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O Ensino Da Arte – Um Desafio No Atual Contexto

2020, A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5

o conteúdo deste livro está licenciado sob uma Licença de Atribuição Creative Commons. Atribuição 4.0 Internacional (CC BY 4.0). O conteúdo dos artigos e seus dados em sua forma, correção e confiabilidade são de responsabilidade exclusiva dos autores. Permitido o download da obra e o compartilhamento desde que sejam atribuídos créditos aos autores, mas sem a possibilidade de alterá-la de nenhuma forma ou utilizá-la para fins comerciais. Conselho Editorial Ciências Humanas e Sociais Aplicadas APRESENTAÇÃO Ítaca Se partires um dia rumo à Ítaca Faz votos de que o caminho seja longo repleto de aventuras, repleto de saber. Nem lestrigões, nem ciclopes, nem o colérico Posidon te intimidem! Eles no teu caminho jamais encontrarás. Se altivo for teu pensamento Se sutil emoção o teu corpo e o teu espírito tocar Nem lestrigões, nem ciclopes Nem o bravio Posidon hás de ver Se tu mesmo não os levares dentro da alma Se tua alma não os puser dentro de ti. Faz votos de que o caminho seja longo. Numerosas serão as manhãs de verão Nas quais com que prazer, com que alegria Tu hás de entrar pela primeira vez um porto Para correr as lojas dos fenícios e belas mercancias adquirir. [...] Tem todo o tempo Ítaca na mente. Estás predestinado a ali chegar. Mas, não apresses a viagem nunca. Melhor muitos anos levares de jornada E fundeares na ilha velho enfim. Rico de quanto ganhaste no caminho Sem esperar riquezas que Ítaca te desse. [...] (KAVÁFIS , 2006, p. 146-147) Freud, em O mal-estar da civilização, obra renomada e publicada em inúmeras edições, defende que a civilização é sinônimo de cultura. Ou seja, não podemos desassociar a funcionalidade cultural em organizar um espaço, determinar discursos e produzirem efeitos. Por vivermos em tempos em que só o fato de existir já é resistir, seria ingenuidade, tanto de assujeitamento, quanto social, acreditar que a cultura não vem produzindo a resistência, principalmente na diferenciação social. Entre estudiosos, um dos pontos mais questionáveis, entre pesquisadores das mais diversas áreas do conhecimento, é sobre o papel do professor como agente cultural, no espaço escolar, mas não podemos legitimar que a escola, bem como o professor, sejam os principais influenciadores. Há, no social, trocas dialógicas, enunciativas e discursivas que configuram e constituem o sujeito em meio sua adequação individual, ou seja, o aculturamento perpassa por "muitas mãos", instituições, sujeitos, ideologias que atuam na formação estrutural. De acordo com nossas filiações, determinamos culturas, determinamos não culturas, assim como afirma Bourdieu (1989), que responsabiliza essas legitimações aos próprios sujeitos que as vivem. Resistir seria, neste caso, transformar o mundo no qual estamos inseridos. A escola precisa ser transformada, há muito tempo ela serve à legitimação da cultura dominante. É de fundamental relevância que a escola esteja cada vez mais próxima daqueles que são, de certa forma, o coração que a faz pulsar, da comunidade escolar que, ao garantir sua identidade cultural, cada vez mais se fortalece no exercício da cidadania democrática, promovendo a transformação da escola em uma escola mais humanizada e menos reprodutora, uma escola que garanta, valorize e proteja a sua autonomia, diálogo e participação coletiva. Assim, dentro dessa coletânea, buscou-se a contribuição do conceito de mediação como um possível conceito de diálogo para com as problemáticas anteriormente explicitadas. O termo ensino e aprendizagem em que o conceito de mediação em Vigotsky (2009) dá início à discussão a uma discussão sobre mediação, que considera o meio cultural às relações entre os indivíduos como percurso do desenvolvimento humano, onde a reelaboração e reestruturação dos signos são transmitidos ao indivíduo pelo grupo cultural. As reflexões realizadas, a partir dos artigos propostos na coletânea, nos mostram que a validação do ensino da arte, dentro das escolas públicas, deve se fundamentar na busca incessante da provocação dos sentidos, na ampliação da visão de mundo e no desenvolvimento do senso crítico de percepção e de pertencimento a determinada história, que é legitimada culturalmente em um tempo/espaço. A escola precisa fazer transparecer a possibilidade de relações sociais, despertar e por assim vir a intervir nestes processos. Se deve analisar de maneira mais crítica aquilo que é oferecido como repertório e vivência artística e cultural para os alunos, bem como se questionar como se media estas experiências, ampliar as relações com a arte e a cultura, ao contrapor-se ao exercício de associação exercido muitas vezes pela escola nas práticas de alienação dos sujeitos diante de sua realidade. Todos, no espaço escolar, atuando de maneira mais contributiva como lugar propício para ressignificação, mediação, produção cultural e diálogos culturais, que articulados junto a uma política cultural democrática podem vir a construir novos discursos que ultrapassam os muros que restringem a escola a este espaço de dominação, legitimado pelo atual sistema. A escola, dentro desta perspectiva, passa a ser concebida como um espaço de dupla dimensão. Dentro desta concepção, os processos de mediação potencializam a práxis de um pensamento artístico e cultural. É, atuando atrelado ao cotidiano, em uma perspectiva de mediação, que parte destes pressupostos apresentados que a escola passa a adquirir um carácter de identidade, resistente à homogeneização cultural. A escola pode causar novas impressões, pode abrir seu espaço para novos diálogos e conversações. É preciso, no entanto, despertar esta relação, desacomodar-se do que é imposto. Muitos são os fatores que teimam em desmotivar, no entanto, está longe desta ser a 90 solução para um sistema educacional que precisa de maneira urgente ser repensado. Ao acompanhar a ação nestas escolas, foi impressionante observar como a movimentação contagiava todos, até mesmo aos que observavam a movimentação e curiosos passavam pelo espaço, alunos de outras turmas apareciam para ajudar e tudo era visto com grande expectativa. Os alunos que participaram do processo aparentavam estar realmente coletivamente envolvidos, e isso pode ser observado nos depoimentos. O movimento observado na montagem, na realização da exposição e na ação educativa foi surpreendente e demonstra que a escola carrega realmente consigo algo muito precioso, que é pouco valorizado, o cotidiano real, o qual não está incluso em documentos, a parte viva da escola. A presente ação demonstrou que a escola pode tomar rumos diferentes dos quais ela é designada pelo sistema. Aponta que um destes caminhos é apostar nos processos de mediação cultural que partam do cotidiano dos sujeitos que constituem este espaço. Assim, os processos de mediação cultural atrelados ao conceito de cotidiano não documentado atuam como exercício de partilha do sensível e colaboram na formação da práxis de um pensamento artístico e cultural. Esta concepção aqui analisada remete à tomada de uma nova postura frente ao ensino da arte e a concepção de espaço escolar assinala à construção de narrativas que possam contribuir para a construção de uma escola menos determinista e mais humanitária. Ao se realizar uma ação como esta proposta, o espaço escolar permite uma participação ativa e democrática entre seus autores, possibilitando a troca de vivências e experiências na comunidade escolar, promovendo um diálogo que potencializa a produção cultural dos alunos. A mediação dos trabalhos pelos alunos foi, segundo os depoimentos, algo muito rica e satisfatória para eles, os quais se mostraram maravilhados ao poderem partilhar de suas criações e apresentá-las à comunidade escolar. Na ação educativa os alunos mediam o processo criativo e estes momentos de mediação, em absoluto, se configuraram como exercícios de partilha da sensível, que carregados de significados possibilitam a troca e o contato com o outro. Diante do que aqui se faz exposto, nada se tem a concluir como algo pronto e acabado, assim o que se faz é concluir uma etapa, que se transformará em múltiplas possibilidades de novos fazeres, desta teia de retalhos cabe, por agora, apreciar a parte que foi tecida e refletir, para sem muito tardar, sair em busca de outros retalhos que possa quiçá, um dia, tornar-se uma trama densa da práxis educativa e artística.

2020 by Atena Editora Copyright © Atena Editora Copyright do Texto © 2020 Os autores Copyright da Edição © 2020 Atena Editora Editora Chefe: Profª Drª Antonella Carvalho de Oliveira Diagramação: Geraldo Alves Edição de Arte: Lorena Prestes Revisão: Os Autores Todo o conteúdo deste livro está licenciado sob uma Licença de Atribuição Creative Commons. Atribuição 4.0 Internacional (CC BY 4.0). O conteúdo dos artigos e seus dados em sua forma, correção e confiabilidade são de responsabilidade exclusiva dos autores. Permitido o download da obra e o compartilhamento desde que sejam atribuídos créditos aos autores, mas sem a possibilidade de alterá-la de nenhuma forma ou utilizá-la para fins comerciais. Conselho Editorial Ciências Humanas e Sociais Aplicadas Profª Drª Adriana Demite Stephani – Universidade Federal do Tocantins Prof. Dr. Álvaro Augusto de Borba Barreto – Universidade Federal de Pelotas Prof. Dr. Alexandre Jose Schumacher – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso Prof. Dr. Antonio Carlos Frasson – Universidade Tecnológica Federal do Paraná Prof. Dr. Antonio Gasparetto Júnior – Instituto Federal do Sudeste de Minas Gerais Prof. Dr. Antonio Isidro-Filho – Universidade de Brasília Prof. Dr. Carlos Antonio de Souza Moraes – Universidade Federal Fluminense Prof. Dr. Constantino Ribeiro de Oliveira Junior – Universidade Estadual de Ponta Grossa Profª Drª Cristina Gaio – Universidade de Lisboa Profª Drª Denise Rocha – Universidade Federal do Ceará Prof. Dr. Deyvison de Lima Oliveira – Universidade Federal de Rondônia Prof. Dr. Edvaldo Antunes de Farias – Universidade Estácio de Sá Prof. Dr. Eloi Martins Senhora – Universidade Federal de Roraima Prof. Dr. Fabiano Tadeu Grazioli – Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões Prof. Dr. Gilmei Fleck – Universidade Estadual do Oeste do Paraná Profª Drª Ivone Goulart Lopes – Istituto Internazionele delle Figlie de Maria Ausiliatrice Prof. Dr. Julio Candido de Meirelles Junior – Universidade Federal Fluminense Profª Drª Keyla Christina Almeida Portela – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso Profª Drª Lina Maria Gonçalves – Universidade Federal do Tocantins Profª Drª Natiéli Piovesan – Instituto Federal do Rio Grande do Norte Prof. Dr. Marcelo Pereira da Silva – Universidade Federal do Maranhão Profª Drª Miranilde Oliveira Neves – Instituto de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará Profª Drª Paola Andressa Scortegagna – Universidade Estadual de Ponta Grossa Profª Drª Rita de Cássia da Silva Oliveira – Universidade Estadual de Ponta Grossa Profª Drª Sandra Regina Gardacho Pietrobon – Universidade Estadual do Centro-Oeste Profª Drª Sheila Marta Carregosa Rocha – Universidade do Estado da Bahia Prof. Dr. Rui Maia Diamantino – Universidade Salvador Prof. Dr. Urandi João Rodrigues Junior – Universidade Federal do Oeste do Pará Profª Drª Vanessa Bordin Viera – Universidade Federal de Campina Grande Prof. Dr. William Cleber Domingues Silva – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro Prof. Dr. Willian Douglas Guilherme – Universidade Federal do Tocantins Ciências Agrárias e Multidisciplinar Prof. Dr. Alexandre Igor Azevedo Pereira – Instituto Federal Goiano Prof. Dr. Antonio Pasqualetto – Pontifícia Universidade Católica de Goiás Profª Drª Daiane Garabeli Trojan – Universidade Norte do Paraná Profª Drª Diocléa Almeida Seabra Silva – Universidade Federal Rural da Amazônia Prof. Dr. Écio Souza Diniz – Universidade Federal de Viçosa Prof. Dr. Fábio Steiner – Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul Prof. Dr. Fágner Cavalcante Patrocínio dos Santos – Universidade Federal do Ceará Profª Drª Girlene Santos de Souza – Universidade Federal do Recôncavo da Bahia Prof. Dr. Júlio César Ribeiro – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro Profª Drª Lina Raquel Santos Araújo – Universidade Estadual do Ceará Prof. Dr. Pedro Manuel Villa – Universidade Federal de Viçosa Profª Drª Raissa Rachel Salustriano da Silva Matos – Universidade Federal do Maranhão Prof. Dr. Ronilson Freitas de Souza – Universidade do Estado do Pará Profª Drª Talita de Santos Matos – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro Prof. Dr. Tiago da Silva Teófilo – Universidade Federal Rural do Semi-Árido Prof. Dr. Valdemar Antonio Paffaro Junior – Universidade Federal de Alfenas Ciências Biológicas e da Saúde Prof. Dr. André Ribeiro da Silva – Universidade de Brasília Profª Drª Anelise Levay Murari – Universidade Federal de Pelotas Prof. Dr. Benedito Rodrigues da Silva Neto – Universidade Federal de Goiás Prof. Dr. Edson da Silva – Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri Profª Drª Eleuza Rodrigues Machado – Faculdade Anhanguera de Brasília Profª Drª Elane Schwinden Prudêncio – Universidade Federal de Santa Catarina Prof. Dr. Ferlando Lima Santos – Universidade Federal do Recôncavo da Bahia Prof. Dr. Gianfábio Pimentel Franco – Universidade Federal de Santa Maria Prof. Dr. Igor Luiz Vieira de Lima Santos – Universidade Federal de Campina Grande Prof. Dr. José Max Barbosa de Oliveira Junior – Universidade Federal do Oeste do Pará Profª Drª Magnólia de Araújo Campos – Universidade Federal de Campina Grande Profª Drª Mylena Andréa Oliveira Torres – Universidade Ceuma Profª Drª Natiéli Piovesan – Instituto Federacl do Rio Grande do Norte Prof. Dr. Paulo Inada – Universidade Estadual de Maringá Profª Drª Vanessa Lima Gonçalves – Universidade Estadual de Ponta Grossa Profª Drª Vanessa Bordin Viera – Universidade Federal de Campina Grande Ciências Exatas e da Terra e Engenharias Prof. Dr. Adélio Alcino Sampaio Castro Machado – Universidade do Porto Prof. Dr. Alexandre Leite dos Santos Silva – Universidade Federal do Piauí Prof. Dr. Carlos Eduardo Sanches de Andrade – Universidade Federal de Goiás Profª Drª Carmen Lúcia Voigt – Universidade Norte do Paraná Prof. Dr. Eloi Rufato Junior – Universidade Tecnológica Federal do Paraná Prof. Dr. Fabrício Menezes Ramos – Instituto Federal do Pará Prof. Dr. Juliano Carlo Rufino de Freitas – Universidade Federal de Campina Grande Prof. Dr. Marcelo Marques – Universidade Estadual de Maringá Profª Drª Neiva Maria de Almeida – Universidade Federal da Paraíba Profª Drª Natiéli Piovesan – Instituto Federal do Rio Grande do Norte Prof. Dr. Takeshy Tachizawa – Faculdade de Campo Limpo Paulista Conselho Técnico Científico Prof. Msc. Abrãao Carvalho Nogueira – Universidade Federal do Espírito Santo Prof. Msc. Adalberto Zorzo – Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza Prof. Dr. Adaylson Wagner Sousa de Vasconcelos – Ordem dos Advogados do Brasil/Seccional Paraíba Prof. Msc. André Flávio Gonçalves Silva – Universidade Federal do Maranhão Profª Drª Andreza Lopes – Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento Acadêmico Profª Msc. Bianca Camargo Martins – UniCesumar Prof. Msc. Carlos Antônio dos Santos – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro Prof. Msc. Claúdia de Araújo Marques – Faculdade de Música do Espírito Santo Prof. Msc. Daniel da Silva Miranda – Universidade Federal do Pará Profª Msc. Dayane de Melo Barros – Universidade Federal de Pernambuco Prof. Dr. Edwaldo Costa – Marinha do Brasil Prof. Msc. Eliel Constantino da Silva – Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Prof. Msc. Gevair Campos – Instituto Mineiro de Agropecuária Prof. Msc. Guilherme Renato Gomes – Universidade Norte do Paraná Profª Msc. Jaqueline Oliveira Rezende – Universidade Federal de Uberlândia Prof. Msc. José Messias Ribeiro Júnior – Instituto Federal de Educação Tecnológica de Pernambuco Prof. Msc. Leonardo Tullio – Universidade Estadual de Ponta Grossa Profª Msc. Lilian Coelho de Freitas – Instituto Federal do Pará Profª Msc. Liliani Aparecida Sereno Fontes de Medeiros – Consórcio CEDERJ Profª Drª Lívia do Carmo Silva – Universidade Federal de Goiás Prof. Msc. Luis Henrique Almeida Castro – Universidade Federal da Grande Dourados Prof. Msc. Luan Vinicius Bernardelli – Universidade Estadual de Maringá Prof. Msc. Rafael Henrique Silva – Hospital Universitário da Universidade Federal da Grande Dourados Profª Msc. Renata Luciane Polsaque Young Blood – UniSecal Profª Msc. Solange Aparecida de Souza Monteiro – Instituto Federal de São Paulo Prof. Dr. Welleson Feitosa Gazel – Universidade Paulista Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (eDOC BRASIL, Belo Horizonte/MG) E24 A educação no Brasil e no mundo [recurso eletrônico] : avanços, limites e contradições 5 / Organizadora Solange Aparecida de Souza Monteiro. – Ponta Grossa, PR: Atena Editora, 2020. – (A Educação no Brasil e no Mundo. Avanços, Limites e Contradições; v. 5) Formato: PDF Requisitos de sistema: Adobe Acrobat Reader Modo de acesso: World Wide Web Inclui bibliografia ISBN 978-85-7247-935-6 DOI 10.22533/at.ed.356201701 1. Educação. 2. Sociedade. I. Monteiro, Solange Aparecida de Souza. II. Série. CDD 370 Elaborado por Maurício Amormino Júnior – CRB6/2422 Atena Editora Ponta Grossa – Paraná - Brasil www.atenaeditora.com.br contato@atenaeditora.com.br APRESENTAÇÃO Ítaca Se partires um dia rumo à Ítaca Faz votos de que o caminho seja longo repleto de aventuras, repleto de saber. Nem lestrigões, nem ciclopes, nem o colérico Posidon te intimidem! Eles no teu caminho jamais encontrarás. Se altivo for teu pensamento Se sutil emoção o teu corpo e o teu espírito tocar Nem lestrigões, nem ciclopes Nem o bravio Posidon hás de ver Se tu mesmo não os levares dentro da alma Se tua alma não os puser dentro de ti. Faz votos de que o caminho seja longo. Numerosas serão as manhãs de verão Nas quais com que prazer, com que alegria Tu hás de entrar pela primeira vez um porto Para correr as lojas dos fenícios e belas mercancias adquirir. [...] Tem todo o tempo Ítaca na mente. Estás predestinado a ali chegar. Mas, não apresses a viagem nunca. Melhor muitos anos levares de jornada E fundeares na ilha velho enfim. Rico de quanto ganhaste no caminho Sem esperar riquezas que Ítaca te desse. [...] (KAVÁFIS, 2006, p. 146-147) Freud, em O mal-estar da civilização, obra renomada e publicada em inúmeras edições, defende que a civilização é sinônimo de cultura. Ou seja, não podemos desassociar a funcionalidade cultural em organizar um espaço, determinar discursos e produzirem efeitos. Por vivermos em tempos em que só o fato de existir já é resistir, seria ingenuidade, tanto de assujeitamento, quanto social, acreditar que a cultura não vem produzindo a resistência, principalmente na diferenciação social. Entre estudiosos, um dos pontos mais questionáveis, entre pesquisadores das mais diversas áreas do conhecimento, é sobre o papel do professor como agente cultural, no espaço escolar, mas não podemos legitimar que a escola, bem como o professor, sejam os principais influenciadores. Há, no social, trocas dialógicas, enunciativas e discursivas que configuram e constituem o sujeito em meio sua adequação individual, ou seja, o aculturamento perpassa por “muitas mãos”, instituições, sujeitos, ideologias que atuam na formação estrutural. De acordo com nossas filiações, determinamos culturas, determinamos não culturas, assim como afirma Bourdieu (1989), que responsabiliza essas legitimações aos próprios sujeitos que as vivem. Resistir seria, neste caso, transformar o mundo no qual estamos inseridos. A escola precisa ser transformada, há muito tempo ela serve à legitimação da cultura dominante. É de fundamental relevância que a escola esteja cada vez mais próxima daqueles que são, de certa forma, o coração que a faz pulsar, da comunidade escolar que, ao garantir sua identidade cultural, cada vez mais se fortalece no exercício da cidadania democrática, promovendo a transformação da escola em uma escola mais humanizada e menos reprodutora, uma escola que garanta, valorize e proteja a sua autonomia, diálogo e participação coletiva. Assim, dentro dessa coletânea, buscou-se a contribuição do conceito de mediação como um possível conceito de diálogo para com as problemáticas anteriormente explicitadas. O termo ensino e aprendizagem em que o conceito de mediação em Vigotsky (2009) dá início à discussão a uma discussão sobre mediação, que considera o meio cultural às relações entre os indivíduos como percurso do desenvolvimento humano, onde a reelaboração e reestruturação dos signos são transmitidos ao indivíduo pelo grupo cultural. As reflexões realizadas, a partir dos artigos propostos na coletânea, nos mostram que a validação do ensino da arte, dentro das escolas públicas, deve se fundamentar na busca incessante da provocação dos sentidos, na ampliação da visão de mundo e no desenvolvimento do senso crítico de percepção e de pertencimento a determinada história, que é legitimada culturalmente em um tempo/espaço. A escola precisa fazer transparecer a possibilidade de relações sociais, despertar e por assim vir a intervir nestes processos. Se deve analisar de maneira mais crítica aquilo que é oferecido como repertório e vivência artística e cultural para os alunos, bem como se questionar como se media estas experiências, ampliar as relações com a arte e a cultura, ao contrapor-se ao exercício de associação exercido muitas vezes pela escola nas práticas de alienação dos sujeitos diante de sua realidade. Todos, no espaço escolar, atuando de maneira mais contributiva como lugar propício para ressignificação, mediação, produção cultural e diálogos culturais, que articulados junto a uma política cultural democrática podem vir a construir novos discursos que ultrapassam os muros que restringem a escola a este espaço de dominação, legitimado pelo atual sistema. A escola, dentro desta perspectiva, passa a ser concebida como um espaço de dupla dimensão. Dentro desta concepção, os processos de mediação potencializam a práxis de um pensamento artístico e cultural. É, atuando atrelado ao cotidiano, em uma perspectiva de mediação, que parte destes pressupostos apresentados que a escola passa a adquirir um carácter de identidade, resistente à homogeneização cultural. A escola pode causar novas impressões, pode abrir seu espaço para novos diálogos e conversações. É preciso, no entanto, despertar esta relação, desacomodar-se do que é imposto. Muitos são os fatores que teimam em desmotivar, no entanto, está longe desta ser a 90 solução para um sistema educacional que precisa de maneira urgente ser repensado. Ao acompanhar a ação nestas escolas, foi impressionante observar como a movimentação contagiava todos, até mesmo aos que observavam a movimentação e curiosos passavam pelo espaço, alunos de outras turmas apareciam para ajudar e tudo era visto com grande expectativa. Os alunos que participaram do processo aparentavam estar realmente coletivamente envolvidos, e isso pode ser observado nos depoimentos. O movimento observado na montagem, na realização da exposição e na ação educativa foi surpreendente e demonstra que a escola carrega realmente consigo algo muito precioso, que é pouco valorizado, o cotidiano real, o qual não está incluso em documentos, a parte viva da escola. A presente ação demonstrou que a escola pode tomar rumos diferentes dos quais ela é designada pelo sistema. Aponta que um destes caminhos é apostar nos processos de mediação cultural que partam do cotidiano dos sujeitos que constituem este espaço. Assim, os processos de mediação cultural atrelados ao conceito de cotidiano não documentado atuam como exercício de partilha do sensível e colaboram na formação da práxis de um pensamento artístico e cultural. Esta concepção aqui analisada remete à tomada de uma nova postura frente ao ensino da arte e a concepção de espaço escolar assinala à construção de narrativas que possam contribuir para a construção de uma escola menos determinista e mais humanitária. Ao se realizar uma ação como esta proposta, o espaço escolar permite uma participação ativa e democrática entre seus autores, possibilitando a troca de vivências e experiências na comunidade escolar, promovendo um diálogo que potencializa a produção cultural dos alunos. A mediação dos trabalhos pelos alunos foi, segundo os depoimentos, algo muito rica e satisfatória para eles, os quais se mostraram maravilhados ao poderem partilhar de suas criações e apresentá-las à comunidade escolar. Na ação educativa os alunos mediam o processo criativo e estes momentos de mediação, em absoluto, se configuraram como exercícios de partilha da sensível, que carregados de significados possibilitam a troca e o contato com o outro. Diante do que aqui se faz exposto, nada se tem a concluir como algo pronto e acabado, assim o que se faz é concluir uma etapa, que se transformará em múltiplas possibilidades de novos fazeres, desta teia de retalhos cabe, por agora, apreciar a parte que foi tecida e refletir, para sem muito tardar, sair em busca de outros retalhos que possa quiçá, um dia, tornar-se uma trama densa da práxis educativa e artística. Boa leitura! Solange Aparecida de Souza Monteiro SUMÁRIO CAPÍTULO 1 ................................................................................................................ 1 SEXUALIDADE, DISCURSO TRADICIONAL E RESISTÊNCIA: UM EMBATE ENTRE FEMINISMO E A FAMÍLIA POR UMA ÓTICA FOUCAULTIANA Solange Aparecida de Souza Monteiro Heitor Messias Reimão de Melo Paulo Rennes Marçal Ribeiro Maria Regina Momesso Débora Cristina Machado Cornélio Andreza de Souza Fernandes Monica Soares Carlos Simão Coury Corrêa Valquiria Nicola Bandeira DOI 10.22533/at.ed.3562017011 CAPÍTULO 2 .............................................................................................................. 20 INGRESSO DE JOVENS NO ENSINO MÉDIO INTEGRADO: EXPERIÊNCIAS DE ACOLHIMENTO Itagiane Jost Marcele Homrich Ravasio DOI 10.22533/at.ed.3562017012 CAPÍTULO 3 .............................................................................................................. 32 ISOMERIA CIS-TRANS: EMPREGO DE PALAVRAS CRUZADAS COMO RECURSO DIDÁTICO Antônio Marcelo Silva Lopes Meyriânne Silva Lopes Sérgio Bitencourt Araújo Barros Francisco de Assis Araújo Barros DOI 10.22533/at.ed.3562017013 CAPÍTULO 4 .............................................................................................................. 43 LEI DOS GRANDES NÚMEROS: DEMONSTRAÇÃO APLICADA AO ENSINO Julia Pereira Manenti Ana Cristina de Castro Zedequias Machado Alves DOI 10.22533/at.ed.3562017014 CAPÍTULO 5 .............................................................................................................. 46 LEITURA E ESCRITA ENQUANTO OBJETOS SIGNIFICATIVOS E AFETIVOS: TEORIA E EXPERIÊNCIA Raimundo Nonato de Oliveira Falabelo Elielton Brandão Serrão Paula Soares Rodrigues DOI 10.22533/at.ed.3562017015 CAPÍTULO 6 .............................................................................................................. 56 LESEX: LIGA DE EDUCAÇÃO SEXUAL Beatriz dos Santos Melo Beatriz Silva de Souza SUMÁRIO Carolina Habergric Folino Lucas Rodrigues Tovar Thainá Gulias Oliveira Débora de Aguiar Lage DOI 10.22533/at.ed.3562017016 CAPÍTULO 7 .............................................................................................................. 68 LETRAMENTO DIGITAL NO CURSO DE ARTESÃ E BORDADOS: UMA AÇÃO DE ESTÁGIO DENTRO DO PROGRAMA MULHERES MIL DO IFRN Edna Maria da Silva Araújo Edícia Mariana de Moura Pereira Diego Silveira Costa Nascimento DOI 10.22533/at.ed.3562017017 CAPÍTULO 8 .............................................................................................................. 82 LETRAMENTO NO ENSINO FUNDAMENTAL II: DA LEITURA EXTRACLASSE À PRODUÇÃO TEXTUAL Adriana Ferreira de Souza DOI 10.22533/at.ed.3562017018 CAPÍTULO 9 .............................................................................................................. 88 LIBERDADE DE EXPRESSÃO OU DISCURSO DE ÓDIO: TOLERAR OS INTOLERANTES? Morgana Rodrigues Anna Beatriz Brandelero Giacomini Rodolfo Denk Neto DOI 10.22533/at.ed.3562017019 CAPÍTULO 10 .......................................................................................................... 100 MATEMÁTICA E INCLUSÃO SOCIAL: CURSO BÁSICO PARA CONCURSO Adriana de Oliveira Dias Exayne Santos Mourão DOI 10.22533/at.ed.35620170110 CAPÍTULO 11 .......................................................................................................... 105 MULTIPLICAÇÃO NA HORTA: UM MODELO DE PRÁXIS EDUCATIVA Robson Damasceno da Silva Maria Eliana Soares DOI 10.22533/at.ed.35620170111 CAPÍTULO 12 .......................................................................................................... 110 NAS SAIAS DE IEMANJÁ: VOZES E SABERES POÉTICOS DO FEMININO NA EDUCAÇÃO SENSÍVEL UMBANDISTAS NA AMAZÔNIA Denise Simões Rodrigues Lívia Cristina Fonseca de Araújo Faro DOI 10.22533/at.ed.35620170112 SUMÁRIO CAPÍTULO 13 .......................................................................................................... 120 O CADERNO VIRTUAL NO CONTEXTO DE LIBRAS NA FORMAÇÃO DE PEDAGOGOS Keila Moura Grassi DOI 10.22533/at.ed.35620170113 CAPÍTULO 14 .......................................................................................................... 132 O ENSINO DA ARTE – UM DESAFIO NO ATUAL CONTEXTO Márcia Lenir Gerhardt Pedro Henrique Graeff Machado Mateus Silva do Carmo DOI 10.22533/at.ed.35620170114 CAPÍTULO 15 .......................................................................................................... 143 O ENSINO DE QUÍMICA: UM OLHAR INVESTIGATIVO EM ALUNOS DE GRADUAÇÃO Tiago Barboza Solner Liana da Silva Fernandes Leonardo Fantinel DOI 10.22533/at.ed.35620170115 CAPÍTULO 16 .......................................................................................................... 152 O LÚDICO COMO RECURSO METODOLÓGICO NA INCLUSÃO DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL NO ENSINO FUNDAMENTAL Vanussa Sampaio Dias da Silva Ingrid Cibele Costa Furtado DOI 10.22533/at.ed.35620170116 CAPÍTULO 17 .......................................................................................................... 170 O LUGAR DAS DISCIPLINAS PEDAGÓGICAS NA FORMAÇÃO DOS LICENCIANDOS EM EAD Maria Letícia Cautela de Almeida Machado DOI 10.22533/at.ed.35620170117 CAPÍTULO 18 .......................................................................................................... 182 O MÉTODO TOTAL PHYSICAL RESPONSE (TPR) NO ENSINO DE INGLÊS PARA CRIANÇAS (LIC): CONSIDERAÇÕES SOBRE A ATMOSFERA MOTIVACIONAL POSSIBILITADA Monique Vanzo Spasiani DOI 10.22533/at.ed.35620170118 CAPÍTULO 19 .......................................................................................................... 198 O PIBID E O USO DOS RECURSOS DIDÁTICOS/TECNOLÓGICO NA SALA DE AULA Eronice Rodrigues Francisco Sandra R. Hermes dos Santos Sérgio S. S. Filho DOI 10.22533/at.ed.35620170119 SUMÁRIO CAPÍTULO 20 .......................................................................................................... 203 O PROCESSO DE INCLUSÃO SOCIAL DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA VISUAL: O PAPEL DA INCLUSÃO DIGITAL Anderson Barros da Silva Geni Emília de Souza DOI 10.22533/at.ed.35620170120 CAPÍTULO 21 .......................................................................................................... 220 O PROFISSIONAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA COMO SUJEITO CAPAZ DE INTERVIR NAS INJUSTIÇAS E PRECARIZAÇÕES DAS INFÂNCIAS, ADOLESCÊNCIAS E JUVENTUDES EMPOBRECIDAS Gabriela Fernanda do Carmo Janaína Augusta Neves de Souza DOI 10.22533/at.ed.35620170121 CAPÍTULO 22 .......................................................................................................... 235 O TRABALHO COM A GEOMETRIA PLANA NO ENSINO FUNDAMENTAL: EXPERIMENTAÇÕES COM MATERIAIS MANIPULATIVOS E RECURSOS TECNOLÓGICOS Natasha Inês Buche Carolina Hilda Schleger Jeverton Iedo Dorr Tanise da Silva Moura Vanessa Volkweis Rodrigues Elizangela Weber Mariele Josiane Fuchs Julhane Alice Thomas Schulz DOI 10.22533/at.ed.35620170122 CAPÍTULO 23 .......................................................................................................... 245 O USO DE DIFERENTES ALTERNATIVAS PARA O ENSINO- APRENDIZAGEM EM BIOLOGIA Terezinha Tronco Dalmolin Márcia Lenir Gerhardt Pedro Henrique Graeff Machado DOI 10.22533/at.ed.35620170123 CAPÍTULO 24 .......................................................................................................... 253 O USO DO LÚDICO NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE DIFERENTES FITOFISIONOMIAS EM UMA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MÉDIO NO MUNICÍPIO DE DIAMANTINO-MT Caroline Xavier da Conceição Áquila Pereira da Silva DOI 10.22533/at.ed.35620170124 CAPÍTULO 25 .......................................................................................................... 259 PERCEPÇÃO DOS DOCENTES QUANTO A INFLUÊNCIA DO ESPAÇO ESCOLAR NA EDUCAÇÃO INFANTIL Gislaine Maria Lente Franco Elisangela de Oliveira Silva Marinalva Pereira dos Santos SUMÁRIO Silvana Mara Lente Odenise Jara Gomes Solange Teresinha Carvalho Pissolato Vania de Oliveira Silva Elivania Toledo Rodrigues DOI 10.22533/at.ed.35620170125 CAPÍTULO 26 .......................................................................................................... 268 PERCEPÇÃO DOS PROFESSORES SOBRE O ATRASO NA LEITURA E ESCRITA DOS ALUNOS EM ANOS INICIAIS DE UMA ESCOLA MUNICIPAL Cecilma Miranda de Sousa Teixeira Brauliene Araújo Neves Francisco Hudson Coelho Frota DOI 10.22533/at.ed.35620170126 CAPÍTULO 27 .......................................................................................................... 275 PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO PARTICIPATIVO (PEP) SOB A PERCEPÇÃO DISCENTE QUANTO AOS OBJETIVOS ESTRATÉGICOS VALIDADOS EM UMA INSTITUIÇÃO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR Marinalva Pereira dos Santos Solange Teresinha Carvalho Pissolato Silvana Mara Lente Vania de Oliveira Silva Elisangela de Oliveira Silva Odenise Jara Gomes Elivania Toledo Rodrigues DOI 10.22533/at.ed.35620170127 CAPÍTULO 28 .......................................................................................................... 288 PARA QUE SE ESCREVE NA ESCOLA? Leonarlley Rodrigo Silva Barbosa Maria Alice de Sousa Carvalho Rocha DOI 10.22533/at.ed.35620170128 CAPÍTULO 29 .......................................................................................................... 297 PRÁTICAS DE EDUCAÇÃO EM SAÚDE PARA A FORMAÇÃO INTEGRAL DE DISCENTES DOS CURSOS TÉCNICOS INTEGRADOS DO INSTITUTO FEDERAL FARROUPILHA CAMPUS JAGUARI Fernanda Lavarda Ramos de Souza Ricardo Antonio Rodrigues DOI 10.22533/at.ed.35620170129 SOBRE A ORGANIZADORA................................................................................... 307 ÍNDICE REMISSIVO ................................................................................................ 308 SUMÁRIO CAPÍTULO 1 doi SEXUALIDADE, DISCURSO TRADICIONAL E RESISTÊNCIA: UM EMBATE ENTRE FEMINISMO E A FAMÍLIA POR UMA ÓTICA FOUCAULTIANA Data de aceite: 06/01/2020 Solange Aparecida de Souza Monteiro Heitor Messias Reimão de Melo Paulo Rennes Marçal Ribeiro Maria Regina Momesso Débora Cristina Machado Cornélio Andreza de Souza Fernandes Monica Soares Carlos Simão Coury Corrêa Valquiria Nicola Bandeira RESUMO: Tomando como base a teoria discursiva de Michael de Foucault, a Análise do Discurso Foucaultiana, compreendemos que a família e o papel da mulher, dentro desta instituição, constroem dispositivos que são significados e se significam socialmente. Ao falar de família e mulher, discursos como jurídicos, religiosos, patológicos, moralistas e, sobretudo, de verdades, emergem acerca de e por meio deles, conceituando e determinando o que é/deve ser a família e a mulher. Por isso, recorremos à análise histórica de Foucault, no qual, por meio dos dispositivos, nos auxilia nos entendimentos das produções das leis acerca das problemáticas envolvendo o lugar social tanto da família, quanto da mulher. Para tanto, tomamos como objetivo central, analisar algumas configurações de atuação do sistema jurídico, para a produção do entendimento de família no Brasil contemporâneo. Como conclusão desta pesquisa, observamos que há uma regularização entre os discursos que querem dizer acerca destes dispositivos, à medida em que se colocam como verdadeiros. Por mim, constatou que o jurídico, assim como afirma Melo (2018), se torna um dispositivo que se molda, estando em consonância com as atualizações do mundo moderno. PALAVRAS-CHAVE: Histórico; Mulher; Família; Jurídico; Poder. INTRODUÇÃO A família, no Brasil contemporâneo, especificamente o lugar que a mulher assume nessa complexidade, resultante de vários fatores, sendo um deles o alargamento jurídico e político do conceito, se auto valida enquanto tal, na construção imaginária em relação à sociedade, o que acende uma amplitude de possibilidades de reconhecimento de diferentes arranjos familiares. O debate sobre o significado de família, frente ao reconhecimento configurações familiares, das tem diversas levantado várias discussões em diferentes âmbitos da sociedade brasileira. O campo jurídico e A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 1 1 legislativo, bem como ações da sociedade civil e religiosa, tem mobilizado debates adversos, constituindo uma luta composta por dois lados antagônicos. De um lado, grupos a favor da ampliação do conceito de família, de outro, grupos contra esse movimento. Justamente porque, segundo Melo (2018): [...] pensa-se que a Instituição Familiar, já resultando do funcionamento ideológico da moralidade, valida seus discursos na configuração daquilo que é ideologicamente entendido, pelos sujeitos dominantes da Instituição família – pai e mãe –, como melhor para a criança que nascerá (e aqui se colocam as formas normais do existir) e para a própria instituição em questão (que assegurando a normalidade da existência permite a sua reprodução moral) (MELO, 2018, p 55). Duas das formas de ação do poder do sistema jurídico sobre a família são a produção de leis e as decisões jurídicas que tratam sobre essa instância, Assim, a produção das relações entre sistema jurídico e família precisam, portanto, ser analisadas a partir do modo como o poder desse se exerce na produção de subjetividades. Melo (2018) afirma que: Nas formações imaginárias, a família é uma instituição impossível de “agir sozinha”. Ao se reagrupar sobre a égide racional do Discurso Jurídico, o Discurso Familiar é impossibilitado de agir pela ilusão da autonomia, pois, ao longo das temporalidades, a família foi o principal alvo das “ações” institucionais. Por isso, compreendemos que Discurso Familiar tem se constituído em um Discurso Jurídico, no qual o poder legal, a partir das relações de força, atesta e obriga o funcionamento civilizante da família. Este funcionamento se impõe agora a partir da racionalidade estatal e não mais da moralidade religiosa (MELO, 2018, p. 58). Ao acercar-se o poder, não é no sentido de que ele atua na repressão, ou de que alguns grupos ou indivíduos o detém sobre outros. Entendemos que o poder produz e circula entre as pessoas. Foucault (2015b, p. 284) “o poder funciona e se exerce em rede. Nas suas malhas, os indivíduos não só circulam, mas estão sempre em posição de exercer esse poder e de sofrer sua ação”. Compreendendose que o poder, ao ser produz e ao circula em meio aos sujeitos, o sistema jurídico, por meio das leis e decisões jurídicas, acerca da família, viabiliza significações, que são produtos de relações de força, os quais colocam em disputa determinados significados em torno de sua definição. Nesse artigo, o empenho se dá sobre o entendimento do papel da mulher, na família corroborado por algumas leis e decisões jurídicas, que versam sobre a ampliação do conceito de família e da mulher e sobre o reconhecimento da união homossexual, fatos que provocaram grupos religiosos e políticos em defesa da família nuclear. Nesse sentido, temos por objetivo analisar algumas configurações de atuação do sistema jurídico, para a produção do entendimento de família no Brasil contemporâneo. Para tanto, apresentamos, inicialmente, alguns subsídios históricos A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 1 2 sobre a produção da família moderna e estabelecemos relações com a noção foucaultiana de dispositivo. Em seguida, lançamos uma análise dessas leis e decisões jurídicas, visibilizadas à modernização do dispositivo da família, constituinte pelo entendimento da existência de diferentes configurações familiares. Contudo, essa modernização não se exerce linearmente, já que sofre embates, lutas e forças contrários, derivados de grupos que afirmam ser a família nuclear o modelo legítimo. Tais embates também são próprios da atualização do dispositivo, já que ele se constitui por meio das relações de poder e onde há poder, ou seja, há resistências. O Projeto de Lei 6.583/2013, conhecido como Estatuto da Família, amplia o conceito, tornando-o mais abrangente. Entendemos que a produção do dispositivo da família, a partir do sistema jurídico, resulta em processos de produção de diferentes subjetividades e envolve a conquista ou negação de direitos, assim como a ação ou base à diferença e, em última instância, o combate ao preconceito e à homofobia. A FAMÍLIA SOB A LENTE FOUCAUTIANA Para compreender a história da família, nos movimentamos pelas teorias do discurso foucaultiano. Principalmente pela maneira de fazer história da teoria. De tal modo, procuramos por uma origem, no sentido metafísico. Foucault (2015), aborda, na genealogia, a busca de acontecimentos e suas dispersões, preocupa-se com as condições de origem e emergência. Assim, ao olharmos para alguns elementos da história da família, a partir da ótica de Michel Foucault e adotando como referência a família contemporânea, pretende-se analisar as condições de possibilidade de sua situação crítica. Foucault (2001,2006), ao abordar a produção da família contemporânea, nos permite identificar algumas condições de possibilidade de visualizar a família enquanto condição sexualizada, que por meio da ciência psiquiátrica, produziu-se uma articulação relacionada a produção da família ao dispositivo da sexualidade. Melo (2018), ao citar Soares (2016), explica que: O Discurso Familiar não agia na unicidade, estando, inicialmente, em concomitância com o Discurso Religioso. Segundo o autor, ambas as instituições atuam na classificação do gênero e da sexualidade, determinando os sentidos acerca do que é ou não uma família e de qual seja ou não a sua imagem. Como fundante dessa dinâmica, há o imaginário da família sagrada, advinda da concepção ocidental, na Idade Média, que organiza a Instituição Familiar como o espaço da dominação patriarcal masculina fundada na divisão e submissão entre os sexos. É esse funcionamento das instituições e dos discursos que produzem as “bases familiares” do mundo ocidental (MELO, 2018, p. 56-57). Sobretudo, Foucault (2001) aborda, por volta do século XVIII, segundo A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 1 3 desenvolveu-se um novo aparelhamento do ambiente familiar, que buscou a eliminação dos/as intercessores/as na relação pais-filhos, modificando o lugar da família em espaço de continua vigilância, como família, hospitais, prisões e escolas – também inseriu, nelas, mecanismos que os controlam e os mantêm na iminência da punição (leia o quadro acima). Esses mecanismos formariam o quê Foucault chamou de tecnologia política, com poderes de manejar espaço, tempo e registro de informações – tendo como elemento unificador a hierarquia. Assim como Melo (2018) afirmou, acerca da dominação masculina, família se tornou o espaço de dominação feminina e controle destinado a suprimir ou domesticar os comportamentos divergentes. Há, assim, por meio da perseguição e proibição da sexualidade da mulher, a constituição de um novo corpo familiar, é a família-célula, família restrita, família corporal e substancial (FOUCAULT, 2001). Para Foucault (2001, p. 315), “trata-se de constituir uma família-canguru: o corpo da criança como elemento nuclear do corpo da família”. Nasce, segundo Foucault (1987, p. 120), uma técnica de poder específica sobre o corpo: a disciplina. A disciplina, diz ele “é a anatomia política do detalhe”. Uma das poucas definições que Foucault faz sobre o dispositivo, é feita em uma entrevista em 1977, que Agamben localiza em Ditos e escritos 3, da edição francesa.6 A partir das definições colocadas por Foucault, nessa entrevista. Agamben (2005) destaca os seguintes pontos: O dispositivo é: um conjunto heterogêneo, que inclui virtualmente qualquer coisa, linguístico e não linguístico no mesmo título: discursos, instituições, edifícios, leis, medidas de segurança, proposições filosóficas, etc. O dispositivo em si mesmo é a rede que se estabelece entre esses elementos. (AGAMBEM, 2005, p. 9). Segundo Agamben (2005), o dispositivo é uma rede estabelecida entre diferentes elementos, e sua função é sempre estratégica e inscrita em uma relação de poder. Justamente porque o poder se configura e se manifesta nas diferentes maneiras hierarquizadas de relação social. Foucault (2001) destaca que foi a problematização da relação corpo-a-corpo entre pais e filhos/as que intensificou o tema do incesto, bem como tornar aceitável a teoria psicanalítica nessa questão. Mas, para isso, colocou-se o desejo incestuoso na criança para com os pais e tornou o incesto a origem das pequenas anomalias, o que reforçou a ideia da necessidade de intervenção do saber médico na família. Desse modo, a teoria psicanalítica do incesto, inscrevendo-se no interior da cruzada antimasturbação, produzindo uma normalização médica da família. Contudo, segundo Foucault (2001), essa campanha, que visava a aproximação entre pais e filhos, esteve direcionada à família burguesa. À família popular, a família do proletariado urbano que se constituía, teve A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 1 4 uma outra campanha que teve por foco o casamento e sua solidificação. Essa campanha de solidificação matrimonial do proletariado juntou-se ainda a outra, voltada à especificação das relações familiares e diferenciação entre indivíduos, idades e sexos. É assim que se deu outra relação entre pais e filhos/as nas famílias proletárias. Foucault (2001, p. 344) escreve que “nada de corpo-a-corpo, nada de contatos, nada de misturas”. O incesto muda de problemática, o perigo não reside mais nas crianças, mas se volta à relação irmão-irmã e pai-filha. Nesse caso, não se deve aproximar, mas sim afastar-se. Se por um lado, nas famílias burguesas, a vigilância sobre o corpo da criança e da mulher incentivou os pais a dormir com seus filhos e filhas, se possível na mesma cama. Por outro, nas famílias do proletariado, a partir da produção do perigo do incesto entre pai-filha ou irmã-irmã, a campanha foi no sentido de que o casal e seus filhos e filhas dormissem em quartos separados (FOUCAULT, 2001). Percebe-se, então, dois medos em relação ao incesto, de um lado a família burguesa e, de outro, a família operária. No entanto, destaca Foucault (2001), que em determinado momento elas sofrem uma influência mútua, formando um modelo familiar de ‘interclasses’. “É a pequena célula pais-filhos, cujos elementos são diferenciados, mas poderosamente solidários, e que são ao mesmo tempo ligados e ameaçados pelo incesto” (FOUCAULT, 2001, p. 345). O elemento incesto é o que, de certo modo, as unificam. Porém, esse intercâmbio não significa que se apagam as diferenças, pois de um lado a sexualidade da criança requer a união da família, de outro a sexualidade do adulto pede a sua repartição. Sobre elas, passa a haver dois caráteres autoritários de intervenção. No caso da burguesia, tem-se a medicina psicanalítica no controle da mulher e da sexualidade infantil, e no caso do proletariado, tem-se o poder judiciário e as instituições de policiamento das famílias populares, o controle. Tanto em um caso, quanto no outro, a psiquiatria atua, pois mesmo que, aparentemente, ela não esteja presente no controle da família proletária, ela está lá inserida ao exercer influência também na produção do poder judiciário (FOUCAULT, 2001). Foucault (2006), ao acentuar o modo como a psiquiatria se apropriou do discurso da família para produzir saber e exercer poder sobre as mulheres, relaciona também à emergência da família celular ao surgimento dos dispositivos disciplinares, tal como a psiquiatria o é. Para ele, a família exerce uma função determinante e indispensável na constituição dos dispositivos disciplinares, pois é ela que vincula os sujeitos a esses dispositivos, bem como articula e faz circular os sujeitos entre um dispositivo e outro. Conforme suas palavras, Quero dizer que a família é a instância de coerção que vai fixar permanentemente os indivíduos aos aparelhos disciplinares, que vai de certo modo injetá-los nos aparelhos disciplinares. É porque a família existe, é porque vocês têm esse sistema A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 1 5 de soberania que age na sociedade sob a forma da família (FOUCAULT, 2006, p. 100). Para Foucault (2006), a família é essencial ao poder disciplinar, embora ela não exerça esse tipo de poder. O poder que ela exerce é de tipo soberano, ou seja, a família é uma célula de soberania. Na família “[...] o pai, enquanto portador do nome e na medida em que exerce o poder sob seu nome, é o pólo mais intenso da individualização, muito mais intenso do que a mulher e os filhos” (FOUCAULT, 2006, p. 99). Esse tipo de relação, segundo o autor, é característico do poder soberano e inverso ao poder disciplinar. Na sociedade disciplinar, a família se concentrou, se intensificou e se limitou. Sobre este processo, a lei teve um papel determinante. Foucault (2006) traz, como exemplo, o código civil francês para afirmar que, pela ação da lei, “a família conservou os esquemas de soberania: dominação, pertencimento, vínculos de suserania, etc., mas ela os limitou às relações homem-mulher e às relações pais-filhos” (FOUCAULT, 2006, p. 103). O código civil fez com que a família fosse definida pelo núcleo paimãe-filhos e, assim, “[...] constituiu um alvéolo de soberania pela ação do qual as singularidades individuais são fixadas aos dispositivos disciplinares” (FOUCAULT, 2006, p. 103). Duas imagens, portanto da disciplina, Num extremo, a disciplina – bloco a instituição fechado, estabelecido à margem, e toda votada para funções negativas: fazer para o mal, romper as comunicações, suspender o tempo. No outro extremo, como o panoptismo, temos a disciplina – mecanismos: um dispositivo funcional que deve melhorar o exercício do poder tornando-o mais rápido, mais leve, mais eficaz, um desenho das coerções subtis para uma sociedade que está porvir. O momento que vai de um projecto ao outro, de um esquema de exceção ao de uma vigilância generalizado, repousa sobre uma transformação histórica: a extensão progressiva dos dispositivos de disciplina ao longo dos séculos VXII e XVIII sua multiplicação através de todo o corpo social, a formação do que se poderia chamar grosso modo a sociedade disciplinar (FOUCAULT, 1997, p. 173). Vemos assim o papel da lei na legitimação da família celular e da mulher em torno de determinadas regras e padrões sociais específicos a cada sujeito, de acordo com as condições de possibilidade dadas em tal momento histórico. E essa força atribuída à família celular, segundo Foucault (2006), foi necessária para que os sistemas disciplinares pudessem se sobrepor aos sistemas de soberania, mas eles não os fizeram desaparecer. Podemos entender então que a família fortaleceu os dispositivos disciplinares e, ao mesmo tempo, foi fortalecida por eles. Conforme Foucault (2015b), um dispositivo se caracteriza por ser um tipo de formação que tem, por finalidade, responder a uma urgência histórica. Nessa direção, a emergência da família celular, articulada às instituições, normas e leis, surge para responder a uma urgência histórica que está ligada, intrinsecamente, ao A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 1 6 desenvolvimento dos dispositivos disciplinares, dentre eles a medicina psicanalítica; o jurídico. Além disso, sua urgência também se liga à fixação do matrimônio e aos novos sentidos atribuídos às crianças, ao seu corpo e a sua sexualidade, bem como a própria constituição do dispositivo da sexualidade. Para Foucault (2015b, p. 364), um dispositivo é, [...] em primeiro lugar, um conjunto decididamente heterogêneo que engloba discursos, instituições, organizações arquitetônicas, decisões regulamentares, leis, medidas administrativas, enunciados científicos, proposições filosóficas, morais, filantrópicas. Em suma, o dito e o não dito são os elementos do dispositivo. O dispositivo é a rede que se pode estabelecer entre esses elementos. Nesse sentido, um dispositivo corresponde a uma rede que se estabelece entre distintos elementos, sendo instituições e leis, dois dos aspectos que o compõem, dentre vários outros. Diante de nossa incursão histórica, a partir de um olhar foucaultiano, podemos entender o dispositivo da família como uma rede que articula e liga instituições médicas, jurídicas, religiosas e de policiamento[1], assim como envolve normas e regras atribuídas a cada sujeito na família, por exemplo a vigilância dos pais sobre o corpo da criança, o maior cuidado da mãe em relação aos/às filhos/as. Nesta rede, também se valorizou o matrimônio, assim como foram produzidos discursos acerca do incesto e da sexualidade, provocando uma determinada organização arquitetônica dos espaços domésticos a partir do próprio medo do incesto. Ou seja, conforme diz Melo (2018), houve uma necessidade em criar um imaginário, acerca da família, respaldado no que essas mesmas instituições consideram como “moral”. Para Garcia Fanlo (2011), os dispositivos prendem os indivíduos a partir de práticas discursivas e não discursivas, que produzem formas de subjetividade. Ao capturá-los, os dispositivos produzem os sujeitos assujeitando-os a determinados efeitos de saber e poder. Assim, eles se inscrevem nos corpos dos sujeitos modos e nas formas de ser, muito em específicos, cuja finalidade é governar, administrar e controlar os seus gestos, pensamentos e comportamentos, de acordo com um sentido que se supõe útil – principalmente, útil pela determinação discursiva da instituição que o assujeita. O dispositivo da família, permitiu, então, a construção histórica e cultural das funções e papéis sociais específicos, atribuindos ao pai, à mãe e aos filhos e filhas, por exemplo, prover e ser provido, cuidar e ser cuidado. Garcia Fanlo (2011) nos ajuda a compreender que o dispositivo, como rede de relações, que articula formas de exercício de poder e configurações de saber, torna possível determinados efeitos de verdade e realidade. Este autor nos auxilia também a entender a família como um dispositivo, ao afirmar que : un dispositivo es un régimen social productor de subjetividad, es decir, productor A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 1 7 de sujetos-sujetados a un orden del discurso cuya estructura sostiene un régimen de verdad. De ahí que la familia, la fábrica, el hospital, la escuela, el cuartel, la iglesia, el club de fútbol, el partido político, la universidad, son dispositivos [...]. (GARCIA FANLO, 2011, p. 7). Nesse sentido, são inúmeros os dispositivos presentes na sociedade, pois dizem respeito àquelas instâncias sociais que produzem subjetividade. O dispositivo da família, assim entendido, produz sujeitos que são submetidos a regimes de verdade, ancorados em uma determinada ordem do discurso. E que regime(s) de verdade pode(m) ser este(s) que sustém o dispositivo da família e do papel da mulher? Podemos pensar no sistema jurídico, como um de seus exemplos, por ser pela lei, enquanto elemento do dispositivo, que se reconhece ou se exclui um significado ou uma forma de família. Pela sua força, a lei controla, delega, determina, pune, visibiliza e invisibiliza, enfim, produz subjetividades. Melo (2018), ao citar Althusser (1985), aborda a legitimação da família, perante os dispositivos que determinam os dizeres. A seguir: Entende-se que a Instituição Jurídica é o “Aparelho que desempenha um papel determinante na reprodução das re1ações de produção de um modo de produção” (ALTHUSSER, 1985, p. 68), atribuindo à família a responsabilidade em “desenvolver” os mecanismos que civilizam o mundo, que determina as ações morais e que estabelece o funcionamento ideológico. Vale ressaltar que a família, antes de desempenhar um papel determinante para desenvolver os mecanismos de civilização, foi determinada pelas instituições que (queriam) falar por/acerca dela (MELO, 2018, p. 59). Por fim, podemos observar algumas formas da atuação do sistema jurídico sobre a produção e regulação da família, e assim de subjetividades, no modo como esse conceito tem sido ampliado nos últimos anos. A legalização do divórcio, o reconhecimento de diferentes configurações familiares, a possibilidade da união civil entre pessoas do mesmo sexo, são alguns exemplos de como a família, ou o que se entende por ela, tem sido alterado. Em outras palavras, Melo (2018) diz que: A sustentação de seus valores sinaliza como até mesmo o Discurso Jurídico foi se “adaptando” às variações da modernidade, mas, ainda assim, institucionalizando e determinando a concepção de família, prezando sempre pela manutenção de suas formas consolidadas de produção da legitimidade/autoridade. De acordo com Althusser (1985), a Instituição Familiar é a concentração do domínio ideológico e o possível lugar de movimentação das relações de forças institucionais, pois não se pensava apenas em uma configuração de instituição moral, mas também a uma instituição que reproduzisse a força do trabalho (MELO, 2018, p. 59) Ações jurídicas e legislativas para a família para a mulher: a modernização do dispositivo A família pode ser idealizada como um dispositivo que articula, em sua produção, determinados discursos que são postos em disputa, em torno da sua A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 1 8 definição. Ao entendermos que os discursos formam os objetos dos quais falam, a família é, antes, produto dessa ordem do discurso, relacionado às relações de poder, saber e produção de subjetividades, que a constituem. Para entendermos a família, é preciso olhar para os discursos que sobre ela são produzidos. A importância do pensamento de Michel Foucault para as teorias feministas é inegável. Temas caros ao feminismo, como identidade, sujeição, sujeito e produção de novas subjetividades, apoiam-se fortemente nas discussões produzidas pelo pensador francês. Contudo, a relação dos teóricos e teóricas feministas com Foucault é muitas vezes tensa, gerando rejeições, incompreensões ou apropriações tardias. Esta tensão também serviu para redimensionar a interpretação do pensamento foucaultiano ou apontar alguns de seus limites em resposta às críticas feministas. Para Scott, seria preciso uma desconstrução dos termos da diferença sexual, o que só poderia ser realizada pela História, mas apenas sob a condição de conseguir construir e adequar um quadro teórico ao material histórico analisado, submetendo a crítica permanente à oposição sexual binária, de maneira a deslocar sua construção hierárquica. Scott apresenta, então, a sua definição do conceito de gênero, composta de duas afirmações, sendo “gênero é um elemento constitutivo de relações sociais baseado nas diferenças percebidas entre os sexos, e gênero é uma maneira primordial [primary way] de significar relações de poder” (SCOTT, 1986, p. 1067). Na produção da família encontramos, por exemplo, os discursos do Direito e nele os enunciados jurídicos e legislativos. Enunciados são compreendidos não como atos de fala, frases ou proposições (FOUCAULT, 2004), mas como uma função que atravessa essas unidades, como algo maior que se articula aos discursos, de modo que discurso e enunciado se formam e se constituem, mutuamente. O pensamento feminista, aponta Butler (2007), instituiu uma disjunção entre sexo e gênero. Enquanto o primeiro significaria o elemento biológico, gênero seria o elemento cultural, a construção social da identidade. Mas não há correspondência imediata entre os dois, de modo que é possível haver gênero masculino sobre um sexo feminino (e vice-versa), ou até mesmo a possibilidade de uma cultura em que existam mais de dois gêneros, a partir dos mesmos elementos sexuais biológicos; gênero, assim é “a interpretação múltipla do sexo” (BUTLER, 2007, p. 8). Enunciados jurídicos e legislativos, assim, constituem o discurso do Direito e são constituídos por ele, ao mesmo tempo em que contribuem na formação do discurso da família. Os enunciados, por sua vez, são compostos por alguns elementos, sendo um deles a sua condição de materialidade, ou seja, “[...] as formas muito concretas com que ele aparece” (FISCHER, 2013, p. 142). Essa materialidade pode ser encontrada nas ações jurídicas e legislativas de um determinado tempo e lugar, através das enunciações produzidas, isto é, nas próprias frases, textos e decisões jurídicas e legislativas, as quais formam regimes de A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 1 9 enunciação. Tomamos por ações legislativas a produção de leis e ações jurídicas as decisões tomadas em âmbito jurídico, por exemplo, pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Pelos discursos produzidos, por meio de ações legislativas e jurídicas, são reconhecidas ou invisibilizadas formas de família, lhes garantindo ou não acesso aos direitos constitucionais. A Constituição Federal de 1988 (CF/1988), nossa Lei Maior, representou um avanço para a histórica negação da possibilidade de ampliação do significado de família. Segundo Dias (2015, p. 32), a CF/1988 “instaurou a igualdade entre o homem e a mulher e esgarçou o conceito de família, passando a proteger de forma igualitária todos os seus membros”. A Constituição ampliou sua proteção para as famílias constituídas para além do casamento, abarcando a união estável e a família monoparental. Além disso, reconheceu o direito igualitário dos/as filhos/as havidos fora do casamento ou por adoção. O reconhecimento das diversas formas de família torna-se, assim, importante, pois está relacionado ao exercício da cidadania, ao direito de liberdade e de dignidade (DIAS, 2015). Aqui, recorremos a De Certeau (1998), no qual, por meio de seu livro a Invenção do cotidiano – Artes do Fazer, compreendemos há um funcionamento de laicidade das instituições públicas, no qual podemos incluir tanto a família quanto o jurídico. Essa laicidade, segundo Melo (2018, p 56-57), “é o melhor exemplo da autonomia que esses discursos vão conquistando”. Retomando De Certeau (1998), a laicidade é a maneira pela qual dispositivo reproduz, se auto permitindo ou sendo permitido pelos sujeitos assujeitados, os valores morais que, como visto, se interseccionaram no/pelo funcionamento jurídico e religioso, respaldando-se na família. Para Melo (2018): Portanto, o discurso da laicidade é um efeito da intersecção entre as instituições e exemplo da autonomia entre elas. Compartilham de uma origem comum, mas, para fazer valer e efetivar, precisam, socialmente, negar essa origem como forma de garantir e produzir a sua legitimidade. Sobre o domínio da liberdade, reproduzem a força da submissão, da qual nenhum sujeito escapa. É preciso, entretanto, problematizarmos essa abertura constitucional para o reconhecimento de outros arranjos familiares para além do modelo nuclear. Lembramos Foucault (2015), ao afirmar que [...] as Constituições escritas no mundo inteiro a partir da Revolução Francesa, os códigos regidos e reformados, toda uma atividade legislativa permanente e ruidosa não devem iludir-nos: são formas que tornam aceitável um poder essencialmente normalizador (FOUCAULT, 2015, p. 156). Na sociedade disciplinar, o sistema jurídico opera no disciplinamento dos corpos, tendo como objetivo a sua normalização. Nesse sentido, a CF/1988, ao A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 1 10 viabilizar tal entendimento de família, representa uma estratégia que tem por objetivo a normalização dessa instância e, com isso, colocar dentro das normas sujeitos que estavam às suas margens. Ao afirmar que determinadas formas de organização, entre as pessoas, passam a ser reconhecidas como família, enquadra-as dentro de normas que não são aleatórias, mas produto de relações de saber e poder. Respaldadas pela nossa Carta Magna, trazemos aqui duas leis que trazem a ampliação do conceito de família. Essa ampliação só se tornou possível, nos termos da Lei, pois a CF/1988, “[...] enlaçou no conceito de entidade familiar e emprestou especial proteção à união estável (CF 226 § 3.º) e à comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes (CF 226 § 4.º) [...]” (DIAS, 2015, p. 131, grifo da autora). Assim, com essa “flexibilização conceitual” (DIAS, 2015, p. 131) da família, foi possível expressar um entendimento amplo acerca do conceito nestas leis, que exemplificamos a seguir. A primeira é a Lei 10.836/2004 que criou o Programa Bolsa Família. Em seu artigo 2º, § 1, I, define família como a unidade nuclear, eventualmente ampliada por outros indivíduos que com ela possuam laços de parentesco ou de afinidade, que forme um grupo doméstico, vivendo sob o mesmo teto e que se mantém pela contribuição de seus membros (s/p). A segunda, conhecida como Lei Maria da Penha, Lei n. 11.340/2006, compreende família como “a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa” (s/p). Desse modo, apoiados em nossa Lei Maior, essas duas leis possibilitam que a família seja entendida e visibilizada para além do modelo nuclear, composto por pai, mãe e filhos/as, mas passe a comportar, como elementos que a definem, laços de afeto e/ou parentesco, que vivam em um mesmo lar ou a constituam a partir do próprio desejo de formá-la. Assim, essas leis desvinculam a noção de família relacionada exclusivamente ao casamento, da necessidade de laços biológicos e da função da reprodução, ressaltando, entretanto, o compromisso entre seus membros. O elemento afeto passa a ser, portanto, dentro do sistema jurídico, um argumento fundamental na definição de família (DIAS, 2015). A valorização de determinados aspectos na definição de família se torna possível pois está engendrada a saberes que tornam possível verdades, produto de práticas sociais. Segundo Foucault (2002) [...] as práticas sociais podem chegar a engendrar domínios de saber que não somente fazem aparecer novos objetos, novos conceitos, novas técnicas, A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 1 11 mas também fazem nascer formas totalmente novas de sujeitos e sujeitos de conhecimento (FOUCAULT, 2002, p.8). Desse modo, tal definição de família produz subjetividades, mas, ao mesmo tempo, só foi possível por derivar de saberes articulados às práticas sociais, práticas que tornaram possível a problematização da noção tradicional de família como única possível. Nessas práticas sociais encontramos relações de poder, pois “[...] por trás de todo saber, de todo conhecimento, o que está em jogo é uma luta de poder. O poder político não está ausente do saber, ele é tramado com o saber” (FOUCAULT, 2002, p. 51). Nessa direção, Machado (2015) nos ajuda a compreender que Todo saber é político. E isso não porque cai nas malhas do Estado, é apropriado por ele, que dele se serve como instrumento de dominação, descaracterizando seu núcleo essencial, mas porque todo saber tem sua gênese em relações de poder (MACHADO, 2015, p.28) Para produzir, então, um saber que entende de tal ou qual forma o significado de família, há toda uma articulação com relações de poder, o que possibilitou romper com a restrição do conceito aos laços de conjugalidade e consanguinidade, fazendo prevalecer os laços afetivos e o espaço doméstico como aspectos que a definem. Assim, essa noção ampliada de família torna-se um marco ao possibilitar abarcar outros arranjos para além do modelo pai-mãe-filhos/as. A partir da existência de outros arranjos familiares, tais sujeitos passaram a reivindicar por direitos, exercendo poder, de tal forma que o sistema jurídico, de acordo com determinadas condições históricas, possibilitou a não restrição de um modelo único. Esse processo também favorece que outros sujeitos, por exemplo casais homossexuais, possam constituir união civil, realizar adoção ou exercer outros direitos sociais. Para Foucault (2014, p. 10), o discurso produz poder, “[...] o discurso não é simplesmente aquilo que traduz as lutas ou os sistemas de dominação, mas aquilo porque, pelo que se luta, o poder do qual nos queremos apoderar”. A produção discursiva sobre família, assim, está envolvida em disputas adversas e não constitui um consenso comum, de tal modo que, em termos legais, ainda encontramos uma ênfase à noção de família relacionada à união entre homem e mulher. Nesse sentido, evidenciamos o Código Civil como outra lei que regulamenta a família e, assim, contribui na produção discursiva sobre tal instância. Em sua última edição, do ano de 2003, está ainda registrada a noção de entidade familiar como união estável entre homem e mulher. Contudo, ainda que faça essa referência ao sexo dos cônjuges, aponta Dias (2015) que o Código Civil não determina a exclusividade do casamento a partir dessa distinção sexual, não excluindo a possibilidade de união civil entre pessoas do mesmo sexo. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 1 12 De qualquer modo, em contraposição a essa referência do Código Civil ao sexo do/a cônjuge, no Senado, encontra-se em discussão o Projeto de Lei 612/2011, que busca modificar essa redação na referida lei e reconhecer família como união entre duas pessoas, excluindo a referência ao sexo e permitindo a legalização, no Código Civil, do casamento homoafetivo[2]. Assim, em âmbito legal, há uma intensa luta em torno da definição de família que corrobora essa instância como alvo de poder, na qual a lei exerce um papel determinante. Além da legislação evidenciada, merecem destaque também alguns marcos jurídicos que têm influenciado na produção do discurso da família, e de seus poderes e saberes, no âmbito da homoparentalidade. Dias (2015) cita o reconhecimento, pela primeira vez no Brasil, feito pela justiça gaúcha em 2001, da união entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar. Em 2011, esse reconhecimento foi feito pelo Supremo Tribunal Federal (STF), possibilitando a casais homossexuais de todo o Brasil constituírem união civil (ADI 4.277 e ADPF 132). E em 2015, o STF tornou possível a adoção por casais homossexuais. Nesse contexto, em 2013, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) proibiu que os cartórios se negassem em realizar o casamento de casais homossexuais, tornando obrigatório a conversão da união estável em casamento (Resolução 175/2013) (DIAS, 2015). Portanto, tal configuração familiar é reconhecida, atualmente, por meio dessas decisões jurídicas, possibilitando-lhes, cada vez mais, acesso aos direitos que, por longos anos, foram reconhecidos apenas a casais heterossexuais. Ao ser possível a determinados sujeitos exercer direitos, até então lhes negados, o sistema jurídico viabiliza, por meio de suas operações nas malhas do poder, que novas subjetividades possam ser produzidas. A possibilidade, por exemplo, da adoção por casais homossexuais, contribui para que esses sujeitos possam se produzir enquanto pais ou mães e seus filhos e filhas enquanto membros de uma família homoparental. Inseridos em relações de poder e saber, questionam, provocam e transformam as normas sociais. Além disso, a possibilidade de não haver sempre um pai e uma mãe teve reflexos também na redação da certidão de nascimento. Encontramos hoje as expressões ‘filiação’ e ‘avós’, em substituição a ‘nome do pai’ e ‘nome da mãe’, ‘avós paternos’ e ‘avós maternos’. Desse modo, a redação desse documento abarca outras possibilidades de constituição familiar, que fogem ao modelo nuclear. O conjunto desses movimentos, que produz essa nova forma de compreender e representar essa instância provocam a atualização do dispositivo da família. Em relação à atualização de um dispositivo, Deleuze (2005) afirma que: À novidade de um dispositivo em relação aos que o precedem chamamos A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 1 13 actualidade do dispositivo, a nossa actualidade. O novo é o actual. O actual não é o que somos, mas aquilo em que nos vamos tornando, aquilo que somos em devir, quer dizer, o Outro, o nosso devir-outro (DELEUZE, 2005, p. 92). Essa atualização se dá na medida em que produz novas maneiras de vivenciar a família, através de novas relações de saber-poder-subjetividade, que interpelam os sujeitos, resultantes da possibilidade de visibilização do pluralismo de configurações familiares. Contudo, essas outras formas de falar e ver a família podem ser vistas produzindo lutas de poder, que provocam grupos em defesa de um conceito unívoco dessa instância. Ocorre que o reconhecimento da multiplicidade de configurações familiares incitou grupos religiosos e políticos que defendem o modelo de família nuclear como único aceitável. Assim, a desconstrução dos valores que apoiavam a família nuclear tradicional, provocou “o medo e a ira dos defensores de uma concepção de família naturalista e sagrada, fundada em valores religiosos e encarregada da missão – primeira e insubstituível – de assegurar a coesão social e a reprodução da espécie” (MELLO, 2005, p. 27). Tais grupos defensores ‘da família’, muitas vezes, atribuem determinadas mazelas da sociedade como resultante desse enfraquecimento da família em sua acepção nuclear. Como produto da defesa desse modelo familiar, encontra-se o Projeto de Lei (PL) nº 6.583/2013, de autoria do deputado Anderson Ferreira, mais conhecido como Estatuto da Família. Este projeto foi aprovado em 2015, por Comissão Especial e pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados. Atualmente, encontra-se em tramitação no Senado Federal. Este projeto, em seu Art. 2º define, por entidade familiar “o núcleo social formado a partir da união entre um homem e uma mulher, por meio de casamento ou união estável, ou ainda por comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes” (PL 6.583/2013, p. 2). Assim, busca excluir, no âmbito da lei, o reconhecimento da diversidade familiar conquistado nos últimos anos. Não obstante, tem como justificativa o “enfrentamento das questões complexas a que estão submetidas as famílias num contexto contemporâneo”, sendo um desses fatores a “desconstrução do conceito de família” (PL 6.583/2013, p. 6). Desse modo, esse projeto vem em combate ao pluralismo de arranjos familiares, ao mesmo tempo em que atribui a essa flexibilização do conceito a razão para as questões complexas da sociedade. Vemos que a produção do discurso da família envolve, portanto, regimes de enunciação de diferentes ordens, produzindo alguns enunciados. Ao observarmos diferentes enunciados que compõem o discurso da família, podemos ver linhas de força que articulam saberes e poderes, apoiados em distintos regimes de verdades. Cada enunciado, assim, traz consigo, lutas de poder e produção de saber que tem por base uma vontade de verdade (FOUCAULT, 2014). A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 1 14 Diante disso, podemos apreender a potencialidade do dispositivo da família na produção das subjetividades, de como o discurso jurídico que compõe essa instância atua sobre a produção dos sujeitos, de suas formas de ser e estar na cultura. CONSIDERAÇÕES FINAIS Analisar o dispositivo da família e mulher na contemporaneidade pode ascender uma amplitude de possibilidades. Tal sistema jurídico produz discursos que instituem verdades imersas em jogos de saber-poder e produção de subjetividades. Ao legitimar um determinado conceito de família, que permite abarcar suas várias possibilidades, produz essas relações entre sujeitos enquanto famílias. Mas, como afirma Melo (2018), a verdade é uma construção social. Problematizar essa instância como um dispositivo, nos possibilita perceber a rede, quase onipresente, que a família representa na produção social. Uma rede capilar que articula os sujeitos, entre outros dispositivos. E, este poder da família, esta centralidade da família na sociedade, que é legitimada pelo sistema jurídico, que confere a essa instância toda uma normatização, um sistema de direitos, deveres e obrigações. Evidenciamos a família e mulher como um dispositivo sobre o qual o sistema jurídico atua para regulamentar, legislar e controlar os sujeitos, tornando-a alvo do poder normalizador. A atuação desse sistema, na produção da família torna-se, de um lado, um canal pelo qual se multiplicam as possibilidades de reconhecimento de arranjos familiares e, de outro, o instrumento de regulação, normalização e controle dessas unidades. A família só é família na forma da lei, o que possibilita a ela existir, legalmente ou não, e ter acesso, ou não, aos direitos instituídos pela legislação. Observar tais fatores mobiliza-se, portanto, a problematizar a produção do dispositivo da família e da mulher na contemporaneidade, o que nos permitiu dar visibilidade à sua atualização, a partir de leis e decisões jurídicas que legitimam a ampliação do conceito de família. Conforme a “história das mulheres” ganhava importância na elaboração de uma nova história, era imediatamente desqualificada pelos historiadores nãofeministas – por um lado, pelo reconhecimento de que haveria sim uma história das mulheres, mas esta constituiria um campo separado de estudos, que caberia apenas às feministas desenvolver; por outro lado, pela desqualificação pura e simples, uma vez que, segundo tais historiadores, o estudo do papel das mulheres em nada afetaria a compreensão histórica já existente de grandes fenômenos como a política, a economia, as revoluções etc. As consequências de tal leitura do conceito de gênero encontram-se, no contexto da teoria e do movimento feminista, no terreno da disputa pela identidade. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 1 15 Seria possível abrir mão da própria ideia de “mulheres” na luta política? E mais: pode haver política sem o recurso a um sujeito estável? A teoria feminista há muito abriu mão de estabelecer um conceito de “mulher” no singular, e mesmo de imaginar essa possibilidade, uma vez que a identidade feminina também é atravessada por outras clivagens, como raça, classe, orientação sexual. Ainda assim, por instável que seja, a ideia de uma mulher a ser representada é um requisito essencial ao movimento político feminista. Para Butler, entretanto, a mulher é igualmente construída dentro do discurso de representatividade do movimento e da teoria feminista. A mulher é o efeito do discurso que advoga sua opressão, produção discursiva engendrada pela representação política. Seguindo a teoria de Foucault, e aplicando-a especificamente ao conceito de gênero e feminismo, a mulher é tornada sujeito, não apenas no sentido de sujeitada à lei (masculina) da opressão, mas portadora de uma subjetividade feminina que a liga à condição de mulher. Entendemos que o reconhecimento das diferentes configurações familiares e o papel da mulher representa uma estratégia que possibilitou a atualização do dispositivo da família. Em relação a esse processo de atualização de um dispositivo, Garcia Fanlo (2011) afirma que: todo dispositivo tiene una genealogía y una historicidad que explica su régimen de aparición, reproducción, funcionamiento y crisis de la que resultará una nueva configuración de la red de saber/poder y, conseguientemente, nuevas formas de experiencias (GARCIA FANLO, 2011, p. 07). Não realizamos aqui uma genealogia do dispositivo da família, mas evidenciamos alguns aspectos históricos, partindo do olhar foucaultiano sobre a família moderna. Foucault (2001, 2006) nos possibilitou compreender, assim, seu regime de aparição, reprodução e funcionamento, que teve como centro a preocupação com o corpo e a sexualidade da criança, resultando desse processo a constituição da família celular-restrita-corporal-substancial (FOUCAULT, 2001). Esse dispositivo, entretanto, entrou em crise por diversos fatores, não aprofundados aqui, mas dentre os quais podemos identificar as lutas para pôr em cheque a noção de família em sua acepção nuclear, exclusivamente ligada ao casamento (heterossexual) e à filiação biológica. Assim, vemos surgir novas noções de família e o reconhecimento legal das diversas configurações familiares, possibilitando a atualização deste dispositivo, e com isso outras formas de ser e existir, bem como outras relações de saber e poder. Esses processos estão imbricados com a produção de discursos sobre a família, enredados aos diferentes campos de saber, sendo um deles o sistema jurídico. Reconhecemos neles, entretanto, lutas em defesa do conceito de família restrito ao modelo nuclear, representado hoje pelo Projeto de Lei 6.583/2013, mas A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 1 16 que também encontra lugar em grupos que se intitulam contra a suposta Ideologia de gênero que conforme Junqueira (2017), é uma expressão criada pela Igreja Católica para se opor aos Estudos de Gênero. Segundo o pesquisador, trata-se de uma “ofensiva [que] visa, além de recuperar espaço à Igreja em sociedades envolvidas em distintos processos de secularização, conter o avanço de políticas voltadas a garantir ou ampliar os direitos humanos de mulheres, pessoas não-heterossexuais e outros dissidentes da ordem sexual e de gênero. Para tanto, tais cruzados morais investem maciçamente na (re)naturalização das concepções de família, maternidade, parentesco, (hetero)sexualidade, diferença sexual.” (JUNQUEIRA, 2017, p. 26). Observar essa produção discursiva do dispositivo da família corrobora as descontinuidades, as resistências, a instituição de verdades que tem por base lutas de saber e poder em torno daquilo que pode ser denominado “família”. Lutas essas que são contínuas e que vão provocando novas condições de possibilidade para a emergência de novas conceituações sobre o termo e novas formas de existência. Uma vez que as identidades se encontram estilhaçadas, e o sujeito, descentrado, resta o problema da representação política (HALL, 2006). REFERÊNCIAS AGAMBEN, Giorgio. O que é um dispositivo? Outra travessia n. 5, Florianópolis, 2005. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. ALTHUSSER, Louis. Ideologia e Aparelhos Ideológicos de Estado. 3.ed, Lisboa, Editora Presença/ Martins Fontes, 1985. 120 p. BRASIL. Lei ordinária nº 10.836 de 9 de janeiro de 2004. Cria o Programa Bolsa Família e dá outras providências. 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Tese (Doutorado) - Universidade Federal Fluminense A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 1 19 CAPÍTULO 2 doi INGRESSO DE JOVENS NO ENSINO MÉDIO INTEGRADO: EXPERIÊNCIAS DE ACOLHIMENTO Data de aceite: 06/01/2020 Data de submissão: 21/10/2019 Itagiane Jost Mestranda do Programa de Mestrado Profissional em Educação Profissional e Tecnológica PROFEPT São Vicente do Sul– RS http://lattes.cnpq.br/7751407219167290 Marcele Homrich Ravasio Docente do Mestrado Profissional em Educação Profissional e Tecnológica – PROFEPT Santo Ângelo –RS http://lattes.cnpq.br/8085073893881510 RESUMO: Este artigo apresenta uma análise de uma pesquisa de mestrado no Programa de Mestrado Profissional em Educação Profissional e Tecnológica (PROFEPT) sobre práticas de acolhimento nos cursos técnicos integrados em um Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia, localizado no estado do Rio Grande do Sul. Embasado na metodologia da pesquisa-ação este artigo visa compreender os aspectos relacionados ao ingresso no ensino médio integrado e a contribuição de práticas de acolhimento. Os dados foram coletados em 2019, através da produção textual de 262 estudantes matriculados no primeiro ano nos Cursos Técnicos Integrados de Administração, Agropecuária, Alimentos e Manutenção e Suporte em Informática, que constituíram os sujeitos da pesquisa. Os textos produzidos foram submetidos à análise textual discursiva, sendo possível identificar opiniões, ideias, sentimentos e percepções sobre a transição do ensino fundamental para o ensino médio integrado e a contribuição das práticas de acolhimento nessa passagem. A partir da visão da totalidade de análise e ancorado nos referencias teóricos da pesquisa emergiram duas categorias: fatores facilitadores da permanência nos cursos técnicos integrados, sendo citados o período de acolhimento no ingresso do ano letivo, o acolhimento no decorrer do ano letivo. Constituindo-se como cuidados, os serviços e atendimentos disponibilizados, a alimentação gratuita e as perspectivas futuras. Além disso, os fatores que dificultam a permanência são a organização curricular, a nova rotina, as responsabilidades e a distância da família. PALAVRAS-CHAVE: jovens; ensino médio integrado; práticas de acolhimento. HIGH SCHOOL STUDENTS’ ADMISSION: HOSPITALITY EXPERIENCES ABSTRACT: This article presents a Master research fragment of the Professional Master’s Degree in Technological and Professional A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 2 20 Education about hospitality practices in one of the integrated technician courses at the Federal Farroupilha Institution in RS. Based on the action research methodology, this article intends to understand the aspects related to the admission at high school and the contribution to the admission practices. The data were collected in 2019 through the textual production of 262 students enrolled in the first level of Business, Farming, Computing and Food Technician Courses, which were the research individuals. The texts produced were submitted to text and discourse analysis, being possible to identify opinions, ideas, feelings and perceptions about the transition from elementary school to high school and the contribution of hospitality practices in this educational move. Observing the whole research theory and anchored by it emerged two categories: permanence facilitator factors in the technician courses, referring to the hospitality period in the beginning schoolyear, as well as the hospitality during the schoolyear. Consisting of efficient services the attendance available, free food and future perspectives. In addition, the factors that make difficult the permanence are the curriculum organization, the new routine, the responsibilities and Family distance. KEYWORDS: youth; high school, admission practices. 1 | INTRODUÇÃO A experiência profissional enquanto pedagoga, servidora de um campus/ instituto federal proporcionou verificar que a entrada de estudantes nos cursos técnicos integrados à educação profissional é marcado por aspectos que dificultam a permanência na instituição escolar. As dificuldades apontadas por estudantes e familiares relacionam-se a passagem do ensino fundamental para o ensino médio integrado e de adaptação ao novo ambiente escolar. O ensino médio integrado caracteriza-se como uma etapa que exige organização e responsabilidade. No campus, locus da pesquisa as aulas estão organizadas de segunda a sexta-feira, com nove períodos diurno, numa média de 14 disciplinas anuais e 32 horas de aula semanal. Para essa organização os estudantes permanecem na moradia da instituição, em pensões, são residentes da cidade ou viajam todos os dias para estudar. Percebendo a dificuldade de inserimento dos estudantes ao ambiente institucional e a partir dos percentuais de 15.7% de transferências e de 28.46% de repetência em 2014, a instituição foi percebendo que os dados sinalizavam para um processo malsucedido em termos de inserção no ambiente escolar. Entendendo a necessidade do estudante se inserir “ introduzir; incluir” e não apenas adaptar “ajustar; acomodar; adequar” à instituição. (FERREIRA, 2004). E compreendendo que: O fracasso dos estudantes diante do que se exige deles e de como se exige equivale à deterioração do sistema, isso sem se deter na análise do que essas exigências A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 2 21 significam para eles, que é quem realmente triunfa ou fracassa (SACRISTAN, 2005, p. 15). Constatou-se, que o acesso estava sendo garantido, entretanto, precisava propiciar condições de permanência e êxito. Nesse sentido, constatou-se que os primeiros momentos do jovem na escola têm fundamental importância para as etapas seguintes. A partir dessa compreensão, a partir do ano letivo de 2015, os ingressantes começaram a vivenciar a experiência de recepção diferenciada, denominada “acolhimento” e, consiste em anteceder três dias o ingresso dos estudantes de primeiros anos na instituição. Assim, este trabalho tem como objetivo discutir o ingresso de jovens na faixa etária de 14 anos de idade, a partir de uma perspectiva acolhedora, a fim de possibilitar-lhes uma adequada ambientação escolar. Considerando tratar-se de jovens que se encontram na fase da adolescência, primeira etapa da juventude, fase marcada por muitas transformações biológicas, psíquicas e sociais (LEÃO e CARMO, 2014). 2 | O ENSINO MÉDIO INTEGRADO O ensino médio tem como objetivos consolidar e aprofundar os conhecimentos do ensino fundamental, preparar para o trabalho, para a cidadania, aprimorar o educando como pessoa humana através da formação ética, do desenvolvimento de sua autonomia e do pensamento crítico. Além disso, possibilitar aos estudantes a compreensão dos princípios científicos e tecnológicos de todas as disciplinas dessa etapa. (BRASIL, 1996). A possibilidade de integração entre a educação básica e a educação profissional previstas no § 2º do art. 36 e os arts. 39 a 41 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 ocorreu a partir da regulamentação pelo decreto nº 5.154/2004. Através de um currículo centrado na concepção de integração tendo como referência o trabalho, a ciência, a tecnologia e a cultura (BRASIL, 2004). Esse decreto retoma uma política de ensino na qual poder público e sociedade civil são chamados para responsabilidade com vistas à construção de um ensino médio de qualidade e como direito à cidadania a partir de um currículo que possibilite ao estudante perceber e atuar diante das transformações do mundo do trabalho. A Lei nº 11.892/201 que instituiu a Rede Federal e cria os institutos federais apresenta como meta a garantia de no mínimo 50% de suas vagas para a educação profissional técnica de nível médio, preferencialmente na forma de cursos técnicos integrados aos jovens e adultos concluintes do ensino fundamental (BRASIL, 2014). Nessa direção, Ramos (2008), contribui sugerindo que o Ensino Médio Integrado seja compreendido através de três aspectos principais: num primeiro sentido, a A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 2 22 formação seria omnilateral, implicando a integração entre trabalho, ciência e cultura, dimensões fundamentais da vida; num segundo sentido, a indissociabilidade entre educação profissional e educação básica, ou seja, trata das formas de como integrar o ensino médio com a educação profissional e num terceiro sentido: a integração entre os conhecimentos gerais e específicos os quais não podem ser trabalhados isoladamente. 2.1 Práticas de acolhimento como elemento mediador na transição do ensino fundamental para o médio integrado Os estudantes que ingressam no primeiro ano do ensino médio integrado à educação profissional, na instituição local da pesquisa, têm em média 14 anos de idade. Assim, é necessário entender esse processo para além de promover o acesso e a permanência, também refletir sobre as dimensões dessa fase e a relação com a escola. A adolescência, é a primeira etapa da juventude, fase em que se encontra grande parte dos estudantes do ensino médio integrado. Essa fase é marcada por muitas transformações biológicas, psíquicas e sociais, o que levam a transformações no corpo, alterações no humor, muitos desejos e também por erros e obstáculos que levam o jovem a sofrimentos (LEÃO e CARMO, 2014). Juntamente com a fase da adolescência os jovens vivenciam também a transição do ensino fundamental para o ensino médio, aumentando os compromissos e as responsabilidades escolares. Em tratando-se de curso integrado além da formação básica o estudante realiza também as disciplinas técnicas profissionalizante através de um currículo integrado. Assim, as vivências de atuação enquanto servidora de um instituto federal possibilitou observar que o ingresso no ensino médio integrado se apresenta como uma ruptura considerando a escolarização anterior, exigindo do jovem organização e responsabilidades. Trata-se de um momento distinto da escolarização, demandando por mais tempo, dedicação e organização para os estudos. No ensino fundamental, anos finais, que corresponde o 6º ao 9º Ano, e antecede o ensino médio, os estudantes permanecem um turno na escola, frequentam na mesma cidade em que reside a família o que facilita a aproximação com os colegas, professores e da escola como um todo. Porém, no ensino médio integrado as atividades letivas ocorrem em dois turnos diurno, o currículo prevê no primeiro ano uma média de 32 horas de aula semanal e 14 disciplinas anuais. Nesse contexto os estudos de Vygotsky são importantes por considerar o sujeito em seus aspectos histórico-cultural e pelo desenvolvimento cognitivo e social a partir da linguagem. Em suas teorias situa o homem como ser social a partir de um A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 2 23 contexto histórico-cultural em que o indivíduo constitui a sociedade e a sociedade constitui o indivíduo. Vygotsky em sua teoria preocupa-se com o desenvolvimento humano, o aprendizado e com as relações entre desenvolvimento e aprendizagem. Procura compreender a origem e o desenvolvimento dos processos psicológicos ao longo de toda a história humana e também da história individual (OLIVEIRA, 2010). Para Vygotsky, desde o nascimento da criança o aprendizado está relacionado ao desenvolvimento. Alguns aspectos do desenvolvimento são proporcionados pelo processo de maturação individual do organismo, entretanto o aprendizado proporciona o estímulo de processos internos de desenvolvimento (OLIVEIRA, 2010). Essa relação entre desenvolvimento e aprendizagem tem bastante relevância para as instituições de ensino, conforme destaca Sacristán (2005): Vygotsky [...] estabelece que o desenvolvimento é o resultado de um processo dialético entre os estímulos procedentes do meio cultural e social e o sujeito que vai se construindo com esses materiais) é um exemplo da importância de adotar um discurso ou outro sobre a forma como evoluímos, para conferir à educação o papel de caminhar junto como processo de evolução, de propiciadora de um ambiente no qual o sujeito se mostra, ou o papel de provocativa e beligerante construtora deste. (p. 47) Assim sendo, a aprendizagem não acontece de maneira isolada. Desde o nascimento, o homem é considerado um ser social, pois, está em interação com o outro e suas manifestações acontecem a partir de outra pessoa. Embora, ainda não utiliza e ainda não tenha domínio da linguagem oral interage e procura familiarizar com o ambiente em que vive. A partir da interação com um grupo social vai construindo o seu conhecimento a partir de seu desenvolvimento psicológico e biológico (VYGOTSKY, 2007). Nesse sentido, pensar em estratégias que possibilitem a interação social em direção a construção ao desenvolvimento de funções psicológicas superiores é fundamental. Por isso, a importância dos espaços escolares no sentido da socialização e para a formação de uma rede de contatos a fim de se construir novos conceitos. A interação com o outro torna-se de grande significado aos estudantes em processo de desenvolvimento cultural e social. Assim, é importante que o estudante se sinta pertencente ao ambiente para que possa participar ativamente. É nesse sentido que se propõe discutir as práticas de acolhimento, numa perspectiva de mediação entre duas etapas de ensino que se apresentam completamente distintas. Assim, os conceitos de instrumentos e de signos tornamse importante. De acordo com a teoria de Vygotsky, as funções mentais superiores a partir de relações sociais ocorrem com a mediação dos instrumentos e de signos. Os instrumentos seriam algo para se fazer alguma coisa e os signos aquilo que significa alguma coisa (MOREIRA, 2014), conforme explicita o autor: A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 2 24 [...] instrumentos e signos são construções sócio-históricas e culturais; por meio da apropriação (internalização) destas construções, via interação social, o sujeito se desenvolve cognitivamente. Quanto mais o indivíduo vai utilizando signos, tanto mais vão se modificando, fundamentalmente, as operações psicológicas das quais ele é capaz. Da mesma forma, quanto mais instrumentos ele vai aprendendo a usar, tanto mais se amplia, de modo quase ilimitado, a gama de atividades nas quais pode aplicar suas novas funções psicológicas (p.109). Para Vygotsky a relação do homem com o mundo é realizada através de uma relação mediada, através de elementos mediadores, ou seja, os instrumentos e os signos. Isso torna as relações mais complexas e ao longo do desenvolvimento do indivíduo as relações mediadas passam a predominar em relação às relações diretas (OLIVEIRA, 2010). Fazendo um resgate dos usos e significações do termo acolhimento percebemos que o Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei Federal nº 8.069/90 (ECA) a partir de considerar como direito à criança e ao adolescente o convívio com a família e à comunidade e em caso de impedimento prevê o acolhimento institucional em ambiente que garanta o seu desenvolvimento integral. Trata-se da efetividade de um direito, exercida pelo Estado em situações de risco e vulnerabilidade, cujos pais e familiares estejam impossibilitados de cumprir com suas funções (BRASIL, 1990). Acolhimento é uma expressão frequentemente ouvida na área da saúde. Sua origem ao que se tem de registro, leva a acreditar que foi por volta de 1990, na área da saúde. Inicialmente o termo sugeria uma mudança do processo de trabalho a partir do estabelecimento de vínculo entre profissional de saúde e usuário (FRANCO et al., 1999). Trazendo para o contexto da educação, a partir das produções da literatura acadêmica observa-se que acolher remete ao cuidado e ao afeto, mas está limitada à educação infantil, o que deve ser problematizado. Afinal, jovens são sujeitos que precisam ser vistos a partir dos aspectos físicos, emocionais, ao contexto social, étnico, de gênero entre outros. Pensar em currículo integrado remete imediatamente a pressupor a inseparabilidade entre cuidado e educação, pois, como refere Pacheco (2011) “a referência fundamental para a educação profissional e tecnológica é o ser humano” (p.29). Assim sendo, o que se propõe é uma ação educadora vinculada a um projeto democrático de inclusão. 3 | METODOLOGIA Este trabalho é um recorte de uma pesquisa de mestrado do Programa de Mestrado em Educação Profissional e Tecnológica (PROFEPT), e segue os A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 2 25 fundamentos metodológicos da pesquisa qualitativa. Essa opção deve-se ao fato de melhor retratar ao que essa pesquisa se propôs que é a compreensão das percepções e dos significados que as ações de acolhimento provocam nos estudantes e como isso reflete em termos de inserção, permanência e êxito na instituição. Caracteriza-se como uma pesquisa-ação, através da qual é possível desempenhar um papel ativo na realidade em que os fatos estão sendo observados, possibilitando ao pesquisador aprimorar a prática a partir da intervenção dentro de uma situação considerada problema. Desta forma, pode ser definida como um modo de conceber e organizar uma pesquisa social (THIOLLENT, 1986). Os sujeitos da pesquisa foram os estudantes que no ano letivo de 2019 ingressaram no primeiro ano do ensino médio, num total de 262 estudantes, matriculados nos cursos técnicos integrados de administração, agropecuária, alimentos e manutenção e suporte em informática. O levantamento de dados ocorreu a partir de produção textual, desenvolvida pelos estudantes, em que puderam expressar suas opiniões sobre como vivenciam o ingresso no ensino médio integrado e como percebem o trabalho de acolhimento realizado no ingresso do ano letivo. Para análise dos textos procedeu-se a análise textual discursiva (ATD), que nas palavras de Moraes e Galiazzi (2011): [...] propõe-se a descrever e interpretar alguns dos sentidos que a leitura de um conjunto de textos pode suscitar. Sempre parte do pressuposto de que toda leitura já é uma interpretação e que não existe uma leitura única e objetiva. Ainda que, seguidamente, dentro de determinados grupos, possam ocorrer interpretações semelhantes, um texto sempre possibilita construir múltiplos significados (p. 14). Trata-se de um exercício de produção e expressão de sentidos. A partir de um conjunto de textos são produzidas compreensões e análises dos mesmos e a partir disso a elaboração de sentidos e significados, o que depende tanto do autor do texto quanto do pesquisador. Trata-se de um exercício de leitura a partir da perspectiva de quem escreve o texto, desta forma, valorizando os sujeitos da pesquisa (MORAES e GALIAZZI, 2011). Compreende-se, desta forma, que a análise textual discursiva converge com o caminho metodológico da pesquisa-ação por abranger o processo de construção da pesquisa, possibilitando a análise de significados e sentidos sobre a temática em questão. 4 | RESULTADOS E DISCUSSÃO No sentido de procurar entender como se caracteriza o processo de transição para o ensino médio integrado e como os estudantes vivenciam essa experiência e ancorado no referencial teórico selecionado para essa pesquisa, procedeu-se A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 2 26 ao processo de leitura, seleção e análise das escritas dos estudantes. Nos textos produzidos foi possível identificar as opiniões, ideias, sentimentos e percepções referentes à questão central dessa pesquisa, ou seja, as práticas de acolhimento no ingresso dos cursos técnicos integrados. Com isso, a partir da leitura minuciosa de cada texto, elementos foram surgindo a partir dos quais foram construídas categorias emergentes, a fim de subsidiar a discussão. São dimensões em torno das quais foram organizadas as percepções dos estudantes, sobre suas experiências quanto as práticas de acolhimento na instituição e sobre a experiência em ingressar num curso técnico integrado. Desse modo, as categorias forma assim definidas: Categoria 1: Fatores facilitadores da permanência nos cursos técnicos integrados e Categoria 2: Fatores que dificultam a permanência nos cursos técnicos integrados e serão discutidos, conforme a ordem apresentada. Quanto aos fatores que favorecem a permanência estão relacionados os aspectos que exercem influência positiva no processo de inserção dos estudantes. Nessa categoria foram citados: o acolhimento no período de ingresso, o cuidado recebido pelos profissionais, constituindo-se como acolhimento no decorrer do ano letivo e os serviços/atendimentos disponibilizados, a alimentação gratuita e as perspectivas futuras, conforme se evidencia em alguns trechos das escritas: “As atividades para conhecer o campus foram muito boas e importantes como para mim que não tem ninguém dos primeiros anos da mesma cidade que eu, com essas atividades tive oportunidade de fazer amigos e conhecer o campus” “Eu gostei muito dos três dias de atividades isso é ótimo para nós que chegamos “meio perdidos” e minha opinião é que continue assim, isso é ótimo e pelo menos pra mim deixou mais certeza que eu queria estudar aqui” Em relação às práticas de acolhimento, temática da pesquisa, observa-se a percepção dos ingressantes sobre os três dias de acolhimento vai ao encontro daquilo que a instituição se propõe, ou seja, proporcionar o conhecimento dos espaços da instituição, seu funcionamento, da estrutura, dos serviços, dos servidores e dos colegas. Chegar num ambiente novo causa estranheza a qualquer sujeito e com os jovens não é diferente, por isso, os primeiros momentos exige atenção. As escritas também revelaram a importância atribuída pelos jovens quanto ao afeto e o cuidado. Pois, embora não necessite mais os cuidados básicos de quando frequentava a educação infantil ou os anos iniciais também quer ser olhado e de certo modo receber um cuidado. Isso fica evidente nos trechos abaixo: “ O acolhimento que os alunos recebem aqui dentro é o que eu acho positivo, receber esse carinho é importante especialmente para quem tem que ficar longe de casa”. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 2 27 “Me sinto acolhida, pois, os professores nos tratam como filhos com muito carinho e afeto, os servidores são queridos e simpáticos”. Sobre cuidado Boff (2012) refere: O que se opõe ao descuido e ao descaso é o cuidado. Cuidar é mais que um ato; é uma atitude. Portanto, abrange mais que um momento de atenção, de zelo e de desvelo. Representa uma atitude de ocupação, preocupação, de responsabilização e de envolvimento afetivo com o outro. (p.37) O autor destaca o fato da sociedade contemporânea e também chamada de sociedade do conhecimento e da comunicação, ao contrário do que pudesse supor está favorecendo a diminuição da comunicação e na solidão entre as pessoas. Cada vez mais o mundo virtual tem facilitado em termos de tempo, a vida das pessoas, mas por outro lado diminuído o contato humano (BOFF, 2012). Vygotsky (2001) ao tratar da afetividade afirma que os estímulos mediados a partir do meio sociocultural são demonstrados através das emoções, ou seja, quando as palavras ouvidas tem a presença de sentimentos age sobre o sujeito de forma positiva, diferente de quando não há sentimentos. E as emoções são divididas em dois grupos: uma relacionada a sentimento positivos e outra aos sentimentos negativos, conforme aponta Vygotsky (2001): Se fazemos alguma coisa com alegria as reações emocionais de alegria não significam nada senão que vamos continuar tentando fazer a mesma coisa. Se fazemos algo com repulsa isso significa que no futuro procuraremos por todos os meios interromper essas ocupações. Por outras palavras, o novo momento que as emoções inserem no comportamento consiste inteiramente na regulagem das reações pelo organismo. (p. 139). Ter essa compreensão enquanto educadores se faz necessária para entender como é possível contribuir com os sentimentos de prazer, alegria e de satisfação ou quanto aos sentimentos de sofrimento ou depressão dos jovens. Para Vygotsky (2001) as emoções vivenciadas têm caráter ativo e age como organizador interno de reações, podendo estimulá-las ou inibi-las. Assim, para um processo de ensino e aprendizagem ser significativo necessita de práticas pedagógicas mediadas por relações afetivas. Em relação a categoria 2, os fatores que dificultam a permanência foram apontados a organização curricular, a necessidade de organizar-se com nova rotina a partir de novas responsabilidades e a distância da família. “Com certeza a dificuldade aqui é grande, porque além do estudo ser mais puxado, o fato de estar morando longe de casa e longe dos pais dificulta muito, mas estou me mantendo forte pois sei que isso é muito bom para mim”. “Obviamente, senti um grande impacto ao se transferir para o IFF, pois além de ter A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 2 28 um ensino avançado em relação a minha antiga escola, a mudança de rotina e a distância da família dificultaram um pouco em minha adaptação, mas hoje estou feliz em fazer parte do IFF SVS”. O ensino médio caracteriza-se pelas suas diferenças se comparado às etapas anteriores, configurando para os jovens ingressantes uma transição com grande impacto. No ensino fundamental, organizado com um currículo por competências para cada área do conhecimento a presença na escola estava organizada para um turno e as disciplinas organizadas para o ensino disciplinar. No ensino médio integrado as aulas ocorrem nos dois turnos diurnos com uma média de 32 horas de aulas semanais e 14 disciplinas anuais. Desta forma, exige do estudante maior dedicação e maior envolvimento com as tarefas escolares para além dos horários previstos em aula. Num primeiro momento a dificuldade de organização para os estudos gera uma desmotivação necessitando de auxílio dos profissionais da instituição para a organização tanto dos horários de estudos quanto dos momentos de lazer. Considerando, ainda que conforme levantamento realizado com os sujeitos participantes apontou que 26.15% residem na moradia, 30.04% em pensões e apenas 43.82% reside com familiar. Destes que residem com a família 11.31% residem na cidade em que se localiza o campus e os demais viajam todos os dias entre idas ao campus e retorno para casa. Assim, a presença da família com menor frequência causa desconforto aos jovens, considerando que a família é um fator essencial no processo de aprendizagem do estudante. Além disso, para muitos estudantes é a primeira experiência de sair de casa para morar longe dos pais, nessa situação, Segundo Lima (2016): Inicialmente, o adolescente acaba focando muito seus pensamentos na casa dos pais e não consegue se concentrar e manter-se focado em outras coisas. A possibilidade de voltar para casa dos pais aos finais de semana é encarada de forma positiva, pois voltar a casa dos pais é percebido com um retorno a um refúgio, no qual se busca um apoio e acolhimento neste momento marcado por tantas mudanças (p. 42). Por outro lado, sendo a autora “permite que os adolescentes adquirem maior liberdade e conquistem autonomia pois, na maioria das vezes essa é a primeira vez que eles passarão a gerir seu tempo e seus recursos econômicos, necessitando desenvolver maturidade para isso (p. 44) ”. 5 | CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante das informações trazidas especialmente das narrativas dos estudantes pode-se afirmar que o ingresso no ensino médio integrado é marcado por várias mudanças em nível pessoal, cognitivo, afetivo e também social. Nesse aspecto, A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 2 29 proporcionar práticas de acolhimento que visam contribuir com a ambientação no espaço escolar, com o estabelecimento de laços de estudantes com colegas, amigos e servidores são aspectos importantes no processo de inserimento ao curso e na escola. Desta forma, práticas de acolhimento podem contribuir para amenizar as dificuldades enfrentadas no período de ingresso e proporcionar condições de permanência e êxito. Por isso, se torna importante investigar, estudar e conhecer os aspectos que estão envolvidos nesse processo. Pode-se afirmar, a partir das narrativas que a maneira como o estudante se integra ao contexto e se relaciona com a comunidade acadêmica torna-se mais confiante e motivado para desenvolver o seu potencial e também aproveitar as oportunidades oferecidas. REFERÊNCIAS BOFF, Leonardo. Saber cuidar: ética do humano-compaixão pela terra. 18. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012. BRASIL. Decreto nº 5.154, de 23 de julho de 2004. Disponível em <http://www2.camara.leg.br/legin/ fed/decret/2004/decreto-5154-23-julho-2004-533121-publicacaooriginal-16200-pe.html. Acesso em: 12 out. 2018. BRASIL, Plano de Desenvolvimento Institucional. Instituto Federal Farroupilha, 2014. Disponível em: <http://w2.iffarroupilha.edu.br/site/midias/arquivos/20148309056884pdi_14_18pdf.pdf>. Acesso em: 06 out. de 2018. BRASIL, Lei Nº 8.069, de 13 de Julho de 1990: Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ leis/18069.htm>. Acesso em: 25 maio de 2019. FERREIRA, A. B. de H. Miniaurélio: o minidicionário de língua portuguesa. Curitiba: Positivo, 2004. FRANCO, T. B. et al. O acolhimento e os processos de trabalho em saúde: o caso de Betim, Minas Gerais, Brasil. Cadernos de Saúde Pública; 15(2) (supl2): 121-131, 1999. Disponível em:<http://www. scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X1999000200019>. 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A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 2 31 CAPÍTULO 3 doi ISOMERIA CIS-TRANS: EMPREGO DE PALAVRAS CRUZADAS COMO RECURSO DIDÁTICO Data de aceite: 06/01/2020 Antônio Marcelo Silva Lopes Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Instituto de Química, Natal – Rio Grande do Norte Meyriânne Silva Lopes Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Piauí, Campus Picos, Departamento de Química Picos – Piauí Sérgio Bitencourt Araújo Barros Universidade Federal do Piauí, Campus Senador Helvídio Nunes de Barros, Departamento de Biologia Picos – Piauí Francisco de Assis Araújo Barros Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Piauí, Campus Picos, Departamento de Química Picos – Piauí RESUMO: O maior desafio do professor é fazer com que seus alunos obtenham uma aprendizagem significativa, para isso deve lançar mão de metodologias que motivem e desenvolvam neles as habilidades necessárias para a compreensão do conteúdo químico. Nessa perspectiva, esse trabalho teve como objetivo a utilização de palavras cruzadas como recurso didático, para o ensino de Isomeria Geométrica por alunos do 3º ano do Ensino Médio de uma escola pública do município de Picos-PI. As palavras cruzadas foram elaboradas de forma autoral aplicadas em três turmas, totalizando 73 alunos, seguido de aplicação de um questionário para avaliação do recurso. A utilização do recurso mostrou-se facilitador do processo de ensinoaprendizagem, de forma fomentar os alunos a buscarem e criarem seus próprios conceitos, desenvolvendo as habilidades necessárias para uma aprendizagem significativa. PALAVRAS-CHAVE: Aprendizagem significativa, Recurso didático, Isomeria geométrica, palavras cruzadas. CIS-TRANS ISOMERISM: USE OF CROSSWORDS AS DIDACTIC RESOURCE ABSTRACT: The greatest challenge of the teacher is to make his students achieve meaningful learning, for this he must use methodologies that motivate and develop in them the skills needed to understand the chemical content. In this perspective, this work had as objective the use of crossed words as didactic resource, for the teaching of Geometric Isomeria by students of the 3rd year of High School in a public school in the municipality of Picos-PI. The crossed words were written in an A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 3 32 authorial form applied in three classes, totaling 73 students, followed by the application of a questionnaire to evaluate the resource. The use of the resource has proved to be a facilitator of the teaching-learning process, in order to encourage students to seek and create their own concepts, developing the skills necessary for meaningful learning. KEYWORDS: Meaningful learning, educational Resource, geometric Isomer, crosswords. 1 | INTRODUÇÃO Em dias de mudanças sociais constantes, causadas principalmente pela crescente expansão científico-tecnológica, o grande desafio do profissional da educação é fazer com que o seu aluno relacione conhecimentos teóricos e críticos sobre a realidade baseado em uma prática pedagógica eficiente, para que haja uma aprendizagem satisfatória e significativa. Assim, o professor deve ser consciente de que sua missão não se limita à mera transmissão de informações. No Ensino de Química, não é diferente, uma vez que a aprendizagem de Química deve propiciar aos educandos a compreensão integral e abrangente dos fenômenos químicos ocorrentes no mundo físico, para que a partir desta, eles possam julgálos, podendo assim interagir com o mundo enquanto pessoas e enquanto cidadãos (SILVA, 2013). A Química é considerada pelos alunos a mais difícil das disciplinas de ciências exatas e um dos principais fatores que contribuem para tal, é a carência de novas metodologias para o Ensino da Química (JÚNIOR; COSTA; RODRIGUES, 2016). Como resultado disso, a realidade tem mostrado alunos cada vez mais desmotivados e desinteressados, principalmente quando os professores não trabalham o conhecimento químico de forma contextualizada e interdisciplinar (JÚNIOR; BIZERRA, 2015). Isso se acentua em conteúdos que exigem do aluno, habilidades como a interpretação, representação e visualização de moléculas como a Isomeria. A Isomeria pode ser definida como a existência de dois ou mais compostos diferentes, que possuam a mesma fórmula molecular, mas formas de conexões diferentes entre seus átomos. A International Union of Pure and Applied Chemistry (IUPAC), classifica os grupos isômeros em dois tipos: Isomeria Constitucional e Estereoisomeria. A primeira, diz respeito a compostos que podem ser diferenciados apenas observando sua fórmula molecular. Já a segunda, abrange compostos na qual suas propriedades são caracterizadas de acordo com o arranjo espacial dos átomos (isomeria geométrica) e que tem relação direta com o desvio óptico da luz polarizada (isomeria óptica) (NETO; CAMPOS; JÚNIOR, 2010). Para fins desse trabalho será tratada apenas a A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 3 33 Isomeria geométrica cis-trans ou Z/E. Para que se identifique a Isomeria geométrica, é traçado um plano de simetria imaginário no composto, quando se têm dois substituintes iguais do mesmo lado do plano trata-se do isômero cis, Figura 1 (a), por outro lado, quando estão em lados opostos, trata-se do isômero trans, Figura 1 (b). Para compostos com todos os ligantes diferentes, usa-se a denominação Z/E (sistema concebido por Chistopher Kelk Ingold (1893-1970), Vladimir Prelog (1906-1998) e colaboradores). É determinada aplicando-se uma ordem de precedência de número atômico aos ligantes. Caso os ligantes com maior precedência estejam do mesmo lado do plano imaginário a isomeria é do tipo Z, Figura 1 (c), caso estejam em lados opostos é do tipo E, Figura 1 (d) (CONSTANTINO, 2012). Apesar das denominações diferentes, a IUPAC recomenda a utilização simultânea dos dois sistemas, e isso pode às vezes acabar gerando ambiguidades (CONSTANTINO, 2012). A Isomeria geométrica também pode ocorrer em compostos inorgânicos, mas não é o foco deste trabalho. Figura 1: Isomeria geométrica cis-trans e Z/E. Fonte: Adaptado de Constantino, 2012. Pode-se atribuir as dificuldades apresentadas pelos alunos acerca do isomerismo geométrico a problemas essencialmente básicos como a representação de fórmulas estruturais e ligações químicas. Ao passo que, para isômeros planos a diferenciação das moléculas ocorre naturalmente, em contrapartida, a diferenciação de isômeros geométricos só é possível com a comparação entre representações tridimensionais (CORREIA et al., 2010). Contudo, existe um fator ainda mais preocupante: a dificuldade nos conceitos isoméricos. Se um aluno não consegue estabelecer a relação entre conceito químico e mundo físico, logicamente o mesmo não conseguirá compreender os fenômenos químicos e muito menos suas representações. Nesse contexto, surgem as atividades e os recursos lúdicos para o ensino de conceitos. Estes estão cada vez mais presentes nas aulas de química, pois os entendem que tais atividades motivam e despertam o interesse dos educandos pelo A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 3 34 conteúdo químico e tornam a aula mais dinâmica e interessante (NETO; MORADILLO, 2016). Nossa proposta tem como recurso lúdico o uso de palavras cruzadas. O uso de recursos lúdicos por meio do cruzamento de signos tem origem nos séculos XIII a.C e XII a.C. As palavras cruzadas podem ser consideradas como o segundo jogo inventado pelo ser humano, perdendo apenas para as frases de adivinhações e evoluíram até a configuração que se conhece hoje (FILHO et al., 2009). Elas possuem estrutura característica e se baseiam num sistema de regras que impõem determinada ordem, incentivando a descoberta, a busca e o raciocínio (NASCIMENTO et al., 2008). As palavras cruzadas são uma estratégia que além de fugir do modelo tradicional de ensino, força o aluno desenvolver habilidades como pesquisa em cadernos, livros, trabalho em grupo e fazer uso de conceitos já vistos e para isto, fazer uso da memória, recordando assim os conceitos já estudados. Desta forma, este trabalho buscou, através de palavras cruzadas elaboradas a partir de conceitos pré-discutidos em sala de aula, a assimilação e melhor compreensão do conteúdo químico por alunos do 3º ano do Ensino Médio. 2 | MÉTODOS 2.1 A natureza e campo da pesquisa A pesquisa é de natureza quali-quantitativa, tratando-se de um estudo de caso. O estudo de caso é uma modalidade de pesquisa amplamente utilizada e consiste no estudo profundo de objetos visando obter seu detalhado conhecimento. Assim, o estudo de caso é baseado em explorar situações cujos limites não estão bem definidos, descrever a situação do contexto onde está sendo realizado o estudo e explicar as variáveis que causam determinados fenômenos que não possibilitam a utilização de experimentos (GIL, 2002). Foi realizada na Escola Normal Oficial de Picos (ENOP), localizada na cidade e Picos – PI. 2.2 O foco e desenvolvimento da pesquisa Esta pesquisa é parte integrante do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID). O PIBID é um programa que se propõe a contribuir a formação de professores, oferecendo bolsas aos alunos de graduação dos cursos de Licenciatura e inserindo-os nas escolas de educação básica, proporcionando um papel mais ativo no processo de ensino-aprendizagem revelando-se como importante ferramenta para a formação de professores (AMBROSETTI, 2013). Na escola em questão, os bolsistas desenvolvem algumas de suas atividades dentro da sala de aula juntamente com o professor, nesse caso em específico nas A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 3 35 turmas de terceiro ano. Durante o acompanhamento das aulas em que a professora ministrava o conteúdo isomeria, notou-se dificuldade pela maioria dos alunos em compreender os conceitos ali apresentados. Haja vista a importância da aprendizagem dos conceitos isoméricos, pois além de mostrar aos estudantes a função de proteínas, aromatizantes, hormônios, entre outros, facilita o aprendizado necessário para o estudo do conteúdo seguinte: as reações orgânicas (CORREIA et al., 2010). Assim, o trabalho teve como foco o desenvolvimento e aplicação de metodologia(s) que pudesse(m) facilitar esse aprendizado, nesse caso foram escolhidas as palavras cruzadas, pois alternativas devem ser buscadas para motivar os estudantes e para isso os docentes precisam procurar metodologias que tenha a interação e a participação do aluno como ideia principal (COSTA; FILHO; MOITA, 2017). A pesquisa foi desenvolvida com alunos dos 3º anos A, B e C do Ensino Médio, totalizando 73 alunos. O recurso foi elaborado com base no conteúdo que o professor titular estava ministrando de acordo com o programa da escola: Isomeria geométrica. As palavras cruzadas foram elaboradas usando o software Corel Draw x7 e de forma autoral. Para a obtenção dos resultados, foi proposta a aplicação individual em sala de aula durante 40 minutos, que corresponde ao tempo de duração médio de uma aula na escola, seguido da aplicação de um questionário avaliativo. O questionário era composto de quatro perguntas objetivas: 1- Algum outro professor já havia utilizado este tipo de metodologia com vocês? 2 - Você acredita que as palavras cruzadas facilitaram a fixação do conteúdo? 3 - Como você classificaria as palavras cruzadas em nível de dificuldade? 4 - Você acha que o professor deveria utilizar mais recursos como este em sala de aula? Após aplicação das palavras cruzadas os dados foram recolhidos e tratados a fim da produção deste trabalho. 3 | RESULTADOS E DISCUSSÃO Inicialmente à aplicação das palavras cruzadas, os alunos foram avisados que estavam livres para consultar o caderno e/ou livro didático, por acreditarmos que estando livre para pesquisar e encontrar as respostas, partindo da relação com seu professor e com as situações provocadas na sala de aula, tais como experimentos, debates, textos, seminários, fatos do quotidiano e até mesmo palavras cruzadas, ele constrói seus próprios significados, direcionando-os assim aos conceitos que queremos que eles aprendam (MALDANER, 1999). A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 3 36 Figura 2: Palavras cruzadas aplicadas na pesquisa. Fonte: Própria, 2017. A Figura 2 mostra as palavras cruzadas desenvolvidas e aplicadas, apresentase preenchida, porém, durante a aplicação apenas algumas letras ficaram preenchidas para direcionamento dos alunos. O Quadro 1 apresenta as afirmações propostas aos alunos, de acordo com o conteúdo estudado, para que lessem e preenchessem nas lacunas que estavam em branco. Horizontal 3. A isomeria cis/trans não pode ser aplicada à compostos cujos todos os ligantes são: 6. É o tipo de isomeria que acontece somente em alcenos. 8. É chamada assim por conta da ligação dupla rígida entre carbonos. 9. Neste tipo de compostos, para que haja a isomeria cis/trans é necessário que pelo menos dois carbonos do ciclo tenham ligantes diferentes entre si e iguais aos de um outro átomo de carbono. Vertical 1. Indica que os átomos estão em posições transversais ou opostas em relação aos carbonos da dupla. 2. Se os ligantes de maior prioridade estiverem no mesmo lado tem-se: 4. Se os ligantes de maior prioridade estiverem de lados opostos tem-se: 5. O que define a prioridade dos ligantes é o número de: 7. Neste tipo de isomeria são levados em consideração os ligantes que tem maior. 9. Indica átomos iguais de um mesmo lado em relação aos carbonos da dupla. Quadro 1: Afirmações propostas aos alunos. Fonte: Própria, 2017. As palavras cruzadas devem servir como motivação à pesquisa e ao estudo em grupo, sendo desta forma, uma atividade diferenciada, por não ser tradicional ou obrigatória, além do incentivo à leitura (SILVA et al., 2012). % (no de alunos) Número de acertos 78,1% (57) 06 ou mais acertos A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 3 37 13,7% (10) Entre 03 e 06 acertos 8,2% (6) Menos de 03 acertos Tabela 1: Análise das respostas das palavras cruzadas. Fonte: Própria, 2017. A evidência de que é possível desenvolver atividades sem pressionar os alunos é evidenciada pelo número de acertos obtidos pelos discentes. Foram escolhidas as quantidades de acertos que mais se repetiram (06, 03 e menos de 03) e calculado o percentual de acordo com número de alunos, conforme a Tabela 1. A análise do número de acertos sugere em um primeiro momento que a discrepância dos acertos pode estar relacionada ao “nível conceitual” dos alunos. Porém essa divergência pode ter relação direta com dificuldades em interpretar textos, raciocínio lógico e na interligação do conhecimento para resolver as situações problemas apresentadas (FILHO et al., 2013). Alguns alunos não colaboraram com a atividade como deveriam, contudo, foi informado pelo professor que os mesmos apresentam esse tipo de comportamento comumente em grande parte das atividades propostas. Estes alunos correspondem justamente ao número baixo de acertos, uma vez que a atividade foi com consulta apenas quem não se propôs a fazê-la obteve resultados pouco expressivos. Os resultados do questionário aplicado aos alunos estão apresentados e discutidos a seguir. A análise do Gráfico 1, demonstra que a utilização desse tipo de metodologia não é frequente no Ensino de química. Isso ocorre porque os métodos adotados no ensino de Química priorizam a memorização de fórmulas e conceitos, desconsiderando a necessidade de mostrar aos alunos a importância e representatividade da disciplina para suas vidas (COSTA; SOUZA, 2013). 1 - A lgum outro professor já hav ia utiliz ado esse tipo de metodologia com v oçês? 80,80% 59 alunos N ão 15,10% 4,10% 11 alunos 3 alunos N ão souberam responder D eixaram em branco Gráfico 1: Uso do recurso metodológico “palavra cruzada” em sala de aula. Fonte: Própria, 2017. Analisando os resultados do Gráfico 2, observa-se a efetivação do conhecimento químico acerca dos conceitos. As palavras cruzadas além de ajudar a desenvolver as habilidades necessárias para o progresso do aluno podem trazer essa relação de A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 3 38 proximidade entre o educando e o conteúdo químico, uma vez que não é encarada pelo mesmo como algo não prazeroso e obrigatório (FILHO et al., 2009). 2 - V oçê acredita que as palavras cruzadas facilitam a fixação do conteúdo? 91,80% 67 alunos Sim 6,90% 1,30% 5 alunos 1 aluno N ão D eixaram em branco Gráfico 2: Respostas segunda pergunta do questionário. Fonte: Própria, 2017. Como se observa, no Gráfico 3, para 60,2 % dos alunos classificaram o nível de dificuldade das palavras cruzadas foi considerado ótimo, isto se deu porque quando o professor utiliza esse tipo de recurso como subsidio, ao ter que pesquisar para preencher as palavras, os alunos preenchem as lacunas deixadas durante o processo de ensino-aprendizagem (LIMA; BARBOSA, 2015), construindo assim seu próprio conhecimento. O nível de dificuldade das palavras cruzadas está relacionado apenas com os conceitos trabalhados pela professora em sala de aula. 3- C omo v oçê classificaria as palav ras cruz adas em nív el de dificuldade? 60,30% 44 alunos Ó timo 17,80% 19,20% 13 alunos 14 alunos 2 alunos Bom R egular R uim 2,70% Gráfico 3: Respostas terceira pergunta do questionário. Fonte: Própria, 2017. Desta forma, a dificuldade enfrentada pelos alunos que classificaram o recurso como médio, regular ou ruim, deve-se ao fato de o próprio conteúdo químico exigir muitas habilidades, tais como a interpretação de texto e representação de fórmulas e ligações, e essa dificuldade se dá mais acentuadamente para aqueles que ainda não as desenvolveram, uma vez que cada aluno aprende de forma individual e no seu próprio tempo. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 3 39 4 - V oçê acha que o professor deveria utilizar mais recursos como este em sala de aula? 94,50% 69 alunos 5,50% 4 alunos Sim deveria N ão deveria Gráfico 4: Respostas quarta pergunta do questionário. Fonte: Própria, 2017. Os discentes pesquisados demonstraram aprovação (94,5 %) no uso do lúdico como recurso alternativo à aula tradicional, conforme Gráfico 4. Durante a aplicação das palavras cruzadas, demonstraram desde o início interesse e entusiasmo em respondê-la, a maioria dos alunos discutiam os acertos e erros, demonstrando ansiedade para saber o resultado, consoante o Gráfico 4. Demonstrando que as palavras cruzadas são uma ferramenta de grande potencial de atuação no processo de ensino-aprendizagem de Química (ARAUJO; SILVA; SILVA, 2016). 4 | CONCLUSÕES A utilização das palavras cruzadas relacionadas ao conteúdo Isomeria geométrica configurou-se como facilitador do processo de ensino e aprendizagem, mostrando potencial para esse fim. Porém, este necessita de alguns ajustes para atrair os alunos que não participaram como se esperava da atividade. Os resultados levam a crer que a atividade atingiu seus objetivos, uma vez que fugindo do modelo tradicional de ensino, instigou os alunos a buscarem e criarem seus próprios conceitos e significados e desenvolverem habilidades as quais são características da aprendizagem significativa. Habilidades tais como “a resolução de questões” baseadas em conceitos previamente estudados em sala, o que fica evidente no número considerável de acertos, e na boa recepção da atividade por eles. Vale lembrar que o professor pode alterar este recurso de acordo com suas necessidades e talvez aplicá-lo referente a outros conteúdos químicos, podendo alterar os níveis de dificuldade. 5 | AGRADECIMENTOS Agradecemos o suporte financeiro da agência CAPES, ao subprojeto IFPI/ A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 3 40 PIBID/Química Campus Picos; somos também gratos à Escola Normal Oficial de Picos e à professora da disciplina de Química. REFERÊNCIAS SILVA, S. G. da. As principais dificuldades na aprendizagem de Química na visão dos alunos do Ensino Médio. In: Congresso de Iniciação Científica do IFRN, 9, 2013. Anais… Currais Novos, 2013, p. 1612 - 1616. Disponível em: <http://www2.ifrn.edu.br/ocs/index.php/congic/ix/paper/ viewFile/1037/76>. Acesso em: 16 abr. 2017. MAIA JÚNIOR; L. S.; COSTA, G. S.; RODRIGUES, W. V. Dificuldades de aprendizagem em quimica de alunos do Ensino Médio na escola Cônego Aderson Guimarães Júnior. In: Congresso Nacional de Educação, 3, 2016. Anais… Natal, 2016. Disponível em: <https://editorarealize.com.br/revistas/conedu/trabalhos/TRABALHO_EV056_MD4_SA18_ ID11489_16082016235818.pdf >. Acesso em: 16 abr. 2017. SILVA JÚNIOR. C. A. B.; BIZERRA, A. M. C. Estruturas e nomenclaturas dos hidrocarbonetos: é possível aprender jogando? Revista Holos, v.6, 2015, p. 146-155. SIMÕES NETO, J. E.; CAMPOS, A. F.; MARCELINO JÚNIOR, C. A. C. Abordando o Conceito de Isomeria por Meio de SituaçõesProblema no Ensino Superior de Química. In: Encontro Nacional de Ensino de Química, 15, 2010. Resumos... Brasília, 2010. Disponível em:< http://www.sbq.org.br/ eneq/xv/resumos/R0699-2.pdf >. Acesso em: 04 fev. 2018. CONSTANTINO, M. G. Química orgánica, volume 2: curso básico universitário. Rio de Janeiro: LTC, 2012. 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A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 3 42 CAPÍTULO 4 doi LEI DOS GRANDES NÚMEROS: DEMONSTRAÇÃO APLICADA AO ENSINO LAW OF LARGE NUMBERS: Data de aceite: 06/01/2020 DEMONSTRATION APPLIED TO EDUCATION Julia Pereira Manenti Instituto Federal de Santa Catarina Criciúma – Santa Catarina Ana Cristina de Castro Instituto Federal de Santa Catarina Criciúma – Santa Catarina Zedequias Machado Alves Instituto Federal de Santa Catarina Criciúma – Santa Catarina RESUMO: A Lei dos Grandes Números afirma que a média de uma quantidade ‘n’ de amostras ‘x’ tendendo ao infinito se aproxima de um valor real esperado, podendo ser usada para tomadas de decisões, análise de situações e previsões futuras. Para demonstrar empiricamente a veracidade desta lei, montouse um recipiente contendo uma determinada quantidade de amendoins achocolatados e obteve-se as amostras em forma de pesquisa em instituições de ensino. Com gráficos e tabelas visualiza-se a convergência para este valor, além de possibilitar uma análise de erros da dispersão ocorrida. PALAVRAS-CHAVE: Lei dos grandes números; probabilidade, aplicação. ABSTRACT: The Law of Large Numbers states that the average of a quantity ‘n’ of samples ‘x’ tending to infinity approaches an expected real value and can it be used for decision making, situation analysis and future predictions. In order to demonstrate empirically the veracity of this law, a container containing a certain amount of chocolate peanuts was assembled so the samples could be obtained in research form in educational institutions. With graphs and tables, the convergence to this value can be visualized, besides allowing an analysis of errors of the dispersion that occurred. KEYWORDS: Law of large numbers, probability, application. 1 | INTRODUÇÃO O estudo de teorias probabilísticas presentes na área da estatística mostra-se relevante para a tomada de decisões a partir da análise dos dados disponíveis; dentro desse âmbito a Lei dos Grandes Números (LGN) torna-se uma peça fundamental para relacionar os dados obtidos a partir de uma pesquisa com o resultado real desta. Esta lei foi desenvolvida pelo matemático A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 4 43 suíço Jacob (Jacques) Bernoulli (1654 – 1705) e publicada por seu sobrinho Nicolaus (I) Bernoulli (1687 – 1759) após seu falecimento no livro “A Arte da Conjectura” (“Ars Conjectandi”). Segundo Gadelha (2004) “Essa Lei é o primeiro teorema limite da probabilidade, um resultado que estabelece uma relação entre os conceitos de probabilidade e frequência relativa e que é fundamental para a teoria moderna de amostragem.”. De acordo com Duque (2014) à medida que o número de repetições de um experimento aumenta, a frequência de um evento ‘A’ converge para a probabilidade teórica P(A), dessa forma é possível estimar o valor real da probabilidade de um evento A, baseando-se na frequência relativa de A em um número alto de repetições. Basicamente a Lei dos Grandes números afirma que com uma quantidade ‘n’ de amostras ‘x’ tendendo ao infinito, tem-se que a média simples dessas amostras se aproxima do valor real (E(x)) e, quanto maior o número de amostras, mais perto a média estará do valor real. Buscando demonstrar e comprovar empiricamente a validade desta lei, foi realizado um experimento que através de um recipiente com doces, cada participante dizia o valor de doces que achava conter. Através disso, iniciou-se o processo para analisar a veracidade da lei. 2 | PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Em um recipiente de formato não padrão e translúcido colocou-se, utilizando luvas e em um local higienizado, uma quantidade de 684 amendoins achocolatados, lacrando-o com fita transparente no final e pondo o valor numérico em um local não visível abaixo do pote, a fim de se obter um experimento confiável. De modo a incentivar as pessoas a colaborarem com a realização do experimento, foi utilizado o próprio recipiente contendo os amendoins como premiação para aquele que acertasse a quantidade real contida. Com uma lista contendo espaço para preenchimento de nome, idade, palpite e o número de telefone (para entrar em contato com o ganhador), deu-se início a coleta de dados individualmente, de tal forma em que era possível visualizar os palpites já realizados. O público-alvo foi servidores e alunos de instituições de ensino na cidade de Criciúma, fazendo com que houvesse uma alta amplitude em variação da idade. 3 | RESULTADOS E DISCUSSÕES Totalizando nove horas de experimento ao longo de uma semana, coletou-se 202 palpites. Com o objetivo de melhor visualizar a convergência das médias simples para o valor real, montou-se o gráfico abaixo: A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 4 44 Gráfico 01: Média simples de grupos de 20 em 20 tentativas; média geral e valor real (de 684 amendoins). Fonte: Autoria própria. 4 | CONSIDERAÇÕES FINAIS No gráfico 01 visualiza-se a proximidade da média geral das tentativas (em laranja) com o valor de 684 amendoins, mesmo que durante a pesquisa as médias tenham oscilado bastante. Fica evidente, também, que o gráfico se assemelha a uma senoide amortecida, como se oscilasse uma amplitude para cima e uma menor para baixo, sempre diminuindo no entrar de uma nova onda. A média de todas as tentativas foi de 641,168, sendo muito próxima do valor real. A não exatidão deriva principalmente do número de dados coletados, sendo 202 tentativas e o ideal são números tendendo ao infinito. Porém pode-se concluir que, visualizando o gráfico e fazendo uma previsão futura de acordo com os dados coletados, que a amplitude das senoides ficará cada vez menor de forma com que o valor médio das tentativas convergiria para o valor real. REFERÊNCIAS DUQUE, O. M. L. Uma Breve Análise do Movimento Browniano. 2014. 142 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Pós-Graduação em Matemática, Universidade Federal do Espirito Santo, Vitória, 2014. Disponível em: <http://repositorio.ufes.br/bitstream/10/7506/1/tese_8192_ movimento%20browniano-dissert.%20corrigida%2002-2015.pdf>. Acesso em: 23 maio 2019. GADELHA, Augusto. Uma pequena história da probabilidade. 2004. 16 p. Notas de Aula. Disponível em: <http://www.mat.ufrgs.br/~viali/estatistica/mat2006/material/textos/hist_prob_Gadelha.pdf >. Acesso em: 29 maio 2019. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 4 45 CAPÍTULO 5 doi LEITURA E ESCRITA ENQUANTO OBJETOS SIGNIFICATIVOS E AFETIVOS: TEORIA E EXPERIÊNCIA Data de aceite: 06/01/2020 Raimundo Nonato de Oliveira Falabelo Universidade Federal do Pará. Faculdade de Educação e Ciências Sociais/Campus de Abaetetuba. Programa de Pós-Graduação em Educação e Cultura/Campus de Cametá/ UFPA. Coordenador do Grupo GEPLAES – CNPq – Grupo de Estudos e Pesquisa em Linguagem, Alfabetização, Emoções e Subjetividade. Elielton Brandão Serrão Programa de Pós-Graduação em Educação e Cultura/Campus de Cametá/ UFPA. Membro do Grupo GEPLAES – CNPq – Grupo de Estudos e Pesquisa em Linguagem, Alfabetização, Emoções e Subjetividade. Paula Soares Rodrigues Prefeitura Municipal de Abaetetuba/PA. Pesquisadora do Grupo GEPLAES – CNPq – Grupo de Estudos e Pesquisa em Linguagem, Alfabetização, Emoções e Subjetividade. RESUMO: Aproximar o conhecimento acadêmico da realidade das práticas escolares, realizando-se, assim, o princípio da articulação entre conhecimentos sistemáticos e conhecimento/saberes/práticas dos professores e as aprendizagens cotidianas das crianças, deve constituir-se no esforço de todo processo de formação do profissional da pedagogia. Este trabalho tem por missão precípua - o que justifica a sua relevância - articular, de forma sistemática, ações teóricas e práticas, voltadas a escolas municipais de ensino fundamental. Como referencial teórico, assume-se como pressuposto, o fato de que somos sujeitos simbólicos, que nos constituímos nas relações sociais, mediadas pela linguagem e pela cultura, de forma que as ações pedagógicas devem centrar-se no envolvimento rico e diversificado das crianças com os suportes semióticos e experimentados enquanto uma prática social, cultural, significativa e afetiva. Em relação à metodologia, utilizou-se diversos suportes semióticos, de forma a envolver as crianças na exploração da leitura e da escrita de forma significativa, contextualizada, emocionalmente prazerosa e afetiva. Os resultados mostram que a aprendizagem flui, de forma significativa e afetivamente prazerosa, quando se faz interligando aos conhecimentos prévios das crianças, quando se explora seu contexto sócio cultural como suporte para a prática social da leitura e da escrita. As atividades, ao não assumirem um tratamento mecânico e artificial da leitura e da escrita, como mera aquisição de técnicas, desvinculadas da função social, mostrou-se envolvente para as crianças, levando-as a participarem das tarefas, lendo, escrevendo, praticando e vivendo a leitura e a escrita enquanto um objeto cultural significativo, emocional e afetivo. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 5 46 PALAVRAS-CHAVE: Criança; Leitura; Escrita; Significação; Afetividade. READING AND WRITING AS MEANINGFUL AND AFFECTIVE OBJECTS: THEORY AND EXPERIENCE INTRODUÇÃO Em ternuras e palavras e, em poética sedução cognitiva. das crianças, nos aproximamos; Este artigo tem por objetivo apresenta reflexões sobre Experiências didáticas e pedagógicas, realizadas em articulação pesquisa, ensino e extensão, enquanto ações universitária, cuja diretriz fundamental é a de instaurar, em ambientes escolares e não-escolares, a relação de crianças – em dificuldades na aquisição e domínio das habilidade de leitura e escrita – com a cultura (Leitura e Escrita), de forma rica e diversificada, possibilitando as mesmas a interação com os diversos gêneros simbólicos, de forma que venham a ressignificar as suas relações com os sabres, os conhecimentos, e a cultura historicamente acumuladas pela humanidade, experimentando a leitura e a escrita como atividades sociais significativas, prazerosas e afetivas, fundamentais a sua formação. Com base nos pressupostos da abordagem histórico cultural do desenvolvimento humano – de acordo com Vigotski e seus colaborares –, assumese como premissa o fato de que somos sujeitos simbólicos, que nos constituímos nas relações sociais, mediadas pela linguagem e pela cultura, ações didáticas, portanto, destinadas a essas crianças, em situação de repetência e ou atraso na relação idade/ano escolar, deve centrar-se no envolvimento rico e diversificado das mesmas com a cultura, com o conhecimento, de forma significativa. Assim, aproximar o conhecimento acadêmico da realidade das práticas escolares, realizando-se, assim, o princípio da articulação entre conhecimentos sistemáticos e conhecimento/saberes/práticas dos professores e as aprendizagens cotidianas das crianças, deve constituir-se no esforço de todo processo de formação do profissional da pedagogia. Em relação à metodologia, utiliza-se diversos suportes semióticos, de forma a envolver as crianças na exploração da leitura e da escrita de forma prazerosa, significativa, contextualizada. As crianças que participam dessas atividades são oriundas de escolas municipais e são previamente selecionadas por seus professores tendo em vista o fato de ainda não dominarem as habilidades de leitura e escrita, A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 5 47 algumas delas estando em situação de repetência. BREVE INCURSÃO À TEORIA A atividade leitora apresenta, ao contrário, todos os traços de uma produção silenciosa: flutuação através da página, metamorfose do texto pelo olho que viaja, improvisação e expectação de significados induzidos de certas palavras, intersecções de espaços escritos, dança efêmera... Ele [o leitor] insinua as astúcias do prazer e de uma reapropriação no texto do outro: aí vai caçar, ali é transportado, ali se faz plural como os ruídos do corpo. Astúcia, metáfora, combinatória, esta produção é igualmente uma ‘invenção’ de memória. Faz das palavras as soluções de histórias mudas... Um mundo diferente (o do leitor) se introduz no lugar do autor (MICHEL DE CERTEAU, 2002). Para Vigotski (2000), a leitura e a escrita não são elementos inatos à criança, sua aquisição depende das práticas sociais e culturais a qual a mesma está inserida. A compreensão da leitura e da escrita não se dá de forma isolada, não é algo trazido em seus aspectos biológicos, mas construído em suas relações sociais, em sua relação com o outro/ outros e com os conhecimentos. É, pois, uma troca de experiência que possibilita a aprendizagem e aquisição da escrita, o acesso ao mundo simbólico. Por exemplo, crianças que se julgam “burras” (ou assim são identificadas) – “Tia, não sei, tia, sô burra nisso” – por não ter domínio da leitura e escrita, parecem acreditar não poder vir a adquirir essas habilidades, o que afeta sua autoestima. O papel da escola é dar a essas crianças, num contexto sistemático, possibilidades para que as mesmas possam se desenvolver, pois, devemos olhar as crianças não apenas em suas dificuldades, mas “o que temos que buscar são as forças positivas [...], dirigindo-nos para alcançar o que é socialmente valorizado, construindo assim a autoestima perdida ou não estabelecida”. (PADILHA, 1998, p. 33). O que parece acontecer no contexto escolar, é que só se consegue enxergar as dificuldades que as crianças apresentam no processo de aquisição da leitura e da escrita, sem se perguntar como ocorreu esse processo antes de sua entrada na escola, em que contexto sócio-cultural estas crianças se encontravam e se encontram inseridas. É em um mundo de leitores ou em um mundo em que a leitura e a escrita são pouco valorizadas? Em relação a essa situação, Vigotski chama a atenção para o fato de que “o aprendizado volta-se para as deficiências da criança, ao invés de se voltar para os pontos fortes...” (VIGOTSKI, 2000, p. 130). Pensar nos pontos fortes, seguindo com esse autor, pois, significa relacionar as atividades de leituras as experiências linguageiras das crianças; seus conhecimentos prévios; seus conhecimentos cognitivos e afetivos que possuem sobre a escrita e a leitura. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 5 48 É necessário que o professor compreenda e aceite que seus alunos, ao entrarem na escola, trazem consigo uma história de vida, história essa constituída no seu meio sócio cultural na sua sociedade de uma forma muito particular, o que vai marcar as diferenças entre as crianças em termos de conhecimentos e aprendizagens, ou de desenvolvimentos cognitivos, afetivos e emocionais, morais, etc.. As crianças, assim, chegam à escola com diferentes apreciações emocionais, afetivas e cognitivas sobre essa tecnologia. O indivíduo apropria-se de coisas do seu cotidiano que pode não ser de interesse de outra pessoa, mas que deve ser respeitado, ou seja, devemos levar em consideração os conceitos espontâneos da criança, ao ensinar os conceitos científicos, pois, segundo Vigotski, “o desenvolvimento dos conceitos espontâneos da criança é ascendente, enquanto o desenvolvimento dos conceitos científicos é descendente.” (VIGOTSKI, 2000, p. 135). Seguir essas orientações, significa compreender a criança em sua totalidade emocional, cultural, afetiva e intelectual: suas leituras de mundo, suas iniciáticas percepções que fazem dos objetos culturais, seus gostos preferências. Tomar essas elaborações pré-conceituais, em sua génese – que vão se fazendo em ritmos assistemáticos, espontâneos e que respondem às necessidades práticas de inserirse e participar da vida social – como condição básica para o aprendizado escolar da tecnologia da leitura e da escrita. As primeiras palavras, como por exemplo, pai, mãe, mamar, comer, etc., são apreendidas e aprendidas em um contexto marcado, preponderantemente, pelo vínculo afetivo-emocional e não cognitivo e reflexivo. Inspirando-se em Vigotski, pode-se supor que as palavras chegam até a criança, desde o seu nascimento, envolta em afetos, carinhos, emoções. São as palavras ternas, em suaves modulações, ditas pelos pais, avós, irmãos, irmãs, etc., que envolvem o pequeno ser em sua entrada no mundo das significações. É a ternura parental, pois, que indicia a aquisição das primeiras palavras e dos conceitos iniciais que a criança usa, de acordo com suas necessidades relacionais e de sobrevivência. Esses conceitos espontâneos são apropriados assistematicamente nas relações cotidianas, não sendo mediados por um processo explicativo de causalidade e relação, em que as palavras significam apenas um objeto ou uma ação percebida diretamente pela experiência de vida da criança. É a utilização sem intervenção das palavras ligada ao seu processo direto e aparente, sem uma tomada de consciência sobre esse processo, que Vigotski chama de pensamento espontâneo. A criança relaciona a palavra com o conhecimento que tem, com suas experiências de vida, e isso precisa ser levado em consideração no ensino da leitura e da escrita, pois sabemos que a palavra não se desenvolve em nós naturalmente. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 5 49 É nas nossas relações com o outro que ela vai sendo incorporada, vai ganhando significados conscientes. As palavras desempenham um papel central não só no desenvolvimento do pensamento, mas também na evolução histórica da consciência como um todo, pois “uma palavra é um microcosmo da consciência humana.” (VIGOTSKI, 2000, p. 132), e “quando uma palavra nova é aprendida por uma criança, o seu desenvolvimento mal começou...”, destaca o autor (2000, p. 71). Ou seja, para Vigotski, uma palavra apresenta níveis complexos de significação. A criança, inicialmente, vai se apropriando dos significados mais simples e, ao ser inserida no processo formal de aprendizagem escolar, é que ela vai passar a ter uma relação de reflexão com as palavras e, assim, vai desenvolvendo os diversos significados que contém uma data palavra. De forma que, o processo de construção do conhecimento pela criança é algo complexo e não reduzido. Não se deve cair na falsa crença de que o aprendizado de uma palavra ou de conteúdos seja o suficiente para a formação do indivíduo e, principalmente, para a aquisição da leitura e da escrita, pois aprender a ler, a escrever, é, antes de tudo, aprender a ler o mundo, compreender seu contexto, não numa dominação mecânica de palavras, e sim numa relação dinâmica que ligue linguagem e realidade. A palavra, pois, é a constituição da própria consciência, diz Vigotski. Nesta observação de Vigotski sobre a necessidade de se relacionar a aprendizagem das palavras aos saberes prévios, conhecimentos iniciáticos do mundo, pode-se identificar uma semelhança com o pensamento de Paulo Freire quando o mesmo fala da importância da alfabetização. Para Freire, A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não possa prescindir da continuidade da leitura daquele. Linguagem e realidade se prendem dinamicamente. A compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura crítica implica a percepção das relações entre o texto e o contexto (FREIRE, 1989, p. 9) Assim, para Vigotski e Freire, a escrita tem grande significado para as crianças, despertando nelas necessidades próprias, pelo fato de se juntar a uma tarefa necessária e importante para a vida e, assim desenvolver-se como uma forma nova e complexa de linguagem. Vigotski (2000) faz ácida crítica à maneira formal e mecânica como via o ensino da escrita: O ensino tem de ser organizado de forma que a leitura e a escrita se tornem necessárias às crianças. Se for usado apenas para escrever congratulações oficiais para membros da diretoria escolar ou para qualquer pessoa que o professor julgar interessante (e sugerir claramente para as crianças) então o exercício da A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 5 50 escrita passará a ser puramente mecânico e logo poderá entediar as crianças, suas atividades não se expressarão em sua escrita e suas personalidades não desabrocharão. A leitura e a escrita devem ser algo de que a criança necessite (p. 155-156). Em seu cotidiano, por estar inserida em uma sociedade letrada, semiótica, profundamente tecnologizada, a criança sente a necessidade da leitura e da escrita para tentar realizar algo que a ela é necessário. E ela busca o aprendizado de forma a realizar-se enquanto ser humano e constituir-se enquanto indivíduo. Ela vai ao encontro da escola com a expectativa de conseguir esse aprendizado, mas infelizmente, depara-se com algo muito diferente da sua realidade, pois, a leitura e a escrita – muitas vezes - são apresentadas de forma mecânica, vistas como uma obrigação e não como desejo de adquiri-la, sem significado para ela, o que acaba gerando o desinteresse, o fracasso e a evasão escolar. A palavra, na sala de aula, parece perder a ternura, a emoção e a afetividade. E por isso, apresenta-se, para muitas crianças, em seu desencanto, em sua expressão de desinteressante objeto emocional. Essa é a grande critica que Vigotski, na citação anterior, faz ao ensino da leitura e da escrita: um processo mecânico e desvinculado das necessidades maiores das crianças, do desenvolvimento de sua consciência. Vigotski parece nos dizer: é preciso despertar, na criança, a paixão pela palavra e por meio da palavra. Essa seria a alavanca pedagógica a um ensino transformador e formador. A leitura e a escrita, como já mencionou anteriormente, são elaboradas pela criança, inicialmente, nas suas relações sociais, necessitando sempre do outro como mediador nesse processo. A elaboração ativa da escrita depende principalmente das possibilidades que as crianças têm/ ou não de utilizar e compartilhar essa escrita em suas interações. Vigotski nos convida a pensar e viver, pedagogicamente, em sala de aula, experiências alfabetizadoras que se conectem ao mundo vivencial, cotidiano, cultural das crianças, em seus vínculos afetivos e percepções cognitivas ainda em frágeis elaboração. Claro que esse é o ponto de partida para que a escola, leve a criança para além de seus conhecimentos assistemáticos, inserindo-a nas aprendizagens sistemáticas, o que significa o domínio de um pensamento e raciocínios categoriais. A sala de aula é o lugar da reflexão sobre o mundo, sobre a vida, sobre as aprendizagens pragmáticas; é o lugar, portanto, do pensamento reflexivo, mediado pelos conceitos sistemáticos, científicos, historicamente acumulados pela humanidade. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 5 51 RESULTADOS E CONCLUSÕES Na gênese do projeto, foram selecionadas crianças do 4º. e 5º. anos que apresentavam, segundo suas professoras, dificuldades no domínio da leitura e da escrita. Houve a apresentação das atividades às crianças, sendo que nesta apresentação estavam presentes a diretora da escola, pais e professora. Foram discutidas as propostas a ser desenvolvidas pelo projeto, tendo como um dos objetivos a ser alcançados: consolidar o domínio das habilidades de leitura e de escrita dessas crianças, superando, assim, essa condição de “dificuldades”. Já nos primeiros dias de atividades proporcionou-se que as crianças pudessem interagir entre si, sendo que esta ação social educativa foi desenvolvida como uma ferramenta essencial para que as crianças fossem afetadas intelectual e afetivamente pelas conhecimentos de leitura e escrita, já que segundo a teoria sócio interacionista de Vigotski (2000), é fundamental a interação com o outro mediado pelos objetos de conhecimentos para que o indivíduo possa vir a desenvolver suas funções psicológicas superiores. Nos primeiros encontros percebeu-se que algumas crianças apresentavam comportamentos retraídos; algumas, de início, sentiam-se receosas por suas dificuldades, não só aquelas dificuldades escolares, mas também aquelas que dizem respeito a relacionar-se com os demais. Mas no decorrer das metodologias desenvolvidas, e com o passar das semanas, estas foram agindo de forma espontânea e assim começaram a participar ativamente das atividades. De emoções e afetividades retraídas, surgem emoções e afetividades participativas! Observamos que uma sala é heterogênea, cada criança é única; o aprendizado acontece de forma diferente entre elas; devemos ter a sensibilidade de notar isto e buscar estratégias para passar os conhecimentos de forma que todos consigam se apropriar de maneira significativa e que encontrem sentido no que fazem, mesmo quando determinada atividade lhes exige paciência, esforço e dedicação. Ressalte-se que o aprender não envolve somente afetos de prazer, mas afetos de paciência, esforço, cansaço. No entanto, quando a criança compreende, emocional e afetivamente, o significado da atividade, a emoção de esforço motiva a cognição ao desenvolvimento da aprendizagem. Ou seja, a emoção e o afeto se inter-relacionam nas atividades de aprendizagem. Para uma discussão mais aprofundada sobre essa relação entre afetividade e cognição sugere-se o exame de textos como Falabelo (2005), Falabelo (2015), Falabelo (2015), identificados nas Referências. Compreendendo que essas crianças provêm de contextos diferenciados, que tem domínio de conhecimentos prévios diversos, deve-se valorizar acontecimentos prazerosos de forma que se sintam atraídas por estas ideias; que se busque fazer A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 5 52 um ensino contextualizado, levando a criança a ler e a compreender o que foi lido, ou seja, desenvolver uma prática de leitura enquanto uma atividade social, trabalhando a função social da leitura e escrita, excluindo-se o conceito de ensino da escrita e da leitura mecanizadas, que por muitas vezes se faz presente na escola, conforme Braggio (1992). Buscamos enfatizar aqueles conhecimentos que as crianças traziam de suas comunidades, tais como: fatos, acontecimentos, brincadeiras, gírias, e tudo que pudesse aproximá-las das atividades de aquisição da leitura e da escrita, de forma significativa, prazerosa e descontraída. E, para isso acontecer, o contexto social e cultural das crianças deveria ser explorado enquanto materiais indispensáveis à didática da leitura e da escrita. Além disso, foram trabalhadas atividades de ensino aprendizagem com metodologias diversificadas como: palavras cruzadas, caça-palavras, pesquisa e colagem com jornais, leituras e interpretação de textos, produção de textos e etc.. Assim, por meio da execução dos métodos propostos, as crianças foram aos poucos fazendo leituras de palavras, frases, pequenos textos e passaram a escreve, também, pequenos textos, individuais ou em grupo. Procurava-se tomar como material para a escrita a própria realidade das crianças; seus desejos; seus sonhos; suas dificuldades; suas maneiras, ainda infantis, de ver e pensar sobre o vivido e suas condições de existência (SMOLKA, 1999) Uma das práticas que se buscava incentivar era: dar a oportunidade de a crianças escolherem o que desejassem ler: “– escolha, visualize, busque o que você quer” – eis a orientação. Isso contribuiu, significativamente, para despertar o interesse maior pela leitura. A leitura livre, em que livros e estorinhas eram trabalhados de acordo com o gosto das crianças. Além do estímulo à leitura, valorizava-se a autoestima e o comportamento de interesse, atenção, participação das crianças por meio de atividades coletivas, despertando a cultura da socialização, da aceitação do outro, pois conforme Charlot (2000), o desafio da aprendizagem é compreender-se como parte de uma humanidade e, em seguida, compreender-se como membro de uma sociedade e, por fim, saber-se em sua individualidade. Tarefa em três tempos. Cooperar, competir, brincar e sorrir eram atitudes que, aos poucos, iam sendo manifestadas e exteriorizadas pelos participantes. O domínio da leitura e da escrita pelas crianças era bastante precário, conforme percebemos. Buscamos, no entanto, não reduzir a oferta de atividades de leitura, propiciando atividades coletivas e individuais de acesso ao texto escrito, ampliando, assim o domínio e consolidando habilidades de leitura e escrita. Notava-se, num crescendo, que as crianças começaram a interagir mais, demonstrando interesse às atividades; passaram a manter interlocuções A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 5 53 espontâneas. interlocução tanto com os colegas quanto com os mediadores, e não apenas verbal, mas também não verbal, através de olhares e de gestos. Isso revelava mudanças significativas nos comportamentos intelectuais, afetivos e emocionais das crianças. Mudanças atitudinais significativas! Vigotski chama a atenção para um fato importante: o autocontrole da criança é promovido pelo conhecimento. À medida que a criança vai desenvolvendo suas funções psicológicas superiores, com a apropriação dos conhecimentos, ela via se autorregulando em seus diferentes comportamentos atitudinais, socialmente valorizados e esperados pelo seu grupo social. Assim, para esse autor, o autocontrole emocional, afetivo, cognitivo, social decorre do desenvolvimento das funções psicológicas superiores; e que esse desenvolvimento dessas funções depende, primordialmente, da aprendizagem. É a aprendizagem – escolar e cotidiana – que são responsáveis pelo desenvolvimento da criança e todos os seus aspectos atitudinais. Dessa forma, conforme Fontana (1997), baseada em Vigotski, a criança na interação diversificada com os conhecimentos, auxiliada pelo adulto que lhe ensina, vai se desenvolvendo e se apropriando das práticas sociais. Diante dos trabalhos desenvolvidos, observou-se um visível aprofundamento no interesse das crianças em relação às práticas de leitura e escrita que estavam sendo disponibilizadas. A parceria entre escola e o projeto acadêmico tem possibilitado experiências inovadoras no que se refere ao processo de alfabetização de crianças em situação de “fracasso escolar”, expressão usada por Charlot (2000). Foi um trabalho árduo, porque não se promove o que chamamos de uma prática diferenciada, sem muito compromissos com aqueles crianças que precisam do conhecimento e da cultura escolar como condição sine qua non para se constituírem em sua humanidade, forjarem suas subjetividades e se fazem em suas individualidades, como sujeitos únicos, históricos, socialmente partícipes de seu grupo social. Por fim, investimos, didaticamente, em palavras cheias de ternura, emoção e afetividade, em poética sedução ao cognitivo movimento do aprender a Ser. REFERÊNCIAS BRAGGIO, S. L. B. Leitura e Alfabetização: da concepção mecanicista a sociopsicolinguistica. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992. CERTEAU, Michel de. A Invenção do Cotidiano; 1. Artes de Fazer. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002. CHARLOT, B. Da relação com o saber: elementos para uma teoria. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 5 54 FALABELO, R. N. O. Vidas em Aberto: A indissociável Inter-Relação Emoções, Afetividade e Cognição nos processos de leitura e escrita [Tese de Doutorado]. Piracicaba, SP, 2005. ________. Conhecimento, Emoções, Afetividade: Desejo de Escrever “Palavrinhas”. Revista UNOPAR Cient., Ciênc. Human. Educ. , Londrina, v. 16, n.4, p. 327-337, 2015 _______. Considerations on affectivity in teaching relations: Vygotsky’s contributions. Acta Scientiarum. Education Maringá, v. 37, n. 4, p. 391-399, Oct.-Dec., 2015 FREIRA, P. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. São Paulo: Autores Associados: Cortez, 1989. FONTANA, R. Psicologia e Trabalho Pedagógico. São Paulo: Atual, 1997. PADILHA, Ana M. L. Possibilidades de histórias ao contrário – ou como desencaminhar o aluno da classe especial. São Paulo: Plexus, 1998. SMOLKA, A. L. B. A criança na fase inicial da escrita: São Paulo: Cortez, 1999. VYGOTSKI, L. S. A formação social da mente. São Paulo : M. Fontes, 2000. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 5 55 CAPÍTULO 6 doi LESEX: LIGA DE EDUCAÇÃO SEXUAL Data de aceite: 06/01/2020 Beatriz dos Santos Melo Universidade do Estado do Rio de Janeiro Rio de Janeiro - RJ Beatriz Silva de Souza Universidade do Estado do Rio de Janeiro Rio de Janeiro - RJ Carolina Habergric Folino Instituto Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ Lucas Rodrigues Tovar Universidade Federal Fluminense Niterói - RJ Thainá Gulias Oliveira Universidade do Estado do Rio de Janeiro Rio de Janeiro - RJ Débora de Aguiar Lage Universidade do Estado do Rio de Janeiro Rio de Janeiro - RJ RESUMO: A educação sexual deve ser pautada na diversidade, assim como na importância de promover o cuidado com os corpos dos estudantes, levando em consideração questões de autoestima, saúde, e respeito às diferenças. Desta forma, é válido considerar a educação em sexualidade como parte da educação para a saúde e também para os direitos humanos, devendo ser incluída nos projetos educativos das escolas, bem como nos currículos das licenciaturas para a plena formação de professores. Nesta perspectiva, a LESex, liga acadêmica de educação sexual da UERJ, visa estreitar os laços entre o ensino, a pesquisa e a extensão, promovendo atividades dialógicas e dinâmicas sobre os principais assuntos que envolvem a sexualidade. Dentre as ações desenvolvidas principalmente para estudantes do ensino básico e superior e para profissionais de educação destacam-se: oficinas, cinedebates, rodas de conversa, mesas redondas e divulgação nas redes sociais. Deste modo, a LESex acredita estar contribuindo para a ampliação do diálogo e disseminação de informações atualizadas sobre sexualidade no ambiente escolar e acadêmico, favorecendo a formação de cidadãos críticos e mais tolerantes à diversidade. PALAVRAS-CHAVE: Sexualidade; liga acadêmica; ensino-pesquisa-extensão. LESEX: SEX EDUCATION LEAGUE ABSTRACT: Sex education should be based on diversity as well as on the importance of promoting student's bodies care and considering issues related to self-esteem, health, and respect differences. Thus, it is valid to consider sex education as part of health and human right A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 6 56 education, being included in educational projects in schools and in teacher's training curricula for a full teaching formation. In this perspective, Lesex, UERJ's academic sex education league, seeks to strengthen the ties between teaching, research and extension, promoting dialogical and dynamic activities about the main themes involving sexuality. Among the actions developed mainly for elementary and higher education students and education professionals, the following are highlighted: workshops, cinedebates, round of conversation, round tables lecture and dissemination in social networks. Thus, Lesex believes it is contributing to the expansion of the dialogue and dissemination of updated information about sexuality in school and academic environment, favoring the formation of critical citizens and more tolerant to diversity. KEYWORDS: Sexuality; academic league; teaching-research-extension. 1 | INTRODUÇÃO A diversidade de conhecimentos, técnicas, práticas e pessoas em uma universidade tem que ser tão vasta quanto o universo contido na palavra “universidade”. Essa pluralidade compreende também as três bases do ensino superior público brasileiro: o ensino, a pesquisa e a extensão. A articulação desses pilares é de responsabilidade de toda comunidade universitária, dos discentes e docentes, dos técnicos administrativos, da reitoria e dos conselhos universitários. Sendo assim, cada uma dessas partes tem que se apropriar do tripé e, dentro de suas funções universitárias, fazê-lo funcional. É nessa perspectiva que surge a Liga de Educação Sexual da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (LESexUERJ), principalmente voltada para que alunos tenham domínio e conhecimento sobre como fazer com que pesquisa, ensino e extensão permaneçam unidos no fazer universitário. A LESex, é uma liga acadêmica fundada em 2015 por alunos do curso de Ciências Biológicas do campus Maracanã da UERJ, com um propósito que vai além da pesquisa, ensino e extensão: trazer a sexualidade para dentro do debate curricular e da vivência dos alunos deste curso. Neste contexto, entendemos a sexualidade no âmbito mais amplo possível, desde saúde sexual/reprodutiva, até saúde mental/ emocional e a marginalização de sexualidades não heterossexuais e gêneros não cissexuais. Segundo Figueiró (2006, p. 2): Sexualidade, por sua vez, inclui o sexo, a afetividade, o carinho, o prazer, o amor ou o sentimento mútuo de bem querer, os gestos, a comunicação, o toque e a intimidade. Inclui, também, os valores e as normas morais que cada cultura elabora sobre o comportamento sexual. Segunda a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2005), a sexualidade pode ser subdividida em três principais temáticas: a biológica, a psíquica e a sociocultural. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 6 57 Sendo assim, ela influencia atitudes, pontos de vista, pensamentos e relações, podendo interferir diretamente na saúde física e mental do ser humano. Desta forma, o debate sobre todo esse conteúdo se faz tão necessário e urgente, uma vez que omitir o ensinamento das temáticas relacionadas à sexualidade é compactuar com um Brasil menos tolerante e “doente”. Neste contexto, o presente artigo tem como objetivo apresentar o trabalho desenvolvido pela LESex, a qual visa promover um diálogo entre ensino-pesquisaextensão, minimizando o déficit que existe no que tange à extensão universitária quando o assunto é educação sexual. 2 | AÇÕES DESENVOLVIDAS As atividades extensionistas realizadas pela LESex podem ser divididas em cinco grandes grupos: oficinas, intervenções no curso de Ciências Biológicas, cinedebates, rodas de conversa, mesas redondas com especialistas e manutenção das redes sociais com informações que permeiam a temática sexualidade e divulgação das atividades realizadas. As oficinas desenvolvidas para os estudantes do ensino básico e superior foram planejadas e adaptadas a partir de diferentes materiais como o Manual do multiplicador adolescente (BRASIL, 2000), a apostila Oficina de ideias - Manual de dinâmicas elaborada pelo Núcleo de Estudos da Saúde do Adolescente (NESA/UERJ) e da Revista adolescer - Metodologias para o trabalho educativo com adolescentes (LOPES et al., 2001). As ações para estudantes do ensino básico foram desenvolvidas a partir de intervenções nas turmas de ensino médio do Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (CEFET/Maracanã) e do Colégio Estadual Antônio Prado Júnior. Na Escola Municipal Argentina, a LESex atuou com turmas do ensino fundamental, enquanto na Feira de Ciências do Instituto de Aplicação Fernando Rodrigues da Silveira (CAp-UERJ), atendeu um público bem diversificado, uma vez que o evento era aberto a alunos e familiares. Assim, em consonância com Louro (1999), consideramos a sexualidade como parte indissociável dos indivíduos, sendo impossível "desligá-la" do espaço escolar. Todas as atividades são realizadas em parceria com os professores das instituições de ensino e baseia-se na execução de oficinas abordando os seguintes temas: métodos contraceptivos, infecções sexualmente transmissíveis (IST), identidade de gênero e diversidade sexual, assim como também efetuar atividades alinhadas com as campanhas nacionais de prevenção contra suicídio, câncer de mama e de próstata (setembro amarelo, outubro rosa e novembro azul). Desta forma, de acordo com a demanda de cada professor, as oficinas são A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 6 58 adaptadas de forma a proporcionar aos alunos atividades criativas, que despertem o interesse pelo conteúdo. Além disso, é fundamental que as atividades contribuam para o estabelecimento de um ambiente confortável, para que os estudantes possam vencer barreiras inibitórias baseadas em tabus, possibilitando a geração de discussões do assunto abordado. Com base nesse panorama, a LESex realiza, sempre que necessário, uma explicação sobre a dinâmica que será executada e apresenta uma introdução específica sobre o conteúdo relacionado à atividade. Porém, em alguns casos, a melhor forma de abordagem do tema é fazer previamente a atividade e deixar os alunos concluírem sobre o tema que foi abordado. Dentre as dinâmicas mais utilizadas nas atividades, destacam-se:  Dinâmica "O Semáforo": consiste em uma dinâmica de sondagem, cujo principal objetivo é identificar as principais dificuldades dos alunos nos temas de interesse relacionados à sexualidade. Inicialmente são colocados no chão da sala de aula 3 caixas de diferentes cores, que representavam o grau de dificuldade do aluno em determinado tema. Assim, a caixa vermelha representa muita dificuldade sobre o assunto, a amarela representa dificuldade média e a verde significa pouca dificuldade. Em seguida, cada aluno recebe pedaços de papel, nos quais devem escrever, em cada um, temas de interesse e/ou dificuldade referentes à sexualidade e depositar na caixa colorida correspondente ao seu grau de interesse e/ou dificuldade. A análise dos papéis contidos nas caixas, irá direcionar as próximas atividades a serem aplicadas àqueles estudantes.  Dinâmica "Por que tanta diferença?": tem como objetivo servir como base para discussão sobre os padrões de gênero presentes na sociedade e o porquê de existir essas diferenças entre gêneros. Nessa dinâmica, a turma é dividida em grupos de meninos e meninas, onde cada grupo deve discutir e listar as vantagens e desvantagens de pertencer ao sexo oposto. Em seguida, as opiniões dos grupos são apresentadas e discutidas com a turma.  Dinâmica "Métodos contraceptivos": a dinâmica se inicia perguntando aos alunos o que eles entendem por fecundação. Em seguida, o conceito de fecundação é explicado, discutido e os principais métodos de contracepção são apresentados. Os estudantes aprendem sobre os métodos de barreira (camisinhas feminina e masculina, diafragma e DIU), hormonais (pílula anticoncepcional, pílula do dia seguinte e injeção hormonal, anel vaginal e DIU hormonal), cirúrgicos (vasectomia e laqueadura) e aqueles considerados naturais (tabelinha e coito interrompido). Dessa forma, espera-se que os alunos desenvolvam maior curiosidade e entendimento sobre quais são os melhores métodos a serem utilizados para impedir a concepção.  Dinâmica "IST": o objetivo dessa dinâmica é a melhor compreensão da transmissão das IST. Para cada aluno é entregue um pedaço de papel com o desenho A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 6 59 de uma figura geométrica: um círculo, um quadrado ou um triângulo. Os círculos, em maior quantidade, representam uma pessoa não contaminada; os quadrados, em quantidade menor que os círculos, representam uma pessoa portadora de alguma IST; já os triângulos, em quantidade ainda menor que os quadrados, representam uma pessoa especificamente contaminada pelo vírus HIV. Os alunos caminham pela sala e em um determinado momento param e escrevem em seu papel a figura geométrica que está no papel de uma pessoa aleatória por perto, terminando assim com 2 figuras geométricas em seu papel. Repete-se o procedimento por mais 4 vezes e é pedido para que os alunos sentem e digam quais figuras geométricas obtiveram. Ao final a legenda das figuras é colocada no quadro e explicada a forma de transmissão das principais IST.  Dinâmica "O corpo": essa dinâmica propõe aos alunos conhecerem melhor a anatomofisiologia dos aparelhos genitais feminino e masculino. Para tal, os alunos são divididos em 4 grupos e cada grupo recebe uma parte do aparelho genital (genitália masculina interna, genitália masculina externa, genitália feminina interna e genitália feminina externa), papel pardo, massa de modelar e canetas. Em seguida, cada grupo deverá desenhar no papel pardo a silhueta de uma pessoa e representar seu respectivo aparelho genital com as massas de modelar. Dessa forma é possível ver o quanto os alunos conhecem da anatomia de seus sistemas genitais e a importância de cada órgão.  Dinâmica "Beleza e idealização": o objetivo dessa dinâmica é discutir sobre os padrões de beleza presentes no mundo da moda e das mídias sociais e o impacto disso na vida de cada um. Para isso, a turma é dividida em grupos de meninos e meninas, onde cada grupo recebe uma revista, papel pardo, tesoura e cola. Os grupos devem discutir entre si o tipo de característica que consideram ideal em uma pessoa do sexo oposto (ou do mesmo sexo) e em seguida listá-las e fazer uma colagem procurando na revista que receberam as características discutidas. Ao final da atividade, abre-se uma discussão sobre as características selecionadas e os desdobramentos que os padrões exercem sobre a saúde física e mental, como por exemplo bulimia, anorexia e baixa autoestima.  Dinâmica “gênero e diversidade sexual”: aborda os conceitos ligados a identidade de gênero, sexo biológico e orientação sexual no qual temos como objetivo desmistificar o senso comum relacionado ao uso desses termos. Para isso, utiliza-se um modelo conhecido em inglês como gender bread, no qual os conceitos supracitados são visualizados em um boneco e posteriormente explicados detalhadamente.  Dinâmica “promoção da saúde física e mental”: baseia-se na criação de espaços de diálogo sobre a prevenção do suicídio, prevenção do câncer de mama e do câncer de próstata. São utilizados vídeos de acesso público no Youtube sobre A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 6 60 autoestima, autoexame das mamas e cartazes falando sobre os exames de próstata disponíveis.  Dinâmica “Relacionamento abusivo”: os estudantes assistem a curta metragem Não confunda amor com abuso, disponível na plataforma YouTube, onde a personagem principal vivencia o cotidiano de um relacionamento abusivo. Ao final, abre-se a discussão com cada grupo de alunos sobre como aquelas atitudes presentes no vídeo não deveriam ser toleradas e como proceder para ajudar algum amigo que estivesse passando por situação semelhante. Na universidade são realizadas intervenções no curso de Ciências Biológicas, durante a recepção da turma de calouros do curso. Nestas atividades são abordadas diferentes temáticas, nem sempre relacionadas diretamente à educação sexual, mas sobre aspectos que permeiam a sexualidade humana. Dentre as ações, destacamse:  Dinâmica “corrida do privilégio”: nesta atividade os participantes são colocados lado a lado em uma linha reta. Com os olhos fechados, estes devem dar um passo para frente ou para trás de acordo com o comando das frases ditas pelo mediador. As frases são relacionadas a situações de privilégio social. Ao final da dinâmica é discutido o porquê de as pessoas estarem paradas em posições diferentes, e de que forma é possível contribuir para diminuir a diferença entre as realidades apresentadas pelo próximo.  Dinâmica “tipos de opressões”: nesta dinâmica são utilizadas frases e trechos de músicas contendo falas polêmicas presentes no cotidiano e na cultura musical brasileira. São separadas cerca de 60 frases ou trechos de músicas com conteúdo machista, lgbtfóbico, racista ou xenofóbico, que são embaralhadas e entregues em um papel para cada participante. Todos sentam em roda e devem ler sua frase em voz alta e ao final comentar sobre o que estava escrito. Dessa forma abre-se o debate sobre os tipos de opressões existentes em nosso cotidiano e como evitar falar certos tipos de ofensa para o outro. Ainda dentro da universidade, são realizados cine-debates, mesas-redondas e rodas de conversa, voltadas para estudantes de diferentes cursos, sejam do ciclo básico ou de cursos de pós-graduação, bem como para profissionais da educação. Contudo, as atividades eram abertas para qualquer pessoa com interesse no tema. O primeiro cine-debate realizado foi sobre transexualidade, com a exibição do filme “Transamérica” e a presença de uma aluna transexual da UERJ e uma integrante da coordenação do projeto transexualizador do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE) da UERJ. O debate estimulou a reflexão sobre as dificuldades de afirmação como pessoa trans e a luta constante de quem teve sua identidade de gênero patologizada. Outro cine-debate realizado foi sobre o curta metragem “Tudo vai ficar bem”. Em consonância com a proposta do filme, foi estabelecido um A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 6 61 local confortável para o diálogo sobre assuntos delicados que afligem a população LGBTQIA+ no Brasil. A roda de conversa intitulada “Precisamos falar sobre educação sexual”, surgiu da necessidade de discutir a importância desta temática, especialmente nas aulas de Ciências e Biologia, de forma não biologizante e reducionista, reconhecendo a interdisciplinaridade do assunto. Mais recentemente, preocupada com o cenário político atual e os ataques que o ensino público, a liberdade sexual e o SUS vêm sofrendo, a LESex propôs dois temas para debate em rodas de conversa: “Política e sexualidade” e “Prevenção combinada e HIV no século XXI”. No primeiro evento, pôde-se discutir a situação atual e estratégias possíveis para abordagem de educação sexual na escola como instrumento de mediação de conflitos e bem-estar. No evento sobre prevenção combinada e HIV, foi possível mostrar a importância do Sistema Único de Saúde (SUS) para o tratamento e prevenção de IST, hepatites virais e a oferta de novas técnicas de prevenção ao HIV, como a PreP (Profilaxia Pré-Exposição ao HIV) e a PEP (Profilaxia Pós-Exposição ao HIV). Quando as reações, efeitos colaterais e interações medicamentosas das pílulas anticoncepcionais começaram a ser pauta de discussões principalmente em redes sociais e a demonização do medicamento veio à tona, a necessidade de trazer um evento sobre o assunto foi urgente. Nesse contexto a LESex promoveu a mesa redonda intitulada “Direito reprodutivo e a pílula anticoncepcional”, com o objetivo principal de elucidar algumas dúvidas geradas em torno da pílula que fez com que muitas mulheres tivessem medo de utilizá-la. Além disso o evento visou dialogar sobre direito reprodutivo e a autonomia que o advento da pílula trouxe para as mulheres. Ainda estimulados pela vontade de discutir como a educação pode ser importante no meio escolar, a mesa redonda “Como a educação sexual pode ajudar na saúde do ambiente escolar” demonstrou que não existe uma receita pronta para a abordagem das temáticas que envolvem a sexualidade em sala de aula. Entretanto, é fundamental para o aluno que o profissional de educação não se omita para as diferentes situações que surgem no cotidiano escolar, banalizando os momentos que requerem intervenção. Para a divulgação das atividades desenvolvidas pela LESex e de informações e atualidades sobre os diferentes temas que permeiam a sexualidade, utilizamos a nossa página no Facebook e o nosso perfil no Instagram. Desta forma, espera-se que seja possível que um maior número de pessoas tenha a oportunidade de obter mais informações sobre os temas trabalhados e de conversar diretamente com os membros da Liga. Além disso, a ampla divulgação do projeto pode proporcionar parcerias com instituições de ensino e o diálogo com outros projetos semelhantes, A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 6 62 que poderão contribuir para o enriquecimento do trabalho da LESex. 3 | DISCUSSÃO Apesar dos avanços na formação inicial e continuada dos professores, a abordagem sobre educação sexual nas escolas brasileiras ainda é muito limitada e cercada de tabus. Diversos autores apontam que as atividades realizadas no contexto escolar ficam, muitas vezes, restritas ao enfoque biológico, enquanto os aspectos sociais e psicológicos são negligenciados (MARTINS, 2017). Desta forma, os projetos de extensão universitária têm tido papel fundamental na educação em sexualidade, contribuindo de forma significativa na formação de estudantes e professores do ensino básico e superior (TEIXEIRA et al., 2019). Com sua origem na Inglaterra no século XIX, a Extensão Universitária tem como intuito promover uma educação continuada para a sociedade, proporcionando uma troca de benefícios e saberes entre os sujeitos (RODRIGUES et al., 2013). Assim, com o desenvolvimento de ações que contribuem para a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos, os programas de extensão são de grande importância para a efetivação do compromisso social da universidade. De acordo com Silva (2011, p. 2): A relação da universidade com a comunidade se fortalece pela Extensão Universitária, ao proporcionar diálogo entre as partes e a possibilidade de desenvolver ações socioeducativas que priorizam a superação das condições de desigualdade e exclusão ainda existentes. E, na medida em que socializa e disponibiliza seu conhecimento, tem a oportunidade de exercer e efetivar o compromisso com a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos. Neste contexto, as atividades desenvolvidas pela LESex - Liga de Educação Sexual da UERJ visam aproximar a relação entre ensino-pesquisa-sociedade, rompendo as barreiras da sala de aula e dos muros da universidade, a fim de promover a difusão de conhecimento de forma crítica, qualificada e livre de preconceitos. De fato, “a extensão, enquanto responsabilidade social faz parte de uma nova cultura, que está provocando a maior e mais importante mudança registrada no ambiente acadêmico e corporativo nos últimos anos” (CARBONARI e PEREIRA, 2007, p. 27). Para as intervenções realizadas com os estudantes da educação básica, optouse pelo desenvolvimento diferentes tipos de oficinas. Segundo Bastiani e Padilha (2007), as oficinas caracterizam-se por atividades em grupo, que atuam em uma concepção de aprendizagem compartilhada, em um ambiente agradável, dinâmico, cordial e lúdico. Neste sentido, a realização das oficinas propiciou o estabelecimento de um espaço de diálogo, de reflexão e de troca de conhecimento entre estudantes e graduandos, contribuindo para um processo educativo-participativo, no qual os estudantes foram estimulados a participar ativamente na construção do seu próprio conhecimento. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 6 63 De acordo com Afonso (2000), no tocante à educação sexual, o emprego de metodologias dialógicas, lúdicas e interativas constitui a melhor estratégia para atingir os estudantes. Desta forma, diversos autores têm utilizado com sucesso esse valioso recurso pedagógico para a abordagem do assunto na educação básica (OLIVEIRA, 2019; BERTOLLO; MARTINS; AYRES, 2018; SANTOS et al., 2017; CARNEIRO, et al., 2015). Embora tenha como função principal o entretenimento, cada vez mais o cinema vem sendo empregado com objetivos educacionais, permitindo a inserção de temas de interesse educacional e social, possibilitando a reflexão dos cidadãos de forma crítica (ANDRADE e TEIXEIRA, 2019; BISPO e MELLO, 2019; TINÔCO e ARAÚJO, 2017). Para Andrade e Teixeira (2016, s/p): O cinema permite passear por espaços e tempos desconhecidos, convidandonos a “sermos outros”, a nos colocarmos na posição do outro – de um estrangeiro, de um índio, de um negro, de uma mulher, de um velho, de uma criança, de um homossexual, de um imigrante, etc – de modo a trabalhar os preconceitos, ensinando a ser aquilo que não somos, a ser múltiplos: o bom cinema pode colaborar para desenvolver a alteridade e a empatia. Desta forma, uma vez que que as obras cinematográficas alcançam todos os níveis de escolaridade, influenciando na formação de valores, costumes e comportamentos na sociedade (QUARESMA, 2010), o uso do cinema mostra-se oportuno para o contexto educacional. Neste sentido, a realização de cine debates na Universidade sobre temas polêmicos, como as questões de gênero, sexualidade, autoestima e preconceito, torna-se fundamental especialmente nos dias de hoje, já que o cinema é capaz de provocar profundos impactos sociais no público (NAPOLITANO, 2009). Por esse motivo, os cine-debates vêm sendo cada vez mais utilizados como recurso pedagógico para a abordagem de diferentes assuntos (ANDRADE e TEIXEIRA, 2019; BISPO e MELLO, 2019; TINÔCO e ARAÚJO, 2017; ANDRADE e TEIXEIRA, 2016). Ampliar os espaços de discussão acerca dos diferentes temas que permeiam a sexualidade humana a partir de rodas de conversas e mesas redondas torna-se fundamental para a divulgação de informações de qualidade e troca de conhecimento, contribuindo para a formação de cidadãos críticos e livres de preconceitos. Por esse motivo, é preciso investir na formação inicial e continuada dos professores, visando a capacitação desses profissionais para uma abordagem consciente e abrangente acerca da sexualidade. Contudo, a construção de uma educação sexual emancipatória constitui uma abordagem política, possibilitando a compreensão da sexualidade em toda sua complexidade, para que os estudantes sejam capazes de se posicionar na sociedade frente às questões sociais, emocionais e políticas que envolvem a sexualidade humana (FIGUEIRÓ, 2006). A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 6 64 4 | CONSIDERAÇÕES FINAIS A educação sexual deve ser pautada na diversidade sexual, assim como na importância de promover o cuidado com os corpos dos estudantes, levando em consideração questões de autoestima, saúde, e respeito às diferenças. Entretanto, não é trivial que as instituições promovam este tipo de abordagem, sendo muitas vezes atribuída aos docentes de Ciências e Biologia que acabam trabalhando as questões biológicas em detrimento de outras discussões tão caras à saúde e à formação dos adolescentes. Neste sentido, considerando o contexto no qual a LESex foi criada, fica evidente a sua importância para apresentar diferentes maneiras de abordar a sexualidade, possibilitando a introdução deste tema na sala de aula. Com atividades práticas e ludicidade, a Liga contribui para que professores e alunos possam superar obstáculos ao tratarem de assuntos delicados, visto que muitos docentes não se sentem confortáveis com o tema e com isso acabam o evitando no cotidiano escolar. Em relação aos universitários, as atividades da LESex proporcionam um livre diálogo e um ambiente propício para discussão das diferentes temáticas que envolvem a sexualidade, favorecendo a formação de agentes propagadores de informação, capacitados a desenvolverem argumentos fortes frente aos diversos preconceitos e tabus existentes em nossa sociedade. Por fim, acreditamos que a ampla divulgação das atividades promovidas pela LESex pode estimular a criação de novas ligas, garantindo que temas tão importantes como a sexualidade deixem de ser um tabu, para se tornar uma temática sem preconceitos e com espaços para debates construtivos, formando cidadãos menos omissos e intolerantes. REFERÊNCIAS AFONSO, L. Oficinas em dinâmica de grupo: um método de intervenção psicossocial. Belo Horizonte: Edições do Campo Social, 2000. ANDRADE, A.; TEIXEIRA, R. R. P. Ampliando horizontes e enfrentando preconceitos por meio de cinedebates. Revista Compartilhar, v. 3, p. 71-73, 2019. ANDRADE, A.; TEIXEIRA, R. R. P. Cinema, educação e tecnologia: contribuições pedagógicas de um projeto de extensão. Revista Interdisciplinar de Tecnologias e Educação: RInTE, v. 2, n. 1, 2016. BASTIANI, J. A. N.; PADILHA, M. I. C. S. Experiência dos agentes comunitários de saúde em doenças sexualmente transmissíveis. Revista Brasileira de Enfermagem, v. 60, n. 2, p. 233-236, 2007. BERTOLLO, L. P. G.; MARTINS, R. R.; AYRES, J. R. C. M. Educação sexual e reprodutiva para A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 6 65 adolescentes como educação entre pares: avaliação de uma experiência de extensão universitária. Revista Brasileira de Extensão Universitária, v. 9, n. 2, p. 83-91, 2018. BISPO, S. P.; MELLO, I. M. Psicologia e cinema: possibilidade de ação diante da temática do racismo. Revista UFG, v. 19, p. 1-14, e-59270, 2019. BRASIL. Manual do multiplicador: adolescente. Ministério da Saúde. Coordenação Nacional de DST e Aids. Brasília: Ministério da Saúde, 2000. CARBONARI, M.; PEREIRA, A. A extensão universitária no Brasil, do assistencialismo à sustentabilidade. São Paulo, setembro de 2007. Base de dados do Anhanguera. Disponível em: <http://www.sare.unianhanguera.edu.br/ index.php/reduc/article/viewArticle/207>. Acesso em: 16 out. 2019. CARNEIRO, R. F.; SILVA, N. C.; ALVES, T. A.; ALBUQUERQUE, D. O.; BRITO, D. C.; OLIVEIRA, L. L. Educação sexual na adolescência: uma abordagem no contexto escolar. SANARE, v. 14, n. 1, p. 104-108, 2015. FIGUEIRÓ, M. N. D. Formação de educadores sexuais: adiar não é mais possível. Campinas: Mercado de Letras; Londrina: EDUEL, 2006. FIGUEIRÓ, M. N. D. Educação Sexual: Como Ensinar No Espaço Da Escola Sexual. 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A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 6 66 SILVA, V. Ensino, pesquisa e extensão: Uma análise das atividades desenvolvidas no GPAM e suas contribuições para a formação acadêmica. Vitória, novembro de 2011. Base de dados do Scielo. Disponível em: <http://www.prac.ufpb.br/copac/extelar/atividades/discussao/artigos/conceitos_de_ extensao_universitaria.pdf>. Acesso em: 12 out. 2019. TEIXEIRA, L. A.; PASSOS, M. M.; FRIGO, D. A.; MAISTRO, V. I. A.; ARRUDA, S. M. O que professores e alunos perguntam sobre sexualidade? REPPE: Revista do Programa de PósGraduação em Ensino, v. 3, n. 1, p. 110-124, 2019. TINÔCO, R. G.; ARAÚJO, A. C. Cinema & Educação física escolar: estado da (7ª) arte. Pensar a Prática, v. 20, n. 4, p. 835-852, 2017. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 6 67 CAPÍTULO 7 doi LETRAMENTO DIGITAL NO CURSO DE ARTESÃ E BORDADOS: UMA AÇÃO DE ESTÁGIO DENTRO DO PROGRAMA MULHERES MIL DO IFRN Data de aceite: 06/01/2020 Edna Maria da Silva Araújo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte Natal – RN Edícia Mariana de Moura Pereira Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte Natal – RN Diego Silveira Costa Nascimento Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte Natal – RN RESUMO: O presente artigo é um reflexo de um relato de experiência do estágio docente III. Analisa aspectos relacionados às principais influências do ensino da informática básica para as alunas do Projeto Mulheres Mil em relação à inclusão social e ao letramento digital. O Programa Mulheres Mil tem como objetivo qualificar mulheres que estavam à margem da sociedade, trazendo-as de volta para atuar no mercado de trabalho. Esse programa atua na qualificação de mulheres que aprendem além da arte de bordados manual, outros assuntos como: a informática, economia, segurança do trabalho, português, matemática financeira entres outros assuntos que certamente serão de grande relevância para a vida pessoal e, principalmente, profissional dessas mulheres. PALAVRAS-CHAVE: Programa Mulheres Mil; Formação docente; Letramento o Digital. DIGITAL LETTERING IN THE CRAFTSMAN AND EMBROIDERY COURSE: A INTERNSHIP ACTION IN THE MULHERES MIL IFRN PROGRAM ABSTRACT: This article is a reflection of an experience of teaching internship III that analyzes related aspects as the main influences of the basic informatics teaching for the Mulheres Mil Project students in relation to the digital literacy. The Mulheres Mil Program aims to qualify women who were on the fringes of the society brought - how to return to work in the labor market. This program works on the qualification of women who have learned beyond the embroidered art manual, other subjects such as: computer science, economics, job security, Portuguese, financial mathematics, entries, other subjects that will certainly have great relevance for personal and especially professional life of these women. KEYWORDS: Mulheres Mil Program; Teacher training; Digital Literacy. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 7 68 1 | INTRODUÇÃO O presente artigo busca tratar primeiramente com autores que explicam o conceito e a importância da inclusão digital e do letramento digital para alunas do Projeto Mulheres Mil. Já na segunda parte do artigo será feito as análises do questionário e da avaliação feita na plataforma Kahoot que foram aplicados em sala de aula, que permitirá verificar as implicações que resultam dessas análises em relação ao letramento digital do programa Mulheres Mil. A partir disso a pesquisa bibliográfica terá um papel de ampliar o conhecimento e as dificuldades sobre o tema a ser analisado. A análise das influências do ensino da informática básica para as alunas será de extrema relevância para diminuir as barreiras existentes da desigualdade social, pois a partir das dificuldades encontradas nessa experiência de estágio atrelada a uma ação de estado do projeto Mulheres Mil foi possível verificar como é feita a inclusão digital desse programa. Assim se faz necessário primeiramente entender o conceito de Inclusão Digital para uma melhor compreensão do tema: É importante observar também que o modelo econômico vigente se utiliza de vários artifícios para fazer suas vítimas, e nesse contexto, a informatização, é utilizada, genericamente, como fortíssimo meio de exclusão. Desta forma, a inclusão digital torna-se uma ferramenta, também, de inclusão social. Neste cenário, o computador deve ser visto como um amigo e não somente como um desafio que não será enfrentado (WEIDEN, 2005). Para De Luca em seu livro O que é Inclusão Digital? Cita: “a inclusão digital deve favorecer a apropriação da tecnologia de forma consciente, que torne o indivíduo capaz de decidir quando, como e para que utilizá-la”. Diz, também, que doar computadores, periféricos e recursos financeiros, prover a conectividade e encorajar o voluntariado interno são apenas algumas formas de promover a inclusão digital como ação de responsabilidade social. Incentivar a produção e a troca de conhecimento nas comunidades localizadas na área de entorno da empresa; fornece dicas profissionais, compartilhar experiências, elaborar projetos em conjunto; incentivar e influenciar a busca de auto sustentabilidade das comunidades; incentivar o empreendedorismo e fornecer apoio tecnológico também são, hoje, valiosas ações corporativas que contribuem para a prática de responsabilidade social, favorecendo a inclusão digital e, consequentemente, a social (p.10) (DE LUCA,CRUZ, 2004). E Cruz, na mesma obra, acrescenta que: para ser incluído digitalmente, não basta ter acesso a micros conectados à Internet. Também é preciso estar preparado para usar estas máquinas, não somente com capacitação em informática, mas com uma preparação educacional que permita usufruir de seus recursos de maneira plena (P. 13) (DE LUCA, CRUZ, 2004). Assim com base na definição de inclusão digital tem-se que entender também A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 7 69 o conceito de letramento digital que está intrinsecamente interligado com a inclusão social. Pois assim é possível compreender que o curso de informática básica do IFRN não só proporciona noções de conhecimento básicos de informática mas vai muito além, tendo em vista que proporciona uma capacitação eficaz no que diz respeito às ferramentas de informática básica utilizadas e ao letramento digital das alunas desse programa. Pois a definição de letramento digital segundo Buzato (2003) é: "o conjunto de conhecimentos que permite às pessoas participarem nas práticas letradas mediadas por computadores e outros dispositivos eletrônicos no mundo contemporâneo". Para Xavier (2002, p.2) “ser letrado digital pressupõe assumir mudanças nos modos de ler e escrever os códigos e sinais verbais e não verbais, como imagens e desenhos, se compararmos às formas de leitura e escrita feitas no livro, até porque o suporte sobre o qual estão os textos digitais é a tela, também digital”. Assim pode se entender que o letramento digital vai muito além de um conhecimento técnico pois a pessoa letrada digitalmente desenvolver habilidades de pesquisa, aprender a entender quais conteúdos são realmente úteis para si. Começa também a utilizar os recurso que estão disponivel no mundo digital a seu favor, além de ter um olhar mais atento criticamente as informações digitais e as ferramentas tecnológicas que surgem todos os dias nesse mundo de informações aceleradas. Assim o próximo autor confirma esse entendimento. O letramento digital segundo Carmo (2003) são: “habilidades para construir sentido a partir de textos multimodais, isto é, textos que mesclam palavras, elementos pictóricos e sonoros numa mesma superfície. Inclui também a capacidade para localizar, filtrar e avaliar criticamente informações disponibilizadas eletronicamente” Já a segunda parte da pesquisa foi voltada para o levantamento dos dados que foram colhidos na avaliação da plataforma Kahoot e de um questionário composto de questões de múltiplas escolhas e questões abertas. Ambos foram aplicados as alunas dos projetos a fim de inferir quais são as principais influências do uso da informática básica para promover o letramento digital dessas mulheres no programa. Assim o programa denominado Mulheres Mil ofertado pelo IFRN campus Natal - Zona Norte tem como objetivo não só a introdução de noções de informática, mas promove o letramento digital dessas mulheres. Através de metodologias de ensino e aprendizagem que permitem a esse grupo de mulheres inclusão digital não apenas dos conceitos do funcionamento do computador, mas vai muito além pois apresentam ferramentas que auxiliam na divulgação de seu trabalho, orientações de segurança sobre os benefícios e malefícios do uso da internet e redes sociais.Tudo isso são forma de incluir socialmente essa mulheres. Logo esse curso de informática básica além de promover o letramento digital das alunas promove também a experiência da prática educativa realizada por alunos de licenciaturas em informática no programa A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 7 70 Mulheres Mil. 2 | DESENVOLVIMENTO A metodologia adotada neste trabalho é qualitativa, de natureza aplicada com os objetivos descritivo e exploratório do problema, utilizando de questionário, como forma de procedimento técnico. As atividades que foram desenvolvidas ao longo do estágio serviram como embasamento para este artigo. Foram realizadas as seguintes atividades: a) Apresentação dos estagiários as alunas da turma de bordados do programa Mulheres Mil pelo professor responsável pela disciplina; b) As práticas educativas foram realizadas no laboratório de ensino superiores, onde as alunas tiveram noções não só de informática básica pelos dez voluntários do curso de licenciatura em informática mas foi promovido letramento digital dessas alunas; c) Na última aula foi realizado uma avaliação online pela plataforma Kahoot e foi aplicado um questionário para saber o que as alunas acharam do curso e darem sugestões de aprimoramento da disciplina; e d) Após as dez aulas realizadas no programa foi feito um relatório descrevendo os principais acontecimentos em sala de aula que visa dar suporte aos estagiários na formação docente na elaboração do relatório. 2.1 Dados gerais do estágio O presente artigo relata uma síntese parcial das atividades realizadas no estágio III no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte do Campus Natal - Zona Norte que está localizado em área urbana na: Rua Brusque, 2926, Conj. Santa Catarina, Bairro Potengi, Natal/RN. No relatório do estágio docente III foram apresentados os resultados e documentação relativos às ações realizadas no estágio curricular obrigatório de docência, realizado no curso de Licenciatura em Informática. O estágio III foi executado por um grupo de 09 alunos, com objetivo de ministrar aulas e aprender na prática a rotina do professor. As aulas foram realizadas no Instituto Federal mais precisamente no laboratório de informática dos cursos superiores à uma turma de mulheres, participantes do projeto Mulheres Mil. Realizado no primeiro semestre do ano de dois mil e dezenove, á turma tinha número de 30 (trinta) mulheres, com faixa etária entre 30 a 65 anos. Estas mulheres são de renda econômica baixa que moram na área urbana no entorno do instituto. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 7 71 Dessa maneira, o estágio de docência permitiu ensinar ao grupo de mulheres noções de informática básica proporcionando também o letramento digital, dando uma noção e entendimento do uso das novas tecnologias. Para as aulas, tiveramse uma preocupação de tornar o ambiente de ensino acolhedor uma vez que os assuntos ensinados eram tirados do seu dia-a-dia para tornar algo mais semelhante a rotina de bordadeiras, para assim, usar a tecnologia a favor de sua profissão. O processo de ensinar durante o estágio tinha estratégia de um aluno de licenciatura ensinasse os conteúdos, e a cada aula revezavam, e os outros oitos davam apoio no manuseio do computador e elucidavam as dúvidas que aparecia durante as aulas. Sendo assim, o estágio III possibilitou a descrição das primeiras impressões sobre a relação de aluno e professor em sala de aula e as suas implicações e contribuições para vida profissional dos futuros professores e das alunas do programa Mulheres Mil. 2.2 Atividades práticas desenvolvidas 28/03 - Na primeira aula, fizemos a apresentação da disciplina, utilizando as informações contidas na ementa para orientar as alunas no tocante ao conteúdo ministrado nas aulas. Além disso, iniciamos com os comandos básicos de ligar e desligar o computador, observando a desenvoltura da turma com relação ao conhecimento desses comandos. Por fim, orientamos as alunas sobre como fazer o login nas máquinas, enfatizando a importância desse comando para as aulas posteriores. 04/04 - Na segunda aula foi apresentado os periféricos do computador, classificando-os em periféricos de entrada e saída, bem como, os periféricos que fazem as duas funções. Em seguida, iniciou-se as orientações sobre os comandos básicos de gerenciamento de arquivos (copiar, colar, recortar e renomear). 11/04 - Na terceira aula, abordamos de forma mais aprofundada os comandos de gerenciamento de arquivos, criação de pastas e subpastas, organização de arquivos e diretórios. Reforçamos os conceitos abordados na aula anterior com o intuito de recapitular e reforçar o aprendizado para dar continuidade às atividades em questão. 18/04 - Na quarta aula, iniciamos com o editor de texto. Apresentamos algumas versões dessa ferramenta, sua aplicabilidade e suas funções básicas (copiar, colar, utilizar letras maiúsculas e minúsculas, alterar fonte, alterar tamanho da fonte e alterar a cor da fonte, negrito, itálico e sublinhado). 25/04 - Não houve aula (alunas liberadas devido as fortes chuvas) 02/05 - Na quinta aula continuamos utilizando o editor de texto, revisando o assunto abordado na aula anterior e explanando sobre comandos um pouco A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 7 72 mais avançados de formatação de texto, como gerenciamento de cores, fontes, alinhamento centralizado, à direita, à esquerda e justificado, inserção de tabelas e imagens e divisão do texto em colunas. 09/05 - Na sexta aula apresentamos o conteúdo internet, explanando conceitos que vão desde a de sua origem até a sua utilização nos dias de hoje. Além disso, foram apresentados vários navegadores diferentes, outros utilitários de internet. 16/05 - Na sétima aula continuamos com o conteúdo internet. Abordamos os conceitos de e-mail (endereço eletrônico) e de sua utilização como identificador pessoal na internet. Por fim, realizamos a criação de contas daquelas que ainda não possuíam uma. 23/05 - Na oitava aula, finalizamos o tema internet com a explanação a respeito do YouTube e sites relacionados. Na ocasião, as alunas foram orientadas a criarem um canal no site, com o intuito de divulgar o trabalho feito por elas no curso de bordado. 30/05 - Na penúltima aula, abordamos o tema redes sociais. O surgimento e orientações sobre o uso com segurança das redes sociais, com foco no Facebook, WhatsApp e Instagram. Em seguida, as alunas foram orientadas a criarem uma página própria em seus perfis no Facebook, com o intuito de divulgar as suas marcas e os trabalhos feito com o bordado a mão. 06/06 - Na última aula, iniciamos com uma revisão de todo o conteúdo ministrado nas aulas e, em seguida, fizemos uma dinâmica avaliativa com uma ferramenta online chamada Kahoot. Trata-se de um quiz muito dinâmico que nos permitiu avaliar o quanto os assuntos foram assimilados pelas alunas. As alunas também responderam um questionário sobre curso. 2.3 Experiência negativa e positiva Nessa experiência foi possível relatar alguns pontos negativos como a necessidade de ter mais estagiários para dar auxílio pois a dificuldade e o medo de manusear o mouse é um dos primeiros obstáculos a ser quebrado. Há poucas alunas que realmente não querem aprender seja por medo, seja por achar que não consegue aprender e por até não saber bem ler e escrever suficiente. Essa é uma triste realidade que ainda há pessoas que não sabem ler e nem escrever. Pois ensinado a uma aluna alguns comandos ela confessou que não sabia escrever havendo a necessidade de ditar letra por letra pra que ela pudesse fazer a atividade. Outro ponto negativo é que o projeto tem uma grande diferença de faixa etária pois existem mulheres com maior grau de dificuldade em aprender e outras que já sabem um pouco mais. Assim os alunos que ministram as aulas têm uma maior preocupação com as que não sabem e por consequência as que dominam ficam um pouco ociosas A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 7 73 esperando o próximo assunto. Entre os pontos positivos dessa experiência pode se relatar a possibilidade do estagiário atuar como docente e sentir a realidade diária do professor, pois para ministrar uma aula tem todo um preparo por trás, desde a escolha do tema a forma como o conteúdo vai ser passado, a elaboração do slides e a melhor forma do assunto ser distribuído para que as alunas do programa Mulheres Mil possam compreendê-lo. Pois é gratificante quando o professor ver nos olhos de algumas alunas a satisfação de ter aprendido algo que para realidade de muitas era algo distante e muitas vezes inatingível. Dessa forma, pode fazer com que elas entendam que nunca é tarde para aprender mesmo que a turma seja mista, com mulheres mais novas e mulheres mais idosas, e isso é mais um ponto positivo para essa experiência. Além do mais, os conceitos de computação são transmitidos por alunos do curso de Licenciatura em Informática, a única disciplina que são lecionada por alunos estagiários, tal condição proporciona aos futuros professores uma experiência que irá agregar em seu currículo, uma vez que, o contato com a alunas de diferentes idades oferece uma experiência de prática educativa de inclusão digital a essas mulheres. 3 | RESULTADOS Neste artigo os resultados são baseados em parâmetros quanto à execução da prática das aulas do estágio pelos graduandos. Isso são parâmetros relacionados às respostas obtidas de um questionário e da avaliação aplicada na plataforma Kahoot . Já no que se refere ao questionário aplicado e respondido após a última aula possibilitou fazer uma tabulação desses dados para uma análise do que o curso de informática básica proporcionou às alunas do programa. Pois as informações coletadas resultaram na comprovação de que curso de informática básica vai muito além dos conceitos iniciais, possibilitando um letramento digital das mulheres. Logo pode-se inferir através dos gráficos os seguintes resultados do questionário. A primeira questão foi aplicada as discentes do programa mulheres que foi indagado qual era o grau de conhecimento de informática antes do curso. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 7 74 Gráfico 01: grau de conhecimento. Como pode-se verificar através da análise do Gráfico 01, que a maioria das alunas consideram ter um grau de conhecimento ruim antes do curso correspondendo 42%. Já a minoria correspondente a 11% diz ter grau de conhecimento bom e 21% e 26% diz ter um grau de conhecimento regular e ótimo respectivamente. De acordo com resultado do gráfico da segunda pergunta aplicada às alunas do programa mulheres mil. Foi indagado quais os assunto que mais gostaram durante curso. Gráfico 02: Assuntos que gostaram. Como pode-se verificar através da análise do Gráfico 02 tanto a pesquisa quanto internet tiveram 37% preferência cada. Já 16% diz gostar de ter estudados redes sociais, os assuntos de Powerpoint e Word tiverem igualmente 5% de preferências A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 7 75 das alunas. já a respeito do resultado do gráfico da terceira pergunta aplicada às alunas do programa mulheres mil. Foi questionado, como as alunas avaliam a forma de ensinar dos tutores. Gráfico 03: Avaliação da forma ensino dos tutores. Como pode-se verificar através da análise do Gráfico 03 que 89% dos estudantes acharam ótima a metodologia de ensino dos tutores. Já 11% classificam com bom a forma de ensino dos tutores. Conforme o resultado do gráfico da quarta pergunta aplicada às alunas do programa mulheres mil. Foi questionado as alunas se os assuntos abordados foram de relevância para o aprendizado. Gráfico 04: Relevância dos Assuntos. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 7 76 Segundo dados obtidos pelo Gráfico 04, pode-se perceber que 100% das alunas concordam que os assuntos abordados foram relevantes para o aprendizado possibilitando uma formação dessas mulheres em relação ao letramento digital. Ainda a respeito do resultado do gráfico da quinta questão aplicada às alunas do programa Mulheres Mil. Foi indagado como as alunas classificam o curso de informática básica. Gráfico 05:Classificação do curso. A partir do Gráfico 05 depreende-se que cerca de 68%, diz classificar o curso de informática básica como ótimo e 32% classificam como bom. Ainda a respeito do resultado do gráfico da sexta pergunta aplicada às alunas do programa Mulheres Mil. Foi questionado se o horário de aula uma vez por semana é o ideal para o curso de informática básica. Gráfico 06: Horário de aula. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 7 77 De acordo com Gráfico 06, depreende-se que as alunas preferem ter mais aulas por semana pois 68% não concordam com um horário de uma vez por semana. Já 32% diz que é ideal o horário de aula uma vez por semana. Ainda a respeito do resultado do gráfico da sétima pergunta do questionário aplicado às alunas do programa mulheres mil. Foi questionado como elas classificaram o grau de conhecimento de informática obtido depois do curso. Gráfico 07:Classificação do conhecimento obtido. Pode inferir-se que através da análise do Gráfico 07 a maioria das alunas passaram a consideram como bom seu grau de conhecimento acerca 49%. Pois quando é feita uma comparação com gráfico 01 verifica-se que 42% das mulheres consideravam seu grau de conhecimento como ruim antes do curso, confirmando assim que depois do curso elas além de adquirirem um conhecimento de informática básica também houve um letramento digital dessas mulheres no programa Mulheres Mil. Continuando a análise do gráfico 07, depreende-se que nenhuma das mulheres consideram mais ter grau de conhecimento ruim. Tendo em vista que houve uma variação positiva do grau de grau de conhecimento depois do curso 26% regular, 26% também para ótimo. Já a respeito do resultado do gráfico da oitava pergunta aplicada às alunas do programa Mulheres Mil. Foi questionado se elas faziam uso de computadores no seu dia a dia. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 7 78 Gráfico 08: Uso de computadores. Conforme o Gráfico 08 infere-se que a maioria das alunas, cerca de 89%, não utilizam de computadores no dia a dia. Apenas 11% faz uso de computadores. De acordo com o resultado do gráfico da nona pergunta aplicada às alunas do programa Mulheres Mil. Foi indagado qual as sugestões das alunas para melhoria do curso de informática básica. Gráfico 09: Sugestões. Conforme o Gráfico 09 infere-se que cerca 42% sugeriram ter aulas duas vezes por semana pois assim teria um menor espaço de tempo entre uma aula e outra durante a semana, além de um contato maior com os tutores. Já 11% acreditam que seria ideal que as aulas se iniciaram nos primeiros horários da tarde, e 47% das A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 7 79 alunas não opinaram. Em relação avaliação que foi aplicada na última aula, usando a plataforma online Kahoot, foi possível inferir a percentagem da assimilação dos conteúdos pelas alunas de acordo com classificação das médias das notas obtidas nas respostas das alunas. Gráfico 10: Assimilação dos Conteúdos. Conforme o Gráfico 10 infere-se que 78% das alunas conseguiram obter nota acima da média (que corresponde 6 pontos) refletindo um dado positivo em relação a assimilação dos conteúdos e consequentemente na qualificação profissional relacionada ao letramento digital dessas mulheres. Já 17% obtiveram nota na média e apenas 4% da turma obteve nota abaixo da média. 4 | CONSIDERAÇÕES FINAIS Como afirmado no começo da pesquisa os resultados e discussões da presente trabalho, relata as experiências do projeto Mulheres Mil. Na verdade estas vivências ultrapassam os viés acadêmicos pois ao longo do curso podemos ter contato com suas vivência, histórias de vida. Uma vez que, este projeto proporcionou não apenas um momento de preparação para o mercado de trabalho e seu potencial profissional, mas também tiveram um momento de interação e crescimento como humano e pessoa. Referindo-se ao viés acadêmico é possível considerar que a realização do projeto Mulheres Mil foi gratificante e produtivo para todos os lados, tanto para as alunas, com a perspectiva de letramento digital e inserção á um mundo tecnológico que elas passaram ter um contato maior através do projeto, que foi realizado para A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 7 80 servir como instrumento e estímulo do uso das novas mídias sociais. E certamente, foi gratificante para os estagiário do curso de Licenciatura em Informática que mesmo com as dificuldades encontradas, enfrentou e as tornou como aprendizado e crescimento dentro de sala de aula. Além disso, os estagiários iniciaram sua carreira docente com proposta de interação e comunicação entre aluno e professor, fortalecendo sua postura dentro e fora de sala de aula. Conclui-se que, através da execução do projeto e análises resultados satisfatório do projeto mulheres mil foi possível comprovar as ideias discutidas no artigo. REFERÊNCIAS LÉVY, Pierre. A Emergência do Cyberspace e as Mutações Culturais. Palestra realizada no Festival Usina de Arte e Cultura, promovido pela Prefeitura Municipal de Porto Alegre. Outubro de 1994. Tradução Suely Rolnik. Revisão da tradução transcrita João Batista Francisco e Carmem Oliveira. 1994. Disponível em: <http://caosmose.net/pierrelevy/aemergen.html> Acesso em: 14 dez. 2015. MORAN, José Manuel; MASETTO, Marcos T.; BEHRENS, Marilda Aparecida. Novas tecnologias e mediação pedagógica. Campinas: Papirus, 2000. _______ . Os novos espaços de atuação do educador com as tecnologias anais 12º EDIPE, Curitiba, 2004. MORAN, J. M. A educação que desejamos: Novos desafios e como chegar lá. São Paulo: Papirus, 2007. COSCARELLI, C. V.; RIBEIRO, A. E. (Orgs.)Letramento digital: aspectos sociais e possibilidades pedagógicas. Belo Horizonte:Autêntica, 2011. CARMO, Josué G. Botura. O letramento digital e a inclusão social. Disponível em: http://paginas. terra.com.br/educacao/josue/ Acesso em: 27 jun 2011. http://www.educacaoliteratura.com.br/index%2092.htm BUZATO, Marcelo E. K. Letramento digital abre portas para o conhecimento. EducaRede. Entrevista por Olivia Rangel Joffily. 23/01/2003 <www.educarede.org.br> A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 7 81 CAPÍTULO 8 doi LETRAMENTO NO ENSINO FUNDAMENTAL II: DA LEITURA EXTRACLASSE À PRODUÇÃO TEXTUAL Data de aceite: 06/01/2020 Adriana Ferreira de Souza (UNEB-Campus II/Alagoinhas-BA) RESUMO: O artigo trata de um relato de experiência pedagógica sobre um projeto de leitura extraclasse e produção textual, da disciplina de Português, no 8º ano matutino, desenvolvido na Escola Municipal Dr. Jairo Azi, em Riacho da Guia, distrito de Alagoinhas, Bahia. O presente texto tem por objetivo refletir sobre o ensino de português, no que concerne à aquisição de habilidades de leitura e escrita no Ensino Fundamenta II. Para tanto, apresentamos as linhas gerais da proposta de trabalho e o desenvolvimento da mesma em sala de aula. As atividades de leitura extraclasse e produção textual do projeto da disciplina de português buscam principalmente recuperar o prazer pela leitura e, consequentemente, desenvolver habilidades de leitura e escrita. O projeto tem por base a metodologia qualitantiva, fundamentando-se em autores que abordam esse tema: Freire, Geraldi, Zilberman, Koch, entre outros. Até o momento, os resultados obtidos mostram um aumento na quantidade de livros lidos pelos alunos, com suas respectivas produções escritas com base nos livros lidos. Assim, concluímos que os alunos podem desenvolver a competência de leitura e escrita que o auxiliará a ser um sujeito ativo do ato de ler e escrever. PALAVRAS-CHAVE: Competência de leitura e escrita; Leitura extraclasse; Produção textual; Sujeito ativo. LITERACY IN ELEMENTARY EDUCATION II: FROM EXTRA READING TO TEXTUAL PRODUCTION ABSTRACT: The article deals with a pedagogical experience report about a project of extraclass reading and textual production, of the Portuguese discipline, in the 8th morning, developed at Dr. Jairo Azi Municipal School, in Riacho da Guia, Alagoinhas district, Bahia. This text aims to reflect on the teaching of Portuguese, with regard to the acquisition of reading and writing skills in Elementary School II. Therefore, we present the general lines of the work proposal and its development in the classroom. The activities of extraclass reading and textual production of the project of the Portuguese discipline seek mainly to recover the pleasure of reading and, consequently, to develop reading and writing skills. The project is based on qualitative methodology, based on authors addressing this theme: Freire, Geraldi, Zilberman, Koch, among others. So far, the results obtained show an increase in the number A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 8 82 of books read by students, with their respective productions written based on the books read. Thus, we conclude that students can develop reading and writing skills that will help them to be an active subject of reading and writing. KEYWORDS: Reading and writing skills; Extra class reading; Text production; Active subject. 1 | INTRODUÇÃO Muitos linguistas questionam sobre o que é ensinar português, uma vez que os alunos já dominam a língua materna necessária para se expressarem e interagirem com os seus interlocutores. O que seria necessário ensinar: Gramática? Literatura? Expressão oral e escrita? São muitos os questionamentos que envolvem o ensino de português. Com base nesse contexto, há professores que buscam um trabalho de integração entre a prática de leitura e a produção de texto. Dessa forma, por meio da leitura, a escola pressupõe que o aluno pode ter cada vez mais contato com a língua escrita, aumentando seu repertório com relação as formas padrão que deseja que ele aprenda (PONTY, 1999). Assim, a escola não ensina o aluno a ler e produzir textos. São feitos exercícios de interpretação e análise de textos e a produzir redações. O que significa que há simulações de leituras e do uso da língua escrita (GERALDI, 1999). No entanto, a leitura não deve ser uma decifração do sentido de um texto, ela deve partir da leitura de mundo para a leitura da palavra, o que possibilita uma compreensão crítica e interpretação do texto, finalizando em sua recriação (FREIRE, 2011). A utilização do código da escrita não serve apenas para produzir textos, mas para entendê-los a partir das experiências, do conhecimento e da visão de mundo do aluno (KOCH, 2002). Leitura e escrita estão vinculadas e sua prática se dá no ambiente escolar (ZILBERMAN, 2009). Para Barbosa e Rovai (2012), “a leitura não é um hábito, uma ação que repetimos irrefletida e automatizamente. A leitura é uma prática social refletida, sentida, fruída, que precisa ser internalizada e fazer sentido”. (BARBOSA; ROVAI, 2012, p. 51), mas a resistência do aluno à leitura irá depender das experiências significativas ou das dificuldades de compreensão que o aluno tiver com ela. Para isso, a prática de leitura deve levar em consideração os interesses dos alunos, desde as obras que valorizam a cultura local, assim como obras contemporâneas, incluindo os clássicos, que podem ser selecionados pelos próprios alunos de acordo com suas expectativas. Além disso, o professor continuará exercendo a tarefa de mediador de leitura, ensinando a ler e criando condições de interpretação, “o que passa pelo desenvolvimento de habilidades de leitura, mas também pela oportunização de experiências estéticas significativas que nos A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 8 83 permitam identificação e alteridade, que nos provoquem torcida, raiva, indignação, alegria, que nos façam rir e chorar.” (BARBOSA; ROVAI, 2012, p. 53). Desde de séculos passados, a leitura e a escrita ocupam um lugar relevante na sociedade, cujo domínio dessas habilidades distingue as pessoas entre si. Assim com a crise da leitura e da escrita que gera a crise da escola e vice-versa, as desigualdades sociais se ampliam cada vez mais. Diante desse contexto, é necessário que os profissionais de educação busquem soluções para superar as dificuldades relacionadas ao domínio das habilidades de ler e escrever textos. O presente texto tem por objetivo refletir sobre o ensino de português no que concerne à aquisição de habilidades de leitura e escrita no Ensino Fundamenta II. Para tanto, apresentamos as linhas gerais da proposta de trabalho e o desenvolvimento da mesma em sala de aula. As atividades de leitura extraclasse e produção textual do projeto da disciplina de português buscam principalmente recuperar o prazer pela leitura e, consequentemente, desenvolver habilidades de leitura e escrita. A metodologia é de base qualitantiva, uma vez que parte da análise da atividade de leitura e produção textual, aplicada com as turmas do 8º ano, onde buscamos explicar o andamento da atividade de forma parcial e limitada, pois tornase imprevisível o desenvolvimento da atividade, ao mesmo tempo em que tentamos quantificar, com base na análise de dados, o andamento da mesma entre as duas turmas de 8º ano. A junção da pesquisa qualitativa e quantitativa nos permite ter mais informações do que poderíamos ter se fossem aplicadas separadamente. (GERHARDT, 2009). 2 | LINHAS GERAIS O projeto de atividade de leitura extraclasse e produção textual, se iniciou a partir de leituras que tratam sobre este tema, em especial, com base na leitura do livro “O texto na sala de aula”, de Geraldi (1999), que apresenta sugestões de atividades para o desenvolvimento de habilidades de leitura e escrita em sala de aula. Não é um roteiro a ser seguido, como afirma o próprio autor, apenas serve de base para a orientação da prática pedagógica de profissionais da área de Letras, que podem adaptá-lo, criando seus próprios projetos, levando em conta a realidade de cada um. Foi aplicado na Escola Municipal Dr. Jairo Azi, do ensino fundamental II, em Riacho da Guia, distrito de Alagoinhas, Bahia, com as turmas do 8º ano, do turno matutino. Consiste na leitura de dez livros de narrativas longas (romances, novelas, peças teatrais), que contemplem estilos variados: romances de aventura, policial, amor, drama, entre outros, distribuídas entre as quatro unidades do ano letivo: dois livros na I e IV unidades, três livros na II e III unidades. Os livros utilizados pelos A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 8 84 alunos pertencem em parte à biblioteca da escola, pois a mesma não dispõe de um grande acervo, livros dos próprios alunos, emprestados ou que baixaram na biblioteca virtual, através do celular. Com base na leitura do livro selecionado, o aluno escolhe uma atividade sugerida para a produção textual que, no final do ano letivo, deverá escolher uma das atividades realizadas para apresentar à turma e outra para expor no mural da sala ou da escola. São essas as atividades propostas aos alunos com base na leitura dos livros selecionados para a leitura extraclasse: 1. Escrever uma carta para o autor, falando sobre o livro, questionando as personagens, suas atitudes, pedindo informações sobre a vida dele. 2. Transformar o livro em história em quadrinhas, procurando destacar os aspectos mais importantes, aqueles que merecem mais atenção. 3. Fazer uma colagem (ou desenho, ou pintura...) que recrie trechos decisivos na história. 4. Escolher uma música bem conhecida e fazer uma paródia, recontando a história do livro. 5. Escrever a história em forma de cordel. 6. Selecionar uma música de sucesso que tenha letra relacionada a momentos da história do livro. 7. Fazer a propaganda do livro. 8. Confeccionar a primeira página de jornal, contendo manchetes, texto com ilustração sobre fatos que compõem a história do livro. 9. Criar uma nova versão da história lida. 10. Escrever um poema com base na história do livro lido. 11. Compor uma letra de música (hip-hop, rap, funk) considerando a história do livro. Consta também de um regulamento que os alunos devem seguir para um bom desempenho das tarefas. 1. Primeiramente, os alunos deverão ler, no mínimo, dez livros durante o ano letivo para realizar as atividades propostas, escolhendo uma atividade diferente para cada livro lido. 2. Na quarta unidade, cada aluno escolherá uma atividade realizada para apresentar em sala de aula e outra para expor no mural da sala ou da A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 8 85 escola. 3. As atividades realizadas no caderno pelos alunos e a apresentação da atividade escolhida pelos mesmos em sala de aula serão avaliadas e pontuadas pelo professor. 4. Para isso, os alunos devem escolher narrativas com histórias variadas: histórias românticas, policiais, de aventura, de ficção científica, de suspense de humor, de terror, etc. 5. A seleção dos livros deve ser feita sob a orientação do professor. 6. Devem ler livros, de preferência, que ainda não leram. 3 | RESULTADOS Até o momento, temos como resultados obtidos, a quantidade de livros lidos pelos alunos até a terceira unidade e as produções escritas com base nos romances lidos. No entanto, há alunos que ainda não completaram a leitura dos livros e, consequentemente, não fizeram as respectivas produções. Mas há casos de alunos que já ultrapassaram o mínimo de leitura estabelecida com as produções escritas. Observamos que há uma quantidade significativa de alunos que ficam na “lista de espera” e que pegam mais de um livro para ler simultaneamente, mas isso não ocorre em todas as turmas. A tabela abaixo representa o andamento dessa atividade nas duas turmas de 8º anos A e B, do turno matutino. Esclarecemos que a terceira unidade ainda está em andamento, o que pode alterar os resultados até o encerramento da mesma. Tabela 1: Andamento do projeto nas turmas Com base na tabela acima, podemos observar que a turma do 8 ano A, até o momento, é a que tem o maior número de alunos que já completaram as atividades propostas, onde muitos ultrapassaram a quantidade mínima de romances lidos já na terceira unidade. O mesmo não ocorre com os alunos do 8º ano B, pois os mesmos estão atrasados na leitura e na produção dos textos. Mas se comprometeram em ler A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 8 86 a quantidade mínima de romances estabelecida na unidade, com suas respectivas produções. No início da atividade de leitura extraclassse, muitos alunos se queixaram de suas mães, uma vez que não permitiam que os mesmos lessem os romances quando estavam, alegando que tinham que cumprir com as tarefas domésticas. Diante dessa situação, propomos que conversassem com suas mães ou responsáveis sobre a atividade e, em comum acordo, gerenciassem o seu tempo. Dessa forma, foi possível que os alunos dessem continuidade a atividade, sem deixarem de cumprir suas obrigações domésticas. Além dessas análises, ao conversar com os alunos a respeito da atividade, alguns disseram que passaram a ler mais rápido, compreendendo melhor o que está escrito. 4 | CONCLUSÕES O objetivo dessa atividade não é formar escritores, embora as produções escritas sejam resultados de sugestões de atividades aplicadas no final do exercício de leitura que tem por objetivo auxiliar o aluno a construir adequadamente um texto, de acordo com o gênero textual solicitado. A prioridade está na formação de leitores para que passem a ter um comportamento ativo, criativo, com a capacidade de refletir, de forma crítica, sobre o mundo que o cerca. Com o projeto de leitura extraclasse e produção textual, acreditamos estar contribuindo para o aperfeiçoamento do profissional de Letras que se preocupa em criar condições que levem o educando a desenvolver competências de ler, interpretar e produzir textos, para que o mesmo não seja apenas um receptor de conteúdo, um ser passivo durante as aulas. REFERÊNCIAS BARBOSA, J. P.; ROVAI, C. F. Gêneros do discurso na escola: rediscutindo princípios e práticas. – 1ª ed. – São Paulo: FTD, 2012. FREIRE, P. A importância do ato de ler. Editora Cortez. 51ª edição, vol. 22. GERALDI, J. et al (Org.). O texto na sala de aula. Editora Ática. Coleção na sala de aula. 3ª ed. 1999. GERHARDT, T. E.; TOLFO, D. S. [organizadores] Métodos de pesquisa / coordenado pela Universidade Aberta do Brasil – UAB/UFRGS e pelo Curso de Graduação Tecnológica – Planejamento e Gestão para o Desenvolvimento Rural da SEAD/UFRGS. – Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2009. KOCH, I. G. V. A argumentação e linguagem. Editora Cortez. 8ª edição, 2002. ZILBERMAN R.; ROSING T. M. K. et al (Org.). Escola e leitura: velhas crises, novas alternativas. – São Paulo: Global, 2009. (Coleção Leitura e Formação). A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 8 87 CAPÍTULO 9 doi LIBERDADE DE EXPRESSÃO OU DISCURSO DE ÓDIO: TOLERAR OS INTOLERANTES? Data de aceite: 06/01/2020 Morgana Rodrigues Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC) – Câmpus Xanxerê Xanxerê – Santa Catarina Anna Beatriz Brandelero Giacomini Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC) – Câmpus Xanxerê Xanxerê – Santa Catarina Rodolfo Denk Neto Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC) – Câmpus Xanxerê Xanxerê – Santa Catarina RESUMO: A presente pesquisa tem o objetivo de contextualizar e discutir o entendimento acerca dos conceitos da liberdade de expressão e tolerância. Para tal, foi aplicado um questionário com os alunos do IFSC – Câmpus Xanxerê, baseado na revisão bibliográfica que o precedeu, tendo como eixo central as ideias de Rainer Forst. Após a aplicação do questionário, procedeu-se uma análise qualitativa, sendo que nesta etapa usou-se a análise crítica para se interpretar os conceitos de liberdade de expressão e tolerância. Com isso, foi possível quantificar o nível de tolerância/intolerância no grupo pesquisado e propor um critério de demarcação entre os discursos que são agressivos ou odiosos daqueles que seriam polêmicos e complexos, mas não intoleráveis. Isso somente foi possível verificar após as análises dos resultados obtidos quantitativamente. A importância do levantamento dos dados desta pesquisa mostra a relevância em nossa atual conjuntura social e política de um debate mais aprofundado sobre os conceitos de liberdade de expressão e tolerância, pois com esses conceitos poderemos visar efetivamente a uma formação cidadã para a construção de uma sociedade democrática, justa e, claro, tolerante. PALAVRAS-CHAVE: Liberdade de expressão. Discurso de ódio. Tolerância. Intolerância. FREEDOM OF SPEECH OR HATE SPEECH: TOLERATE THE INTOLERANT? ABSTRACT: This research aims to contextualize and discuss the understanding of the concepts of freedom of speech and tolerance. To this end, a questionnaire was applied with students from IFSC – Câmpus Xanxerê, based on the bibliographic review that preceded it, having as central axis Rainer Forst’s ideas. After the application of the questionnaire, an analysis of the data was first performed and a critical analysis of the concepts directed to freedom of expression and tolerance was done subsequently. Thus, it was possible to quantify A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 9 88 the level of tolerance/intolerance and propose a demarcation standard between the aggressive or odious discourses of those that would be controversial and complex but not intolerable. This was only possible after after analyzing the results obtained. The importance of this research’s data survey shows the relevance of a more in-depth debate about the concepts of freedom of speech and tolerance in our current social and political conjuncture, because with these concepts we can effectively target citizen formation for the construction of an effectively democratic, fair and, of course, tolerant society. KEYWORDS: Freedom of speech. Hate speech. Tolerance. Intolerance. 1 | INTRODUÇÃO A Constituição Federal Brasileira de 1988, em seu parágrafo IX do artigo 5°, estabelece que a liberdade de expressão consiste em um direito fundamental, exercido independentemente de censura ou licença. Entretanto, mesmo que esse direito garanta tal liberdade, ele não se refere à ideia de fornecer uma “licença” na qual todos seriam detentores do direito de praticarem discursos que condizem com tudo aquilo que pensam, isto é, o direito que cada um teria em expressar tudo que lhe convém. Sendo assim, por mais que a liberdade de expressão seja entendida muitas vezes como uma licença para expressar o que se quer, a mesma deve ser compreendida com cautela e prudência, pois dada a garantia de que todos podem efetivamente sem censura ou licença se expressar, isso não lhes dá automaticamente o direito de ofender ou prejudicar alguém pelo fato de que, os que defendem uma concepção libertária, a liberdade de expressão permite tudo. Afinal, a exteriorização de ideias é um “ato de fala” (falar é um ato e consequentemente todo ato é uma ação) e, sendo uma ação, isso pode gerar danos, ou seja, algo que prejudica algo ou alguém. Falar gera consequências factuais que podem ser desastrosas. Você pode pensar o que quiser (liberdade de pensamento), mas não pode falar tudo o que quiser (liberdade de expressão), sendo que este valor não é absoluto, pois uma fala racista ou que faça apologia a morte de determinadas pessoas ou grupo por causa da sua raça, etnia ou religião, gera consequências que podem produzir danos morais e materiais. Percebe-se que há então uma colisão entre a liberdade de expressão e a garantia de determinados direitos, ou seja, são elementos que devem ser considerados na ponderação entre a liberdade de expressão de um lado, e os direitos à honra, à intimidade, à vida privada, imagem e a segurança, de outro. A partir dessa diferenciação, podemos nos colocar a questão dos limites da tolerância: podemos tolerar os intolerantes? Segundo Araújo (2018), a liberdade de expressão “é uma liberdade de espírito, A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 9 89 de intelecto. É liberdade de tornar públicas, de exteriorizar crenças, suposições, juízos, hipóteses e, de modo geral, o pensamento”. A liberdade de expressão é essencial, pois permite o debate e a refutação de ideias equivocadas, a fim de garantir seu progresso. Porém, não é através de ofensas, agressões e discriminações que se constrói uma sociedade democrática, mas sim com a desconstrução dos preconceitos, criando-se assim, uma sociedade equitativa, tolerante e justa. Desta maneira, procurou-se investigar a interrelação entre a liberdade de expressão e a tolerância. Isso ocorre, justamente, pelo motivo de que exteriorizar ideias é um direito individual, mas sua manutenção está diretamente ligada ao interesse coletivo, pois proporciona a maximização de discussões, um dos requisitos para a existência de uma sociedade democrática pluralista que exige responsabilidade, razoabilidade e bom senso. A partir disso, acredita-se, a presente pesquisa visa defender a ideia de que não se pode tolerar os intolerantes. Essa tese parte da ideia de que deve haver um critério de demarcação, utilizado como uma “régua” que separa o que é considerado um discurso intolerante e intolerável de um discurso que seja razoável e tolerante. Para tanto, é necessário defender uma razão prática pública partilhável que possa ser aceita por todos os concernidos, ou seja, por todos que participam do debate público. Quando o debate livre e amplo ocorre, imediatamente as pessoas começam a defender seus próprios interesses individuais e egoístas, e juntamente com eles aparecem algumas ideias e concepções que podemos dizer que se tornam “intolerantes” e “intoleráveis”. Com essas duas categorias, se pode construir a “régua da tolerância”, pois a partir dessa métrica, certas expressões preconceituosas e intolerantes, que se configurariam como discursos de ódio, devem ser reprimidas e ao fim, proibidas. Estes discursos odiosos devem ser proibidos, pois para a construção de uma cultura efetivamente democrática e liberal, fundada na virtude política da tolerância, ou melhor dizendo, na admissão individual de que a diferença do outro acerca de seu pensar seja permitido, é necessário impedir que uma cultura do ódio e do preconceito seja endossada pelo entendimento equivocado do que seja a tolerância. Com isso, os críticos poderiam objetar que a tolerância cairia num paradoxo, pois para ser tolerante, a pessoa que se diz tolerante deve permitir que a intolerância se expresse, ao preço de se tornar ela mesma uma pessoa intolerante. Na próxima seção, buscamos responder a essa objeção. 2 | TOLERÂNCIA COMO CONCEPÇÃO LIBERAL DEMOCRÁTICA Há duas maneiras de perceber o que seja a tolerância. A primeira, seria a concepção que foi proposta pelo filósofo inglês John Locke (1689) e, a segunda, seria a abordagem proposta pelo filósofo francês Voltaire (1763). Assim, temos A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 9 90 na concepção de Voltaire, a tolerância entendida como um conceito que procura garantir efetivamente a pluralidade de ideias e religiões, ou seja, uma concepção tolerante acerca das diferentes religiões, defendendo ainda que as ideias diversas das suas devam ter espaço para serem ditas e vivenciadas por seus seguidores, reconhecendo as diferenças do outro e procurando, dessa forma, internalizar em sua própria estrutura social e pessoal as dissimilitudes do seu contrário (tolerância como coexistência, aproximando-se da estima). Segundo Forst (2013), existem quatro tipos de tolerância historicamente constituídas: a) a tolerância como permissão: sendo a forma mais perniciosa de se entender a tolerância, pois não permite que formas de pensamento distintas da sua possas ser defendidas, pois a permissão dada é estritamente controlada; b) tolerância como coexistência: como o próprio conceito apresenta, deixa-se que as culturas e ideias minoritárias coexistam mutuamente dentro de uma estrutura já definida e hierarquicamente constituída, sem contudo haver um respeito pelas ideias e culturas distintas da maioria, tornando-se assim uma espécie de modus vivendi, produzindo uma forma de convivência precária e instável; c) tolerância como respeito: essa perspectiva defende a concepção de que todos têm um “direito à justificação”, sendo que isso significa que qualquer ideia ou forma de vida deve ser respeitada dando-lhe o direito de se justificar na esfera pública perante todos, e a partir disso poderemos racionalmente decidir se a demanda é razoável ou não; e finalmente d) tolerância como estima: nesta forma de tolerância devemos reconhecer e estimar todas as formas de vida e cultura, de modo que seríamos irmanados numa forma de monismo multicultural. A ideia que mais nos aproximamos é a concepção de tolerância como respeito. Retornando a concepção da tolerância lockeana, esta ideia defende uma postura de tolerância restrita, na qual qualquer ação que aparente trazer algum malefício deve ser prontamente constrangida. Com isso, pode-se perceber o quão complexas são as repercussões que envolvem a história da tolerância, não apenas no que diz respeito à variante do "medo de Locke", que teme que a tolerância excessiva possa levar à dissolução da vida ético político-moral, mas sim no que diz respeito a uma terceira visão, qual seja, quando ambos os lados de um conflito alegam ter o entendimento correto da tolerância e acusam um ao outro de intolerância, entrando assim, em uma disputa violenta. A tolerância, nesse caso, é ignorada e surgem propostas de uma solução política final para os dissidentes de minhas ideias ou mesmo dos que pensam de forma diversa da minha. Mas isso não é mais tolerar, é eliminar o seu contrário. Nessa perspectiva, do medo de Locke, há somente a mobilização das forças majoritárias contra algo que eu tolero e o início da eliminação e supressão do contraditório, porque é infiel e não confiável. Disso, surge a forma mais básica de tolerância, a permissiva. Mas afinal, tolerar A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 9 91 é aceitar doutrinas opostas às que eu acredito e deixá-las que existam cada uma ao seu próprio modo? O conceito de tolerância pode ainda ser usado, ou outro conceito deveria ser mobilizado para substituí-lo? Caso aceite e entenda as ideias e crenças que estão em disputa, mas que são contrárias as minhas mais profundas e arraigadas crenças, ainda neste caso eu estaria tolerando essas ideias ou seria outra atitude que estou exercitando? Seria a tolerância um conceito estreito demais, devendo em seu lugar lançar mão da ideia do reconhecimento? Para exemplificar essas questões, pense nas disputas pela diversidade sexual, política, religiosa, etc., sendo que essas questões tocam diretamente em algumas ideias centrais que foram trabalhadas por Charles Taylor e outros teóricos, como Axel Honneth e Nancy Fraser, que buscam redefinir e recolocar o debate da tolerância pela ideia mais promissora do reconhecimento, pois não é possível tolerar os grupos historicamente marginalizados, seja em razão da sua orientação sexual, da sua identidade de gênero, da cor da sua pele, da sua origem étnica ou religiosa ou de outros marcadores sociais da diferença, devemos reconhecê-los como pessoas com dignidade. Essas lutas por reconhecimento são hoje parte central da gramática dos conflitos sociais no mundo contemporâneo. No entanto, essa luta identitária ao invés de apaziguar e trazer efetivamente a igualdade e reconhecimento destes grupos subalternizados, acabou por aumentar ainda mais os conflitos e, para alguns, reanimou os movimentos conservadores e reacionários. Isso ocorre justamente porque colocou em destaque as minorias que ganharam muito espaço e voz, possibilitando que suas pautas sociais fossem implementadas. A partir disso, surgiu uma reação curiosa, sendo que os movimentos conservadores e alguns reacionários começaram a ganhar força e destaque, e essa maioria, que é a classe média e média alta das sociedades ocidentais, sentiram-se enganados e perceberam que seus privilégios estavam sendo perdidos, e assim, os que se sentiram ofendidos pelas políticas identitárias, iniciaram uma reação. O discurso reacionário hoje é que as minorias se transformaram em maioria, o que ofende a proporcionalidade do maior para o menor ou do mais importante em relação ao marginal e subalterno. Essa maneira de raciocinar é a maneira dos ressentidos pensarem e lutarem por seus privilégios. Ou seja, a maioria define a pauta, e a minoria aceita, calada e constrangida, sendo que as minorias devem suportar o papel social ao qual foram identificados e relegados. Dessa forma, o ideal de reconhecimento parece ter ficado ainda mais distante e difícil de ser implementado na realidade. Portanto, a perspectiva que defende a tolerância torna-se interessante novamente, pois aparentemente é a mais viável, visto que os indivíduos querem ser diferentes e lutam por isso, e não querem ser iguais, no sentido de haver uma teoria unitária que una todos de maneira a estimarmos os que pensam e vivem diferente de nós. Não sendo possível realizar a máxima bíblica de “amar os seus inimigos”, pelo menos não no sentido da socialização interpessoal A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 9 92 das complexas e contraditórias sociedades contemporâneas, acreditamos ser mais razoável utilizar a ideia da tolerância, porém, não em sua versão permissiva, mas sim baseada no respeito. Mesmo com esse refluxo no ideal do reconhecimento, não seria mais prudente usar o conceito de reconhecimento como substituto da tolerância quando se trata de promover a aceitação racional da diferença de crenças filosóficas, religiosas ou éticas? Essa é a concepção que Charles Taylor defende em seu livro de 1993, “O multiculturalismo e a política do reconhecimento”. A tolerância não é a solução, pois, para Taylor, a mera tolerância não modifica nada na estrutura social. Seria desejável um liberalismo que fosse diferente do modelo atual, capaz de evitar a simples homogeneização da diferença e que seja mais adequado às sociedades multiculturais da atualidade. Numa entrevista, em 2015, para o jornal El País, Taylor afirmou que: [...] a tolerância não é a melhor palavra. Uma democracia não é tolerante, é um regime de direito, algo superior à tolerância. A questão é se somos capazes de manter um verdadeiro regime de direito. Caso contrário, a melhor solução disponível é a tolerância. Mas o objetivo deve ser uma democracia na qual todos tenham o direito de expressar sua opinião, votar como quiser, praticar a religião que aceitar. (TAYLOR, 2015) Para Taylor, somente a busca por reconhecimento possibilitará uma efetiva e real transformação da sociedade na direção de uma sociedade mais justa e igualitária. A questão que fica é: isso é factível, não se exige demais dos indivíduos nessas condições? Trocar a tolerância pelo reconhecimento é esperar demais da humanidade? Acreditar que podemos chegar sempre numa unanimidade não seria ingênuo? Contudo, não queremos cair na visão polarizada ou naquela conhecida metáfora do antropólogo Clifford Geertz de que “não é porque um ambiente cem por cento asséptico seja possível, que iremos realizar cirurgias no esgoto”. Não criticamos o reconhecimento por ser uma postura difícil de ser alcançada ou mesmo que o melhor a se fazer é abandonar essa perspectiva, por ser idealista e utópica. Mas o que se coloca aqui é o problema de estimar modos de vida tão distintos que alguns tornam-se inaceitáveis, pois há concepções de mundo que são divergentes e razoáveis, mas, por outro lado, existem divergentes e não razoáveis, valendo isso igualmente para as esferas filosóficas e religiosas. Perceber que a luta pelo reconhecimento das identidades se choca e produz aquela ideia há muito tempo deixada de lado, o choque de civilizações é não levar a sério que existem razões que não são razoáveis. A luta se trava agora entre duas formas de identidade: uma seria aquilo que podemos definir como as identidades particulares (éticas) e a segunda, seria a busca por uma identidade universal (política): A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 9 93 Uma vez que o ideal republicano do bem comum teria se provado inatingível – ou pior, um engodo, o melhor que teríamos a fazer é investir na defesa ferrenha do (nosso) particularismo. Essa dicotomia caminha a par com outra, igualmente cara à política identitária: dado que toda afirmação com pretensão à validade universal esconde uma vontade de poder imperialista e subjugante, só nos restaria a defesa intransigente de nossos próprios pontos de vista. (ENGELKE, 2017) Usamos intencionalmente a ideia de identidade, pois seja na sua vertente individualista, seja em sua versão universalizante, sempre se acaba por produzir uma identidade. O exemplo é a identidade nacional, como sendo a identidade cidadã democrática daquele país ou a defesa de um grupo minoritário que deve ser reconhecido. Uma possibilidade para tentar mediar e justificar uma saída a esse impasse, seria colocar a discussão em outro nível. A razão prática, quando chamada a se pronunciar nesse caso, pode nos fornecer uma saída a esse aparente dilema, pois o que ocorre é algo parecido com a diferenciação entre moral e política. Deixada a razão funcionar de forma linear, ela imediatamente vai buscar categorizar e colocar uma sobre a outra, de modo verticalizado. Temos que superar essa forma de razão teórica e levá-la a ser coproduzida tanto pela razão teórica quanto prática. Neste caso, a moral e a política são cooriginárias e interdependentes, pois a moral sem política é uma ficção e política sem moral é opressão tirânica. A partir disso, podemos nos fazer o seguinte questionamento: há tolerância somente dentro de uma democracia? Obviamente a resposta será negativa, pois há “tolerância” fora dos regimes democráticos, basta pensar em estados não democráticos que tem alguma forma de tolerância. Obviamente, não do modo como procuramos defender. Para citar um exemplo, reflita sobre como alguns Estados islâmicos, moderados, toleram que algumas mulheres possam ter o direito de dirigir. Os homens e a sociedade como um todo toleram isso, desde que não seja excessivo. O caso mais emblemático dos últimos anos foi o caso da Arábia Saudita, o qual permitiu que as mulheres pudessem ter o direito de dirigir automóveis e ir aos estádios de futebol. Esses seriam, pois, exemplos de tolerância fora da democracia. Temos ainda casos de sociedades que toleram a violência, como por exemplo a sociedade brasileira e norte americana. Tanto o Brasil como os Estados Unidos, toleram a violência, tanto que na esfera política, desde 2016, nos EUA, com as ideias e discursos de Donald Trump, e no Brasil, desde 2018, principalmente com o surgimento de “novas” figuras políticas, as quais têm um discurso com aberto elogio à violência e ao endurecimento de práticas e costumes. Aqui temos uma linha tênue entre o que se tolera e o que é tolerável. A partir dessa constatação, temos que demarcar a linha onde podemos falar da tolerância e qualificar afinal o que se está dizendo quando se usa este conceito. Teremos que, ao fim e ao cabo, traçar uma linha entre aquilo que pode ser efetivamente uma prática e exercício da tolerância e aquilo que excede isso e deve ser de alguma forma recolocado e esclarecido no A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 9 94 debate público. Para exemplificar com um problema prático, podemos pensar nos limites do que definimos como tolerável e o que é intolerável. Temos a seguinte situação, conhecida como o fenômeno do “efeito silenciador.” Grosso modo, a suposta defesa da liberdade de expressão em sua forma absoluta, acaba com a liberdade de expressão. Por exemplo, em nome de poder dizer tudo, de pregar o ódio contra uma minoria, extingo a possibilidade de que essa minoria tenha acesso a um lugar de fala, pois ela é sistematicamente atacada e ao fim, silenciada ou em caso limite, extinta. Nesse contexto, um transexual ou um indígena terão dificuldade em ter acesso a um cargo público, pois a sociedade em que ele se insere não permite que ele se expresse ou que consiga as mesmas condições e oportunidades, pois é estigmatizado e, portanto, acaba por ter a sua igual liberdade reduzida ou mesmo negada e suas chances reduzem-se drasticamente ou mesmo se extinguem pela diferença gritante do que lhe é oportunizado. A delimitação da concepção da tolerância deve ser definida como uma questão política, e não ética. Tendo como pressuposto que estamos imersos em um Estado democrático, é necessário posicionar-se através de uma ordem prática, que é intrínseca a qualquer forma de democracia. Para tal tarefa, o princípio da justificação não precisa utilizar nem da ideia de valores nem da verdade. A validade da concepção de tolerância se dá intersubjetivamente dentro de uma esfera política democrática. Para evitar essa compreensão hierárquica e contraditória do "estado de tolerância", parece mais sensato entender o "imperativo da tolerância" como sendo endereçado exclusivamente para os cidadãos, enquanto um "imperativo de neutralidade" que deve ser dirigido ao Estado. Finalmente, essa neutralidade deve ser entendida não de tal maneira que o Estado, em todas as suas decisões, deve buscar a 'neutralidade de efeitos' em todos os indivíduos e grupos possivelmente afetados, o que seria impossível, mas tal 'neutralidade de justificativa' é necessário no sentido de que apenas razões reciprocamente e geralmente aceitáveis, e não avaliações éticas controversas, podem ser o fundamento de normas gerais. (FORST, 2013, p. 519-520) Assim, a atitude de tolerância, de acordo com a concepção de respeito, exige que cada um de nós possa pedir e oferecer razões e justificativas para as normas que podemos ou não compartilhar moralmente e politicamente. Nós chamamos isso de capacidade de reconhecer razões adequadas no uso político teórico e prático, e descobri-los conjuntamente na razão do discurso. Portanto, a tolerância, entendida corretamente, é uma virtude do uso público da razão. Esta capacidade, juntamente com o senso de justiça dentro de uma compreensão do que pode ser justificado para os outros como iguais, é indispensável. Isso implica trabalho discursivo, porque o que não é generalizável, não pode, por regra geral, ser determinado a priori, tornando necessária a tolerância. Esse fato pressupõe a integração em uma comunidade A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 9 95 discursiva na qual há pelo menos tanto em comum que até mesmo uma crítica das estratégias discursivas dominantes e vocabulários em uma linguagem comum tornase possível. Essa base comum de respeito mútuo é indispensável em uma sociedade democrática tolerante, visando à justiça política (FORST; BROWN, 2015). 3 | DELIMITAÇÃO DA TOLERÂNCIA NA DEMOCRACIA A tolerância refere-se ao ato de agir com respeito perante opiniões ou comportamentos idiossincráticos. Desta forma, se pensada em conjunto com o conceito de democracia e de justiça política, tem, indubitavelmente, um papel multifacetado e de uma importância imensa no contexto das sociedades democráticas modernas. Estas que, de acordo com a ONU, promovem um ambiente favorável à proteção e realização efetiva dos direitos humanos, pois pressupõe uma sociedade política pluralista que não se rompe em meio a conflitos decorrentes de visões de mundo diferentes (BRUM, 2011), nas quais os cidadãos se confrontam continuamente em busca de conciliar suas reivindicações (WERLE, 2012). Nesse âmbito, o conceito de tolerância, para ganhar uma configuração e conteúdo, é normativamente dependente da ideia de democracia (FORST, 2018). Esta que se liga principalmente à ideia de justiça, para que assim, a democracia seja instituída de maneira justificável a todos, reciprocamente. Isto é, justiça e democracia liberal andando lado a lado resultam na tolerância. Em vista disso, a busca pelos limites da tolerância dar-se-á por meio de procedimentos democráticos deliberados pelos próprios cidadãos, não como uma prática essencialmente teórica, mas sim, por meio de ações praticadas conforme razões aceitáveis por todos os cidadãos, uma prática discursiva, fundadas nos atos de fala. Sendo assim, é imprescindível notar que esse conceito normativo da tolerância, estabelece o principal motivo de lutarmos por uma tolerância justa: o de sermos tratados corretamente e reconhecidos como sujeitos ético-morais. Sujeitos, que também oferecem e exigem razões para serem tolerados, além de acreditarem na necessidade e também na possibilidade de justiça (FORST, 2018) apesar da permanência de divergências profundas de opiniões ou comportamentos. 4 | METODOLOGIA Para obtenção dos resultados acerca da pesquisa, a metodologia empregada foi a bibliográfica e documental, ligada a análise qualitativa, além da perspectiva quantitativa, através da aplicação de um questionário semiestruturado. A análise bibliográfica focou nas ideias e pressupostos teóricos que apresentaram significativa A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 9 96 importância na definição e construção dos conceitos discutidos na problemática da pesquisa, utilizando-se de referenciais digitais, bem como de revistas científicas, livros e artigos. Em relação a parte quantitativa, esta foi feita por meio da elaboração e aplicação de um questionário que foi posteriormente analisado estatisticamente, buscando descrever o entendimento dos inquiridos sobre liberdade de expressão e discurso de ódio. Os resultados da pesquisa promoveram uma melhor interpretação e entendimento de como são e foram construídos os conceitos de tolerância, intolerância, democracia e liberdade de expressão. 5 | RESULTADOS E DISCUSSÕES Foi realizado um questionário envolvendo 222 alunos do Ensino Médio Integrado no IFSC – Câmpus Xanxerê, com foco na análise das opiniões acerca do tema proposto. Com base nos dados levantados, 93,7% dos participantes percebem no Brasil atual um cenário marcado pela intolerância em relação ao outro. Ademais, 63,5% acreditam que o relativismo não é um pré-requisito para a manutenção da tolerância, ou seja, tolerar não é sinônimo de manter uma postura passiva e omissa. Isso pode ser observado na Figura 1 e Figura 2. Figura 1 Cenário de intolerância brasileiro. Fonte: Autoria própria (2019). Figura 2 Tolerância não pressupõe relativismo. Fonte: Autoria própria (2019). Essas estatísticas concordam, portanto, com aquilo que a pesquisa busca defender: não se pode tolerar os intolerantes, justamente pelo fato de que defender ideias que levam a eliminação de um grupo (discurso de ódio) levaria a um ciclo de violência, não possibilitando a construção de uma sociedade tolerante e razoável, logo, decente. Essa questão pode ser entendida como um paradoxo, ou seja, uma declaração aparentemente verdadeira, mas que nos leva a uma contradição lógica. A tolerância A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 9 97 deve ou não tolerar a intolerância? Neste contexto, Karl Popper publicou a obra de filosofia política “The Open Society and Its Enemies” (“A Sociedade Aberta e Seus Inimigos”) em 1945 que, apresenta um pensamento semelhante por meio da ideia de que, no meio social, o desaparecimento da tolerância é decorrente, paradoxalmente, de uma tolerância ilimitada. Assim, para que uma sociedade exerça a autodefesa frente a ameaças intolerantes, é indispensável que seja aberta e tolerante, no entanto, deve preservar, em nome da tolerância, a intransigência para com a intolerância: Tolerância ilimitada leva ao desaparecimento da tolerância. Se estendermos ilimitada tolerância mesmo aos intolerantes, se não estivermos preparados para defender a sociedade tolerante do assalto da intolerância, então, os tolerantes serão destruídos e a tolerância, com eles. — Nessa formulação, não insinuo, por exemplo, que devamos sempre suprimir a expressão de filosofias intolerantes; desde que possamos combatê-las com argumentos racionais e mantê-las em cheque frente a opinião pública, suprimi-las seria, certamente, imprudente. Mas devemos nos reservar o direito de suprimi-las, se necessário, mesmo que pela força; pode ser que eles não estejam preparados para nos encontrar nos níveis dos argumentos racionais, mas comecemos por denunciar todos os argumentos; eles podem proibir seus seguidores de ouvir os argumentos racionais, porque são enganadores, e ensiná-los responder argumentos com punhos e pistolas. Devemos, então, nos reservar, em nome da tolerância, o direito de não tolerar o intolerante. (POPPER, 2012). Portanto, defender ideias intolerantes é algo auto-contraditório, moralmente falando, pois levaria essas mesmas ideias a serem perseguidas e ao fim, destruídas. A livre exposição de ideias – desde que as mesmas sejam razoáveis – caracteriza uma sociedade democrática, na qual discussões e posições das mais diversas matrizes teóricas podem ser discutidas e consensuadas. Isso ocorreu rotineiramente durante a pesquisa, tanto por meio da revisão bibliográfica, como das discussões com o orientador e das dúvidas levantadas pelos entrevistados, atendendo, assim, aos objetivos propostos, pois percebe-se que nessas interrelações as mais diversas posições aparecem. 6 | CONSIDERAÇÕES FINAIS Após a realização da pesquisa, os dados obtidos durante o processo de análise promoveram debates com os envolvidos no projeto e tiveram a finalidade de verificar conhecimentos e opiniões a respeito do tema da pesquisa. No que se refere aos esforços aplicados para alcançar os resultados, a reconstrução dos conceitos acerca da liberdade de expressão mostrou sua diferenciação daqueles discursos que são agressivos ou odiosos (que defendem a eliminação do discurso contrário). Outro ponto a ser considerado é a originalidade da temática e a importância do levantamento desses dados, uma vez que a discussão sobre a liberdade de expressão está em voga no cenário atual, pois visa a formação cidadã para constituir uma sociedade efetivamente democrática, justa e, claro, tolerante. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 9 98 REFERÊNCIAS ARAÚJO, Márcio Schusterschitz da Silva. Como entender a liberdade de expressão. 2018. Disponível em: <https://marcioschusterschitz.com/2018/09/17/como-entender-a-liberdade-deexpresSao/>. Acesso em: 30 set. 2019. ARROYO, Francesc (Ed.). Charles Taylor: As pessoas hoje não têm claro o sentido da vida. El País. Madrid, 10 ago. 2015. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/brasil/2015/08/06/ internacional/1438877393 088926.html>. Acesso em: 01 out. 2019. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 5 de outubro de 1988. São Paulo: Saraiva, 2002. BRUM, Luíza Ribeiro. O conceito de tolerância: a visão de Habermas. X Congresso Nacional de Educação – EDUCERE, Curitiba. 2011. ENGELKE, Antonio. Pureza e poder: Os paradoxos da política identitária. Piauí. São Paulo: abril, v. 132, 17 set. 2017. Mensal. Disponível em: <https://piaui.folha.uol.com.br/materia/pureza-e-poder/#>. Acesso em: 03 out. 2019. FORST, Rainer. In: BROWN, Wendy et al. What is important in theorizing tolerance today? Contemporary Political Theory, [s.l.], v. 14, n. 2, p.159-196, 3 fev. 2015. Springer Nature. Disponível em: <https://doi.org/10.1057/cpt.2014.44> Acesso em: 20 set. 2019. FORST, Rainer. Justificação e crítica: perspectivas de uma teoria crítica da política. São Paulo: Editora Unesp, 2018. POPPER, Karl. The open society and its enemies. Routledge, 2012. RICOEUR, Paul. Tolerância, intolerância, intolerável. Leituras 1: em torno ao político. Tradução de Marcelo Perine. São Paulo: Loyola, p. 174-186, 1995. WERLE, Denílson Luis. Tolerância, legitimação política e razão pública. Revista Dissertatio de Filosofia, v. 35, p. 141-161, 2012. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 9 99 CAPÍTULO 10 doi MATEMÁTICA E INCLUSÃO SOCIAL: CURSO BÁSICO PARA CONCURSO Data de aceite: 06/01/2020 Adriana de Oliveira Dias Universidade do Estado de Mato Grosso – Unemat, Faculdade de Letras, Ciências. Sociais e Tecnológicas Alto Araguaia – MT Exayne Santos Mourão Universidade do Estado de Mato Grosso – Unemat, Faculdade de Letras, Ciências. Sociais e Tecnológicas Alto Araguaia – MT RESUMO: Este trabalho apresenta os resultados do projeto de extensão intitulado Matemática Básica para Concurso. Muitas pessoas veem no concurso público uma forma de melhorar de vida pois a situação de insegurança perante a instabilidade das empresas privadas e a falta de cumprimento das leis trabalhistas provocam ainda mais o aumento na competitividade para ingressar neste setor. Devido ao grande número de pessoas que prestam concurso público e as exigências cobradas pelas provas, os cursinhos voltados especificamente para concursos públicos têm sido muito procurados. Entretanto esses cursos geralmente são pagos, o que resulta na exclusão de pessoas com baixa renda que também desejam se preparar para passar nesses processos seletivos. Atualmente o perfil dos ingressantes no serviço público em sua grande maioria são pessoas com renda familiar média ou alta. Em contrapartida pessoas com renda baixa receberam ao longo da vida um ensino de baixa qualidade, não possuem prática de estudo e tem pouco acesso a materiais e a cursos preparatórios de qualidade. Em virtude dos fatores apresentados, nota-se a importância da aplicação deste projeto de extensão, visto que oferece o curso preparatório na área de matemática gratuitamente e auxilia na superação das desigualdades sociais existentes. PALAVRAS-CHAVE: Concurso Público, Matemática, Inclusão social. MATHEMATICS AND SOCIAL INCLUSION: BASIC COURSE FOR PUBLIC TENDER ABSTRACT: This paper presents the results of the extension project entitled Basic Math for Public Tender. Many people see the public tender as a way to improve their lives because the insecurity situation due to the instability of private companies and the lack of compliance with labor laws further increase the competitiveness to enter this sector. Due to the large number of people providing public tender and the demands. For the tests, the courses aimed specifically at public competitions have been much sought after. However, these courses are usually paid, which results in the exclusion of A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 10 100 low-income people who also want to prepare to go through these selection processes. Currently the profile of the new entrants to the public service are mostly people with a medium or high household income. In contrast, low-income people have received lowquality education throughout their lives, have no study practice and have little access to quality materials and preparatory courses. Due to the factors presented, it is noted the importance of applying this extension project, since it offers the preparatory course in the area of mathematics for free and helps in overcoming existing social inequalities. KEYWORDS: Public Tender, Mathematics, Social Inclusion. 1 | INTRODUÇÃO O sonho de se tornar um funcionário público é algo ainda almejado por muitos brasileiros. A estabilidade que essa situação traz faz com que a concorrência a cargos públicos seja sempre grande. Em nossa região não há um grande número de empresas e acaba que o funcionalismo público se torna um atrativo aos cidadãos aqui instalados. Este projeto teve como objetivo trabalhar os conteúdos matemáticos básicos que são exigidos em alguns concursos, não foi diferenciado nível de dificuldade dos conteúdos, bem como ensino fundamental, médio ou superior. A intenção era atender a demanda dos inscritos, dessa forma, o curso não teve uma programação definida, a mesma foi construída de acordo com os concursos nos quais nossos participantes tinham interesse. Ao final foi prevista a confecção de uma apostila contendo os assuntos que foram abordados, a mesma foi disponibilizada aos participantes do curso. O mercado de trabalho brasileiro tem se tornado cada vez mais exigente com critérios de seleção mais rígidos, e isso se reflete também no funcionalismo público que possui como meio de ingresso os denominados concursos públicos, cuja finalidade é além de selecionar os melhores candidatos para as vagas disponíveis, nivelar conhecimentos básicos. Em 21 de agosto de 2009 foi editado o Decreto Federal nº 6944 que institui normas gerais para concursos públicos no âmbito da União. Segundo Castelar (2010), em geral esses concursos possuem um grande número de inscritos gerando um alto índice de concorrência. Essa atração se dá pelo fato de o setor público pagar melhores salários que os praticados em níveis similares no setor privado. Os cargos públicos em geral proporcionam benefícios como estabilidade financeira, e em alguns cargos específicos planos de saúde, previdência diferenciada e período de férias mais prolongado. Apesar do grande número de concorrentes existentes nesses concursos, uma pesquisa feita por Castelar (2010) com relação ao perfil dos candidatos aprovados em um concurso que exigia como formação o ensino médio demonstrou que A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 10 101 a alta renda familiar, escolaridade acima do ensino médio, ser oriundo de região metropolitana, ter cursado o ensino médio em escola privada e ser jovem, são fatores que contribuem para aumentar a chance de passar no concurso. Por outro lado, ter renda pessoal abaixo de dois salários mínimos e ser oriundo de escola pública contribui negativamente. Neste contexto evidencia-se como relevante o fator econômico, os que têm mais acesso a uma educação de base de melhor qualidade tem mais probabilidade de serem aprovados. “Ainda assim o concurso público é o meio mais democrático e igualitário de que o cidadão dispõe para ter acesso a cargos e empregos públicos” (BARATA, 2009). No entanto, apenas os conhecimentos adquiridos na escola ou na Universidade não são suficientes para atender as exigências do cargo pretendido, pode ser que o concurso exija um conteúdo que não foi contemplado na formação do estudante ou foi ensinado de maneira muito superficial. Assim a maioria das pessoas que almeja um cargo público recorre a cursos preparatórios para concursos. Esses cursos podem ser oferecidos de maneira presencial ou à distância e na sua grande maioria são pagos, o que só acentua o fator econômico como ponto positivo para a aprovação no concurso. Apesar dos inúmeros cursos preparatórios para os diversos tipos de concursos existentes no Brasil, os mesmos são em quase sua totalidade particular, deixando de lado uma grande parte da população que não pode arcar com o custo dos mesmos. A comunidade do Município de Alto Araguaia, Santa Rita do Araguaia e região não contavam com cursos gratuitos com esse caráter, sendo esta proposta pioneira. Oferecendo cursos gratuitos onde foram abordados conteúdos básicos de matemática com os temas pedidos nos principais concursos públicos em geral, colaborou para o bom desempenho dos inscritos nos mais diversos tipos de concursos que envolveram conteúdos matemáticos. 2 | MATERIAL E MÉTODOS O projeto previu a elaboração de dois cursos preparatórios para concurso, cada um deles com uma carga horária de 40 horas, sendo divididas em 10 encontros semanais de 4 horas aos sábados à tarde das 14:00 às 18:00 horas. As inscrições foram feitas gratuitamente nas dependências da Universidade, qualquer membro da comunidade interna ou externa pode se inscrever. Quanto ao conteúdo dos cursos, foi elaborado de acordo com o interesse da turma, inicialmente analisamos quais concursos as turmas tinham interesse em prestar. Em seguida era analisado o edital, verificando os conteúdos referentes à disciplina de matemática e então preparada as aulas voltadas para esses temas e A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 10 102 também a resolução de questões das provas de concursos anteriores. As aulas foram expositivas, com utilização de quadro negro, giz e projetor multimídia. Foram planejadas priorizando um espaço para que o aluno pudesse interagir, questionar e também trazer seus próprios materiais para que fossem sanadas suas dúvidas, com um momento de diálogo no qual o aluno não se sentia com receio de fazer seus questionamentos por mais óbvios que eles fossem. 3 | RESULTADOS E DISCUSSÃO O curso colaborou para um bom desempenho dos inscritos nos mais diversos tipos de concursos que envolviam conteúdos matemáticos. Além disso, foi disponibilizada gratuitamente aos participantes do curso uma apostila elaborada pela equipe executora com conteúdos e exercícios resolvidos. A primeira turma contou inicialmente com a presença de 12 participantes, ao final havia 4 alunos. Em relação aos alunos que concluíram o curso foi notado seu progresso quanto a interpretação das questões, o raciocínio lógico e resolução dos problemas. Uma das maiores dificuldades apresentadas por eles era a interpretação das questões e a realização de operações básicas, principalmente quando envolviam números extensos e/ou com vírgulas, esta segunda dificuldade se dava pelo uso frequente de calculadoras. Foto1. Alunos durante a aula do projeto A importância desse tipo de curso e a qualidade com que foi dado o primeiro se refletiu na segunda turma que recebeu 48 inscrições, e finalizou com 20 alunos. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 10 103 4 | CONCLUSÃO Constata-se então, que o curso teve grande importância para a comunidade participante, a acadêmica bolsista teve a oportunidade de transmitir seus conhecimentos, desenvolver uma melhor didática e dispor de uma nova experiência fomentada pela universidade. Este projeto foi de suma importância para os participantes, alunos e acadêmica, isto é notado pela troca de aprendizagem e experiências de todos, além de aproximar a Universidade da comunidade. REFERÊNCIAS BARATA, Ana Maria. Questões relevantes sobre concurso público. Revista do Ministério Público do Estado do Pará - Ano IV - Vol. I – 2009. CASTELAR, Ivan; VELOSO, Alexandre Weber Aragão; FERREIRA, Roberto Tatiwa; SOARES, Ilton. Uma análise dos determinantes de desempenho em concurso público. Revista Economia Aplicada, v. 14, n. 1, 2010. p. 81-98. FERNANDEZ, Atahualpa; FERNANDEZ, Marly. Concurso público: aulas magistrais, zebras e esforço pessoal. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3226, 01 de maio de 2012. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/21653>. Acesso em: 11 de ago. 2016. IAHN, Luciene Ferreira; MAGALHÃES, Luzia Eliana Reis; BENTES, Roberto de Fino. Educação a distância x Educação presencial: estudo comparativo entre dois cursos preparatórios para concurso. Relatório de pesquisa apresentado ao setor de Educação Continuada em Geral da Fundação de estudos Sociais do Paraná – FESP. Curitiba – PR, 2008. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 10 104 CAPÍTULO 11 doi MULTIPLICAÇÃO NA HORTA: UM MODELO DE PRÁXIS EDUCATIVA1 Data de aceite: 06/01/2020 Robson Damasceno da Silva Universidade Federal do Pará - Campus Universitário de Castanhal (CUNCAST)Faculdade de Pedagogia através da práxis educativa aprendam com maior facilidade os assuntos matemáticos, em específico a multiplicação. Os resultados deste estudo fomentam mudanças significativas no processo de ensino e aprendizagem. PALAVRAS-CHAVE: Educação do Campo. Didática. Matemática. Maria Eliana Soares MSc. em Docência em Ciências e Matemáticas. Profª de Magistério Superior Universidade Federal do Pará - Campus Universitário de Castanhal (CUNCAST) RESUMO: Este trabalho apresenta um recorte de uma pesquisa de campo de abordagem qualitativa realizada numa escola Municipal na região rural de Castanhal – Pará. O mesmo visa à exploração do cotidiano escolar para o ensino de conteúdos matemáticos, e tem como objetivo utilizar a horta como instrumento de ensino matemático. A intenção é contribuir para uma educação de cunho adaptativo e inovador. Para tanto, buscamos apoio em Ribeiro (1972), Freire (1987); Brasil (2007); Freire (2008); Morin (2011) dentre outros. A finalidade deste trabalho é apresentar a matemática como uma disciplina conveniente e inovadora através da linguagem própria da realidade e da didática adaptada, com o intuito de deixar no passado o pensamento negativo atribuído a esta disciplina, e fazer com que os educandos ABSTRACT: This paper presents a clipping of a field research of qualitative approach carried out in a municipal school in the rural region of Castanhal - Pará. Mathematical teaching. The intention is to contribute to an adaptive and innovative education. To this end, we sought support in Ribeiro (1972), Freire (1987); Brazil (2007); Freire (2008); Morin (2011) among others. The purpose of this paper is to present mathematics as a convenient and innovative discipline through the proper language of reality and adapted didactics, in order to leave in the past the negative thinking attributed to this discipline, and to make learners through educational praxis. More easily learn mathematical subjects, in particular multiplication. The results of this study foster significant changes in the teaching and learning process. KEYWORDS: Rural Education. Didactics. Mathematics. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 11 105 INTRODUÇÃO Este relato versa sobre uma pesquisa de campo, realizada durante a disciplina de Fundamentos Teóricos e Metodológicos do Ensino de Matemática (FTM) em maio e junho de 2017, e consiste no complemento das discussões teóricas e metodológicas da disciplina, pela qual tivemos a oportunidade de ministrar aulas expositivas e dialogadas para alunos do 3º ano do ensino fundamental de uma escola da rede municipal, localizada na zona rural do município de Castanhal, cuja atividade caracterizou-se uma intervenção pedagógica no ensino de matemática impulsionada pela interrogação: Como fazer uma metodologia inovadora em uma escola do campo, de modo a tornar o ensino relevante para a realidade local? A perspectiva foi proporcionar aos educandos um ensino de matemática diferenciado despertando curiosidades e lhes proporcionando entendimento do assunto a partir da utilização da horta como instrumento de ensino da matemática, considerando a cultura local. Sendo a cultura por fazer parte de nossa vida, criamos, aperfeiçoamos e transmitimos esta cultura, por isso torna-se essencial elaborar uma metodologia em cima desse ponto crucial, que segundo Ribeiro (1972), cultura é a herança social de uma comunidade humana, representada pelo acervo coparticipado de modos padronizados de adaptação à natureza para o provimento da subsistência, de normas e instituições reguladoras das reações sociais e de corpos de saber, de valores e de crenças com que explicam sua experiência, exprimem sua criatividade e se motivam para ação. Além do mais, segundo Cruz (2016) o docente, precisa ser forjado também no chão da escola, num movimento de alternância de tempos e espaços pedagógicos que possibilite o diálogo do saber acadêmico com o contexto vibrante, complexo, tencionado das instituições de ensino da educação básica. Para isso os PCNs, dentre seus objetivos busca a capacidade dos alunos de “questionar a realidade formulando-se problemas e tratando de resolvê-los, utilizando para isso o pensamento lógico, a criatividade, a intuição, a capacidade de análise crítica, selecionando procedimentos e verificando sua adequação” (BRASIL, 2007). PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS O presente trabalho segue a abordagem qualitativa que segundo Minayo por se tratar de uma pesquisa social, consiste num tipo de pesquisa, cujo objeto é essencialmente qualitativo, isto porque “A realidade social é o próprio dinamismo da vida individual e coletiva com toda a riqueza de significados dela transbordante” (MINAYO, 2001, p 15). Conforme o objetivo estabelecido esta proposta toma a horta como instrumento A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 11 106 de apoio para o ensino da matemática, especificamente da multiplicação, pois a mesma por ser algo que faz parte da realidade social e cultural será de suma importância para os alunos, bem como da professora que pode melhorar a qualidade do ensino a partir desta metodologia. Vale ressaltar que a pedagogia enquanto arte de ensinar e de aprender pode levar a uma prática educativa libertadora ou conservadora, cabe ao educador direcionar tal prática, e optar por aquela que vai tirar seu educando da passividade. E, nos aproximando de Freire (1987), sobre a existência da prática neutra, consideramos também que a pedagogia não o é, uma vez que é esta que dá a direção às práticas educativas e formativas. Ao utilizarmos a horta como ferramenta de ensino confiamos que podemos conhecer a realidade da família do assentamento através dos alunos, e contribuir de alguma maneira para a melhoria daquela realidade, considerando o que afirma MORIN (2011, p. ) que “A condição humana deveria ser o objeto essencial de todo o ensino. Conhecer o humano é, antes de mais nada situá-lo no universo, e não separá-lo dele”. O direcionamento curricular a partir da realidade social e cultural define a pesquisa de cunho exploratório, pois como o referente acima, devemos explorar o cotidiano, de modo que os alunos assimilem o conteúdo de matemática, e a coleta de dados foi por meio de um relatório e um questionário aplicado a professora da turma que resultou nesta produção. A avaliação das questões e das interações com os estudantes durante a realização da atividade se deu pela análise de discurso, a partir da linguagem dos interlocutores, cuja linguagem individual e coletiva Orlandi (2009) define e caracteriza “[...] como mediação necessária entre o homem e a realidade natural e social. Essa mediação, que é o discurso, torna possível tanto a permanência e a continuidade quanto o deslocamento e a transformação do homem e da realidade em que ele vive” (ORLANDI, 2009, p. 15). Com relação aos estudantes, identificamos o resultado do projeto de forma positiva pelo envolvimento e criatividade dos educandos na hora da atividade, e com relação à professora, o resultado foi de contribuição, segundo a mesma, essas atividades contribuem de forma riquíssima com a aprendizagem das crianças. Nessa percepção, reforçamos em nossa formação acadêmica a necessidade de que nossas práticas futuras sejam recheadas desses sentimentos, para intervir na formação de nossos educandos, tornando-os protagonistas de seu processo de aprendizagem, de modo que esta esteja entrelaçada com a vida em sociedade. Sobre isso também nos orienta os PCN: [...] um currículo de Matemática deve procurar contribuir, de um lado, para a A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 11 107 valorização da pluralidade sociocultural, impedindo o processo de submissão no confronto com outras culturas; de outro, criar condições para que o aluno transcenda um modo de vida restrito a um determinado espaço social e se torne ativo na transformação de seu ambiente (BRASIL, 2007, p. 25). Com base nas orientações de Brasil (2007) nos deteremos a partir daqui a relatar os detalhes desta atividade, elencando fatos e situações que nos serviram de inspiração e contribuíram para resultados satisfatórios diante do que nos propomos a realizar. Relato da experiência A priori conhecemos a escola, a turma, e fomos saber quais a dificuldades dos alunos e o conteúdo que a professora estava trabalhando com os estudantes, bem como as formas que ela desenvolve e quais recursos ela manuseia para as atividades aplicadas em sala de aula. Embora, pensássemos ser esta uma metodologia inovadora, mas não tínhamos a certeza de sua aceitação pelos educandos, a qual consiste em esquecer o método tradicional e inovar dentro da sala de aula, fazendo com que os alunos sejam o centro desse processo. Contudo, ao colocá-la em prática, imediatamente observamos que os alunos ficaram perplexos, pois queriam copiar ou estudar a tabuada, modelo tradicional que a maioria dos professores ainda utiliza. Por um momento chegamos a ficar intimidados, mas logo nos recompomos, e nos conduzimos na ação com empenho e confiança, o que evidenciou a pertinência do projeto, a ponto de que os alunos se envolvessem e se apropriassem da ideia a partir das situações problemas. Duas dessas expressões que ilustram aquele momento são: Professor, se são 40 frascos para o plantio, e se nós colocamos 3 sementes em cada frasco, quantas mudas podem nascer? (Aluno A) E, se nascerem todas as sementes, mas depois morrer a metade. Com quantas mudas ficaremos? (Aluno B) Com relação ao primeiro argumento, trabalhamos com a noção de probabilidade, pois não sabemos exatamente quantas sementes germinarão, e com relação à segunda, trabalhamos o cálculo de duas operações. Com a atividade, os alunos souberam interligar a matemática com o plantio das sementes, resolvendo problemas elaborados por eles mesmos. Trabalhamos a multiplicação a partir da realidade dos educandos, pois todos veem seus pais plantando mudas cotidianamente, por isso consideramos de suma importância manter este método na escola e torná-lo rotineiro em aulas de áreas rurais, uma vez que trabalhando com o cotidiano, qualquer disciplina pode adaptarA Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 11 108 se naturalmente. Segundo a professora da turma as atividades realizadas por qualquer outro professor, desde que seja planejada é de grande valor à aprendizagem dos alunos. E, considerando que há vários níveis de aprendizagem numa classe, as inovações e tecnologias educacionais contribuem diretamente para aprendizagem individual e coletiva. NOSSAS IDEIAS CONCLUSIVAS A experiência de envolver a matemática no plantio de sementes foi bem interessante, pois as crianças foram estimuladas a calcular a multiplicação a partir do agrupamento das sementes, e esta contribuiu com aprendizagem das mesmas. Tornar o ensino das escolas do campo mais propício e motivador aos estudantes, obtendo resultados significativos, contribui para mudar a concepção de ensino tradicionalista que ainda é muito forte atualmente. O Projeto Político Pedagógico das escolas do campo deve ter a finalidade de ser mais prática, cujas ações devem ser adaptadas a partir de recursos das comunidades campesinas que possam auxiliar o currículo, bem como na formação continuada dos educadores do campo, de modo a adequar-se às condições culturais dos educandos. REFERÊNCIAS BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: matemática. Brasília: MEC/SEF, 1997. 142p. CRUZ, Renilton. PIBID Experiências Inovadoras do Diálogo Entre a Universidade e a Educação Básica. Editora: CRV, 2016 FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 32 ed. São Paulo: Paz e Terra, 1987. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. 37ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 2008. MINAYO, Maria Cecília de Souza (org.). Pesquisa Social. Teoria, método e criatividade. 18 ed. Petrópolis: Vozes, 2001. MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. Editora: Cortez. 2005. RIBEIRO, Darcy. O processo Civilizatório: Etapas da Evolução Sociocultural. 10º ed., Petrópolis: Vozes, 1987. MACHADO, Carmem Lúcia Bezerra; CAMPOS, Christiane Senhorinha Soares; PALUDO, Conceição (Orgs.). Teoria e prática da educação do campo: análises de experiências. Brasília: MDA, 2008. 236 p. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 11 109 CAPÍTULO 12 doi NAS SAIAS DE IEMANJÁ: VOZES E SABERES POÉTICOS DO FEMININO NA EDUCAÇÃO SENSÍVEL UMBANDISTAS NA AMAZÔNIA Data de aceite: 06/01/2020 Denise Simões Rodrigues Universidade Do Estado do Pará, Departamento de Filosofia e Ciências Sociais Belém- Pará Lívia Cristina Fonseca de Araújo Faro Secretaria Municipal de Educação de Belém, Diretoria de Educação Belém- Pará RESUMO: Este estudo, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação, Linha de Pesquisa de Saberes Culturais da Amazônia, da Universidade do Estado do Pará, emergiu da seguinte problemática: Como as dimensões simbólicas e poéticas do feminino contidas em narrativas do mito de Iemanjá na Umbanda podem contribuir para a Educação Sensível de filhas e filhos da Orixá? A perspectiva teórica de análise dos dados coletados baseia-se em Bachelard (1989), Cabrera (2004), Campelo e Luca (2007), Castoriadis (1982), Duarte Júnior (2001), Eliade (1991; 2016), Ferreira (1994-95), Halbwachs (2004), Maffesoli (1998), Ortiz (1999), Prandi (2001), Salles (2005), Boaventura Santos (2010), Silva (2015), Thompson (1995), Verger (2012) e Zumthor (2010), ajudou compreender sobre memória, cultura e educação sensível fora do espaço escolar e elucidar experiências religiosas como fenômenos culturais, considerando uma ciência que valorize o senso comum e os saberes marginalizados historicamente: o mítico, o poético, o feminino e os da tradição oral afrodescendente na Amazônia. A pesquisa de campo qualitativa, de abordagem etnometodológica (WATSON; GASTALDO, 2015), fez uso do método das poéticas orais (FARES; PIMENTEL, 2014), a partir da observação participante e de entrevistas narrativas. Teve como sujeitos filhas e filhos da Sagrada Orixá Iemanjá que participam como membros de Umbanda, pretendeu ao ouvir suas narrativas sobre a Grande Mãe, tecer uma análise que torne possível a “mediunização” entre o terreiro e a academia, na perspectiva de contribuir na superação da visão dual do pensamento moderno que separa sensibilidade e racionalidade e, assim, deflagrar, para além dos terreiros, vozes urdidas e silenciadas historicamente. PALAVRAS-CHAVE: Educação Sensível. Iemanjá. Feminino. Poética Oral. Amazônia. IN IEMANJÁ SKIRTS: VOICES AND POETTIC KNOWLEDGE OF WOMEN IN UBANDIST SENSITIVE EDUCATION IN AMAZON ABSTRACT: This study, linked to the Post Graduation Program in Education, in the A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 12 110 research line Cultural Knowledge of Amazon, of the Universidade do Estado do Pará, emerges from the following problematic: How the symbolic and poetic dimensions of the feminine, contained in narratives of the myth of Iemanjá in Umbanda, can contribute to the sensitive education of daughters and sons of the Orixá? The theoretical perspective that helped in the analysis of the collected data and in the elaboration of the thesis are Bachelard (1989), Cabrera (2004), Campelo e Luca (2007), Castoriadis (1982), Duarte Júnior (2001), Eliade (1991; 2016), Ferreira (1994-95), Halbwachs (2004), Maffesoli (1998), Ortiz (1999), Prandi (2001), Salles (2005), Boaventura Santos (2010), Silva (2015), Thompson (1995), Verger (2012) e Zumthor (2010) who will help to understand memory, culture and sensitive education outside the school space and to elucidate the religious experiences as cultural phenomena, considering a science that enriches the comum sense and historically marginalized knowledge: the mythical, the poetic, the feminine and those from the Afrodescendant oral tradition in Amazon. The field research qualitative of ethnomethodological approach (WATSON; GASTALDO, 2015) used the oral poetic method (FARES; PIMENTEL, 2014) from participant observation and narrative interviews. It had as subjects daughters and sons of the Sacred Orixá Iemanjá and those who participate as members of Umbanda, intend just listening to its narratives about the Great Mother, to make an analysis that makes possible the "mediumshipness" between the sacred space of the terreiro and the academy, with the perspective of contributing to overcoming the dual vision of modern thought that separates sensibility and rationality and thus to trigger, beyond the terreiros, voices historically deformed and silenced. KEYWORDS: Sensitive Education. Iemanjá. Female. Oral Poetics. Amazon 1 | TRILHAS DE CONCHAS: CAMINHOS DA PESQUISA Esta investigação, parte integrante da dissertação de mestrado intitulada Entre saias de espumas e trilhas de conchas: vozes e saberes poéticos do feminino na Educação Sensível das filhas e filhos umbandistas de Iemanjá na Amazônia, do Programa de Pós-Graduação em Educação, Linha de Pesquisa de Saberes Culturais da Amazônia, da Universidade do Estado do Pará, emergiu da seguinte problemática: Como as dimensões simbólicas e poéticas do feminino contidas em narrativas do mito de Iemanjá na Umbanda podem contribuir para a Educação Sensível de filhas e filhos da Orixá? Tal pergunta conduziu à reflexão sobre as possibilidades de encontrar, dentro da academia, um espaço para o debate de uma Educação Sensível, que se dá por meio da poética oral, da tradição narrativa, dos sentidos, e ao movimento de pôr à escuta, na academia e na sociedade para além dos terreiros, os saberes constitutivos das identidades que constituem o feminino em mulheres e homens que se educam na Umbanda. Para me ajudar a responder a esta pergunta, aponto as seguintes questões norteadoras: 1) Quais saberes simbólicos do feminino estão presentes em narrativas da Orixá Iemanjá na Umbanda A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 12 111 na Amazônia paraense? 2) Como esses saberes poéticos podem contribuir para a formação da identidade de filhas e filhos da Orixá? 3) Como acontece o processo de educação (do) sensível na concepção do feminino em filhas e filhos de Iemanjá na Umbanda na Amazônia? Como objetivo geral esta pesquisa propõem-se a analisar as dimensões simbólicas e poéticas do feminino contidas em narrativas orais de filhas e filhos da Orixá Iemanjá na Umbanda na Amazônia Paraense. Concebe como objetivos específicos: 1) Desvelar a importância do simbólico e do poético no mito da Orixá para a educação (do) sensível da expressão do feminino nessas práticas religiosas; 2) Identificar os saberes inscritos na estrutura das narrativas orais de filhas e filhos de Iemanjá na Umbanda; 3) Elucidar como os saberes presentes nas narrativas sobre Iemanjá contribuem para a educação (do) sensível de filhas e filhos de Orixá na Umbanda. A pesquisa de campo e documental é qualitativa, de abordagem etnometodológica (WATSON; GASTALDO, 2015), fez uso do método das poéticas orais (FARES; PIMENTEL, 2014), a partir da observação participante e de entrevistas narrativas, de modo a perceber a linguagem poética, observando o que Zumthor (2010) chama de "voz em presença", uma voz encarnada em toda a estética narrativa ̶ corpo, entonação, silêncios, espaço, tempo ̶ que envolve uma relação com o outro. Requisitou da pesquisa, por assim dizer, uma arqueologia, a medida que busca indícios para enxergar a interpretação da realidade daquele que porta a voz (FARES; PIMENTEL, 2014). Desafio possível esse de realizar uma análise poético-sociológica a que se oferece. Teve como sujeitos filhas e filhos da Sagrada Orixá Iemanjá e que participam como membros de Umbanda na região metropolitana de Belém, e pretendeu ao ouvir suas narrativas sobre a Grande Mãe, tecer uma análise que torne possível a “mediunização” entre o terreiro e a academia, na perspectiva de contribuir na superação da visão dual do pensamento moderno que separa sensibilidade e racionalidade e, assim, deflagrar, para além dos terreiros, vozes urdidas e silenciadas historicamente. A partir dessa abordagem, enfatizou o objeto de estudo como produto da cultura e o analisou seguindo o raciocínio poético que o embasa na prática cotidiana ̶ os traços culturais, as normas, os sistemas de crenças, os costumes, as tradições, os hábitos e os padrões culturais dos grupos ̶ da qual os sujeitos participam. Assim foi possível realizar uma pesquisa de campo ouvindo as vozes de filhas e filhos de Iemanjá, acompanhando os rituais de terreiro, para tornar possível a análise de como constituem as suas rotinas como descendente da Orixá. Ocupando-se também, com as diferentes e múltiplas formas de como tais sujeitos, de uma sociedade específica, contextualizada culturalmente ̶ o terreiro de Umbanda ̶ constroem o mundo social em que vivem. A pesquisa teve como lócus uma casa de Umbanda, localizada em Ananindeua, área periférica da região metropolitana de Belém, onde o trabalho de A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 12 112 campo deu-se por três meses e meio em dois cultos públicos semanais. As Vozes do Mar, como foram nomeadas as pessoas que colaboraram com suas narrativas para este trabalho, são filhas e filhos da Iabá Iemanjá, inicialmente, apenas as/os que faziam parte da Corrente da Tenta do lócus apresentado, mas o percurso da pesquisa, solicitou ouvir o reverberar vozes de diferentes terreiros, portanto, de modos de organização religiosa diferentes. Utilizou-se nesse estudo como técnica delimitadora a análise não probabilística por acessibilidade e tipicidade. A produção de dados foi realizada mediante a disponibilidade dos sujeitos em participar da pesquisa e narrarem suas experiências como filhas e filhos de Santo. A perspectiva teórica que ajudou na análise dos dados coletados está baseada em Bachelard (1989), Cabrera (2004), Campelo e Luca (2007), Castoriadis (1987), Duarte Júnior (2001), Eliade (2016), Fares e Pimentel (2014), Ferreira (1994-95), Halbwachs (2004), Maffesoli (1998), Ortiz (1999), Prandi (2001), Salles (2005), Boaventura Santos (2010), Thompson (1995), Verger (2012) e Zumthor (2010), que ajudaram a compreender sobre memória, cultura e educação sensível fora do espaço escolar e elucidar as experiências religiosas como fenômenos culturais, considerando uma ciência que valorize o senso comum e os saberes marginalizados historicamente: o mítico, o poético, o feminino e os da tradição oral afrodescendente na Amazônia, tendo a sociologia como suporte a analisar o aspecto mítico do fenômeno na produção de uma educação Sensível. 2 | POR UMA ECUCAÇÃO SENSÍVEL: UM MERGULHO PARA OUVIR AS VOZES DO MAR Iabá Iemanjá, útero etéreo, lugar do princípio, significa, vibra e guarda a geração da Vida em si, isto é, Ela é a matriz, o ventre pelo qual passa a Criação. Do manancial de sua força cria e desfaz. É calma e fúria. Tudo acomoda. Seu hálito fresco é um refrigério que guarda vida e morte num infinito movimento (CABRERA, 2004). Campbell (1990), afirma sobre quando se tem uma Deusa como Criadora “o próprio corpo dela é o universo. Ela se identifica com o universo. [...]. Ela é toda a esfera dos céus que abarcam a vida [...]. Tudo quanto você vê, tudo aquilo em que possa pensar, é produto da deusa" (CAMPBELL, 1990, p.). Rosalira Oliveira (2005) lembra que não há divisão, porque não se separa realidade divina da realidade material, humana, que também é natureza divina, portanto, o princípio gerador feminino em Iemanjá se funda como um modelo para Suas filhas e filhos, dando-lhes sentido de ser e de se reconhecerem como tal. Daí a necessidade de os mitos precisarem ser olhados e analisados sob um olhar histórico-religioso, como uma possibilidade de explicar e justificar as condutas e comportamentos de um dado grupo. Esta ótica, de acordo com Eliade (2016), permite superar a visão de mito como um desvio da A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 12 113 natureza, da normalidade, do padrão e admiti-lo como um fenômeno cultural. O mito é revelador da palavra criadora, primordial, que fundamenta a vida social, embora racionalmente criticado pela sociedade devido a sua extrema subjetividade. É, pois, o mito, uma criação sagrada que constitui o ser humano. Resulta disto a importância de compreendê-lo. Segundo a audição das Vozes do Mar, o maternal, princípio gerador, está, nessa perspectiva, para além da possibilidade ou desejo de ser mãe no plano físico, mas sustenta as qualidades do Princípio Gerador da Vida, em todo o seu processo de gerar e manter vida o tempo todo. O mito, como fica evidente, constitui e regula o modo de ser dessas pessoas, independentemente de seu gênero. Eliade (2016) provoca ainda a perceber e atentar para o tempo em que o mito é cantado, narrado ou recitado, “[n]um lapso de tempo sagrado”, pois que é nesse tempo quando os entes Sobrenaturais – o próprio sagrado – são convocados à presença pela palavra. Na Umbanda, no momento ritual, Iemanjá é evocada pela narrativa do Ponto cantado. Sendo assim, é indispensável olhar a poética da voz, da palavra sagrada, do verbo criador, primordial pronunciada pelos filhos da Iabá sobre sua Grande Mãe. A voz, por suas características de maleabilidade, por ser ponte entre as realidades, mostra-se como uma interessante expressão para o desejo de mediação a que este trabalho se propõe. O verbo, voz poética, palavra primordial, a matéria mãe-complacente de maior plasticidade no mundo físico é pois, que conduz a educação no terreiro. O basilar sobre o feminino em Iemanjá a que se dedica este estudo é o Princípio divino criador em seu caráter: gestador, gerador, acomodador, maternal, revelado em sua própria materialidade de seu Reino: o Mar. Princípio que Bachelard (1989) nomina de “a água maternal e a água feminina”, portanto, como princípio criativo feminino, a Orixá constrói as identidades de Suas filhas e de Seus filhos, Seus descendentes. A água é substância materna, não obstante, abranda, refresca, dá vida, nutre, lava, proporciona saciedade, bem-estar e paz, o alimento sem esforço, Grande Mãe. A Saia-Mar da Deusa, portanto, congrega todas as significações já mencionadas e as inalcançáveis pela condição humana. A Saia, nas narrativas míticas da tradição Yorubá em que Iemanjá cria a noite e em que repreende Xangô, para além da vestimenta da Mãe, é Ela a própria Mãemar transfigurada, é o Reino manifesto, gerador do conforto, criador e acomodador das polaridades, impositor de seus limites. O imaginário, portanto, grita entre os que persistem firmemente em mostrá-lo, brota feito olho d’água, incontrolável, se derrama pelas frestas impossíveis de calafetar. O imaginário irrompe a vida dos homens e das mulheres, o Princípio ancestral pulsa fulgurante nas células, ainda que negado. Não é mais suficiente, como lembra Maffesoli (1998), nos rendermos à exigência platônica de elevar o sensível ao inteligível. A vida nos impulsiona à busca da relação ecológica, por assim dizer, entre afeto e intelecto, daí a necessidade A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 12 114 de que as Vozes do Mar, vocalizadas da vivência e do senso comum, negadas na modernidade, guardem o mesmo status que a cientificidade, que os demais autores reconhecidos e legitimados academicamente. O que o autor chama “o sim” a tudo que vive, que pulsa nas relações sociais, carregando aí o “programa da incerteza”, do desconhecido, do imaginado, do que não é dado, o imprevisível. A transformação das experiências sensíveis de filhas(os) de Santo cuja coroa pertence à Orixá Mãe em narrativa (um texto, uma codificação inexata) e estas, por sua vez, em análise/ apreciação numa dissertação (outro texto, outra codificação inexata) requer perfazer o caminho apontado pela leitura de Ferreira (1994-95) a respeito dos pressupostos de Lotmam sobre cultura como informação, codificação, transmissão e memória. Cada uma dessas tarefas, quer das Vozes do Mar, quer da pesquisadora, se colocam a serviço de uma tradução de um sistema de signos. Uma tradução possível do vivido pelo sensível e pelo inteligível – que cria potenciais patrimônios memoriais, mas também que é criado sob o efeito de outros. Ao narrar, o texto vocalizado cria a realidade. Muitas dessas imagens intraduzíveis, aparentemente disformes, sem nexo e que, por isso, não entram na narrativa, porque não ganham significação, mas, mesmo que não entrem, vivem e alimentam a narrativa, constroem o clima narrativo porque compõem a experiência sensível. Vivem no narrado o dizível e o indizível, a memória e o esquecimento, o dito e o interdito, a palavra e o silêncio e, entre as aparentes dualidades, desdobra-se outras, como caleidoscópio. A vivência traduzida pelo pensamento binário nesse contexto, portanto, não se divide em dois, mas é múltipla. O que não foi traduzido, não se adere ao tecido grupal e, portanto, é esquecido. Carlos Rodrigues Brandão (2002), ensina que a educação é um processo e que ao participar de “eventos culturais fundadores de práticas sociais”, nós (re)criamos a nós mesmos e a essas práticas, por meio da dimensão pessoal e coletiva. Em vista disso, a “interação (muito mais do que de “estocagem”) de afetos, sensações, sentidos e saberes, algo mais e mais desafiadoramente denso e profundo destes mesmos atributos” (BRANDÃO, 2002, p. 26), o motivo e o sentido desse processo. Entre a situação, as pessoas e o grupo, sendo assim, aprendemos a ser quem somos e produzimos os modos de ser do grupo. A educação, nessa acepção, é como um processo criativo que compreende a interação com o outro e com as formas simbólicas fundantes das e nas relações socioculturais. Uma educação como trans-curso, como a passagem que se dá em um determinado contexto sócio-histórico, em um determinado tempo, e que carrega outros tempos e outros contextos, conforme a necessidade e escolhas individuais e coletivas da comunidade, portanto, um processo de aprender a ser e aprender a ser com o outro. Ao falar de educação dentro de um terreiro de Umbanda, a pesquisa carreia o foco para, fora do contexto escolar, ocupar-se dos saberes sensíveis que afetam e são afetados, constroem e são construídos pelas Vozes do A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 12 115 Mar na comunidade religiosa em questão. Um saber, como alumia Maffesoli (1998), enraizado no senso comum, no afetual, no emocional da comunidade. Um saber encarnado no corpo, cuja organicidade cria e é criada pelo corpo social, enraizado tanto quanto movente na memória social. Este paradoxo saber, despe-nos do conforto usual, o põe a toda prova e se propõe à recusa ou, no mínimo, à tensão do paradigma dominante convencionado na ciência e na educação. Segundo Maffesoli (1998), requer de nós coragem para desapegar do conhecido das velhas superstições do modo de aprender para “arriscar”, subverter à ordem, dar-se ao inesperado, impalpável, reconhecendo, assim, o afeto e o intelecto em um mesmo nível, mais do que isso, reconhecendo a comunhão entre eles. É um “saber afectual”, que se apresenta se não pela metáfora. A metáfora, carregando as imagens vivas, faz o “transporte dos sentidos” e, embora não seja possível a explicação racionalista para a vivência no terreiro de Umbanda, como repetem em uníssono as Vozes do Mar, unidas, palavra e imagem, erguem a metáfora, para nomear o improvável com suas potências de criação e intuição. Mostra-se uma Educação Sensível pela qual aprendem e passam a relacionar-se com o sagrado, consigo e com o mundo de maneiras diferentes. A perspectiva de contribuir com essa pesquisa para uma educação mais aberta à vida cotidiana, a propósito de “reencantar o mundo”, na tarefa mesma de educar, encontra no sentido como matriz, como o canal que inaugura a experiência espiritual, é um princípio na Umbanda, um modo de acessar os fundamentos religiosos. Ao enunciar que sobre a deidade se fala por imagens emocionais – por metáfora – reitera o que dizem as(os) filhas(os) de Santo quando narram o possível de suas vivências, uma vez que estas são um jorro de imagens imprecisas. Maffesoli (1998, p. 149) em sua análise juntando as pontas entre o insondável e o social: similar a isso, “do social não se pode falar senão por evitação, por alusão de maneira indireta.”. É por isso que a metáfora é tão cara para nós, porque oferece incerteza no trato com a vida. Ao narrar, essas Vozes contam também de sua relação com o organismo social vivo. Considerando as intenções deste trabalho de “mediunizar” entre esses dois espaços sociais de conhecimento (academia e terreiro) e, para além, reconhecer a conexão entre eles, bem como a de contribuir com uma educação mais ampla e inclusiva, é irremediável constatar para atingir tal percurso a necessidade de enxergar e entender a mediação entre o saber sensível e o conhecimento intelectivo na construção das identidades das Vozes do Mar, afinando-se pois, com a posição de Duarte Júnior (2000) que aponta a pertinência de ambos complementarem-se. 3 | NAS SAIAS DE IEMANJÁ: SABERES POÉTICOS DO FEMININO Assumindo essa proposição de mediunizar entre o terreiro e a academia, para A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 12 116 tornar visível dentro desse universo acadêmico uma centelha do vivido, a pesquisa apresenta os saberes dionisíacos, porém, não sem recomendar um leitura entregue às Vozes do Mar, deixando que elas alimentem o imaginário do leitor, para que encontre saberes consoantes a ele. Assim expõe os 4 (quatro) saberes sensíveis trazidos pelas Vozes do Mar, por meio de signos bastante conhecidos, os três primeiros metaforizam o fluxo da onda do Mar, o outro, a navegação. A saber: Para formar a onda: o saber da criação. Quando o sopro (da vida, o início ̶ Olorum) faz vibrar e mover suas moléculas, o Mar cria a forma: a onda. Diretamente ligada ao princípio gerador, a Mãe Sereia e seus descendentes geram, dão forma, não apenas ao filho no corpo físico, mas formas novas: projetos, ideias, expressões artísticas, resolução de problemas (característica muito forte de seus descendentes). É um saber de gerar no sentido de principiar, criar. Para mover a onda: o saber da espera. A confluência de energia da água e do vento se articulam numa combinação para crescer e mover as ondas, que podem encontrar outras forças, que podem aumentá-las ou destruílas antes de chegarem à praia. O paradoxo da espera não guarda estaticidade, a espera é movente, como a onda, porém, aguarda o tempo daquilo que não é possível mover por si mesma: a outra onda que a ela se junta ou a desfaz, um nova rajada de vento... É a entrega à que as Vozes do Mar, em unanimidade, ecoaram. Há espera para trazer ao mundo sua criação, há espera para gerar as formas no tempo mais ecológico possível, há espera pelos tempos internos e externos da criação, de esperar os filhos voltarem para casa, esperar a enchente, esperar a vazante, há a espera do tempo do outro (nascer, viver, caminhar). A maternidade carece e exige um tempo e espaço de espera. Para quebrar na praia: o saber do cuidar. É, por assim dizer, a qualidade mesma do acolher, do proteger. É onda quebrando na praia: ao mesmo tempo que deixa presentes-conchas, solta sua criação, abraça a areia para dentro de si, lambe e suga o que a força da espera entregou. A mãe que coloca no colo, nesse movimento de acolher, cuidar e proteger, em que pese a insegurança da areia sumindo sob os pés ou o banzo da onda nova que chega de surpresa. O princípio que gera, cria, espera, cuida, entre preamar e baixa-mar, carreia saberes sensíveis em um mar-caleidoscópio: seus elementos mudam de posição e criam diferentes imagens ao menor movimento. E as filhas e os filhos da Iabá não apenas vivem este movimento por ser sua natureza, mas o buscam porque o movimento é o que funda todos os saberes. O movimento nada mais é que para navegar no mar: o saber do fundamento de ciclo. Este é o fundamento do próprio mar: um ciclo incessante. Então, a busca do princípio do ciclo é a busca do equilíbrio, é onde se mantém, onde se encontram os saberes que traduzidos pelo estudo. Metaforizando a vivência do movimento da vida: o fundamento do ciclo, a Voz do Mar Inaê, relembra o conselho do Guia Marinheiro pertencente à Linha de Iemanjá, sobre como conduzir a vida, ancorada pelos princípios descendidos da Deusa, quando anuncia que precisava A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 12 117 aprender a navegar no intermitente Mar de sua Mãe: “Quando ele foi me dar o axé, ele disse: 'Feche os olhos e sinta o mar da sua Mãe, Ela vai lhe ensinar a navegar em águas revoltas e águas calmas e você não vai mais ter medo!”. Uma chave, o saber de navegar sobre o mar da vida lhe foi oferecida para usar em seu cotidiano. O aprendizado dos Fundamentos da Mãe passa a ser vivo, cotidiano, constituindo do modo em que ela conduz seu destino. Ao incluir um e outro aspecto da vida, a filha de Santo se acalma, se aconchega nos braços da Mãe, porque assente tudo que é. Entrega-se totalmente à sua origem e passa pelo momento de dor sem desequilíbrio, sem sucumbir como seria de seu movimento habitual. Manter-se no Princípio de ciclo é onde se encontra o equilíbrio das filhas e dos filhos de Iemanjá enquanto criam, esperam e cuidam. Essas dimensões simbólicas e poéticas reveladas na pesquisa pelas Vozes do Mar, traduções metafóricas das vivências narradas por elas em sua performance, e as traduções da pesquisadora a partir da experiência no terreiro e da escuta dessas vozes, foram vividas pelo e a partir do sentir e contribuem para a construção de sua identificação como descendentes da Orixá, pelas vias de uma razão sensível. Esse processo acontece a partir da vivência da palavra Sagrada, do verbo primordial, ou seja a vivência da Orixá, assim como pela evocação e vocalização sobre tal vivência que desperta a compreensão pessoal e coletiva do fenômeno. A vivência se dá, inicialmente, pelo contato com o jorro de imagens, pelos sentidos conhecidos ou não. Depois, às partilhas nas vivências com os irmãos de Santo, deu significado e ancoram, por uma razão sensível, o entendimento que tornam a vivência significativa em suas práticas cotidianas. O saber sensível da vivência de in-corpo-oração incorpora-se na vida das filhas e filhos de Mamãe Sereia. O aprendizado no e do terreiro de Umbanda, portanto, não acontece de uma forma racionalmente organizada. Tais saberes apresentam a presença de uma estética própria do e no terreiro de Umbanda, uma estética que educa. Nessa estética do e no terreiro de Umbanda, onde a estesia (estética) conduz à educação, à metáfora, ao poético, é um fio condutor para a construção das identidades de filhas e filhos da Orixá. Na Umbanda na Amazônia Paraense, os saberes do feminino estão ligados diretamente ao Princípio Gerador da Vida, cuja tradução mais significativa para a humanidade é a maternidade. Essa experiência constitui os saberes que fazem filhas e filhos se reconhecerem descendentes de Janaína, que os assenta no fundamento Dela, já que vivem a Orixá em seu corpo, o que torna o saber encarnado. As imagens da Grande Mãe evocadas neste trabalho, entretecidas de simbolismo, provocam a um mergulho nas Águas da tradição afro-brasileira na perspectiva de encontrar esses fatores não ditados pelo real, do ponto de vista funcional, mas pelo imaginário. E é nesse imaginário que, como aponta Castoriadis (1987), a sociedade encontra o complemento necessário para a sua ordem. No terreiro de Umbanda o processo de educação se dá por todos os sentidos vividos/experimentados quando A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 12 118 as histórias são narradas pela voz ou pelo ritual, quando todo o conhecimento passa pelos sentidos, se constituindo como uma educação (do) sensível para lembrar Duarte Júnior (2000) e, por isto, ganha impressões profundas e profusas em sua constituição das identidades de filhas e filhos de Iemanjá Umbanda. REFERÊNCIAS BACHELARD, Gaston. A Água e o Sonho: ensaio sobre a imaginação da matéria. São Paulo: Martins Fontes, 1989. BRANDÃO, Carlos Rodrigues. A Educação como Cultura. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2002. CABRERA, Lydia. Iemanjá & Oxum. Tradução de Carlos Eugênio M. de Moura. São Paulo: EDUSP, 2004. CAMPBELL, Joseph. O poder do Mito. Com Bill Moyers; organizado por Betty Sue Flowers, tradução de Carlos Felipe Moisés. São Paulo: Palas Athenas, 1990. 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A proposta desta pesquisa perpassou pela necessidade de reverberar como um instrumento que se utiliza de processadores de texto, contribuiu na aplicação virtual de uma Oficina Online de Introdução à LIBRAS na formação de pedagogos. Objetivou-se verificar, através da metodologia de abordagem qualitativa e a análise de conteúdo da aplicação do Caderno Virtual numa plataforma online e de um questionário também aplicado nesse repositório à relevância e aplicabilidade deste objeto como uma nova mídia digital educativa, promovendo argumentos e possibilidades de interação professor/aluno-cursista a formação docente. Constatou – se que tal ferramenta, apesar de algumas dificuldades de acesso e interação, será muito útil na formação pedagógica, apostando na aplicabilidade produtiva e eficaz, não só na formação docente como na sua prática em sala de aula com seus alunos, poiso Caderno possibilita adequações para qualquer área, além de oficinas cursos e minicursos. PALAVRAS-CHAVE: Mídia digital educativa. Caderno Virtual. Língua de Sinais. Formação. VIRTUAL NOTEBOOK IN THE CONTEXT OF POUNDS IN PEDAGOGICAL TRAINING ABSTRACT: This article aims to present the use of a media tool for teacher education. With the advent of the internet and the evolution of Digital Information and Communication Technologies, the teaching / learning process was not limited to traditional classroom resources only. The purpose of this research was the need to reverberate as a tool that uses word processors, contributed to the virtual application of an Online Workshop of Introduction to LIBRAS in the training of educators. The objective was to verify, through the qualitative approach methodology and content analysis of the application of the Virtual Notebook in an online platform and a questionnaire also applied in this repository to the relevance and applicability of this object as a new educational digital media, promoting arguments and possibilities of teacher / studentstudent interaction teacher education. It was found that, despite some difficulties in access A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 13 120 and interaction, such a tool will be very useful in the pedagogical formation, betting on the productive and effective applicability, not only in the teacher formation but also in its classroom practice with its students. adaptations for any area, besides workshops courses and short courses. KEYWORDS: Educational digital media. Virtual notebook. Sign language. Formation. 1 | INTRODUÇÃO Esse artigo perpassou pelo tema de estudo sobre mídias digitais nas práticas educacionais e desenvolvimento das bases práticas e teóricas de uma mídia educacional, denominada Caderno Virtual, desenvolvida na Especialização em Produção de Mídias para Educação Online (UFBA/UAB), por um grupo de discentes, guiados pelo Tutor Luís Cerqueira, que nos apresentou essa ideia considerando reflexões sobre a produção de uma mídia baseada no uso incomum de processadores de texto, para trabalhar na perspectiva de formação do pedagogo, a fim de dinamizar o estudo de conteúdos numa Oficina de Introdução à LIBRAS online, para estudantes de Pedagogia. O tema escolhido versou sobre a linha de pesquisa: Ambientes de Aprendizagem: novas Linguagens e Tecnologias no Ensino. Esta escolha permeou a discussão de se produzir uma ferramenta através de um processo coletivo no uso de processador de texto, proporcionando a interação digital durante sua utilização, caracterizando-a por ser uma mídia possivelmente inovadora e acessível aos sujeitos do âmbito educacional. Com base no tema escolhido, estudo das mídias digitais nas práticas educacionais, o artigo em questão integra esforços de um grupo de estudantes que almejam construir exemplares contextualizados desta nova mídia educacional – Caderno Virtual, que viabilize a sua aplicação na educação, em diversas e específicas áreas de acordo com o campo de atuação de cada um, contando com a atuação em grupo via WhatsApp, youtuber e presencialmente. O Caderno Virtual – CV é um conjunto de documentos criados em processadores de texto que tem por função ser um material didático voltado à mediação de processos de aprendizagens, tais como aulas, treinamentos, oficinas dentre outras, que possui um tema central, onde sua construção é feita com uso do que temos chamado por “unidades de CV”, como: Caixa de texto; fragmento de texto para fixar; links para acesso externo, vídeos, podcast, dentre outros recursos. Deve ser construído em paralelo ao desenvolvimento de estratégias de aplicação e levando em consideração amplo espaço para expressão, interação e colaboração entre os sujeitos envolvidos, conforme afirma Cerqueira: A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 13 121 Um novo recurso educacional agregando diversos recursos midiáticos, viabilizando a construção do conhecimento conjuntamente entre o docente e o aluno, possibilitando também a criação de um roteiro singular para manejo de conteúdos curriculares, para tornar o acesso ao caderno possível em qualquer lugar, utilizando meios digitais para difundir o conhecimento. É um convite para autoria docente e discente. Permiti que o alunado interaja, inserindo suas ideias dentro dos espaços editáveis dos cadernos, proporcionando maior interação e prazer na aprendizagem, baseando - se no caderno convencional físico, sendo adaptado para o ambiente virtual (CERQUEIRA et al., 2018). O advento da internet e a evolução das TDIC permitiram que o processo de ensino/aprendizagem não ficasse limitado apenas aos recursos tradicionais em salas de aula, conduzindo mudanças na área educacional. Sendo assim, segundo Uliano (2016), a tecnologia ganha espaço como ferramenta importante no cotidiano escolar. Por meio da informação, o professor pode propor alternativas que busquem a socialização e interação dos alunos no processo de ensino e aprendizagem. E para que tais mudanças acontecessem surgiu a necessidade de refletir sobre práticas pedagógicas inovadoras que possibilitem melhor qualidade desta práxis, nesse sentido, Caderno Virtual traz uma proposta potencialmente inovadora da utilização de processadores de texto como ferramenta didática voltada à mediação de processos de aprendizagens, tais como aulas, treinamentos, oficinas, cursos e minicursos. Almejando que o uso dessa mídia enriquecesse a teoria pedagógica e a formação dos futuros pedagogos, principalmente, no caso desta pesquisa, no que tange a Língua de Sinais, levando em consideração amplo espaço para expressão, interação e colaboração entre os sujeitos envolvidos, objetivou-se analisar a aplicabilidade do produto construído. Portanto, o objetivo deste artigo foi analisar a relevância e aplicabilidade do Caderno Virtual como recurso didático-pedagógico em cursos para a formação de professores num ambiente virtual, elaborou-se uma mídia através de um processador de texto, formando um conjunto de atividades para uma oficina virtual com estudantes de Pedagogia, apresentou-se a LIBRAS. Através do CV construído, verificou-se a interação do público-alvo na participação da oficina online. Através da proposta deste e de um pequeno questionário, buscouse entender a pertinência desse tipo de mídia em cursos para a formação de professores. Versamos no entendimento do que é o Caderno Virtual, como uma mídia digital, sua aplicabilidade, interatividade e inovação na educação online e na formação de profissionais da educação, bem como modelo híbrido de educação. 2 | FUNDAMENTOS TEÓRICO-PRÁTICOS Antes de conceituar o Caderno Virtual como uma mídia para educação, precisamos entender o significado de como este pode se tornar uma mídia. Mídias A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 13 122 é um termo usado para referenciar um vasto e complexo sistema de expressão e de comunicação. Na atualidade, mídias é uma terminologia usada para: suporte de difusão e veiculação da informação como rádio, televisão, jornal para gerar informação através de máquina fotográfica e filmadora. A mídia também é organizada pela maneira como uma informação é transformada e disseminada, mídia impressa, mídia eletrônica, mídia digital, além do seu aparato físico ou tecnológico empregado no registro de informações (Almeida, 2018). “No que se refere à área educacional, a mídia esteve sempre presente na educação formal, porém, não raras vezes, sofreu certa resistência, em relação a sua aplicação na escola. Porém, o impacto social causado pela penetração da tecnologia de informação e comunicação (TIC) nos últimos anos, ocasionou intensas transformações nas principais instituições sociais. A família foi invadida pela programação televisiva em seu cotidiano, a Igreja se rendeu ao caráter de espetáculo da TV, a escola que pressionada pelo mercado utiliza a informática com um fim em si, e a essas influências se associa à Internet, com intensa possibilidade de uso.” (DORIGONI e SILVA, 200, p.2) O conceito de mídia digital refere-se a qualquer material que utiliza um computador ou equipamento digital para criar, explorar, finalizar, ou dar continuidade a um projeto que tem como suporte a internet, comunicação online ou off-line, produção gráfica, videogames, conteúdos audiovisuais e afins (ALMEIDA, 2018). Nesse entendimento, podemos pensar que o Caderno Virtual pode sim ser uma mídia educativa, pois muitos dos elementos citados por Almeida contemplam tal afirmação e sendo considerada uma mídia digital educativa, devemos entender agora o que é essa nova ferramenta. Como já citado, o Caderno Virtual – CV é um conjunto de documentos criados em processadores de texto que contêm múltiplas atividades, dispostas através de vídeos, podcast, imagens, charges, links, podendo ser utilizado de forma colaborativa e interativa pelos usuários, possibilitando a criação de um roteiro singular para manejo de conteúdos curriculares, onde os envolvidos têm um direcionamento, utilizando recursos móveis (smartphone, tablets, notebooks e outros) para tornar o acesso ao caderno possível em qualquer lugar, sobretudo em ambientes virtuais, como blogs, salas de aulas online interativas, Moodle e afins. Segundo Cerqueira, et al (2018), “é um instrumento de interação professor-estudante, objetivando a aprendizagem de um tema específico, apresentando roteiros curriculares de forma lúdica e interativa”. De acordo com Manovich (2001. p. 55), o conceito de interatividade é tautológico, visto que as modernas HCI (Human Computer Interface) são, por definição, interativas, ao contrário das interfaces mais antigas como as de processamento de dados. Já as modernas interfaces humano/computador permitem ao usuário controlar a mídia em tempo real pela manipulação da informação mostrada na tela. Assim, uma vez que o objeto está representado em uma mídia, Manovich sustenta que esse objeto A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 13 123 se torna interativo. Para Primo (1997,1998, apud Primo 2003. p.2), “a interação é uma ‘ação entre’ os participantes do encontro (...) o foco se volta para a relação estabelecida entre os interagentes, e não nas partes que compõem o sistema global”. E assim entendendo interação, a proposta do autor é buscar na comunicação interpessoal sua base de análise, a partir de uma abordagem que ele denomina sistêmico-funcional. Nesse caso, o que importa é, segundo o próprio autor, “investigar o que se passa entre os sujeitos, entre o interagente humano e o computador, entre duas ou mais máquinas.” Portanto, concepções de comunicação calcadas em modelos como o transmissionista, ou em quaisquer dos elementos individualmente compreendidos neste modelo, estariam fora da linha de abordagem do autor. Laborando sobre esse novo recurso educacional e refletindo o conceito de inovação, nos deparamos com as considerações de Menezes, Campos e Ribeiro, (2012), que dependendo, principalmente da sua aplicação, a inovação pode ser considerada como exploração com sucesso de novas ideias. Dentre as várias possibilidades de inovar, aquelas que se referem as inovações de produto ou de processo são conhecidas como inovações tecnológicas. As informações e inovações encontram-se disponíveis nos ambientes virtuais via rede, produzindo uma infinidade de dados que precisam ser compreendidos, discutidos e trabalhados coletivamente, para serem apreendidos criticamente. É possível afirmar que as Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação - TDIC podem levar à constituição de ambientes colaborativos inovadores. A respeito disso, Lemos e Cunha (2003, p.13) acrescentam: Vivemos uma nova conjuntura espaço-temporal marcadas pelas tecnologias digitais telemáticas onde o tempo real parece aniquilar, no sentido inverso à modernidade, o espaço de lugar, criando espaços de fluxos, redes planetárias pulsando no tempo real, em caminho para a desmaterialização dos espaços de lugar. Assim na cibercultura podemos estar aqui e agir à distância. A forma técnica da cibercultura permite a ampliação das formas de ação e comunicação sobre o mundo. Dessa forma, existem diversos pontos relevantes para dimensionar um trabalho que reúna o processo de ensino-aprendizagem nas escolas por meio da tecnologia, estudos mais recentes desconstroem os estereótipos da educação tradicional e reconstroem no mesmo meio uma mistura personalizada do ensino e do aprendizado utilizando as tecnologias, conforme dimensiona Bacich, Tanzi Neto, Trevisani, (2015). Essa junção denominada de ensino híbrido, dinamiza cenários diferenciados para que os estudantes desenvolvam, com melhor aproveitamento dos conteúdos, as suas capacidades. O ensino híbrido destaca a interação do ser humano com as tecnologias, assim, essa mistura não necessariamente precisa acontecer entre quatro paredes, ela pode ser adaptada a qualquer ambiente. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 13 124 Neste caso, incluímos o CV elaborado no Google Classromm (https://classroom. google.com/c/MTYwMTUyMTY5MjRa). Nos últimos anos, a Google tem lançado e melhorado ferramentas de suporte tecnológico nas mais diversas áreas. No campo da educação, o destaque está no Google Sala de Aula que oferece um conjunto de ferramentas de comunicação e produtividade destinadas a promover a colaboração e criatividade, conforme afirma Witt (2015). E nesse universo digital, disseminar a importância da LIBRAS para a formação do pedagogo é imprescindível. Para Campello (2009, p. 40) “a cultura surda deve ser inserida nos currículos escolares”, aqui sendo entendida enquanto representação linguística, que apresenta a necessidade da construção da identidade de uma comunidade, que se manifesta através de valores, atitudes e vivências sociais. Um personagem fundamental na elaboração e execução de uma prática pedagógica inclusiva é o professor, pois ele está diretamente lidando com os desafios do processo de ensino e aprendizagem, sendo detentor de saberes e conhecimentos teórico-metodológicos que fundamentam a sua prática de sala de aula, assim há a necessidade de que o docente busque em sua trajetória de trabalho, recursos e estratégias didático-pedagógicas que incluam toda a clientela, seja ela ouvinte ou surda. Destaca-se que as tecnologias contribuem muito com a disseminação da LIBRAS, pois através dela tanto os ouvintes quantos os surdos podem compreender a Língua de Sinais com toda sua estrutura. A criação de Softwares Educacionais em língua de sinais e em escrita de sinais é um dos recursos que ajudam nessa compreensão. Reforçando, Stumpf (2010, p. 02) acrescenta: Do ponto de vista dos surdos o uso do computador e da Internet inaugurou uma nova dimensão às suas possibilidades de comunicação, pois são tecnologias acessíveis visualmente. Se, para os ouvintes, elas abriram perspectivas que levaram a modificações profundas nos usos e costumes de toda a sociedade, para os surdos, essas mudanças podem ser ainda mais significativas. De acordo ainda com Marchesi (2004, p. 48) “Os bons professores manifestamse com mais facilidade nas escolas que dispões das condições adequadas para apoiar o esforço de cada professor e para criar um ambiente de colaboração”. Assim, a criação de uma ferramenta educacional que ajude o pedagogo na sua formação de forma enriquecedora e produtiva fortalece sua práxis. 3 | METODOLOGIA Sabe-se que a escola deve ser um espaço democrático de interações entre saberes, favorecendo a aprendizagem em qualquer modalidade, considerando ainda a diversidade cultural de sua clientela, revelando-se um espaço de inclusão. Para alcançar os objetivos propostos nesse artigo, foi utilizada a metodologia de análise A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 13 125 de conteúdo de abordagem qualitativa. Segundo Godoy (1995): A pesquisa qualitativa envolve a obtenção de dados descritivos sobre pessoas, lugares e processos interativos pelo contato direto do pesquisador com a situação estudada, procurando compreender os fenômenos segundo a perspectiva dos sujeitos, ou seja, dos participantes da situação em estudo. Visando à compreensão ampla do fenômeno que está sendo estudado, considera que todos os dados da realidade são importantes e devem ser examinados. (GODOY, 1995. p.58) Para Moraes (1999), a análise de conteúdo constitui uma metodologia de pesquisa usada para descrever e interpretar o conteúdo de toda classe de documentos e textos, que vai além de uma leitura comum. Para a fundamentação teórica, foram utilizados textos que abordavam o conceito de mídia/digital, um texto colaborativo explanando sobre o que é Caderno Virtual, perpassando pela interação e interatividade, discutindo um pouco sobre educação híbrida e por fim contextualizando a LIBRAS. 3.1 Produção da Mídia Buscou-se criar uma mídia que contribuísse para a formação docente através de uma oficina de introdução de LIBRAS com alunos do Curso de Pedagogia da UNEB e sua aplicação para a área do conhecimento da Língua de Sinais, foram produzidas atividades interativas com conteúdos relacionados à língua dos sujeitos surdos, servindo-se das ferramentas existentes num processador de texto formando um Caderno Virtual. É iniciado com um podcast introdutório explicando o conteúdo proposto, um breve histórico sobre a Língua de Sinais, apresentação do Alfabeto de Sinais e atividades correlatas para aprimoração, números em LIBRAS, também com atividades correlatas, além de vídeos explicativos e textos para conhecimento e reflexão do cursista (figuras 1 e 2). Figura 1: início do CV Fonte: A autora A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 13 126 Figura 2: final do CV Fonte: A autora O Caderno Virtual foi depositado no repositório do Google Classroom - https:// classroom.google.com/c/MTYwMTUyMTY5MjRa, ambiente online muito interessante de trabalhar com aulas interativas. Essa sala de aula virtual possui espaços para que o professor/oficineiro possa anexar suas atividades/tarefas, com prazos e notas avaliativas caso queira, mural para postar mensagens e o espaço das pessoas, onde ficam registrados os e-mails dos alunos/cursistas convidados para a sala virtual. Os mesmos podem interagir nas atividades e tarefas propostas, respondendo o proposto e dando a devolutiva no mesmo ambiente (figuras 3), foi adicionado também a este ambiente um questionário simples, com 5 perguntas, para a análise das impressões dos cursistas. Figura 3: Tela do Ambiente Virtual Fonte: A autora A partir da produção da mídia houve a motivação da escrita deste artigo científico A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 13 127 com todas as observações e reflexões da proposta em relação à concretização do Caderno Virtual e sua aplicabilidade. 4 | RESULTADOS Após todo o percurso metodológico na construção do Caderno Virtual como possibilidade de uma mídia inovadora na perspectiva de formação docente, o ambiente utilizado para depositar a mídia construída foi muito importante para a investigação da aplicabilidade do Caderno Virtual como recurso didático-pedagógico em cursos para a formação de professores num ambiente virtual, sendo este o objetivo principal desta pesquisa. O acesso à sala virtual Google Classroom foi através de convite impetrado há alguns futuros pedagogos e estendido para alguns amigos que tiveram interesse em descobrir como funcionaria uma oficina virtual. A princípio a intenção da aplicação do CV seria de forma síncrona, pois a intenção inicial era realizar a oficina presencialmente, interagindo ao mesmo tempo com o cursista, porém como o propósito do Curso de Especialização é Produção Online, optou-se por uma interação assíncrona com o cursista num ambiente virtual, com participação voluntária dos mesmos. Nessa perspectiva, a educação ocupou, como seu outro território de cotidiano do saber, o Ambiente Virtual de Aprendizagem. Nesse, os (as) estudantes são estimulados(as) a aprender e construir conhecimentos em/na rede, o que favorece a autonomia e o processo de uma aprendizagem significativa. É na potencialidade dessas múltiplas formas de interação e comunicação propiciadas pelos ambientes virtuais que reside a principal diferença da prática educativa em rede. (ROCHA et al. 2017,p.36) A maioria dos cursistas convidados tiveram certa dificuldade em acessar o ambiente/repositório escolhido, inclusive a autora no início sentiu a mesma dificuldade em manuseá-lo, mas após domínio do espaço virtual manusear as atividades propostas na mídia e responder ao questionário, para alguns dos participantes encaminhou-se com mais tranquilidade,. Interagindo com as atividades propostas no Caderno, o cursista respondeu a cinco simples perguntas relacionadas ao contexto deste artigo. A primeira pergunta foi: Você já conhecia o Caderno Virtual? Se sim, como conheceu, se não o que achou? Os que responderam, informaram não conhecer e afirmaram que é uma proposta “interessante”, “dinâmica”, “interativa”, com várias ideias para exercitar. Percebe-se nas respostas dadas que essa forma de mídia ainda é desconhecida e que se mostrou positiva nas palavras supracitadas, ressaltando assim a utilidade e valorização da mesma. Na segunda pergunta questionou-se: Teve dificuldade em realizar as atividades A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 13 128 do Caderno Virtual? A maioria respondeu que sim, principalmente na hora de editar o caderno, pois dependendo do processador de texto utilizado, podem ocorrer reconfigurações ocasionando a não realização a contento. O terceiro questionamento foi: Você já tinha conhecimento sobre a LIBRAS? Se sim, como conheceu, se não, o que achou? A maioria respondeu não ter um profundo conhecimento, sendo o básico e que a proposta da oficina online despertou o interesse e que consideraram uma forma dinâmica de conhecê-la. À LIBRAS é uma Língua dinâmica e como tal consegue encantar os ouvintes e até mesmos o sujeito surdo que não possuem domínio sobre ela. Deste modo, evidencia-se a diversidade educacional, no âmbito de uma cultura homogênea, única e global, no uso de ferramentas de fácil acesso e aplicabilidade construtiva. O quarto questionamento refere-se: Você considera o Caderno Virtual uma mídia inovadora que ajudou ou ajudaria na sua formação? As respostas foram positivas com relação a ser uma mídia inovadora, principalmente por dispor de muitos recursos em um só arquivo, considerando uma excelente ferramenta de ensino-aprendizagem. Por fim, foi solicitado que deixassem um comentário sobre o que achou de uma oficina de LIBRAS on-line, utilizando o CV. E as respostas foram precisas em afirmar que gostaram da forma lúdica e dinâmica que a oficina foi apresentada, conforme abaixo: “Caderno Virtual consegue reunir atividades limitadas apenas pela criatividade do professor, então podemos ter ótimos trabalhos e resultados surpreendentes” (cursista 1) “A oficina apresenta um conteúdo muito rico, a formatação do CV chama atenção para aprender de forma lúdica” (cursista 2) “Achei fantástico, porém melhoraria o desempenho do caderno virtual, para realizar as atividades” (cursista 3) “Acredito que é uma ótima iniciativa, e faz com que o aluno se interesse mais pelo assunto, pelo leque de informações disponibilizadas nele. É uma boa ferramenta para ensino-aprendizagem” (cursista 4) “Interessante ter uma oficina on-line, sem precisar sair de casa. Gostei!” (cursista 5) As questões levantadas apontam para o que Manovich (2001) sustenta sobre interatividade e que Primo (2003) reforça que há relação estabelecida entre os interagentes, apresentando assim a aplicabilidade do produto na construção da formação do pedagogo e da comunidade participante, como um todo, mesmo com alguns percalços como a questão do processador de texto utilizado e de como converter de um tipo para o outro, mas que objetiva-se resgatar as interações das diversas formas, independente do tempo e do espaço físico que esteja inserido. No sentido da aplicabilidade do Caderno Virtual, percebeu-se que o repositório A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 13 129 escolhido funcionou como sala de aula, porém não funcionou como acessibilidade prática ao mesmo, pois dependeu de convite individual, por e-mail e liberação pela autora/professora, mas com relação ao CV em si, só não houve uma boa aplicação com os cursistas que possuíam processador de texto incompatível ao arquivo apresentado o que apresenta uma fragilidade a ser trabalhada no mesmo. 5 | CONCLUSÃO Percebeu-se o quanto essa nova possibilidade de recurso educacional, pode ajudar na formação tanto no âmbito educacional básico como na formação docente, de forma interativa, dinâmica e colaborativa, conclui-se que, mesmo com os vários obstáculos e as adaptações que sempre surgirão, a proposta do Caderno Virtual como uma possível mídia inovadora que agrega vários recursos num só arquivo, é sim aplicável no ambiente acadêmico e de formação, pois independente de ser depositada ou não em um repositório virtual, o CV possibilita acesso pelo smartphones, tablets, pelo whatsapp, e-mail, drives e afins, desde que haja internet e um aplicativo de processador de texto, pode-se utilizá-lo em qualquer lugar e na hora que desejar. Através da análise realizada e a possibilidade que este recurso deve oferecer, compreende-se que o Caderno Virtual é útil na aprendizagem, seja ela virtual ou presencial, buscando ser mais um aliado não só na formação do pedagogo, como também na sua práxis, oportunizando assim mais dinamismo e compartilhamento de saberes entre professor e aluno, ressaltando que essa mídia pode ser dinamizada para todo tipo de conhecimento, com conteúdos variados e de entretenimento, levando em conta que para produzi-la precisa-se buscar elementos atrativos. Diante disto, faz - se necessário apropriar-se das tecnologias, identificandoas como elementos essenciais na comunicação e produção de conhecimentos compartilhados, possibilitando assim ao usuário manusear de forma criativa um processador de texto criando “unidades de CV” imagináveis e surpreendentes. REFERÊNCIAS ALMEIDA, Bianca Daéb’s Seixas. Disciplina Introdução ao AVA e à Educação Online. 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A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 13 131 CAPÍTULO 14 doi O ENSINO DA ARTE – UM DESAFIO NO ATUAL CONTEXTO Data de aceite: 06/01/2020 Márcia Lenir Gerhardt Colégio Politécnico da Universidade Federal de Santa Maria Santa Maria – Rio Grande do Sul/RS Pedro Henrique Graeff Machado Colégio Politécnico da Universidade Federal de Santa Maria Santa Maria – Rio Grande do Sul/RS Mateus Silva do Carmo Colégio Politécnico da Universidade Federal de Santa Maria Santa Maria – Rio Grande do Sul/RS RESUMO: A arte é um tema que causa estranhamento quando é trabalhada e/ou discutida nos diferentes públicos. Em sala de aula é desafiador diante dos diferentes propósitos dos educandos. No Ensino Médio do Colégio Politécnico da UFSM, no Município de Santa Maria/RS, é perceptível a preocupação dos educandos em ter foco num processo seletivo para o Ensino Superior. Dessa forma, torna-se maior o desafio diante dos conceitos e pré-conceitos construídos historicamente na sociedade, sobre a importância das diferentes disciplinas trabalhadas durante a Educação Básica, em especial no Ensino Médio. Sendo assim, objetivou-se, nessa discussão apresentar como ocorre o ensino da Arte no Ensino Médio no Colégio. O estudo é de cunho qualitativo, descritivo e realizado de forma colaborativa utilizando-se da observação para as análises e reflexões. A observação é realizada durante o período letivo, a cada aula e atividade trabalhada. A presente discussão se ampara em Freire (1996), Rios (2003), Barbosa (2005) entre outros. As aulas são amparadas teoricamente em diferentes autores. Buscamse artigos da área das artes e das demais áreas do conhecimento. Os resultados, desse tipo de trabalho desenvolvido, mostram a formação de adolescentes mais críticos, sensíveis aos fatos do cotidiano, com uma visão politizada e interdisciplinar. Pode-se concluir que ensinar arte interdisciplinarmente, com o olhar voltado ao educando e ao seu, e nosso entorno é desafiador e, proporciona a todos os envolvidos uma leitura social, ética, política, estética, cultural mais aguçada do meio no qual vivemos, o que faz com que todos sintam-se sujeitos atuantes e transformadores da sociedade. PALAVRAS-CHAVE: Ensino de Arte. Educação. Ensino Médio. THE TEACHING OF ART - AT CURRENT CONTEXT CHALLENGE ABSTRACT: Art is a subject that causes strangeness when worked and/or discussed in A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 14 132 different audiences. In the classroom it's challenger in front of different purposes from the students. At Colégio Politécnico da UFSM's high school, in Santa Maria/RS/Brazil, it's noticeable the concern from the students for having focus in a select process to college. This way, it becomes harder the challenge in front of the historical construction of conceptions and prejudices in society, about the importance of different subjects worked during the school period, especially at the high school. Therefore, it aims to present how the Art's teaching occurs at high school. The study is qualitative in nature, descriptive and performed collaboratively using observation to analysis and reflection. The observation ocurred during the school year, in each class and activities proposed. The present discussion is supported by Freire (1996), Rios (2003), Barbosa (2005) and others. The classes are theoretically supported on different authors. Art and others subjects' articles are searched. The results of this kind of work developed have showed the formation of teenagers more critical, sensetive to the everyday facts, with a politicized and interdisciplinary vision. It can be concluded that teaching art interdisciplinarily, looking to the students and to their and our surrounding is challenger and provides to each one involved a sharper social, ethical, political, aesthetical, cultural reading of the environment we live, what makes us all fell acting and transforming the society. KEYWORDS: Art's teaching. Education. High school. 1 | INTRODUÇÃO Falar sobre arte é um desafio no atual contexto. E sobre o ensino e aulas de arte? O que mais ouvimos é: aulas de arte servem para que? Não tem muitas questões no ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio)! Não serve para nada mesmo! Vamos estudar Matemática, Química, Física, ...! Esses pré-conceitos, já estabelecidos se tornam um desafio quando vamos planejar uma aula de arte. Na sala de aula se torna maior o desafio, frente aos diferentes propósitos dos educandos. De acordo com Dal’Maso e Oliveira (2011, p.725) A concepção moderna de conhecimento racional estabelece uma divisão entre a racionalidade e sensibilidade, razão e emoção, ciência e arte. Na escola esta separação é compreensível, uma vez que o processo educacional se orientou e orienta no sentido da transmissão de conhecimento objetivo, racional e universal, sendo a arte considerada, na maioria das escolas apenas como atividade lúdica tendo como finalidade, a vivência artística, o prazer recreativo. Ainda é significativa a visão de que o conhecimento objetivo e racional se sobrepõe aos demais tipos de conhecimentos, e a arte é uma das disciplinas que se envolve em uma eterna luta de sobrevivência nesse cenário, em diferentes escolas do país. A presente discussão ocorre a partir das aulas de artes desenvolvidas no Ensino Médio do Colégio Politécnico da UFSM (Politécnico). O Politécnico é uma A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 14 133 das Unidades de Educação Básica, Técnica e Tecnológica localizada dentro da Universidade Federal de Santa Maria/UFSM, no Município de Santa Maria/RS. O Politécnico oferece e desenvolve a Educação Básica (ensino médio), a Formação Inicial e Continuada, a Educação Profissional Técnica de nível médio (subsequente) e a Educação Profissional Tecnológica (14 cursos Técnicos subsequentes, 4 cursos Tecnólogos, 2 cursos de Pós-Graduação). No Ensino Médio do Politécnico, há uma preocupação, por parte dos educandos, com os processos seletivos para o ensino superior. E então, como ensinar/trabalhar a arte em tal contexto? Diante disso, o presente texto objetiva relatar como ocorre o ensino da arte e como é trabalhada a disciplina de Artes no Ensino Médio do Politécnico. 2 | O ENSINO DA ARTE ATRAVÉS DA VIVÊNCIA/EXPERIÊNCIA EM E COM AS ARTES Os educandos que chegam ao Politécnico ingressam através de um processo seletivo realizado pela instituição. Dessa forma, os ingressantes são de diferentes escolas e de diferentes municípios. Essa particularidade é observada e trabalhada nas aulas de artes para identificar o que os alunos vivenciaram e aprenderam sobre arte até então, e para se conhecerem melhor. Para o desenvolvimento das atividades, inicialmente apresenta-se o objetivo da disciplina para o ano todo. E, a partir de cada uma das aulas, o planejamento é realizado considerando o que os educandos discutiram durante a aula anterior. O tema, que é observado nessas discussões com os educando, é teorizado e discutido novamente com maior intensidade. Os educandos são instigados para que façam suas observações/contribuições a partir de sua realidade, ressaltando a importância do respeito à opinião do outro, à cultura do outro. Vivemos em uma sociedade multicultural. Nós educadores, temos o desafio de educar com uma ética para a diversidade, porque o ser humano precisa ser capaz de ouvir, despertar sensações, sentimentos e conviver com o diferente. Respeitar a sociedade, o professor, o aluno, a escola, as famílias, os diferentes credos é ser ético, pois, “o ético está muito ligado ao estético” (FREIRE, 2000, p.34), “uma rigorosa formação ética ao lado sempre da estética. Decência e boniteza de mãos dadas”, ou seja, “a prática educativa tem de ser, em si, um testemunho rigoroso de decência e de pureza” (FREIRE, 1996, p.36). Esse movimento estabelecido entre os envolvidos exige um esforço de ambos, pois esses se conhecerão e reconhecerão no próximo. Ao emitir minha opinião terá alguém ouvindo e interagindo e da mesma forma quando alguém emitir sua opinião A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 14 134 eu estarei ouvindo e interagindo com esse e os demais envolvidos. Esse ouvir e interagir faz parte das aulas e do planejamento para os diferentes momentos, das diferentes séries. Na 1ª série trabalhamos inicialmente os conceitos de arte. A partir de estudos bibliográficos, observação, pesquisa de imagens, linguagens das artes, através de questionamentos se estimula o educando a refletir sobre dos temas que surgem em cada aula, para que eles construam o seu próprio conceito de arte, embasados naquilo que eles mesmos ajudaram a explorar. As diferentes linguagens da arte são vivenciadas por meio de visitas aos museus, exposições em diferentes espaços, oficinas com profissionais da área, com a construção artística, apreciação de diferentes documentários, vídeos, poesia. Durante esse processo a leitura de imagem é apresentada aos educandos, e esses vão realizando suas leituras a partir do que já vivenciaram até então. Na 2ª série os educandos trabalham a História da Arte através da leitura de imagens. Explorar as imagens de cada um dos períodos que constituem a História da Arte e identificar as características dessas épocas, o contexto social, científico, cultural, político proporciona ao educando uma possibilidade de relacionar, de forma interdisciplinar, o que ele estudou nas demais disciplinas daquele ano, dos anos anteriores e com o seu próprio contexto. O estudo de mídias e de imagens de obras de arte e de diferentes gêneros para o aprendizado de arte e da História da Arte desenvolve, nos sujeitos do processo, a percepção visual não somente da obra analisada, e sim do mundo a sua volta e, de seu entorno, contribuindo assim, à “construção de um olhar crítico no exercício de sua cidadania”; pensamento que vai ao encontro de Buoro (2003, p. 16) em seu estudo. Para Barbosa (2005, p. 142), interpretar uma obra de arte consiste em situá-la, não só historicamente, [...] mas também social, biológica, psicológica, ecológica, antropológica etc., pois contextualizar não é só contar a história da vida do artista que fez a obra, mas também estabelecer relações dessa ou dessas obras com o mundo ao redor, é pensar sobre a obra de arte de forma mais ampla. Nas diferentes visitas a museus, à exposições, com as vivências do cotidiano, o educando é estimulado a fazer relações do que está presenciando com o que foi trabalhado nos diferentes períodos da história da arte e assim realizando a contextualização em um aspecto, artístico, social, político, filosófico, cultural, científico, etc. O Museu se constitui, nesse processo, em uma instituição e/ou elemento importante para os educandos construírem suas diferentes concepções do que é A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 14 135 arte e como essa tem influência no desenvolvimento do ser humano e da própria história do Homem, bem como, o resultado da relação do homem com as diferentes épocas, culturas, espaços. Na 3ª série estuda-se a arte brasileira através de documentários, artigos científicos e das vivências nos museus, exposições, pesquisas que o próprio educando realiza. Nessa série é trabalhada com maior afinco a Iniciação Científica, na disciplina de Projetos, enquanto que nas séries anteriores os educandos são estimulados a Iniciação Científica para irem conhecendo e familiarizando-se com o processo investigativo e a construção metodológica do conhecimento. 3 | VIVÊNCIAS/EXPERIÊNCIAS COM ARTES REALIZADAS PELOS ADOLESCENTES DO ENSINO MÉDIO DO COLÉGIO POLITÉCNICO DA UFSM PARA APRENDER, CONHECER/RECONHECER, SENTIR, COMPREENDER A ARTE Trabalhar com a adolescência é uma experiência na docência muito instigadora e ao mesmo tempo desafiadora. Adolescentes conectados com as diferentes mídias tecnológicas são os sujeitos desse processo de aprendizado, assim como, o docente que ensina e aprende ao mesmo tempo com essa geração de adolescentes. Como docentes precisamos ter consciência que estamos juntos em um processo de construção e formação constante e contínua, indo ao encontro de Freire (1996) quando ele trata a respeito da inconclusão do ser humano. E, a cada momento trabalhado com os educandos sinto, como professora, o quanto temos para aprender com eles, sendo assim “a consciência do inacabamento entre nós, mulheres e homens, nos fez seres responsáveis, daí a eticidade de nossa presença no mundo” (FREIRE, 1996, p.56). Para o desenvolvimento das atividades nas aulas de Artes apresenta-se o objetivo da disciplina para o ano todo e, de cada encontro. O planejamento é realizado a partir de cada aula, considerando a discussão realizada na aula anterior. O tema, observado nas discussões é teorizado, discutido com maior intensidade e os educandos são instigados a investigar e a realizarem suas observações/ contribuições a partir de sua realidade. No início do ano faz-se uma exposição, em algum espaço disponível do Politécnico, com trabalhos de educandos do ano anterior, objetos de arte indígena, africana, objetos da natureza, uma instalação envolvendo objetos industrializados e da natureza (Imagens 1, 2, 3, 4). Os educandos, da 1ª série sentem-se, em um primeiro momento, surpresos, por iniciarmos uma discussão teórica a partir de uma exposição e não o contrário. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 14 136 Imagem 1: Atividade realizada pelos alunos Imagem 2: Atividade realizada pelos alunos Esse momento foi muito construtivo porque o inesperado ocasionou estranhamento e com isso a reflexão de cada um foi a partir do que ele sentiu naquele momento, não foi a partir do conceito apresentado por um autor. Esse diálogo que se construiu entre os educandos – professor – educandos – educandos a respeito dos diferentes conceitos de arte nos fez entender, também que é possível uma formação ética e estética. Para Freire (2002) a formação ética e estética acontece na sala de aula, no momento em que o aluno, o professor, a escola, a sociedade lutam juntos por uma educação conscientizadora e dialógica. Imagem 3: Atividade realizada pelos alunos Imagem 4: Atividade realizada pelos alunos Desde o início do ano letivo são trabalhados os conceitos de arte. Esses, por sua vez, a partir da vivência, de estudos bibliográficos, observação, pesquisa de imagens, linguagens das artes, questionamentos, visitas a museus e exposições. Estimula-se a reflexão sobre diferentes temas para que os alunos construam os próprios conceitos. Nas reflexões dos grupos em questão, polemizou-se o que é e não é arte, o grafite e a pichação. As dimensões que se destacam nesse processo são, de acordo A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 14 137 com Freire (1996), a epistemológica, a política e a estética. No presente ano (2019), por ocasião de uma visita ao Museu de Artes do Rio Grande do Sul (MARGS) uma das salas de exposição do museu trazia obras sobre pichação e grafite. Esse momento foi aproveitado para continuarmos a discussão, surgida em uma aula anterior, sobre o grafite ser ou não ser arte, assim como a pichação. Esse tema foi abordado com maior intensidade trazendo para eles, através de documentários e de vídeos, como é tratado o grafite e a pichação. No ano anterior, havia surgido essa mesma polêmica a respeito do grafite e dapichação como sendo ou não arte. No mesmo período, foi publicado nos jornais locais, a respeito desse tema em Santa Maria/RS trazendo espaços que adotaram o grafite em suas fachadas e muros. Após a reflexão, os alunos foram levados a esses espaços da cidade, que tem grafites e pichações, e eles puderam fazer a relação e diferenciação do que é grafite e pichação e como essas manifestações se relacionam com o espaço urbano e com a sociedade. Nesse processo de construção o professor e o aluno estão engajados crítica e criativamente; ambos percebem suas realidades com um olhar crítico e constroem conhecimentos através desse diálogo. Para Freire (1996) o ato de criar, recriar objetos, de conhecer faz da educação uma arte. A educação assim é uma teoria e uma prática, um ato político, estético e ético. Os educandos fizeram suas reflexões sobre a temática após as visitas aos diferentes espaços, e na sequência construíram propostas/projetos de pichação e de grafite. Nesse aspecto, a tarefa fundamental da educação, da escola, ao construir, reconstruir e socializar o conhecimento, é formar cidadãos para que possam contribuir e atuar criticamente e criativamente no contexto social de que fazem parte, exercer seus direitos (RIOS, 2003). Para a atividade avaliativa, os educandos escolheram um tema polêmico (na ótica deles) na atual sociedade e criaram um projeto de grafite e como o mesmo tema pode ser representado em forma de pichação. Durante esse processo de construção, os educandos utilizaram das aulas de matemática onde foram estudados e trabalhados a geometria e as proporções espaciais com a finalidade de desenvolver a noção de espaço, de simetria, de escala, utilizados para a construção da proposta do grafite assim como da pichação. Outras áreas aparecem conjugadas na construção do conhecimento, como a química, a física, linguagens, a educação física, a sociologia, a filosofia, política, economia, entre outras em diversos aspectos da sociedade, da cultura e do ensino. Os alunos realizaram tanto na aula de matemática como na aula de artes o estudo de escala de como adaptariam seus projetos em muros e/ou paredes, sempre A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 14 138 visando uma interdisciplinaridade e um olhar tanto crítico como preciso da imagem a ser construída. Sendo assim foi possível perceber que o grupo de educandos teve a oportunidade de rever e formar uma opinião a respeito das diferentes expressões, no caso do grafite e da pichação. Essa atividade foi realizada pelas três séries, sendo que cada uma delas trouxe as suas concepções de acordo com o que é proposto para cada uma delas. Neste ano, a turma iniciante irá explorar os espaços da cidade de Santa Maria/ RS, que são ocupadas por grafites e pichações, e realizarão um documentário a respeito do tema defendendo a sua concepção de grafite e de pichação naquele espaço. A proposta desenvolvida por um dos grupos sobre esse tema, no ano de 2018 (Imagens 5, 6), foi submetida ao evento 2ª Mostra de Ciências e Matemática de Santa Maria, promovida pelo Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática (PPGECIMAT) da Universidade Franciscana de Santa Maria/RS (UFN), que tem por objetivo “contribuir para alfabetização científica dos jovens na Educação Básica; despertar vocações científicas e tecnológicas; estimular os estudantes para que sigam uma carreira científico-tecnológica” (UFN, 2019). A proposta, com o título “Arte e Matemática: como trabalhar as semelhanças de dois diferentes?” foi uma das vencedoras e os alunos autores (3 alunos) receberam como prêmio uma bolsa de iniciação científica, do CNPq / Ensino Médio durante todo o ano de 2019. Imagem 5: Atividade realizada pelos alunos Imagem 6: Atividade realizada pelos alunos A leitura de imagem, trabalhada concomitantemente com a História da Arte Universal e Brasileira, se dá, nos diferentes espaços e ferramentas. As diferentes tecnologias são utilizadas como meio para aprender e valorizar a arte criada a partir das diferentes tecnologias e a possibilidade de visitar sites de museus nacionais e internacionais. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 14 139 A leitura de imagem é estudada, também, nas exposições e museus locais (Imagens 7), nas ruas da cidade, em museus de outras cidades como Porto Alegre (Imagens 7), Pelotas, Rio Grande, todos no RS e outros locais onde surgem exposições artísticas. Esses espaços são visitados com autorização dos familiares dos alunos e da própria direção do Colégio que oportuniza esse tipo de atividade, quando é possível. Imagem 7: Aula/visita no Museu de Artes de Santa Maria/MASM. Imagem 8: Aula/visita no Museu de Artes do Rio Grande do Sul/MARGS. Essas aulas realizadas nos museus são momentos oportunos e enriquecedores para a formação do ser humano no seu processo de ensino-aprendizagem. É um momento de resgate da nossa própria história como seres humanos e momento de contextualização. [...] é preciso resgatar a dimensão do homem como ser social e cultural, leitor e intérprete, criador e criatura. A obra de arte parece ser um objeto especialmente facilitador desse resgate, não só porque aglutina múltiplas formas do saber, mas principalmente porque uma obra de arte não é apenas objeto de apreciação estética; é fruto de uma experiência de vida desvelada pelo processo de criação do artista e pelo sistema se signo da obra (BUORO, 2003, p. 31). O museu é um espaço que apresenta a arte de uma outra maneira, que nem sempre é possível na escola. Mostra a arte, nas suas diferentes linguagens, de outro ponto de vista, e essa oportunidade enriquecedora se torna um diferencial na formação do educando e do educador. 4 | CONCLUSÃO Pode-se concluir que os desafios na Educação são molas propulsoras para não desistirmos desta tortuosa e doce profissão que é ser professor, por vezes ingrata, porém apaixonante a cada dia. No caso de ensinar arte, não é diferente, somos eternos aprendizes em um mundo que não para e, como sujeitos, que exercemos nosso exercício cidadão, temos o compromisso de não deixá-lo parar. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 14 140 Trago algumas palavras dos próprios alunos para concluir a respeito dessa breve apresentação sobre como acontece o ensino da arte em um espaço, dentre todos os demais. Em um espaço, constituído por diferentes que convivem no respeito mútuo que a Educação exige para que a Escola tenha a oportunidade de acontecer/ funcionar. Todos os professores, inclusive eu, professora de Artes, trabalhamos no ensino médio e, também dedicamos nossos saberes para fazer aulas nos cursos técnicos, tecnólogos, pós-graduação, que o Colégio Politécnico da UFSM oferece para a sociedade. Esse tipo de aulas de artes realizadas na instituição proporciona aos educandos, no olhar dos mesmos, “uma oportunidade de questionar o nosso mundo a volta”; da mesma forma de “não se contentar com respostas rasas e sempre buscar mais”. As aulas desenvolvem um “ensino como uma forma de desenvolvimento pessoal, social e político e não somente por uma nota”; “estimula a iniciação científica” o que faz com que o educando tenha a possibilidade de ir além de um único conceito e desenvolver suas concepções. “Nos faz sair do nosso quadrado e buscar ver além do que nos está apresentado, o que pode estar além do que é visível”, isto é, a leitura de e do mundo. Proporciona ao educando “algo relacionado com o nosso melhor aprendizado e mais experiências para vida”. “Acho que as aulas de arte são importantes principalmente para o nosso repertório sociocultural”. “Uma saída da ‘visão de cabresto’ em relação à arte em si e suas manifestações, como foi com a questão do grafite e pichação que a gente tinha aquela visão de que picho é aquilo feio e picho é crime. Por meio das visitas a museus a gente começa a ser inserido nesse meio que é algo quase impossível, porque normalmente a gente não procura esses lugares para lazer ou apreciar mesmo. Outra coisa legal, também, é a aula fora da sala de aula. É como se a gente tivesse uma aula de alguma ciência da natureza no laboratório vendo as coisas na prática. Nesse caso, a gente vê a arte na prática não só na teoria”. Esse ensino da arte nos proporciona “algo relacionado a aprender com as vivências e tirar uma reflexão de cada uma” e é assim que, como educadora, me constituo diariamente onde aprendo com as vivências do cotidiano pessoal e profissional, e refletindo sobre cada uma delas me constituo um ser que continuo acreditando na Educação e em um mundo melhor. REFERÊNCIAS BARBOSA, Ana Mae. Arte educação contemporânea: consonâncias internacionais. São Paulo: Cortez, 2005. BUORO, Anamelia Bueno. O olhar em construção: uma experiência de ensino e aprendizagem da A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 14 141 arte na escola. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2003. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. _____________ A educação na cidade. 5 ed. São Paulo: Cortez, 2000. _____________ Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. 9 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002. DAL’MASO, Eunice Maria; OLIVEIRA, Ana Arlinda. Ensinar e aprender arte no ensino médio. In: X Congresso Nacional de Educação – EDUCERE. I Seminário Internacional de Representações Sociais, Subjetividade e Educação – SIRSSE. Anais. (p. 724-736), PUC/PR, Curitiba, 2011. Disponível em: https://educere.bruc.com.br/CD2011/pdf/4626_2410.pdf Acesso em: 01 de out. 2019. RIOS, Terezinha Azeredo. Compreender e ensinar: por uma docência da melhor qualidade. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2003. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 14 142 CAPÍTULO 15 doi O ENSINO DE QUÍMICA: UM OLHAR INVESTIGATIVO EM ALUNOS DE GRADUAÇÃO Data de aceite: 06/01/2020 Tiago Barboza Solner Universidade Franciscana (UFN) Santa Maria – Rio Grande do Sul Liana da Silva Fernandes Universidade Franciscana (UFN) Santa Maria – Rio Grande do Sul e dez de Engenharia Química de uma Univerisade do município de Santa Maria/RS. Através deste estudo pode-se perceber que no cenário atual, os professores não utilizam recursos diferenciados, talvez pelo receio do novo, o que compromete o processo de ensino aprendizagem dos estudantes em sala de aula. PALAVRAS-CHAVE: Metodologias; Contextualização; Ensino Médio e Superior. Leonardo Fantinel Universidade Franciscana (UFN) Santa Maria – Rio Grande do Sul RESUMO: O Ensino de Química vem sendo abordado por muitos pesquisadores atualmente, sendo alvo de discussões e preocupações no que diz respeito à maneira de ensinar um determinado conteúdo, e que esse seja significativo na formação dos estudantes. Para tanto, esse trabalho tem como objetivo investigar como está ocorrendo o ensino de química no Ensino Médio a partir da abordagem com alunos ingressantes no Ensino Superior. O instrumento de coleta de dados foi composto por um questionário estruturado contendo questões de múltipla escolha com alternativas claras e objetivas, a fim de obter respostas mais próximas da realidade de cada participante. O questionário foi aplicado aos alunos da graduação, sendo nove do curso de Farmácia, nove da Engenharia Biomédica CHEMICAL TEACHING: AN INVESTIGATIVE LOOK AT GRADUATE STUDENTS ABSTRACT: Chemistry Teaching has been approached by many researchers today, being the subject of discussions and concerns regarding the way to teach a certain content, and that this is significant in the formation of students. Therefore, this work aims to investigate how is teaching chemistry in high school from the approach with students entering higher education. The data collection instrument consisted of a structured questionnaire containing multiple choice questions with clear and objective alternatives, in order to obtain answers closer to the reality of each participant. The questionnaire was applied to undergraduate students, nine from the Pharmacy course, nine from Biomedical Engineering and ten from Chemical Engineering in a University of Santa Maria / RS. Through this study it can be seen A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 15 143 that in the current scenario, teachers do not use different resources, perhaps for fear of the new, which compromises the process of teaching students learning in the classroom. KEYWORDS: Methodologies; Contextualization; High and Higher Education. 1 | INTRODUÇÃO O Ensino de Química vem sendo abordado por muitos pesquisadores atualmente, sendo alvo de discussões e preocupações no que diz respeito à maneira de ensinar um determinado conteúdo, e que esse seja significativo na formação dos estudantes. Ensinar química nos dias atuais requer muita dedicação e estudo por parte dos professores em sala de aula, visto que, a maneira como se aborda um determinado conteúdo, pode ser muito positivo ou negativo na vida dos estudantes. Nessa perspectiva, Chassot (1990) destaca que, de modo geral, o que se encontra é um ensino de química que muito pouco tem contribuído para a transformação dos estudantes em cidadãos críticos, afirmando ainda que, da forma como tem sido praticado, esse ensino resulta em algo literalmente “inútil”, ou no paradoxo útil/ inútil, realmente útil, para manter o “status quo”. À continuação, o autor argumenta a favor de um ensino de química questionador que deve se transformar num ensino libertador. Para verificar como está ocorrendo o ensino de química na atualidade, bem como, analisar os tipos de metodologias que estão sendo trabalhadas em sala de aula, esse trabalho apresenta o seguinte objetivo: investigar como está ocorrendo o ensino de química no Ensino Médio com alunos ingressantes no Ensino Superior. Ao traçar o perfil dos alunos frente à temática de um grupo de acadêmicos do Ensino Superior, devidamente matriculados no primeiro semestre dos cursos de graduação, de uma Instituição de Ensino Superior, localizada na região central do estado do Rio Grande do Sul, buscamos primeiramente, conhecer um pouco do perfil de cada estudante, bem como, investigar como vem ocorrendo o Ensino de Química no Ensino Médio. Nosso interesse em recolher as informações que subsidiam o objetivo geral dessa pesquisa foi em um primeiro momento entrevistar alunos que continham disciplinas de Química em sua grade de horários em seus cursos de graduação, sendo eles, Engenharia Biomédica, Engenharia Química e Farmácia, contando com a participação de 27 alunos matriculados nos três cursos. Investigar o que os acadêmicos trazem em sua bagagem escolar a respeito do tema Ensino de Química pode nos ajudar a compreender melhor como vem sendo trabalhado esse conteúdo em sala de aula e as metodologias que estão sendo inseridas por professores em suas práticas pedagógicas. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 15 144 2 | O ENSINO DE QUÍMICA O ensino de química vem sendo investigado com muita cautela nos últimos anos, mostrando muitas vezes que a geração de alunos avançou e o ensino nem sempre acompanha tal avanço. Esse avanço muitas vezes acontece devido a estes alunos fazerem parte de um mundo mais interativo, onde o acesso de informações e as novas tecnologias invadem suas vidas de maneira muito rápida. E cabe ao professor avançar da mesma forma, seja na maneira como aborda determinado conteúdo, ou até mesmo na busca por metodologias mais atualizadas, que visam na contribuição de ensino e aprendizado mais dinâmico e que o mesmo fortaleça esse processo. Silva (2011) ao falar de avanços no ensino de química, traz alguns fatores que podem influenciar nesse processo de declínio que a química vem sofrendo atualmente: o baixo salário, metodologias de ensino em sala de aula ultrapassadas, falta de interdisciplinaridade e contextualização, redução na formação de licenciados em química, poucas aulas experimentais e desinteresse dos alunos. Ensinar química nos dias atuais ainda é considerado uma tarefa muito difícil para professores, visto que, as aulas ainda são desenvolvidas, em muitas escolas, por meio de atividades de repetição, fragmentação e esvaziamento do caráter social (SANTOS e MALDANER, 2010). E para tanto, ficam evidentes as dificuldades apresentadas no processo de ensino aprendizagem de química. A maioria dos professores faz a opção por uma metodologia tradicional, e os alunos por sua vez costumam ter certa dificuldade em adequar-se aos conteúdos apresentados por esta disciplina, por considerá-la abstrata e de difícil compreensão. Isso nos leva a uma busca incessante por alternativas que permitam reverter ou modificar essa realidade. Neste contexto, muitos estudos têm sido realizados com o objetivo de desenvolver alternativas metodológicas que possam contribuir para esse ensino (WANDERLEY et. al., 2005). Outro fator que pode estar contribuindo para uma evolução não positiva no ensino de química, é a maneira como grande parte dos professores de química acabam dando uma ênfase maior nos conceitos a serem transmitidos aos alunos e muitas vezes esquecem-se de apontar a aplicação no conteúdo. Seja na vida das pessoas, nos avanços tecnológicos e nos processos industriais, tais maneiras de ensinar não abordam totalmente a essência do objetivo principal do ensino de Química (PORTO, et al., 2014). Uma das grandes dificuldades no processo de ensino-aprendizagem da química é relacionar os conteúdos ministrados em sala de aula com o cotidiano. Diante deste contexto, torna-se necessária uma mudança metodológica utilizada por professores desta área, uma vez que, é apontada como um dos principais motivos A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 15 145 do descontentamento dos alunos no que tange ao desinteresse e ao baixo nível do aprendizado. Atualmente, o que se deseja é que as aulas de química sejam mais atrativas, possibilitando, assim, que o ensino comece a avançar de maneira mais significativa. Para isso, a inserção de tecnologias educacionais poderá fornecer um dinamismo necessário às mesmas, ou ainda a criação de materiais de baixo custo, visando atrair a atenção dos alunos. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN+) a contextualização no ensino não deve se basear na promoção de uma ligação artificial entre o conhecimento e o cotidiano do aluno. Deve ir muito além da utilização de simples exemplos ao final de cada capítulo abordado em sala de aula, isto é, propor “situações problemáticas reais e buscar o conhecimento necessário para entendêlas e procurar solucioná-las” (PCN+, 2002, p.93). Ainda segundo os documentos oficiais que regem a educação, “[...], no Brasil, a abordagem da Química escolar continua praticamente a mesma. Embora às vezes maquiada com uma aparência de modernidade, a essência permanece a mesma, priorizando-se informações desligadas da realidade vividas pelos alunos e pelos professores” (BRASIL, 1999, p.64). Pode-se perceber que é preciso que o professor comece a buscar a inserção de ferramentas educacionais e metodologias diferenciadas que visem essa desconstrução de aula ministrada somente por intermédio de conceitos e sem contextualização, de forma que os alunos comecem a gostar de química, conseguindo, por fim, utilizar alguns conceitos em sala de aula de forma a associar com o seu cotidiano, motivando-os no que diz respeito a sua aprendizagem. Ainda no que diz respeito à contextualização, o referido documento afirma: “Nunca se deve perder de vista que o ensino de Química visa a contribuir para a formação da cidadania e, dessa forma, deve permitir o desenvolvimento de conhecimentos e valores que possam servir de instrumentos mediadores da interação do indivíduo com o mundo. Consegue-se isso mais efetivamente ao se contextualizar o aprendizado, o que pode ser feito com exemplos mais gerais, universais, ou com exemplos de relevância mais local, regional. (BRASIL, 1999, p. 38)”. Neste contexto, é possível verificar a atual importância de incluir novas práticas e estratégias para ensinar química, avaliando como professores podem contribuir com a aprendizagem de forma a contextualizar os conteúdos ministrados em sala de aula, aumentando o interesse em aprender um determinado conteúdo, fortalecendo assim o processo de ensino- aprendizagem desse aluno. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 15 146 3 | METODOLOGIA Com o objetivo de investigar como está ocorrendo o ensino de química no Ensino Médio com alunos ingressantes no Ensino Superior, o presente estudo foi desenvolvido com alunos de graduação, matriculados no primeiro semestre nos cursos de Farmácia, Engenharia Biomédica e Engenharia Química em uma Instituição de Ensino Superior localizada na região central do Estado do Rio Grande do Sul, ambos na disciplina de Química Geral. Para se obter uma compreensão mais ampla dos resultados, o trabalho foi divido em três etapas que embasaram a realização dessa pesquisa. A primeira etapa foi constituída na elaboração de um questionário estruturado contendo 10 questões, o qual teve como objetivo verificar os conhecimentos químicos de ingressantes no Ensino Superior, assim como investigar o tipo de metodologias que os professores abordam em sala de aula com seus alunos na disciplina de Química. Os cursos escolhidos possuem em sua grade curricular ementas que contemplem disciplinas de química. O instrumento de coleta de dados foi composto por um questionário semiestruturado contendo questões de múltipla escolha com alternativas claras e objetivas com a finalidade de se obter respostas mais aproximadas da realidade de cada participante. O questionário foi aplicado com 9 alunos do curso de Farmácia, 9 de Engenharia Biomédica e 10 de Engenharia Química. A abordagem desta pesquisa caracteriza-se em caráter qualitativo e quantitativo. Segundo Deslauriers (1991) a análise qualitativa apresenta como objetivo da amostra a produção de informações aprofundadas e ilustrativas: seja ela pequena ou grande, tendo como enfoque a produção de novas informações. Fonseca (2002) descreve uma visão diferenciada sobre este de abordagem: “Diferentemente da pesquisa qualitativa, os resultados da pesquisa quantitativa podem ser quantificados. Como as amostras geralmente são grandes e consideradas representativas da população, os resultados são tomados como se constituíssem um retrato real de toda a população alvo da pesquisa. A pesquisa quantitativa se centra na objetividade. Influenciada pelo positivismo, considera que a realidade só pode ser compreendida com base na análise de dados brutos, recolhidos com o auxílio de instrumentos padronizados e neutros. A pesquisa quantitativa recorre à linguagem matemática para descrever as causas de um fenômeno, as relações entre variáveis, etc. A utilização conjunta da pesquisa qualitativa e quantitativa permite recolher mais informações do que se poderia conseguir isoladamente” (FONSECA, 2002, p. 20). Baseado no exposto, é possível perceber que a pesquisa quali e quantitativa, embora possuam diferentes abordagens metodológicas, não são excludentes e podem, dependendo dos objetivos que a investigação propõe, ser utilizadas em conjunto. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 15 147 4 | RESULTADOS E DISCUSSÕES Para obtenção e análise dos resultados, conforme mencionado anteriormente, foi aplicado aos acadêmicos um questionário semiestruturado. Esse questionário foi divido em duas categorias, a primeira que visa conhecer o perfil dos acadêmicos participantes desse estudo e a outra que aborda questões relacionadas as aulas de química durante o seu percurso no Ensino Médio. Os acadêmicos participantes desse estudo apresentaram uma faixa etária entre 17 e 31 anos de idade, sendo que a predominância é entre 17 e 20 anos de idade. Com relação aos participantes dessa pesquisa, 32% dos estudantes são oriundos de escola pública e que 68% de escola privada. Outra questão que foi abordada aos alunos, foi se em sua escola havia laboratório de Ciências/Química, onde 74% dos estudantes informaram que sua escola havia laboratório de Ciências/Química e que 26% não. Um dado que vale ressaltar, é que desses 74%, 4 deles afirmaram que em sua escola “até tinha laboratório, porém este era utilizado para outros fins”. A preocupação com essa questão do não uso do laboratório nas aulas de Química vem se mostrando preocupante ao longo dos anos. Diferentes autores, como Moreira e Diniz (2003); Silva e Machado (2008); Maia (2010) e Santana (2011) destacam com preocupação o mau uso destes laboratórios, ou a sua utilização para outros fins. Desconsiderando a utilização do ambiente laboratorial como um recurso para ensinar uma determinada disciplina. Também foi investigada a forma como os professores utilizavam em seu planejamento as aulas experimentais como auxílio para explicar algum conteúdo. Pôde-se perceber que 55,55% dos estudantes responderam que sim, e 44,45% não. Este dado revelou que, por mais que exista uma porcentagem maior de professores que apliquem determinado experimento, ainda é pouco numeroso. Uma vez que os experimentos são atividades que deveriam fazer parte do cotidiano de um professor de Química. A falta de experimentação nas aulas de Química, vem sendo questionada durante muito tempo por alguns pesquisadores da área, como Pessoa et al. (1985), Galiazzi et al. (2001), Maldaner (2003) e Borges (2002). Estes descrevem diversos relatos em suas pesquisas sobre este tema, destacando algumas justificativas, tais como: a falta de atividades experimentais já preparadas e de fácil acesso aos professores, pouco tempo do professor para planejar e construir seus experimentos, visto que a carga horária é menor que o necessário, recurso insuficiente para reposição e compra de equipamentos e materiais. Um dos fatores essenciais para a compreensão do conhecimento químico é a contextualização em sala de aula, utilizar exemplos do cotidiano faz com que os A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 15 148 alunos associem o conhecimento químico e aprendam de forma mais eficaz e com uma maior compreensão. Devido a essa questão, foi perguntado aos estudantes se o professor trabalha a disciplina de maneira contextualizada. De acordo com as respostas, 44,45% dos estudantes informaram que seus professores não trabalham de forma contextualizada em sala de aula. E quando se fala em contextualizar não podemos pensar em somente associar um determinado conteúdo com o cotidiano do aluno, contextualizar é muito mais que isso, é propor “situações problemáticas reais e buscar o conhecimento necessário para entendê-las e procurar solucionálas” (PCN+, p.93). Uma das perguntas respondidas pelos alunos é se a Química do Ensino Médio está agindo como um mediador para a química estudada no Ensino Superior. Essa questão merece uma reflexão, pois, 51,86% dos estudantes informaram que a Química ministrada no ensino médio não foi mediadora. A falta de contextualização durante a abordagem de um determinado conteúdo em sala de aula, pode ter sido o fator determinante para essa quantidade expressiva de alunos que responderam não ao questionamento. Foi questionado, também, nesta pesquisa sobre os tipos de recursos diferenciados utilizados pelo professor em sala de aula. O livro didático foi sinalizado como o recurso mais utilizado por 74,04% dos estudantes. Seguido pelos experimentos químicos, com 14,81% e 11,15% utilizando filmes. As respostas dos alunos frente a este questionamento, está em acordo com os relatos publicados pelos autores Delizoicov, Angotti e Pernambuco (2007), os quais apresentam em suas pesquisas que na maioria das salas de aula, o principal instrumento de trabalho do professor é o Livro Didático. 5 | CONCLUSÃO A disciplina de química apresenta a experimentação como uma grande ferramenta para compreenção de conceitos mais abstratos, a qual está sendo muito pouco utilizada, mantendo, ainda, o livro didático como o recurso mais utilizado. Através dos resultados obtidos neste estudo, pode-se constatar que o ensino de química não tem apresentado muitas inovações em sala de aula quando referese a metodologias diferenciadas. No cenário atual, os professores não utilizam recursos diferentes, talvez pelo receio do novo, o que pode dificultar o processo de ensino-aprendizagem. Pois a utilização de tais recursos favorecem o desenvolvimento da aprendizagem dos alunos, pois propiciam meios de motivá-los e envolvê-los com o conteúdo que está sendo abordado em sala de aula. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 15 149 REFERÊNCIAS BORGES, A. T. Novos rumos para o laboratório escolar de ciências. Caderno Brasileiro de Ensino de Física, v. 19, n. 3, p. 291-313, 2002. BRASIL, Ministério da Educação, Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais: ensino médio. Brasília: Ministério da Educação, 1999. BRASIL. Ministério da Educação (MEC), Secretaria de Educação Média e Tecnológica (Semtec). PCN + Ensino médio: orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais – Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias. Brasília: MEC/Semtec, 2002. CHASSOT, A. I. A educação no ensino da Química. Ijuí: INIJUÍ, 1990. DESLAURIERS, J. & KÉRISIT, M. 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Especialista em Psicopedagogia vanussa30@yahoo.com.br Ingrid Cibele Costa Furtado Prof. Esp. Orientadora Ingridcosta2011@hotmail.com RESUMO: Este artigo objetiva refletir a importância do lúdico como aliado no ensino e inclusão de alunos com deficiência intelectual no nível do fundamental, idade de grandes descobertas e intensa relação como meio. Em se tratando de um alunado com deficiência intelectual, como em qualquer nível, o desafio é a oferta de um ensino com metodologias que atendam melhor as suas especificidades e favoreça o processo de inclusão. Segundo a perspectiva inclusiva, aceitar as diferenças implica respeitar as características, os interesses, as motivações e os projetos de vida de cada criança, o que só é possível criando estratégias e recursos. A partir daí pensa-se em uma escola de qualidade como sendo aquela que oferte em seus espaços de aprendizagem salas de aula comum que contemple entre seus recursos metodológicos o lúdico. Temse como referência neste trabalho: Montessori (1965), Rosamilha (1979), Cunha (1998), Maluf (2003), Dalabona e Mendes (2004), Kishimoto (apud LUCENA, 2004), Antunes (2005, 2006), Kishimoto (2005), autores que defendem o brincar como importante atividade para o desenvolvimento e o reconhecem como atividade experiencial e caminho para o trabalho pedagógico. Este estudo está fundamentado em pesquisas bibliográficas de metodologia qualitativa buscando uma melhor compreensão da realidade do objeto em questão. A linha de Pesquisa utilizada segue a LP3 Práticas educativas e de prevenção processos e problemas. Conclui-se que a atuação do método lúdico tem uma importante função de favorecer o desenvolvimento cognitivo, físico, psicológico e social, fundamentais para a inclusão da pessoa com deficiência intelectual. PALAVRAS-CHAVE: Lúdico. Recurso metodológico. Deficiência intelectual. THE LÚDICO AS A METHODOLOGICAL RESOURCE IN THE INCLUSION OF STUDENTS WITH INTELLECTUAL DEFICIENCY IN FUNDAMENTAL TEACHING ABSTRACT : The present article aims to reflect the importance of play as an ally in the teaching and inclusion of students with intellectual deficiency at the fundamental level, the age of great discoveries and intense relation with the environment. In the case of a group of A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 16 152 students with intellectual disabilities, as at any level, the challenge is to offer a teaching methodologies that better meet their specific needs and favor the process of inclusion. According to the inclusive perspective, accepting the differences implies respecting the characteristics, interests, motivations and projects of life of each child, which is only possible by creating strategies and resources, from there we think of a quality school as being that that offers in its spaces of learning common classrooms that contemplate between its resources methodological the ludic. We have as reference in this work Montessori (1965), Rosamilha (1979), Cunha (1998), Maluf (2003), Dalabona and Mendes (2004), Kishimoto (apud LUCENA, 2004), Antunes (2005, 2006), Kishimoto (2005), as an important activity for development and recognize it as an experimental activity and way to the pedagogical work. This study is based on bibliographic researches of qualitative methodology seeking a better understanding of the reality of the object in question. The line of research used follows the LP3 Practical educational and prevention processes and problems. It is concluded that the action of the play method has an important function of favoring the cognitive, physical, psychological and social development so important for the inclusion of the person with intellectual disability. KEYWORDS: Playful. Methodological. Intellectual deficiency. 1 | INTRODUÇÃO É direito de todas as crianças uma educação em sala de ensino regular, em escolas da comunidade, com oferta de um ambiente educativo enriquecedor e que atenda às necessidades pedagógicas de cada aluno com sua especificidade, além de ofertar experiências significativas de qualidade. Este estudo buscou compreender “O lúdico como recurso metodológico na inclusão de alunos com deficiência intelectual no ensino fundamental” por meio sistêmico de pesquisa bibliográfica com os principais autores que abordam o lúdico, o desenvolvimento da pessoa com deficiência intelectual e a utilização e benefícios desse lúdico enquanto recurso de aprendizagem e inclusão. Segundo a perspectiva inclusiva, aceitar as diferenças implica respeitar: características, interesses, motivações e os projetos de vida de cada criança, o que só é possível criando estratégias e recursos. A partir daí pensase em uma escola de qualidade como sendo aquela que oferte em seus espaços de aprendizagem salas de aula comum e salas de recursos que contemplem entre seus recursos metodológicos, o lúdico. O lúdico é um recurso metodológico muito utilizado por profissionais da educação por suas importantes contribuições na aprendizagem de alunos com deficiência intelectual e no avanço do processo inclusivo. Comprovadamente, autores como: Montessori (1965), Rosamilha (1979), Cunha (1998), Maluf (2003), Dalabona e Mendes (2004), Kishimoto (apud LUCENA, 2004), Antunes (2005, 2006), Kishimoto A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 16 153 (2005) têm demonstrado sua eficácia em diversas áreas do desenvolvimento humano. As práticas lúdicas usadas no método de aprendizagem educacional possibilitam a qualquer aluno, independente de suas limitações, uma aprendizagem significativa. E, sendo esta uma necessidade, cabe ao professor permitir que seus alunos participem de atividades importantes, condizentes com uma aprendizagem mais significativa. Na verdade, o lúdico como proposta metodológica, é uma oposição à escola que é tão uniformizadora quanto excluidora. Ao inverter o processo de aprendizagem, impondo valores e conteúdos universais sem partir da prática social e cultural da criança, a escola desconsidera sua identidade e diferenças. Acredita-se que para instigar o sujeito e proporcionar seu desenvolvimento e inclusão é preciso propor atividades prazerosas, desafiadoras, significativas, que despertem o interesse e a sociabilização. Desse modo, as atividades lúdicas podem ser uma excelente ferramenta pedagógica de desenvolvimento e inclusiva. É nítido que a abordagem lúdica seja integradora dos aspectos motores, cognitivos, afetivos e sociais, partindo do pressuposto de que é brincando e jogando que a criança aprende e ordena o mundo à sua volta, percebendo experiências e conhecimentos e, sobretudo, introduzindo princípios, atitudes e valores entre os alunos, favorecendo a aceitação, o acolhimento, a valorização e inclusão de alunos com deficiência intelectual. Na busca de refletir sobre questões como estas, propôs-se o desenvolvimento de uma pesquisa de revisão bibliográfica, de metodologia qualitativa buscando conhecer o objeto e fenômeno real seguindo uma linha de pesquisa PL3 por focar nas Práticas educativas e de prevenção, processos e problemas. Se bem aplicado e compreendido, o recurso lúdico poderá se constituir em um importante recurso para melhoria da aprendizagem e inclusão do aluno com deficiência intelectual em atividade escolar na sala de aula regular. 2 | O LÚDICO NO ÂMBITO ESCOLAR As brincadeiras e os jogos são muito utilizados como recurso de ensino, principalmente, na Educação Infantil e nas séries iniciais do Ensino Fundamental. Utilizar a brincadeira como recurso no processo de ensino é aproveitar a motivação interna que as crianças têm para tal comportamento e tornar mais atraente a aprendizagem de conteúdos escolares, além de favorecer a interação entre elas (CORDAZZO; VIEIRA, 2007). Dentro do campo dos avanços que a educação já apresenta, observa-se que há uma nova maneira de valorização da criança e do lúdico, fruto de lutas sociais de constantes reivindicações para que a criança fosse reconhecida em suas necessidades, dentre elas a de brincar na escola: A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 16 154 Apesar do compromisso com um “resultado escolar” que a escola prioriza e que, em geral resulta numa padronização, estão em jogo na Educação da criança as garantias dos direitos ao seu bem-estar, à expressão, ao movimento, à segurança, à brincadeira, à natureza, e também ao conhecimento produzido e a produzir (ROCHA, 2001, p. 32). Para Kishimoto (apud LUCENA, 2004, p. 43), A utilização do jogo potencializa a exploração e a construção de conhecimento, por contar com a motivação interna, típica do lúdico, mas o trabalho pedagógico requer a oferta de estímulos externos e a influência de parceiros, bem como a sistematização de conceitos que não jogos. Ao utilizar de modo metafórico, a forma lúdica (objeto suporte de brincadeira) para estimular a construção do conhecimento, o brinquedo educativo conquistou um espaço definitivo na educação infantil. Nesta referida perspectiva, o brincar na educação pode ser considerado um instrumento de motivação e estímulo a diversas habilidades como a expressão do pensamento e a linguagem, a compreensão do mundo à sua volta, a percepção de si e dos outros, a resolução de conflitos e na construção de valores éticos, que vão refletir em toda sua vida social também. Jesus (2011) chama a atenção para alguns teóricos que defendiam a perda do caráter funcional lúdico ao brinquedo, quando este era desenvolvido com finalidade educativa de desenvolver alguma habilidade, entre estes autores Kishimoto (1998, p. 15) ao afirmar que o [...] jogo educativo apresenta duas funções: a lúdica, que implica na escolha voluntária do jogo e a educativa, sendo que o jogo é colocado como algo que auxilia na aprendizagem e na noção de mundo. O jogo educativo ocorre pela união das características da educação e do jogo, sendo necessário o equilíbrio entre a liberdade característica do jogo e o objetivo de ensinar conteúdos da educação. Quando ocorre o desequilíbrio entre essas características o brinquedo utilizado no jogo deixa de ser brinquedo para se tornar um material pedagógico ou didático e isso acaba interferindo na aprendizagem, uma vez que as características principais se perdem. A necessidade de compreender, conhecer e reconhecer as particularidades na atividade lúdica de cada criança como forma de estarem no mundo, de serem, de se empregarem em uma atividade útil a favor e não contra a sua própria natureza, é o que Rosamilha (1979, p. 77) enfatiza, ao dizer que: Criança é antes de tudo, um ser feito para brincar. O jogo, eis ai um artificio que a natureza encontrou para levar a criança a empregar uma atividade útil ao seu desenvolvimento físico e mental. Usemos um pouco mais esse artifício, coloquemos o ensino mais ao nível da criança, fazendo com que seus instintos naturais sejam aliados e não inimigos. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 16 155 Como no ambiente escolar, o professor é o encarregado da aprendizagem das crianças e será ele quem fará o convite para a realização das atividades lúdicas e quem irá promover “as condições de sustentação da experiência lúdica que está na origem do processo de conhecer” (ROSA, 2002, p. 104 apud JESUS, 2011, p. 23). Ao se apresentar uma brincadeira a uma criança, individual ou grupal, não há passividade nesta ação, a criança é convidada a pensar, dialogar, se mexer, rir, interagir ou se concentrar, de forma que aja e reaja no meio onde está, proporcionando um crescimento global. Desta forma desenvolve processos mentais superiores, ao mesmo tempo em que se torna participante efetivo do seu meio sociocultural, avançando para outras formas de aprendizagem. Maranhão (2005, p. 33), destaca o pensamento de Vygotsky que entende a brincadeira como uma atividade social da criança, por meio desta, a criança adquire elementos imprescindíveis para a construção da sua personalidade e para compreender a realidade da qual faz parte. Ele apresenta a concepção da brincadeira como sendo um processo e uma atividade social infantil. Carmo (2015, pg 17) traz uma importante citação a respeito de como Piaget abordou a importância do lúdico em sua concepção a respeito do estágio evolutivo na criança: “A brincadeira representa um fator de grande importância no processo de desenvolvimento e socialização dos alunos, proporcionando-lhes descobertas marcantes, estruturadas em estágio evolutivo, seguindo a abordagem de Piaget. No início é predominante o jogo de exploração, por meio do estágio sensóriomotor, onde o aluno manipula e explora os objetos, consolidando os movimentos de repetição e reorganização; no pré-operatório a atividade dominante é o jogo simbólico, nele a criança pode perceber que um objeto pode figurar qualquer outra coisa; e, por fim, as operações concretas: nesse período a atividade dominante é o jogo de regras, sendo fundamental para o desenvolvimento das capacidades intelectuais. Nele a criança começa a compreender suas obrigações perante o coletivo. As brincadeiras e os jogos, por conseguinte, constituem-se indispensáveis ao processo de desenvolvimento infantil, dos quais a criança atravessa estágios caracterizados por situações de desenvolvimento específicas da fase para a construção de sua aprendizagem. A respeito do brinquedo, Jesus (2011) traz a classificação de Kishimoto (2001), ao afirmar que este pode ser de dois tipos: o primeiro é aquele utilizado de forma livre, onde o professor valoriza a socialização das crianças; e o outro é aquele no qual ocorre a valorização e aquisição de conteúdos, que a autora chama de brincar dirigido e jogo. A criança também pode sinalizar por meio do lúdico que a sua sociabilização não anda boa, assim como possa está passando por algum problema ou conflito dentro da própria sala. Muller (2006, p. 51), no capítulo destinado a brincadeira A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 16 156 e a autoestima chama atenção para uma importante função da brincadeira como um fator importantíssimo e indispensável ao desenvolvimento intelectual, afetivo e social: “A brincadeira é a via natural da expressão das crianças, produz nelas alegria e as estimula a explorar o mundo que as rodeia. Quando brinca, a criança se sente contente com ela mesma, e quando brinca com os outros se sente parte de um grupo, o que tem sido descrito como mais relacionados à auto-estima”. A inclusão da criança em uma atividade lúdica favorece o contato dela consigo mesma e sua liberdade emocional como explicitado pelo autor. O brinca a leva a se expor e torna qualquer outra atividade posterior mais fácil. A recusa de participar de atividades lúdicas pode sinalizar que algo emocionalmente não vai bem com a criança no campo social e emocional. Muller (2006, p. 52) prossegue afirmando que a brincadeira proporciona à criança um meio para expressar seus sentimentos, suas ideias e é uma mostra do enorme impulso para auto-realização que existe na infância. A brincadeira nas atividades de aprendizagem dá segurança à criança frente ao aprender e lhe permite associar aprendizagem com prazer, o que é uma característica das crianças com uma boa autoestima acadêmica. Na medida em que se sentem inteligentes e capazes elas apresentam interesse em continuar aprendendo. A escola atualmente tem a responsabilidade de perceber e aceitar seus alunos com suas necessidades e motivações diferenciadas e, a partir daí, ofertar também metodologias distintas que atendam a essas necessidades para seu bom desempenho educacional e global. O lúdico, por conseguinte, tem se mostrado como importante recurso de desenvolvimento e inclusão. 3 | O DEFICIENTE INTELECTUAL E A INCLUSÃO Várias crianças em idade para o ensino fundamental matriculadas nas escolas, nem sempre se encontram inseridas, somente passam por lá. Não aproveitam realmente aquilo que aquele espaço poderia proporcionar-lhes, seja porque a forma de ensinar não lhes seduz ou não é a mais adequada, seja porque possuem comportamentos fora do padrão esperado, como comportamentos que Winnicott (1987) denomina de antissociais e, igualmente, possuem dificuldades expressivas na aprendizagem, que as estigmatizam na maioria das vezes (MAIA, 2009 apud MAIA, 2014). Discorrendo historicamente da educação do deficiente intelectual, Pessotti (1984 apud ROSA, 2017), quando destaca a educação de 1839 com SÉGUIN que abriu a primeira escola do mundo para crianças e jovens com deficiência intelectual, A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 16 157 onde desenvolveu um método de tratamento e, mais tarde, apresentou a pedagogia baseada nas funcionalidades da inteligência, ilustrada com vários exemplos de sua aplicação. Tal educação era voltada para o diagnóstico, avaliação e higiene destes e, posteriormente, é criada a educação do sistema muscular e ginástica e ainda a educação do sistema nervoso. SÉGUIN trata da “idiotia” pelo método fisiológico, afirmando que seu método “aliviava” as dificuldades encontradas pelas pessoas com deficiência intelectual. Ele propunha uma educação que considerasse a pessoa integralmente em todos os aspectos e interesses. Nesse sentido, ele construiu as bases que tramitam entre saúde e educação da pessoa com deficiência intelectual que delineou, posteriormente, a educação especial e influenciou teóricos como Maria Montessori que posteriormente criaria uma teoria baseada no concreto e uso de recursos lúdicos. Em seu trabalho com destaque às considerações de Pessotti (1984, p. 24 apud ROSA (2017, p. 34) prossegue discorrendo historicamente e diz que foi principalmente na Europa, a educação da pessoa com deficiência, iniciada no Século XVIII, apontava como esses indivíduos eram segregados e protegidos em instituições residenciais e hospitalares: “Não se pune nem se abandona o deficiente, mas também não se sobrecarrega o governo e a família com sua incômoda presença”. Já no Século XIX há uma ruptura do modelo com enfoque clínico para uma proposta pedagógica, pois florescem os ideais do naturalismo na época, e é com Itard, médico reconhecido, que nasce o conceito da educação especial entendida como intervenção pedagógica, mas ele desafia a visão estática e irreversível a respeito da pessoa com deficiência intelectual por meio da experiência educativa com Victor, o selvagem de Aveyron. Garoto este que foi acompanhado em uma escola para surdos-mudos por uma equipe multiprofissional, dentre eles o psiquiatra Pinel que o diagnosticou com deficiência Intelectual. Foi com Itard, aluno de Pinel, que Victor passou por um processo educacional para reintegração na sociedade. Seu trabalho marcou importantes avanços na Educação Especial (ROSA, 2017). Durante décadas, vários autores trouxeram concepções variadas acerca do que seria a deficiência intelectual, alguns de visões e vertentes biológicas, médicas e institucionais. Atualmente vem sendo muito bem aceita a definição da Associação Americana de Deficiência Mental (AAMR) e o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtorno Mentais (DSM - V), podendo-se conceituar a deficiência hoje de deficiência intelectual como sendo um estado de redução notável do funcionamento intelectual inferior à média, associado a limitações pelo menos em dois aspectos do funcionamento adaptativo de comunicação, cuidados pessoais, competência doméstica, habilidades sociais, utilização dos recursos comunitários, autonomia, saúde e segurança, aptidões escolares, lazer e trabalho. Conforme preconizam esses mesmos critérios de classificação internacional, A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 16 158 sabe-se que este se trata de um transtorno do desenvolvimento, um rebaixamento da função intelectiva que aparece antes dos 18 anos. Para tanto, se faz necessário um diagnóstico mais técnico, minucioso e cauteloso com a presença de vários aspectos. Na Deficiência Intelectual, quando comparada a parâmetros de quociente de inteligência (QI) ela se apresenta inferior a 70, média presente na população considerada sem deficiência mental, conforme testes psicométricos que vão de provas, roteiros e escalas baseados em teorias da psicogenética. Vale lembrar que aqui no Brasil e em muitos países já se abandonou mais esses referenciais de QI como determinantes no diagnóstico. Vários são os quadros apresentados por alunos que apresentam como dificuldade a deficiência intelectual, dentre eles a Síndrome de Down, alguns autistas, outras síndromes e deficiências múltiplas. Contudo, o paradigma da inclusão já é algo bem presente no nosso tempo e tem ganhado espaço, em diferenciação com a integração, que só inseria esse aluno no espaço da escola. Esse paradigma trabalha a conscientização de que a escola é para todos, aberta às diferenças, prima pelas especificidades de cada aluno, especialmente aqueles excluídos do sistema tradicional e pela sociedade. Com a Constituição Federal de 1988, oficializou-se o princípio da inclusão na educação, assegurando aos portadores de deficiência a preferência em estudar na rede regular de ensino, com garantia de atendimento especializado e outras adaptações e remoções de barreiras, entre outros. Daí em diante percebe-se uma série de documentos que surgiriam para promoção do atendimento educacional especializado na rede regular de ensino. Para discorrer sobre esse importante momento de fomento da inclusão, Carmo (2015, p.15) cita Aranha (2004, p.7): “A escola inclusiva é aquela que garante a qualidade de ensino educacional a cada um de seus alunos, reconhecendo e respeitando a diversidade e respondendo a cada um de acordo com suas potencialidades e necessidades. Segundo a autora a escola só poderá ser considerada inclusiva quando estiver organizada para favorecer a cada aluno, independentemente de etnia, sexo, idade, deficiência, condição social ou qualquer outra situação. É por meio da educação inclusiva que se integram e efetivam ao ambiente escolar, conceitos como aceitação e valorização das diferenças, desenvolvimento de potencialidades, integração, respeito, que é o que transforma o espaço escolar em um espaço igualitário e de oportunidade a todos. Desta forma, enquanto parte de uma sociedade, a escola inclusiva tem contribuído com a aceitação, a inclusão e acessibilidade das pessoas com deficiência. Atualmente é perceptível a presença de crianças com deficiência na escola em classes regulares, em salas de atendimento educacional especializado (AEE), mas ainda se fazem necessários à continuidade dos estudos e a melhoria das leis que A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 16 159 asseguram esse importante direito à pessoa com deficiência. “Pressupõe-se, conceitualmente, que todos, sem exceção, devem participar da vida acadêmica, em escolas ditas comuns e nas classes ditas regulares onde deve ser desenvolvido o trabalho pedagógico que sirva a todos, indiscriminadamente” (CARVALHO, 1998, p. 170). Para Antunes (2006), a inclusão significa que o aluno esteja na escola, participando, aprendendo e desenvolvendo suas potencialidades. Um outro aspecto da inclusão consiste em identificar barreiras que impedem os alunos de adquirirem conhecimentos acadêmicos, podendo ser estas: a organização da escola, o prédio, o currículo, a forma e os recursos utilizados e o próprio preconceito presente entre profissionais e alunos da escola. Dentro da dinâmica de ensino inclusivo não se pode perder de vista o aluno enquanto sujeito único e com suas necessidades individuais. E, para tanto, as escolas devem estar preparadas para ser espaço inclusivo, mas nem todas estão adequadas para receber e incluir seus alunos com deficiência, grande parte alega falta de estrutura e preparo dos professores. Indo mais além percebe-se, que estão despreparados também sobre a utilização do recurso lúdico em sala em benefício da inclusão de seus alunos. E por que não levar essas questões à escola e mostrar os benefícios desse importante recurso na inclusão? 4 | O LÚDICO COMO METODOLOGIA NA EDUCAÇÃO INCLUSIVA Nos primórdios das antigas civilizações já se retratavam a utilização dos jogos como parte da vida das crianças e adultos e como forma de os apresenta-los e inseri-los à sociedade. Dentro desse contexto a criança participava ativamente, como numa espécie de ritual de passagem para a vida adulta, utilizando os mais diversos tipos de jogos. Ferreira (1997, p.16) explicita melhor esse rito e prática em sua obra: “Uma outra atividade, de caráter ritualístico, na qual estava presente o lúdico de forma muito significativa para o homem antigo, foi a dança, onde este exibia suas qualidades físicas, seus sentimentos pela caça e pela pesca feliz, ou a dramatização de qualquer evento que merecesse destaque, como os nascimentos e os funerais. A dança representava, pelo que se pode perceber, um papel fundamental no processo de educação, por se fazer presente em todos os ritos que preparavam para a vida social”. Na citação acima, percebe-se que as antigas civilizações adotavam em seus afazeres ritualísticos, inúmeros procedimentos que envolviam o lúdico, destacandose principalmente a brincadeira proporcionada pela dança, que representava, entre outras coisas, o prazer e a diversão da caça e da pesca, simbolizando em suas coreografias, elementos da educação tribal, necessários para os indivíduos A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 16 160 pertencentes ao Clã. A dança, nesse contexto adquiria um caráter do rito de passagem, de cerimônia de transformação (onde o adolescente aprendia a ser adulto), cuja utilidade expressava-se, ainda, na estruturação do caráter dos jovens já em idade quase adulta, preparando-os oficialmente para uma inclusão/apresentação a sociedade. O brincar é necessidade inata humana, é uma forma de expressão, de comunicação que os seres humanos possuem desde o nascimento. É uma atividade humana social de contexto cultural, em que os homens utilizam a imaginação e a fantasia para interagir com a realidade que o cerca e redimensionar com novas ações, e indo mais além, servia de atividade ritualística para apresentá-la a sociedade. Segundo o Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil, quando se trata da educação de crianças, as atividades deverão ser apropriadas às suas necessidades (BRASIL, 1998): Brincar é uma das atividades fundamentais para o desenvolvimento da identidade e autonomia. O fato de a criança, desde cedo poder se comunicar por meio de sons, gestos e mais tarde representar determinado papel nas brincadeiras faz com que este desenvolva a imaginação. Nas brincadeiras as crianças podem desenvolver algumas capacidades importantes, tais como atenção, a imitação, a memória, a imaginação, amadurecem também algumas capacidades de socialização, por meio da interação e da utilização de experimentação de regras e papéis sociais. [...] o aprendizado desperta vários processos internos de desenvolvimento, que são capazes de operar somente quando a criança interage com pessoas em seu ambiente e quando em cooperação com seus companheiros. Uma vez internalizados, esses processos tornam-se capazes de aquisições do desenvolvimento independente da criança. (VYGOTSKY, 2002, p. 117-118). Neste sentido com o lúdico, a criança interage com o mundo, favorecendo a iniciativa, a autoconfiança e a autonomia, fatores significativos para a aprendizagem (JULIANI; PAINI, [2008]). O brincar na sala torna-se um importante momento de aprendizado por meio da coletividade e cooperação. A importância do brincar consiste em desenvolver por meio das relações que vão consolidando sua identidade, sua autonomia, imagem de si e do mundo que o cerca (MALUF, 2003). O grande potencial de desenvolvimento que tem o brinquedo nas mãos de uma criança é destacado na obra de Cunha (1994 ) apud Maluf, (2003), quando esta diz que brincando a criança desenvolve suas potencialidades. Os desafios ocultos no brincar fazem com quem a criança pense e alcance melhores níveis de desempenho. A autora segue com o pensamento de outro grande teórico a respeito do brincar; Winnicott (1975) quando traz uma contribuição ao formular que a criança, dentro do seu mundo, tem o prazer em todas as experiências de brincadeiras, um prazer que é físico e mental. Quando brincam, as crianças demonstram sua criatividade, A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 16 161 imaginação e inteligência. Desenvolvem capacidades e habilidades para sua futura atuação profissional, tais como atenção, concentração, memória etc. É por esses fatores, que o brincar como elemento criativo é importante mobilizador de ações, consegue desencadear processo de aprendizagem, torna a criança um sujeito ativo no processo de aprender, à medida que pratica uma atividade ativadora de prazer e de vários sistemas cognitivos desencadeadores do desenvolvimento. Desse modo, Davýdov (1982, p. 180) destaca o papel importante da forma com que se ensina, da relevância deste, para se desenvolver funções psíquicas superiores, no processo de apropriação da aprendizagem. Quando pensado na importância de desenvolver habilidades intelectivas é de fundamental importância à escolha da metodologia e do recurso: “A maneira pela qual o ensino está organizado intervém no desenvolvimento intelectual do sujeito, ou seja, “o ensino constitui a forma internamente indispensável e geral de desenvolvimento intelectual”. Rosa (2002) destaca que se nem o aluno nem o professor tiverem a capacidade de brincar não haverá um “espaço potencial”, não havendo a comunicação e o desenvolvimento necessário para a aprendizagem dentro da atividade lúdica. Assim, o brincar é a tarefa do dia a dia da criança que nem pais e educadores ou professores conseguirão transmitir, pois é vivência. O professor enquanto mediador do processo de aprendizagem e inclusão em sala deverá estar atento e ser o maior incentivador da atividade lúdica, respeitando o tempo do seu aluno, sobretudo a criança com deficiência intelectual e/ou múltipla, fazendo cumprir importantes orientações norteadoras do nosso ensino. Kishimoto (2011 apud JESUS, 2011, p. 23) ressalta a importância de o professor participar e mediar às atividades lúdicas em sala: [...] podemos perceber que o jogo educativo é um recurso que pode ser bastante produtivo; contudo, não adianta possuir o melhor jogo educativo se o professor não souber estimular as crianças, torna a sua utilização significativa e participar dos jogos e brincadeiras propostos. Para o jogo ser realmente eficiente o professor tem que participar durante o desenvolvimento da atividade lúdica, sendo que deve ocorrer a mediação entre a atividade lúdica e o aprendizado que ela trará. Sendo que esta mediação pode ser realizada por meio de sujeitos (como o professor, a mãe ou um amigo), de objetos e artefatos, por que a mediação é importante no processo educativo. Em especial no processo inclusivo. Toda a aprendizagem e preparo para ações futuras que o brincar proporciona para o desenvolvimento educativo da criança é fundamental para a sua formação e etapas de vida, torna o ambiente acolhedor, encorajador e desmistificador de receios e medos. Dalabona e Mendes (2004, p. 109) destacam: É preciso respeitar o tempo da criança ser criança, sua maneira absolutamente original de ser e estar no mundo, de vivê-lo, de descobri-lo, de conhecê-lo, tudo simultaneamente. É preciso quebrar alguns paradigmas que foram sendo criados. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 16 162 Brinquedo não é só um presente, um agrado que se faz a criança: é investimento em crianças sadias do ponto de vista psicossocial. Ele é a estrada que a criança percorre para chegar ao coração das coisas, para desvelar os segredos que lhe esconde um olhar surpreso ou acolhedor, para desfazer temores, explorando o desconhecido. No desenvolvimento escolar elas começam a demonstrar seus dotes criativos em atividades individuais ou em grupos, observa-se um melhor desempenho nas atividades que requeiram inteligência, imaginação, atenção e concentração, habilidades psicomotoras que, consequentemente, desenvolverão capacidades indispensáveis à sua futura atuação acadêmica e profissional. Segundo Rolim, Guerra e Tassigny (2008, p. 45), O brincar relaciona-se ainda com a aprendizagem. Brincar é aprender; na brincadeira, reside à base daquilo que, mais tarde, permitirá à criança aprendizagens mais elaboradas. O lúdico torna-se, assim, uma proposta educacional para o enfrentamento das dificuldades no processo de ensino-aprendizagem. Ainda com Abrantes (2010 apud Carmo, 2015, p. 17) podemos inferir que: “O jogo possui vários objetivos pedagógicos como: trabalhar a ansiedade dos alunos por meio das atividades que exigem concentração; rever limites, pois é pelo jogo que o aluno se enquadra em regras, reagindo com suas emoções para aprender a ganhar e perder, aprendendo inclusive a respeitar e ser respeitado; proporcionar confiança em si e nos outros, estimular a autoestima; confeccionar jogos, fazendo que a criança tenha oportunidade de errar, acertar, construir,criar, copiar, desenvolver planos aumentando sua autoestima, acreditando que é capaz de fazer muitas coisas para si; desenvolver a autonomia, proporcionando ao aluno a oportunidade de responsabilizar-se por suas escolhas e atos; ampliar o raciocínio lógico, exigindo planejamento e estratégias para raciocinar”. Os mais diversos mecanismos e objetivos pedagógicos, desencadeados pela atividade lúdica citados acima, são a base para uma educação igualitária, participativa, inclusiva, de respeito e estimulo a valorização das diferenças. Desta maneira, observa-se o quão rico se torna a exploração do lúdico na sala de aula. Silva, Cabral e Christoffel (2008 apud PASCULLI; BALEOTTI; OMOTE, 2012), conforme acima explicitado, reafirmam que o brincar proporciona eficazmente essa interação social com outras crianças da família, amigos, colegas da escola e vizinhança, e com estes adquire habilidades que não seria capaz de aprender sozinha. E, dentro do processo de inclusão, é preciso que a criança tenha todas as condições necessárias para desenvolver seu potencial e consiga integrar-se à turma de forma efetiva e eficiente. O lúdico não se refere apenas ao brincar, jogar e ao movimento espontâneo. O lúdico é essencial no desenvolvimento humano acrescentando ingredientes indispensáveis no relacionamento interpessoal, facilitando também a criatividade A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 16 163 e estabelecendo relações. A ludicidade é uma necessidade do ser humano, independentemente, da idade e não pode ser vista como mera diversão, pois está ligada ao processo dinâmico da educação a fim de estabelecer relações concretas no processo de construção do conhecimento, e ainda é indispensável à saúde física, emocional e intelectual, uma vez que está presente na cultura dos povos, desde os tempos mais remotos. É importante lembrar que no caso do deficiente intelectual, este aprende melhor quando em contato com recursos concretos. Davýdov (1982) ao discorrer sobre os elementos essenciais para o desenvolvimento da potencialidade do sujeito, afirma que esta se inicia pela apropriação dos conhecimentos teóricos, representadas nas inter-relações entre o interno e o externo, entre a totalidade e a aparência, entre o original e o derivado. O mesmo autor a respeito do método considera que este permite a produção teórica das formas de representação e contemplação sensorial. Para ele o concreto real é o método de ascensão do abstrato ao concreto, o que o considera um dos princípios necessários para o sucesso e organização do ensino para se chegar a um pensamento teórico. No capítulo destinado à brincadeira e à autoestima, Müller (2006, p. 51), chama atenção para uma importante função da brincadeira como um fator importantíssimo e indispensável ao desenvolvimento intelectual e afetivo das crianças: A brincadeira é a via natural da expressão das crianças, produz nelas alegria e as estimula a explorar o mundo que as rodeia. Quando brinca, a criança se sente contente com ela mesma, e quando brinca com os outros se sente parte de um grupo, o que tem sido descrito como mais relacionado à autoestima. Como se pode perceber, a inclusão da criança em uma atividade lúdica favorece o contato dela consigo mesma e sua liberdade emocional. O brincar leva a se expor e torna quaisquer outras atividades posteriores mais fáceis. A recusa de participar de atividades lúdicas pode ser um sinal importante de que algo emocionalmente não vai bem com a criança. Muller (2006) prossegue afirmando que a brincadeira proporciona à criança um meio para expressar seus sentimentos, suas ideias e é uma mostra do enorme impulso para autorrealização que existe na infância. Na inclusão, muitos são os desafios e sentimentos oriundos deste processo, e o lúdico viabiliza esse espaço expressivo para que o professor e técnicos percebam essas vivências em seu aluno. A utilização da brincadeira nas atividades de aprendizagem dá segurança à criança frente ao aprender e lhe permite associar aprendizagem com prazer, o que é uma característica das crianças com uma boa autoestima acadêmica. Na medida em que se sentem inteligentes e capazes elas apresentam interesse em continuar aprendendo. O aluno com deficiência intelectual e/ou múltipla que apresentar A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 16 164 um rebaixamento da sua autoestima poderá ter no lúdico um importante aliado para auxiliar no regaste desta, assim o lúdico é a via de ensino onde o ambiente proporcionado cria condições de igualdade. Segundo Silva (2004) ensinar por meio de jogos é um caminho para o educador desenvolver aulas mais interessantes, descontraídas e dinâmicas, podendo competir em igualdade de condições com inúmeros recursos a que o aluno tem acesso fora da escola, despertando ou estimulando sua vontade de frequentar com assiduidade a sala de aula e incentivando seu desenvolvimento no processo de ensino e aprendizagem, já que aprende e se diverte, simultaneamente. Nesse sentido, de acordo com os autores, o brincar se constitui em um recurso pedagógico também favorecedor da inclusão. No brincar o pedagogo pode e deve, quando necessário, direcionar a ação, fazer intervenções por vezes impondo limites claros e objetivos, dependendo do momento da criança para que esta, por meio do lúdico, possa trabalhar sua impulsividade, agressividade, assim como aprender a lidar com as próprias dificuldades e limitações na ação pedagógica. Foi possível perceber que os autores já citados, concordam e veem como importante a utilização de brinquedos, brincadeiras e jogos como recurso pedagógico no desenvolvimento da aprendizagem e inclusão de alunos com deficiência intelectual, propondo que os pedagogos façam uso desses materiais com conhecimento adequado, não só colocando apenas por colocar os brinquedos para as crianças, mas sabendo abstrair, do momento lúdico, o melhor da criança, as hipóteses para melhor uso como recurso na aprendizagem e na inclusão. 5 | METODOLOGIA Este estudo está fundamentado em pesquisas bibliográficas de metodologia qualitativa buscando uma compreensão da realidade do objeto em questão. Referida metodologia parte do pressuposto de que tanto os pesquisadores como os pesquisados apresentam noções e concepções em relação ao objeto de estudo que são coerentes e pertinentes a discursões e reflexões a respeito deste. Seu principal foco é interrogar sobre os fenômenos que ocorrem com os seres humanos na sua vida social e possibilitar estabelecer outras marcas teóricas a partir das informações estudadas desta realidade e posteriormente servir de referencial a outros trabalhos. As bibliografias utilizadas contemplam autores que abordam a importância da atividade lúdica enquanto recurso metodológico na aprendizagem da criança com deficiência intelectual, fazendo a ponte com a possibilidade de este recurso contribuir enquanto metodologia para o aluno da educação inclusiva. A leitura dos autores será sistemática, com fichamento de cada obra, ressaltando os pontos sobre a temática abordada. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 16 165 A partir dessa questão, pontos importantes devem ser citados como norte de todo trabalho como a importância do lúdico no âmbito escolar e suas repercussões de aprendizagem na escola, enfatizando seu diferencial e sua eficiência, trazendo à tona no aluno habilidades, potencialidades e organização social. Em seguida, será abordada a deficiência intelectual e a inclusão. Por fim, o estudo fundamenta-se teoricamente em importantes autores para explicar o lúdico como metodologia na educação inclusiva, de que forma este contribui para viabilizar a boa adaptação e sucesso da pessoa com deficiência intelectual no ensino regular. Considera-se que a pesquisa bibliográfica utilizada possa descrever a importância do lúdico na inclusão de alunos com deficiência intelectual, suas preferências, o que pensam os educadores e técnicos, como a escola avalia a importância desse recurso utilizado na inclusão. Posteriormente, à pesquisa bibliográfica serão analisadas as informações, e discussões teóricas, consideração final e referência bibliográfica. De semelhante forma, espera-se, também, contribuir para melhoria da consciência coletiva nas escolas, à medida que temas como estes são alvos de debates entre profissionais da educação. 6 | CONCLUSÃO A atuação do método lúdico tem uma importante função para a inclusão da pessoa com deficiência intelectual, uma vez que favorece o desenvolvimento cognitivo, físico, psicológico e social, e por meio deste estudo, verificou-se que a ludicidade pode e deve ser utilizada nas salas de aula regulares, pois visa favorecer não só o processo inclusivo, mas ajuda a melhorar no ensino-aprendizagem. Nesse sentido, a ludicidade enquanto recurso metodológico apresenta atribuições importantíssimas no desenvolvimento de habilidades, porque busca aperfeiçoa ações motoras, ao mesmo tempo em que torna a criança mais criativa, com maiores habilidades de criticidade e avaliação de situações problemas e articulação de regras, pois o enredo das atividades lúdicas são criadas a partir de ações que envolvem o concreto, situações reais com problemas simulados por meio das atividades lúdicas sobre determinadas realidades, percebido nos jogos simbólicos e em outra fase na operacionalização do concreto, dependendo do estágio em que se encontra esse aluno. E aí residem, as preferências destes. Levando em consideração a lentidão no processo de maturação cognitiva do aluno com deficiência intelectual e suas necessidades específicas de uma metodologia prazerosa que atenda essa especificidade, o lúdico contribui nesse processo de estimulação e maturação. Assim, torna-se indispensável a utilização deste recurso didático numa instituição educacional com propostas pedagógicas, principalmente se sua filosofia for sócio interacionista, pelo caráter de espaço de aprendizagem formal A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 16 166 e de motivação ao protagonismo do próprio conhecimento, sendo necessário e viável por meio desta metodologia lúdica um trabalho estimulativo, de desenvolvimento de habilidades importantes para seu dia a dia, autonomia e aquisição de conteúdos acadêmicos, independente da limitação cognitiva. Deste modo, pode-se contar com o uso de tal recurso como um importante instrumento no espaço escolar formal e inclusivo, tornando-o mais acolhedor, convidativo, atraente, prazeroso por despertar o interesse inicial de se aventurar na atividade seja ela individual ou coletiva. Todavia, cabe ao professor buscar mais conhecimentos sobre a melhor forma de dispor deste recurso, buscar capacitar-se, desenvolver habilidades para direcioná-lo à determinada área do conhecimento na perspectiva de um retorno em forma de aprendizagem. Assim, o lúdico na condição de recurso não terá um fim em si mesmo, mas é imprescindível que promova conhecimento e favoreça a melhoria nas relações afetivas e sociais em sala, promovendo de forma natural e sadia o processo de desenvolvimento e de inclusão. O que se observa é que a escola, ainda é um espaço formal, pois conserva em seu arcabouço metodológico e de proposta curricular atividades mais formais como as de cunho curricular acadêmico, voltadas para a didática de recursos impressos e audiovisuais. No caso da inserção do lúdico, este cria outras possibilidades de aprender com prazer, desenvolve melhor a fantasia e o imaginário de forma natural, de viabilidade para narrativas de experiências que podem ser bem pessoais e próximas da sua realidade, de sua história e saberes. Observa-se também, que no processo inclusivo ainda há muitas etapas a serem percorridas e que grande parte das escolas não estão preparadas para receber os alunos com deficiência intelectual, sobretudo, não dispõem de metodologias como o lúdico no auxílio à inclusão. Considera-se, por fim, que, para que o professor veja o brincar como uma ação experiencial no cotidiano da educação fundamental e seja um facilitador dessa experiência com seu aluno, a escola incentive a prática como forma de enriquecer sua dinâmica metodológica em sala e promova a inclusão de seus alunos com deficiência intelectual, uma vez que este encontre no lúdico um espaço para seu desenvolvimento. REFERÊNCIAS ANTUNES, C. 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O objetivo é discutir os componentes curriculares relacionados às disciplinas pedagógicas que compõem as diferentes licenciaturas do Consórcio CEDERJ, de modo a contribuir para a formação de professores na modalidade à distância, articulando atualidades sociais e culturais aos conhecimentos educacionais contemporâneos. Realizou--se um estudo de natureza teórico-prática, cujo levantamento de dados se deu a partir da análise das salas de aula da Plataforma CEDERJ, bem como pelo exame detalhado das ementas das disciplinas pedagógicas. Verificou-se que os componentes curriculares pedagógicos que compõem as licenciaturas CEDERJ apresentam-se em três grandes blocos: os Fundamentos da Educação, as Práticas Pedagógicas e os Estágios Supervisionados. Tais disciplinas pedagógicas buscam integrar conceitos, metodologias e práticas e subsidiar o exercício do pensamento crítico sobre teorias e práticas pedagógicas, bem como a construção de uma prática reflexiva, autônoma e criativa. Conclui-se que a formação para o exercício da docência na atualidade demanda toda uma articulação teórico-técnicopedagógica que possibilite a análise das relações entre os conteúdos de ensino e os diferentes modos de ensinar, bem como das possibilidades de fomentar a construção do vínculo entre o professor e o aluno na educação a distância. PALAVRAS-CHAVE: Formação Pedagógica; Licenciatura; Educação a Distância. THE PLACE OF PEDAGOGICAL DISCIPLINES IN THE TRAINING OF LICENSORS IN EAD ABSTRACT: This article is justified by the current demand in the educational field to establish a relationship between the curricular components of teacher education in undergraduate degrees, the contemporary forms of curricular organization in distance educational models A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 17 170 and the diversity of instrumental repertoire that these models have can favor. The objective is to discuss the curricular components related to the pedagogical disciplines that make up the different degrees of the CEDERJ Consortium, in order to contribute to the formation of teachers in the distance modality, articulating social and cultural news with contemporary educational knowledge. A theoretical and practical study was carried out. Data were collected through the analysis of the CEDERJ Platform classrooms, as well as through the detailed examination of the pedagogical subjects' menus. It was found that the pedagogical curricular components that make up the CEDERJ degrees are presented in three major blocks: the Fundamentals of Education, Pedagogical Practices and Supervised Internships. Such pedagogical disciplines seek to integrate concepts, methodologies and practices and support the exercise of critical thinking about pedagogical theories and practices, as well as the construction of a reflexive, autonomous and creative practice. It is concluded that the formation for the teaching practice nowadays demands a whole theoretical-technical-pedagogical articulation that allows the analysis of the relations between the teaching contents and the different ways of teaching, as well as the possibilities to foster the bond building. between teacher and student in distance education. KEYWORDS: Pedagogical Formation; Graduation; Distance education. 1 | INTRODUÇÃO A produção de conhecimento educacional em tempos de multimídias, hipertextos e contextos transdisciplinares de formação, nos convida a repensar os valores de base da cultura escrita, considerando sua origem no pensamento científico, vislumbrando novos modos de conceber os processos de ensino e de aprendizagem. Interessado na relação entre ciência, tecnologia e os processos de construção dos conhecimentos, Berticelli (2004) destaca que “os contínuos avanços da comunicação informática eletrônica nos conduzem por novas veredas interpretativas do tempo, do espaço, do real e do virtual” (p. 383), o que se torna incessantemente desafiador. Esse vertiginoso desenvolvimento das tecnologias de comunicação tem sido um poderoso instrumento para a ciência expandir-se para novos olhares sobre o conhecimento e os modos de conhecer. As plataformas de ensino a distância representam, assim, um desafio para todos os envolvidos nos cursos de formação de professores porque chamam a atenção para as bases tanto conceituais de produção de conhecimento quanto didáticas que reestruturam caminhos de ensinar a ensinar. Trata-se de um conjunto de posturas pedagógicas que não apenas usam diferentes mídias e recursos tecnológicos no espaço da sala de aula virtual, mas que as contemplam como oportunidades para conhecer um pouco mais sobre as infinitas possibilidades de formulação de conceitos (Vygotsky, 2008), que configuram múltiplas formas de aprender e de interagir no mundo. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 17 171 As multimídias contemporâneas incorporam fluidez a tudo, o que inclui conceitos, valores, objetos materiais de consumo e até mesmo as relações sociais. Segundo Rodrigues (2003), a noção de bem permanente abre espaço à provisoriedade das coisas e das relações, às mudanças constantes nos discursos e no estilo de vida, como movimentos inerentes aos seres humanos. Assim, as formas dinâmicas de produção e de interação com o conhecimento, especialmente os advindos de suportes da Internet, são incorporadas como legítimas no cotidiano das pessoas exatamente por atenderem às necessidades reais de agilidade, intencionalidade e aproximação entre os pares. No entanto, este é exatamente o ponto em que essa conta não fecha. Não fecha porque há a escola como a instituição do “ainda” (RODRIGUES, 2003, p. 38-9), porque “ainda” reproduz ideários de currículos e paradigmas metodológicos que não conversam com as Ciências, as Artes, as Tecnologias, nem, tampouco, com o mundo por trás de seus muros. Enquanto isso, inteiramente ocupadas em viver contextualmente, as pessoas procuram espaços em que possam buscar informações e construírem conceitos reais por viverem desafios diários também reais. Estes espaços são diversos e incluem as multimídias mediadas via Internet. É exatamente sobre este hiato entre o conhecimento escolar que persiste como exigência curricular e a complexidade das diferentes formas de aprender que constituem a vida real que a pesquisa que deu origem a este artigo busca se aprofundar. Como assinala Miranda (2000), a existência de uma extensa e moderna infraestrutura de acesso à informação, por si só, já desencadeia forças criativas e produtivas em escala considerável, mas também requer estratégias adequadas para fomentar a melhor distribuição das oportunidades. Entre tais estratégias, pensar a formação do professor na modalidade a distância (EAD) certamente figura entre as mais efetivas, contribuindo para minimizar a exclusão social, de forma a atenuar ou superar as disparidades regionais, ampliando-se as oportunidades de acesso e de uso das fontes disponíveis nas redes e sistemas de informação e comunicação digital. Desta forma, para a elaboração deste artigo realiza-se um recorte da pesquisa em andamento. O desafio posto é o de discutir os componentes curriculares relacionados às disciplinas pedagógicas que compõem as diferentes licenciaturas do Consórcio CEDERJ, de modo a contribuir para a formação de professores na modalidade à distância (EAD), articulando atualidades sociais e culturais aos conhecimentos educacionais contemporâneos. Tal objetivo está atrelado ao movimento educacional contemporâneo que busca conversas necessárias junto às diversas teorias convergentes na relação escola-sociedade-tecnologias de informação. Estes diálogos se constroem na medida em que atendem à construção de um porvir de práticas educacionais mais coerentes com as múltiplas identidades dos estudantes, em processos mediados por multimídias que imprimem marcas específicas, tanto nas interações sociais quanto A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 17 172 na elaboração dos conhecimentos. 2 | O CONTEXTO DA PESQUISA: AS LICENCIATURAS A DISTÂNCIA QUE COMPÕEM O CONSÓRCIO CEDERJ O consórcio CEDERJ constitui um dos projetos da Fundação CECIERJ - Centro de Ciências e Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro. Reúne as universidades e instituições de ensino superior (IES) públicas com o objetivo de ofertar educação superior pública, gratuita e de qualidade para todo o Estado do Rio de Janeiro, por meio de cursos na modalidade EAD (Educação a Distância). O consórcio é composto por cursos de graduação a distância por intermédio de parceria formada entre o Governo do Estado do Rio de Janeiro e sete instituições públicas de Ensino Superior (Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca – CEFET; Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ; Universidade Estadual do Norte Fluminense – UENF; Universidade Federal Fluminense – UFF; Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO; Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ; e Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ). Atualmente o CEDERJ oferta quinze cursos de graduação na modalidade a distância em trinta e três polos regionais, estando prevista, para 2020, a ampliação para trinta e cinco polos e dezessete cursos. A pesquisa que constitui base para a discussão deste artigo tomou como objeto de investigação os oito cursos de licenciaturas que fazem parte do consórcio, a saber: Letras (UFF), Matemática (UFF e UNIRIO), Física (UFRJ), Química (UFRJ e UENF), Ciências Biológicas (UFRJ, UERJ e UENF), Geografia (UERJ), História (UNIRIO) e Turismo (UFRRJ e UNIRIO). Excluiu-se a licenciatura em Pedagogia, uma vez que tal curso apresenta uma matriz curricular com especificidades que o diferencia dos demais cursos de licenciatura. As licenciaturas pesquisadas são ofertadas em vinte e nove polos do consórcio. As matrizes curriculares que compõem cada uma dessas licenciaturas são constituídas por um núcleo de estudos de formação das áreas específicas e interdisciplinares e por um núcleo de formação pedagógica, além de uma carga horária destinada à prática como componente curricular, aos estágios supervisionados obrigatórios e às atividades teórico-práticas de aprofundamento em áreas específicas de interesse dos alunos, em consonância com o que aponta a Resolução CNE/CP nº 02/2015 (BRASIL, 2015). O foco de interesse deste artigo recai especificamente sobre os componentes curriculares relacionados às disciplinas pedagógicas que constituem os cursos de licenciaturas CEDERJ. De acordo com o Art.13º, § 5º, da Resolução CNE/CP nº 02/2015, “nas Licenciaturas o tempo dedicado às dimensões pedagógicas não será inferior à quinta parte da carga horária total” (BRASIL, 2015, p.12). Tal proporção visa A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 17 173 garantir a formação do futuro professor, uma vez que os cursos de licenciaturas não diplomam simplesmente matemáticos, biólogos, químicos, etc., mas professores de matemática, biologia, química e demais áreas do conhecimento. A gerência da formação pedagógica dos alunos dos oito cursos de licenciaturas que compõem o consórcio CEDERJ se distribui entre as Coordenações Pedagógicas UERJ, UFRRJ e UENF, conforme a localização dos vinte e nove polos (que oferecem os cursos) nas áreas de abrangência de cada uma dessas universidades. A autora desta pesquisa é a atual responsável pela Coordenação Pedagógica UERJ, o que viabilizou a realização da investigação. A Coordenação Pedagógica UERJ atualmente é responsável pelos cursos de licenciatura oferecidos em quatorze polos CEDERJ: Angra dos Reis, Duque de Caxias, Magé, Miguel Pereira, Nova Friburgo, Nova Iguaçu, Paracambi, Petrópolis, Piraí, Resende, Rio das Flores, Saquarema, São Pedro d'Aldeia e Volta Redonda. A Coordenação Pedagógica UFRRJ é responsável pelos cursos de licenciatura oferecidos em oito polos CEDERJ: Barra do Piraí, Belford Roxo, Cantagalo, Campo Grande, Niterói, Rio Bonito, São Gonçalo e Três Rios. E a Coordenação Pedagógica UENF gerencia a formação pedagógica dos cursos de licenciatura oferecidos em sete polos CEDERJ: Bom Jesus de Itabapoana, Itaocara, Itaperuna, Macaé, Natividade, São Fidelis e São Francisco de Itabapoana. De qualquer forma, independente de qual seja a Coordenação Pedagógica responsável pela licenciatura, a formação pedagógica desses cursos/polos é constituída pelo mesmo rol de disciplinas pedagógicas, baseadas nas mesmas ementas curriculares. Todavia, tais disciplinas são oferecidas por diferentes professores, conforme as três Coordenações Pedagógicas, e, deste modo, apresentam algumas variações didático metodológicas. Ainda assim, as três coordenações buscam trabalhar de forma articulada, em busca de formações com qualidade congênere. Para que o leitor tenha uma ideia da grandeza destas coordenações, no semestre letivo de 2019.2, a Coordenação Pedagógica UERJ tinha sob sua responsabilidade um total de 7.726 alunos inscritos em suas disciplinas pedagógicas. Por sua vez, a Coordenação Pedagógica UFRRJ contava com 2.983 alunos e a Coordenação Pedagógica UENF com 1.131 licenciandos. Deste modo, as três coordenações totalizavam 11.840 alunos. A seguir, discute-se sobre os componentes curriculares relacionados às disciplinas pedagógicas que compõem as diferentes licenciaturas do Consórcio CEDERJ. 3| A FORMAÇÃO PEDAGÓGICA DAS LICENCIATURAS DO CONSÓRCIO CEDERJ A pesquisa descrita neste capítulo constituiu um estudo de natureza teóricoA Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 17 174 prática. O levantamento de dados se deu a partir da observação e análise das salas de aula da plataforma CEDERJ, bem como pelo exame detalhado das matrizes curriculares dos cursos de licenciaturas do consórcio e das ementas das disciplinas pedagógicas, através da Coordenação Pedagógica UERJ. Verificou-se que a formação pedagógica dos cursos de licenciaturas do consórcio CEDERJ se materializa nas matrizes curriculares a partir dos seguintes componentes curriculares obrigatórios: os Fundamentos da Educação, as Práticas de Ensino e os Estágios Supervisionados. O componente curricular Fundamentos da Educação visa introduzir fundamentos teóricos-conceituais das áreas filosófica, psicológica, histórica e sócio antropológica, de modo que se constitui por quatro disciplinas. A disciplina Fundamentos da Educação I - Filosofia da Educação - tem uma carga horária teórica de sessenta horas/aula. A Filosofia é a base de todo o pensamento ocidental. Todos os campos do saber conhecidos na atualidade são tributários do pensamento filosófico. No campo da Educação isto fica ainda mais explícito pois toda teoria ou prática pedagógica sustenta-se numa concepção filosófica. Deste modo, o objetivo geral da disciplina é possibilitar ao licenciando travar contato com o pensamento filosófico, percebendo sua relevância para a formação humana e para a reflexão sobre os sentidos da prática educacional. A segunda disciplina deste bloco, Fundamentos da Educação II - Psicologia da Educação – também apresenta uma carga horária teórica de sessenta horas/ aula. Em linhas gerais, a Psicologia investiga o desenvolvimento da personalidade do indivíduo, a formação de seu caráter, seu desenvolvimento cognitivo e suas relações sociais, bem como ocorre os processos de ensino e de aprendizagem. Deste modo, suas diferentes correntes teóricas formam um complexo conhecimento científico que contribui de forma significativa para a formação dos professores das diferentes licenciaturas, na medida em que tal conhecimento possibilita uma visão ampla sobre as singularidades dos alunos e sua constituição biopsicossocial, bem como a criação de estratégias pedagógicas adequadas aos diversos grupos sociais. Em vista disso, o objetivo geral da disciplina é abordar a produção de conhecimento sobre a natureza humana e sua condição sociocultural, bem como os processos de ensino e de aprendizagem. A disciplina Fundamentos da Educação III - História da Educação – também tem a carga horária teórica de sessenta horas/aula. O objetivo geral da disciplina é enfocar os principais processos históricos, políticos e sociais que envolvem a Educação no mundo ocidental, a fim de problematizar as práticas e situações educacionais atuais. O conhecimento da história da Educação é fundamental não apenas para se entender os contextos atuais educacionais, como também apontar direcionamentos futuros, a partir de uma visão democrática. Desta maneira, contribui-se para que A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 17 175 o licenciando esteja atento à realidade em devir - viva, dinâmica e em constante construção - do espaço escolar. A última disciplina deste bloco, Fundamentos da Educação IV - Sociologia da Educação – do mesmo modo, tem a carga horária teórica de sessenta horas/aula. O estudo da cultura, da ética e da estética em Educação são o foco desta disciplina, bem como as relações entre escola, aluno, professor e sociedade. Deste modo, busca-se entender sociologicamente as relações indivíduo e sociedade tomando como foco à Educação enquanto fenômeno social. Intenta-se, ainda, possibilitar uma reflexão sobre a Sociologia da Educação em seus diversos contextos políticosociais, identificando sua contribuição para a formação de educadores que irão formar indivíduos para uma realidade em transformação. Assim, essas quatro disciplinas constituem o componente curricular Fundamentos da Educação, que perfaz um total de duzentos e quarenta horas/aula teóricas nas matrizes curriculares dos cursos de licenciaturas CEDERJ. No entanto, embora tal componente se constitua por carga horária teórica, faz-se necessário salientar que seus conteúdos são trabalhados de forma contextualizada. Segundo Ritto (2010), as questões do mundo atual, por serem de grande magnitude e igualmente complexas, precisam ser tratadas através de um processo de contextualização. Segundo o autor, só através da contextualização que as demandas sociais penetram no processo de pesquisa, influenciando a formulação dos problemas, a implantação de soluções e a avaliação de resultados. Trata-se, portanto, da formação de um professor pesquisador que assume a sua realidade escolar como um objeto de pesquisa, de reflexão e de análise. No entanto, para que o professor possa refletir sobre sua prática, é necessário que sua formação lhe possibilite a construção de embasamento teórico que lhe dê sustentação para tal análise. Todavia, como assinala Moran (2007), os novos meios de comunicação na Educação exigem do professor novas formas de lidar com a informação e o conhecimento. Assim, o mundo globalizado exige cada vez mais professores dotados de discernimento e de poder de decisão e iniciativa (MORAN, 2007). Tal perspectiva representa uma forma diferenciada de compreender a pesquisa, para além da produção de conhecimento científico, mas, como processo que deve estar implicado num compromisso ético e social para o entendimento de um mundo complexo e permeado por sujeitos plurais. Entendida desta maneira, “a pesquisa é um elemento essencial na formação do professor” (ANDRÉ, 2005, p.55). É nesse sentido que Libâneo (2009) defende que desde a formação inicial o professor precisa unir cultura geral, especialização disciplinar e a busca de conhecimentos conexos com a sua disciplina de formação porque para formar o cidadão de hoje é preciso formá-lo para lidar tanto com noções e problemas surgidos A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 17 176 nas mais inusitadas situações profissionais quanto sociais, culturais e éticas. Diante de tal perspectiva, compete ao professor não apenas dominar os conteúdos específicos e pedagógicos, mas também as abordagens teóricometodológicas do seu ensino, de forma interdisciplinar e adequada às diferentes fases do desenvolvimento humano e à diversidade de alunos que constituem as salas de aula (BRASIL, 2015, Art. 8º). Nesse sentido, a formação pedagógica dos cursos de licenciaturas do consórcio CEDERJ também se constitui pelo componente curricular Práticas de Ensino. Tal componente é constituído por três disciplinas: Didática, Currículo e Avaliação da Aprendizagem. Tais disciplinas são constituídas, cada uma, por 30 horas/aula de conteúdo prático e 30 horas/aula de conteúdo teórico, perfazendo um total de cento e oitenta horas/aula nas matrizes curriculares de tais cursos. Em Prática de Ensino I, a disciplina Didática tem o objetivo geral de articular os princípios teóricos do campo da Didática ao cotidiano da prática escolar, de modo a produzir saberes sobre o processo de ensino, envolvendo as relações entre teoria e prática e conteúdo e forma, com fins de atuação humana, técnica, pedagógica e política no exercício do magistério. A Prática de Ensino II – Currículo - complementa essa formação, com o objetivo específico de abordar a problemática curricular como campo de pesquisa, investigação e atuação. Trata-se de reconhecer as diferentes teorias curriculares e identificar as tendências e questões atuais nesse campo; analisar as políticas públicas de currículo e discutir as relações entre: currículo e cultura, currículo e poder, currículo e ideologia, currículo e controle social. Desse modo, a disciplina não lida com o currículo apenas de forma teórica, mas busca articular os princípios teóricos do campo do currículo ao cotidiano da prática escolar, correlacionando produção curricular, saberes profissionais e formação de professores. Deste modo, intenta-se destacar o currículo como espaço de produção cultural e práticas interculturais. Em Prática de Ensino III - Avaliação -, o objetivo geral é aprofundar o estudo crítico de concepções e tendências avaliativas, bem como analisar e elaborar instrumentos de avaliação de aprendizagem. Trata-se de conceituar a avaliação como uma modalidade de investigação no contexto que envolve os processos de ensino e de aprendizagem; bem como analisar epistemologicamente as concepções e tendências avaliativas e suas consequências na prática da avaliação. Sobre esse aspecto, é necessário que o licenciando compreenda que a opção por determinada avaliação é feita em conformidade com determinados fins educacionais e estes precisam estar relacionados ao cotidiano da prática escolar e às realidades socioculturais dos alunos. A disciplina envolve ainda a identificação das avaliações institucionais externas e sua importância. Cabe ainda salientar que as três disciplinas que compõem o componente A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 17 177 Práticas de Ensino envolvem uma parte prática de análise e elaboração de instrumentos de ensino e de avaliação de aprendizagem. Trata-se da construção de ideário didático-metodológico - e não de um modelo metodológico -, tendo em vista o planejamento diversificado e as práticas inclusivas e contextualizadas em Educação. Tal perspectiva de formação vai de encontro a uma visão instrumental e tecnicista de formação do professor. Segundo Libâneo (2013, p.92), nesta concepção “basta que o professor seja um bom técnico que saiba aplicar conhecimentos produzidos por outros”. Contrariamente a tal posicionamento, a formação pedagógica que aqui se discute defende a atividade docente como forma de trabalho intelectual, em contraste com sua definição em termos puramente instrumentais ou técnicos. Os professores como intelectuais assumem todo o seu potencial como pesquisadores, estudiosos e profissionais ativos e reflexivos e devem ser vistos como “cidadãos que legitimam na sua atividade de ensino a natureza do seu discurso, em termos políticos e ideológicos (MOUSINHO, 2018, p.31). Outro componente curricular obrigatório que constitui a formação pedagógica das licenciaturas do consórcio CEDERJ são os Estágios Supervisionados. Trata-se de “um conjunto de atividades de formação, realizadas sob a supervisão de docentes da instituição formadora, e acompanhado por profissionais, em que o estudante experimenta situações de efetivo exercício profissional” (BRASIL, 2015b, p.32). Desse modo, “supõe uma relação pedagógica entre alguém que já é um profissional reconhecido em um ambiente institucional de trabalho e um aluno estagiário” (ibidem, p.31). A Resolução CNE/CP nº 02/2015 complementa que: O estágio curricular supervisionado é componente obrigatório da organização curricular das licenciaturas, sendo uma atividade específica intrinsecamente articulada com a prática e com as demais atividades de trabalho acadêmico (BRASIL, 2015, Art.15, § 6º, p. 13). Portanto, não se trata de uma atividade facultativa sendo uma das condições para a obtenção da respectiva licença. No entanto, segundo Mousinho (2018), o reconhecimento de que o estágio supervisionado é essencial para uma formação docente contemporânea e qualificada, por intermediar a relação entre o conhecimento teórico e a prática adotada, precisa primeiro desconstruir a visão que lhe atribui um sentido exclusivamente prático e reprodutivo e entendê-lo como pesquisa. Na Resolução CNE/CP nº 02/2015 (BRASIL, 2015) está expressa a ideia de que teorias e práticas devem compor uma relação indissociável, bem como há ênfase na valorização da atuação prática constituindo-se não como forma de reprodução, mas de criação. Ou, pelo menos, como forma de recriação do conhecimento, como assinala Mousinho (2018), na elaboração de um programa de curso e de planos de aula ou na participação na construção de um projeto pedagógico, que envolvem A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 17 178 pesquisa bibliográfica, seleção de material, etc. Pimenta e Lima (2005/2006) nos auxilia a compreender o estágio enquanto teoria e prática, ao sinalizar que é preciso entender a imbricação entre sujeitos e instituições, ação e prática. A autora explica que a prática é institucionalizada e as ações referem-se aos sujeitos; em sentido amplo, ação designa a atividade humana, está vinculada efetivamente ao fazer. Entretanto, em uma compreensão filosófica e sociológica, a noção de ação é sempre referida a objetivos, finalidades e meios, implicando a consciência dos sujeitos para essas escolhas, supondo um certo saber e conhecimento. Deste modo, num processo de reflexão das ações pedagógicas, as teorias contribuem para o questionamento das práticas institucionalizadas e das ações pedagógicas dos sujeitos (PIMENTA & LIMA, 2005/2006). Nos cursos de Licenciaturas CEDERJ, esse componente curricular busca exatamente essa relação dinâmica entre teoria e prática, bem como imprimir aos estágios supervisionados uma perspectiva de pesquisa da prática e das ações pedagógicas. Para tanto, o componente é dividido em quatro disciplinas. O Estágio Supervisionado I, volta-se apenas para a observação do espaço escolar, com uma carga horária de sessenta horas/aula. O Estágio Supervisionado II envolve, além da observação, atividades de coparticipação, perfazendo um total de noventa horas/ aula. O Estágio Supervisionado III exige a participação efetiva do licenciando na atividade pedagógica, perfazendo uma carga horária total de cento e vinte horas/ aula e o Estágio Supervisionado IV também se constitui de atividade de participação em prática pedagógica, num total de cento e cinquenta horas/aula. Portanto, o componente curricular Estágio Supervisionado das licenciaturas CEDERJ, em suas quatro disciplinas, perfazem quatrocentas e vinte horas/aula e tem por objetivos gerais: observar, analisar e vivenciar o cotidiano escolar e as ações pedagógicas empreendidas, relacionando-os aos princípios teóricos e metodológicos estudados; bem como proporcionar experiências de aplicação de conhecimentos ou de desenvolvimento de procedimentos próprios ao exercício da docência. Deste modo, é o estágio supervisionado que apresenta ao licenciando os diferentes espaços, sujeitos e práticas presentes no ambiente escolar, bem como os principais conflitos do cotidiano escolar, possibilitando-lhe observar a relação teoria e prática. Além dos componentes curriculares obrigatórios descritos acima, a formação pedagógica dos licenciandos do Consórcio CEDERJ é também constituída por quatro disciplinas complementares, oferecidas pela Coordenação Pedagógica UERJ: Educação Especial (60h/aula); Políticas Públicas em Educação (60h/aula); Fundamentos da Educação de Jovens e Adultos (60h/aula) e Tópicos sobre a diversidade na Educação (60h/aula). Tais disciplinas apresentam-se como obrigatórias em alguns cursos de A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 17 179 Licenciatura/CEDERJ e em outros constam como eletivas, muito embora devam ser transformadas em obrigatórias a qualquer momento, em decorrência do processo de reforma curricular. Tal mudança se justifica pelo que define a Resolução CNE/CP nº 02/2015, em seu Art. 13º § 2º: Os cursos de formação deverão garantir nos currículos conteúdos específicos da respectiva área de conhecimento ou interdisciplinares, seus fundamentos e metodologias, bem como conteúdos relacionados aos fundamentos da educação, formação na área de políticas públicas e gestão da educação, seus fundamentos e metodologias, direitos humanos, diversidades étnico-racial, de gênero, sexual, religiosa, de faixa geracional, Língua Brasileira de Sinais (Libras), educação especial e direitos educacionais de adolescentes e jovens em cumprimento de medidas socioeducativas (BRASIL, 2015, p. 11). Conclui-se, assim, que o rol de disciplinas que compõem a formação pedagógica dos cursos de licenciaturas do Consórcio CEDERJ buscam integrar conceitos, paradigmas, metodologias e práticas e subsidiar o exercício do pensamento crítico sobre teorias e práticas pedagógicas. Trata-se de pensar não apenas a formação profissional, mas também a formação humana e integral do futuro professor. Deste modo, os componentes curriculares pedagógicos constituem base para que os futuros professores construam com seus alunos, de forma mais consciente, os saberes que envolvem a sua área, formando-os para a prática docente reflexiva, autônoma e criativa. 4 | CONSIDERAÇÕES FINAIS Finaliza-se tal artigo ratificando a importância dos componentes pedagógicos na composição das matrizes curriculares dos cursos de licenciatura do Consórcio CEDERJ, uma vez que não é possível vislumbrar a formação do professor a partir de um currículo constituído apenas pelos conteúdos específicos de cada área. Tratase de assegurar aos futuros professores a possibilidade de pensar criticamente sua prática docente, bem como fazer escolhas consistentes quanto ao modo, as estratégias e os recursos que utilizarão no contexto escolar, com vistas a contribuir para os processos de aprendizagem de seus alunos. Refletir sobre a formação docente requer necessariamente pensar em um espaço-tempo de possibilidades múltiplas de ensino e de aprendizagem. Há conhecimentos inerentes à formação do professor relacionados a saberes e práticas especificamente ligados ao ensino, tanto quanto aqueles concernentes às individualidades que se encontram na escola. Assim, a formação para o exercício da docência na atualidade demanda toda uma articulação teórico-técnico-pedagógica que possibilite a análise das relações entre os conteúdos de ensino e os diferentes modos de ensinar, bem como das possibilidades de fomentar a construção do vínculo entre o professor e o aluno na A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 17 180 educação a distância. REFERÊNCIAS ANDRÉ, M.E.D. A Pesquisa, formação e prática docente. In: ANDRÉ, M.E.D.A. (Org). O papel da pesquisa na formação e na prática dos professores. 4ª ed. São Paulo: Papirus, 2005, p.55-67. BRASIL. Resolução CNE/CP nº 02, de 1º de julho de 2015. Define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial em nível superior (cursos de licenciatura, cursos de formação pedagógica para graduados e cursos de segunda licenciatura) e para a formação continuada. Brasília: MEC, 2015. BRASIL. Parecer CNE/CP nº 02, de 25 de junho de 2015. 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A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 17 181 CAPÍTULO 18 doi O MÉTODO TOTAL PHYSICAL RESPONSE (TPR) NO ENSINO DE INGLÊS PARA CRIANÇAS (LIC): CONSIDERAÇÕES SOBRE A ATMOSFERA MOTIVACIONAL POSSIBILITADA Data de aceite: 06/01/2020 Monique Vanzo Spasiani Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) São Carlos – SP RESUMO: Apesar de seu crescente e mundial reconhecimento linguístico e pedagógico, o ensino de Língua Inglesa (LI) no Brasil ainda se mostra bastante problemático, principalmente se observarmos a esfera educacional pública do país. Ao transpormos essa questão para o ensino de LI para Crianças (LIC), o problema se agrava ainda mais. Assim, este trabalho pretende investigar os possíveis resultados de uma adaptação do método Total Physical Response (TPR), desenvolvido por James Asher, no ensino-aprendizagem de LIC, oferecendo ao docente maior sistematização e não o deixando à mercê do livro didático ou de sua formação insatisfatória. Segundo Larsen-Freeman (2000), o TPR propõe o ensino de LE em um contexto de comandos e ações, aproximando o seu aprendizado com o da Língua Materna (LM) e proporcionando uma experiência agradável e motivadora aos alunos. Por meio de uma metodologia qualitativa de cunho interpretativista, fez-se isso em contexto de um instituto de idiomas, com alunas de aproximadamente 9 anos de idade, por um período de aproximadamente 2 meses. Concluiu-se que o TPR é um método bastante útil no ensino-aprendizagem de LIC, sobretudo porque ele possibilita um ambiente de aprendizagem motivador; e crianças tendem a aprender melhor quando se sentem confortáveis, livres de pressão e motivadas (ROCHA, 2009, p. 250). Entende-se que os resultados aqui alcançados podem em muito contribuir para o ensino-aprendizagem de LIC no contexto brasileiro, orientando as práticas pedagógicas dos profissionais da área de ensino de LE e apresentando-lhes diferentes maneiras de lidar com essa faixa-etária em sala de aula. PALAVRAS-CHAVE: Ensino-aprendizagem de LE. Ensino de inglês para crianças. LIC. TPR. Motivação. THE TOTAL PHYSICAL RESPONSE (TPR) METHOD IN THE ENGLISH TEACHING FOR CHILDREN (ELC): CONSIDERATIONS ABOUT THE PROVIDED MOTIVATIONAL ATMOSPHERE ABSTRACT: Despite its growing and worldwide pedagogical and linguistic recognition, the teaching of English Language (EL) in Brazil is still quite problematic, especially if we look at the public educational sphere of the country. By looking at the issue in teaching EL for A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 18 182 Children (ELC), the problem is further aggravated. Thus, this paper aims to investigate the possible results of an adaptation of the method Total Physical Response (TPR), developed by James Asher, in the teaching and learning of ELC, providing the teacher more systematization and not leaving him/her at the mercy of his/her unsatisfactory formation. According to Larsen-Freeman (2000), TPR proposes FL teaching in a context of commands and actions, approaching its learning with Mother Language (ML) and providing an enjoyable and motivating experience to students. Through a qualitative methodology of interpretative nature, we did it in the context of a language institute with students from about 9 years old, for a period of approximately 2 months. It was concluded that the TPR is a very useful tool for teaching and learning ELC, particularly because it enables a motivating learning environment; and children tend to learn better if they feel comfortable, free from pressure and motivated (ROCHA, 2009, p. 250). It is understood that the results here achieved can contribute to the teaching and learning of ELC in the Brazilian context, guiding the pedagogical practices of professionals of the LE teaching area and showing them different ways to deal with this age group in classrooms. KEYWORDS: Foreign language teaching and learning. Teaching EL for children. ELC. TPR. Motivation. 1 | INTRODUÇÃO O interesse em aprender uma Língua Estrangeira (LE) sempre esteve presente no decorrer da história da humanidade, desde suas civilizações iniciais até o momento presente, o chamado mundo globalizado. De certo, ao longo desse percurso, os objetivos e finalidades desse aprendizado foram os mais distintos (cf. Richards e Rodgers, 2001). Por uma questão política e econômica, o inglês tem se apresentado como a LE de maior interesse entre os aprendizes de lingua. Embora outros idiomas também componham a nossa contemporaneidade, o inglês logra de uma posição privilegiada, sobretudo se ponderarmos que a globalização se efetiva com sua utilização (ORTIZ apud ASSIS-PETERSON e COX, 2007). Isso faz com que o ensino de Língua Inglesa (LI) esteja presente em diversos contextos e para diversas faixas-etárias, ganhando notoriedade e promovendo inúmeras discussões e reflexões acerca do seu fazer. Apesar disso, o ensino-aprendizagem de Língua Inglesa - sobretudo para Crianças (LIC), que é a faixa-etária alvo deste trabalho - ainda enfrenta algumas barreiras. Primeiramente, há a não obrigatoriedade do ensino de LE nos anos iniciais do Ensino Fundamental (EF) da rede pública de ensino, estabelecida pela Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. No entender de Rocha e Tílio (2009, p. 296), o caráter facultativo do ensino de LE nas séries iniciais do EF brasileiro: [...] implica a ausência de bases mínimas comuns de referência, política A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 18 183 e teoricamente sustentadas, o que enfraquece o processo e intensifica desigualdades, permitindo-nos caracterizar sua concretização em âmbito nacional como excludente. (ROCHA e TÍLIO 2009, p. 296) É importante ressaltar que tal ausência de bases mínimas comuns de referência não só afeta o ensino público, mas também outros domínios educacionais, como o particular, colocando em xeque os conteúdos mínimos necessários para que o aprendiz se desenvolva como aluno e como cidadão. Em segundo lugar, tem-se a ausência de profissionais certificados para ensinar LE na infância. Muitos autores têm discutido sobre isso (CAMERON, 2001; SANTOS, 2005; FERNÁNDEZ e RINALDI, 2009; LIMA, 2010, SHIMOURA, 2005), enfatizando sempre a importância de uma formação específica e adequada quando se trata de promover o aprendizado nessa faixa-etária tão peculiar. Sob essa perspectiva, surgem dúvidas acerca da qualidade do ensino de LIC no contexto atual. Já que os conteúdos não são claramente estabelecidos e a formação profissional é deficiente, ele acaba se baseando em intuições ou no livro didático (LD) adotado. Pesquisas apontam para a relevância do material didático (MD) no processo de ensino-aprendizagem de LE (CORACINI, 1999, 2003; LEFFA, 2003; RAMOS E ROSELLI, 2008; ROCHA E TÍLIO, 2009), todavia, o que era para ser utilizado apenas como um recurso facilitador, hoje vem regulando o trabalho docente, ditando não só o conteúdo que os professores devem trabalhar, mas também a forma. Nesse sentido, este trabalho objetivou investigar os possíveis resultados de atividades alternativas no ensino-aprendizagem de LIC, oferecendo um respaldo ao docente e não o deixando à mercê do LD ou de sua formação insatisfatória. Para isso, testou-se uma adaptação do método Total Physical Response (TPR), desenvolvido por James Asher, em sala de aula. Gattolin (1998) já havia evidenciado a atmosfera afetuosa e motivadora propiciada pelo método, a mesma que favorece a aprendizagem significativa. 2 | PERSPECTIVAS TEÓRICAS Com a globalização e o surgimento das novas tecnologias, fez-se crescente o (re)conhecimento linguístico e o interesse pelo ensino de LE, revelando, inclusive, a tendência de que ele se manifeste para os aprendizes cada vez mais cedo (ROCHA, 2006). Em âmbito nacional, estudiosos como Shimoura (2005) e Rinaldi (2006) tratam da questão da formação de professores e das habilidades necessárias para se ensinar LE na infância. Já Rocha (2006) busca elaborar justificativas e provisões teóricas para o ensino de LE nos dois primeiros ciclos do Ensino Fundamental, bem A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 18 184 como oferecer propostas teórico-práticas para esse campo. Santos (2009) discute em sua tese a expansão da oferta de inglês para crianças como uma maneira de incluílas na sociedade contemporânea, proporcionando-as igualdade de conhecimento e oportunidades de interação social. Figueira (2002), por sua vez, investiga a construção do processo de ensino-aprendizagem de LE com crianças na faixa-etária de 8 a 10 anos, ou seja, crianças alfabetizadas. Em termos de prática pedagógica, objeto também desta pesquisa, temos os trabalhos de Tonelli (2005) e Scaffaro (2006), que incluem, respectivamente, as histórias infantis e a atividade de contar histórias no processo de ensino-aprendizagem de língua inglesa para crianças (LIC), sendo esta última como recurso na retenção de vocabulário novo na língua inglesa em crianças na fase pré-escolar. Gattolin (1998) já havia trabalhado com o ensino e aprendizagem de vocabulário e mostrado a importância de que ele fosse motivador. Nessa esfera prática, destaca-se ainda Szundy (2005), que propõe uma discussão profunda sobre a utilização de jogos de linguagem (jogos de nomear, jogos de reconhecimento e jogos de descrever) como instrumentos de ensinoaprendizagem na sala de aula de LE com crianças entre 7 e 9 anos, concluindo que os mesmos têm a função de co-construtor do conhecimento. Luz (2003) também se faz importante nesse meio, já que, analisando as atividades em sala de aula com crianças aprendendo inglês como LE, aponta que os professores devem desenvolver práticas de ensino-aprendizagem em que os alunos, ao interagirem com os colegas, tornem-se mais colaborativos e usem a língua-alvo de forma mais criativa. Diante disso, faz-se necessário que as características inerentes à criança sejam consideradas pelo professor em seu fazer pedagógico, uma vez que, convergindo com Santos (2005), se o ensino de LIC seguir os mesmo moldes e objetivos do ofertado em séries mais avançadas, este estará fadado ao fracasso, correndo o risco de desenvolver no aluno uma aversão à língua ou prejudicar seu aprendizado, momentâneo ou futuro. A verdade é que ensinar LE para uma criança está longe de ser uma tarefa fácil e que dispensa qualificações e habilidades específicas, como já advertiram Rocha (2008), Cameron (2001) e Silva (1997). É preciso que o professor considere e respeite a sua natureza como aprendiz, refletindo sempre sobre as maneiras mais propícias de ensiná-la (WOOD, 1998). Rocha (2008), ancorada em estudiosos do campo, discorre sobre tal natureza, pontuando as caraterísticas infantis que tornam o processo de ensino-aprendizagem de LIC tão delicado e singular. Dentre elas, está o fato de a criança ser naturalmente curiosa, mas engajar-se apenas em atividades que lhe despertam o interesse. Por seu foco ser curto, todavia, essas atividades precisam envolver a construção ativa do conhecimento e o uso efetivo da linguagem para que o aprendizado se dê de maneira satisfatória (VYGOTSKY, 1998, 2001) e A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 18 185 para que ele, principalmente, faça a criança compreender seu papel de indivíduo ativo no mundo multilíngue contemporâneo. Ademais, contesta-se aqui a ideia de que pequenos aprendizes somente aprendem uma linguagem simples, destituída de qualquer complexidade, e que o ensino de língua na infância deva ser apenas divertido. Sobre isso, Cameron apud Rocha (2009) adverte que a criança tem um imenso potencial de aprendizagem “[...] podendo interessar-se por tópicos complicados, difíceis e também abstratos, desde que se sintam confortáveis, ou seja, livres de pressão e motivadas.” (ROCHA, 2009, p. 250). Destarte, os aspectos afetivos e sociais da criança ocupam posição especial no processo de ensino-aprendizagem de LIC, pois eles influenciam diretamente no seu desempenho como aprendiz, revelando que nenhuma atividade seria bem executada se eles não fossem considerados. Sob essa perspectiva, deve-se atentar para a questão da motivação do aprendiz. Dörnyei (2005) diz saber por que ela é importante: pois ela proporciona o impulso inicial para se estudar uma nova língua, além de orientar as forças que servem de base para o longo e complexo processo de aprender. Segundo o autor, sem motivação suficiente, até mesmo os indivíduos mais habilidosos podem acabar por não alcançarem seus objetivos. Nas palavras de Williams e Burden (2001), o status privilegiado da motivação ainda permanece: Se eu pedisse para identificar as mais poderosas influências na aprendizagem, a motivação provavelmente estaria no topo da lista da maioria dos professores. Parece sensato assumir que a aprendizagem é mais provável de ocorrer quando queremos aprender (WILLIAMS E BURDEN, 2001, p. 111, tradução do autor). Em uma tentativa de definir o termo motivação, que abrange uma variedade de significados, Dörnyei (2001, 2003) explica que este é abstrato e ligado a fatores contextuais, sendo usado para esclarecer o motivo das pessoas agirem da forma que agem. Então, faz-se fundamental a presença da motivação no contexto de ensino de LIC, conforme pontuaram Gattolin (1998) e Norte (1992) quando evidenciaram que um método - como o TPR, de James Asher – era capaz de trazê-la para o ambiente educacional e torna-lo ainda mais propicio à aprendizagem significativa. Conforme Richards e Rodgers (2001), James Asher foi um professor de psicologia da Universidade Estadual de San José, na Califórnia, o qual se dedicava, por exemplo, ao estudo da psicologia do desenvolvimento, das teorias de aprendizado e da pedagogia humanística, tendo se utilizado desse conhecimento para desenvolver o TPR, método fortemente ligado a teorias da memória em psicologia que serve ao ensino de LE em um contexto de comandos e ações. Relaciona-se também com a aquisição de Língua Materna (LM), já que Asher acreditava que adultos podiam A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 18 186 aprender uma nova língua da mesma forma que uma criança aprendia a sua primeira: respondendo fisicamente a um comando para depois produzi-lo verbalmente: Não tente forçar a fala dos alunos. À medida que os alunos internalizarem um mapa cognitivo da língua-alvo por meio de entender o que é ouvido, haverá um ponto de prontidão para falar. O indivíduo começará espontaneamente a produzir enunciados. (ASHER, p. 2, 1986, tradução do autor) No TPR, os comandos feitos por meio do verbo no imperativo, aliados aos movimentos corporais, são o ponto central da linguagem e do aprendizado, pois são eles que introduzem os conhecimentos iniciais em LE, tornando a aprendizagem acessível e agradável aos alunos. Asher (1986) postula que os comandos devem ser variados e devem ser dificultados aos poucos. Ex: “Maria, point to the table”; “Maria, point to the table and the chair”; “Maria, go to the board and draw a spider”; “Maria, can you draw a spider on the board?; “João, if Maria goes to the board, go after her and draw a dog.” Ramiro Garcia (1985), baseado nos ensinamentos e estudos de Asher, afirma que há 4 estágios de aquisição de linguagem por meio do TPR. A primeira é a compreensão, sendo necessário que os alunos compreendam a língua antes de produzi-la. O segundo passo é a produção oral (fala), promovida apenas quando os alunos se sentirem confiantes. A terceira e última fase é a leitura e, finalmente, a escrita, facilitadas quando a aprendizagem é iniciada pela compreensão. Ainda segundo o autor, os alunos que aprendem por meio do método são: alunos mais espontâneos ao falarem, alunos mais dispostos a participarem de exercícios orais e alunos mais autoconfiantes para arriscarem a fala. Apesar de ser rotulado como um método funcional apenas para o início da aprendizagem de LE, haja vista a dificuldade de se ensinar conceitos abstratos e tempos verbais mais complexos por meio dele (OLIVEIRA, 2014), Asher (1977) e outros pesquisadores da área (GATTOLIN, 1992; NORTE, 1992; entre outros) concordam que o TPR é um método que, por excelência, produz uma atmosfera altamente motivadora em sala de aula, o que supera as limitações por ele apresentadas e se faz conveniente quando se trata da aprendizagem de LE para crianças, seres tão peculiares e com necessidades, fisiológicas e psicológicas, tão específicas. [...] Um método que é pouco exigente em termos de produção linguística e que envolve movimentos semelhantes aos realizados em jogos reduz o stress do aluno, ele [Asher] acredita, e cria um clima positivo no aprendiz, o que facilita a aprendizagem. (RICHARDS E RODGERS, 2001, tradução da autora) Deste modo, como fornecer aos alunos oportunidades para que eles se sentissem mais confortáveis e motivados em sala de aula a fim de avaliar a atmosfera gerada em consequência eram nossos objetivos com este trabalho, pareceu-nos acertado, A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 18 187 diante do exposto, elaborar atividades que tivessem como base o TPR, método o qual tem a motivação como uma de suas consequências principais. 3 | ASPECTOS METODOLÓGICOS Entende-se que o caráter desta pesquisa é estritamente qualitativo, pois buscou-se compreender fenômenos sociais inseridos em um contexto (BORTONIRICARDO, 2008). Não obstante, há ainda o seu traço interpretativista, uma vez que se pretendeu retratar e refletir sobre o cotidiano de uma sala de aula por meio da observação e interpretação desta pesquisadora. É de se considerar que aqui o pesquisador refletiu e dissertou sobre suas próprias práticas como professor, tornando-se professor-pesquisador (PP) deste estudo. Tal singularidade nos parece bastante conveniente, posto que: O docente que consegue associar o trabalho de pesquisa a seu fazer pedagógico, tornando-se um professor pesquisador de sua própria prática ou das práticas pedagógicas com as quais convive, estará no caminho de aperfeiçoar-se profissionalmente, desenvolvendo uma melhor compreensão de suas ações como mediador de conhecimentos e de seu processo interacional com os educandos. (BORTONI-RICARDO, 2008, p. 32-33). A Tabela 1 descreve os instrumentos de registro de dados utilizados neste trabalho, bem como os objetivos principais de cada um e a linha teórica que eles se baseiam. Instrumento Diário pesquisa Justificativa Baseado em Utilizado para que o PP pudesse fazer anotações rápidas logo após as aulas, fossem elas de cunho descritivo ou não, de maneira que os acontecimentos ainda estivessem de B O R T O N I guardados na memória e tivessem fácil resgate. Além RICARDO, 2008 de reproduções de diálogos, perguntas realizadas e comentários feitos pelos alunos, o PP registrou também as sequências interpretativistas. Utilizado como um complemento ao primeiro instrumento, uma vez que é um instrumento de coleta que permite a obtenção de dados que podem ser de difícil percepção P I N H E I R O , Gravações em e apreensão, como os comportamentos individuais e KAKEHASHI e vídeo grupais, as expressões faciais, a linguagem não-verbal, ANGELO, 2005 os quais são valiosos subsídios para as interpretações posteriores. Ao final das práticas, aplicou-se, também, um questionário B O R T O N I Questionário com os pais objetivando indagá-los sobre as aulas e sobre RICARDO, 2008, com os pais a motivação de seus filhos. p. 61 Tabela 1 - Instrumentos de registro de dados Fonte: Elaborado pela autora (2019) A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 18 188 As práticas ocorreram em um instituto de idiomas localizado em uma cidade de médio porte, no interior do estado de São Paulo, com professores graduados (ou graduandos) em Letras e com uma turma de crianças composta por 2 alunas de aproximadamente 9 anos de idade. Os encontros aconteceram semanalmente (duas aulas de uma hora e quinze minutos cada por semana), por um período de aproximadamente 2 meses, totalizando 19 aulas. 4 | ANÁLISES E RESULTADOS De fato, a motivação dos alunos é um dos aspectos mais importantes possibilitados pelo TPR. Para esta pesquisa, considera-se com relação à motivação os estudos desenvolvidos por Gardner e seus associados sintetizados no Modelo Socioeducacional de Motivação (GARDNER, 1985 apud GATTOLIN, p. 154, 1998): Esse modelo incorpora as crenças culturais do aprendiz, suas atitudes com relação à situação de aprendizagem, sua integratividade e sua motivação. O autor enfatiza que o fator mais importante desse modelo é a motivação, a qual ele define como sendo uma combinação de esforços mais o desejo de atingir o objetivo de aprender a língua-alvo mais atitudes favoráveis em relação à aprendizagem dessa língua. Assim, utilizou-se uma adaptação do TPR em sala de aula a fim de investigar o ambiente proporcionado pelo método, observando, sobretudo, os esforços, desejos e atitudes dos alunos em relação a sua utilização. Observou-se a presença de três fatores relacionados ao TPR fundamentais para o ambiente motivador em sala de aula: o envolvimento físico, a compreensão da língua-alvo e a realidade dos alunos. 4.1 O envolvimento físico Como já exposto, o TPR é um método que propõe o ensino de LE em um contexto de comandos e ações, em que os alunos respondem com movimentos corporais a comandos orais e, assim, vão compreendendo e assimilando a língua-alvo. Em sua dissertação, Norte (1992) discorreu sobre as influências do movimento físico no aprendizado dos alunos, enfatizando, principalmente, a retenção do conteúdo que ele possibilita, já que permite aos alunos fazerem associações de forma a tornar o insumo compreensível. Além disso, tratou da questão da diminuição do stress e da atmosfera de tensão quando ele está presente: [...] [o movimento corporal] é uma forma de tornar o insumo compreensível e minimizar o stress. Além de fornecer um contato estreito entre os participantes, permite maior mobilidade dentro da sala de aula. Esses movimentos satisfazem a necessidade de ação, principalmente quando se trata de crianças. (NORTE, p. 97, 1992). A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 18 189 Certamente, se os aprendizes tivessem que ficar sentados apenas fazendo exercícios escritos ou ouvindo a explanação do professor, eles se cansariam e produziriam muito menos. De fato, a turma antes das aplicações era muito agitada e inquieta fisicamente, quadro que se modificou quando as aplicações se iniciaram, o que é bastante emblemático para a nossa pesquisa. Isso indica que a movimentação utilizada na aula satisfazia a necessidade de ação das alunas, fazendo-as ficarem atentas e motivadas com os conteúdos. Em outros momentos, antes do início das aulas, as alunas questionavam se eles iriam fazer “algo diferente” nelas, referindo-se ao desempenho físico das ações, como mostra a transcrição a seguir: PP: Hello, students! How are you? A1: Teacher, vai ter alguma coisa diferente hoje na aula? PP: Diferente como? A1: Ah, coisa diferente. Diferente de aula normal. PP: Como assim? A1: Ah, igual a aula passada, que tinha aqueles cartazes e a gente fazia mimica do nosso dia com as coisas lá. A1, utilizando os termos “mimica” e “coisas”, estava se referindo, respectivamente, às ações dos comandos e os objetos utilizados para tal. Os movimentos físicos e a utilização de objetos reais rompem com a ideia de sala de aula tradicional, ou seja, com a rotina de sala de aula tradicional, tornando os alunos mais motivados e receptivos ao conteúdo, já que encaram a aula como um evento muito semelhante a brincadeiras. A maneira como o professor desempenha esses comandos também é essencial para que se garanta um ambiente relaxante e agradável de ensino. Norte (1992) postula que os comandos proferidos por ele devem ser bastante variados, oscilando de sérios, tolos a até malucos. Compreendendo a importância dessa questão, a PP desempenhava seus comandos de maneira cômica e divertida, provocando inúmeras reações positivas nas crianças: A1: [dando risada]. Teacher, você é crazy. Bem loucona, einh teacher? A2: [dando risada] Faz de novo! Nesse sentido, os movimentos corporais, aliados aos objetos utilizados e a execução dos comandos, contribuem muito para um ambiente motivador e de baixa ansiedade em sala de aula, sendo favoráveis ao ensino de LI para crianças, o que vem de encontro com autores como Gattolin (1999), Norte (1992), entre outros. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 18 190 4.2 Compreensão da língua-alvo Convergindo com autores como Norte (1992) e Gattolin (1998), a análise de nossos dados comprovou que uma das causas da motivação nos alunos é a compreensão da língua-alvo. O aluno se sente muito mais motivado e, consequentemente, aberto ao aprendizado de uma língua quando ele consegue compreendê-la. Compreendendo-a, ele consegue tanto se engajar na produção oral da mesma quanto no desenvolvimento das atividades propostas, principalmente porque ele se sente confiante. Sobre isso, Krashen (1983, p. 1) afirma: Nós aprendemos a língua quando obtemos input compreensível, quando nós entendemos o que nós ouvimos ou lemos em outra língua. Isso significa que a aquisição é baseada primeiramente no que ouvimos e entendemos. Há inúmeras maneiras de se garantir que os alunos compreendam a língua por meio do TPR, mas destacam-se aqui a repetição e o envolvimento físico. Sobre a repetição, ao contrário do de que se pode imaginar, ela tem: [...] um papel fundamental dentro do ensino de línguas, especialmente quando se trata do ensino formal de uma LE no qual, devido ao período muito limitado de contato entre o aprendiz e a língua-alvo, a repetição fornecida em sala de aula representa um caminho mais curto para o uso efetivo dessa língua (GATTOLIN, p. 143, 1998). Por meio da análise das gravações em vídeo, notou-se que, ao dar os comandos, o professor se utilizava da repetição para promover a compreensão e retenção do insumo pelos alunos, estratégia que pareceu funcionar muito bem. PP: A1, point to Wednesday Addam’s mother. [erra] PP: A2, point to Morticia Addam’s mother. [acerta] PP: A1, point to Wednesday Addam’s mother. [erra] PP: A2, point to Wednesday Addam’s mother. [acerta] PP: A1, point to Wednesday Addam’s mother. [acerta] PP: A1, point to Pugsley Addam’s mother. [acerta] PP: A1, point to Gomez Addam’s mother. [acerta] No excerto anterior, percebe-se que A1, apesar de saber o significado da palavra mother, estava com dificuldades de relacioná-la à pessoa. Assim, a PP repete os comandos para que o foco se desse só na parte da sentença em que ela estava com dúvidas. Tal prática de repetição foi recorrente ao longo das aplicações e surtia efeitos positivos na compreensão dos alunos, sobretudo porque, na hora de darem os comandos aos colegas, eles desempenhavam instantaneamente os comandos mais utilizados pelo professor-pesquisador, ou seja, aqueles os quais ele mais repetia A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 18 191 (como point to, touch the, go to, sit on, jump in etc). Sobre o envolvimento físico, pudemos comprovar que ele também é um dos grandes responsáveis pela compreensão da língua, como apontou Asher em seus estudos sobre o TPR. O aprendiz, ao observar a execução do comando, passa a entender seu significado, o que funciona como “uma poderosa ferramenta alternativa à tradução” (ASHER, 20--). A1: Teacher, não tô lembrando o que é “Put your hands up to speak”. PP: A2, do you know? [responde que sim com a cabeça]. So... Put your hands up to speak, A2! [A2 faz a ação] A1: Ah, já entendi. Faz comigo, Teacher. PP: Put your hands up to speak, A1. [A1 faz a ação e acerta] Essa retenção de insumo, tanto devido à repetição quanto ao envolvimento físico dos alunos, era comprovada ainda mais durante as sessões de revisão no começo de cada aula, nas quais os alunos lembravam de imediato o que havia sido aprendido na aula anterior sem que para isso fosse necessária uma nova explicação do professor. PP: Do you remember the actions? Wake up, get up, take a shower, go to the kitchen…? Do you remember…? I will mime them for you. [explicando gestualmente o que seria feito] A1: Não, Teacher. Deixa a gente... A gente sabe. PP: Do you know? A1: Vai, A2. Fala pra mim que eu faço as ações. Depois a gente troca. [A2 consente e elas desempenham os comandos e ações com sucesso] Destarte, os alunos, compreendendo mais a língua-alvo, sentem-se mais confiantes e se engajam mais nas atividades propostas, o que indica um aumento da motivação em relação ao aprendizado da língua-alvo. No questionário, ao ser interrogada se sua filha cantava as músicas que aprendia em sala de aula em casa, a mãe escreveu: MA: Sim, canta bastante. Não tem vergonha de soltar a voz. Isso eu acho que já é confiança no que aprendem. Na aula 13, por exemplo, em que os alunos foram solicitados a irem para a área externa da escola e ajudar o professor a desenhar uma minicidade no chão, a qual deveria ser grande o suficiente para que elas pudessem andar sobre ela, o professor, após explicar os procedimentos da atividade, não conseguiu dar nem três comandos às alunas que elas já queriam produzi-los por si só: PP: Go to the bank/ Run to the school/ Sit in... A1: Teacher, deixa a gente dar os comandos. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 18 192 PP: Ok! Give the commands to A2. A1: A2, go to the school and study English. Além da vontade das alunas de produzirem os comandos e de não somente responder a eles, tem-se a questão de suas extensões. A princípio, era solicitado que as alunas apenas usassem os lugares aprendidos nos comandos, e não as ações relativas a cada um. Observamos que elas se anteciparam, o que indica, além da retenção das ações aprendidas na aula anterior, um engajamento e motivação maiores naquela atividade. Gardner (1985) já havia definido a motivação como uma combinação de esforços mais o desejo de atingir o objetivo de aprender a línguaalvo mais atitudes favoráveis em relação à aprendizagem dessa língua, o que se encaixa perfeitamente nesse contexto. 4.3 Realidade dos alunos Intentou-se, durante o desenvolvimento dos planos de aula, aliar, sempre que possível, as atividades à realidade das alunas, pois acredita-se na importância dessa questão: “[...] a escola deve trabalhar com o conhecimento do cotidiano, mais próximo da realidade dos alunos concretos que frequentam as escolas [...]” (MELO e URBANETZ, 2008, p. 115). Assim, ao longo das aplicações, pareceu-nos claro que as alunas se motivavam ainda mais quando as atividades faziam parte de suas realidades ou elas podiam fazer associações com elas. No início, por exemplo, o tema principal das práticas era verbos de rotina (como wake up, get up, take a shower, have lunch, have breakfast, have dinner, go to school, do the homework etc.), o que fez com que as alunas se identificassem muito com essas aulas, porque eram ações que, em maior e menor grau, faziam parte de suas realidades. Objetos utilizados em seus cotidianos (como esponjas, escovas de dente, escova de cabelo, touca de banho, pratos, talheres e canecas) foram trazidos fisicamente para o desempenho dos comandos, demonstrando seus desejos de desempenhá-los ainda mais. Além disso, ansiavam por mostrarem aos colegas e professor de que maneira desempenhavam aquela ação em suas casas, de que maneira tomavam banho, de que maneira tomavam café da manhã, se tomavam café da manhã etc., promovendo, até mesmo, uma discussão sobre diferentes costumes e culturas em sala de aula. Em inúmeros momentos, conteúdos foram cortados das aulas, pelas próprias alunas, por não fazerem parte de seus cotidianos. Lugares, como Sports Center, por exemplo, foram substituídos por Park ou Shopping Mall, dado que as alunas não têm referência de Sports Center em suas rotinas. O comando Catch the bus, por sua vez, só foi utilizado durante a explanação do professor e em mais nenhum momento e isso se deve ao fato de que a ação de pegar o ônibus não era uma ação recorrente A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 18 193 naquele contexto e, da mesma forma que o aluno se motiva com um conteúdo que é parte de sua realidade, ele acaba não se interessando por aquele que não é. Na verdade, a intenção das alunas era desempenhar ações que fossem bem próximas de suas realidades, o que fazia com que elas questionassem o professor de maneira ainda mais específica: AA: Como é “ir para a escola de carro”? / Como é “almoçar na casa da minha vó”? / Teacher, como é “fazer a lição de ciências”? Na aula 16, em uma apresentação de sentenças as quais podiam acontecer na escola (Listen to the teacher/ Work with a partner/ Copy the sentences/ Ask the teacher/ etc) feita pelo professor por meio de imagens e ações, há a seguinte anotação do professor no diário de pesquisa: PP: Alunas ficaram empolgadas para comentarem o lugar de cada ação em seus próprios cotidianos escolares, contavam como aconteciam aquelas ações em suas turmas/escolas e questionavam sobre como dizer outras ações que não estavam no planejamento, mas que elas executavam na escola. Tal passagem, juntamente com a análise das gravações em vídeo desse momento, demonstra um engajamento das alunas naquela atividade, principalmente pelo fato de ela ter possibilitado uma relação com seus próprios cotidianos escolares. A atividade, então, foi significativa a elas e, sendo significativa, reteve em maior grau suas atenções e facilitou seus aprendizados. A aula 13, em que os alunos foram dirigidos à área externa da escola para desenharem a minicidade com giz no chão, foi uma aula bastante emblemática para a nossa pesquisa, porque ela nos mostrou que, para além dos aspectos linguísticos da língua, as atividades aplicadas também foram capazes de trazer uma formação cidadã aos alunos. Certamente, ensinar língua estrangeira não é apenas ensinar a língua pela língua, [...] é procurar auxiliar a criança [ou qualquer aprendiz] a construir caminhos que a ajudem a ampliar o conhecimento de si própria e da sociedade em que vive, a compreender melhor os contextos que a cercam, fortalecendo-a com a visão positiva e crítica de si mesma e das diferenças, a integrá-la no mudo plurilíngüe, pluricultural e densamente multisemiotizado em que vivemos [...] (ROCHA, 2008, p. 20) Ao desenharem a minicidade no chão, elas consideraram, sozinhas, que nela deveria haver faixas de pedestres, semáforos, lixeiras nas ruas, além de nomearem cada lugar na cidade de acordo com suas imaginações (Grandpa’s Bakery, Maria’s Park etc). Além disso, ao andarem pela minicidade e responderem aos comandos feitos pelos colegas, elas optavam por andarem na mão correta da via, parar nos semáforos ou deixar pedestres atravessarem na faixa. Quando alguma aluna dizia, A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 18 194 por exemplo, “Go to the bank and get some money”, a outra aluna ia até o banco, passava pelo detector de metais, aguardava na fila e só depois tirava o dinheiro no caixa. 5 | CONSIDERAÇÕES FINAIS Intentando trazer contribuições significativas para essa discussão, esta pesquisa propôs o ensino de LIC por meio da utilização de uma adaptação do TPR em sala de aula, oferecendo ao docente maior sistematização e não o deixando à mercê do livro didático ou de sua formação insatisfatória. Investigou-se, principalmente, qual seria a atmosfera de ensino proporcionada pelo método. Concluiu-se que o TPR é uma ferramenta bastante útil no ensino-aprendizagem de LIC, sobretudo porque ele possibilita a motivação das crianças, a qual é garantida por meio do envolvimento físico, da compreensão da língua-alvo e da inserção da realidade dos alunos nas atividades. Entende-se que os resultados aqui alcançados podem em muito contribuir para o ensino-aprendizagem de LIC no contexto brasileiro, orientando as práticas pedagógicas dos profissionais da área de ensino de LE e apresentando-lhes diferentes maneiras de lidar com essa faixa-etária em sala de aula. REFERÊNCIAS ASHER, J. Learning another language through actions: the complete teacher’s guidebook. Los Gatos, Calif.: Sky Oaks Publications, 1ª ed.1977, 3ª ed. 1986. ASHER, J. The Total Physical Response, known world-wide as TPR. [20--] Disponível em: http:// www.tprsource.com/asher.htm Acesso em: 4 nov 2015. ASSIS-PETERSON, A. A.; COX, M. I. P. Inglês em tempos de globalização: para além de bem e mal. English in the age of globalization: beyond good and evil. Calidoscópio, v. 5, n. 1, jan/abr. Unisinos, 2007. BORTONI-RICARDO, S. M. O professor pesquisador: introdução à pesquisa qualitativa. São Paulo: Parábola. 135p. 2008. (Série Estratégias de Ensino, n. 8.) BRASIL. 1996. MEC. 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A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 18 197 CAPÍTULO 19 doi O PIBID E O USO DOS RECURSOS DIDÁTICOS/ TECNOLÓGICO NA SALA DE AULA Data de aceite: 06/01/2020 Eronice Rodrigues Francisco Professora da Escola Estadual Maria Auxiliadora – Supervisora Pibid-Informática. Alto Araguaia – MT – Brasil Sandra R. Hermes dos Santos Professora da Escola Estadual Maria Auxiliadora – Supervisora Pibid-Informática. Alto Araguaia – MT – Brasil Sérgio S. S. Filho Docente do curso de Licenciatura em Computação e Bacharelado em Ciência da Computação – Universidade do Estado de Mato Grosso – Alto Araguaia – MT – Brasil. daquele tradicionalismo. O papel do supervisor do PIBID é possibilitou intermediar o trabalho dos bolsistas, professores e alunos, proporcionando a interação, socialização e contribuição para um aprendizado significativo. Percebeu-se que as atividades aplicadas abordando os gêneros textuais pelos bolsistas do projeto PIBID foram significativas e dinâmicas. A experiência como supervisora do PIBID está sendo única e muito significante, pois o envolvimento e o empenho de todos causou um impacto positivo na escola. PALAVRAS-CHAVE: Experiência. Aprendizagem. Recursos pedagógicos. PIBID AND THE USE OF TEACHING / TECHNOLOGICAL RESOURCES IN THE RESUMO: Neste artigo é apresentado um relato de experiência como supervisora do Subprojeto PIBID-Informática do Campus Universitário de Alto Araguaia- MT. O objetivo deste é apresentar algumas atividades desenvolvidas pelos bolsistas IDs com aplicação de conteúdos didáticos por meio de uma metodologia diferenciada utilizando recursos/tecnologias digitais. A metodologia utilizada foi à expositiva e ativa, pois colocou o discente no centro do aprendizado. Os resultados evidenciaram que as aulas planejadas e executadas com os recursos tecnológicos despertaram os interesses dos alunos em aprender, e assim possibilitando que o professor inove e saia CLASSROOM ABSTRACT: This article presents an experience report as supervisor of the PIBID-Informatics Subproject of the Alto Araguaia University Campus-MT. The purpose of this is to present some activities developed by IDs scholars with the application of didactic content through a different methodology using digital resources / technologies. The methodology used was expository and active, because it placed the student at the center of learning. The results showed that the classes planned and executed with the technological resources aroused the students' interest in learning, thus enabling the A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 19 198 teacher to innovate and leave that traditionalism. The role of the supervisor of PIBID is to make it possible to intermediate the work of the fellows, teachers and students, providing interaction, socialization and contribution to meaningful learning. It was noticed that the applied activities addressing the textual genres by the PIBID project fellows were significant and dynamic. The experience as a PIBID supervisor is being unique and very significant as everyone's involvement and commitment has had a positive impact on the school. KEYWORDS: Experience. Learning. Pedagogical resources. 1 | INTRODUÇÃO A utilização de recursos tecnológicos vem ganhando cada vez mais espaço nas escolas. Por isso, o contato do aluno com a tecnologia é muito importante desde cedo, mantendo-o ao longo de sua formação. O uso de novas tecnologias faz a diferença ao proporcionar práticas pedagógicas inovadoras. Somos desafiados a todo instante. É possível fazer algo mais pela educação, sem medo de novos desafios, pois o professor deve estar em constante busca pelo conhecimento. Cada vez mais a escola está passando por transformações do ponto de vista tecnológico, onde o professor e o aluno estão cada vez mais inseridos na lógica informacional e tecnológica da produção do conhecimento. Faria (2004) explica que os recursos tecnológicos facilitam a passagem do modelo mecanicista para uma educação sócio interacionista. É importante criar um ambiente de ensino e aprendizagem instigante, que proporcione oportunidades para que os alunos participem. Neste trabalho apresentaremos algumas das práticas realizadas pelos bolsistas do Subprojeto PIBID-Informática do Campus Universitário de Alto Araguaia-MT. O objetivo deste artigo é apresentar algumas atividades desenvolvidas pelos bolsistas IDs com aplicação de conteúdos didáticos por meio de uma metodologia diferenciada utilizando recursos/tecnologias digitais. A metodologia utilizada foi a expositiva e ativa, pois colocou o discente no centro do aprendizado. Os resultados evidenciaram que as aulas planejadas e executadas com os recursos tecnológicos despertam os interesses dos alunos em aprender. 2 | METODOLOGIA O planejamento das aplicações foi organizado em dois momentos: Planejamento didático e tecnológico: Foi sugerido para cada trio um recurso tecnológico a ser aplicado em sala de aula e laboratório de informática. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 19 199 Foram apresentados alguns recursos tecnológicos: Lousa Digital, LibreOffice Impress, LibreOffice Writer, sempre utilizando Datashow, sugerimos os conteúdos didáticos a serem aplicados, onde foi optado por trabalhar os gêneros textuais, porque conforme as diretrizes dos PCN (Parâmetros Curriculares Nacionais) de Língua Portuguesa, para o Ensino Fundamental I, “[...] é papel da escola possibilitar o acesso do educando às diversas formas textuais que circulam na sociedade, ensinando-o a produzi-las e compreendê-las”. Os gêneros textuais trabalhados foram: paródia musical, histórias em quadrinhos, fábulas e poemas. As bolsistas IDs que trabalharam o gênero paródia musical usaram o Data Show para explicar e exemplificar sobre a origem e sobre os diversos tipos de parodia; trouxeram vários exemplos impressos e cada aluno pode perceber a variação do gênero. Para que os alunos produzissem foi escolhido: Paródia musical e então foram apresentadas várias parodias musical, alguns vídeos e os alunos foram incentivados a cantarem as paródias que foram trazidas pelos bolsistas. Após a fase de explicação, foi dado um tempo para que os alunos escolhessem a música para fazer a paródia musical usando temas como: escola; meio ambiente e direito das crianças. O segundo momento foi de criação, cada dupla começou a escrever sua paródia musical, tendo como consultar a letra original da música e como já sabiam praticamente de cor as músicas a maioria das duplas não teve dificuldade para produzir belas paródias. Na sequência da aplicação, os alunos foram levados para o laboratório de informática onde puderam fazer a digitação e formatação usando LibreOffice Writer. Para finalizar puderam cantar suas paródias, pois as bolsistas levaram o Play Black das músicas parodiadas e foi um verdadeiro festival de música. Houve também gravação de vídeo com as apresentações das paródias. Muito produtiva e encantadora, pois os alunos aprenderam se divertindo. Os bolsistas IDs que trabalharam o gênero Histórias em Quadrinhos iniciaram as aulas com uma roda de Leitura onde os alunos recontaram com riqueza de detalhes as histórias que leram nos gibis, com isso trabalhou a oralidade. Com a utilização da lousa Digital e o Datashow multimídia passaram os slides para aplicação do conteúdo, ensinaram a estes alunos um pouco mais sobre HQs, por exemplo, as onomatopeias, tipos de gêneros textuais, tipos de balões e exemplos em dois vídeos de como elaborar HQs entre outros. Após esta aplicação de aula em laboratório, os alunos produziram uma história que posteriormente se tornaria uma HQ (História em quadrinho) com o aplicativo online Toondoo, disponível em http://www.toondoo.com. Para próxima etapa levaram os alunos para o Laboratório onde eles tiveram acesso a um login e senha, podendo assim acessar a página de criação de HQs onde puderam transportar do papel para o site, escolhendo os personagens, animações A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 19 200 e fundos que o aplicativo oferecia. As HQs produzidas por eles demonstraram criatividade, imaginação e surpreenderam ao escreverem, mostrando interesse em escrever mais HQs. Os bolsistas que trabalharam com o gênero Fábula apresentaram aos alunos atividades de leitura e interpretação de algumas fábulas, foram apresentados também alguns vídeos. Os alunos tiveram a oportunidade de realizar leitura individual em um site da Internet, o qual oferecia histórias com áudio e movimentação dos personagens. Após as conclusões das atividades, os alunos criaram suas próprias Fábulas. Os alunos foram auxiliados nas produções e foi sugerido que os mesmos representassem a fábula que produziram em cartolina. Em outro momento os alunos foram levados ao laboratório de informática para que fizessem a digitação, formatação e a ilustração usando LibreOffice Writer e o Kalourpaint. O outro grupo de bolsista trabalhou como o gênero Poema. Iniciou a aplicação do conteúdo questionando se os alunos conheciam poema e se já viram alguém recitando. Isto estimulou os alunos a refletir sobre o gênero. Distribuíram cópias das poesias de Manuel Bandeira, Manoel de barros e outros autores para que pudessem ler e interpretar. Na sequência explicaram a definição poema, verso e estrofe e mostraram alguns vídeos que reproduziam a leitura de poemas. Após esta etapa, as crianças foram separadas em duplas e fizeram a leitura em voz alta da poesia escolhida, ressaltando o ritmo e a entonação na leitura do gênero. Finalizaram a aplicação pedindo que cada dupla produzisse e ilustrassem seu poema dentro dos temas sugeridos (primavera, criança, estações do ano, Alto Araguaia, E essa turma também foram levados ao laboratório de informática para digitação e formatação usando LibreOffice Writer o Kalourpaint. 3 | RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados evidenciaram que as aulas planejadas e executadas pelos bolsistas utilizando os recursos tecnológicos despertaram os interesses dos alunos em aprender, pois os alunos demonstraram mais interesses e motivação em participar e desenvolver as atividades propostas. A partir das vivências proporcionadas pelo PIBID, foi possível perceber a importância e a emergência do uso das tecnologias em sala de aula e como estas se apresentam como um instrumento de mediação pedagógica, servindo tanto para o professor como para o aluno. O PIBID vem nos ajudando a concretizar práticas pedagógicas que podem contribuir com o nosso processo educativo, sobretudo, na melhoria da qualidade das aprendizagens dos alunos da Escola Estadual “Maria Auxiliadora”. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 19 201 4 | CONSIDERAÇÕES FINAIS Os recursos tecnológicos na educação escolar contribuem na inovação da prática do professor na sala de aula, pois eles trazem para o processo de ensino aprendizagem uma mudança significativa da função do educando, pois o torna partícipe do processo educativo, bem como impulsiona o professor a buscar novos conhecimentos e se adequar às constantes mudanças que a sociedade tem passado e que a escola não pode ficar indiferente. As tecnologias estão cada vez mais presentes em nossas vidas sendo assim também inseridos na escola e o professor cada vez mais precisa se atualizar, Segundo THOALDO (2010); “A educação no mundo de hoje tende a ser tecnológica, por isso, exige entendimento e interpretação, tanto dos professores quanto dos alunos em relação a essas novas tecnologias. Através do uso da tecnologia no ambiente escolar, ficam claros os diversos sentimentos em relação a postura dos professores frente a novos desafios, como a satisfação de estar participando de uma realidade tecnológica ou a ansiedade por enfrentar novas mudanças. E em relação aos alunos também ocorrem transformações, pois passam a ficar mais motivados para estudar e aprender, e as aulas não ficam tão expositivas.” Como professora supervisora, aprendi muito, pois percebi a importância do professor estar sempre se atualizando, pois o conhecimento adquirido é nosso, mas a educação está sempre em processo de formação, logo o professor mesmo depois de formado, não está pronto, é um processo contínuo, que não acaba no final da graduação. Estando na era da tecnologia, nossos alunos estão chegando as nossas salas de aula, cada vez mais curiosos, pois eles têm acesso a vários meios de informação. Daí a importância de nós professores estarmos sempre se atualizando. O uso dos recursos tecnológicos/tecnologias digitais vem ganhando cada vez mais espaço nas escolas. O contato do aluno com a tecnologia é muito importante desde cedo. Qualquer que seja a disciplina, matéria ou conteúdo pode ter atividades preparadas, construídas e realizadas com recursos tecnológicos aplicados de forma pedagógica. As atividades realizadas pelos bolsistas IDs na escola enriqueceram e facilitaram o aprendizado dos alunos e também causou motivação em nós professores contribuindo assim para o nosso desenvolvimento profissional, pois notamos que teríamos que (re) aprender muitas de nossas metodologias de ensino. REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Educação. Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua Portuguesa, 1ª a 4ª séries. 3ª ed. Brasília. MEC- Secretaria de Ensino Fundamental, 2001. FARIA, E. T. Professor e as novas Tecnologias. In: ENRICONE, D. (org.) Ser Professor. Porto. Thoaldo, D.L.P.B. (2010) O uso da tecnologia em sala de aula. Trabalho de Monografia apresentado na pós-graduação em Gestão Pedagógica da Universidade Tuiuti do Paraná 1: 1-35. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 19 202 CAPÍTULO 20 doi O PROCESSO DE INCLUSÃO SOCIAL DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA VISUAL: O PAPEL DA INCLUSÃO DIGITAL Data de aceite: 06/01/2020 Data de submissão: 19/10/2019 Anderson Barros da Silva Graduado em Gestão de Recursos Humanos e Psicologia (Bacharelado) pela Universidade Cruzeiro do Sul. Licenciado em Pedagogia pela Universidade Cidade de São Paulo. Especialista em Educação a Distância e Mestrando em Ensino de Ciências e Matemática pela Universidade Cruzeiro do Sul Universidade Cidade de São Paulo – UNICID, São Paulo – SP. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq. br/0216402976395965 Geni Emília de Souza Graduada em Serviço Social (Centro Universitário UniFMU-SP), Mestre em História Econômica (FFLCH- USP), Especialista em Violência Doméstica contra a Criança e Adolescente VDCA (LACRI/IPUSP), Especialista em Informática na Educação ((Universidade Cruzeiro do Sul). Universidade Cruzeiro do Sul – UNICSUL, São Paulo – SP. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq. br/6414434352749200 RESUMO: Dentre os vários aspectos ligados à inclusão social, elegeu-se como objeto desta investigação o papel ocupado pela inclusão digital de pessoas com deficiência visual, devido à sua relevância social e necessidade de abordar o tema, buscando-se compreender os possíveis impactos na vida dos sujeitos com essa deficiência, a partir das perspectivas teóricas que se debruçaram e que permitem compreender essa realidade. O percurso metodológico passou pelo levantamento bibliográfico, seguido de uma revisão da literatura pertinente ao tema pesquisado. A análise pauta-se nos conceitos desenvolvidos por Sawaia (1999), Martin-Baró (2003) e pela legislação brasileira. O presente estudo teve como objetivo analisar metodologicamente o papel da inclusão digital no processo de inclusão social de pessoas com deficiência visual, a partir de uma visão sociocultural comprometida com a promoção da cidadania. As tecnologias assistivas colaboram para a inclusão digital de pessoas com deficiência visual, o que possibilita a sua inclusão social. Como resultado, constatase que a inclusão digital é um forte constituinte e garantidor da inclusão ou exclusão social, embora haja a necessidade de produzir novas pesquisas qualitativas e quantitativas, nas quais se busque compreender a efetividade do processo de inclusão digital no processo de inclusão social das pessoas com deficiência visual, na perspectiva desses sujeitos e a sua representatividade nos dados estatísticos. PALAVRAS-CHAVE: Inclusão social, inclusão digital, deficiência visual, tecnologias assistivas. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 20 203 THE PROCESS OF SOCIAL INCLUSION OF PERSONS WITH VISUAL DISABILITY: THE ROLE OF DIGITAL INCLUSION ABSTRACT: Among the various aspects of social inclusion, was elected as the object of this research the role occupied by the digital inclusion of people with visual impairment due to their social relevance and the need to address the issue, seeking to understand the possible impacts on the lives of individuals with this deficiency, from the theoretical perspectives that have studied and allow us to understand this reality. This was literature. The analysis staff on the concepts developed by Sawaia (1999), Martin-Baro (2003) and by Brazilian law. This study aimed to analyze methodologically the role of digital inclusion in the process of social inclusion of people with visual impairment, from a sociocultural vision committed to the promotion of citizenship. Assistive Technologies collaborate to the digital inclusion of people with visual impairments, enabling social inclusion of these people. As a result, it appears that digital inclusion is a strong constituent and guarantor of inclusion or social exclusion, although there is the need to produce new qualitative and quantitative research, in which seeks to understand the effectiveness of the process of digital inclusion in the inclusion process social of people with visual disabilities, in view of these subjects and their representation in statistical data. KEYWORDS: social inclusion, digital inclusion, visual impairment, assistive technologies. 1 | INTRODUÇÃO O processo de globalização, também conhecido como mundialização dos capitais, trouxe consigo novos paradigmas e conceitos, que cobram da sociedade novas formas de inserção social. Neste mundo globalizado, a informação está a apenas um clique, no entanto, deve-se pensar o papel da inclusão digital de pessoas com deficiência visual no processo de inclusão social, pois os sujeitos com deficiência visual não podem ser ignorados ou negligenciados no cenário atual. Além disso, devem-se analisar sistematicamente os caminhos a serem percorridos, para que se possa promover a cidadania de forma efetiva, sem que se inicie um processo de inclusão perversa, que sustenta ideologias violentas no encobrimento da violência perpetrada na dialética da inclusão/exclusão, que por muitas vezes ocorre conjuntamente (SAWAIA, 1999). A partir da análise sistemática dos dados, poder-se-á, por fim, pensar novas estratégias de desenvolvimento social e educativo. Embora Morcelli e Seabra (2014), considerem que diversas pesquisas recentes estejam sendo produzidas na área, devido a necessidade e tamanha importância do tema, percebe-se uma carência igualmente grande de materiais significativos que abordem o assunto de forma clara e satisfatória em língua portuguesa. Pode-se A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 20 204 pensar que o entrave possa existir no uso da tecnologia, ou apenas nas dificuldades de inserir sujeitos cegos no uso das tecnologias, no entanto, é necessário considerar o processo sócio-histórico do país e seus desdobramentos na construção da cidadania e identidade social da população em geral. Para que se possa tratar o tema de forma satisfatória, é necessário analisar a forma como o processo de inclusão digital é tratado frente à inclusão social e consequentemente, analisar o papel da inclusão digital de deficientes visuais na promoção da cidadania. Entretanto, devem-se observar os reais resultados na prática social e nas vidas dos sujeitos participantes. Sendo assim, deve-se verificar se os resultados são de fato de valor positivo na vida do sujeito ou se apenas contribuem para manutenção da ideologia dominante, utilizando-se dados das pesquisas nacionais publicadas. Os objetivos específicos do trabalho de pesquisa em questão versam sobre uma melhor compreensão das dificuldades e necessidades existentes no processo de inclusão digital de pessoas com deficiência visual, visando à promoção da cidadania. É necessário observar quais são os obstáculos a serem superados para que a inclusão ocorra de forma efetiva e não seja um processo que reafirme a exclusão, ou seja, para que não ocorra uma inclusão perversa (SAWAIA, 1999). Além disso, deve-se observar o papel da inclusão digital no processo de inclusão social, uma vez que, o processo de globalização avança de forma cada vez acelerada, solicitando à sociedade, cidadãos bem preparados para as novas demandas, não podendo o sujeito cego ser excluído do sistema social. Essa é uma pesquisa bibliográfica de abordagem qualitativa, pois se considera que seja a mais adequada para tratar a questão, devido à escassez de materiais publicados no Brasil sobre o tema. Buscou-se analisar metodologicamente o papel da inclusão digital no processo de inclusão social de pessoas com deficiência visual, a partir de uma visão sociocultural comprometida com a promoção da cidadania. Para que seja possível abordar o papel da inclusão digital no processo de inclusão social de pessoas com deficiência visual, enquanto prática de cidadania é necessário fundamentar as bases de pesquisa, muito embora, é possível se perceber a necessidade de tratar o tema justamente pelo fato de pouco material ter sido produzido em língua portuguesa. Este trabalho é organizado em seções. A seção 2 apresenta os aspectos históricos acerca da deficiência. A seção 3 aborda a dialética inclusão / exclusão a partir dos pressupostos teóricos de Sawaia (1999) e Martin-Baró (2003). Na seção 4 será discutido o processo de inclusão digital de pessoas com deficiência visual, partindo-se de um contexto mais amplo para abordar de forma satisfatória como esse processo ocorreu e ocorre no Brasil, destacando-se o papel A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 20 205 das tecnologias assistivas. Por fim, são apresentadas as considerações finais e as referências que deram sustentação a esse trabalho. 2 | ASPECTOS HISTÓRICOS SOBRE A DEFICIÊNCIA “Há aqueles que lutam um dia; e por isso são muito bons; Há aqueles que lutam muitos dias; e por isso são muito bons; Há aqueles que lutam anos; e são melhores ainda; Porém há aqueles que lutam toda a vida; esses são os imprescindíveis” (Bertolt Brecht). De acordo com Amiralian (1986), no percurso histórico da humanidade, as pessoas com deficiência têm percorrido caminhos tortuosos, com diversos obstáculos e limitações sociais, ou seja, restrições que ultrapassam as condições físicas e psíquicas do sujeito, pois os entraves que dificultam a aceitação social das pessoas com deficiência ao longo da história se deram, e se dão, no âmbito biopsicossocial. Biológicas por causa das limitações físicas dessas pessoas, psicológicas e sociais porque se deve considerar o psiquismo e as interações sociais estabelecidas na produção de sentido para o que se compreende como deficiência, bem como o papel social das pessoas com essas condições. Amaral (1995), aponta que há algum tempo, existe uma tendência entre diversos autores em considerar a necessidade de compreender o contexto no qual a situação do deficiente emerge, necessidade essa que está para além da compreensão do conceito, por considerarem que toda deficiência é social. Entretanto, essa é uma consideração atual e nem sempre foi assim. Os registros históricos comprovam que as pessoas com deficiência foram excluídas e segregadas socialmente por muito tempo, sendo que nos dias atuais ainda se evidencia os processos de exclusão por meio da discriminação e preconceito que essas pessoas sofrem. Embora não haja registros do modo como os sujeitos com deficiência viviam e eram tratados na pré-história, considerando-se as condições físicas e climáticas da época, pode-se inferir a inexistência de abrigos que os protegesse durante os dias e as noites, de modo que as pessoas estivessem expostas ao calor e a frio intensos. A escassez e o fato de não se cultivar alimentos obrigava as pessoas a caçarem e a mudarem periodicamente. A caça fornecia não somente o alimento, que deveria ser cultivado durante o inverno, mas também como material para proteção ao frio. A partir da manifestação da inteligência, o homem demonstrou ser um sujeito gregário, inicialmente sugiram os pequenos grupos de caça, até que preocupados com a sobrevivência, saúde e segurança dos membros do grupo, surgiram as tribos. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 20 206 Todavia, considera-se que devido às condições ambientais, a sobrevivência das pessoas com deficiência nesse período fosse impossível, pois além das atividades de caça, pesca e colheita de frutos, folhas e raízes, havia a necessidade de deslocamentos constantes, em busca de melhor ambiente para viverem. Sendo assim, essas pessoas eram percebidas como um fardo para o grupo. Dessa forma, se desfazer das crianças que nasciam com deficiência era prática comum em certas tribos, pois somente os mais fortes sobreviviam. Com o passar do tempo, essas pessoas continuaram a ser percebidas como obstáculos para a sociedade (AMARILIAN, 1986). De acordo com Silva (2010), o Egito antigo é uma exceção, pois há evidências arqueológicas que fazem referência ao fato de que as pessoas com deficiência estavam presentes nas diferentes hierarquias sociais. Entretanto, nas demais civilizações, Grécia e Roma antiga, por exemplo, o abandono e sacrifício dessas pessoas eram práticas comuns. As crianças que não eram sacrificadas ficavam escondidas. Na Idade Média, existia uma ambiguidade no modo como as pessoas com deficiência eram vistas e tratadas. Ora a ideia de castigo divino era utilizada para justificar a condição dessas pessoas, ora atribuía-se a elas poderes especiais. Foi durante o reinado de Luís IX (1214 – 1270), que foi criado o primeiro hospital para pessoas cegas, o Quinze-Vingts (15 x 20 = 300), em referência ao número de soldados que retornaram cegos da Sétima Cruzada (SILVA, 2010). Durante o século XIX, no Instituto Nacional dos Jovens Cegos de Paris, Charles Braille (1809 – 1852) desenvolveu o sistema de escrita padrão utilizado por pessoas cegas até os dias atuais, o BRAILLE, após ter seu pedido de aperfeiçoamento do sistema de escrita noturna, negado por Charles Barbier 1(1764 – 1841). A criação do sistema Braille, em 1829, inaugurou “a era moderna” da história das pessoas cegas, promovendo uma verdadeira revolução no processo de ensino e aprendizagem dos cegos. A partir de então, a institucionalização da educação e da profissionalização dos cegos ganhou impulso, e o Braille se configurou como a forma mais efetiva de escrita e leitura para pessoas cegas. No entanto, a progressiva proliferação das instituições especializadas em educação de cegos em todo o mundo, por si só, não lhes garantiu integração na sociedade, acesso a direitos, nem fim do preconceito e do estigma associado à cegueira (JÚNIOR; MARTINS, 2010, p.28). Nas Idades Moderna e Contemporânea, muitos foram os avanços quanto ao processo de inclusão social das pessoas com deficiência, por conta disso, este trabalho concentrar-se-á nos estudos que tratam sobre a deficiência visual e o processo de inclusão dessas pessoas. Charles Barbier desenvolveu o código de comunicação noturna a pedido de Napoleão. O código deveria ser utilizado para transmitir mensagens à noite durante as batalhas, mas foi rejeitado pelos militares por ter sido considerado complexo demais. 1 A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 20 207 A frase em epígrafe declara que há lutas diárias, mensais e anuais e que essas lutas tornam os sujeitos muito bons e melhores ainda, do que eram antes delas. Porém há ainda, aqueles que lutam e lutarão por toda a vida e, por isso, podem ser chamados de imprescindíveis, de excepcionais. Entretanto, não se deve esquecer que, apesar dessas lutas, essas pessoas são pessoas, cidadãos e cidadãs de direito, que merecem ser conhecidas e para conhecê-las, é necessário compreender o caráter dessas lutas, nas quais, de modo mais ou menos violento, se encontra a exclusão que os marca e os marcará para sempre e, por conseguinte, o seu desdobramento, que nem sempre é uma inclusão. 3 | A DIALÉTICA INCLUSÃO / EXCLUSÃO SOCIAL “Do rio que tudo arrasta se diz que é violento. Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem” (Bertolt Brecht). De acordo com Sawaia (1999), a inclusão social pode ser compreendida como a transmutação do processo de exclusão. Portanto, para que se possa falar do processo de inclusão, a qual os deficientes visuais estão submetidos dentro da lógica social, torna-se necessário compreender o seu desdobramento, ou seja, o processo de exclusão social. Sobre a exclusão, Sawaia (1999, p. 9), reflete que: [...] é processo complexo e multifacetado, uma configuração de dimensões materiais, políticas e subjetivas. É processo sutil e dialético, pois só existe em relação à inclusão como parte constitutiva dela. Não é uma coisa ou um estado, é processo que envolve o homem por inteiro e suas relações com os outros. Não tem uma única forma e não é uma falha do sistema, devendo ser combatida como algo que perturba a ordem social, ao contrário, ele é produto do funcionamento do sistema. Dessa forma, entende-se a inclusão como forma constituinte da exclusão, uma vez que só existe como processo oposto ao primeiro, portanto, dependente da exclusão, que está para além das desigualdades sociais. Segundo Sawaia (1999), em lugar da exclusão, existe uma dialética inclusão/ exclusão, que produz subjetividades específicas, que poderão revelar sentimentos de inclusão ou até de discriminação e revolta, de modo que a determinação econômica não dará conta de explicar essas subjetividades, uma vez que, são determinadas e determinam diferentes formas de legitimação social e individual em suas manifestações de identidade, sociabilidade, afetividade, consciência e inconsciência que se manifestam no cotidiano, ou seja, nas relações sociais. Pode-se então inferir que para determinar se um processo é efetivamente inclusivo, deve-se buscar conhecer as perspectivas e vivências dos sujeitos aos A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 20 208 quais esse processo se destina, dando-lhes recursos para que possam analisar o binômio inclusão/exclusão como um processo complexo. Nesse sentido, Martin-Baró (2003), aponta para a urgência em perceber o que definiu como violência estrutural, que para o autor é a violência que deriva da estrutura social e da forma como a sociedade organiza os meios de produção e consumo. Segundo o autor, a valorização social ou justificação, são definidas como o valor atribuído a um ato, de modo que seja aceito em determinada sociedade ou funcione como justificativa para este, influencia na percepção dos sujeitos e dificulta o processo reflexivo. Sawaia (1999, p. 8), enfatiza que esse binômio não é em si subjetivo nem objetivo, individual nem coletivo, não sendo também racional nem emocional. Mas “é processo sócio-histórico, que se configura pelo recalcamento em todas as esferas da vida social, mas é vivido como necessidade do eu, como sentimentos, significados e ações” (1999:8). Uma vez recalcado, esse conteúdo deve ser ressignificado. Entretanto, de acordo com Martin-Baró (2003), a estrutura do ato tem em si amplitude, de modo que o ato pode ou não ser percebido como violento, sendo que o que determina o caráter agressivo do ato não é o uso de força física, mas a presença da opressão e a submissão que ele condiciona para atingir determinada finalidade. Ao resgatar a frase em epígrafe com base nesse pensamento, pode-se pensar que o rio que tudo arrasta é a expressão da violência, a ação, a força física, o ato violento. Enquanto que, pelas margens que o comprimem, se compreende a maneira como a sociedade se estrutura, se organiza, na qual está presente a opressão social e submissão dos sujeitos excluídos. Sendo assim, pode-se pensar que se o processo de inclusão não considerar o sujeito em sua inteireza, de modo a permitir a práxis, mas ao invés disso condicione a uma submissão, esse caracterizar-se-á por uma inclusão perversa, que inclui para excluir. 4 | INCLUSÃO DIGITAL DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA VISUAL “Quando eu digo que vejo um objeto à distância, quero dizer que já o possuo ou que ainda o possuo, ele está no futuro e no passado ao mesmo tempo em que está no espaço” (MERLEAU-PONTY, 1997, p. 306). Os avanços do mundo na era global demandam que o cidadão saiba utilizar as Tecnologias da Informação e da Comunicação – TICs, para que tenha sucesso em uma sociedade cada vez mais competitiva, conectada e autônoma, no que se refere ao uso das tecnologias. Todavia, deve-se considerar que: A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 20 209 A característica específica da cegueira é a qualidade de apreensão do mundo externo. As pessoas cegas precisam utilizar-se de meios não usuais para estabelecerem relações com o mundo dos objetos, pessoas e coisas que as cercam: esta condição imposta pela ausência da visão se traduz em um peculiar processo perceptivo, que se reflete na construção cognitiva e na organização e constituição do sujeito (AMIRALIAN, 1997, p. 21). Nesse sentido, as pessoas com deficiência visual necessitam lançar mão do uso de tecnologias que lhes permitam sair da condição de excluídos digitais. Considerando que a inclusão digital é uma necessidade inerente desse século, então isso significa que o cidadão do século XXI, entre outras coisas, deve considerar esse novo fator de cidadania, que é a inclusão digital. Esse fator constitui, ainda, uma questão ética, a de oferecer essa oportunidade a todos, ou seja, todo indivíduo tem direito à inclusão digital, e o incluído tem o dever de reconhecer que esse direito deve ser estendido a todos. A frase de Merleau-Ponty (1997), que se encontra em epígrafe, imprime um sentido conotativo à visão, não se trata de um sentido ligado a um órgão físico. Para ver um objeto à distância e possuí-lo, ou ainda possuí-lo, é necessário que se abstraia, que a representação do objeto, que também não é físico, seja introjetada, ou assim permaneça, simbolicamente. Ao habitar uma consciência, um objeto poderá estar no futuro e no passado, ao mesmo tempo em que está no espaço. O espaço virtual também permite tal flexibilidade de tempo ao objeto. Sendo assim, para uma pessoa com deficiência visual, que vivencia tempo e espaço de modo distinto do vidente, deveria ser mais fácil compreender o espaço virtual. Entretanto, existem barreiras que devem ser rompidas por meio da inclusão digital. Dessa forma, inclusão digital é um processo que deve levar o indivíduo à aprendizagem no uso de um programa que leve a sociedade brasileira a entrar na sociedade da informação, possibilitando o fortalecimento da comunidade. 4.1 O processo de inclusão das pessoas com deficiência visual no Brasil O processo de inclusão social das pessoas com deficiência visual no Brasil possui as suas peculiaridades, pois ao mesmo tempo em que foi pioneiro em algumas ações, outras foram implantadas mais tardiamente, observando-se diretrizes e modelos internacionais. De acordo com Júnior e Martins (2010), durante o século XIX, foi criado de forma pioneira na América Latina, o Imperial Instituto de Meninos Cegos, conhecido atualmente como Instituto Benjamin Constant, por meio do Decreto Imperial nº 1.428, de 12 de Setembro de 1854. Durante a primeira metade do século XX, as ações educativas, caritativas A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 20 210 e assistencialistas, caracterizavam as ações existentes para o atendimento das pessoas com deficiência. Todavia, segundo os mesmos autores (2010, p. 29), no Brasil, a partir da década de 1970: Observa-se um novo modelo de organização das pessoas com deficiência visual – o modelo associativista. As primeiras associações de cegos surgiram no Rio de Janeiro, resultado de interesses eminentemente econômicos. Os associados eram, em geral, vendedores ambulantes, artesãos especializados na fabricação de vassouras, empalhamento de cadeiras, recondicionamento de escovões de enceradeiras e correlatos. As novas associações distinguiam-se das ações do governo, caridade e filantropia da sociedade civil, pois surgiam do desejo dos próprios sujeitos cegos, que almejavam melhoria de condições e posição na sociedade. A Fundação Dorina Nowill para Cegos, que atualmente é uma referência tanto na produção de livros nos formatos braille, áudio e digital, como no atendimento às pessoas com deficiência visual, é um exemplo de associação fundada nesse modelo. O modelo associativista dos cegos nasceu em um momento de transição de duas visões de mundo: do modelo médico ao modelo social com base nos Direitos Humanos. Nessa época de transição, houve aumento na impressão de livros em Braille, com a instalação da imprensa Braille na Fundação para o Livro do Cego no Brasil, criada em 1946 – atualmente denominada Fundação Dorina Nowill para Cegos –, para possibilitar a educação dos cegos e ampliar o acesso à leitura. A Fundação foi criada por iniciativa de algumas normalistas do colégio Caetano de Campos, em São Paulo. Entre as normalistas estavam Neith Moura e Dorina Nowill que, durante o curso normal, criaram um grupo experimental de educação de cegos que desenvolvia metodologias de ensino e transcrevia manualmente livros para o Braille. O trabalho de transcrição para o Braille transformou-se, após algum tempo, na Fundação para o Livro do Cego no Brasil (JÚNIOR; MARTINS, 2010, p. 29). A efetiva garantia de direitos e a possibilidade de se criar dispositivos que permitam a promoção da acessibilidade desses sujeitos veio com a Constituição Cidadã, de 1988. Entretanto, a Damian, Galvão Filho e Rezende (2007, p. 12), apontam que O processo de construção dos direitos humanos das pessoas com deficiência, no entanto, assim como o de outros grupos discriminados da população, não começa com a legalidade de textos, mas com a legitimidade de ações de pessoas e grupos organizados que, por meio da pressão social, reivindicam direitos humanos e impulsionam a mudança, adequação e implementação da legislação. Segundo Drezza (2007), a Constituição de 1934 já garantia os direitos à saúde, educação e trabalhos dos sujeitos com deficiência, enquanto que, a Emenda Constitucional nº 12, de 1978, possibilitou o reconhecimento constitucional desses direitos. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 20 211 A consolidação das normas de proteção e a definição e distinção de deficiência, deficiência permanente e incapacidade, bem como, a definição explícita dos tipos de deficiência veio com o Decreto n. 3.298, de 20 de Dezembro de 1999. O Decreto n. 5.296, em seu Art. 5º, § 1º, classifica a deficiência visual como: Cegueira, na qual a acuidade visual é igual ou menor que 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; a baixa visão, que significa acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; os casos nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60o; ou a ocorrência simultânea de quaisquer das condições anteriores (BRASIL, 2004). De acordo com Morcelli e Seabra (2014, p. 204), a deficiência visual pode ser compreendida como “a perda ou redução da capacidade visual em ambos os olhos, com caráter definitivo, não sendo susceptível de ser melhorada ou corrigida com o uso de lentes e/ou tratamento clínico ou cirúrgico”. Sendo que, distingue-se a cegueira da visão subnormal ou baixa visão. Chama-se visão subnormal (ou baixa visão, como preferem alguns especialistas) à alteração da capacidade funcional decorrente de fatores como rebaixamento significativo da acuidade visual, redução importante do campo visual e da sensibilidade aos contrastes e limitação de outras capacidades (GIL, 2000, p. 6). A cegueira e a baixa visão não são os únicos distúrbios da visão, que podem dificultar o acesso às TICs. Segundo Rocha, Alves e Duarte (2011) deve-se considerar o daltonismo como um dos distúrbios da percepção visual, pois ele caracteriza-se pela incapacidade de distinção de cores. Campêlo et al (2011), corroboram com essa ideia. Sendo assim, deve-se compreender que o espectro deficiência visual abriga distintos distúrbios da visão. A cegueira é o mais grave desses distúrbios, pois isso compromete o desempenho do sujeito de forma mais severa. A compreensão dos sujeitos cegos deve se iniciar pelo entendimento de sua deficiência básica: uma limitação perceptiva. As pessoas cegas são portadoras de uma deficiência sensorial – a – ausência de visão -, que as limita em suas possibilidades de apreensão do mundo externo, interferindo em seu desenvolvimento e ajustamento às situações comuns da vida (AMIRALIAN, 1997, p. 21). O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, por meio da Pesquisa Nacional de Saúde – PNS, realizada em 2013, divulgou que 6,2% da população brasileira possui algum tipo de deficiência (auditiva, visual, física e intelectual), sendo que, a deficiência visual a mais representativa, atinge 3,6% dos brasileiros. Na avaliação por tipo, o Censo mostrou que a deficiência visual atingia 35.774.392 de pessoas (IBGE, 2010). A PNS considerou como deficiência visual “os casos de cegueira de ambos os A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 20 212 olhos, cegueira de um olho e visão reduzida do outro, cegueira de um olho e visão normal do outro e baixa visão de ambos os olhos” (IBGE, 2015). De acordo com Rocha, Alves e Duarte (2011), o Decreto 5.296/2004, é a primeira iniciativa legal brasileira que visa à promoção da acessibilidade web. Por meio do referido decreto, foi concedido um prazo de doze meses, prorrogável por igual período, a partir da sua data de publicação, em 2 de dezembro de 2004, para que os websites governamentais estabelecessem a acessibilidade. A iniciativa brasileira surgiu em conformidade com as diretrizes internacionais do World Wide Web Consortium - W3C/WAI - Web Accessibility Initiative (MORCELLI e SEABRA, 2014; ROCHA, ALVES e DUTRA, 2011). O World Wide Web Consortium - W3 é um consórcio de empresas, fundado em 1994 por Tim Berners Lee, que tem como finalidade regulamentar os assuntos ligados à Web e elaborar normas padrão para a construção de seus conteúdos. Já o Web Accessibility Initiative (WAI), é um grupo de trabalho criado pelo W3C em 1999, com a misão de criar estratégias, diretrizes, orientações e recursos que auxiliem na construção e implementação da acessibilidade web (ROCHA, ALVES e DUARTE, 2011). O Modelo de Acessibilidade do Governo Eletrônico (e-MAG) foi lançado em 2005, objetivando “atender e proporcionar acessibilidade dos sites e portais governamentais” (MORCELLI e SEABRA, 2014), já que, embora o Decreto 5.296/2004, “determine a acessibilidade em websites governamentais brasileiros” (ROCHA, ALVES e DUARTE, 2011, p. 81), mas não apresenta as orientações para sua implantação. Em 2010 o Governo Eletrônico (e-GOV) lançou a cartilha Padrões Brasil e-Gov: Cartilha de Usabilidade, que fornece recomendações de boas práticas na área digital, com o objetivo de aprimorar a comunicação, o fornecimento de informações e serviços prestados por meios eletrônicos pelos órgãos do Governo Federal (BRASIL, 2010). Cabe então diferenciar os termos acessibilidade e usabilidade, que embora estejam relacionados, são distintos. De acordo com a Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT (2004), acessibilidade é a “possibilidade e condição de alcance, percepção e entendimento para a utilização com segurança e autonomia de edificações, espaço, mobiliário, equipamento urbano e elementos”. Sendo assim, compreende-se como “acessível tudo aquilo que pode ser usado por qualquer pessoa, independentemente de sua condição física” (ROCHA, ALVES e DUARTE, 2011, p. 79). A Lei nº 13.146, de 6 de Julho de 2015, que institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), sancionada pela presidenta da República, Dilma Roussef, amplia o conceito de acessibilidade. De A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 20 213 acordo com a referida lei: Acessibilidade: possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, de espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes, informação e comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias, bem como de outros serviços e instalações abertos ao público, de uso público ou privados de uso coletivo, tanto na zona urbana como na rural, por pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida (BRASIL, 2015). A ABNT por meio da NBR 15599/2008, define usabilidade como: Medida da experiência e satisfação de um usuário ao interagir com um produto ou um sistema, seja um site, um software ou todo dispositivo operado por um usuário. A usabilidade é uma combinação dos fatores que afetam a experiência do usuário com o produto ou o sistema, quais sejam: facilidade de aprendizagem, eficiência do uso, memorização, frequência de erros e severidade, satisfação subjetiva (ABNT, 2008). Dessa forma, enquanto a acessibilidade diz respeito a tornar disponíveis, locais, produtos, serviços e informações ao maior número de pessoas, independente de suas capacidades físico-motoras, perceptivas e culturais, a usabilidade refere-se à avaliação da qualidade da interação entre os usuários e as interfaces (BRASIL, 2010). Embora o processo de acessibilidade dos sujeitos com deficiência visual tenha ocorrido de forma mais expressiva a partir do sistema braile, diversos foram os avanços no sentido de romper as barreiras impostas pela sociedade. A evolução dos diversos elementos tecnológicos do cotidiano da pessoa com deficiência visual teve como ponto de partida a bengala, e hoje, com os avanços proporcionados pela informática, abrange tecnologias muito conhecidas como a escrita Braille, o ábaco, a impressora Braille, leitores de tela, computadores de mão, mouses para cegos, teclados especiais etc (DAMIAN, GALVÃO FILHO E REZENDE, 2007, p. 51). Uma das ferramentas de acessibilidade é a e-acessibilidade ou acessibilidade web. Seu propósito é possibilitar acesso democrático a ferramentas, websites, aplicativos e serviços baseados na grande rede mundial de computadores. Objetiva a percepção, compreensão, navegação e interação de pessoas com deficiência (permanentes ou temporárias) com o conteúdo oferecido pelos websites. Tem a missão de remover barreiras que dificultam ou impossibilitam a compreensão e o acesso à informação em ambientes Web (ROCHA, ALVES e DUARTE, 2011, p. 80). Considerando que o acesso à informação é um direito garantido por lei e que os critérios de acessibilidade e de usabilidade determinam que qualquer pessoa deva ter acesso às ferramentas que tornam as informações acessíveis, deve-se ponderar sobre as tecnologias que cumprem tal função. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 20 214 4.2 Tecnologias Assistivas Em seu art. 63, a Lei nº 13.146, de 6 de Julho de 2015, que institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), sancionada pela presidenta da República, Dilma Roussef, determina que: É obrigatória a acessibilidade nos sítios da internet mantidos por empresas com sede ou representação comercial no País ou por órgãos de governo, para uso da pessoa com deficiência, garantindo-lhe acesso às informações disponíveis, conforme as melhores práticas e diretrizes de acessibilidade adotadas internacionalmente (BRASIL, 2015). Entretanto, para que uma pessoa com deficiência visual possa utilizar bem a internet, será necessário fazer uso de ferramentas que proporcionem maior acessibilidade e usabilidade ao meio tecnológico e à informação, a fim de possibilitar uma maior independência dessas pessoas. A essas ferramentas, atribui-se o nome de tecnologias assistivas. Nesse sentido, tecnologias assistivas são ferramentas de apoio que possibilitarão que uma pessoa com deficiência possa realizar uma tarefa específica, como acessar a internet. Esses recursos podem ser dispositivos físicos, softwares etc. Cabe destacar que, por tecnologias, considera-se a perspectiva adotada por Lévy (1993), que as percebe como tecnologias intelectuais que ampliam e modificam as funções cognitivas dos sujeitos, na medida em que favorecem a criação e a invenção de problemas. As tecnologias assistivas mais utilizadas (ROCHA, ALVES e DUARTE, 2011; MORCELLI e SEABRA, 2014), são: a impressora Braille, ferramenta capaz de imprimir os textos exibidos no computador em Braille; o thermoform, dispositivo similar a uma copiadora que produz mapas, formas e figuras em alto-relevo; os monitores especiais, que por serem maiores que os convencionais, ampliam o conteúdo exibido e, os famosos leitores de tela, que são softwares que acessam os conteúdos exibidos na tela do computador e por meio de sintetizadores de voz, os transforma em áudio. De acordo com Rocha, Alves e Duarte (2011), os leitores de tela mais utilizados no Brasil, por pessoas com deficiência visual são Jaws for Windows2, Virtual Vision3, NVDA4 e Orca5. Já Morcelli e Seabra (2014), citam o Dosvox6, o Virtual Vision e o Jaws. Os softwares possibilitaram que os sujeitos com deficiência visual tivessem 2 asp> 3 4 5 6 Consulte maiores informações em: <http://www.freedomscientific.com/products/fs/jaws-product-page. Consulte maiores informações em: <http://www.virtualvision.com.br/index.html> Consulte maiores informações em: <http://www.nvda-project.org/> Consulte maiores informações em: <http://live.gnome.org/Orca> Consulte maiores informações em: <www.intervox.nce.ufrj.br/dosvox/intro.htm> A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 20 215 mais autonomia e independência, pois com o auxílio desses, esses sujeitos podem realizar tarefas sem depender de outras pessoas, como usar bem o computador e acessar à internet. Entretanto, a pesquisa realizada por Morcelli e Seabra (2014), evidenciou um limitador, uma vez que todos os participantes da pesquisa declararam que o Jaws é o melhor software disponível no mercado, mas que nem todos o utilizam, devido a seu alto custo (por volta de R$ 600,00 a licença de uso), preferindo Dosvox e o Virtual Vision por serem gratuitos, porém sem contar com o mesmo desempenho. 5 | CONSIDERAÇÕES FINAIS O respeito aos direitos humanos não pode se limitar aos direitos civis e políticos. A simples existência de leis que visam a garantia de direitos, como por exemplo, as leis de acessibilidade, não garantem que os direitos humanos sejam atendidos em todas as suas dimensões e demandas. A Constituição Federal em seu artigo 5º dispõe que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade”, entre outros. Sendo assim, em teoria, o deficiente visual possui os mesmos direitos que os demais cidadãos. Entretanto, segundo Damian, Galvão Filho e Rezende (2007, p.12), deve-se considerar que a discriminação enfrentada por eles “é resultado de um longo processo histórico, de exclusão”, que criou vulnerabilidades sociais. Nesse sentido, as tecnologias assistivas colaboram para a inclusão digital de pessoas com deficiência visual, o que possibilita a inclusão social dessas pessoas. Entretanto, as fragilidades percebidas devem ser consideradas para que não se faça uma inclusão perversa, que tende a gerar o inverso da ideia inicial, que é o de incluir em sua plenitude. Dessa forma, caso não seja garantido o acesso às tecnologias, os sujeitos que não podem pagar pela tecnologia com o melhor desempenho, que supre as suas reais necessidades, estarão dentro, mas não incluídos. Permanecerão à margem por terem sido incluídos de qualquer maneira, por fazerem parte de um processo que inclui para excluir. Deve-se considerar ainda que, “no caso das pessoas com deficiência, a acessibilidade ou o direito à reabilitação, por exemplo, podem permitir ou viabilizar o exercício de outros direitos: o acesso ao trabalho, à educação, ao lazer” (DAMIAN, GALVÃO FILHO e REZENDE, 2007, p. 11). Sendo assim, considerando-se a expressividade da deficiência visual no Brasil, que atinge 3,6% dos brasileiros, a garantia de acesso das pessoas com essa deficiência às tecnologias, dentro dos critérios de acessibilidade e usabilidade, permitirá um processo de inclusão social mais efetivo e coeso. Portanto, avalia-se A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 20 216 a inclusão digital um forte constituinte e garantidor da inclusão ou exclusão social. Entretanto, para que se possa compreender a efetividade do processo de inclusão digital no processo de inclusão social das pessoas com deficiência visual, há a necessidade de produzir novas pesquisas qualitativas e quantitativas, nas quais se considere a perspectiva desses sujeitos e a sua representatividade nos dados estatísticos. REFERÊNCIAS ALCÂNTARA, Alex Sander. Internet em Braille. Agência FAPESP. Disponível em: <http://agencia. fapesp.br/internet_em_braille/10644/>. Acesso em: 15 jul. 2016. ALONSO, Luiza Beth Nunes; FERNEDA, Edilson; SANTANA, Gislane Pereira. Inclusão digital e inclusão social: contribuições teóricas e metodológicas. Barbaroi, Santa Cruz do Sul, n. 32, p. 154177, jun. 2010. Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010465782010000100010&lng=pt&nrm=iso>. Acessos em 22 ago. 2019. AMARAL, L. A. Conhecendo a deficiência (em companhia de Hércules). São Paulo: Robe Editorial, 1995. AMIRALIAN, M. L. T. M. 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A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 20 219 CAPÍTULO 21 doi O PROFISSIONAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA COMO SUJEITO CAPAZ DE INTERVIR NAS INJUSTIÇAS E PRECARIZAÇÕES DAS INFÂNCIAS, ADOLESCÊNCIAS E JUVENTUDES EMPOBRECIDAS Data de aceite: 06/01/2020 Data de Submissão: 14/10/2019 Gabriela Fernanda do Carmo Universidade Federal do Tocantins – Miracema do Tocantins – TO http://lattes.cnpq. br/4399095123049363 Janaína Augusta Neves de Souza Orientadora: Profª. Ms. Universidade Federal do Tocantins – Miracema do Tocantins – TO http://lattes.cnpq.br/3471504418421372 RESUMO: Este artigo aborda o tema “Educação, Pobreza e Desigualdades Sociais”, tendo como objetivo de ilustrar o profissional da Educação Básica como sujeito capaz de intervir nas injustiças e precarizações das infâncias, adolescências e juventudes empobrecidas. O professor é o mediador do processo de ensino aprendizado ocorrido em sala de aula, por isso deve mostrar a importância que o processo da educação tem na vida de seus alunos, sendo este o caminho para diminuir a pobreza e acabar com as desigualdades. A metodologia utilizada para a produção deste artigo foi pesquisa teórica, pesquisa de campo, com visita a escola e entrevista, e por meio dela pode-se conhecer as dificuldades encontradas pelos professores em sala de aula, sendo que a falta de interesse dos alunos foi a mais enfatizada na pesquisa, por isso, foca-se nela. Permitiu, também, conhecer as metodologias utilizadas pelos professores e as possíveis causas da falta de interesse dos alunos pela educação escolar. Por meio da leitura de alguns autores, pode-se conhecer novas metodologias para auxiliar estes professores a envolverem os alunos no processo de ensino aprendizagem, levando-os a refletirem sobre o seu papel de cidadão consciente. Pode-se perceber que os alunos precisam ter o discernimento que a diminuição da pobreza e das desigualdades só será possível por meio da educação, e este é o papel do professor em sala de aula, intermediar o conhecimento e as informações, para que este aluno tenha a possibilidade de sair da linha da pobreza e da desigualdade. PALAVRAS-CHAVE: Educação; Professor; Pobreza; Desigualdade. THE BASIC EDUCATION PROFESSIONAL AS A SUBJECT ABLE TO INTERVENE IN THE INJUSTICES AND PRECARIZATIONS OF IMPOVERISHED CHILDHOOD, ADOLESCENCES AND YOUTH ABSTRACT: This article deals with the theme “Education, Poverty and Social Inequalities”, aiming to illustrate the Basic Education professional as a subject capable of intervening in the injustices and precariousness of A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 21 220 impoverished childhood, adolescence and youth. The teacher is the mediator of the teaching-learning process that takes place in the classroom, so he should show the importance that the education process in the students’ lives, which is a way to reduce poverty and end inequalities. The methodology used for the production of this article was theoretical research, field research, visits to the school and interview, and through this methodology one can get to know the difficulties encountered by the teachers in the classroom, and the lack of interest from students was one of the most emphasized topic in the research therefore we focuses on it. It also allowed knowing the methodologies used by the teachers and the possible causes of the students' lack of interest in school education. By reading some authors, we can learn about new methodologies to help these teachers to involve students in the teaching-learning process, leading them to reflect on their role as conscious citizens. It can be seen that students need to have the insight that the reduction of poverty and inequality will only be possible through education, and this is the role of the teacher in the classroom, mediate knowledge and information, so that the students have the possibility to get out of the line of poverty and inequality. KEYWORDS: Education; Teacher; Poverty; Inequality. 1 | INTRODUÇÃO O presente artigo aborda o tema “Educação, Pobreza e Desigualdades Sociais”, com a temática “O profissional da Educação Básica como sujeito capaz de intervir nas injustiças e precarizações das infâncias, adolescências e juventudes empobrecidas”, partindo de estudos e pesquisas focados nos alunos que são beneficiados com o Programa Bolsa Família. Compreende-se que o profissional da Educação Básica, aquele que se dedica a tarefa de ensinar com dedicação e habilidade, por meio da análise do contexto concebendo o melhor plano para alcançá-lo, utilizando os recursos e ferramentas para envolver os alunos, deve considerar a relação da educação com a pobreza, uma vez que ele é corresponsável pelo ensino aprendizagem de seus alunos. Ou seja, o professor deixou de ser um mero transmissor do conhecimento, passando a ser um orientador, um estimulador de todos os processos que levam os alunos a construírem seus conceitos, valores, atitudes e habilidade que lhes permitam crescer como pessoas, como cidadãos. Por isso, faz-se necessário que o professor busque alternativas para erradicar as injustiças impostas aos alunos de famílias pobres, para que os mesmos tenham as mesmas oportunidades de aprendizagem. Segundo Duarte (2013, p. 69), de forma mais ou menos consciente, com mecanismos mais ou menos objetivos, a relação da educação com a pobreza precisa ser visibilizada. Desta forma, o artigo debate sobre o profissional da educação como sujeito de intervenção a pobreza por meio do seguinte questionamento: “Como A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 21 221 o professor da Educação Básica contribui para o interesse escolar dos alunos beneficiados Pelo programa Bolsa Família?”. Por meio deste questionamento, o objetivo geral é: Ilustrar sobre o profissional da Educação Básica como sujeito capaz de intervir nas injustiças e precarizações das infâncias, adolescências e juventudes empobrecidas, seguido pelos objetivos específicos: 1) Conhecer os métodos utilizados pelos professores para aumentar o interesse dos alunos pela aprendizagem; 2) Identificar possíveis motivos que levem os alunos a não se interessarem pelo processo de ensino aprendizagem; e 3) Apontar métodos que ajudem os professores a levarem seus alunos a se interessarem pelo processo de aprendizagem, partindo da relação que há entre educação e pobreza. Assim, o artigo pretende contribuir na formação acadêmica dos discentes, por meio de pesquisas e metodologias, trazendo conhecimento em relação à educação, pobreza e desigualdade, no sentido de esclarecer a existência destes no âmbito educacional. Contribuirá com a sociedade no sentido de demonstrar os índices relacionados à pesquisa em relação à diminuição da pobreza através do Programa Bolsa Família. Quanto ao profissional, pretende contribuir para a produção de novas ideias e conhecimentos para a área pedagógica, assim, de certa forma, informar e coletar dados demonstrando a situação detectada na pesquisa. 2 | REVISÃO TEÓRICA 2.1 Educação Do ponto de vista semântico, a palavra educação tem sua origem nos verbos latinos educare (alimentar, amamentar, criar), significando algo que se dá a alguém, e educere que expressa à ideia de conduzir para fora, fazer sair, tirar de (GARCIA, 2012). Educação engloba os processos de ensinar e aprender, é o processo contínuo de desenvolvimento das faculdades físicas, intelectuais e morais do ser humano, a fim de melhor se integrar na sociedade ou no seu próprio grupo. Segundo Nunes (1998, p.36) educação significa a atividade desempenhada pelos adultos para assegurar a vida e o desenvolvimento da geração mais nova, das crianças, dos adolescentes e jovens, para despertar e fazer crescer as suas habilidades e poderes físicos e espirituais. A educação, em sentido mais amplo, representa tudo àquilo que pode ser feito para desenvolver o ser humano e, no sentido restrito, representa a instrução e o desenvolvimento de competências e habilidades. Para Freire (1996, p.51), educar é construir, é libertar o homem do determinismo, passando a reconhecer o papel da História e a questão da identidade cultural, tanto A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 21 222 em sua dimensão individual, como na prática pedagógica proposta. A concepção de educação de Paulo Freire percebe o homem como ser autônomo. A educação, fundamentada na Constituição Federal, e amparada por princípios que buscam uma sociedade mais justa, é direito de todos, dever do Estado e da família, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (artigo 205 da Constituição Federal). O artigo 205 da Constituição Federal (BRASIL, 2007) dispõe que: A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. O artigo 205 da Constituição Federal estabelece três objetivos básicos da educação: pleno desenvolvimento da pessoa, preparo da pessoa para o exercício da cidadania e qualificação da pessoa para o trabalho. Assim, a educação de qualidade deve ser percebida não apenas como o acesso ao conhecimento, mas, sobretudo, como instrumento fundamental na transformação e no desenvolvimento do homem, permitindo-lhe uma formação cidadã e humana. É por meio da educação que o ser humano irá lutar contra a pobreza e a desigualdade social que existe em nosso país. 2.2 Pobreza e Desigualdade Primordialmente é necessário destacar alguns pontos fundamentais para o entendimento do que vêm a ser os temas Pobreza e Desigualdade, fazendo, assim, as suas distinções e suas analogias, no meio social e apontar os problemas e soluções que podem ser feitas para diminuição ou, quem sabe, a extinção dos supramencionados conteúdos. Segundo Demo (2003, p.197) a pobreza é uma situação social e econômica caracterizada por uma carência material e insatisfação das necessidades básicas para se viver, em outras palavras é a falta de riqueza de bens e serviços úteis para a vida. Sendo assim, caracterizada como o problema mais agudo da economia do país. Já a desigualdade está figurada como a falta de equilíbrio no padrão de vida de seus habitantes. Em outro conceito ela existe na sociedade quando as formas de viver se tornam diferentes entre as pessoas, gerando assim, o termo desigualdade social, além disso, ela é um problema de estrutura do país. Desse modo, se percebe que existe uma ligação entre os temas, pois onde há pobreza provavelmente há desigualdade e onde existe a desigualdade poderá ter pobreza, assim, o autor busca fazer alguns destaques no que diz respeito a responsabilidade pública no intuito de conseguir um melhor entendimento acerca da A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 21 223 erradicação desse problema. De acordo com Demo (2003, p.202) há um grande questionamento: será possível erradicar a pobreza ou a desigualdade? Conforme se observa, por completo é algo que fica fora da realidade de qualquer país, acabar de vez com esses dois problemas é de fato quase que impossível, pois no regime capitalista, onde a acumulação de riqueza é algo incentivado, fica meio que inviável que o governo consiga resolver essa adversidade. Por outro lado acredita-se que seja possível controlar ou reduzir o índice da pobreza e desigualdade de uma localidade, mesmo sendo algo complicado de ser feito, mas com políticas públicas voltadas para a redistribuição de renda, pode-se dar o primeiro passo, pois o sistema de crescimento econômico deve ser estudado para não ferir ou deixar de lado essas classes que mais necessitam de ajuda. No Brasil existem esses dois problemas: a pobreza e a desigualdade. Os idealistas defendem uma corrente visando que o primeiro deve-se erradicar e o segundo combater. Demo (2003), por sua vez, traz uma reflexão que diz respeito à riqueza que aqui é vasta e porquê de existir pobreza na sociedade brasileira: [...] O argumento maior era que o Brasil não é carente de recursos: não é país pobre, mas injusto com muitos pobres. Se pobreza é carência de renda e o país não é carente de renda, logo, em raciocínio econométrico linear, pobreza é excrescência. (...) (DEMO 2003, p.201). Essa saliência que se destaca no texto é entendida da seguinte forma: o governo é rico e deixa a pobreza e a desigualdade possuir um índice alto por falta de responsabilidade, dessa forma, cria-se programas de natureza compensatória como o famoso “Bolsa Família”, visando à distribuição de renda. Nesse entender, não se tem certeza que a pobreza pode ser provocada pelos entes públicos ou pela falta deles, mas se todos os habitantes do planeta tivessem o mesmo padrão de vida (alto), as consequências para a sustentabilidade seriam prejudicadas, e provavelmente a vida na terra poderia ter sérios problemas, pois o alto consumismo levaria a escassez dos recursos. Portanto, a redução da pobreza é um caminho mais viável e possível de se existir, pois depende diretamente do crescimento econômico e da diminuição do grau de desigualdade. No Brasil, o índice da população pobre está na casa dos 30%, segundo dados da Pnad, 1999, mas em uma comparação social entre países com o mesmo ou quase a mesma riqueza que o nosso país possui, o percentual teria que cair para apenas 8% de pessoas ou famílias com renda mínima inferior a linha da miséria, se tornando um absurdo para uma nação como a nossa. Voltando a distribuição de renda como fator de redução da pobreza e combate à desigualdade, muitos autores partilhavam de ideais fabulosas e fantasiosas onde A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 21 224 o Estado conseguiria identificar todos os indivíduos da população pobre e transferir a renda de maneira precisa entre as famílias para retirá-los da linha da pobreza, algo que posteriormente foi deixado de lado tempos depois, em razão da grande dificuldade que os entes públicos teriam para fazer um levantamento desse nível. Segundo Demo (2003, p. 224) a erradicação e diminuição da pobreza e do índice de desigualdades ainda é algo que fica apenas em teorias futuras. Por meio de seus estudos, percebe-se que é meio complexo mostrar ganhos visíveis no plano do combate à desigualdade, embora ele consiga apresentar que a pobreza (material) pode sofrer algumas melhorias nos parâmetros, em razão do incentivo da redistribuição de renda. Um fator muito questionado é que não é só a desigualdade social a principal causadora da pobreza material, mas a corrupção e os gastos exagerados que acontecem nos Estados. De acordo com a Pnad - 1999, os 30% da população que são considerados pessoas pobres ou que vivem abaixo da linha da pobreza poderiam ser combatidos se o Brasil tivesse menos políticos corruptos. Dessa forma, acredita-se que a diminuição da pobreza em nosso país e no restante do mundo é possível, mas sua erradicação é tratada como fato impossível de acontecer em razão da falta de interesse que alguns sistemas possuem em tratar esse tema. Enfim, a pobreza é algo que existiu, existe e existirá podendo essa ser reduzida com métodos de inovação na redistribuição de renda, mas não poderá ser extinta. Já a desigualdade poderá ser combatida através da inclusão de todo, em novas oportunidades e modificação da cultura, principalmente, na diminuição do preconceito com as classes mais pobres. Assim, acredita-se que para diminuir a pobreza e as desigualdades faz-se necessário a intervenção da justiça, uma vez que esta é o princípio básico que mantém a ordem social através da preservação dos direitos e sua forma legal. 2.3 Justiça Justiça é a virtude de dar a cada um aquilo que é seu, é a faculdade de julgar segundo o direito e melhor consciência, entretanto não é possível definir com precisão o seu real significado. Justiça muitas vezes é confundida com igualdade, o que é um grande engano. Apesar de seguirem uma mesma linha de ideias não podem ser confundidas, já que a expressão igualdade, não propaga uma ideia de justiça. Acredita-se, que desde a antiguidade, existia um sistema regulador, que nem sempre foi escrito ou enunciado expressamente, mas sempre existiu, em todos os tempos e entre todos os povos. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 21 225 Segundo a revista Mundo Educação (2008, p.80), o conceito de justiça social está fundamentado em certos preceitos morais e políticos que cuidam de questões como igualdade de direitos, garantia de direitos básicos e, ainda, solidariedade coletiva. De várias maneiras, a noção de justiça social deriva da luta pela melhoria das condições sociais daqueles que vivem em situação precária. As maneiras como esse objetivo pode ser alcançado variam de acordo com os meios propostos, o que, por sua vez, está relacionado com o contexto ideológico daqueles que adotam a visão. De forma geral, a ideia de justiça social vai de encontro com a ideia de justiça civil. Enquanto a imagem da justiça civil é concebida como “cega” em relação às diferenças dos indivíduos, pois busca a imparcialidade em seu julgamento, a justiça social está disposta a observar o contexto e a situação dos envolvidos de forma que seja possível atribuir à resolução mais apropriada para cada caso. Isso quer dizer que as ações de justiça social são de caráter corretivo ao atribuir medidas protetivas para certas camadas sociais que possuem dificuldades econômicas ou que sofrem com estigmas sociais relacionados com a cor ou etnia, por exemplo. As cotas raciais são o exemplo mais explícito e mais polêmico que temos de ações que buscam justiça social em nosso país. A medida parte da constatação de que a grande maioria da população, menos favorecida economicamente, é composta por negros e pardos, enquanto as escalas mais altas da hierarquia social e econômica são compostas majoritariamente por pessoas brancas. O exemplo mais visível está no acesso da população negra ao ensino público superior. Segundo o IBGE, em 2001, da população inserida no sistema de ensino brasileiro, apenas 10,2% dos estudantes de nível superior eram negros, enquanto 39,6% eram brancos. Após a implementação de ações de mediação, como o estabelecimento das cotas raciais para o vestibular, em 2011, verificou-se o aumento de estudantes negros no ensino superior para 35,8%. O que vemos com essa medida é o início da democratização do acesso ao ensino público, em que a disputa por vagas torna-se injusta no momento em que aqueles que dispõem de melhor condição econômica dispõem também de mais oportunidades de preparo para a disputa das vagas. Essa disparidade também é vista quando observamos a distribuição de renda em relação à cor de pele. Verificase que, segundo o Censo nacional de 2010, a média salarial de pessoas que se identificam como brancas (R$ 1.538) ou amarelas (R$ 1.574) é quase o dobro do valor verificado para os grupos de pretos (R$ 834), pardos (R$ 845) ou indígenas (R$ 735). As dificuldades, que se somam às desigualdades que a parte mais carente da população sofre, somam-se também aos estigmas sociais associados à cor ou à condição econômica. Isso vitimiza a população pobre em mais de uma forma: a A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 21 226 exclusão deixa de ser apenas econômica e passa a ser social quando o acesso dos indivíduos mais pobres é dificultado diante das diferenças de oportunidade que existem no contexto social. Com isso, relaciona-se o conceito de justiça ao conceito de cidadania, uma vez que cidadania é a condição de cidadão, com seus direitos e obrigações. Restringese, neste artigo, o direito à educação, a qual é fundamental para a formação e desenvolvimento da capacidade física, moral e intelectual do ser humano visando à integração social, papel este desenvolvido pelo professor. 2.4 Professor Segundo Guimarães (2011, p.26) o professor é um profissional cujo espaço principal de trabalho é o ensino. É um profissional que ensina, ou cuja função é ensinar. Para Freire (2013, p.24), ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou construção pessoal. Ser professor é fazer trocas de conhecimentos, ao mesmo tempo em que se ensina se aprende alguma coisa também. Ser profissional da educação é ter a capacidade de educar e estudar ao mesmo tempo. Ser educador é uma tarefa árdua, profissão essa que na maioria das vezes não é reconhecida pela sociedade, ou o meio em que vivemos. A função do educador é ensinar por meio de pesquisas, formando um cidadão crítico, para que ele possa ter uma visão crítica sobre a sociedade. Formar no sentido de buscar, adquirir conhecimento. Ensinar exige respeito aos saberes do educador e do educando em questão, exige também risco, o que quer dizer que o educador não pode somente estar voltado a seguir um cronograma, deve arriscar-se em trazer sempre algo novo, algo que chame a atenção e que desperte o interesse dos educandos. Todavia, um bom educador não deve somente estar voltado para as teorias postas no decorrer de sua formação acadêmica, um bom profissional tem que saber lidar com as teorias e principalmente com a prática, pois nenhuma segue caminho sem a outra, para se ter prática é necessário ter teorias. Ser professor é ter a competência de exercer seu papel da melhor maneira possível, ter a consciência que ensinar não é somente chegar a sala de aula e passar exercícios, avaliações, trabalhos, e sim, saber lidar com as dificuldades de cada aluno, tentar sempre melhorar o desempenho buscando novas propostas de ensino para aprimorar seu conhecimento. Libâneo (1998, p.29) afirma que o professor medeia à relação ativa do aluno com a matéria, inclusive com os conteúdos próprios de sua disciplina, mas considerando o conhecimento, a experiência e o significado que o aluno traz à sala de aula, seu A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 21 227 potencial cognitivo, sua capacidade e interesse, seu procedimento de pensar, seu modo de trabalhar. Nesse sentido o conhecimento de mundo ou o conhecimento prévio do aluno tem de ser respeitado e ampliado. Ensinar bem não significa repassar os conteúdos, mas levar o aluno a pensar, criticar. Percebe-se que o professor tem a responsabilidade de preparar o aluno para se tornar um cidadão ativo dentro da sociedade, apto a questionar, debater e romper paradigmas. Cury (2003, p.127) afirma que “a exposição interrogada gera a dúvida, a dúvida gera o estresse positivo, e este estresse abre as janelas da inteligência. Assim formamos pensadores, e não repetidores de informações” Assim, o papel do professor é de ser um mediador do conhecimento no processo de ensino aprendizagem, não um mero transmissor de informação, para que os alunos se apropriem das ferramentas necessárias à transformação da realidade social. 3 | RESULTADOS A partir das exigências da disciplina de Seminário de Pesquisa I, em se construir um artigo, foi necessário coletar informações e, por meio delas, alcançar os objetivos proposto neste artigo. O primeiro passo foi escolher uma escola e fazer o conhecimento de sua realidade segundo o tema proposto. Na primeira visita, o objetivo foi de conhecer o Centro de Ensino Médio Dona Filomena Moreira de Paula, que localiza-se na rua Hosana Cavalcante, Nº 176 – Setor Santa Filomena, na cidade de Miracema do Tocantins. A escola foi criada pela lei Nº 405, de 10 de setembro de 1982, hoje com 34 anos. No ano de 1998 foi escola referência Nacional em gestão. Em 1999 e 2000 recebeu o Prêmio Gestão. Atualmente a escola atende a segunda fase do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano), o Ensino Médio (1ª a 3ª série) e a EJA – Educação de Jovens e Adultos – no terceiro segmento (1ª a 3ª série do Ensino Médio). Seu funcionamento ocorre nos três turnos. Segue, abaixo, tabela da distribuição de turmas na escola. TURNO SÉRIE MATUTINO VESPERTINO NOTURNO 6º ano – E.F. - 1 - 7º ano – E.F - 1 - 8º ano – E.F. - 1 - 9º ano – E.F. - 1 - 1ª série – E.M.R. 4 - 1 2ª série – E.M.R. 3 - 1 3ª série – E.M.R. 2 - 1 A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 21 228 1ª série- E. M. EJA - - 1 2ª série – E.M. EJA - - 1 3ª série – E.M. EJA - - 1 Visita técnica à escola, 2016. A escola possui uma boa infraestrutura, contendo 10 (dez) das salas de aula, 1(uma) sala para diretora, 1(uma) sala para a coordenação, 1(uma) sala para a orientação pedagógica, 1(uma) sala para o coordenador financeiro, 1(uma) sala para os professores, 1(uma) sala para a secretaria, 1(uma) biblioteca, 1(uma) sala de audiovisual, 1(um) laboratório de informática, 1(uma) sala para laboratório de ciências, mas este é incompleto, 1(uma) sala de recurso para atender alunos especiais, 1(uma) cozinha e 1(uma) quadra coberta. O pátio é grande. Há 4 (quatro) banheiros para os alunos, sendo 2(dois) masculinos e 2 (dois) femininos e, dois banheiros para uso dos servidores 1 (um) masculino e 1 (um) feminino. O quadro de servidores da escola é composto por 29 servidores do setor administrativo e 21 professores. Segue, abaixo, tabela com informações quanto a formação dos professores. Sexo Graduação Especialização Mestrado Masculino 12 05 00 Feminino 09 03 01 Visita técnica à escola, 2016. Quanto aos alunos, há um total de 584 matriculados e, destes 150 são atendidos pelo Programa Bolsa Família. De acordo com os dados fornecidos pela secretária, 68 alunos atendidos pelo Programa Bolsa Família têm até 15 anos de idade e 82 alunos acima dos 15 anos. Para ser mais preciso, 65 alunos são do Ensino Fundamental e 85 são do Ensino Médio. A EJA não possui nenhum aluno, pois atende alunos acima de 18 anos. Numa segunda visita a instituição de ensino, foi realizada uma pesquisa com 2 (dois) professores e com a diretora da escola, a fim de conhecer melhor a realidade do processo de ensino aprendizagem dos alunos relacionando com a temática proposta neste artigo. As perguntas1 feitas focaram-se em saber se a escola atendia a alunos contemplados com o Programa Bolsa Família, com o objetivo de conhecer o 1 Existem crianças/adolescentes/jovens de famílias que recebem o Programa Bolsa Família na Unidade Escolar? Quantos? Como é o rendimento escolar deles? A escola tem estrutura física, de pessoal, de custeio, para garantir o sucesso escolar destas crianças/adolescentes, jovens? Como os professores veem essas crianças/ adolescentes/jovens de famílias que recebem o Bolsa Família? Quais as principais dificuldades que os professores enfrentam com esses alunos? A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 21 229 rendimento escolar destes alunos e o papel do professor em contribuir com eles, no que diz respeito a injustiça e precarizações das infâncias, adolescências e juventudes empobrecidas. Por meio da entrevista, tivemos a oportunidade de saber que os professores não têm conhecimento de quais são os alunos contemplados pelo Programa Bolsa Família. Desse modo, percebe-se que o professor não tem como fazer acepção destes alunos, ou seja, a educação de qualidade é garantida a todos, independente de o aluno ser contemplado ou não por algum programa social. O professor deve desenvolver o seu papel de mediador do conhecimento, ou seja conduzir o seu aluno no processo de ensino aprendizagem, para que a educação atenda os seus objetivos básicos e seja o instrumento de transformação no desenvolvimento do homem, para que ele tenha uma formação cidadã e humana. Percebe-se que o Centro de Ensino Médio Dona Filomena Moreira de Paula possui uma estrutura física mediana, se compararmos a outras escolas que têm condições bem mais precárias. Esta escola está situada em um bairro de periferia, ou seja, as famílias ali localizadas são de classe social baixa o que já deixa explícito que a escola apresenta um risco social relacionado a pobreza e desigualdade, o que pode afetar o processo de ensino aprendizagem de seus alunos. A entrevista mostrou que o rendimento escolar dos alunos não está relacionado aos alunos que são contemplados pelo Programa Bolsa Família, mas a todos os alunos matriculados. Assim, buscou-se conhecer as principais dificuldades encontradas pelos professores no processo de ensino aprendizagem, e dentre elas, temos a ausência dos pais no acompanhamento de seus filhos, a não realização das tarefas enviadas para serem realizadas em casa e, a maior dentre elas, é a falta de interesse. A partir desta informação buscou-se conhecer os motivos que levam os alunos a não se interessarem pelo processo de ensino aprendizagem e a conhecer as metodologias utilizadas pelos professores para tornarem suas aulas mais atrativas. Segundo um professor entrevistado, os alunos não sabem a importância que a educação escolar tem em suas vidas, o poder de transformação que pode ser exercido por meio dela. Outro fator seria de eles não terem perspectivas de vida, uma vez que sua condição social não os leve a sonhar com uma vida mais digna e promissora. Também pode ser citado a falta de motivação aos alunos por parte dos professores, uma vez que estes são corresponsáveis pelo processo de ensino aprendizagem. E dentre outros motivos, a falta de recursos destinados à educação, como por exemplo, com este calor do Tocantins, faz-se necessário que as salas sejam climatizadas, para que se tenha um ambiente propício a troca de conhecimento. Fica claro que estes fatores influenciam os alunos a não se desenvolverem intelectualmente, pois não buscam conhecimentos e recursos necessários, através A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 21 230 de uma formação acadêmica e profissional, para que, por meio da educação haja a redução da pobreza e o combate à desigualdade. Depois de conhecer que a falta de interesse é o grande “calcanhar de Aquiles” dos alunos do Centro de Ensino Médio Dona Filomena Moreira de Paula, foi necessário conhecer as metodologias que os professores utilizam para despertar o interesse dos alunos, tornando, assim, suas aulas mais atrativas. De acordo com a entrevista feita a um professor, ele relata que muitas vezes, tornar a aula interesse é um desafio, haja vista os alunos estarem mais envolvidos com as novas tecnologias. Destacou que para os alunos terem um bom rendimento, faz-se necessário a interação entre professor e aluno em sala de aula, para que o aluno tenha uma boa participação, tanto oral quanto escrita. Outra metodologia é ter uma aula descontraída, mas que não fuja ao controle. A fala do professor não pode ser linear, deve-se alterar em tons diferentes, para que o aluno não canse. O professor tem a responsabilidade de preparar uma boa aula, ou seja, fazer um planejamento, e isto inclui domínio do conteúdo, para que o aluno sinta segurança no que o professor está ensinando. As atividades em sala devem ser diversificadas, como por exemplo, individual, em dupla, em grupos, dentre outras. A escola não tem como oferecer metodologias que envolvam as novas tecnologias, como a internet, uma vez que a rede wifi da escola não comporta um grande número de usuários. Outro fator é que nem todos os alunos têm celulares que se conectam a internet. O laboratório da escola possui 22 computadores, mas somente 10 estão em bom funcionamento. Assim, o professor tem de usar os recursos tradicionais. O professor precisa despertar o interesse dos alunos pelo processo de ensino aprendizagem por meio de suas aulas, nos momentos de reflexão e de debates, deixando claro que a educação é a grande arma para a erradicação e diminuição da pobreza e do índice de desigualdades. Depois de conhecer os problemas que afetam o rendimento escolar e as metodologias utilizadas pelos professores, para tornar suas aulas mais atrativas, foi mostrado aos professores uma lista de nome de alunos que são comtemplados com o Programa Bolsa Família, com o objetivo de conhecer o seu rendimento escolar. Para surpresa de muitos, cerca de 75% dos alunos contemplados pelo Programa Bolsa Família têm um bom rendimento escolar, são assíduos as aulas, participam com o professor no processo de interação do conhecimento, conseguem atingir a média proposta. Os três entrevistados citaram uma aluna que é contemplada pelo Programa Bolsa Família como sendo a aluna destaque da escola. É esforçada, busca além do que é ofertado em sala de aula, tem uma postura crítica, se utiliza de bons argumentos, é convincente. Vê-se que esta aluna está buscando alcançar sonhos e A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 21 231 objetivos de vida que a tirem da linda da pobreza e da desigualdade, isto, por meio da educação. Neste relato, fica claro o empenho dos professores ao transmitirem o conhecimento não como detentores deste, mas como mediadores, uma vez que levam o aluno a pensarem e refletirem sobre suas ações, tornando-o um cidadão crítico. Assim, a igualdade de todos os cidadãos será cumprida por meio da justiça. Numa sociedade que está sempre em transformação, o professor contribui com seu conhecimento e sua experiência, tornando o aluno crítico e criativo. Deve estar voltado ao ensino dialógico, uma vez que os seres humanos aprendem interagindo com os outros. É o processo aprender a aprender. O professor deve provocar o aluno passivo para que se torne num aluno sujeito da ação. Com isso, fez-se necessário buscar metodologias mais eficazes para que os alunos interajam e se interessem mais pelo processo de ensino aprendizagem, não se esquecendo que é por meio da educação que eles irão desenvolver a capacidade crítica da realidade, para que possam utilizar o que aprenderam na escola em diversas situações e/ou lugares. Os métodos que ajudam os professores no processo de ensino são aqueles que têm um grau considerável de aceitação dos estudantes, baseadas em formas diferenciadas de transmissão do ensino, pois é necessário que o professor vivencie a realidade dos alunos para poder buscar meios para melhor aplicabilidade do conteúdo. Assim, deve sempre observar o plano de aula para não sair do planejamento, pois é através dos estímulos que os mestres irão contribuir para o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem dos alunos. Dessa maneira, as suas características são: • Vivenciar a realidade do aluno; • Instigar no desenvolvimento da leitura e a escrita; • Lidar com as diferenças; • Entender que cada aluno possui um tempo de aprendizagem; • Buscar formas para incitar habilidades pessoais; artes, esportes, teatro, músicas; • Desenvolver habilidades necessárias para serem pensadores; • Utilizar inovações no ensino como: tecnologias, aulas práticas e expositivas; • Estimular os educandos para a melhoria da relação em sociedade; • Conscientizar os alunos que a escola é um meio de transformação da realidade. O professor precisa mostrar a beleza e o poder das ideias, mesmo que use apenas os recursos de que dispõe: quadro-negro e giz. Observa-se nessa afirmação A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 21 232 que a aula pode ser bem positiva e agradável, sem os grandes recursos que permeiam todas as atividades humanas e em todos os lugares: os recursos tecnológicos. Com isso, ressaltamos a grande importância que o professor tem como sujeito capaz de intervir nas injustiças e precarizações das infâncias, adolescências e juventudes empobrecidas, por meio da educação, uma vez que está é responsável pela formação e desenvolvimento da capacidade física, moral e intelectual do ser humano visando à integração social. 4 | CONCLUSÃO A educação é de suma importância na vida de qualquer cidadão, mas é necessário que ela se torne importante na vida dos educandos desde cedo, pois é por meio dela que a sociedade terá cidadãos críticos e atuantes. Este artigo abordou o papel do profissional da Educação Básica como sujeito capaz de intervir nas injustiças e precarizações das infâncias, adolescências e juventudes empobrecidas, relatando sua relevante presença, assim como sua intervenção na produção do conhecimento, uma vez que este conhecimento é construído em parceria com o aluno. Relatou-se ainda, nesta pesquisa, o rendimento escolar dos alunos, tendo conhecimento que a falta de interesse é o que leva os alunos a não se interessarem mais pelo processo de ensino aprendizagem. Este rendimento não está relacionado somente aos alunos contemplados pelo Programa Bolsa Família, mas a uma grande maioria dos alunos matriculados. Observou-se também, que a atuação do professor no processo de ensino aprendizagem não pode ser restrita a repassar conhecimento, mas orientar e valorizar as habilidades do aluno, para que eles possam tornar-se cidadãos críticos e conscientes, a fim de diminuir a pobreza e acabar com as desigualdades. Freire (1996, p.52) diz que “saber que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção”. O professor aberto às indagações dos alunos e a curiosidade. Percebe-se que as metodologias utilizadas pelos professores, para atrair os alunos para o processo de ensino aprendizagem, precisam ser melhoradas, uma vez que, eles precisam conhecer a verdadeira realidade de seus alunos, para, a partir dela elaborar e planejar aulas atrativas e interativas. Por meio deste artigo, pode-se conhecer o rendimento escolar dos alunos contemplados pelo Programa Bolsa Família, que dentre muitos deles, se interessam pelos estudos e querem realizar seus sonhos e objetivos de vida. A pesquisa foi de grande relevância para o âmbito acadêmico, uma vez que possibilitou conhecer a realidade da educação básica, os desafios dos professores A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 21 233 em sala de aula, como intermediários do conhecimento, a falta de importância que os alunos dão aos conhecimentos adquiridos na escola e, as metodologias utilizadas pelos professores para atrair a atenção dos alunos. A partir das experiências vivenciadas nesta pesquisa, conclui-se que o professor deve refletir sobre seu papel na constituição do conhecimento de seu aluno e sobre a forma de desenvolver seu trabalho, a fim de levar seus alunos a serem líderes de si mesmos e serem questionadores – enfim, cidadãos que farão a diferença no mundo, intervindo nas injustiças e precarizações das infâncias, adolescências e juventudes empobrecidas. REFERÊNCIAS AZEVEDO, Janete M. Lins de. A educação como política pública. 3. ed. Campinas: Autores Associados, 2004. 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MAGALHÃES, Solange Martins Oliveira (org.) Professores e professoras: formação: Poiesis e práxis Goiânia: Ed. da PUC Goiás, 2011. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 21 234 CAPÍTULO 22 doi O TRABALHO COM A GEOMETRIA PLANA NO ENSINO FUNDAMENTAL: EXPERIMENTAÇÕES COM MATERIAIS MANIPULATIVOS E RECURSOS TECNOLÓGICOS Julhane Alice Thomas Schulz Data de aceite: 06/01/2020 Natasha Inês Buche Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha – IFFar/Campus Santa Rosa - RS Carolina Hilda Schleger Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha – IFFar/Campus Santa Rosa - RS Jeverton Iedo Dorr Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha – IFFar/Campus Santa Rosa - RS Tanise da Silva Moura Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha – IFFar/Campus Santa Rosa - RS Vanessa Volkweis Rodrigues Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha – IFFar/Campus Santa Rosa - RS Elizangela Weber Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha – IFFar/Campus Santa Rosa - RS Mariele Josiane Fuchs Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha – IFFar/Campus Santa Rosa - RS Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha – IFFar/Campus Santa Rosa - RS RESUMO: Esta produção decorre de experiências em oficinas pedagógicas de Matemática desenvolvidas por acadêmicos do curso de Licenciatura em Matemática, bolsistas do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) do Instituto Federal Farroupilha - Campus Santa Rosa. As referidas oficinas foram realizadas com alunos do 8° ano do Ensino Fundamental de uma Escola da Rede Municipal localizada no município de Santa Rosa/RS, tendo como objetivo motivar os alunos para o estudo da Matemática através de atividades diferenciadas utilizando a metodologia da Investigação Matemática aliada ao uso de jogos, materiais didáticos e recursos tecnológicos. As atividades desenvolvidas tentaram buscar significação para os conceitos matemáticos, sendo elas: atividade do caça ao tesouro, construção do Tangram, visualização da representação dos polígonos no software GeoGebra, jogo Kahoot e o jogo “Trilha da Área e Perímetro”. No decorrer das oficinas observou-se a superação das dificuldades apresentadas pelos alunos referente aos conceitos de Geometria Plana, principalmente na diferenciação entre os conceitos de área e A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 22 235 perímetro. Vislumbrou-se ainda a satisfação, animação, desempenho e participação dos alunos mediante as atividades propostas. Percebeu-se maior participação dos alunos ao longo das oficinas, uma vez que apresentaram evolução no domínio desses conceitos. Aos bolsistas, a cada oficina percebeu-se a necessidade de incluir no planejamento seguinte explicações para auxiliar nas dúvidas que surgiam por parte dos alunos. Além disso, a vivência dos bolsistas enquanto prática docente proporcionou discorrer sobre a atuação do professor, o qual exige estabelecer diálogo constante sobre conhecimentos teóricos, didáticos e metodológicos no processo de ensino e aprendizagem. PALAVRAS-CHAVE: Aprendizagem, Material Manipulativo, Tecnologias, Geometria Plana. THE WORK WITH FLAT GEOMETRY IN AN ELEMENTARY SCHOOL: MANIPULATIVE MATERIALS AND TECHNOLOGICAL RESOURCES EXPERIMENTS ABSTRACT: This production stems from experiments in pedagogical workshops of mathematics developed by academics of the undergraduate course in mathematics, scholarship holders of the Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) from Instituto Federal Farroupilha - Campus Santa Rosa. These workshops were carried out with students of the 8th grade of elementary Municipal School located in the city of Santa Rosa/RS, aiming to motivate students to study mathematics through differentiated activities using of mathematical research methodology allied to the use of games, didactic materials and technological resources. The activities developed attempted to seek meaning for the mathematical concepts, being them: Treasure Hunt activity, Tangram construction, visualization of the polygon’s representation in GeoGebra software, Kahoot game and the game " Trilha da Área e Perímetro". During the workshops, we observed the overcoming of the presented difficulties by the students regarding the concepts of flat geometry, especially in the differentiation between the concepts of area and perimeter. It was also observed the students’ satisfaction, enthusiasm, performance and participation through the proposed activities. A greater students’ participation was perceived throughout the workshops, since they presented evolution in the domain of the activities’ concepts. To the scholarship holders, noticed in each workshop the need to include in the following planning explanations to assist in the doubts that arose on the part of the students. In addition, the experience of the scholarship holders as a teaching practice provided the discussion about the teacher's performance, which requires establishing a constant dialogue on theoretical, didactic and methodological knowledge in the teaching and learning process. KEYWORDS: Learning, Handling Material, Technologies, Flat Geometry. 1 | INTRODUÇÃO A presente produção tem o intuito de relatar oficinas de práticas pedagógicas A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 22 236 realizadas com os alunos do 8º ano de uma Escola da Rede Municipal localizada no município de Santa Rosa/RS, pelos bolsistas do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID). O objetivo das intervenções consistia em trabalhar com os conceitos de área e perímetro através de atividades diferenciadas, com a finalidade de auxiliar os alunos na busca pelo entendimento dos conceitos matemáticos e suas aplicabilidades em situações cotidianas. Com o intuito de auxiliar os alunos a construírem seu conhecimento de maneira significativa, compreendendo os porquês dos conceitos matemáticos, as oficinas foram planejadas. Considerou-se, ainda, a dificuldade dos alunos em aprender determinados conceitos da Matemática, principalmente em compreender a diferença entre os conceitos de área e perímetro. Assim, o professor precisa rever as metodologias que utiliza no processo de ensino, fazendo novos planejamentos, propondo situações diversificadas, na busca por uma melhor ação em sala de aula. Importante, também, considerar o conhecimento prévio que o aluno tem, pois segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN (BRASIL, 1998) muitas vezes alguns professores subestimam este conhecimento dos alunos, não analisando que esta bagagem conceitual torna-se de grande valia para auxiliar no processo de aprendizagem de novos conceitos. Para tanto, as oficinas foram planejadas de modo a explorar o raciocínio lógico envolvendo o cálculo de área e perímetro, as propriedades das figuras planas, bem como suas definições. Dessa forma, na primeira oficina os alunos foram subdivididos em grupos, na qual realizavam um circuito de atividades com questões sobre figuras planas, descobrindo pistas e deslocando-se por diferentes caminhos, para então encontrar o tesouro escondido. Na segunda oficina, os alunos construíram um Tangram em papel quadriculado a fim de visualizar a área, o perímetro e as variações destas medidas a cada novo recorte, além de identificar as figuras planas obtidas e posteriormente realizar o cálculo da área e perímetro das mesmas. Na terceira oficina, a qual foi realizada nas mediações do IFFar/Campus Santa Rosa enfocou-se a construção de figuras planas no software GeoGebra, bem como a realização de dobraduras em papéis coloridos para o cálculo e visualização dos conceitos de área e de perímetro. 2 | REFERENCIAL TEÓRICO Ao fazer a abordagem da Geometria Plana, especialmente dos conceitos de área e perímetro, alguns professores costumam apresentar este assunto com a sequência de definições e exercícios, utilizando o livro, o caderno e a régua para realização das atividades. Acabam, por vezes, não utilizando outros recursos para explicar o conteúdo, implicando no não entendimento dos alunos acerca do cálculo A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 22 237 da área e do perímetro, levando-os a confundir o real significado de cada uma destas conceituações. Alguns desses erros e dificuldades foram também evidenciados em pesquisas realizadas no Brasil. Tais trabalhos investigaram questões relacionadas ao estudo das grandezas, em particular as grandezas geométricas: área e comprimento, apontando para a existência de dificuldades dos alunos brasileiros nos conceitos citados, quando estão procurando solucionar problemas envolvendo esses conteúdos (BARROS, 2006, p.11). Os conceitos de área e perímetro estão presentes em diversas aplicações do cotidiano, se relacionando as mais diversas áreas de conhecimento, dentre elas a Física, a Agronomia, as Engenharias entre outras. Apesar de serem abordados em diferentes etapas da escolarização, a compreensão destes conceitos poderá apresentar algumas lacunas, pois é recorrente alguns deles apresentarem dificuldades na sua distinção, principalmente no seu cálculo e na seleção das unidades de medida adequadas. Tem-se que a área é a: Extensão de uma superfície que é medida em unidades próprias. A medida de uma área é um número real que resulta da comparação desta área com uma área tomada para unidade. Normalmente a área de uma superfície identifica-se com a medida dessa área (ALBUQUERQUE; CARVALHO, 1990, p. 19). Já para determinar o que é perímetro, Albuquerque e Carvalho (1990, p. 95) falam que é o “comprimento da linha que define uma figura plana. Por exemplo, o perímetro de um triângulo é a soma dos comprimentos dos seus três lados; o perímetro do círculo é o comprimento da circunferência”. O perímetro é observado em figuras bidimensionais, isto é, figuras geométricas planas, e é caracterizado como medida de comprimento porque seu resultado é a medida do contorno de uma figura geométrica. Para poder calcular o perímetro quando as medidas não são descritas, precisamos medir a figura com régua, trena, metro ou qualquer outro objeto que possa ser usado para medição. Com vistas a aprendizagem dos alunos, considerando o trabalho com estes conceitos, ressalta-se a importância de utilizar metodologias que proporcionem o aprendizado de modo significativo, sendo uma possibilidade a utilização da Investigação Matemática. Cabe lembrar que em um processo investigativo, o desenvolvimento da parte conceitual “(...) desenvolve-se usualmente em torno de um ou mais problemas. O primeiro grande passo de qualquer investigação é identificar claramente o problema a resolver”. (PONTE; BROCARDO; OLIVEIRA, 2009, p.16), sendo o aluno o principal autor da construção de seu conhecimento e o professor o mediador deste processo, no qual ele poderá utilizar recursos didáticos manipulativos, pois: A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 22 238 Qualquer material pode servir para apresentar situações nas quais os alunos enfrentam relações entre objetos que poderão fazê-los refletir, conjecturar, formular soluções, fazer novas perguntas, descobrir estruturas. Entretanto, os conceitos matemáticos que eles devem construir, com a ajuda do professor, não estão em nenhum dos materiais de forma a ser abstraídos deles empiricamente. Os conceitos serão formados pela ação interiorizada do aluno, pelo significado que dão às ações, às formulações que enunciam, às verificações que realizam (PASSOS, 2006, p. 81). Portanto, o uso de materiais precisa estar alicerçado em um planejamento intencional do seu uso, com vistas aos objetivos a serem alcançados a partir da intervenção docente. Nesse viés, cabe a inserção de recursos tecnológicos para além dos manipulativos, pois A era da informação é fruto do avanço das novas tecnologias que estocam, de forma prática, o conhecimento e gigantescos volumes de informações. (...) Estas novas tecnologias permitem-nos acessar não apenas conhecimentos transmitidos por palavras, mas também por imagens, sons, vídeos, dentre outros. (VIANA, 2004, p. 11, 12) A curiosidade pelo estudo de um conteúdo poderá emergir de um trabalho diferenciado, quando realizado fora do habitual, e o uso das tecnologias contribui para o encantamento. E isso não seria diferente com os alunos da Educação Básica, que estão em fase de descobertas tanto na vida pessoal quanto na escola. Os alunos, cada vez mais, anseiam por uma aula com atividades atrativas, que propiciem aprendizagens de forma mais rápida e com facilidade. Para Toledo (2015) uma das diversas formas de aperfeiçoar a construção do conhecimento nas escolas é a partir do: (...) uso de recursos tecnológicos (computador, recursos multimídias, softwares educativos), que auxiliam tanto o professor quanto o aluno durante o processo de aprendizagem, proporcionando condições, ao professor, para ministrar aulas de forma mais criativa, acompanhando as transformações e mudanças que ocorrem quando o aluno passa a exercer sua independência na procura e seleção de informações e na resolução de problemas, tornando-se assim o ator principal na construção do seu conhecimento (TOLEDO, 2015, p. 26). Assim o professor tende a utilizar os recursos tecnológicos em sala de aula como auxiliar no processo de aprendizagem do aluno. Importante ressaltar que nem todos os professores têm acesso a estes recursos, situação esta, ainda muito presente nas escolas. Todavia, os educadores vêm recebendo cada vez mais formação para estudar e aprender a utilizar os recursos tecnológicos em sala de aula de forma positiva e consciente. Nos estudos da Matemática, vale destacar a importância do uso de recursos tecnológicos na construção de figuras planas para o desenvolvimento de conceitos e procedimentos para a construção. O software GeoGebra, por sua vez, nos proporciona uma construção precisa e boa visualização das figuras, permitindo A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 22 239 alterar cores, fazer ampliações, dinamizações das representações, o que permite identificar conceitos, elementos e propriedades. 3 | DISCUSSÕES E ANÁLISE Partindo das concepções discutidas anteriormente, foram planejadas as oficinas. A primeira oficina intitulada como “Caça ao tesouro” teve como propósito o cálculo da área e do perímetro, a soma dos ângulos internos e diagonais de polígonos como o retângulo, o losango, o triângulo e o hexágono. Os alunos foram organizados em grupos e identificados por cores. Cada grupo recebia, em um local diferente, uma pergunta matemática relacionada aos polígonos e um desafio para responder ou realizar. Se respondessem corretamente, ganhavam um polígono referente a próxima localização e uma pista que o bolsista indicava. No final, todos eram encaminhados para o mesmo local, no qual havia um prêmio para todos, pois o jogo apesar de competitivo tinha o objetivo de premiar a todos pelo seu esforço. Foi possível perceber que os alunos foram participativos, souberam trabalhar em grupos e classificar os três tipos de triângulos existentes, o que pode ser observado na Figura 1. No entanto, demonstraram dificuldades em recordar os conceitos matemáticos de área e perímetro e suas fórmulas de cálculo. Figura 1: Registro do grupo Verde. Fonte: PIBID (2018). Na segunda oficina realizada foi abordado o conceito de área e perímetro de diferentes polígonos através da manipulação do Tangram, com vistas a sanar as dificuldades apresentadas nas atividades da oficina anterior. Após a socialização da proposta, os alunos foram organizados em grupos e cada um recebeu um papel A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 22 240 quadriculado. Seguindo as instruções concedidas por um bolsista, conseguiram confeccionar o Tangram, o qual foi manipulado para responder um questionário relacionado aos conceitos que estavam sendo explorados, especialmente para que calculassem a área e perímetro de cada figura e a área total do material construído. Na Figura 02 pode-se visualizar um aluno construindo o material. Figura 02: Atividade com o Tangram. Fonte: Pibid (2018). Observou-se certa facilidade, por parte dos alunos, em responder o questionário, pois quando estavam construindo o Tangram eram questionados sobre os conceitos geométricos que poderiam ser abordados em cada peça confeccionada, percebendose mediante as exposições orais, um entendimento por parte dos mesmos. Além disso, durante a atividade mostraram organização com a disposição das peças do Tangram e foram solidários uns com os outros em momentos de dificuldade, sendo este um ponto positivo já que, mesmo estando em grupos, auxiliavam os colegas que pertenciam ao grupo vizinho. Para a terceira oficina, a proposição foi de que os alunos viessem ao IFFar/ Campus Santa Rosa para uma oficina diferenciada, em que os conceitos de área e perímetro, bem como propriedades dos polígonos fossem exploradas através de jogos e no software GeoGebra. Para tanto, este encontro foi desenvolvido em dois momentos: o primeiro no Laboratório de Matemática e o segundo no Laboratório de Informática. No primeiro momento, no Laboratório de Matemática, cada aluno recebeu A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 22 241 uma folha de color set e uma régua para representar diferentes polígonos a partir de dobraduras. Os polígonos construídos partiram inicialmente da representação de um quadrado, emergindo na sequência, o retângulo, o losango, o triângulo e o hexágono. A partir das figuras construídas, os alunos eram questionados sobre como poderíamos generalizar a fórmula para o cálculo de área e perímetro de cada polígono representado. Figura 03: Atividade para representar polígonos. Fonte: Pibid (2018). Nesta atividade os alunos apresentaram dificuldades em formular os cálculos de área e perímetro, sendo necessário que os bolsistas intervissem no desenvolvimento dos registros, ora de modo individual ora no coletivo, para que pudesse compreender o que estava sendo solicitado, bem como na distinção entre os conceitos que estavam sendo explorados. No segundo momento da oficina, realizado no Laboratório de Informática, cada aluno recebeu um roteiro com o passo a passo para as construções que seriam realizadas no software Geogebra, conforme construções ilustradas na Figura 04. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 22 242 Figura 04: Representando retângulo e quadrado no GeoGebra. Fonte: Pibid (2018). A atividade consistia em representar os polígonos explorados nas oficinas anteriores e calcular suas respectivas áreas e perímetros, visualizando assim suas propriedades. Ao concluírem estas explorações, os alunos realizaram um jogo interativo na plataforma Kahoot, o qual consistia em um conjunto de perguntas e respostas referente aos conceitos trabalhados ao longo das três oficinas. Com relação a atividade realizada no software Geogebra analisou-se que os alunos manusearam o software com facilidade, já que até então não o conheciam, conseguindo visualizar mediante as representações realizadas, a diferença entre a área e o perímetro. Já no jogo Kahoot, ficaram eufóricos em desenvolve-lo, mostraram que conheciam o seu funcionamento e a partir da efetivação do mesmo, demonstraram entendimento acerca dos conceitos abordados. As oficinas, de forma geral, buscaram trazer a compreensão de alguns conceitos geométricos de forma manipulativa, com caráter instigante e desafiador. A partir dos registros apresentados pelos alunos e de suas exposições orais, observou-se a concretização dos objetivos previamente elaborados no planejamento da proposta, visto os entendimentos dos alunos sobre a parte conceitual envolvida, emergidos a partir das oficinas realizadas. 4 | CONSIDERAÇÕES FINAIS No decorrer da realização das oficinas constatou-se a construção de conhecimentos pelos alunos sobre a geometria plana, os quais superaram suas dificuldades sobre os conceitos explorados, principalmente na diferenciação entre os conceitos de área e perímetro. As contribuições evidenciadas mediante as atividades práticas realizadas reafirmam a importância de ofertar meios diferenciados de aprender, mediante perspectivas didáticas e metodológicas diversificadas e, por vezes, distintas do A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 22 243 trabalho realizado em sala de aula. Além de primar por construções/explorações que exijam dos alunos a elaboração de escritas e generalizações sobre os conceitos matemáticos, de modo que saibam relatar suas características e conceituações com suas próprias palavras. Enquanto bolsistas, as oficinas proporcionaram a experiência de como planejar uma aula atendendo ao tempo, ao conteúdo, as formas de ensinar e considerando possíveis imprevistos que poderão surgir durante seu desenvolvimento. Ressalta-se, também, a importância de dominar a parte conceitual a ser explorada, relacionando-a com situações problema contextualizadas e de caráter histórico, de modo que cative o aluno para o processo de aprendizagem da Matemática. REFERÊNCIAS ALBURQUERQUE, T. O.; CARVALHO, R. F. Dicionário Elementar - Matemática. Lisboa: Texto Editora, 1990. BARROS, A. L. S. Uma análise das relações entre área e perímetro em livros didáticos de 3° e 4° ciclos do ensino fundamenta. Disponível em: https://repositorio.ufpe.br/bitstream/123456789/4473/1/ arquivo5323_1.pdf> Acesso em: 01 mar. 2019. PASSOS, C. L. B. Materiais manipuláveis como recursos didáticos na formação de professores de matemática. In: LORENZATO, S. (Org.). Laboratório de Ensino de Matemática na formação de professores. Campinas: Autores Associados, 2006, p. 77-92. PONTE, J.P.; BROCARDO, J.; OLIVEIRA, H. Investigações Matemáticas na sala de aula. 2 ed. Belo Horizonte: Editora Autêntica, 2009. TOLEDO, B. S. O uso de softwares como ferramenta de ensino-aprendizagem na educação do ensino médio/técnico no Instituto Federal de Minas Gerais. Dissertação (Mestrado em Sistemas de Informação e Gestão do Conhecimento). Universidade FUMEC. 2015. 114f. VIANA, M. A. P. Internet na Educação: Novas formas de aprender, necessidades e competências no fazer pedagógico. In: MERCADO, L. P. L. (Org.) Tendências na utilização das tecnologias da informação e comunicação na educação. Maceió: EDUFAL, 2004. 228p. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 22 244 CAPÍTULO 23 doi O USO DE DIFERENTES ALTERNATIVAS PARA O ENSINO- APRENDIZAGEM EM BIOLOGIA Data de aceite: 06/01/2020 Terezinha Tronco Dalmolin Colégio Politécnico da Universidade Federal de Santa Maria Santa Maria – Rio Grande do Sul/RS Márcia Lenir Gerhardt Colégio Politécnico da Universidade Federal de Santa Maria Santa Maria – Rio Grande do Sul/RS Pedro Henrique Graeff Machado Colégio Politécnico da Universidade Federal de Santa Maria Santa Maria – Rio Grande do Sul/RS RESUMO: Vivemos a biologia em todos os espaços e momentos. Somos também parte da biologia. Estudar e aprender os diferentes eixos da biologia se torna mais enriquecedor quando contextualizados com a realidade dos envolvidos, com fatos do cotidiano. Em sala de aula não é diferente. No Ensino Médio do Colégio Politécnico da UFSM, cenário da presente discussão, a preocupação dos educandos em ter um bom desempenho no aprendizado é um fator positivo para a criação de alternativas para a aprendizagem. Sendo assim, objetiva-se apresentar como são desenvolvidas algumas das atividades trabalhadas na disciplina de Biologia de forma que a interdisciplinaridade se faça naturalmente presente. A discussão se configura em um estudo de cunho qualitativo, com características descritivas, o mesmo foi realizado de forma colaborativa utilizando-se da observação para as análises e reflexões. Teoricamente se ampara em Freire (1996), Vygotsky (1996) entre outros. Como resultados, os educandos, a partir de uma temática trabalhada nas aulas de Biologia, realizaram a construção de diferentes células, considerando os tipos, conceitos, estruturas das mesmas que foram trabalhadas e investigadas durante o período letivo. Os materiais escolhidos para a confecção foi opção de cada educando, desde que o mesmo tivesse uma identificação com o mesmo. Pode-se concluir que durante esse processo de construção, em que o educando protagonizou junto com educadores que se envolveram, tanto o ensino como a aprendizagem se tornaram mais significativas e contextualizadas. O educando teve a possibilidade de ressignificar os conceitos trabalhados e recontextualizar no seu meio, independente das suas particularidades. PALAVRAS-CHAVE: Ensino-Aprendizagem. Biologia. Ensino Médio. THE USE OF DIFFERENT ALTERNATIVES TO THE TEACHING-LEARNING IN BIOLOGY ABSTRACT: We live biology everywhere and A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 23 245 every time. We are part of Biology too. Studying and learning the different branches of Biology become more enriching when contextualized with the reality of those involved with the everyday facts. In the classroom it's not different. At Colégio Politécnico da UFSM's high school/Santa Maria city/ RS state/Brazil, scenario of this discussion, the concern of the students to have a good performance on learning is a positive factor to the creation of learning alternatives. This way, it aims to present how some activities worked in Biology class are developed in a way that interdisciplinary is naturally present. This discussion is a study of qualitative nature, with descriptive characteristics, realized in a collaborative way using observation to analysis and reflection. It is theoretically supported on Freire (1996), Vygotsky (1996) and others. As results, starting from a thematic worked in biology class, the students have constructed different cells, considering the kinds, conceptions, and their structures that were worked and studied during the school year. The material chosen to the cells' making was of students' option [...]. It can be concluded that, during this making process, the students stared with the involved educators and the teaching and learning have become more signified and contextualized. The students have had the possibility of ressignify the concepts worked and recontextualize them in their environment, regardless of their particularity. KEYWORDS: teaching-learning. Biology. High school 1 | INTRODUÇÃO Ao falarmos em Biologia, logo nos lembramos de Ciência. Talvez, pela configuração estrutural que os currículos escolares, no transcorrer dos tempos, tinham. Hoje permanece, ainda, essa ideia. Ao discutirmos o ensino dessas, e das demais áreas pensamos como isso ocorreu no transcorrer histórico das diferentes instituições. Observamos que o ensino de Ciências, e demais áreas do saber, perduraram, por muito tempo, somente no campo teórico. Os educandos, na sua maioria, eram instigados a somente receber e reproduzir o conhecimento, atuando, assim, como sujeitos passivos desse processo. A preocupação com a construção de um conhecimento significativo para que o aluno fosse capaz de utilizá-lo e contextualizá-lo em diferentes situações de seu cotidiano, veio a se configurar em uma educação, uma escola mais recente. A aprendizagem pela memorização ou mecânica mostrou-se ineficiente, no transcorrer da história, para a compreensão dos conteúdos, dos temas trabalhados nas diferentes áreas do conhecimento e para a formação do cidadão intelecto e sujeito protagonista. Nesse viés, as políticas educacionais, também foram se redesenhando, configurando outro cenário para a educação, com outras abordagens educativas. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), foram precursores de uma nova A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 23 246 abordagem educativa, sendo um dos exemplos de documento criado para orientar os educadores. Buscou-se, então, e ainda está se trabalhando para que o conhecimento seja trabalhado e (re) construído de forma significativa, através da utilização de materiais didáticos alternativos e recursos tecnológicos da realidade escolar e dos educandos. O ensino e aprendizagem, nesse cenário, torna-se um processo constante e inacabado para o educando e o educador. No caso da disciplina de Biologia, foco dessa apresentação, não é diferente, como veremos no transcorrer do texto. A biologia faz parte de nós, ou nós dela. Estudar e aprender biologia se torna mais enriquecedor quando contextualizada com a realidade dos envolvidos, com o cotidiano. Em sala de aula também é assim. A prática apresentada aconteceu com os alunos do Ensino Médio do Colégio Politécnico da UFSM (Politécnico). O Colégio Politécnico da UFSM é uma das Unidades de Educação Básica, Técnica e Tecnológica localizada dentro da Universidade Federal de Santa Maria/ UFSM, no Município de Santa Maria/RS. O Colégio oferece e desenvolve a Educação Básica (ensino médio), a Formação Inicial e Continuada, a Educação Profissional Técnica de nível médio (subsequente) e a Educação Profissional Tecnológica (14 cursos Técnicos subsequentes, 4 cursos Tecnólogos, 2 cursos de Pós-Graduação). No Ensino Médio do Politécnico, cenário da presente discussão, os educandos buscam sentido no aprendizado, o que é um fator positivo para a criação de alternativas diferentes para a aprendizagem. Sendo assim, objetiva-se, no transcorrer dessa conversa, apresentar como foi desenvolvidas uma das diversas atividades trabalhadas na disciplina de Biologia de forma que a interdisciplinaridade se faz naturalmente presente. 2 | SE EU TENHO RETALHOS DE TECIDO, UMA MELANCIA, MACARRÃO, BALAS, ARAME, BATATA DOCÊ, CEBOLA; EU CONSIGO ENSINAR/APRENDER SOBRE “AS CÉLULAS”? A disciplina de Biologia, no Politécnico tem um programa a ser seguido e dentro desse os educandos são motivados à construção com materiais diversos. A temática é apresentada e trabalhada pelo docente com os educandos, e esses exploram em diferentes espaços, desde o livro didático a outras fontes de pesquisa que eles próprios buscam, alertados sempre, de observarem para que sejam confiáveis. A heterogeneidade dos grupos de educandos tornam o trabalho mais interessante e desafiador, pois, como esclarece Vygotsky (1996), o educador deve buscar metodologias de ensino diferentes para que todos os estudantes consigam realizar seu aprendizado, visto que ninguém aprende da mesma forma e no mesmo espaço de tempo. Para Freire (2002, p.18), “...ensinar é um ato criador, um ato A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 23 247 crítico e não mecânico. A curiosidade do e dos alunos, em ação, se encontra na base do ensinar-aprender”. Buscando atender as diferentes expectativas tanto professor como educando se constituem juntos, onde todos ensinam e aprendem. O diálogo e o respeito são essenciais para que esse processo de trabalho conjunto dê certo. Com as demandas educacionais na sociedade atual, o ensinar e aprender deixam de ser simples processos de repetição de informação e se constituem em processos de reconstrução ou de mudanças na estrutura do conhecimento de quem aprende. Esse tipo de processo vai se configurando em um aprendizado que, além do conhecimento específico, o aluno é submetido a alfabetização científica (POZO, 1996). No Politécnico, os educandos vivenciam essa alfabetização científica em uma disciplina específica, Projeto, com presença curricular na 3ª série, sendo que nas anteriores, a alfabetização científica é estimulada de diferentes formas durante as atividades pedagógicas e as diferentes formas de avaliações. Os educandos precisam da informação correta e, sobretudo, há a necessidade de desenvolver a capacidade de buscá-la, selecioná-la e interpretá-la a fim de que possam ter uma assimilação crítica da realidade e fenômenos a que ela se refere (POZO; CRESPO, 2009). Uma dentre as diversas propostas de atividades desenvolvidas com os educandos é o uso de diferentes alternativas para o ensino e aprendizagem. Para Moran (2008, p.1), “a escola precisa reaprender a ser uma organização efetivamente significativa, inovadora, empreendedora”. Cientes da necessidade de inovar, dentro e fora da sala de aula, busca-se trabalhar com os educando não somente o livro didático e o laboratório, e sim outras formas. Nesse momento será apresentada uma das atividades de biologia que envolveu, além das demais disciplinas, a de Biologia e a de Artes (Imagens de 1 a 10) em que os alunos construíram a representação de célula esquemática elaboradas a partir de diferentes materiais. A partir da observação e de estudos bibliográficos e questionamentos se estimulou o educando a refletir sobre o tema, células, que se estudou. O estudo sobre o tema aconteceu em sala de aula, no laboratório, com pesquisas realizadas a partir de diferentes fontes, em que os educandos investigam desde o seu celular aos computadores oferecidos na escola, na biblioteca, no próprio livro didático. A partir desse processo o educando teve condições de explorar ao máximo a temática e identificar os elementos constituintes da célula. Com esse embasamento foi escolhido o tipo de material para ser usado na construção das células. Essa forma de trabalhar com o aluno, possibilita autonomia, maior confiança, contextualização com o seu meio e consigo mesmo, tornando-o um protagonista do A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 23 248 seu processo de aprendizagem. “O respeito à autonomia e à dignidade de cada um é um imperativo ético e não um favor que podemos ou não conceder uns aos outros” (FREIRE, 1996, p. 59). Imagem 1: Papel machê. Os grupos de educandos, a partir de sua realidade, buscaram elementos que constituíam o objeto representativo, estudado já teoricamente, e assim o construir, considerando cada uma de suas partes, ocasionando assim uma releitura das diferentes células em um contexto próprio, releitura que pode ser lida como arte, um processo de investigar, criar e ressignificar. Buoro (2003, p.29) ressalta que arte e ciência sempre estiveram presentes na vida do ser humano, isto é, Se nas primeiras relações do homem com a Natureza a Ciência se fez presente, o mesmo ocorreu com a Arte [...]. Na verdade, no percurso da história não há civilização que não tenha produzido Arte e Ciência, embora as ideias positivistas nos tenham feito crer durante muito tempo que só a Ciência era capaz de contribuir para o conhecimento humano e, consequentemente, para a evolução da sociedade, ficando a Arte restrita ao campo das formas e da sensibilidade, sem outro domínio que não o estético. O ensino-aprendizado interdisciplinar propicia uma relação consciente do educando/educador, com o seu meio e as inter-relações com as diferentes áreas do conhecimento e com o mundo. Dessa forma, contribuímos com uma educação para a formação de sujeitos criativos que atuarão de forma mais crítica, como cidadãos e futuros, profissionais nos diferentes espaços que ocuparão. Imagem 2: Retalhos de tecido. Imagem 3: Materiais recicláveis e gelatina. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Imagem 4: Materiais recicláveis e gelatina. Capítulo 23 249 Cada grupo de educandos definiu um tipo de célula e materiais para a representação e/ou releitura da mesma e toda a sua composição, de acordo com o que fora estudado em sala de aula e laboratório. Houveram diferentes escolhas de materiais: células comestíveis construídas com biscoitos, pizzas, macarrão, frutas, balas. Outras de almofadas de tecido, retalhos de tecidos, papel, isopor, linhas, arames, rolinhos de papel higiênico, saquinhos plástico, etc. A reciclagem, o reaproveitamento foi um tema muito destacado pelos alunos durante o processo da construção. Imagem 5: Materiais recicláveis. Imagem 7: Chocolate, bala, creme e bolo de chocolate. Imagem 6: Materiais recicláveis. Esses alunos haviam trabalhado, também, anteriormente, a temática do lixo e da reciclagem na disciplina de Artes, através de documentários a respeito do assunto, documentários com pessoas que vivem da atividade da reciclagem. Foram trabalhadas obras de artistas como Vik Muniz e como essa reconstrução pode mudar a vida de pessoas que sobrevivem à margem da sociedade. Após concluídas, os educandos expuseram para a comunidade escolar, suas construções/leituras/releituras das células e os mesmos foram questionados a respeito pelos visitantes. Para Freire (1996) o ato de criar, recriar objetos, de conhecer faz da educação uma arte. A educação assim é uma teoria e uma prática, um ato político, estético e ético. Nesse processo de construção os próprios educandos reconhecem seu aprendizado e entendem melhor como cada uma das partes é importante para constituir o todo, independente da temática abordada. Imagem 5: Pizza Imagem 5: Pizza doce com bala e chocolate. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Imagem 5: Melancia e espaguete Capítulo 23 250 As alternativas para o desenvolvimento das propostas partiram dos educandos, que com a mediação do professor, quando o caso mais de um, relacionaram com as outras disciplinas, houve uma construção conjunta, interdisciplinar sendo tratadas com cuidado as diferenças e particularidades. O educando teve a possibilidade de ressignificar os conceitos trabalhados e recontextualizar com o seu meio, sendo também o protagonista deste ensinar/aprender e aprender/ensinar. 3 | CONCLUSÃO A educação no Brasil e no mundo, vai se construindo e reconstruindo na constituição da sua história. As escolas são, um dos palcos das diferentes cenas educacionais, pedagógicas, de sucessos e de fracassos, que vão acontecendo, nos diferentes roteiros escritos e vivenciados pelas diferentes gerações, nos diferentes contextos, sejam, educacionais, sociais, políticos, econômicos. No presente contexto, no qual estamos vivendo mudanças no nosso ensino, nas escolas, na política, o ato de ensinar e aprender vão se reconfigurando conforme os diferentes atores. Na presente discussão apresentou-se como ocorreu o desenvolvimento de uma das diversas atividades trabalhadas na disciplina de Biologia com reconhecimento da participação das demais áreas do saber, presentes no currículo do politécnico. Pode-se concluir, de forma positiva, que é possível e viável a construção de ferramentas pedagógicas, fundamentadas nas concepções dos alunos, a qual tem por objetivo tornar a aprendizagem mais atrativa, lúdica, significativa, respeitando o contexto de cada um. A atividade apresentada, assim como outras que são desenvolvidas nas diferentes aulas, mostram-se como possibilidades didático-pedagógicas no processo educativo desses adolescentes. A aprendizagem não ocorre simplesmente pela repetição (decorar), é um processo de construção cognitiva que trará mudanças no educando e no educador. As concepções alternativas servem para embasar qualquer aprendizagem, uma vez que, além de influenciar, são propulsoras para um conhecimento científico. É importante ressaltar que, devido ao contexto que o aluno se encontra, muitas das suas concepções são equivocadas e, portanto, cabe aos educadores modificá-las visto que elas são muito resistentes. Foi perceptível entre os estudantes que a motivação é um elemento que afeta a aprendizagem significativa. Observado isso, cabe aos educadores, elaborar ferramentas pedagógicas, que permitam que os alunos possam compreender criteriosamente os conceitos para aproximá-los através de suas ideias, o seu contexto, ao conhecimento científico. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 23 251 É preciso que, como educadores, analisamos a maneira como estamos abordando o que pretendemos ensinar, evitando a reprodução de um conhecimento pré-estabelecido. Além disso, é fundamental a criação de atividades interdisciplinares com disciplinas que contribuem nesse processo para que os alunos relacionem seus conhecimentos. Sem concluir, consideramos que o papel do professor em sala de aula seja para a formação de um aluno reflexivo, crítico, protagonista baseando-se em seu contexto cultural a partir do diálogo, contribuindo para que os educandos sejam futuros transformadores de sua realidade e de seu meio ambiente. Diante disso, estamos sempre na busca de novos desafios para junto com os educandos nos tornarmos educadores melhores. REFERÊNCIAS BUORO, Anamelia Bueno. O olhar em construção: uma experiência de ensino e aprendizagem da arte na escola. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2003. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. ____________. Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. 9 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002. MORAN, J. Aprendizagem significativa Entrevista ao Portal Escola Conectada da Fundação Ayrton Senna, publicada em 01/08/2008, em Disponível em <http: www.escola2000.org.br/comunique/ entrevistas/ver_ent.aspx?id=47> Acesso em 03 de nov. 2015. POZO, J. I. Aprendices y maestros. Madrid: Alianza/ Psicologia Minor. 1996. POZO, J. I.; CRESPO, M. Á. G. A aprendizagem e o ensino de ciências: do conhecimento cotidiano ao conhecimento científico. Porto Alegre: Artmed, 2009. VYGOTSKY, L. S. A Formação Social da Mente: O Desenvolvimento dos Processos Psicológicos Superiores. 5.ed. São Paulo (Brasil): Martins Fontes, 1996. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 23 252 CAPÍTULO 24 doi O USO DO LÚDICO NO PROCESSO DE ENSINOAPRENDIZAGEM DE DIFERENTES FITOFISIONOMIAS EM UMA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MÉDIO NO MUNICÍPIO DE DIAMANTINO-MT Data de aceite: 06/01/2020 Caroline Xavier da Conceição Secretaria de Estado de Educação – SEDUC Diamantino – MT Áquila Pereira da Silva Secretaria de Estado de Educação – SEDUC Diamantino – MT RESUMO: O processo de ensino e aprendizagem deve proporcionar ao aluno uma maior notoriedade e participação nos processos formativos. Os Jogos didáticos são ferramentas importantes para serem utilizados em sala de aula de forma a priorizar o aprendizado significativo dos conceitos e conteúdos trabalhados. A partir disso, o presente trabalho tem como objetivo explicitar o desenvolvimento de um jogo didático desenvolvido com turmas do Ensino Médio de uma Escola Estadual no município de Diamantino – MT, referente à disciplina de Biologia de forma a contemplar os estudos sobre as principais fitofisionomias do mundo e do Brasil. A metodologia desenvolvida foi uma proposta de trabalho com os alunos, tendo como objetivo desenvolver atividades de biologia de forma lúdica, alternando a ação pedagógica que tradicionalmente é utilizada em sala de aula, buscando estimular o desenvolvimento de suas habilidades intelectuais. Foi possível observar durante a realização das atividades que os alunos participaram de forma ativa no desenvolvimento da prática, bem como, ao jogar fizeram utilização dos conceitos teóricos trabalhados anteriormente em sala de aula. Como resultado, foi possível inferir no decorrer das atividades que a prática dos alunos durante os procedimentos cumpriu com o que é pressuposto pelos conceitos teóricos trabalhados em sala de aula, uma vez que se nota melhor assimilação do conteúdo trabalhado, bem como a participação destes no processo de desenvolvimento da atividade. Sendo assim, é possível afirmar após os resultados e discussões que os jogos didáticos são de extrema importância para a formação educacional de alunos de qualquer instância. PALAVRAS-CHAVE: Atividade Lúdica; processo formativo; processo educacional. THE USE OF PLAYFUL IN THE TEACHINGLEARNING PROCESS OF DIFFERENT PHYTO-PHYSIONOMIES IN A STATE HIGH SCHOOL IN DIAMANTINO- MT ABSTRACT: The teaching and learning process should provide the student with greater awareness and participation in the training processes. The didactic games are important tools to be used in the classroom in order to A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 24 253 prioritize the meaningful learning of the concepts and contents worked. From this, the present work aims to explain the development of a didactic game developed with high school classes of a State School in Diamantino - MT, referring to the discipline of Biology in order to contemplate the studies on the main phytophysiognomies of the world and Brazil. The methodology developed was a work proposal with the students, aiming to develop biology activities in a playful way, alternating the pedagogical action that is traditionally used in the classroom, seeking to stimulate the development of their intellectual skills. It was possible to observe during the performance of the activities that the students participated actively in the development of the practice, as well as, while playing, made use of the theoretical concepts previously worked in the classroom. As a result, it was possible to infer during the activities that the students' practice during the procedures complied with what is presupposed by the theoretical concepts worked in the classroom, since it is better to assimilate the worked content, as well as their participation in the classroom. process of activity development. Thus, it is possible to affirm after the results and discussions that the didactic games are extremely important for the educational formation of students of any instance. KEYWORDS: Playful activity; training process; educational process INTRODUÇÃO O processo de ensino e aprendizagem deve proporcionar ao aluno uma maior notoriedade e participação nos processos formativos, para tal, a utilização de métodos e práticas didáticas vem ao encontro dos esforços em sala de aula para tornar o conhecimento mais acessível e condizente com as necessidades e particularidades de seus atores. Segundo Silva et al. (2016), a utilização de jogos didáticos possibilita aos alunos e professores uma maior interação e descobrimento de formas diversas de aprendizagens. Por meio dos jogos didáticos, o aluno pode experimentar o processo de aprendizagem de forma dinâmica, interativa, prazerosa e interessante. Ao professor cabe uma reinvenção de seus processos metodológicos e um redescobrimento de seu processo de ensino-aprendizagem, objetivando-se um processo educacional pleno e satisfatório. Para Kishimoto (1994), por meio da aula lúdica os alunos são instigados a potencializar sua criatividade, sendo protagonistas do processo pedagógico, despertando por meio da brincadeira a vontade pelo saber e a vontade de participar, assim a atividade lúdica se torna interessante, uma vez que promove o aumento da concentração e permeia a assimilação dos conteúdos facilmente. Segundo Callai (1991) para que os conteúdos possam ser aceitos, absorvidos, reinterpretado e significados pelos alunos, considerando-se seus conhecimentos prévios como ser social, é necessário que o processo educacional permita, proporcione A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 24 254 e incentive o educando de forma que o aprendizado seja prazeroso. Corroborando a essa ideia, Marandino et al. (2009) aponta que o emprego de atividades lúdicas em sala de aula leva a uma maior participação dos alunos no processo educativo, tornando-os partícipes da construção de seu próprio conhecimento, ampliando as possibilidades de aprendizagem, bem como propiciação de uma maior vivência experimental que os ajudem a fazer relações com os conhecimentos escolares. Os Jogos didáticos são ferramentas importantes para serem utilizados em sala de aula de forma a priorizar o aprendizado significativo dos conceitos e conteúdos trabalhados. Dessa forma, ao aluno, são proporcionados o conhecimento amplo e a familiarização dos conceitos e termos técnicos da linguagem científica a que se propõe a atividade lúdica. A partir disso, o presente trabalho tem como objetivo explicitar o desenvolvimento de um jogo didático desenvolvido com turmas do Ensino Médio de uma Escola Estadual do município de Diamantino – MT, referente à disciplina de Biologia de forma a contemplar o ensino das principais fitofisionomias do mundo e do Brasil. METODOLOGIA A metodologia desenvolvida foi uma proposta de trabalho com os alunos que frequentam uma Escola Estadual de Ensino Médio no município de Diamantino-MT, tendo como objetivo desenvolver atividades de biologia de forma lúdica, alternando a ação pedagógica que tradicionalmente é utilizada em sala de aula, buscando estimular o desenvolvimento de suas habilidades intelectuais. O jogo didático sobre as principais fitofisionomia - particularidade vegetal ou flora típica de uma região -, do mundo e do Brasil foi empregado em uma Escola Estadual de Ensino Médio no município de Diamantino – MT. Para sua confecção foi necessário: papel sulfite A4, papel cartão, cola branca; tesoura; papel autoadesivo transparente. Para a confecção do jogo de cartas (Biomas Card,Imagens em anexo) foi realizado a impressão das principais fitofisionomias do Mundo e do Brasil em papel sulfite A4, no qual estes foram recortados e posteriormente colados em papel cartão para uma maior firmeza das cartas, de forma a facilitar seu manuseio. Para sua conservação, utilizou-se papel autoadesivo transparente para seu revestimento. Para o início do jogo os alunos são divididos em grupos de 5 indivíduos, cada grupo recebe um jogo contendo 20 cartas, sendo que o baralho apresenta duas cartas de cada fitofisionomia. Cada jogador receberá o mesmo número de cartas, sendo proibido a visualização das cartas dos adversários. O jogador que inicia deve escolher um oponente para “duelar” bem como a carta deste. Escolhido o oponente e a carta, o jogador deve escolher a característica de A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 24 255 sua preferência, revelando qual a característica e pontuação, em seguida o oponente faz o mesmo. Aquele que obtiver a maior pontuação da característica escolhida ganha. Caso haja empate deve-se escolher outra característica da mesma carta, caso as cartas sejam iguais será necessário a escolha de outra carta do adversário, revelando-se a mesma característica escolhida anteriormente. Ao fim da jogada, aquele que tiver a maior pontuação ganhará a carta do oponente. O objetivo do jogo é obter todas as cartas dos adversários ou, em caso de empate, ganha quem tiver a maior pontuação no somatório das características das cartas em mãos. RESULTADOS E DISCUSSÕES Foi possível observar durante a realização das atividades que os alunos participaram de forma ativa no desenvolvimento da prática, bem como, ao jogar fizeram utilização dos conceitos teóricos trabalhados anteriormente em sala de aula. Com o emprego do jogo foi percebido que os conceitos e características das fitofisionomias trabalhados foram absorvidos de forma mais lúdica e educativa, deixando assim o processo de ensino-aprendizagem mais dinâmico, interativo e motivador. Em relação ao uso de atividade lúdica em sala de aula, nota-se que a proposta é uma eficiente alternativa na discussão sobre as fitofisionomias mundiais e biomas brasileiros. Percebe-se também uma melhora no quesito disciplinar dos alunos, visto que, os mesmos, ao desenvolverem a atividade proposta, mostram-se mais dispostos e interessados no processo de ensino de ensino-aprendizagem. É preciso considerar no desenvolvimento de jogos pedagógicos a interação e o divertimento dos alunos. Ademais, é passível de consideração a individualidade do aluno enquanto ser e a aquisição de saberes e experenciações. Em concomitância a isso Ferrazeri (2004) afirma que os jogos didáticos podem ter duas funções a lúdica e a educativa, a lúdica tendo por função oferecer o maior prazer e diversão aos atores participantes da atividade, por outro lado, a educativa possui como propósito ensinar ou complementar saberes teóricos desenvolvidos em sala de aula. Para Antunes (2009), a utilização dos jogos didáticos não é apenas mais uma maneira de se desenvolver o conhecimento de forma criativa, mas representa uma metodologia motivadora para um processo de ensino aprendizagem com significações, no qual os alunos deixam de ser meros ouvintes, para serem protagonistas do seu processo educacional. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 24 256 CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir dos elementos supracitados pode se inferir que a utilização de jogos didáticos em práticas pedagógicas fomentando a ludicidade dos discentes é satisfatória e viável. Foi possível observar no decorrer das atividades que a prática dos alunos durante os procedimentos cumpriu com o que é pressuposto pelos conceitos teóricos apresentados nesta produção. Sendo assim, é possível afirmar após os resultados e discussões que os jogos didáticos são de extrema importância para a formação educacional de alunos de qualquer instância. Por esta razão, faz-se necessário estudos mais abrangentes acerca desta problemática. Eis as considerações deste trabalho. REFERÊNCIAS ANTUNES, C. Jogos para o bem ensinar. 1º ed, Fortaleza: Imeph, 2009. CALLAI, Helena Copetti (Org.). O ensino em estudos sociais. Ijuí, RS: Edunijuí, 1991. FERRAREZI, L. A. A importância do jogo no resgate do ensino de geometria. VIII Encontro Nacional de Educação Matemática. Universidade Federal de Pernambuco, Recife 15 a 18 de junho de 2004. KISHIMOTO, T.M. Jogo, Brinquedo, Brincadeira e a Educação. 6. ed. São Paulo: CORTEZ,1994. MARANDINO, M; SELLES, S.E; FERREIRA, M.S. Ensino de biologia: histórias e práticas em espações educativos. São Paulo: Cortez, 2009. KHOURI, R. Jogo de Cartas dos Biomas. Disponível em:<https://descomplica.com.br/blog/biologia/ jogo-de-cartas-biomas/>, acesso em 10 de agosto de 2019. SILVA, K. J. F.; SOBREIRA, A. C. M.; BEZERRA, M. A.; SILVA, M. O.; MARTINS, M. M.M.C. A utilização de jogos didáticos no ensino de Biologia: uma revisão de literatura. 3º CONEDU, Congresso Nacional de Educação, 2016. SILVA, L. R. B.; BARBOZA, R. J. O.; MATOS, J. G. J.; LIRA, M. M. R. A importância do uso de jogos didáticos e suas contribuições para o ensino de química. 3º CONEDU, Congresso Nacional de Educação, 2016. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 24 257 ANEXO A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 24 258 CAPÍTULO 25 doi PERCEPÇÃO DOS DOCENTES QUANTO A INFLUÊNCIA DO ESPAÇO ESCOLAR NA EDUCAÇÃO INFANTIL Elivania Toledo Rodrigues Data de aceite: 06/01/2020 Gislaine Maria Lente Franco Universidade do Estado de Mato Grosso, Faculdade de Ciências da Saúde, Departamento de Medicina Cáceres – MT Universidade Evangélica do Paraguai, Mestrado em Educação Assuncion – PY Elisangela de Oliveira Silva Ministério Público Estadual, Cáceres Cáceres – MT Marinalva Pereira dos Santos Universidade do Estado de Mato Grosso, Campus de Diamantino Diamantino – MT Silvana Mara Lente Universidade do Estado de Mato Grosso, Campus de Diamantino Diamantino – MT Odenise Jara Gomes Secretaria Municipal de Educação de Cáceres, Supervisão Pedagógica Cáceres-MT Solange Teresinha Carvalho Pissolato Universidade do Estado de Mato Grosso, Campus de Diamantino Diamantino – MT Vania de Oliveira Silva Universidade do Estado de Mato Grosso, Campus de Sinop Sinop – MT RESUMO: O referente artigo tem como objetivo demonstrar a percepção dos docentes quanto à influência do espaço escolar na educação infantil a partir da aplicação de questionário aberto. Abrange uma pesquisa exploratória. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, por ser de cunho interpretativo quanto às múltiplas percepções. A pesquisa foi realizada na Escola Municipal de Educação Infantil “Tia Alair” representa o Projeto Padrão do FNDE – Proinfância tipo B. Mais, é preciso ter boa gestão quanto aos espaços disponíveis, passar por manutenção visando garantir a integridade física e ainda a capacitação dos profissionais que lá atuam para conseguir melhor aproveitar os espaços no desenvolvimento da criança. Foram considerados que espaços organizados, planejados, arejados e iluminados influenciam na educação infantil, isto reporta a ressaltar que o projeto Pró-Infância embora ainda tenha alguns contratempos e quem questiona sua funcionalidade, é o que se tem de melhor no contexto da educação infantil. Outro destaque está na relação professor – aluno, que promove ou deveria promover uma compreensão do A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 25 259 espaço ocupado no processo educativo, de maneira a permitir que a criança o domine e tenha segurança para reconhecê-lo. Em linhas gerais, os entrevistados ressaltam que a escola tem funcionalidade, porém com algumas limitações. E, que requer algumas adequações físicas e profissionais para atender de maneira adequada e respaldada nas diretrizes da educação infantil. PALAVRAS-CHAVE: Percepção dos docentes, espaço escolar, educação infantil. 1 | INTRODUÇÃO O Espaço Escolar é formado por valores implícitos que contribuem para que o ambiente transforme em lugar que propicie laços afetivos, sentimento de identidade e de pertencimento. Sendo assim, o espaço escolar é gestado por múltiplos interesses manifestos e ocultos que podem afetar a vida dos sujeitos, gerando inclusões e exclusões. É um elemento essencial do currículo, porém faz parte de um currículo oculto, ou seja, normas e valores que, embora não estejam explícitos são, efetivamente, divulgados pela escola (RIBEIRO, 2004, p.104). Complementa Salvador (2011) apud Sant’Anna (2007) que o espaço deve passar para o indivíduo que nele está inserido uma percepção satisfatória, agradável e emocionante do ambiente. O conforto ambiental, eficiência energética e a percepção arquitetônica devem caminhar juntas. Cabe destacar que de acordo com a psicologia, neurociência e ciências cognitivas, percepção é a função cerebral que impõe definição a cada excitação sensorial a partir de histórico de vivências densa. Transversalmente da percepção um indivíduo estabelece e interpreta as suas impressões sensoriais para impor significado ao seu meio. Consiste na obtenção, interpretação, escolha e composição das informações adquiridas pelos sentidos (SALVADOR, 2011). Vale destacar que o espaço escolar forma personalidades e traz realizações, possui o dever de proporcionar ao educando condições para desenvolver habilidades cognitivas e motora, tendo em conta à evolução do pensamento crítico (SILVA; SILVA; LIRA; SANTOS e RIBEIRO, 2012, p. 01). Este desenvolvimento procede de conciliação através de potencial do organismo humano e as circunstâncias oferecidas pelo meio e que os esquemas de apropriação vão se transformando progressivamente, considerados estágios de desenvolvimento. Neste mesmo segmento é possível compreender a estreita relação existente entre capacidade de aprendizagem e o local de ensino. No Brasil a maioria das escolas públicas não possuem infraestrutura apropriada para seu funcionamento, assim, ser professor torna-se um desafio, exigindo do educador a procura por espaços e metodologias quem suprem a necessidade dos educandos, respeitando suas individualidades e diferentes estágios de A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 25 260 desenvolvimento e aprendizagem (SILVA; SILVA; LIRA; SANTOS e RIBEIRO, 2012, p.01). Ainda com respaldo nos autores tem-se que o desafio do professor é constante quanto ao espaço que o limita de realizar certas atividades, tentam propiciar aos alunos atividades que os conduzem para ambientes além do tradicional, harmonizando o desenvolvimento de novos imaginários, sentidos e habilidades. Por meio da convivência com educandos em diversas atividades propostas, observa-se a necessidade e importância da utilização de ambientes alternativos como estratégia pedagógica, tendo em vista a ampla influência do ambiente de ensino no processo ensino-aprendizagem. Essa mudança de ambiente traz ao educando o desenvolvimento de novas e diversas habilidades. O educador deve tomar consciência do ambiente em que o educando interage para assim compreender o seu comportamento, suas ações, sua maneira de aprender, e seu processo de desenvolvimento, bem como a influência que o mesmo exerce sobre a criança (SILVA e MUZARDO, 2016, p.66 apud DUDEK, 2000). Nesta linha de pensamento foi desenvolvido este estudo com o objetivo de demonstrar a percepção dos docentes quanto à influência do espaço escolar na educação infantil a partir da aplicação de questionário aberto. Cabe concluir que a busca pela arquitetura escolar se iniciou ao longo do processo de constituição da escola moderna. Fundamentando como tal a instituição proposta à formação de cidadãos, desenvolvida a partir das ideais iluministas e que se submergiu na mesma medida da sociedade industrial. Inicialmente os primeiros estudos e propostas para edificação escolar do século XIX, preocupou-se com o estilo externo do edifício escolar do que nas funções propriamente educativas. E, hoje é muito relevante a busca de realização de novos estudos para que se aproxime cada vez mais as edificações às necessidades de ambientes escolares propícios para o desenvolvimento da criança com é o caso da escola em estudo. 2 | PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Abrange uma pesquisa exploratória, apresenta percepções de docentes no contexto escolar da educação infantil com ambientes poucos ou nada propícios ao desenvolvimento das atividades pedagógicas interferindo na Educação Infantil. Dispõe de uma pesquisa qualitativa, “por envolver uma abordagem interpretativa e naturalista de seu objeto de estudo. ” (DENZIN e LINCOLN, 2000, p.1). O espaço escolar da Escola Municipal de Educação Infantil “Tia Alair” foi oportuno para a cumprimento da Amostra Aleatória Simples, sendo possível executar a aplicação de questionário aos que interessados a participar do estudo, totalizando 10 participantes entre docentes, gestora e técnico de desenvolvimento infantil. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 25 261 3 | RESULTADOS E DISCUSSÕES Este ponto de discussão tange as contribuições dos profissionais que atuam na Escola Tia Alair, em Diamantino – MT. Foram entrevistados um total de onze (11) profissionais dentre eles técnico de desenvolvimento infantil, gestores administrativo e pedagógico, e, professoras quanto a influência do espaço escolar na educação infantil, vantagens e desvantagens desses espaços para o desenvolvimento infantil, e, as considerações quanto aos ambientes da escola Tia Alair. Ao questionar os entrevistados sobre a influência do espaço na educação infantil, todos foram taxativos em afirmar que os ambientes influenciam sobremaneira na educação infantil. Foram selecionadas algumas afirmativas apresentadas pelos entrevistados que segue dispostas no Quadro 01: Profissional Considerações sobre ... TDI1 [...] ambiente bem organizado e arejado [...] facilitará o trabalho dos professores e alunos Professora1 [...] o espaço precisa ser agradável para as crianças, bem iluminado, um ambiente amplo e decorado. Professora2 [...] ambiente amplo, arejado e funcional influencia muito no desenvolvimento das atividades tanto individuais tanto coletivas. TDI2 [...] o ambiente escolar influencia diretamente na educação infantil pois quando o ambiente passa harmonia e organização notamos que a aprendizagem ocorre de forma eficaz. Gestora1 [...] acredito que os ambientes têm forte influência na Educação Infantil, mas não é tudo, porém tem fator bastante positivo no desenvolvimento. Quadro 1. Contribuições dos entrevistados sobre influência. Fonte: Questionário aplicado pela autora e respondido pelos profissionais da amostra da pesquisa, 2018. As afirmações destacadas no Quadro 01 reportam a contribuição dos espaços no processo de interação com o meio destacado por Piaget correspondendo a uma organização interna com adaptação formalizadas pelas crianças que promovem a aquisição de conhecimentos e condutas, os quais se processam com a adaptação ao meio após o equilíbrio entre a acomodação e a assimilação. Ainda pode se considerar a teoria apresentada por Vygotsky, a sócio interacionista, onde o contato com o meio cultural e com os objetos provocam nas crianças o reconhecimento dos mesmos e, por conseguinte desencadeiam o domínio e o conhecimento. Foram considerados que espaços organizados, planejados, arejados e iluminados influenciam na educação infantil, isto reporta a ressaltar que o projeto Pró-Infância embora ainda tenha alguns contratempos e quem questiona sua funcionalidade, é o que se tem de melhor no contexto da educação infantil. Quanto as contribuições do ambiente na educação infantil ressaltam-se as A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 25 262 afirmativas relevantes apresentadas pelos entrevistados. Conforme disposto no Quadro 02 as contribuições vão desde a própria condição do ambiente até o despertar para a autonomia e socialização, observe: Profissional Considerações sobre ... TDI3 Um ambiente bem organizado, com os mobiliários bem distribuídos e que respeita todas as exigências do conforto ambiental contribui de forma significativa na educação infantil. Professora2 Acredito que contribui no desenvolvimento da criança da sua autonomia e socialização. A criança precisa se sentir segura para aprender com propriedade. Professora3 A qualidade, a organização e a iluminação pode estimular, instiga o desenvolvimento das capacidades de cada criança, ajuda a manter a concentração fazer se sentir parte integrante do ambiente. TDI4 Contribui diretamente a criança e ao professor. Alivia estresse, trazendo tranquilidade e segurança a aquela criança. O conforto e sua mobilidade assimila segurança, principalmente à crianças tímidas e inseguras. Quadro 2. Contribuições dos entrevistados sobre as contribuições do ambiente na educação infantil. Fonte: Questionário aplicado pela autora e respondido pelos profissionais da amostra da pesquisa, 2018. Todas as afirmativas destacadas remetem a compreensão de que o espaço de educação infantil tem papel fundamental no processo de desenvolvimento infantil, inclusive ocupa-se da compreensão de Vygotsky (1996) quanto a internalização, onde o ambiente é considerado espaço para o desenvolvimento intelectual das crianças. Logo, as influências sociais são de extrema importância para o seu desenvolvimento cognitivo, pois Vygotsky compreende que as partes biológicas por si só não conseguem realizar a aprendizagem no seu todo. Num processo interativo, com o meio, com o ambiente, com o contato direto com os objetos dispostos nos ambientes consiste na valorização das representações construídas na produção do conhecimento e dos significados (VYGOTSKY, 1996). Explica-se que por meio do contato com o objeto e a partir da troca de informação e interação social o aluno se torna capaz de conceber sobre aquele objeto e construir sua concepção sobre o mesmo. Outro destaque está na relação professor – aluno, que promove ou deveria promover uma compreensão do espaço ocupado no processo educativo, de maneira a permitir que a criança o domine e tenha segurança para reconhecê-lo. Agora é claro que este espaço precisa ser adequado dentro das condições arquitetônicas para o atendimento à criança. Questionados quanto as vantagens e desvantagens dos espaços escolares no desenvolvimento infantil, os entrevistados apresentaram concepções semelhantes, sendo destacados àquelas que representam as expressões com maior recorrência entre as respostas apresentadas, como se segue nos quadros 3 e 4: A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 25 263 Profissional Vantagens TDI5 [...] móveis e brinquedos adequados; ter uma rotina; experiências novas Professora4 aprendizado; a criança aprende a lidar com a rotina, pois muitas vezes esses espaços requerem horários; segurança. Professora1 Um espaço escolar com uma boa ergonomia; Um ambiente que explora o cognitivo da criança; A interação da criança com meio em que está inserido. TDI1 Um ambiente livre aonde a criança possa explorar a ludicidade, realizando atividades como: as brincadeiras, os brinquedos e jogos. Pois brincando que a criança desenvolve a identidade e autonomia. Gestora2 O espaço da criança contribui para o desenvolvimento da criança (físico e psicológico). Quadro 3. Contribuições dos entrevistados sobre vantagens dos espaços escolares. Fonte: Questionário aplicado pela autora e respondido pelos profissionais da amostra da pesquisa, 2018. Profissional Desvantagens TDI3 [...] falta de flexibilidade. Pois a criança acaba perdendo a força quando se tem muitas coisas prontas. Professora2 Um ambiente pode pausar ou regredir a aprendizagem da criança; O espaço físico deve passar por manutenção. Professora1 Quando o espaço não passa segurança para a criança se desenvolverá inseguro e introvertido. Gestora1 Não saber usar os recursos disponíveis no espaço; limitar a criança, confina-la somente em um espaço. Quadro 4. Contribuições dos entrevistados sobre desvantagens dos espaços escolares. Fonte: Questionário aplicado pela autora e respondido pelos profissionais da amostra da pesquisa, 2018. As respostas apresentadas pelos entrevistados correlacionam ao previsto nas diretrizes nacionais da educação infantil. Enaltecendo a rotina, a liberdade, com possibilidade de desenvolvimento por meio da realização de atividades interativas e pedagógicas. Para Piaget (1970) conhecer é aprender a realidade em termos de compreensão de como determinado estado de coisas se torna possível, e, nisto se considera a organização do espaço escolar na educação infantil. Já quanto as desvantagens destacaram o disposto por Piaget (1970) onde o professor assume um papel de suma importância, criando espaços, disponibilizando materiais e fazendo mediação da construção do conhecimento. Assim, foi destacado uma afirmativa quanto a não valorização e não utilização correta dos recursos pelos profissionais que atuam com as crianças na escola pesquisada. Ainda se tem que os ambientes por serem fixos não oportuniza mudanças de cenários para promoção de muitas atividades, além de em alguns casos não estarem adequados para o uso e bem-estar físico das crianças. A questão da manutenção A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 25 264 é preocupante no contexto das escolas públicas, que quase sempre demoram para passar por uma reforma de manutenção. Questionados quanto ao espaço da escola onde atuam as afirmativas foram amplas como apresentado no quadro 5: Profissional Considerações sobre ... TDI1 A escola é o primeiro ambiente em que a criança estará em contato com adultos que não são da sua família, desenvolvendo características como respeito, disciplina e paciência. Professora4 O espaço contribui para o desenvolvimento físico e psicológico da criança, contribui com o desenvolvimento da identidade cultural e o desenvolvimento profissional. Gestora2 A escola possui um espaço amplo, contribui fortemente na consolidação da aprendizagem haja visto que possui um espaço amplo, com brinquedos, com ventilação, com possibilidades para expressar, conviver, explorar. TDI3 Um dos exemplos de um ótimo espaço físico é o Solário, pois proporciona a liberdade de movimentos, possibilita sua socialização com a natureza e com as outras crianças que ali estão brincando. Quadro 5. Contribuições dos entrevistados sobre o espaço escolar Tia Alair. Fonte: Questionário aplicado pela autora e respondido pelos profissionais da amostra da pesquisa, 2018. Das afirmativas apresentadas pelos entrevistados destaca-se a lembrança de ser a escola o primeiro ambiente cultural que a criança se insere, externamente, e esta realidade provoca um processo de adequação entre o ambiente familiar e o ambiente escolar. Isto é bem tratado por Vygotsky (1996) que descarta a contribuição para que a criança aprenda a partir de sua própria existência e experiências vivenciadas ao longo do tempo e espaço, de maneira a significá-las. Em linhas gerais os ambientes como já tratados anteriormente são específicos para o atendimento da educação infantil, e, uma das respostas destaca o ambiente solário, que se torna mais um espaço não disposto em uma escola construída fora da proposta do Pró-Infância. Dentre outras contribuições dos entrevistados, destacam-se o disposto no quadro 6 que destacam sobre a gestão escolar e dos espaços, lugares específicos, ambientes mal planejados, ambiente aconchegante e a necessidade de reorganização dos espaços. Profissional Considerações sobre ... TDI4 É preciso de uma gestão para que estes espaços não precisem ser desfeitos no futuro. Professora2 [...] o ambiente escolar em que estou inserido possui os lugares específicos para aplicação de distintas atividades. Professora3 Os poucos espaços que possuímos ajudam nesse sentido de promover desenvolvimento das crianças. [...] ambientes mal planejados ou sem manutenção causam transtornos e possíveis acidentes nos pequenos. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 25 265 TDI1 [...] um ambiente aconchegante, arejado, iluminado, tem que ter uma área verde com sombra, porque com brinquedos adequados. Gestora2 Penso que os espaços são muito importantes para o desenvolvimento na Educação Infantil. Porém os profissionais precisam se conscientizar do seu papel frente a reorganização desses espaços e do tempo estabelecido para se trabalhar com as crianças. Quadro 6. Outras Contribuições dos entrevistados. Fonte: Questionário aplicado pela autora e respondido pelos profissionais da amostra da pesquisa, 2018. Percebe-se que os entrevistados reconhecem a importância do espaço no contexto da educação infantil, porém reforçam que os profissionais precisam ter habilidades estratégicas para a organização destes ambientes. A realidade da escola, por ter uma demanda grande de crianças sofreu alterações nos ambientes e por vezes não atende as necessidades das crianças e profissionais. Ainda por ser uma escola implantada com pouco tempo, não está arborizada e existe a indisponibilidade de utilização dos ambientes externos para prática de atividades extraclasses. Também foi destacado os despreparos dos profissionais para organizar e reorganizar estes espaços, que foram construídos para atender a educação infantil. Em linhas gerais, os entrevistados ressaltam que a escola tem funcionalidade, porém com algumas limitações. E, que requer algumas adequações físicas e profissionais para atender de maneira adequada e respaldada nas diretrizes da educação infantil. 4 | CONSIDERAÇÕES FINAIS Quanto a verificação da capacidade do ambiente escolar de influenciar na educação infantil foi possível afirmar que na educação infantil esta realidade é mais de relevante, pois os espaços influenciam sobremaneira nesta etapa educacional, tanto que levou o governo a pensar um espaço adequado para tal. Ao demonstrar as contribuições da arquitetura na educação infantil a partir da percepção dos docentes com a aplicação de questionário aberto ficou claro que estes profissionais compreendem esta contribuição conseguindo destaca-las. Porém, tecem algumas limitações na realidade da escola estudada. REFERÊNCIAS DENZIN, N. K.; LINCOLN, Y. S. The sage hand book of qualitative research. 2 edição Thousand Oaks: Sage, 2000. PIAGET, J. A epistemologia genética. Petrópolis. R. J: Vozes, 1970. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 25 266 RIBEIRO, S. L. Espaço escolar: um elemento (in) visível no currículo. Rev. Sitientibus. Feira de Santana, n. 31, p.103-118, jul./dez., 2004. Disponível em: w.w.w.uefs.br/sitientibus/pdf/31/espaçoescolar.pdf. Acesso em: 23 de fevereiro de 2019. SALVADOR, E. V. Percepção Arquitetônica do Espaço de Trabalho pela Comunidade Universitária. Estudo de caso da UFSCar: Campus São Carlos. Dissertação (Mestrado). Universidade Federal de São Carlos, 2011. SILVA, D. G.; SILVA, L. F.; LIRA, M. S.; SANTOS, A. P.; RIBEIRO, M. A. A Influência do local de ensino no processo de aprendizagem. Universidade Federal de Pernambuco. Pró-Reitoria de Extensão e Cultura. 70 Anos Tempos Transversos. SILVA, F. L.; MUZARDO, F. T. Estudo exploratório sobre o espaço escolar: a percepção de professores de escolas públicas. Revista THEMA, 2016, vol. 13, nº 1, pág. 65-78. VYGOTSKI, L. S. A construção do pensamento e da linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1996. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 25 267 CAPÍTULO 26 doi PERCEPÇÃO DOS PROFESSORES SOBRE O ATRASO NA LEITURA E ESCRITA DOS ALUNOS EM ANOS INICIAIS DE UMA ESCOLA MUNICIPAL Data de aceite: 06/01/2020 Data de Submissão: 25/10/2019 Cecilma Miranda de Sousa Teixeira Pedagoga e Professora do Curso de Medicina da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) em Imperatriz, Maranhão: ORCID: 0000-0002-70538602. Brauliene Araújo Neves Acadêmica do Curso de Pedagogia da UFMA em Imperatriz, Maranhão: CV: https://lattes.cnpq. br/9333327341493734 Francisco Hudson Coelho Frota Pedagogo, Consultor em TICs do Curso de Pedagogia da UFMA em Imperatriz – Maranhão: CV: https://lattes.cnpq.br/1597944779494739 RESUMO: Diversas condições estão relacionadas ao processo de aprendizagem da escrita e leitura, como alunos, família, professores, escola, o contexto sociocultural e sócio afetividade neste processo. Percepção dos professores sobre o atraso na leitura e escrita dos alunos em anos iniciais de uma escola municipal de Imperatriz – Maranhão. Estudo feito em uma escola da periferia com baixo rendimento, o que instigou este estudo. Objetivou-se investigar a percepção dos professores sobre o atraso na escrita e leitura dos alunos. Pesquisa, qualitativa realizada em novembro de 2016, com 4 professores do 1º ao 5º ano, exceto do 4º ano por recusa. Os 110 estavam distribuídos por turmas, sendo 1 com 27, outra com 33 e 2 com 25 alunos. Considerar que um mesmo aluno pode constar em mais de um dos itens, portanto, 9 alunos possuíam reprovações, 15 não sabiam ler, 80 não sabiam escrever e 68 não sabiam ler e escrever e 9 diagnosticados com déficit de atenção. Na percepção dos professores a principal causa do atraso foi a ausência dos pais no acompanhamento das crianças e para melhorar a aprendizagem da leitura, escrita e reprovações, foi destacado que a escola deveria levar mais a sério estas dificuldades, desenvolver projetos e capacitar professores; que os professores devem trabalhar mais a leitura e escrita usando recursos diversificados, que a dificuldade é pela falta de interesse do aluno e que a reprovação deveria ser para os pais porque os professores fazem sua parte e os pais não fazem. Concluiu-se que na percepção dos professores a dificuldade de aprendizagem dos alunos, está relacionada principalmente aos pais, à indisciplina e a superlotação das turmas. Recomendam-se outros estudos para consolidar estes resultados e fomentar ações educacionais nas escolas sensibilizando os professores como responsáveis pelo processo e subsidiar o poder público na melhoria educacional no município. PALAVRAS-CHAVE: Leitura. Escrita. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 26 268 Percepção de professores. TEACHER’S PERCEPTION ABOUT DELAY IN READING AND WRITING STUDENTS IN EARLY YEARS OF A MUNICIPAL SCHOOL ABSTRACT: Several conditions are related to the learning process of writing and reading, such as students, family, teachers, school, the socio-cultural context and socio-affection in this process. Teachers ‘perceptions of students’ delay in reading and writing in early years of a municipal school in Imperatriz - Maranhão. A study done in a low-income peripheral school, which prompted this study. This study aimed to investigate teachers ‘perceptions of students’ delay in writing and reading. Qualitative research conducted in November 2016, with 4 teachers from 1st to 5th grade, except 4th grade for refusal. The 110 were divided into groups, 1 with 27, another with 33 and 2 with 25 students. Considering that the same student can appear in more than one of the items, therefore, 9 students had failures, 15 could not read, 80 could not write and 68 could not read and write and 9 could not be diagnosed with attention deficit. In the teachers’ perception, the main cause of the delay was the absence of parents to accompany the children and to improve learning in reading, writing and failing, it was stressed that the school should take these difficulties more seriously, develop projects and train teachers; that teachers should work more reading and writing using diverse resources, that the difficulty is because of the student’s lack of interest and that disapproval should be for parents because teachers do their part and parents don’t. It was concluded that in the teachers ‘perception the students’ learning difficulties are mainly related to parents, indiscipline and class overcrowding. Other studies are recommended to consolidate these results and to promote educational actions in schools, sensitizing teachers as responsible for the process and subsidizing the public power in the educational improvement in the municipality. KEYWORDS: Reading. Writing. Perception of teachers. 1 | INTRODUÇÃO A leitura e escrita é um processo que envolve o contexto sócio cultural da criança e como agente estimulador na geração de hipóteses dos fatos, acontecimentos do seu entorno. Contudo, aliado ao desenvolvimento cognitivo inerente a cada fase como descrito por Vitgosky, há necessidade da presença do professor para direcionar esta fase, elegendo dentre as concepções metodológicas de aprendizagem disponíveis na área educacional, aquela que mais se adequa a sua realidade. Família é a primeira escola, ainda que informal e a ela compete, sobretudo, ensinar valores indispensáveis ao convívio em sociedade, valores estes que deve a escola implementar, associando ao ensino da leitura e da escrita. Lamentavelmente, o que vivenciamos hoje é um mister de delegação de responsabilidade do ensino de princípios e valores o que leva a criança cada vez A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 26 269 mais à indisciplina e como consequência à falta de atenção em sala de aula o que pode contribuir para a não aprendizagem da leitura e da escrita. Nesta perspectiva, Brasil (2001) considera que o objetivo da educação é formar cidadãos, independente da sua concepção. Há de se considerar, portanto, que a construção do sujeito se dá a partir de uma determinada realidade social, do seu contexto de vida. Portanto, a educação não é um ato isolado, onde uma dificuldade de aprender possa ser vista apenas e unicamente como resultado de processos cognitivos individuais. Aprender ler e escrever vai muito além, pois envolve a socioafetividade na relação professor/aluno, a escolha dos conteúdos, a metodologia e a forma de avaliação (FÁVERO; CALSA, 2013). A partir desta visão e das observações feitas durante as atividades no Programa de Iniciação à docência - PIBID, Subprojeto de Pedagogia, na escola em questão, haja vista, a constatação de crianças do 4º e 5º ano, já reprovadas que não sabem ler e nem escrever, surgiram inquietações que levaram aos questionamentos: Qual a percepção dos professores em relação ao atraso da leitura e escrita das crianças? Que concepção considera para resolver este atraso? O que justificou esta abordagem, cujos objetivos foram investigar a percepção dos professores sobre o atraso na escrita e leitura dos alunos e destacar a concepção dos professores para melhorar este atraso. 2 | DESENVOLVIMENTO No sentido amplo a escola pode ser considerada um espaço público ou privado destinado ao ensino coletivo e que possui características funcionais que as diferenciam entre si, embora com objetivo comum de promover a educação. Para Formiga, Sá e Barros (2012), a educação em uma perspectiva mais tradicional é a transmissão de saberes, cabendo ao educando assimilar estes saberes. De um modo geral, segundo Brasil (2001) o objetivo da educação é formar cidadãos, independente da sua concepção. Contudo, não se pode afirmar que os professores reconheçam a sua função no contexto atual de educador, razão pela qual ainda se perceba enraizados no ensino tradicional, o que nem sempre se pode atribuir a responsabilidade unicamente sobre o professor, num país de política do descaso com a educação. Neste sentido, Silva (2013), considera que para que haja aprendizagem, o ser humano precisa estar em condições de fazer um investimento pessoal em direção ao conhecimento, ligado aos recursos pessoais mesclados às possibilidades socioafetivos, portanto, são condições inerentes a quem busca aprender e a quem A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 26 270 se dedica a ensinar. Portanto, a prática educativa, seja ela na educação básica ou superior, não é um fenômeno unidimensional. Isso é tão importante que no campo das abordagens e nela estão presentes as dimensões técnica, cognitiva, social, política, cultural, humana e emocional. Por outro lado, segundo Freire (1996) os saberes necessários à prática docente exigem, além dos conhecimentos do campo científico da formação do docente, rigorosidade metódica, curiosidade epistemológica, pesquisa constante, reflexão crítica sobre sua prática, bom senso, humildade, tolerância, empatia e instrumental técnico. Daí se acredita que o desempenho do professor, sobretudo com as crianças no inicio da aprendizagem possa se apresentar mais gratificante e com melhores resultados. 3 | METODOLOGIA Pesquisa de campo, com abordagem qualitativa, que conforme Minayo (2010) se trata de abordagem que responde a questões muito particulares e se ocupa, nas Ciências Sociais, com um nível de realidade que não pode ou não deveria ser quantificada e assim, trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes. Para análise, fundamentou-se na proposta da análise de conteúdo de Bardin, descrita como uma técnica de análise das comunicações, do que foi dito nas entrevistas ou observado pelo pesquisador como citado por Mozzato e Grzybovski (2011). Foram envolvidas 4 professoras dos anos iniciais do ensino fundamental de uma escola pública municipal, localizada na periferia do município, onde se realiza atividades do Programa de Iniciação à Docência (PIBID), no Eixo “Monitoria”. A exclusão foi do 4º ano devido à recusa da professora em participar. Para tanto, buscou-se dados de informações sobre a turma como número de alunos na turma, reprovados, quantos não sabem ler e escrever isolados e agrupados de não saber ler e escrever e se há crianças diagnosticadas com dificuldade de aprendizagem. Além disso, foram feitas as seguintes questões norteadoras: Na sua percepção, a que atribui o atraso na leitura e escrita das crianças e qual a concepção para melhorar este atraso? As questões foram entregues às professoras que responderam e devolveram, após assinatura do Termo de Consentimento Livre e esclarecido (TCLE) e das explicações dos objetivos da pesquisa, e visando garantir o anonimato dos atores envolvidos designou-se usando nomes de pedras preciosas. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 26 271 4 | RESULTADOS E DISCUSSÕES Diante da análise dos dados, os resultados apresentaram o total de alunos nas 4 turmas de110, sendo 1 turma com 27 alunos, outra com 33 e 2 outras com 25 alunos cada uma. Na fase de questões específicas sobre as turmas, considerou-se que um mesmo aluno pode constar em mais de um dos itens, o que pode ser observado nos números apresentados em relação a não saber ler, escrever ou ambos, Do total de alunos, 9 possuíam reprovações, 15 não sabiam ler, 80 não sabiam escrever e 68 não sabiam ler e escrever tendo 9 alunos com diagnóstico de déficit de atenção. Em termos percentuais, observa-se que 68 (61,8 %) dos alunos não sabem ler e escrever, o que denota preocupação, principalmente que dos 68 alunos, 30 (44,1%) se encontram no 3º e 5º ano, onde o esperado é que uma criança que frequenta a escola desde o 1º ano já tenha certo grau de aprendizagem da leitura e da escrita. Conhecer estes aspectos foi relevante, pelo muito que se tem escutado em diversos cenários, que as turmas são superlotadas e que esta seria uma das razões pela qual os professores não conseguem ter domínio da turma, tanto no sentido da disciplina, como também na condução de práticas mais estimuladoras para prender a atenção da criança, ou despertar o interesse das mesmas. Assim como a presença de crianças com dificuldade de aprendizagem (DA). Considerando a DA, Fávero e Calsa (2013) diz que requer se pensar considerando a Teoria das Representações Sociais para vislumbrar a possibilidade de transformação e modificação de práticas sociais, por meio da análise de práticas cotidianas escolares. Na percepção dos professores as principais causas do atraso na leitura e na escrita das crianças foram devido a: Falta de ajuda da família, precisamos trabalhar também os pais que são muito desinteressados. (Ametista) É o não acompanhamento dos pais e a falta de atenção dos mesmos. (Diamante) A família por não acompanhar a criança em suas atividades que vai para casa, sem falar nas reuniões que eles não participam. (Esmeralda) Ausência da família na escola e no acompanhamento das atividades, a indisciplina e superlotação de alunos na sala de aula. (Rubi) Em se tratando da concepção dos professores para melhorar o atraso na aprendizagem da leitura e escrita foi destacada que: Na verdade, não são as crianças que devem ser reprovadas não,...quem tem que ser reprovado são os pais...os professores fazem a parte deles e os pais não fazem. (Ametista) Trabalhar os aspectos da leitura e da escrita com ações planejadas com uso de fichas de leitura, alfabeto móvel, jogos e com a ajuda dos pais. (Diamante) A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 26 272 Para mim, a maior dificuldade é a falta de interesse do próprio aluno, deviam se interessar. (Esmeralda) A escola deve levar mais a sério as dificuldades dos alunos e propor e propor mais ações voltadas para a leitura e desenvolver projetos para amenizar a indisciplina e até capacitação para os professores. (Rubi) Observa-se que a maioria dos professores centrou as responsabilidades nos pais, na família e pouco se considerou fundamental nas tomadas de decisões. Embora de fato este seja um fator contributivo importante. Considerando este aspecto, conhecer alguns aspectos da formação do contexto familiar da criança seria significativo, pois conforme Vieira et al. (2015), não há mais um padrão de família, e sim uma variedade de padrão familiar, com identidade própria em constante desenvolvimento, o que requer do professor conhecer a realidade familiar onde o aluno está inserido, conhecer quais são os anseios, angustias e necessidades vivenciadas pelos alunos, pois assim poderá compreender o por que das dificuldades demonstradas no processo da aprendizagem de modo geral. Para Freire (1983) alfabetizar é adquirir a prática da escrita pelo processo de construção do conhecimento, tendo uma visão crítica da realidade, para a conquista da cidadania. Portanto, não representa apenas conhecer os grafemas e fonemas, mais dá significado às coisas do seu cotidiano, independente do método ou recursos e o lúdico deve fazer parte deste contexto. 5 | CONCLUSÃO Diante dos resultados analisados, concluiu-se que na percepção dos professores a dificuldade de aprendizagem dos alunos está relacionada principalmente à ausência dos pais no acompanhamento da vida escolar da criança, seguido da indisciplina e a da superlotação das turmas. E que a concepção para melhora ou resolver estas dificuldades seria a ajuda dos pais, do interesse do aluno e da escola em proporcionar melhores condições para os professores. Praticamente, o professor se excluiu do contexto da responsabilidade do atraso da leitura e aprendizagem dos alunos, pois somente uma professora mencionou que o professor deve propor ações voltadas para a leitura e desenvolver projetos. Recomendam-se outros estudos para consolidar estes resultados e fomentar ações educacionais nas escolas sensibilizando os professores como atores responsáveis pelo processo e subsidiar o poder público na melhoria educacional no município. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 26 273 REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Educação e Cultura (MEC). Diretrizes Nacionais para a educação especial na educação básica. Secretaria de Educação Especial-MEC; SEESP, 2001. Disponível em: http:// portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/diretrizes.pdf. Acesso em: 03 de maio de 2017. FÁVERO, Maria Teresa Martins; CALSA, Geiva Carolina. Dificuldades de Aprendizagem? Seminário de Pesquisa do PPE. Universidade Estadual de Maringá 12 a 14 de Junho de 2013. Disponível em: www.ppe.uem.br/dissertacoes/2005-Maria_Teresa.pdf. Acesso em: 04 de maio de 2017. FORMIGA, Nilton; SÁ, Gerônimo; BARROS, Sebastiana. As causas da evasão escolar? Um estudo descritivo em jovens brasileiros. 2011. Disponível em: www.unitau.br/unindu/artigos/pdf525.pdf. Acesso em: 12 de maio de 2017. FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 13. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: Saberes necessários à prática educativa. (1996). MINAYO, M.C.S. (org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 29. ed. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 2010. (Coleção temas sociais). MOZZATO, A. R.; GRYBOVSKI, D. Análise de conteúdo como técnica de análise de dados qualitativos no campo da administração: potencial e desafios. RAC, Curitiba, v. 15, n. 4, pp. 731-747, Jul./Ago. 2011. SILVA, Maria J; PAES, da; CASTRO, Freitas; ALIL, de R. (2001). Influências do Comportamento Comunicativo verbal e não verbal do docente em sala de aula: visão dos alunos e docentes de enfermagem. Enfermería Global, Nº 3 Noviembre, 2003. Disponível em: www.un.es/eglobal. Acesso em: 02 de maio de 2017. VIEIRA, Madalena Rodrigues. 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A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 26 274 CAPÍTULO 27 doi PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO PARTICIPATIVO (PEP) SOB A PERCEPÇÃO DISCENTE QUANTO AOS OBJETIVOS ESTRATÉGICOS VALIDADOS EM UMA INSTITUIÇÃO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR Data de aceite: 06/01/2020 Marinalva Pereira dos Santos Universidade do Estado de Mato Grosso, Campus de Diamantino Diamantino – MT Solange Teresinha Carvalho Pissolato Universidade do Estado de Mato Grosso, Campus de Diamantino Diamantino – MT Silvana Mara Lente Universidade do Estado de Mato Grosso, Campus de Diamantino Diamantino – MT Vania de Oliveira Silva Universidade do Estado de Mato Grosso, Campus de Sinop Sinop – MT Elisangela de Oliveira Silva Ministério Público Estadual, Cáceres Cáceres – MT Odenise Jara Gomes Secretaria Municipal de Educação de Cáceres, Supervisão Pedagógica Cáceres-MT Elivania Toledo Rodrigues Universidade do Estado de Mato Grosso, Faculdade de Ciências da Saúde, Departamento de Medicina Cáceres – MT RESUMO: O objetivo do estudo consiste em verificar a partir da percepção dos discentes se o PEP 2015/2025 vigente para todos os Câmpus, se atende as necessidades regionais na área de abrangência do Campus Universitário Francisco Ferreira Mendes, instituição objeto de pesquisa. Para tanto foi desenvolvido um estudo qualitativo descritivo, a partir de levantamento de dados por meio de Escala Likert para que os discentes acentuassem quanto ao grau de importância dos objetivos validados. Os resultados demonstraram que o planejamento participativo foi de suma importância para a construção do plano de desenvolvimento da instituição, pois, demonstra a importância da participação de toda comunidade acadêmica nas decisões de interesse da universidade. Para os resultados alcançados com a escala obtevese que os acadêmicos compreendem em partes que os objetivos validados como relevantes para o campus onde estão matriculados. Dado a diversidade cultural, ambiental e condição multicampi da instituição em estudo onde alguns campi estão em processo estruturação inicial e outros se consolidando em qualidade de ensino, pesquisa, extensão e inovação tecnológica, os objetivos passam a serem diferentes. Neste sentido é compreensível que na percepção dos acadêmicos participantes do estudo apontem alguns objetivos validados no PEP 2015-2025 como não importantes ou de A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 27 275 importância relativa. Embora seja inegável o papel do planejamento participativo na garantia dos interesses da comunidade acadêmica. INTRODUÇÃO Segundo o informativo com os princípios bases para iniciar o PEP 2015-2025 (UNEMAT, 2015) em longo prazo “é possível alcançar o fortalecimento institucional com: i. Melhoria de qualidade dos bseus serviços; ii. Maior competência na realização do seu mandato legal; iii. Mais efetividade em suas atividades; iv. Ampliação da unidade institucional ou diminuição da “fragmentação” (os diferentes atores, partes interessadas, percebem que o pacto e instrumentos articuladores do planejamento estratégico é mais benéfico a todos do que às partes); v. Aperfeiçoamento nas decisões gerenciais (tático-operacionais), com mais objetividade das decisões presentes e seus alcances futuros; vi. Maior fortalecimento político (maior base social, mais respeitabilidade externa, reforçando sua “legitimidade como bem social”). Assim, investigar a percepção dos discentes em relação aos objetivos estratégicos validados no Planejamento Estratégico Participativo (PEP) da Universidade do Estado de Mato Grosso (2015-2025) se tornou elementar. Principalmente pela importância do Planejamento Estratégico, recentemente validado na Unemat, e a preocupação em relação ao Campus de Diamantino que por ser um campus ainda em estruturação e em processo de legalização tem uma realidade diferenciada dos demais campus da universidade, logo, muitos objetivos validados podem não atender ou não atendem diretamente as necessidades imediatas. Para Toni (2008, p. 85) “todo planejamento exige racionalidade e flexibilidade. Há de se considerar as necessidades de adequação dos meios e das estratégias em prol dos objetivos traçados, considerando que cada variável pode interferir positiva ou negativamente no final dos processos”. Uma das vertentes do planejamento é o Planejamento Participativo, que se desenvolveu paralelamente ao planejamento estratégico. Neste contexto, discussões sobre as dimensões destacadas no planejamento da instituição reportam a conscientes reflexões quanto ao papel da universidade e a obrigatoriedade de um plano estratégico que garanta o alcance dos objetivos e metas propostos, que passeiam deste a atuação docente até a infraestrutura e inovação tecnológica. Considerando o ensino como processo de aprender para criar e fazer, é necessário ter em vista o resultado dessa aprendizagem no desempenho das próprias organizações. Pensar a teoria e prática de maneira fragmentada e independente tem resultado em formação deficiente, ou seja, gerando profissionais com dificuldade de aplicar os conhecimentos adquiridos na Universidade no exercício da gestão administrativa. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 27 276 É necessário que o professor crie alternativas e métodos para inovar suas aulas. O discente consegue digerir melhor quando o conteúdo é transmitido de forma diferente e com interação seja com vídeos, seminários, músicas e/ou materiais de apoio relacionados ao tema, e não quando o conteúdo é passado de forma monótona e sem motivação. O profissional da educação também deve estar atento que as classes é objeto de constante investigação e reflexão para o professor, se este estiver atento a dinâmica do ambiente, saberá que precisa ser modificado ou reelaborado sempre que necessário e de acordo com as necessidades dos discentes ou do conteúdo em destaque. Não se trata de fazer de cada acadêmico um pesquisador profissional, mas um profissional pesquisador, quer dizer, que sabe manejar as virtudes metodológicas e sobretudo pedagógicas da pesquisa. Para renovar adequadamente os reptos profissionais num mercado escorregadio e submetido a processos violentes e geralmente muito dúbios de inovação, é 10 fundamental saber reconstruir a proposta profissional. Segundo Fonseca (2003, p. 43) “diversificar as fontes utilizadas em sala de aula tem ido o grande desafio dos professores na atualidade”, por isso é essencial adequar o professor às inovações tecnológicas e que o mesmo possa utilizar toda esta informação em suas aulas. É fundamental que a universidade adote dinâmicas, acompanhe e incentive mudanças em função das suas necessidades e de seus objetivos, se constituindo como uma instituição. Nota-se no diz respeito a qualificação do quadro de docente é muito importante, pois vem a promover a interdisciplinaridade no desenvolvimento de projetos de ensino, pesquisa e extensão relevantes a sociedade nas diversas áreas do conhecimento. Onde capacitar, qualificar e atualizar o professor pedagogicamente vem contribuir com a didática do mesmo em sala de aula. No entanto, de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) em seu artigo 52 diz “pelo menos 1/3 do quadro de docentes necessitam ter o título de mestrado ou doutorado para que a instituição seja reconhecida como universidade, e estes em regime integral”. Os conteúdos se consomem no tempo, enquanto a habilidade de saber pensar necessita manter-se viva, mais que nunca. Se não sabe pesquisar, não sabe questionar. Não sabendo questionar, não sabe ultrapassar os impasses inevitáveis que toda profissão encontra em sua prática. Assim, o mais importante hoje na pesquisa não é o manejo de instrumentos metodológicos, mas o manejo dos desafios inovadores e por vezes surpreendentes da vida. Saber pensar é ótimo para o mercado, mas é ainda mais essencial para a vida (DEMO, 2000). Destaca-se ainda que “[...] à medida que interagem com seus ambientes, as organizações absorvem informações, transformam-nas em conhecimento e agem com base numa combinação desse conhecimento com suas experiências, valores e A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 27 277 regras internas. ” (DAVENPORT; PRUSAK, 1998, p.1). Bem como, o uso dos recursos tecnológicos como meio facilitador do processo de aprendizagem e veiculação das informações, tem como principal objetivo o desenvolvimento educacional. Permitem uma nova linguagem para enfrentar a metodologia dos professores em relação aos processos de ensinar e aprender, dando maior ênfase, a capacidade de aprender, novas habilidades, de assimilar novos conceitos, de avaliar novas situações, exercitando a criatividade. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Trata-se de um estudo qualitativo que segundo Menga apud Marconi e Lakatos (1986, p. 18) é aquele que se: “[...] desenvolve numa situação natural: é rico em dados descritivos, tem um plano aberto e flexível e focaliza a realidade de forma complexa e contextualizada. ” O qual se desenvolveu por meio de levantamento documental, bibliográfico e de campo tendo como população e amostra do estudo o que se segue na tabela 01: Discentes População Amostra Curso de Direito 439 120 Curso de Administração 274 96 Curso de Enfermagem 240 80 Curso de Educação Física 210 52 Tabela 1. População 1.163 discentes e amostra 348 discentes Fonte: Elaborado pela autora (2017) Neste sentido, foram levantados dados por meio de registro documental, a saber o PEP-UNEMAT 2015-2025, dados estes correspondentes aos objetivos validados, os quais subsidiaram a construção da Escala Likert utilizada para a aferição de valores quanto a importância de cada objetivo para a realidade loco regional do Campus de Diamantino. Destaca-se ainda a utilização do método hermenêutico e da análise de conteúdo, método utilizado em vários momentos da análise dos dados coletados tendo como instrumento principal de análise o Relatório Final do PEP 2015/2025, onde foram validados os objetivos estratégicos pela UNEMAT para os 13 Campus que compõem a instituição seguido dos resultados apresentados na coleta dos dados. RESULTADOS E DISCUSSÕES Os resultados foram alcançados com a aplicação do questionário com Escala A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 27 278 Likert como instrumentos para coletas de dados para conhecer a percepção dos discentes a respeito dos indicadores: discente, docente, Ensino e currículo, gestão, infraestrutura, e, tecnologia e inovação. PRAZO CURTO MÉDIO LONGO DIMENSÃO: DISCENTE VALOR ATRIBUIDO IM I MI Melhorar a Assistência Estudantil 41 102 205 Definir ações de combate à evasão 191 97 60 101 161 Potencializar a relação teoria x prática 76 86 186 Fortalecer políticas de nivelamento dos calouros 130 138 80 Fortalecer as políticas de ingresso, permanência, conclusão NI IR 86 Estimular a convivência e lazer nos Câmpus Aprimorar as formas de ingresso 49 98 120 81 Aprimorar práticas construtivas na formação do profissional 87 205 46 10 Consolidar a participação em projetos sobre a interação entre o ser humano e o ambiente. 38 39 98 173 Criar estruturas de atendimento aos universitários. 13 30 102 203 Quadro 1. Dimensão discente - objetivos estratégicos validados LEGENDA: (NI) Não Importante; (IR) Importância Relativa; (IM) Importância Média; (I) Importante e (MI) Muito Importante. Fonte: Própria autora (2017). Totalizaram trezentos e quarenta e oito (348) discentes respondentes. Os resultados como demonstrado no Quadro 01 apontaram pontos relevantes a serem analisados: Os acadêmicos têm plena convicção que políticas estratégicas quanto a melhoria da assistência estudantil e relação entre teoria e prática são Muito Importante, seguida da necessidade de definição de ações de combate à evasão considerando de Importância Média. Percebe-se que há uma compreensão quanto ao papel da universidade em assistir os acadêmicos por meio de novas formas de acesso e garantia de permanência, vendo como ponto frágil a evasão acadêmica. Estes resultados vêm ao encontro do apontado por Costa (2013) quanto à gestão pública que deve primar pela redução dos gargalos na educação superior, incluindo a qualidade acadêmica, o que engloba o ingresso e permanência no curso, exigindo assim políticas de assistência estudantil acirradas. Fica claro que os próprios acadêmicos relatam a importância dos objetivos validados. Incluindo aqui os resultados alcançados para médio prazo, quanto ao nivelamento dos acadêmicos assinalaram ser importante (138) bem como as formas de ingressos. Para os discentes é de importância média (205) as práticas de formação profissional e muito importante (203) e (173) respectivamente o atendimento ao universitário e ações envolvendo o homem e a natureza. Já dizia Meister (1999) A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 27 279 sobre a tendência da universidade em ampliar a capacidade de formação profissional, inclusive frente processo competitivo que atingiu as instituições de educação superior. Quanto a dimensão docente, os acadêmicos sinalizaram em sua maioria concordância quanto aos objetivos validados no PEP Unemat 2015-2025, observe o quadro 2: DIMENSÃO DOCENTE VALOR ATRIBUIDO PRAZO NI IR IM I MI Aprimorar desenvolvimento de práticas construtivas formação do profissional. 10 20 181 98 39 Consolidar participação em projetos entre o ser humano e o ambiente. 20 02 140 46 120 Criar estruturas de atendimento aos universitários 03 21 23 98 223 02 124 91 131 09 39 191 100 02 20 138 198 Capacitação contínua pedagógica para todos os professores CURTO Aprimorar mecanismo de avaliação docente. 18 Dar condições de trabalho adequadas ao corpo docente universitário. MÉDIO LONGO Regulamentação dos professores atuando em cargo de Gestão. 193 80 69 06 Regulamentar a relação entre os docentes da UNEMAT e a sociedade 113 71 97 48 15 Ampliar o quadro de docentes efetivos. 06 07 89 104 146 Promover a interdisciplinaridade no desenvolvimento de projetos 70 90 19 71 98 Aumentar a participação em conselhos externos. 198 60 31 59 0 Capacitar, qualificar e atualizar pedagogicamente os docentes. 02 30 18 86 212 Promover a divulgação das ações de ensino, de pesquisa e de extensão 07 71 89 181 Garantir a qualificação profissional 04 136 112 96 Criar fóruns de políticas públicas - referência regional, nacional e internacional 203 91 54 Desenvolver políticas de parceria público-público e ou público-privado. 39 49 181 69 86 73 110 49 Consolidar a interlocução da formação inicial com a educação básica 30 Quadro 2. Dimensão docente - objetivos estratégicos validados LEGENDA: (NI) Não Importante; (IR) Importância Relativa; (IM) Importância Média; (I) Importante e (MI) Muito Importante. Fonte: PEP UNEMAT 2015-2025, organizado pela autora, 2017. O quadro 2, num panorama geral entre os objetivos de curto, médio e longo prazo fica demonstrado que sete (7) objetivos foram destacados pelos acadêmicos como muito importante com destaque no atendimento aos universitários (223), condições de trabalho docente (198) e divulgação das ações de ensino, pesquisa e extensão (181). Prosseguem os acadêmicos valorizando a articulação em prol do A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 27 280 corpo discente tanto para acolhimento como para garantia de profissionais habilitados para atuarem como corpo docente. Esta preocupação Davenport e Prusak (1998) já assinalava quando afirma que a organização precisa interagis com seu ambiente. Esta é uma oportunidade de absorvem informações transformando-as em valores. Na compreensão dos discentes foram destacadas três (3) importância média a saber para busca de práticas construtivas na formação profissional (181), projetos articulados com o meio ambiente (140) e garantia de qualificação docente (136). Estes pontos são de extrema relevância em qualquer realidade acadêmica. Agora, em um (1) objetivo os discentes assinalaram de importância relativa, o que se fere a fóruns de políticas públicas (203). Cabe ainda destacar que para os discentes três (3) objetivos não são importantes; que correspondem às regulamentações e participação em conselhos externos. Vale acrescentar por Fonseca (2003) que aos docentes recai um grande desafio na atualidade, inclusive é fundamental que a universidade adote dinâmicas para atender interesses dos alunos. No campo da dimensão ensino e currículo, seguem no quadro 03 os resultados alcançados: VALORES ATRIBUIDOS PRAZO DIMENSÃO: ENSINO E CURRÍCULO NI CURTO IR IM I MI Qualificação e capacitação do quadro docente 55 102 102 89 Direcionar esforços para consolidar os cursos existentes 130 86 103 29 Otimizar o sistema de créditos para facilitar a conclusão do curso pelo aluno 49 17 151 131 39 96 102 101 139 186 23 Propor alterações da estrutura curricular - resolução de deficiência educacional no ingresso 10 Promover a inovação curricular MÉDIO Flexibilizar o currículo respeitando a interdisciplinaridade e a acreditação das disciplinas - inserção de práticas metodológicas inovadoras e a consolidação das políticas de inclusão. 86 39 131 92 Inserção e uso de tecnologias de ponta previstas em PPC do curso que viabilizem disciplinas 102 31 98 117 86 06 156 85 92 92 204 102 43 Adequação dos espaços para convivência teórico-prático fora do ambiente da sala de aula. Ser excelência na qualidade do ensino em áreas estratégicas definidas pela UNEMAT LONGO 79 Consolidar o ensino de graduação-implementação de pósgraduação nos campus/faculdades. Tornar-se referência no oferecimento de cursos nas modalidades diferenciadas. Quadro 3. Dimensão: Ensino e currículo - objetivos estratégicos validados LEGENDA: (NI) Não Importante; (IR) Importância Relativa; (IM) Importância Média; (I) Importante e (MI) Muito Importante. Fonte: PEP UNEMAT 2015-2025, organizado pela autora, 2017. Dos objetivos destacados no quadro 3, num total de três (3) foram considerados A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 27 281 pelos acadêmicos como muito importante para o Campus de Diamantino, os quais estão ligados a espaços teórico prático (156), inserção de tecnologias (117) e busca de excelência de ensino (92). Tudo se reporta a fomentar a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, a ciência, o pensamento, a arte e o saber; fomentar o pluralismo de ideias nas concepções pedagógicas, científicas, tecnológicas, culturais, artísticas e esportivas e valorização do pessoal técnicoadministrativo e docente. Destaca-se ainda seis (6) objetivos considerados pelos acadêmicos importantes para o campus que correspondem qualificação profissional (102), inovação curricular (186), sistema de crédito (151), consolidação da graduação com a pós-graduação (204). Para todos os objetivos destacados há uma emergente necessidade de serem desenvolvidos no campus o que possivelmente levaria a troca de médio e longo prazo para curto prazo. Seria interessante também que o próprio Campus Universitário oferecesse treinamento ou mesmo formação continuada para estes docentes contratados, qualificá-los para ministrar suas aulas com qualidade, e saber utilizar dos recursos disponível na universidade a seu favor. Possibilitar maior acesso a programas de pós-graduação entre instituições parceiras, incentivar a troca de saberes entre culturas, estender os relacionamentos da Universidade com outras Instituições de Ensino. Evidenciar o protagonismo da sociedade em concomitância com a comunidade acadêmica e desenvolver ações que favoreçam a efetividade da integração da universidade pública com a sociedade é uma das preocupações da gestão, observe o quadro 4: VALORES ATRIBUIDOS PRAZO DIMENSÃO: GESTÃO NI CURTO IR IM I MI Capacitar os gestores 25 101 131 91 Revisar/Criar normas e procedimentos que regulamentam a Unemat, reduzindo burocracia 38 140 91 79 Proporcionar maior acessibilidade às informações. 45 101 203 Incentivar a inovação tecnológica. 108 96 144 Fortalecer a imagem e os canais de comunicação da Instituição; 90 36 114 108 Estabelecer políticas para garantir a qualidade no ensino, pesquisa e extensão nos cursos já existentes. 02 107 36 203 41 96 201 13 8 101 90 96 98 36 5 Ampliar gestão participativa e inovadora, buscar efetivamente o saneamento de problemas e primar pela excelências das ações por meio do Planejamento Estratégico Participativo. Promover políticas de inserção da comunidade na Unemat e da Unemat na comunidade. Proporcionar maior autonomia e participação. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 41 Capítulo 27 282 MÉDIO Fortalecer as atividades das políticas de planejamento institucional. 34 198 61 36 Intensificar a comunicação com o governo do estado. 41 38 139 161 Estabelecer uma política de preservação do meio ambiente. 31 42 40 201 Buscar alternativas de fomento. 191 86 71 198 105 38 Desenvolver Política de Sustentabilidade da UNEMAT. 15 198 98 23 Implementar Setores Recursos Tecnológicos e incentivar as iniciativas de criação de novas tecnologias. 161 101 60 26 Aprimoramento dos projetos: atuar em consonância com os anseios diretos da comunidade onde está inserida, promovendo a participação da comunidade acadêmica LONGO 06 Quadro 4. Dimensão: gestão - objetivos estratégicos validados LEGENDA: (NI) Não Importante; (IR) Importância Relativa; (IM) Importância Média; (I) Importante e (MI) Muito Importante. Fonte: PEP UNEMAT 2015-2025, organizado pela autora, 2017. Para a dimensão gestão, como observado no quadro 4 acima, os acadêmicos assinalaram seis (6) como muito importante para o campus abrangendo objetivos voltados para acessibilidade às informações e políticas de garantia (203); preservação do meio ambiente e gestão participativa e inovadora (201), articulação com governo (161) e inovação tecnológica (144). Os demais variam entre importantes, de importância média e importância relativa. O ambiente educacional não pode ser visto apenas como uma realidade isolada como se fosse uma cabine fechada, deve ser um ambiente com uma visão sistêmica como um todo, segundo Moraes (1997) o que é feito na sala de aula não deve ser feito para a sala de aula, mas para a vida. Assim, os objetivos destacados pelos acadêmicos como importante estão diretamente relacionados a responsabilidade da gestão para a garantia desta formação integral do profissional egresso. Ao que se apresenta os acadêmicos destacaram objetivos que reforçam uma gestão participativa inovadora com foco no resultado e na responsabilidade social, não sendo diferente para todos campus da universidade. Com vista a contribuir para qualidade do ensino e serviços, fomentação de projetos de pesquisa e extensão e implantação de cursos de pós-graduação. O que vem ao encontro do argumento apresentado por Demo (2000) quando trata dos desafios inovadores e que por vezes são essenciais não apenas para o mercado e sim para a vida. No tocante a dimensão infraestrutura os resultados apontaram uma variação marcante inclusive com apontamentos de serem objetivos não importantes e importância relativa, observe o quadro 5: A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 27 283 VALORES ATRIBUIDOS PRAZO DIMENSÃO: INFRAESTRUTURA I MI 71 139 120 18 90 113 Descartar resíduos de forma correta e contínua 39 131 191 31 Elaborar plano para construção, estruturação e manutenção para atender ensino, pesquisa, extensão, cultura e gestão. 09 131 91 117 Dar manutenção imediata (TI) para atender as demandas de sistemas e comunicações -IES NI IR IM 13 86 196 18 Disponibilizar acesso à internet com eficiência em todo os ambientes da UNEMAT. Otimizar as políticas de TI CURTO 127 Aprimorar o controle e a divulgação do parque patrimonial de equipamentos 201 55 70 25 Estabelecer política de depreciação, reposição e atualização de bens móveis. 09 131 91 198 03 Ter sistema de controle, gestão e serviços acadêmicos - interface padronizada e descentralizado 111 135 51 49 03 Adquirir e dar manutenção de equipamentos de informática e servidores de dados. 05 10 86 130 126 Ter áreas experimentais para aulas de campo 61 107 131 36 Adequar o sistema de saneamento básico, rede elétrica e de drenagem dos campus 201 39 70 26 Disponibilizar casa do estudante e restaurante universitário 235 15 103 Melhorar a área de estacionamento dos campus 205 111 32 191 120 Adquirir os livros da bibliografia básica de novos cursos antes de sua implantação. MÉDIO LONGO 38 Aplicar um plano de segurança para os 13 câmpus. 161 145 42 Ampliar os auditórios para eventos que envolvem a comunidade acadêmica e sociedade. 31 12 68 248 Implementar gestão da frota interna. 36 71 131 86 Ter instalada rede de fibra óptica interligando todos os câmpus e estar consolidada a política de expansão dos serviços e centros de dados de cada câmpus, integrando a UNEMAT com a RNP - Rede Nacional de Pesquisa 12 49 39 240 Ter amplos espaços - infraestrutura (planejamento arquitetônico moderno e sustentável) 09 13 79 231 13 39 112 96 Consolidar os espaços adequados nos câmpus para a prática de artes em cursos e em eventos culturais abertos à comunidade. 49 Quadro 5. Dimensão: Infraestrutura - objetivos estratégicos validados LEGENDA: (NI) Não Importante; (IR) Importância Relativa; (IM) Importância Média; (I) importante e (MI) Muito Importante. Fonte: PEP UNEMAT 2015-2025, organizado pela autora, 2017. Quanto a dimensão infraestrutura os resultados apontam que os acadêmicos percebem muito importante a ampliação de auditórios (248), instalação de rede de fibra óptica (240) e espaços arquitetônicos modernos e sustentáveis (231). Como importante descarte correto de resíduos (191), política de uso bens móveis (198), eficiência no acesso à internet (139), área experimentais e gestão de frota (131), e, A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 27 284 manutenção de equipamentos (130). Destaca-se como não importante controle de parque patrimonial (201), políticas de TI (127); seguido de cinco (5) objetivos elencados como de importância relativa a saber casa do estudante e restaurante universitário (235), estacionamento (205) e estrutura básica de saneamento (201) dentre outros. Tem-se que o planejamento estratégico como descreve Toni (2008) deve ser flexível e racional, assim acredita-se que este ponto possa ser aplicado no contexto do campus caso seja manifestação de toda comunidade acadêmica, para que seja possível flexibilizar os objetivos que não são prioridades para o campus. Em um contexto planejado e em comum a comunidade identifica e prioriza os problemas, formula estratégias concretas de seu enfrentamento e encontra caminhos alternativos e propostas de negociação, onde a organização do grupo é a estratégia para os dois passos anteriores. Sendo passível também de adequações e reformulação. VALORES ATRIBUIDOS PRAZO DIMENSÃO: INOVAÇÃO TECNOLÓGICA NI IR IM I 113 91 93 49 91 89 Agências de fomento, comunidade acadêmica e iniciativa privada. 23 39 201 71 Fortalecer as estruturas que garantem a inovação tecnológica 31 121 131 96 05 139 90 103 79 13 12 69 193 19 13 186 96 13 49 36 98 49 81 18 81 39 19 190 09 97 91 102 31 Fortalecer as políticas de incentivo à inovação tecnológica no currículo. 12 Propor Políticas de incentivo a pesquisa e investimento em inovações tecnológicas, com a participação do governo, CURTO Otimizar as políticas de TI, visando o aprimoramento, atualização, PRAZO qualificação e usabilidade dos recursos. Inserir a UNEMAT nas ações do NIT no Parque Tecnológico Criar e disponibilizar ferramentas para a melhoria do ensino a distância da UNEMAT Ampliar a pesquisa com vistas ao desenvolvimento científico, tecnológico e de inovação no estado de MT. Consolidar recursos, parcerias e políticas de pesquisas para novas tecnologias Consolidar políticas de incentivo para pesquisas de inovação 39 MI MÉDIO tecnológica nos diversos cursos PRAZO Estimular políticas de incentivo à parceria público-privado 02 210 35 98 Ter políticas de TI consolidadas. 192 18 120 25 79 39 49 91 89 87 205 46 10 10 201 98 39 126 131 61 Estreitar o relacionamento institucional com setores, apresentar seus produtos e identificar potencialidades tecnológicas e humanas Fomentar plano de política pública estadual de inovação tecnológica e polos tecnológicos. LONGO PRAZO Garantir propostas inovadoras para as ações governamentais. Propor e acompanhar políticas de incentivo à pesquisa, criando fundos próprios para este fim. 21 Quadro 6. Dimensão: Tecnologia e inovação - objetivos estratégicos validados LEGENDA: (NI) Não Importante; (IR) Importância Relativa; (IM) Importância Média; (I) importante e (MI) Muito A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 27 285 Importante. Fonte: PEP UNEMAT 2015-2025, organizado pela autora, 2017. Quanto a dimensão e inovação tecnológica destacam-se como de relevância para o campus segundo os discentes apenas dois (2) objetivos muito importantes; NIT no Parque Tecnológico (193) e, Recursos para novas tecnologias (190). Os demais se mesclam entre importante, importância média, relativo e não importante. Cabe destacar em linhas gerais que no processo de gestão institucional da universidade pública, a partir da constituição de 1988, os antigos métodos paternalistas e autoritário de tomada de decisão foram substituídos pelas práticas e métodos democráticos e participativos, em que a comunidade acadêmica visualiza de forma transparente e toma iniciativas por meio de grupos de múltiplas atuações dentro da universidade. Esse processo é um reconhecimento de que a comunidade tem direito de participar ativamente no processo de construção do Planejamento Estratégico Participativo. CONSIDERAÇÕES FINAIS O Planejamento Estratégico existe com o objetivo de propor ações planejadas, onde a gestão é menos subjetiva, integrada e apresenta menos conflitos, sempre objetivando os interesses da Universidade pública. E neste caso, na Universidade do Estado de Mato Grosso, demonstra a importância da participação de toda comunidade acadêmica nas decisões de interesse da universidade. Sabe-se que o PEP da instituição foi construído com a participação de toda comunidade acadêmica acontecendo com marcantes seminários de discussões e debates para se aparelhar um modelo ideal de planejamento para a instituição. Porém, pontos como os elencados neste estudo, como é o caso do campus de Diamantino, diverge dos demais campus consolidados da universidade. Assim compreende-se que os objetivos para um campus em efetivação e estruturação são diferentes de um campus consolidado. Neste sentido é compreensível que na percepção dos acadêmicos participantes do estudo apontem alguns objetivos validados no PEP 2015-2025 como não importantes ou de importância relativa. Embora seja inegável o papel do planejamento participativo na garantia dos interesses da comunidade acadêmica. REFERÊNCIAS BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei número 9394, 20 de dezembro de 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ leis/L9394.htm>. Acesso em: 17 mar. 2017. COSTA, J. S. Cor em movimento: um estudo de caso sobre a vida do projeto pré-vestibular gerido A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 27 286 pela UNEMAT no município de Cáceres-MT. 2013. 163f. Dissertação (Mestrado em Educação). – Universidade Federal de Mato Grosso, Instituto de Educação, Cuiabá, 2013. DAVENPORT, T. H., PRUSAK, L. Conhecimento empresarial. Rio de Janeiro: Campus, 1998. DEMO, P. Conhecer & aprender: sabedoria dos limites e desafios. Porto Alegre: Artmed, 2000a. FONSECA, S. G. Didática e prática de ensino de história. 11.ed. Campinas, SP: Papirus, 2003. LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. A. Fundamentos metodologia científica. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2011. MASSETTO, M. T. Didática: A aula como centro. São Paulo: FTD, 1997. MEISTER, J. C. Educação corporativa. São Paulo: Makron Books, 1999. MELLO, G. N. de. Formação inicial de professores para a educação básica: uma (re) visão radical. 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Data de aceite: 06/01/2020 Leonarlley Rodrigo Silva Barbosa Mestre em Ensino na Educação Básica pela Universidade Federal de Goiás/UFG, especialista em Educação para a Diversidade e Cidadania pela UFG e graduado em Pedagogia pela mesma instituição. Professor da Rede Municipal de Ensino de Goiânia – GO. Maria Alice de Sousa Carvalho Rocha Professora Adjunta da Universidade Federal de Goiás do Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada à Educação, Goiânia – GO. RESUMO: Este trabalho vincula-se à pesquisa Arte, psicanálise e educação: os procedimentos estéticos do cinema e as vicissitudes da infância (UFG/PUC Goiás e UEG), que tem como proposta principal problematizar questões sobre linguagem e sujeito. Assim, este relato tem como objetivo discutir o ensino de língua portuguesa nos anos iniciais da Educação Básica. Inicialmente, procura-se problematizar a relação ensino e língua, a partir da observação de práticas docentes no encaminhamento das atividades de leitura e escrita, desenvolvidas em sala de aula. Na sequência, apresenta-se uma diferenciação entre informação e experiência. Para terminar, o texto traz produções escritas, realizadas por alunos em sala de aula, com o foco voltado para o uso da palavra. PALAVRAS-CHAVE: Língua Portuguesa. Ensino. Linguagem. WHAT IS WRITTEN FOR IN SCHOOL? ABSTRACT: This work is linked to the research Arte, psicanálise e educação: os procedimentos estéticos do cinema e as vicissitudes da infância (UFG / PUC Goiás and UEG), which main purpose is to explore matters regarding language and the subject. Thus, this report aims to discuss Portuguese language teaching in the early years of Basic Education. Initially, we seek to problematize the relation between teaching and language from the observation of teaching practices concerning reading and writing activities developed in the classroom. Subsequently, a differentiation between information and experience is established. At last, the text features written productions made by students in class, focussing on the use of the word as experience and creation. KEYWORDS: Teaching. Language. Portuguese Language. 1 | INTRODUÇÃO Aula de Língua Portuguesa. As crianças entram na sala de aula e se sentam. A professora solicita o livro didático da disciplina, indica a página e orienta a atividade a ser A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 28 288 desenvolvida. As crianças cumprem a tarefa. A professora, no quadro-giz, corrige e depois passa de carteira em carteira dando visto no caderno. As crianças guardam os materiais na mochila e aguardam o momento de ir para casa. O sino bate e, alegres, elas saem. Essa rotina descreve o que se passa em muitas aulas de Língua Portuguesa. Foi esse o cotidiano que encontramos ao acompanhar e observar as aulas dessa disciplina em algumas das escolas públicas por onde passamos. Embora saibamos que existem muitas outras práticas escolares diferenciadas, notamos o quanto esta, que foi relatada anteriormente, se repete. Esse tipo de prática merece ser problematizada, afinal, para que se escreve na escola? Que concepções de sujeito, de linguagem e de língua sustentam esse tipo de vivência? Ela promoveria uma experiência de escrita? Seria capaz de favorecer a criatividade e a produção de sentidos? São essas questões que procuraremos discutir neste texto, utilizando como ilustração algumas atividades realizadas pelos alunos do Ensino Fundamental da Educação Básica, publicados no site Folhinha Aplicada que é um Projeto de Extensão realizado no Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada à Educação da Universidade Federal de Goiás sob a coordenação da Profa. Maria Alice de Sousa Carvalho Rocha e do qual sou membro efetivo. Site: www.folhinhaaplicada.com (ISSN 2595-0576). 2 | INFORMAÇÃO NÃO É EXPERIÊNCIA Vivemos em um mundo que valoriza as informações e não as experiências, como bem observa Larrosa (2002) no artigo Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Nesse texto, o autor relembra Walter Benjamim que, já no início do século XX, denunciava um movimento de declínio da experiência. Segundo Larrosa (2002), esse movimento, do qual fala Benjamim, tem ganhado mais espaço em nossa sociedade moderna, principalmente por ter o capital como força motivadora. Fazer o mundo girar em torno desse bem incentiva práticas educativas que priorizam seus imperativos, como, por exemplo, a produção de mercadorias, o consumismo, a informação, o excesso de trabalho e o pouco tempo. Isso porque o que interessa é um sujeito que atenda às demandas, sempre atualizadas, do capital. Segundo ele, nessa sociedade, o sujeito: Além de ser um sujeito informado que opina, além de estar permanentemente agitado e em movimento, é um ser que trabalha, quer dizer, que pretende conformar o mundo, tanto o mundo “natural” quanto o mundo “social” e “humano”, tanto a “natureza externa” quanto à “natureza interna”, segundo seu saber, seu poder e sua vontade. [...] é animado por portentosa mescla de otimismo, de progressismo e de agressividade: crê que pode fazer tudo o que se propõe (se hoje não pode, algum dia poderá) e para isso não duvida em destruir tudo o que percebe como um obstáculo à sua onipotência. (LARROSA, 2002, p. 24, aspas do autor) A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 28 289 Assim, não nos causa surpresa a rotina das aulas de Língua Portuguesa que observamos. Tanto que as políticas educacionais em formas de leis e/ou documentos incentivam esse tipo de prática, pois, como observa Neves (2005), desde a década de 1990, o Brasil serve-se do modelo econômico hegemônico neoliberal para implementar os processos pedagógicos ocorridos na escola. Exemplo disso é o documento intitulado Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (PCNLP), que serve como referência para os projetos de ensino dessa área nas escolas brasileiras. Muitos estudos, entre eles o de Rocha e Rodrigues (2016), apontam a ênfase no estudo da Língua Portuguesa pelo viés pragmatista, que apenas explora conteúdos informacionais e habilidades de competência “no sentido de conhecer e aplicar os distintos usos da língua por meio de exercícios de metacognição e/ou metalinguagem” (ROCHA; RODRIGUES, 2016, p.4). Além disso, Alcântara e Stieg (2016), ao discutirem a última versão da proposta de estabelecimento de uma Base Nacional Comum Curricular (BNCC), observam esse mesmo direcionamento. A BNCC foi encaminhada recentemente para o Conselho Nacional de Educação tomar as devidas providências. Entretanto, segundo a análise dos autores, em relação ao componente curricular de Língua Portuguesa, há ainda uma ênfase no caráter instrumental da língua. Segundo eles, o modelo curricular, apresentado até agora, tem como objetivo principal facilitar as avaliações oficiais do governo a fim de atingir a meta prevista para 2021 (média 6,0 no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – Ideb). De certa forma, tanto nos documentos oficiais quanto nas práticas, o trabalho com a Língua Portuguesa enfatiza conteúdos isolados, privilegia normas linguísticas em detrimento de uma experiência de linguagem. São muitos textos apresentados, uma grande variedade de exercícios, mas aplicados em função de informar e em explorar aspectos menores da língua. Esse procedimento sugerido, e muitas vezes alimentado, produz um tipo de sujeito, o da informação e, como diz Larrosa: O sujeito da informação sabe muitas coisas, passa seu tempo buscando informação, o que mais o preocupa é não ter bastante informação; cada vez sabe mais, cada vez está melhor informado, porém, com essa obsessão pela informação e pelo saber (mas saber não no sentido de “sabedoria”, mas no sentido de “estar informado”), o que consegue é que nada lhe aconteça. (LARROSA, 2002, p. 21-22) Se a escola prioriza conteúdos e treinamentos a fim de atender às exigências políticas, que têm uma visão mais imediatista do processo educacional, não se constitui um leitor e nem um escritor. O professor fica impedido de fazer um trabalho diferenciado por ter que cumprir a matriz curricular, em função de que seu aluno será avaliado segundo o que ela recomenda. Verificamos que a maioria dos sujeitos que passam pela escola, depois de anos nesse tipo de ensino, não leem e não escrevem, não usam a palavra com toda a potencialidade que ela tem. Essa é a consequência A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 28 290 de um ensino voltado apenas para a informação. O que vimos, nessas aulas, não afeta o sujeito, pois as informações que ele obteve não o fazem relacioná-las com suas experiências e nem produzir outras. De acordo com Larrosa (2002), o sujeito da experiência é aquele que está aberto para aprender, para buscar e para experenciar a palavra. A palavra diz o mundo, mas também o produz. Assim, a linguagem não é apenas um sistema abstrato e um mero meio de comunicação que permitiria o acesso e a interação social. Ela é mais que isso, ela constitui nossa subjetividade. Segundo Larrosa (2002): E isto não significa que o homem tenha a palavra ou a linguagem como uma coisa, ou uma faculdade, ou uma ferramenta, mas que o homem é palavra, que o homem é enquanto palavra, que todo humano tem a ver com a palavra, se dá em palavra, está tecido de palavras, que o modo de viver próprio desse vivente, que é o homem, se dá na palavra e como palavra. (LARROSA, 2002, p. 21) Na infância, a brincadeira tem esse papel. Quando uma criança brinca, ela reordena as impressões que adquiriu, reelaborando-as e constituindo uma experiência. Sobre isso, Rodari (1982) explica: A brincadeira, o jogo, não é uma simples recordação de impressões vividas; mas uma reelaboração criativa delas, um processo pelo qual a criança combina entre si os dados da experiência no sentido de construir uma nova realidade, correspondente às suas curiosidades e necessidades. Todavia, exatamente porque a imaginação trabalha apenas com materiais colhidos na realidade (e por isso pode ser maior no adulto), é preciso que a criança, para nutrir sua imaginação e aplicá-la em atividades adequadas que lhe reforçam as estruturas e alongam os horizontes, possa crescer em um ambiente de impulsos e estímulos, em todas as direções. (RODARI, 1982, p. 162-163) Como observa o autor, a criança precisa explorar sua imaginação e, para que isso ocorra, o ambiente em que vive deve possibilitar essa condição, a do brincar (RODARI, 1982). A inserção no mundo da escrita não deve ser diferente, pois muitos leitores e escritores testemunham e validam essa mesma condição ao lerem e escreverem. A escola não poderia favorecer essa experiência? O ensino da língua escrita com enfoque na alteridade não promoveria a subjetividade? Por que não usar a palavra para constituir experiências, incentivar a imaginação e a criação? 3 | A PALAVRA É NOSSA A seguir, iremos apresentar propostas realizadas pelos alunos que ilustram essa possibilidade de ensino de Língua Portuguesa numa perspectiva de constituir experiência. Isto é, contribuir para que o aluno use a palavra de modo transformador. São atividades para “considerar as palavras, criticar as palavras, eleger as palavras, cuidar das palavras, inventar palavras, jogar com as palavras, impor palavras, proibir A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 28 291 palavras, transformar palavras etc.” (LARROSA, 2002, p. 21). Estas atividades, além de serem feitas na sala de aula, foram publicadas no Jornal Folhinha Aplicada, um periódico mensal da Primeira Fase do Ensino Fundamental, do Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada à Educação da Universidade Federal de Goiás (Cepae/UFG). Esse jornal também objetiva promover experiências ao publicar as produções variadas dos alunos, que são organizadas como as editorias de um jornal como outro qualquer que circula na sociedade. Além desse objetivo, ele incentiva e promove situações discursivas em que as particularidades de um texto – as fronteiras, o acabamento, o tema, o dizer do locutor, o autor, o destinatário, a expressividade e as formas de estruturação, são elementos relacionados, dependentes do movimento de construção textual. (SOUZA, CARVALHO, MOTA, BARBOSA, COSTA, 2014, p. 59) A primeira foi realizada com uma turma de segundo ano, da primeira fase da Educação Básica. A professora selecionou uma música bastante conhecida pelos alunos e depois de lerem, cantarem, comentarem sobre o uso das comparações que compõem sua letra, solicitou que eles escrevessem outras comparações. A música era “Fico assim sem você”, composição de Abdullah e Cacá Moraes, interpretada por Adriana Calcanhoto, regravada também por Claudinho e Buchecha. Sua letra: Avião sem asa Fogueira sem brasa Sou eu assim, sem você Futebol sem bola Piu-Piu sem Frajola Sou eu assim, sem você Por que é que tem que ser assim? Se o meu desejo não tem fim Eu te quero a todo instante Nem mil autofalantes Vão poder falar por mim Amor sem beijinho Buchecha sem Claudinho Sou eu assim sem você Circo sem palhaço Namoro sem abraço Sou eu assim sem você Tô louco pra te ver chegar Tô louco pra te ter nas mãos Deitar no teu abraço Retomar o pedaço Que falta no meu coração Eu não existo longe de você E a solidão é o meu pior castigo Eu conto as horas pra poder te ver Mas o relógio tá de mal comigo A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 28 292 Por quê? Por quê? Neném sem chupeta Romeu sem Julieta Sou eu assim, sem você Carro sem estrada Queijo sem goiabada Sou eu assim, sem você Por que é que tem que ser assim? Se o meu desejo não tem fim Eu te quero a todo instante Nem mil autofalantes Vão poder falar por mim Eu não existo longe de você E a solidão é o meu pior castigo Eu conto as horas pra poder te ver Mas o relógio tá de mal comigo Eu não existo longe de você E a solidão é o meu pior castigo Eu conto as horas pra poder te ver Mas o relógio tá de mal comigo A seguir, o resultado dessa atividade: FOLHINHA APLICADA, Vol. 3 Nº 04, Fevereiro/2012, p. 02. Disponível em: <https://docs. wixstatic.com/ugd/fbf895_e59aa9b4486a4ee2b5ef489413d7ed2f.pdf> A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 28 293 Como se pode observar, os alunos conseguiram apresentar um número bem razoável de comparações. De acordo com a professora, alguns alunos disputavam quem tinha conseguido escrever mais. Outra atividade que gerou bastante interesse e exigiu também associações diversas dos alunos, foi uma proposta adaptada do livro de Rodari (1982), chamada de Tema Fantástico que consiste em criar, a partir de uma palavra, frases criativas. Nessa atividade, é preciso escrever as letras uma sobre as outras e, ao lado de cada letra, escrever palavras que formem uma frase com sentido ou nonsense. Os alunos do segundo ciclo criaram a partir dos seus nomes próprios. As composições elaboradas e publicadas foram as seguintes: FOLHINHA APLICADA, Vol. 8 Nº 31, Maio/2017, p. 04. Disponível em: <https://docs.wixstatic. com/ugd/fbf895_00854bf3fe4a474b94f29633bce9f73a.pdf > A última atividade foi realizada após uma imersão em histórias fantásticas. Durante algum tempo, os alunos leram, observaram a construções dos personagens dessas histórias, seus conflitos e suas soluções. Por fim, escreveram as suas narrativas: A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 28 294 FOLHINHA APLICADA, Vol. 4 Nº 11, Janeiro/2013, p. 03. Disponível em: <https://docs.wixstatic. com/ugd/fbf895_f75c58e11df74e9cab4ed4bb29a99ed1.pdf > Como se pode notar, as crianças conseguiram apresentar narrativas incorporando vários aspectos trabalhados a partir das histórias lidas, inclusive apresentando outros personagens, como o do Super-Herói das histórias em quadrinhos. Veja que o repertório textual delas transitou por outros gêneros textuais, apresentando intertextualidades. 4 | CONSIDERAÇÕES FINAIS O intuito de apresentar este trabalho é mostrar que a escrita pode ser trabalhada na escola para favorecer a subjetividade, isto é, permitir que o aluno possa explorar a língua de maneira criativa e transformadora. Dessa forma, estaremos contribuindo para a constituição de experiências e não apenas transmitindo informações. A preocupação da escola com a transmissão de conteúdos, em função das avaliações, A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 28 295 exclui a participação do aluno. Assim, suas experiências não são exploradas e ele nem é convidado a construir outras potencializando sua imaginação e criatividade. Rodari (1982, p. 160) já dizia que “não é, portanto, de admirar que a imaginação nas nossas escolas ainda seja tratada como parente pobre, em desvantagem com a atenção e com a memória”. Concordamos com Rodari quando ele expõe que, para haver uma mudança na sociedade, é preciso de homens capazes de criar, que saibam usar a sua imaginação em todos os espaços sociais. Se uma sociedade baseada no mito da produtividade (e na realidade do lucro) precisa de homens pela metade – fiéis executores, diligentes reprodutores, dóceis instrumentos sem vontade própria – é sinal de que está malfeita, é sinal de que é preciso mudá-la. Para mudá-la, são necessários homens criativos, que saibam usar a sua imaginação. (RODARI, 1982, p. 163) Esses exemplos, embora simples, oferecem possibilidades para que o aluno tome a palavra, não como uma ferramenta qualquer, mas como promotora de experiência e criação. Mesmo que ele ainda não apresente um repertório grande de informações sobre a língua constituída em sua escrita, podemos ver que o aluno a tece e esperamos que não a abandone. Será convocando os alunos para trabalhar com a língua de modo a explorar sua potência criativa que o professor estará contribuindo para favorecer a experiência e a transformação. REFERÊNCIAS ALCÂNTARA, Regina Godinho; STIEG, Vanildo. “O que quer” a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) no Brasil: o componente curricular língua portuguesa em questão. Revista Brasileira de Alfabetização – ABAlf. Vitória, ES, v. 1, n. 3, p. 119-141, jan./jul. 2016. FOLHINHA APLICADA. Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada à Educação da Universidade Federal de Goiás (Cepae/UFG). Goiânia. Disponível em: (www.folhinhaaplicada.com). LARROSA, Jorge. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Tradução de Wanderley Geraldi. In: Revista Brasileira de Educação, n.19, p. 20-28, jan./abr., 2002. NEVES, L. M. W. (org.). A Nova Pedagogia da Hegemonia: estratégias do capital para educar o consenso. São Paulo: Xamã, 2005. ROCHA, Maria Alice de Sousa Carvalho; RODRIGUES, Sônia Maria. Língua Portuguesa na Educação Básica: instrumentalização ou alteridade? (mimeo) Apresentado no VIII Congresso da Cátedra da Unesco de Leitura e Escrita em San Jose, Costa Rica, 2016. RODARI, Giani. Gramática da Fantasia. Tradução de Antonio Negrini; direção da coleção de Fanny Abramovich. São Paulo: Summus, 1982. SOUZA, Andrea Alves da Silva Souza; CARVALHO, Maria Alice de Sousa; MOTA, Telma Maria Santos Faria Mota; BARBOSA, Leonarlley Rodrigo Silva; COSTA, Sônia Santana da. Jornal na escola: um exercício para pensar o mundo. In: Veredas Escolares: partilhando experiências criativas de ensino e aprendizagem do Cepae/UFG – 1ª ed. Goiânia: Gráfica e Editora América, 2014. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 28 296 CAPÍTULO 29 doi PRÁTICAS DE EDUCAÇÃO EM SAÚDE PARA A FORMAÇÃO INTEGRAL DE DISCENTES DOS CURSOS TÉCNICOS INTEGRADOS DO INSTITUTO FEDERAL FARROUPILHA CAMPUS JAGUARI Data de aceite: 06/01/2020 Fernanda Lavarda Ramos de Souza Odontóloga do Instituto Federal Farroupilha – Campus Jaguari, Discente do Curso de Mestrado Profissional em Educação Profissional e Tecnológica - Polo IFFAR Jaguari - Rio Grande do Sul Ricardo Antonio Rodrigues Docente do Instituto Federal Farroupilha – Campus Jaguari, Coordenador do Curso de Mestrado Profissional em Educação Profissional e Tecnológica - Polo IFFAR Jaguari - Rio Grande do Sul RESUMO: Mais que um direito fundamental, a saúde é essencial para a efetivação dos outros direitos. A atenção integral em saúde é imprescindível para a promoção de saúde e bem-estar. Dentro deste contexto, encontramos a educação em saúde, que pode construir vínculos entre o contexto de saúde e as atitudes do indivíduo. A escola é ambiente de contínuas relações sociais e troca de saberes. Neste sentido, a visão holística é estratégia valiosa para que, aliado aos valores e experiências de cada um, sejam trabalhados assuntos relevantes de bem-estar que influenciem no autocuidado, qualidade de vida e, consequentemente, na formação escolar. Este artigo tem por objetivo problematizar a educação profissional para que ela seja emancipatória, voltada para a formação integral dos discentes, omnilateral. Através da reflexão sobre as bases legais e conceituais sobre o serviço/setor de saúde do Instituto Federal Farroupilha campus Jaguari, há o propósito de ponderarmos sobre as ações no tocante aos seus resultados para a práxis, visando a problematização dos pensares e fazeres. O sentido e papel do serviço nos Institutos Federais devem ser compreendidos à luz da educação omnilateral. A intenção do trabalho da equipe multidisciplinar é fomentar práticas interdisciplinares que atendam a especificidade de uma formação integral e integradora entre os saberes e as pessoas. Na EPT, o serviço visa contribuir para a permanência e o êxito dos discentes. Através de um trabalho pautado na multidisciplinaridade e interdisciplinaridade, é possível oferecer ferramentas para uma formação integral, não somente em nível acadêmico, mas também uma formação humana plena. PALAVRAS-CHAVE: educação em saúde; educação profissional; trabalho multidisciplinar; ensino integrado. HEALTH EDUCATION PRACTICES FOR INTEGRAL TRAINING OF INTEGRATED TECHNICAL COURSES OF THE INSTITUTO FEDERAL FARROUPILHA CAMPUS JAGUARI A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 29 297 ABSTRACT: More than a fundamental right, health is essential for the realization of other rights. Comprehensive health care is essential for health promotion and wellbeing. Within this context, we find health education, which can build links between the health context and the individual's attitudes. The school is an environment of continuous social relations and knowledge exchange. In this sense, the holistic vision is a valuable strategy so that, allied to the values and experiences of each one, relevant issues of well-being that influence self-care, quality of life and, consequently, school education are addressed. This article aims to problematize professional education so that it is emancipatory, focused on the integral formation of students, omnilateral. Through reflection on the legal and conceptual bases on the health service / sector of the Instituto Federal Farroupilha campus Jaguari, there is the purpose of pondering on the actions regarding their results for praxis, aiming at problematizing the thoughts and doings. The meaning and role of service in Federal Institutes must be understood in the light of omnilateral education. The intention of the work of the multidisciplinary team is to foster interdisciplinary practices that meet the specificity of an integral and integrative education between knowledge and people. At EPT, the service aims to contribute to the permanence and success of students. Through a work based on multidisciplinarity and interdisciplinarity, it is possible to offer tools for an integral formation, not only at the academic level, but also a full human formation. KEYWORDS: Health education; professional education; multidisciplinary work; integrated teaching. 1 | INTRODUÇÃO Mais que um direito fundamental, a saúde é essencial para a efetivação dos outros direitos. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS, 1984) é “a extensão na qual um indivíduo ou grupo conseguem compreender suas aspirações e satisfazer suas necessidades, sendo vista como um recurso para vida cotidiana”. Este conceito demonstra a estreita relação da mesma com a qualidade de vida. Além das práticas clínicas e curativas, a atenção integral em saúde é imprescindível para a promoção de saúde e bem-estar. Dentro deste contexto, encontramos a educação em saúde, que agrega conhecimentos tanto da área da educação, quanto da área da saúde, e pode construir vínculos entre o contexto de saúde e as atitudes do indivíduo. Com ela, espera-se conscientizar as pessoas no tocante aos cuidados e aspectos de saúde, bem como refletir sobre a realidade. É definida pelo Ministério da Saúde (2004) como “[...] ações que objetivam a apropriação do conhecimento sobre o processo saúde–doença, incluindo fatores de risco e de proteção à saúde bucal, assim como a possibilidade de o usuário mudar hábitos, apoiando-o na conquista de sua autonomia.” A escola é ambiente de contínuas relações sociais e troca de saberes. Neste sentido, a visão holística é estratégia valiosa para que, aliado aos valores e A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 29 298 experiências de cada um, sejam trabalhados assuntos relevantes de bem-estar que influenciem no autocuidado, qualidade de vida e, consequentemente, na formação escolar. No âmbito dos Institutos Federais, cada campus possui uma equipe de Assistência Estudantil, que de forma multidisciplinar e articulada com os demais setores da Instituição, trata de assuntos relacionados ao acesso, permanência, êxito e participação dos estudantes na instituição. Esta equipe engloba profissionais com formação na área de saúde, que, dentre suas diversas atribuições, devem propor sequências de ações atrativas que possam auxiliar no autocuidado e bem-estar dos discentes, tendo como o foco o trabalho preventivo. Neste sentido, devem encontrar meios de sensibilizar o educando quanto à importância da qualidade de vida para a formação acadêmica e profissional. Deste modo, este artigo tem por objetivo problematizar a educação profissional para que ela seja emancipatória, voltada para a formação integral dos discentes, omnilateral. Através da reflexão sobre as bases legais e conceituais sobre o serviço/ setor de saúde do Instituto Federal Farroupilha campus Jaguari, há o propósito de ponderarmos sobre as ações no tocante aos seus resultados para a práxis, visando a problematização dos pensares e fazeres. Por meio de estratégias de ensino, as equipes de saúde devem buscar instrumentos que possibilitem a compreensão dos discentes sobre sua condição no mundo e ampliação de suas capacidades para sua formação, para o mundo do trabalho e para a vida. Conforme Machado e colaboradores (2007), “para educar em saúde, se faz necessário estar aberto ao contorno geográfico, social, político, cultural do indivíduo, família e comunidade”. A prática da educação em saúde na escola constitui um espaço de reflexão e ação, apoiado em conhecimentos técnicos, científicos, populares e culturais, possibilitando mudanças no indivíduo e capacidade para atuar em suas famílias e comunidades, transformando o contexto social e marcando significativamente sua presença no mundo. 2 | DESENVOLVIMENTO E DEMONSTRAÇÃO DOS RESULTADOS O Instituto Federal Farroupilha promove a formação profissional, científica e tecnológica, com foco na formação integral do discente. Em suas estruturas administrativas conta com equipes de Assistência Estudantil, que compreendem profissionais com formação na área da saúde. Estas equipes trabalham de forma multi e interdisciplinar, de forma a apoiar a formação técnica e humana dos discentes dos campus. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 29 299 Uma política transversal, integrada e intersetorial, a qual faça dialogar as diversas áreas, setores e a sociedade, compondo redes de compromissos e corresponsabilidades quanto à qualidade de vida, em que todos sejam partícipes no cuidado com a saúde. (Política de Atenção à Saúde dos Discentes do IF Farroupilha, 2015) O sentido e papel do serviço ou setor de saúde nos Institutos Federais devem ser compreendido à luz da educação omnilateral. Não se trata de termos vários profissionais da área de saúde à disposição para as demandas interventivas e situações e intercorrências no campo da saúde, desconsiderando a dimensão do Ensino. Não se trata de uma Unidade Básica de Saúde ou unidade de Pronto Atendimento para atender as emergências. O serviço de saúde de um campus do Instituto Federal tem caráter formativo, preventivo e educativo, por excelência. O caráter multidisciplinar é para atender a missão de nossa instituição que é atender todas as dimensões de todos os sujeitos envolvidos no processo de aprendizagem. Embora não seja um serviço instituído aos servidores da educação, mas aos educandos, a proposta é indiretamente fomentar práticas educativas que auxiliem direta e indiretamente no acesso, na permanência e no êxito de nossos discentes. Multidisciplinar porque o ser humano é multifacetado, possui muitas demandas a serem atendidas e não apenas a cognitiva. O Ensino Integrado é holístico e deve tender para uma visão sistêmica e não cartesiana, como lemos, Atualmente, não se concebe uma Educação Profissional identificada como simples instrumento de política assistencialista ou linear ajustamento às demandas do mercado de trabalho, mas sim como importante estratégia para que os cidadãos tenham efetivo acesso às conquistas científicas e tecnológicas da sociedade. Impõese a superação do enfoque tradicional da formação profissional baseado apenas na preparação para execução de um determinado conjunto de tarefas a serem executadas. A Educação Profissional requer, além do domínio operacional de um determinado fazer, a compreensão global do processo produtivo, com a apreensão do saber tecnológico, a valorização da cultura do trabalho e a mobilização dos valores necessários à tomada de decisões no mundo do trabalho. (BRASIL, 2012) Como estamos falando do Currículo Integrado, a intenção do trabalho da equipe multidisciplinar é fomentar práticas interdisciplinares que atendam a especificidade de uma formação integral e integradora entre os saberes e as pessoas. A dimensão psíquica, a dimensão física, a dimensão afetiva, a dimensão cognitiva e um vasto leque de dimensões que fazem parte do ser humano e que precisam, de algum modo, ser consideradas no processo educativo. Diante da missão que temos enquanto instituição de Ensino, Art. 6º Os Institutos Federais têm por finalidades e características: I - ofertar educação profissional e tecnológica, em todos os seus níveis e modalidades, formando e qualificando cidadãos com vistas na atuação profissional A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 29 300 nos diversos setores da economia, com ênfase no desenvolvimento socioeconômico local, regional e nacional; II - desenvolver a educação profissional e tecnológica como processo educativo e investigativo de geração e adaptação de soluções técnicas e tecnológicas às demandas sociais e peculiaridades regionais; (BRASIL, 2008) É importante registrar que ao falarmos de Currículo Integrado, não visamos formar cartesianamente especialistas, mas cidadãos e cidadãs que compreendam e pratiquem o conhecimento científico de maneira articulada, conforme lemos: Art.2º- A educação profissional observará as seguintes premissas: I - organização, por áreas profissionais, em função da estrutura sócio-ocupacional e tecnológica; II - articulação de esforços das áreas da educação, do trabalho e emprego, e da ciência e tecnologia; III - a centralidade do trabalho como princípio educativo; e IV - a indissociabilidade entre teoria e prática (BRASIL, 2004). Não podemos negligenciar uma formação que atente e atenda para as muitas facetas e nuances do que somos enquanto humanos, e das condições que são necessárias para uma formação mínima e suficiente desta complexa cadeia. O desenvolvimento endógeno, sustentável do ponto de vista socioambiental e socioeconômico, não pode ser reduzido ao monetário e/ou a financeirização da vida. Precisamos dar conta da formação omnilateral de nossos educandos para não cairmos no reducionismo cartesiano, positivista, empirista e cientificista que decorrem justamente de uma visão frágil e fragmentada sobre o processo de ensino e aprendizagem. Nos Institutos Federais esse cuidado com o todo deve permear o nosso fazer, não apenas pensando os nossos estudantes como sujeitos que irão para a universidade, tirando assim, a identidade e a grandeza em si, do Currículo Integrado, precisamos pensar nossos discentes dentro da lógica da verticalização, da promoção do empoderamento dos sujeitos pelo conhecimento como potência de compreensão, interpretação, explicação e transformação social. Art. 6º - Os Institutos Federais têm por finalidades e características: III - promover a integração e a verticalização da educação básica à educação profissional e educação superior, otimizando a infra-estrutura física, os quadros de pessoal e os recursos de gestão; IV - orientar sua oferta formativa em benefício da consolidação e fortalecimento dos arranjos produtivos, sociais e culturais locais, identificados com base no mapeamento das potencialidades de desenvolvimento socioeconômico e cultural no âmbito de atuação do Instituto Federal; (BRASIL, 2008) Muitos de nossos discentes, embora adolescentes ainda, permanecem em nossa Instituição, fazem suas refeições e higiene pessoal, praticam exercícios, A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 29 301 estudam e pesquisam, envolvem-se em vários projetos durante os dias que ficam para as aulas, e é nesse contexto que precisam ser assistidos na perspectiva de uma formação ampla, interdisciplinar, multidisciplinar que atenda, de algum modo, as expectativas humanas e sociais do Ensino. Diante do que nos propomos a fazer como instituição de Ensino, está uma visão que seja integradora e integrante do ser humano, includente e transformadora. E isso não se trata de ideologia apenas, assim seria se colocássemos as necessidades reais das pessoas abaixo de crivos imaginários pautado na exclusão ou legitimação dela. Tratar da inteireza do ser humano é uma condição fundamental para o reconhecimento e a valorização do que somos enquanto seres racionais. O serviço de saúde em nossas unidades pretende atender justamente a concepção de que é o cuidado com as pessoas que permite uma sociedade melhor. Essa preocupação está na base, no cerne conceitual de nossa gênese teórica enquanto Instituição. Na proposta dos Institutos Federais, agregar à formação acadêmica a preparação para o trabalho (compreendendo-o em seu sentido histórico, mas sem deixar de firmar o seu sentido ontológico) e discutir os princípios das tecnologias a ele concernentes dão luz a elementos essenciais para a definição de um propósito específico para a estrutura curricular da educação profissional e tecnológica. O que se propõem é uma formação contextualizada, banhada de conhecimentos, princípios e valores que potencializam a ação humana na busca de caminhos de vida mais dignos. (PACHECO, 2011, p.15) Durante o ano letivo, são realizadas oficinas, rodas de conversa, projetos de ensino englobando temas como saúde geral, saúde bucal, nutrição e aspectos psicossociais, com foco na saúde do adolescente. Estas ações estão trazendo à luz resultados, embora provisórios, que indicam benefícios e necessidades. Podemos destacar a relevância de dispor de uma equipe de saúde, com estrutura física habilitada para acolhimentos, sendo um diferencial de outras instituições de ensino, que carecem deste olhar específico contínuo de prevenção e promoção de saúde durante o ano letivo. Além disso, o acompanhamento de saúde dos discentes por parte dos profissionais pode propiciar a frequente troca de saberes, que, embora não se configure garantia na melhoria e/ou manutenção dos hábitos de saúde, tem campo fértil para estas práticas. Ensinar não é apenas transmitir saberes e informações, é problematizar hábitos, é questionar convicções, é oportunizar reflexões teóricas e através de práticas educativas e pedagógicas que auxiliem o desenvolvimento pleno e íntegro de nossos discentes. O cuidado preventivo é a melhor forma de constituirmos cidadãos e cidadãs capazes de lutar por seus direitos, ao reconhecê-los como dimensão fundante da vida humana. O Currículo Integrado possibilita ao discente uma visão articulada entre os saberes dedutivos formais e o mundo da vida, visa conectar os A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 29 302 saberes existenciais e empíricos ao universo complexo e polissêmico do mundo do trabalho. O caráter inter e transdisciplinar nada mais são que princípios basilares da própria EPT, conforme observamos: Art. 6º - São princípios da Educação Profissional Técnica de Nível Médio: I - relação e articulação entre a formação desenvolvida no Ensino Médio e a preparação para o exercício das profissões técnicas, visando à formação integral do estudante; II - respeito aos valores estéticos, políticos e éticos da educação nacional, na perspectiva do desenvolvimento para a vida social e profissional; III - trabalho assumido como princípio educativo, tendo sua integração com a ciência, a tecnologia e a cultura como base da proposta político-pedagógica e do desenvolvimento curricular; IV - articulação da Educação Básica com a Educação Profissional e Tecnológica, na perspectiva da integração entre saberes específicos para a produção do conhecimento e a intervenção social, assumindo a pesquisa como princípio pedagógico; V - indissociabilidade entre educação e prática social, considerando-se a historicidade dos conhecimentos e dos sujeitos da aprendizagem; VI - indissociabilidade entre teoria e prática no processo de ensino-aprendizagem; VII - interdisciplinaridade assegurada no currículo e na prática pedagógica, visando à superação da fragmentação de conhecimentos e de segmentação da organização curricular; VIII - contextualização, flexibilidade e interdisciplinaridade na utilização de estratégias educacionais favoráveis à compreensão de significados e à integração entre a teoria e a vivência da prática profissional, envolvendo as múltiplas dimensões do eixo tecnológico do curso e das ciências e tecnologias a ele vinculadas; (BRASIL, 2012) Contudo, parece ser necessária uma construção de novos saberes, novas formas de pensar e agir, contribuindo para construção do ser omnilateral. É possível, hipoteticamente, atribuirmos esta carência principalmente no que tange à quantidade de discentes que participam das atividades, com número reduzido nos períodos de contraturno escolar. Além disso, embora haja o esforço coletivo em traçar caminhos para a adoção de hábitos saudáveis e qualidade de vida, com foco na formação integral, há de considerarmos os diversos fatores que podem influenciar o bemestar, como as questões familiares e sociais. A construção do processo educativo em saúde que atenda ao princípio da integralidade como eixo norteador das ações de saúde requer a participação ativa da população na leitura e reflexão crítica de sua realidade, das estruturas socioeconômicas como constituintes de acessos na busca por condições humanas dignas, como sujeito histórico e social, possuidor em sua dimensão holística de interfaces integradas e permeadas pelo processo autônomo das descobertas e inquietações frente ao modo de viver em sociedade exercendo sua cidadania. (Machado e colaboradores, 2007) A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 29 303 3 | CONCLUSÕES Diante das reflexões e ponderações de que tratamos neste artigo, percebemos que é importante retomar de modo reflexivo e cuidadoso a matriz legal e conceitual do setor de saúde e seu papel vinculado ao Ensino. Na EPT, esse serviço visa contribuir para a permanência e o êxito dos discentes, e essa função precisa ser compreendida dentro e diante de uma complexidade mínima. Há muitas práticas educativas dentro da EPT que não raramente se distanciam do sentido e papel dos Institutos Federais, por isso a retomada constante de nossa identidade institucional é uma necessidade e não uma ação isolada que atende especificidade desta ou daquela pesquisa. No contexto docente o Ensino no Currículo Integrado é um desafio enorme, sobretudo pela carência de formação inter e transdisciplinar nos diferentes percursos formativos das licenciaturas, que em boa parte dos casos, são apenas bacharelados disfarçados. Para uma atuação condizente no Currículo Integrado é necessário formação, convicção e boas escolhas por boas metodologias. Ao dizermos isso, queremos problematizar que para um profissional de saúde, os problemas são similares, tendo em vista que a tendência é a inserção do mundo do Ensino, não como alguém que possua uma experiência formativa inter e transdisciplinar. Um profissional de Enfermagem, de Medicina, de Nutrição, de Odontologia, de Psicologia, entre outros, dificilmente faz uma concurso para um Instituto Federal tendo presente tudo o que representa uma equipe de saúde, dentro de uma organização que visa a omnilateralidade. De modo praticamente ao docente o servidor Técnico-Administrativo em Educação que atua na saúde das unidades de ensino dos IFs faz um concurso para atuar como profissional daquela área específica, e o fato de ter que trabalhar multidisciplinarmente em prol do Ensino, por mais que seja algo facilmente apropriável do ponto de vista teórico, na práxis e na prática depende de muitos fatores. Não é automática a convicção de que um profissional de determinada área, como a Odontologia, deve ter o direcionamento para sua importância dentro da lógica do Ensino, e não apenas que tenha um gabinete odontológico dentro de um campus. A convicção de que tem-se que atuar em um campus específico, em prol do Ensino, não é a mesma coisa, nem de longe, de atuar num campo específico e determinado. Os profissionais da saúde podem incorrer no mesmo fator limitante, já enunciado em relação aos docentes de não terem em seu itinerário formativo a subjetivação de que sua função está para o Ensino, para um campus específico e não para um campo ou ramo específico da atividade humana. Por fim, conforme nos indicam os documentos sobre Permanência e Êxito (2012;2014;2015), sobretudo o de 2012, Conforme IF Farroupilha (2012, p. 3-4) a A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 29 304 Política de Assistência Estudantil do IF Farroupilha, tem como base conceitual a convicção de que precisamos: I - Promover o acesso e a permanência na perspectiva da inclusão social e democratização do ensino; IV - Contribuir para o enfrentamento das desigualdades sociais; V - Promover e ampliar a formação integral dos estudantes, estimulando e desenvolvendo a criatividade, a reflexão crítica, as atividades e os intercâmbios de caráter cultural, artístico, científico e tecnológico; VI - Preservar e difundir os valores éticos de liberdade, igualdade e democracia: VII - Interagir com a família dos estudantes, no intuito de qualificar o processo e os resultados da aprendizagem, estabelecendo relações de cooperação; VIII - Estimular a participação dos estudantes, através de suas representações, no processo de gestão democrática. (Política de Assistência Estudantil do IF Farroupilha, 2012) Assim, parece ser necessário o olhar contínuo na construção das práticas educativas, visando a construção do ser omnilateral. Novos saberes, novas formas de pensar e agir, em um processo integrador, includente e transformador do ser humano. São necessárias ações atrativas que contribuam na emancipação e tomada de consciência dos discentes, no tocante à importância do cuidado de si e do outro no seu processo educativo e qualidade de vida, considerando que todos precisam ser atendidos em todas as suas dimensões. Através de um trabalho pautado na multidisciplinaridade e interdisciplinaridade, é possível oferecer ferramentas para que o educando reflita e construa conhecimentos para uma formação integral, não somente em nível acadêmico, mas também uma formação humana plena. REFERÊNCIAS ANTUNES, Ricardo. Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a qualificação e a negação do trabalho. São Paulo: Boitempo, 1999. BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CEB nº 6, de 20 de setembro de 2012. Define Diretrizes Curriculares para a Educação Profissional. Brasília, 2012. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=11663-rceb006-12pdf&category_slug=setembro-2012-pdf&Itemid=30192> . Acesso em 01 nov. 2018. BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CEB nº 11, de 9 de maio de 2012. Trata das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional Técnica de Nível Médio. Brasília, 2012. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_ docman&view=download&alias=10804-pceb011-12-pdf&category_slug=maio-2012pdf&Itemid=30192> Acesso em 01 nov. 2018. BRASIL. Decreto nº 5.154, de 23 de julho de 2004. Regulamenta o § 2º do art. 36 e os arts. 39 a 41 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Brasília, 2004. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2004/ Decreto/D5154.htm>. Acesso 01 nov. 2018. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 29 305 BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, 1996. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ leis/l9394.htm. Acesso em 01 nov. 2018. BRASIL. Lei n. 11.892/2009, de 29 de Dezembro de 2008. Institui a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, cria os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Lei/ L11892.htm. Acesso 01 nov. 2018. BRASIL. MEC. SETEC. IFFARROUPILHA. Diagnóstico quantitativo e qualitativo das taxas de evasão, retenção e conclusão. Instituto Federal Farroupilha: 2015. BRASIL. MEC. SETEC. INSTITUTO FEDERAL FARROUPILHA. Resolução nº 12 de março de 2012. Aprova a Política de Assistência estudantil do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia. Disponível em: https://www.iffarroupilha.edu.br/regulamentos-e-legisla%C3%A7%C3%B5es/ resolu%C3%A7%C3%B5es/item/1330-resolu%C3%A7%C3%A3o-consup-n%C2%BA-12-2012pol%C3%ADtica-de-assist%C3%AAncia-estudantil. Acesso em 20 mar. 2019 BRASIL. MEC. SETEC. INSTITUTO FEDERAL FARROUPILHA. Resolução nº 178 de novembro de 2014. Aprova o Projeto de Programa de Permanência e Êxito dos Estudantes do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha. Glossary of terms used in Health for All series. Geneva, WHO, 1984 IF FARROUPILHA. Resolução CONSUP Nº 014/2015, de 16 de março de 2015. Aprova a Política de Atenção à Saúde dos Discentes do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha. Disponível em: https://www.iffarroupilha.edu.br/regulamentos-e-legisla%C3%A7%C3%B5es/ resolu%C3%A7%C3%B5es/item/1368-resolu%C3%A7%C3%A3o-consup-n%C2%BA-14-2015pol%C3%ADtica-de-aten%C3%A7%C3%A3o-%C3%A0-sa%C3%BAde-dos-discentes. Acesso em 29 de outubro de 2018. MACHADO, Maria de Fátima Antero Sousa et al. Integralidade, formação de saúde, educação em saúde e as propostas do SUS: uma revisão conceitual. Ciência & saúde coletiva, v. 12, p. 335-342, 2007. MINISTÉRIO DA SAÚDE, Diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal. Disponível em http:// bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_brasil_sorridente.htm. Acesso em: 03 de outubro de 2018. PACHECO, Eliezer. Institutos Federais. Uma revolução na educação profissional e tecnológica. Brasília: Fundação Santillana; São Paulo: Moderna, 2011. A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo 29 306 SOBRE A ORGANIZADORA Solange Aparecida de Souza Monteiro - Doutoranda em Educação Escolar. Mestra em Processos de Ensino, Gestão e Inovação pela Universidade de Araraquara - UNIARA (2018). Possui graduação em Pedagogia pela Faculdade de Educação, Ciências e Letras Urubupungá (1989). Possui Especialização em Metodologia do Ensino pela Faculdade de Educação, Ciências e Letras Urubupungá (1992). Trabalha como pedagoga do Instituto Federal de São Paulo (IFSP/Câmpus Araraquara-SP). Participa dos núcleos: - Núcleo de Gêneros e Sexualidade do IFSP (NUGS); -Núcleo de Apoio as Pessoas com Necessidades Educacionais Específicas (NAPNE), Membro da Equipe de Formação Continuada de Professores. Desenvolve sua pesquisa acadêmica na área de Educação, História da Educação Sexual, Sexualidade e em História e Cultura Africana, Afro-brasileira e Indígena e/ou Relações Étnico-raciais. Participa do Grupo de pesquisa - GESTELD - Grupo de Estudos em Educação, Sexualidade, Tecnologias, Linguagens e Discursos. Membro desde 2018 do Grupo de pesquisa "Núcleo de Estudos da Sexualidade - NUSEX" - https://www.fclar.unesp. br/#!/pesquisa/grupos-de-pesquisa/estudos-da-sexualidade/apresentacao A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Sobre a Organizadora 307 ÍNDICE REMISSIVO A Afetividade 28, 47, 51, 52, 54, 55, 57, 208, 268 Amazônia 110, 111, 112, 113, 118, 119 Aplicação 32, 36, 37, 40, 43, 58, 88, 96, 97, 100, 120, 121, 123, 124, 126, 128, 130, 145, 158, 179, 198, 199, 200, 201, 259, 261, 265, 266, 278 Aprendizagem 24, 28, 29, 30, 32, 33, 35, 36, 39, 40, 41, 42, 46, 48, 50, 52, 53, 54, 63, 70, 104, 105, 107, 109, 120, 121, 122, 123, 124, 125, 128, 129, 130, 140, 141, 143, 145, 146, 149, 152, 153, 154, 155, 156, 157, 161, 162, 163, 164, 165, 166, 167, 168, 169, 171, 175, 177, 178, 180, 182, 183, 184, 185, 186, 187, 189, 193, 195, 196, 197, 198, 199, 202, 207, 210, 214, 220, 221, 222, 228, 229, 230, 231, 232, 233, 236, 237, 238, 239, 244, 245, 246, 247, 248, 249, 251, 252, 253, 254, 255, 256, 260, 261, 262, 263, 264, 265, 267, 268, 269, 270, 271, 272, 273, 274, 276, 278, 296, 300, 301, 303, 305 Aprendizagem significativa 32, 40, 128, 154, 184, 186, 251, 252 C Caderno virtual 120, 121, 122, 123, 126, 127, 128, 129, 130 Competência de leitura e escrita 82 Concurso público 100, 102, 104 Contextualização 135, 140, 143, 145, 146, 148, 149, 176, 248, 303 Criança 2, 4, 5, 7, 16, 24, 25, 30, 47, 48, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 55, 64, 152, 153, 154, 155, 156, 157, 160, 161, 162, 163, 164, 165, 166, 185, 186, 187, 194, 201, 203, 259, 260, 261, 263, 264, 265, 269, 272, 273, 291 D Deficiência intelectual 152, 153, 154, 157, 158, 159, 162, 164, 165, 166, 167, 169 Deficiência visual 203, 204, 205, 207, 209, 210, 211, 212, 214, 215, 216, 217, 218, 219 Didática 53, 104, 105, 122, 167, 177, 196, 277, 287 Discurso de ódio 88, 97 E Educação a distância 104, 131, 170, 173, 181, 203, 218 Educação do campo 105, 109 Educação sensível 110, 111, 113, 116 Ensino de arte 132 Ensino médio 20, 21, 22, 23, 26, 29, 30, 31, 32, 35, 36, 41, 58, 97, 101, 102, 132, 133, 134, 136, 139, 141, 142, 143, 144, 147, 148, 149, 150, 228, 229, 230, 231, 244, 245, 247, 253, 255, 303 Ensino médio e superior 143 Ensino médio integrado 20, 21, 22, 23, 26, 29, 31, 97 Ensino-pesquisa-extensão 56, 58 Escrita 46, 47, 48, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 55, 70, 82, 83, 84, 125, 127, 171, 187, 207, 214, 231, 232, 268, 269, 270, 271, 272, 273, 288, 289, 291, 295, 296 A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo Índice Remissivo Índice Remissivo 308 Experiência 21, 22, 26, 27, 29, 30, 46, 48, 49, 65, 66, 68, 69, 70, 73, 74, 82, 104, 106, 108, 109, 115, 116, 118, 134, 136, 140, 141, 156, 158, 167, 182, 196, 198, 214, 218, 227, 232, 244, 252, 288, 289, 290, 291, 296, 304 F Feminino 9, 60, 110, 111, 112, 113, 114, 116, 118, 229 Formação 6, 9, 22, 23, 24, 31, 35, 41, 46, 47, 50, 55, 56, 63, 64, 65, 66, 67, 68, 71, 77, 87, 88, 98, 101, 102, 107, 109, 112, 120, 121, 122, 125, 126, 128, 129, 130, 132, 134, 136, 137, 140, 143, 144, 145, 146, 150, 162, 169, 170, 171, 172, 173, 174, 175, 176, 177, 178, 179, 180, 181, 182, 184, 194, 195, 196, 197, 199, 202, 222, 223, 227, 229, 230, 231, 233, 234, 239, 244, 246, 247, 249, 252, 253, 257, 261, 271, 273, 276, 279, 280, 281, 282, 283, 287, 297, 299, 300, 301, 302, 303, 304, 305, 306, 307 Formação docente 68, 71, 120, 126, 128, 130, 178, 180, 197 Formação pedagógica 120, 170, 173, 174, 175, 177, 178, 179, 180, 181 I Iemanjá 110, 111, 112, 113, 114, 116, 117, 118, 119 Inclusão digital 69, 70, 74, 203, 204, 205, 209, 210, 216, 217, 218, 219 Inclusão social 68, 69, 70, 81, 100, 203, 204, 205, 207, 208, 210, 216, 217, 219, 305 Intolerância 88, 90, 91, 97, 98, 99 Isomeria geométrica 32, 33, 34, 36, 40 J Jovens 20, 22, 23, 25, 27, 28, 29, 30, 139, 157, 161, 179, 180, 207, 222, 228, 229, 274 L Lei dos grandes números 43 Leitura 15, 26, 27, 37, 46, 47, 48, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 55, 70, 82, 83, 84, 85, 86, 87, 115, 117, 126, 132, 135, 139, 140, 141, 165, 169, 187, 200, 201, 207, 211, 220, 232, 268, 269, 270, 271, 272, 273, 288, 296, 303 Leitura extraclasse 82, 84, 85, 87 Letramento o digital 68 Liberdade de expressão 88, 89, 90, 95, 97, 98, 99 Licenciatura 35, 71, 72, 74, 81, 131, 170, 173, 174, 180, 181, 198, 235 Liga acadêmica 56, 57 Língua de sinais 120, 122, 125, 126 Lúdico 35, 40, 41, 63, 152, 153, 154, 155, 156, 157, 160, 161, 163, 164, 165, 166, 167, 168, 253, 273 M Matemática 42, 45, 68, 100, 102, 105, 106, 107, 108, 109, 133, 138, 139, 147, 150, 169, 173, 174, 203, 235, 237, 238, 239, 240, 241, 244, 257 Metodologias 32, 33, 36, 52, 53, 58, 64, 70, 143, 144, 145, 146, 147, 149, 152, 157, 167, 170, A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo Índice Remissivo Índice Remissivo 309 180, 202, 211, 220, 222, 230, 231, 232, 233, 234, 237, 238, 247, 260, 304 Mídia digital educativa 120, 123 P Palavras cruzadas 32, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 53 Poética oral 110, 111 Práticas de acolhimento 20, 23, 24, 27, 30 Probabilidade 43, 44, 45, 102, 108 Produção textual 20, 26, 82, 84, 85, 87 Programa mulheres mil 68, 75, 76, 78 R Recurso didático 32, 41, 122, 128, 166 Recurso metodológico 38, 152, 153, 165, 166 Recursos pedagógicos 198 S Sexualidade 1, 3, 4, 5, 7, 16, 17, 18, 56, 57, 58, 59, 61, 62, 63, 64, 65, 66, 67, 307 Significação 47, 50, 115, 235 Sujeito ativo 82, 162 T Tecnologias assistivas 203, 206, 215, 216 Tolerância 88, 89, 90, 91, 92, 93, 94, 95, 96, 97, 98, 99, 271 A Educação no Brasil e no Mundo: Avanços, Limites e Contradições 5 Capítulo Índice Remissivo Índice Remissivo 310