política, pois não encontrava nenhuma oposição forte, apesar de poucas
resistências do Partido Democrata. Nas palavras do autor, “nunca um partido conseguira
249
FREITAS, Clodoaldo. Os fatores do coelhado: escorço de história. 2. ed. Teresina: Academia Piauiense de
Letras, 2019, p. 48.
250
Idem, p. 48.
251
Idem, p. 50.
99
galgar o poder como o Federal. Todos os cargos públicos, toda a magistratura, toda a relação,
tudo lhe pertence”.252 Com a estabilidade e a força política do grupo da situação ao qual
esteve associado Gabriel, Clodoaldo apontou:
Seguro no poder, o governador não curou de nenhum melhoramento para
este infeliz Piauí. O serviço público correu da mesma forma que no tempo
dos outros, e, o que é mais grave, continuaram as mesmas depredações, as
mesmas ferozes violências das autoridades contra as garantias e liberdades
públicas sem coerção alguma de sua parte. Em Picos, o coronel Helvídio
Clementino de Souza Martins mandou publicamente, às cinco horas da tarde,
no meio da rua, capangas seus agredirem ao vigário Padre Dr. Benedito
Portela e o jornal oficial, O Piauí, de que era redator o ex-chefe de polícia,
Dr. Anísio de Abreu, criatura de Karnak, com um desembaraço vizinho do
cinismo, saiu em defesa do audaz criminoso, fazendo declaração expressa de
que estava obrigado a defender quantos federais resvalassem no abismo do
crime. Semelhante inaudita declaração do chefe de polícia do Estado mostra
o grau de desmoralização da administração do Dr. Gabriel Ferreira.253
Apesar de o autor apresentar o governo como condizente com as práticas de violência
exercidas por membros do grupo do governador, acrescentou fazer justiça em prol de Gabriel
Ferreira. Isso pelo fato de que este não teria feito diretamente violências a direitos adquiridos.
Apontou que o mesmo foi fraco no sentido de barrar os abusos, mas não teria se manchado do
que considerou crimes e vergonhas dos seus antecessores e sucessor. Apesar de ter feito jus
nesse sentido ao nome de Gabriel Ferreira, Clodoaldo considerou como “lado escuro e
criminoso” da sua administração o que seria o esbanjamento enorme que teria feito com
dinheiros públicos:
Ao Sr. Joaquim Santana deu só de uma vez 16:000$000 para consertos de
rampas e taludes no porto desta capital, serviço que não foi feito até hoje
como é notório; deu-lhe depois outras verbas sem que ele tivesse, como é de
lei, prestado contas das primeiras; deu ao Sr. João Mendes 20:000$000 para
fazer um alojamento nesta capital, para os colonos que se dirigissem para a
Gameleira; deu 3:000$000 a um caixeiro do Sr. José Martins Teixeira para
bater a estrada da Gameleira para União e 3:000$000 ao Sr. Raimundo
Gomes para bater a que vai daqui para a Gameleira; deu 3:000$000 ao Sr.
Gentil Pedreira para fazer uma ponte no grotão que fica à entrada da Estrada
Nova, nesta cidade; deu 5:000$000 ao Sr. Piauilino, para abrir uma estrada
entre São Raimundo Nonato e a fazenda Canto do Buriti. Acusado pela
oposição, o Dr Gabriel cassou algumas dessas verbas, declarando fazê-lo
para salvar a sua honra particular comprometida!254
Clodoaldo afirmou que se não fossem os esbanjamentos de dinheiros públicos
praticados na sua administração como os supostos acima, seu governo teria sido considerado
o melhor dos governos do coelhado. Isso pelo fato de que apesar da carência de atos de
252
FREITAS, Clodoaldo. Os fatores do coelhado: escorço de história. 2. ed. Teresina: Academia Piauiense de
Letras, 2019, p. 53.
253
Idem, p. 54.
254
Idem, p. 58-9.
100
violência diretos da sua parte cometidos contra a oposição, era um homem considerado por
Clodoaldo “de inteligência” que ocupou a cadeira administrativa.
Próximo do final da administração de Gabriel Ferreira ocorreu a mudança de governo
nacional. Com a ascensão de Floriano Peixoto como presidente do Brasil em 23 de novembro
de 1891, a oposição no Piauí pretendeu retirar do poder do estado o então governador e nesse
sentido acabar com a política de domínio do dito coelhado. Para Clodoaldo e os
oposicionistas esse período de crise era propício para se realizar a fusão de todos os grupos
que formavam oposição em um só partido, isolando assim o coelhado, considerado inimigo
comum das dissidências, resultando na sua queda, como reflexo da queda do Marechal
Deodoro da Fonseca do poder nacional.
Clodoaldo narrou que com a queda do Marechal Deodoro e a subsequente deposição
do governador do Maranhão, Lourenço de Sá, foi pensamento da oposição depor
imediatamente o governador Gabriel Ferreira. Reunindo-se com Firmino Martins foi decidido
organizar-se com indivíduos e grupos de força, como o Batalhão de Infantaria, para a
realização do movimento. Com o projeto organizado, só restava esperar o amadurecimento da
ideia na consciência popular, mediante considerado pelos lideres da oposição.255
Passados poucos dias, segundo Clodoaldo, o momento era propício. Gabriel Ferreira
se encontrava em ruptura das relações amistosas com o Barão de Uruçuí. A população da
capital estaria em grande acrimônia com relação ao governador. As forças da oposição
encontravam-se agitadas, por um lado os democratas, pelo outro o Partido Católico, estavam
em acordo pela realização da deposição de Gabriel Ferreira. O próprio genro do Barão de
Uruçuí, Elias Martins, encontrava-se associado ao movimento dos grupos dissidentes.
Com as forças unidas em torno do objetivo de depor o governador, foram realizadas
algumas conferências públicas com os principais representantes do movimento e populares.
Dentre as personalidades que tomaram a dianteira da revolta estavam o próprio Clodoaldo,
Higino Cunha, Francisco de Paula Alvelos, José Euzébio, Antônio Costa, Elias Martins, José
Lopes, Antônio Diniz, José Luís, dentre outros. Uma comissão formada por esses membros
ficou responsável por expor ao Quartel de Linha, na representação do Coronel José Ramos, os
intuitos do movimento organizado em prol da retirada do governador Gabriel Ferreira do
poder. Este, sem necessidade da utilização de força, depois de conferência com os militares,
teria renunciado do cargo. Quanto ao ocorrido, Clodoaldo narrou:
255
FREITAS, Clodoaldo. Os fatores do coelhado: escorço de história. 2. ed. Teresina: Academia Piauiense de
Letras, 2019, p. 61.
101
258
FREITAS, Clodoaldo. Os fatores do coelhado: escorço de história. 2. ed. Teresina: Academia Piauiense de
Letras, 2019, p. 74-5.
259
Idem, p. 94.
103
absolutas do coelhado”, como regime “perverso e mau” de dominação da política que tinha
como “fator supremo” Coelho Rodrigues. Este, no ano de 1892, segundo Clodoaldo, da
Europa, onde estava residindo o último ano trabalhando na realização da escrita do projeto de
código civil da República desde 1890, não cessava de animar ao governador Coriolano o
exercício da sua administração.260
O governo de Coriolano correspondeu com o período em que Coelho Rodrigues, após
regressar da Europa, tornou-se senador pelo Piauí. Coelho Rodrigues estava cotado pelos seus
partidários no estado piauiense para assumir o cargo de senador da República desde o ano de
1890. O mesmo na época conseguiria facilmente se eleger, porém dispensou a candidatura
pelo fato de ter fechado contrato com o governo para a realização do projeto de código civil,
de exclusiva dedicação.
Com a morte de Theodoro Pacheco, segundo Joaquim Nogueira Paranaguá, o nome de
Coelho Rodrigues era o mais cotado para substituí-lo no senado.261 Houve alguns embaraços
por parte do governo para que fosse reconhecido candidato eleito, tendo em vista o
fechamento do contrato para a realização do trabalho de codificação. Com o seu retorno da
Europa no final do ano de 1892 foram abertos requerimentos junto aos seus partidários para
que fosse reconhecido senador eleito. Depois de algumas tentativas, com a justificativa de ter
terminado o projeto de código civil, a Comissão de Constituição e Poderes, formada por
Aristides da Silveira Lobo, Quintino Bocayuva e Nina Ribeiro, no dia 04 de maio de 1893,
apresentou o seguinte parecer:
A Commissão de Constituição e Poderes á que forão presentes as authenticas
e a apuração da eleição senatorial a que se procedeu, em 31 de janeiro do
corrente anno, no Estado do Piauhy, verifica que a maioria de votos, na
importância de 7.889, que constitue maioria sobre todos os votados, recahio
no cidadão Dr. Antônio Coelho Rodrigues, pelo que é a comissão de parecer
que seja reconhecido e proclamado senador pelo Estado do Piauhy, o Dr.
Antônio Coelho Rodrigues.262
Coelho Rodrigues tomou assento no senado no dia 09 de maio de 1893. A escrita dos
“fatores do coelhado” não contemplou o período da sua ascensão a esse importante cargo na
representação nacional, o que certamente teria rendido mais páginas da história do
ressentimento dos grupos de oposição que viam ascender aos principais cargos
260
FREITAS, Clodoaldo. Os fatores do coelhado: escorço de história. 2. ed. Teresina: Academia Piauiense de
Letras, 2019, p. 85.
261
ELEIÇÃO NO PIAUHY. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 24 de março de 1895. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=16723.
262
CONGRESSO NACIONAL: SENADO (pareceres). Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 05 de maio de 1893.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=10927.
104
263
FREITAS, Clodoaldo. Os fatores do coelhado: escorço de história. 2. ed. Teresina: Academia Piauiense de
Letras, 2019, p. 99.
264
RODRIGUES, Antônio Coelho. A República na América do Sul ou um pouco de história e crítica oferecida
aos latino-americanos, 1906. Brasília: Senado Federal, 2016.
105
265
FERNANDES, Ronaldo Costa. In: RODRIGUES, Antônio Coelho. A República na América do Sul ou um
pouco de história e crítica oferecida aos latino-americanos, 1906. Brasília: Senado Federal, 2016.
266
RODRIGUES, Antônio Coelho. A República na América do Sul ou um pouco de história e crítica oferecida
aos latino-americanos, 1906. Brasília: Senado Federal, 2016, p. 92.
106
267
CHACON, Vamireh. História dos Partidos Brasileiros. Brasília: Universidade de Brasília, 1981.
107
Um dos representantes políticos pelo Piauí que compuseram a cúpula do partido foi
Coelho Rodrigues, ao lado de políticos correligionários como o próprio Joaquim Nogueira
Paranaguá, que do Piauí teria sido um dos executores da política do coelhado, segundo as
críticas de Clodoaldo Freitas. Dentre as personalidades que fizeram parte do PRF em escala
nacional, além dos já citados, mediante a lista dos representantes principais do Partido
publicada no Jornal do Comércio, estão: Quintino Bocayúva, Nina Ribeiro, Manoel Victorino
Pereira, Prudente de Morais Barros. Este último vai se tornar o primeiro presidente civil do
Brasil por esse partido, após o fim do governo militar de Floriano Peixoto.268
Apesar de eleger o presidente da República, Prudente de Morais, em 1894, mais pela
sua hegemonia do que pela sua organização, pois contava com o maior apoio dos federais dos
estados brasileiros, o PRF foi uma agremiação bastante diversificada e com posições políticas
antagônicas. Congregaram-se dentro do Partido elementos conservadores, liberais,
republicanos históricos e adventícios, além dos indivíduos que não tinham nenhum interesse
partidário. Isso certamente foi fator contribuinte para que a organização do PRF não durasse
muito tempo, o que levou ao fim do mesmo no ano de 1897, logo após a tentativa de golpe do
vice de Prudente, Manuel Victorino, em união com Francisco Glicério, pelo assentamento do
poder dos jacobinos florianistas.269
Coelho Rodrigues foi um dos políticos que operacionalizou dissidência do PRF no
final do ano de 1895 e início do ano de 1896, quando ainda ocupava uma das cadeiras no
senado da República como representante do Piauí em fins do seu mandato. Nacionalmente, as
relações de Coelho Rodrigues com o diretório do PRF e, sobretudo, com Francisco Glicério
foram abaladas. Mediante publicação de uma carta no Jornal do Comércio, Coelho Rodrigues
teria sinalizado ao governador do estado do Piauí em 1895, o capitão Coriolano de Carvalho,
até então seu partidário, sobre o fato do Partido Republicano Federal, ou simplesmente,
Partido Federal, encontrar-se dividido na capital da República. De um lado estariam aqueles
que o mesmo intitulou de jacobinos na representação de Quintino Bocayuva e Francisco
Glicério; e do outro os democratas, chefiados por Almeida Barreto, João Severiano, Virgílio
Damásio, Christiano Benedicto Ottoni, Matta Machado, Bezerra de Menezes e o próprio
268
PUBLICAÇÕES A PEDIDO: PARTIDO REPUBLICANO FEDERAL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro,
05 de janeiro de 1895. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=15949.
269
CHACON, Vamireh. História dos Partidos Brasileiros. Brasília: Universidade de Brasília, 1981.
108
270
RODRIGUES, Antônio Coelho. Os capitães-generaes do Piauhy e o Partido Democrata Federal. Jornal do
Comércio. Rio de Janeiro, 20 de fevereiro de 1896. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=20311.
271
LESSA, Renato. A Invenção Republicana: Campos Sales, as bases e a decadência da Primeira República
Brasileira. 3 ed. Rio de Janeiro: Topbooks, 2015, p. 135.
109
proferindo violentos discursos contra o PRF, partido oficial ao qual o governo do estado foi
adepto.
Por outro lado, Coelho Rodrigues teria apontado que o Governo Federal, por meio da
pasta da guerra, estaria secundando esforços para a sua eliminação do meio político. Tal
assertiva se dava pelo fato de que o então general Pires Ferreira, seu ex-correligionário, após
conseguir ascender a um importante cargo de Comandante do 4° Distrito Militar, do estado de
São Paulo, e encontrar-se como adversário de Coelho Rodrigues, teria se disposto a pactuar
com o capitão Coriolano no Piauí por aquilo que supostamente se planejava estabelecer.
Trocando por miúdos, segundo Coelho Rodrigues, com interesses próprios de firmar sua
posição no Piauí, Coriolano, em acordo com Pires, rompeu sua aliança com Coelho
Rodrigues, partindo da suposta dissidência deste como uma justificativa para a eleição do
capitão Raymundo Arthur de Vasconcelos, o qual de fato acabou assumindo o cargo de
governador do Piauí em julho de 1896, substituindo Coriolano.
Pouco tempo após a ruptura entre Coelho Rodrigues e Coriolano de Carvalho, o
ministro da guerra cassava a nomeação do capitão Benovolo, até então responsável no Piauí
pelas obras militares. No seu lugar foi empossado Raymundo Arthur, que desde então
preparava juntamente com Coriolano, o caminho para as novas configurações políticas que
garantiriam o sucesso dos seus interesses e isolamento de determinados elementos, como no
caso de Coelho Rodrigues.272
A ascensão de Raymundo Arthur ao governo em 1896 significou uma quebra das
relações políticas entre a capital e o estado partindo de Coelho Rodrigues como personalidade
influente sobre o governo piauiense na representação nacional. As bases de apoio deste
estavam sendo minadas, de um lado pelo capitão Coriolano, o qual elegeu para substituí-lo no
governo do estado Raymundo Arthur, e por outro pelos ex-correligionários general Pires
Ferreira, como comandante do 4° distrito por São Paulo e próximo ao ministro da guerra, e o
próprio Joaquim Nogueira, que estava até então como deputado federal pelo Piauí, e também
rompeu relações com Coelho Rodrigues. Além disso, o próprio Francisco Glicério, que como
influente político durante os primeiros governos da República teria se indisposto contra
Coelho Rodrigues, haja vista a sua dissidência pelo PDF.
Logo, a partir de supostas interferências do governo central na política do Piauí, por
meio de acordo entre seus representantes João da Cruz, Anísio de Abreu, Pires Ferreira e
272
RODRIGUES, Antônio Coelho. Os capitães-generaes do Piauhy e o Partido Democrata Federal. Jornal do
Comércio. Rio de Janeiro, 20 de fevereiro de 1896. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=20311.
110
273
VÁRIAS NOTÍCIAS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 06 de novembro de 1896. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=22944.
274
RODRIGUES, Antônio Coelho. Ao Piauhy e aos piauhyenses. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 24 de
maio de 1899. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=32229
275
Idem.
111
Em escala geral, teria sido isso o que aconteceu com Coelho Rodrigues. O mesmo não
se encaixava como peça para a garantia do interesse de grupo que pretendia legitimar a
república, e por isso acabou excluído de um dos principais cargos da administração nacional,
o de senador. Resumindo, para a garantia do interesse de determinado grupo no poder da
nação, a república acabou sendo convertida em instrumento de certas personalidades políticas
do centro, das quais Coelho Rodrigues acabou sendo afastado, sobretudo por ser considerado
um ex-monarquista de que possivelmente viria a defender. Esse simbolismo em torno da
imagem de determinados políticos conservadores como condizentes com uma política
monárquica gerava a sua exclusão. Lembrando que Coelho Rodrigues foi bem próximo do
Imperador, a ponto de ter sido agraciado com o título de Conselheiro de Sua Majestade.
O fato é que o seu afastamento rendeu anos posteriores a escrita do livro “A República
na América do Sul”, onde certamente motivado pela frustração, tentou apresentar aos seus
contemporâneos o que na verdade a dita república estava se tornando. Desiludido com os
rumos do regime, Coelho Rodrigues na sua obra acabou expondo do seu ponto de vista a que
interesses a república que se formava servia, sobretudo a partir do governo Campos Sales.
Campos Sales foi o político que substituiu Prudente de Morais na presidência nacional
em 1898 e deu legitimidade ao que historicamente ficou conhecida como a república
oligárquica. Por meio da sua Política dos Estados, ou Política dos Governadores, conseguiu
estabelecer uma governabilidade para o regime. Segundo Lessa, os dez anos iniciais da
República, desde a sua instalação até o governo Campos Sales, foram de indefinição da
maneira como o regime deveria funcionar. Sales teria sido o presidente que conseguira
estabelecer um sentido para o funcionamento do sistema, mesmo que baseado em prática nada
republicana.276
O pacto oligárquico estabelecido por meio da Política dos Estados operacionalizou
uma sistemática que permitiu que a nação fosse controlada, evitando a suposta anarquia e
desordem social. Para tanto foi combinada, de um lado, a importância da unidade nacional, e
do outro, os particularismos regionais dos estados, sobretudo os estados maiores, como São
Paulo, Minas Gerais, Bahia, Rio de Janeiro e Pernambuco. Nesse sentido, as oligarquias
estaduais exerciam o poder local pleno e garantiriam por meio do voto, mesmo forçado, a
partir do sistema coronelista vigente nos municípios, um congresso que fosse plenamente de
acordo com os interesses do presidente da república. Por sua vez o exercício da presidência
276
LESSA, Renato. A Invenção Republicana: Campos Sales, as bases e a decadência da Primeira República
Brasileira. 3 ed. Rio de Janeiro: Topbooks, 2015.
112
cabia aos representantes dos grandes estados, por meio de eleições presidenciais controladas.
Isso garantiria a unidade nacional.277
Pelo que se percebe, Coelho Rodrigues acabou se tornando parte do grupo das elites
que, por meio da nova sistemática vigente, esteve como dissonante do poder. Aqueles que
acompanharam o percurso de Coelho Rodrigues até então podem se perguntar sobre o fato da
sua anterior relação próxima com Campos Sales, ainda no governo provisório de Deodoro em
1889, onde foi incumbido da execução do projeto de Código Civil, e porque o mesmo esteve
afastado dessa atividade com um ex-colega posteriormente na presidência da república ou
mesmo da política. O fato é que no período que decorreu o governo Campos Sales, pelo que
percebemos, a relação entre ambos já não foi tão amistosa, apesar de Coelho Rodrigues ter
sido empossado como prefeito do Distrito Federal durante o governo Campos Sales.
Podemos supor que os domínios do regime não partem simplesmente de um indivíduo,
são grupos que dispõem de interesses para a partilha do poder. As relações de políticos da
cúpula do governo Campos Sales com elites piauienses podem ter mudado, o que acarretou
em uma exclusão do elemento Coelho Rodrigues daquela política local. Isso não desconsidera
os particularismos de uma inimizade acarretada por desentendimento entre ambos no correr
do tempo, haja vista que Coelho Rodrigues no seu livro apontou que um dos motivos por ter
rompido relações com Sales foi, supostamente, “o seu bairrismo selvagem, a sua política
parricida e o seu vampirismo financeiro”.278
O fato é que Coelho Rodrigues foi critico no seu livro, sobretudo da maneira como a
política republicana a partir de Sales, acabou sistematizando a organização nacional em prol
dos interesses, sobretudo das elites oligárquicas sulistas, que dominaram e deram sentido à
república. O mesmo partiu da própria ineficácia do sistema legislativo vigente, materializado
na Constituição, como inicial meio de questionar aquilo que teria se imposto desde o início do
regime, e que mencionamos anteriormente, uma “Constituição ditatorial do Rio Grande”.
Carregada do positivismo, do qual Coelho Rodrigues foi crítico ferrenho, a constituição
supostamente legitimava um domínio sulista sobre a República brasileira em detrimento da
união.
O motivo disso diz respeito, sobretudo, aos interesses dos indivíduos, mas que Coelho
Rodrigues justificou como algo ligado às suas convicções filosóficas. Os ideais da filosofia
positivista de Augusto Conte exerceram muita influência sobre o século XIX e, sobretudo, na
277
LESSA, Renato. A Invenção Republicana: Campos Sales, as bases e a decadência da Primeira República
Brasileira. 3 ed. Rio de Janeiro: Topbooks, 2015.
278
RODRIGUES, Antônio Coelho. A República na América do Sul ou um pouco de história e crítica oferecida
aos latino-americanos, 1906. Brasília: Senado Federal, 2016.
113
279
VÁRIAS NOTÍCIAS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 30 de setembro de 1896. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=22579.
280
RODRIGUES, Antônio Coelho. A República na América do Sul ou um pouco de história e crítica oferecida
aos latino-americanos, 1906. Brasília: Senado Federal, 2016.
114
281
RODRIGUES, Antônio Coelho. A República na América do Sul ou um pouco de história e crítica oferecida
aos latino-americanos, 1906. Brasília: Senado Federal, 2016, p. 62-63.
115
Para curar dos males causados pela instalação da República que preservava interesses
particulares e consolidava uma sistemática de domínio antirrepublicana e por tanto
inconstitucional, mediante Coelho Rodrigues, este expressou sua opinião. Antes que
monarquista ou republicano Coelho Rodrigues se dizia patriota. De fato, presou pela união
nacional da pátria e era avesso a separatismo. O mesmo dizia-se preocupado com a
possibilidade de dissolução do Brasil, por isso acreditava que a unidade da nação valia mais
do que a forma de governo. Porém, Coelho Rodrigues, desiludido com os rumos da política
republicana, no seu livro, se disse arrependido das criticas feitas ao antigo regime. O mesmo
afirmou ter tido mais segurança na monarquia e por isso nos deparamos com sua tendência à
restauração do sistema deposto como medida para salvar o Brasil de possível dissolução.
Tal possível dissolução supostamente ocorreria em meio ao assalto, em nome da união
nacional, feito por determinados grupos de interesses, sobretudo do Sul do Brasil escudados
pela dita República. Para Coelho Rodrigues, os grupos que compunham o centro do governo
da nação, incluindo Paulistas e os tradicionais do Rio, foram taxados como sendo aqueles que
seriam os exploradores do país, escondendo-se atrás daquilo que foi chamado de república
para praticar as suas "atrocidades" sobre o Brasil e os brasileiros.
Podemos enxergar nas entrelinhas os interesses que certamente estiveram para além da
sua luta política. Coelho Rodrigues encontrou-se em uma situação de vulnerabilidade diante
dos novos grupos, com interesses diversos, do centro do governo nacional. O mesmo não
mais se encaixou dentre os grupos no poder, a tirar pelo fato de que no decorrer do tempo
Coelho Rodrigues passou de uma situação de figura publica nacional de destaque, e
localmente um oligarca, ao qual foi atribuía a prática de domínio conhecida como coelhado
pelos seus opositores políticos, para uma situação de desiludido com os rumos tomados pela
política nacional e, sobretudo, pela dita república.
Coelho Rodrigues muitas vezes mostrou-se controverso, o que é justificável perante as
circunstâncias do seu tempo que tornaram possível sua postura. Sua estadia e viagens à
Europa o faziam inspirar-se nos regimes democráticos das repúblicas exteriores. Porém no
Brasil a prática da república não condisse com os reais significados de um regime que pregava
a democracia. Isso é passível de inspirar o sentimento de Coelho Rodrigues pelo retorno
monárquico, no sentido de que o mesmo acreditava na segurança e funcionalidade do regime
deposto, antes que a continuação de uma “república de fachada”.282
282
RODRIGUES, Antônio Coelho. A República na América do Sul ou um pouco de história e crítica oferecida
aos latino-americanos, 1906. Brasília: Senado Federal, 2016.
116
Porém, tal consideração não deve ser tomada como fim em si mesmo. O retorno à
monarquia configurava-se em um pensamento de Coelho Rodrigues não somente pelo fato de
que o regime deposto lhe proporcionava segurança em meio ao caos que foi a república em
seus começos. É eminente que sua posição social esteve mais segura enquanto reinou Pedro
II. As relações de Coelho Rodrigues no Império eram importantes para manter-se estável na
política nacional. Quando a nova forma de governo foi estabelecida, apesar de um suposto
sucesso inicial, as novas relações foram com o tempo mostrando-se instáveis. Isso é
perceptível na passagem do seu livro em que, com certa ironia, mostrou sua posição contrária
à Política dos Governadores:
O número dos nossos exploradores é relativamente pequeno, e apenas
mantém a sua indústria rendosa à sombra da tolerância da força armada.
No dia em que esta lhes faltar, não haverá inimigos a combater; porque os
mais graduados irão digerir no estrangeiro o fruto do nosso trabalho, e o
resto será capaz de proclamar a restauração da sra. d. Isabel, se não recear a
resistência dos que já tomaram o pulso ao seu Governo. Esses heróis da
política dos governadores só nos parecem gigantes, porque estamos de
joelhos, ou porque têm a seu lado a luz do poder, e nessa posição a sombra é
sempre maior do que o corpo.283
Na passagem Coelho Rodrigues deixou clara a sua posição diante da política nacional,
sobretudo com relação à Política dos Governadores. A passagem de 1904, logo no período do
governo Francisco de Paula Rodrigues Alves, mostra claramente um político que se desiludiu
com os rumos traçados pela República, certamente que com influência dos seus interesses.
Isso justifica o posicionamento de Coelho Rodrigues no sentido de restauração da monarquia,
antes que viver uma república de interesse de um grupo de políticos do bairrismo, como o
mesmo intitulou os grupos dominantes da política nacional, sobretudo no sul do país.
No caso em questão da sua desilusão republicana e tendência ao antigo regime
podemos pensar no seu fracasso durante o decorrer do tempo, fato que o motivou a preferir o
retorno monárquico. Em meio aos seus escritos, Coelho Rodrigues deixou transparecer as
adversidade pelas quais a política lhe fez passar, sobretudo na República. Podemos
mencionar, além de tudo o que foi discutido, o próprio fracasso, mesmo diante de várias
insistências durante vários anos no decorrer da República, para a aprovação do seu projeto de
Código Civil.
Isso está intrinsecamente ligado ao seu fracasso na política. O mesmo passou da
condição de representante nacional do Piauí reconhecido, para a de desiludido com o sistema.
283
RODRIGUES, Antônio Coelho. A República na América do Sul ou um pouco de história e crítica oferecida
aos latino-americanos, 1906. Brasília: Senado Federal, 2016, p. 93.
117
Isso pelo fato das adversidades que fizeram redefinir grupos, tornando-se Coelho Rodrigues
um sujeito relativamente esquecido no seu tempo, haja vista o seu fracasso.
118
284
AGUIAR, Antônio Chrysippo. Coelho Rodrigues e a ordem de silêncio. 1. ed. Teresina: 2006.
285
Para mais informações sobre direito privado e também sobre direito público, ver: REIS, Sebastião Alves dos.
Uma visão do Direito: Direito Público e Direito Privado. Revista de Informação Legislativa, Brasília, v. 35, n.
137, p. 63-68, jan./mar., 1998. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/332/r137-
06.pdf?sequence=4&isAllowed=y. Acesso em: 20/jan./2022.
119
privado brasileiro, reuniria em sua composição os elementos legislativos para garantia dos
direitos e obrigações da população civil, regulando relações familiares, patrimoniais e de
sucessão, relações de trabalho, direito de propriedade, dentre outras matérias.
Nesse sentido, faremos inicialmente um levantamento histórico de como se deu o
processo de codificação civil no Brasil, levando em consideração as informações que o
próprio Coelho Rodrigues levantou sobre o assunto e que compôs a segunda edição do seu
projeto de código civil, publicado em 1897 com uma história documentada abaixo do título
“Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos anteriores”. 286
Buscamos evidenciar nessa investida inicial a sua participação ainda no Império como um dos
jurisconsultos responsáveis pela revisão do texto legislativo civil escrito por Joaquim Felício
dos Santos, o terceiro a que foi confiado pelo governo imperial em 1881 a redação do código
civil.
Posteriormente, a intenção é perscrutarmos a sua própria contratação para a redação do
primeiro projeto de código civil da República a partir de 1890, logo que o novo regime foi
instalado. A intenção é discutirmos como se deu o processo que envolveu a aceitação ou não
do projeto escrito por Coelho Rodrigues como base para o código civil brasileiro.
Sustentamos que a investida de Coelho Rodrigues para a execução da sua obra legislativa
tornou-se a mais complexa das tentativas de codificação, isso pelo fato da dificuldade que
teve para, em meio às disputas de então, desenvolver um projeto que acompanhasse as
mudanças políticas operacionalizadas pela viragem da Monarquia à República, o que
demandava adequar a legislação ao que de mais novo exigia para ser executado no novo
regime.
Finalizamos a nossa discussão questionando e sustentando o quanto Coelho Rodrigues
foi participe dentro do processo de codificação civil, apesar de não constar na historiografia
como tal. Enquanto convidado especial, sua presença foi constante em reuniões que
aconteceram nas casas legislativas com a finalidade de discussão da procedência do projeto
daquele que o substituiu na empresa da codificação e o oficial codificador das leis civis
brasileiras, Clóvis Beviláqua. Este é um fato que não conta nos esparsos estudos sobre Coelho
Rodrigues. Isso nos fez pensa-lo como uma personalidade que muito fez por um trabalho de
época ao qual foi dada grande importância, e que no fim pouco reconhecimento teve quando
286
Para mais informações a respeito da segunda edição do trabalho realizado por Coelho Rodrigues, ver:
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
120
comparado com outras personalidades históricas expressivas do seu tempo envolvidas nesse
processo.
287
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
288
GRINBERG, Keila. Código Civil e cidadania. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001, p. 9.
121
abarcava todos os habitantes do país, ao passo que o código tornava-se importante regulador
das relações de todos aqueles capazes de constituir direitos e obrigações civis, ou seja, de
todos os cidadãos. Portanto, o código civil deve compreender as situações jurídicas de direito
privado existente entre cidadãos, e regular suas relações, por exemplo, de “comprar, vender,
trabalhar, casar, fazer testamento, herdar, comparecer em juízo como autor, réu ou
testemunha”.289
Desde a independência surgiu no Brasil a necessidade de elaboração do código civil,
composto de leis eminentemente nacionais. A Constituição de 1824 quando promulgada
anunciou a urgência com que deveriam ser formulados o código civil e criminal. Em 1831 o
Código Criminal brasileiro entrou em vigor e perdurou durante todo o Império, somente
sendo revisado anos mais tarde quando sobreveio a República. Por outro lado, o civil não
passava de uma ideia não consolidada.
No tocante às questões civis, o Brasil continuava regido pelas Ordenações Filipinas de
Portugal. As Ordenações Filipinas faziam parte do corpo de leis civis promulgada por
monarcas dos séculos anteriores ao iluminismo e aos teóricos da revolução francesa.
Sobretudo a partir da década de 1870 aumentava-se a pressão sobre o governo brasileiro para
a renovação da legislação civil. As ordenações eram tidas como corpo normativo que
simbolizavam o atraso, por fazerem parte das normas jurídicas anteriores às codificações, que
simbolizavam o novo e moderno na construção dos estados nacionais. Mediante João
Horácio, contemporâneo que escreveu sobre Coelho Rodrigues em 1890, quando este foi
contratado para redigir o seu projeto de código:
Nós, separados de Portugal há 64 annos, tendo promettido na nossa
constituição jurada em 25 de Março de 1824, um código civil fundada nas
bases da justiça e da equidade, até hoje nos regemos pelo Código Filippino,
lei barbara, anachronica, repudiada pela própria nação a que servio, replecta
de paradoxos e de velharias impossíveis, que assignalárão o domínio
absoluto, o feudalismo, as castas, o fidalgo e o plebeu, enfim todas essas
infinitas desigualdades odiosas, que as revoluções modernas hão procurado
extirpar do organismo social dos povos!290
Apesar da escrita de João Horácio datar de um período pós-instalação da República,
desde meados do século XIX não faltaram referências quanto à importância da renovação do
aparato legislativo civil como necessidade de um país que pretendia se tornar uma nação forte
e consolidada. Francisco Ignácio de Carvalho Moreira, o Barão de Penedo, desde 1845,
quando presidia o Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros, enfatizava o quão tenebroso
289
GRINBERG, Keila. Código Civil e cidadania. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001, p. 9.
290
HORÁCIO, João. Carta do Rio. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 22 de julho de 1890. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=1449.
122
era o quadro das nossas leis civis, a ponto de afirmar que “o país não tem legislação própria,
tal o seu estado de confusão”.291
Comentário no mesmo sentido teria feito anteriormente Francisco Jê Acaiaba de
Montezuma, o Visconde de Jequitinhonha, apontando ser urgente a discussão da matéria.
Segundo comentário de Manoel Pinto de Souza Dantas, quando senador, em discurso na
assembleia geral do senado em 1886, o mesmo teria afirmado que “nesta parte da América, a
Venezuela, o Chile, a República Argentina, todos tem o seu Código Civil. Só nós é que
estamos com estas leis vetustas, anachronicas e confusas da antiga metrópole”, referindo-se às
Ordenações. Concordando, Soares Brandão acabou concluindo que “não temos andado com
muito espirito prático nessa questão”.292
Mais tarde, com a publicação da história documentada do processo de codificação em
1897, Coelho Rodrigues reafirmou a importância de dotar o Brasil de um código civil. Tinha
tanto interesse na matéria que reuniu no seu histórico não apenas o processo que impugnou
sua obra, mas uma variedade de informações a respeito de todo o processo histórico
envolvendo a formulação de obra cara ao direito civil pátrio. Coelho Rodrigues quis externar
aos seus contemporâneos para além das frustrações envolvendo sua pessoa, muitos aspectos
que o colocam como um dos principais responsáveis por incitar as necessárias e urgentes
mudanças reclamadas pelas circunstâncias do seu tempo, que culminariam na formulação do
Código Civil de 1916.293
Em artigo publicado no Jornal do Comércio no ano de 1896, Coelho Rodrigues, ao
discursas sobre questões políticas, lembrou o quão custoso para determinados juristas
nacionais foi terem se envolvido com a obra legislativa de direito privado, o código civil.
Acabou relatando que para além de si próprio ter sido injustiçado com o fato de o seu projeto
tramitar sem sucesso nas casas legislativas, teria acometido a um dos iniciadores do processo
de codificação com a loucura e ao outro sobreveio a morte.294
Claro que o mesmo quis enfatizar o quão custoso foi no decorrer do tempo a
realização de uma obra até então inconclusa, e sem perspectiva para consolidação. As
291
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
292
ASSEMBLEIA GERAL: SENADO. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 05 de agosto de 1886. Disponível
em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=15865.
293
RODRIGUES, op. cit.
294
RODRIGUES, Antônio Coelho. Os capitães-generaes do Piauhy e o Partido Democrata Federal. Jornal do
Comércio. Rio de Janeiro, 20 de fevereiro de 1896. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=20311.
123
295
GRINBERG, Keila. Código Civil e cidadania. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.
296
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
297
Idem.
124
Compuseram a comissão José Carlos de Almeida Arôas, Antônio Joaquim Ribas, Braz
Florentino Henriques de Souza, Joaquim Marcelino de Brito, Jerônymo Martiniano Figueira
de Mello, Francisco José Furtado e Caetano Alberto Soares, sob a presidência do Visconde de
Uruguai. Depois de apresentados os pareceres em separado a comissão dissolveu-se, pois o
projeto se achava em esboço e, portanto, incompleto. Alegando anos mais tarde
incompatibilidade entre sua concepção jurídica e a do governo, Teixeira de Freitas teria
abandonado o contrato.
Mediante as considerações de Grinberg, os reais motivos para a desistência de Freitas,
segundo alguns, teria sido por conta da suposta loucura que o acometia, causada pelo excesso
da dedicação sem descanso à codificação da legislação civil.298 O próprio Coelho Rodrigues
apresentou a sua opinião nesse sentido afirmando acreditar que o “famoso jurisconsulto” teria
entrado em um “estado de monotonia religiosa [...], provavelmente por excesso de
trabalho”,299 o que o fez desistir, mesmo após o governo ter ampliado o prazo de entrega do
trabalho contando mais dez anos sobre os três firmados em contrato. A tal “monotonia
religiosa”, segundo Ramos, foi um conceito utilizado à época que significava um estado de
doença mental.300
Outros acreditavam que o motivo da sua desistência foram os relacionamentos
pessoais e divergências políticas e jurídicas entre o mesmo e personalidades da época. O fato
é que em 1867, Teixeira de Freitas escreveu ao governo uma carta onde deixava claro que
havia desarmonia entre seu pensamento e as vistas do Governo Imperial. Segundo Grinberg,
enquanto Freitas pretendia que o código abarcasse tanto o direito civil quanto o comercial, o
governo pretendia que o código civil abordasse apenas aspectos que contemplassem a
legislação civil. Teixeira de Freitas acreditava que dessa forma o código nasceria com um
mal, tendo em vista que estaria sempre subordinado ao código comercial.301
Com a quebra da relação entre Teixeira de Freitas e o governo esfriaram-se os debates
em torno da codificação. Somente no ano de 1872 foi decretado o contrato celebrado com o
conselheiro e senador Nabuco de Araújo para que entregasse ao governo do Império um
projeto de código civil. Segundo consta na história documentada apresentada por Coelho
298
GRINBERG, Keila. Código Civil e cidadania. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.
299
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
300
RAMOS, Henrique Cesar Monteiro Barahona. O “mandato divino” de Teixeira de Freitas: O jurista entre a
loucura e a fé. Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH, São Paulo, p. 1-14, julho, 2011.
Disponível em:
http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/14/1308185621_ARQUIVO_omandatodivinodeteixeiradefreitas
_ojuristaentreareligiaoeafe.pdf.
301
GRINBERG, op. cit.
125
Rodrigues, Nabuco de Araújo era o político e jurisconsulto mais preparado para suceder
Teixeira de Freitas na obra. O mesmo tinha acompanhado de perto como integrante da
comissão primária o processo de construção do projeto do primeiro codificador, por isso era o
mais apto para realizar o trabalho.302
Nabuco de Araújo tornou-se o segundo na tentativa de proporcionar ao Brasil um
corpo legislativo civil. Com previsão para começar os trabalhos no ano de 1873, contando três
anos para a execução do projeto, Nabuco acabou se dispondo ao exercício depois de fechar
contrato por meio de Duarte de Azevedo, este enquanto Ministro da Justiça. Apesar do tempo
estipulado, o trabalho se estendeu até 1878, ano em que Nabuco de Araújo acabou falecendo,
sem que houvesse concluído a obra. Na verdade o mesmo ainda não tinha escrito nenhum
texto, apenas reunido uma grande quantidade de notas e apontamentos.303
Segundo consta na história documentada de Coelho Rodrigues, isso acabou tornando-
se reflexo da vida agitada de Nabuco na política. O mesmo, quando contratado para a redação
do projeto de código civil, não deixou de exercer suas funções como Conselheiro de Estado e
Senador. Coelho Rodrigues mencionou que apesar da capacidade e preparo, essa vida agitada
bastaria para esgotar a atividade de Nabuco, o qual acabava prestando poucas horas a serviço
da redação do código. No final, foi entregue pelo seu filho, Sizenando Nabuco, material ainda
não coordenado e apenas redigido o título preliminar com 188 artigos e mais 182 da parte
geral, isto é, ao todo 300 artigos, pela maior parte calcados sobre o Esboço de Teixeira de
Freitas.304
Coelho Rodrigues reuniu as informações transmitidas por Sizenando, quando este deu
conta de apresentar ao então Ministro da Justiça, Lafayette Rodrigues Pereira, em 1878, a
obra inconclusa do seu pai. O mesmo apontou que quando Nabuco tomou para si a empresa
da codificação era preciso reformar a obra inteira. Pela complexidade da feitura do código, foi
necessário empreender uma revisão sistemática de todo o direito civil para começar então a
escrita do seu projeto. Da mesma forma que Teixeira de Freitas teria feito com o seu esboço,
Nabuco o fez, dividindo a matéria, distribuindo por índices alfabéticos, tomando os
302
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
303
Joaquim Aurélio Barreto Nabuco de Araújo, ou simplesmente Joaquim Nabuco, historiador, político e
diplomata brasileiro, filho de Nabuco de Araújo, produziu um livro biográfico a respeito do seu pai que, apesar
da proximidade do autor ao objeto de estudo, torna-se uma importante referência sobre a pessoa de Nabuco de
Araújo e, de maneira geral, sobre a política imperial brasileira. Para mais informações, ver: NABUCO, Joaquim.
Um estadista do Império: Nabuco de Araújo, sua vida, suas opiniões, sua época (1813-1857). Rio de Janeiro: H.
Garnier, Livreiro-editor, 1897.
304
RODRIGUES, op. cit.
126
305
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
306
Idem.
307
Para mais informações sobre Joaquim Felício dos Santos, ver: CARVALHO, Felipe Quintella Machado de.
Joaquim Felício dos Santos e a codificação do direito civil brasileiro. Revista Brasileira de Direito Civil –
RBDCivil, Belo Horizonte, v. 19, p. 63-96, jan./mar. 2019. Disponível em:
file:///C:/Users/win10/Downloads/362-965-1-PB.pdf.
308
GAZETILHA: CÓDIGO CIVIL BRAZILEIRO. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 05 de julho de 1881.
Disponível em:
127
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=3519.
309
Idem.
310
Idem.
311
GAZETILHA: PROJECTO DO CÓDIGO CIVIL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 15 de novembro de
1881. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=4391.
128
suppõe não haver propósito de trabalho sério na comissão não se refere a S. Ex. [a Coelho
Rodrigues]”.312
A comissão permanente foi oficialmente reconhecida em 09 de novembro de 1881,
quando expedido decreto do Ministério da Justiça. A partir de então teria ficado certo de que
os trabalhos em torno da codificação fossem conduzidos com a devida atenção. Porém, o que
de fato se sucedeu foi o suposto desinteresse por parte de membros da mesma, partindo do
próprio presidente Lafayette, que teria deixado Joaquim Felício sem resposta a respeito dos
trabalhos da codificação, quando este enviou àquele ofício pedindo conta dos resultados sobre
o processo. Segundo Antônio Felício, nem mesmo um cumprimento verbal adequado teria
sido dado quando o presidente encontrou-se pessoalmente com o seu tio.313
Na história documentada Coelho Rodrigues trouxe à tona os impasses entre os
membros da comissão, acarretando nas sucessivas saídas dos seus integrantes. Nela
apresentou a justificativa de Joaquim Felício para a suposta saída inicial do Conselheiro
Joaquim Ribas e Justino Gonçalves, os quais na sua visão teriam se sentido desautorizados
com o ato de 09 de novembro expedido pelo então ministro Souza Dantas. Tal ato previa que
a comissão não interrompesse os trabalhos de Joaquim Felício, mas antes acabasse se
constituindo como permanente e desse os devidos prosseguimentos aos trabalhos em torno da
codificação. Ficou a mesma funcionando a partir de então composta dos quatro demais
jurisconsultos, a citar: Joaquim Felício, Lafayette, Ferreira Vianna e Coelho Rodrigues. 314
Em março de 1882, portanto quatro meses depois de formada a comissão permanente,
Joaquim Felício acabou pedindo demissão do cargo que ocupava, o que gerou as críticas feitas
pelo seu sobrinho, Antônio Felício, à comissão. A principal justificativa apresentada pelo
próprio Joaquim Felício foi de que dentro desse período nenhuma reunião ou conferência
séria haviam sido realizadas, deixados os trabalhos jogados ao arbítrio do presidente da
mesma, Lafayette, que não estava dando a devida atenção, segundo Joaquim, a um serviço de
tanta importância.
No capítulo da história documentada sobre a história da comissão permanente, Coelho
Rodrigues escreveu que teria tentado a conciliação dos membros para que a comissão não se
desfizesse. Porém, tendo em vista o atrito entre Lafayette Pereira e Joaquim Felício,
312
SANTOS, Antônio Felício dos. Commissão do código civil. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 14 de março
de 1882. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=5178.
313
Idem.
314
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
129
aumentado depois de trocas de ataques críticos nos jornais, este último teria deixado o cargo
ao qual foi confiado. A comissão ficou então reduzida a três integrantes: Lafayette, o então
conselheiro Ferreira Vianna e Coelho Rodrigues.315
A saída de Joaquim Felício acabou abalando a vigência da comissão que dissolveu-se
no ano seguinte, em maio de 1883, quando Lafayette Pereira foi chamado para compor a
presidência do Gabinete Ministerial de 24 daquele mês. Até esse período os trabalhos da
comissão se resumiram nas tentativas do próprio Coelho Rodrigues para a continuação da
obra. O mesmo teria apresentado aos outros dois membros o seu articulado sobre a matéria de
que havia ficado responsável, referente aos direitos da família, resolvendo o presidente
Lafayette na ocasião animá-lo, afirmando que continuasse independente de novas sessões da
comissão, o seu estudo sobre a matéria até que “o ministro recomposse a comissão, como
promettera fazer, logo que tivesse do parlamento o necessário crédito, de que, aliás, não
cogitou”.316
Coelho Rodrigues ainda teria tentado, depois de dissolvida a comissão, no início do
mês seguinte, em junho, falar com o novo Ministro da Justiça, Conselheiro Francisco Prisco
Paraíso, sobre o trabalho em torno da codificação. No momento teria sido ponderado pelo
ministro que diante da pouca duração dos ministérios da monarquia, na inconveniência de se
mudar a direção de um trabalho complexo como este, foi resolvido que se continuasse no
mesmo estado de inércia, até que o conselheiro Lafayette pudesse retornar à direção da
comissão como seu presidente.317 O retorno almejado do conselheiro Lafayette, porém, não se
consolidou e durante os anos seguintes a comissão caminhava para ser oficialmente desfeita,
apesar de insistências da parte de Coelho Rodrigues.
Mediante aquilo que este último afirmou na sua história documentada, em meados do
ano de 1885 o Barão de Cotegipe, pouco tempo antes de montado o seu ministério, após
questionar Coelho Rodrigues uma noite sobre suas ideias a respeito de um plano e execução
de um código civil, teria pedido que reduzisse as ideias em um escrito e lhe mostrasse. Coelho
Rodrigues acabou aceitando a proposta feita e no final de julho de 1885 teria apresentado ao
Barão de Cotegipe seu plano de execução. Este último, depois de fazer um breve questionário,
segundo Coelho Rodrigues, recomendou que o guardasse até segunda ordem.318
315
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
316
Idem, p. 237.
317
Idem.
318
Idem.
130
319
JURISPRUDÊNCIA: NOTÍCIA SOBRE AS TENTATIVAS DE ORGANISAÇÃO DO CÓDIGO CIVIL
BRAZILEIRO. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 18 de janeiro de 1889. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=22065.
131
320
JURISPRUDÊNCIA: NOTÍCIA SOBRE AS TENTATIVAS DE ORGANISAÇÃO DO CÓDIGO CIVIL
BRAZILEIRO. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 18 de janeiro de 1889. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=22065.
321
Idem.
322
GRINBERG, Keila. Código Civil e cidadania. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001, p. 51.
323
JURISPRUDÊNCIA: NOTÍCIA SOBRE AS TENTATIVAS DE ORGANISAÇÃO DO CÓDIGO CIVIL
BRAZILEIRO, op. cit.
132
Um fato curioso de se destacar no mesmo plano foi a maneira como Coelho Rodrigues
pensou a regularização do casamento civil obrigatório para pessoas acatólicas. Apesar de ser
algo visado, não no sentido legítimo de justiça comum, pois continuava a obrigatoriedade do
casamento religioso para os católicos sem prejuízo do registro civil, essa acabou sendo a
estratégia pensada por Coelho Rodrigues como forma de incluir os praticantes de outras
crenças e religiosidades no quadro da justiça, garantindo assim a possibilidade de constituição
de família legítima e a legitimação dos seus direitos e obrigações como cidadãos nessa
sociedade em transformação.324 Outra curiosidade foi o fato de ter tocado na matéria do
casamento civil antes de ser formulada a lei que estabelecia o casamento civil no Brasil, obra
posterior e de sua própria autoria.
Mesmo com a apresentação do plano e a disposição de Coelho Rodrigues para se
ocupar do projeto de codificação, não houve mobilização do governo para dar fôlego à
redação do código civil até 1889. Nesse ano foi formada a última comissão no Império com a
pretensão de dotar o Brasil da obra de direito civil. Em julho, Cândido Luiz Maria de Oliveira,
que esteve como ministro da justiça, dirigiu ofício, publicado no Jornal do Comércio, ao
então Conselheiro Souza Dantas, informando sobre a organização da nova comissão nomeada
pelo Imperador para a elaboração de uma legislação civil que satisfizesse “as exigências do
progresso scientífico e as condições da civilisação do império”.325 Tal comissão deveria ser
composta pelo Conselheiro Souza Dantas, ao qual foi dirigido o ofício, Affonso Augusto
Moreira Penna, Olegário Herculano de Aquino e Castro, José Júlio de Albuquerque Barros, o
Barão de Sobral, José da Silva Costa e Antônio Coelho Rodrigues. Destaque para o fato de
que Coelho Rodrigues foi o único representante da original comissão de 1881, dissolvida em
1886, nomeado para compor a mais nova comissão de 1889.
Os trabalhos da última comissão imperial se deram em meio a algumas conferências,
muitas das quais presididas pelo próprio Imperador. Em uma das primeiras, depois de
divididos os pontos entre os membros, o ministro teria apresentado a matéria de que havia
ficado responsável, sobre o direito das sucessões. Na mesma ocasião o Conselheiro Olegário
apresentou o plano do primeiro livro da parte especial, o do direito das coisas. Foi discutido
ainda o Título Preliminar sobre a lei, seus efeitos e aplicação, de responsabilidade do Barão de
324
JURISPRUDÊNCIA: NOTÍCIA SOBRE AS TENTATIVAS DE ORGANISAÇÃO DO CÓDIGO CIVIL
BRAZILEIRO. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 18 de janeiro de 1889. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=22065.
325
GAZETILHA: CODIGO CIVIL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 02 de julho de 1889. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=23086.
133
Sobral. Coelho Rodrigues havia ficado responsável pela matéria do direito de família, cuja
exposição e discussão haviam sido marcadas para a próxima sessão, do dia 21 de agosto.326
A sessão não aconteceu no dia 21, sendo remarcada para o dia 23 daquele mês.
Novamente sobre a presidência do Imperador, compareceram todos os membros na reunião,
menos Affonso Penna, que esteve ausente das conferências até então realizadas por estar de
viagem à província de Minas Gerais sem motivo expresso no Jornal do Comércio. Depois de
ser apresentado por Coelho Rodrigues o índice sobre o direito de família, e discutida dentre os
membros presentes, a matéria acabou sendo aprovada. A Coelho Rodrigues foi então decidido
que desse continuidade aos seus trabalhos.327
A comissão reuniu-se em torno de nove vezes em conferências com durações médias
de duas horas e meia cada. Os trabalhos estavam sendo conduzidos com a devida atenção,
mediante considerável número de reuniões feitas, o que logo poderia ter rendido a formulação
do trabalho de codificação, já que seus membros estiveram comprometidos. Porém, com
poucos meses de vigência a comissão acabou se desfazendo logo após a queda da monarquia
em novembro de 1889. No Jornal do Comércio foi publicado o decreto do Ministro da Justiça
do governo provisório da República, Campos Salles, no dia 20 de novembro, resolvendo
dissolver a comissão criada em 01 de junho daquele ano, tendo em vista a mudança de regime
político para a República.328
Apesar das sucessivas tentativas, o Brasil continuava sem um código civil com a
viragem da monarquia à República. Muitos políticos reproduziam falas supersticiosas quanto
ao fato de desde a independência o país ainda não ter codificado as suas leis civis, de
necessidade urgente a uma nação à época. Uma das falas dizia que “nos fundamentos do
edifício do nosso código civil há alguma caveira de burro enterrada”, 329 o que remetia no
pensamento da época à grande dificuldade de execução da obra de direito civil, que, mesmo
diante de várias investidas, nunca ficava pronta.
326
GAZETILHA: CODIGO CIVIL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 14 de agosto de 1889. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=23378.
327
GAZETILHA: CODIGO CIVIL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 24 de agosto de 1889. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=23440.
328
GAZETILHA: COMMISSÃO DO CODIGO CIVIL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 22 de novembro de
1889. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=24042.
329
SANTOS, Antônio Felício dos. Commissão do código civil. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 14 de março
de 1882. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=5178.
134
Passamos à República sem que o código civil se tornasse realidade. Na verdade, a obra
de codificação não vai passar de uma ideia que, apesar de urgente, não se concretizava. A
mudança de regime aumentou consideravelmente a exigência da renovação legislativa, pois
simbolizava aquilo que de mais atualizado compunha o novo, que seria a nascente República,
em detrimento do velho que ficava para trás, o antigo regime. Reunindo a sua experiência e
levando em consideração o histórico das tentativas de codificação ainda no Império, Coelho
Rodrigues vai ser o jurisconsulto escolhido para realizar o trabalho mais complexo do seu
tempo, a tirar pelas exigências que o novo regime reclamava no que compreendia ao seu
direito privado.
3.2. Coelho Rodrigues e o contrato para execução do primeiro projeto de código civil da
República
330
HORÁCIO, João. Carta do Rio. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 22 de julho de 1890. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=1449.
135
dissolvia a comissão, teria pedido a Coelho Rodrigues que, enquanto não fosse jubilado do
cargo de professor, continuasse a serviço daquele ministério.331
Em dezembro do mesmo ano Coelho Rodrigues foi incumbido da elaboração do
projeto de lei do casamento civil. Segundo apresentado na sua história documentada, Coelho
Rodrigues afirmou que, do dia 15 ao dia 24 daquele mês, foram intensas as reuniões com
participação de Campos Salles, onde foram discutidos artigo por artigo os pontos que
deveriam entrar no projeto de lei. No dia 28 de dezembro foi publicada no Jornal do
Comércio a notícia sobre a finalização do projeto no dia anterior, e da distribuição de cópias
entre os membros das casas legislativas para análise e posterior votação. 332 A lei que
estabeleceu a regularização do casamento civil no Brasil entrou em vigor depois de aprovada
por meio do decreto-lei n° 181, de 24 de janeiro de 1890.333
Segundo afirmou Coelho Rodrigues na sua história documentada, quando se
encontrava em Pernambuco por meio de licença, recebeu em 06 de maio de 1890 um
telegrama de Campos Sales, pedindo que retornasse ao Rio. Chegando à capital no dia 18 do
mesmo mês o ministro o informou que “precisava de um código civil regido, se não com a
mesma urgência com que o fora a lei do casamento, ao menos com a mesma, com que estava
sendo reformado o código criminal”,334 e queria que Coelho Rodrigues o fizesse. Declinando
inicialmente da proposta por afirmar haver pessoas mais preparadas para a empresa, no final
das contas foi fechado acordo para que redigisse o projeto de código civil da República
brasileira.
O acordo previa que o contrato oficial fosse feito em julho do ano de 1890, e que
começasse a contar a partir do dia 01 do mês de setembro. Esse foi o tempo exigido por
Coelho Rodrigues para organizar-se, de um lado escusando-se de ser senador pelo Piauí, e do
outro para não agravar os prejuízos com a liquidação do seu escritório de advocacia, como
331
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
332
GAZETILHA: CASAMENTO CIVIL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 28 de dezembro de 1889.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_07&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=24264.
333
A lei que estabelecia o casamento civil no Brasil foi revogada pelo decreto n° 11, de 18 de janeiro de 1991, no
governo Fernando Collor de Melo. Para consultar o decreto de lei que regularizou constitucionalmente o
casamento civil no Brasil, formulado por Coelho Rodrigues, ver em: BRASIL. Decreto-lei n° 181, de 24 de
janeiro de 1890. Promulga a lei sobre o casamento civil. Lex: Coleção de Leis do Brasil: edição federal, Rio de
Janeiro, 1890. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1851-
1899/d181.htm#:~:text=DECRETO%20N%C2%BA%20181%2C%20DE%2024%20DE%20JANEIRO%20DE
%201890.&text=Promulga%20a%20lei%20sobre%20o%20casamento%20civil.&text=Art.&text=%C2%A7%20
3%C2%BA%20A%20autoriza%C3%A7%C3%A3o%20das,si%20forem%20menores%20ou%20interdictos.
Acesso em: 24/jan./2022.
334
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897, p. 240.
136
afirmou na sua história documentada. Dessa maneira poderia preparar-se para sua viagem à
Europa, lugar escolhido para a escrita do projeto de código civil, pois, segundo Coelho
Rodrigues, não pretendia desviar a atenção e se ocupar de outras atividades durante a
produção da obra legislativa, nem participar da agitada vida política na capital da mais nova
república.335
Em 12 de julho de 1890 foram então oficialmente assinados os termos do contrato, que
foi submetido por meio de decreto ao aval final do chefe do governo provisório, marechal
Deodoro da Fonseca, mediante constou em publicação do Jornal do Comércio. Dentre as
responsabilidades a cumprir, Coelho Rodrigues deveria entregar o projeto, articulado e
numerado, dentro de três anos, contados a partir do dia 01 de setembro do mesmo ano,
mediante acertado no acordo preestabelecido com o ministro da justiça. Seguindo esses
termos, estruturalmente, o projeto deveria compor-se de uma parte geral e outra especial, com
poucas mudanças quanto à estrutura do plano que Coelho Rodrigues já ensaiava
anteriormente:
A parte geral será subdividida em três livros: o 1°, das pessoas; o 2°, dos
bens; e o 3°, dos actos e dos factos jurídicos. A parte especial será também
subdividida em quatro livros: o 1°, dos direitos da família; o 2°, dos direitos
reais; o 3°, dos direitos pessoais; e o 4°, do concurso de direitos,
compreendendo cinco secções: a 1ª, das sucessões testamentárias e
legítimas; a 2ª, das instituições de crédito real e de seguro; a 3ª, do concurso
dos credores e da preferência dos créditos; a 4ª, das prescripções; e a 5ª, da
restituição in integrum, se não parecer preferível substituir este remédio
extraordinário por outro ordinário ou supprimi-lo.336
Excetuando o tempo estipulado para entregar a obra, o contrato dava total liberdade ao
jurisconsulto contratado no que conviesse alterar ou acrescentar quanto ao direito vigente, no
que tocava às matérias do código civil. Com a República ocorreram transformações
necessárias na organização da legislação, o que tornava o contrato aberto para aquilo que
fosse preciso mudar, segundo o governo, “de acordo com a experiência das nações civilizadas
e com as necessidades da situação do Brazil”.337 Nesse ponto, enxergamos a investida de
Coelho Rodrigues como a mais complexa dentre as tentativas de codificação, pelo fato da
necessidade maior de mudanças exigidas em uma legislação renovada para ser executada por
um regime político diverso daquele em que ousaram os antecessores, sem sucesso, codificar
as leis civis.
335
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
336
GAZETILHA: CÓDIGO CIVIL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 16 de julho de 1890. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22C%c3%b3digo%20Civil%22&pa
gfis=1395.
337
Idem.
137
338
GAZETILHA: CÓDIGO CIVIL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 16 de julho de 1890. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22C%c3%b3digo%20Civil%22&pa
gfis=1395.
339
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897, p. 07.
340
Idem, p. 77.
138
341
AVELINO, J. G. M.; CASTELO BRANCO, E. A. O projeto de codificação de Coelho Rodrigues: A
normatização dos contratos em solo familiar e um passeio por dentro da casa, esse reduto brasileiro profundo. In:
RÊGO, A. R.; QUEIROZ, T.; HOHLFELDT, A. (Org.). Tempo & Memória: Interfaces entre os campos da
comunicação e da história. Logroño, Rioja, Espanha: Fundación Dialnet, 2020. pp. 169-192.
139
contrato teria fim somente em setembro daquele ano, podendo ainda, como previsto no
contrato, prorrogar o prazo por mais seis meses, até março de 1894. Nesse caso, dispunha de
largo tempo para aproveitar com sua família o restante da estadia fora do país. Coelho
Rodrigues relatou que nessas condições foi pela primeira vez a um teatro na Europa.342
Enquanto isso, no Brasil, logo cedo foram surgindo críticas a Coelho Rodrigues por
parte de certas personalidades políticas que trouxeram à tona a dúvida sobre o seu trabalho e a
preferência pela discussão e posterior aprovação do projeto de Joaquim Felício, ultimo
projetista do código civil no Império. Em sessão da Câmara dos Deputados de setembro de
1891, publicada no Jornal do Comércio, Alcides de Mendonça Lima, ao falar sobre a
urgência reclamada da legislação civil, afirmou que o tempo contratado com Coelho
Rodrigues para a confecção do trabalho foi demasiadamente longo. Pretendia que fosse
discutida a supressão da verba relativa ao código civil do contratado. Ao mesmo tempo
enviou requerimento à Câmara, “afim de que o projecto do Código Civil organisado pelo
illustre mineiro Joaquim Felício dos Santos, seja submettido a uma commissão de cinco
membros para dar parecer a respeito”.343
No final da sua fala, Alcides Lima apontou que o governo teria confiado a tarefa a um
jurisconsulto que não compreendia a alta missão de que foi incumbido. Mediante o mesmo,
em vez de Coelho Rodrigues encontrar-se presenciando no Brasil a prática daquilo que
deveria codificar, acabou partindo para escrever seu projeto no estrangeiro. Essa fala revelou
a intenção do relator na Câmara de promoção do projeto de Joaquim Felício, com o qual
certamente manteve relacionamento pessoal, em detrimento do projeto contratado com
Coelho Rodrigues. Joaquim Felício no ano de 1891 conseguiu eleger-se senador por Minas
Gerais, e arregimentava forças políticas para elevar o seu projeto de código nas casas do
poder legislativo.
Isso acabou gerando uma disputa, corporificada no Jornal do Comércio, entre os
membros do legislativo para a elevação do trabalho de um codificador em detrimento do
outro. De um lado, Alcides Lima e Homero Batista enviaram requerimento para que o
Presidente da República solicitasse informações do estado em que se encontrava o trabalho de
342
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
343
CÂMARA DOS DEPUTADOS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 12 de setembro de 1891. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=5167.
140
Coelho Rodrigues.344 Este, mesmo da Europa, teve defensores diante dos ataques. Foi o caso
de Bernardino de Campos que, em sessão na Câmara e baseando-se no contrato assinado com
o governo, afirmou, mediante sua opinião, a competência de Coelho Rodrigues para o cargo
designado e o prazo que o mesmo tinha dentro dos termos legais assinados com o ex-ministro
do governo provisório para a realização do seu projeto.345 Na sessão seguinte, Moraes Barros,
concordando com Bernardino, afirmou que “esse trabalho não podia ser entregue senão a um
só individuo, nem podia ser melhor do que foi, a escolha”.346
No final de outubro desse mesmo ano de 1891 foi criada a comissão de justiça e
legislação para discutir a possibilidade da revogação, almejada por alguns, do contrato
estabelecido com Coelho Rodrigues no governo provisório. Nesse período foi elaborado o
Projeto n° 45, no Senado, em que um dos autores foi Alberto Lobo Leite Pereira, amigo
íntimo, segundo Coelho Rodrigues em sua história documentada, de Joaquim Felício.347
Ambos, Alberto Lobo e Joaquim Felício, estavam como senadores e, juntamente com outras
personalidades políticas, como Pinheiro Machado, Paranhos e Ramiro Barcellos, lutavam no
Projeto n° 45 pela rescisão do contrato com Coelho Rodrigues e a adoção “como código civil
da República, o projecto apresentado pelo senador Joaquim Felício dos Santos”.348
Depois de longas discussões em sessões do legislativo, a comissão de justiça deu
parecer opinando que fosse retirado de discussão o projeto que visava a aprovação do trabalho
de Joaquim Felício. Posto em votação dentre os membros do legislativo, o primo de Coelho
Rodrigues, Eliseu Martins deu voto afirmativo para o parecer da comissão, da mesma forma o
fez Ubaldino do Amaral. Gomensoro declarou-se vencido, assim como Américo Lobo, o qual
rebateu o parecer da comissão afirmando que a nação não poderia esperar três anos pelo
trabalho de Coelho Rodrigues, e que o governo no ato da revogação do contrato poderia
344
CÂMARA DOS DEPUTADOS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 19 de setembro de 1891. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=5235.
345
CÂMARA DOS DEPUTADOS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 14 de setembro de 1891. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=5195.
346
CÂMARA DOS DEPUTADOS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 16 de setembro de 1891. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=5205.
347
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
348
CONGRESSO NACIONAL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 27 de outubro de 1891. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=5601.
141
indenizá-lo por qualquer prejuízo. Por achar-se o congresso com número reduzido, a
discussão ficou para ser votada na sessão do dia seguinte.349
Na continuação da discussão em sessão posterior, ocupou-se da fala Campos Sales,
que na época estava como senador por São Paulo. O mesmo foi um dos membros da comissão
de justiça montada para a discussão da possibilidade da dissolução do contrato firmado com
Coelho Rodrigues e ele próprio, quando foi ministro da justiça do governo provisório da
República. Campos Sales foi um dos que subscreveu o parecer contrário ao projeto n° 45 que
visava a aceitação do trabalho de Joaquim Felício. Defendeu na sua fala o contrato legal
firmado com Coelho Rodrigues para a redação do código civil, lançando ainda um
questionamento aos membros do congresso:
Dever-se-ha, em tal conjuntura, repudiar o trabalho commetido ao Sr. Dr.
Coelho Rodrigues, quebrar um pacto solemne, firmado com elle pelo
Governo da Republica, faltando, assim, á fé, resultante do contrato
synallegmatico e que foi contrahido com todas as formalidades legaes?350
No final das contas foi levado em consideração o parecer da comissão de legislação e
justiça. Joaquim Felício acabou pedindo para que o seu projeto fosse retirado de discussão,
depois das tentativas sem sucesso. A notícia sobre a decisão final dessa disputa saiu no Jornal
do Comércio, em que foi considerada a aprovação do “parecer da commissão de justiça e
legislação sobre a adopção do projecto do Código Civil do Sr. Joaquim Felício, ao qual foi
recusada a restituição da proposta para o fim de ser opportunamente trazida á discussão [o seu
projeto]”.351
Coelho Rodrigues, por outro lado, continuou na Europa dando prosseguimento ao seu
trabalho de codificação. Na sua história documentada relatou que terminado o seu projeto no
dia 11 de janeiro de 1893, e sabendo que Fernando Lobo Leite Pereira estava como ministro
da justiça, afirmou que pretendia esperar a mudança do ministério e, por isso, não apresentou
seu trabalho imediatamente após concluí-lo. Pelo que foi relatado, além do então presidente
Floriano Peixoto supostamente não dar importância à matéria do direito civil, Coelho
Rodrigues considerou que havia má vontade do ministro sobre o seu projeto de código.
Fernando Lobo era irmão de Américo Lobo que, como vimos, foi amigo próximo de Joaquim
349
CONGRESSO NACIONAL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 27 de outubro de 1891. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=5601.
350
CONGRESSO NACIONAL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 30 de outubro de 1891. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Congresso%20nacional%22&pag
fis=5629.
351
GAZETILHA: CONGRESSO NACIONAL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 31 de outubro de 1891.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Congresso%20nacional%22&pag
fis=5639.
142
Felício e um dos autores do projeto que visava a aprovação do trabalho deste último no
senado.352
Dias depois, o Jornal parisiense Le Temps, teria noticiado a demissão do ministro da
justiça do Brasil Fernando Lobo, o qual supostamente havia saído do cargo em 16 de janeiro
de 1893. Sabendo da notícia Coelho Rodrigues, que estava preparando-se para uma excursão
à Itália, organizou-se no sentido de retornar ao Brasil. Nesse interim, teria noticiado ao
presidente Floriano Peixoto que havia concluído seu trabalho e tinha como pretensão
apresenta-lo ao governo. Pediu então no ofício enviado ao presidente que nomeasse uma
comissão revisora para apurar os resultados do seu projeto de código civil.
A notícia porem da saída de Fernando Lobo, segundo Coelho Rodrigues na sua
história documentada, apresentou-se falsa.353 Continuava o ministro no exercício do seu
cargo quando chegou ao Brasil. Supomos que houve equívoco por informações inconsistentes
do jornal francês ao publicar nota sobre a saída de Fernando Lobo do ministério. Houve um
período dentro da sua atuação como ministro que o mesmo ficou afastado por problema de
saúde, nisso pode ter residido a confusão sobre sua saída. O mesmo continuou no cargo até
setembro de 1893.
Chegando ao Brasil em 22 de fevereiro de 1893, Coelho Rodrigues tentou por várias
vezes uma conferência com o presidente da República, sem sucesso. Posteriormente acabou
submetendo-se a apresentar o seu trabalho ao ministro Fernando Lobo, o qual foi, na sua
visão, completamente alheio à sua matéria da codificação do direito civil. Ao procurar o
ministro que se encontrava na Secretaria do governo, pouca importância este teria dado ao seu
projeto. Segundo constou na história documentada, o ministro Fernando Lobo estava mais
envolvido com os projetos de um inventor dos balões dirigíveis, chamado Severo Maranhão,
com quem conversava, não chegando a ver o invólucro com o material referente à legislação
civil.354
Após a entrega do seu projeto até maio de 1893 foi reclamada por varias vezes em
requerimento a demora para a formação da comissão por parte do ministério da justiça, para
dar o parecer sobre o projeto de Coelho Rodrigues. Depois de entregue o trabalho, a comissão
devia dar seu parecer dentro de três meses. Coelho Rodrigues entregou seu projeto em
fevereiro, somente no final de maio a comissão foi formada, em dia depois do prazo
estabelecido no contrato para que o parecer fosse dado. Américo Lobo saiu em defesa do
352
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
353
Idem.
354
Idem.
143
ministro Fernando Lobo no senado, afirmando que a demora para formação da comissão deu-
se por parte da Faculdade de Direito do Recife na procura de um professor da instituição que
se dispusesse ao encargo, o que somente teria sido possível por volta de 12 de maio de
1893.355
Passado um longo processo, Coelho Rodrigues conseguiu atenção para o seu projeto
três meses após entrega-lo ao governo, e depois da ocupação de uma cadeira no senado.
Somente em 31 de maio foi formada a comissão que, segundo Coelho Rodrigues, constituiu-
se depois do prazo, dentro do qual a mesma deveria dar o ser parecer, como previsto nos
termos do contrato. Essa demora, que Coelho Rodrigues julgou proposital, segundo conta na
sua história documentada, esteve relacionada aos empecilhos que o ministro Fernando Lobo
impunha para que o autor do projeto não se elegesse senador pelo Piauí, o qual poderia usar,
segundo Coelho Rodrigues, a justificativa do contratado ainda não ter apresentado o seu
trabalho quando em maio reclamava a senatoria. Apesar do suposto empecilho, Coelho
Rodrigues foi eleito senador em 09 de maio de 1893, o que possibilitou a reclamada atenção
aos tramites envolvendo o seu projeto de código.
Encontrando-se como senador representante do Piauí no Congresso, supostamente
pareceu mais fácil para Coelho Rodrigues angariar forças no sentido da aprovação do seu
projeto, porém a realidade foi outra, apesar das suas sucessivas tentativas. A comissão que se
constituiu para dar parecer sobre o trabalho do contratado formada pelo presidente Antônio
José Rodrigues Torres Neto, pelo relator Antônio Dino da Costa Bueno e Manoel do
Nascimento Machado Portella Júnior, depois da análise da obra, apresentaram parecer em 27
de julho de 1893, reprovando o projeto de Coelho Rodrigues como base para o código civil da
República. Como conclusão do parecer foi afirmado pela comissão: “o projecto não tem as
condições necessárias para ser aceito, [...], como base de revisão para o futuro Código Civil
da República”.356
A data da reprovação do projeto, mediante Coelho Rodrigues foi marcada como
provocação por uma suposta intriga pessoal com o diretor geral da secretaria da justiça, Lúcio
de Mendonça. Este teria pedido a Coelho Rodrigues que consagrasse no seu projeto o divórcio
com dissolução do vínculo conjugal. Replicando o reclamante, Coelho Rodrigues havia dito
que consideraria a sugestão caso fosse proposta pela comissão revisora. Isso acabou sendo
355
CONGRESSO NACIONAL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 12 de maio de 1893. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=10999.
356
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
144
motivo, segundo Coelho Rodrigues, para a intriga pessoal, culminando na reprovação oficial
do projeto no dia 27 de julho, data que simbolizava o aniversário da Lei Naquet, a qual
reestabeleceu o divórcio na França. Fazendo dessa forma revelava-se a mão do diretor geral
por trás do ministro Fernando Lobo na impugnação da obra que, mediante Coelho Rodrigues,
foi movido pelo sentimento de intriga pessoal já que Lúcio de Mendonça não teria sido
atendido de imediato pelo pedido feito.357
Após a decisão de reprovação do trabalho ocorreu um longo processo em que se
envolveu Coelho Rodrigues de um lado, na defesa do seu projeto, e os membros da comissão
do outro. Na sua resposta às críticas feitas ao seu trabalho, Coelho Rodrigues afirmou que não
esperava decisão diferente quando viu formada a comissão. Para além do caso envolvendo o
diretor geral, o presidente da comissão seria dotado de influência da sua “vizinhança forense”,
referindo-se ao fato de ser Rodrigues Torres Neto amigo próximo do ministro, o que Coelho
Rodrigues justificou também como um dos motivos maiores para a reprovação do seu
projeto.358
A resposta com tom acusatório direcionada, sobretudo, ao presidente da comissão
acabou afetando na proporção que as discussões tomaram a partir de então. A comissão em
réplica à resposta de Coelho Rodrigues passou a ataca-lo de forma mais direta e pessoal.
Primeiro foi feita referência satírica ao seu estado mental pelas acusações feitas não somente
ao presidente como aos demais membros. Coelho Rodrigues teria dito que os outros dois,
professores nas duas principais faculdades brasileiras, teriam deixado o cargo a que foram
designados subir à cabeça. Posteriormente, o contratado foi chamado de “imitador”, por
supostamente ter copiado artigos de códigos estrangeiros e, portanto, não havia levado a sério
o trabalho para o qual foi designado. Apesar da insistência de Coelho Rodrigues a comissão
não mudou o seu parecer.359
Um fato a ser analisado sobre os pareceres da comissão diz respeito à questão da
mesma não ter se referido à suposta cópia do material dos códigos estrangeiros no primeiro
parecer. Somente depois das acusações de Coelho Rodrigues sobre as possíveis relações de
amizade e intrigas interferirem na decisão, a comissão acabou fazendo referência a uma
357
RODRIGUES, Antônio Coelho. Eu e o Supremo Tribunal Federal. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 06 de
setembro de 1910. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_10&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=1922.
358
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
359
Idem.
145
suposta prática em que Coelho Rodrigues teria imitado determinados artigos retirados de
códigos de outras nações.
Coelho Rodrigues ainda publicou uma tréplica à réplica da comissão anos depois, com
assinatura de 21 de agosto de 1895. Nela reafirmou aquilo que havia dito onde não esperava
ser diferente o julgamento sobre seu trabalho. Isso pelo fato da comissão ter sido composta
por membros que de alguma forma possuíam desavenças políticas ou mesmo pessoais com o
contratado. Coelho Rodrigues relatou que para além da suposta amizade entre o presidente da
comissão e o ministro, Machado Portella Júnior teria recebido nota reprovativa pelo mesmo
em uma disciplina no curso de direito da Faculdade de Direito do Recife quando era seu
aluno, o que segundo Coelho Rodrigues, também acabou motivando na decisão final da
comissão.
Coelho Rodrigues afirmou ainda que caso a comissão fosse formada com membros
que simpatizassem com ele, certamente a decisão teria sido diferente. Segundo afirmou na sua
história documentada, caso fosse outra a configuração teriam acontecido conferências, como
previstas no contrato, para que acompanhasse o exame da comissão, e pudesse assim
responde-la e propor juntamente com ela as mudanças que por ventura precisassem ser feitas.
Porém, o que de fato se sucedeu foi a falta de diálogo existente entre a comissão e Coelho
Rodrigues, onde nenhum contato por meio de reunião estabeleceram. Na verdade, segundo
Coelho Rodrigues, o artigo 8° do contrato, que propunha a presença do contratado nas
reuniões do parecer, teria sido excluído da coleção oficial.360
Além dos motivos expressos, Coelho Rodrigues fez uma explanação daquilo que, de
maneira geral, acabou tornando-se para ele o motivo da recusa do seu projeto. Primeiramente,
atribuiu o fato do projeto de Joaquim Felício ter sido reavido para discussão. Por outro lado,
Coelho Rodrigues culpou a decisão do ministro Fernando Lobo em recusar o seu projeto,
sobretudo pelo fato do seu irmão, Américo Lobo, ter sido um dos responsáveis por formular o
projeto n° 45 no senado, na sessão de maio de 1891, estabelecendo a aprovação repentina do
trabalho escrito por Joaquim Felício.
Sua tréplica não teve resposta por parte da comissão, ficando até então a decisão
oficial do governo de reprovação do seu projeto. Nesse interim, do congresso nacional, o
senador Theodureto Souto formulou requerimento ao ministro da justiça em 1893, como
publicado no Jornal do Comércio, para que fosse reconhecido o projeto de Coelho Rodrigues
como base do código civil da República, e que fosse submetido ainda naquela sessão à
360
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
146
361
GAZETILHA: CONGRESSO NACIONAL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 11 de maio de 1893.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=10987.
362
CONGRESSO NACIONAL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 31 de maio de 1895. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22codigo%20civil%22&pagfis=174
09.
363
VÁRIAS NOTÍCIAS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 19 de setembro de 1893. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&hf=memoria.bn.br&pagfis=12234.
364
VÁRIAS NOTÍCIAS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 01 de julho de 1896. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=21673.
147
de que Coelho Rodrigues teria disposto de pouco tempo para realizar o seu projeto de código
civil.365
Um dos pontos mais criticados no trabalho pela comissão diz respeito à maneira como
Coelho Rodrigues localizou o serviço doméstico como uma relação familiar e não puramente
de trabalho. Olhando por outro viés daquilo que foi discutido anteriormente, pelo lado da
comissão à época quando deu seu parecer, fazendo dessa forma Coelho Rodrigues não seguia
os exemplos dos códigos modernos ao regular essa relação. Na opinião da comissão,
localizando o trabalho doméstico como uma relação de família o contratado aparentemente
reforçava a soberania do chefe de família sobre uma relação que deveria ser enxergada como
juridicamente de trabalho, regulada pelo Estado, assegurando assim em tese a sua entrada no
espaço privado para a garantia dos direitos e obrigações dos empregados.366
Apesar das ressalvas, considerando a deficiência do projeto, a comissão especial no
final do parecer decidiu pela sua aprovação como base para o código civil brasileiro. O
decreto baixado autorizava que o presidente da República nomeasse uma comissão de
jurisconsultos para que fosse dado um parecer ao trabalho depois que fosse revisado pelo
contratado levando em consideração as exigências dos membros da comissão do senado.
Nesse interim, teria sido requerido por Gonçalves Chaves, Severino Vieira e Coelho
Rodrigues que o projeto ficasse provisoriamente em vigor, durante o processo da sua
revisão.367
Porém, mesmo após a decisão da comissão especial do senado, bem como os
requerimentos para sua aprovação provisória, não houve efetividade do poder executivo no
prosseguimento do processo. No Jornal do Comércio foram diversas as publicações onde
políticos encaminhavam requerimento ao governo com a pretensão de aprovar o trabalho
elaborado por Coelho Rodrigues, sem sucesso. Caso de Justo Chermont, pedindo ao poder
executivo que se autorizasse a contratação de um jurisconsulto para realizar a revisão do
código de Coelho Rodrigues.368
365
CONGRESSO NACIONAL: PARECER DA COMMISSÃO ESPECIAL, ENCARREGADA DO ESTUDO
DO PROJECTO DO CÓDIGO CIVIL APRESENTADO PELO SR. SENADOR COELHO RODRIGUES.
Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 21 de agosto de 1896. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=22188.
366
Idem.
367
GAZETILHA: CONGRESSO NACIONAL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 04 de setembro de 1896.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=22324.
368
GAZETILHA: CONGRESSO NACIONAL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 06 de setembro de 1896.
Disponível em:
148
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=22344.
369
RODRIGUES, Antônio Coelho. O Juvenal Gavarni. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 12 de outubro de
1896. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22codigo%20civil%22&pagfis=227
07.
370
RODRIGUES, Antônio Coelho. Os capitães-generaes do Piauhy e o Partido Democrata Federal. Jornal do
Comércio. Rio de Janeiro, 20 de fevereiro de 1896. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22codigo%20civil%22&pagfis=203
11.
149
quais eram mineiros Joaquim Felício, o ministro da justiça da época Fernando Lobo, e seu
irmão, senador Américo Lobo. Todos eram comprovincianos mineiros, o que possibilitou na
formação de reações contra o piauiense Coelho Rodrigues e seu projeto, na pretensão de
tornar o trabalho de Joaquim Felício aceito quando este foi senador. Coelho Rodrigues
questionou essa suposta influência regionalista pela reprovação do seu projeto tanto na
história documentada de 1897,371 quanto no seu livro “A República na América dos Sul”, em
1906.372
Segundo Coelho Rodrigues, o governo posterior de Prudente de Morais acabou
seguindo na mesma linha do Marechal Floriano. Isso fez com que Coelho Rodrigues, mesmo
apoiando inicialmente a eleição de Prudente de Morais como primeiro presidente civil, se
sentisse posteriormente desiludido com o seu governo.373 Tal desilusão é reflexa da possível
falta de apoio do governo, no período em que escreveu, de 1896, no incentivo à aprovação e
posterior decretação do código civil, que tramitava no congresso durante alguns anos. Quando
publicou em 1897 o seu “Projecto do Código Civil, precedido da história documentada do
mesmo e dos anteriores”, deixou transparecer a sua total indignação pela política brasileira, ao
passo em que lamentava o fato de ter se incumbido por tanto tempo de um trabalho que no
fim lhe custou o fracasso dentro da empresa da codificação civil.374
Fato intrigante com relação a Coelho Rodrigues foi que o mesmo não teve nenhum
direito a revisão posterior do seu trabalho após terem sido apresentados os pareceres, e ter
passado pelo congresso. Além disso, em nenhum dos pareceres esteve presente como previa o
contrato, por supostas desinformações do governo para que não tivesse direito a justificativas
sobre as matérias, segundo relatou Coelho Rodrigues. Teixeira de Freitas teve vários anos
para concluir seu trabalho, onde foram realizadas diversas conferências com jurisconsultos
renomados. Joaquim Felício, depois de apresentado o seu projeto e reprovado pela comissão,
teve a oportunidade de participar como membro da comissão especial criada para levar à
execução o código civil, aproveitando o seu projeto como base. Sobre Coelho Rodrigues e sua
tentativa reinou um silêncio profundo.
371
RODRIGUES, Antônio Coelho. Projecto do Código Civil precedido da história documentada do mesmo e dos
anteriores. Rio de Janeiro: Typographia do Jornal do Commércio, 1897.
372
RODRIGUES, Antônio Coelho. A República na América do Sul ou um pouco de história e crítica oferecida
aos latino-americanos, 1906. Brasília: Senado Federal, 2016.
373
RODRIGUES, Antônio Coelho. Ao Piauhy e aos piauhyenses. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 18 de
novembro de 1898. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=30318.
374
RODRIGUES, op. cit., 1897.
150
375
REQUERIMENTOS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 10 de abril de 1897. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22codigo%20civil%22&pagfis=244
61.
376
VÁRIAS NOTÍCIAS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 01 de março de 1899. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22codigo%20civil%22&pagfis=314
07.
377
VÁRIAS NOTÍCIAS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 23 de agosto de 1899. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22codigo%20civil%22&pagfis=331
64.
151
ano de 1905, que muitas das matérias do seu código civil foram embasadas nos
conhecimentos do seu antecessor.378
Em passagem do citado trabalho, Clovis Beviláqua afirmou nas suas próprias palavras:
“principalmente o Esboço, de Teixeira de Freitas e o projecto do Dr. Coelho Rodrigues, mais
seguidamente este que aquelle, forneceram-me copiosos elementos para a construcção que me
havia sido confiada”.379 O então ministro da justiça Epitássio Pessoa, quando incumbiu Clóvis
Beviláqua em 1899 de redigir o projeto de código civil tão almejado da República já
adiantava que tomasse como base principal para execução o trabalho escrito por Coelho
Rodrigues, segundo consta em publicação do Jornal do Comércio.380
Sustentamos que o projeto de Coelho Rodrigues foi clareador para o estabelecimento
de uma legislação civil para a República que se pretendia construir no seu sentido jurídico,
agora com Beviláqua como sucessor na empresa. Este, ao fazer consideração sobre as
malogradas tentativas anteriores, sobretudo ao fato de Joaquim Felício ter sido julgado pelos
seus críticos por suposta incongruência com relação ao organismo vivo do direito civil, fez
um pessoal reconhecimento a respeito de Coelho Rodrigues. Clóvis Beviláqua teria afirmado,
em comparação aos outros jurisconsultos que, “mais feliz na escolha de seus guias, melhor
conhecedor do movimento legislador e doutrinário, em nossos dias mostrou-se,
incontestavelmente, o Dr. Antônio Coelho Rodrigues, cujo projecto, entretanto, não logrou
conquistar a approvação dos poderes competentes”.381
Vimos que o trabalho de Coelho Rodrigues acabou não sendo aceito como base para o
código civil da República. Os reveses políticos de então, bem como as dificuldades
encontradas no transitar de um regime ao outro, e as necessárias reformas para execução de
obra cara ao direito privado brasileiro, tornaram-se empecilhos sobre sua realização. Apesar
desses fatores, Coelho Rodrigues não deixou de tornar-se referência no que diz respeito ao seu
conhecimento adquirido no decorrer no processo de renovação legislativa, tornando-se o seu
projeto uma importante fonte para Clóvis Beviláqua redigir o trabalho que no fim tornou-se o
código civil da República brasileira.
Apesar desse reconhecimento por parte de personalidades políticas e jurídicas do
período, a exemplo de Epitássio Pessoa e do próprio Clóvis Beviláqua, o jurisconsulto
378
BEVILÁQUA, Clóvis. Em defeza do projecto de Código Civil Brasileiro. Rio de Janeiro: Livraria Francisco
Alves, 1906. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/224223. Acesso em: 12/ago./2020.
379
Idem, p. 26.
380
VÁRIAS NOTÍCIAS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 24 de abril de 1899. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=31927.
381
BEVILÁQUA, op. cit., p. 25.
152
piauiense ficou relativamente esquecido no decorrer do tempo dentro desse processo. Coelho
Rodrigues muitas vezes não passa de uma esparsa menção para saltar do histórico da
codificação à consumação do feito pelo oficial codificador da legislação civil brasileira. Entre
Coelho Rodrigues e Clóvis Beviláqua, porém, existiu uma relação que ultrapassou
reconhecimento e copiosidade de matérias, o que ficou obscurecido nos estudos históricos
sobre esse processo e sobre a relação envolvendo ambos.
Fontes inéditas no Jornal do Comércio contribuem para uma discussão sobre a ampla
participação de Coelho Rodrigues nos debates sobre a realização do trabalho de código civil
de Clóvis Beviláqua. Em muitas das sessões nas casas legislativas nacionais Coelho
Rodrigues se fez presente, apesar de não atuar mais como político no período, e estabeleceu
longas discussões com outros jurisconsultos, onde as suas contribuições foram consideradas,
levando em conta a experiência que teve dentro desse processo de execução da obra
legislativa de direito civil. Passaremos então a visualizar essa relação.
Segundo publicação no Jornal do Comércio, cedo Coelho Rodrigues foi consultado
por um amigo chamado José Luiz da Fonseca Magalhães, em junho de 1898, para que lesse o
trabalho de Clóvis Beviláqua intitulado Direito da Família, pedindo posteriormente seu juízo
sobre a obra. Em resposta Coelho Rodrigues teria se indisposto a fazer um exame apurado do
que lhe havia sido apresentado, mas estava certo de que, sendo já Clóvis Beviláqua “um nome
celebre no mundo jurídico”, seu trabalho certamente era digno de nota. Coelho Rodrigues
apontou, em linhas gerais que, para além de estar “a par da legislação vigente”, foi feito por
parte de Clóvis Beviláqua um trabalho “consciencioso de legislação comparada”.382
Essas considerações feitas por Coelho Rodrigues em 1898, foram republicadas em
março de 1899, com diversas outras publicações de autores como José Higino, Affonso Celso,
Cândido de Oliveira, Araripe Júnior, Silvio Romero, dentre outros, em homenagens a Clóvis
Beviláqua. Professor famoso da Faculdade de Direito do Recife da sua geração, Clóvis
Beviláqua figurava como um dos principais nomes da intelectualidade jurídica e filosófica da
sua época, com diversas publicações na área do direito em revistas nacionais e estrangeiras, a
exemplo das suas monografias sobre Direito da Família, Direito das Obrigações,
Criminologia e Direito, Legislação Comparada, Juristas Filósofos e outros.383
Professor emérito da Faculdade de Direito do Recife, símbolo da moderna geração de
intelectuais da sua época, sinônimo da modernidade na ciência, Clóvis Beviláqua foi a
382
HOMENAGEM AO DR. CLÓVIS BEVILÁQUA (Pelos principais juristas do Brazil). Jornal do Comércio.
Rio de Janeiro, 22 de março de 1899. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Bevilacqua%22&pagfis=31616.
383
Idem.
153
principal referência para levar a efeito o código civil. Reconhecido pelo governo nacional,
acabou sendo convidado pelo ministro da justiça Epitácio Pessoa, do governo Campos Sales,
para redigir o projeto de codificação. Em reunião que aconteceu no dia 27 de março de 1899,
Clóvis Beviláqua teria dito ao então ministro estar pronto para começar os trabalhos de
redação do novo projeto de código civil.384 O contrato com o governo foi oficializado no mês
de abril do mesmo ano.
Depois de contratado pelo governo, após poucos meses Clóvis Beviláqua deu por
terminado o trabalho, ainda no mesmo ano, entregando o projeto em novembro de 1899. Sua
obra foi a mais breve a ser concluída dentre as demais tentativas até então realizadas,
contabilizando aproximadamente oito meses de dedicação. Podemos levar em consideração
que já eram muitas as referências que o então codificador tinha à disposição sobre a matéria
do direito civil pátrio, como o mesmo afirmava, além de que Clóvis Beviláqua foi um exímio
estudioso da matéria, com diversas publicações a respeito, o que certamente contribuía para a
eficiência da escrita do projeto. Por outro lado, mediante acusações de alguns, como veremos
adiante, o trabalho de Clóvis Beviláqua foi considerado uma fiel cópia do projeto elaborado
por Coelho Rodrigues.
O fato é que após Clóvis Beviláqua entregar seu projeto ao ministro Epitácio em
novembro de 1899, este logo remeteu à análise particular de alguns juristas, pois pretendia
ouvir suas opiniões e conselhos, a exemplo de Manoel Antônio Duarte de Azevedo, o
primeiro a quem remeteu e que, segundo o ministro, apresentou-lhe “lúcido parecer”.
Posteriormente reuniu alguns jurisconsultos em comissão para a realização de uma revisão do
projeto. Os membros da dada comissão foram Olegário Herculano de Aquino e Castro, José
Evangelista Sayão de Bulhões Carvalho, Joaquim da Costa Barradas, Amphilóphio Botelho
Freire de Carvalho e Francisco de Paula Lacerda de Almeida, sob a presidência do próprio
ministro da justiça, Epitácio Pessoa.385
A comissão formada deu início à revisão em março de 1900, apresentando o seu
primeiro parecer, segundo o ministro, em agosto do mesmo ano. Foram 51 sessões dentro
desse período. Posteriormente foi realizada uma segunda revisão, dessa vez com uma
audiência em que participou o autor do projeto, contabilizando nessa segunda parte 12
sessões, que aconteceram até o fim de outubro. Epitácio, finalizando sua fala, apontou que
384
VÁRIAS NOTÍCIAS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 28 de março de 1899. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_08&Pesq=%22Bevilacqua%22&pagfis=31671.
385
PESSOA, Epitácio. Gazetilha: Código Civil. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 18 de novembro de 1900.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22codigo%20civil%22&pagfis=738
.
154
terminado esse processo, depois de redigido o projeto e impresso, foi realizada uma nova
leitura em três discussões, e em inícios do mês de novembro de 1900 acabou o trabalho de
Clóvis sendo aprovado pela comissão do governo.386
Percebemos uma enorme diferença daquilo que presenciamos no processo que
impugnou o projeto de Coelho Rodrigues, período em que o governo esteve completamente
alheio à realização do projeto de código civil da República. No caso de Clóvis Beviláqua,
houve um grande impulso do governo, sobretudo por parte do ministério da justiça, que
conduziu com agilidade os trabalhos referentes à renovação da legislação civil brasileira. Os
reflexos disso materializaram-se na maneira como Epitácio deu importância tanto à feitura da
obra, como remetendo a mesma a um processo apurado de revisão, para no fim levar a efeito a
organização do código civil e sua posterior aprovação. Além disso, o governo Campos Sales
tinha como pretensão a organização institucional do regime que até então, segundo Lessa,
encontrava-se sem uma ordem definida. A obra de direito civil era importante na guinada para
legitimar a República.387
Em 10 de novembro de 1900, segundo consta em publicação do Jornal do Comércio,
Epitácio entregou o projeto de código civil a Campos Sales depois de escrito e revisto pela
comissão dos jurisconsultos contratados pelo governo, para que o então presidente da
República remetesse à análise do congresso. Enquanto o trabalho estava em andamento para
ser apreciado pelas casas legislativas, foi devidamente enviado à análise de outras instituições
para que dessem os seus pareceres a respeito. O mesmo Jornal informou em publicação de 27
de janeiro de 1901, sobre o convite feito pela câmara dos deputados ao Instituto dos
Advogados Brasileiros para que estudassem o projeto Beviláqua.388 Da mesma maneira foi
feito pedido a algumas das principais faculdades nacionais para que analisassem o dado
projeto.
Em publicação de 02 de abril de 1901, o Jornal do Comércio informava que a
congregação da Faculdade Livre de Ciências Jurídicas e Sociais do Rio de Janeiro, depois de
ofício dirigido pela câmara dos deputados, nomeou uma comissão de professores lentes
catedráticos para darem parecer sobre o projeto Beviláqua. Segundo consta, Coelho
386
PESSOA, Epitácio. Gazetilha: Código Civil. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 18 de novembro de 1900.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22codigo%20civil%22&pagfis=738
.
387
LESSA, Renato. A Invenção Republicana: Campos Sales, as bases e a decadência da Primeira República
Brasileira. 3 ed. Rio de Janeiro: Topbooks, 2015.
388
VÁRIAS NOTÍCIAS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 27 de janeiro de 1901. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22codigo%20civil%22&pagfis=136
9.
155
Rodrigues, apresentado como conselheiro e lente dessa instituição, foi um dos professores
nomeados para fazer parte da comissão, que ficou composta por ele, Tarquínio de Souza, João
Manoel, Carlos de Gusmão, Júlio de Barros e o desembargador Santos Campos.389 Esse foi o
período inicial do envolvimento direto de Coelho Rodrigues em prol da análise do projeto
Clóvis Beviláqua, fazendo publicar na Revista de Jurisprudência valorosas considerações a
respeito.
No final de abril de 1901, Clóvis Beviláqua escreveu uma compilação de cartas
publicadas no Jornal do Comércio respondendo Coelho Rodrigues sobre criticas feitas ao seu
projeto na referida revista. Este último, assim como fizera Rui Barbosa, teria criticado,
sobretudo, a linguagem utilizada por Beviláqua no seu projeto, acompanhada de diversos
erros de gramática. Em sua resposta, Clóvis Beviláqua teria dito que aquelas considerações
negativas acabaram sendo motivadas pelo conflito de ideias entre ambos e, principalmente,
pelo sentimento pessoal no período em torno do processo de codificação, já que Coelho
Rodrigues possuía pendências com o governo pela aprovação anterior do seu trabalho.390
Nesse período, Coelho Rodrigues vai reclamar ao governo os créditos pelo seu projeto,
pretendendo fazer que se cumprisse a resolução do senado de 1896 que mandava submeter
seu trabalho a análise de um jurisconsulto ou uma comissão de jurisconsultos. Coelho
Rodrigues, segundo Clóvis Beviláqua, foi uma das pontes entre ele e Epitácio Pessoa,
recomendando ao ministro o seu nome para a redação do código civil. Pelo que se pressupõe,
a partir da análise das cartas, Beviláqua deveria ter atuado como codificador que se utilizasse
do projeto do seu antecessor como base principal para levar a efeito o código civil. Dessa
maneira, fazia cumprir a resolução do senado para a revisão do projeto de Coelho Rodrigues,
abrindo espaço para que este fosse reconhecido junto à obra e recebesse os devidos créditos
pelo seu trabalho utilizado como base.
Podemos perceber o desenrolar dos interessem em jogo nas entrelinhas do que foi
considerado. Clóvis Beviláqua teria sido nomeado pelo governo, inclusive com indicação de
Coelho Rodrigues para a sua nomeação. Coelho Rodrigues, aparentemente, via uma chance
para que o seu projeto fosse a base principal para execução do código civil, em que Beviláqua
atuaria como um revisor. Dessa forma se fez quando constituiu-se comissão especial, depois
389
VÁRIAS NOTÍCIAS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 02 de abril de 1901. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22codigo%20civil%22&pagfis=191
5.
390
BEVILÁQUA, Clóvis. O Projeto do Código Civil e o Sr. Dr. Coelho Rodrigues. Jornal do Comércio. Rio de
Janeiro, 16 de abril de 1901. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=2019.
156
de reprovado o projeto Joaquim Felício em 1883, onde o seu trabalho deveria ser aproveitado.
Como afirmou Clóvis Beviláqua, Coelho Rodrigues pretendia que “se fizesse apenas uma
revisão do seu projeto, sob a sua imediata fiscalização”.391
Por outro lado, porém, o ministro supostamente deixou claro por meio de contrato que
Clóvis Beviláqua tinha total liberdade para a escrita do seu projeto, e que poderia utilizar por
base o projeto de Coelho Rodrigues, apropriando-se assim da resolução do senado de 1896.
Apesar de tal decisão, não foi garantido a Coelho Rodrigues nenhum acordo que o
beneficiasse pelo seu trabalho tomado por base, o que supostamente motivou-o então a
criticar o trabalho de Beviláqua e reclamar ao governo o direito de propriedade literária sob o
seu projeto, desautorizando que nele fosse alterado algo quando autorizado pelo governo a sua
utilização.
Em publicação posterior ao falar sobre o impasse, Coelho Rodrigues respondeu que
sua iniciativa em reclamar ao governo o crédito e, necessariamente, o prêmio pelo projeto
esteve calcada na suposta falta de compromisso do governo em pagar o prêmio pelo projeto
que, segundo o mesmo, foi utilizado como base para o trabalho de Clóvis Beviláqua. Nisso,
Coelho Rodrigues acrescentou a própria fala de Beviláqua onde inscreveu na sua exposição de
motivos ter se utilizado de copiosos elementos do projeto do seu antecessor para a construção
que lhe havia sido confiada. Nesse caso reclamou propriedade literária ao governo pelo fato
do seu trabalho continuar pendente apesar de ter sido base para execução do projeto
Beviláqua, como este mesmo confessou.392
Na realidade, Coelho Rodrigues afirmou que o ministro teria simulado executar o
plano do senado, contratando um jurisconsulto para aparentemente realizar a revisão do seu
projeto. Em seguida, teria sido firmado acordo sigiloso entre Epitácio e Beviláqua, para que
este redigisse um novo projeto, o que na realidade seria uma forma de mascarar a resolução
que autorizava a revisão e utilização do projeto de Coelho Rodrigues como base, sem que
fosse pago pelos seus esforços, segundo denunciou este. Para tanto, o ministro teria recorrido
à comissão revisora por meio de acordos políticos no sentido de que a aceitação do projeto
Clóvis/Epitácio, como passou a ser chamado, fosse possível, e somente assim remetido ao
congresso.393
391
BEVILÁQUA, Clóvis. O Projecto do Código Civil e o Sr. Dr. Coelho Rodrigues IV. Jornal do Comércio. Rio
de Janeiro, 17 de maio de 1901. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=2273.
392
Idem.
393
Idem.
157
394
RODRIGUES, Antônio Coelho. Jurisprudência: Código Civil – Projecto Clóvis-Epitácio – Sua gênese e
evolução. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 24 de maio de 1901. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=2328.
395
Idem.
396
Idem.
158
397
VÁRIAS NOTÍCIAS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 22 de agosto de 1901. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22codigo%20civil%22&pagfis=308
4.
398
VÁRIAS NOTÍCIAS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 02 de outubro de 1901. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=3426.
399
Idem.
400
TORRES NETO, A. J. Rodrigues. O Código Civil Brazileiro. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 28 de
junho de 1901. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=2625.
159
401
CÓDIGO CIVIL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 19 de janeiro de 1902. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=3839.
402
CONGRESSO NACIONAL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 26 de fevereiro de 1902. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=4125.
403
CÂMARA DOS DEPUTADOS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 21 de março de 1902. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=4301.
160
404
VÁRIAS NOTÍCIAS. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 01 de abril de 1902. Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_09&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=4384.
405
GAZETILHA: CONGRESSO NACIONAL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 29 de dezembro de 1910.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_10&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=3917.
161
reclamasse por justiça em prol de Coelho Rodrigues. Em dezembro de 1911, Celso Bayma
acabou fazendo justificativa da emenda enviada ao congresso nacional pela bancada piauiense
que tramitava no decorrer desse ano e autorizava o pagamento dos 100:000$ também a
Coelho Rodrigues, “uma vez que o referido jurisconsulto se tinha desempenhado da sua
missão contratual”.406 Nesse sentido, assim como Clóvis Beviláqua havia recebido o prêmio,
depois da sua justificativa afirmando ter tomado por base principal o projeto de Coelho
Rodrigues, nada mais justo que este também fosse recompensado. Segundo afirmação que
teria sido proferida pelo próprio Celso Bayma no congresso, o mesmo teria dito que:
O Dr. Clóvis Beviláqua declarou lealmente ao elaborar o seu bello trabalho
que na confecção de seu projecto elle tinha tomado por base a obra do
Conselheiro Coelho Rodrigues.
E se o Congresso julgou acertado e de direito mandar pagar ao Dr. Clóvis
Beviláqua o prêmio do seu trabalho, nada justifica que o illustre Sr. Dr.
Coelho Rodrigues não receba a recompensa dos seus serviços prestados com
dedicação e sabedoria ao serviço da promulgação de um código civil para o
nosso paiz. (Muito bem.)407
Apesar da reclamação de Bayma e apoiadores pelo reconhecimento de Coelho
Rodrigues, e o pagamento pelos serviços prestados, não houve efetividade na discussão pela
aprovação da emenda. No ano seguinte, pouco tempo após o retorno das atividades
parlamentares, Coelho Rodrigues veio a óbito no dia 01 de abril de 1912. Findou a sua
participação como um jurisconsulto que deu fôlego à obra de codificação civil brasileira, mas
que no fim pouco foi o reconhecimento que o mesmo recebeu do governo. A sua presença foi
envolta de controvérsias, que apesar de reclamada por si e por contemporâneos pelo
reconhecimento, não chegou a ser recompensado pelos serviços prestados.
A presença de Coelho Rodrigues no processo de codificação do direito civil foi
grande, apesar de pouco mostrada na historiografia. Como vimos, mesmo depois de envolver-
se em um processo para não ser silenciado pelo governo, mediante sua afirmação, acabou
sendo ouvido pelo legislativo sobre suas reclamações, apesar de não ter havido efetividade
para repará-las. Coelho Rodrigues posteriormente participou de diversas reuniões para dar
parecer e suas contribuições sobre o projeto de Clóvis Beviláqua, mesmo não estando atuando
em cargo político, mas chamado a compor as sessões da comissão da câmara como convidado
especial. Essa parte da sua vida até então não havia sido relatada nos estudos sobre Coelho
Rodrigues, tornando-se uma novidade o fato de que suas contribuições estiveram para além da
406
GAZETILHA: CONGRESSO NACIONAL. Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 14 de dezembro de 1911.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=364568_10&Pesq=%22Coelho%20Rodrigues%22&pagfi
s=7911.
407
Idem.
162
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O esforço deste trabalho reflete a intenção do autor em demonstrar o quão atuante foi
Antônio Coelho Rodrigues enquanto político e jurisconsulto, revelando as disputas políticas e
jurídicas em um contexto de mudanças nacionais no final do século XIX e início do XX.
Piauiense notável, sua trajetória pessoal e profissional, acabaram sufocadas pelo tempo,
figurando na historiografia por meio de esparsos registros do seu passado. Isso tornou o
político e jurista natural do Piauí, uma personalidade relativamente esquecida, apesar da sua
expressividade não somente local, mas de reconhecimento nacional, e até mesmo
internacional, dentro da época em que viveu.
A viragem da monarquia à República brasileira é uma das temáticas mais trabalhadas
pela historiografia tradicional. Coelho Rodrigues foi participe dentro desse processo histórico,
onde suas movimentações políticas e jurídicas contribuíram para a construção de um sentido
de nação brasileira. Apesar da aparente apatia, foi operador das mudanças, principalmente no
tocante às questões referentes à renovação do aparato legislativo reclamadas pelo tempo de
transformações no transitar de um regime ao outro. Coelho Rodrigues foi um político e
jurisconsulto, que apesar de se considerar incapaz de adequar a sua ação às condições do país
e do tempo, empreendeu esforços que foram amplamente considerados no decorrer do
processo de construção nacional.
Nosso estudo tornou-se uma proposta variada. Enfocamos inicialmente na análise da
sua trajetória de vida como forma de contribuir com uma história biográfica em torno de
Antônio Coelho Rodrigues. Isso nos possibilitou ampliar o conhecimento sobre essa
personalidade que foi expressiva no seu tempo, mas cujos registros não fazem jus ao seu
nome, não figurando trabalhos consistentes ao seu respeito. Coelho Rodrigues adveio de uma
pequena cidade do sertão do Piauí, e ganhou projeção nacional. Graduou-se na Faculdade de
Direito do Recife, onde posteriormente doutorou-se e se tornou professor pela mesma
instituição. Nesse interim, atuou como político pela sua província/estado, de onde possuiu
grande influência e reconhecimento. Historicamente, porém, ficou relativamente esquecido
como um dos ilustres da sua época.
O afamado professor de direito civil, depois de ter participado de duas das comissões
em prol da feitura do código civil no Império, acabou sendo contratado assim que instalada a
República para redigir o texto legislativo civil que tornar-se-ia base de execução do código
civil da República. Os reveses políticos de então, quando apresentou o seu projeto ao governo
Floriano Peixoto, dificultaram o reconhecimento da sua obra. Negada pela comissão do
165
governo, posteriormente aprovada pela comissão do senado, no fim o trabalho acabou sendo
arquivado pela câmara. Essa foi uma controvérsia política que se estendeu à utilização da sua
obra como base principal para a realização do projeto de Clóvis Beviláqua, apesar de não
dispor do reconhecimento.
Sustentamos que foi possível uma relação entre Coelho Rodrigues e Clóvis Beviláqua,
e que na verdade o primeiro contribuiu amplamente para levar a efeito uma obra de época
importante para a construção legislativa renovada da nação que se criava. Os reveses políticos
das condições da sua existência, porém, foram influentes para que Coelho Rodrigues acabasse
em uma condição de fracassado diante das suas atuações tanto políticas quando como
jurisconsulto. Isso não permitiu que o seu nome figurasse enquanto um sujeito que muito
contribuiu para a formação nacional brasileira.
Partindo de Coelho Rodrigues como sujeito signo da pesquisa, nos propomos a estudar
as disputas políticas nacionais em uma época de transformações no decorrer da Monarquia à
República, o que demandava a necessidade de institucionalização da nação sob a ideia de uma
República que se criava. Coelho Rodrigues foi participe dentro do processo de
transformações. Como político esteve atuando tanto no Império como na República enquanto
deputado e senador pela província/estado natal, o Piauí.
Nas entrelinhas dessa discussão, buscamos enxergar a maneira como Coelho
Rodrigues esteve atuante no decorrer da sua vida política e como, apesar do seu suposto
sucesso, esteve envolvido nas controvérsias do seu tempo. Com a instalação da República
foram mudando-se os grupos no poder. Do relativo sucesso, Coelho Rodrigues acabou
experimentando o fracasso. Não mais conseguindo vencer eleições para o senado, passou a
criticar o novo regime que se instalava, principalmente com relação aos novos dirigentes com
quem não mais simpatizou.
Acompanhando o seu fracasso na política, Coelho Rodrigues não conseguiu
estabelecer relações que lhe permitissem a execução do seu projeto de código civil.
Contratado como um dos principais intelectuais da sua época, professor respeitado da
Faculdade de Direito do Recife, Coelho Rodrigues redigiu o primeiro projeto de código civil
da República brasileira. Sustentamos a sua investida como a mais complexa das tentativas
pelo fato de que a escrita de um trabalho de direito privado que contemplasse uma legislação
renovada condizente com as novas condições em que se encontrava o Brasil com a mudança
de regime era algo bastante difícil.
Somado à execução de um trabalho de tamanha monta, suas relações políticas neste
momento também não lhe foram favoráveis. Coelho Rodrigues acabou não encontrando
166
meios adequados para apresentar o seu trabalho. Governo totalmente alheio à matéria civil,
ministério da justiça indisposto para com o seu projeto, foi impossível, mesmo atuando como
senador, fazer a sua proposta ser aprovada pelo governo. O congresso até lhe foi favorável,
porém no fim das contas o trabalho silenciou.
Além de todo o processo que acompanhou desde o Império pela execução do código
civil, apesar de não atuar na política, foi convidado especial em diversas reuniões para
apresentar parecer sobre o projeto de Clóvis Beviláqua. Além de ter sido afirmado que este
último tomou por base principal o projeto de Coelho Rodrigues, o que por si já demandava
reconhecimento, ambos foram relacionados como principais responsáveis por levar a efeito
obra cara ao direito brasileiro à época. Com o tempo, Clóvis Beviláqua obteve
reconhecimento sobre o qual alimentaram-se produções historiográficas consistentes, por
outro lado Coelho Rodrigues acabou ficando relativamente esquecido.
O fracasso historiográfico de Coelho Rodrigues pode estar relacionado, como
discutimos, ao fato de que os historiadores do final do século XIX e início do XX, embebidos
da fonte positivista, valorizaram aqueles espíritos considerados liberais e republicanos nos
seus estudos. Coelho Rodrigues foi associado ao suposto atraso do regime imperial por ser
considerado conservador. Essa divisão de tendência política pela historiografia positivista
certamente contribuiu para que Coelho Rodrigues não fosse foco de atenção por parte de
pesquisadores no decorrer do tempo.
Por fim, sustentamos o quanto Coelho Rodrigues foi participe dentro de um processo
histórico que acabou reduzindo o seu aparecimento como um dos principais políticos e
jurisconsultos da sua época com ação para promover mudanças sociais importantes. Coelho
Rodrigues experimentou uma condição de existência em que a complexidade das relações e as
mudanças estruturais o empurraram para o relativo esquecimento histórico. Suas
movimentações políticas e jurídicas, porém, foram importantes para a ampliação dos
conhecimentos em torno das disputas políticas e jurídicas no decorrer da Monarquia à
República brasileira.
167
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
A) FONTES:
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170
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