Tendências Contemporâneas Do Ensino de Artes

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Tendências Contemporâneas

do Ensino de Artes
Volume único Terezinha Losada

Apoio:
Fundação Cecierj / Consórcio Cederj
Rua da Ajuda, 5 – Centro – Rio de Janeiro, RJ – CEP 20040-000
Tel.: (21) 2333-1112 Fax: (21) 2333-1116

Presidente
Carlos Eduardo Bielschowsky

Vice-presidente
Masako Oya Masuda

Coordenação do Curso de Pedagogia para as Séries Iniciais do Ensino Fundamental


UNIRIO - Leonardo Vilela
UERJ - Dirceu Castilho

Material Didático
ELABORAÇÃO DE CONTEÚDO Departamento de Produção
Terezinha Losada
EDITOR DIRETOR DE ARTE
COORDENAÇÃO DE DESENVOLVIMENTO
Fábio Rapello Alencar Alexandre dOliveira
INSTRUCIONAL
Cristine Costa Barreto COORDENAÇÃO DE PROGRAMAÇÃO VISUAL
REVISÃO Alexandre dOliveira
SUPERVISÃO DE DESENVOLVIMENTO
Cristina Freixinho Janaína Santana
INSTRUCIONAL
Miguel Siano da Cunha REVISÃO TIPOGRÁFICA Ricardo Polato
Carolina Godoi ILUSTRAÇÃO
DESENVOLVIMENTO INSTRUCIONAL
E REVISÃO Cristina Freixinho Fernando Romeiro
Anna Maria Osborne Elaine Bayma
CAPA
Nataniel dos Santos Gomes Renata Lauria
Fernando Romeiro
Paulo Alves COORDENAÇÃO DE
PRODUÇÃO GRÁFICA
PRODUÇÃO
AVALIAÇÃO DO MATERIAL DIDÁTICO Verônica Paranhos
Ronaldo dAguiar Silva
Thaïs de Siervi

Copyright ' 2011, Fundação Cecierj / Consórcio Cederj


Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada, por qualquer meio
eletrônico, mecânico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por escrito, da Fundação.
L879
Losada, Terezinha.
Tendências contemporâneas do ensino de artes / Terezinha
Losada – Rio de Janeiro: Fundação CECIERJ, 2013.
130 p.; 19 x 26,5 cm.

ISBN: 978-85-7648-775-3

1. Arte - estudo e ensino. 2. Funções da linguagem. II. Título.


CDD 700.7
2013.2/2014.1
Referências Bibliográcas e catalogação na fonte, de acordo com as normas da ABNT.
Texto revisado segundo o novo Acordo Ortográco da Língua Portuguesa.
Governo do Estado do Rio de Janeiro

Governador
Sérgio Cabral Filho

Secretário de Estado de Ciência e Tecnologia


Gustavo Reis Ferreira

Universidades Consorciadas
CEFET/RJ - CENTRO FEDERAL DE EDUCAÇÃO UFRJ - UNIVERSIDADE FEDERAL DO
TECNOLÓGICA CELSO SUCKOW DA FONSECA RIO DE JANEIRO
Diretor-geral: Carlos Henrique Figueiredo Alves Reitor: Carlos Levi

UENF - UNIVERSIDADE ESTADUAL DO UFRRJ - UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL


NORTE FLUMINENSE DARCY RIBEIRO DO RIO DE JANEIRO
Reitor: Silvério de Paiva Freitas Reitora: Ana Maria Dantas Soares

UERJ - UNIVERSIDADE DO ESTADO DO UNIRIO - UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO


RIO DE JANEIRO DO RIO DE JANEIRO
Reitor: Ricardo Vieiralves de Castro Reitor: Luiz Pedro San Gil Jutuca

UFF - UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE


Reitor: Roberto de Souza Salles
Tendências Contemporâneas
do Ensino de Artes Volume único

SUMÁRIO Aula 1 – Linguagens e ciências: a estrutura curricular da educação brasileira __ 7


Terezinha Losada

Aula 2 – Dimensão estética: a pluralidade das formas de conhecimento _____ 19


Terezinha Losada

Aula 3 – Dimensão educacional: a pluralidade das correntes pedagógicas ___ 43


Terezinha Losada

Aula 4 – Dimensão cultural: a pluralidade das tradiçıes artísticas __________ 61


Terezinha Losada

Aula 5 – Funçıes da linguagem: o referente, o emissor e o receptor ________ 77


Terezinha Losada

Aula 6 – Funçıes da linguagem: o canal e o código ____________________ 91


Terezinha Losada

Aula 7 – Funçıes da linguagem: a mensagem _______________________ 105


Terezinha Losada

Aula 8 – Contextualização: o processo de construção do conhecimento __ 117


Terezinha Losada

Referências _______________________________________________ 127


Linguagens e ciências: a estrutura

AULA
curricular da educação brasileira
Terezinha Losada

Meta da aula
Apresentar a estrutura curricular da educação brasileira, que
se divide nas áreas de Linguagem e de Ciências Naturais e
Humanas, destacando as principais características, objetivos e
desaos metodológicos do ensino na área de linguagens.
objetivos

Esperamos que, ao nal desta aula, você seja


capaz de:
1. identicar as linguagens como a principal ferramenta
humana para estabelecer as relaçıes sociais, a cons-
trução, a representação e a comunicação de todos os
tipos de conhecimentos, isto é, você deverá ser capaz
de reconhecer o caráter instrumental das linguagens;
2. diferenciar as múltiplas formas de linguagem: verbal,
matemática, visual, sonora, corporal, bem como suas
hibridizaçıes, que é o caso do teatro, do cinema e das
novas mídias que utilizam ao mesmo tempo esses
vários códigos de comunicação;
3. identicar as múltipas funçıes instrumentais das
linguagens artísticas (Música, Artes Cênicas e Artes
Visuais) no cotidiano e na educação;
4. distinguir o conceito de interdisciplinaridade,
ligado à divisão disciplinar das ciências, do
conceito de transversalidade, ligado ao caráter
instrumental das linguagens.
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Linguagens e cie ncias: a estrutura curricular da
educação brasileira

INTRODUÇÃO Muitos teóricos armam que o grande desenvolvimento do ser humano fren-
te aos demais seres da face da terra deve-se a sua habilidade em utilizar as
mãos, tornando-o capaz de construir ferramentas e transformar a natureza.
Para o antropólogo Levi-Strauss, tal distinção deve-se à aquisição da lingua-
gem. Para ele, a linguagem é a principal “ferramenta” desenvolvida pelo ser
humano, permitindo-lhe elaborar e transmitir conhecimentos, construindo,
desse modo, diferentes culturas e sociedades.
Nesta primeira aula, vamos discutir os diversos tipos de linguagem, suas
diferentes funções comunicativas e os objetivos do ensino de linguagem nos
curr́culos escolares.

AS DIVERSAS LINGUAGENS

ATIVIDADE

Atende aos Objetivos 1 e 2

1.

8 CEDERJ
1
É impressionante o volume de informações que recebemos cotidianamente

AULA
por meio dos mais variados tipos de est́mulos, sinais e códigos. Essa ima-
gem registra uma cena urbana. Anote os diversos tipos de informações e
est́mulos que você observa nesta ilustração e que poderia sentir e perceber
se estivesse concretamente nesta cena.
Informações visuais: ______________________________________________
_________________________________________________________________
Informações verbais: ______________________________________________
_________________________________________________________________
Informações numéricas: ___________________________________________
_________________________________________________________________
Poss́veis informações sonoras: ____________________________________
_________________________________________________________________
Poss́veis informações e sensações corporais: ________________________
_________________________________________________________________
Poss́veis informações quantitativas: ________________________________
_________________________________________________________________

RESPOSTA COMENTADA
O objetivo deste exerc´cio de observação e memória foi apenas res-
saltar a innidade de informações que recebemos cotidianamente por
meio dos mais diversos códigos e meios de comunicação. Informações
verbais (orais e escritas) estão presentes nos letreiros das lojas, nas
placas de informação, além da fala das pessoas e dos vendedores
ambulantes anunciando seus produtos. A linguagem matemática é
percept´vel na numeração das ruas, das linhas de ônibus, nos preços
dos produtos nas vitrines, como também nas noções de quantidade,
quando avaliamos o congestionamento do trânsito ou a velocidade
de um carro que passa. São inúmeras as informações visuais, tais
como as cores codicadas dos semáforos (sinais), as fotograas
dos anúncios publicitários, a arquitetura da cidade, a decoração das
lojas, além da cont´nua mudança da moda no vestir, com todas as
suas cores, estamparias e modelos.
Impercept´vel numa fotograa, mas perturbadoramente presente
no cotidiano é a linguagem sonora: o burburinho dos motores, das
buzinas dos carros, dos diferentes tipos de sirenes (ambulância,
bombeiros, pol´cia), dos toques dos celulares, até o eventual canto
de um pássaro ou o latido de um cachorro. Há ainda a expressão
corporal ou cênica do uxo ritmado dos pedestres, ora desviando,
ora esbarrando uns nos outros; os gestos convencionais dos guardas
de trânsito, o assédio dos entregadores de lipetas, que pelo menos
encontraram essa alternativa de trabalho, além do consternamento,
ou mesmo temor, diante das inúmeras crianças e jovens pedintes,
que infelizmente ainda marcam o cenário da realidade brasileira.

CEDERJ 9
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Linguagens e cie ncias: a estrutura curricular da
educação brasileira

Veja, agora, como você pode identicar os inúmeros tipos de


linguagens e os diferentes ve́culos dessas linguagens.

Figura 1.1: ADN (ácido desoxirribonucleico), base da herança genética.


Fonte: http://es.wikipedia.org/wiki/Archivo:ADN_static.png

Assim como na vida cotidiana, as linguagens são fundamentais


também para a elaboração e divulgação de todos os tipos de conheci-
mentos técnicos e cient́cos. Quando olhamos o diagrama do código
genético (Figura 1.1) mesmo não sabendo exatamente o que signica
cada uma daquelas part́culas ali representadas, temos um entendimento
bastante sintético e imediato da dinâmica de seu funcionamento. Isto é,
percebemos a conexão de pares de formas que se repetem num movimento
innito. Este modelo gráco facilita enormemente a compreensão do
complexo processo de combinação dos ácidos nucléicos na organização
do código genético.

10 CEDERJ
(a) (b) (c)

1
AULA
Figura 1.2: (a) Organograma; (b) gráco em forma de pizza; (c) gráco de coluna.
Fontes: http://www.istockphoto.com/le_closeup/?id=11261411&refnum=1056317&source=sxch
u04&sou rce=sxchu04, http://www.sxc.hu/photo/1189105, http://www.sxc.hu/photo/1209458

O mesmo ocorre nos organogramas (Figura 1.2(a)). Mesmo sem


saber do que se trata, facilmente deduzimos a referência a um processo
ordenado de subdivisões, que sugere a subordinação de um elemento ao
outro. Estrutura esta muito distinta da cadeia genética, na qual todos os
elementos parecem ter o mesmo valor, sem qualquer relação de hierarquia.
Outro exemplo de representação visual muito comum e eciente
são os grácos (Figura 1.2 (b) e Figura 1.2 (c)). Eles nos permitem esta-
belecer relações de quantidade e proporções dif́ceis de serem percebidas
na forma abstrata dos números, especialmente os de grande magnitude.
Neste caso, são muito úteis também as remissões comparativas da lingua-
gem, estabelecendo relações com medidas que nos são mais familiares.
Assim, dizemos que uma determinada grandeza corresponde a distância
de tantas voltas na Terra, ou a área de tantos campos de futebol, ou ao
valor monetário da compra de tantos carros.
Por essas diversas razões, o estudo das diferentes linguagens é
tão importante na educação. Isso pode ser facilmente percebido por
meio de um rápido passeio por esse material didático, seja na sua forma
impressa ou eletrônica. Observe a presença dos textos, das ilustrações e
dos números ordenando as páginas e seus diversos itens, além de outras
relações quantitativas. Na educação presencial é fundamental a organi-
zação do espaço f́sico da escola, os modos de interação verbal e corporal
entre os professores, alunos e técnicos. Na educação a distância, essa
interlocução direta é mais restrita; porém, essa modalidade de ensino
permite o acesso a diferentes textos, imagens e v́deos por meio de um
simples toque no computador. Nesta modalidade de ensino, a distância
f́sica entre as pessoas é superada por meio da utilização de outros meios

CEDERJ 11
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Linguagens e cie ncias: a estrutura curricular da
educação brasileira

de comunicação, tais como os fóruns virtuais de debate, a veiculação


de som e imagem, redimensionando, desse modo, nossas concepções
tradicionais de tempo e espaço.
Em suma, as linguagens e seus diversos ve́culos são – como tão
bem sintetizou MCLUHAN – magn́cas extensões de nosso corpo e de
nossa mente. Por outro lado, é preciso aceitar que nenhuma linguagem
Na década de 1960,
diante apenas do e nenhum meio de comunicação é capaz de representar plenamente a
advento da televisão,
o autor canadense realidade dos fenômenos ou de nossas impressões e sentimentos sobre
Marshall MCLUHAN eles. Cada linguagem inscreve certas possibilidades e certos limites nos
(1911-1980) preco-
niza que os meios seus modos de representação (códigos) e nos seus meios de comunicação
de comunicação
transformariam o (tecnologias).
mundo numa imen-
Por isso, a estrutura curricular da educação brasileira prevê a área
sa aldeia global.
Profeta do processo de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, voltada para o estudo dos
de globalização, suas
ideias serão ampla- diferentes tipos de linguagem. Esta área envolve o estudo da linguagem
mente resgatadas a
partir dos anos 1980,
verbal (L́ngua Portuguesa, L́ngua Estrangeira), da linguagem corporal
devido a difusão dos (Educação F́sica) e também das linguagens art́sticas (Artes Visuais,
computadores pesso-
ais e da comunicação Música, Artes Cênicas e Dança). Ao lado da área de linguagens, a
via internet. Volta-
remos discutir esse estrutura curricular da educação brasileira também prevê as áreas das
autor nas próximas Ciências Naturais e das Ciências Humanas. Vamos analisar brevemente
aulas, mas você pode
conhecer melhor suas quais são as principais diferenças e, consequentemente, os principais
ideias revolucionárias
visitando seu site o- desaos metodológicos no ensino destas diferentes áreas curriculares:
cial: http://www.mar-
linguagens e Ciências.
shallmcluhan.com
Fonte: http://
en.wikipedia.org/wiki/
File: MarshallMcluhan.
OS DESAFIOS NO ENSINO DAS CIÊNCIAS
png

As disciplinas cient́cas são delimitadas pelo seu objeto de estudo


e pelas diferentes questões que se elaboram sobre estes objetos. De acordo
com o seu objeto de estudo, distinguimos as ciências que se ocupam dos
fenômenos naturais daquelas que se ocupam dos fenômenos humanos.
Dependendo do tipo de questão formulada frente a esses objetos,
distinguimos, entre as Ciências Naturais, a F́sica, que se ocupa das leis
da matéria; a Qu́mica, que trata de suas propriedades; a Biologia, que
envolve as funções orgânicas.
Da mesma maneira, entre as chamadas Ciências Humanas, de
acordo com a questão formulada identicamos diferentes campos dis-
ciplinares. A História ocupa-se da concatenação dos fatos no tempo; a
Sociologia prioriza o estudo das estruturas sociais e dos modelos pol́ticos;

12 CEDERJ
a Geograa investiga a relação do ser humano com o meio ambiente,

1
destacando seus aspectos f́sicos, demográcos e econômicos.

AULA
Através do detalhamento desses objetos e questões, cada uma
dessas disciplinas se subdivide em inúmeras subdisciplinas, cada qual
podendo abarcar teorias divergentes. Nesse processo de especialização,
aquilo que a ciência ganha em profundidade geralmente perde nas cone-
xões com o todo. Esse é, portanto, o principal desao metodológico do
ensino na área de ciências: Como fomentar o necessário conhecimento
especializado sem perder de vista o sentido de totalidade?
Em s́ntese, o grande desao do ensino de ciências é estabelecer
a interdisciplinaridade, ou seja, a relação entre as diferentes disciplinas
cient́cas, de modo que o aluno possa ter, ao mesmo tempo, uma visão
plural e integrada da realidade.

ATIVIDADE

Atende ao Objetivo 3

2.

Figura 1.3: Plataforma da Petrobras do Campo Tupi, na bacia de Santos, onde foram
realizados os primeiros testes de extração de petróleo na camada do pré-sal.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Oil_platform_P-51_(Brazil).jpg

CEDERJ 13
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Linguagens e cie ncias: a estrutura curricular da
educação brasileira

A descoberta de reservas de petróleo na camada do pré-sal do litoral


brasileiro, por exemplo, é um tema atual que para ser devidamente com-
preendido exige uma abordagem interdisciplinar. Abra um site de pesquisa
na internet e faça uma busca das expressões citadas a seguir. Comente
brevemente como as imagens utilizadas nos sites pesquisados te ajudaram
a compreender algum aspecto do assusnto em questão.

“origem do petróleo”

“localização do pré-sal”:

“distribuição dos royalties do pré-sal”:

RESPOSTA COMENTADA
Você deve ter percebido que a discussão deste assunto envolve a
relação de conhecimentos ligados a diferentes campos das cièncias.
A hipótese mais aceita entre os cientistas é a de que o petróleo
resulte da decomposição e sedimentação de fósseis, criando os
hidrocarbonetos (Qu´mica). O petróleo pode ser encontrado em
camadas superciais ou muito profundas da crosta terrestre, como
ocorre no pré-sal, tipo de formação geológica que se estende ao
longo da costa brasileira (Geologia, Geograa). Sendo uma impor-
tante riqueza natural, o petróleo é também tema de importantes
discussões econômicas, pol´ticas e sociais ligadas ao campo da
História. Este é o caso das atuais discussões sobre a distribuição dos
royalties do pré-sal. Royalties são taxas que as empresas exploradoras
do petróleo pagam ao Governo Brasileiro e que este distribui aos
diversos estados da Federação. Os critérios dessa distribiução dividem
as opiniões e os interesses dos estados produtores e não-produtores
de petróleo. Você deve ter percebido também que a utilização de
mapas, ilustrações cient´cas e grácos de relações numéricas faci-
litam a compreensão dessas informações especializadas.

14 CEDERJ
OS DESAFIOS NO ENSINO DAS LINGUAGENS

1
AULA
Voltando a discussão sobre a área das linguagens, poder́amos
então perguntar: qual é o objeto e qual é a questão das linguagens? E
ter́amos de reconhecer que as linguagens permeiam todos os objetos e
todas as questões, todos os conhecimentos de senso comum e todos os
conhecimentos cient́cos. Anal, como vimos, para elaborar e divulgar
suas teorias, as ciências dispõem das linguagens. Recorrem a corriqueira
linguagem verbal, criando terminologias especiais e denindo conceitos
que garantam a objetividade cient́ca. Utilizam linguagens especiais,
como a linguagem da matemática ou o código dos s́mbolos qu́micos.
Recorrem, ainda, a s representações imagéticas, tais como os grácos,
diagramas, mapas etc.

A linguagem permeia o conhecimento e as formas de conhecer, o pensa-


mento e as formas de pensar, a comunicação e os modos de comunicar, a
ação e os modos de agir. Ela é a roda inventada que movimenta o homem
e é movimentada pelo homem. Produto e produção cultural nascida por
força das práticas sociais, a linguagem é humana e, tal como o homem,
destaca-se pelo seu caráter criativo, contraditório, pluridimensional,
múltiplo e singular a um só tempo (BRASIL, 2002, p. 125).

Em outras palavras, as linguagens são intrinsecamente transdiscipli-


nares, pois cumprem uma função instrumental na construção e veiculação
de toda sorte de conhecimentos. Portanto, o grande desao metodológico
para o ensino de linguagem é garantir esse seu caráter transversal.

CEDERJ 15
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Linguagens e cie ncias: a estrutura curricular da
educação brasileira

CONCLUSÃO

Devido exatamente ao seu caráter transversal e instrumental, é muito


comum diretores de escolas solicitarem que os professores organizem com
os alunos peças de teatro, números de músicas e produção de murais para
serem apresentados na escola em datas festivas. Porém, para que estas ativi-
dades sejam desenvolvidas com qualidade e tenham uma efetiva participação
criativa dos alunos, é necessário que o aprendizado das linguagens art́sticas
seja desenvolvido na escola ao longo de todo o ano. Caso contrário, as
crianças carão apenas repetindo mecanicamente coisas planejadas pelos
professores, isso quando não é o próprio professor que faz o trabalho em
nome do aluno, fato muito frequente na produção de presentes para o Dia
das Mães e outras atividades ligadas a s artes visuais.
Em outras palavras, queremos frisar que, apesar de suas várias
funções instrumentais, a expressão art́stica não ocorre de modo auto-
mático ou espontâneo. É necessária uma alfabetização das crianças
nestes códigos, assim como ocorre no ensino de L́ngua Portuguesa e de
Matemática, sendo, para isso, desenvolvido um programa cont́nuo e
sistemático de aprendizagem, do mesmo modo como ocorre com todas as
demais disciplinas do curr́culo. Conforme sintetiza a arte-educadora Ana
Mae Barbosa (2003) "a arte tem conteúdo, história, várias gramáticas e
múltipos sistemas de interpretação que devem ser ensinados".
Porém, esse corpo de conhecimentos disciplinares da área de linguagem,
seja no âmbito das categorias gramaticais ou da história, não deve ser ensi-
nado como um conteúdo puramente escolar e válido em si mesmo, mas sim
na transversalidade de seus usos concretos, isto é, de modo contextualizado,
estimulando o desenvolvimento dos alunos como receptores e como emissores
dos diversos gêneros narrativos: cotidianos, técnicos, cient́cos e art́sticos.
A relevância desse caráter transversal e instrumental das linguagens
art́sticas, particularmente na formação das crianças, é destacada por
importantes educadores do passado e da atualidade. Há um consenso entre
eles de que o desenvolvimento de atividades ligadas a s artes na escola:
• estimula as faculdades sensórias e as habilidades motoras da crian-
ça, formando as bases do pensamento simbólico (Montessori e Piaget);
• desenvolve a criatividade e a capacidade de solução de pro-
blemas (Dewey);

16 CEDERJ
• permite a elaboração de conteúdos afetivos (Dewey e Freinet);

1
• incentiva a cooperação nas interações sociais e a construção da

AULA
identidade cultural (Vigotsky, Paulo Freire, Freinet);
• estabelece v́nculos existenciais e afetivos entre o ambiente esco-
lar e a realidade cotidiana e cultural do aluno (Richter).

ATIVIDADE FINAL
Atende ao Objetivo 3

Fonte: http://www.sxc.hu/photo/1182575

Além de instrumentalizar a análise de aspectos espec́cos das cie ncias, as imagens


(e a arte em geral) te m também o poder de suscitar reexões amplas sobre a
realidade humana, como é o caso da charge apresentada sobre a questão do
petróleo. Faça a sua interpretação desta imagem.

CEDERJ 17
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Linguagens e cie ncias: a estrutura curricular da
educação brasileira

RESPOSTA COMENTADA
Nesta charge, o artista se apropriou do código de representação das placas de
trânsito, dando novos sentidos aos seus elementos. Em vez da função usual de
sinalizar a presença de um posto de combust´vel, ela indica que o cidadão pode estar
cometendo suic´dio ao desenvolver essa ação. Por meio desta estratégia poética e
humor´stica, ele nos leva a pensar sobre os riscos à sobrevivência do planeta e da
espécie humana relacionados ao uso desta fonte de energia.

RESUMO

Ao analisarmos a estrutura curricular da educação brasileira, é essencial levar


em conta dois conceitos de grande importa ncia nos planejamentos didáticos:
interdisciplinaridade e transversalidade.
As estratégias interdisciplinares de ensino visam a relacionar os conhecimentos
espec́cos das diversas disciplinas cient́cas, permitindo que voce elabore uma
visão ampla e integrada da realidade. O ensino das linguagens, por sua vez, deve
explorar estratégias transversais, que permitam a voce decifrar e produzir mensagens
relacionadas aos mais diversos contextos: cient́cos, culturais e emotivos.

INFORMAÇÃO SOBRE A PRÓXIMA AULA

Exatamente devido a seu caráter instrumental, o estudo da linguagem verbal (L́ngua


Portuguesa e L́ngua Estrangeira) e da linguagem matemática sempre tiveram
grande prest́gio na escola, sendo estas reconhecidas como áreas de conhecimento
necessárias para o bom desenvolvimento das demais disciplinas do curr́culo. No
entanto, o mesmo não pode ser dito em relação a s linguagens art́sticas, muitas
vezes negligenciadas na escola como disciplinas de menor importa ncia. Por que isso
ocorre? Na próxima aula, buscaremos discutir esse problema, analisando as relações
entre razão e sensibilidade nas diversas teorias do conhecimento.

18 CEDERJ
Dimensão estética: a
pluralidade das formas

AULA
de conhecimento
Terezinha Losada

Meta da aula
Apresentar a arte como uma forma particular
e especial de conhecimento por meio de uma
breve revisão das principais teorias do conheci-
mento e teorias estéticas, legadas pela tradição
losóca ocidental.
objetivos

Esperamos que, ao nal desta aula, você seja


capaz de:
1. distinguir a arte, a religião, a Filosoa e a
ciência como diferentes modos narrativos
utilizados pelo ser humano para explicitar a sua
compreensão sobre o universo, o mundo, a vida
social e individual;
2. comparar as diversas concepçıes de
conhecimento desenvolvidas pela tradição
losóca por meio da análise das relaçıes entre
razão e sensibilidade;
3. reconhecer a importância da experiência estética
e artística na construção do conhecimento,
identicando diferentes tipos de práticas
artísticas desenvolvidas na escola.
Tendências Contemporâneas no Ensino de Artes | Dimensão estética: a pluralidade das formas de
conhecimento

INTRODUÇÃO
Na aula anterior, analisamos a estrutura curricular da educação brasileira,
particularmente a importância da área de Linguagem, Códigos e suas Tecno-
logias. Salientamos o caráter transversal das linguagens, que funcionam como
instrumentos para a elaboração e a difusão de toda sorte de conhecimentos,
ligados às ciências e à vida em geral. Destacamos que, exatamente por isso,
o ensino da L́ngua Portuguesa e da Matemática são muito valorizados na
escola. Porém, as linguagens art́sticas nem sempre guardam o mesmo pres-
t́gio. Por que isso ocorre?
Para discutirmos essa questão nesta aula, vamos analisar um uso muito par-
ticular das linguagens: a arte, ou seja, esta forma especial de elaboração da
experiência, do conhecimento e da cultura que não se organiza a partir de
princ́pios racionais ou lógicos, como ocorre com a ciência, mas de princ́pios
estéticos, ligados à percepção sensorial que temos do mundo.
Em torno desse propósito, faremos uma breve discussão das principais teorias
do conhecimento e teorias estéticas formuladas pela tradição losóca. Neste
levantamento histórico será apresentado um grande volume de nomes, datas,
conceitos e correntes teóricas. Mas que tranquilo! Esta é, sem dúvida, a aula
mais densa de teorias de todo o curso e não esperamos que você memorize
todos os dados nela apresentados. Para isso podemos utilizar a memória deste
texto, dos livros, das enciclopédias ou dos computadores, essas preciosas
“extensões” de nossa mente, conforme salientou McLuhan.
De fato, esperamos que esta aula funcione como um mapa, que sinalize os
principais caminhos desenvolvidos pelos lósofos ocidentais para relacionar
os territórios da razão e da sensibilidade em suas teorias do conhecimento.
Muitas dessas teorias já foram ou serão tratadas em outras disciplinas do
nosso curso e serão resgatadas nas próximas aulas, momento em que você
poderá entendê-las melhor, por meio de várias contextualizações.

O MODERNO E O PÓS-MODERNO

Vamos iniciar nosso percurso histórico problematizando como


a questão do conhecimento está posta na atualidade. Para isso vamos
comparar as ideias de dois importantes lósofos: Hegel e Lyotard.

20 CEDERJ
2
AULA
Fonte: http://multimedia.iol.pt/iol/gar_multimedia/objecto_imagem/id/1265/584

Para Hegel (1770-1831), lósofo alemão do século XIX, a história


tem uma nalidade, um sentido, que seria a plena realização do esp́rito.
Nessa perspectiva, ele identica três formas de realização do esp́rito: a
arte, a religião e a Filosoa. Cada qual é apresentada como uma etapa a
ser superada historicamente no desenvolvimento humano, de modo que
a arte representaria a forma mais elementar de realização do esp́rito,
enquanto a Filosoa, a mais evolu́da.
Não toda e qualquer losoa, mas a dialética por ele elaborada.
Desse modo:

O seu sistema representaria (...) o m da losoa, a superação da


oposição entre os diferentes sistemas e a s́ntese das verdades que
todos contêm, resultado de sua análise das etapas do desenvolvi-
mento do esp́rito (JAPIASSU; MARCONDES, 1993, p. 116).

Assim Hegel fez seu prognóstico sobre a morte da arte, da religião,


e também anuncia o m da Filosoa, já plenamente explicitada no seu
próprio sistema losóco. Quanto a História, esta permaneceria no seu
vir-a-ser dialético, de contradição a contradição. Essas ideias de Hegel
exerceram forte inuência no posterior desenvolvimento das teorias
losócas e art́sticas, sendo amplamente debatidas até os nossos dias.
Lyotard (1924-1998), lósofo francês contemporâneo, guarda
em comum com Hegel a concepção de que a arte, a religião, a Filosoa
e também a ciência são diferentes modos narrativos desenvolvidos pelo
ser humano para explicitar sua compreensão sobre a vida, o mundo
e o universo.

CEDERJ 21
Tendências Contemporâneas no Ensino de Artes | Dimensão estética: a pluralidade das formas de
conhecimento

Porém, ele discorda frontalmente da classicação hierárquica e


evolucionista desenvolvida por Hegel. Na obra Condição pós-moderna,
de 1979, Lyotard argumenta que, no mundo de hoje, não há mais lugar
para os grandes sistemas explicativos da Filosoa e da ciência, que mar-
caram a tradição moderna. A antiga aspiração ao absoluto, desenvolvida
pela Filosoa, e a verdade, perseguida pelas ciências, deveria ceder a
análise da pluralidade e diversidade humana.
Pois, para Lyotard, diferentemente de Hegel, a História não tem
um sentido único que possa ser avaliado de modo evolutivo. Diante
disso, ele questiona o caráter emancipatório da razão, apresentando a
crença na Filosoa e na ciência que o Iluminismo nos legou como uma
narrativa totalizante e autoritária. Com forte inspiração romântica,
ele postula que a verdadeira emancipação do homem se dá pela liberdade
de sentir, pela criatividade, pelo caráter desregulamentador da arte.
Sem formar um movimento coeso, vários outros lósofos contem-
porâneos compartilham dessas ideias de Lyotard, substituindo a busca de
uma teoria absoluta sobre a realidade pelo interesse por microteorias
que tratem de aspectos espec́cos da realidade, tais como: poder, sexuali-
dade, direito, loucura, arte, etc. Por contestarem a tradição losóca, estes
pensadores utilizam muitos prexos de negação (anti, des) na elaboração
de seus conceitos e são também assim identicados, sendo denominados
como pós-modernos ou pós-estruturalistas. No entanto, conforme discuti-
remos adiante, esse debate ainda está em aberto na atualidade, envolvendo
o confronto de diferentes ideias.

ATIVIDADE

Atende aos Objetivos 1, 2 e 3

1.a. O que você acha dessas teses de Hegel e Lyotard? Para você, a arte, a
religião, a Filosoa e a ciência são formas de conhecimento ou “realização
do esp́rito”? Justique a sua resposta.

22 CEDERJ
2
1.b. Você considera que há uma hierarquia entre essas atividades que

AULA
sinalize um processo evolutivo rumo ao conhecimento absoluto, conforme
argumenta Hegel? Em caso positivo, você adotaria a mesma classicação
de Hegel ou proporia outra? Ou você considera que sejam apenas dife-
rentes formas de experimentar e representar a realidade, como argumenta
Lyotard? Justique a sua resposta.

RESPOSTA COMENTADA
A resposta a esta atividade é de caráter pessoal.
Entretanto, repare que há na atualidade uma grande aceitação das
ideias pós-modernistas de Lyotard, que priorizam o particular e o
plural, em oposição às noções de universal e absoluto. Entretanto,
conforme discutiremos adiante, muitos aspectos relativos a essas
questões dividem as opiniões dos lósofos ainda hoje. Decerto a
consideração desses confrontos de ideias exige um estudo detalhado
da tradição losóca, que extrapola o âmbito desta disciplina. Por-
tanto, o objetivo desta sucinta e rápida aula será apenas o de situar
algumas questões relativas à área de artes, tais como:
- A arte é ou não uma forma de conhecimento?
- A arte está superada, ou ainda representa um modo de experi-
mentar e explicar a realidade no mundo atual?
Mesmo nestes limites, não pretendemos oferecer respostas conclu-
sivas ou consensuais, mas apenas estimular a sua reexão sobre
esse assunto, para que você elabore suas próprias opiniões.

AFINAL, O QUE É A VERDADE? O QUE É A REALIDADE?


O QUE É A CONSCIÊNCIA? O QUE É O CONHECIMENTO?

Com base na distinção entre a experiência racional e a expe-


riência sensorial, também chamada experiência sens́vel ou estética,
desde Platão e Aristóteles essas questões instigam os lósofos ociden-
tais. As artes se inscrevem nesse debate losóco sobre o conhecimento,
ora como o contraponto negativo da razão, como o zeram todas as
tendências racionalistas; ora como um modo rudimentar de elaboração
da experiência, tal como formulado pelos empiristas; e ora como a mani-

CEDERJ 23
Tendências Contemporâneas no Ensino de Artes | Dimensão estética: a pluralidade das formas de
conhecimento

festação mais perfeita do esp́rito, maneira privilegiada de alcançar o


absoluto, como fora considerado por Nietzsche, pelos estetas românticos
e também por muitos lósofos contemporâneos ligados ao movimento
pós-estruturalista ou pós-modernista.
De fato, esse divórcio entre razão e sensibilidade está presente na
própria identidade antropológica da sociedade ocidental, repercutin-
do não só nas teorias losócas e cient́cas, mas também nos nossos
modos de perceber, agir e representar o mundo, bem como nas diversas
concepções de educação.
Nesta aula, vamos abordar o debate losóco sobre o conhecimen-
to para na próxima aula identicarmos a inuência desses pensadores
no desenvolvimento das principais correntes pedagógicas, destacando
sempre suas concepções sobre o ensino de Artes.

Platão e o racionalismo

Figura 2.1: Platão.


Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/
Ficheiro:Platon-2.jpg

24 CEDERJ
Para Platão (427-348 ou 347 a.C.), a aparência sens́vel é ilu-

2
sória, e a essência verdadeira do homem e do cosmos só é alcançada

AULA
pela ideia. Curiosamente, para expor esses conceitos, Platão utilizou
a metáfora, altamente gurativa, do mito da caverna (ver Figura 2.2).
De um lado o fogo que representa a verdade das essências. Do outro
lado, escravos acorrentados no interior escuro da caverna, tomando a
aparência distorcida e fantasmagórica das sombras projetadas pela luz
como se fosse a realidade. A caverna é o mundo concreto dos fenôme-
nos, do homem acorrentado a s opiniões, aos afetos, ao senso comum
e a s diferentes visões de mundo. Segundo Platão, esses vários aspectos
distorcem a compreensão da verdade, que só pode ser alcançada por
meio da intuição das ideias.

Figura 2.2: O mito da caverna.


Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro: Plato%27s_
allegory_of_the_cave.jpg

Segundo Marc Jimenez (1999, p. 194), ao contrapor o mundo


intelig́vel e o mundo sens́vel, entre a razão, o conhecimento, o Logos
de um lado, e a sensibilidade, o prazer, o gozo, de outro, temos em
Platão a origem de todas as teorias losócas fundamentadas na ideia
(idealismo) e na razão (racionalismo).

CEDERJ 25
Tendências Contemporâneas no Ensino de Artes | Dimensão estética: a pluralidade das formas de
conhecimento

As formulações estéticas de Platão são derivadas dessa teoria


do conhecimento e se projetam em suas concepções pol́ticas. Para ele,
as artes de modo geral e particularmente as artes plásticas do per́odo
clássico grego, que se xaram na representação referencial do mundo,
são consideradas atividades inferiores e até danosas ao esp́rito e, por
isso, deveriam ser proscritas da cidade ideal concebida pelo lósofo
na obra A República.

ARISTÓTELES E O EMPIRISMO

Figura 2.3: Aristóteles.


Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/Aristotle

Disc́pulo rebelde de Platão, Aristóteles (384-322 a.C.) rejeita


a cisão de mundos formulada pelo mestre. Para ele, o conhecimento é
constru́do gradativamente a partir das impressões sensoriais até alcan-
çar a abstração das ideias. Embora considerada inferior aos processos
racionais da reexão, a imitação apresenta-se como um modo cognitivo
elementar, como uma forma natural e salutar de aprendizagem. Desse
modo, podem ser associadas a Aristóteles todas as teorias que relacionam
o conhecimento a observação do mundo emp́rico (empirismo).

26 CEDERJ
Para Aristóteles, a arte, como representação sens́vel do mundo,

2
mesmo não alcançando a verdade dos conceitos losócos, teria o mérito

AULA
de cumprir nalidades morais por meio da representação da diferença
entre o bem e o mal. Analisando as formas teatrais de seu tempo, Aristó-
teles argumenta que a epopeia representa estas relações entre o bem e o
mal de modo positivo, descrevendo os grandes fatos heroicos. Entretanto,
a arte pode educar também a partir de exemplos negativos, representando
o feio e o grotesco, como ocorre na comédia, ou purgando as paixões
extremadas por meio da catarse provocada pela tragédia.

Discutindo o conceito de catarse, Marc Jimenez (1997, p. 223) comenta


que a tragédia permite viver de forma ct́cia, de maneira inocente e
inofensiva para a pessoa e para a sociedade, paixões que, se fossem reais,
as colocariam em perigo. A catarse autorizaria então uma espécie de
desrecalque e desempenharia um papel de EXUTÓRIO. Na atualidade esse EXUTÓRIO
processo de catarse pode ser observado no grande envolvimento do públi-
co com as situações trágicas e também moralizantes das telenovelas. Termo que signica
despir, deixar de
lado, pôr para fora.

Em suma, relacionando o belo aos critérios da verdade e do bem,


os dois lósofos articulam projetos pol́ticos estabelecendo funções
morais e pedagógicas para a arte. Embora as considerações de Aristóteles
sobre as artes se apresentem como mais ex́veis e liberais que a postura
de censor da pólis assumida por Platão, Marc Jimenez (1999, p. 229)
adverte que Aristóteles partilha a mesma desconança de Platão diante
das obras de arte que desaam os limites do razoável, da razão, e tendem
a se afastar da verdade.
Nesse sentido, ambas

São losoas da separação que procuram todos os caminhos


poss́veis de uma reconciliação. Mas, quando o conseguem, é sem-
pre em proveito do mundo intelig́vel e em detrimento do mundo
sens́vel: os valores do esp́rito, da inteligência, da razão dominam
os valores sens́veis. Sem exagerar, poder́amos dizer que toda a
estética ocidental, da antiguidade até a modernidade, não cessa de
contar a história dessa separação. Sem dúvida ela conserva ainda
hoje suas seqüelas (JIMENEZ, 1999, p. 195).

CEDERJ 27
Tendências Contemporâneas no Ensino de Artes | Dimensão estética: a pluralidade das formas de
conhecimento

Essas considerações de Marc Jimenez respondem a nossa questão


sobre a diferença de prest́gio entre o ensino de Arte e o das linguagens
verbal e matemática, ligadas ao pensamento lógico e cient́co. Veremos
a seguir como alguns lósofos modernos e contemporâneos trataram
desta cisão, buscando conciliar esses diferentes aspectos da vida humana.

As imagens ilustram o desenvolvimento da arte grega da Antiguidade.


Notem que, na primeira escultura, a gura humana é representada de
modo frontal e r́gido (Per́odo Arcaico). Na segunda, a anatomia e o movi-
mento do corpo se tornam mais naturais, levando muitos historiadores
a armarem que tais esculturas se inam de vida. Denominado Per́odo
Clássico, foi nesta época da cultura grega que viveu Platão. A terceira
representa o Per́odo Helen́stico, caracterizado por obras marcadamente
emotivas e dramáticas.

a) b) c)

Figura 2.4: (a) Per́odo Arcaico. Kouros; (b) Per́odo Clássi-


co. Prax́teles, Afrodite; (c) Per́odo Helenista. Laocoonte e
seus lhos.
Fontes: (a) http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Apollo_of_Tenea_
Glyptothek_Munich_168.jpg; (b) http://pt.wikipedia.org/wiki/
Ficheiro:Aphrodite_Braschi_Glyptothek_Munich_258.jpg; (c)http://
pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Laocoon_Pio-Clementino_Inv1059-
1064-1067.jpg

28 CEDERJ
2
AULA
Atende aos Objetivos 1, 2 e 3

2. Posto que Platão considerasse que a arte não seria necessária na “cidade
ideal”, certamente não haveria o seu ensino na escola desta cidade. Aris-
tóteles, ao contrário, destacou certas funções educativas da arte. Que tipo
de atividades art́sticas você acha que seriam desenvolvidas numa escola
que seguisse os princ́pios desse lósofo?

RESPOSTA COMENTADA
Aristóteles argumenta que a arte colabora para a construção de
valores morais, ajudando-nos a distinguir o bem e o mal. É curioso
notar que, mesmo sem citar Aristóteles, essa concepção é ainda
muito difundida na atualidade. As atividades de artes na escola são
muito utilizadas para a celebração de datas comemorativas que
estimulam o amor e respeito ao próximo (Dia das Mães, do Índio,
da Consciência Negra), a identidade nacional (Dia da Independência
e da Bandeira), ou a discussão de temas relevantes à vida social
(ecologia, saúde, leis de trânsito, etc.) Sem dúvida, todas estas apli-
cações da arte são muito importantes, mas, conforme discutiremos
adiante, o ensino de arte não pode ser reduzido apenas a esses
momentos festivos e a estas funções morais.

CEDERJ 29
Tendências Contemporâneas no Ensino de Artes | Dimensão estética: a pluralidade das formas de
conhecimento

KANT E O CONCEITO DE IMAGINAÇÃO

Figura 2.5: Immanuel Kant.


Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/
File:Immanuel_Kant_(painted_portrait).jpg

Kant postula que a experiência do real resulta da necessária


conjugação de duas fontes de conhecimento: a sensibilidade, pela qual
percebemos ou intuimos as coisas, e o entendimento, relativo a for-
mulação dos conceitos. Porém, ele não elabora uma teoria empirista a
partir desta conexão entre sensibilidade e entendimento, mas sim um
idealismo transcendental, modo como a sua losoa é normalmente
classicada.
Para explicar sua teoria do conhecimento, Kant toma como exem-
plo a lei gravitacional, desenvolvida por Newton, importante cientista de
seu tempo. Ele argumenta que, embora possa estar ligada a experiência
sensorial como, por exemplo, a queda de uma maçã, a lei gravitacional
não depende dessa experiência para ser elaborada, pois, caso dependesse,
seria um conhecimento tácito, acess́vel a qualquer pessoa. Em outras
palavras, Kant busca explicar que a hipótese cient́ca é um a priori, isto
é, uma ideia pura, algo novo e inaugural, que a mente intui a partir do
fenômeno e nele projeta como pura teoria, permitindo assim a elaboração
de novos conceitos sobre a realidade.
Para explicar esse processo de descoberta, Kant irá desenvolver o
conceito de Imaginação. Nunes (1991, p. 51) comenta que:

Na acepção kantiana a imaginação é a faculdade intermediária,


que liga as intuições da Sensibilidade aos conceitos do Enten-

30 CEDERJ
dimento. Mas esta ligação pode ser feita de duas maneiras: ou

2
subordinando as intuições aos conceitos, e nesse caso temos o

AULA
conhecimento objetivo, ou apenas relacionando-os funcionalmen-
te entre si, caso em que temos o prazer estético.

Nota-se que, por meio do caráter intermediário da imaginação,


Kant estabeleceu uma ponte entre os territórios da razão e da sensibili-
dade, separados desde a Antiguidade. A importância cognitiva da sensi-
bilidade não é negada por ele, como fora por Platão e pelos racionalistas,
nem tampouco é tomada como uma forma de conhecimento elementar, O Dicionário Ele-
trônico Houaiss
como fora concebida por Aristóteles e pelos empiristas. (HOUAISS, 2009)
traz os seguintes
Ao contrário, a sensibilidade e a imaginação, antes sempre rela- verbetes para o termo
ESTÉTICA.
cionadas a s artes, aos del́rios e a s ilusões, assumem nas formulações de
Parte da losoa vol-
Kant um papel fundamental para explicar a possibilidade de elaboração tada para a reexão
a respeito da beleza
do conhecimento cient́co. sens́vel e do fenôme-
no art́stico.
Por meio da dimensão estética da imaginação (aquela segunda Veja as diversas de-
maneira descrita por Nunes), Kant também explica a possibilidade de o nições para o termo.
1.1 Rubrica: losoa.
esp́rito formular as complexas ideias metaf́sicas, tais como as noções segundo o criador
do termo, o lósofo
de Deus, liberdade e nalidade, que tal como a arte são representações alemão Alexander
da imaginação irredut́veis a conceitos (NUNES, 1991, p. 53). Baumgarten (1714-
1762), ciência das
Essas ideias de Kant serão decisivas para o desenvolvimento da faculdades sensitivas
humanas, investiga-
ESTÉTICA romântica e a consideração da arte como uma forma particular das em sua função
cognitiva particular,
e especial de construção do conhecimento.
cuja perfeição con-
siste na captação da
beleza e das formas
art́sticas
1.2 Rubrica: losoa.
no kantismo, estudo
dos ju́zos por meio
dos quais os seres
humanos armam
que determinado
objeto art́stico ou
natural desperta
universalmente um
sentimento de beleza
ou sublimidade
1.3 Rubrica: losoa.
no hegelianismo,
estudo da beleza
art́stica, que apre-
senta em imagens
sensoriais, ou repre-
sentações sens́veis, a
verdade do esp́rito,
do princ́pio divino,
ou da ideia.

CEDERJ 31
Tendências Contemporâneas no Ensino de Artes | Dimensão estética: a pluralidade das formas de
conhecimento

ATIVIDADE

Atende aos Objetivos 1, 2 e 3

3. Tendo em vista o conceito de Imaginação desenvolvido por Kant, qual


seria o papel do ensino de arte numa escola que adotasse as ideias desse
lósofo?

RESPOSTA COMENTADA
Com certeza a arte teria um papel bem distinto das funções morais
atribu´das por Aristóteles. É poss´vel que ela fosse muito valorizada,
exatamente porque desenvolve a imaginação e a criatividade,
faculdades cognitivas necessárias tanto ao desenvolvimento da
própria arte, quanto da ciência. Veremos na próxima aula que foi
essa convicção que norteou a valorização da arte na escola por John
Dewey, lósofo fundador da Escola Nova.
De todo modo, para Kant, a experiência estética tem uma nalidade
em si mesma, independente de qualquer outra função, que é o ju´zo
de gosto, permitindo-nos na apreciação da natureza, da arte e de
todas as coisas que nos cercam a distinção entre o belo e o feio.
Sem dúvida a beleza é uma fonte de prazer important´ssima em
nossas vidas. Mesmo que a beleza não seja nosso único e principal
critério, ela geralmente orienta nossas escolhas. Entre dois pares
de sapatos do mesmo preço, por exemplo, certamente irei comprar
aquele que me parece o mais bonito.
No entanto, veremos que além de contribuir para a formação moral,
conforme salientou Aristóteles, estimular o desenvolvimento cognitivo
e o prazer do sentimento do belo, aspectos salientados por Kant, a
dimensão estética da arte pode cumprir ainda outras importantes
funções na educação.

32 CEDERJ
ILUMINISMO E ROMANTISMO: O PARADOXO ENTRE

2
RAZÃO E SENSIBILIDADE

AULA
Nada mais exemplar da profunda oposição entre razão e sen-
sibilidade na cultura ocidental do que os dois movimentos culturais
surgidos no século XVIII: o Iluminismo e o Romantismo. Ambos são
movimentos de oposição a ordem aristocrática do absolutismo, repre-
sentando os anseios liberais da burguesia e da classe média emergente.
Porém, elaboram estratégias diametralmente opostas para expressar seu
esp́rito revolucionário.
Os iluministas resgatam os valores da Antiguidade grega: sua
estrutura pol́tica baseada no poder representativo do Senado; o
caráter secular de seus deuses, que expressam as paixões humanas; a
importância do conhecimento racional e sistemático, elaborados por
seus lósofos e geômetras, como o meio de promover a emancipação
humana. Os enciclopedistas, ligados a esse movimento, tiveram um
papel decisivo no desenvolvimento da Revolução Francesa (1789),
inuenciando outros movimentos republicanos na Europa, nos Estados
Unidos e também no Brasil.

(a) (b)

Figura 2.6: Os enciclopedistas (a) Denis Diderot (1713-784); (b)


Jean-Jacques Rousseau (1712-1778).
Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/File:Louis-Michel_van_Loo_001.
jpg; http://en.wikipedia.org/wiki/File:Jean-Jacques_Rousseau_(pain-
ted_portrait).jpg

CEDERJ 33
Tendências Contemporâneas no Ensino de Artes | Dimensão estética: a pluralidade das formas de
conhecimento

No entanto, a almejada liberdade, igualdade e fraternidade,


lema utópico dos iluministas, logo se frustra, especialmente com o
desenrolar da Revolução Industrial no século XIX. Quando consagraram
o poder da burguesia, que controlava a indústria e o comércio, estas
transformações pol́ticas e econômicas também criaram uma enorme
massa proletária, destitu́das de direitos, mal remunerada, submetendo
inclusive crianças a extenuantes jornadas de trabalho.

Figura 2.7: Mão de obra infantil.


Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Trabalho_infantil

34 CEDERJ
ATIVIDADE

2
AULA
Atende aos Objetivos 1, 2 e 3

4. A imagem anterior representa o trabalho infantil nas fábricas do século


XIX . Aliado ao estudo da História, da Geograa e da Sociologia, o ensino
de Arte também contribui para a discussão dos problemas sociais, pois
além de ser um documento histórico, que revela a cultura dos diferentes
locais e épocas, a arte é sempre uma forma de expressão atual, utilizada
por muitos artistas para incitar a reexão cr́tica sobre a sua realidade.
Cite, a seguir, alguns exemplos ligados a qualquer forma art́stica (lite-
ratura, teatro, música, artes visuais) que tenham esse perl de cr́tica
pol́tica e social.

RESPOSTA COMENTADA
Os exemplos desse tipo de aplicação das artes são muito frequentes
e variados, particularmente nas práticas art´sticas que envolvem o
uso da linguagem verbal, caso da literatura e do texto teatral. No
campo da música, por exemplo, o caráter narrativo do funk é muito
apreciado pelos alunos como meio de discutir problemas sociais
e também questões ligadas à vida do jovem contemporâneo. No
âmbito das artes visuais, tornou-se muito frequente a utilização de
“sucatas”, isto é, a reciclagem art´stica de materiais descartáveis
como meio de denunciar o consumismo e os problemas ecológicos
do mundo atual.

Dissidente do c́rculo dos enciclopedistas, Rousseau percebeu


muito precocemente essas contradições. Ele nega o modelo clássico de
sociedade, baseado na Antiguidade grega e na Renascença, que inspirava
os iluministas. Evocando o bucolismo de uma Idade Média idealizada,
Rousseau propôs o retorno a uma vida simples e natural. Sua tese fun-
damental é a de que o homem nasce bom e a sociedade é que o corrom-
pe. Isto é, a sociedade calcada na desigualdade, espoliando a maioria
em favor dos privilégios de uma minoria. Suas ideias, assim como sua
conduta livre e rebelde, inuenciaram o movimento romântico na arte

CEDERJ 35
Tendências Contemporâneas no Ensino de Artes | Dimensão estética: a pluralidade das formas de
conhecimento

de sua época e posteriores movimentos culturais como, por exemplo, o


movimento hippie de meados do século XX.
Os lósofos românticos também são considerados os primeiros
autores ligados a s concepções humanistas de educação, caso da obra
Em́lio (1762) do próprio Rousseau e de Cartas sobre a educação esté-
tica do homem (1794/95) de Schiller, per́odo em que Pestalozzi também
elaborou suas teorias educacionais.

(a) (b)

O Dicionário Eletrô-
nico Houaiss (HOU-
AISS, 2009) traz o
seguinte verbete para
o termo N I I L I S M O :
1. redução ao nada;
aniquilamento; não
existência;
2. ponto de vista Figura 2.8: (a) Friedrich Schiller (1759-1805); (b) Friedrich Nietzsche
que considera que as (1884-1900).
crenças e os valores Fontes: http://en.wikipedia.org/wiki/File:Friedrich_schiller.jpg; http://
tradicionais são en.wikipedia.org/wiki/File:Portrait_of_Friedrich_Nietzsche.jpg
infundados e que
não há qualquer sen-
tido ou utilidade na
existência;
3. total e absoluto
esp́rito destruti- Nas suas Cartas, Schiller preconiza que, por meio da educação
vo, em relação ao estética, a liberdade que a arte propicia poderia estender-se para os
mundo circundante e
ao próprio eu; dom́nios das relações sociais e morais, promovendo o surgimento de um
4. rubrica: losoa.
no nietzschianismo, Estado ideal, no qual o estético e o moral se confundem. Porém, em
negação, decl́nio
sua sexta carta, ele já acusa a suspeita, muito recorrente na atualidade,
ou recusa, em curso
na história humana de que o otimismo utópico desta estetização da pol́tica, que busca fundir
e especialmente na
modernidade ociden- a arte a vida, esbarra nas condições adversas da educação do homem
tal, de crenças e con-
vicções – com seus
moderno, baseada na fragmentação e utilitarismo das ciências.
respectivos valores Se, para Schiller, tais condições se apresentam como uma adver-
morais, estéticos
ou pol́ticos – que sidade, possivelmente superável pela educação estética, para Nietzsche,
ofereçam um sentido
consistente e positivo os vieses da modernidade são insuperáveis. Antiluzes, antiutopias,
para a experiência antimoral, antirreligião, Nietzsche, em seu N I I L I S M O radical, também faz
imediata da vida.
considerações sobre a educação e a estetização do cotidiano. Quanto

36 CEDERJ
a educação, tece cr́ticas que ainda permanecem atuais. Recrimina a

2
reprodução mecânica e enfadonha dos clássicos gregos nas escolas em

AULA
detrimento de uma formação pautada nas questões fundamentais da
vida. Sobre a estetização do cotidiano, Nunes (1991, p. 67) sintetiza
que para Nietzsche as artes

Surgem da própria vida, e o conhecimento que alcançamos por


intermédio delas, irredut́vel ao pensamento lógico e conceptual,
é mais uma resposta do homem ao caráter pavoroso e proble-
mático da existência, para justicar, como fenômeno estético,
a realidade que, em si mesma, é irracional e destitu́da de valor.

ATIVIDADE

Atende aos Objetivos 1, 2 e 3

5. Nas atividades anteriores, perguntamos como você imaginava que seria


uma escola baseada nas ideias dos lósofos em discussão. Você acha que é
poss́vel se ter uma escola baseada nos princ́pios niilistas de Nietzsche?
Justique.

RESPOSTA COMENTADA
Realmente, é dif´cil imaginar uma escola que se dena como “niilista”,
pois a educação pressupõe esperança, conança nos valores e conhe-
cimentos que transmite, seja no sentido de manter uma tradição, ou
de transformá-la para melhor.
No entanto, todos nós temos nossos momentos niilistas, nos quais
nada parece fazer sentido. É comum nessas horas nos isolarmos
do mundo para ouvir uma música, contemplar uma paisagem, ou
mesmo para escrever um poema, só para desabafar. Portanto,
além da percepção da beleza, a arte tem esse poder de expressar
o sublime, de comunicar sentimentos incomunicáveis nas formas
cotidianas da linguagem, de modo que o ensino de Arte cumpre
também esse importante papel de permitir a elaboração e expressão
de conteúdos emocionais.

CEDERJ 37
Tendências Contemporâneas no Ensino de Artes | Dimensão estética: a pluralidade das formas de
conhecimento

Contudo, veremos na próxima aula que a realização desse potencial


expressivo da arte não ocorre de modo automático e espontâneo. Ao
contrário, exige um processo de aprendizagem, de “alfabetização”
nas linguagens art´sticas.

Iniciamos esta aula comentando a conança de Hegel na evolução


histórica da consciência humana rumo ao Absoluto. Além de Nietzsche,
outros dois importantes pensadores de nais do século XIX irão contestar
esse poderes da Razão e da Consciência: Marx e Freud.
Marx desenvolveu o conceito pol́tico de ideologia, denido
como falsa consciência. Isto é, como valores do interesse das classes
dominantes que são difundidos culturalmente na sociedade como sendo
do interesse de todos, promovendo, desse modo, a aceitação das desi-
gualdades sociais como algo necessário ou natural.
Freud, por sua vez, discute na teoria psicanal́tica os limites da
consciência humana, denominada ego. Segundo ele, nosso modo de ser e
agir é largamente inuenciado por dois tipos de conteúdos inconscientes
de natureza antagônicas. De um lado, os conteúdos do id, relacionados
aos nossos impulsos vitais, tais como o instinto sexual e de sobrevivência.
Do outro lado estaria o superego, que representa a pressão dos valores e
regras culturais, conteúdos inconscientes que em larga medida coincidem
com o conceito de ideologia, desenvolvido por Marx.

(a) (b) (c) (d)

Figura 2.9: (a) Nicolau Copérnico (1473-1543); (b) Charles Darwin (1809-1882); (c) Karl Marx (1818-1883); (d)
Sigmund Freud (1858-1939).
Fontes: (a) http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Copernicus.jpg; (b) http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Copernicus.jpg; (c)
http://en.wikipedia.org/wiki/File:Karl_Marx_001.jpg; (d) http://en.wikipedia.org/wiki/File:Sigmund_Freud_LIFE.jpg

38 CEDERJ
Aliás, Freud foi um homem absolutamente cético (ou niilista?)

2
sobre os des́gnios superiores da humanidade. Segundo ele (CHAUÍ,

AULA
1997), o narcisismo do homem moderno foi ferido três vezes por
postulados da ciência: o de Copérnico, revelando que a Terra não é o
centro do universo; o de Darwin, sobre sermos descendentes de primatas;
e, por m, a própria teoria psicanal́tica, que apresenta a consciência
humana irremediavelmente cindida pelos impulsos antagônicos do
inconsciente.

CONCLUSÃO

O contexto pós-moderno sob as tensões da tradição

Os lósofos Lyotard e Habermas (1929-) são os grandes protago-


nistas das controvérsias sobre a discussão do contexto contemporâneo.
Suas teorias reapresentam o paradoxo entre razão e sensibilidade, geran-
do, novamente, a emergência de várias teorias divergentes.

(a) (b) (c)

Figura 2.10: (a) Jean-François Lyotard (1924-1998); (b) Jürgen Habermas (1929-); (c) Marshall McLuhan
(1911-1980).
Fontes: http://en.wikipedia.org/wiki/File:Jean-Francois_Lyotard_cropped.jpg; http://en.wikipedia.org/wiki/
File:JuergenHabermas.jpg; http://en.wikipedia.org/wiki/File:MarshallMcLuhan.png

CEDERJ 39
Tendências Contemporâneas no Ensino de Artes | Dimensão estética: a pluralidade das formas de
conhecimento

Conforme discutimos brevemente no in́cio desta aula, Lyotard questio-


na o caráter emancipatório da razão, apresentando a crença na ciência
que o Iluminismo nos legou como uma narrativa totalizante e coerci-
tiva. Habermas, ao contrário, postula que o projeto iluminista está ina-
cabado e deve ser conclu́do por meio do desenvolvimento de uma nova
razão baseada no esp́rito cr́tico e no agir comunicativo.
Habermas condena, principalmente, a dimensão instrumental
que a razão adquiriu no século XX, reduzida a ser apenas um meio para se
alcançarem ns determinados. Fins estes que, geralmente, privilegiam
os interesses pol́ticos e econômicos em detrimento do homem.
De fato, Habermas é um continuador da Escola de Frankfurt,
também denominada Escola Cr́tica. Os pensadores dessa tendência
(Adorno, Horkheimer, Walter Benjamin e Marcuse) zeram uma revisão
do marxismo, particularmente sobre a análise do desenvolvimento da
sociedade de consumo e da indústria cultural. Além de contribu́rem de
forma signicativa para o debate da estética no século XX, esses teóricos
anteviram algumas das principais questões do mundo contemporâneo
fazendo, também, prognósticos niilistas. Estão relacionadas a esses
teóricos as primeiras discussões sobre alguns efeitos nocivos do amplo
desenvolvimento dos meios de comunicação, tais como a massicação,
a perda de identidade e a banalização dos valores culturais.
Em contrapartida, alguns teóricos manifestam franco otimismo
diante dos progressos da ciência e da técnica, caso especial de McLuhan.
Conforme comentamos na aula anterior, diante apenas do desenvol-
vimento da televisão na década de 1960 ele anteviu o fenômeno da
globalização, armando que o mundo se transformaria numa imensa
aldeia global. Aliás, McLuhan já discutia nesta época o importante
e positivo impacto que as novas tecnologias teriam sobre a Educação,
inuenciando o atual debate sobre esse assunto.

40 CEDERJ
ATIVIDADE FINAL

2
Atende aos Objetivos 1, 2 e 3

AULA
E voce , o que acha dessas diferentes perspectivas (ora pessimistas, ora otimistas)
sobre o impacto das tecnologias da comunicação no mundo atual?

RESPOSTA COMENTADA
Decerto, a nossa participação neste curso de Educação a Distância revela que
compartilhamos do otimismo de McLuhan. Contudo, isso não signica que iremos
perder de vista a importância do crivo cr´tico das demais ideias aqui discutidas. Em
suma, o objetivo desta aula é exatamente esse, o de fundamentar historicamente
e suscitar discussões sobre a pluralidade de ideias que envolvem a compreensão
da importância do conhecimento, da Educação e do ensino de Arte no contexto
cultural contemporâneo.

RESUMO

A partir da análise das relações entre a experie ncia estética e a atividade racional,
podemos confrontar a opinião de diversos lósofos sobre a arte. Destacamos as
objeções de Platão ao caráter ilusório, ou mesmo corruptor, das impressões sens́-
veis e suas representações por meio da arte. Aristóteles toma a arte como ve́culo
de difusão de valores morais. Para Kant, diferentemente, o sentimento de beleza
que derivamos da natureza e da arte é algo livre, desinteressado e irredut́vel a
conceitos. Kant também destaca a importa ncia cognitiva da imaginação, faculdade
necessária tanto ao desenvolvimento da arte, quanto da cie ncia. A estética roma n-
tica, por sua vez, atribui a arte um papel contestador, ora como cr́tica social, ora
como manifestação das angústias dos seres humanos frente ao seu mundo. Estes
dois aspectos – social e psicológico – foram aprofundados respectivamente por
Marx, ao desenvolver o conceito de ideologia, e por Freud, por meio do conceito
de inconsciente.

CEDERJ 41
Tendências Contemporâneas no Ensino de Artes | Dimensão estética: a pluralidade das formas de
conhecimento

Por m, observe algumas concepções divergentes sobre o contexto contempora neo.
Habermas defende a importa ncia de se continuar perseguindo o desenvolvimento
da razão cr́tica. Lyotard contesta que tal projeto caracter́stico da modernidade
deve ser superado por uma perspectiva pós-moderna, que contemple a plurali-
dade dos modos de sentir, viver e narrar a realidade. No entanto, por diferentes
razões, ambos guardam certo pessimismo sobre o mundo contempora neo, marcado
pelo desenvolvimento técnico e cient́co, aspecto que, ao contrário, entusiasma
McLuhan e seus seguidores atuais.

INFORMAÇÃO SOBRE A PRÓXIMA AULA

Por meio das atividades propostas nesta aula, buscamos demonstrar como as
diversas concepções losócas discutidas afetam o nosso modo de pensar e realizar
o ensino de Arte. Aprofundaremos essa discussão na próxima aula, dedicada a
discussão da dimensão cultural da arte, de suma importa ncia na escolha do que
ensinamos nas aulas de Arte.

42 CEDERJ
Dimensão educacional: a plurali-

AULA
dade das correntes pedagógicas
Terezinha Losada

Meta da aula
Apresentar uma revisão histórica das principais ten-
dências pedagógicas do ensino de arte no Brasil.
objetivos

Esperamos que, ao nal desta aula, você seja


capaz de:
1. identicar os fundamentos históricos e
losócos das diversas tendências educacionais
para o ensino de arte;
2. reconhecer suas principais características,
potencialidades e limites pedagógicos;
3. contextualizar, de modo crítico e criativo, esse
repertório de conhecimentos pedagógicos
acumulados ao longo da história no
desenvolvimento de sua prática docente.
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Dimensão educacional: a pluralidade das cor-
rentes pedagógicas

INTRODUÇÃO Várias disciplinas do curr́culo de nosso curso envolvem a discussão das


principais correntes pedagógicas, analisando seus fundamentos losócos,
pol́ticos e metodológicos. Nesta aula, retomaremos este assunto para discu-
tir especicamente como o ensino de arte é considerado por estas diversas
correntes do pensamento educacional.
Para isso, iremos resgatar muitas das discussões realizadas nas duas aulas
anteriores. Na primeira, foi abordado o caráter transversal das linguagens,
devido a suas funções instrumentais na elaboração de todo tipo de conhe-
cimento: cotidiano, técnico, cient́co e também art́stico. Na segunda aula,
discutimos as ideias de diversos lósofos sobre a importância da experiência
estética (sensorial) e art́stica na construção do conhecimento. Nela, buscamos
apresentar a arte como uma forma particular de elaboração do conhecimento,
ao lado de outros modos narrativos como os elaborados pela religião, pela
losoa e pelas ciências.

Nesta aula, utilizaremos como fonte bibliográca de consulta


o documento do MEC denominado Orientações Curricula-
res para o Ensino Médio, publicado em 2006. No seu item
Revisão Histórica é apresentada uma s́ntese das principais
concepções e práticas educacionais ligadas a s várias correntes
pedagógicas.
Fonte: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/book_volume_01_internet.
pdf

PEDAGOGIA TRADICIONAL

Na aula anterior, comentamos que Platão considerou a arte uma


atividade corruptora, que nos afasta da verdade e da boa conduta. Em
larga medida, podemos associar suas concepções idealistas ao intelec-
tualismo da Pedagogia Tradicional, que toma a escola como o espaço
para a pura transmissão de conhecimentos.
Numa analogia ao mito da caverna, podemos dizer que, nesta con-
cepção educacional, a escola representa a luz do mundo das ideias. Território
onde são cultivadas e transmitidas as verdades, neste caso, a transmissão
das verdades cient́cas, posto que o estudo da Filosoa foi largamente
abandonado nas últimas décadas, voltando para a estrutura curricular da
educação brasileira recentemente, por meio da Lei no 11.684/2008, que
prevê o ensino de Filosoa e Sociologia no Ensino Médio.

44 CEDERJ
Já a caverna, com todas as suas sombras ilusórias e fantasmagó-

3
AULA
ricas, representaria as impressões, sentimentos e experiências ligadas a
realidade concreta do aluno. Aspectos estes normalmente desqualicados
ou mesmo reprimidos pela educação tradicional como conhecimento de
senso-comum, isto é, um conhecimento vulgar, ligado a crendices, aos
nossos afetos e temores, sem o crivo sistemático dos métodos cient́cos
de aferição da verdade.
Esta mesma metáfora do mito da caverna é válida para associar as
concepções da Pedagogia Tradicional ao movimento losóco iluminista
do século XVIII. Pois esta corrente losóca prioriza o conhecimento
positivo ou objetivo, ligado a razão e a ciência, como o meio de se
alcançar a Verdade sobre as coisas do mundo e a Liberdade dos seres
humanos, lemas da Revolução Francesa.
Por outro lado, podemos também relacionar a Pedagogia Tradicio-
nal a algumas ideias de Aristóteles. Pois, conforme vimos anteriormente,
ele desenvolveu a noção de que as artes cumprem funções pedagógicas
moralizantes e civilizatórias, seja de modo edicante, caso da epopeia,
ou então quando representam aspectos negativos da realidade por meio
da comédia ou da tragédia.

Johann Friedrich Herbart (1776-1841)


Filósofo alemão, Herbart é considerado o pri-
meiro pensador a organizar o campo da Peda-
gogia como uma cie ncia sistemática. Ele negava
a existe ncia de faculdades inatas, tomando a
educação como o meio de moldar a formação
mental das crianças. Sua teoria destaca tre s
procedimentos educativos básicos: o governo,
exercido em casa pelos pais e na escola pelo
professor com o objetivo de manter a ordem,
controlando o comportamento impulsivo da
criança; a instrução propriamente dita, que
Fonte: http://en.wikipedia. deve por diversos meios despertar o interesse do
org/wiki/Johann_Friedri- aluno; e, por m, a disciplina, que se distingue
ch_Herbart do governo por se relacionar ao desenvolvimen-
to da autodeterminação do aluno.
Qualicados como Pedagogia Tradicional, tais pressupostos serão poste-
riormente questionados por John Dewey e teóricos da Escola Nova, que
salientam especialmente o papel passivo do aluno nesse modelo, frente a
autoridade do professor e das formas estabelecidas de conhecimento.

CEDERJ 45
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Dimensão educacional: a pluralidade das cor-
rentes pedagógicas

ATIVIDADE

Atende aos Objetivos 1 e 2

1. Pesquise o item “Revisão Histórica” do texto Orientações Curriculares


para o Ensino Médio – Arte (BRASIL, 2006) e cite os tipos de atividades
art́sticas desenvolvidas na escola pela Pedagogia Tradicional.
Em seguida, faça um breve comentário sobre as relações dessa tendência
com as ideias de Herbart, apresentadas no boxe anterior, e dos lósofos
Platão e Aristóteles, dicutidos na Aula 2.

Atividades de Música:

Atividades de Artes Cênicas e Dança:

Atividades de Artes Visuais:

Comentário:

RESPOSTA COMENTADA
Você deve ter notado que as concepções de Herbart e da Pedagogia
Tradicional conciliam aspectos poss´veis de serem relacionados tanto
às ideias de Platão como às de Aristóteles. A marca intelectualista ou
idealista de Platão pode ser observada no ensino de música, quando
este enfatiza a estrita transmissão do código musical e também na
utilização do desenho geométrico como meio para desenvolver o
pensamento lógico-matemático.
Em contrapartida, estão mais próximas das ideias de Aristóteles
as derivações instrumentais que tomam o ensino de linguagem
como meio de favorecer a formação moral e c´vica dos alunos, tais
como: o canto orfeônico (hinos), as peças celebratórias de teatro e

46 CEDERJ
3
a concepção higienista do corpo adotada nas aulas de

AULA
Educação F´sica. É interessante notar também que a
ênfase instrucional do ensino de arte na Pedagogia Tradi-
cional seguia distinções de classe social e de gênero. Aos
meninos das escolas de elite era privilegiado o ensino da
Geometria, com o objetivo de desenvolver o pensamento
abstrato; para os das classes populares era enfatizada a
formação para o trabalho, por meio das escolas de artes e
of´cios. Seguindo a mesma lógica, as escolas femininas de
elite ensinavam “prendas domésticas”, visando à formação
das futuras esposas e mães e, por outro lado, ensinavam
atividades art´sticas ligadas ao magistério, para as moças
que ingressariam nessa carreira de trabalho.

NOVA ESCOLA

Figura 3.1: John Dewey (1859-1952) e An́sio Teixeira (1900-1971).


Fontes: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:John_Dewey_lib.jpg;
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:An%C3%ADsioTeixeira.jpg

Os princ́pios da Escola Nova são uma reação a Pedagogia Tradi-


cional em favor de uma escola mais investigativa, reexiva e participativa.
Este movimento foi iniciado pelo lósofo norte-americano John Dewey,
sendo An́sio Teixeira (Figura 3.1) um dos principais difusores dessas
ideias no Brasil. As diferenças entre essas duas correntes pedagógicas
foram sintetizadas pelo educador Demerval Saviani (1997) em sete pares
de princ́pios opostos (ver quadro).

CEDERJ 47
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Dimensão educacional: a pluralidade das cor-
rentes pedagógicas

Quadro 3.1: Diferenças entre as correntes pedagógicas

ÊNFASES DA PEDAGOGIA TRADICIONAL ÊNFASES DA PEDAGOGIA


NOVA
Conhecimento Sentimento
Lógico Psicológico
Conteúdo Métodos e processos
Professor Aluno
Esforço Interesse
Disciplina Espontaneidade
Inspiração losóca Inspiração experimental

Esta renovação do pensamento educacional está relacionada ao


contexto cultural do in́cio do século XX, marcado pela industrializa-
ção e urbanização, momento em que também ocorre a Semana de Arte
Moderna de 1922, realizada em São Paulo. A partir de então, as intensas
experimentações sobre os novos estilos art́sticos em voga na Europa se
aliam ao interesse em representar as caracter́sticas da cultura brasileira,
como ocorre nas obras de Tarsila do Amaral, e posteriormente de Di
Cavalcanti e Portinari (Figura 3.2), entre outros artistas.

Figura 3.2: Obra de Ca ndido Portinari (1903-


1962).
Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/File:Discovery_
of_the_Land1.jpg

48 CEDERJ
Resgatando as discussões da Aula 2, pode-se derivar dos princ́-

3
AULA
pios da Escola Nova algumas relações com os pressupostos cognitivos
de Kant. Pois os educadores escolanovistas destacam a importância da
arte na escola para desenvolver a imaginação e a criatividade, estimu-
lando o desenvolvimento das capacidades de levantar hipóteses sobre a
realidade e testá-las na solução de problemas. E, conforme discutimos,
para Kant a Imaginação, geralmente ligada apenas a s artes, é também
fundamental para o desenvolvimento das ciências.
Também podemos relacionar a valorização do ensino de arte no movi-
mento escolanovista ás ideias de Nietzsche, Freud e a s posteriores formulações
de Lyotard, posto que todos eles consideram a arte como uma forma particular
e especial de conhecimento válida em si mesma, que nos permite lidar com
conteúdos emocionais, imposs́veis de serem elaborados pela lógica racional.
Baseada nestes princ́pios românticos, a tônica do ensino de arte
nesta vertente é a experimentação e a livre expressão. A interferência
do professor neste processo é normalmente vista como algo negativo,
que afeta a liberdade e a espontaneidade da criança. Apesar das grandes
contribuições dessa corrente pedagógica, este aspecto será redimensiona-
do nas atuais propostas metodológicas para o ensino de arte, conforme
veremos adiante.

Dra. Nise da Silveira


Direcionada para a Educação Infantil e
para a formação de professores de arte, a
Escolinha de Arte Brasil (EAB) foi o grande
centro de difusão das concepções escola-
novistas no Brasil, envolvendo importantes
educadores como Augusto Rodrigues,
Noemia Varela, Lucia Valentim e Marga-
reth Spencer. A livre expressão art́stica
Fonte: http://pt.wikipedia.org/ foi também a estratégia revolucionária
wiki/Ficheiro:Art0902.jpg desenvolvida pela Dra. Nise da Silveira
(1905-1999) no tratamento psiquiátrico.
Radicalmente contrária a agressividade dos métodos terape uticos tradicio-
nais (eletrochoque, lobotomia), ela adota a experie ncia estética como meio
de humanizar o tratamento das doenças mentais, tendo suas pesquisas e
atividades cl́nicas reconhecidas mundialmente (Arte Terapia, Terapia Ocupa-
cional). Além da importa ncia terapeutica, o Museu Imagens do Inconsciente,
inaugurado por ela em 1952, revelou também talentos art́sticos como, por
exemplo, Arthur Bispo do Rosário, hoje consagrado como uma refere ncia
da arte brasileira.
Visite os sites do boxe multim́dia a seguir sobre essas importantes iniciativas.

CEDERJ 49
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Dimensão educacional: a pluralidade das cor-
rentes pedagógicas

Museu Imagens do Inconsciente:


http://www.museuimagensdoinconsciente.org.br/
Escolinha de Arte do Brasil – EAB
http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/
index.cfm?fuseaction=marcos_texto&cd_verbete=3757&cd_
item=10&cd_idioma=28555
http://www.educacaopublica.rj.gov.br/biblioteca/educa-
cao/0069_09.html

ATIVIDADE

Atende aos Objetivos 2 e 3

2. Ao tratar da Escola Nova, o item “Revisão Histórica” do texto Orientações


Curriculares para o Ensino Médio – Arte (BRASIL, 2006) cita importantes
educadores ligados a essa corrente.
Leia novamente o texto no site indicado no boxe multim́dia da Introdução
desta aula.
Escolha no texto um educador da área de Música e pesquise na internet
maiores informações sobre a sua proposta de ensino, descrevendo, a seguir.

RESPOSTA COMENTADA
As propostas de educação musical relacionadas à Escola Nova
ainda hoje são muito difundidas. Elas guardam em comum certos
princ´pios, tais como a exploração dos movimentos r´tmicos do corpo
e a improvisação musical a partir de melodias populares, da fala
cotidiana, dos sons do ambiente e do uso de instrumentos simples
de percussão.

50 CEDERJ
CONSTRUTIVISMO E SOCIOCONSTRUTIVISMO

3
AULA
O empirismo é o principal aspecto da teoria do conhecimento
de Aristóteles. Para ele a experiência sensorial e concreta que temos do
mundo e sua representação pelas formas art́sticas ajudam o paulatino
desenvolvimento do pensamento abstrato. No âmbito das teorias edu-
cacionais, esta ênfase na experimentação como meio para a construção
do conhecimento é normalmente identicada como construtivismo. Os
métodos educacionais desenvolvidos por Pestalozzi (1746-1827) e Mon-
tessori (1870-1952), entre outros importantes educadores, são baseados
neste princ́pio empirista. Todos destacam a importância da utilização
de jogos e atividades operatórias para promover o desenvolvimento cog-
nitivo da criança. A maioria dessas atividades envolve o caráter lúdico
das linguagens art́sticas, valorizadas nesta corrente por cumprirem essa
função instrumental, relacionada ao desenvolvimento cognitivo.
Piaget (1896-1980) formalizou teoricamente essa concepção
identicando fases progressivas do desenvolvimento cognitivo infantil:
sensóriomotor (0 a 2 anos), pré-operacional (3 a 6 anos), operações
concretas (7 a 11 anos) e nalmente operações formais (12 em diante),
fase marcada pelo amplo dom́nio do pensamento abstrato.
Vygotsky, por seu turno, irá contestar esse caráter linear e uni-
versal do desenvolvimento infantil proposto por Piaget, argumentando
sobre a importância dos fatores socioculturais nesse processo, tendência
denominada socioconstrutivismo. De grande importância nesse sentido,
é seu conceito de zona proximal de aprendizagem, que prevê uma postura
ativa do professor no sentido de criar situações de aprendizagem que
favoreçam o desenvolvimento cognitivo da criança.

Figura 3.3: Jean Piaget (1896-1980), Lev Vygotsky (1896-1934) e Paulo Freire
(1921-1997).
Fontes: http://en.wikipedia.org/wiki/Jean_Piaget; http://es.wikipedia.org/wiki/Lev_
Vygotski; http://en.wikipedia.org/wiki/Paulo_Freire

CEDERJ 51
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Dimensão educacional: a pluralidade das cor-
rentes pedagógicas

As ideias marxistas também promoveram um grande impacto nas


teorias educacionais. Alguns teóricos denominados cr́tico-reprodutivistas
passam a ver a escola como sendo inexoravelmente um aparelho ideo-
lógico do Estado. Numa perspectiva niilista (veja o verbete na Aula 2),
para estes, a escola apenas perpetua as diferenças sociais. No sentido
inverso, outros teóricos e educadores atribuem a Educação e a arte
uma função cr́tico-transformadora, capaz de desvelar as ideologias e
incentivar as mudanças sociais. Entre estes últimos, a arte passa a ser
vista como importante instrumento pedagógico para o fortalecimento
da identidade cultural e conscientização pol́tica. A Pedagogia do Opri-
mido desenvolvida por Paulo Freire representa esta concepção, tendo
inuenciado o trabalho de inúmeros outros educadores e artistas como,
por exemplo, Augusto Boal, autor da obra Teatro do Oprimido.

ATIVIDADE

Atende aos Objetivos 2 e 3

3. Vamos conhecer melhor as propostas de Augusto Boal. Visite o site


do Centro Teatro do Oprimido (http://ctorio.org.br/novosite/). No item
“Método”, da barra principal da homepage, você encontrará uma breve
descrição das principais técnicas teatrais por ele desenvolvidas: Teatro
Jornal, Teatro Invis́vel, Teatro Imagem, Teatro Fórum, Arco-́ris do Desejo,
Teatro Legislativo. As descrições das técnicas no site recomendado são
bastante sumárias.
Escolha uma delas para aprofundar seu conhecimento sobre ela nesta
atividade. Utilizando o nome de Augusto Boal e da técnica escolhida como
palavra- chave, faça novas pesquisas na internet para ter mais informações
e, caso encontre, descreva uma experência concreta de sua aplicação.

RESPOSTA COMENTADA
Um dos aspectos mais interessantes das propostas de Augusto Boal
é que, no planejamento pedagógico, você só pode escolher anteci-
padamente a técnica teatral a ser ultilizada e o tema a ser tratado.
Fora isso, tudo mais é imprevis´vel! Pois Boal não desenvolveu um
teatro convencional, com texto xo, nal predeterminado, atores de

52 CEDERJ
3
AULA
lado e público de outro. Ao contrário, conforme devem ter notado,
todas as suas propostas são interativas, de modo que seu desen-
volvimento e desenlace dependem da participação ativa e cr´tica
do público. Aliás, muitas vezes, o público sequer percebe que está
participando de uma proposta teatral, vivendo aquela “cena” como
uma experiência concreta, em algum contexto real de sua vida.
Atualmente, muitos programas de televisão exploram suas técnicas
teatrais por meio das famosas “pegadinhas”. Além do ineditismo,
aquilo que distingue as propostas de Boal dessas outras iniciativas
é exatamente o seu propósito. O objetivo do Teatro do Oprimido
não é expor as pessoas a situações vexatórias, como ocorre nos
atuais programas televisivos, mas incitá-las a reetir e agir diante dos
problemas candentes de sua realidade. Certamente, uma proposta
como essa tem muito a contribuir para a Educação!

TECNICISMO

De fato, as propostas escolanovistas e socioconstrutivistas apre-


sentadas nunca se estabeleceram como uma pol́tica ocial para a
 margem do sistema hegemônico, de matriz tradicional e
educação. A
tecnicista, elas podiam ser encontradas apenas em escolas diferencia-
das, geralmente particulares, caso das propostas escolanovistas; ou em
projetos educativos populares que, a partir da década de 1960, teve seus
participantes perseguidos pela ditadura militar, conforme ocorreu com
Paulo Freire. De todo modo, o caráter inovador de ambas as propostas
contagiou inúmeros educadores permeando, mesmo que de modo t́mido
e informal, o sistema de ensino.
A partir da promulgação da LDB 5.692/71, o ensino de arte torna-se dis-
ciplina curricular obrigatória e o tecnicismo, o modelo educacional dominante.

Centrado no uso de recursos tecnológicos, essa tendência enfatiza


o estudo programado e o uso de meios audiovisuais e do livro
didático. No ensino de arte predomina o ‘receituário’ de técnicas
art́sticas ligadas a programação visual e a publicidade. De fato,
naquele momento, a indústria cultural e os meios de comunicação
de massa efetivam-se no Brasil, surgindo os telejornais, as novelas e
os projetos de educação de adultos via telecursos (BRASIL, 2006).

CEDERJ 53
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Dimensão educacional: a pluralidade das cor-
rentes pedagógicas

A recente revolução tecnológica da informática trouxe também


fortes impactos na educação em geral, gerando particulamente a ampliação
dos cursos de formação a distância e semipresenciais, como este de que
estamos participando. Evitar os vieses tecnicistas do passado, explorando
de modo cr́tico, criativo e interativo as potencialidades dessas novas
tecnologias é, sem dúvida, o principal desao dessa modalidade de ensino.

TENDÊNCIAS ATUAIS

A partir da década de 1980 intensicam-se as pesquisas sobre os


fundamentos e métodos espec́cos para o ensino de arte. Isso se deve a
expansão dos cursos de graduação e pós-graduação em arte, o fortale-
cimento das associações de professores da área e o maior intercâmbio
com a comunidade internacional.

ATIVIDADE

Atende aos Objetivos 2 e 3

4. O item Sistematizações Conceituais e Metodológicas (página 174) do


documento Orientações Curriculares para o Ensino Médio (MEC, 2006)
cita várias propostas metodológicas relacionadas às diferentes linguagens
art́sticas que prosperam nesta época, a saber:
- Música: Proposta de H. J. Koellreuter, modelo C(L)ASP ou (T)EC(L)A de
Swanwick.
- Dança: Educação somática, Eutonia, Método Laban.
- Artes Cênicas: livros de jogos teatrais de Viola Spolin, Augusto Boal e
Ingrid Koudela.
- Artes Visuais: DBAE (Ensino de Arte Baseado em Disciplinas), Abordagem
Triangular de Ana Mae Barbosa.

Conforme zemos na atividade anterior, dedicada ao estudo das propostas


de Augusto Boal, desenvolva nesta atividade também uma pesquisa na
internet sobre uma das propostas educacionais citadas. Identique a lin-
guagem art́stica escolhida, o nome do método ou autor e faça um breve
comentário sobre suas caracter́sticas.
Linguagem art́stica:
___________________________________________________________________
Método ou autor:
___________________________________________________________________
Comentário:
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________

54 CEDERJ
3
AULA
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
_________________________________________________________________

RESPOSTA COMENTADA
Diferentemente da “livre expressão”, tônica do ensino de arte esco-
lanovista, o que caracteriza a maioria dessas propostas é buscar
uma formação mais ampla, relacionando – cada proposta ao seu
modo – aspectos tais como: o fazer art´stico, a apreciação e inter-
pretação cr´tica de obras de arte, o conhecimento da História da
Arte, a compreensão e a aquisição dos códigos art´sticos, fatores
que aprofundam e dão signicado existencial e histórico ao apren-
dizado da arte.

Duas outras tendências ainda são destacadas em nosso texto base


(MEC, 2006): Diversidade e Pluralidade Cultural e Cotidiano e
M́dias. Ambas dialogam com as questões das teorias sociais e losócas
contemporâneas, também chamadas pós-modernas.
É importante salientar que o foco ora multi, ora inter, ora trans-
cultural da primeira tendência está profundamente ligado a questões
sociais e pol́ticas. Vincula-se ao modelo colonial desenvolvido pelas
nações europeias no passado e a fatores atuais tais como o processo de
globalização da informação e da economia, o m da guerra fria e os
conitos pós-coloniais, especialmente na África. Estes fatores recentes
promoveram um grande uxo migratório de pessoas exiladas de suas
terras por problemas pol́ticos e econômicos em direção a s nações mais
estáveis e prósperas, como os EUA e os Estados europeus. Portanto, a
questão multicultural é, ao mesmo tempo, uma reivindicação dessas
minorias e um desao estatal na formulação de pol́ticas públicas para
o enfrentamento dessas novas demandas sociais.

CEDERJ 55
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Dimensão educacional: a pluralidade das cor-
rentes pedagógicas

Figura 3.4: Os sertões, de Euclides da Cunha (primeira página), e Casa-grande


& senzala, de Gilberto Freyre (capa).
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Os_Sert%C3%B5es_livro_1902.jpg

Na perspectiva de pa́s colonizado, o debate sobre a diversidade


cultural já guarda uma longa e rica história no Brasil, que antecede esse
interesse atual nas nações hegemônicas. Nesse sentido, podem ser citados
diversos estudos e movimentos art́sticos-culturais. Na obra Os sertões
(1902), Euclides da Cunha analisa as contradições pol́ticas e culturais
do Brasil ao relatar a violenta repressão ao movimento pol́tico-religioso
liderado por Antonio Conselheiro na Guerra de Canudos (Bahia, 1896-
1897). O sociólogo Gilberto Freyre aborda a construção da identidade
brasileira a partir da análise de sua história colonial e escravagista, na
obra Casa-grande & senzala (1933). Diversos movimentos art́sticos tais
como o modernismo do in́cio do século XX, o tropicalismo, nos anos
1960, e recentes propostas musicais como o Mague Beat, problematizam
a questão da inovação art́stica, aliada ao reconhecimento e a valorização
da cultura brasileira.
Decerto o debate sobre a diversidade cultural na educação bra-
sileira não se esgota no resgate dessas importantes iniciativas e deve
avançar. A partir de intensa mobilização pol́tica, novas legislações (Lei
11.645/08) foram criadas prevendo a abordagem das culturas ind́gena
e afro-brasileira nos curr́culos educacionais, e vem crescendo o número
de pesquisas, publicações e projetos educativos sobre esses temas.

56 CEDERJ
Também profundamente relacionada ao debate pós-moderno, a

3
AULA
última tendência mencionada, Cotidiano e M́dias, volta-se particular-
mente para a cultura urbana. Nela se inscreve uma vasta lista de temas:
as relações entre centro e periferia nas grandes cidades, entre cultura
erudita e cultura de massa e o impacto das novas m́dias, especialmente
na vida das crianças e jovens, temas muito explorados pela vertente
educativa denominada Cultura Visual.

Figura 3.5: Grate, muro do Jockey, no Rio de Janeiro.


Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Muro_jockey.jpg

Além desses aspectos abrangentes da realidade contemporãnea,


são ainda destacadas a importância de se discutir na escola tópicos
microculturais relativos a cultura e a condição social feminina, questões
de gênero e de opções sexuais, demandas relativas a educação de porta-
dores de necessidades especiais, educação ambiental, entres outros temas.

CONCLUSÃO

Diante do panorama apresentado, podemos nos perguntar: qual


a importância das diversas teorias educacionais? Como o professor
deve lidar com essa diversidade de propostas, escolhendo a que mais lhe
agrada, ou recusando as do passado em favor das mais recentes? Bus-
cando responder a essas questões, podemos concluir nossa aula citando
as advertências feitas na introdução da Revisão Histórica de nosso
texto base, MEC, 2006, p. 169, a qual esclarece que:

CEDERJ 57
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Dimensão educacional: a pluralidade das cor-
rentes pedagógicas

Essas iniciativas foram criadas atendendo a demandas diversas.


Embora alguma delas tenha dominado o ensino de Arte em deter-
minados momentos, outras se colocaram como possibilidades
alternativas. No conjunto, essas diferentes iniciativas formam
um corpus de conhecimento pedagógico acumulado na área do
ensino de Arte (...). O panorama apresentado (...) pretende romper
com a visão evolucionista de que cada nova proposta elimina a
anterior. O que se busca com esse olhar histórico é o exerc́cio de
compreensão do próprio trabalho docente, um posicionamento
cr́tico em relação a s tendências metodológicas mais recorrentes,
resgatando-as, revisando-as, transformando-as e inovando-as de
acordo com as demandas de cada contexto ou atuação, mediante
a atualização e a análise teórica.

ATIVIDADE FINAL
Atende aos Objetivos 1, 2 e 3

Com o objetivo de contextualizar, em sua prática pedagógica, os temas discutidos,


nesta atividade nal voce deverá realizar um planejamento didático. Escolha um
tema relacionado aos focos de interesse das correntes pedagógicas pós-modernistas
(diversidade cultural, m́dias ou cotidiano). Identique seu público-alvo e descreva
no item metodologia a seque ncia de atividades que voce irá desenvolver para
tratar o tema, sejam aulas teóricas, atividades práticas, visitas, debates, em suma,
tudo que voce julgar importante, envolvendo o número de aulas que achar
necessário. A única exige ncia é que uma dessas atividades deve ser a aplicação
de uma das técnicas teatrais desenvolvidas por Augusto Boal.

Tema da aula:

___________________________________________________________________________

Público-alvo:

___________________________________________________________________________

Técnica teatral de Augusto Boal escolhida:

___________________________________________________________________________

58 CEDERJ
Metodologia:

3
AULA
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
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___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________

RESPOSTA COMENTADA
Ao longo de nosso curso você será convidado a realizar vários outros planejamen-
tos didáticos, explorando aspectos pontuais das teorias que estivermos discutindo.
Esse, contudo, é especialmente importante porque poderá enriquecer e orientar a
realização de todos os demais. Seu objetivo é demonstrar que você pode articular,
de modo cr´tico e criativo, estratégias didáticas oriundas das mais variadas correntes
pedagógicas e ligadas às diferentes linguagens art´sticas.

RESUMO

Nota-se que algumas das tende ncias pedagógicas enfatizam o valor particular e
auto nomo da arte, enquanto outras destacam o seu valor instrumental. A auto-
nomia é o traço dominante, embora não exclusivo, das propostas escolanovistas,
como também de algumas metodologias desenvolvidas a partir dos anos 1980,
como o DBAE, por exemplo. Outras priorizam o valor instrumental do ensino
de arte, entendido como um meio para se alcançar diferentes objetivos peda-
gógicos. Tais objetivos podem estar relacionados ao desenvolvimento cognitivo
do estudante, como ocorre em certas propostas da Pedagogia Tradicional e no

CEDERJ 59
Construtivismo; em outros casos pode visar a uma atualização tecnológica e a
preparação para o trabalho, traço da Pedagogia Tradicional aplicada nas escolas
populares e do Tecnicismo; ou então tomar o ensino de arte como meio para
promover o desenvolvimento do esp́rito cr́tico e identidário do aluno, e nfase do
socioconstrutivismo e das vertentes pós-modernas. No entanto, o objetivo desse
panorama não foi o de se construir uma lista de tende ncias ultrapassadas, mas
o de resgatar as múltiplas potencialidades desses conhecimentos pedagógicos
acumulados ao longo da história.
Dimensão cultural: a pluralidade

AULA
das tradições artísticas
Terezinha Losada

Metas da aula
Demonstrar que os estilos artísticos variam de
acordo com a visão de mundo e os interesses
comunicativos de cada cultura, de cada época e
de cada situação contextual.
objetivos

Esperamos que, ao nal desta aula, você seja


capaz de:
1. reconhecer que a forma de uma mensagem
muda de acordo com a sua função em cada
contexto (prático, cultural, histórico);
2. identicar os preconceitos universalistas e
evolucionistas subjacentes às distinçıes entre
arte erudita, arte popular, cultura de massa e
artes aplicadas;
3. identicar a arte como um fenômeno cultural
que é objeto de estudo de várias áreas do
conhecimento, tais como Filosoa, História,
Sociologia, Antropologia, Semiótica, entre
outras;
4. reconhecer a importância do estudo da História
da Arte na escola, como meio de fortalecer as
noçıes de identidade cultural e diversidade
cultural;
5. identicar que as atuais legislaçıes
educacionais requisitam, no planejamento
curricular, a discussão de conteúdos relativos às
culturas africana e indígena.
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Dimensão cultural: a pluralidade das tradições
art́sticas

INTRODUÇÃO Em nossa primeira aula, destacamos a função transversal das linguagens,


que permeia todas as esferas de nossa vida. Na aula seguinte, discutimos a
importância da experiência estética na construção do conhecimento. Agora,
iremos tratar da dimensão cultural da arte, tomando-a como um patrimônio
historicamente constru́do, que revela a identidade das diferentes civilizações
e seus grupos sociais.

EVOLUCIONISMO OU DIVERSIDADE?

Conforme foi analisado na aula anterior, a oposição entre evolucio-


nismo e diversidade é uma das principais divergências entre as concepções
modernistas e pós-modernistas nas teorias losócas. Tais divergências
também dividem correntes da História da Arte. No campo das artes
visuais, durante muito tempo os historiadores utilizaram o critério da
MIMESE imitação da realidade, M I M E S E , para analisar as obras de arte, deduzindo
Vindo do grego, dele uma classicação evolucionista dos estilos art́sticos.
o termo mimese
liga-se ao conceito Em um paralelo aos ciclos da vida biológica (nascimento, infância,
de imitação. Para
maturidade, velhice e morte), resulta dessa abordagem a concepção de
Platão, todas as
manifestações sen- que a arte das tradições antigas, como é o caso da rigidez e frontalidade
s́veis são imitações
do mundo das ideias, da arte eg́pcia (Figura 4.1), representaria a infância art́stica da humani-
sejam as formas da
Natureza ou da arte.
dade. Segundo esses historiadores, a arte só viria a alcançar concepções
Já para Aristóteles mais desenvolvidas e maduras com o advento da cultura grega (Figura
(HOUAISS, 2001,
p. 1924), a mimese 4.2), quando a representação das guras assume uma forma mais natural
seria a imitação da
vida interior dos e espontânea.
homens, suas pai-
xões, seu caráter,
seu comportamento
etc.. Gramatical-
mente o sentido imi-
tativo do anteposi-
tivo mime(o) liga-se
a vários termos, tais
como mimeógrafo,
técnica de reprodu-
ção gráca, m́mica,
técnica de repre-
sentação cênica, ou
então ao comporta-
mento dito mimético
de certos animais,
que mudam de cor
de acordo com o
ambiente onde estão
para se proteger,
camuando-se.

62 CEDERJ
4
AULA
Figura 4.1: Antiguidade, arte Figura 4.2: Antiguidade, arte grega, mosaico
eg́pcia, pedra tumular, Nefertari. dos caçadores.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/ Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Deer_
Ficheiro:Maler_der_Grabkammer_ hunt_mosaic_from_Pella.jpg
der_Nefertari_004.jpg

A queda do Império Romano, fragmentando a Europa em peque-


nos feudos, demarca o m da Antiguidade, iniciando o per́odo denomi-
nado Idade Média. Nesta época, a arte torna-se bastante frontal e r́gida
(Figura 4.3). Formas art́sticas mais naturalistas só voltaram a surgir no
in́cio da Idade Moderna (Figura 4.4), per́odo marcado pela formação
dos Estados europeus sob o comando de reis absolutistas; pelas grandes
navegações, que levaram ao descobrimento do Brasil; pelo desenvolvi-
mento das cidades, do comércio, das ciências e das artes.
Adotando o citado critério evolucionista, esse intenso movimento
cultural foi denominado Renascimento, devido ao resgate de muitas tra-
dições gregas da Antiguidade que haviam sido abandonadas (ou morrido)
ao longo da Idade Média, per́odo chamado de Idade das Trevas.

CEDERJ 63
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Dimensão cultural: a pluralidade das tradições
art́sticas

Figura 4.3: Idade Média, ́cone bizantino. Figura 4.4: Idade Moderna
Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/ – Renascimento, Virgem, o
File:L%27abb%C3%A9_M%C3%A9na_et_le_ menino e Santa Ana, Leonar-
Christ_01.JPG do da Vinci.
Fonte: http://es.wikipedia.org/
wiki/Archivo:Leonardo_da_
Vinci_020.jpg

Essa alternância entre ciclos ora mais esquemáticos, ora mais


naturalistas das representações art́sticas levou muitos historiadores da
arte a associarem as representações que imitam a aparência da realida-
de (mimese) como sendo as mais evolu́das, estigmatizando tudo o que
fugisse desse modelo como sendo primitivo ou inculto.
Em torno desses princ́pios evolucionistas são denominadas arte
primitiva as produções art́sticas de povos do passado ou atuais que
vivem isoladas de nossos padrões de desenvolvimento, como é caso da
cultura ind́gena brasileira. Do mesmo modo, são classicadas as pro-
duções art́sticas dos diferentes grupos sociais no interior de uma mesma
sociedade. A arte cultivada pelas elites é tomada como o padrão culto,
e tudo o que não segue os seus modelos é denominado arte ingênua
ou arte popular.
Em todos os casos, a diferença é tratada como inferioridade, isto
é, como falta de cultura ou mesmo uma debilidade cognitiva, sugerindo
que tais civilizações ou grupos sociais são compostos por seres humanos
infantis ou imaturos.

64 CEDERJ
A RELAÇÃO ENTRE FORMA E FUNÇÃO

4
AULA
Ernst Gombrich (1909-2001) adota as relações entre forma e fun-
ção nas imagens como o meio de romper com essa concepção. Ele inicia a
obra que trata desse assunto armando que o evolucionismo está morto
(GOMBRICH, 1986), tornando-se, por isso, um dos precursores dos estudos
culturais sobre arte, ligados a s áreas da Antropologia e da Semiótica.

ATIVIDADE

Atende aos Objetivos 1 e 2

1. Para facilitar o entendimento das ideias de Gombrich, vamos analisar


as imagens a seguir, ligadas ao mundo contemporâneo. Marque com um
X qual delas você considera mais evolu́da, justicando, em seguida, a sua
resposta.

(a) (b)

RESPOSTA COMENTADA
Não sei qual foi a sua resposta, mas certamente trata-se de uma
comparação desconcertante. Pois, se um arquiteto quiser mostrar
ao seu cliente a aparência de um edif´cio, a Figura b, com todos
os seus efeitos de perspectiva, luz e sombra, apresenta-se como a
forma de representação mais adequada. Porém, se ele for instruir
um engenheiro sobre a sua construção, o modo linear e plano da
planta baixa, exemplicado na Figura a, torna-se mais eciente,
pois representa todos os cômodos do edif´cio com suas respectivas
medidas, sem as distorções das projeções em perspectiva.
Portanto, não é poss´vel analisar tais exemplos a partir de pressu-
postos evolucionistas ou absolutos. Considerando suas respectivas

CEDERJ 65
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Dimensão cultural: a pluralidade das tradições
art́sticas

funções comunicativas, nenhum dos métodos de representação


visual apresentados é melhor, mais evolu´do ou mais culto do que
o outro. Eles apenas atendem a interesses diferentes.

Um dos principais objetivos das teorias de Gombrich foi buscar


demonstrar que a arte de cada tradição cultural deve ser analisada e
compreendida de acordo com suas próprias funções contextuais ou
interesses comunicativos. Ele desenvolveu sua análise confrontando
a arte grega e a eg́pcia da Antiguidade, citadas anteriormente. Leia o
boxe de curiosidade.

Gombrich ressalta que a arte eg́pcia tinha uma função ocial e religiosa,
representando o que as coisas são e deveriam ser por toda a eternidade.
Para ser claro e leg́vel, as pessoas eram sempre representadas de modo
frontal, com o rosto de perl, de modo a serem facilmente identicadas.
Notem que essa mesma estratégia ainda hoje é utilizada nas fotograas
de documentos e de identicação policial. As imagens do faraó e de
outras divindades ocupam a posição central da composição, e a diferença
de tamanho entre as guras reete sua importa ncia na hierarquia social.
Notem que costumamos utilizar essa estrutura frontal e centralizada
na maioria das fotograas de cerimo nias ociais, como, por exemplo, a
representação do presidente com seus ministros, fotograas de formatura
acade mica ou mesmo as fotos ociais dos times de futebol.

Figura 4.5: O drible. Figura 4.6: Time de futebol.


Fonte: http://www.sxc.hu/ Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Time_
browse.phtml?f=downlo Botafogo_1912.jpg
ad&id=814382&redirect=
photo(o drible)

66 CEDERJ
A arte grega, por outro lado, assumiu uma função narrativa, repre-

4
sentando como as coisas são em sua aparência imediata e transitória,

AULA
assemelhando-se, desse modo, a noção atual do agrante fotográco.
Nela predomina o ponto de vista do artista, como é o caso da gura na
qual o fotógrafo captura o instante de um drible. Desse modo, a arte
deixa de representar uma verdade eterna, consensual, guiada por regras
ligadas a tradição, e passa a representar fatos corriqueiros ou mesmo
situações imaginadas pelos artistas, tornando-se uma cção.
Por isso, conforme discutimos na aula anterior, Platão se opôs a pre-
sença da arte na sua cidade ideal, pois ela poderia induzir ao erro e a ilusão,
ao passo que Aristóteles considera que o caráter ccional da arte poderia
cumprir nalidades educativas. As divergências entre esses dois lósofos
sobre a arte de seu tempo nos demontra que nenhum dos dois estilos ana-
lisados – eg́pcio e grego – é melhor ou mais evou́do do que o outro. Eles
apenas são diferentes, representando diferentes funções comunicativas.
Em um paralelo com os exemplos usados no in́cio desta discussão,
poder́amos dizer que a arte eg́pcia se assemelha a planta baixa arquitetô-
nica. Nela, tudo é representado na exata medida das convenções sociais,
enquanto a arte grega representa os fatos em perspectiva, salientando a
aparência das coisas, o ponto de vista e a opinião do autor.
Analisando essas diferenças, Gombrich deu uma importante
contribuição teórica para romper com os estigmas pejorativos e precon-
ceituosos das teorias evolucionistas. Ele nos demonstrou que, com sua
inteligência e criatividade, toda civilização e seus diversos grupos culturais
desenvolvem suas próprias formas simbólicas de representação, a m de
expressar seus interesses, seus valores e sua visão de mundo.
No entanto, abandonar nossos próprios valores e interesses para
entendermos quais são os valores e interesses do outro é algo sempre
muito dif́cil, tanto em nossa vida cotidiana como na pol́tica ou nos
estudos acadêmicos. Por isso, a ruptura com concepções evolucionistas
e universais em favor da identicação e valorização da diferença
tornou-se um fator central das teorias sociais contemporâneas, também
chamadas pós-modernas.

CEDERJ 67
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Dimensão cultural: a pluralidade das tradições
art́sticas

ATIVIDADE

Atende aos Objetivos 1 e 2

2. As duas imagens apresentadas nesta atividade não utilizam o método


mimético ou naturalista de representação da realidade. A Figura 4.7 é uma
placa de trânsito, a Figura 4.8 representa uma carranca, arte tradicional da
região brasileira do rio São Francisco.
Pesquise e comente a relação entre a forma como a gura humana é
representada nestas duas imagens e a sua função contextual.

Figura 4.7: Placa de sinalização de tra nsito. Figura 4.8: Carranca, arte
Fonte: http://www.sxc.hu/photo/806340 popular da região do rio São
Francisco (MG) Brasil.
Fonte: http://en.wikipedia.org/
wiki/File:Carranca-vampiro.JPG

RESPOSTA COMENTADA
Esses exemplos sintetizam as nossas discussões, demonstrando
como a forma de uma imagem muda de acordo com suas funções
contextuais e culturais. Nenhuma delas representa a gura humana
de modo el ou mimético. Na Figura 4.7, a gura humana é repre-
sentada de modo extremamente simplicado. Esta forma esque-
mática de representação cumpre a função de permitir uma leitura
rápida e objetiva da informação que pretende transmitir, aspecto
necessário nas placas de trânsito e demais meios de sinalização. A
Figura 4.8, ao contrário, representa a gura humana, exagerando
suas formas de modo dramático e caricatural. Seguindo uma tradi-
ção antiga, também presente em outras culturas, essas esculturas

68 CEDERJ
4
AULA
denominadas “carrancas”, são colocadas nas proas dos barcos do rio
São Francisco com a função de assustar o observador, protegendo
a embarcação do assalto de qualquer perigo, tais como invasores,
monstros, maus esp´ritos etc.

A DIVERSIDADE DAS TEORIAS DA ARTE

Para pesquisar os signicados de uma obra de arte, foram desen-


volvidos diferentes métodos de abordagem, ligados a diferentes disci-
plinas cient́cas. Vamos discutir brevemente esses métodos analisando
a obra representada na Figura 4.9.

Figura 4.9: Indígenas, de Debret.


http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Debret37.jpg

O método biográco aborda a vida e as motivações do artista.


Neste caso trata-se de Jean-Baptiste Debret (1768-1848), pintor e dese-
nhista francês que integrou a missão art́stica francesa de 1816, trazida
ao Brasil por D. João VI para fundar a Academia de Artes e Of́cios,
mais tarde denominada Academia Imperial de Belas-Artes.
O método formalista, por sua vez, discute as caracter́sticas da
obra, isto é, seu tema e a forma como ele é tratado, descrevendo as téc-
nicas, os materiais e os efeitos expressivos nela utilizados. Neste caso,

CEDERJ 69
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Dimensão cultural: a pluralidade das tradições
art́sticas

Debret representou um grupo de ind́genas, colocando no centro da


composição um homem com penacho e lança, cercado por mulheres e
crianças realizando atividades cotidianas. Ele utiliza a técnica da aqua-
rela, tinta a base de água que permite um colorido leve e transparente.
Todas as guras do primeiro plano são bem delineadas e iluminadas.
As guras do fundo, no canto esquerdo do quadro, são representadas
numa escala de tamanho menor, com tons mais claros e formas menos
denidas, criando desse modo um efeito de profundidade espacial.
Os métodos histórico e sociológico abordam as caracter́sticas
sociopol́ticas da época em que a obra foi realizada, discutindo como
esses fatores afetam as caracter́sticas estil́sticas daquela obra e seu
diálogo com as tendências art́sticas anteriores.
Nesse sentido, vale salientar que a corte portuguesa veio para o
Brasil fugindo do bloqueio econômico de Napoleão Bonaparte, trazen-
do consigo toda uma infraestrutura técnica e cultural que permitisse a
sobrevivência e o funcionamento da corte na colônia brasileira, a qual era
usada antes apenas para a exploração de riquezas. Debret tem inuência
dos estilos neoclássico e romântico, em voga na Europa a partir do século
XVIII. Ironicamente, por ser inspirado no movimento iluminista e na
Revolução Francesa, o ideário dessas correntes culturais e art́sticas irá
inuenciar os movimentos republicanos responsáveis pelo m do regime
monárquico no Brasil, assim como em várias nações europeias.
Enquanto os métodos histórico e sociológico discutem as cir-
cunstâncias e mudanças da sociedade e da arte ao longo do tempo, o
método antropológico discute o contrário, ou seja, indaga sobre aquilo
que permanece imutável numa cultura, apesar das mudanças circuns-
tanciais da História.
As abordagens pós-modernas projetam essas macroindagações
culturais dos antropológos para microaspectos da realidade, envolvendo
questões tais como: Será que um jovem e um velho veem o mundo da
mesma maneira? E um rico e um pobre? E um descendente de europeus,
ou de ́ndios, ou de negros? E um portador de necessidades especiais? E
um homossexual? Será que homens e mulheres veem e vivem esse mundo
da mesma maneira? Como as diferenças religiosas afetam nossa visão de
mundo? Como essas diferenças se manifestam nas representações culturais
e art́sticas? Há espaço para essa diversidade ou predominam concepções
hegemônicas? Como tratar desses diversos aspectos na educação?

70 CEDERJ
Sem dúvida, a obra de Debret é um importante documento his-

4
tórico e antropológico. Ela nos mostra como os ́ndios nativos do Brasil

AULA
viviam no século XIX, sua liberdade com a nudez e muitos de seus
hábitos e modos de viver. No entanto, ela expressa um olhar externo,
ou seja, a visão de Debret, um francês, sobre essa cultura exótica. Tudo
é representado de acordo com os cânones da arte europeia, de modo
bastante pitoresco, idealizado e romântico. Será que a vida dos ́ndios
então colonizados era de fato assim tão harmoniosa? Qual o siginica-
do de sua própria cultura, de seus rituais, de seus adornos? Essas são
algumas das questões formuladas pelas correntes antropológicas e dos
atuais estudos culturais.

Quadro 4.1: Diagrama de s́ntese

Método Questão
Biográco Quem fez a obra?
Formalista Quais as caracter́sticas da obra?
Quando e em que contexto social, pol́tico e econo mi-
Histórico e sociológico
co a obra foi produzida?
Antropológico Quais as macromotivações culturais da obra?
Quais as micromotivações culturais da obra, envol-
Pós-moderno ou pós-
vendo questões de classe social, idade, etnia, ge nero,
estruturalistas
opção sexual e religiosa, entre outros aspectos?

DIVERSIDADE CULTURAL E EDUCAÇÃO

Estas recentes formulações teóricas a respeito da diversidade cultural


foram acompanhadas de intensos movimentos sociais e pol́ticos que bus-
cam denir uma prática social mais democrática e plural. Nesse sentido,
novas legislações preveem a presença de conteúdos sobre as culturas ind́-
gena e afro-brasileira nos curr́culos escolares, a denição de cotas sociais
ou étnicas de acesso desses grupos sociais a s universidades, bem como a
garantia dos direitos dos portadores de necessidades especiais.
Uma das grandes diculdades dos professores na consecução des-
sas propostas é a falta de material de pesquisa e material didático relativos
a essas novas demandas. No entanto, muitas pesquisas e iniciativas têm
sido desenvolvidas buscando suprir essa carência.

CEDERJ 71
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Dimensão cultural: a pluralidade das tradições
art́sticas

O Artigo 26A da Lei 11.645/2008 preve :

Nos estabelecimentos de Ensino Fundamental e de Ensino Médio,


públicos e privados, torna-se obrigatório o estudo da história e
cultura afro-brasileira e ind́gena.

§ 1” O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá


diversos aspectos da história e da cultura que caracterizam a for-
mação da população brasileira, a partir desses dois grupos étnicos,
tais como o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos
negros e dos povos ind́genas no Brasil, a cultura negra e ind́gena
brasileira e o negro e o ́ndio na formação da sociedade nacional,
resgatando as suas contribuições nas áreas social, econo mica e
pol́tica, pertinentes a história do Brasil.

§ 2” Os conteúdos referentes a história e a cultura afro-brasileira


e dos povos ind́genas brasileiros serão ministrados no a mbito
de todo o curr́culo escolar, em especial nas áreas de educação
art́stica, de literatura e história brasileiras.

ATIVIDADE

Atende ao Objetivo 5

3. Acesse na internet o site Portal do Professor do Ministério da Educação


(http://portaldoprofessor.mec.gov.br/). Na sua página principal, você
encontrará ́cones indicando as seguintes possibilidades de pesquisa:
“Espaço Aula”, “Recursos Educacionais” e “Cursos e Materiais“. Utilizando
palavras-chave tais como “cultura afro-brasileira”, “cultura ind́gena” e
“educação especial”, você irá encontrar várias opções de abordagem desses
temas em sala de aula. Selecione uma fonte relativa a cada um desses temas
que tenha achado interessante e faça um breve comentário sobre elas.

Cultura afro-brasileira
Nome do recurso:

Link:

Comentário:

Cultura ind́gena
Nome do recurso:

Link:

72 CEDERJ
4
AULA
Comentário:

Educação especial
Nome do recurso:

Link:

Comentário:

RESPOSTA COMENTADA
A criação deste site foi uma iniciativa do MEC de grande importância
para a formação do professor. Nele são encontrados recursos dos
mais variados suportes multim´dia e formatos (textos e sites para
pesquisa, livros didáticos, relatos de planos de aula). Outro aspecto
importante é que se trata de uma produção colaborativa, na qual
todo professor pode publicar suas iniciativas e comentar a de seus
colegas. Participe, publicando um dos comentários feitos por você
nesta atividade no site.

CONCLUSÃO

Portanto, mesmo não sendo uma ciência com aquele perl disciplinar
de objetos e questões espec́cas mencionado em nossa primeira aula, pode-
mos dizer que as linguagens geram um importante e diversicado campo
teórico, envolvendo contribuições de diversas abordagens disciplinares.
Assim, buscamos, nesta aula, reconstruir o "campo" das linguagens e das
artes como uma área de conhecimento fundamental para o desenvolvimento
humano, um "campo" no sentido mais extenso do termo, intrinsecamente
multi e interdisciplinar e, acima de tudo, essencialmente transversal, pois
seu dom́nio coincide com a própria estatura simbólica e cultural do ser
humano, tão rica e instigante exatamente devido a sua diversidade.

CEDERJ 73
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Dimensão cultural: a pluralidade das tradições
art́sticas

Sem dúvida, o acesso a esses conhecimentos é fundamental para a


aquisição e o uso das linguagens tanto em suas formas cotidianas como
cient́cas e art́sticas. Desse modo, para cumprir sua função instrumental,
desenvolvendo as potencialidades dos alunos como emissores e recepto-
res, deve também ser previsto e prestigiado nas estruturas curriculares
o estudo desse vasto conjunto de ideias e teorias que constitui o campo
disciplinar da arte.

ATIVIDADE FINAL
Atende aos Objetivos 3 e 4

Escolha uma obra de arte de que voce goste. Pode ser uma pintura, uma música,
um lme ou qualquer outro ge nero art́stico, ligado a cultura erudita ou
popular. Identique a obra escolhida e, em seguida, escreva um breve texto
cr́tico sobre ela. Busque responder a s diversas questões relativas aos diferentes
métodos teóricos apresentadas no diagrama. Não é necessário responder a todas
as questões. Elas são apenas para metros de análise.

RESPOSTA COMENTADA
Para construir o seu texto, se oriente nas análises feitas sobre a obra Ind́genas, de
Debret (Figura 4.9) .

74 CEDERJ
4
RESUMO

AULA
A partir da discussão das relações entre forma e função, nesta aula buscamos
ressaltar a importa ncia da arte como patrimo nio histórico e cultural, ressaltando
seu papel no fortalecimento da identidade cultural e na promoção do respeito
a diversidade. Para isso, buscamos desconstruir os preconceitos universalistas e
evolucionistas subjacentes a s distinções entre arte erudita, arte popular, cultura
de massa e artes aplicadas.

CEDERJ 75
Funções da linguagem: o referen-

AULA
te, o emissor e o receptor
Terezinha Losada

Meta da aula
Relacionar as dicussıes de Roman Jakobson
sobre as funçıes da linguagem ao campo do
ensino de artes.
objetivos

Esperamos que, ao nal desta aula, você seja


capaz de:
1. reconhecer as motivaçıes comunicativas
ligadas às diferentes funçıes da linguagem;
2. aplicar os conceitos discutidos na formulação
de planejamentos didáticos que estimulem os
processos interpretativos e criativos do aluno.
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Funções da linguagem: o referente, o emissor e
o receptor

INTRODUÇÃO Na aula anterior, discutimos a relação entre forma e função para analisar
a diversidade cultural. Nesta aula, veremos que o linguista russo Roman
Jakobson (1896-1982) se utilizou desse mesmo critério para interpretar a
linguagem verbal, criando uma tipologia das mensagens. Embora dirigida à
análise dos usos cotidianos da linguagem, sua teoria exerceu grande inuência
no desenvolvimento da cr́tica literária e das artes em geral.

Figura 5.1: Roman Jakobson.


Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/File:Jakobson_RO.jpg

Os conceitos de Jakobson são um componente curricular frequente nas aulas


de L́ngua Portuguesa e talvez sejam conhecidos por muitos. Segundo ele, o
processo comunicativo envolve seis diferentes fatores: o emissor, que para
enviar uma mensagem ao receptor, sobre qualquer tema referente à realidade,
precisa dispor de um código (a linguagem verbal ou qualquer outro código)
e também de um canal, isto é, de algum meio de comunicação.

78 CEDERJ
5
AULA
Quadro 5.1: Fatores que envolvem uma mensagem

Fator comunicativo Função da linguagem


Emissor Função emotiva
Receptor Função conativa
Referente Função referencial
Canal Função fática
Código Função metalingu́stica
Mensagem Função poética

Jakobson argumenta que toda e qualquer mensagem envolve a


presença desses diversos fatores. Porém, de acordo com a intenção, ou
seja, a função comunicativa de cada mensagem particular, algum fator
será enfatizado, enquanto os demais funcionarão de modo secundário.

Para a discussão dessas múltipas aplicações da teoria de


Jakobson, recomendamos para esta aula a leitura do livro Fun-
ções da linguagem, de Samira Chalhub. Texto ágil e sintético
que orienta muitas das análises que serão aqui apresentadas.

CEDERJ 79
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Funções da linguagem: o referente, o emissor e
o receptor

FUNÇÃO REFERENCIAL
D E N O TA Ç Ã O
A linguagem tem uma função cognitiva. Por seu O Referente liga-se a 3“ pessoa do
intermédio, nomeamos todas as coisas que conhe-
cemos e inventamos. Este sentido convencional, ou verbo. Do que se fala? De quem se fala?
literal, das palavras é chamado denotação.
(CHALHUB, 1990).
C O N O TA Ç Ã O A intenção da mensagem com função
É o que normalmente chamamos de sentido gu- referencial é criar uma representação da reali-
rado, ou seja, quando, a partir de alguma relação
de semelhança, aplicamos o sentido usual de uma dade circundante. Ela está ligada a apreensão
palavra a outras situações. Se eu armar que Maria
é uma rosa, decerto quero dizer que ela é bonita e sensorial que temos do mundo. Nela, predomi-
delicada, e não que seja efetivamente um vegetal. na o sentido D E N O TAT I V O da linguagem, criando
mensagens objetivas e descritivas.
Vejamos alguns exemplos da função referencial. Na linguagem
cotidiana, essa função apresenta-se nas mensagens com a intenção de
descrever aspectos sobre as coisas, pessoas e fatos que nos rodeiam.
Outro exemplo é a linguagem jornal́stica, que deve relatar com delidade
e imparcialidade os fatos pol́ticos e sociais, embora, muitas vezes, se
possam identicar vieses subjetivos e ideológicos. Essa função também
destaca-se na linguagem cient́ca, que busca descrever, de modo crite-
rioso e objetivo, os fenômenos naturais e sociais.

ATIVIDADE

Atende ao Objetivo 1

1. Observe atentamente o ambiente à sua volta e descreva de modo bem


objetivo o seu contexto, neste exato momento. Mencione a data, o horário,
o local onde você está e suas caracter́sticas; se há a presença de outras
pessoas no ambiente e o modo como você está vestido. Por m, mencione
um detalhe desse ambiente, por mais simples que seja, que você nunca
havia notado antes.

80 CEDERJ
5
AULA
RESPOSTA COMENTADA
Este exerc´cio de observação é interessante porque, envoltos em
nossas atividades cotidanas, muitas vezes deixamos de observar o
mundo a nossa volta. Note, também, que a estrutura do texto que
você acabou de produzir é aplicada a várias funções técnicas, tais
como as atas de reuniões e os laudos de per´cia policial.

Linguagens artísticas

Na arte, a função referencial manifesta-se especialmente nas


tendências naturalistas e realistas, que enfatizam a dimensão sensorial
e concreta da realidade. Na literatura, esse caráter descritivo muitas
vezes envolve a apropriação dos modos cotidianos e regionais de fala.
As artes cênicas acrescem ao caráter literário anteriormente citado o
uso de gurinos e cenários realistas no teatro, no cinema, na televisão,
entre outras m́dias.
Mesmo sendo a menos referencial das linguagens art́sticas, na
música tal caracter́stica é percept́vel, por exemplo, no estilo romântico,
quando este busca reproduzir com os instrumentos musicais os sons da
natureza (ru́dos dos pássaros, dos ventos e trovões). Também é percept́vel
na música contemporânea, quando ela se apropria de ru́dos gravados do
cotidiano ou utiliza objetos do dia a dia como instrumentos musicais.
Devido a representação gurativa, as artes visuais são profun-
damente referenciais, especialmente a arte ocidental, que, resgatando a
tradição grega, desde o Renascimento até o Impressionismo perseguiu
uma forma ideal de representar a realidade. Esse é caso do busto de
D. Pedro I (Figura 5.2); devido ao seu caráter referencial, os retratos, as
paisagens, as representações de cenas c́vicas e cotidianas são importantes
registros art́sticos para os estudos históricos.

CEDERJ 81
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Funções da linguagem: o referente, o emissor e
o receptor

Figura 5.2: Busto de D. Pedro I (de Marc Ferrez).


Museu Histórico Nacional.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Ferrez-
MHN-dpedroI.jpg

ATIVIDADE

Atende ao Objetivo 1

2. Escolha uma das linguagens art́sticas anteriormente mencionadas (lite-


ratura, artes visuais, artes cênicas, música) e elabore uma atividade para
ser desenvolvida na sala de aula explorando a função referencial.

RESPOSTA COMENTADA
A função referencial explora a relação entre arte e realidade. As ativi-
dades art´sticas com esse foco estimulam o aluno a observar o mundo
ao seu redor, compreendê-lo e representá-lo de modo estético e cr´tico.
Vale ainda salientar que, no planejamento didático, a realização dessas
atividades art´sticas pode ser associada de modo interdisciplinar às
reexões ligadas às Ciências Naturais e Sociais.

82 CEDERJ
Função emotiva

5
AULA
O emissor liga-se a 1“ pessoa do verbo. Quem fala? (CHA-
LHUB, 1990).
A função emotiva é identicada por sua marca subjetiva. Ela é
proeminente nas situações em que buscamos expressar nossos senti-
mentos e emoções. Porém, pode ser observada também em quase todas
as mensagens cotidianas, pois, mesmo quando tratamos de um assunto
referencial, deixamos transparecer o valor emotivo que o tema tem para
nós. No texto oral, isso se manifesta na postura corporal, nas entonações
de voz. Na linguagem escrita, por meio do uso de adjetivos, interjeições,
sinais de pontuação (exclamação, reticências) e alguns advérbios.
Chalhub (1990, p. 22) argumenta que, devido ao caráter confes-
sional e subjetivo dessa função, o diálogo toma a forma de monólogo
emotivo – no qual o emissor é receptor de si mesmo. Quantas vezes,
como se costuma dizer, alugamos a orelha de um amigo simplesmente
porque precisamos desabafar, falar de nossas emoções e sentimentos.

ATIVIDADE

Atende ao Objetivo 1

3. Desejo agora que você esqueça tudo que está ao redor, feche os olhos
por um minuto, a m de olhar para dentro de si, seu estado de esp́rito,
seus sentimentos, seu humor. Feito isso, escreva um breve parágrafo sobre
o que você sentiu e pensou.

RESPOSTA COMENTADA
Este exerc´co de observação interior é interessante porque, envoltos
em nossas atividades cotidanas, muitas vezes deixamos de observar
quais são os nossos próprios anseios, necessidades e situação afetiva.
Note também que a estrutura do texto que você acabou de produzir
é aplicada a várias funções contextuais, tais como a tradição de
escrever um diário pessoal, hoje largamente substitu´da pelos blogs,

CEDERJ 83
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Funções da linguagem: o referente, o emissor e
o receptor

facebooks ou sites de relacionamento, nos quais, além de um perl


sobre sua aparência f´sica (função referencial), você também comenta
aspectos sobre o seu tipo psicológico e suas preferências pessoais
(função emotiva).

Linguagens artísticas

Na arte, a função emotiva manifesta-se especialmente nas ten-


dências genericamente denominadas expressionistas. Nelas, a referência
ao mundo concreto de fato funcionam como um pretexto para a mani-
festação dos sentimentos do artista, seja de modo dramático ou l́rico.
Essa função está profundamente relacionada ao paradoxo entre razão e
sensibilidade, analisado em nossa primeira aula. Naquela oportunidade,
você viu que, em diversos per́odos históricos, especialmente os de crise,
tal tendência mais emotiva se manifesta.
Nas artes visuais, isso é percept́vel na dramaticidade do estilo
helen́stico grego (Aula 2) e das formas barrocas da arte do século XVII.
No século XIX, esse teor emotivo manifesta-se no lirismo e melancolia
das pinturas de paisagens do Romantismo, movimento que também
encontra forte expressão na literatura e na música.
No âmbito do teatro, destacam-se a tragédia grega e posteriores
textos cênicos, inspirados neste estilo, bem como o traço confessional
dos monólogos, que apresentam um único ator em cena falando de si
e consigo.
De fato, desde o movimento romântico, a arte ocidental passou a
ter uma forte marca emotiva, de modo que tendemos a identicar como
sendo sua principal função a expressão da subjetividade do artista e das
emoções humanas, caso da escultura tumular apresentada (Figura 5.3)
que representa os sentimentos de amor e perda.

84 CEDERJ
5
AULA
Figura 5.3: Alfredo Oliani: Último adeus, Cemitério São Paulo, túmulo da fam́lia
Cantarella.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Alfredo_Oliani_-_%C3%9Altimo_Adeus_
(T%C3%BAmulo_Cantarella).JPG

Porém, ao discutirmos a diversidade cultural na aula anterior,


você viu que as funções da arte mudam de acordo com os interesses de
cada cultura e contexto histórico e com os propósitos comunicativos
do artista.

O conceito de gênio criativo surge no Renascimento, quando as cie ncias


e as artes emancipam-se da esfera religiosa, que orientava a produção
de conhecimento ao longo da Idade Média. A partir dos movimentos
republicanos do século XVIII, muitos artistas desvinculam-se do mecenato
da Igreja ou das cortes. Nesse per́odo, além do aspecto técnico-criativo,
a estética roma ntica cria o conceito do artista como ge nio maldito,
rebelde, marginal a sociedade, devido ao fato de ele transgredir seus
valores morais, sociais e pol́ticos.
Esta supervalorização da autoria criou uma estreita associação entre a arte
e a função emotiva. No entanto, Gombrich adverte-nos que a arte pode
cumprir diferentes funções de acordo com as motivações dos diferentes
contextos e culturas. Nesse mesmo sentido, Shalhub pondera que é uma
noção inge nua tomar a criatividade como uma manifestação livre e espon-
ta nea do ge nio do artista. Conforme veremos ao longo dessa discussão,
a criatividade art́stica envolve princ́pios ligados a várias outras funções
da linguagem, relacionados ao modo como o artista seleciona e combina
elementos básicos da linguagem (função poética), dialoga com o código
dos estilos de sua época e de outras (função metalingu́stica) e explora os
materiais e tecnologias de que dispõe para trabalhar (função fática).

CEDERJ 85
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Funções da linguagem: o referente, o emissor e
o receptor

ATIVIDADE

Atende ao Objetivo 2

4. Escolha uma das linguagens art́sticas anteriormente mencionadas


(diferente da já utilizada na Atividade 2) e elabore uma atividade para ser
desenvolvida na sala de aula, explorando a função emotiva.

RESPOSTA COMENTADA
A função emotiva explora a relação entre arte e autoria. As ativi-
dades art´sticas com esse foco estimulam o aluno a observar a si,
seus sentimentos, emoções, suas opiniões acerca de si, do outro
e do mundo. Vale salientar que as disciplinas cient´cas tratam de
inúmeras questões polêmicas sobre a vida social e ambiental do ser
humano. Associar de modo interdisciplinar as atividades art´sticas a
esses temas é uma excelente oportunidade para o aluno elaborar e
expressar seus próprios sentimentos e opiniões sobre esses temas,
posicionando-se de modo pessoal (emotivo), distinto da abordagem
objetiva, ligada à função referencial.

FUNÇÃO CONATIVA OU APELATIVA

O receptor liga-se a 2“ pessoa do verbo. Com quem se fala


(CHALHUB, 1990).
O termo latino conatum signica tentar inuenciar alguém com
o emprego de um esforço. Esta função é marcada gramaticalmente pela
presença do imperativo e do vocativo. É revelada, também (CHALHUB,
1990, p. 22), nas fórmulas mágicas e encantatórias, que se expressam
em forma de desejo: Fique com Deus, Vá para o inferno.
Nos seus usos cotidianos, o caráter persuasivo ou apelativo da
função conativa é observado especialmente na propaganda, dirigida a
divulgação de ideias (pol́ticas, religiosas etc.), e na publicidade, vinculada
a divulgação de produtos.

86 CEDERJ
ATIVIDADE

5
AULA
Atende ao Objetivo 1

5. Imagine agora que aquela pessoa que você descreveu sicamente na


Atividade 1 (função referencial) e na Atividade 3 (função emotiva) não
seja você, mas sim um ente querido, ligado a sua fam́lia ou c́rculo de
amizade. Escreva a seguir três conselhos ou ordens que você daria a essa
pessoa para ela viver melhor.
a) ______________________________________________________________
b) ______________________________________________________________
c) ______________________________________________________________

RESPOSTA COMENTADA
Embora dirigido a você, este exerc´cio simula uma situação cona-
tiva. São conativas todas as mensagens que, de modo imperativo,
veiculam uma ordem ou conselho. Provavelmente, a estrutura das
frases que você acabou de produzir seja muito semelhante a outros
tipos de discursos conativos, tais como: mandamentos religiosos
(10 mandamentos cristãos), regras de jogo e legislações em geral,
como é o caso das placas grácas de trânsito, que automaticamente
traduzimos como ordens do tipo: Não ultrapasse, Vire à esquerda
ou à direita etc.

LINGUAGENS ARTÍSTICAS

Note que um mesmo tema pode ser tratado de diferentes maneiras.


A primeira escultura de D. Pedro I apresentada (Figura 5.2) foi elabora-
da de modo impessoal e distanciado, ligando-se ao caráter objetivo da
função referencial. Nesta última (Figura 5.4), ao contrário, D. Pedro I
foi representado de forma dramática e envolvente, aproximando-se da
função emotiva. Pode-se também dizer que esta escultura tem um sentido
apelativo ou conativo, pois D. Pedro I parece conclamar o espectador a
segui-lo. Nesse sentido, Chalhub comenta que a função emotiva sempre
tem um contraponto conativo, pois o emissor quer comover o receptor,
no sentido de mover com.

CEDERJ 87
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Funções da linguagem: o referente, o emissor e
o receptor

Figura 5.4: Estudo para estátua equestre de D.


Pedro I. Louis Rouchet, 1857.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Escultura_do_Brasil

O mesmo ocorre em relação aos movimentos de vanguarda do


século XX. Embora possam enfatizar outras funções, a maioria dessas
experimentações art́sticas tem forte traço conativo. Em vez de seduzir
o receptor com uma forma agradável e facilmente assimilável, busca
chocá-lo com o alto grau de novidade de sua poética, criando um efeito
de estranhamento no público.
Outro aspecto conativo das vanguardas foi estimular a partici-
pação do espectador, rompendo com o caráter passivo ou puramente
contemplativo da obra de arte. Nas artes visuais, surgem obras que
podem ser manipuladas e transformadas pelo público, caso de algumas
esculturas de Lygia Clark constru́das com placas de metal articuladas
por dobradiças. Há ainda os happenings (acontecimentos), obras em
que o artista apenas propõe uma situação que tem um desenvolvimento
imprevis́vel, dependendo da participação do público. Esse tipo de mani-
festação, na fronteira entre as artes visuais e as artes cênicas, é hoje muito
utilizado pelos movimentos sociais, a exemplo do movimento estudantil
brasileiro dos caras-pintadas, ligado a deposição do presidente Collor,
ou de manifestações de grupos ecológicos mundo afora.

88 CEDERJ
O teatro, por sua vez, busca romper a distância entre palco e pla-

5
teia, criando estruturas cênicas mais interativas. Ligado aos movimentos

AULA
pol́ticos contrários a ditadura militar dos anos 1960, Augusto Boal, por
exemplo, desenvolveu a proposta denominada Teatro Invis́vel. Nela, os
atores atuam nas ruas sem se identicarem como tal, criando situações
que exigem a participação do público sobre temas ligados a realidade
social e pol́tica do pa́s.
Denominada pegadinhas, esse tipo de proposta é hoje muito
utilizado por programas de televisão, geralmente expondo o público a
situações vexatórias. Nesse sentido, vale destacar a objeção de Adorno,
lósofo ligado a Escola de Frankfurt, de que a principal estratégia do sis-
tema hegemônico para evitar o efeito transgressor das vanguardas não foi
rechaçá-las, mas sim absorver suas estratégias, banalizando e neutralizando
seus efeitos cr́ticos, como ocorre com as pegadinhas da televisão.

ATIVIDADE

Atende ao Objetivo 2

6. O foco da função conativa é o receptor. Conforme os exemplos men-


cinados, as mensagens ligadas a esta função comunicativa podem ser
imperativas (ordens ou conselhos) ou então incitar uma atitude do recep-
tor, caso das propostas art́sticas citadas. Pesquise na internet os termos
happening e “Teatro Invis́vel, de Augusto Boal”. Em seguida, elabore uma
atividade envolvendo aspectos da vida escolar explorando essas estratégias
poéticas.

RESPOSTA COMENTADA
A função conativa explora a relação entre arte e público, estimulando
a criação coletiva de obras, a interatividade e a cooperação. Por
meio desse tipo de ação art´stica, muitos temas relevantes podem
ser tratados na escola, tais como os preconceitos sociais e raciais, o
assédio entre colegas (bulling), questões ecológicas (desperd´cio de
água, energia, tratamento do lixo), entre outras possibilidades.

CEDERJ 89
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Funções da linguagem: o referente, o emissor e
o receptor

CONCLUSÃO

Podemos concluir essas primeiras discussões sobre a classicação


das mensagens desenvolvida por Jakobson, destacando que ela constitui
uma excelente ferramenta teórica para orientar o trabalho do professor.
De um lado, porque estimula o processo interpretativo, estabelecendo
certos critérios objetivos para a análise das obras de arte e de qualquer
outro produto cultural. Por outro lado, a aplicação de seus conceitos
estimula também o processo criativo, propiciando que o professor
desenvolva atividades com diferentes focos de interesse, levando o
aluno a explorar diferentes aspectos da realidade ou um mesmo tema
por diferentes pontos de vista; neste caso, as perspectivas referencial,
emotiva e conativa.

RESUMO

Nesta aula, discutimos as funções da linguagem ligadas a s tre s pessoas do verbo.


A e nfase na 1“ pessoa (quem fala – função emotiva) gera mensagens cotidianas e
art́sticas de cunho subjetivo, que expressam os sentimentos e opiniões do emis-
sor. A e nfase na 2“ pessoa (com quem se fala – função conativa) ocorre quando
se quer infuenciar o receptor, seja por meio de uma ordem, ou conclamando-o a
aderir a certas ideias (propaganda), ou a consumir certos produtos (publicidade).
Já a e nfase na 3“ pessoa (do que ou de quem se fala – função referencial) destaca-
se nas mensagens cotidianas e art́sticas que se dirigem á descrição objetiva da
realidade, seja sobre seus aspectos naturais ou sociopol́ticos.

INFORMAÇÃO SOBRE A PRÓXIMA AULA

Na próxima aula, trataremos dos fatores que sustentam essa interação comunicativa:
o código (função metalingu́stica) e o canal (função fática).

90 CEDERJ
Funções da linguagem: o

AULA
canal e o código
Terezinha Losada

Meta da aula
Relacionar as discussıes de Roman Jakobson
sobre as funçıes da linguagem ao campo do
ensino de artes.
objetivos

Esperamos que, ao nal desta aula, você seja


capaz de:
1. reconhecer as motivaçıes comunicativas ligadas
às diferentes funçıes da linguagem;
2. aplicar os conceitos discutidos na formulação
de planejamentos didáticos que estimulem os
processos interpretativos e criativos do aluno.
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Funções da linguagem: o canal e o código

INTRODUÇÃO O primeiro modelo do processo comunicativo, desenvolvido pelo psicólogo


austr́aco Karl Bühler, contemplava apenas os três fatores discutidos na aula
passada: o emissor, o receptor e o contexto. Jakobson ampliou e desenvolveu
essa abordagem acrescentando três outros fatores ligados à própria natureza
da linguagem:
1) o canal, que trata do suporte f́sico da mensagem;
2) o código, que envolve a estrutura abstrata da linguagem utilizada, aspecto
que discutiremos nesta aula;
3) a mensagem em si mesma, tema de nossa próxima aula.
Tais fatores, por vezes pouco relevantes nos usos cotidianos da linguagem,
são, conforme buscaremos demonstrar, fundamentais para a compreensão
da arte, razão pela qual as teorias de Jakobson exerceram forte inuência no
desenvolvimento da cr́tica literária e art́stica.

FUNÇÃO FÁTICA

Liga-se ao canal, ao suporte f́sico em que a mensagem é trans-


mitida. Onde? (CHALHUB, 1990).
Na linguagem cotidiana, usamos a função fática para estabelecer
e manter o contato com o receptor. Isso é percept́vel nas formas de cum-
primentos (Oi! Como vai?), na troca de olhares e expressões corporais ou
em expressões tais como é, isto mesmo, ham-ham, t́picas quando
falamos ao telefone.
No mundo contemporâneo, a análise desta função se destaca
devido a crescente presença dos meios de comunicação em nossas vidas.
Conforme discutimos em nossa primeira aula, os pensadores da Escola
de Frankfurt foram os primeiros cr́ticos da indústria cultural. Segundo
eles, ao mesmo tempo que promoviam uma popularização da cultura,
tornando-a acess́vel ao grande público, os novos meios de comunicação
(cinema, m́dia impressa, televisão) também provocavam uma banalização
e massicação dos valores culturais.
No sentido inverso, como vimos, foram os argumentos otimistas de
McLuhan que, mesmo antes do advento da internet, já preconizavam que
os meios de comunicação transformariam o mundo numa imensa aldeia
global. Analisando o impacto das novas m́dias no processo comunicativo,
McLuhan arma que o meio é a mensagem. Para entendermos melhor
o sentido desta insólita proposição, vamos analisar um exemplo prático.

92 CEDERJ
ATIVIDADE

6
AULA
Atende ao Objetivo 1

1. Imagine que você queira transmitir a mensagem ”Eu te amo” à pessoa


amada. Tal mensagem pode ser sussurrada no ouvido dessa pessoa, pode
ser escrita no cartão de um buquê de ores ou então, como fazem atual-
mente alguns casais, pode ser expressa em letras garrafais numa faixa de
propaganda estendida de lado a lado na rua onde reside o destinatário.
Você acha que esses diferentes meios alteram o signicado da mensagem?
Por quê?

RESPOSTA COMENTADA
Embora os termos sejam os mesmos – “Eu te amo” –, certamente
cada um dos meios citados causa um impacto diferente no recep-
tor (função conativa). Pois os meios não são ve´culos neutros, ao
contrário, eles condensam diferentes potencialidades expressivas,
valores simbólicos e ideológicos (função fática). Assim, podemos
distinguir o sentido mais ´ntimo e mesmo corriqueiro do primeiro
exemplo, do tradicional e o sentido simbólico, caráter romântico do
buquê de ores, do extravagante sentido público do último exemplo.
Ou seja, atribu´mos valores diferentes a uma mensagem de acordo
com o meio pelo qual ela é veiculada. Por isso, é comum, diante
da desconança de alguém sobre uma informação que estamos
transmitindo, armarmos que aquilo é verdade porque você viu num
livro, jornal ou canal de televisão.

LINGUAGENS ARTÍSTICAS

De acordo com suas intenções comunicativas, o artista também


dispõe de diferentes meios e materiais para elaborar suas mensagens. Ele
pode utilizar os suportes e técnicas art́sticas tradicionais ou então as
mais recentes tecnologias, como também utilizar materiais inusitados,
como é caso das obras de Franz Krajcberg apresentados na Figura 6.1.
Este artista realiza as suas esculturas a partir de restos mortos de troncos,
galhos e ra́zes de árvores, criando obras de alta qualidade estética e que
também incitam reexões ecológicas.

CEDERJ 93
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Funções da linguagem: o canal e o código

Figura 6.1: Detalhe do Espaço Franz Krajcberg, Curitiba, Brasil.


Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Franz_Krajcberg_space.jpg

Observe que as demais esculturas apresentadas na aula anterior


também possuem suas caracter́sticas fáticas. No entanto, a utilização
do mármore ou da fundição em bronze são canais ou técnicas tão tra-
dicionais no campo da escultura que tomamos esse aspecto como algo
natural, sem considerarmos esse aspecto relevante para a interpretação
da obra. Na obra de Krajcberg, diferentemente, esse aspecto fático é
sem dúvida aquilo que mais nos chama a atenção, tornando essa função
determinante na interpretação da mensagem.
A partir do século XX, o sentido de muitas obras será determi-
nado por estas escolhas fáticas. Nas artes visuais, os cubistas utilizaram
a colagem de jornais e outros elementos em suas telas; os construtivis-
tas russos criavam suas esculturas a partir da montagem de materiais
industriais (madeira, ferro, vidro). Duchamp utilizou a apropriação de
objetos já fabricados (ready-made), caso da famosa obra Fonte, que é
um mictório produzido em série e ironicamente assinado por ele com
um pseudônimo. Entre inúmeros outros exemplos, na atualidade pode-
se destacar o trabalho de Jenny Holzer, artista que utiliza camisetas,
cartazes, outdoors para veicular suas obras.

94 CEDERJ
6
AULA
Figura 6.2: Marcel Duchamp, Fonte: ready-made assinado
com o pseudo nimo R. Mutt, 1917.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Fontaine_
Duchamp.jpg

Tal pesquisa fática é notável na música contemporânea quando


são criados efeitos sonoros a partir de instrumentos não tradicionais,
seja utilizando objetos do cotidiano ou os recursos das tecnologias de
ponta. No teatro e na dança, a função fática está relacionada aos recursos
técnicos ligados a iluminação, cenograa e gurino. Em todos os casos, a
seleção e a combinação dessas técnicas e materiais afetam profundamente
o signicado das obras.
Diante desses exemplos, observamos que a função fática inscreve
a relação entre arte e tecnologia, pois o surgimento de novos materiais,
suportes e tecnologias sempre inuenciou o desenvolvimento da Histó-
ria da Arte. A invenção da imprensa foi determinante para a Literatura,
possibilitando, por meio do livro impresso, sua divulgação para o grande
público. O mesmo ocorreu no campo da música, diante do aparecimento
das tecnologias de gravação e reprodução da fugacidade dos sons. A
criação da tela de tecido, suporte ex́vel e transportável, incrementou o
mercado de arte no Renascimento. Os impressionistas desenvolveram o
princ́pio da mistura ótica, técnica de justaposição de pontos coloridos,
hoje utilizada na indústria gráca como, por exemplo, as impressoras
de computador.

CEDERJ 95
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Funções da linguagem: o canal e o código

Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/
Ficheiro:Camera_obscura.jpg

É importante salientar que os artistas sempre desenvolveram e utilizaram


as tecnologias dispon́veis na época para realizar suas obras. No per́odo
do Renascimento, por exemplo, Durer desenvolveu a malha quadriculada,
para orientar a cópia dos seus modelos. Leonardo da Vinci utilizou a
ca mara escura, equipamento que posteriormente possibilitou o desen-
volvimento da máquina fotográca. Desse modo, é muito aceitável supor
que, se vivessem na atualidade, esses dois artistas do Renascimento não
hesitariam em usar as tecnologias da informática para produzir suas
obras. O que voce acha?

ATIVIDADE

Atende ao Objetivo 1

2. As novas tecnologias ligadas à informática permeiam todas as esferas do


cotidiano na atualidade. O número de linhas de telefonia celular no Brasil
aproxima-se do número de habitantes, e a maioria desses equipamentos
possui câmeras fotográcas. Os computadores conectados à rede da internet
se alastram nos lares, comunidades e escolas, tornando poss́vel o acesso e
a manipulação de inúmeras informações verbais, imagéticas e sonoras. Esse
conjunto de novos meios não pode ser negligenciado pelo professor!
Avalie o potencial de recursos tecnológicos dispon́veis entre os alunos
e escolas de sua região e planeje uma atividade art́stica (artes visuais,
artes cênicas, música e suas poss́veis inter-relações) que poderiam ser
aplicadas em sala de aula.

96 CEDERJ
6
AULA
RESPOSTA COMENTADA
Uma atividade muito interessante, e já bastante difundida, envolven-
do a função fática é a utilização de materiais recicláveis nas aulas de
artes (“sucatas” industriais ou orgânicas, como fez Kracjberg). Nesta
atividade, entretanto, decidimos focar a utilização das novas m´dias.
Pois, apesar de despertar grande interesse nos estudantes e estar
cada vez mais presente em suas vidas, o uso dessas tecnologias
na escola ainda é muito incipiente. Exatamente por serem alunos
de um curso semipresencial, que utiliza essas novas tecnologias
para formar futuros professores, vocês representam a vanguarda
dessa transformação, tão importante para a educação do futuro.
Utilizando os recursos do computador (softs de edição de imagem
e de som) e as oportunidades de pesquisa da internet, você pode
desenvolver inúmeras atividades que enriqueçam as aulas de artes
e que relacionem seus conteúdos com outros aspectos da vida e
das ciências.

FUNÇÃO METALINGUÍSTICA

O fator em evidência nesta função é o código, identicado pela


questão: Com o quê? (CHALHUB, 1990).
Na função referencial usamos a linguagem para nos referir aos
objetos do mundo. Na função metalingu́stica, a linguagem é utilizada
para falar sobre a própria linguagem.
Os exemplos emblemáticos desta função comunicativa são os
dicionários e as gramáticas, pois são textos que tratam do sentido e
das regras de uso dos termos da própria linguagem. Na fala cotidiana,
essa função é percebida no uso de expressões tais como: Você me
compreendeu?, Não foi isso que quis dizer, Isto é, Em outras
palavras etc.

CEDERJ 97
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Funções da linguagem: o canal e o código

Este texto também é um bom exemplo de metalinguagem, pois


estamos usando a linguagem para discutir os diversos tipos e usos da
linguagem. Aliás, Samira Chalhub (2001) destaca que o trabalho inter-
pretativo da cr́tica nada mais é do que um exerc́cio metalingu́stico.
O mesmo ocorre com a atividade de tradução, especialmente a poética,
que, para além do sentido literal, precisa resgatar o sentido poético de
um poema ou romance, tentando reconstru́-lo no universo de possibi-
lidades do código de outro idioma. O mesmo ocorre com as traduções
intersemióticas, tais como a adaptação de um romance para o cinema,
ou de músicas que inspiram pinturas, entre outros exemplos.

ATIVIDADE

Atende ao Objetivo 1

3. Para discutir esta função da linguagem, sempre pergunto aos meus alunos
por que Beethoven, sendo um músico tão criativo, nunca compôs um samba?
Será que ele, sendo um compositor alemão do século XVIII, poderia compor
um samba se quisesse? O que você acha?

RESPOSTA COMENTADA
Para responder a esta questão, teremos de resgatar nossas discus-
sões sobre a dimensão cultural da arte, pois, independentemente
de sua grande criatividade musical, sendo um compositor alemão
do século XVIII, Beethoven jamais poderia compor um samba; do
mesmo modo como você não é capaz de criar um texto em grego
sem conhecer o código desse idioma. Para compreender melhor
esta questão, vamos resgatar as ideias de Ernst Gombrich, teórico
discutido na Aula 3.

98 CEDERJ
LINGUAGENS ARTÍSTICAS

6
AULA
Quando Gombrich arma que nenhum artista é independente
de predecessores e modelos (1986, p. 24), ele quer dizer que aquilo que
determina a preservação ou mudança dos estilos art́sticos é a metalin-
guagem, isto é, o modo como o artista dialoga com os códigos de sua
própria tradição cultural e com as informações que porventura tenha
sobre outras culturas.
Em outras palavras, do mesmo modo como só conseguimos pen-
sar e nos comunicar a partir dos códigos lingu́sticos que conhecemos,
o artista também cria suas obras a partir dos modelos de representação
(schematas) por ele já conhecidos. Portanto, o ato criativo não é uma
inspiração pura, livre de qualquer condicionamento. Se fosse assim, argu-
menta Gombrich, as obras de arte seriam absolutamente distintas entre
si. Não seria poss́vel contar a História da Arte, distinguindo as caracte-
r́sticas comuns (estilo ou código) de cada época e de cada lugar.
Utilizando a distinção lingu́stica entre l́ngua e fala, Gombrich
arma que os estilos art́sticos também são construções coletivas que
funcionam como um idioma (l́ngua) sobre o qual o artista articula sua
expressão individual (fala). Nessa prática construtiva, os artistas são
condicionados por sua tradição cultural e são, também, os responsáveis
por sua transformação. Do mesmo modo, são os falantes, ou usuários
da l́ngua, que a transformam ao longo da História, criando novos
termos, como são as g́rias, e imprimindo novos sentidos a s palavras já
existentes, conforme atestam as pesquisas etimológicas.
Portanto, toda obra de arte tem um traço metalingu́stico, posto
que traduz ou transforma algum código estil́stico preexistente. Retoman-
do nosso exemplo, podemos dizer que todo samba é assim identicado
porque repete algo do código dessa tradição, ao mesmo tempo que pode
estar também inovando-a e transformando-a.
Essas inovações, contudo, não são gratuitas. Elas atendem aos
novos interesses comunicativos dos artistas e do público. A partir da
Revolução Industrial do século XIX e da revolução tecnológica atual,
as intensas transformações sociais repercutem no âmbito da cultura em
geral e da arte em particular. A ruptura com a tradição e a busca pelo
novo tornou-se um paradigma da arte ocidental, de modo que o tema

CEDERJ 99
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Funções da linguagem: o canal e o código

ou o objetivo da maioria das obras de arte passou a ser a discussão do


próprio conceito arte, tornando-se, fundamentalmente, obras com ênfase
na função metalingu́stica.
As pesquisas da arte abstrata (Figura 6.3) representam essa ten-
dência de ruptura com a tradição. Rompe-se com a tradição gurativa
cultivada desde a Grécia Antiga (função referencial). Rompe-se com o
valor subjetivo da obra, cultivado pela tradição romântica (função emo-
tiva). Observe que o artista Bruno Giorgi utiliza princ́pios matemáticos
para elaborar sua obra, denominado-a Teorema.

Figura 6.3: Escultura em mármore de Bruno Giorgi, intitulada Teorema, 1987-88.


Instalada na praça da Alfa ndega, defronte ao Banrisul. Porto Alegre, Brasil. Fundo
editado.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Teorema_-_Bruno_Giorgi.jpg

100 CEDERJ
Este intenso exerc́cio metalingu́stico acabou transformando a

6
inovação, em si mesma, como um dos principais critérios de avaliação e

AULA
valorização da arte ocidental. A busca por novos códigos de representa-
ção se tornou uma função da arte, particularmente entre os movimentos
de vanguardas do século XX. Em outras palavras, há na arte desse per́odo
uma grande ênfase na função metalingu́stica. Os artistas utilizam a arte
para discutir o próprio conceito de arte, subvertendo seus códigos tradi-
cionais. Disso resulta também uma grande ênfase na função fática, por
meio da pesquisa de novos materiais e meios adequados a esse propósito
altamente cr́tico e experimental, caso da emblemática obra Fonte, de
Marcel Duchamp.

CONCLUSÃO

Nesta aula, associamos os conceitos de Jakobson, sobre as funções


da linguagem, a s análise culturais de Gombrich sobre as relações entre
forma e função na identicação dos estilos art́sticos.
Embora relacionados a todos os usos da linguagem, vimos que os
conceitos de Jakobson representam um importante instrumento teórico
para a interpretação das obras de arte e também para estimular a pesquisa
de estratégias didáticas, destacando, particularmente, a importância de
se discutir os diferentes códigos art́sticos (função metalingu́sticas) e
suas tecnologias de produção (função fática).

ATIVIDADE FINAL
Atende ao Objetivo 2

Complementando a atividade de visita a museus, a arte-educadora Ana Mae


Barbosa propõe a realização de exerc́cios de releitura de obras de arte. Essa técnica
se distingue da simples cópia, pois deve estimular o estudante a contextualizar
a obra de arte.

Por meio desse tipo de atividade o aluno desenvolve, ao mesmo tempo, suas
habilidades como receptor de arte e como emissor, produzindo trabalhos art́sticos.

CEDERJ 101
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Funções da linguagem: o canal e o código

Tais visitas a museus hoje podem ser feitas de modo virtual, por meio dos sites
dessas instituições. A seguir estão os links de dois importantes museus do estado
do Rio de Janeiro: Museu Nacional de Belas-Artes – MNBA (http://www.mnba.gov.
br/) e Museu de Arte Moderna – MAM-RJ (http://www.mamrio.com.br/).

Visite esses museus e escolha uma obra que ache interessante. Faça a releitura
dessa obra percebendo, desse modo, como tal atividade pode ser aplicada em sala
de aula. Utilize o quadro a seguir ou outro suporte, de acordo com os materiais
(função fática) que desejar empregar.

102 CEDERJ
6
RESUMO

AULA
Na aula anterior, discutimos as funções da linguagem ligadas a s tre s pessoas do
verbo: 1“ pessoa (quem fala – função emotiva), 2“ pessoa (com quem se fala –
função conativa) e 3“ pessoa (de quem ou do que se fala – função referencial).
Nesta aula, abordamos os elementos que sustentam esse processo comunicativo.
O código (função metalingu́stica) liga-se a dimensão abstrata da linguagem,
envolvendo os diferentes idiomas (portugue s, france s, latim) e também as carac-
ter́sticas convencionais que distinguem os vários estilos art́sticos (Renascimento,
Barroco, Cubismo etc.). O canal (função fática), por outro lado, está relacionado
a dimensão concreta dos meios utilizados para veicular a mensagem, sejam eles
tradicionais (livro, pintura a óleo sobre tela), ligados a s inovações tecnológicas,
ou experimentais, como a pesquisa de novos suportes e materiais na arte. Vimos
nos exemplos apresentados que a pesquisa de novos códigos de representação
e meios de veiculação é uma das principais caracter́sticas da arte moderna e
contempora nea.

INFORMAÇÃO SOBRE A PRÓXIMA AULA

Na próxima aula, vamos discutir a função poética explorando a relação entre


arte e criatividade, momento em que voce será desaado a aplicar essas diversas
funções da linguagem já discutidas na interpretação de obras de arte e outros
produtos culturais.

CEDERJ 103
Funções da linguagem: a

AULA
mensagem
Terezinha Losada

Meta da aula
Relacionar as dicussıes de Roman Jakobson
sobre as funçıes da linguagem no campo do
ensino de artes.
objetivos

Esperamos que, ao nal desta aula, você seja


capaz de:
1. reconhecer as motivaçıes comunicativas ligadas
às diferentes funçıes da linguagem;
2. aplicar os conceitos discutidos na formulação
de planejamentos didáticos que estimulem os
processos interpretativos e criativos do aluno.
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Funções da linguagem: a mensagem

INTRODUÇÃO As teorias de Jakobson marcam uma guinada nas pesquisas lingu́sticas.


Até o século XX, os estudos sobre a linguagem limitavam-se à análise dos
aspectos gerais e abstratos da l́ngua, discutindo suas estruturas sintáticas
e morfológicas. A fala, isto é, o uso concreto que fazemos da l́ngua, não
era considerada objeto de estudo cient́co, devido ao seu caráter mutável
e circunstacial.
Analisando o processo comunicativo, Jakobson identicou certas caracter́s-
ticas gerais no universo innito das mensagens que articulamos, levando-o a
desenvolver a classicação das mensagens que ora estamos estudando. Em
outras palavras, ele demonstrou que era poss́vel estabelecer certos critérios
objetivos para a atividade interpretativa.

Quadro 7.1: Classicação das mensagens

Fator
Função da linguagem Questão Relação
comunicativo

Do que se fala?
Função referencial Referente De quem se fala? Arte e realidade

Função emotiva Emissor Quem fala? Arte e autoria

Função conativa Receptor Com quem se fala? Arte e público

Onde se fala?
Função fática Canal (meios, suportes, ma- Arte e tecnologia
teriais)

Com o que se fala?


Função metalingu́stica Código (diferentes idiomas e Arte e estilos
linguagens)

Função poética Mensagem Como se fala? Arte e criatividade

Cada um dos fatores comunicativos presentes em toda mensagem permitem-


nos formular diferentes questões e estabelecer diferentes relações que orien-
tam o processo de interpretação da mensagem em análise.
Nesta aula, iremos discutir a função poética, que trata da própria mensagem.
Diferente das demais funções já discutidas ligadas ao processo interpreta-
tivo, esta função vincula-se ao processo criativo. Sua questão é: “como” a
mensagem foi constru́da?

106 CEDERJ
FUNÇÃO POÉTICA

7
AULA
O fator enfatizado nesta função é a mensagem. Podemos identi-
cá-lo perguntando: Como se fala? (CHALHUB, 1990).
Vamos iniciar a discussão desta função realizando a seguinte
atividade.

ATIVIDADE

Atende ao Objetivo 1

1. Responda:
a) Quantas vezes você costuma ler uma matéria de jornal de que gostou
e que achou interessante?

b) E uma música de que tenha gostado e que tenha achado interessante,


quantas vezes você costuma escutá-la?

RESPOSTA COMENTADA
Em tom de ironia, certa vez uma aluna já formada em jornalismo
respondeu-me que lê as reportagens jornal´sticas “meia” vez, pois
logo antevê sua abordagem, perdendo o interesse. De fato, para a
maioria de nós basta uma boa leitura do jornal, ao passo que pode-
mos escutar uma música inúmeras vezes sem nos cansar, extraindo
de cada escuta diferentes sentidos e sentimentos. Isso ocorre porque
na matéria jornal´stica predomina o valor cognitivo ou informativo da
mensagem, ligado à função referencial da linguagem, de modo que
seu conteúdo pode ser expresso de diferentes formas sem preju´zo
do seu teor informativo. Na arte, ao contrário, forma e conteúdo
relacionam-se de modo único, indissociável. É essa interrelação entre
o “o quê” e o “como” que imprime o seu valor estético, aspecto que
Jakobson dene como função poética.

CEDERJ 107
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Funções da linguagem: a mensagem

Sem dúvida, a preocupação com a maneira como a mensagem é


constru́da é uma caracter́stica proeminente na poesia e na arte de modo
geral. No entanto, Jakobson (1991, p. 128) adverte que qualquer tenta-
tiva de reduzir a esfera da função poética a poesia ou de connar a poesia
a função poética seria uma simplicação excessiva e enganadora.

Tal ênfase pode ser vericada em outros tipos de mensagens.


Quando vamos fazer um discurso em público, apesar de sabermos de
antemão o seu propósito, gastamos horas e horas pensando no modo
de comunicá-lo. Os pol́ticos são famosos por suas frases de efeito, e
muitos jornais e revistas costumam ter uma sessão só para estampar as
melhores frases da semana. O jogo de palavras dos slogans, provérbios e
trocadilhos é outro exemplo no qual o valor da mensagem está no modo
exato como as palavras são selecionadas e combinadas.
De fato, a seleção e a combinação são dois modos básicos de
arranjo da linguagem, presentes na elaboração de qualquer mensagem;
portanto, aquilo que determina a ênfase na função poética é o zelo no
trato desses dois mecanismos. Esse aspecto pode ser observado quando
selecionamos e combinamos as roupas que vamos vestir, quando nos
detemos na arrumação de uma mesa para um jantar especial, entre tantos
outros exemplos cotidianos.

O eixo da seleção

Numa frase, um termo pode ser substitu́do por outro com teor
equivalente, por exemplo: Eu te amo, Eu te adoro, Eu gosto de você.
Esse é o eixo da seleção. Ele é guiado pela similaridade, pela analogia
semântica dos sinônimos e antônimos. Na função poética, aquilo que
predomina nas seleções não é apenas o valor denotativo (literal) da
palavra, mas especialmente o seu teor conotativo, ligado a s qualidades
sens́veis que a palavra sugere, isto é, suas caracter́sticas sonoras, r́t-
micas e grácas. Por isso, Jakobson associa o eixo da seleção ao caráter
alusivo da metáfora.
Ao discutir o conceito de denotação, comentamos que aquilo que
liga uma palavra (signicante) ao seu sentido (signicado) é uma conven-
ção. No entanto, Jakobson irá relativizar a ideia corrente na lingu́stica
de que esta relação é estritamente arbitrária. Por exemplo, na palavra

108 CEDERJ
trovão, a vibração da letra r e a articulação aberta do fonema ão,

7
também utilizado para criar o grau aumentativo das palavras, parecem

AULA
guardar um nexo de analogia com a magnitude dos ru́dos e vibrações
concretas do fenômeno natural representado por esta palavra. Isto não
signica que irei confundir o termo trovão com o termo Brandão,
que possui caracter́sticas similares, pois acima desses atributos quali-
tativos, aquilo que governa o código é a convenção. Contudo, devido a
semelhança entre os dois termos e a essas analogias sens́veis, se for criar
um personagem agressivo e intempestivo numa história, certamente o
nome Brandão lhe cairá muito bem. São essas relações metafóricas que
orientam o eixo da seleção na mensagem poética.

O eixo da combinação

A combinação é guiada pela contiguidade, pelo deslocamento.


Por meio da combinação, as palavras selecionadas são ordenadas numa
determinada sequência, de acordo com as diversas regras e opções sintá-
ticas do código. Por exemplo, falamos Eu te amo, e não Eu te gosto.
Sendo gostar um verbo transitivo indireto, a escolha desse termo implica
a simultânea utilização de outro modelo combinatório, qual seja: sujeito
(Eu) – verbo (gosto) – objeto indireto (de você).
Jakobson associa o eixo da combinação a meton́mia, gura de
linguagem que afeta a sequência sintática da frase. A partir das relações
contextuais entre dois termos diferentes, pelo nexo meton́mico, podemos
suprimir um deles, deixando-o subentendido no outro. Assim, quando
armo gosto de Picasso, estou, de fato, querendo dizer que gosto (da
obra) de Picasso. Esta caracter́stica da meton́mia que permite alterar,
fragmentar ou subverter a sequência da frase é muito explorada na
literatura, especialmente na poesia, com o objetivo de criar seus jogos
de rima e métrica.
Analisando esses dois mecanismos de elaboração da linguagem,
Jakobson (1991, p. 130) arma que a função poética projeta o princ́pio
da equivalência do eixo da seleção para o eixo da combinação. A equiva-
lência é promovida a condição de recurso constitutivo da sequência.

CEDERJ 109
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Funções da linguagem: a mensagem

Arte e processo criativo

Embora presente em outras mensagens, a função poética é estrei-


tamente relacionada a linguagem art́stica. Sem pretender esgotar o con-
ceito de arte, Jakobson (1969, p. 128) argumenta que apenas esta função
pode responder a questão sobre qual é o caracter́stico indispensável,
inerente a toda obra poética.
Pois é a função poética que imprime a chamada qualidade
estética da obra de arte, percept́vel na maneira especial e singular
em que o artista selecionou e combinou os diversos fatores do pro-
cesso comunicativo.
Em outras palavras, para abordar qualquer aspecto da realidade
(função referencial) ou expressar sua subjetividade (função emotiva),
instigando a atenção do público receptor (função conativa), o artista
precisa selecionar e combinar as possibilidades expressivas da linguagem
(função poética).
Este processo criativo envolve também a seleção e combinação dos
elementos dos códigos estil́sticos que o artista conhece (função meta-
lingu́stica), bem como dos materiais e tecnologias de que dispõe para
trabalhar (função fática). Isso pode ser feito obedecendo aos cânones
da tradição cultural ou subvertendo-os de modo inovador. Congura-se
assim a malha de interação dos diversos fatores do processo comunicativo
na construção da mensagem.
Assim, podemos concluir que embora possa estar presente em
outros tipos de mensagem, tudo aquilo que chamamos arte, nos mais
diversos tempos e lugares, envolve a função poética, isto é, a seleção
e combinação cuidadosa e precisa dos elementos da linguagem. O
objetivo dessas obras é sempre o de comunicar algo por meio de um
efeito estético. No entanto, chamamos obras-primas, aquelas situações
em que o artista cria um efeito estético tão especial e profundo que
sequer sabemos dizer o que é, por serem impressões e sentimentos
irredut́veis a conceitos, que escapam a racionalidade, como tão bem
formulou Kant.
Decerto podemos achar que alguns artistas ou algumas obras
espec́cas cumprem melhor essa espetacular e arrebatadora função.
Porém, como se diz, Gosto não se discute! ou Há gosto para tudo!.
Por isso, tal como Kant, Jakobson também nos adverte que seu objetivo

110 CEDERJ
não era julgar a arte, mas apenas estabelecer alguns critérios para a sua

7
apreciação, embora seu sentido último e mais verdadeiro nunca se esgote

AULA
por meio da análise cr́tica.

A Fonte de Marcel Duchamp


A obra Fonte, de Marcel Duchamp, é considerada um marco da história
da arte moderna e contempora nea. Ela é citada pela cr́tica de arte
como a s́ntese e a expressão mais radical da ruptura com a tradição
art́stica promovida pelas vanguardas do in́cio do século XX, sendo ainda
reconhecida como uma das principais refere ncias da produção art́stica
contempora nea.
Vamos, então, utilizar os critérios desenvolvidos por Jakobson para
buscar compreender melhor os signicados e a importa ncia histórica
dessa obra.

Figura 7.1: Fonte, de Marcel Duchamp.


Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Fontaine_
Duchamp.jpg

FUNÇÃO REFERENCIAL

Referente: Do que ou de quem se fala?


A gura dentro do boxe representa um mictório masculino, pro-
duzido industrialmente. Porém, foi assentado num pedestal e exposto
numa galeria de arte, em vez de ser xado na parede de um banheiro,
local onde normalmente é encontrado. Ou seja, isso é efetivamente um
vaso sanitário, algo já feito (ready-made).

CEDERJ 111
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Funções da linguagem: a mensagem

Decerto essa atitude de Duchamp coloca em crise a relação entre


arte e realidade até então cultivada pela tradição art́stica. Isso porque,
em vez de representar a realidade, ele simplesmente apresenta algo
da realidade num contexto art́stico – a galeria de arte.

FUNÇÃO EMOTIVA

Emissor: Quem fala?


Normalmente, consumimos esses produtos industriais sem nos
preocuparmos sobre quem os criou originalmente, e, de todo modo,
não foi Duchamp quem desenhou esse sanitário, ele simplesmente se
apropriou dele; portanto, essa é uma obra impessoal. Ela não revela o
primor técnico do artista, nem sua subjetividade ou seus sentimentos,
exceto pelo gesto rápido da assinatura e data colocada na peça, como
normalmente se faz nas obras de arte. Porém, não é o seu nome que
está registrado ali, mas o pseudônimo R. Mutt. Decerto essa atitude
de Duchamp coloca em crise a relação entre arte e autoria até então
cultivada pela tradição art́stica.

FUNÇÃO CONATIVA

Receptor: Com quem se fala?


Imagine agora a reação do público no ano de 1917 ao encontrar
esta peça exposta numa galeria de arte. Choque total! Decerto esta ati-
tude de Duchamp colocou em crise as relações entre arte e público até
então cultivadas pela tradição art́stica, isto é, a concepção de que a arte
dirige-se ao deleite do esp́rito, a contemplação do belo.

FUNÇÃO FÁTICA

Canal: Onde se fala?


Conforme discutimos na aula anterior, a estratégia utilizada por
Duchamp para gerar todas essas crises foi eminentemente fática.
Ou seja, em vez de usar materiais e suportes tradicionais, tais como a
pintura sobre tela ou a escultura em mármore, ele utilizou algo novo,
até então inusitado no campo da arte. Neste caso, a apropriação de um
objeto cotidiano.

112 CEDERJ
FUNÇÃO METALINGUÍSTICA

7
AULA
Código: Com o quê se fala?
Sem dúvida, essa escolha fática de Duchamp gerou uma profunda
crise metalingu́stica no público, isto é, as pessoas olhavam aquilo e
provavelmente se perguntavam: O que está acontecendo? Por que esse
obejto, ligado a vida privada e a s necessidades biológicas mais primárias
do ser humano, está aqui exposto e assinado como se fosse uma obra
de arte? Que petulância! Será que este artista esta querendo zombar de
nosso bom-senso, de nosso esp́rito cr́tico? Isso não é arte! Ou será?
Como analisar essa situação se não se encaixa em nenhum código, em
nenhuma convenção art́stica antes prevista?
O fato é que esta foi a obra mais comentada da exposição e até hoje
suas repercussões estão sendo discutidas. Diante disso, pode-se dizer que
por meio de uma estratégia fática, a seleção de um mictório, Duchamp
criou uma obra que enfatiza a função metalingu́stica. Isso porque ela é
uma obra de arte que nos leva a reetir sobre o próprio conceito de arte,
discutindo seus limites e suas imprevis́veis possibilidades.

CONCLUSÃO

Identicando o que o artista selecionou e combinou na criação de


sua obra, analisamos no texto anterior como os diversos fatores do pro-
cesso coumunicativo nela se manifestam: Referente, Emissor, Receptor,
Canal e Código. Em outras palavras, discutimos sua estrutura poética
ou função poética.
Desse modo, independentemente de gostarmos ou não dessa
obra, pudemos compreender alguns de seus signicados e as razões de
sua importância histórica, isto é, o seu caráter de contestação radical
dos princ́pios art́sticos cultivados por séculos pela tradição art́stica
ocidental. Olhando por outro prisma, também se pode dizer que esta
obra é uma autêntica representante da cultura art́stica ocidental, pois
seu teor cr́tico e profundamente irônico só faz sentido numa sociedade
em que a arte tenha cultivado todos os valores que ela contesta. Se antes
de Duchamp os cr́ticos e lósofos tinham grande diculdade em denir
o que é a arte, depois dele esta tarefa tornou-se ainda mais dif́cil.

CEDERJ 113
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Funções da linguagem: a mensagem

ATIVIDADE FINAL

Atende aos Objetivos 1 e 2

Agora é sua vez de aplicar os conceitos de Jakobson. Escolha uma obra de arte e
desenvolva a sua análise cr́tica. Utilize a mesma estrutura de análise da obra de
Duchamp apresentada na Resposta Comentada da outra atividade e dos demais
exemplos discutidos nas aulas anteriores.

Seja conativo! Imagine que voce está escrevendo um texto para algum jornal e queira
realmente despertar o interesse do público sobre algum artista e sua obra.

Voce pode escolher qualquer obra: do passado ou atual; ligada a cultura erudita,
a cultura popular ou a cultura de massa; feita por um artista renomado, pouco
conhecido, ano nimo, ou mesmo por voce . Tal obra pode estar ligada a qualquer
linguagem: música, artes visuais, teatro, dança, cinema, v́deo, videoclip, literatura,
quadrinhos, grate etc., etc., etc. Antes, porém, observe as orientações a seguir:

Em primeiro lugar, é importante salientar que a função poética é um aspecto


subentendido a toda e qualquer obra que voce escolha. Diante disso, esta função
NÃO SERÁ VÁLIDA COMO CLASSIFICAÇÃO, pois a função poética é, de fato, a
incógnita a ser desvendada, respondendo-se a seguinte questão:

COMO o artista SELECIONOU e COMBINOU os elementos ligados aos diversos


fatores do processo comunicativo?

A partir dessa questão, voce deve analisar como cada um dos demais fatores
apresenta-se na obra, tecendo um breve comentário sobre cada função da
linguagem: referencial, emotiva, conativa, fática e metalingu́stica. Ao nal, voce
deve identicar qual dessas funções lhe parece mais relevante na interpretação
daquela obra, justicando sua escolha.

É importante também considerar os seguintes aspectos:

1. Note que esta classicação nal pode variar de pessoa para pessoa. Ela
revela a sua interpretação da obra e, como vimos uma obra de arte pode gerar
múltiplos sentidos sem nunca se esgotar. O importante é que voce justique
os seus argumentos, utilizando corretamente os conceitos. Em outras palavras,
nesta atividade o professor irá avaliar apenas a compreensão dos conceitos e sua
aplicação em novas situações.

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2. É importante salientar também que este tipo de análise é denominada semiótica

7
ou semiológica, por se deter nos aspectos intr́nsecos da linguagem, isto é, nas

AULA
características presentes na obra. Portanto, na justicativa sobre cada uma das
funções da linguagem (as subsidiárias e a principal) voce deve descrever os aspectos
observados relativos a cada fator comunicativo.

3. Todos os fatores comunicativos devem ser analisados, pois de algum modo eles
contribuem para a interpretação da obra. Note que em alguns casos um fator
comunicativo é importante exatamente pela ausência daquela caracter́stica na
obra. Por exemplo, na primeira escultura de D. Pedro I (Figura 5.2), apresentada
na Aula 5, a função emotiva não se manifesta, o que reforça o sentido objetivo de
sua e nfase puramente referencial, ao passo que outra representação de D. Pedro I
(Figura 5.4) é altamente emotiva, permitindo, inclusive, que ela seja classicada
como conativa, pois D. Pedro I parece incitar o público a segui-lo. Nesse mesmo
sentido, pode-se dizer que na arte abstrata há certo sentido de fuga da realidade,
devido aos artistas ligados a este estilo terem abandonado a função referencial
da linguagem.

4. Por m, é important́ssimo frisar que fatores externos à obra também iluminam
a sua interpretação, tais como dados históricos, sociológicos e biográcos. Muitas
cr́ticas são feitas a s análises semióticas, acusando-as de não considerarem estes
aspectos. Isso é uma meia-verdade! De fato, muitos teóricos recusam a consideração
destes fatores em suas análises, xando-se apenas nas caracter́sticas internas da
obra, sendo, por isso, chamados formalistas. Outros salientam sua importa ncia,
porém com a ressalva de que tais contextualizações devem sempre ser aplicadas ao
esclarecimento dos atributos percept́veis na obra. Propomos que nesta atividade
seja adotada essa segunda perspectiva. Portanto, diante da obra escolhida, é
interessante voce pesquisar esses aspectos em livros, sites ou entrevistas com os
autores, quando poss́vel. O importante é que, em suas análises, voce busque
relacionar estas informações a s caracter́sticas observáveis na obra.

Feitas estas orientações, o desao está lançado. Bom trabalho!

RESPOSTA COMENTADA
Para realizar esta atividade, utilize as informações da tabela apresentada e siga a mesma
estrutura da análise realizada no item Fonte, de Marcel Duchamp (Figura 7.1). Pesquise
também a análise realizada sobre as obras apresentadas nas Aulas 4 e 5.

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Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Funções da linguagem: a mensagem

RESUMO

Ao longo das discussões e exerc́cios realizados nestas aulas sobre as funções da


linguagem, buscamos demonstrar que as ideias de Jakobson representam uma rica
ferramenta teórica para orientar a atividade do professor nas aulas de arte. Suas
categorias classicatórias funcionam como chaves conceituais que nos permitem
abrir a discussão de diferentes dimensões da linguagem, seja no sentido de inter-
pretar os produtos art́sticos e culturais, seja no sentido de estimular a produção
art́stica dos alunos, por meio de diferentes desaos técnicos e expressivos.
Sua aplicação pode ser destinada a jovens e adultos, inclusive apresentando toda
a teoria e os conceitos aqui expostos, mas também a s crianças. Neste caso, não é
necessário explicar tudo que discutimos nestas aulas, mas apenas estabelecer um
diálogo sobre as obras de arte, a partir de questões muito simples, ligadas aos
diferentes fatores comunicativos, tais como:
a) Função referencial: O que o artista representou nesta obra?
b) Função emotiva: Ele representou as coisas do modo como voce as ve , ou ele
exagerou, distorceu sua apare ncia, desenvolvendo um modo pessoal de repre-
sentar as coisas?
c) Função conativa: Que impressão esses efeitos usados pelo artista te causaram
– alegria, tristeza, susto, medo, o que ?
d) Função fática: Quais os materiais usados pelo artista? Voce já conhecia esse
material, essa técnica ou tecnologia?

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Contextualização: o processo de

AULA
construção do conhecimento
Terezinha Losada

Meta da aula
Apresentar a importância do princípio da
contextualização no ensino de arte e
das linguagens em geral.
objetivos

Esperamos que, ao nal desta aula, você seja


capaz de:
1. identicar as similaridades entre as atuais
formulaçıes para o ensino de Língua
Portuguesa, Matemática e Artes.
2. reconhecer a dinâmica interativa dos eixos da
Abordagem Triangular de Ana Mae Barbosa:
fazer, apreciar e contextualizar.
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Contextualização: o processo de construção do
conhecimento

INTRODUÇÃO Vamos encerrar nosso curso resgatando as discussões feitas em


nossa primeira aula. Nela, você viu que os curr́culos da Educação Básica
brasileira são divididos em duas grandes áreas: Linguagens e Ciências,
esta última dividida entre Ciências Naturais e Ciências Humanas.
As Ciências têm um caráter disciplinar, recortando a discussão
de objetos e questões espec́cas sobre a realidade. O grande desao
pedagógico nesta área é, portanto, a interdisciplinaridade, a m de se
estabelecer os nexos entre essas várias áreas de conhecimento, propician-
do uma compreensão integrada da realidade natural e humana.
A importância do estudo de linguagem, por outro lado, deve-se
a sua função instrumental, isto é, por serem ferramentas cognitivas que
permeiam de modo transversal a construção do pensamento e de toda
sorte de conhecimentos, meios de comunicação e interação humana.
Exatamente por isso o ensino de L́ngua Portuguesa (principal
ferramenta de acesso a s Ciências Humanas) e o ensino de Matemática
(linguagem fundamental no desenvolvimento das Ciências Naturais) são
tão prestigiados nas grades curriculares, concentrando o maior número
de carga horária de aulas. No entanto, mesmo com todo esse empenho,
essas duas disciplinas costumam apresentar resultados cr́ticos, sendo
normalmente as principais responsáveis pelos altos ́ndices de retenção
escolar. Por que isso ocorre?
Veremos a seguir que a falta de contextualizações transversais no
ensino dessas linguagens é apontada pelas atuais propostas pedagógicas
como o principal fator responsável por esses problemas. No mesmo
sentido, a abordagem triangular, desenvolvida pela educadora Ana Mae
Barbosa, destaca a contextualização como um eixo fundamental para
o desenvolvimento do ensino de arte.

A IMPORTÂNCIA DA CONTEXTUALIZAÇÃO NO ENSINO DE


LÍNGUA PORTUGUESA E DE MATEMÁTICA

O caráter instrumental da linguagem e a importância de seu apren-


dizado ocorrer de modo contextualizado são aspectos em destaque nos
recentes documentos educacionais sobre o ensino de L́ngua Portuguesa
e de Matemática.

118 CEDERJ
8
AULA
Fonte: http://www.sxc.hu/photo/690954

Para metros Curriculares Nacionais (PCN) de L́ngua Portuguesa para 5“ a


8“ séries (BRASIL, 1998, p. 19, grifos nossos):

O dom́nio da linguagem, como atividade discursiva e cognitiva,


e o dom́nio da l́ngua como sistema simbólico utilizado por uma
comunidade lingü́stica, são condição de possibilidade de plena
participação social. Pela linguagem os homens e as mulheres se
comunicam, tem acesso a informação, expressam e defendem
pontos de vista, partilham ou constroem visões de mundo, pro-
duzem cultura.

PCN de Matemática para 5“ a 8“ séries (BRASIL, 1998, p. 19-24, grifos


nossos)

A Matemática caracteriza-se como uma forma de compreender


e atuar no mundo e o conhecimento gerado nessa área do saber
como um fruto da construção humana na sua interação constante
com o contexto natural, social e cultural.

[...] a par de seu valor intrínseco, de natureza lógica, (as desco-


bertas Matemáticas) tem sido instrumentos úteis na solução de
problemas cient́cos e tecnológicos (contudo) não se pode perder
de vista os caracteres especulativo, estético não imediatamente
pragmático do conhecimento matemático sem os quais se perde
parte de sua natureza.

É interessante notar que as duas disciplinas não se apresentam


nesses documentos como sendo estritamente de dom́nios cient́cos ou
áreas circunscritas de conhecimento, e sim como atividade discursiva
e cognitiva, no caso de L́ngua Portuguesa, e como forma de compre-
ender e atuar no mundo, no caso da Matemática; ou seja, são formas
de pensar, comunicar e interagir.

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Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Contextualização: o processo de construção do
conhecimento

Por outro lado, as duas disciplinas destacam seu status de lin-


guagem, o qual envolve o conhecimento de sua estrutura codicada,
abstrata ou simbólica. A L́ngua Portuguesa é apresentada como sis-
tema simbólico e a Matemática pela sua natureza lógica de caráter
especulativo, estético, não imediatamente pragmático.
Em torno destas duas dimensões (ser um código e ter funções instru-
mentais ), a excessiva ênfase nos aspectos abstratos da linguagem é apon-
tada como o maior problema no ensino dessas disciplinas. Esses aspectos
são apresentados como um conteúdo puramente escolar, sem relação com
seus usos concretos, isto é, as funções instrumentais das linguagens.

Fonte: http://www.sxc.hu/photo/1052394 Fonte: http://www.sxc.hu/photo/614682

Quanto a organização dos conteúdos, o PCN de Matemática para 5“ a 8“


séries postula que de modo geral observa-se uma forma excessivamente
hierarquizada de faze -la. É uma organização dominada pela idéia de
pré-requisito, cujo único critério é a estrutura lógica da Matemática
(BRASIL, 1998, p. 22).
No item Reexão gramatical na prática pedagógica, o PCN de L́ngua
Portuguesa para 5“ a 8“ séries arma (BRASIL, 1998, p. 28):

Na perspectiva de uma didática voltada para a produção e interpre-


tação de textos, a atividade metalingu́stica deve ser instrumento
de apoio para a discussão dos aspectos da l́ngua que o professor
seleciona e ordena no curso do ensino-aprendizagem. Assim, não
se justica tratar o ensino gramatical desarticulado das práticas
de linguagem. É o caso, por exemplo, da gramática que, ensinada
de forma descontextualizada, tornou-se emblemática de um con-
teúdo estritamente escolar, do tipo que só serve para ir bem na
prova e passar de ano. [...] Em função disso discute-se se há ou não
necessidade de ensinar gramática. Mas essa é uma falsa questão: a
questão verdadeira é o que, para que e como ensiná-la.

120 CEDERJ
Tradicionalmente, o ensino da linguagem verbal, nacional e estran-

8
geira, se divide em três eixos: gramática, literatura e redação. Resgatando

AULA
nossas discussões sobre as teorias de Roman Jakobson (Aulas 5, 6 e 7),
pode-se dizer que o aluno precisa conhecer o código (gramática) para
desenvolver suas habilidades como emissor (redação ou produção de
texto) e como receptor (literatura). De fato, as atuais formulações
pedagógicas reivindicam que, no eixo da recepção, o estudante deve ser
estimulado a apreciar e interpretar a arte (literatura e demais formas
art́sticas), como também todos os outros tipos (gêneros) de mensagem
que povoam o nosso cotidiano.

Código Gramática (verbal, musical, visual, ce nica etc.)


Emissor Redação ou produção de texto, fazer art́stico.
Receptor Literatura, demais artes e ge neros comunicativos.

O grande problema é que esses aspectos costumam ser tratados


na escola de modo fragmentado e geralmente enfatizando o estudo
dos conteúdos gramaticais como algo válido em si mesmo. Vale ainda
salientar que os discursos e os textos não existem para aprendermos
gramática. Ao contrário, a gramática existe e deve ser ensinada na escola
como conhecimentos facilitadores da compreensão e da produção de
textos, aumentando e aprofundando seus esquemas cognitivos pela
ampliação do léxico e de suas respectivas redes semânticas (BRASIL,
1998, p. 33). Por isso, se postula uma didática voltada para a produção
e interpretação de textos, imprimindo a atividade metalingu́stica um
caráter instrumental.

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Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Contextualização: o processo de construção do
conhecimento

ATIVIDADE

Atende ao Objetivo 1

1. Os gêneros lingu́sticos são muitos variados, denindo diferentes estruturas


discursivas importantes de serem analisadas na escola. No âmbito da litera-
tura, temos o poema, o romance, o conto e a crônica. Nos demais usos da
linguagem, podem ser mencionados, além das estruturas narrativa, descritiva
e dissertativa, inúmeras outras possibilidades, tais como a estrutura do texto
jornal́stico, das cartas e dos anúncios publicitários. A linguagem matemática
também permeia nosso cotidiano, assumindo diferentes funções. Pesquise
em revistas cinco situações distintas de uso da linguagem matemática.
Recorte e cole no quadro a seguir os exemplos encontrados.

RESPOSTA COMENTADA
A linguagem matemática está presente na própria estrutura de uma
revista, denindo a sua data e a numeração de sua edição, tiragem
e páginas. Vários outros exemplos, contudo, podem ser encontrados
tanto nos textos quanto nas imagens, por meio de referências quan-
titativas, monetárias, de porcentagem ou de combinação numérica,
caso dos códigos de barras e placas de automóveis.

122 CEDERJ
ABORDAGEM TRIANGULAR: A IMPORTÂNCIA DA

8
CONTEXTUALIZAÇÃO NO ENSINO DE ARTES

AULA
A educadora Ana Mae Barbosa desenvolveu a Abordagem Trian-
gular durante efervescência das discussões metodológicas para o ensino de
arte na década de 1980, exercendo uma fecunda inuência na formação
dos professores de arte.
Inicialmente, sua proposta tinha como vértices o conhecer, o
apreciar e o fazer. Posteriormente, o termo conhecer foi subs-
titu́do por contextualizar. Longe de ser um mero jogo de palavras,
em torno dessa mudança conceitual podemos sintetizar os objetivos das
discussões realizadas ao longo de todo o nosso curso.

Figura 8.1: Os eixos da Abordagem Triangular de Ana


Mae Barbosa.

Antes, porém, vamos analisar brevemente os princ́pios desta aborda-


gem didática, em especial o signicado de sua estrutura triangular. A adoção
desse modelo implica que estes três pontos (apreciar, fazer e contextualizar)
devem estar sempre interligados e que não há uma hierarquia de importância
entre eles. Ao contrário, eles são dinamicamente complementares, gerando
um movimento cont́nuo de um vértice para o outro.
O vértice da apreciação é normalmente relacionado ao acesso a s
grandes obras da literatura e das artes. De fato, são discursos-produtos
realizados por grandes mestres – os artistas – que reinventam a linguagem
e condensam um profundo sentimento do mundo e de nossa identidade
cultural. No entanto, conforme já foi frisado em nossas aulas anteriores, é

CEDERJ 123
Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Contextualização: o processo de construção do
conhecimento

de suma importância contemplar, sem estigmas e preconceitos, a riqueza


da cultura popular, as manifestações técnicas da linguagem e ligadas a
cultura de massa.
O vértice do fazer envolve todas as oportunidades de o estu-
dante elaborar e expressar sua visão de mundo. Devemos lembrar que
não existe o mundo dos emissores e o mundo dos receptores, outra
constatação óbvia que, no entanto, a escola tem muita diculdade de
compreender. Somos todos emissores e receptores de conhecimentos,
informações, opiniões e valores. Restringir o aluno a qualidade de
receptor é condená-lo a uma passividade anti-humana e é, portanto,
uma atitude desumanizadora. Nega os conhecimentos oriundos da vida
cotidiana do aluno e inibe sua conança na capacidade de conhecer e
transformar o mundo.

(a) (b) (c)

Figura 8.2: Linguagens art́sticas: (a) Música; (b) Teatro e (c) Artes visuais
Fontes: http://www.sxc.hu/photo/956901; http://www.sxc.hu/photo/476129; http://www.sxc.hu/photo/607060

ATIVIDADE

Atende ao Objetivo 2

2. Na aula passada, você desenvolveu um detalhado texto cr́tico sobre


uma obra de arte de sua escolha, utilizando a teoria sobre as funções da
linguagem de Roman Jakobson.
Agora você vai planejar uma aula sobre aquela obra já analisada por você,
propondo atividades ligadas a cada um dos eixos da Abordagem Trian-
gular de Ana Mae Barbosa: o fazer, o apreciar e o contextualizar. No eixo
da contextualização, proponha ao longo de seu planejamento atividades
envolvendo pelo menos três dos nexos contextualizadores apresentados
no texto, identicando-os a seguir.

124 CEDERJ
8
AULA
Nome e autor da obra em análise:

Nexos contextualizadores aplicados:


a)
b)
c)
Planejamento:

RESPOSTA COMENTADA
Note que a dinâmica da estrutura triangular dessa proposta permite
que a aula seja iniciada a partir de qualquer um de seus vértices.
Não existe uma ordem xa, e o desenvolvimento de atividades
ligadas a cada um dos eixos pode ocorrer em vários momentos.
Vamos analisar um exemplo. Como se trata de uma aula baseada
na análise de uma obra de arte espec´ca, você pode fazê-la da
forma mais tradicional, isto é, mostrar a obra para os alunos e, de
imediato, fazer uma exposição teórica sobre seu autor, seu estilo,
seus signicados e suas referências históricas. Desse modo, já
estaria cumprida a etapa de contextualizar os conhecimentos sobre
aquela obra. Porém, isso teria ocorrido de uma forma intelectualista
e diretiva, sem permitir que o aluno elabore e explore suas próprias
hipóteses interpretativas e ligadas ao fazer. Por isso Ana Mae subs-
titui o termo “conhecer” por “contextualizar”, pois contextualizar é
processo de aprendizagem, algo interativo, investigativo, ao passo
que o termo “conhecer” refere-se ao resultado da aprendizagem,
que pode ocorrer de modo ativo e cr´tico, ou passivo, congurando
aquilo que Paulo Freire denomina “educação bancária”. Para evitar
esse viés você pode solicitar, como atividade introdutória, que os

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Tendências Contemporâneas do Ensino de Artes | Contextualização: o processo de construção do
conhecimento

alunos façam um desenho sobre o tema da obra antes de conhecê-


la, para depois comparar as soluções encontradas pelos alunos e
a do artista. A apreciação pode ser um processo de descoberta,
utilizando-se as questões apresentadas na aula anterior, baseada
nas funções da linguagem. Depois podem ser feitas pesquisas e
exposições teóricas aprofundando as contextualizações já iniciadas,
bem como a proposição de novos trabalhos práticos, explorando,
dessa vez, os conhecimentos acumulados.

RESUMO

Um paralelo entre as recentes formulações pedagógicas para a área de linguagem


(Matemática, L́ngua Portuguesa e Artes) apresenta o conceito de contextualiza-
ção como o ponto de converge ncia entre elas. No a mbito do ensino de arte, a
Abordagem Triangular articula, de modo integrado, o fazer art́stico (emissão),
a apreciação de bens culturais (recepção) e a contextualização (referencial).
Na organização do planejamento didático, podemos destacar diferentes nexos
contextualizadores: nexos metalingu́sticos, histórico-culturais, interdisciplinares,
transversais e existenciais-afetivos, os quais devem ser sempre articulados a partir
da dimensão estética da experiencia art́stica.

126 CEDERJ
Tendências Contemporâneas
do Ensino de Artes

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Aula 1

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Aula 4

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