054 A Habitacao Flutuante 102
054 A Habitacao Flutuante 102
054 A Habitacao Flutuante 102
CARDONE, Laura
Universidade Presbiteriana Mackenzie, e-mail: cacomovme@gmail.com
RAMOS, Ricardo Carvalho Lima
Universidade Presbiteriana Mackenzie, e-mail: movme@uol.com.br
RESUMO
Este artigo apresenta algumas reflexões e uma análise comparativa e qualitativa de dois
modelos de habitação flutuante com a finalidade de estabelecer parâmetros projetuais
resilientes às inundações e enchentes urbanas. Para isso, foram selecionados dois objetos de
pesquisa. No âmbito da arquitetura vernacular, estuda-se a habitação flutuante da população
ribeirinha do Rio Solimões no Amazonas (Brasil), enquanto as habitações flutuantes do bairro de
IJburg, em Amsterdã (Holanda), são abordadas no âmbito do desenvolvimento tecnológico.
Palavras-chave: Resiliência, Habitação flutuante, Inundação urbana.
ABSTRACT
This article presents some reflections and a comparative and qualitative analysis of two models of
floating housing with the purpose of establishing project parameters resilient to floods and urban
floods. In order to do so, two research objects.In the context of vernacular architecture, we study
the floating habitation of the riverbank population of the Solimões River in Amazonas (Brazil),
while the floating dwellings of the IJburg neighborhood, in Amsterdam (Holland), are
approached in the scope of technological development.
1 INTRODUÇÃO
O presente estudo possui como problema de pesquisa a arquitetura resiliente
às inundações e enchentes urbanas como forma de mitigação das
consequências e redução do grau de vulnerabilidade da população e do
ambiente de inserção. O objetivo é compreender o funcionamento e o êxito
de sistemas flutuantes aplicados à tipologia de habitação, e definir parâmetros
projetuais resilientes a esses fenômenos. Visa iniciar uma discussão sobre a
implantação do conceito de resiliência nos sistemas urbanos, a partir de uma
pesquisa comparativa e qualitativa de modelos já consolidados, baseada em
revisão bibliográfica e visita em campo ao objeto de estudo brasileiro.
No contexto resiliente vernacular, foi definida a casa flutuante da população
ribeirinha do Rio Solimões como modelo estruturado, fundamentalmente, pela
sabedoria popular transmitida através das gerações e adaptado ao longo dos
_______________
CARDONE, L.; RAMOS, R. C. L. A habitação flutuante como uma resposta resiliente: entre o
vernacular e o contemporâneo. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE QUALIDADE DO PROJETO NO
AMBIENTE CONSTRUÍDO, 6., 2019, Uberlândia. Anais... Uberlândia: PPGAU/FAUeD/UFU, 2019. p
585-595. DOI https://doi.org/10.14393/sbqp19054.
586
2 FUNDAMENTAÇÃO
Enchentes e inundações são eventos naturais inerentes da hidrográfica dos
rios, são a dinâmica hidrológica de qualquer curso d’água. Há quatro tipos de
leitos de rio: leito menor (parte ocupada pelo curso das águas, onde não há
crescimento de vegetação), leito vazante (ocupado pelas águas durante o
período de seca), leito maior ou secundário (ocupado pelas águas durante o
período de cheia) e o leito excepcional (ocupado nos períodos de grandes
cheias, com intervalos irregulares) (CUSTÓDIO, 2002).
grandes cidades, como São Paulo, pode ser agravada pela urbanização.
(BARCELLOS et al., 2009).
Segundo o relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas
(IPCC) de 2013, mesmo que as emissões de gases do efeito estufa diminuam, a
Terra continuará sofrendo com os danos residuais e terá que se preparar para
lidar com o aumento gradual da temperatura e de tempestades cada vez
mais intensas, que provocarão uma série de inundações em contraste com
períodos longos de estiagem. Países tropicais como o Brasil estão entre os mais
afetados. Conclui-se que, ao afetarem o nível dos cursos d’água, essas
tempestades intensificam as inundações e enchentes repentinas nas cidades,
demonstrando que o aquecimento global tem relação direta com a dinâmica
dos desastres urbanos.
Já o Relatório do Painel de Alto Nível do Secretário-Geral das Nações Unidas,
de 2012, menciona que as incertezas e os riscos deveriam fazer parte
integrada do planejamento das cidades, onde as manifestações de resiliência
deveriam ser reiteradamente incentivadas, dado que incentivar a resiliência é
uma das maneiras mais eficientes de promover a sustentabilidade. No
momento em que esses conceitos forem introduzidos nas políticas públicas, a
tendência é que haja uma mudança no tratamento dos fenômenos
climáticos, passando de uma abordagem de resposta aos desastres para o
gerenciamento de seus riscos, prevenção das perdas sociais e melhoria das
capacidades de enfrentamento de situações desfavoráveis.
Embora essa metodologia esteja presente em alguns países europeus, como
na Holanda, é inexistente no Brasil. Antes que se possa discutir resiliência diante
do desenvolvimento macro da cidade, o que envolveria alterações nos
sistemas já implantados, propõem-se o início da discussão a partir do
levantamento de soluções menores e pontuais.
Como primeira análise, foi estudada a população ribeirinha do Amazonas e
seu modo de habitar a região do Rio Solimões. Destaca-se por sua
capacidade adaptativa diante de fatores que causam instabilidades em seu
sistema, como as mudanças sazonais do leito do rio.
A habitação ribeirinha, das várzeas dos rios alagáveis, harmoniza-se
com as oscilações do nível d’água. Dois tipos de casas
predominam: as palafitas e as casas flutuantes, ambas de madeira
retirada da floresta e exemplos de construções perfeitamente
ajustadas ao meio ambiente (LENCIONE, 2013, p. 51).
É possível estabelecer duas analogias entre a cidade contemporânea e a
comunidade ribeirinha: o modo de morar, e a necessidade de evolução da
tecnologia construtiva local. A população ribeirinha se organiza por meio do
acúmulo de conhecimentos que lhe permite responder aos desafios impostos
pela interação com os elementos naturais do ecossistema de inserção. Trata-
se de esquemas conceituais, práticas e habilidades, resultantes de um
processo histórico de aprendizagem, capaz de orientar as decisões de
ocupação, desde a escolha do local mais adequado para a construção, até
as técnicas construtivas propriamente ditas. É um conjunto de saberes
repassado de geração a geração, responsável por manter a boa relação
com o meio habitado e garantir a sobrevivência do sistema ao longo dos anos
(ALENCAR; SOUSA, 2016).
588
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A água é antes de qualquer definição fonte de existência, a qual ao longo de
4,5 bilhões de anos define-se como permanência e evolução. Quando
analisada em conjunto com o desenvolvimento da sociedade, apresenta-se
como o recurso natural presente em todos os aspectos capazes de definir a
sociedade como civilização humana (MARENGO, 2008). Portanto, é evidente
expectar que o progresso das cidades tenha políticas públicas capazes de
priorizar a boa relação entre suas fontes de água e o desenvolvimento urbano.
No entanto, raramente acontece, gerando consequências equivalentes à
desastres naturais, como é o caso de São Paulo.
Ao comparar os dois objetos de estudo apresentados, nota-se que ambos são
resultados de um processo de adaptação e experimentação. A população
ribeirinha do Rio Solimões consolida seu caráter resiliente pela aquisição de
sabedoria popular, que a cada geração torna-se mais desenvolvida e
próspera. O modelo holandês resulta de um extenso investimento em
resiliência e tecnologia que, ao atingir o campo habitacional, possibilitou criar
mais de um sistema de construção resiliente a inundações e enchentes.
O desenvolvimento histórico de São Paulo, o alto índice de ocorrência de
inundações e enchentes urbanas, e o prognóstico das alterações climáticas
evidenciam a necessidade da adoção de medidas resilientes. Como
mencionado acima, trata-se de um processo de investigação vinculado ao
conhecimento do meio físico e de técnicas construtivas, o qual só terá início
quando o conceito de resiliência for compreendido como essencial para a
permanência da ocupação.
Como conclusão, o levantamento dos objetos de estudo permitiu a definição
dos seguintes parâmetros de projeto para a habitação flutuante:
• Implantação: local considerado fixo; seguro para a instalação de
pilares-guias, responsáveis por controlar a movimentação vertical da
construção. No contexto urbano, sua localização deve possibilitar a
conexão com o sistema público de abastecimento;
• Tecnologias construtivas: base flutuante composta por material de
baixa densidade (toras de açacú); base de concreto oca, flutuando
com a força de empuxo. Podem ser aplicadas em locais diversos ao
original e adaptadas, por exemplo, substituindo as toras de açacú por
materiais recicláveis como o plástico;
594
AGRADECIMENTOS
PIBIC-Mackenzie.
REFERÊNCIAS
100 RESILIENT CITIES. Rotterdam's Resilience Story. 2016. Disponível em:
<http://www.100resilientcities.org/cities/rotterdam/>. Acesso em: 27 maio 2019.
ALENCAR, E. F.; SOUSA, I. S. Tradição e mudanças no modo de habitar as
várzeas dos rios Solimões e Japurá, AM. Iluminuras, Porto Alegre, v. 17, n. 41, p.
203-232, Jan/Jun. 2016. Disponível em:
<http://www.academia.edu/25724147/TRADIÇÃO_E_MUDANÇAS_NO_MODO_
DE_HABIT AR_AS_VÁRZEAS_DOS_RIOS_SOLIMÕES_E_JAPURÁ_AM>. Acesso em:
15 maio 2019.
BAGGALEY, K. How floating architecture could help save cities from rising seas.
Disponível em: <https://www.waterstudio.nl/tag/ijburg/>. Acesso em: 23 fev.
2019.
BARCELLOS, C. et al. Mudanças climáticas e ambientais e as doenças
infecciosas: cenários e incertezas para o Brasil. Epidemiol. Serv. Saúde, Brasília,
v. 18, n. 3, p. 285-304, Jul/Set. 2009. Disponível em:
<http://scielo.iec.gov.br/pdf/ess/v18n3/v18n3a11.pdf>. Acesso em: 4 dez. 2017.
BRAÑA, E. R. Las casas anfibias de Holanda y la ciudad futurista
Lilypad. Disponível em: <http://caxigalinas.blogspot.com/2011/12/las-casas-
anfibias-de-holanda-y-la.html>. Acesso em: 10 mar. 2019.
CASTELNOU, A. M. N. et al. Sustentabilidade socioambiental e diálogo de
saberes: o Pantanal Mato-grossense e seu espaço vernáculo como
referência. Desenvolvimento e Meio Ambiente, Curitiba, v. 7, p. 41-67, Jan.
2003.
CASTRO, A. L. C. Glossário de Defesa Civil: Estudos de Riscos e Medicina de
Desastres. 2. ed. Brasília: Ministério do Planejamento e Orçamento, 1998. 173 p.
IPCC, 2013: Climate Change 2013: The Physical Science Basis. Cambridge
University Press, Cambridge. Disponível em:
<http://www.climatechange2013.org/images/report/WG1AR5_ALL_FINAL.pdf>.
Acesso em: 2 jun. 2019.
CUSTÓDIO, V. A persistência das inundações na Grande São Paulo. 2002. Tese
(Doutorado) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas.
595