fatores de risco
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fatores de risco
https://doi.org/10.1590/1982-3703003265461 Artigo
Risk Factors for Anxiety in College Students during the COVID-19 Pandemic
Abstract: The undergraduate period carries a higher risk for mental health problems between
college students, such as anxiety. This study aimed to evaluate the risk factors for anxiety in
college students during the COVID-19 pandemic using a convenience sample (N=384).
A sociodemographic and economic questionnaire; a childhood trauma questionnaire; an online
self-applied depression, anxiety, and stress scale; and a multivariate logistic regression model
were used. The identified risk factors include the female gender, studying part-time, having
entered university by quotas, a perception of their mental health during the pandemic as
average/poor or worsening, self-medication, and a history of physical abuse in childhood
and/or adolescence. Some factors increased the chance of experiencing anxiety symptoms
during the COVID-19 pandemic between university students, highlighting the need for mental
health care and promotion in this population.
Keywords: Anxiety, Pandemic, Covid-19, University Students.
Disponível em www.scielo.br/pcp
Psicologia: Ciência e Profissão 2024 v. 44, e265461, 1-14.
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Calves, M. G. R., & Tucci, A. M. (2024).Ansiedade em universitários na pandemia.
de se manter o isolamento social e a migração do sis- porque o ensino remoto e a adaptação a esse ensino
tema de ensino presencial para o online, os alunos têm gerado grande impacto na vida universitária.
sofreram psicologicamente com as medidas restritivas, Assim, o objetivo principal deste estudo foi ava-
o atraso em suas graduações, a imprevisibilidade de liar os fatores de risco para sintomas de ansiedade
seus destinos no mundo do trabalho, bem como com em estudantes universitários durante a pandemia de
o surgimento de dificuldades financeiras e o medo de covid-19. Como objetivo secundário, investigou-se
transmitirem o vírus a seus familiares (Cao et al., 2020). o histórico de vivência de situações de estresse na
Entre os distúrbios psicológicos apresentados infância e/ou adolescência nessa população, por ser
pelos universitários durante a pandemia de covid-19, este um importante e reconhecido fator de risco para
a ansiedade foi enfatizada em diversos estudos sintomas de ansiedade. Assim, a hipótese do estudo
(Cao et al., 2020; Chang, Yuan, & Wang, 2020; Liu et al., foi que a vivência de situações de estresse precoce é
2020; Wang et al., 2020). Chang et al. (2020) identi- um fator de risco para sintomas de ansiedade durante
ficaram a frequência de ansiedade em 26,60% dos a pandemia de covid-19, ou seja, os estudantes que
estudantes universitários chineses. No estudo de Liu relataram histórico de estresse durante as fases da
et al. (2020), a frequência foi de 22,1%, e o desarranjo infância e/ou adolescência apresentavam maior
na programação acadêmica foi destacado como fator chance de desenvolverem sintomas de ansiedade
para desenvolvimento de ansiedade nessa população. durante a pandemia de covid-19.
Um dos importantes fatores de risco que vem sendo
apontado na literatura para o desenvolvimento de sin-
Método
tomas de ansiedade é o histórico de vivência de estresse
Esta pesquisa, de caráter exploratório, fez a opção
durante a infância e/ou adolescência. Em estudos
pelo método quantitativo e transversal, visando atin-
com estudantes universitários (Karatekin, 2018; Watt,
gir os objetivos almejados. Os participantes do estudo
Ceballos, Kim, Pan, & Sharma, 2020), detectou-se que as
foram incluídos de acordo com o preenchimento dos
primeiras experiências estressoras de vida aumentaram
critérios de inclusão, além de seu consentimento para
a chance de desenvolvimento de ansiedade.
a participação no mesmo, via concordância com o
Sabe-se que a ocorrência de eventos estressan-
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
tes em fases precoces do desenvolvimento pode levar
Foram garantidas a confidencialidade e a priva-
ao aumento definitivo na dispensação do hormônio
cidade, a proteção dos dados e a não-estigmatização
liberador de corticotrofina e de cortisol (Schalinski,
dos participantes da pesquisa, uma vez que apenas os
Teicher, & Rockstroh, 2019). Assim, é possível formu-
pesquisadores do projeto terão acesso a seus dados,
lar a hipótese de que crianças ou adolescentes que
por meio de códigos para garantir um maior sigilo.
vivenciaram situações de estresse intensas ou recor-
Os códigos foram inseridos no banco de dados pelas
rentes podem apresentar alterações que favorecem o
iniciais dos nomes, seguidas pela idade de cada parti-
surgimento de inúmeras psicopatologias, entre elas
cipante. Os dados permanecerão armazenados em um
a ansiedade (Lima & Araujo, 2020).
banco de dados ao qual apenas a pesquisadora terá
Cabe ressaltar que, na universidade na qual este
acesso. O uso das informações para o estudo também
estudo foi realizado, o gênero feminino era predomi-
foi autorizado a partir do aceite que consta no TCLE.
nante – no ano de 2020, 57,68% dos estudantes ingres-
sos eram mulheres. Essa frequência é ainda maior no
campus em que se deu a coleta de dados deste estudo, Participantes do estudo
chegando a 66,47% do total de ingressantes. Sabe-se Este estudo foi desenvolvido com estudantes uni-
que estudantes universitários do gênero feminino versitários de um campus, da área da Saúde, de uma
apresentam maior vulnerabilidade para sintomas universidade pública federal do estado de São Paulo.
de ansiedade (Lantyer, Varanda, Souza, Padovani, A amostra foi definida por conveniência e de acordo
& Viana, 2016; Maltoni, Palma, & Neufeld, 2019). com a aceitação dos estudantes em participar da
Dessa maneira, reforça-se a necessidade de estudos pesquisa. Responderam ao questionário 413 estudantes,
que verifiquem os fatores de risco e intervenções sendo 278 veteranos e 135 calouros de ambos os sexos
que minimizem os efeitos do impacto da pandemia e oriundos de diferentes cursos da graduação, do pri-
na saúde mental dessa população, especialmente, meiro ao último ano. Dos 413 indivíduos participantes,
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29 responderam algumas classificações que não per- depressão, ansiedade e estresse”. Por tratar-se de um
mitiram a análise dos dados, por exemplo: “não sabe”, questionário autoaplicável, tornou-se um instru-
“não lembro” e gênero “outro”. Isso se deu pelo fato de mento viável para a utilização em coleta de dados
que muitas caselas da análise estatística ficaram vazias online, devido ao cenário de isolamento social vigente.
(iguais a zero) e limitariam o poder dos testes utilizados, O instrumento é composto por 21 questões,
especialmente a análise de regressão logística (Nakano divididas em três subescalas que se destinam à ava-
& Oikawa, 2004). Dessa forma, as análises foram realiza- liação de sintomas de depressão, estresse e ansiedade,
das com a amostra de 384 indivíduos. sendo que cada uma delas é composta por sete itens.
Para este estudo, utilizou-se a análise das respostas
das questões: 2, 4, 7, 9, 15, 19 e 20, referentes à subes-
Critérios de inclusão
cala de ansiedade.
Os participantes incluídos na pesquisa foram
As respostas para cada uma das perguntas podem
estudantes universitários que possuíam no mínimo
variar em pontuação de 0 a 3, sendo 0 referente a “não
18 anos, de ambos os sexos e que estavam cursando a
se aplicou de maneira alguma” e 3 a “aplica-se muito
graduação na universidade. Poderiam ser dos seguin-
ou a maior parte do tempo” (Vignola & Tucci, 2014).
tes cursos: Bacharelado Interdisciplinar em Ciências
Posteriormente, é realizada a somatória da pontuação
do Mar, Educação Física, Engenharia Ambiental,
alcançada nos escores de cada item das subescalas
Engenharia de Petróleo, Fisioterapia, Nutrição,
e multiplica-se o resultado por dois (Lovibond &
Psicologia, Serviço Social e Terapia Ocupacional.
Lovibond, 1995; Vignola & Tucci, 2014). Neste estudo,
as respostas foram agrupadas para a análise, sendo
Critérios de exclusão que a presença de sintomas de ansiedade foi conside-
Foram excluídos do estudo os estudantes univer- rada nas pontuação a partir de dez pontos.
sitários que possuíam menos de 18 anos de idade ou
não concordaram em participar do estudo. Além des-
Questionário sobre traumas na infância (QUESI)
tes, foram retirados da análise estatística os 29 indiví-
Esse instrumento, autorrelatado e retrospectivo,
duos mencionados anteriormente.
tem como finalidade investigar a ocorrência de eventos
traumáticos na infância dos participantes da pesquisa.
Instrumentos Desenvolvido por Bernstein, Fink, Handelsman
e Foote (1994), originalmente foi nomeado como
Questionário socioeconômico e demográfico,
childhood trauma questionnaire (CTQ). A versão bra-
vida acadêmica e condições autorreferidas
sileira foi adaptada e validada por Grassi-Oliveira,
de saúde física e mental
Stein e Pezzi (2006), recebendo o nome de “questioná-
Esse questionário foi composto por questões per-
rio sobre traumas na infância” (QUESI).
tinentes à caracterização do perfil socioeconômico e
Em sua versão reduzida (Bernstein, Stein, et al., 2003),
demográfico e da vida acadêmica e condições autorre-
é composto por 28 questões, com avaliação por meio
feridas de saúde física e mental dos estudantes univer-
de escala Likert de cinco pontos. Esse instrumento
sitários. Foram avaliadas as questões relativas a: idade;
avalia a ocorrência dos seguintes eventos: abuso
curso; sexo; cor autorreferida; status de relaciona-
emocional, abuso físico, abuso sexual, negligência
mento; religião de preferência; renda familiar; se pos-
emocional e negligência física. A pontuação total do
sui filhos; se recebe auxílio permanência; se reside com
escore de cada subescala pode variar entre cinco, que
familiares; se trabalha; se recebe cotas da universidade;
corresponde à ausência da vivência de trauma no
e autoavaliação da saúde mental e física.
tópico mensurado, e 25, que diz respeito ao escore
máximo. Por fim, estabeleceu-se a somatória do
Depression, anxiety and stress scale (DASS-21) escore total de cada subescala para se obter o escore
Esse instrumento foi desenvolvido por Lovibond final e a classificação dos traumas entre nenhum a
e Lovibond (1995) com o objetivo de averiguar sin- severo (Bernstein, Stein, et al. 2003). Neste estudo,
tomas de depressão, estresse e ansiedade. No Brasil, as respostas foram agrupadas em “vivenciou ou não
foi traduzido e validado para o português por Vignola o trauma”, sendo que o estudante que respondeu
e Tucci (2014), recebendo a nomeação de “escala de “nunca” recebeu a classificação de “não”.
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Em relação aos dados de saúde física e mental abuso sexual, 26% referiu negligência física e 47,4%
dos estudantes participantes, a maioria não realizava indicaram negligência emocional.
nenhum tratamento de saúde (79,2%) ou tinha acom- O ajuste do modelo de regressão logística multi-
panhamento com psiquiatra ou psicólogo (73,2%) variada foi avaliado pelo teste de Hosmer-Lemeshow,
e considerava sua saúde física como mediana a boa sendo que o resultado encontrado foi de 0,122,
(82%). No que diz respeito à saúde mental, somente indicando que o modelo foi ajustado adequadamente.
24,5% responderam que a mantiveram boa durante Os resultados dessa análise mostram que o gênero
a pandemia, e 75,5% relataram a percepção de que feminino apresentou maiores chances (odds) de ter
ela se manteve ruim, média ou piorou no mesmo sintomas de ansiedade em comparação ao gênero
período, sendo que 83,9% mencionaram que se sen- masculino (OR = 2,88; IC95%[1,35; 6,54]). Estudantes
tiam sozinhos com frequência. A maioria não tinha o do período integral tiveram menores chances de referir
sintomas de ansiedade em comparação a estudantes
hábito de fumar (81,8%), e 22,9% dos alunos relataram
de período não integral (OR = 0,49; IC95%[0,26; 0,90]).
que se medicaram de maneira incorreta ou realizaram
Alunos que entraram na universidade por cota tiveram
a prática de automedicação durante a pandemia.
maiores chances de apresentar sintomas de ansie-
A maior participação no estudo foi de alunos
dade em comparação aos alunos que não entraram
da Fisioterapia (18,2%) e a menor de Engenharia
por cota (OR = 1,86; IC95%[1,01; 3,46]). Estudantes
de Petróleo (0,5%). A maioria dos participantes da
que relataram estar com saúde mental ruim/média
amostra cursava a graduação em período integral
ou com piora na pandemia tiveram maiores chances
(67,7%). A forma de ingresso majoritária foi pelo
de referir sintomas de ansiedade em comparação aos
Sistema de Seleção Unificada (Sisu) (95,3%), e 39,1% alunos que relataram boa saúde mental (OR = 6,82;
dos estudantes fizeram uso de cotas. IC95%[2,69; 21,09]). Alunos que se medicaram por
A classificação obtida na aplicação do instru- conta própria durante a pandemia tiveram maio-
mento DASS-21 revelou que a maior parte dos estu- res chances de apresentar sintomas de ansiedade
dantes apresentou grau normal/mínimo de ansiedade em comparação aos alunos que não se medicaram
(66,1%) e que 33,9% apresentaram grau moderado/ (OR = 3,51; IC95%[1,86; 6,76]). Por fim, alunos que
muito grave de ansiedade durante a pandemia. Mais referiram vivência de abuso físico na infância e/ou
de metade dos estudantes referiu algum abuso emo- adolescência tiveram maiores chances de mencionar
cional (54,2%). Em relação às demais variáveis, 19% da sintomas de ansiedade em comparação a alunos sem
amostra vivenciou algum abuso físico, 18,5% sofreu tal histórico (OR = 2,41; IC%[1,19; 4,91]).
Tabela 2
Resultado da regressão logística para associação entre as características sociodemográficas e tipo de traumas
QUESI e classificação DASS-21.
Multivariável
Variáveis
aOR IC (95%) p-value
Masculino 1 - -
Gênero*
Feminino 2,88 (1,35; 6,54) 0,008
Idade Média (DP) 0,98 (0,91; 1,04) 0,466
Branco 1 - -
Raça/cor
Não branco 0,71 (0,39; 1,27) 0,247
Não 1 - -
Período integral*
Sim 0,49 (0,26; 0,90) 0,022
Não 1 - -
Tem filhos
Sim 0,72 (0,27; 1,87) 0,498
continua...
6
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...continuação
Multivariável
Variáveis
aOR IC (95%) p-value
Sim 1 - -
Mora com familiares
Não 0,72 (0,27; 1,90) 0,512
Até 1 SM 0,40 (0,13; 1,22) 0,113
De 1 a 3 SM 0,52 (0,23; 1,14) 0,102
Renda De 3 a 5 SM 0,67 (0,29; 1,55) 0,353
Não sabe 0,39 (0,14; 1,06) 0,069
5 ou mais SM 1 - -
Sim 1 - -
Tem religião
Não 0,83 (0,48; 1,43) 0,511
Sim 1 - -
Está trabalhando
Não 1,39 (0,65; 3,07) 0,403
Não 1 - -
Cotas*
Sim 1,86 (1,01; 3,46) 0,048
Não 1 - -
Auxílio permanência
Sim 1,46 (0,65; 3,25) 0,358
Não 1 - -
Tratamento alternativo na pandemia
Sim 1,54 (0,76; 3,09) 0,224
Não 1 - -
Tratamento psicológico na pandemia
Sim 1,62 (0,84; 3,08) 0,145
Boa/Média 1 - -
Saúde nos último 30 dias
Ruim 1,62 (0,85; 3,08) 0,142
Boa 1 - -
Saúde metal na pandemia*
Ruim /Média /Piorou 6,82 (2,69; 21,09) <0,001
Não 1 - -
Sentiu solitário
Sim 2,48 (0,93; 7,68) 0,088
Não 1 - -
Fuma
Sim 1,17 (0,60; 2,28) 0,641
Não 1 - -
Automedicação*
Sim 3,51 (1,86; 6,76) <0,001
Não 1 - -
QUESI Abuso emocional
Sim 1,04 (0,55; 1,99) 0,895
Não 1 - -
QUESI Abuso físico*
Sim 2,41 (1,19; 4,91) 0,014
Não 1 - -
QUESI Abuso sexual
Sim 1,25 (0,61; 2,57) 0,538
Não 1 - -
QUESI Negligência emocional
Sim 1,16 (0,63; 2,17) 0,629
Não 1 - -
QUESI Negligência Física
Sim 0,93 (0,48; 1,78) 0,824
OR: odds ratio bruto; aOR: odds ratio ajustado; IC: intervalo de confiança; *Evidência de significância estatística (p < 0,05).
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subnotificação de ocorrências, o que se dá por diversos geral em momento anterior à pandemia, os quais
motivos, que vão desde os tabus que envolvem a dis- mostram que o gênero feminino é mais vulnerável e
criminação das vítimas, que por vezes são tidas como tem mais risco para desenvolver sintomas de ansie-
culpadas ou têm seus depoimentos questionados, até o dade (Steel et al., 2014).
medo e a falta de crença na efetividade do sistema legal Outro aspecto destacado neste estudo, como
do país, ou mesmo nas diferentes maneiras de se defi- fator de risco para o desenvolvimento de sinto-
nir abuso sexual. Assim, fica evidente a necessidade mas de ansiedade, foi o fato de se estudar em meio
de políticas públicas mais eficazes de divulgação e período (vespertino/noturno). Pode-se especular
combate da violência sexual, especialmente quando que grande parte desses estudantes exerce alguma
cometida contra crianças e adolescentes. atividade remunerada no contraturno universitário,
Os resultados deste estudo apontaram a presença de o que sugere que, além de lidarem com a apreensão
outros fatores de risco para o desenvolvimento dos sin- associada à graduação durante a pandemia, esses
tomas de ansiedade na amostra: ser do gênero feminino; universitários tiveram preocupações relacionadas
estudar em período não integral (vespertino ou noturno); às incertezas que também permearam o mundo do
ter ingressado na universidade por meio de cotas; ter per- trabalho. Estas incluem a precarização dos serviços e
cepção de sua saúde mental durante a pandemia como a possibilidade de desemprego, bastante característi-
média/ruim ou pior; e automedicação. cas do cenário econômico no país durante o período
A amostra desta pesquisa foi composta majori- (Ghiraldelli, 2021; Mattei & Heinen, 2020).
tariamente por mulheres. Ser do sexo feminino cons- Os alunos que ingressaram na universidade por
tituiu fator de risco para a manifestação de sintomas meio de cotas também foram identificados como
de ansiedade durante a pandemia, resultado que está grupo de risco para o desenvolvimento de ansiedade.
em consonância com outras pesquisas realizadas com Assim como outras instituições federais de ensino
a aplicação da DASS-21, no Brasil, durante o mesmo superior (Ifes), a universidade em questão, em
período. Esses estudos mostraram que as mulheres consonância com a Lei nº 13.409, de 28 de dezembro
estão sujeitas a apresentar maior grau de sintomas de 2016, passou a reservar parte de suas vagas para
ansiosos que os homens (Goularte et al., 2021; Lopes alunos que atendam certos critérios, os quais: terem
& Nihei, 2021; Souza et al., 2021). cursado integralmente o ensino médio em escolas
Em virtude da disparidade de gênero na sociedade públicas; serem autorreferidos como pretos, pardos,
atual, ser mulher é um aspecto que vem carregado de indígenas ou possuidores de alguma deficiência;
significados e sobrecargas. Às mulheres, são tradicio- e serem oriundos de famílias com renda per capita
nalmente delegados os cuidados com a família e as igual ou inferior a um salário mínimo e meio.
tarefas domésticas. Além disso, as mulheres se preo- No entanto, é importante mencionar a limita-
cupam em buscar qualificações que viabilizem suas ção da pergunta que constava no questionário acerca
disputas por futuras vagas de emprego, lutando contra da renda familiar, pois o intervalo de valores pode
diversas dificuldades para entrarem no mercado de tra- ter sido muito extenso, não sendo possível detectar
balho e remunerações mais baixas em comparação ao valores que representassem melhor a amostra do
gênero oposto (Alves & Resende, 2021). estudo. Assim, sugere-se que essa variável seja ava-
Aliado às questões de gênero, o retorno dos estu- liada por meio de valor numérico e não categórico.
dantes para a casa dos familiares se fez necessário Porém, na observação do contexto geral, é inegável
durante a pandemia, já que, em sua maioria, esses a afirmação de que os estudantes cotistas estão em
estudantes são provenientes de outros municípios e situação de maior vulnerabilidade social, sendo este
regiões do Brasil. Dessa forma, a migração das aulas um componente significativo que os dispõe como
para o regime remoto pode ter contribuído para que as mais suscetíveis a apresentarem sofrimento mental
estudantes mulheres se deparassem com a multiplici- (Conceição, Ituassu, & Ribeiro, 2017).
dade de tarefas concentradas no ambiente doméstico, Em relação à saúde mental, a maior parte da
que geralmente são delegadas a elas, gerando prejuízos amostra referiu a autopercepção como média, ruim
para a saúde mental, incluindo a presença de sinto- ou pior durante o período pandêmico, sendo essa
mas de ansiedade (Bartmeyer & Salles Filho, 2020). variável detectada como fator de risco associado
Esse achado também reforça dados da população ao desenvolvimento de sintomas de ansiedade.
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Esse resultado corrobora outros estudos, os quais maior frequência de mulheres e o tamanho da amos-
apontaram significativos impactos psicológicos resul- tra não representam toda a população universitária.
tantes da pandemia em universitários (Cao et al., 2020; Assim, para via de generalização do resultado,
Chang et al., 2020; Liu et al., 2020; Wang et al., 2020). o ideal seria obter uma amostra mais representativa.
É possível especular que a autopercepção da desor- A última limitação identificada refere-se aos questio-
ganização psíquica esteja associada à sensação de nários autoaplicáveis, que estão sujeitos à interpreta-
impotência diante do contexto atípico, o que pode ção dos participantes e lapso de memória/temporal
resultar na manifestação e/ou intensificação dos sin- dos fatos analisados.
tomas de ansiedade. Por fim, é recomendável que outras pesquisas
A prática da automedicação foi outra variável sejam desenvolvidas com o intuito de compreen-
encontrada como fator de risco para o desenvolvi- der melhor os impactos psicológicos da pandemia
mento de ansiedade neste estudo. Uma pesquisa de covid-19 na população universitária. É de suma
realizada durante a pandemia de covid-19 na Índia importância identificar os fatores que levam a maiores
detectou que um quarto da amostra fazia uso de riscos e vulnerabilidade e preveni-los ou promo-
automedicação, sendo que 60% dos que afirmaram ver ações que os minimizem. Ademais, sugere-se a
a prática também apresentaram sintomas de ansie- elaboração de mais estudos que avaliam interven-
dade (Chopra et al., 2021). No cenário pandêmico ções para a produção de cuidado com os estudantes
brasileiro, destaca-se a busca massiva por medica- no período pandêmico, tendo em vista a promo-
mentos que foram divulgados como sendo preventivos ção da saúde mental e a minimização dos danos
contra a covid-19, sem qualquer comprovação de efi- acarretados pela pandemia.
cácia (Melo, Duarte, Moraes, Fleck, & Arrais, 2021).
Os resultados encontrados nesta pesquisa são Conclusão
de grande importância para melhor compreensão da Os resultados deste estudo apontam que, entre
saúde mental dos universitários durante o início da os estudantes universitários, alguns fatores aumen-
pandemia de covid-19, um período de crise sanitária taram a chance de vivenciar sintomas de ansiedade
e econômica internacional. No entanto, este estudo durante a pandemia de covid-19. Entre esses fatores,
apresenta algumas limitações, que devem ser levadas estão: ser do gênero feminino; estudar em período
em consideração. A primeira, apontada anterior- não integral; ter ingressado na universidade por meio
mente nesta seção, trata da utilização de um intervalo de cotas; ter percepção de sua saúde mental durante
muito grande entre as possibilidades para preenchi- a pandemia como média ou ruim ou pior; fazer uso
mento da pergunta relacionada à renda, fator que de automedicação; e ter histórico de abuso físico na
seria solucionado caso a coleta dessa variável fosse infância e/ou adolescência.
realizada em valor numérico. Espera-se que este estudo possa contribuir para
Outra limitação refere-se à coleta de dados a compreensão dos sintomas de ansiedade entre os
online, que se fez necessária em função do distancia- estudantes universitários, especialmente entre aque-
mento social e adaptação das aulas da universidade les com maiores riscos e vulnerabilidade durante a
para o regime remoto. Essa situação pode ter feito pandemia de covid-19. Espera-se, ainda, dar maior
com que universitários mais vulneráveis socioecono- visibilidade para a necessidade de promoção da
micamente e com acesso mais restrito à tecnologia saúde mental e de acompanhamento dessa popu-
tenham tido dificuldades para acessar o questioná- lação no retorno às atividades presenciais, para que
rio online. Além disso, a amostra por conveniência, outros agravos possam ser prevenidos.
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Recebido 29/06/2022
Reformulado 10/01/2023
Aceito 08/02/2023
Received 06/29/2022
Approved 02/08/2023
Recibido 29/06/2022
Aceptado 08/02/2023
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Psicologia: Ciência e Profissão 2024 v. 44, e265461, 1-14.
Como citar: Calves, M. G. R., & Tucci, A. M. (2024). Fatores de Risco para Ansiedade entre
Estudantes Universitários na Pandemia de Covid-19. Psicologia: Ciência e Profissão, 44, 1-14.
https://doi.org/10.1590/1982-3703003265461
How to cite: Calves, M. G. R., & Tucci, A. M. (2024). Risk factors for anxiety in college students during the
COVID-19 pandemic. Psicologia: Ciência e Profissão, 44, 1-14. https://doi.org/10.1590/1982-3703003265461
Cómo citar: Calves, M. G. R., & Tucci, A. M. (2024). Factores de riesgo de ansiedad entre
estudiantes universitarios en la pandemia de la covid-19. Psicologia: Ciência e Profissão, 44, 1-14.
https://doi.org/10.1590/1982-3703003265461
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