Sítios Arqueológicos do Algarve Português
JOÃO PEDRO BERNARDES
Universidade do Algarve
jbernar@ualg.pt
TRIBUNA DE OPINIÓN
Quando o pioneiro da Arqueologia do sul de Portugal, Estácio da Veiga, escavou Milreu em 1877, pensava
que tinha encontrado a cidade romana de Ossonoba. Só, em meados do século XX, quando se descobre a
base de um grande templo no largo da sé da cidade de Faro, é que Abel Viana situa correctamente Ossonoba
na capital da região do Algarve. Milreu é uma grande e rica villa romana conhecida sobretudo pelos seus
mosaicos. Foi escavada e musealizada a partir dos anos 70 do século passado por Theodor Hauschild do
Instituto Arqueológico Alemão. A musealização do arqueólogo alemão e as intervenções pontuais que se lhe
seguiram, incidiram exclusivamente na pars urbana, ainda que Estácio da Veiga nos tenha deixado uma planta
completa da villa, incluindo a pars rustica. Foi fundada no século I d.C., sendo sucessivamente remodelada até
meados do século IV. Pertencem a este século a maior parte das estruturas que hoje se vêem na villa, como
o templo, que ainda hoje está parcialmente de pé, ou os mosaicos com motivos aquáticos. Para além destes
elementos, a villa apresenta um grande peristilo onde se repetem os mosaicos com motivos aquáticos, umas
termas, um lagar de azeite, um lagar de vinho, e muitas outras dependências, algumas das quais estão sob
uma casa rural construída no século XVI. O sítio foi cristianizado, tendo sido edificado um baptistério junto
ao templo pagão, a que se seguiu uma ocupação islâmica. Uma particularidade interessante das ruínas de
MIlreu é que, após a ocupação romana e das época seguintes, o espaço e as suas estruturas continuaram a
ser permantemente habitados até ao século XX.
Fig. 1. Milreu, mosaicos do podium do templo
Outro sítio romano que deve ser visto como um aglomerado secundário (vicus) e não como uma villa
é o Cerro da Vila, em Vilamoura. Este sítio arqueológico foi descoberto nos anos 60 do século passado e foi
escavado nos anos 70 e 80 por José Luís de Matos. Já neste século, Félix Teichner, que também escavou em
Milreu, identificou uma grande estrutura industrial com indícios de tinturaria e de outras atividades de produção
ligadas à exploração de recursos marinhos ou terrestres. Recentemente, foi parcialmente escavado um pequeno
porto de mar que se localizava à entrada de uma antiga laguna nas margens da qual se implantou o sítio romano
no século I. A partir de finais do século II e século III o sítio desenvolve-se muito, fruto, em grande parte, da sua
ligação com o mar. Foi ocupado ininterruptamente até ao século XI, tendo tido uma ocupação importante da
época islâmica. No sítio pode ver-se uma casa de peristilo com termas e vários pavimentos de mosaico, duas
casas mais pequenas também com mosaicos, umas
enormes termas públicas, armazéns, tanques, para além
de outras dependências e estruturas nomeadamente
as de um grande mausoléu. As dimensões das suas
termas, maiores do que muitas termas urbanas, são
o que mais impressiona. O sítio possui ainda algumas
estruturas da Antiguidade tardia e da época Islâmica.
Existe no local um centro de interpretação onde parte
dos achados mais significativos deste aglomerado
secundário podem ser vistos.
O castelo de Silves é outro interessante sítio do
Algarve Português, sendo uma das principais obras
de arquitectura de origem islâmica de Portugal. A sua
construção remonta aos inícios da ocupação islâmica
peninsular, pois que aí já se encontra espólio datável
dos séculos VIII- IX. O castelo e a cidade foi crescendo
Fig. 2. Poço-cisterna do museu de Silves
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TRIBUNA DE OPINIÓN
e no século XI torna-se a mais importante da
região. Foi conquistada pelos cristãos em 1189
que reforçaram então o castelo de origem árabe
com uma área aproximada de 12 hectares. No
seu interior existem várias estruturas desse
passado de que se destacam as ruínas de um
palácio almóada, que se associa ao “palácio
das varandas” celebrado na poesia do reipoeta local Al-Mutamide, e o Aljibe, uma grande
cisterna de planta retangular (com 20 m x 16mx
7m) que abastecia de água parte significativa
da cidade. Boa parte do espólio recolhido no
castelo e na cidade pode ser visto no museu
municipal construído em torno de um magnífico
poço-cisterna da época almóada.
Na área ocidental do Algarve existem
dois sítios romanos, não musealizados, mas
muito interessantes do ponto de vista científico.
Boca do Rio, situado na praia do mesmo nome
foi um centro piscícola romano entre os séculos
I e V d.C. No século XVI foi ocupado por uma
Fig. 3. Cistern das ruinas da Boca do Rio
almadrava e no século XVIII instalaram-se
sobre as suas ruínas romanas armazéns da
Companhia Geral das Reais Pescarias do reino do Algarve. O sítio romano possuía uma frente marítima ocupada
por uma residência com termas e pavimentos de mosaicos, de que são visíveis na praia muitas estruturas.
Existem dezenas de tanques destinados a preparados piscícolas que eram aqui produzidos e exportados em
grande quantidade, servindo-se de ânforas lusitanas, mas também béticas e provavelmente africanas.
Próximo da Boca do Rio, já muito
próximo da ponta de Sagres, situava-se,
também na linha costeira, o centro oleiro
do Martinhal. Conhecem-se daqui 11
fornos, sendo um destinado a produzir
cerâmicas de construção e os restantes
dez ânforas, sobretudo do tipo Almagro
51 a/b e Almagro 51 C. Estes fornos
de ânforas estão hoje na arriba e,
devido ao recuo da linha de costa, têm
vindo a ser destruídos pela erosão
marítima, tal como acontece com várias
estruturas da Boca do Rio. O que torna
interessante este sítio, é a oficina
constituída por uma enorme estrutura
com 42 metros x 11 metros que integra
vários compartimentos e uma grande
cisterna.
Fig. 4. Anfora produzida no Martinhal
Fig. 5. Colmea produzida no Martinhal
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BIBLIOGRAFÍA:
BERNARDES, J. P. & MEDEIROS, I. (2016) – “Boca do Rio (Budens, Vila do Bispo): novos dados de uma villa piscícola romana”. Revista
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GOMES, R. V. (2006): Silves (Xelb) - Uma Cidade do Gharb al-Andalus. O Núcleo Urbano. Trabalhos de Arqueologia. 44. Lisboa.
TEICHNER, F. (2008): Zwischen Land und Meer – Entre tierra y mar. Studien zur Architektur und Wirt-schaftsweise ländlicher Siedlungen
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