Sociologiaescolaconsideracoes_Oliveira_2024
Sociologiaescolaconsideracoes_Oliveira_2024
Sociologiaescolaconsideracoes_Oliveira_2024
CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
NATAL/RN
2024
SHEYLA CHARLYSE RODRIGUES DE OLIVEIRA
NATAL/RN
2024
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Moacyr de Góes - CE
BANCA EXAMINADORA
_____________________________________________________________
Profa. Dra. Elda Silva do Nascimento Melo (PPGEd/UFRN)
Orientadora
_____________________________________________________________
Profa. Dra. Cynara Teixeira Ribeiro (PPGEd/UFRN)
Examinadora Interna – titular
_____________________________________________________________
Prof. Dr. Gilmar Santana (PPGCS/UFRN)
Examinador Interno – titular
_____________________________________________________________
Profa. Dra. Maria Aldecy Rodrigues de Lima (UFAC)
Examinadora Externa - titular
_____________________________________________________________
Profa. Dra. Silvana Carneiro Maciel (UFPB)
Examinadora Externa – titular
_____________________________________________________________
Adir Luiz Ferreira (UFRN)
Examinador Interno - suplente
_____________________________________________________________
Antônia Maíra Emelly C. da S. Vieira (UERN)
Examinadora Externa - suplente
DEDICATÓRIA
1. INTRODUÇÃO .............................................................................................21
2. DE ONDE SE SABE? AS CIÊNCIAS SOCIAIS NA EDUCAÇÃO
BÁSICA............................................................................................................ 27
2.1 O ensino de Sociologia: de problema epistemológico a objeto de
Representação Social...................................................................................... 43
2.2 A formação crítica e reflexiva: um pressuposto da Sociologia?................. 51
3. O QUE E COMO SE SABE? REFORMAS EDUCACIONAIS, CURRÍCULOS,
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E A CONSTRUÇÃO DE UM OBJETO DE
REPRESENTAÇÃO..........................................................................................58
3.1 As reformas educacionais, os currículos, a formação de professores e o
ensino médio: notas para um entendimento a respeito da Sociologia
escolar...............................................................................................................65
3.2 Ciências humanas e suas tecnologias: interdisciplinaridade ou invisibilização
de uma área de
conhecimento?...................................................................................................71
3.3 BNC-Formação: docência transformada em treinamento
(?).......................................................................................................................83
3.4 Docência, empregabilidade e a formação dos professores de
Sociologia........................................................................................................101
4. QUEM SABE? ESTUDANTES DO ENSINO MÉDIO DO MUNICÍPIO DE
NATAL E O CAMINHO DAS SUAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS ACERCA
DA DISCIPLINA DE
SOCIOLOGIA..................................................................................................117
4.1 A representação de alguém: a caracterização dos sujeitos da
pesquisa...........................................................................................................118
4.2 A abordagem estrutural e a organização das representações sociais: a
tessitura de um caminho sociocognitivo..........................................................124
4.2.1 “A disciplina de Sociologia é”: dimensões de uma representação
social...............................................................................................................135
5. SOBRE O QUE SE SABE E COM QUE EFEITOS? A REPRESENTAÇÃO
SOCIAL ACERCA DA DISCIPLINA DE SOCIOLOGIA E SEU ESTATUTO
EPISTEMOLÓGICO .......................................................................................152
5.1 O Núcleo Central da representação social e suas interfaces: a Sociologia na
escola sob a ótica
estudantil..........................................................................................................162
5.2 Que educação queremos? Themata, Representações Sociais e a consolidação
de uma Sociologia importante...............................................................................174
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................183
REFERÊNCIAS...............................................................................................191
APÊNDICES....................................................................................................199
22
1 INTRODUÇÃO
1 Faz-se relevante destacar que ao se fazer menção ao termo ensino de Sociologia segue-se
uma terminologia já difundida pela legislação, porém, (...) o ensino da Sociologia se dá, em
verdade, por meio do ensino das Ciências Sociais, uma vez que não se olvida que o ensino de
Sociologia na educação básica pressupõe também temas, teorias e conceitos próprios das áreas
da Antropologia e da Ciência Política. (OLIVEIRA, 2016, P. 61)
2 A Sociologia escolar nasceu no Brasil antes de seu surgimento na universidade. Um marco
notável de sua institucionalização nas escolas é o ano de 1925, quando foi introduzida no
programa de ensino do Colégio Pedro II. Com efeito, a partir da Reforma João Luiz Alves –
também conhecida como Lei Rocha Vaz (Brasil, 1925, Decreto Nº 16.782 de 13 de janeiro de
1925) – a Sociologia passou a figurar como disciplina regular do currículo do ensino secundário,
prescrito para todas as instituições nacionais que desejassem certificação de equiparação ao
Colégio Pedro II, situado no então Distrito Federal, cidade do Rio. (MEUCCI, 2015, P.252)
29
6 O PNLD, a partir de 2017 incluiu via Decreto 9.099, o Programa Nacional da Biblioteca da
Escola (PNBE). Ou seja, o Programa se tornou diretamente responsável pelos livros de leitura,
dicionários, programas educativos, e materiais didáticos impressos e softwares de ensino.
(Sousa, p.49, 2020)
7
Fato já perceptível com as escolhas do “projeto de vida” e “projetos integradores” no PNLD
2021.
37
8
a Reforma do Ensino Médio (lei 13.415/2017), a Terceirização (lei 13.429/2017), a Reforma
Trabalhista (lei 13.467/2017), A PEC do congelamento dos gastos públicos por 20 anos (Emenda
Constitucional 95/2016) e a Reforma da Previdência (Emenda Constitucional 103/2019).
38
9
Altera as Leis n º 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da
educação nacional, e 11.494, de 20 de junho 2007, que regulamenta o Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação, a
Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de
1943, e o Decreto-Lei nº 236, de 28 de fevereiro de 1967; revoga a Lei nº 11.161, de 5 de agosto
de 2005; e institui a Política de Fomento à Implementação de Escolas de Ensino Médio em
Tempo Integral. (BRASIL, 2017).
39
Nesse sentido, pois, fica evidente que enquanto normativa nacional para
a educação a BNCC, embora não seja efetivamente um currículo, passa a
orientar não somente as competências e habilidades, mas, também os
conteúdos para a educação básica. Focando no ensino médio, espaço até então
ocupado pela Sociologia, enquanto disciplina, convém mencionar que o “novo”
formato, proposto pelo referido arcabouço legal, tornou ainda mais exíguo o lugar
do componente curricular sociológico na escola.
Ante aquele quadro de intermitência curricular da Sociologia, entendemos
que a disciplina não voltou à estaca zero, por assim dizer, mas é necessário
reconhecer que sofreu um significativo revés do ponto de vista dos espaços que
40
10 Expressão popularmente conhecida que significa fingir que fez algo ou fazê-lo mal feito.
11 A este respeito a nossa discussão será consideravelmente ampliada no capítulo 2 desse
trabalho. Contudo, a saber, os itinerários formativos dividem-se, segundo a própria BNCC (2018),
nas seguintes áreas: I – linguagens e suas tecnologias; II – matemática e suas tecnologias; III –
ciências da natureza e suas tecnologias; IV – ciências humanas e sociais aplicadas; V – formação
técnica e profissional. (BRASIL, 2018).
41
Há algo muito mais grave em curso, que impede que a escola média seja
também um lugar social de construção de identidades, de sociabilidade
e reconhecimento de jovens estudantes, a nosso ver, muito mais
relacionada ao vazio gerado entre sua orientação ao mercado de trabalho
e seu papel transitório para o ingresso nos cursos superiores, que ao
formato de seu currículo. (ABECS, p.16, 2015)
Nesse cenário, uma reforma que toma uma parte pelo todo nos parece
compromissada com algo que não é a educação enquanto direito universal. A
formação imputada pela BNCC, pela reforma do ensino médio e endossada
ainda pelas DCNEM, do ano de 2018, consideram relevante, por exemplo, a
disciplina de matemática, enquanto a Sociologia cabe a obrigatoriedade de
“estudos e práticas”, mas que não confere a necessidade de um componente
curricular para tal. A naturalização e cristalização que se dá sobre a “tradição”
que algumas disciplinas ocupam no currículo escolar brasileiro, impedem em
muitas circunstâncias que se questione, por exemplo, porque numa reforma
onde há uma queixa de uma escola conteudista, ou de um currículo inchado, as
disciplinas das Ciências Humanas são diretamente questionadas sob sua
relevância, carga horária, utilidade etc., em detrimento de cátedras como as das
Ciências da Natureza, por exemplo.
revela, portanto, todas as implicações dos sujeitos que a produzem, bem como,
todos os conflitos, relações de poder, identidades etc.
Numa espécie de “leitura flutuante” (Bardin, 2014), notamos, pois, que o
movimento de apagamento da Sociologia, enquanto disciplina, acontece não
somente nos espaços físicos e acadêmicos, mas, sobretudo também no campo
discursivo, que inclui, nesse caso, a legislação mais atual a respeito do ensino
médio brasileiro. Como nos mostra Neuhold (2014), aqui no Brasil os debates
acerca da reorganização curricular por áreas de conhecimento é uma discussão
que ocorre desde meados da primeira década do século XXI. Contudo, de modo
muito conveniente, as contestações que deveriam repensar a organização
curricular de modo global, ou seja, a envolver todos os componentes curriculares
é notadamente direcionada a disciplinas consideradas menos promissoras, do
ponto de vista empregatício, e até com questões que envolvem a sua
sobrevivência na escola, o que é o caso da Sociologia. (NEUHOLD, 2014). Esse
movimento de silenciamento que perpassa os documentos oficiais reforça ainda
um não reconhecimento social desse saber como algo relevante, o que agiganta
a orquestra de hostilidade à Sociologia como disciplina do ensino médio.
Ante o exposto, fica evidente que os embates para que a Sociologia
ocupasse seu lugar ao sol tomaram um tempo significativo na história das
disciplinas brasileiras e passa, novamente, por um cenário de questionamentos,
tensões e incertezas e, nesse contexto
esperar com tal diploma universitário de Ciências Sociais? Por quê? Com
qual interesse e com quais objetivos devemos fazer a análise do mundo
social? Ou qual papel a sociologia exerce no curso da história e no bojo
das transformações sociais? (CARVALHO FILHO, p. 62 apud LAHIRE,
2002).
13 Em consonância com Neuhold (2014), entendemos que os três termos se referem, guardados
os devidos períodos históricos no Brasil, a formação de jovens que se inserem na faixa etária
entre 15 e 18 anos.
14 A este respeito, o trabalho de Neuhold (2014) elucida detalhadamente o processo de formação
do que a autora denomina de uma Sociologia do ensino de Sociologia, traçando todo o processo
de institucionalização da disciplina escolar a partir dos debates que os intelectuais da área vão
48
estabelecendo, além de fazer em seu primeiro capítulo uma relação direta entre essa “nova”
problemática epistemológica das Ciências Sociais e as sociedades científicas da área.
49
15Aqui, enfatizamos que nos referimos aos 12 professores de Sociologia com formação em
Ciências Sociais.
51
16O terceiro capítulo deste trabalho explanará considerável e mais claramente o que é e as
contribuições da TRS para o desenvolvimento desse estudo.
52
17 No estudo em questão fez-se uso da Técnica de Associação Livre de Palavras, que consiste
em pedir aos sujeitos pesquisados que, partindo de um termo indutor (“Ensinar Sociologia é...”)
evoquem palavras (as três primeiras) que mantenham uma relação com aquele termo.
Provavelmente, os sujeitos indicarão aquelas palavras que lhes são mais latentes, que talvez
circulem em seus discursos e práticas mais corriqueiramente.
53
18
Ver SOUZA, Karla Danielle da Silva. Educação e cidadania: caminhos de desigualdades e
neoliberalismo no Brasil. 2020. 203 f. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) - Centro de Ciências
Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2020.
62
modo como essas reformas vem acontecendo, desde a Reforma Capanema fica
evidente que não há uma visão crítica sobre a realidade social desse país e,
nesse sentido, sobre a realidade escolar. Os modelos curriculares parecem-nos
importados imputando a realidade uma necessidade de adequar-se a essas
estruturas, quando o movimento deveria ser o contrário.
Oliveira (2021) ilustra essa problemática sob a perspectiva de Anísio
Teixeira (1956), quando nos diz que:
caibam? A métrica que os coloca como bons ou maus alunos é adequada a suas
realidades? Há, efetivamente, um interesse coletivo e público de que esses
jovens sejam sujeitos de suas histórias e protagonistas dentro dessa sociedade?
Para Chervel (1990) é por meio das disciplinas escolares que a escola vai
propor um conteúdo que esteja a serviço de uma finalidade educativa, esperada
em determinado contexto social e histórico. Para este estudioso, o sumiço de
algumas disciplinas, por exemplo, explica-se pela sua não capacidade de
atender a finalidade educativa de sua época.
Nesse sentido, numa aproximação mais expressiva com os modelos
curriculares críticos e pós-críticos, apresentados por Silva (2021), em seus
estudos sobre as teorias curriculares, a centralidade do nosso questionamento
reside, essencialmente, no “por quê?” (...) alguns saberes escolares são levados
a patamares inalcançáveis de legitimidade, enquanto outros tem quase
simultânea à sua história enquanto disciplina, um histórico de incertezas e
intermitências. Assim sendo, coadunando com (SILVA, 2021, p.16)
questionamos: “Por que esse conhecimento e não outro? Quais interesses
fazem com que esse conhecimento e não outro esteja no currículo? Por que
privilegiar um determinado tipo de identidade e subjetividade e não outro?
Ainda nesse sentido, julgamos importante compreender o que estamos
falando ao referirmo-nos a estas disciplinas. Para André Chervel (1990), o
conceito de disciplina do modo como entendemos hoje é recente e sua definição
deve ficar a cargo do pesquisador que enquanto a mensura também faz a sua
história. Fazendo em seu texto um considerável percurso léxico e cognitivo a
respeito do tema, a conclusão a que chega é a de que “a disciplina é, igualmente,
para nós em qualquer campo que se a encontre um modo de disciplinar o
espírito, quer dizer de lhe dar os métodos e as regras para abordar os diferentes
domínios do pensamento, do conhecimento e da arte.”. (CHERVEL, 1990, p.
180) A disciplina escolar diz respeito ainda, segundo o mesmo autor, a uma
espécie de entidade da própria escola sendo seu estudo e sua compreensão um
meio para o entendimento da própria instituição escolar, contudo, tal
entendimento se daria por meio dos saberes que essa instituição propaga, em
determinadas épocas e contextos.
Assim, nos parece evidente que compreender a história das disciplinas
escolares é, também, um exercício de compreensão do papel da própria escola,
68
histórico. Numa síntese daquilo que elucidam Chervel (1990) e Goodson (2018),
intentamos compreender o funcionamento da escola e sua relação com as
demais instituições sociais fazendo uso do artefato curricular, bem como da
história da Sociologia, enquanto disciplina escolar. Há ainda, nesse caminho, a
menção a alguns imperativos funcionais escolares que corroboram para uma
visão absolutamente estereotipada e naturalizada a respeito da referida
disciplina e do seu lugar nos currículos escolares.
Ao levarmos em conta, por exemplo, as representações sociais
constituídas a respeito da disciplina de Sociologia, pelos estudantes aqui
investigados e entendendo que essa representação social é sempre a
representação de alguma coisa (objeto) e de alguém (sujeito). (...) tendo com
seu objeto uma relação de simbolização (substituindo-o) e de interpretação
(conferindo-lhe significações). (JODELET, 2001, p. 27) compreendemos que a
construção dessas representações, especificamente no que se refere ao nosso
objeto – a disciplina de Sociologia no Ensino Médio – mantem direta relação com
a forma como são dispostos e executados os currículos que trazem (ou não) a
referida disciplina.
Sendo assim, compreender os porquês e o histórico intermitente da
Sociologia enquanto disciplina escolar significa entender melhor as
representações sociais que os estudantes constroem e, de que modo o fazem a
partir de um contexto insalubre, no que se refere ao ensino sociológico. Esse
cenário de insalubridade para a Sociologia está, sem dúvida, relacionado aos
movimentos e mudanças ocasionados pelas diversas reformas educacionais no
Brasil. Mas, mais que isso, nesse movimento de refração e reflexão.
Conforme trouxemos no primeiro capítulo desse trabalho, a história da
Sociologia enquanto saber escolar é uma história de intermitências que envolve
seu ingresso e exclusão dos currículos em diversos momentos e que, no geral,
estão marcados por diversos contextos sócio-históricos e suas reformas
educacionais. Estas reformas estão sempre relacionadas a política pública
educacional, ou seja, numa definição deveras simplista as reformas acontecem
(ou deveriam acontecer) em acordo com ações conduzidas pelo Estado, no
intento de garantir o cumprimento dos direitos outorgados constitucionalmente,
como é o caso do direito à educação. As políticas públicas são, no Brasil, uma
política de Estado, inerente a qualquer governante que passe pela direção do
70
país. Entretanto, o modo como estas políticas serão desenvolvidas fica a cargo
da política social e econômica adotada por cada governo.
Segundo Libâneo (2016), contudo, aqui no Brasil no âmbito das políticas
oficiais de governo
Diante do panorama até aqui colocado fica claro que não há teoria
curricular, currículo ou mesmo reformas e políticas educacionais despidos de
valores sociais, econômicos e políticos. No caso do Brasil, e pensando-o a partir
do lugar que ele ocupa, principalmente num cenário macrossocial e econômico,
72
Ante a breve explanação que foi feita até aqui entendemos, em definitivo,
que os currículos são um espaço de poder e um instrumento que reflete uma
série de disputas e, portanto, carrega as marcas dessas relações. O currículo é,
sem dúvidas, uma construção social – conforme endossamos com Goodson
(2020) e com Silva (2021) – e, por assim ser:
Arroyo (2021) nos provoca, por exemplo, quando questiona que mesmo
acumulando muitos saberes, os currículos pouco sabem ou refletem, em alguma
medida, os conhecimentos carregados por aqueles que os operacionalizam – os
professores, ou ainda aqueles que os aprendem – os educandos. Não há para
73
onde está inserido, os conteúdos que ele aprende e o próprio fazer de seus
professores. É nesse espaço de tensões, multiplicidades e fluidez que nós
perguntamos a esses estudantes o que a disciplina de Sociologia é, para eles.
Somos levados a pensar que suas respostas, que ilustram, pois, os
processos de ancoragem e objetivação, sofrem influência direta da forma como
os currículos do ensino médio acontecem e, no caso em evidência nesse
trabalho, de como a disciplina de Sociologia vem, historicamente, se colocando
(ou não) nesses currículos. Ilustrando melhor os processos de ancoragem e
objetivação, fica claro que o movimento de atribuir sentido ao objeto de
representação (ancoragem) e tornar esse objeto concreto (objetivação) é algo
estreitamente relacionado à realidade na qual os sujeitos estão inseridos:
20
Essa formação inicial em nível superior envolve os cursos de licenciatura, os cursos de
formação pedagógica para graduados e os cursos de segunda licenciatura.
90
21
É o nome que se dá às manobras para cumprimento das metas fiscais. Consiste em operações
orçamentárias, que não estão previstas na legislação, que visam atrasar o repasse financeiro a
algumas instituições bancárias como forma de apresentar bons indicadores econômicos.
(SOUZA, 2020, P 81)
93
22 No estado do Rio Grande do Norte também tem cursos ativos de licenciatura em Ciências
Sociais a Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), no campus central, no
município de Mossoró e a Universidade Potiguar (UNP), instituição privada de ensino, que oferta
a licenciatura em Ciências Sociais na modalidade de Educação à Distância (EAD), para vários
municípios do estado potiguar, ou mesmo fora dele. As duas instituições não se circunscrevem
no recorte a ser estudado nesse trabalho e, por uma questão de tempo seus cursos, nesse
momento, não serão objetos das discussões aqui levantadas.
107
da Ciências
Aprendizagem Sociais
Tecnologias OBR 60 Oficina de OBR 100
Educacionais e Projetos em
Elaboração de Contextos
Materiais Educativos I
Didáticos
Estágio OBR 100 Disciplina - 60
Supervisionado Optativa
II
Oficina II de OBR 60 Diversidade de OBR 60
Métodos gênero,
Qualitativos Educação e
relações
Étnico-raciais
Estágio OBR 100 Oficina de OBR 100
Supervisionado Projetos em
7º III 7º Contextos
Educativos II
Estágio OBR 100
Supervisionado
III
Disciplina - 60
Optativa
Participação OBR 60 Estágio OBR 100
Política e Supervisionado
8º Educação 8º IV
Atividades OBR 200 Oficina de OBR 100
Acadêmico- Produção de
Científico- Material
Culturais Didático-
Pedagógico
para o Ensino
de Ciências
Sociais
Trabalho de OBR - Disciplina - 60
Conclusão de Optativa
Curso
Disciplina - 60
Optativa
25Os tipos de ensino, que ousadamente anunciamos no tema do estudo como as Sociologias no
ensino médio, são configurados por práticas educativas em movimento que se expressam no
cotidiano das escolas, em função de contextos e situações diversas. (CUNHA, 2017, P. 208)
115
53,70% 46,30%
0,00% 10,00% 20,00% 30,00% 40,00% 50,00% 60,00% 70,00% 80,00% 90,00% 100,00%
Masculino Feminino
80%
60%
44%
40% 29%
27%
20%
0%
98,50%
100,00%
90,00%
80,00%
70,00%
60,00%
50,00%
40,00%
30,00%
20,00%
10,00% 1,50%
0,00%
por semana, nas três séries do Ensino Médio. Aqui é importante mencionar que
as redes estadual e privada, nas escolas investigadas, tinham a Sociologia como
disciplina anual, tendo esta 1 aula semanal de 45 minutos, durante todo o ano
letivo. Já na instituição federal a Sociologia e a Filosofia são disciplinas
semestrais que se alternam nas turmas e, por esse motivo, a disciplina tem 2
aulas semanais, de 45 minutos cada, mas, em somente um semestre letivo.
Desse modo, embora organize-se de modo diferente, ao final de um ano letivo é
esperado que os estudantes das três redes de ensino tenham cumprido a carga
horária total de 120 horas/aula de Sociologia.
A respeito das instituições pesquisadas, serão ocultados seus nomes,
conforme acordo tácito estabelecido entre os gestores das instituições e a
pesquisadora responsável. No município de Natal, ainda de acordo com o último
censo escolar, encontram-se 111 instituições de ensino que ofertam o Ensino
Médio. Para esta pesquisa foram visitadas duas instituições de ensino da rede
privada, uma instituição da rede pública estadual e uma da rede pública federal.
As escolas da rede privada localizavam-se no bairro Pitimbú e no Tirol,
respectivamente nas zonas Sul e Leste do município, enquanto a escola da rede
estadual ficava no Centro da cidade e a instituição da rede federal no bairro do
Tirol, também zona Leste da capital potiguar. As visitas a estas escolas
aconteceram entre os meses de setembro de 2022 e janeiro de 2023 em horários
previamente agendados com a gestão e os professores de Sociologia das
escolas que, gentilmente, cederam seus horários de aula para que fosse
desenvolvida, com os estudantes a principal técnica de investigação da pesquisa
em curso: a Técnica de Associação Livre de Palavras (TALP). A este respeito,
os tópicos seguintes elucidarão detalhadamente os caminhos teóricos e
metodológicos adotados na referida pesquisa, levando em consideração o
objetivo de encontrar a representação social acerca da disciplina de Sociologia
dos estudantes aqui caracterizados.
também sua forma de agir e, nesse sentido, impactando seu entorno, o que lhe
atribui, também, um aspecto que é social. De outra forma, o fenômeno
representacional é psicossociológico e, portanto, a sua compreensão gravita
entre os campos sociológico e psicológico do conhecimento. Já a não exatidão
na conceituação da representação social, junto a outros fatores tornaram-se
emblemas à teoria moscoviciana que, assim como nos elucida Oliveira (2015),
agravam-se quando esta teoria toma como objetos os saberes produzidos no
senso comum. Assim, vejamos:
31OME: Cálculo matemático que revela a hierarquia atribuída às palavras durante o processo
da TALP.
139
docente e o ensino de Sociologia. Em sua obra, Arroyo (2021), faz uma ampla
discussão sobre os sujeitos e saberes implicados no território em disputa onde
configuram-se os currículos, conforme trouxemos em várias menções ao longo
desse texto. E quando fala da escola, do currículo e de algumas de suas funções
o autor nos coloca que
Pensar suas realidades fora de uma previsão de futuro ou como algo que
ficou no passado parece um elemento significativo a esses jovens quando falam
da disciplina de Sociologia. O estranhamento, a desnaturalização, propostos
inclusive nas Orientações Curriculares Nacionais para o Ensino Médio – OCNEM
(2006), parecem reverberar na importância que tem a Sociologia para essa
compreensão social, para o desenvolvimento de um senso crítico e, inclusive,
para a ação cidadã. Essa dimensão representativa reforça os achados da nossa
pesquisa de mestrado que mostravam as representações dos professores de
141
Sociologia é interagir com o outro, essa interação com o outro é o que faz
a sociedade e como somos pessoas diferentes debatemos acerca de
ideias, visões de mundo e perspectivas. (INTERLOCUTOR 69)
143
E segue:
vemos que tal parte da ciência, mesmo que inexata, tem grandes
impactos até em questões de interesse comum, como econômica e
mecanismos de poder/eleições. (INTERLOCUTOR 128)
Complexa porque tem toda uma construção e explicação para o
comportamento de cada sociedade. (INTERLOCUTOR 77)
A sociologia abrange muitas áreas e nos dá conhecimentos diversificados
que servem para diversas situações em nossas vidas. (INTERLOCUTOR
84)
Pois trata de relações intrinsecamente humanas e se manifesta em tudo.
(INTERLOCUTOR 97)
Segundo o mesmo autor, essa não seria uma tarefa fácil, principalmente
quando levamos em conta o contexto no qual o seu texto foi produzido, mais um
período histórico de instabilidade para a Sociologia. Todavia, ainda que nesse
contexto, ao tentar responder ao questionamento sobre “qual seria a
especificidade da Sociologia?” O exercício feito por Sarandy (2001) é
significativamente compatível com a percepção que os estudantes trazem nessa
pesquisa. O diferencial da Sociologia no ensino médio seria sua contribuição,
148
Podemos afirmar que o contato dos jovens educandos com essas teorias,
(...) irá produzir neles uma percepção, uma compreensão e um modo de
raciocínio que nenhuma outra disciplina poderá produzir. É exatamente
essa compreensão ou essa percepção específica que indica a identidade
da sociologia e que fornece seu sentido enquanto disciplina do ensino
médio, não os seus conteúdos em si mesmos. (SARANDY, 2001, P.05)
Pois de maneira geral sua síntese costuma ser com materiais muito
antigos e de difícil acesso (gramatical). (INTERLOCUTOR 80)
Chata pelas discussões que causa, entediante pois tem bastante textos
e debates. (INTERLOCUTOR 90)
A tarefa não é tanto ver aquilo que ninguém viu, mas, pensar o que ninguém
ainda pensou sobre aquilo que todo mundo vê
(Arthur Schopenhauer)
A Construção de um
saber que se dá em
interação: uma análise Tabata Larissa Soldan UFPR – 2015
de representações
sociais da Sociologia
escolar
As Representações
Sociais de jovens
estudantes do Ensino Raquel Vasconcelos dos UNIVASF – 2020
Médio sobre o ensino de Santos Neta
Sociologia: reflexões
acerca das relações
entre juventudes, escola
e o ensino de Sociologia
Fonte: elaborado pela autora (2024)
Quando optamos pela abordagem estrutural como fio condutor dentro das
possibilidades disponíveis para quem estuda a Teoria das Representações
164
Assim sendo, temos que as palavras que farão parte do núcleo central da
representação são aquelas que possuem uma frequência maior, sendo citadas
mais vezes e ocupando a primeira posição quando de sua hierarquização. Em
seguida temos as evocações que ocupam os círculos mais externos, sendo
essas palavras as que compõem os elementos intermediários I e II e um pouco
mais distante a periferia. Destacamos aqui ainda que a imagem do SER com as
fendas abertas em seus círculos busca representar o movimento que existe na
estrutura representacional, movimento este evidenciado também pelas cores
das palavras, sendo aquelas que estão na cor preta elementos estabelecidos
nos locais que ocupam, as que estão na cor vermelha representam evocações
que estão saindo do espaço onde estão e as palavras na cor azul representam
elementos que estão adentrando a estrutura representacional.
Na análise dos dados colhidos na TALP, portanto, fizemos uso do SER
(MELO, 2022)32, desenvolvido pela orientadora dessa tese e faremos aqui uma
observação à forma como essas apreciações aconteceram.
32 Link de acesso ao SER, sistema que gera as espirais a partir dos dados trazidos pelas TALP.
https://talp-app.herokuapp.com/
166
Figura 05. Núcleo Central das Espirais por rede de ensino: 1. Rede pública
estadual; 2. Rede pública federal e 3. Rede privada
33A base de cálculos utilizada para geração de dados na SER foi apresentada no capítulo
anterior no item 4.2.1
169
Dessa forma, evocações como essas e tantas outras que traziam em suas
justificativas referências a aspectos conceituais ou científicos da disciplina de
Sociologia, compõe os primeiros elementos intermediários dessa representação,
bem como, a segunda dimensão representativa34 de maior expressividade,
conforme trouxemos no capítulo anterior. A dimensão crítico-racional conforma
justamente esse espaço da disciplina que oferece instrumentos para uma
compreensão científica da sociedade. Interessante pensar que diferente de um
professor de Sociologia, que poderia trazer essa dimensão como um objetivo a ser
alcançado ou como um compromisso de sua atuação, os estudantes trazem a
perspectiva de quem está aprendendo tais conceitos e, em alguma medida,
relacionando-os com a realidade.
E, nesse sentido, nos parece que a Sociologia escolar vem cumprindo seu
papel:
Importante
Sociedade Complexa
35Sobre imaginação sociológica ver: MILLS, Charles Wright. A Imaginação Sociológica. 6 ed.
Tradução: Waltensir Dutra. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1982.
174
Importante
Reflexiva Necessária
Ferramenta Transformadora
Desvalorizada Interessante
Diálogo Analítica
Chata Discussão
Criticidade Legal
Fundamental
Antes de falar sobre o ensino de Sociologia e o espaço (ou não) que essa
disciplina vem ocupando nos currículos da educação básica brasileira, entendemos
que há uma questão subjacente ao nosso objeto de investigação, mas, que a ele
relaciona-se diretamente, que é o modelo de formação e de educação que vem
sendo pensados para o Brasil. Já tendo abordado de modo extenuante essa
temática até chegarmos aqui, percebemos que antes de pensar como está a
176
de pesquisa e que não podem ser reduzidas nem à observação, nem ao cálculo.
(LIMA, 2008). Segundo o mesmo autor a evolução das teorias científicas estaria
diretamente relacionada a um movimento dialético de Themata opostos.
FORMAÇÃO
FORMAÇÃO IMPORTANTE NÃO-CRÍTICA
CRÍTICA
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
metodológico seja distinto, os resultados apontam para um lugar que nos faz
questionar como esse entendimento de relevância dado a disciplina em questão
se consolida diante de cenários tão adversos. Além de elementos trazidos nas
pesquisas anteriores a nossa, como por exemplo: a formação crítica e cidadã, a
relação professor/aluno, o potencial de conscientização política e intervenção
social atribuídos à Sociologia escolar, defendemos nesse trabalho a tese de que
as representações positivas arroladas a referida disciplina estão ancoradas num
thema, no referencial de um pensamento preexistente que traz o que podemos
chamar, assim como Ribeiro (1986), de projeto de crise educacional.
A partir dos dados obtidos por meio das TALP desenvolvidas nesse
trabalho, o núcleo central da representação dos estudantes apontou para a
palavra “importante” como elemento mais estável na imagem construída pelo
grupo, acerca da disciplina de Sociologia. Ao analisarmos todo o contexto sócio-
histórico de intermitência curricular da disciplina, de modelos curriculares aos
quais esses estudantes encontram-se submetidos, além de um “novo”
movimento de apagamento da Sociologia na escola, endossado pelo Novo
Ensino Médio36, junto a BNCC defendemos que a visão trazida pelos
pesquisados está diretamente relacionada ao chamado projeto de crise da qual
se constitui a educação brasileira. Essa crise, segundo Ribeiro (1986) evidencia-
se não exatamente como uma crise, mas, como um projeto educacional que vem
excluindo, sistematicamente, pobres, negros e tantas outras minorias alienadas
de uma escola que é pensada para aumentar as distâncias sociais.
A projeção dessa e de outras crises, que refletem hoje num processo de
educação dual e ainda esvaziada de sentido, principalmente para os jovens
periféricos, nos fazem pensar que quando um estudante diz que a disciplina de
Sociologia é importante porque ela o auxilia numa leitura social mais acurada ou
porque ela ajuda-o no desenvolvimento do seu senso crítico ou ainda porque por
meio dela a compreensão de sua realidade social é possível, esse estudante
está nos falando que a Sociologia, enquanto disciplina escolar, deixa de ser um
36A implementação do NEM iniciada no ano de 2022 está suspensa desde abril de 2023 e pode
sofrer alterações ainda no corrente ano. Como alternativa às regras do Novo Ensino Médio, o
governo apresentou, em outubro, o Projeto de Lei 5.230/2023, que redefine a Política Nacional
de Ensino Médio no Brasil.
186
37Esse dado está baseado no levantamento feito aqui nessa pesquisa, acerca de trabalhos
acadêmicos de dissertação ou tese que envolvem as Representações Sociais de estudantes
sobre a disciplina de Sociologia. Os dados estão dispostos na tabela X, seguidos de análise.
189
Acho boas as matérias aqui na escola, mas, com essas mudanças muitas
disciplinas foram encurtadas, principalmente na área de humanas, talvez
mudar o formato das disciplinas fosse mais interessante, melhor. Id. 01
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
SANTOS, A. C. et. al. Entre o fazer e o dizer da Sociologia no Ensino Médio. In:
I Seminário Nacional do Ensino Médio: história, mobilização, perspectivas. 2011,
Mossoró. Anais eletrônicos. Mossoró, 2011.
APÊNDICES
201
1. Escreva rapidamente as palavras (somente palavras, uma para cada espaço) que, em sua
opinião, completam a afirmação:
2. Agora enumere as palavras que você escreveu, classificando-as de acordo com a importância
que você atribui a cada uma delas. Use os quadrinhos para pôr os números.
1. Escreva rapidamente as palavras (somente palavras, uma para cada espaço) que, em sua
opinião, completam a afirmação:
2. Agora enumere as palavras que você escreveu, classificando-as de acordo com a importância
que você atribui a cada uma delas. Use os quadrinhos para pôr os números.
1. Escreva rapidamente as palavras (somente palavras, uma para cada espaço) que, em sua
opinião, completam a afirmação:
2. Agora enumere as palavras que você escreveu, classificando-as de acordo com a importância
que você atribui a cada uma delas. Use os quadrinhos para pôr os números.