O Fim Da História
O Fim Da História
O Fim Da História
Semanas atrás conversava com um cidadão segundo o qual a esquerda acabou. Baseia-se em
quê? No resultado das recentes eleições municipais e na dificuldade de divisar na cena atual
algo similar à militância que conheceu em sua juventude.
No meu tempo de faculdade aconteceram algumas passeatas no estilo “contra o sistema”, “pela
educação”... Lembro de uma que assisti do janelão do departamento de arte gráfica, onde
ganhava alguns trocados como estagiário desenhando com nanquim em papel vegetal. Tinha
alguma habilidade e por meses almoçava melhor por conta da modesta bolsa. No bolo da
passeata distingui um camarada que não saía da mesa de carteado no centro acadêmico.
Olhando em retrospectiva, decorridas mais de quatro décadas, acho que estava mais para
informante da repressão, auscultando a presença dos mais exaltados, do que para militante ...
O presidente do centro acadêmico naquela época era um sujeito afável, que jamais se formaria.
Era um militante da esquerda, que deve ter abandonado o curso de engenharia para conquistar
um diploma em alguma área das ciências sociais. Mostrava uma dedicação exemplar ao
movimento estudantil, o oposto do que conquistava nas disciplinas em que se matriculava. Tinha
alguma ligação com um deputado estadual e é forçoso reconhecer que era um convicto, destes
que gostam de discussões coletivas e dedicam seus dias a causas políticas.
Ainda tinham voz personagens como Luís Carlos Prestes e João Amazonas, que conheci num
evento promovido pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência no Campus da
Universidade de São Paulo. O PCdoB tinha como inspiração ninguém mais, ninguém menos,
que Enver Hohxa e sua Albânia. Então cairia o Muro de Berlim e a esquerda tupiniquim, não
tendo como defender sujeitos como Erich Honecker, recolheu-se para reflexões. Naturalmente
sem admitir que o comunismo é um fracasso universal. Não. Só não deu certo porque as forças
contrárias são muito poderosas! Esta narrativa tranquiliza os espíritos fanáticos e renova suas
energias na busca da utopia, deixando pra trás os numerosos e amargos registros distópicos.
O que mudou, desde então? Prestes, Hohxa, Honecker e Amazonas já se foram e seu jeito de
expandir o comunismo ficou pra trás. Por isto incautos e apressados acham que a esquerda já
era e que o comunismo não assusta mais ninguém. Se olharem para a crescente concentração
de poder - que desde muito tem traído nosso pacto federativo,- e a visível supressão de
liberdade talvez comecem a acreditar que há algo de podre neste reino e que nossa democracia
pode não passar de fachada.
A militância revolucionária, que um dia fez de conta que leu Marx, que sonhou brandir o Livro
Vermelho de Mao, foi metamorfoseando seu discurso, mas a dialética segue a mesma.
Numa biografia de Aparício Torelly, o Barão de Itararé, Cláudio Figueiredo reproduz um trecho
do “Jornal do Povo” a respeito da conquista do voto feminino, mera “ilusão burguesa”: “Nós
desejaríamos que essas cretinas que ainda dividem a Humanidade em machos e fêmeas, e não
em exploradores e explorados, nós desejaríamos que elas nos dissessem o que as mulheres – a
não as “damas” – têm lucrado com a atividade de Berthas Lutz”.
Bertha Lutz é considerada a grande líder do movimento pelos direitos políticos das brasileiras,
marcadamente na conquista sufragista. Atualmente a bandeira feminista e a conversa de
empoderamento se alinham ao discurso autoproclamado progressista, caracterizando mais uma
vez hipocrisia e apropriação indébita.
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A esquerda mudou seu foco, seguindo a receita da revolução cultural. Entrou nas universidades
como nunca e apostou em décadas de transformação. Na revolução tradicional tiros e bombas
podem mudar o panorama em questão de semanas ou meses. Nunca deu certo no Brasil. Então
a paciência entrou em campo e semeou joio. As instituições foram contaminadas, a colheita é
farta e será difícil reverter tudo isto.
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Circulam pela rede mundial frases atribuídas ao filósofo cubano Armando Ribas. Uma delas tem
especial agressividade: “O socialismo é forjado pela inveja, é administrado pela hipocrisia, gera
preguiça e destrói a riqueza”.
Quanto a destruir a riqueza, Ribas não está sozinho. No prefácio de “Democracia, o Deus que
falhou”, Hans-Hermann Hope dá o tom: “Este livro é um golpe intelectual na democracia. Ele
explica que ela é uma máquina de destruição de riqueza, de desperdício econômico e de
empobrecimento; e ele a identifica como uma causa sistemática de corrupção moral e
degeneração. Em suma: a democracia é mostrada como uma forma “branda” – e especialmente
insidiosa – de comunismo. Ao mesmo tempo, este livro apresenta uma rigorosa defesa da
instituição da propriedade privada, demonstrando que ela é uma condição necessária para a paz
e a prosperidade duradouras”.
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O metacapitalismo e o comunismo são como gêmeos não univitelinos. São filhos da ambição,
concentradores de poder, ateus ontológicos e se apresentam como salvadores sem nenhum
interesse. São extremos que se tocam na esfera das relações humanas e por incrível que pareça
têm caminhos similares, ainda que suas bandeiras pareçam antípodas.
Como podemos nos posicionar diante destas tendências hegemônicas, que parecem sufocar o
futuro próximo? Para responder recorro ao Livro de Jó (28:12-28): “Porém onde se achará a
sabedoria, e onde está o lugar da inteligência? ... E disse ao homem: Eis que o temor do Senhor
é a sabedoria, e apartar-se do mal é a inteligência”.