Livro Dignidade Menstrual

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:

PARA QUEM?
1º Edição
Porto Alegre, 2024
Rede UNIDA

:
PARA QUEM?
Copyright © 2024 by Associação Rede UNIDA

Coordenador Geral da Associação Rede UNIDA


Alcindo Antônio Ferla

Coordenação Editorial
Editor-Chefe: Alcindo Antônio Ferla

Editores Associados
Carlos Alberto Severo Garcia Júnior, Daniela Dallegrave, Denise Bueno, Diéssica Roggia Piexak, Fabiana Mânica Martins, Frederico Viana
Machado, Jacks Soratto, João Batista de Oliveira Junior, Júlio César Schweickardt, Károl Veiga Cabral, Márcia Fernanda Mello Mendes, Márcio
Mariath Belloc, Maria das Graças Alves Pereira, Quelen Tanize Alves da Silva, Ricardo Burg Ceccim, Roger Flores Ceccon, Stephany Yolanda Ril,
Vanessa Iribarrem Avena Miranda, Virgínia de Menezes Portes

Conselho Editorial
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Alcindo Antônio Ferla (Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil).
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Ardigó Martino (Università di Bologna, Itália).
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Ricardo Burg Ceccim (Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil).
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Vincenza Pellegrini (Università di Parma, Itália).

Comissão Executiva Editorial


Alana Santos de Souza
Jaqueline Miotto Guarnieri
Camila Fontana Roman

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

D575
Dignidade Menstrual: para quem? / Claudia Fegadolli; Ana Luiza Satie Voltolini Uwai
(Organizadoras) – 1. ed. -- Porto Alegre, RS: Editora Rede Unida, 2024.
64 p. (Série Interlocuções Práticas, Experiências e Pesquisas em Saúde, v. 52).
E-book: PDF.
Inclui bibliografia.
ISBN: 978-65-5462-133-5
DOI: 10.18310/9786554621335

1. Menstruação. 2. Dignidade Menstrual. 3. Vulnerabilidade. 4. Extensão Universitária.


5.Direitos Humanos. I. Título II. Assunto. III. Organizadoras.
NLM WA 4
CDU 614
Bibliotecária: Alana Santos de Souza | CRB1 10/2738
FICHA TÉCNICA
Coordenação Extensionistas em campo
Claudia Fegadolli Anna Campos
Biana Politto de Sá
Vice-coordenação Egle Maite
Lumena Almeida Castro Furtado Fabiana Buso Ferreira
Colegiado de coordenação Heloiza Cristina Gonçalves de Souza
Carolina Vigliar Karla Aparecida Albuquerque Dos Santos
Isabela Benassi Laura Silva Santana
Vivian Mendes Max Ruan de Souza Peruzzo
Raquel Oliveira de Brito
Equipe Samira Nazario
Coordenadoras de campo Yu Ohtsuki
Ana Luiza Satie Voltolini Uwai
Julia Köpf de Moraes Paulo Iniciação científica
Julia Soares dos Santos Amanda Alves Vilas Boas Oliveira
Karin Di Monteiro Luiza Guimarães Imagure
Luiza Tenan Vitor
Apoio técnico Sônia Maria Reis da Costa Rêgo
Ananda Méndez Inácio
Giovanna Rondon Giovanella Projeto Gráfico
Juliana Freires dos Santos Aline Maruyama

Organizadoras Diagramação
Claudia Fegadolli Ana Luiza Satie Voltolini Uwai
Ana Luiza Satie Voltolini Uwai

AGRADECIMENTO
Alexandre Padilha por destinação de emenda parlamentar para a Universidade Federal de
São Paulo, o que garantiu o financiamento do projeto Dignidade Menstrual.
PREFÁCIO
Em meio às ruas vibrantes e complexas da maior metrópole da América Latina,
escondem-se vidas invisíveis, situadas nas margens de uma sociedade que muitas
vezes lhes nega o básico. Ignorado até bem pouco tempo atrás, o debate sobre
a dignidade menstrual tem ganhado cada vez mais destaque, reconhecendo a
importância de garantir acesso a produtos de higiene menstrual, condições de
saneamento básico e educação adequada, de forma a promover a saúde, o bem-
estar e a igualdade de gênero para todas as pessoas que menstruam.
Esta obra apresenta ao leitor as bases conceituais sobre o tema, a análise das
políticas públicas para a garantia da dignidade menstrual, bem como a situação
atual e os desafios que precisamos enfrentar. É um trabalho que transcende os
muros da academia, destacando a urgência de se incluir a dignidade menstrual nas
políticas públicas. As vozes das ruas e ocupações, onde a ausência do Estado é mais
sentida, ecoam através das páginas e palavras das entrevistadas, revelando a falta
de suporte e o tratamento desigual enfrentado por pessoas que menstruam.
“Dignidade Menstrual: para quem?” é um grito de alerta, um chamado para
lançarmos nossos olhares sobre uma realidade que persiste ignorada na cidade de
São Paulo e no Brasil, especialmente entre os grupos sociais mais vulnerabilizados
e marginalizados. Esta iniciativa não só mapeou a realidade da pobreza menstrual,
mas também criou laços com as comunidades locais, ressaltando que a luta pela
dignidade menstrual é intrinsecamente ligada à busca por uma vida digna e justa
para todas as pessoas.

5
Dignidade Menstrual: para quem?

O projeto, desenvolvido pelo Laboratório de Saúde Coletiva da UNIFESP, em


parceria com movimentos sociais, mapeou qualitativamente a pobreza menstrual
no centro da capital paulista, dividindo a região em três núcleos coordenados por
diferentes grupos. A equipe, composta por extensionistas, técnicos e estudantes,
realizou um levantamento detalhado e promoveu ações educativas para fortalecer
redes de assistência. A cartografia narrada das vivências nos núcleos da Luz, Sé e
Canindé/Pari expôs a dura realidade de diferentes grupos, desde pessoas em situação
de rua até aquelas em trabalhos precarizados, mostrando que a falta de acesso a
absorventes é apenas uma parte de um problema maior, que inclui a ausência de
banheiros, água potável e informações adequadas. A percepção recorrente de que a
menstruação é algo sujo ou que vulnerabiliza ainda mais os corpos que menstruam,
ilustra que a experiência do ciclo menstrual é diversa e necessita ser compreendida
em suas múltiplas facetas.
Com uma visão global e local, o livro ainda compara as experiências internacionais
para a promoção do acesso a absorventes menstruais com a realidade do Brasil
e, mais especificamente, de São Paulo, fornecendo uma compreensão crítica das
políticas e práticas necessárias para melhorar a situação.
A dignidade menstrual deve ser vista como parte de uma agenda mais ampla
de direitos humanos, saúde e justiça social. É essencial que as políticas públicas
integrem a dignidade menstrual como um direito fundamental, proporcionando
não apenas absorventes, mas também o acesso a banheiros, água e informações
adequadas. Que este livro inspire ações concretas e colaborações contínuas para
assegurar que todas as pessoas que menstruam possam viver com dignidade e
respeito.

Mariana Seabra Souza Pereira


Enfermeira Mestre em Saúde Pública pela ENSP/FIOCRUZ

6
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO------------------------------------------------------------------------------ 9

INTRODUÇÃO------------------------------------------------------------------------------- 11
DIGNIDADE MENSTRUAL----------------------------------------------------------------------- 11
POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A GARANTIA DA DIGNIDADE MENSTRUAL-------------- 13
ACESSO A ABSORVENTES MENSTRUAIS---------------------------------------------------- 14
EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS PARA A PROMOÇÃO DO ACESSO A
ABSORVENTES MENSTRUAIS------------------------------------------------------------------ 14
BRASIL---------------------------------------------------------------------------------------------- 15
SÃO PAULO---------------------------------------------------------------------------------------- 17

A ORIGEM E OS OBJETIVOS DO PROJETO-------------------------------------------- 19


PERCURSO----------------------------------------------------------------------------------------- 20

COMO É O TERRITÓRIO PARA AS PESSOAS INVISIBILIZADAS EM SUA POBREZA


MENSTRUAL?------------------------------------------------------------------------------- 22
NÚCLEO LUZ-------------------------------------------------------------------------------------- 24
NÚCLEO SÉ---------------------------------------------------------------------------------------- 28
NÚCLEO CANINDÉ/PARI------------------------------------------------------------------------ 32
AS VIVÊNCIAS DAS PESSOAS COM A MENSTRUAÇÃO------------------------------- 36
A POBREZA MENSTRUAL ENTRE AS PESSOAS EM SITUAÇÃO DE RUA--------------- 36
A POBREZA MENSTRUAL ENTRE AS PESSOAS QUE VIVEM EM OCUPAÇÕES------- 40
A POBREZA MENSTRUAL ENTRE PESSOAS QUE EXERCEM TRABALHOS
PRECARIZADOS NO TERRITÓRIO, EXCETO TRABALHADORAS DO SEXO------------ 42
A POBREZA MENSTRUAL ENTRE AS TRABALHADORAS DO SEXO-------------------- 43

AÇÕES DO PROJETO----------------------------------------------------------------------- 47
ELABORAÇÃO DE MATERIAIS EDUCATIVOS------------------------------------------------ 47
RODAS DE CONVERSA EDUCATIVAS SOBRE DIGNIDADE MENSTRUAL -------------- 48
PALESTRAS SOBRE DIGNIDADE MENSTRUAL--------------------------------------------- 48
PALESTRAS E PLANEJAMENTO DE AÇÕES COM PROFESSORES E ESTUDANTES
DA EMEF ESPAÇO BITITA----------------------------------------------------------------------- 49
AÇÃO NO INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE SÃO
PAULO----------------------------------------------------------------------------------------------- 49
INSERÇÃO DE CONSELHEIRA NO CONSELHO GESTOR DA UNIDADE BÁSICA DE
SAÚDE DO PARI----------------------------------------------------------------------------------- 51
AÇÃO NA VILA SANTO ANTONIO (PARI)----------------------------------------------------- 52

CONCLUINDO, SEM TERMINAR--------------------------------------------------------- 53

E A UNIVERSIDADE EM TUDO ISSO?---------------------------------------------------- 55

REFERÊNCIAS------------------------------------------------------------------------------ 58
APRESENTAÇÃO
O ebook Dignidade Menstrual: para quem? se propõe a debater o direito
à dignidade menstrual de uma parcela da população aviltada pelas profundas
desigualdades sociais do Brasil, invisibilizada no atual debate público sobre a
pobreza menstrual. São cerca de 60 milhões de pessoas que menstruam no Brasil,
porém grande parte não pode ter dignidade menstrual1.
Os recentes avanços no enfrentamento desse tema têm se concentrado
principalmente na regulamentação do acesso de estudantes a insumos menstruais,
especificamente aos absorventes descartáveis, com muito a se construir para que
esse direito seja realmente garantido às mulheres e outras pessoas que menstruam.
Recentemente, ação do governo federal brasileiro normatizou a distribuição de
absorventes a pessoas em situação de vulnerabilidade, porém tais medidas são
limitadas na promoção da dignidade menstrual. A experiência dos grupos que
vivem afetados pela pobreza, mas que não são institucionalizados, é configurada
por pouco ou nenhum acesso a conhecimento, água, banheiros limpos, produtos de
higiene, insumos e medicamentos.
Há lacunas importantes no conhecimento em relação à forma como pessoas
diversas, de diferentes identidades de gênero e faixas etárias, vivenciam a
menstruação. Por isso, com o olhar voltado às pessoas afetadas por vulnerabilidades,
esta publicação retrata o trabalho desenvolvido, nos anos de 2021 e 2022, pela
parceria entre o Laboratório de Saúde Coletiva (LASCOL) da Universidade Federal
de São Paulo (UNIFESP) e três movimentos sociais organizados, na região central

9
Dignidade Menstrual: para quem?

de São Paulo, a campanha Fluxo Solidário, o Centro de Convivência É de Lei e o


Movimento de Mulheres Olga Benario.
É importante destacarmos que vivíamos, neste período, o auge da pandemia
de Covid-19, com muitas restrições e, ao mesmo tempo, maior necessidade de
proteção e de uso de produtos e insumos de saúde e de higiene. O cenário foi o de
aprofundamento da pobreza, da fome e da violência urbana, com relevante violência
de Estado em suas diversas formas, na região em que o projeto foi desenvolvido.
Pela experiência acumulada de transitar e de agir no território, os agentes de
movimentos sociais participantes do projeto, orientados também pelos princípios,
métodos e técnicas de produção do conhecimento próprias à extensão universitária,
caminharam pelo território, observaram, conversaram com as pessoas, debateram e
registraram suas impressões sobre o direito à dignidade menstrual
Esse ebook é o resultado da sistematização do conhecimento acumulado, de
relatos de vida, assim como da síntese das ações de educação, de solidariedade e
de organização social e política, já realizadas ou em construção.
A fim de contribuir para que todas as pessoas que menstruam tenham visibilidade
e possam alcançar a dignidade menstrual, convidamos a sociedade a conhecer este
trabalho.
Claudia Fegadolli

10
INTRODUÇÃO
DIGNIDADE MENSTRUAL
A dignidade menstrual pode ser reconhecida quando as pessoas que menstruam
possuem as condições e recursos fundamentais para vivenciarem a menstruação
sem constrangimentos, incômodos ou sofrimentos evitáveis. É a situação oposta à
pobreza menstrual, em que não se tem acesso a protetores menstruais, infraestrutura
para higiene, saneamento básico, água, banheiros, medicamentos, assim como o
conhecimento sobre a menstruação e a saúde menstrual.

A falta de acesso aos recursos afeta a dignidade menstrual das pessoas que
menstruam, mulheres cisgêneras, homens transgêneros e pessoas não-binárias, as
quais são levadas a buscar soluções improvisadas e impróprias para higienização
íntima e/ou contenção do sangramento menstrual, como por exemplo a utilização
de pedaços de pano usados, pedaços de tecidos ou jornal. Constituem-se
também elementos da pobreza menstrual a falta de informação sobre a saúde e
o funcionamento do próprio corpo devido a tabus e a preconceitos enraizados na
sociedade a respeito da menstruação2.

A pobreza menstrual afeta diretamente a saúde física e mental das pessoas


que menstruam, podendo ser a causa de alergias, irritações da pele e mucosas e
infecções urogenitais, principalmente quando há uso de protetores menstruais
internos por mais tempo que o recomendado ou, ainda, pelo uso de alternativas
inadequadas. Sofrimento psíquico ou emocional costuma estar associado quando

11
Dignidade Menstrual: para quem?

há preocupação sobre a falta de produtos, o medo de situações constrangedoras


ou a insegurança sobre a própria vivência por desinformação e preconceito3. Além
disso, a falta de produtos e meios adequados para vivenciar a menstruação também
pode gerar prejuízos importantes, como faltar à escola ou trabalho, comprometendo
oportunidades profissionais e a geração de renda. Cerca de 62% das adolescentes
já deixaram de ir à escola ou outros lugares e mais de 70% já passaram por algum
constrangimento durante o período menstrual4.

O tema da dignidade menstrual tem alcançado, nos últimos anos, maior


visibilidade no debate público, principalmente a partir de 2015, quando a
pobreza menstrual passou a ser problematizada no contexto dos Objetivos do
Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU)5, por ser
considerada uma questão de saúde pública e de direitos humanos, diretamente
relacionada à desigualdade de gênero, à pobreza, às dificuldades de acesso à
água, saneamento e educação, com o reconhecimento de que seu enfrentamento
demanda a implementação de políticas públicas abrangentes6.

Mais de 11 milhões de brasileiras não têm acesso a produtos de higiene e quatro


em cada 10 mulheres no país convivem com o tema da pobreza menstrual, pois
ou são afetadas ou conhecem alguém que é, sendo um dos principais motivos o
elevado custo dos produtos7,8.

A falta de produtos para a contenção do fluxo, porém, não é a única barreira para
a dignidade menstrual. Cerca de 1,3 milhões dos domicílios brasileiros não possui
banheiro, mais de 10 milhões não contam com água em redes de distribuição e 22,6
milhões das casas não contam com coleta de esgoto, uma distribuição desigual que
acompanha a distribuição de renda no país9. A falta de infraestrutura e saneamento
básico afeta a saúde de todas as pessoas que vivem nessa situação precária, mas
especialmente das que menstruam. Há, ainda, as pessoas que vivem em situação
de rua, com números crescentes e alarmantes, e que têm pouco e dificultoso acesso
a banheiros públicos ou de estabelecimentos comerciais, que, quando acessíveis,
não são limpos10,11.

Um outro aspecto bastante relevante na temática da dignidade menstrual é


o acesso à informação e ao conhecimento relativo aos corpos que menstruam,
seus direitos e cuidados com a menstruação. Não é incomum que adolescentes
desconheçam como a menstruação ocorre, antes dela começar a acontecer, mesmo
em realidades em que as vulnerabilidades sociais não se fazem tão presentes, o
que pode provocar situações como gravidez indesejada, problemas de saúde ou
sociais12,13. Preconceitos, mitos e tabus podem tornar a experiência da menstruação
constrangedora, incômoda ou traumática, sendo necessário que toda a sociedade
seja educada a respeito do tema e se sensibilize perante as necessidades das
pessoas que menstruam, sem que menstruar seja motivo de vergonha ou imponha

12
Dignidade Menstrual: para quem?

restrições de qualquer tipo ou riscos à saúde física ou mental de quem menstrua.

A falta de dignidade menstrual está, portanto, relacionada a uma série de fatores,


como desigualdade social, desigualdade de gênero e de renda, falta de acesso a
saneamento básico ou insumos, assim como à educação popular, sendo preciso
considerar como tais elementos afetam pessoas de maneiras específicas. Indivíduos
ou grupos com distintos marcadores sociais, como raça, gênero, educação e classe
social, vão ter diferentes vivências do seu período menstrual.

POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A GARANTIA DA


DIGNIDADE MENSTRUAL
No debate sobre a pobreza menstrual, vem ganhando espaço, no mundo todo,
a ideia da responsabilização do Estado e da importância de garantia de políticas
públicas que promovam a dignidade menstrual. O tema vem se fortalecendo no
debate público principalmente a partir de publicações da Organização da Nações
Unidas e de organizações não governamentais que atuam na visibilização de
vulnerabilidades ligadas às questões de gênero.

Como já mencionado, a promoção da dignidade menstrual é apontada como


uma das ações que vai de encontro aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável
(ODS) até 2030, incluindo medidas que resolvam problemas relacionados à redução
da pobreza, educação, igualdade de gênero, saúde sexual e reprodutiva, bem-
estar psicossocial, água, proteção ao meio ambiente, saneamento e higiene, que
correspondem aos ODS 1 a 175,13. Tais medidas devem ser assumidas pelos governos
como questões prioritárias, ao mesmo tempo em que se faz necessária a mobilização
social para construir e implementar políticas educacionais e de equidade de gênero,
relativas ao tema.

No Brasil, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e o Fundo de


População das Nações Unidas (UNFPA), organizaram, em 2021, o relatório “Pobreza
menstrual: desigualdades e violações de direitos”2. Este é um marco relevante
para o tema no país, por apresentar o panorama da pobreza menstrual na infância e
adolescência, além de medidas necessárias para seu enfrentamento. O documento,
entretanto, não aborda populações adultas vulnerabilizadas pela pobreza e por
situações de vida, como as trabalhadoras de baixa renda, moradoras de cortiços ou
de ocupações ou, ainda aquelas sem renda ou em situação de rua.

Da mesma forma, a movimentação social em torno da elaboração de dispositivos


regulatórios vai se fortalecendo principalmente em torno da pobreza menstrual de
adolescentes e escolares.

13
Dignidade Menstrual: para quem?

Mais recentemente, as recomendações para as políticas públicas do UNFPA


(2023)14 avançaram no reconhecimento de outros grupos que devem ser favorecidos
por ações voltadas à promoção da dignidade menstrual, além dos alcançados pelo
sistema educacional, como aqueles assistidos pela assistência social e pelo sistema
prisional ou socioeducativo brasileiro, assim como as pessoas em situação de rua
ou abrigamento.

ACESSO A ABSORVENTES MENSTRUAIS


A dificuldade de acesso a produtos menstruais, como absorventes, calcinhas ou
coletores tem sido mapeada em diversos estudos, principalmente em países de baixa
e média renda, conforme mostra uma recente revisão da literatura. Os absorventes
descartáveis, bastante úteis e cômodos, são considerados itens de difícil acesso por
não estarem disponíveis em sistemas de suporte social e por terem preço elevado,
o que se relaciona a muitos fatores, mas que tem influência importante no nível de
tributação. Os governos de diferentes países têm adotado medidas para redução da
tributação, muitas vezes pressionados por movimentos populares.

EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS PARA A


PROMOÇÃO DO ACESSO A ABSORVENTES
MENSTRUAIS

14
Dignidade Menstrual: para quem?

Políticas de enfrentamento à pobreza menstrual já foram implementadas em


diversos países, como o Quênia, que em 2004 foi o primeiro a suprimir a tributação
sobre os produtos de higiene menstrual. No Canadá a isenção de impostos vigora
desde 2015. Nos Estados Unidos, onde as regras são estaduais, cerca de 20 dos 50
estados aboliram os impostos sobre absorventes.

Entre os países que não aboliram, mas que reduziram a tributação dos insumos,
está a Malásia, onde pressões populares resultaram em mudanças nas regras de
taxação de produtos menstruais, que eram considerados artigos de luxo até 2018.
Na Alemanha, absorventes são taxados similarmente a produtos de primeira
necessidade, como os alimentos. Na Itália, partir de 2019, os absorventes passaram
a ser produtos de primeira necessidade, com tributação que passou de 22 para 5%
apenas para os absorventes biodegradáveis, agregando medidas de estímulo à
proteção do meio ambiente. Em 2017, o governo da Índia havia decidido aumentar a
alíquota sobre os produtos usados na menstruação, porém após reações populares
não tiveram redução, mas permanecem em torno de 28%.

Há países que adotam o fornecimento gratuito como ação de combate à pobreza


menstrual, como a França, que fornece absorventes para estudantes universitárias
desde 2021 e a Nova Zelândia, onde há fornecimento gratuito nas escolas.

Entre os países da América Latina, a Colômbia diminuiu os impostos sobre


produtos de higiene menstrual de 16% para 5% em 2016 e, em 2018, aboliu as taxas
depois de uma grande mobilização por parte da sociedade civil e de movimentos
políticos. Em 2021, o Peru passou a disponibilizar gratuitamente produtos de higiene
menstrual em estabelecimentos públicos de saúde, instituições educacionais,
albergues e centros penitenciários.

Além desses países que implementaram medidas por dispositivos regulatórios,


a Argentina é um exemplo latino-americano que inovou em ações decorrentes de
movimentos sociais, como a campanha #MenstruAcción, a qual resultou em acordo
com representantes de supermercados e fornecedores para a redução nos preços de
absorventes internos e externos. A pressão do movimento social também impactou
políticas locais, como a adoção de distribuição gratuita de absorventes em dois
municípios, Morón e Santa Fé.

BRASIL
O Brasil é um dos países que mais tributam absorventes higiênicos no mundo, com
uma tributação de cerca de 30%, o que encarece os produtos e dificulta o acesso a
estes. A alíquota tributária estabelecida para esses produtos é comparável à de bens
supérfluos, o que deveria ser revisto, considerando a possibilidade constitucional de
estabelecer a tributação de produtos de acordo com a sua essencialidade15. A taxação

15
Dignidade Menstrual: para quem?

vigente reforça a desigualdade de gênero e afeta a dignidade menstrual das pessoas


que menstruam, principalmente aquelas e aqueles que se encontram em situação de
maior vulnerabilidade social.

Em julho de 2024, no processo de regulamentação da reforma tributária brasileira,


um grupo de trabalho da Câmara dos Deputados aprovou zerar a tributação para
absorventes, tampões higiênicos, calcinhas absorventes e coletores menstruais, o que
deve possibilitar redução no custo de tais produtos no país.

No país, o Conselho Nacional de Direitos Humanos recomendou, em 2020, a criação


de uma política nacional de superação da pobreza menstrual16. Nessa direção, foram
promulgados a Lei Federal nº 14.214/2117 e o decreto regulamentar 11.432/2318, que
iniciaram tramitação em 2019. A legislação estabelece a oferta gratuita de absorventes
higiênicos e outros cuidados básicos de saúde menstrual para pessoas em situação
de rua ou em situação de vulnerabilidade social extrema, assim como para as pessoas
recolhidas em unidades do sistema prisional e para as que estão em cumprimento
de medidas socioeducativas. A referida lei foi vetada pelo ex-presidente Bolsonaro e
teve veto derrubado pelo Congresso Nacional. Prevê a viabilização, pelo Ministério da
Saúde, de cuidados para a saúde menstrual e da aquisição de absorventes higiênicos,
preferencialmente aqueles produzidos com materiais sustentáveis, para que os
Estados, o Distrito Federal e os Municípios os disponibilizem às pessoas em situação de
precariedade menstrual. No caso das pessoas privadas de liberdade, a articulação da
política deve se dar entre os Ministérios da Saúde e o da Justiça e Segurança Pública.
Nesse sentido, “Programa Dignidade Menstrual - um ciclo de respeito”, promovido
pelo governo Lula, busca atenuar o desafio da pobreza menstrual com a distribuição
gratuita de absorventes para pessoas em situação de vulnerabilidade nas unidades
da Farmácia Popular do Brasil19. O programa prevê o fornecimento de absorventes
para pessoas com idade entre 10 e 49 anos, que façam parte de famílias inscritas no
Cadastro Único com renda mensal por pessoa de até R$ 218, para estudantes de baixa
renda e pessoas em situação de rua.

O programa é um avanço importante no país, no entanto algumas limitações


merecem atenção. Primeiramente, a política não aborda a necessidade de mulheres
com mais de 49 anos, que também podem enfrentar dificuldades financeiras para
adquirir absorventes. Além disso, a exigência de acesso ao aplicativo Meu SUS digital
pode representar uma barreira significativa para muitas pessoas acessarem o benefício.

É importante destacar, também, que os eixos de intervenção recomendados para


a promoção da dignidade menstrual incluem, para além do acesso às tecnologias
menstruais, a infraestrutura para a saúde menstrual (água, saneamento e banheiros),
o acesso à saúde, a formação e educação menstrual, assim como a realização de
pesquisas e produção de dados que ajudem a conhecer e enfrentar o problema.

16
Dignidade Menstrual: para quem?

Há também legislações estaduais e municipais no país, como mostra uma análise


de impacto regulatório, publicada em 2021 pelo Ministério da Saúde, a qual informou
que existem iniciativas de oferta de absorventes nos estados de Goiás, Roraima,
Paraíba e Rio de Janeiro e Bahia assim como no município de São João Del Rei, todas
determinadas por leis do ano de 202120. Outras leis brasileiras referentes ao tema
são as de abrangência municipal: Lei nº 6712/202121, de Cuiabá/MT, que “institui e
define diretrizes para a política pública “Menstruação Sem Tabu” de conscientização
sobre a menstruação e a universalização do acesso a absorventes higiênicos e a Lei nº
11.192/202122, de Fortaleza/CE, que “dispõe sobre a instituição da política municipal
de atenção à higiene íntima e saúde menstrual para estudantes da rede municipal
pública de ensino, adolescentes, jovens e mulheres em situação de extrema pobreza e
vulnerabilidade social. No âmbito estadual, a Lei nº 8478/202123, de Alagoas, institui e
define diretrizes para a política pública Liberdade para Menstruar, no âmbito do estado
de Alagoas e a Lei nº 23.904/202124 dispõe sobre a garantia de acesso das mulheres em
situação de vulnerabilidade social a absorventes higiênicos no estado de Minas Gerais.

Como já ressaltado, o acesso à dignidade menstrual é muito desigual para diferentes


grupos sociais e a busca da equidade deve orientar as ações a serem desenvolvidas
dentro de políticas públicas nessa área, garantindo de forma prioritária a quem mais
precisa.

Um estudo de revisão sobre as políticas públicas brasileiras voltadas à dignidade


menstrual identificou 17 projetos de lei em contextos estaduais, municipais (7) ou de
abrangência nacional (17) publicados entre 2019 e 2021 e incluem: estados da Bahia,
Mato Grosso, Paraná, Rondônia e municípios de Campo Grande (MS) e São Miguel do
Oeste (SC). A análise do artigo indica que os projetos são limitados em sua abrangência
da pobreza menstrual, não abarcando suas diversas causas e invisibilizando homens
trans e pessoas não binárias que menstruam25.

SÃO PAULO
No estado de São Paulo, a Lei nº 17.525/202226 instituiu o Programa Dignidade Íntima,
no âmbito da Secretaria da Educação e do Centro Estadual de Educação Tecnológica
“Paula Souza” do Estado de São Paulo, que prevê aquisição de produtos relacionados
à higiene menstrual das estudantes, tais como absorventes higiênicos, coletores
menstruais, lenços umedecidos sem perfume, sacos e respectivos dispensadores para
descarte de absorvente, por meio de transferência direta de recursos do Estado para as
escolas públicas, especialmente as escolas técnicas e faculdades de tecnologia (ETECs e
FATECS). Este dispositivo regulatório tem permitido maior acesso a insumos menstruais
a uma parcela das pessoas que menstruam: as que estudam em escolas estaduais em
São Paulo.

17
Dignidade Menstrual: para quem?

Em fevereiro de 2023, o governador Tarcísio vetou o projeto de Lei “Menstruação sem


Tabu” (PL 1177/201927), de autoria da bancada feminina da Assembleia Legislativa de São
Paulo (Alesp). O PL havia sido aprovado na câmara no final de 2022 e previa apoio às
pessoas que menstruam que se encontram em situação de vulnerabilidade social28.

No município de São Paulo, está em vigência a Lei nº 17.574/202129 que “institui o


Programa de cuidados com as estudantes nas escolas da Rede Municipal de Ensino de
São Paulo”, visando a organização nas Unidades Educacionais de Ensino Fundamental
e Médio de cestas de itens de higiene, contendo desde absorventes internos e externos,
até lenço umedecido, desodorante sem perfume e sabonete, para as e os estudantes que
precisarem. O projeto original tinha como beneficiárias somente meninas e mulheres
cisgêneras, ignorando a população trans masculina que também menstrua e necessita
dessa política. Considerando isso, a vereadora Erika Hilton e o vereador Thammy Miranda
apresentaram substitutivo para que fosse incluído no texto da lei os homens trans e
demais pessoas que menstruam que tenham outra expressão de gênero. No final de
2023, no entanto, o Tribunal de Contas do município identificou falhas no cumprimento
da legislação e ausência de relatórios e estudos sobre a distribuição de produtos e da
comprovação da frequência de estudantes à escola30.

18
A ORIGEM E OS
OBJETIVOS DO PROJETO
Este projeto nasceu a partir do olhar de participantes de movimentos sociais
atuantes na região central de São Paulo sobre a experiência da menstruação entre
pessoas que vivem e circulam no centro da cidade, que são afetadas por diversas
vulnerabilidades, porém socialmente invisibilizadas. Em articulação com o Laboratório
de Saúde Coletiva da UNIFESP (Lascol), três movimentos com experiência na
temática somaram esforços: a Fluxo Solidário, o Centro de Convivência É de Lei e o
Movimento de Mulheres Olga Benario.

Com uma coordenação colegiada constituída, o grupo construiu uma proposta com
o objetivo geral de produzir ações voltadas à promoção da dignidade menstrual a
partir:

-do mapeamento qualitativo da pobreza menstrual no centro de São Paulo;

-do mapeamento, ativação e fortalecimento de redes assistenciais e de solidariedade


no território e

-da construção de ações educativas.

Foi um objetivo secundário do Lascol contribuir com o fortalecimento e a articulação


de movimentos sociais parceiros por meio do desenvolvimento compartilhado do
projeto, com o intuito de favorecer redes de solidariedade na luta por direitos humanos.

Com essa direção, foi cadastrado e aprovado na Unifesp um projeto de extensão


com o título Dignidade Menstrual, numa perspectiva extensionista.

19
Dignidade Menstrual: para quem?

PERCURSO
Considerando a amplitude do território, os locais de desenvolvimento do projeto
foram delimitados de acordo com a inserção dos movimentos sociais envolvidos,
a fim de valorizar os conhecimentos e articulações prévias de cada grupo. Assim, a
região central de São Paulo foi dividida em três áreas que passaram a constituir, cada
uma, um núcleo do projeto, com coordenação local por cada um dos respectivos
movimentos sociais, que atuaram de maneira integrada. Não houve a pretensão
de atuar sobre todas as áreas do centro, mas nas que melhor expressassem as
dinâmicas de interesse.

Cada um dos movimentos sociais envolvidos no projeto assumiu, então, a


coordenação de seu núcleo territorial, responsável por planejar as entradas de
campo e por organizar todo o trabalho de cada núcleo. Cada núcleo incluiu:

-uma pessoa de apoio técnico, responsável por atuar na condução do grupo de


extensionistas, apoiar sua formação, orientar, recolher e sistematizar o material
produzido em campo;

-três a quatro extensionistas, com o papel de conversar e interagir com as pessoas,


observar o território e fazer registros escritos e audiovisuais e

-um estudante de graduação no papel de iniciação científica, responsável por


levantamentos na literatura.

Uma estudante de graduação da Unifesp também atuou no apoio aos três


núcleos, na sistematização dos materiais e nas etapas posteriores, de construção de
ações educativas.

O mapeamento foi inspirado nos métodos e técnicas da cartografia


qualitativa, em que os pesquisadores percorrem o território de acordo com as
suas dinâmicas, de maneira implicada. Os extensionistas, nesse caso, a partir de
suas experiências anteriores, inserção e conhecimento sobre os territórios foram
construindo as formas de abordagem dos participantes. Foram cerca de 8 meses em
campo, em que ocorreram presencialmente momentos de discussão das vivências,
formação e articulação do núcleo, de forma que todos os extensionistas atuassem
de maneira compartilhada A cada mês um encontro reunindo todos os núcleos e
a coordenação geral do projeto era realizado para alinhamento e planejamento
conjunto.

Foram inicialmente realizadas observações da dinâmica dos territórios que


permitiram a identificação de locais ou serviços que pudessem contribuir com
a produção do conhecimento na temática abordada e com ações articuladas
intersetorialmente, especificamente escolas, serviços de saúde e de assistência
social, núcleos de moradia, comércios e movimentos sociais organizados.

20
Dignidade Menstrual: para quem?

As visitas e contatos interpessoais nos territórios foram registradas em diários de


campo pelos extensionistas e,posteriormente, utilizadas como fonte empírica para
o desenvolvimento do projeto. Há registros de diálogos que se estabeleceram nas
ruas e locais por onde circularam e vivenciaram, os quais permitiam uma conexão
com o vivido naquele território.

Rodas de conversa foram construídas conjuntamente com participantes do


projeto e objetivaram compreender especificidades socioculturais mais profundas
de cada grupo31. Ainda que a condução das conversas tenha sido apoiada por
um roteiro norteador, este não foi limitador e, em cada uma das diferentes rodas
de conversa, novas questões sobre a temática da menstruação surgiram. Assim,
alguns objetivos foram se desenhando no processo, como identificar e documentar
as necessidades e preferências das pessoas que menstruam quanto à higiene
menstrual; entender as barreiras para atingir dignidade menstrual; e compreender
as formas e a necessidade de apoio de organizações locais ou movimentos sociais
no enfrentamento da pobreza menstrual.

Os resultados serão apresentados, portanto, a partir do olhar dos extensionistas


em suas incursões pelos territórios e das reflexões construídas nos espaços de
compartilhamento. A organização do mapeamento foi estabelecida em discussões
a partir do compartilhamento das vivências e segue o que foi encontrado em cada
núcleo, mas que também unifica os temas dando a noção de conjunto. Os achados
orientaram as ações educativas desenvolvidas no projeto de extensão.

21
COMO É O TERRITÓRIO
PARA AS PESSOAS
INVISIBILIZADAS EM SUA
POBREZA MENSTRUAL?
O território da Sé possui uma população estimada de cerca de 431 mil pessoas e
densidade demográfica de 16.454 habitantes/km²32. Essa zona central do município
de São Paulo é composta por importante aparato de mobilidade urbana, com
muitas opções de transporte público, além de ampla oferta de empregos e serviços.
Segundo o Mapa da Desigualdade (2021)33 da Rede Nossa São Paulo, a região
da República, que faz parte dessa área, possui a maior proporção da população
com acesso a transporte de massa e o pior dado sobre violência contra a mulher
do município 865,4/10.000. Este dado foi calculado através da porcentagem de
população que mora em um raio de até um quilometro de distância de estações de
transporte público, como trem, metrô e monotrilho.

A população que vive ou circula na região é bastante heterogênea, com diferentes


grupos sociais que coexistem nesse espaço atravessado por desigualdades e
disputa de interesses, distribuídos em boas edificações, mas também em moradias

22
Dignidade Menstrual: para quem?

precárias, ocupações e cortiços, além das pessoas que vivem em situação de rua,
brasileiros, imigrantes ou refugiados34.

Os três núcleos do projeto, ao serem analisados em detalhe, revelam


singularidades, que serão apresentadas em três territórios.

Território LUZ Território SÉ Território CANINDÉ

23
Dignidade Menstrual: para quem?

NÚCLEO LUZ
Por: Ana Luiza Satie Voltolini Uwai, Karin Di Monteiro Moreira, Ananda Méndez
Inácio, Luiza Guimarães Imagure, Claudia Fegadolli

Este núcleo incluiu áreas dos bairros Luz, Santa Ifigênia e Campos Elíseos,
região que ficou conhecida como “Cracolândia” em 1995, após ter a nomenclatura
empregada em uma reportagem do jornal O Estado de São Paulo sobre a prisão
de pequenos traficantes dias após a inauguração da delegacia de repressão ao
crack35.

Durante a realização do projeto, o Centro de Convivência É de Lei se localizava na rua do Carmo, no entanto, a partir de 2024, o endereço passou
a ser na rua Lettiere, 65, na Bela Vista.

Reconhecida como um espaço ocupado por pessoas em situação de rua que


fazem ou não o uso de crack e outras drogas, a região tem sido, há quase 30 anos,
palco de sucessivas políticas repressivas e de operações policiais truculentas. No
mesmo território convivem diferentes atores sociais, como agentes da força de
segurança do estado (Polícia Civil, Polícia Militar e Guarda Civil Metropolitana),
agentes de saúde pública, redutores de danos, organizações da sociedade civil,
ativistas de direitos humanos, moradores do entorno, frequentadores dos bairros,
comerciantes locais, movimentos sociais na luta por moradia, profissionais de
imprensa, fiéis de diferentes setores da igreja, assistentes sociais, pesquisadores e
estudantes, profissionais do sexo, pessoas em situação de rua, entre tantos outros.

Território marcado pela constante necessidade de mediação entre os diferentes


sujeitos que o ocupam, a Cracolândia reúne uma série de interesses em disputa:

24
Dignidade Menstrual: para quem?

imobiliários, especulativo-financeiros, eleitorais ou políticos, que têm sido


mobilizados ao longo dos anos em benefício de grupos específicos.

Nessa concorrência de projetos, a interferência do Estado opera favorecendo


partes ligadas ao capital econômico, uma vez que é caracterizada pela atuação
violenta das forças de segurança, simultaneamente à ausência de políticas de
saúde integral, de direitos humanos, de moradia e de assistência social à população
em situação de vulnerabilidade, o que representa um meio de expulsão. Um
importante exemplo desta dinâmica são as sucessivas ações da Polícia Militar em
conjunto com a Guarda Civil Metropolitana que ocorreram no território a partir de
maio de 2022, que foram responsáveis pela dispersão violenta de pessoas da praça
Princesa Isabel e que provocaram a migração de grupos em fluxo pelo centro da
cidade, sob a narrativa de “acabar com a Cracolândia”.

Depois das violentas ações de 2017, a primeira grande operação contou com
cerca de 650 funcionários de segurança pública e foi marcada por denúncias de
truculência e de violência por parte da polícia. Durante os meses que se seguiram,
inúmeras operações passaram a ocorrer com frequência na região, causando
mudanças na localização da população que ali vivia ou a frequentava, com
repetidos movimentos de retirada a cada nova acomodação dos grupos. Essas
movimentações frequentes rebatizaram a área como região do Fluxo, devido ao
movimento de fluxo da população pelas ruas do território, como o Largo Coração
de Jesus, a Praça Princesa Isabel, a rua Helvétia, a Avenida São João e a região
da Santa Ifigênia entre as ruas dos Gusmões e a General Osório35. Um fluxo
desordenado e induzido pela violência que vai construindo relações complexas
com os comerciantes e moradores, o que ajuda a justificar essa ação perante a
opinião pública

No território foi possível observar situações de violência policial cotidianas,


como revistas e abordagens agressivas. As abordagens policiais, presenciadas
pelos extensionistas e relatadas por pessoas contactada pelo projeto, resultam no
confisco de pertences pessoais como roupas, documentos, cobertores, produtos
de higiene, ação conhecida popularmente como “rapa”.

Créditos: Luca Meola Créditos: Luca Meola

25
Dignidade Menstrual: para quem?

Ainda que a presença das forças de segurança na região seja ostensiva, o


acompanhamento de movimentos sociais e organizações da sociedade civil e
de direitos humanos é constante e foi fundamental para o desenvolvimento do
projeto na região. São destacadas aqui os movimentos sociais que contribuíram
com a organização de encontros, relatos e informações indispensáveis ao trabalho
de campo, como é o caso do Teatro de Contêiner Mungunzá, que é um espaço
cultural e social localizado próximo à estação da Luz e cedeu espaço para reuniões
e ações realizadas pelo projeto. O Teatro divide sua sede com movimentos como
o Coletivo Tem Sentimento, que desenvolve projetos de geração de renda para
mulheres cis e trans da região da Cracolândia, o Coletivo de arte Birico e o Pagode
na Lata.

As ações no local foram coordenadas pelo Centro de Convivência É de Lei, que


atua na região e foi um dos movimentos sociais responsáveis pelo projeto.

O Centro de Convivência É de Lei é uma organização da sociedade civil sem fins


lucrativos que atua desde 1998 na promoção da redução de riscos e danos, sociais
e à saúde, associados à política de drogas. O propósito da organização é promover
a perspectiva ética do cuidado no campo das drogas, ampliando a possibilidade
de escolha das pessoas, desconstruindo preconceitos, e incentivando uma cultura
garantidora de direitos e diferenças. Sua missão é cocriar e disseminar referências
e práticas de cuidados e estratégias de redução de danos a partir da atuação
junto às pessoas que são afetadas pela política de drogas, às que trabalham na
rede intersetorial, à academia e à gestão pública, visando incidência política que
transforme a lógica da guerra às pessoas.

As ações do É de Lei se concentram em três principais frentes de atuação:

-Práticas de Redução de Danos: Ações de acolhimento, orientação e


encaminhamento de demandas do Centro de Convivência, desenvolvimento de
projetos culturais, de prevenção às IST, HIV/aids e promoção da redução de danos
em diversos contextos, como em territórios onde há pessoas em situação de rua e
contextos de festividades.

-Ensino e Pesquisa: Troca de experiências práticas e teóricas no campo da


Redução de Danos. Oferta de cursos, supervisões, palestras e formações, eventos
técnicos e científicos, parcerias com universidades e instituições, produção e
colaboração em pesquisas.

-Comunicação e Advocacy: Incidência política e formulação de estratégias para


efetivação de direitos e políticas públicas. Diálogo público e disseminação de boas
práticas de cuidado. Construção colaborativa de estratégias, junto às pessoas
afetadas pela política de drogas, contemplando necessidades comuns e lutando
por políticas garantidoras de direitos.

26
Dignidade Menstrual: para quem?

Apesar de, inicialmente, o foco do grupo do território da Luz serem as mulheres


cis e os homens trans que menstruam e estão em situação de rua, as movimentações
do fluxo e a presença violenta das forças de segurança, fizeram com que fosse
necessário abrir outras possibilidades de ação do projeto. A tensão no território
e as ações policiais também fizeram com que a equipe tivesse dificuldade de
conversar sobre questões diretamente ligadas à dignidade menstrual com as
pessoas que circulam pelas ruas, pois as demandas estavam mais relacionadas à
alimentação e moradia, por exemplo.

Nesse contexto, houve aproximação do projeto com o coletivo Mulheres da


Luz, que passou a ser o principal foco do núcleo. O coletivo Mulheres da Luz, que
busca promover a cidadania e a garantia dos direitos das mulheres em situação
de prostituição local, desenvolve atividades relacionadas à educação, cultura,
cidadania, saúde e acesso a direitos sociais. Nesse grupo, tivemos contato
com mulheres em situação de prostituição e de extrema pobreza. A maioria das
mulheres com que conversamos tinha idade acima dos 40 anos, algumas delas
relatavam serem mães e que suas famílias não sabiam sobre a sua atividade na
prostituição. Para as participantes, a prostituição é a única fonte de renda, ainda
que a remuneração seja extremamente baixa.

Além de identificar e atuar com movimentos sociais locais, o projeto buscou


compreender a atuação dos equipamentos públicos de atendimento à população
em situação de rua na região do Fluxo. Identificamos o Centro de Referência de
Assistência Social, Unidades Básicas de Saúde, Unidade Recomeço Helvétia, o
Centro de Atenção Psicossocial IV, pontos de cuidado e assistência em que não
houve receptividade para o diálogo com funcionários e demais profissionais de
saúde da unidade.

De acordo com a avaliação de movimentos sociais que atuam na região,


desde antes da pandemia está em curso um movimento de fechamento de
diversos equipamentos públicos, num constante processo de sucateamento dos
equipamentos de saúde e de assistência social na região. Organizações sociais
denunciaram, por exemplo, o fechamento do serviço Atende II durante a pandemia
de COVID-19, que era o único equipamento em funcionamento que possibilitava à
população em situação de rua e aos usuários e usuárias de drogas locais o acesso
à água corrente, água potável, alimentação, chuveiros e pernoite.

O Atende II era uma unidade de atendimento diário emergencial que fez parte
do Programa Redenção e era voltado ao atendimento multidisciplinar dos usuários
de drogas que se concentram na região. Para os movimentos sociais, o fechamento
do último equipamento de referência na região representa uma exposição ainda
maior das pessoas em situação de rua aos diversos efeitos da pandemia e a outras
vulnerabilidades, incluindo o aprofundamento da pobreza menstrual.

27
Dignidade Menstrual: para quem?

Outra ação parcialmente encerrada no mesmo período foi o Vidas no Centro,


criada em 2020 pela Prefeitura de São Paulo e que operava com cinco unidades
na capital paulista com oferta de banheiros, banhos e lavanderias para população
em situação de rua. A iniciativa executada por meio da Secretaria Municipal
de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Turismo (SMDET), com apoio das
secretarias municipais de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS) e Direitos
Humanos e Cidadania (SMDHC), chegou a um número recorde de atendimentos
em abril de 2020, no começo da pandemia da Covid-19, realizando mais de 1,5
milhão de atendimentos nas estações localizadas no Centro da cidade de São
Paulo.

NÚCLEO SÉ
Por: Giovanna Antonela Rondon Giovanella, Julia Köpf de Moraes Paulo, Sonia
Maria Reis da Costa Rêgo, Claudia Fegadolli

O núcleo Sé coordenou o projeto nos seguintes distritos da subprefeitura: Sé,


República, Bela Vista e Bom Retiro. A partir das primeiras aproximações no território,
decidiu-se dar enfoque nas pessoas que vivem em moradias precárias. O projeto adotou,
conceitualmente, que moradias precárias são as ocupações, cortiços, coabitação de lote
e favelas. No processo inicial de observação e de reconhecimento da dinâmica cotidiana
do território, as principais habitações precárias encontradas nas visitas de campo do
território foram as ocupações, regularizadas ou irregulares.

28
Dignidade Menstrual: para quem?

Roda de Conversa realizada na Ocupação São João 588/288

O histórico de ocupações de imóveis abandonados no Centro de São Paulo foi


intensificada a partir dos anos 1990, sendo um dos marcos desse período a ocupação
de um casarão da Universidade de São Paulo em Campos Elísios, no ano de 1997,
por cerca de 1500 famílias. De 1997 a 2007, houve a ocupação de cerca de 63 edifícios
vazios, marcando a disputa por moradia digna em um território com muitas edificações
sem destinação social, a partir de um movimento de esvaziamento do centro iniciado
na década de 1960 e que se tornou intenso na década 197036. Entre as dezenas de
ocupações existentes no centro de São Paulo atualmente, quatro foram inseridas no
projeto, por critério de proximidade de lideranças ou facilidade de acessar a população
de interesse.

O primeiro local inserido foi a Ocupação São João 588/288, antigo Hotel Columbia
Palace, que foi ocupado em 2010, após 27 anos de abandono. Hoje, ali vivem 81 famílias
com aproximadamente 300 pessoas. A ocupação é associada a dois movimentos por
moradia, o Movimento Sem-Teto pela Reforma Urbana (MSTRU) e a Frente de Luta
por Moradia (FLM). Além dessa, outra ocupação participante foi a Ocupação dos
Imigrantes Jean-Jacques Dessalines, do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e
Favelas (MLB). Devido ao elevado número de refugiados haitianos, o nome da ocupação
é uma homenagem a Jean-Jacques Dessalines, um dos líderes responsáveis pela
libertação e independência do Haiti no início do século XIX. O antigo prédio foi ocupado
em 2021, durante a pandemia da COVID-19. Atualmente há cerca de 80 famílias vivendo
no local, principalmente famílias de migrantes ou refugiados.

29
Dignidade Menstrual: para quem?

Roda de Conversa sobre Pobreza Menstrual e Saúde da Mulher na Ocupação da Rua Treze de Maio

Outra ocupação incluída foi a Ocupação Penha Pietra‘s, também associada a


movimentos de moradia, como Movimento de Moradia e Inclusão Social e a FLM. Esta
ocupação se formou em 2021, quando cerca de 260 pessoas adentraram o prédio onde
funcionava um antigo hotel entre a Avenida Paulista e a Rua da Consolação. O nome da
ocupação é em homenagem a Penha Pietra, professora de dança e fundadora do grupo
de teatro “Os 16 Meninos da 13 de Maio”, que dedicou sua carreira pelo direito à arte e à
cultura na cidade.

Além das ocupações vinculadas a movimentos sociais, também se dialogou com


ocupações independentes, sendo uma delas a Ocupação da Rua Treze de Maio. O
antigo casarão foi ocupado há 3 anos por amigos e familiares, não ligados a movimentos
sociais de moradia. Atualmente ali vivem mais de 40 pessoas, divididas em diferentes
núcleos familiares. A organização e a gerência do local são de responsabilidade de uma
coordenadora, que é quem divide as despesas e gastos.

Para além das ocupações, outros movimentos presentes no território foram


contactados, principalmente aqueles ligados à Igreja Católica. Um deles foi a Missão
Paz São Paulo, criada nos anos 1930, instituição filantrópica scalabriniana de apoio
e acolhimento a imigrantes e refugiados. A missão é organizada em cinco linhas
diferentes: Casa do Migrante, local de acolhida, que funciona como abrigo; Centro
Pastoral e de Mediação dos Migrantes, com função de assistência documental e
jurídica, inserção laboral, capacitação, saúde e serviço social; Eixos Transversais,
com atuação em Advocacy, projetos e comunicação; e, por fim, a Igreja Nossa
Senhora da Paz. A Missão atua no acolhimento de imigrantes e refugiados.

Assim como a Missão Paz, a Igreja Nossa Senhora da Achiropita, localizada


na Rua Treze de Maio, também possui atuação social. A Igreja possui o Espaço
Social Dom Orione, criado no ano de 1994. Ali a população em situação de rua
da região tem acesso a banho, lavagem de roupas, aulas de computação, cursos,
oficinas artesanais e de marchetaria, atendimento psicológico, passeios culturais,

30
Dignidade Menstrual: para quem?

encaminhamento para emprego, além de momentos de lazer. Cerca de 190 pessoas


em situação de rua são atendidas no espaço. Tanto a Missão Paz quanto a Igreja
Nossa Senhora da Achiropita foram contatos importantes e permanentes durante
o desenho do projeto.

Quanto aos serviços de saúde encontrados na região, as principais unidades


básicas de saúde (UBS) foram: UBS Humaitá, UBS República, UBS Sé e UBS Nossa
Senhora do Brasil. As três últimas possuem o chamado Consultório na Rua,
com o foco de promover saúde à população em situação de rua. Não foi possível
comunicação direta com as unidades básicas de saúde e pouca foi a participação
dessas para o desenvolvimento do projeto. Os serviços comunicaram ao projeto
que havia sobrecarga de trabalho com a pandemia da COVID-19, o que não permitia
aos trabalhadores dedicação a atividades como esta.

Foi esse o cenário reconhecido pelo núcleo coordenado pelo movimento Fluxo
Solidário, com suas estruturas, funcionamento e atores relevantes.

A Fluxo Solidário é uma campanha de combate à pobreza menstrual e


desigualdade de gênero, criada no ano de 2020 durante a pandemia da COVID-19.
O projeto se deu a partir de um clube de leitura do livro “Presos Que Menstruam: A
Brutal Vida das Mulheres - Tratadas como Homens - Nas Prisões Brasileiras”. O livro
da autora brasileira Nana Queiroz relata o cotidiano das prisões femininas no Brasil
e os desafios de vivenciar a privação de liberdade como mulher. A partir da leitura
e discussão dos principais temas abrangidos no livro, foi iniciada a campanha com
enfoque na temática da menstruação. Durante a sua atuação o projeto realizou
rodas de conversa sobre menstruação, autonomia menstrual e saúde da mulher.
Tais rodas de conversa foram realizadas juntamente a diferentes projetos e
movimentos sociais, como em ocupações do Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem Terra (MST), ONG Mulheres da Luz, Reserva Indígena Tekoa Pyau e Pastoral
Povo da Rua. Além das rodas de conversa, durante os momentos de encontro,
o projeto criava kits com absorventes, produtos de higiene pessoal e calcinhas,
que eram distribuídas em tais localidades. A Fluxo conta também com diversas
parcerias para cessão de espaço para a realização de suas atividades, como por
exemplo a Central de Cooperativas e Empreendimentos Solidários (UNISOL Brasil),
com sede na praça da Sé.

31
Dignidade Menstrual: para quem?

NÚCLEO CANINDÉ/PARI
Por: Júlia Soares dos Santos, Juliana Freires dos Santos,
Amanda Alves Vilas Boas, Claudia Fegadoll

O terceiro núcleo esteve situado na zona central do município de São Paulo e incluiu
os bairros de Alto do Pari, Pari e Canindé. O bairro do Canindé está localizado entre
os bairros da Luz, Brás e Pari, estendendo-se até a marginal Tietê. Do outro lado do
rio e da marginal está o bairro da Vila Guilherme.

O bairro do Canindé e Alto do Pari pertencem ao distrito paulistano do Pari, que é


administrado pela Subprefeitura da Mooca. Este território abrange uma população
de quase 20.000 pessoas32.

O Pari já era citado no recenseamento empreendido pela câmara municipal


de São Paulo em 1975. À época, existiam no bairro cerca de 15 residências, onde
moravam 72 pessoas, que se ocupavam principalmente da atividade de pesca.
Atualmente, o bairro possui um comércio intenso e indústrias, sendo conhecido
como o “bairro doce” de São Paulo, em razão do grande número de atacadistas e
indústrias de doces na região.

32
Dignidade Menstrual: para quem?

Cine-debate sobre o filme Neirud, com presença da cineasta Fernanda Faya

Oficina de cartazes para 08 de Março – dia das mulheres trabalhadoras Roda de conversa sobre o combate à violência contra às mulheres

Lançamento do livro Guerras Culturais – em parceria com estudantes do curso de História da Arte da UNIFESP

Brechó realizado na Casa Laudelina – uma das atividades fixas que muitas vezes
serve de propaganda para outras atividades do espaço com foco no combate a
violência.

33
Dignidade Menstrual: para quem?

Além dos doces, o território desenvolve determinadas características devido à


sua proximidade com o Brás, conhecido nacionalmente por seu intenso comércio
popular. A forte atividade comercial é muito voltada às roupas e aos artigos
eletrônicos. A Galeria Pagé Brás, conhecido polo de comércio popular, está localizada
no bairro do Canindé, a exemplo de outros shoppings populares. Possui também
estabelecimentos industriais, principalmente a indústria de confecções. O bairro
possui comércios de artigos para casa e decoração, além de ferramentas, acessórios,
máquinas, equipamentos e outras variedades, tanto no varejo, quanto no atacado37.

O grande fluxo comercial nessa localidade fez com que o bairro fosse atrativo às
novas geração de imigrantes que chegam à cidade. Na região, há muitos bolivianos,
inclusive a feira boliviana acontece no bairro. Mas há pessoas de várias nacionalidades
e caminhar pelas ruas permitiu-nos ouvir conversas em árabe, espanhol, chinês
e outros idiomas. O bairro inclui também muitos descendentes de portugueses,
coreanos e palestinos.

A pobreza é presente na região. Segundo o mapa de vulnerabilidade social da


cidade de São Paulo33, o Pari fica em sexta posição com os piores indicadores sociais,
em segundo lugar a Sé, em que o projeto também atuou.

As mulheres são mais da metade da população do distrito do Pari33 e é nesse


cenário que atua o Movimento de Mulheres Olga Benario, que em 2021 ocupou no
local uma casa abandonada há mais de 30 anos. Atualmente, na rua Padre Vieira, 145,
funciona a Casa Laudelina de Campos Melo, a 2ª ocupação de mulheres do estado
de São Paulo e a 4ª das 20 ocupações que o movimento já organizou no Brasil

O Movimento de Mulheres Olga Benario tem amplitude nacional e organiza as


mulheres trabalhadoras em mais de 20 estados do Brasil pelos seus direitos e pelo
socialismo. A Casa Laudelina de Campos Melo, é uma ocupação urbana que existe
desde 2021, que aprofunda essa política, atuando como centro de acolhimento, apoio
e desenvolvimento às mulheres. O espaço desenvolve diversas atividades de combate
à violência de gênero, de enfrentamento à pobreza menstrual, promovendo oficinas
de geração de renda, formação política e organização das mulheres e articulando com
demais movimentos a responsabilização do Estado para a construção de alternativas
populares às situações de violência vividas pelas mulheres do país.

A região possui instituições religiosas como a paróquia Santo Antônio do Pari,


fundada em fevereiro de 1914, por dom Duarte Leopoldo e Silva e a matriz de Santo
Antônio do Pari, de 1924, que foi restaurada após um incêndio ocorrido no ano de
200639.

34
Dignidade Menstrual: para quem?

O bairro comporta uma Instituição de Longa Permanência para idoso (ILPI), o


Sítio das Alamedas, de responsabilidade da Secretaria Municipal de Assistência e
Desenvolvimento Social (SMADS) e os Centros de Acolhida para Adultos Vivenda
da Cidadania, que é misto, atende homens e mulheres em situação de rua. Há
também a Casa de Apoio Maria Maria, exclusivo para mulheres cis, o Centro de
Acolhida Especial para famílias Canindé (CTA-18) e a Estação Vivência, exclusiva
para homens.

O território também conta com uma Unidade Básica de Saúde onde o movimento
constrói ativamente o conselho gestor, promovendo diálogos com as profissionais
da saúde e aprofundando uma parceria de ação no território sobre promoção das
ações da UBS e das atividades da Casa Laudelina no combate à violência contra à
mulher.

O Instituto Federal de São Paulo é um importante espaço de referência para


a região do Pari, por ser um polo educacional que oferece cursos de nível médio,
técnico e superior, além de atividades extracurriculares desenvolvidas com a
comunidade externa, como por exemplo projetos de diálogo e formação com a
Escola Municipal de Ensino Fundamental Espaço de Bitita, que possui a maior
parte de estudantes imigrantes da América Latina. Ambos os espaços já foram focos
de parceria do trabalho do movimento Olga Benario, sobre dignidade menstrual e
combate à violência.

35
Dignidade Menstrual: para quem?

AS VIVÊNCIAS DAS
PESSOAS COM A
MENSTRUAÇÃO
A partir do mapa estrutural, com seus principais fixos, fluxos e atores institucionais
e sociais, são aqui apresentadas as vivências de pessoas afetadas por diversas
vulnerabilidades, discutidas em alguns recortes: pessoas em situação de rua,
moradoras de ocupações, trabalhadoras do sexo, outras trabalhadoras formais e
informais.

A POBREZA MENSTRUAL ENTRE AS PESSOAS


EM SITUAÇÃO DE RUA
O primeiro censo de pessoas em situação de rua do município de São Paulo
foi realizado em 1991 pela antiga secretaria municipal da família e do bem-estar
social, que identificou um conjunto de 3.392 pessoas. Em 2019, o número passou
para 24.344 e chegou a 31.884 ao final de 2021, um aumento de 7.540 pessoas ou
31%, de acordo com o Censo da População em Situação de Rua, desenvolvido
pela Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS). A

36
Dignidade Menstrual: para quem?

quantidade de pessoas nas ruas de São Paulo continua crescendo e era, em 2023,
superior a 42.240 pessoas, como mostra levantamento realizado pelo Observatório
Brasileiro de Políticas Públicas com a População em Situação de Rua40.

Ainda de acordo com o Censo da População em Situação de Rua, em 2021 cerca


de 12.851 pessoas viviam em situação de rua nos territórios da Subprefeitura da
Sé, o que representa a maior concentração de rua da cidade, com 40,31% das
pessoas sem teto na capital paulista. Nesse território, ao menos 7% são pessoas que
potencialmente menstruam, por serem mulheres cis, homens trans, pessoas não
binárias ou agêneros com idades entre 12 e 49 anos, embora esse número possa ser
maior, já que não há informações sobre a idade de 16,4% (5.222) das pessoas nem
sobre gênero de 17,2% (5.472 pessoas) nesse recorte de idade/gênero realizado pelo
censo. O caminhar pelas ruas da região gerou, nos extensionistas, a impressão de
que esses números estão subestimados.

Entre as pessoas que menstruam, o censo revelou que 57% utilizavam absorventes
ou coletores, a maioria absorventes descartáveis. Entre estas 36,1% relataram
acessar absorventes nos centros de acolhida, de convivências ou provenientes de
projetos, 35,5% compravam e 24% pediam nas ruas ou recebiam de doações41. Um
dado que mostra o grande percentual de 43% das pessoas que menstruam sem
acesso a absorventes ou coletores. Essa é uma das poucas informações disponíveis
sobre a dignidade menstrual das pessoas em situação de rua no município de São
Paulo.

Foi dificultoso para o projeto acessar a experiência da menstruação nessa


população, uma vez que suas demandas e necessidades prioritárias são muito
anteriores à questão do bem-estar menstrual, como por exemplo não ter casa, a
exposição à violência ou o não acesso a benefícios da lei orgânica de assistência
social (LOAS). É importante lembrarmos que os extensionistas são ligados a
movimentos sociais atuantes na região e que, portanto, já desenvolvem outras ações
no território. Ao buscarem compreender melhor a experiência da menstruação, em
incontáveis vezes tiveram que priorizar outro tipo de conversa ou ofertar algum tipo
de apoio, principalmente nos temas relacionados às violências policial e de Estado
ou, ainda, à redução de danos para usuários de drogas. Muitas vezes a demanda era
apenas a possibilidade de escuta das difíceis histórias de vida.

Durante a busca por depoimentos ou expressões da experiência menstrual foi


frequente a necessidade de fornecermos absorventes, uma vez que foi assumido
o compromisso ético do projeto o apoio às situações em que o grupo tivesse
condições de intervir na promoção da educação, saúde e bem-estar. Muitas
pessoas se aproximavam dos extensionistas quando notavam a disponibilidade de
absorventes, com intuito apenas para consegui-los, sem querer conversar, o que não
foi questionado pelos extensionistas. Somente as pessoas que realmente queriam

37
Dignidade Menstrual: para quem?

expressar suas experiências o faziam, sem nenhum condicionamento de doação de


absorventes. A oferta de itens de conforto menstrual foi um requisito importante
para a possibilidade de atuação dos extensionistas, que se deparavam com situações
extremas de pobreza e indignidade menstrual, em alguns casos agravadas pela
atuação do Estado:

Conversei com uma mulher que me pediu para tirar minha calcinha e dar
para ela e também queria absorventes, mas naquele dia não tínhamos
(sobre uma mulher cis negra de 40 anos, que vive nas ruas desde os 16 anos)

Denise me pediu absorventes e calcinha, pois na última ação do


rapa (serviço de remoção) levaram todos seus pertences e ela
estava apenas com a calcinha do corpo, e perto de menstruar.

O enfrentamento da pobreza menstrual pelas pessoas em situação de rua ocorre


principalmente por ações de solidariedade entre as pessoas do próprio território,
que se organizam numa rede de apoios instável e móvel entre a população local:

Na praça princesa Isabel, dona Maria comentou sobre a dificuldade de


acessar banheiros, disse estar na menopausa, mas aceitou os absorventes
para entregar a outras mulheres dali.

Ainda que existam ações de apoio mútuo, os recursos alcançados para contenção
de fluxo e higiene não são suficientes para garantir dignidade menstrual.

Diante da insuficiência, identificamos pessoas que usam o mesmo absorvente por


muitas horas ou dias e também aquelas que armazenam absorventes utilizados para
reutilização. Além da falta de insumos, o acesso a locais e à água para realizar higiene
menstrual também é dificultoso:

Ela informou a situação precária que se dá para manter a higiene básica no


dia a dia, que piora quando vem o fluxo menstrual. Ela disse que com os
acessos reduzidos de senhas para banho nos equipamentos do Vidas no
Centro, nem sempre consegue manter uma rotina diária de banhos, que
usa banheiros públicos da estação de metrô Dom Pedro II e do terminal de
ônibus Princesa Isabel, e na hora do aperto usa caçamba de lixo próximo
de onde está ou em calçadas menos movimentadas.

As redes assistenciais social e de saúde não alcançam essas pessoas e não


impedem situações degradantes de impossibilidade de higienização e de acesso ao
cuidado e às tecnologias essenciais para a saúde menstrual e integral:

Sofia, 25 anos, tem dois filhos gêmeos com 2 anos e está em situação
de rua após fugir de casa por agressão do seu companheiro. Nas
ruas ela passa muito tempo acordada e em estado de atenção

38
Dignidade Menstrual: para quem?

com seus filhos, muitas das vezes mal se alimenta para garantir
a alimentação deles e com isso seu ciclo menstrual sofre muita
alteração, o uso dos absorventes que utiliza muitas vezes ela consegue
retirar no abrigo ou em último caso utiliza pano para substituir.

Ela relatou que em 2018, aproximadamente, aceitou cuidado do CAPS AD


CENTRO, onde conseguiu anticoncepcional injetável, que usou por cerca
de 6 meses. Por volta do quarto mês, relata ter tido hemorragia anal, e por
conta própria interrompeu o uso, que também cessou a hemorragia, mas
não passou por atendimento clínico para comprovar a relação dos fatos.
Esse caso que a fez ficar receosa de aceitar aproximação de profissionais
dos serviços que trabalham com a população de rua.

Os relatos descritos fazem parte do mapeamento da pobreza menstrual entre as


pessoas em situação de rua, cujos pontos principais são sintetizados a seguir:

- Diante de inúmeras e importantes violações à dignidade humana, o tema da


Dignidade menstrual não é prioridade entre as pessoas em situação de rua.

- A maioria das demais violações sofridas intensificam a situação de não acesso


à dignidade menstrual.

- Faltam banheiros e acesso à água e a produtos de higiene, não havendo recursos


financeiros para sua aquisição de forma individual.

- Não acesso a equipamentos públicos, como serviços de saúde e de assistência


social e quando o fazem é de maneira fragmentada, sem construção de vínculo e
sem cuidado longitudinal, não fazendo conexão com a produção cotidiana da vida
daquelas pessoas.

- Não acesso a produtos e tecnologias para conforto menstrual, como


medicamentos orais e injetáveis.

- Violência de estado e violência policial, com perda de bens e dos poucos


recursos são cotidianamente presentes.

- O acesso a absorventes, muitas vezes, é alcançado apenas por doações.

- Solidariedade entre a população local cria rede de apoio móvel e frágil.

- Os movimentos sociais do território são, em muitas situações o único elo com


um cuidado a essa população.

39
Dignidade Menstrual: para quem?

A POBREZA MENSTRUAL ENTRE AS PESSOAS


QUE VIVEM EM OCUPAÇÕES
Em 2018, mais de 45 mil famílias viviam em 206 ocupações irregulares na cidade de
São Paulo, das quais 3300 habitavam 53 imóveis na região central42. Entre as muitas
dificuldades enfrentadas por quem vivem em ocupações, a pobreza menstrual é
presente e está relacionada ao acesso insuficiente a produtos e a espaços para a
higiene menstrual, assim como ao incômodo evitável e ao pouco conhecimento
sobre o próprio corpo, entre outros elementos:

Existem apenas 5 banheiros na ocupação e somente um deles conta com


um chuveiro para servir às 12 famílias moradoras. Desses 5, apenas 3
contam com vaso sanitário e todos funcionam por meio do uso de baldes
para dar descarga. Considerando o número de mulheres que reside
na ocupação, fico apreensiva em imaginar como deve ser lidar com a
menstruação tendo a disponibilidade de banheiros tão precários e como
deve ser o dia-a-dia das pessoas da ocupação que têm que disputar
esse único chuveiro para se apresentar adequadamente ao trabalho.

A sua grande maioria não deixou de trabalhar durante o período


menstrual, porém as dificuldades para a higiene corporal são muitas:
falta de banheiro, banheiros sujos, inseguros, falta de insumos.

As pessoas que vivem em ocupações, além da moradia precária, também


enfrentam condições de trabalho difíceis. Dessa forma, à dificuldade com banheiros
em casa, soma-se o uso de banheiros inadequados na vida profissional e o acesso
insuficiente a absorventes:

Relatou que no dia que está menstruada no trabalho é muito ruim.


Porque os banheiros no trabalho não são muito limpos e que quando
não tem absorvente substitui por papel mesmo.

É frequente a escolha imposta entre comprar produtos para a menstruação ou


outros gêneros de primeira necessidade, expondo as mulheres ao desconforto
menstrual e a constrangimentos:

O custo dos absorventes pesa muito na conta. Já deixaram de comprar


absorvente para comprar leite para os filhos e usavam papel higiênico velho
que tem em casa. Comprar pão e não absorvente é uma questão frequente.

As condições para aquisição de absorventes são restritas. Ao serem


questionadas se algumas deixaram de comprar insumos higiênicos para
conter o sangramento optando por alimentação, muitas responderam
que sim e em substituição usaram papel higiênicos ou pedaços de pano.

A maioria já havia deixado de fazer algo por estar menstruada, dificuldade


financeira para comprar absorventes.

40
Dignidade Menstrual: para quem?

Nas ocupações, as rodas de conversa possibilitaram acessarmos outra


importante dimensão da pobreza menstrual: os tabus e os desconhecimentos sobre
a menstruação:

As respostas são que menstruação é a sujeira que o corpo coloca para


fora, menstruação é dor, é um sangue sujo.

Notou-se grande desconhecimento sobre os aspectos fisiológicos da


menstruação, assim como a respeito dos métodos não tradicionais de retenção
do fluxo. Ao conversarmos sobre o tipo de protetor menstrual utilizado, a maioria
das mulheres usa absorvente descartável. Poucas tinham conhecimento de outros
protetores menstruais, como a calcinha e o absorvente reutilizáveis, assim como o
coletor menstrual. Houve desconhecimento sobre a forma de utilização e modos de
higienização dos coletores, assim como preconceito sobre o risco de vazamento e
de exalação de odores.

Quando explicado o funcionamento do coletor, muitas ainda demonstravam


receio na sua utilização:

Neste momento foi necessária explicação sobre a anatomia do corpo


que menstrua e como tal protetor deve ser inserido.

As rodas de conversas nas ocupações, onde vivem adolescentes e jovens,


trouxeram à tona que lacunas na formação escolar afetam a experiência da
menstruação. A maioria das meninas não tinha educação sexual ou educação
menstrual na escola, apenas pontualmente por iniciativa das próprias estudantes:

Uma adolescente de 14 anos perguntou se o OB (absorvente interno)


tira a virgindade.

Algumas das adolescentes falaram sobre a vergonha de menstruar no


colégio e o medo da possibilidade de acontecer bullying.

O ambiente escolar é ainda mais hostil para os jovens trans que menstruam:

Ele conta que, nesse ano, foi agredido e expulso do banheiro da escola
por outro aluno, que também o ameaça de estupro. Por sorte, a escola
tomou providências e expulsou esse aluno. Ele também conta do seu
incômodo com a menstruação, como se isso desvalidasse sua identidade
masculina, e muitas vezes, mata aula para não passar por transfobia na
escola.

Estes encontros visibilizaram a importância da inclusão da população trans nas


políticas públicas voltadas à dignidade menstrual em qualquer território.

41
Dignidade Menstrual: para quem?

Durante as atividades do projeto, a distribuição gratuita de absorventes foi


discutida e as participantes manifestaram a expectativa de que centros de saúde
e escolas pudessem apoiá-las. Não apenas devido ao preço dos absorventes, mas
também porque a menstruação frequentemente ocorre em momentos em que as
pessoas estão fora de casa e desprevenidas.

Os aspectos que mais se evidenciaram no mapeamento da pobreza menstrual


entre as pessoas que vivem em moradias precárias pode ser apresentado da
seguinte maneira:

- Banheiros insuficientes e precários na vida cotidiana, nas próprias moradias e


no ambiente de trabalho.

- Dificuldade de adquirir absorventes, com impacto no orçamento familiar.

- Conhecimento insuficiente ou deficitário sobre a menstruação e métodos de


contenção do fluxo, gerando dificuldades adicionais e constrangimentos.

- Pouco apoio de instituições e pontos da rede de educação, saúde e assistencial.

- Ambiente escolar e de trabalho hostil para quem menstrua, principalmente para


os corpos trans.

A POBREZA MENSTRUAL ENTRE PESSOAS QUE


EXERCEM TRABALHOS PRECARIZADOS NO
TERRITÓRIO, EXCETO TRABALHADORAS DO
SEXO

Conceitualmente, definimos como trabalhos precarizados aqueles que são


temporários, de baixa remuneração, sem registro formal e/ou sem acesso a direitos
trabalhistas. As pessoas que atuam neste tipo de trabalho enfrentam dificuldade
de acessar lugares adequados para realizarem a higiene menstrual, além do alto
preço de produtos básicos de higiene e de insumos menstruais. Essas barreiras à
dignidade menstrual vão sendo vencidas pelas oportunidades geradas a partir das
relações construídas no cotidiano do trabalho. A pobreza menstrual entre essas
pessoas pode ser retratada a partir de alguns relatos possibilitados pelos encontros
do projeto:

Renata mora em um pensionato e sobrevive apenas da venda de cigarros


durante o dia. Disse que para usar o banheiro vai em um bar na outra
ponta da passarela e em um salão de beleza. Contou que o banheiro
não é dos mais equipados, mas é o suficiente para as necessidades
do dia a dia. Disse que toma anticoncepcional, então menstrua em

42
Dignidade Menstrual: para quem?

períodos maiores e que consegue absorvente às vezes com o dinheiro


das vendas, às vezes com o escambo de cigarro no pensionato.

Marcia, de 47 anos, trabalha no território como faxineira. Disse que o


acesso a itens de higiene era difícil, pois eram muito caros para adquirir
em quantidade suficiente. Ela não menstrua mais, mas precisa comprar
para a filha adolescente.

Em um dos territórios, houve aproximação com as trabalhadoras terceirizadas


de um Instituto Federal de Educação. Mesmo no trabalho institucional, foram
identificados banheiros considerados inadequados pelas usuárias e exposição a
outras vulnerabilidades que aprofundam inequidades de gênero, como ausência
de local para amamentação e de falta de iniciativas de promoção da dignidade
menstrual da mulher trabalhadora.

O retrato da pobreza menstrual entre trabalhadoras do território é distinto em


alguns aspectos. Embora sejam pessoas com renda e moradia fixa, os trabalhos
ocorrem em situações precárias, com baixa remuneração e as expõe a dificuldades
cotidianas que afetam sua dignidade menstrual. Alguns pontos foram destacados:

- Dificuldade de acesso a banheiros, sendo necessário contar com a solidariedade


de comerciantes locais.

- Quando existentes, os banheiros são inadequados.

- Dificuldade de adquirir absorventes, pelo impacto no orçamento familiar.

- Aquisição de absorventes por escambo.

- Necessidade de se conectar a redes de solidariedade para acessar absorventes.

- Percepção acentuada da falta de dignidade menstrual atravessar diferentes


gerações, constrangendo a pessoa que não menstrua mais a se implicar com as
dificuldades das jovens.

A POBREZA MENSTRUAL ENTRE AS


TRABALHADORAS DO SEXO

A prostituição chega na região da Luz nos anos de 1950 e foi se conformando


principalmente após ação da Prefeitura da cidade de confinamento dos prostíbulos,
com uma realidade atual em que mulheres mais velhas, acima de 40 anos, exercem
a atividade43. A pobreza menstrual é evidentemente presente nesse grupo, que
desconhecia o tema da dignidade menstrual:

43
Dignidade Menstrual: para quem?

(...) eu me apresentava e introduzia sobre a dignidade menstrual com as


mulheres, nenhuma delas sabia o que era dignidade menstrual (não só
desta vez como em todos os campos até hoje realizados)

Entre as pessoas contactadas, ouvimos frequentemente relatos de mulheres


jovens que já não menstruavam mais, assim como ouvimos de muitas outras pessoas
em situação de rua, enquanto outras relataram apresentar fluxo menstrual intenso.
Quando presente, a aceitação da menstruação entre as pessoas com quem tivemos
contato é baixa, descrita por algumas mulheres como algo bastante inconveniente e
que desperta nojo, nos clientes e nelas próprias:

Relataram que a menstruação era um problema, pois interfere na prática


sexual e representa para elas uma semana sem trabalhar, pois os clientes
em sua maioria sentem nojo do sangue e não admitem uma mulher
menstruada.

A interferência da menstruação no cotidiano do trabalho é um problema para


as trabalhadoras do sexo, a qual é considerada pelos clientes da prostituição como
algo nojento. Durante as conversas, mais de uma mulher disse ter ouvido ameaças
de violência por trabalharem em período menstrual. Essa dificuldade torna a
contenção do fluxo uma necessidade para o trabalho, agregando um novo elemento
de intensificação do sofrimento diante da pobreza menstrual.

Devido a essa necessidade de não apresentarem fluxo menstrual evidente, as


trabalhadoras do sexo costumam adotar medidas que colocam em risco sua saúde.
É comum entre elas a inserção de uma bola de algodão no canal vaginal como forma
de conter o fluxo menstrual, ainda que informem que conhecem os riscos à saúde que
esse método de contenção pode oferecer. Mesmo correndo riscos, o insumo não é
sempre efetivo, algumas compartilharam que, por vezes, o algodão pode ficar preso
ou deixar o sangue vazar. Houve relato de situações em que o algodão não conteve o
fluxo e que o eventual cliente percebeu a menstruação, tendo se recusado a aceitar
o programa. Há relatos também de que, frequentemente, o algodão é “perdido”
internamente durante o ato sexual e que é comum o uso de ducha higiênica na
vagina para inchar o algodão e possibilitar a sua retirada. Também foi relatado o uso
frequente de pedaços de esponja de lavar louça ou da esponja que acompanha o
preservativo feminino para a contenção menstrual.

Vários relatos que visibilizam como essa população está sujeita a constrangimentos
e a situações de grande potencial de gerar problemas de saúde importantes. Fora
do período de trabalho, as mulheres também não têm direito à dignidade menstrual
referente ao acesso a produtos, principalmente os absorventes:

Disse da dificuldade de acesso aos absorventes, conseguido em sua


grande maioria de doações, que seu fluxo de sangue é grande, mas que

44
Dignidade Menstrual: para quem?

quando está com poucos absorventes usa um por dia e limpa o sangue
que escorre com um paninho úmido, que depois descarta.

Assim, como já mencionado, as soluções encontradas tanto no trabalho ou fora


dele colocam, com frequência, a saúde das mulheres em risco:

Como forma de superar este empecilho (da não aceitação dos parceiros
sexuais), elas utilizam bolas de algodão para estancar o sangue, algumas
utilizam a esponja da camisinha feminina e até esponja de lavar louça,
além de ser uma prática muito incômoda (isso foi unanimidade entre
elas) ainda correm o risco de não conseguirem retirar o algodão por
completo.

Além de todas essas dificuldades, as mulheres em situação de prostituição têm


muita limitação de acesso a outros elementos da estrutura básica para higiene
durante o trabalho, como água, toalhas limpas e roupa de cama limpa, entre
outros itens. Também faltam banheiros em quantidades e qualidade adequadas às
suas necessidades. O fechamento de espaços públicos e a escassez de locais de
acolhimento tem aprofundado a pobreza menstrual. Esse grupo também costuma
usar banheiros de bar, que geralmente são apertados e sujos, muitas vezes não
possuem porta ou, ainda, o espaço da rua:

Disse que consegue se higienizar melhor quando seus clientes a levam


para algum hotel, e que sempre usa o chuveiro nessas situações, mas
que não é tão recorrente os programas em locais privados.

Para agravar a situação, elas não conseguem acessar os serviços de saúde com
qualidade. Nas conversas desenvolvidas sobre as possibilidades de interrupção da
menstruação por anticoncepcional e sobre a utilização de métodos de prevenção
de doenças ou de gravidez, identificou-se que há carência de conhecimentos
e dificuldade de acessar métodos, produtos e tecnologias no SUS. Há também
barreiras para acessar a assistência e o cuidado, com diversas tentativas frustradas
que as levam a resolver os problemas à sua maneira:

Fabi disse ter tentado a pílula, mas não ter se adaptado, por sentir dor de
cabeça e enjoo e que por último havia tentado a injeção, mas que ainda
tinha escapes durante o período.

Esse exemplo visibiliza a importância de estratégias que aproximem os


trabalhadores da saúde das populações que moram e trabalham nos territórios do
centro e de pautar o tema da dignidade menstrual nas políticas de saúde.

Nesse cenário, o mapa da pobreza menstrual ente as profissionais do sexo


incluem os seguintes aspectos:

45
Dignidade Menstrual: para quem?

- Pouco conhecimento sobre a menstruação e condições para ter saúde e


dignidade menstrual.

- Mitos e tabus sobre a menstruação, considerada impura e inconveniente.

- Dificuldades em acessar serviços de saúde por razões como vergonha,


dificuldade em assumir que são trabalhadoras sexuais ou medo do preconceito por
serem mulheres mais velhas em situação de prostituição.

- Assistência à saúde fragmentada e interrompida por experiências de insucesso;

- Dificuldade em acessar tecnologias de conforto menstrual.

- Dificuldade de acesso a banheiros e água para higienização.

- Dificuldade de acesso a absorventes.

- Uso de materiais e métodos inadequados para contenção do fluxo, como


algodão e esponjas de cozinha, se expondo a complicações de saúde.

- Menstruação provoca constrangimento no cotidiano do trabalho sexual, muitas


vezes impedindo sua execução, trazendo ainda um comprometimento de renda;

- Ameaças de violência devido à menstruação durante o tempo do trabalho


sexual.

- Desconhecimento sobre o funcionamento dos serviços de saúde.

- Distanciamento dos serviços de saúde desta população por não acolhimento e


cuidado desqualificado, como a produção de diagnósticos errados e consequente
não acesso ao atendimento necessário.

46
AÇÕES DO PROJETO
Concomitantemente ao processo de mapeamento, o projeto foi desenvolvendo
articulações e ações no território voltadas à promoção da dignidade menstrual.

ELABORAÇÃO DE MATERIAIS EDUCATIVOS


Entre as principais ações, foram desenvolvidos materiais educativos a serem
utilizados nessa e em futuras ações, os quais serão disponibilizados gratuitamente
para outras iniciativas educativas. Os materiais estão disponíveis em: lascol.com.
br/nossos-projetos/dignidade-menstrual.

47
Dignidade Menstrual: para quem?

RODAS DE CONVERSA EDUCATIVAS SOBRE


DIGNIDADE MENSTRUAL
Rodas educativas foram realizadas nas ocupações e com o coletivo mulheres da
Luz. Tinham o intuito de compreender as faces da pobreza menstrual vivenciada
e de dialogar sobre dúvidas e mitos a respeito da menstruação, uso de insumos,
direitos e acesso a políticas públicas de cuidado e assistência, entre outros temas
relacionados.

PALESTRAS SOBRE DIGNIDADE MENSTRUAL


Foram realizadas 10 palestras na EMEF Espaço de Bitita, escola renomeada por
professores e alunos em homenagem ao apelido de infância de Carolina Maria
de Jesus. As palestras tiveram a participação diversas turmas, próximo de 500
estudantes e 30 professores e levantaram discussões sobre feminismo, luta das
mulheres, pobreza e desigualdade, educação progressista e luta comunitária.

48
Dignidade Menstrual: para quem?

PALESTRAS E PLANEJAMENTO DE AÇÕES


COM PROFESSORES E ESTUDANTES DA EMEF
ESPAÇO BITITA

AÇÃO NO INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO,


CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE SÃO PAULO
O projeto proporcionou maior articulação com essa instituição de ensino do
território, onde foram realizadas rodas de leitura, grupos de estudos e entrega
de absorventes 200 pacotes de absorventes para as trabalhadoras terceirizadas,
servidoras e estudantes.

Ação entre estudantes e entidades estudantis para garantir


absorventes nos banheiros do IFSP

49
Dignidade Menstrual: para quem?

Distribuição dos kits de higiene e absorventes para lideranças da região Cine-debate realizado em conjunto com estudantes do IFSP sobre
desenvolvimento de plano de ação no território dignidade menstrual

Debate com estudantes do curso de geografia do IFSP sobre acesso a dignidade menstrual no Pari

Distribuição dos kits de higiene e absorventes para lideranças da região desenvolvimento de plano de ação no território

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Dignidade Menstrual: para quem?

INSERÇÃO DE CONSELHEIRA NO CONSELHO


GESTOR DA UNIDADE BÁSICA DE SAÚDE DO
PARI
O processo de aproximação com serviços de saúde, em um dos territórios,
possibilitou que os movimentos sociais se apropriassem dos mecanismos de
participação do SUS, até então pouco percebidos. Com intuito inicial de pautar o
tema da dignidade menstrual, o movimento de mulheres Olga Benario organizou
a candidatura para o Conselho Local de Saúde da UBS e elegeu uma conselheira, o
que tem permitido a ampliação da inserção do movimento no debate sobre a saúde
das mulheres em contexto de vulnerabilidade urbana.

Apresentação do Projeto Dignidade Menstrual - UNIFESP Produção de kits de higiene com panfletos para conscientizar sobre
para o Conselho gestor da UBS/ AMA Pari dignidade menstrual

Campanha de apresentação do movimento Olga e das ações realizadas na UBS através do Conselho Gestor

51
Dignidade Menstrual: para quem?

AÇÃO NA VILA SANTO ANTONIO (PARI)


O núcleo Canindé/Pari organizou ações educativas com doação de itens de
higiene menstrual, adquiridos pelo projeto e advindos de doações para a casa
Laudelina.

Montagem de kits com absorventes e produtos de higiene doados pelo Mulheres


do Samba para a Casa de Referência Laudelina de Campos Melo e absorventes de
pano, coletor e calcinha menstrual do projeto Dignidade Menstrual - Unifesp. Itens
entregues para corpos que menstruam na Vila Santo Antônio (Pari).

52
CONCLUINDO,
SEM TERMINAR
A importância de colocar a dignidade menstrual como objeto das políticas
públicas foi ganhando força no desenvolvimento do projeto, que visibilizou os
diferentes sofrimentos e limitações produzidos pela vivência da pobreza menstrual,
nos diferentes grupos envolvidos. O projeto permitiu aprofundar o conhecimento a
respeito da produção de vida de pessoas que, embora vivendo no centro da maior
cidade do Brasil, seguem sem acessar políticas de assistência à saúde, assistência
social e moradia. Ficaram evidenciadas a precariedade e a insuficiência das estruturas
para garantir dignidade menstrual e condições de vida dignas à essas pessoas nos
territórios. Pessoas que são invisíveis ou que são objetos de preconceitos que
naturalizam as inúmeras violências exercidas sobre estas pelo poder público e pela
sociedade.

O trabalho revelou a necessidade de educar, informar e fornecer meios para


que pessoas em vulnerabilidade social alcancem a dignidade menstrual. O acesso
a absorventes íntimos é um direito que deve ser garantido por novas políticas e
programas. No entanto, ficou destacada a importância de ampliar o olhar sobre o
tema, reconhecendo que os insumos menstruais representam apenas uma parte
das necessidades para que as pessoas alcancem minimamente sua dignidade
menstrual.

Populações como as da região da Luz/Fluxo convivem com um Estado produtor


de violências e ausente no cuidado e amparo. É importante que políticas públicas
e projetos voltados a essa temática incluam a necessidade do acesso a banheiros,
água, outros itens de higiene corporal e informação de qualidade. Aprofundar o tema
da dignidade menstrual ajuda a compreender muitos outros aspectos da produção
da vida das populações que estão em risco ou que vivenciam, no seu cotidiano,
violações de seus direitos.
53
Dignidade Menstrual: para quem?

A temática da dignidade menstrual precisa passar a ser tratada transversalmente


em várias políticas públicas que impactam na produção de uma vida digna. Fica
evidenciado que só é possível enfrentar esse desafio articulando com outras
políticas públicas como a de saúde, de assistência social e de direitos humanos.

O direito à dignidade menstrual se coloca também como um tema que deveria


estar mais presente em projetos de pesquisa e extensão que possam ampliar
o conhecimento sobre as vivências, aproximando a universidade e a vida nos
territórios.

No desenvolvimento do projeto houve um fortalecimento da relação dos seus


participantes, em suas diferentes inserções, entre si e com populações e movimentos
que produzem o cotidiano nos territórios estudados. Relações que, em alguns
espaços, seguirão no desenvolvimento de outras iniciativas.

Como ressaltamos no início do presente livro, o tema da dignidade menstrual tem


ampliado seu espaço na agenda de vários países e no Brasil. Precisamos intensificar
o debate e as ações para que esta seja incluída nas políticas públicas que buscam
defender o direito a uma vida digna para todas as pessoas.

54
Dignidade Menstrual: para quem?

E A UNIVERSIDADE
EM TUDO ISSO?
Um projeto que nasce da sensibilidade de movimentos sociais nos seus territórios
em articulação com a Universidade já carrega na sua origem uma provocação
importante, um convite para olharmos a relação da universidade com a produção
das vidas nos diferentes espaços onde ela acontece.

O papel social das universidades é dependente da porosidade que estas


conseguem desenvolver para se conectar com o que atravessa a produção viva
das muitas vidas nas suas singularidades, vulnerabilidades e potências. Para as
universidades públicas, a responsabilidade com o desenvolvimento de políticas
públicas é mais um elemento dessa necessária conexão.

Desenhar o papel social das universidades, os compromissos centrais do ensino,


da pesquisa e das atividades de extensão é um projeto sempre em disputa e
atravessado por muitas forças. Disputar a Universidade é disputar os mundos que
queremos construir.

Produzir a entrada da Universidade nos três territórios do centro de São Paulo


em um movimento articulado com os movimentos sociais de cada um destes e
trazer para dentro da Universidade as diferentes vozes sobre o tema da dignidade
menstrual é uma aposta na construção em ato, viva, na possibilidade dessa conexão.

55
Dignidade Menstrual: para quem?

O trabalho descrito nesse e.book visibiliza as muitas vulnerabilidades que


atravessam a busca da dignidade menstrual para diferentes pessoas que menstruam.
Reforça a conexão dessa vivência com a produção mais ampla do viver cotidiano.
Explicita, ao trazer a complexa cadeia de conexão desta vivência com os muitos
arranjos de produção das vidas, a necessidade urgente de ampliação das políticas
públicas voltadas para estas populações, buscando a garantia de direitos.

Para muitas dessas pessoas, a perspectiva da necropolítica transforma sua


invisibilidade em abandono, torna sua vida descartável. Neste contexto, ao estar
nos territórios não para avaliar de longe, numa pseudoneutralidade, o que ali é
produzido, mas para estar junto, para desenvolver o projeto com os coletivos que
ali atuam concretiza o compromisso da universidade com o respeito à dignidade e
ao direito à vida.

Há uma aposta de que, estando ali com os alunos, eles possam aprender que,
mais do que adotar uma postura de quem ali está para ensinar algo às pessoas
que foram compondo o campo do trabalho, devem se abrir para aprender com os
encontros, se conectar com uma formação para a solidariedade e com a capacidade
de resistência e enfrentamento das desigualdades. Não é um uso do território
apenas como campo de aprendizagem, mas é produzir uma ação da universidade
no campo coerente com seu papel social.

Essa interação possibilitou a reflexão sobre políticas públicas e permite a uma


universidade pública federal ampliar sua responsabilidade com a construção e
qualificação destas.

Esse compromisso se estende também aos integrantes de movimentos sociais


que fizeram parte desse processo. Algumas pessoas, mesmo terminando o trabalho
do projeto, continuaram fazendo parte de ações ou fóruns que operam ali, com foco
na solidariedade, na defesa de direitos e se conectando com as potências de cada
território.

A vivência do projeto, como já descrito, permitiu visibilizar as muitas estratégias


usadas pelas pessoas que menstruam, expondo a força das ações individuais e
principalmente as coletivas na perspectiva de enfrentar situações atravessadas pelo
não acesso a direitos.

O desenvolvimento compartilhado do projeto se conectou todo o tempo com


um dos objetivos do Laboratório de Saúde Coletiva – Lascol: contribuir com o
fortalecimento e a articulação de movimentos sociais parceiros com o intuito
de favorecer redes de solidariedade na luta pela garantia de direitos e por uma
sociedade menos desigual.

Uma aposta de que levar a Universidade para os territórios e deixar que a vida
pulsante nesses entre na produção cotidiana desta é fortalecer a conexão com o
convite de Sergio Vaz: “os sonhos só acontecem quando a gente acorda”

56
Dignidade Menstrual: para quem?

Que projetos como este possam ajudar as universidades a saírem do lugar


da repetição e a ampliar sua capacidade de produzir sonhos, assumindo seu
compromisso com o enfrentamento das desigualdades e a defesa de todas as vidas.

Lumena Almeida Castro Furtado


Coordenadora do LASCOL à época do projeto

57
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63
:
PARA QUEM?

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