HMP - Resumo
HMP - Resumo
HMP - Resumo
Resumo
1
O rito em uso na Península antes era conhecido por rito hispânico, visigótico ou
moçárabe – o Antifonário de Léon é o único manuscrito completo destes ritos
que sobreviveu.
Os monges de Cluny viriam a perder o predomínio para os monges de S.
Agostinho e para os monges de Cister.
As casas monásticas cistercienses mais importantes eram Alcobaça e o Lorvão
de onde provêm os manuscritos mais importantes deste período.
O mais antigo manuscrito litúrgico com notação musical é do Convento de
Arouca – uma página de música rasurada no final de um desses documentos
parece ter contido uma peça a duas vezes, sendo caso único em fontes
medievais portuguesas nas quais os cantos litúrgicos eram monódicos, a uma só
voz.
Lorvão e Arouca eram conventos femininos e possuíam vários livros litúrgicos
que eram no entanto apenas produzidos nos mosteiros masculinos como
Alcobaça e Santa Cruz de Coimbra onde existiam bibliotecas e scriptoria.
Nas ordens militares do Sul os manuscritos musicais parecem ter sido mais
raros.
O interesse dos documentos posteriores a 1150 está numa variante utilizada na
notação francesa ou aquitana em que as notas eram escritas numa única linha a
seco ou a encarnado – a notação ou sistema português identificava o meio tom
com um losango.
Os livros de origem francesa também foram destruídos, tendo sobrevivido até
ao século XIV ou XV, sendo nessa altura o seu pergaminho usado para outros
textos.
A pauta musical de 4 ou 5 linhas foi sendo progressivamente adoptada em
Portugal para a escrita do cantochão.
A existência de poucos tratados musicais do período leva os historiadores a
considerarem que o ensino seria empírico e fechado a influências estrangeiras,
o que poderá ser confirmado pelo aparecimento do sistema de notação
português.
A organização musical nas Sés Catedrais começa a delinear-se nos séculos XII e
XIII – a seguir ao deão aparecia o chantre ou cantor responsável pelo canto
litúrgico.
Nas escolas capitulares ou claustrais educavam-se os moços de capela ou
meninos cantores.
A formação incluía a teoria musical, a educação da voz, a memorização de
melodias e o conhecimento das cerimónias litúrgicas.
A escola capitular mais antiga conhecida é a da Sé de Braga que existia em
1072.
Noutras Sés as informações são mais tardias: Coimbra em 1086, Lisboa em
1150, Porto em 1186 e Évora em 1200.
O primeiro regimento de uma capela conhecido é de 1229 de S. Maria da
Oliveira de Guimarães.
2
Está documentada a presença em Espanha de trovadores provençais como
Guillaume de Poitiers, Marcabru, Peire Vital e Giraud de Bornelh.
Alguns trouvères do Norte de França viveram em Espanha como foi o caso de
Thibaut de Champagne a cujo nome estão associados 500 poemas e 400
melodias.
Existia ainda uma tradição trovadoresca peninsular de raiz local se bem que
influenciada pela lírica provençal, está vertida em galaico-português e o seu
centro mais importante é Santiago de Compostela.
O mais antigo trovador português é João Soares de Paiva e o mais antigo é D.
Pedro filho do rei D. Dinis.
O apogeu da cantiga trovadoresca em Portugal dá-se no reinado de D. Afonso III,
mas os monarcas como D. Dinis ficaram conhecidos pelas suas obras.
Existem cerca de 2100 poemas escritos em galaico-português, sendo 400 de
teor religioso e estando recolhidos nas Cantigas de Santa Maria.
Os restantes poemas de carácter profano estão recolhidos em três manuscritos:
o Cancioneiro da Ajuda;
o Cancioneiro da Biblioteca Vaticana;
o Cancioneiro da Biblioteca Nacional de Lisboa.
O interesse principal do Cancioneiro da Ajuda reside nas iluminuras que
representam cantores, bailarinas ou jogralesas, tocadores de viola de arco, viola
dedilhada, saltério, sonalhas, pandeiro ou adufe e dirigidos por um nobre
trovador sentado num escabelo com um rolo de pergaminho na mão que
contém as cantigas.
Foram ainda descobertos outros manuscritos como um que continha sete
canções do jogral de Vigo Martin Codax e outro com várias cantigas e respectiva
música de D. Dinis.
Chegaram até nós muitas cantigas trovadorescas sem notação musical o que
levanta a hipótese de terem sido escritas letras cantadas em melodias já
conhecidas profanas ou religiosas.
Contrafacta – poemas compostos imitando a métrica e a rima de outra cantiga
ou de um canto litúrgico já existente e cuja melodia usavam.
As cantigas trovadorescas eram interpretadas e ornamentadas de modo
improvisado e com acompanhamento de instrumentos como aparece nas
iluminuras do Cancioneiro da Ajuda.
O sistema de notação musical de Martin Codax assim como o das Cantigas de
Santa Maria é ambíguo o que impossibilita uma transcrição rítmica moderna
segura.
Os géneros poéticos da lírica galaico-cristã são:
o A cantiga de amor semelhante à canso provençal;
o A cantiga de amigo de que se conservam 400;
o A cantiga de escárnio e maldizer de carácter satírico semelhante ao
sirventés provençal;
o Pastorela, pranto, elogio e tenção.
As cantigas de amigo apresentam a particularidade de nelas ser a amada que se
dirige ao amigo – essa particularidade tem sido interpretada pela situação social
no norte da península em que as mulheres passavam largos períodos sozinhas.
3
Na cantiga de amigo parece ainda ser uma mulher rural ou campestre ao
contrário da dama cortês da cantiga de amor o que aponta para uma possível
origem popular da cantiga de amigo.
Do ponto de vista formal distinguem-se as cantigas de maestria e as cantigas de
refrão.
As cantigas de amigo são de refrão com paralelismo e leixaprén – número par
de estrofes cada uma constituída por um dístico e um refrão monóstico – esta
estrutura sugere uma realização coral e cenográfica.
As cantigas de amigo e as Cantigas de Santa Maria parecem ainda aparentadas
com a poesia árabe medieval na sua estrutura.
A temática poética das Cantigas de Santa Maria é de louvor a Nossa Senhora ou
referindo-se a milagres por ela concedidos alguns em localidades portuguesas.
Existem 4 fontes para as Cantigas de Santa Maria: duas na biblioteca do
Escorial, uma na Biblioteca Nacional de Madrid e uma na biblioteca Nacional de
Florença.
Os códices têm uma forma compacta e unitária e não compiladas a partir de
folhas dispersas como acontece com os outros manuscritos trovadorescos.
O trovador é em princípio de origem nobre enquanto o jogral é um profissional
que ganha a vida actuando em público e que é geralmente de origem humilde.
Existe ainda na península o segrer, segriel ou segrel, que se encontra a meio
caminho entre o trovador e o jogral.
A partir do século XIV surge ainda o termo menestrel utilizado para designar os
jograis instrumentistas ao serviço das capelas reais ou catedralícias.
Os termos para referência às canções, arremedilho e a designação de mimos
para os artistas demonstra a associação com os actores ambulantes do final do
Império Romano.
As Ordenações Afonsinas fazem ainda referência a jogralesas ou soldadeiras
impondo-lhes regras e limites.
4
Em 1463 foi nomeado para rei dos charamelas Johan de Reste e entre as suas
obrigações contava-se ensinar e adestrar os moços na charamela, na viola de
arco e noutros instrumentos.
As guerras com Castela e a crise de 1383-85, a emigração de nobres para
Castela e a austeridade da nova corte explicam os poucos documentos que
sobreviveram.
Os músicos da corte por vezes viajavam no séquito das princesas mas outras
vezes também o faziam por vontade própria.
Nas festas e banquetes há ainda notícia de bailes com música de menestréis.
Música alta era a música ao ar livre, cerimonial e militar com instrumentos mais
sonoros enquanto a música baixa era música de corte, particularmente de
dança com instrumentos mais suaves.
A música religiosa ocupava um papel preponderante nas instituições da corte.
A Capela Real era a principal instituição musical portuguesa criada por D. Dinis
em 1229 no Palácio das Alcáçovas.
Na Crónica da Tomada de Ceuta é feita referência a música do Te Deum
contraponteada na cerimónia em que os infantes foram armados cavaleiros e
que correspondia à polifonia.
D. Duarte decretou ainda as necessidades da Capela e quais as aprendizagens
dos seus moços referindo a técnica de dobragem polifónica improvisada sobre
uma melodia dada conhecida por descante ou faburdão, uma prática muito em
voga em Inglaterra.
Nos finais do século XIV surgem ainda as capelas privativas de príncipes e
grandes senhores.
A chancelaria de D. Afonso V refere a contratação de Manuel Pires como mestre
de órgão e o envio de Álvaro Afonso a Inglaterra para obter uma cópia do
regimento da Capela Real.
Há ainda referência a obras escritas por Álvaro Afonso, Gomes Aires, João de
Lisboa e Tristiano de Silva.
No reinado de D. João II surgem referência à utilização de charamelas e
sacabuxas nas igrejas para além dos órgãos.
Na Sé de Braga existia o mestre Afonso, na de Coimbra Estêvão Domingues e
em Lisboa Mestre Garcia.
Em 1323 D. Dinis estabelece um ordenado para o professor de música, um
décimo do ordenado do Lente de Direito.
Apenas em 1544 se conhece o nome do titular do cargo de professor de música.
Mateus de Aranda.
5
2. A Alta Renascença
2.1. A Música religiosa
2.1.1. Principais centros de actividade musical
As obras dos primeiros mestres de capela portugueses, Mateus de Fonte, Fernão
Rodrigues e João de Vilhacastim não sobreviveram.
As primeiras obras musicais portuguesas foram de dois autores:
o Vasco Pires, cantor e mestre de capela da Sé de Coimbra;
o Fernão Gomes, autor de Hóstias et Preces para o Ofertório da Missa de
Defuntos e de uma Missa Orbis factor – a primeira versão polifónica
conhecida do Ordinário da Missa escrita por um compositor português.
O primeiro compositor de renome foi no entanto Pedro do Porto, cantor da
Capela da Rainha Isabel a Católica entre 1489 e 1499 e entre 1507 e 1514
mestre dos moços de coro da Catedral de Sevilha com o encargo do ensino
musical, alimentação, vestimenta e alojamento.
Aparece por vezes a designação de Pedro de Escobar que alguns historiadores
identificam com Pedro do Porto e que deixou 24 obras religiosas e 18 peças
profanas em vários manuscritos.
O cardeal D. Afonso nomeou para mestre da capela da Sé de Évora o espanhol
Mateus de Aranda.
Em Évora assistiu-se ao alargamento progressivo da prática musical polifónica
das capelas privadas dos reis e dos infantes às capelas das Sés.
A Capela Real parece ter tido influência na criação da Capela da Sé de Lisboa
onde o cargo de mestre de capela foi criado em 1530.
Vários membros da família real possuíam capelas privadas destacando-se a dos
Duques de Bragança em Vila Viçosa que viria a ter especial importância no
século XVII.
Dois filhos de D. Manuel, D. Afonso e D. Henriques estiveram à frente das
dioceses de Lisboa, Évora e Braga o que pode ter desenvolvido a prática musical
polifónica nas suas capelas.
A formação de uma capela musical apta a executar polifonia implicava a criação
de uma escola para moços de coro.
Évora terá tido a primazia na formação da capela e de uma escola de música, o
que se deverá à corte ter estado instalada nessa cidade no reinado de D. João
III.
A dificuldade de encontrar nacionais para os cargos de mestre de capela levou à
contratação de mestres estrangeiros como Alonso Lobo na Sé de Lisboa.
Mateus de Aranda foi mestre de capela da Sé de Évora e em seguida ocupou o
lugar de mestre de música na Universidade de Coimbra.
Publicou ainda os dois primeiros livros de música que se imprimiram em
Portugal: Tractado de cãtollano e Tractado de canto mensurable.
Durante um período de quase dois séculos Évora foi o principal centro de
formação de compositores como: Padre Manuel Dias, Padre Manuel Mendes,
Padre Cosme Delgado, Filipe de Magalhães, Padre Manuel Rebelo, Padre António
Pinheiro, Padre Diogo Melgas, Frei Manuel Cardoso, Duarte Lobo, Estêvão Lopes
Morago e Francisco Martins.
7
Braga também possuía uma capela polifónica sendo o seu primeiro mestre
conhecido Miguel da Fonseca e os seguintes Baltazar Vieira, Abade Pêro de
Gambôa e Padre Lourenço Ribeiro.
A escola de música da Sé de Braga funcionava até finais do século XVI no
Colégio de S. Pedro do Seminário de Braga.
Na Sé do Porto havia o mestre de capela Padre Jorge Vaz mas os ordenados
auferidos por estes mestres eram muito inferiores aos praticados em Évora o
que poderá explicar a menor importância da vida musical no Porto.
Em Lamego é referido ainda uma capela de canto de órgão mas só em 1606
surge o nome de um mestre, António Lucas.
Em Viseu havia em 1570 uma capela tendo sido mestre dela Ambrósio de Pinho.
Em Elvas em 1570 existia uma capela com mestre e organista e com o Mestre
Manuel Garcia.
Em Portalegre há referência a um coro em 1565 com o mestre Padre Manuel
Mendes.
No Funchal havia ainda uma capela com o mestre Gaspar Coelho.
Nos Açores existiam capelas em Angra e na ilha de S. Miguel em Ponta Delgada
e nas igrejas de algumas vilas.
Na Sé de Coimbra a actividade musical apagou-se um pouco depois dos inícios
do século XVI devido à predominância do Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra,
casa-mãe em Portugal dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho.
Em Santa Cruz surge o Prior D. João de Noronha, um compositor de música
polifónica e que contratou 4 cantores mores.
Um desses cantores mores tinha como função mestre de capela e a
incumbência do ensino musical dos noviços que aprendiam o canto e alguns
instrumentos como os de tecla (clavicórdio, cravo e órgão), as violas de arco ou
violas de gamba, a harpa e os instrumentos de sopro.
O mosteiro de Santa Cruz era ainda uma comunidade musical relativamente
autónoma que empregavam apenas os seus membros como cantores,
instrumentistas e mestres de música e apoiando-se neles como compositores e
fabricantes de instrumentos.
Alguns compositores de Santa Cruz são Dom Heliodoro de Paiva, o espanhol
Dom Francisco de Santa Maria e sobretudo o mestre de capela Dom Pedro de
Cristo.
8
O modelo de referência dos compositores quinhentistas é o franco-flamengo
como é possível detectar nas obras de Josquin des Prés, António Prestes ou João
de Barros.
Na obra Clamabat autem mulier Chananea de Pedro Escobar surge uma
alternância de vozes que é característica da escrita franco-flamenga e que dá
uma maior intensidade dramática à peça.
A antologia Portugaliae Musica da Gulbenkian possui várias obras do século XVI
como 3 pequenas composições de Mateus de Aranda ou o Magnificat de Pedro
Escobar.
Pedro Talésio foi mestre de capela da Sé da Guarda e lente de míusica da
Universidade de Coimbra, tendo publicado uma Arte de canto chão com huma
breve Instrucção, pêra os Sacerdotes, Diáconos, Subdiaconos e moços de coro,
conforme ao uso Romano.
Outro compositor de destaque na Antologia é Damião de Góis que nos deixou
algumas composições embora poucas mas que foi dos autores com maior
projecção no estrangeiro.
A presença de músicos portugueses no estrangeiro está pouco documentada
sendo referidos um cantor da Capella Giulia, um organista em várias igrejas e
Vicente Lusitano, famoso pela sua polémica com Nicola Vicentino, que ganhou
apesar de defender uma posição mais conservadora.
Há ainda referência a Frei João Leite Pereira que terá trabalhado como organista
do Duque Vicenzo Gonzaga em Mântua no início do século XVII.
A única obra de um compósito português publicada no estrangeiro foi um livro
de motetes do cónego de Lamego, Pedro Álvares de Moura publicado em Roma.
O processo de Damião de Góis pela Inquisição revela ainda uma prática que
seria frequente no Norte da Europa de serões musicais.
No Arquivo Distrital de Braga e na Biblioteca Municipal do Porto há ainda
manuscritos com perto de uma centena de obras sacras que podem ser
atribuídas ao mestre de capela da Sé de Braga Miguel Fonseca.
Dom Pedro de Cristo foi mestre de capela em Santa Cruz de Coimbra e em São
Vicente de Fora de Lisboa e a sua vasta obra compreende mais de 200 peças de
polifonia sacra – as suas obras seguem a estrutura renascentista das 4 vozes e
utiliza ainda técnicas expressivas como a alternância entre secções mais
estáveis e outras mais agitadas assim como o encadeamento de várias vozes.
9
António Carreira foi o primeiro grande compositor de música para órgão embora
a sua identidade é problemática já que com o mesmo nome, o pai foi mestre da
capela real e o filho foi autor de obras vocais.
Os Tentos ou Fantasias para órgão de António Carreira adoptam uma estrutura
monotemática ao contrário das obras pluritemáticas de outros autores do
período – tendência para o cromatismo e dissonância com função expressiva
sendo por vezes classificados de maneiristas.
Sabemos ainda de vários tratados e colecções de obras para tecla que não
chegaram até nós como as obras de Gonçalo de Baena, Gregório Silvestre de
Mesa e Pêro Pimentel.
10
Garcia de Resende compilou em 1516 o Cancioneiro Geral que abrange a
produção poética desde meados do século XV.
A maioria das mil poesias do Cancioneiro é versos de ocasião de tema amoroso
ou satírico.
A técnica poética mais característica é a glosa processo que consistia em
desenvolver ou criar um mote ou tema que era colocado à cabeça da
composição e repetido depois como refrão.
Distinguem-se dois géneros de glosas:
o Vilancico ou vilancete (villancico) – mote, refrão estribilho ou cabeça de 2
ou 3 versos, copla, glosa ou pé com uma quadra de dois pares de versos e
volta ou torna de 3 versos, sendo os dois últimos uma repetição com ou
sem variação dos versos finais do mote;
o Cantiga (canción) – de tom mais sério e convencional – mote de 4 a 6
versos, copla de 8, 9 ou 10 versos, também com repetição do mote; um
outro género tem várias voltas no final do qual se repete o mote.
Sob o ponto de vista musical, o vilancico e a cantiga foram tratados da mesma
forma pelos compositores ibéricos: duas secções musicais normalmente com o
esquema ABBA, com a secção A canta-se o refrão e a volta e com a B cada uma
das mudanças.
Um terceiro género profano é o romance, género narrativo que remonta ao
século XIV e que pode estar relacionado com as canções de gesta.
Um exemplo de um romance importante deste período é o incip Puestos están
frente a frente e que descreve a batalha de Alcácer-Quibir.
Outro exemplo é a Niña era la Infanta apresentado por ocasião do casamento da
Infanta D. Beatriz com o Duque de Sabóia em 1521.
Nos 3 géneros fazem uso de diferentes tipos de escrita desde o contraponto
mais elaborado segundo o modelo franco-flamengo à escrita silábica e
homorítimica, isto é com todas as vozes cantando uma nota para cada sílaba –
estilo da frottola italiana popular na corte aragonesa de Nápoles.
O repertório de vilancicos, cantigas e romances é comum a Espanha e Portugal,
pelo que devemos referir as fontes espanholas:
o 4 cancioneiros manuscritos, da Biblioteca Colombina (1490), do Palácio
finais do século XV – 458 peças), da Casa Medinaceli (177 peças) e de
Segóvia;
o 2 cancioneiros impressos: Recopilación de sonetos y villancicos a 4 e 5
vozes de Juan Vasquez e Villancicos de diversos autores conhecido como
Cancioneiro de Uppsala.
Nos cancioneiros espanhóis tal como nos portugueses o vilancico é o género
predominante.
As fontes portuguesas são:
o Cancioneiro de Elvas (65 peças);
o Cancioneiro da Biblioteca Nacional de Lisboa (19 peças profanas num
conjunto essencialmente religioso);
o Cancioneiro da Biblioteca da École Supérieure dês Beaux-Arts de Paris (131
peças);
o Cancioneiro do Museu Nacional de Arqueologia e Etnologia de Belém.
11
Várias melodias do Cancioneiro de Paris são o tiple ou voz superior de versões
polifónicas dos mesmos vilancicos que aparecem noutros cancioneiros o que
poderá indicar que as versões polifónicas são posteriores à fixação escrita da
melodia.
O número de peças destes cancioneiros é relativamente pequeno mas para
algumas composições é de admitir que só existiria a melodia que não foi
colocada por escrito e que outras versões foram apenas anotadas em folhas
soltas que se perderam.
As obras dos cancioneiros são em geral de carácter amoroso que seria o mais
apropriado para ser posto em música.
Os cancioneiros abarcam o período dos reinados de D. João II, D. Manuel, D. João
III e a segunda metade do século XVI.
As peças são na maioria dos casos anónimas mas é possível identificar alguns
autores através de outros cancioneiros com as mesmas canções como Juan del
Encina ou Pedro Escobar.
As peças com texto português são apenas um quarto do total já que a maioria
das canções está escrita em castelhano, o que não surpreende por a corte ser
bilingue pelos casamentos com as famílias reais espanholas.
Surgiram ainda os vilancicos de tema religioso geralmente de Natal num
conjunto de manuscritos da Universidade de Coimbra.
Nos cancioneiros regista-se uma simplicidade de estilo embora nalgumas
canções comece a aparecer características próprias da Renascença final ou do
estilo maneirista: escrita contrapontística mais complexa e a intensificação da
componente expressiva através de processos como a dissonância ou o
cromatismo, que traduzem a influência do madrigal italiano.
Na Renascença a arte social por excelência era a dança fosse de salão, religiosa
ou popular e o seu lugar era o palácio, a igreja ou a rua.
Um dos exemplos deste ripo de música é a folia que irá ter uma grande
influência na música instrumental do Barroco.
A dança e a canção têm ainda um papel importante no teatro tendo o próprio Gil
Vicente composto canções como a que aparece no Auto da Sibila Cassandra.
No teatro vicentino há também entradas instrumentais com trombetas e
charamelas sendo ainda referidos instrumentos como as gaitas, as violas, o
rabel e o tamborim e danças como a chacota e a folia.
12
3. Aspectos musicais da Expansão portuguesa
As condições climatéricas dos trópicos e o recuo da influência católica no
Oriente fizeram com que poucas fontes locais musicais tivessem sobrevivido.
Quanto a testemunhos vivos, eles estão presentes na África e no Brasil onde a
influência portuguesa continuava importante no século XX – por exemplo nas
pequenas comunidades cripto-cristãs e em algumas comunidades de
descendentes.
A generalidade dos documentos históricos não faz referência a instrumentos
musicais ou a obras musicais.
Os aspectos musicais da Expansão são essencialmente 4:
o Influência na música portuguesa das culturas musicais exóticas;
o Interacção entre as tradições musicais dos navegadores e colonizadores e
das tradições musicais locais;
o O papel da música na missionação;
o Influência da Expansão na música metropolitana.
13
As expedições levavam diversos instrumentos musicais como é o caso da de
Pedro Álvares Cabral que tinha trombetas, séstros, flautas, tamborins e gaitas
de foles.
A música de corte tinha ainda o seu lugar nos contactos diplomáticos como
descreve Fernão Mendes Pinto na Peregrinação numa cena de banquete, em
cerimónias religiosas e até num funeral para o qual Gaspar de Meireles cativo na
China foi forçado a tocar no cortejo.
3.3.2. A África
Os testemunhos históricos da presença portuguesa em África são mais difíceis
de reconstituir.
A catequização em África também foi acompanhada pela educação musical.
3.3.3. O Oriente
14
António de Gouveia refere como o Xá da Pérsia apreciava a música dos
missionários portugueses tendo ido ouvi-la no Natal de 1608.
Na Índia a Companhia de Jesus desempenhou um importante papel nos seus
colégios, escolas e igrejas utilizando na música e no teatro o mesmo fervor
missionário.
Desde 1558 há notícia da representação de tragédias latinas no Colégio de Goa
na presença do vice-rei.
A música religiosa também teve papel importante com as igrejas a cantar
missas em polifonia.
Algumas representações eram ainda feitas e nas línguas locais.
A atitude face à música indígena é ilustrada pela proibição de as mulheres
aprenderem a bailar, tanger ou cantar Deqhanins e outros bailes e cantigas
gentílicas.
Em Macau em 1584 a escola tinha mais de 200 alunos que aprendiam a contar e
escrever mas também música.
O Padre Tomás Pereira completou os seus estudos no colégio de S. Paulo em
Macau e em Pequim construiu vários órgãos, incluindo um órgão mecânico que
tocava melodias chinesas e tinha um jogo de campainhas.
O imperador Kam-hi mandou escrever um livro de teoria musical chinesa e foi
acrescentado um 5.º tomo em apêndice redigido por Tomás Pereira e pelo
italiano Padre Pedrini sobre os elementos da música europeia e fez traduzir em
tártaro o Tratado de Música Práctica e Especulativa de Tomás Pereira.
As primeiras reacções dos padres Luís Frois e Lourenço Mexia em relação à
música japonesa são muito negativos.
Apesar dessas diferenças, os japoneses convertidos aprenderam rapidamente a
música europeia ensinada pelos jesuítas.
O kokyu japonês, um violino de 3 ou 4 cordas que aparece nos finais do século
XVI tem origem na rabeca portuguesa.
O padre Luís Shiozuka tornou-se famoso como instrumentista e mestre de
capela.
Um episódio famoso da missionação no Japão é a visita de 4 jovens príncipes
japoneses à Europa onde aprenderam e praticaram música que tocaram de
volta à corte do ditador Hideyoshi.
Nos seminários jesuítas do Japão começou a ser construído um tipo curioso de
órgão feito de bambu conservando-se apenas um na Igreja de Las Piñas perto
de Manila.
Os vestígios da presença musical encontram-se ainda noutro tipo de suportes
como pinturas ou biombos.
No Sul do Japão em comunidades cripto-cristãs manteve-se ainda um tipo de
canto muito parecido com o gregoriano.
15
Os reflexos da Expansão começam a sentir-se em cerimónias oficiais em que
surgem elementos africanos como o casamento do filho de D. João II com a filha
dos Reis Católicos.
Outras referências surgem ainda no teatro jesuítico com coros em língua tupi.
A presença de culturas musicais extra-europeias parece ter sido esporádica com
excepção da influência árabe e dos escravos africanos.
Os escravos africanos trouxeram as suas tradições e as suas festas que
contrastavam com a habitual melancolia portuguesa.
É determinada no entanto a proibição de realização de bailes e ajuntamentos de
escravos, sem dúvida uma tentativa de evitar a perpetuação dos cultos
religiosos negro-africanos.
A cristianização dos negros teve como consequência a formação de irmandades
ou confrarias como a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens
Pretos.
Os negros participaram também desde cedo nas procissões religiosas em
especial no Corpo de Deus com as suas danças como o frenético lundum seja
como tocadores de pífaros, cornetas, rabecas e tambores.
Os cantos e bailes de origem africanos não foram registados de nenhuma forma
sendo apenas uma tradição oral que acabou por se perder.
Sobreviveram apenas os vilancicos religiosos escritos em português de negro e
que fazem referência a danças, instrumentos e onomatopeias indígenas.
A adaptação das tradições musicais locais foi apenas utilizada na missionação.
O predomínio do cristianismo e o seu proselitismo intenso levaram à supressão
de outras culturas.
Apenas no Brasil a síntese de várias tradições resultou numa nova cultura.
16
4. O século XVII
4.1. O florescimento musical durante o domínio filipino
A crise do império, a contra-reforma e a perda da independência política do final
do século XVI levaram Portugal a uma situação de isolacionismo e
subalternidade cultural.
A introdução da Inquisição em 1536 é uma das marcas da intolerância religiosa
e ideológica.
Em 1547 é produzido o primeiro Índex de obras proibidas pela Igreja.
Em 1555 o ensino no Colégio das Artes da Universidade de Coimbra é entregue
à Companhia de Jesus que forma um monopólio no ensino superior português.
A música terá sido a arte menos afectada por este panorama.
Apesar disso a música profana deixou de ter um meio favorável ao
desenvolvimento com o desaparecimento da corte e com a deslocação dos
nobres para os solares de província.
A música religiosa vai no entanto desabrochar no período filipino em virtude de
questões religiosas.
Portugal foi o único país católico que cumpriu integralmente as decisões do
Concílio de Trento mas, como os compositores portugueses nunca se tinha
deixado seduzir pelos excessos contrapontísticos e pela utilização de temas
profanos características da polifonia franco-flamenga, as condenações destas
práticas tiveram poucos efeitos em Portugal.
A atmosfera de fervor religioso vai favorecer a criatividade dos mestres de
capela das sés e dos conventos onde se concentra a actividade musical do
período devido ao apagamento da Capela Real.
Existia uma diferença entre a música das grandes catedrais destinada ao
público e que era mais simples e austera e a música de capelas privadas como a
Capela do Paço Ducal de Vila Viçosa mais sofisticada e complexa.
A maior parte da música que sobreviveu neste período foi a música mais
conservadora, mas foi provavelmente o período em que maior número de obras
foi publicado em Portugal.
A maior parte das publicações deveu-se a considerações de fama e prestígio
mas também dependia do apoio financeiro de mecenas a quem eram dedicadas
com prefácios elogiosos.
Muitas das obras de compositores como Duarte Lobo, Filipe de Magalhães e
Manuel Cardoso foram publicadas no final das suas vidas, mas teriam sido obras
compostas há mais tempo, o que explicaria o aparente conservadorismo.
Os três compositores referidos são as figuras principais da Escola de Évora,
tendo sido todos discípulos do Padre Manuel Mendes.
Duarte Lobo foi mestre de capela do Hospital Real de Lisboa e provavelmente
da Sé de Lisboa e foi célebre no seu tempo como teórico musical, destacando-se
António Fernandes como seu discípulo.
Frei Manuel Cardoso é o compositor mais interessante da Escola de Évora já que
o seu estilo intensamente expressivo utiliza com abundância o cromatismo, as
dissonâncias e os intervalos aumentados e diminutos – Rui Vieira Nery defende
que se trata de maneirismo.
Os compositores portugueses demonstraram um especial interesse no
tratamento musical de textos litúrgicos com elevado conteúdo emocional
17
levando também a dificuldades contrapontísticas elevadas a um virtuosismo
técnico.
Estes aspectos vêm romper com o equilíbrio formal e estilístico do
Renascimento.
Entre os últimos compositores da Escola de Évora são de destacar Estêvão
Lopes Morago e o Padre Francisco Martins e Diogo Melgas.
18
O interesse do Duque de Bragança centrava-se nas obras religiosas manuscritas
em especial de origem ibérica.
D. João IV dedicou-se ele próprio à composição e teoria musical embora seja
problemática a autoria das duas obras que lhe são atribuídas.
Apesar dessas questões, parece incontornável o papel de mecenas musical
desempenhado pelo futuro rei.
19
A abundância de termos teatrais é explicada pela origem dos vilancicos
religiosos como representações teatrais dentro da igreja.
A dança era um elemento importante no teatro religioso e nas procissões do
Corpo de Deus e os vilancicos incluem um vasto leque de danças.
Em Portugal o vilancico vai preencher um lugar vago pela quase inexistência de
teatro profano que se limitava às representações nos pátios das comédias.
Os jesuítas desenvolveram ainda um teatro didáctico em latim, os Ludi priores
ou Ludi solemnes, e também tragicomédias sobre temas hagiográficos, bíblicos,
mitológicos e históricos.
As tragicomédias jesuíticas trouxeram ainda a cenografia barroca mas a música
associada a estas obras não sobreviveu.
Para além da colecção em Santa Cruz existe ainda uma outra colecção na
Biblioteca Pública de Évora.
A maioria dos vilancicos está escrita em espanhol ou em vários dialectos, sendo
raros os vilancicos em português.
Alguns dos autores da colecção de Évora são: António Marques Lésbio, Francisco
Martins e Pedro Vaz Rego.
20
A inclusão de uma parte de baixo contínuo ou de acompanhamento, técnica do
período de 1600 a 1750 será cada vez mais frequente no música vocal religiosa
a partir de meados do século XVII.
Nos Responsórios de D. Pedro da Esperança encontramos também o primeiro
exemplo de uma parte escrita para violino na música portuguesa.
Dom Agostinho da Cruz foi ainda o autor de um dos primeiros manuais escritos
para o violino.
21
5. O século XVIII
5.1. A italianização da vida musical na primeira metade do século XVIII
A subida de D. João V ao trono marca o início de uma viragem política, social e
cultural.
Terminam as guerras com a Espanha.
A descoberta do ouro no Brasil abriu uma nova época de prosperidade
financeira que perdurou até finais do século XVIII.
D. João V teve de se confrontar com o excessivo peso da Igreja depois da
Contra-Reforma e melhorar a debilidade da sociedade civil.
O ouro do Brasil foi investido em instituições como a Academia Portuguesa de
História e em obras e instituições artísticas relacionadas com a representação
religiosa do Poder Absoluto.
A “ópera ao divino” imperava em Portugal enquanto nas cortes europeias se
popularizava a ópera séria.
A renovação musical do reinado de D. João V vai estar ligada à reforma da
Capela Real, elevada à dignidade de Sé Patriarcal em 1716 e em 1713 à criação
do Seminário da Patriarcal, a principal escola de música de Portugal.
Em 1729 foi criada uma escola de cantochão dedicada ao ensino do canto
capucho, dirigida pelo veneziano Giovanni Giorgi.
Foram ainda enviados bolseiros a Roma como António Teixeira, João Rodrigues
Esteves e Francisco António de Almeida.
No século XVIII Roma era um dos maiores centros musicais da Europa e os
embaixadores portugueses contrataram vários cantores da Capella Giulia do
Vaticano para servirem na Capela Real.
Em 1719 Dominio Scarlatti veio dirigir a Capela Real Portuguesa e teve como
vice-mestre de capela o organista Carlos Seixas.
22
Outro exemplo é os últimos vilancicos cantados nas Igrejas de S. Vicente de
Fora e de Santa Justa de Lisboa, cujos libretos revelam uma estrutural formal de
cunho italiano, traduzida na alternância de árias, recitativos e coros, e na
inclusão de sinfonias ou aberturas instrumentais.
23
As obras de António José da Silva eram representadas perante um público mais
heterogéneo que integrava membros da nobreza e da burguesia com uma
mistura de personagens sérias e cómicas que reflectem a tradição barroca dos
libretos italianos e contendo uma componente crítica e satírica.
Em 1742 a doença de D. João V leva-o a proibir todas as representações teatrais
em Lisboa.
A importância da ópera eclipsou a restante actividade musical profana da qual
existem poucos vestígios.
As 105 sonatas para tecla de José António Carlos de Seixas dirigiam-se a um
público aristocrático e feminino.
As sonatas de Seixas representam a primeira fase de desenvolvimento da
sonata para tecla na transição do barroco final para o período pré-clássico.
Na sua maioria as sonatas de Seixas destinam-se ao cravo e ao clavicórdio
embora algumas sejam escritas para órgão.
A muitas sonatas aparece associado um minuete nos manuscritos,
testemunhando a voga da dança francesa da qual subsistem também manuais
de dança.
Em fontes de música para guitarra também surgem várias danças francesas ou
danças ibéricas.
Carlos Seixas é ainda o autor de 3 obras que ilustram importantes géneros
orquestrais: Sinfonia em estilo italiano, Abertura em estilo francês e Concerto
para cravo e orquestra – um dos primeiros do género na Europa.
Outro autor de música orquestral importante deste período foi António Pereira
da Costa que fez publicar em Londres 12 concertos grossos.
24
A orquestra da corte começou a ser conhecida por Real Câmara na segunda
metade do século XVIII.
Quanto ao corpo de baile, a utilização exclusiva de homens terá afastado de
Lisboa os melhores bailarinos que não dançavam papéis de travesti e impediu o
desenvolvimento do bailado feminino.
Até ao terramoto o repertório dos teatros de corte foi essencialmente
constituído por óperas sérias de David Perez, mas a partir de 1763 a ópera
cómica ou buffa tornou-se mais popular, como de resto em toda a Europa.
Eram ainda representadas as óperas sérias de Niccoló Jommelli, que influenciou
os compositores portugueses.
A actividade dos portugueses foi mais produtiva no campo da serenata e da
oratória, que substituíram, por razões económicas, a ópera na corte, uma vez
que dispensavam os cenários e o guarda-roupa.
Os principais autores portugueses do período foram: João Cordeiro da Silva,
Pedro António Avondano e João de Sousa Carvalho.
Todos estes compositores excepto Avondano foram mestres no Seminário da
Patriarcal.
Ao longo do reinado de D. Maria I foi-se acentuando a decadência dos teatros e
estabelecimentos musicais.
Com a inauguração do Teatro de S. Carlos em 1793 termina o ciclo da ópera de
corte que durou 60 anos.
O Teatro do Bairro Alto e da Rua dos Condes recomeçaram a partir de 1761 a
alternar teatro declamado português com óperas italianas e bailados.
Algumas actrizes e cantoras se destacaram como Cecília Rosa, Isabel Ifigénia e
Luísa Rosa de Aguiar ou Luísa Todi que chegou a ter uma carreira internacional.
Em 1771 surge a Sociedade para a Subsistência dos Teatros Públicos, numa
tentativa de gestão operática e teatral, à imagem das società di cavalieri
italianas.
Era uma sociedade monopolista, sob a protecção da corte, que estabelecia o
exclusivo do teatro declamado em português para o Teatro do Bairro Alto, e o
da ópera italiana para o Teatro da Rua dos Condes.
A função educativa e civilizacional assume contornos iluministas.
As grandes despesas de manutenção levaram rapidamente à sua extinção.
Entre 1790 e 1792 surge de novo a ópera italiana no Teatro da Rua dos Condes,
dirigida pelo português António Leal Moreira, que viria no ano seguinte a
assumir a direcção musical do Teatro S. Carlos.
No Porto realizaram-se irregularmente espectáculos de ópera no Teatro Público
ou do Corpo da Guarda, com a protecção do Governador Almada e Melo. O Porto
tinha duas companhias de teatro, uma nacional e outras de ópera italiana.
A popularidade dos espectáculos de ópera levou à produção de adaptações
declamadas em português de libretos de ópera em numerosas edições
dedicadas à burguesia e que ficaram conhecidos como teatro de cordel.
A burguesia nacional sentia-se atraída pela ficção literária de uma ideologia e de
um modelo político racionalista.
25
A influência operática italiana determinou o estilo da música religiosa produzida
no século XVIII. Os principais modelos de referência foram David Perez (Mattuti
dei Morti de 1774) e Niccolò Jommelli (Missa de Requiem).
Os principais compositores religiosos portugueses foram: Luciano Xavier dos
Santos, organista e mestre da Real Capela da Bemposta e António da Silva
Gomes e Oliveira, organista da Real Capela da Ajuda.
Representam diferentes aspectos do estilo pré-clássico de raiz italiana, em
especial napolitana.
Algumas obras apresentam a leveza e simplicidade do style galant enquanto
outras apresentam solos vocais muito ornamentados.
26
António da Silva Leite publicou seis sonatas de guitarra tocadas num
instrumento semelhante ao cittern inglês e protótipo da actual guitarra
portuguesa.
À modinha também se tem atribuído o papel de antecessora do fado, género
que só aparece claramente definido no segundo terço do século XIX.
Outro instrumento muito popular na altura era ainda a viola de cinco ordens
(pares de cordas).
Guitarrista e compositor, outra figura portuguesa de destaque deste período foi
o Abade António da Costa.
Destaca-se ainda a produção de música para instrumentos de tecla entre os
quais o pianoforte, que já começa a competir com o cravo.
O mais notável compositor de música para tecla da segunda metade do século
XVIII foi João de Sousa Carvalho.
Quanto a manuais para instrumentos de tecla neste período surgem dois, um de
Alberto José Gomes da Silva e outro de Francisco Inácio Solano.
27
6. O século XIX
6.1. A ópera e o teatro musicado
6.1.1. A hegemonia da ópera italiana. Os teatros de S. Carlos e de S. João
A partir da última década do século XVIII a vida musical portuguesa é dominada
pelos teatros de ópera que surgem nas duas maiores cidades do país, colocando
a música instrumental num papel de satélite da cultura operática italiana.
A abertura do S. Carlos em Lisboa (1793) e do S. João no Porto (1798) marca o
aparecimento de casas de espectáculo públicas seguindo o modelo
arquitectónico italiano.
Construídos com sociedades de capitalistas ou subscrições públicas de acções,
os teatros eram alugados a empresários que montavam toda a temporada.
Em 1846 surge ainda o Teatro D. Maria II tornando-se três as casas de ópera
nacionais.
Menos importantes do que a ópera, existiam também o teatro declamado, o
teatro musicado e outros tipos de espectáculos.
Dentro da ópera italiana o género sério denominado melodrama era o mais
importante, seguido dos géneros semi-sério e cómico ou buffo.
Em Portugal não existia esta hierarquia de géneros mas assistia-se ao
predomínio da ópera séria.
Até 1798 o repertório do Teatro S. Carlos era constituído unicamente por óperas
cómicas ou drammi giocosi e a seguir a essa data incluía também óperas sérias
sob influência do cantor castrado Girolamo Crescentini.
O único compositor português apresentado nos primeiros cinco anos do teatro
foi António Leal Moreira, seu director musical.
A vingança da cigana tinha libreto de Domingos Caldas Barbosa e incluía árias,
duetos, recitativos e conjuntos vocais em estilo italiano complementados com
modinhas ou canções populares como a do negro Cazumba.
No Teatro S. Carlos eram ainda apresentados bailados nos intervalos das óperas
e também por vezes espectáculos de teatro declamado.
No primeiro andar foi criado o Salão Nobre onde se apresentavam oratórias e
outras peças de música sacra durante a Quaresma.
Em 1799 o S. Carlos apresenta uma ópera de Marcos Portugal compositor cujas
obras já se tinham celebrizado na Europa.
Ao estabelecer-se em Portugal em 1800 Marcos Portugal assumiu a direcção
musical do Teatro de S. Carlos e da Capela Real.
O compositor segue a família real para o Brasil onde permanece depois da
independência ocupando o cargo de compositor de música do imperador
dedicando-se na última fase da sua vida à música religiosa.
O repertório de óperas de S. Carlos na primeira metade do século XIX é
dominado pelas produções italianas e algumas óperas francesas.
Na temporada de 1806 é apresentada uma ópera séria de Mozart, La clemenza
di Tito.
Fechado depois da expulsão dos franceses, o Teatro S. Carlos reabre em 1815-
16 com as primeiras óperas de Rossini que vão dominar o repertório até 1824,
data em que surgem compositores como Giacomo Meyerbeer e Saverio
Mercandante.
28
Encerrado durante a guerra civil, o S. Carlos volta a reabrir com uma
programação assente em Rossini, Donizetti e Bellini.
O Conde de Farrobo torna-se empresário do S. Carlos em 1838, conduzindo o
teatro a uma das suas melhores épocas – contratação do compositor italiano
Pietro António Coppola.
Em 1843 com a estreia de Nabucco de Verdi dá-se uma nova viragem com o
predomínio das composições verdianas.
O panorama português era semelhante ao de Itália onde até 1871 nunca se
ouviu nenhuma produção wagneriana.
Em 1798 é inaugurado o Teatro S. João no Porto em homenagem ao príncipe e
futuro rei D. João VI tendo as suas primeiras temporadas espelhado a situação
em Lisboa.
O S. João debatia-se no entanto com uma grande falta de meios incluindo um
subsídio inferior do Estado que não lhe permitiu contratar cantores de nomeada.
Durante o século XIX o S. João foi a principal casa de espectáculos do Porto com
funções de teatro lírico e de teatro declamado, já que nunca se construiu uma
casa de espectáculos específica para esses espectáculos no Porto ao contrário
do que tinha acontecido em Lisboa.
O Palácio de Cristal assumiu-se como alternativa em 1869-70 com a
apresentação de Don Carlos de Verdi.
O mais importante teatro privado português foi construído no primeiro quartel
do século XIX por uma família burguesa nobilitada que pretendia copiar o fausto
das grandes casas senhoriais.
Joaquim Pedro Quintela, conde de Farrobo mandou construir um teatro na sua
Quinta das Laranjeiras inaugurado em 1825 e destruído por um incêndio em
1862.
O teatro das Laranjeiras recebeu ópera italiana cantada por profissionais e
amadores e o seu repertório incluía obras de Rossini, Mercandante, Donizetti e
dos portugueses António luís Miro e João Guilherme Daddi.
Outros espectáculos decorreram fora de Lisboa e Porto nomeadamente em
Lamego, Aveiro, Ponta Delgada, Angra do Heroísmo e Funchal mas sempre com
companhias provenientes das maiores cidades.
29
No século XIX também se registou um intercâmbio entre os teatros portugueses
e os brasileiros, contribuindo para uma diversidade de influências externas.
No Porto foi inaugurado o Teatro Baquet em 1859 que representava o mesmo
tipo de papel de teatro secundário tendo Sá Noronha e António Maria Celestino
tentado criar em 1861 uma companhia de Ópera Cómica Nacional.
Surgiram ainda outros teatros como o D. Afonso (1885), o Carlos Alberto (1897 e
o Avenida (1888).
Augusto Machado escreveu um grande número de operetas em português e
tentou criar uma tradição de opereta baseada em temas históricos.
30
Na temporada de 1908-09 termina o monopólio das companhias italianas que
tinha marcado os primeiros 120 anos da tradição da ópera em Portugal.
31
Em 1845 é ainda criada a Academia Melpomenense cuja actividade duraria até
1861 e que apresentou obras dos compositores portugueses Joaquim Casimiro,
Francisco António Norberto dos Santos Pinto, Guilherme Cossoul e João
Guilherme Daddi.
32
O conservatório de música da Casa Pia foi integrado como Escola de Música no
novo conservatório.
Em 1845 o Conde de Farrobo assumiu a direcção do Conservatório e em 1863 o
violoncelista Guilherme Cossoul foi nomeado director da Escola da Música.
Apesar de ser a principal escola de ensino musical no século XIX, o
conservatório não conseguiu dar a formação necessária à maioria dos
compositores que o frequentaram e que completaram a sua preparação no
estrangeiro como Eugénio Mazoni e Augusto Neuparth.
Também os compositores procuraram a sua formação no estrangeiro como
Augusto Machado que estudou com Lavignac em Paris ou Alfredo Keil que
estudou em Nuremberga.
A utilização de óperas essencialmente estrangeiras levou a que não houvesse
em Portugal uma procura pelas obras desses compositores.
A partir de meados do século XIX surgiram escolas privadas ou sociedades de
amadores como a escola popular de canto da Câmara Municipal do Porto
dirigida por Jacopo Carli e inaugurada em 1855.
Em 1884 irá surgir em Lisboa uma instituição que se tornará um marco no
ensino musical, a Academia dos Amadores de Música.
33
João Baptista Antunes era proprietário da Real Fábrica de Instrumentos Músicos
de Teclado mas por não conseguir resistir à concorrência estrangeira dedicou-se
apenas à afinação.
A família alemã Haupt conheceu um desenvolvimento significativo na
construção de instrumentos de sopro da família das madeiras.
Na construção de instrumentos de madeira, o português Manuel António da
Silva foi o fabricante que mais prestígio teve com as suas flautas, clarinetes,
oboés e fagotes.
Frederico Haupt incenticou a criação de uma oficina para a construção de
instrumentos de sopro da família dos metais fabricando cornetas, trompas lisas,
trombones de varas, cornetas de chaves e oficleides mas a divulgação do
saxofone levou à decadência desta oficina.
34
7. Dos finais do século XIX à actualidade
7.1. As tentativas de renovação da vida musical: as influências germânicas
e a música instrumental
Nos anos 70 do século XIX deu-se uma abertura maior à Europa com as maiores
influências a virem de França.
Uma das consequências dessa abertura foi o maior interesse no estudo da
história da música com Joaquim de Vasconcelos, Francisco Marques de Sousa
Viterbo ou Ernesto Vieira.
A maior alteração dá-se no entanto nos géneros musicais deslocando-se o
interesse principal do teatro lírico para a música instrumental.
Essa alteração fez-se sentir essencialmente em Lisboa e no Porto já que
Coimbra não desenvolveu um público teatral e antes cultivava um estilo boémio
e estudantil.
Registou-se ainda uma aproximação dos músicos portugueses às influências
germânicas.
No Porto alguns dos maiores vultos deste período como Bernardo Valentim
Moreira de Sá, Guilhermina Suggia e Raimundo de Macedo estudaram na
Alemanha assim como Alexandre Rey Colaço e Victor Hussla de Lisboa.
35
No Porto a influência germânica fez-se sentir de forma acentuada traduzindo-se
numa actividade docente intensa e concertística cujos agentes mais directos
foram Bernardo Moreira de Sá, Raimundo de Macedo e Guilhermina Suggia.
No Porto foram ainda fundadas a Sociedade de Quartetos em 1874 e a
Sociedade de Música de Câmara em 1883.
Moreira de Sá criou ainda o Quarteto Moreira de Sá em 1884 dando a conhecer
música clássica e romântica até então inédita em Portugal.
Moreira de Sá ainda dirigiu concertos na Associação da Classe Musical dos
Professores de Instrumentos de Arco do Porto e nos quais foram apresentadas
as primeiras obras de Wagner.
Em 1917 foi fundado o Conservatório do Porto com um plano de estudos que
terá influenciado a reforma do conservatório de Lisboa de Viana da Mota dois
anos mais tarde.
Guilhermina Suggia teve uma brilhante carreira internacional como violoncelista
tendo tocado na Orquestra Sinfónica do Orpheon Portuense e no Quarteto
Moreira de Sá.
Em 1901 Suggia parte para Leipzig para continuar os seus estudos musicais
onde começa a sua carreira internacional.
Raimundo de Macedo desenvolveu uma acção importante como pianista e chefe
de orquestra.
No Porto distinguiram-se ainda Óscar da Silva, Luís Costa e Hernâni Torres,
todos de formação germânica.
36
7.1.3. Luís de Freitas Branco e a introdução do modernismo em Portugal
Luís de Freitas Branco foi uma das figuras mais importantes no panorama
musical da viragem do século por ter aproximado a música portuguesa das
correntes mais modernas em voga na Europa.
Efectua estudos em Berlim voltando a Portugal em 1915 desenvolvendo uma
actividade pedagógica importante em conjunto com Viana da Mota na reforma
do Conservatório.
A obra inicial de Freitas Branco foi enquadrada nos movimentos modernistas em
que se enquadravam Fernando Pessoa e Amadeu de Sousa Cardoso.
João de Freitas Branco propõe uma divisão em três fases da obra do seu pai:
o A primeira começada com o poema sinfónico Depois de uma leitura de
Antero;
o A segunda compreendendo as obras de designação clássica;
o A terceira a linha nacionalista influenciada primeiro pelo Integralismo
Lusitano e a segunda o espírito da reforma do Conservatório.
A música de Freitas Branco caracterizava-se pelo ecletismo em que cada
variação é considerada uma técnica e uma concepção estética diferentes tendo
recorrido pouco ao património folclórico.
Em Portugal não se tratava de um retorno a uma tradição sinfónica mas sim à
criação dessa tradição que apesar dos casos isolados de Bomtempo e Viana da
Mota, nunca tinha chegado a existir.
37
O principal pólo de referência nos compositores do início do século XX é a
música francesa nomeadamente a escola de César franck a Vincent d’Indy, de
Fauré a Debussy e Ravel, de Poulenc a Paul Dukas.
Seguindo uma linha iniciada por Freitas Branco, alguns desses compositores
aproxima-se do neoclassicismo.
Outros ainda aproximam-se do dodecafonismo da Escola de Viena mas de forma
pouco consistente.
O nacionalismo em particular os aspectos do folclore também foram uma
influência para muitos destes compositores.
38
Em 1963 for iniciativa da FNAT (Fundação Nacional para a Alegria no Trabalho) é
criada uma companhia portuguesa de ópera sediada no Teatro da Trindade.
A musicologia histórica conhece uma evolução a partir dos anos 30 com Manuel
Joaquim, Mário de Sampaio Ribeiro e Macário Santiago Kastner.
39