Sobre Apneia - Jorge Valentim
Sobre Apneia - Jorge Valentim
Sobre Apneia - Jorge Valentim
58669
RESUMO
Este trabalho apresenta, num primeiro momento, uma breve reflexão sobre
a relevância da efabulação do tema da violência e de seus respectivos ecos,
seja na tônica da representação de abusos das mais diversas ordens, seja na
efabulação da dinâmica dos seus efeitos colaterais. Em seguida, propõe-se
uma leitura do mais recente romance da escritora portuguesa Tânia Ganho,
Apneia (2020), destacando as representações de violências e abusos contra
personagens femininas e infantis. Para tanto, tomaremos como suporte
teórico alguns pressupostos de pensadores das Ciências Humanas, como
Hannah Arendt (1985), Judith Butler (2021), Marie-France Hirigoyen (2010)
e Zygmunt Bauman (2008).
PALAVRAS-CHAVE: Violências. Abusos. Representações ficcionais. No-
víssima ficção portuguesa. Tânia Ganho.
Ela abre os braços para ele não sair de trás de si. [...]
Adriana tenta puxá-lo pelo braço, mas ele avança para o pai,
de mãos abertas. Ela vê o abismo, a falésia que termina abrup-
tamente. Um bando de gaivotas levanta voo e grita por cima
deles. Alessandro estremece e levanta a cabeça para as seguir.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALEMANY, Carme. Violências. Tradução de Naira Pinheiro. In: HIRATA,
Helena et al. (orgs.). Dicionário crítico do feminismo. São Paulo: Editora da
UNESP, 2009, p. 271-276.
GANHO, Tânia. Apneia. 3ª. ed. Lisboa: Casa das Letras, 2021.
NOTAS
1 Doutor em Letras Vernáculas (Literatura Portuguesa) pela Faculdade de Letras da UFRJ.
Professor Titular de Literaturas de Língua Portuguesa do Departamento de Letras da UFSCar.
Coordenador do Grupo de Estudos sobre a Novísisma Ficção Portuguesa (GENFIP/CNPq/
UFSCar). Bolsista Produtividade do CNPq. Presidente da ABRAPLIP – Gestão 2022-2023.
2 Conceito definido por María López Villodres (2019) como uma espécie de masculi-
nidade hegemônica, que se impõe pela agressividade na resolução dos problemas e pela
invulnerabilidade em relação às mulheres e às dissidências sexuais. Tal postura reitera uma
hierarquia do patriarcado, cujos sentimentos dos homens são reprimidos como uma forma
de legitimização do poder.
3 Nascida em Coimbra, Tânia Ganho é Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas,
tendo trabalhado durante vários anos em legendagem para televisão e cinema. Foi assistente
convidada na Universidade de Coimbra, onde leccionou tradução literária, área a que se
dedica há mais de 20 anos. Traduziu autores como Hervé Le Tellier, Angela Davis, Siri Hus-
tvedt, Maya Angelou, Leila Slimani, Chimamanda Adichie, Amor Towles, David Lodge e
Alan Hollinghurst, entre muitos outros. É autora dos romances A vida sem ti (2005), Cuba
Libre (2007), A lucidez do amor (2010), A Mulher-Casa (2012) e Apneia (2020), com o qual
se destacou como finalista do Prémio Livro do Ano 2020, da Editora Bertrand, e do Prémio
Fernando Namora 2021. Tem vários contos publicados na revista Egoísta.
4 De antemão, adianto que a noção de violência aqui adotada vai ao encontro da definição
esboçada por Carme Alemany, para quem, “as violências contra as mulheres devido ao seu
sexo assumem múltiplas formas. Elas englobam todos os atos que, por meio de ameaça,
coação ou força, lhes infligem, na vida privada ou pública, sofrimentos físicos, sexuais ou
psicológicos, com a finalidade de intimidá-las, humilhá-las, atingi-las na sua integridade
física e na sua subjetividade” (ALEMANY, 2009, p. 271). Dentre as variadas maneiras de
manifestação da violência, para além das citadas, ainda incluo a violência de gênero.