A LEITURA NA ESCOLA PÚBLICA

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A LEITURA NA ESCOLA PÚBLICA: PERCEPÇÕES DISCENTES

Heloisa Barretto BORGES – UEFS1162


Maria Helena da Rocha BESNOSIK - UEFS1163
Rita de Cássia Brêda Mascarenhas LIMA – UEFS1164

“Ler, pois, é uma viagem, uma entrada insólita em outra dimensão


que, na maioria das vezes, enriquece a experiência: o leitor que, num
primeiro tempo, deixa a realidade para o universo fictício, num
segundo tempo volta ao real, nutrido da ficção” (JOUVE, 2002, p.
109).

Resumo: O objetivo principal da pesquisa que originou este trabalho foi traçar o perfil do
leitor da escola pública envolvendo professores e estudantes. Apresentamos neste texto
resultados oriundos do grupo focal realizado com dez estudantes. A utilização desse
instrumento de coleta possibilitou conhecer o lugar da leitura em suas vidas, suas preferências
e modos de ler. Os dados revelaram uma relação dos jovens com a leitura influenciada pela
família, mídia ou escola, demonstrando que cada leitor constrói a sua história como sujeito
historicamente situado. A leitura, neste estudo, é concebida como prática sociocultural que
acontece dentro e fora da escola.
Palavras-chave: Pefil leitor. Leitura literária. Escola Pública.

1. Introdução

Este trabalho é parte da pesquisa ―Leitores da escola pública: um estudo de caso no


Colégio Estadual de Feira de Santana‖, iniciada em 2008, com financiamento da Fundação de
Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB) e foi concluída em junho de 2012. Esta
pesquisa está vinculada ao Núcleo de Leitura Multimeios da Universidade Estadual de Feira
de Santana que, desde 1992, vem realizando trabalhos de pesquisa e extensão, tendo os
Círculos de Leitura como sua metodologia basilar. A investigação surgiu da necessidade de
fortalecimento e sistematização das histórias de leitura dos leitores considerados comuns e,
consequentemente, com pouca visibilidade nas pesquisas oficiais. O objetivo principal foi
traçar o perfil do leitor da escola pública envolvendo professores e estudantes.
Tal experiência revelou um perfil diversificado de leitor, que nem sempre está em
sintonia com o perfil preconizado pela escola ao considerar leitores aqueles que apenas leem o
cânone literário. Foi percebido, então, que muitos alunos e professores se consideravam não
leitores porque liam cultura de massa, livros de autoajuda, best-sellers, textos da internet, ou
outros suportes e autores não autorizados pela escola. Um aspecto importante deste estudo é

1162
Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS). Feira de Santana (BA), Brasil. E-mail:
isabborges@hotmail.com
1163
Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS). Feira de Santana (BA), Brasil. E-mail:
maria.besnosik@gmail.com
1164
Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS). Feira de Santana (BA), Brasil. E-mail:
rbredalima@yahoo.com.br
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que foi percebido que os jovens estão lendo sim, desfazendo o equívoco de que os estudantes
atuais não leem porque não gostam de fazê-lo.
A questão que moveu nosso desejo de pesquisa foi conhecer os perfis de leitores que
circulam na escola básica e que proposta pedagógica no âmbito da formação leitora de seus
alunos esta instituição oferece. Muitos estudos e pesquisas já vêm constatando que docentes e
discentes têm sido reféns de uma metodologia que não prioriza a valorização do saber literário
e da leitura como condição para seu autoconhecimento, sua inserção e ajustamento no mundo
em constante transformação. Um argumento lúcido que pode emergir desse turbilhão é que
ensinar a leitura constitui-se em uma ação educativa que a escola é desafiada a abraçar,
ampliando a responsabilidade para todas as áreas do quadro curricular da Educação Básica.
Da escola, como instituição oficial do processo educativo, especificamente, ainda se
espera que envide maiores esforços para investimentos produtivos no campo da leitura, a fim
de elaborar projetos de formação de leitores que se enquadrem numa visão crítica da leitura e
que propicie o acesso aos materiais disponíveis no mercado. Torna-se sensato reconhecer que
a leitura literária intra e extramuros escolares produz múltiplos efeitos e ela pode ser cultivada
em espaços sociais diversificados a partir do perfil de seus leitores e seus diferentes modos de
ler.
Nesta pesquisa, com intuito de traçar o perfil leitor dos sujeitos da escola pública,
adentramos o espaço da escola e estabelecemos com os discentes integrantes desta uma
relação de cumplicidade e de escuta. Considerando os limites deste texto, optamos por
socializar apenas os dados oriundos do Grupo Focal. A realização do grupo focal foi marcante
no processo de coleta de dados por possibilitar um momento concreto em que os jovens se
apropriaram da palavra e descreveram suas experiências de leitura a partir da referência da
família, da escola e de outros espaços.
A experiência foi realizada com 10 (dez) estudantes do Ensino Médio em uma
pequena sala disponibilizada pela diretoria da escola. Ao iniciarmos a atividade, explicamos
que nós, pesquisadores, escutaríamos mais do que falaríamos1165. A nossa atuação constituiu-
se em provocar o diálogo que foi se desenrolando no próprio grupo.
Ao longo do texto, buscaremos discutir as múltiplas faces que a leitura ora apresenta,
além das percepções discentes acerca dos seus percursos leitores e do papel da família e da
escola na sua história de leitura.

2. A leitura: múltiplas faces

As abordagens atuais sobre a leitura têm revelado a grande relevância de seu domínio
para o ajustamento do indivíduo em suas práticas sociais, levando em conta que os suportes
leitores interagem com a cultura, mantendo um vínculo espaço-temporal ilimitado e se
constituindo como um bem cultural disponibilizado à fruição de todos.
A leitura literária tem gozado de um status prestigiado no espaço escolar, na
contemporaneidade, considerando o entendimento de seus efeitos no imaginário e no
psiquismo humanos, bem como no exercício das emoções pessoais e coletivas. Eagleton
(1997, p. 22) postula que ―… a literatura não existe da mesma maneira que os insetos, e que
os juízos de valor que a constituem são historicamente variáveis, mas que esses juízos têm,
eles próprios, uma estreita relação com as ideologias sociais‖. Assim, fica perceptível que o
ser humano está inserido num mundo objetivo de vivências compartilhadas e que há um
vínculo significativo entre a literatura e a sua condição existencial. Sob essa ótica, a pessoa

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É importante salientar que essa foi a primeira oportunidade dos estudantes vivenciarem a realização de um
Grupo Focal, por isso optamos em esclarecer o procedimento de execução.
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em sua individualidade/subjetividade experiencia variados sentimentos, os quais são


compartilhados na coletividade/objetividade do mundo real. Tais vivências, detentoras de
marcas políticas e sociais, afloram tanto no processo de produção de textos literários (visão de
mundo do escritor), quanto no processo de recepção (construção de sentidos do leitor).
Considerando o aspecto polissêmico da produção literária, entende-se que as vozes
plurais que emanam do texto e que interagem com o imaginário do leitor vão tecendo o
sentido global do texto. Então, a construção de sentidos é para o leitor a consequência do
encontro que se estabelece entre ele e o livro, sendo marcada sempre pelo ineditismo, visto
que cada leitura é única. Para Jouve (2002, p.52): ―Existe de fato um nível de leitura em que,
por meio de certas ―cenas‖, o leitor reencontra uma imagem de seus próprios fantasmas‖.
Jouve ainda se refere ao ―pacto de leitura‖, através do qual o leitor encaminha o seu
modo de ler a partir do gênero textual e do lugar que este ocupa na instituição literária. São
convenções que se constroem de modo sutil e que determinam ao leitor sua maneira de ler a
obra e insinuam expectativas de leitura. Assim, ―Todo texto, de fato, inscreve-se numa
linguagem, uma poética e um estilo, que são, para o leitor, sinais de seu trabalho de
deciframento‖ (JOUVE, 2002, p.69).
Nesse sentido, é na sintonia entre escritor e leitor que a dinâmica da leitura se
consolida, posto que ―a leitura é sempre a apropriação, invenção, produção de significado‖
(CHARTIER, 1988, p. 77). O autor chama a atenção para a figura do leitor quando aborda
sobre o caráter especialmente singular da experiência leitora, sem desvincular esse sujeito de
seu cenário sociocultural. Ele sublinha sua liberdade, embora não absoluta, mas capaz de
mergulhar no que lê de modo peculiar, ou subverter o que lê de acordo com os limites
interpretativos de sua experiência nos âmbitos temporal e local. Dessa forma:

[…] as experiências individuais são sempre inscritas no interior de modelos


e de normas compartilhadas. Cada leitor, para cada uma de suas leituras, em
cada circunstância, é singular. Mas esta singularidade é ela própria
atravessada por aquilo que faz que este leitor seja semelhante a todos aqueles
que pertencem à mesma comunidade. O que muda é que o recorte dessas
comunidades, segundo os períodos, não é regido pelos mesmos princípios
(CHARTIER, 1988, p. 91-92).

Nessa perspectiva, na compreensão de que há uma interação texto-leitor, concordamos


com Jouve (2002) quando destaca que, no ato de leitura, a recepção não ocorre de modo
passivo, visto que a obra carece da participação do leitor como destinatário ativo.
Dessa forma, os modos de ler são socialmente referenciados, entretanto, são
normalmente motivados pelas conquistas individuais dinamizadas no interior dos grupos
sociais, em cujos espaços os sujeitos compartilham vivências da cultura escrita e elaboram
visões de mundo aproximadas, sem apagar as peculiaridades leitoras de cada partícipe no ato
de ler.
Lajolo, abordando sobre leitura de romances, põe em tela a importância do leitor ao
declarar que ―sem leitor não há romance nem literatura‖. A pesquisadora afirma: ―Mas que
ninguém se iluda: no mundo da leitura e dos livros nada é possível sem que os leitores – no
avesso do trabalho dos escritores – desempenhem seu papel e cumpram sua função‖
(LAJOLO, 2004, p. 139-140). Depreende-se assim que, explícita ou implicitamente, o leitor
marca seu pertencimento na obra literária a partir do esboço inicial da produção e que não
importa se autores não admitam essa presença imanente e alguns afirmem não pensar no leitor
em seus momentos de criação, visto que a presença do sujeito-leitor é algo marcante como o
interlocutor potencial da obra literária.
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Cosson, ao propor o ―letramento literário‖, ressalta a possibilidade de uso social e


domínio da escrita literária além dos limites comuns de utilização das práticas escolares. Ele
discorre que:

Na leitura e na escritura do texto literário encontramos o senso de nós


mesmos e da comunidade a que pertencemos. A literatura nos diz o que
somos e nos incentiva a desejar e a expressar o mundo por nós mesmos. E
isso se dá porque a literatura é uma experiência a ser realizada. É mais que
um conhecimento a ser reelaborado, ela é a incorporação do outro em mim
sem renúncia da minha própria identidade. No exercício da literatura,
podemos ser outros, podemos viver como outros, podemos romper os limites
do tempo e do espaço de nossa experiência e, ainda assim, sermos nós
mesmos. É por isso que interiorizamos com mais intensidade as verdades
dadas pela poesia e pela ficção (COSSON, 2006, p. 17).

Nesse processo de letramento literário, há que se atentar para a importância do leitor, o qual
exerce o papel de consolidar, no ato de leitura, o processo de produção do escritor. A experiência da
leitura denota a ação do texto sobre o leitor. A diversidade textual disponível na sociedade letrada
permite leituras que emocionam, divertem, informam, convencem, desafiando sempre o leitor a
conquistar além de prazeres da fruição, a consolidação de prazeres de saber e conhecer. O
entendimento do poder influenciador da leitura é indiscutível, visto que a leitura não é uma
experiência neutra. Nas histórias de leituras dos indivíduos, há sempre subjacente ao texto um teor
interpretativo-ideológico que contamina o pensar e o sentir desses leitores.
Nessa perspectiva, o impacto da leitura ocorre notadamente num espaço simbólico em que
prevalece uma relação entre o mundo real e/ou idealizado do sujeito leitor e o mundo esboçado pelo
texto. Diante do exposto, urge criar no espaço escolar oportunidades de experiências leitoras que
propiciem aos alunos a (re)descoberta de si mesmos e do mundo, num processo contínuo de
ressignificação da vida em todas as suas nuanças.

3. A leitura: percepções discentes

Quem são esses leitores reais? O que pensam sobre a sua formação como leitores?
Qual tem sido o papel da escola na formação de um leitor crítico? Essas são algumas questões
que, de certa forma, nortearam as nossas conversas e discussões no Grupo Focal.
Iniciamos provocando uma reflexão sobre as características de um sujeito leitor e se
eles se consideravam leitores. As falas selecionadas1166 revelam uma imagem de leitor
centrado no texto escrito, que busca a informação como fonte de conhecimento, um leitor
atento aos acontecimentos:

―Acho que ter conhecimento leva a pessoa se tornar um bom leitor, porque
se ele quer, por exemplo, ele ouve falar no tema, ele quer descobrir, quer
aprofundar nesse tema, nesse assunto. Então ele busca vários tipos de
informações e muitas vezes o livro e a leitura são formas de conhecimento
que eles vão em busca. Então é conhecimento‖ (Aluno 01).

―Pra mim o leitor não é só aquele que lê um livro, um jornal. É aquele que lê
tudo que está na frente, até um outdoor, uma placa, sempre está observando
tudo, lendo, sempre informado‖ (Aluno 02).

―Informação, no caso uma pessoa que lê, ela sempre está bem informada,
tem uma opinião, senso crítico. Então você consegue distinguir uma pessoa

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Os sujeitos colaboradores da pesquisa são identificados por números.
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que gosta de ler, que tem esse hábito por essa característica, porque quando a
gente não lê só fica tendo a mídia, no caso, a televisão e rádio, sempre só
essas duas, você acaba ficando limitado, você não tem uma opinião vasta, e
quando você lê não, você tem um senso crítico maior [...]‖ (Aluno 03).

A leitura é apresentada por estes jovens como a possibilidade de compreender melhor


os acontecimentos e, a partir daí, formular opiniões, argumentar, demonstrar pontos de vista.
Na continuidade da conversa, poucos conseguem se enquadrar nessas características de leitor
delineadas por eles, sendo que a maioria não se sente tão leitor. Nas falas já revelam as
influências recebidas no seu processo de formação e o tipo de leitura que mais agrada,
demonstrando suas preferências, sendo a ficção um tipo de leitura bastante citada, conforme
os depoimentos dos alunos 01 e 04:

―Assim, eu me enquadro, eu sou uma pessoa que gosto muito de ler; leio
vários tipos de livros, entendeu? Eu não escolho assim não. Pra mim
qualquer tipo de livro gosto de ler, gosto de conhecimento, interpretar [...].
Leio todos os tipos de livros. Atualmente mesmo estou lendo A menina que
roubava livros, estou gostando da história, interessante e tudo. E eu sempre
gostei de ler livro, termino de ler um livro e já estou buscando outro com
outros tipos de assunto, cada livro de tipos diferentes‖.

―Assim, eu tenho um gosto particular por livro que tenha ficção, gosto de ler
livros de ficção e gosto de ler esses livros assim que cada capítulo puxa
outro capítulo, que tem aquele gancho, que eu quero ler logo que acabei de
ler. Aí eu tenho esse gosto, interesse por esse tipo de livro‖.

Buscando entender os percursos leitores dos estudantes, provocamos o grupo a


rememorar as influências recebidas em seus espaços familiares e nas práticas socioculturais.
Os resultados revelaram que, em geral, tais influências se encontram no seio familiar, a
exemplo de alguém muito próximo que gosta de ler.

―Tenho uma tia minha, tia de consideração, que ela tem muitos livros e gosta
bastante de ler mesmo. Ela tem ficção também, tem um monte de livro
assim, interessante, geralmente esses títulos mais conhecidos, e aí 50% das
revistas que já li eram dela, que ela me emprestou pra eu ler. Ela sempre me
emprestava coisas pra ler, quando eu gosto dele é difícil eu parar de ler‖
(Aluno 04).

―Eu gosto bastante de livro, eu não sei, o que é... qualquer livro que me
indica eu leio. Por causa do meu cunhado, antes eu gostava de romance e
agora o que ele me dá e diz ―você vai gostar‖ eu leio, independente que seja
suspense, a leitura ou romance‖ (Aluno 03).

―[...] eu aprendi a ler mesmo foi com meu pai, ele sempre incentivou a gente
a leitura e tal. Aí quando minha irmã mais velha se casou com meu cunhado
e saiu de casa, ele fez uma biblioteca dentro de casa, ele adora leitura. Aí
então ele incentivou bastante mesmo: ―Você vai fazer um vestibular e não
tem conhecimento de leitura e tal‖. Ele começou a me incentivar, emprestar
livros e tal, aí a gente compra livro, ele compra, eu compro, a gente troca,
foram esses dois, meu pai e meu cunhado‖ (Aluno 03).
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Embora a escola não tenha se revelado, neste Grupo Focal, como o espaço de maior
referência na formação leitora dos alunos, alguns demonstraram ser a figura do professor
também motivadora.

―Eu tenho vontade de conhecer vários tipos de livros, de autor, no caso o


professor de Português incentiva a gente ler. Então isso me trouxe
conhecimento. Eu conheci várias histórias, vários romances, então eu leio
por conhecimento, por ter vontade de conhecer mesmo‖ (Aluno 05).

Constatamos também que estamos diante de um leitor que é bastante influenciado


pelas novas tecnologias e, principalmente, pela mídia. Este leitor escolhe as suas leituras
tomando como referência o sucesso que o livro faz a partir da opinião construída pelos jornais
e revistas. Observamos, nesse caso, que não é a escola que direciona as escolhas de alguns
leitores.

―Eu acho que me deixo influenciar um pouco pela mídia que lança aquele
livro. Aí começa a sair nos jornais, por exemplo, A cabana, ... é o livro que a
revista Veja indica (Risos). Pela influência da mídia eu li A cabana e gostei.
Aí eu fico influenciado, assim busco o que gosto e o que fez sucesso. Se
tanta gente gostou eu também posso gostar. É difícil eu pegar um livro de
cantinho de prateleira pra ler, às vezes é até bom, eu que não presto atenção‖
(Aluno 04).

Outros leitores recebem influência do cinema. O filme tem uma linguagem diferente
da literatura mas, pelos depoimentos dos jovens, esta linguagem tem contribuído na sua
formação leitora. O jovem assiste ao filme e quer conhecer o livro que originou o filme.

―O que me motiva também é que eu assisto um filme e fico sabendo que


daquele filme tem um livro. Aí falam que o livro é melhor que o filme, aí eu
fico na curiosidade por ler o livro logo pra comparar com o filme. O filme
mesmo que assisti, O código da Vinci,foi um livro que eu fiquei logo louca
pra ler, todo mundo fala que é ótimo. Uma coisa que me motiva muito é
assistir o filme. Eu acho muito interessante assistir o filme e ler o livro para
ter essa comparação, é até bom pra desenvolver argumento, ideias‖ (Aluno
01).

Hoje, quando buscamos traçar o perfil do leitor contemporâneo, não podemos


esquecer de que estamos diante de outra revolução na leitura, como bem lembra Chartier. Na
era das novas tecnologias são outros suportes e outras formas e modos de ler e de se debruçar
sobre o texto escrito. O acesso à internet é uma realidade vivenciada por praticamente todos
os estudantes. Entretanto, é possível afirmar que a procura pela internet tem variado muito a
intenção desta busca. Há estudantes que acessam as redes sociais, outros que acessam em
busca de textos de opinião, como também há aqueles que veem na internet a possibilidade de
ampliação de conhecimentos por meio de pesquisa em sites variados.
No Grupo Focal, a opinião de um dos membros sobre o vestibular revelou que este
processo seletivo vem estimulando a construção de um leitor mais pragmático, que lê em
função de algumas necessidades, a exemplo do texto informativo que é procurado para dar
conta de uma exigência da redação.

―Agora que tá chegando perto do vestibular, estou lendo muitos textos na


internet, artigo de jornalistas e tudo, por causa da redação. Eu estou no
cursinho, aí o professor lá do Acesso falou que a gente que gosta de ler, não
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tem que estar preso sempre a livro, que é bom ter a opinião de críticos,
jornalistas e tal, por causa da redação, né. Por causa do tema do aborto, aí eu
comecei mais a procurar esse tipo de texto informativo. Mas agora, mais por
causa do vestibular, porque antes eu não tinha essa procura não‖ (Aluno 03).

4. Considerações Finais

O que podemos afirmar é que estamos diante de sujeitos que, estimulados a falar sobre
as suas leituras, nos apresentam um leque de experiências leitoras, contradizendo a ideia
corrente de que o jovem não lê e que não gosta de ler. Deparamo-nos com jovens atentos,
preocupados com a sua formação leitora, que reconhecem a importância da leitura e que
denunciam que a escola infelizmente não vem cumprindo o seu papel na construção dessa
formação. Alegam que as práticas de leitura e as referências indicadas pela escola não
atendem às demandas atuais, nem estimulam a busca de novas leituras.
Um dado relevante que merece destaque nesta coleta de dados foi perceber que a
influência da família e da mídia foi mais marcante nos percursos formativos dos jovens
leitores do que a própria instituição escolar. Diante desse quadro, vale ressaltar que a escola
precisa urgentemente repensar suas práticas e concepções de leitura, com vistas a contribuir
para a formação efetiva de leitores críticos, exigência de uma sociedade cada vez mais
complexa e plural.
Os dados apresentados neste texto, oriundos de uma pesquisa caracterizada como
estudo de caso, revelam apenas as percepções dos estudantes acerca da sua formação leitora.
Certamente, existem outros olhares e outras percepções sobre o mesmo objeto que, sem
dúvida, contribuem para a construção de um perfil mais próximo do que poderíamos chamar
de um leitor real. Portanto, neste texto, não temos a pretensão de estabelecer um ponto final,
mas apenas de lançar possíveis debates a partir do que foi apresentado.

Referências Bibliográficas

CHARTIER, Roger. A aventura do livro: do leitor ao navegador: conversações com Jean


Lebrun; tradução de Reginaldo Carmello Corrêa de Moraes. [São Paulo]: Imprensa Oficial do
Estado de São Paulo: Editora UNESP, 1998.

COSSON, Rildo. Letramento literário: teoria e prática. São Paulo: Contexto, 2006.

EAGLETON. Terry. Teoria da Literatura: uma introdução. Trad.: Waltensir Dutra. São
Paulo: Martins Fontes, 1997.

JOUVE, Vincent. A Leitura. Trad.: Brigitte Hervot. São Paulo: Editora UNESP, 2002.

LAJOLO, Marisa. Como e por que ler o romance brasileiro. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004.

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